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Psicologia Dos Povos-Wundt

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Texto completo: Histria e Vida Mental: A Psicologia dos Povos wundtiana.

Proposta para sesso temtica (ABRAPSO -2007) Autor: Ronald Clay dos Santos Ericeira- Doutorando em Psicologia Social pelo Programa de Ps-Graduao em Psicologia Social (UERJ). 1 INTRODUO A obra de Wilhelm Wundt sobejamente conhecida pela suas contribuies aos desenvolvimentos tericos e metodolgicos da Psicologia Experimental. factvel que Wundt empreendeu esforos intelectuais e profissionais direcionados configurao da Psicologia como uma cincia autnoma, aqui entendida como possuidora de uma metodologia prpria de abordagem de seu objeto de estudo: as funes mentais dos seres humanos. Nessa direo, Wundt forjou pertinentes leis gerais sobre o funcionamento da experincia consciente, quais sejam: princpio da realidade imediata, da sntese criadora, e da conscincia auto-reguladora. A vertente social da obra wundtiana mais difundida alude aos princpios tericos empregados no laboratrio experimental de Leipzig. A relevncia histrica e epistemolgica da Psicologia dos Povos (Vlkerpsychologie) quase sempre secundada pelos manuais de Histria da Psicologia. As digresses presentes neste trabalho so referentes a uma resenha da verso em espanhol de quatrocentas e sessenta e quatro pginas, que resumem os dez volumes publicados originalmente em alemo. Em a Psicologia dos Povos, Wundt prope uma srie de consideraes psicolgicas referentes s qualidades intelectuais e morais dos povos. Sua abordagem examina os diferentes graus de evoluo psquica do homem, desde a fase primitiva at as produes espirituais 1 das culturas mais complexas. Um elemento analtico a ser destacado dessa seminal obra do psiclogo alemo referente ao emprego do termo Psicologia dos Povos. Este, no sculo XIX, um neologismo com sentidos diversos, a saber: ele poderia se referir s consideraes etnogrficas sobre qualidades intelectuais, morais, e contedos de ordem psquica dos povos, precisamente desvendando as relaes mentais que guardam entre si. Em outros termos, tratar-se-ia de uma caracterologia dos povos primitivos e cultos;

Atento para o uso do termo espiritual, que est sendo empregado na acepo do vocbulo alemo Geistproduo espiritual = produo mental.

segundo, poderia ser considerado um ramo da psicologia aplicada, calcada em questes espirituais (arte, religio, linguagem) resultantes da vida humana em coletividade Em efeito, a Psicologia dos Povos consiste em dispor contedos religiosos, artsticos, lingsticos e scio-econmicos no em sees longitudinais, mas transversais. Isto , considerando os graus principais da evoluo psicolgica dos povos aos pares e em cada grau de conexo geral dos seus fenmenos . Em que pese a dificuldade de limite dos perodos da evoluo mental dos povos, Wundt advogava que certas representaes, sentimentos, motivos de conduta poderia sem agrupados em fases, que apresentariam caractersticas psicolgicas especficas de cada perodo da evoluo mental. As fases da evoluo psicolgica seriam definidas e estariam circunscritas em quatros estgios: Primitivo; Totemismo; Heris e Deuses; Evoluo em direo humanidade. Observo que uma questo relevante a ser tratada prpria definio de um campo de estudo singular para a Psicologia dos Povos. Isso porque as proposies tericas e metodolgicas da Psicologia dos Povos aproximavam-na de outras disciplinas em emergncia naquele perodo, qual seja: a Etnografia, a Etnologia e a Psicologia Social. Aquelas estudavam como surgiram os povos e como mantiveram seus hbitos e costumes at a atualidade. A Psicologia Social estudaria a vida dos pequenos grupos. Por seu turno, a Psicologia dos Povos estaria interessada em determinas as caractersticas mentais dos povos e no como eles utilizam mecanismos simblicos para se modificarem e se diferenciarem entre si. Na tica wundtiana, esse ramo da Psicologia estudaria a organizao dos graus de evoluo psicolgica dos povos em sees transversais que aglutinariam os feitos humanos de cada poca (religio, arte, casamento, poltica). Sendo estes considerados como processos mentais superiores. cabvel destacar que esse trabalho de pesquisa wundtiano conduziu a consideraes sobre os diferentes graus de evoluo psquica dos povos. Ou, seja, propese elaborao de um caminho de descoberta da psicognese do homem. Wundt acreditava que o exame dos estados psquicos anteriores possibilitaria aportar pistas sobre as produes culturais mais complexas e sofisticadas. Nessa direo, malgrado a opo de emprego da nomenclatura Vlkerpsychologie, a obra no trata apenas de povos, mas de famlias, grupos, comunidades, entre outros. Em sua tica, a categoria povo teria um fundamental espectro conceitual que englobaria outras categorias (classe, etnia, estirpe,

etc). No entanto, na viso wundtiana, uma verdadeira Psicologia consagrada aos estudos das culturas humanas deveria ampliar seu campo de estudo at se constituir uma Psicologia da Humanidade. 2 AS FASES DE EVOLUO PSICOLGICA POR UMA TICA DIACRNICA No tocante ao primeiro estgio da evoluo mental, Wundt afirma que o absolutamente primitivo seria um povo que no teria uma fase psquica anterior ou que executaria um nmero menor de operaes mentais em relao s qualidades gerais humanas. Acrescenta que os dotes intelectuais e morais dos primitivos se mantiveram limitados pela inexistncia de contatos culturais com os povos vizinhos. A configurao da fase primitiva da humanidade trouxe algumas inquietaes metodolgicas para Wundt. Onde encontrar os povos primitivos? Que critrios utilizar para identific-los? Novamente depara-se com uma questo conceitual, haja vista o primitivo poder ser identificado tanto pela tica negativa - o selvagem desprovido de qualidades humanas-, quanto pela viso positivada - a noo de bom selvagem que se contrapes ao deletrio mundo dos povos civilizados. Cumpre assinalar que o autor analisou dados coligidos por missionrios e viajantes sobre tribos consideradas intactas do contato com outros povos: os pigmeus na regio do Rio Nilo e algumas tribos asiticas nas Filipinas e Malsia. Na Psicologia dos Povos destacado que as formas culturais do matrimnio e da famlia teria surgido no seio das sociedades primitivas. Suas relaes familiares seriam marcadas primeiramente pela agamia e a promiscuidade e depois pela poliginia e poliandria entre os diferentes grupos. Ademais, para Wundt, os primitivos teriam uma mitologia pouco complexa baseada na crena em vrios deuses, demnios e na magia. Alis, na perspectiva wundtiana, a cosmologia primitiva seria ingnua, cujos influxos seriam derivados de suas crenas em seres e aes inefveis, que seriam os responsveis pelas enfermidades e pela morte sujeitos. Nessa direo, no haveria uma causalidade lgica, mas uma causalidade mgica no vinculada a regras racionais de explicao do mundo. A propsito, essas duas formas de pensamento no guardariam estreitas relaes entre si. A primeira estaria preocupada com leis e regularidades; a segunda com o acaso e o impondervel.

Prosseguindo as digresses sobre a religiosidade primitiva, vale apontar um politesmo sobejamente marcado e a ausncia de cultos formais em um sentido estreito do termo. Havia sim prticas individuais mgicas para combater os demnios das enfermidades e danas cerimoniais endereadas aos deuses como suplcios. Em que tange o vesturio e habitaes primitivos, eles vestir-se-iam de forma simples, sem representativos adornos, criariam pequenos animais, morariam em cavernas com o fito nico de se proteger das intempries da natureza. Precisamente o uso de roupas e a utilizao teleolgica de instrumentos domsticos diferenciariam o homem primitivo do estado animal. No trato da arte primitiva, haveria dois segmentos com maior destaque: a dana, marcada pela destreza de movimentos, posturas e expresses mmicas e a cano, inspirada na imitao dos sons da natureza. Por seu turno, a fase totmica demarcaria uma estreita relao entre homens e animais e plantas. Os dados sobre este estgio do psiquismo humano foram fornecidos pelos viajantes Spencer e Gillen 2 em suas viagens Austrlia e ao noroeste dos Estados Unidos. Notadamente, essas tribos estavam divididas em cls que cultuavam totens. A poca totmica recebe esta designao pela relao estreita estabelecida entre um totem (animal ou vegetal) e um cl (grupos de homens que se reconhecem pertencendo a uma mesma filiao totmica). Convm salientar que as mltiplas subdivises dos grupos australianos e americanos em cls engendraram um sistema religioso complexo com o estabelecimento de domnios profanos e objetos sagrados os totens. Alm disso, as representaes anmicas constituiriam o fundamento da estrutura de crenas em totens, posto alm se sagrados, esses so considerados como antepassados ou fundadores dos cls. O sistema totmico possibilitou ainda que as coisas do mundo pudessem ser classificadas e organizadas a partir de critrios de excluso ou incluso aos cls totmicos. Desse modo, surgiu a conceituao de tabu que definia regras comportamentais ante os contedos sagrados, os quais poderia ser de evitao, devoo, interdio, resguardo, etc. Outrossim, a noo de feitiche tambm emergiu ao se referir s atribuies de poderes mgicos ou demonacos a objetos naturais ou inanimados. O fetichismo citado como outro possvel elemento desencadeador do pensamento religioso e mitolgico No
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A ttulo de informao, o material que esses dois viajantes forneceram a Wundt, que o possibilitou dissertar sobre a fase totmica em a Psicologia dos Povos, o mesmo que Durkheim (1989) utilizou para escrever As formas elementares da vida religiosa.

totemismo, pedras, esculturas, madeiras so veneradas por se acreditar que so detentores de poderes mgicos ou porque foram enviados por desgnio divino.. A propsito, na atualidade, ainda haveria resqucios de prticas feitichistas no culto de amuletos e talisms. O sistema religioso totmico teria antecedido a prtica religiosa de devoo aos antepassados e aos mortos. No domnio familiar, teria havido um avano moral em direo exogamia e proibio do incesto. A preponderncia da exogamia aconteceu com o objetivo de diminuir o rapto de mulheres entre tribos rivais. Assim, gradualmente, a poliandria e poliginia vo desaparecendo das prticas sociais. Na arte totmica, h um desenvolvimento significativo das artes plsticas com a talha de armas e utenslios mgicos, alm de tatuagens no corpo e do uso de mscaras adornas em danas cerimoniais. Este estgio seria marcado ainda pela consolidao do comrcio entre as tribos. A fase herica e dos deuses trouxe baila a emergncia do processo de individualizao dos sujeitos ante as sociedades gregas e romanas, haja vista a valorizao da personalidade forte e relevante dos heris. Nesse sentido, alm de uma antropomorfizao dos deuses, ocorreu uma representativa valorizao social de caractersticas humanas individuais. Logo, a noo de heri passou a englobar a idia de personalidade. Ademais, se o heri era o paroxismo das qualidades humanas, os deuses seriam o status de apogeu para os heris. A partir da oposio entre os deuses antropomrficos e os demnios impessoais, a religio estruturou-se como um domnio autnomo da vida em sociedade. Alis os mitos e cultos somente assumiriam uma feio religiosa definitiva nesse perodo. A religio se forja, pois, como corolrio do pensamento mtico. No entanto, na tica wundtiana, embora as religies mantenham estreitos vnculos com as mitologias, elas esto intimamente fundidas com os sentimentos e afetos despertados por tradies msticas e lendas, as quais, ao serem acionadas, produzem a elevao da conscincia religiosa e o fortalecimento dos afetos coletivos. Talvez por isso, na fase herica, ocorreu a disseminao de diversas festas e celebraes aos deuses da natureza e do vinho: as bacanais em homenagem a Baco; e as saturnlias em louvor a Saturno.

Wundt aponta este perodo como demarcando o princpio da religio nacional, j que cada Cidade-Estado elegia os seus deuses e heris a serem cultuados pela populao. Essas formas de culto concordavam na inteno fundamental em evocar a divindade em favor pessoal, e assim lograr xito em seus pedidos. Nessa direo, oraes, splicas, agradecimentos, hinos, plegarias laudatrias, sacrifcios, oferendas, eram recursos religiosos utilizados para se entrar em contato com as divindades, visando o propsito de se alcanar benefcios pessoais. Nesse perodo da evoluo humana, os mitos teognicos e cosmognicos (Cronos e Ria, Jeovah, Ado e Eva), se desenvolvem e com eles a crena na vida aps a morte e na diviso do mundo em vrios planos de existncia: o terrestre; o celestial que seria o local da morada dos deuses, dos bem-aventurados e virtuosos e o inferno, morados dos culpados e degenerados. No que tange s outras esferas da vida social, o Estado e os direitos polticos se constituram, desde ento, apartados de preceitos religiosos. Alm de definir os heris e os deuses cultuados em suas jurisprudncias, cada Cidade-Estado elaborava as normas jurdicas que regulamentavam as relaes interindividuais que se desdobravam em seus territrios. A arte da poca herica sinalizada como uma das mais importantes da histria da arte mundial, com o desenvolvimento da arquitetura na construo de templos, lpides e tmulos. Alm disso, as obras plsticas, a poesia e o teatro tambm usufruram avanos no mbito das tcnicas e na diversidade de material empregado. O perodo de Evoluo Humanidade teria se iniciado a partir do movimento renascentista. O fim do imprio romano demarcou tambm o fim do monoplio da igreja sobre a cultura. O Renascimento teria renovado a cultura mundial, ao mesmo tempo, em que forjou um contedo prprio ao esprito de seu tempo. Na acepo de Wundt, as funes psicolgicas superiores, como linguagem, costumes, pensamento religioso e expresso artstica se tornam universais. A universalidade entendida como o acesso geral de todos os seres humanos ao vasto cabedal de saberes e fazeres acumulados pelos povos em suas trajetrias histricas. Entretanto, Wundt novamente encontra dificuldades para o uso inequvoco do termo humanidade. Este pode ter tanto um sentido mais amplo - aplicado para designar e especificar as virtudes humanas - quanto pode indicar os valores ticos que distinguem os homens dos animais.

A organizao do Estado Moderno, a intercomunicao entre os povos, a fabricao de produtos mentais superiores, como lnguas, religies, costumes teriam sido eventos que contriburam para o caminho do homem para a fase da Humanidade. Nesta emergiram os grandes imprios transculturais, as grandes religies mundiais, as culturas universais, quais consubstanciaram a possibilidade de escrita de uma historiografia sobre a histria mundial. A comunicao escrita, com a publicao em srie de livros, teria sido o primeiro passo da transposio de uma cultura nacional para a cultura mundial. Isso porque obras escritas em diferentes tempos e espaos puderam circular livremente entre os povos. Assim, os saberes e os fazeres tradicionais deixaram de ser transmitidos exclusivamente por meios orais. Logo, h o distanciamento entre as culturas locais e a histria pertencente toda a humanidade. Nas primeiras, haveria o predomnio da linguagem oral sobre a escrita. A lngua falada seria um produto social resultante da convivncia interindividual. Por seu turno, a massificao da produo escrita possibilitou a fixao das lnguas, facilitou as trocas comerciais e a expanso da literatura, que se tornou uma disciplina indubitavelmente universal. Alm disso, a consolidao da escrita permitiu que os diversos conhecimentos circulassem entre as diferentes sociedades,

independentemente do tempo e do lugar que foram formulados. Segundo Wundt, os grandes imprios absolutistas desempenharam um papel ambguo no mbito do desenvolvimento cultural da humanidade. A atuao de um rei absolutista consolidou a idia de um culto monotesta. Porm, somente com o fim dos grandes imprios coloniais que houve o reconhecimento do valor artstico e cultural dos povos at ento minoritrios ou escravizados. Assim, as produes simblicas culturais orientais, com seus mitos, sagas, teatros e conhecimentos cientficos, expandiram-se em direo ao ocidente, aps a dissoluo dos imprios greco-romanos. Alis, as viagens deixaram de ser feitas apenas para a conquista de territrios estrangeiros e passam a ser vislumbradas com o intuito de se conhecer novas terras e com o objetivo de se ampliar os crculos de saber. Alm disso, a imigrao e o deslocamento dos povos entre longos e distintos territrios viabilizam as trocas culturais entre as civilizaes. No tocante as transformaes religiosas da fase da Humanidade, as religies nacionais cedem lugar para as religies mundiais. No perodo herico, deuses e crenas se deslocaram entre os povos. Os deuses estrangeiros eram incorporados ao panteon nacional,

ainda que com nomes diferentes. Todavia, os antigos deuses no correspondiam mais s mudanas exigidas pelas grandes transformaes sociais, as quais exigiam novas divindades, j que as virtudes nacionais no eram mais postas entre as mais altas e gerais exigncias humanas. Era preciso que as religies mundiais se conectassem vida humana terrena. Para Wundt, haveria duas religies mundiais no sentido estrito: Budismo e Cristianismo. O Confucionismo seria apenas um sistema doutrinal antes de ser qualquer religio. Por seu turno, o Islamismo seria uma mescla de idias religiosas judaico-crists com tradies rabes e turcas. Em sua tica, Budismo e Cristianismo teriam se tornado mundiais pelas suas tendncias universais, sem localismos. A primeira expressaria a religiosidade do mundo oriental, este do mundo ocidental. As duas vem a vida humana como sofrimento, do qual nasce uma tendncia ao ascetismo e penitncia pela esperana em um futuro eterno. Em ambas, os filhos de um Deus/Rei tornam-se mendigos e dedicam-se salvao dos povos. Budismo e Cristianismo insistiriam na salvao da humanidade em sua totalidade, sem levarem em considerao o gnero, a classe social e a etnia de seus adeptos. Nessa direo, as religies mundiais honram figuras humanas representando divindades e nelas se v refletida toda a Humanidade. Em ltimo termo, seria indiferente que Buda e Cristo tenham ou no tido existncias reais. Esta seria uma questo de possibilidade histrica, no de necessidade religiosa, que prescindindo de outro testemunho, aceita a potente personalidade religiosa de seus criadores que permanece indubitvel para seus crentes. A idia de que Deus, pai provedor, no faz distino de cor, raa, sexo, possibilitou colocar todos os povos da humanidade sob a gide da mesma cruz. Somos irmo sob o amor de Cristo. Em termos sintticos, para Wundt, a cultura mundial teria as seguintes propriedades: a crescente indiferena pelo Estado Moderno; a elevada estima das personalidades e direitos individuais; interesse por questes polticas e valorizao da formao espiritual. A cultura mundial seria simultaneamente cosmopolita e individualista, refletindo o carter universal do humano. H aqui uma tenso entre o universalismo mundial e o individualismo, j que o prestgio e o culto personalidade ter seu auge na

fase da Humanidade. Alis, caberia a cada sujeito elaborar seu prprio percurso em busca do aprimoramento espiritual, isto , do refinamento de seus contedos psquicos superiores.

Em efeito, Wundt prope um evolucionismo romntico da humanidade, posto haver uma valorizao do carter individual perante, por exemplo, os desgnios de um Estado Nacional soberano. Nessa perspectiva, acrescenta, a histria da humanidade deveria aambarcar a histria da produo mental de todos os povos e no apenas contemplar a historiografia das civilizaes eruditas. Do ponto de vista antropocntrico, a questo da histria universal seria a mais relevante para o homem. Na acepo wundtiana, a histria do mundo seria a histria da humanidade, a histria de todos os espritos humanos. Assim. todos os feitos surgidos por motivos espirituais nascidos da atividade humana sero contedos essenciais da Histria. Esse adendo uma advertncia ao fato de que a maioria dos tratados histricos atenienses se detinha apenas na descrio dos feitos dos povos cultos, logo no apareciam inclusos os povos que tiveram, a seu modo, uma histria espiritual prpria, como os povos africanos e amerndios. Nesse vis, a produo cultural primitiva no seria menos um produto histrico de menos valor do que os Estados poltico e nacionais europeus. Para os primitivos, o passado trazido baila atravs de lendas e mitos, por isso so conhecidos como povos sem histria 3 . Somente com a formao dos grandes imprios coloniais e a multiplicao de contatos culturais e comerciais que a histria mundial, como conhecemos na atualidade, entra em cena. Do ponto de vista psicolgico, haveria duas concepes de histria: uma objetiva relacionada sucesso de acontecimentos atravs do tempo, os quais so organizados pelas narrativas construdas pelos historiadores. Por outro lado, esta seqncia objetiva de fatos vivenciada subjetivamente. Assim, o homem estaria distante de abarcar todos feitos de sua histria, posto no conseguir englobar o horizonte da conscincia histrica vivida, por exemplo, pelos primitivos. Dentro de cada horizonte de conscincia isolado estariam representados os mais diferentes graus de conscincia histrica. Esta estreita relao do conceito de histria com o carter da vida consciente permitiu a formulao de um postulado terico, qual seja: uma relao causal entre a
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Para aprofundar o debate entre os povos com e sem histria ver Lvi-Strauss (1976).

conscincia individual e a compreenso da vida histrica. A propsito, entre as diferentes determinantes da vida histrica, a vontade se constitui uma condio sine qua non, tanto na histria coletiva, quanto no funcionamento do psiquismo individual. A histria e a pr-histria srios efeitos da influncia da vontade pessoal sobre a comunidade, seno a apario de personalidades individuais influenciando no destino dos povos dentro da existncia consciente da conexo histrica. Isto se completa na cultura mundial, quando se cria uma propriedade comum espiritual da Humanidade que leva consigo uma conscincia prpria. Esta evoluo tem como componente principal a religio ao erigir um forte lao entre os povos que, por mais que difiram histrica e culturalmente, criam uma comunidade humana geral. Nessa direo, a viso de Histria wundtiana se aproxima dos princpios filosficos, de Hegel, que questionam a evoluo da Histria por desgnios divinos. Para ambos, devem-se abrir brechas metodolgicas para o entendimento da ao individual. A histria da humanidade seria regida pelas mesmas leis gerais da vida psquica. Assim, abrese uma nova via terica da Histria, que seria uma conseqncia de um plano prdeterminado, uma obra de leis imanentes da prpria vida histrica. Influncia de Hegel para quem a histria seria evoluo das idias, fundadas sobre si mesmas, na qual os motivos surgem uns depois dos outros com uma estreita necessidade lgica. O fundamento prprio de uma histria da evoluo psicolgica da humanidade no o ser de uma realidade nascida das idias, seno emanadas da prpria realidade. Sua pretenso distingue-se de uma filosofia da Histria. Distingue-se dela na concepo psicolgica sobre a vida mental. Uma filosofia da histria deveria basear-se na histria da evoluo psicolgica da humanidade. A histria da humanidade, j despojada de suas envolturas psquicas, mitolgicas e biolgicas, recebe contedos de todos os conceitos anteriores, como povo, Estado, religio, cultura, Todos se subordinando ao princpio de uma imanente regularidade. 3 COMENTRIOS FINAIS Diria que os objetivos desta comunicao foram minimamente trs, a saber: primeiro, debater a proeminncia desta obra como uma proposta concreta de abertura da Psicologia para as demais Cincias Sociais Sociologia, Antropologia, Economia e

Poltica; segundo, discutir a noo de religio, arte, linguagem e cultura como funes psicolgicas superiores; terceiro, tratar a interpretao idiossincrtica de Wundt sobre Histria a partir de suas digresses sobre a vida mental consciente. Desse modo, vimos que anlises de Wundt sobre os processos mentais superiores somente se efetivaram devido ao debate constante que estabeleceu com as disciplinas sociais e humanas que emergiam e se consolidavam no domnio cientifico no comeo do sculo XX. Do mesmo modo, esse psiclogo se props a estudar temas que, atualmente, esto distante do horizonte de pesquisa dos saberes Psi. Nessa perspectiva, malgrado partilhe as crticas metodologia aplicada na escrita da Vlkerpsychologie, reitero a inteno de restabelecer a preeminncia histrica desta obra como uma possibilidade de a Psicologia repensar seu objeto de estudo centrado no indivduo e no dilogo nem sempre travado com as demais cincias humanas e sociais. Por fim, percebemos que sua noo da Histria estaria estreitamente imbricada com os preceitos da vida mental formulado no Laboratrio de Leipzig. Alis, o entendimento da histria da humanidade deveria seguir os princpios referenciais que regem o psiquismo humano, qual seja: a incorporao de contedos psquicos inferiores por snteses mais complexas. A propsito, a Histria e a Conscincia Humana seriam intrinsecamente auto-organizadoras. Assim, as funes mentais superiores propiciaria o encadeamento lgico das idias e dos eventos histricos.

BIBLIOGRAFIA

DURKHEIM, mile. Formas elementares da vida religiosa: o sistema totmico na Austrlia. So Paulo: Paulinas, 1989. LVI-STRAUSS. O pensamento selvagem. So Paulo: Nacional, 1976. WUNDT, WILHELM. La psycogia de los pueblos: bosquejo de uma historia de la evolution psycologica de la humanidad. Barcelona: s/l, 1963.

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