Cidade imperial livre
No Sacro Império Romano-Germânico, uma cidade imperial livre (em alemão: Freie Reichsstadt) era aquela formalmente dirigida apenas pelo imperador — diferentemente da maioria das cidades do Império, que pertenciam a um território e assim eram regidas por um dos muitos príncipes (Fürsten) do Império — duques ou príncipes-bispos. Cidades livres também tiveram representação independente no Reichstag do Sacro Império.
Para ser mais preciso, uma distinção foi feita no papel entre as cidades imperiais (Reichsstädte) e as cidades livres (Freie Städte). Cada cidade livre era anteriormente regida por um príncipe-bispo, mas essas cidades haviam conquistado sua independência do bispo durante a Alta Idade Média. Eram Basileia (1000), Worms (1074), Mogúncia (1244, revogada em 1462), Ratisbona (1245), Estrasburgo (1272), Colônia (1288) e Speyer (1294). Embora os detalhes jurídicos variassem bastante entre elas, as cidades livres originalmente tinham mais direitos e privilégios do que as cidades imperiais. Por exemplo, cidades livres só tinham que apoiar o Imperador durante as cruzadas e organizar a sua própria proteção, enquanto as cidades imperiais também tinham que pagar impostos ao Imperador e abastecer as tropas para suas campanhas militares.
Mas, ao longo do tempo, a diferença tornou-se cada vez menos evidente, tanto que as "Cidades Livres e Imperiais" eram conhecidas coletivamente na Dieta como "Cidades Imperiais Livres". De fato, o que importava não era o status legal, mas a diferença de riqueza: cidades ricas, como Lübeck ou Augsburgo, foram verdadeiros enclaves autogovernados dentro do Império; travaram guerra e faziam a paz, controlavam seu próprio comércio e permitiam pouca interferência do exterior. No final da Idade Média, muitas cidades livres formaram alianças (Städtebünde), das quais a mais conhecida foi a Liga Hanseática, embora alguns dos seus membros nunca tivessem sido cidades livres, tendo ingressado na liga com a permissão de quem comandava o seu território.
As cidades ganhavam (e algumas vezes perdiam) a sua liberdade entre as constantes mudanças do poder político medieval. Algumas cidades obtinham uma carta de doação e outras eram ricas o suficiente para comprar sua liberdade a um príncipe que precisasse de dinheiro; algumas a ganhavam pela força bruta, enquanto outras a conseguiam em tempos de caos. Várias cidades se tornaram livres através da extinção das famílias dominantes, como o Hohenstaufen.
Algumas cidades livres perderam os seus privilégios. Outras voluntariamente colocaram-se sob a protecção territorial de um magnata. Outros ainda, como Donauwörth em 1607, foram destituídas de seus privilégios, pelo imperador em pessoa, num verdadeiro jogo de ofensas; outras eram afastadas pelo Imperador, como Mühlhausen, Duisburg e Offenburg, embora esta última foi capaz de recuperar o seu estatuto.
Cidades livres e imperiais foram apenas admitidas formalmente como Reichsstand para o Reichstag em 1489 e assim seus votos eram geralmente considerados apenas a título de consulta, em comparação com as bancadas do Kurfürsten e dos Príncipes. As ligas de cidades dividiam-se em dois grupos, ou bancadas, na Dieta Imperial, a do Reno e da Suábia. Na altura da Paz de Vestfália (1648), as cidades constituíam um terceiro "colégio eleitoral" formal na Dieta. A mais poderosa Reichsstädte incluía Augsburgo, Bremen, Colônia, Frankfurt, Hamburgo, Lübeck e Nuremberga.
O número de cidades imperiais livres variou muito ao longo dos séculos, assim como a sua distribuição geográfica. Em geral, houve muitas mais cidades livres nas áreas com uma estrutura política diversificada, do que em áreas onde havia grandes territórios se estabelecendo.
A Encyclopædia Britannica de 1911 refere-se a uma lista elaborada em 1422 com 75 cidades livres, e uma outra, elaborada em 1521, com 84. A consolidação territorial gradualmente reduziu o número para as 51 cidades presentes no Reichstag de 1792, no final do Império. Muitas estavam no sudoeste e na Francônia, em algumas regiões do norte e do oeste, e nenhuma no leste. Na sua maioria, essas cidades eram ex-membros da antes poderosa Liga Hanseática.
Nos séculos XVI e XVII, algumas cidades livres do Império foram separadas devido a mudanças territoriais externas. As tropas de Henrique II da França tomaram as cidades livres conectadas aos três bispados de Metz, Verdun e Toul. Da mesma forma, os maréchals de Louis XIV da França tomaram muitas cidades com base em alegações produzidas pela sua Câmara de Reuniões. Dessa forma, na Alsácia, Estrasburgo e as dez cidades da Decápole foram anexadas. Além disso, quando a Confederação suíça ganhou a sua independência do Império, em 1648, as cidades imperiais suíças, como Basileia, Berna e Zurique, deixaram o Império como cantões confederados.
À época da França Revolucionária, esta tendência seria rapidamente intensificada na Europa. Primeiro, entre 1789 e 1792, as zonas a oeste do rio Reno foram anexadas pelo exército revolucionário, que terminaria assim a longa tradição de liberdade de diversas cidades como Colônia, Aachen, Düren, Espira e Worms. Depois, as Guerras Napoleônicas levaram à reorganização do Império em 1803, e todas as cidades livres, exceto seis — as cidades Hanseáticas de Hamburgo, Brema e Lubeque, e as cidades de Francoforte, Augsburgo e Nuremberga — foram eliminadas.
Finalmente, Napoleão dissolveu o Império em 1806. Em 1811, todas as cidades livres tinham sido vencidas — Augsburgo e Nuremberga tinham sido anexadas pela Baviera; Frankfurt tinha-se tornado o centro do Grão-Ducado de Frankfurt, um Estado fantoche de Napoleão, e as três cidades Hanseáticas tinham sido anexadas diretamente pela França, como parte de seu esforço para fazer valer o Bloqueio Continental contra a Inglaterra. Hamburgo e Lübeck e os territórios ao redor formaram os departamentos de Bouches-de-l'Elbe, Bremen e Bouches-du-Weser.
Quando a Confederação Germânica foi criada em 1815, Hamburgo, Lübeck, Bremen e Frankfurt, mais uma vez, tornaram-se cidades livres. Frankfurt foi anexada pela Prússia, em consequência da Guerra Austro-Prussiana de 1866.
As três cidades hanseáticas permaneceram como Estados-membros do novo Império Alemão, e assim se mantiveram na República de Weimar e no Terceiro Reich, embora sob Hitler este estatuto fosse puramente fictício. Devido à antipatia de Hitler por Lübeck[1] e a necessidade de compensar a Prússia por suas perdas territoriais decorrentes da Lei da Grande Hamburgo, a cidade foi anexada à Prússia, em 1937.
Na República Federal da Alemanha, criada após a II Guerra Mundial, Bremen e Hamburgo tornaram-se Estados-Membros (Länder), um estatuto que mantêm até hoje. Berlim, que nunca tinha sido uma cidade livre, também recebeu o estatuto de Estado após a guerra, por ter sido dividida no pós-guerra.
Ver também
editar- Este artigo incorpora texto do artigo «Imperial Cities Or Towns» (em inglês) da Encyclopædia Britannica (11.ª edição), publicação em domínio público.
Referências
- ↑ Guia de Lubeck (em inglês)