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Terapia familiar

Das divergncias s possibilidades de articulao dos diferentes enfoques


Terezinha Fres Carneiro
Professora Associada do Departamento de Psicologia da PUC/RJ

campo da terapia familiar pode ser dividido, de uma maneira geral, em terapia familiar sistmica e terapia familiar psicanaltica. Esta diviso , muitas vezes, tomada rigidamente por alguns autores puristas de cada uma destas abordagens, o que acaba por prejudicar a produo terica na rea e os desenvolvimentos tcnicos dela decorrentes. Criam-s assim impasses terico-prticos a partir de uma polmica que pode ser muitas vezes con siderada falsa. Aps mais de vinte anos de trabalho clnico e de pesquisa com famliase casais, mar cados em alguns momentos por influncias predominantemente sistmicas (Fres-Car neiro,1983) e em outros, por influncias predominantemente psicanalticas (FresCarneiro, 1994), temos buscado, nos ltimos anos, refletir sobre as possibilidades de arti cular, tanto no campo teorico,quanto prtico, as contribuies destes dois enfoques na rea da terapia familiar e de casal (F res-Carneiro, 1989). Para chegarmos a nos sa proposta de articulao dos diferentes enfoques, consideramos importante percorrer os caminhos do surgimento e da organizao do campo das terapias de famlia.

O Surgimento da Terapia Familiar: Idias Precursoras


A terapia familiar evoluiu a partir de uma multiplicidade de influncias tendo recebido contribuies de diferentes reas do conhecimento. Desde o incio da formulao da psicanlise, Freud considerou e ressaltou em seus estudos as relaes fa-

miliares. Em "Fragmento da Anlise de um Caso de Histeria" (1905), ele afirma que devemos prestar tanto ateno s condies humanas e sociais dos enfermos quanto aos dados somticos e aos sintomas patolgicos, ressaltando que o interesse do psicanalista deve dirigir-se sobretudo para as relaes familiares dos pacientes. Freud faz referncia famlia em vrios outros momentos de sua obra. Em uma das suas Conferncias ele se refere s resistncias externas, emergentes das circuns-

tncias do paciente, de seu ambiente, que interferem no processo analtico e que podem explicar um grande nmero de fracassos teraputicos. Ressalta que, muitas vezes, quando a neurose tem relao com os conflitos entre os membros de uma famlia, os membros sadios preferem no prejudicar seus prprios interesses do que colaborar na recuperao daquele que est doente. Todavia, apesar da preocupao com as relaes familiares e da importncia que atribui a elas, Freud, como sabe

mos, no desenvolveu uma teoria da famlia nem tampouco uma tcnica de atendimento familiar. No final da primeira metade do sculo, aps a publicao em 1948, por Norbert Wiener do livro Cybernetics, vrias cincias comearam a enfatizar os sistemas ho meostticos com processos de retroalimentao (feedback) que tornam os sistemas autocorretivos. Assim, desenvolvimentos tericos da Biologia, da Sociologia, da Antropologia, da Informtica, da Teoria Geral dos Sistemas, influenciaram significativamente as primeiras formulaes da teoria e da tcnica do trabalho teraputico com famlias. Na rea "psi", podemos ressaltar algumas postulaes tericas de autores que colaboram para o surgimento da terapia familiar. Um importante precursor, sem dvida, foi Adler que enfatiza, na sua teoria do desenvolvimento da personalidade, a importncia dos papis sociais e das relaes entre estes papis na etiologia da patologia. Influenciado pelas teorias de Adler, Sullivan coloca que a doena mental tem origem nas relaes interpessoais perturbadas e que um entendimento mais completo do indivduo s pode ser alcanado no contexto de sua famlia e de seus grupos sociais. Sullivan coloca, assim, a patologia na relao, na dimenso intera cional. Paralelamente a Sullivan, Frieda Fromm-Reichman estuda a relao me-fi lho como possvel fonte de patologia e formula o conceito de me esquizofrenogni ca para explicar, em termos etiolgicos, a relao do paciente esquizofrnico com sua me. No final da Segunda Guerra, surge o movimento das comunidades teraputicas, proposto por Maxwell-Jones, para a reformulao da assistncia psiquitrica. O conjunto das relaes imediatas do paciente internado passou a ser considerado no seu tratamento. A idia fundamental que a melhora do quadro clnico do paciente vai ocorrer na medida em que ansiedades e conflitos surgidos nas relaes entre os membros da comunidade hospitalar possam ser trabalhados. Em seguida, Pichon-Rivire inclui a famlia na sua compreenso da doena mental e desenvolve a noo de "bode expiatrio" como depositrio da patologia que de toda a famlia. Todos estes movimentos, formulaes tericas e novas compreenses da patologia propiciaram o surgimento dos primeiros estudos no campo da terapia familiar propriamente dita. No incio da dcada de 50, ao mesmo tempo em que crescia, a partir da produo terica, a conscincia da importncia da famlia no desenvolvimento e na manuteno da patologia mental, a prtica clnica vigente era regida por regras que ressaltavam que o contato com a famlia do

paciente no deveria ser feito. Esta situao postergou a divulgao do trabalho clnico inicial com famlias e tornou a pesquisa, neste perodo, o modo mais facilmente aceitvel de se atenderem famlias, facilitando a aprendizagem sobre seu funcionamento e sobre as possibilidades teraputicas de atendimento conjunto. Assim, os primeiros autores importantes na rea da terapia familiar, produziram conceitos tericos relevantes sobre estrutura e dinmica da famlia, ao longo do desenvolvimento de grandes projetos de pesquisa. Esta pesquisa inicial foi realizada com a populao esquizofrnica, tendo em vista ser a esquizofrenia uma doena freqente, de longa durao, com alto ndice de reincidncia, e muito resistente aos mtodos teraputicos vigentes. O problema social dela decorrente justificou a aplicao de verbas pblicas na investigao desta patologia, o que ocorreu, neste momento, sobretudo nos Estados Unidos e na Inglaterra. Dentre os vrios grupos de pesquisa que se organizaram, o grupo de Gregory Bateson, cujo trabalho foi desenvolvido em Palo Alto, tem como resultado, em 1956, a primeira publicao na rea; o artigo clssico intitulado "Toward a Theory of Schizophrenia" onde so postuladas as bases familiares da etiologia da esquizofrenia e formulado o conceito de duplo-vnculo. Segundo estes autores, para que tenha lugar uma situao de duplo-vnculo so necessrias as seguintes condies: duas pessoas com um alto nvel de envolvimento (em geral a me e o seu beb); um paradoxo infringido pela me ao beb que chamado de "vtima"; a repetio desta experincia que passa a ser habitual; a impossibilidade da "vtima" de abandonar o campo, ou seja, escapar ao paradoxo. Aos poucos, o foco destes estudos, ini-

cialmente voltados para famlias com pacientes esquizofrnicas foi se ampliando, abrangendo famlias com pacientes neurticos e eventualmente famlias sem patologias srias. Os trabalhos mostraram que os fenmenos descobertos nas famlias esquizofrnicos eram elementos bsicos na dinmica familiar. Constata-se que os mesmos princpios interacionais estavam presentes em todas as famlias, embora em graus diferentes. A patologia no representava (assim como no representa no indivduo) uma situao qualitativamente diferente, mas uma exacerbao de determinados padres.

O Campo da Terapia Familiar: Enfoque Sistmico X Enfoque Psicanaltico


O Enfoque Sistmico Os Estados Unidos, que esto agora na terceira gerao de terapeutas familiares, reclamam para si o pensamento sistmico no trabalho clnico com famlias. A partir da teoria geral dos sistemas e da teoria da comunicao surgiram vrias escolas de terapia familiar e vrios institutos e centros de atendimento e de formao foram criados. Para os tericos da comunicao, qualquer comportamento verbal ou no verbal, manifestado por uma pessoa - o emissor em presena de outra - o receptor - comunicao. Ao mesmo tempo que a comunicao transmite uma informao, ela define a natureza da relao entre os comunicantes. Estas duas operaes constituem, respectivamente, os nveis de relato (digital) e de ordem (analgico) presentes em qualquer comunicao. Quando estes dois nveis se contradizem, temos o para

doxo. A comunicao paradoxal est na origem da patologia familiar. A famlia vista como um sistema equilibrado e o que mantm este equilbrio so as regras do funcionamento familiar. Quando, por algum motivo, estas regras so quebradas, entram em ao meta-regras para restabelecer o equilbrio perdido. A terapia desenvolvida a partir deste enfoque enfatiza a mudana no sistema familiar, sobretudo pela reorganizao da comunicao entre os membros da famlia. O passado abandonado como questo central, pois o foco de ateno o modo comunicacional no momento atual. A unidade teraputica se desloca de duas pessoas para trs ou mais medida em que a famlia concebida como tendo uma organizao e uma estrutura. dada uma nfase a analogias de uma parte do sistema com relao a outras partes, de modo que a comunicao analgica mais enfatizada que a digital. Os terapeutas sistmicos se abstm de fazer interpretaes na medida em que assumem que novas experincias - no sentido de um novo comportamento que provoque modificaes no sistema familiar - que geram mudanas. Neste sentido so usadas prescries nas sesses teraputicas para mudar padres de comunicao, e prescries, fora das sesses, com a preocupao de encorajar uma gama mais ampla de comportamentos comunicacionais no grupo familiar. H uma certa concentrao no problema presente, mas este no considerado apenas como um sintoma. O comportamento sintomtico visto como uma resposta necessria e apropriada ao comportamento comunicativo que o provocou. A partir do enfoque sistmico, vrias escolas de terapia familiar se desenvolveram, entre elas a Escola Estrutural, a Estratgia, a de Milo e, mais recentemente, a Escora Construtivista.

Escola Estrutural
Minuchin o principal terico da Escola Estrutural e para ele a famlia um sistema que se define em funo dos limites de uma organizao hierrquica. O sistema familiar diferencia-se e executa suas funes atravs de seus subsistemas. As fronteiras de um subsistema so as regras que definem quem participa de cada subsistema e como participa. Para que o funcionamento familiar seja adequado, estas fronteiras devem ser ntidas. Quando as fronteiras so difusas, as famlias so aglutinadas; fronteiras rgidas caracterizam famlias desligadas. Famlias saudveis emocionalmente possuem fronteiras claras. A estrutura no , para Minuchin (1974), uma entidade imediatamente acessvel ao observador. no processo de unio com a famlia que o terapeuta obtm os dados. A medida em que a terapia evolui, o terapeuta coloca questes, identifica os

padres transacionais e as fronteiras, levanta hipteses sobre os padres disfuncionais e obtm assim um mapa familiar. O terapeuta deve ajudar a transformao do sistema familiar, e para isto ele se une famlia desempenhando o papel de lder, identifica e avalia a estrutura familiar, e cria circunstncias que permitam a transformao da estrutura. As mudanas teraputicas so alcanadas atravs das operaes reestruturadoras, tais como: a delimitao de fronteiras, a distribuio de tarefas, o escalonamentodostress e a utilizao dos sintomas. A terapia estrutural uma terapia de ao, e o sintoma visto como um recurso do sistema para manter uma determinada estrutura.

Escola Estratgica
Jay Haley um dos principais tericos da Escola Estratgica juntamente com Jackson, Bateson, Weakland e Watzlawick. Para Haley (1976) o que caracteriza o sistema familiar a luta pelo poder. Ele utiliza o termo estratgico para descrever qualquer terapia em que o terapeuta realiza ativamente intervenes para resolver

problemas. A viso estratgica define o sintoma como expresso metafrica ou analgica de um problema representando, ao mesmo tempo, uma forma de soluo insatisfatria para os membros do sistema em questo. Nesta abordagem h uma orientao franca para o sintoma e os problemas so vistos como dificuldades interacionais que se desenvolvem atravs da supernfase ou da subnfase nas dificuldades de viver. A resoluo dos problemas requer a substituio dos padres interacionais. A abordagem teraputica pragmtica: trabalham-se as interaes e evitam-se os porqus. O principal objetivo mudar o comportamento manifesto do paciente. So utilizadas instrues paradoxais que consistem em prescrever comportamentos que, aparentemente, esto em oposio aos objetivos estabelecidos, mas que visam a mudanas em direo a eles. A instruo paradoxal mais freqentemente utilizada sob a forma de prescrio de sintoma, isto , encorajando-se aparentemente o comportamento sintomtico. Para Watzlawick et al (1967) o uso do paradoxo leva substitui

o do duplo vnculo patognico por um duplo vnculo teraputico.

Escola de Milo
A principal representante deste grupo Mara Selvini Palazzoli que, juntamente com Boscolo, Ceccin e Prata, fundou em 1967 o Centro para o Estudo da Famlia. Partindo dos mesmos pressupostos tericos da Escola Estratgica, Palazzoli et al (1980) consideram que os problemas que emergem quando os mapas familiares no so mais adequados, ou seja, os padres de comportamento desenvolvidos no so mais teis nas situaes atuais. Dada a tendncia homestase, os problemas surgem quando as regras que governam o sistema so to rgidas que possibilitam padres de interao repetitivos, homeostticos e vistos como "pontos nodais" do sistema. Um princpio teraputico fundamental para o grupo de Milo a conotao positiva dos comportamentos apresentados pela famlia. Quando se qualificam como positivos os comportamentos sintomticos, motivados pela tendncia homeosttica do sistema e no os comportamentos. Outro tipo de interveno utilizada pelo grupo de Milo o ritual familiar, ou seja, uma ao ou uma srie de aes das quais todos os membros da famlia so levados a participar. A prescrio de um ritual visa evitar o comentrio verbal sobre as normas que perpetuam o jogo em ao. No ritual familiar novas regras substituem tacitamente as regras precedentes. Para elaborar um ritual o terapeuta deve ser bastante observador e criativo. O ritual rigorosamente especfico a uma determinada famlia.

Assim, os terapeutas de famlia da Escola Construtivista passam a considerar a autonomia do sistema familiar partindo do estudo dos sistemas auto-organizados, da ciberntica de segunda ordem, e dos sistemas autopoticos postulados por Humberto Maturana (1990). Ocorre, neste enfoque, uma ruptura entre o sistema familiar/observado e o terapeuta/observador. O sistema surge como construo de seus participantes. O terapeuta estar interessado no mais no comportamento a ser modificado, mas no processo de construo da realidade da famlia e nos significados gerados no sistema. A nfase deslocada do que introduzido no sistema pelo terapeuta para aquilo que o sistema permite a ele selecionar e compreender. Alguns terapeutas estratgicos podem ser citados como tendo includo posteriormente na sua prtica o modo de pensar construtivista; entre eles, os do grupo de Milo. Palazzoli et al (1980) estabelecem trs princpios indispensveis ao trabalho teraputico: a formao de uma hiptese, a circularidade e a neutralidade. A hiptese formulada deve ser testada ao longo da sesso; se rejeitada, o terapeuta procurar outras, baseando-se nos dados obtidos na verificao da primeira hiptese. Todas as hipteses devem ser sistmicas, ou seja, devem incluir todos os membros da famlia e fornecer uma conjetura que explique a funo da relao. A circularidade diz respeito capacidade do terapeuta de conduzir a sesso baseando-se nos feedbacks recebidos da famlia como resposta informao que solicitou em termos relacio-

nais. A neutralidade consiste numa atitude de imparcialidade do terapeuta que se alia a cada membro da famlia, neutralizando qualquer tentativa de coalizo ou seduo de qualquer componente do grupo familiar. O enfoque construtivista, proposto a partir de uma tica sistmica de segunda ordem, questiona portanto o poder do terapeuta na terapia familiar e as intervenes teraputicas diretivas. A nfase no colocada na pergunta, mas na construo da interao e a ao do terapeuta pretende explorar as construes onde surgem os problemas.

O Enfoque Psicanaltico
A terapia familiar de enfoque psicanaltico d nfase ao passado, histria da famlia tanto como causa de um sintoma, quanto como um meio de transform-lo. Os sintomas so vistos como decorrncia de experincias passadas que foram recalcadas fora da conscincia. O mtodo utilizado, na maior parte das vezes, interpretativo com o objetivo de ajudar os membros da famlia a tomar conscincia do comportamento passado, assim como do presente e das relaes entre eles. Influenciados pelo trabalho estritamente psicanaltico, desenvolvido na Clnica Tavistock de Londres, Pincus & Dare (1978) formulam suas hipteses que fundamentam a prtica clnica com famlias e casais a partir de um grande interesse na trama inconsciente dos sentimentos, desejos, crenas e expectativas que unem os membros de uma famlia entre si e aos passados individuais e familiar. Estes autores interessamse particularmente pelos efeitos dos segredos e dos mitos na dinmica familiar. Ressaltam que os segredos podem pertencer a um membro da famlia, ou serem, tacitamente, compartilhados com outros; ou, inconscientemente, endossados pelos membros da famlia, de gerao para gerao, at se tornarem um mito. Quando um membro da famlia desafia um segredo familiar, a atitude dos outros membros tambm muda em relao ao segredo, o conluio rompido e novos fatos e fantasias vm tona. A partir da prtica clnica Pincus & Dare mostram como os segredos mais freqentes e mais cuidadosamente escondidos so aqueles que nascem de sentimentos ou fantasias incestuosas. O enfoque psicanaltico em terapia familiar denominado por Ruffiot (1981) de

Escola Construtivista
No final da dcada de 70, utilizando os conceitos da ciberntica de segunda ordem e de sua aplicao aos sistemas sociais, surge a Escola Construtivista. A partir da concepo de retroalimentao evolutiva de Prigogine (1979), considera-se que a evoluo de um sistema ocorre atravs da combinao de acaso e histria em que, a cada patamar, surgem novas instabilidades que geram novas ordens, e assim sucessivamente. Nesta perspectiva em que os sistemas vivos so considerados como hipercomplexos e indetermi nados, instabilidade e a crise ganham um novo sentido no sistema familiar. A crise no mais um risco, mas parte do processo de mudanas, assim como o sintoma.

grupalista e inspirado na sua teoria e na sua prtica, por uma representao fantas mtica e grupal do indivduo no seio de sua famlia. Assim, Ruffiot formula a hiptese de um aparelho psquico familiar a partir do modelo de aparelho psquico grupai de Kas (1976). Ele estabelece uma relao entre aparelho psquico do grupo familiar e o aparelho psquico primitivo do recmnascido, considerando que a natureza do psiquismo primrio o fundamento do psiquismo familiar e de todo psiquismo grupai. Esta abordagem se baseia numa escuta do funcionamento da fantasmtica familiar no aparelho psquico da famlia, um inconsciente a vrias vozes que aparece na associao livre dos membros da famlia reunidos na sesso. Eiguer (1984) postula que a famlia compem-se de membros que tm, em grupo, formas tpicas de funcionamento psquico inconsciente que se diferenciam do funcionamento de cada membro. Ele formula o conceito de organizadores grupais para explicar os investimentos recprocos que ocorrem entre os membros da famlia e, ressalta a fantasia original de castrao como determinante da definio de diferena sexual, derivando da a delimitao dos papis de pai, me, irmo, irm. Para Eiguer a fantasia original est na base dos vnculos, sendo portanto ati vadora como os investimentos narcsicos e objetais, e favorecendo o reagrupamento interfantasioso.

com famlias e casais. nesta possibilidade de sntese, de articulao dos dois enfoques, que estamos sobretudo interessados. As vezes falta a algumas abordagens psicanalticas conceber a famlia como uma unidade sistmica indivisvel. essencial estudar a articulao entre o indivduo e seu grupo familiar levando em conta as descobertas mais significativas das abordagens sistmicas sem se tornar prisioneiro das teorias. Na perspectiva sistmica h uma preocupao com o comportamento e a busca de modific-lo, o que leva a uma desateno em relao aos processos psquicos subjacentes, enquanto na perspectiva psicanaltica h uma preocupao em expressar os desejos inconscientes que esto na origem da disfuno familiar. Mas estas duas concepes tericas e as prticas delas decorrentes no podem deixar de considerar que a famlia e o casal so grupos organizados, auto-reguladores, com uma linguagem prpria, regras prprias de funcionamento e mitos prprios. Nicoll (1988) fala de um rigor elstico, quer dizer, de uma atitude que requer nas disciplinas psicolgicas, a intuio, a subjetividade do observador que so insubstituveis para o conhecimento, quando discute a possibilidade de articulao dos enfoques sistmico e psicanaltico em terapia familiar. Lemaire (1984) ressalta a necessidade

de uma trplice chave de leitura, no trabalho com famlia e casal, que passa pelo in trapsquico, pelo sistmico-interacional e pelo social. Para ele o fato, por exemplo, de o terapeuta conjugal compreender psicanaliticamente os fenmenos inconscientes das identificaes projetivas que esto na base da coluso narcsica do casal, no deve impossibilit-lo de lanar mo de desenvolvimentos terico-tcnicos das teorias sistmicas. Ele pode, ao mesmo tempo, trabalhar sobre a comunicao, as expresses paradoxais, os duplo-vnculos, sem ser impedido de levar em conta processos arcaicos inconscientes que esto em jogo desde o estabelecimento da relao amorosa. Dependendo do tipo de demanda familiar, pode-se escolher um referencial de compreenso mais sistmico ou mais psicanaltico. importante escolher um quadro de pensamento, mas este no deve ser rgido pois tambm, do nosso ponto de vista, a viso sistmica e a viso psicanaltica no se excluem mutuamente. Sem dvida, consideramos importante a consistncia entre teoria e prtica, a coerncia com uma determinada posio epistemolgica. Entretanto, dentro de uma mesma posio epistemolgica, incontveis modelos de atendimento so possveis. Como ressalta Maturana (1990), h diversos modos de fazer terapia e estes modos distintos tm a ver com as distintas caractersticas dos terapeutas.

Articulao dos Diferentes Enfoques


O campo da terapia familiar, como vimos, apresenta um panorama muito variado e complexo, no contendo um corpo terico unificador ao qual fazer referncia. Os primeiros estudos que tinham como ponto de partida os trabalhos sobre duplovnculo realizados pelo grupo de Palo Alto sobre a esquizofrenia estiveram, por causa de seu carter revolucionrio, na origem do desenvolvimento de uma oposio entre modelo psicanaltico e modelo sistmico. Estes estudos caracterizavam-se por uma abordagem pragmtica da realidade, e o modelo de psicanlise ao qual se opunham era o modelo econmico de Freud. A verdadeira oposio no estava portanto entre psicanlise e teoria sistmica, ou entre indivduo e famlia, mas sobretudo entre contedos internos e comportamentos expressos. Alguns terapeutas de famlia propem um trabalho numa abordagem sistmica pura como Palazzoli (1978) e Haley (1976). Outros pretendem trabalhar em terapia familiar numa abordagem psicanaltica sem nenhum suporte sistmico como Eiguer (1984) e Ruffiot (1981). H entretanto autores que tentam fazer uma sntese destas duas abordagens, no trabalho

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