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A Depresso na Criana: Percepo das Relaes Familiares

na Criana, na Me e no Pai 5 Estudos de Caso

Margarida Pereira das Neves

Orientador de Dissertao:
Prof. Doutor Emlio Salgueiro

Coordenador de Seminrio de Dissertao:


Prof. Doutor Emlio Salgueiro

Tese submetida como requisito parcial para a obteno do grau de:


MESTRE EM PSICOLOGIA
Especialidade em Psicologia Clnica

2012

Dissertao

de

Mestrado

realizada

sob

orientao de Prof. Doutor Emlio Salgueiro,


apresentado no ISPA Instituto Universitrio
para obteno de grau de Mestre na especialidade
de Psicologia Clnica conforme o despacho da
DGES, n 19673/2006 publicado em Dirio da
Repblica 2 srie de 26 de Setembro, 2006
II

AGRADECIMENTOS

Antes de mais gostaria de comear por agradecer ao professor Emlio Salgueiro por
me ter acolhido e orientado no seu Seminrio de Dissertao. Ao longo de um processo nem
sempre contnuo e decorrido dentro do esperado tenho a agradecer a sua disponibilidade,
apoio e compreenso permitindo-me evoluir, certamente, a nvel pessoal e profissional. Muito
obrigado por tudo!
Quero agradecer tambm ao Conselho de Administrao do Hospital pela permisso
da recolha de dados para a presente investigao, ao Dr. Pedro Pires, Dr. Paula Zaragoza e
Dr. Vera Ramos, bem como restante equipa da Unidade de Pedopsiquiatria, pela
disponibilidade e apoio prestados durante o perodo de estgio acadmico e na concretizao
deste estudo. Dirijo um agradecimento especial Dr. Ins Figueiredo pela simpatia, amizade,
apoio e orientao ao longo de todo este meu percurso inicial na prtica da psicologia clnica.
professora Teresa Lopo pela sua disponibilidade e partilha de conhecimentos sobre
a prova As Aventuras de Pata-Negra (Corman, 2001).
Dr. Clara Castilho pelo seu exemplo, amizade e apoio ao longo da minha vida,
nunca se esquecendo de mim e estando presente sempre que preciso.
A toda a minha famlia, em particular ao meu pai, ao meu irmo e tia Rosalina.
Agradeo tambm aos meus amigos que me acompanharam neste trajecto acadmico.
Por ltimo, mas no menos importante, quero deixar um agradecimento especial aos
pais e s crianas que se disponibilizaram para participar neste estudo, pela partilha de
conhecimentos que proporcionaram, sem os quais este projecto no seria possvel.
Dedico esta tese ao meu pai e tia Rosalina pelo precioso apoio ao longo da minha
vida mas, tambm, a todas as pessoas que nunca esquecerei, me, madrinha, av, Maria.

III

IV

A criana modela-se.
Ajuda-a a modelar-se oferecendo-lhe tudo quanto tenhas de mais autntico dentro de ti.
Oferece-te a ti prprio como modelo.
Faz de modelo, no s com o teu corpo de Homem, mas tambm com o que resta da tua
espontaneidade infantil para o Amor.
Homens capazes de Amor so aqueles que foram crianas ou que se reconciliaram com a
criana que foram.
Se amas a criana que em ti existe, ento podes amar as crianas.
()

Educar oferecer-se como modelo.


Educar respeitar o seu prprio modelo.
Educar respeitar a criao do Homem
e do seu Universo.
Educar respeitar a criana e a criatividade infantil.
Se podes ser infantil, podes ser Homem, podes ser Mestre.

Joo dos Santos (2007)

VI

RESUMO

A depresso na criana obteve o seu devido reconhecimento apenas a partir da segunda


metade do sculo XX. Ainda assim, observa-se que na literatura tem-se atribudo menos
relevncia ao estudo da depresso na infncia comparativamente com a depresso na
adolescncia e adultcia. Atendendo importncia do contexto familiar no mbito do
desenvolvimento e manuteno do sofrimento depressivo na criana, o presente estudo tem
como objectivo principal identificar e descrever a percepo das relaes familiares em
crianas diagnosticadas com uma organizao depressiva, na me e no pai, de forma a
contribuir para uma maior compreenso do funcionamento familiar destas crianas. Este
estudo constitudo por cinco crianas com diagnstico de depresso com idades
compreendidas entre os 7 e os 10 anos, trs crianas pertencem ao sexo masculino e duas ao
sexo feminino e as respectivas figuras parentais. Utilizou-se o mtodo de Estudo de Caso
mltiplo, exploratrio e os instrumentos seguintes: Desenho Livre, Desenho da Figura
Humana (Machover, 1978), Desenho da Famlia (Corman, 2003), Inventrio de Depresso
para Crianas (Marujo, 1995), Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas (Bene, 1985),
Teste de Relaes Familiares, Verso Casais (Bene, 1976), As Aventuras de Pata-Negra
(Corman, 2001) e, ainda, duas entrevistas semi-directivas, uma destinada aos pais e outra s
crianas. Os resultados sugerem a percepo de uma relao dependente com uma figura
materna deprimida ou flica aliada a uma figura paterna demitida da sua funo parental e/ou
deprimida, ambas culpabilizadas, sentidas como punitivas e pouco disponveis face s
necessidades afectivas da criana, resultando numa falha de confirmao narcsica, no
permitindo criana sentir-se valorizada na experincia de individuao e autonomia.
Palavras-chave: Percepo; Relaes Familiares; Depresso na Criana.

VII

ABSTRACT

Child depression was recognized only from the second half of the twentieth century.
However, it is observed that the literature gives less importance to the study of childhood
depression compared with depression in adolescence and adulthood. Considering the
importance of the family context to the development and maintenance of depressive disorder
in children, the main goal of the present study is to identify and describe the perception of
family relations in children diagnosed with a depressive organization, in mother and father, to
contribute for a better understanding of family functioning of these children. This study
assessed five children diagnosed with depression with ages between seven and ten years old,
three children were males and two were females and their parental figures. We used the Case
Study method multiple, exploratory and the following instruments: Non-thematic Drawing,
Human Figure Drawing (Machover, 1978), Family Drawing (Corman, 2003), Childrens
Depression Inventory (Marujo, 1995), Family Relations Test, Childrens Version (Bene,
1985), Family Relations Test, Married Couples Version (Bene, 1976), PN Test (Corman,
2001) and also two semi-structured interviews, one for parents and one for children. The
results suggest the perception of a dependent relationship with a depressed or phallic mother
figure allied to a father figure dismissed from their parental function or depressed, both
blamed, perceived as punitive and less available for the childs emotional needs, resulting in
failure of narcissic confirmation, not allowing the child to feel valued in the experience of
individuation and autonomy.

Keywords: Perception; Family Relations; Child Depression.

VIII

NDICE

Introduo.............................................................................................................................. 1
Enquadramento Terico ......................................................................................................... 2
1. O Modelo Bio-Ecolgico do Desenvolvimento Humano ............................................... 2
2. O Perodo de Latncia ................................................................................................... 3
3. A Depresso na Criana ............................................................................................... 4
4. As Famlias de Crianas com Depresso ..................................................................... 13
5. Objectivo .................................................................................................................... 17
Mtodo ................................................................................................................................ 18
1. Delineamento.............................................................................................................. 18
2. Participantes ............................................................................................................... 18
3. Procedimento .............................................................................................................. 19
4. Instrumentos ............................................................................................................... 21
4.1.Desenho Livre ......................................................................................................... 22
4.2.Desenho da Figura Humana .................................................................................... 22
4.3.Desenho da Famlia ................................................................................................. 23
4.4.Inventrio de Depresso para Crianas .................................................................... 24
4.5.Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas ....................................................... 25
4.6.Teste de Relaes Familiares, Verso Casais ........................................................... 26
4.7.As Aventuras de Pata-Negra ................................................................................... 27
Resultados ........................................................................................................................... 28
1. Sntese do Estudo de Caso 1 Tom (10 anos e 5 meses) e do Estudo de Caso 2 Isabel
(7 anos e 3 meses) ....................................................................................................... 28
2. Sntese do Estudo de Caso 3 Joo (9 anos e 6 meses) ............................................... 36
3. Sntese do Estudo de Caso 4 Mariana (9 anos e 9 meses) ......................................... 42
4. Sntese do Estudo de Caso 5 Gabriel (10 anos e 4 meses) ......................................... 47
IX

Discusso ............................................................................................................................. 52
Concluso ............................................................................................................................ 60
Referncias Bibliogrficas ................................................................................................... 61
Anexos................................................................................................................................. 71
Anexo A: Pedido de Autorizao para Recolha de Dados ................................................. 72
Anexo B: Projecto de Investigao ................................................................................... 74
Anexo C: Consentimento Informado ................................................................................ 85
Anexo D: Autorizao para Recolha de Dados ................................................................. 87
Anexo E: Guio de Entrevista dos Pais ............................................................................. 88
Anexo F: Classificao Social Internacional de Graffard .................................................. 94
Anexo G: Itens do Instrumento Teste de Relaes Familiares, Verso Casais (Bene, 1976)
......................................................................................................................................... 98
Anexo H: Guio de Entrevista da Criana ....................................................................... 101
Anexo I: Itens da Forma para Crianas em Idade Escolar do Teste de Relaes Familiares,
Verso Crianas (Bene, 1985) ........................................................................................ 105
Anexo J: Inventrio de Depresso para Crianas ............................................................. 109
Anexo K: Contedo Manifesto e Latente dos Cartes do PN Segundo Chabert (1982) e
Corman (2001) ............................................................................................................... 106
Anexo L: Estudo de Caso 1 Tom (10 anos e 5 meses) ................................................ 119
Anexo M: Estudo de Caso 2 Isabel (7 anos e 3 meses) ................................................. 159
Anexo N: Teste de Relaes Familiares, Verso Casais Pais do Tom e Isabel ............ 198
Anexo O: Estudo de Caso 3 Joo (9 anos e 6 meses) .................................................... 212
Anexo P: Estudo de Caso 4 Mariana (9 anos e 9 meses)............................................... 271
Anexo Q: Estudo de Caso 5 Gabriel (10 anos e 4 meses) ............................................. 329
Anexo R: Tabela de Resultados ...................................................................................... 381

INTRODUO

Atendendo ao Modelo Bio-Ecolgico do Desenvolvimento Humano criado em 2006


por Bronfenbrenner e Morris a criana uma entidade em crescimento, dinmica e activa face
ao ambiente que a rodeia, influenciando e sendo influenciada progressivamente atravs das
interaces permanentes, diversificadas e complexas que estabelece com o meio. Atravs da
centralidade que apresenta na vida das crianas o contexto familiar destaca-se dos restantes
meios no mbito da promoo do desenvolvimento fsico e psicolgico da criana (Schaffer,
1996). Para que este processo ocorra de forma harmoniosa e para que a criana desenvolva a
capacidade de resistir a tenses e conflitos torna-se necessrio que a famlia possibilite um
contexto estruturante e organizador onde a qualidade das relaes familiares, nomeadamente,
da relao conjugal e da relao pais/filhos assume particular importncia (Denis, 2004;
Ferreira, 2002; Goldschmidt, 2003; Salgueiro, 1995; Strecht, 2001).
Assim, os casos de crianas em que a coeso e a estabilidade do Eu na latncia no so
alcanadas devido invaso de problemticas no resolvidas durante o perodo anterior a esta
fase de desenvolvimento, seguindo-se uma regresso a nveis de fixao libidinais ou do Eu a
fases anteriores, podem ser facilitados por uma falha de conteno no ambiente familiar
(Coimbra de Matos, 2003; Ferreira, 2002). Nestes casos, para Teresa Ferreira (2002) o
funcionamento depressivo parece assumir-se como o diagnstico mais comum afectando no
s o investimento no mundo interno da criana como as relaes sociais e a capacidade de
investir em novas aprendizagens e descobertas. Como diria Joo dos Santos (2000) se a
aprendizagem da relao afectiva com a me, e a da resoluo mental da depresso se no
fazem adequadamente antes da escola, a criana no pode aceitar o que l se ensina (p. 138).
Posto isto, considerando que na literatura so descritos mltiplos factores de ordem
parental e familiar que actuam na gnese e manuteno da depresso na infncia (Sander &
McCarty, 2005) a presente investigao visa identificar e descrever a percepo das relaes
familiares em crianas diagnosticadas com uma organizao depressiva, na me e no pai, de
forma a contribuir para uma melhor compreenso do funcionamento familiar destas crianas.

E no sero todas estas linhas tortas, sobre as quais ns caminhamos, as linhas com que se
possa construir o espao para se continuar o sonho?
Maria Jos Vidigal (2005)

ENQUADRAMENTO TERICO

1. O Modelo Bio-Ecolgico do Desenvolvimento Humano

O Modelo Bio-Ecolgico do Desenvolvimento Humano (Bronfenbrenner & Morris,


2006) concebe a criana como uma entidade em crescimento, dinmica e activa face ao
ambiente que a rodeia. As interaces so bi-direccionais (i.e., entre o organismo e ambiente)
e progressivamente mais complexas, assim como, regulares ao longo de extensos perodos de
tempo. Tanto o ambiente imediato como o mais remoto exercem influncia no sujeito. Desta
forma, o modelo rejeita explicitamente a assumpo de que os processos desenvolvimentais
so de carcter universal (Verssimo & Santos, 2008, p. 392). Posto isto, so descritas as
relaes entre trs componentes essenciais ao longo do tempo: Processo; Pessoa e Contexto.
No que se refere ao Processo este constitui o principal componente do modelo, na
medida em que, engloba diferentes formas de interaco entre a Pessoa e o Contexto ao longo
do tempo, sendo considerado o mecanismo primrio do desenvolvimento humano.
As caractersticas da Pessoa designam os nveis scio-histrico, psicolgico e
biolgico (Verssimo & Santos, 2008). A teoria bio-ecolgica contempla ainda, a influncia
exercida conjuntamente pela experincia subjectiva que o sujeito realiza face aos elementos
pertencentes ao seu ambiente circundante e as propriedades objectivas desses recursos do
meio, para o desenvolvimento humano. Do ponto de vista experiencial consideram-se as
mudanas de percepo do ambiente circundante de um indivduo decorrentes do
desenvolvimento cognitivo deste, o que est dependente dos estdios de desenvolvimento ao
longo da vida. A experincia relaciona-se com os sentimentos (e.g. crenas, dvidas, valores,
atitudes) sugeridos pelos recursos ambientais e emoes que podem ter simultaneamente uma
valncia positiva e negativa, com intensidades diferentes, os quais podem continuar ou mudar
com o decorrer do ciclo de vida (Bronfenbrenner & Morris, 2006).
O Contexto de desenvolvimento refere-se a constrangimentos situacionais, os quais
podem-se situar ao nvel de diferenas nos sistemas scio-culturais (e.g. Nativos americanos
vs. Afro-americanos), diferenas no acesso aos recursos (e.g. classe operria vs. classe mdia)
e modos de interaco familiar (e.g. estilo democrtico vs. permissivo), entre outros
(Verssimo & Santos, 2008). Bronfenbrenner e Morris (2006) distinguem cinco Contextos
essenciais: o Familiar; Escolar; Grupos de pares; Creche/Jardim-de-Infncia; e Vizinhana.

2. O Perodo de Latncia

O termo latncia ou perodo de latncia sexual, da autoria de William Fliess, foi


introduzido na terminologia psicanaltica por Freud no ano de 1905, atravs da obra Trs
ensaios sobre a teoria da sexualidade (Freud, 1905/1981).
A concepo psicanaltica de Freud (1905/1981) distingue dois perodos essenciais de
desenvolvimento da sexualidade humana:

um primeiro, que engloba as crianas do

nascimento aos 5,5/6 anos, no qual prevalece a escolha do objecto sexual infantil. durante
este perodo que a criana se desenvolve em conformidade com os trs primeiros estdios
psicossexuais do desenvolvimento humano definidos por Freud oral, anal, flico; e, um
segundo perodo iniciado na puberdade atravs da renncia ao primeiro objecto de amor, isto
, ao objecto edipiano, e a escolha de um novo objecto de amor, que marcar o incio da
sexualidade adulta (Ferreira, 2002; Sprinthall & Collins, 2008).
Situado entre os dois perodos descritos anteriormente, mais concretamente, entre o
estdio flico e a puberdade, o perodo de latncia, tambm denominado de estdio de
latncia, idade escolar (da entrada na escola), idade da razo ou terceira e ltima infncia,
inicia-se com a dissoluo do complexo de dipo (atravs da proibio do incesto) e a
formao do Superego, sendo constitudo por crianas dos 5,5/6 anos at entrada na
puberdade (Bornstein, 1975; Coimbra de Matos, 2003; Denis, 2004; Edwards, 1999; Ferreira,
2002; Golse, 2005; Hagelin, 1980; Laplanche & Pontalis, 1985; Richaudeau, 1979). Tal como
o prprio nome indica, durante a latncia a libido, a sexualidade encontra-se latente, ou seja,
apesar de presente no se manifesta (Nabais & Guerreiro, 2005).
Durante o perodo de latncia surgem importantes alteraes a nvel biolgico,
psicolgico e social na vida da criana. Biologicamente, o aparelho genital externo sofre uma
paragem at puberdade. No entanto, a produo de excitao sexual mantm-se, formando
energia psquica sem a existncia de um objecto sexual pr-definido, o que gera sentimentos
de desprazer e frustrao na criana. Deste modo, so accionados os mecanismos de defesa
necessrios, de forma a limitar a aco das pulses sexuais e incestuosas. Atravs do processo
de sublimao, estas pulses so reenviadas para objectivos no sexuais (aprendizagem e
aquisies intelectuais), recalcadas e expressas atravs de formaes reactivas como a
vergonha, aspiraes estticas e morais ou, ainda, integradas nos traos de carcter do
indivduo (Bornstein, 1975; Ferreira, 2002; Freud, 1905/1981; Gueniche, 2005; Richaudeau,
1979). Verifica-se, assim, uma abstinncia total ou parcial da actividade sexual infantil,
agora sob o controlo da instncia super-egica reprimindo o passado, considerado perigoso
pela moralidade da censura actual (Ferreira, 2002, p. 225). Devido aco exercida pelo
3

Superego, o ego torna-se resiliente, malevel e educvel (Kramer & Rudolph, 1991, p. 319).
Richaudeau (1979) acrescenta, ainda, que embora se observem ainda algumas manifestaes
sexuais (masturbao, curiosidade) doravante marcadas por uma forte culpabilidade, a
sexualidade no sofre nova reorganizao (p. 155). Quanto ao plano social, este encontra-se
marcado pelo incio da escolarizao e pelas exigncias educativas introduzidas nesta fase do
desenvolvimento que pressupem uma socializao acrescida criana (Denis, 2004).
Posto isto, tal como Ferreira (2002) indica latncia significa esforo de consolidao
do Eu infantil a luta pela maturidade, pela coerncia e coeso do mundo interior (p. 218).
A autora adianta, tambm que, para alcanar de modo favorvel esta maturidade necessrio
que o desenvolvimento intelectual e afectivo da criana tenha ocorrido de forma harmoniosa.
Esta considerao remete-nos para a importncia desempenhada pelos factores intrapsquicos,
em conjugao com a qualidade das relaes familiares no funcionamento psquico
harmonioso da criana: o equilbrio das instncias psquicas, sempre em elaborao, deve ser
sustentado por relaes adequadas a personagens familiares, capazes de se ajustarem ao
aparecimento de mecanismos de defesa ou sintomas frequentemente desconcertantes,
irritantes ou angustiantes (Denis, 2004, p. 529).
Como refere Coimbra de Matos (2003) quando surgem falhas no desenvolvimento
natural durante o perodo anterior latncia, atravs da invaso de problemticas de
conhecimento/identidade sexual no resolvidos na segunda infncia (dos 3 aos 6 anos) a
latncia no estabelecida. Como resultado verifica-se a permanncia agora anormal
porque extempornea de pensamentos, fantasias, dvidas e conflitos cerca da sexualidade,
assim como de uma imaturidade afectiva e relacional. A latncia no verificada a avidez de
saber insatisfeita (Coimbra de Matos, 2003, p. 110). Segundo Teresa Ferreira (2002) nestes
casos o funcionamento depressivo parece ser o diagnstico mais comum (Ferreira, 2002).
Alexandre (1993) destaca as perturbaes do pensamento como o motivo principal de pedidos
de consulta, devido a um excesso ou insuficincia do recalcamento, associando-se
directamente a uma depresso primria organizada na insuficincia da funo contentora da
me, na generalidade dos casos.

3. A Depresso na Criana

Antes de mais, importa salientar que a depresso a que este estudo reporta distingue-se
de um sintoma episdico de tristeza/luto face a um acontecimento recente de perda ou crise
familiar, visto tratar-se de um processo adaptativo e no patolgico (Coimbra de Matos, 2007;
Ferreira, 2002; Freud, 1917/1974).
4

Posto isto, Freud (1917/1974) foi quem definiu pela primeira vez as caractersticas da
melancolia atravs da publicao da obra Luto e Melancolia em 1917. Apesar do trabalho de
luto apresentar sintomas semelhantes melancolia pela perda de interesse pelo mundo
externo na medida em que este no evoca esse algum , a mesma perda da capacidade de
adoptar um novo objecto de amor (o que significaria substitu-lo) e o mesmo afastamento de
toda e qualquer actividade que no esteja ligada a pensamentos sobre ele (p. 250) difere
desta no sentido em que representa uma reaco adaptada e transitria perda de um objecto
importante, dando lugar ao desinvestimento afectivo nesse objecto e investimento em novos
objectos. Na melancolia, por outro lado, assiste-se a um empobrecimento no s no mundo
externo como no mundo interno do sujeito pela diminuio acentuada da auto-estima (com
auto-censuras e castigos), retirando valor ao Eu. Ao contrrio do trabalho de luto, a
melancolia comporta caractersticas inconscientes pois o sujeito embora possa saber quem
perdeu, desconhece o que perdeu com esse algum. Assim, a perda do objecto transforma-se
na perda do Eu atravs do mecanismo de introjeco ambivalente do objecto perdido, onde a
severidade do superego (de origem precoce, oral, formado na relao com o imago materno)
dirige-se ao Eu do sujeito (atravs da clivagem) pretendendo atingir o objecto de amor
introjectado. Objecto e sujeito, realidade externa/interna so confundidas face extrema
dependncia marcada por uma relao de objecto de tipo narcsica, funcional. Assim, instalase o sentimento de culpa, os castigos e a auto-punio (associado falta de apetite e de sono)
podendo culminar em suicdio (Coimbra de Matos, 2007; Ferreira, 2002; Freud, 1917/1974).
A melancolia (ou depresso major), depresso mais profunda e ligada psicose
destaca-se, assim, da depressividade (ou depresso basal) pelo grau de severidade acentuado
marcado pelo estabelecimento de uma relao fusional com o objecto. Desta forma, a
depressividade caracteriza-se por uma forte dependncia emocional ao objecto, investindo
inconscientemente na relao com este e idealizando-o (como defesa tomada de conscincia
da malignidade do objecto e falha narcsica), no suportando a separao, o que impede o
sujeito de realizar o trabalho de luto face perda (real ou imaginria) do objecto (Coimbra de
Matos, 2002, 2007, 2011). Sujeito e objecto esto mal diferenciados mas no confundidos
como na psicose, realizando-se a introjeco do bom e mau objecto. Verifica-se uma forte
necessidade de suporte, apoio, constituindo uma relao objectal anacltica com falhas graves
de confirmao e valorizao narcsica (Coimbra de Matos, 2007, 2011; Ferreira, 2002).
Simultaneamente, para Coimbra de Matos (2007) o depressivo exprime o desejo de se separar
do objecto primrio, permanecendo num impasse entre a evoluo edipiana e a regresso oral,
salientando-se a falta de solidez na organizao anal. Teresa Ferreira (2002) conclui que a
caracterstica primordial presente em todas as formas de depresso a inconsistncia do
5

ncleo de auto-estima, falhando de imediato o investimento na prpria vida. Suspende-se o


interesse pelo mundo externo, perde-se a capacidade de amar. A energia agressiva dirigida
no ao exterior mas aos imagos internos, partes do Eu (p. 324).
No que concerne depresso na criana, problemtica na qual se centraliza a presente
investigao, segundo Teresa Ferreira (2002) o diagnstico mais frequente na clnica
infantil, abrangendo cerca de 40% dos casos. Todavia esta patologia carece ainda de
investigao cientfica quando comparada aos trabalhos realizados sobre a depresso na
adolescncia e adultcia. Em parte, pode dever-se ao facto de que apenas a partir da segunda
metade do sculo XX a depresso na criana obteve o seu devido reconhecimento (Cmara,
2005; Carvalho, Milheiro & Garrido, 2006; Coimbra de Matos, 2007; Palacio-Espasa, 2002;
Santos, 2000). A viso idealizada da infncia pela sociedade pode ter contribudo para a
explicao deste reconhecimento tardio da depresso infantil, visto que a ideia de sofrimento
psquico na infncia tende a ser sentida como perturbadora (Gueniche, 2005; Maranga, 2007).
A este propsito Joo dos Santos (1990) assinala que a recusa do adulto em reconhecer a
tristeza da criana pode representar a recusa daquele em reconhecer a sua prpria tristeza
infantil e/ou actual. Por outro lado, o polimorfismo da sintomatologia depressiva infantil e as
diferenas face ao quadro clnico no adulto sobretudo quanto tendncia para uma diminuda
expresso dos afectos de tristeza e a baixa frequncia de psicoses manaco-depressivas na
criana podem tambm explicar a desvalorizao da depresso na criana, confundindo-a com
outras psicopatologias (Gueniche, 2005; Maranga, 2007; Palacio-Espasa, 2004; PalacioEspasa & Dufour, 2002; Pedinielli & Bernoussi, 2006).
Na gnese da depresso Teresa Ferreira (2002) defende que no h ncleo depressivo
na criana sem uma correspondente decepo narcsica da me (p. 313). O objecto
vulgarmente depressgeno ou desnarcisante, a figura materna projecta na criana a sua
decepo narcsica, a sua malignidade, desvalorizando-a pela percepo daquilo que o filho
no , o negativo ou o que deveria ser face ao confronto com o seu ideal, com a criana
imaginria que existe dentro de si prpria, revelando a sua parte depressiva ao filho. O imago
materno organiza-se, assim, na criana como algo inatingvel e como um vazio atravs da
percepo de no se sentir amada na mesma medida em que ama e deseja ser amada, cedendo
lugar ferida narcsica. Este movimento traduz a no correspondncia afectiva na relao
precoce me-criana (Cmara, 2005; Coimbra de Matos, 2002, 2007; Ferreira, 2002; Lustin,
2004; Strecht, 1998; Winnicott, 1993). A falta de valorizao e confirmao narcsica da
criana na sua alteridade por parte da figura materna implicar a anulao do sentimento de
omnipotncia indispensvel construo do narcisismo primrio da criana, favorecendo a
vivncia depressiva e a emergncia do falso self que permite escamotear o verdadeiro self
6

traduzindo, assim, as dificuldades na construo da identidade na criana (Ferreira, 2002;


Funck-Brentano, 2005; Gueniche, 2005; Pedinielli & Bernoussi, 2006; Winnicott, 1988,
1993). Neste sentido, como sublinha Coimbra de Matos (2002) a me ama a criana
enquanto a v sem desejo prprio, no afirmativa nem oponente. Quando a criana comea a
manifestar mais explicitamente a sua prpria, diferente e/ou oposta intencionalidade, a me
retira-lhe grande parte do afecto que lhe dedicava. Da a depresso do filho/a (pp. 445-446).
Deste modo, pode-se deduzir que o depressivo o rico (de afecto) que empobreceu;
enquanto o psictico o pobre que sempre foi pobre (rejeitado desde sempre) (p. 446). A
perda do amor do objecto condiciona, assim, o surgimento da depresso na criana (Coimbra
de Matos, 2002, 2007).
Todavia, Teresa Ferreira (2002) ressalva a importncia de percepcionar a depresso
como uma forma de preservar as pulses de amor pela esperana de poder amar de novo: sou
um ser solitrio mas no desisti ainda de um encontro com algum, outro e persisto existo,
apenas nessa esperana (p. 313). Na relao de objecto o deprimido transfere as pulses de
amor e de dio, procurando proteger o objecto da sua agressividade, remetendo-a para o Eu.
Posto isto, para Teresa Ferreira (2002) a depresso na criana designada como a
perturbao da organizao do sentimento de auto-estima, concentrando-se volta de uma
ferida narcsica, com consequente alterao funcional do psiquismo (p. 266).
Habitualmente verifica-se uma heterogeneidade nos sintomas que motivam a consulta
destas crianas: tristeza, perda ou diminuio dos interesses habituais, baixa auto-estima,
ideias mrbidas ou at mesmo tentativas de suicdio, perturbaes do comportamento como
hetero e/ou auto-agresses, fatigabilidade excessiva, instabilidade psicomotora, dificuldades
de concentrao, queixas somticas (e.g., gastrointestinais), perturbaes da linguagem (e.g.,
gaguez, tiques), dificuldades no controlo esfincteriano (e.g., encoprese, enurese), dificuldades
do sono (e.g., insnia, hipersnia), da alimentao (e.g., anorexia, bulimia) e dificuldades
escolares na latncia (Ferreira, 2002; Gueniche, 2005; Marcelli, 1995, 2005; Palacio-Espasa,
2004; Palacio-Espasa & Dufour, 2002; Santos, 2000; Strecht, 1998, 2001; Vogel, 2012).
O sofrimento psquico ligado vivncia depressiva condiciona com muita frequncia a
capacidade da criana adquirir, reter ou usar conhecimentos, o prazer de conhecer, no fundo,
de pensar (Santos, 2000; Strecht, 1998, 2001). Pois como explica Pedro Strecht (1998) a
capacidade de interiorizar conhecimentos est definitivamente ligada capacidade precedente
de interiorizar bons objectos capazes de amar e proteger (p. 199).
A expresso clnica da depresso infantil varia segundo a idade, o sexo e o grau de
maturao cognitivo-afectiva da criana (Gueniche, 2005; Strecht, 2001). Para Palacio-Espasa
(2004) quanto mais nova a criana, mais inibio existir nas suas manifestaes
7

depressivas (p. 250). Deste modo, nas depresses de crianas muito novas sobressai a apatia,
o desinvestimento e a inibio (atravs de uma tomada de conscincia menor e dos recursos
defensivos empregues para reprimir os afectos negativos), enquanto nas depresses de
crianas em final de latncia e sobretudo na adolescncia a expresso da tristeza aumenta,
assemelhando-se progressivamente aos traos observados na depresso dos adultos
(Gueniche, 2005; Palacio-Espasa, 2004). Assim, os critrios de diagnstico de depresso
utilizados para os adultos no devem ser aplicados no diagnstico desta patologia nas crianas
(Palacio-Espasa, 2004; Pedinielli & Bernoussi, 2006). Posto isto, o diagnstico feito com
recurso entrevista clnica e s provas projectivas no mbito da avaliao psicolgica e
atravs da anlise da transferncia e contra-transferncia experienciadas na relao de objecto
que a criana estabelece com o terapeuta. Com frequncia so crianas que no manifestam
sinais de tristeza aparente, todavia, fazem-nos sentir interiormente a sua tristeza pela nossa
identificao ao seu sofrimento interno. H que ressalvar que da mesma maneira que a
depresso no deve ser considerada equivalente tristeza manifesta, no se deve associar
todos os sinais de tristeza ao diagnstico de depresso (Ferreira, 2002; Marcelli, 2005;
Palacio-Espasa, 2004; Palacio-Espasa & Dufour, 2002).
Entre as principais caractersticas experienciadas na relao teraputica com a criana
deprimida situam-se de uma ou outra forma: Avidez relacional, associada ao desejo de
incorporao, intenso, violento, ligado insatisfao oral (Ferreira, 2002; Klein, 1987). Esta
avidez pode expressar-se atravs de fantasias de comer sem fim ou no controlo dos impulsos
orais que conduz anorexia; Sentimento de vazio vivenciado na angstia de perda do amor do
objecto ou ausncia de ligaes afectivas significativas, na falha narcsica; Solido manifesta
na vivncia de impossibilidade de estabelecer laos afectivos com o outro; Sensao de a
criana se encontrar perdida resultante da falha da construo identitria pela ausncia de
modelos de identificao consistentes; Fragilidade do Eu dominada pela vivncia de uma
baixa auto-estima e insegurana interior que impedem a mobilizao dos recursos internos
necessrios para assegurar a sua proteco; e, por ltimo, dependncia afectiva pela
submisso vontade do outro sobre o qual projectado o poder, sendo idealizado e temido,
necessitando do suporte do objecto, da relao anacltica para atenuar a insegurana interior e
assegurar a sua prpria sobrevivncia (Ferreira, 2002; Gueniche, 2005; Strecht, 2001).
Na opinio de Cmara (2005) as crianas deprimidas tendem a manifestar-se apticas,
sem curiosidade e inibidas na explorao que exercem sobre o meio pois toda a sua
caminhada marcada pela insegurana, pelo medo, pela vivncia antecipatria do falhar (p.
55). Esta vivncia de medo transferida para a relao de objecto face possibilidade de uma

nova ruptura, desistncia, insucesso na relao podendo revelar uma atitude de indiferena
aparente, inibio relacional e/ou provocao hostil do adulto (Ferreira, 2002).
Ao nvel manifesto estas crianas tendem a apresentar caractersticas distintivas no
olhar, discurso e actividades como o jogo ou desenho. Citando Teresa Ferreira (2002) o
desejo do encontro l-se no olhar (p. 312). Assim, observa-se um olhar fugidio e apelativo,
ou um olhar de frente mas distncia pelo medo do outro ou, ainda, um olhar intenso, vido,
sedutor seguido de uma retirada defensiva. Este olhar vido procura no outro uma leitura
compreensiva e afectuosa da sua existncia (uma pessoa), um sofrimento (um interior) e uma
sada para esse sofrimento (uma relao). Quanto ao discurso pode ser fluente ou pobre,
lacnico com contedos que remetem para os afectos depressivos: no sou bom, ningum
gosta de mim, preferia morrer ou para a omnipotncia como defesa manaca desses
afectos: sou o mais forte de todos simbolizando o vazio, a vivncia de perda do amor do
objecto (Ferreira, 2002; Strecht, 1998, 2001). O jogo/desenho pode ser marcado pela
exuberncia de aco, pela reduo da mentalizao ou pela inibio motora, atravs da
atitude de desistncia que domina o Eu: no sei, no consigo, fao sempre mal, entre
outros (Cmara, 2005; Ferreira, 2002; Marcelli, 2005; Palacio-Espasa, 2004).
Posto isto, entre as principais defesas utilizadas por estas crianas situam-se a
tendncia ao agir, pela reduo da mentalizao do sofrimento psquico, a denegao, a
idealizao, a defesa manaca e a inibio, atravs da procura de aconflitualidade,
expressando-se geralmente num fraco rendimento escolar, intelectual e social (Cmara, 2005;
Ferreira, 2002; Strecht, 1998, 2001). Nas crianas mais pequenas destaca-se o recurso s
modalidades antidepressivas na ordem da mania como a instabilidade psicomotora,
comportamentos de oposio como os amuos, clera, raiva, a tendncia para a exaltao da
auto-estima (e.g., sou muito forte, sou grande), manifestaes hetero ou auto-agressivas e
no final da latncia pode-se assistir a perturbaes do comportamento como o roubo, a
mentira e a fuga, o que permite reprimir e negar os afectos depressivos e, assim, impedir a
elaborao da posio depressiva (Gueniche, 2005; Klein, 1986; Lustin, 2004; Marcelli, 2005;
Palacio-Espasa, 2004; Santos, 2000; Strecht, 1998).
A classificao do DSM-IV-TR (American Psychiatric Association [APA], 2002)
distingue trs formas clnicas de perturbaes depressivas: a depresso major, a distimia e a
perturbao depressiva sem outra especificao.
Na depresso major os requisitos clnicos (cinco ou mais) devem estar presentes
durante pelo menos duas semanas, quase todos os dias. Pelo menos um dos sintomas : 1)
humor depressivo e/ou irritvel durante a maioria do dia (descrio subjectiva ou observada
por outros) ou 2) perda de interesse ou de prazer na maioria das actividades (descrio
9

subjectiva ou observada por outros). Adicionalmente, a criana deve apresentar pelo menos
quatro dos seguintes sintomas (ou trs caso tenha preenchido os dois critrios anteriores): 3)
perda ou aumento do apetite e do peso; 4) insnia ou hipersnia; 5) lentificao ou agitao
psicomotora; 6) fadiga ou perda de energia; 7) sentimentos de desvalorizao ou de
culpabilidade; 8) diminuio da capacidade de pensamento, concentrao ou aumento de
indeciso; 9) desejo de preferir estar morto ou ideias de suicdio.
No caso da distimia, sintomaticamente semelhante depresso major, mas com menos
intensidade, os sintomas devem ser crnicos pelo menos durante um ano, com humor
depressivo e/ou irritvel presente durante a maior parte do dia, quase todos os dias. Assim,
deve apresentar pelo menos dois dos seguintes sintomas: 1) perda ou aumento do apetite; 2)
insnia ou hipersnia; 3) fadiga ou pouca energia; 4) baixa auto-estima; 5) dificuldades de
concentrao ou na tomada de decises; 6) sentimentos de falta de esperana.
Por fim, na perturbao depressiva sem outra especificao situam-se os casos de
crianas com caractersticas depressivas que no preenchem os critrios para as perturbaes
depressivas acima referidas (major e distmica).
Relativamente classificao psicodinmica ter-se- em conta o estudo realizado pela
Equipa 2 do Centro de Sade Mental Infantil e Juvenil de Lisboa no ano de 1988 com 40
crianas deprimidas, no qual se apurou os ncleos da patologia depressiva com vista a uma
interveno teraputica mais precisa. Estes ncleos depressivos constituem-se como modelos
conflituais associados a cada etapa do desenvolvimento e resultam da evoluo do narcisismo
na criana em ligao com as experincias traumticas vivenciadas no meio externo. Mais
tarde, podem evoluir para uma integrao reparadora ou persistir como pontos de fixao aos
quais se regressa no caso de as experincias traumticas antigas se repetirem e facilitarem a
ruptura defensiva interna. Posto isto, nas linhas seguintes sero descritos em pormenor os trs
ncleos depressivos pr-genitais (oral, anal e flico) e, ainda, algumas consideraes sobre o
ncleo depressivo edipiano onde se pode organizar a depresso neurtica e a evoluo
depressiva relativa crise da latncia (Ferreira, 2002).
O ncleo depressivo precoce relaciona-se com a fase oral e, como tal, remete para a
relao precoce com o imago materno, caracterizando-se por um apelo fusional na relao
com o outro (atitude de seduo), olhar vido, instabilidade interna ou externalizada pela
procura vida de um bom objecto, inibio e receio da prpria agressividade, fragilidade e
dependncia do Eu, confuso sujeito/objecto manifesta numa linguagem nem sempre clara,
falha na noo dos limites entre fantasia/realidade, nos limites do agir, do tempo e do espao
(Ferreira, 2002).

10

O ncleo depressivo primrio, ligado fase anal marcado pelo processo de


separao/individuao descrito por Mahler (1993) que pressupe um afastamento
progressivo da figura materna sem perder o afecto desta. Contudo, devido a uma falha de
valorizao/confirmao narcsica do objecto materno, ao confronto com uma me poderosa,
flica e castradora ou face distncia relacional com uma me deprimida a criana teme que a
afirmao do Eu represente uma ruptura relacional e a perda do amor do objecto. Assim,
sente-se invadida pelo sentimento de humilhao, desvalorizao, insegurana, vazio, medo
de ser rejeitada/abandonada, tornando-se dependente, submissa pelo recurso ao evitamento e
renncia ao prprio poder. A figura materna idealizada (defesa falha narcsica) reenviando
para o sentimento de insuficincia e baixa auto-estima na criana face percepo de um
modelo ideal inatingvel (Coimbra de Matos, 2007; Ferreira, 2002; Malpique, 1999). Teresa
Ferreira (2002) adianta, ainda, que a valorizao narcsica pela figura paterna reveste-se da
maior importncia pelo efeito reparador na depresso primria da criana.
A depresso anacltica do lactente em situao de hospitalismo descrita por Spitz
(2004) pode inserir-se no ncleo de depresso primria por pressupor a interiorizao de uma
relao objectal que sofre uma ruptura face condio de privao materna. Neste estado de
carncia afectiva observa-se uma primeira fase de protesto, seguindo-se uma segunda fase de
desespero que culmina na depresso que conduz morte na terceira e ltima fase.
A depresso branca poder tambm inscrever-se ao nvel da depresso primria
atravs de uma resposta psicossomtica (e.g., eczema e asma) manifesta no comportamento de
frustrao e vazio na criana face desorganizao das defesas psquicas e falha de
mentalizao desencadeada por uma relao de objecto progressivamente esvaziada de
afectos (Ferreira, 2002; Gueniche, 2005).
O terceiro ncleo depressivo, de tipo flico, designa a organizao estrutural triangular
pr-edipiana, na qual sobressai a descoberta da diferena de sexos. Como diria Teresa Ferreira
(2002) ambos os pais devem reconhecer o valor de cada sexo na criana organizando o
narcisismo flico vivido como uma plenitude, como fora e organizador de uma sexualidade
futura no masculino ou no feminino, completada no movimento edipiano do Eu (p. 308). A
ausncia de valorizao narcsica nesta fase experienciada inconscientemente como uma
falha ou castrao podendo remeter para uma regresso ou dominar a incapacidade de
organizar uma relao amorosa no futuro pela inibio do desejo de procura activa do
encontro amoroso ou, pelo contrrio, a procura compulsiva numa atitude sedutora de
superfcie (Ferreira, 2002; Strecht, 2001). Assim, futuramente podem-se organizar
personalidades frgeis com patologia de identidade sexual pela dvida de um valor como
seres, no masculino ou no feminino (Ferreira, 2002, 308). A falha no narcisismo flico pode
11

ligar-se ao sentimento de humilhao, desvalorizao, submisso ao poder flico materno na


criana, perda do amor do objecto ou constatao da sua imaturidade funcional face ao
enorme poder atribudo ao objecto ideal, no lhe permitindo afirmar o seu. No plano
fantasmtico a figura paterna reveste-se da maior importncia pela possibilidade de
representar uma funo reparadora em ambos os sexos. Quando tal no se observa pode-se
pressupor que a figura paterna distante, ausente ou tambm se encontra submetida ao
matriarcado familiar (Ferreira, 2002).
O ncleo depressivo edipiano neurtico constitui-se como parte integrante na evoluo
normal da neurose da criana face ao duplo sentimento de excluso da cena primitiva (relao
dos pais) e reconhecimento da diferena de geraes (face aos pais) culminando em sintomas
como tenses nocturnas, ansiedade, pesadelos, entre outros. Quando a criana no apresenta
recursos suficientes para lidar com o sentimento de excluso, abandono, solido devido s
falhas de integridade narcsica apuradas em etapas anteriores, a vivncia de tristeza, inibio e
desinteresse pode sobrepor-se ansiedade de castrao (considerada adaptada nesta etapa)
instalando-se a depresso neurtica (Ferreira, 2002; Lustin, 2004).
Por fim, em crianas na latncia verifica-se uma evoluo depressiva nos casos em que
sempre dominou uma organizao narcsica pouco consistente nas fases precedentes (oral,
anal, flica e edipiana) sem, contudo, se verificar a predominncia de uma destas fases.
Assim, a criana recorre ao evitamento dos conflitos e das decepes narcsicas, tal como, a
uma posio passiva, inibida na qual domina a culpabilidade consciente e inconsciente como
defesa ao agravamento depressivo e descompensao narcsica. frequente apresentarem
como motivo de consulta queixas de insucesso escolar, apatia, ausncia de curiosidade e
tristeza data da entrada para a escola (Ferreira, 2002; Strecht, 2001).
Em fases do desenvolvimento avanadas como a adolescncia ou fase adulta o sujeito
deprimido pode procurar preencher o sentimento de vazio (falha narcsica), a fragilidade e/ou
dependncia do Eu atravs de formas simbolicamente substitutivas do objecto de amor (e.g.,
lcool e droga) ou em sublimaes pela arte e actividade profissional (Ferreira, 2002).
No tratamento da depresso deve-se procurar implementar uma abordagem
psicoteraputica adequada a cada caso e segundo o tipo de organizao depressiva da criana.
Desta forma, destacam-se trs abordagens psicoteraputicas diferentes, no se devendo
registar um perodo de tratamento inferior a seis meses: psicoterapia semanal individual com a
criana a par de consultas teraputicas aos pais; seguimento psicoteraputico da criana com
apoios especficos no mbito escolar pretendendo-se uma melhor adaptao do meio criana
(Ferreira, 2002; Strecht, 2001); consultas teraputicas com os pais e com a criana (Ferreira,
2002; Stark, Banneyer, Wang & Arora, 2012). Durante as sesses de psicoterapia o terapeuta
12

deve procurar criar uma relao emptica com a criana, oferecendo-se como modelo
contnuo, contentor e afectuoso de forma a restaurar o narcisismo ferido da criana,
fortalecendo o Eu fragilizado e/ou aliviando o impacto do superego punitivo e rgido
(Ferreira, 2002; Strecht, 1998). Aparentemente, no so descritos benefcios clnicos na
administrao de psicotrpicos na depresso infantil, que ao serem utilizados poderiam at
surtir efeitos adversos aos resultados esperados (Ferreira, 2002; Palacio-Espasa, 2004).
Todavia, na opinio de Marcelli (2005) a prescrio de antidepressivos numa posologia de
dose correcta e controlada recomendada no caso de depresses mais graves resistentes
psicoterapia e s reestruturaes de vida.
Em suma, pode-se depreender que para alguns autores a depresso na criana
associada a uma reaco afectiva a acontecimentos exteriores nos quais sobressai a separao
ou perda do amor do objecto (Bowlby, 1990; Coimbra de Matos, 2002, 2007; Ferreira, 2002;
Spitz, 2004). Ainda assim, na opinio de Klein (1986) atravs da teoria da posio depressiva,
a depresso resulta do desenvolvimento maturativo no qual domina o processo fantasmtico.

4. As Famlias de Crianas com Depresso

O desenvolvimento das crianas insere-se em determinados contextos sociais com os


quais esta contacta, sendo o contexto familiar, aquele que mais se destaca dos restantes para a
maioria das crianas, devido centralidade que apresenta na vida dos sujeitos. Segundo
Schaffer (1996) a famlia o primeiro e o mais importante contexto para o crescimento fsico
e psicolgico (p. 204). A famlia apresenta um conjunto de caractersticas que a tornam nica
face aos outros contextos: so grupos restritos e ntimos que facilitam criana a aquisio de
regras de comportamentos consistentes; a unidade bsica dentro da qual a criana
apresentada vida social; as famlias so compostas por elementos que asseguram a
segurana e os cuidados necessrios criana (Schaffer, 1996); e detm tambm um papel
relevante no desenvolvimento da identidade da criana. Para que este processo ocorra de
forma harmoniosa necessrio que a famlia possibilite um contexto estruturante e
organizador (com destaque para a diferenciao de geraes e sexos) onde a qualidade da
relao de casal e da relao pais-filhos assume particular importncia na forma como as
crianas se sentem investidas pelos pais (Goldschmidt, 2003).
Como sistema, a famlia organiza-se como um todo, assim, no se pode tentar
compreend-la pelo somatrio das suas partes, pois a famlia uma unidade dinmica. A
famlia integra subsistemas inter-relacionados e governados por regras definidas: os membros
familiares e as interaces que estabelecem entre si geram um padro de influncia circular
13

onde os membros so interdependentes e, deste modo, as mudanas que ocorrem numa parte
da famlia repercutem-se nas restantes. Como sistema aberto (i.e. sujeito s influncias
externas) a famlia est sujeita continuidade e mudana (Schaffer, 1996). Teresa
Goldschmidt (2003) ressalva a importncia da capacidade que a famlia tem para investir
afectivamente nos seus elementos, em particular nas crianas, centrando-se nas suas
necessidades e no nas necessidades das figuras parentais.
Compreende-se facilmente, assim, que a sade mental de uma criana e a sua
capacidade para resistir a tenses e conflitos provm do espao virtual promotor do
desenvolvimento que os pais constroem na relao com o/a filho/a (Salgueiro, 1995). Assim,
mesmo que uma criana se fragilize muito na sua insero escolar, se tiver uma boa base de
apoio familiar, estar mais apta a ultrapass-la do que se essa falha for concomitante ou
secundria a uma dificuldade familiar (Strecht, 2001, p. 132).
No que concerne, mais especificamente, s famlias de crianas com depresso
segundo Sander e McCarty (2005) na gnese da depresso na infncia actuam mltiplos
factores de ordem parental e familiar, tais como: clima familiar; interaces pais-criana; tipo
de vinculao existente; psicopatologia parental (viz., depresso parental); estilo cognitivo
parental. E, ainda, o temperamento da criana e a maneira como esta lida com o ambiente
familiar podendo condicionar a sua resilincia (Cyrulnik, 2003) ou tornar a criana mais
vulnervel depresso. Variveis como stress, conflito conjugal e suporte social interagem de
forma determinante com os factores mencionados anteriormente.
Nas linhas seguintes sero analisados estes factores de forma mais detalhada,
atendendo aos diversos autores que se dedicaram ao estudo terico e/ou emprico da
etiopatogenia familiar na depresso da criana.
Coimbra de Matos (2002) reitera a existncia de uma constelao familiar
depressgena composta pelo desequilbrio entre o feminino e o masculino, entre as figuras
parentais, com um objecto parental dominador e actuante, geralmente tambm tirnico
(vulgarmente associado me) e o outro demitido da sua funo parental (comummente
ligado ao pai que pode estar deprimido). O autor assinala que a condio patognica encontrase na relao privilegiada, situao totalitria que a criana experiencia com o objecto
dominante da dade parental, atravs do controlo materno precoce e continuado (que pode ser
desempenhado pela figura paterna e no materna) perante a demisso da outra figura. Posto
isto, conclui que criana s lhe resta a obedincia, submisso e progressiva desistncia e
adaptao depressiva; e/ou a revolta amordaada. Ulteriormente, poder chegar (ou no)
revoluo e libertao (p. 445). A tendncia para a presena de uma figura materna

14

dominadora, controladora e punitiva tambm defendida por Garber, Gallerani e Frankel


(2009).
O sentimento de impossibilidade de corresponder expectativa parental por parte da
criana devido carga fantasmtica de um superego rgido e exigente face ao ideal do Eu
contribui tambm para a gnese da depresso infantil (Gueniche, 2005; Marcelli, 2005).
frequente encontrar-se na literatura a associao de conflitos acentuados nas relaes
familiares de crianas deprimidas, incluindo maiores nveis de agresses verbais e fsicas,
caracterizando-as como disfuncionais. Estes conflitos parecem estar ligados a uma dificuldade
na sua resoluo. Atravs da observao da interaco pais-filhos, da percepo das figuras
parentais e da anlise dos relatos das prprias crianas deprimidas verifica-se uma tendncia
para interaces familiares mais negativas, hostis e negligentes, acentuando-se a falta de
comunicao, coeso e suporte familiar comparativamente com famlias de crianas no
deprimidas (Garber et al., 2009; Jones, Beach & Fincham, 2006; Schwartz, Gladstone &
Kaslow, 1998; Stark et al., 2012). No estudo comparativo realizado por George, Herman e
Ostrander (2006) observou-se uma associao entre sintomas depressivos na infncia e
ambientes familiares pouco coesos e intelectuais, com elevados conflitos. Neste seguimento,
para Funk e Stark (2012) e Stark et al. (2012) a criana internaliza o padro de relaes
familiares negativas, tornando-a mais susceptvel patologia depressiva.
As experincias de separaes e/ou perdas precoces e repetidas com valor traumtico,
em especial da figura materna, tambm associadas a situaes de bito de um dos pais, avs,
irmos ou outras figuras significativas, separao ou divrcio parental, hospitalizaes, entre
outros, parece afigurar-se na literatura como um dos factores que mais se salienta na gnese
da depresso infantil (Ferreira, 2002; Gueniche, 2005; Marcelli, 2005; Schwartz et al., 1998).
Os conflitos conjugais tendem a afectar negativamente a depresso na criana
(Cummings, Keller & Davies, 2005; Ferreira, 2002; Jones et al., 2006) atravs da influncia
no estilo parental e no tipo de vinculao, contribuindo para o aumento dos conflitos na
relao pais-criana e criana-irmos. Neste sentido, num estudo longitudinal de ODonnell,
Moreau, Cardemil e Pollastri (2010) observou-se que os estilos parental e cognitivo actuam
como moderadores na relao entre o conflito inter-parental e a depresso na infncia.
Deste modo, as carncias ou incoerncias afectivas e/ou educativas precedentes ou no
de situaes de separao so apontadas como causas para a patologia depressiva da criana
(Gueniche, 2005). Em comparao com os seus pares observa-se que as crianas deprimidas
tendem a percepcionar os pais como figuras que providenciam pouco afecto e suporte, um
maior controlo, intruso e rejeio e menor disponibilidade emocional para os filhos,
tornando-os mais propensos a uma vinculao insegura (Bowlby, 1990; Garber et al., 2009;
15

Jones et al., 2006; Marcelli, 1995; Schwartz et al., 1998). A este propsito Gullone, Ollendick
e King (2006) analisaram o papel da representao da vinculao em 326 crianas e
observaram que uma representao da vinculao que indique disfuno correlaciona-se aos
sintomas depressivos.
A partir de um estudo longitudinal Mezulis, Hyde e Abramson (2006) obtiveram uma
correlao entre o temperamento negativo da criana, eventos de vida negativos e
vulnerabilidade para a depresso, atravs do estilo cognitivo, agravado pelos comportamentos
maternos de feedback negativo face criana e expresso de zanga.
Vrios autores (Ferreira, 2002; Gueniche, 2005; Hughes & Asarnow, 2011; Marcelli,
2005; Schwartz et al., 1998; Strecht, 1998) assinalam a importncia da existncia de uma
patologia familiar que geralmente se traduz em ncleos depressivos num ou em ambos os
pais, com destaque para a figura materna que atravs da relao precoce com a criana
permite a introjeco do seu sofrimento psquico pela criana. No mbito da patologia
parental intervm tambm os mecanismos biolgicos na ordem de uma maior predisposio
gentica para a depresso nas crianas filhas de pais deprimidos, com risco acrescido no caso
de ambos os pais se encontrarem deprimidos. A interaco das mes deprimidas com os filhos
descrita como tendencialmente disfuncional pela presena de sentimentos negativos como a
tristeza, irritabilidade e hostilidade dirigidos aos filhos. Tratam-se de mes mais intrusivas,
menos positivas, mais conflituosas, mais punitivas (tm pouca tolerncia ao comportamento
dos filhos e so mais crticas) e apresentam dificuldades em resolver conflitos ou adoptar um
estilo parental democrtico recorrendo com frequncia ao isolamento e evitamento dos
conflitos ou superproteco dos filhos. Estimulam menos os filhos e promovem uma
vinculao insegura, predominando a vinculao insegura-evitante. O tipo de vinculao
desorganizada parece sobressair no caso de depresses maternas mais graves (Carvalho et al.,
2006; Garber et al., 2009; Goodman & Gotlib, 1999; Hughes, Hedtke & Kendall, 2008; Stark
et al., 2012). Num estudo longitudinal com uma amostra de 83 pais de crianas com idades
inferiores a 18 meses conduzido por Gartstein e Bateman (2008) verificou-se uma correlao
entre maiores nveis de depresso materna, de afectos negativos da criana e de sintomas
depressivos na criana. A investigao longitudinal de Lau, Rijsdijk, Gregory, McGuffin e
Eley (2007) obteve resultados semelhantes aos observados no estudo anterior, ao verificar
uma associao entre a depresso materna, estilo cognitivo negativo da criana e a ocorrncia
de sintomas depressivos na infncia, agravados face a eventos de vida negativos. A depresso
materna pode tambm contribuir para um agravamento dos conflitos entre o casal parental e,
assim, afectar a interaco do pai com os filhos, nomeadamente atravs da superproteco
materna e de um baixo envolvimento paterno com os filhos (Carvalho et al., 2006).
16

Outros factores como as famlias monoparentais e as famlias com baixos recursos


socioeconmicos podem tambm contribuir para o desenvolvimento ou agravamento da
depresso infantil (Carvalho et al., 2006; Ferreira, 2002; Schwartz et al., 1998).
Ainda que tenham sido enumerados alguns acontecimentos de vida traumticos
ligados a uma situao de perda ou separao (real ou imaginria) e os factores favorveis
associados ao contexto familiar tendo como resultado a depresso na criana, importa
ressalvar que no existe uma relao causal linear entre estes elementos. Todavia, tratam-se
de situaes descritas com grande frequncia nos antecedentes de crianas com diagnstico de
depresso (Gueniche, 2005; Marcelli, 2005).
Tal como referem Jewell e Beyers (2008) facilmente se compreende que os efeitos da
interaco de variveis do ambiente familiar para distinguir e prever psicopatologia na
infncia so complexos e exigem maior ateno (p. 88). Assim, a presente investigao
prope-se estudar esta temtica aplicada ao estudo da depresso na criana que tem sido
menos abordada na literatura comparativamente com a depresso na adolescncia e adultcia;
desconhecem-se estudos significativos que procurem conhecer o funcionamento familiar da
populao que este estudo se prope estudar de forma abrangente e integrada, isto ,
articulando numa mesma investigao os sentimentos e emoes familiares a partir das
percepes da criana e das suas figuras parentais; desconhecem-se investigaes inseridas no
contexto scio-cultural portugus que explorem as relaes familiares de crianas com
depresso; o tipo de metodologia utilizada destaca-se da restante literatura por no se
encontrarem estudos de tipo qualitativo, incluindo o mtodo de Estudo de Caso e raramente se
utiliza o instrumento Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas (Bene, 1985) combinado
com a prova Teste de Relaes Familiares, Verso Casais (Bene, 1976).

5. Objectivo

O objectivo principal do presente estudo identificar e descrever a percepo das


relaes familiares em crianas diagnosticadas com uma organizao depressiva e nas
respectivas figuras parentais. Assim, espera-se contribuir para uma maior compreenso do
funcionamento familiar destas crianas, considerando que o contexto familiar desempenha
uma importante funo no desenvolvimento e manuteno do sofrimento depressivo na
criana. Posto isto, o presente estudo pretende dar resposta seguinte questo de investigao:
qual a percepo das relaes familiares em crianas com funcionamento depressivo, na me
e no pai?

17

MTODO

1. Delineamento
De modo a responder questo de investigao qual a percepo das relaes
familiares em crianas com funcionamento depressivo, na me e no pai? Optou-se pela
utilizao do mtodo de Estudo de Caso mltiplo, exploratrio, com metodologia qualitativa
por se colocar a questo o qu? sem que sejam delineadas a priori uma teoria e hipteses
precisas, visto que o objectivo principal desenvolver hipteses que possam ser testadas em
pesquisas confirmatrias. Esta metodologia aborda fenmenos contemporneos a partir do seu
contexto real, onde as variveis so dificilmente manipulveis pelo experimentador (Yin,
1984). Assim, os Estudos de Caso so generalizveis a proposies tericas e no a
populaes ou universos (Yin, 1984, p. 21), ou seja, pressupe-se a generalizao analtica
com vista a corroborar, fortalecer ou refutar uma teoria e no a generalizao estatstica.
Perante a utilizao de mltiplas fontes de evidncia e a representao dos fenmenos atravs
da perspectiva do prprio sujeito, este mtodo permite, ainda, descries e anlises mais
intensivas dos fenmenos (Shaughnessy, Zechmeister & Zechmeister, 2006; Stake, 2005;
Stark & Torrance, 2005).

2. Participantes

Esta investigao constituda por cinco crianas diagnosticadas com depresso pelos
psiclogos e pedopsiquiatras da Unidade de Pedopsiquiatria do Servio de Pediatria de um
hospital situado na Pennsula de Setbal e os respectivos pais. Trs crianas pertencem ao
sexo masculino e duas ao sexo feminino. Segundo a terminologia psicanaltica de Freud
(1905/1981) estas crianas encontram-se no perodo de latncia, com idades compreendidas
entre os 87 e os 125 meses, isto , entre os 7 anos e 3 meses e os 10 anos e 5 meses (M=113,4
meses). Com excepo da menina mais nova que frequenta o 1 Ano de escolaridade, todas as
outras crianas frequentam o 4 Ano do 1 Ciclo do Ensino Bsico (no final do ano lectivo
todas transitaram de ano, sem registarem reprovaes nos anos lectivos anteriores). Nos casos
em estudo todas as famlias residem na Pennsula de Setbal e os progenitores so casados,
encontrando-se apenas uma famlia reconstruda com descendncia de uma relao anterior,
sendo que as restantes famlias so de tipo nuclear e todas as crianas tm apenas um(a)
irmo/irm. Dois casos, o Tom e a Isabel so irmos, perfazendo uma famlia nuclear
completa em estudo. A idade das mes varia entre os 37 e os 39 anos (M=38.5) e a dos pais
18

entre 38 e 46 anos (M=41.25). Quanto s habilitaes literrias das mes, uma tem Mestrado
(encontrando-se a realizar o Doutoramento), duas tm o Ensino Secundrio concludo e uma
tem o Ensino Secundrio incompleto (6 Ano). Dos pais, um tem o Mestrado e os restantes
tm o Ensino Secundrio incompleto (9 Ano, 8 Ano e 5 Ano), sendo que o pai com menos
habilitaes o nico progenitor que se encontra desempregado. As famlias em estudo
distribuem-se da seguinte forma quanto classe social a que pertencem: Caso do Joo
Classe I (Alta); Casos do Tom, Isabel e Gabriel Classe III (Mdia); Caso da Mariana
Classe IV (Mdia Baixa).

3. Procedimento

Inicialmente remeteu-se a carta com o pedido de autorizao (Anexo A), projecto de


investigao (Anexo B) e Consentimento Informado (Anexo C) ao Presidente do Conselho de
Administrao e Direco do Servio de Pediatria de um hospital da Pennsula de Setbal.
Aps a obteno da autorizao (Anexo D) foram identificadas cinco crianas avaliadas e
diagnosticadas com um funcionamento depressivo pelos Psiclogos e Pedopsiquiatras da
Unidade de Pedopsiquiatria, Servio de Pediatria, do hospital em causa. De forma a evitar
possveis condicionantes indesejveis face aos objectivos da investigao, alm de crianas
com diagnstico de organizao depressiva, utilizaram-se, ainda, como critrios que todas as
crianas teriam de viver com ambos os pais e encontrar-se no perodo de latncia,
aproximadamente dos 6 aos 10 anos de idade.
No incio ou trmino de uma consulta da criana/pais na Unidade de Pedopsiquiatria o
investigador foi apresentado pelo tcnico famlia explicitando sumariamente a investigao
e procedimentos inerentes a esta. Aps os pais aceitarem participar no estudo, agendou-se as
prximas sesses de recolha dos dados (dependendo da disponibilidade de cada famlia, por
vezes, os prximos encontros foram marcados sesso-a-sesso).
Realizaram-se trs sesses de recolha de dados com cada criana e duas com os pais
(apenas uma sesso com ambos os pais) com a durao aproximada de uma hora, com
excepo do Caso do Joo que registou cinco sesses com a criana e trs com os pais, devido
menor disponibilidade de tempo dos pais (as primeiras trs sesses com o Joo tiveram uma
durao de cerca de 30 minutos). As sesses realizaram-se antes (Caso da Isabel), durante
(sesses com os pais) e/ou aps a consulta de Pedopsiquiatria/Psicologia da criana na
Unidade e, ainda, em datas pr-estabelecidas com a investigadora.
Contrariamente ao que se tinha previsto na fase de planificao deste estudo, no se
seguiu a mesma ordem na aplicao dos instrumentos com todos os Casos em estudo. Ainda
19

que este facto possa condicionar os resultados obtidos funcionando como varivel parasita,
optou-se pela adaptao s necessidades especficas de cada criana (e.g., tempo que
despendem na aplicao de cada prova), disponibilidade horria dos pais e da prpria
investigadora e existncia de gabinetes disponveis para cada sesso.
Assim, a recolha dos dados teve incio atravs de uma sesso com ambos os pais (Caso
do Tom, Isabel e Gabriel) ou com apenas a me (Caso do Joo e Mariana) apresentando-se o
consentimento informado, no qual se explicou o mbito da investigao, o nmero de
encontros necessrios recolha dos dados e os cuidados ticos implicados (e.g., carcter
voluntrio de participao, confidencialidade, proteco dos dados). Na primeira sesso com
o pai presente foi-lhe igualmente apresentado o consentimento informado, sendo importante
ressalvar que todas as crianas obtiveram o devido consentimento por escrito das figuras
parentais. Com ambos os pais presentes realizou-se uma entrevista semi-directiva (Anexo E)
com o objectivo de recolher os dados necessrios elaborao da anamnese da criana,
genograma familiar e, ainda, para a Classificao Social Internacional de Graffard (Gomes
Pedro, 1985) (Anexo F). Procedeu-se passagem da prova Teste de Relaes Familiares,
Verso Casais (Bene, 1976) (Anexo G) a cada figura parental individualmente.
A primeira sesso com a criana iniciou-se com uma entrevista semi-directiva (Anexo
H) com o intuito de recolher informaes associadas histria e percepo familiar da criana
como, tambm, permitir que esta se expressasse de forma espontnea, favorecendo, assim, a
criao de uma relao de aliana com a observadora, de modo a facilitar a passagem das
provas projectivas que se seguiram.
Nos Casos do Tom, Isabel e Mariana, em seguida, administraram-se os testes
Desenho Livre e Desenho da Figura Humana (Machover, 1978). Na segunda sesso
procedeu-se aplicao dos instrumentos Desenho da Famlia (Corman, 2003), Teste de
Relaes Familiares, Verso Crianas (Bene, 1985) (Anexo I) e Inventrio de Depresso
para Crianas (Marujo, 1995) (Anexo J).
No caso do Gabriel aps a aplicao do Desenho Livre utilizou-se o Inventrio de
Depresso para Crianas (Marujo, 1995). Na segunda sesso aplicou-se o Desenho da
Figura Humana (Machover, 1978) e o Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas (Bene,
1985). O Desenho da Famlia (Corman, 2003) aplicou-se na ltima sesso.
Na segunda sesso de recolha de dados com o Joo aplicou-se o Desenho Livre, na
terceira sesso o Desenho da Famlia (Corman, 2003). A quarta sesso iniciou-se com a
passagem do instrumento Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas (Bene, 1985),
seguiu-se o Desenho da Figura Humana (Machover, 1978) e o Inventrio de Depresso para
Crianas (Marujo, 1995).
20

Na ltima sesso com cada criana realizou-se a passagem da tcnica projectiva As


Aventuras de Pata-Negra (Corman, 2001) (Anexo K).
Deve-se, ainda, referir que a passagem dos instrumentos supramencionados foi
realizada pelo mesmo examinador e numa sala pertencente Unidade de Pedopsiquiatria.
Durante a passagem das provas enfatizou-se a importncia da participao voluntria de cada
sujeito, tal como, o facto de no existirem respostas certas ou erradas nas provas aplicadas,
visto que o interesse est no que o indivduo considera mais verdadeiro para si mesmo. Todos
os nomes mencionados nesta investigao so fictcios, de forma a preservar a
confidencialidade dos dados.
Aps a recolha dos dados junto das famlias recorreu-se aos processos clnicos de
forma a obter os dados relativos origem e motivo do pedido, gravidez, parto,
desenvolvimento durante a primeira, segunda e terceira infncia da criana, histria familiar e
relatrios escolares. Em seguida, procedeu-se anlise dos dados atravs da integrao da
informao fornecida nos processos clnicos, observao livre, entrevistas e provas aplicadas
aos pais e crianas, enfatizando-se a percepo das relaes familiares de cada sujeito em
estudo (criana, me e pai). Por fim, elaborou-se uma comparao e discusso geral dos
resultados obtidos em cada uma das famlias de forma a aceder a uma leitura compreensiva
das percepes familiares presentes nas famlias de crianas diagnosticadas com depresso.

4. Instrumentos

De forma a analisar a percepo das relaes familiares na criana com depresso, na


me e no pai utilizaram-se os seguintes instrumentos: Desenho da Famlia (Corman, 2003),
Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas (Bene, 1985), Teste de Relaes Familiares,
Verso Casais (Bene, 1976) e As Aventuras de Pata-Negra (Corman, 2001). Para
complementar o funcionamento das crianas recorreu-se ao Desenho Livre e ao Desenho da
Figura Humana (Machover, 1978). Para avaliar a depresso das crianas procedeu-se
passagem do Inventrio de Depresso para Crianas (Marujo, 1995).
Adicionalmente, neste estudo criaram-se duas entrevistas semi-directivas, uma
destinada aos pais e outra s crianas com o intuito de recolher informaes complementares
sobre a criana e famlia face aos objectivos da investigao. Algumas das questes
formuladas na entrevista das crianas basearam-se no instrumento Semistructured Clinical
Interview for Children and Adolescents de McConaughy e Achenbach (2001). A entrevista
dos pais permitiu, ainda, formular o genograma familiar e aceder classe social de cada
famlia com recurso Classificao Social Internacional de Graffard (Gomes Pedro, 1985).
21

4.1. Desenho Livre

A tcnica grafo-motora do Desenho Livre usualmente utilizada na clnica infantil


como forma privilegiada de aceder ao mundo fantasmtico da criana. Para a criana o
desenho sentido como um meio natural de se expressar, pois mesmo na latncia frequente
uma criana ultrapassar a inibio verbal comunicando pelo desenho, onde expressa o conflito
latente que a trouxe consulta, a vida fantasmtica, as defesas o funcionamento mental
(Ferreira, 2002, p. 358). atravs do desenho espontneo que se distingue de forma particular
a organizao de figuras no espao, a relao entre os objectos, os pormenores, a utilizao e
escolha das cores, assim como, as formas e os elementos incongruentes. criana
possibilitada a escolha do seu modo de expresso e de deslocar para o desenho o que sente
durante a sesso (Celi, 2004). Tal como defende Celi (2004) os afectos so transmitidos
pelas cores, e so permitidas todas as regresses, como no sonho (p. 270). Este trabalho deve
ser completado atravs do recurso palavra e associao, permitindo a traduo das
vivncias psquicas na realidade consciente da criana. A interpretao do Desenho Livre
deve ter sempre em considerao a idade e o nvel de desenvolvimento da criana que o
realiza (Celi, 2004; Di Leo, 1987).
Posto isto, durante a avaliao psicolgica dada a seguinte instruo criana:
gostaria que fizesses um desenho nesta folha, disponibilizando-se uma folha branca, um
lpis de carvo, lpis de cor e canetas de feltro. Caso a criana necessite, incluir uma
borracha. Aps a finalizao do desenho surge a fase de inqurito, onde deve ser pedido
criana para descrever o que desenhou (e.g., quem so as pessoas que desenhou e o que esto
a fazer) e contar uma histria alusiva ao desenho.

4.2. Desenho da Figura Humana

O Desenho da Figura Humana, originalmente criado por Goodenough em 1926 como


instrumento de medida do desenvolvimento intelectual de crianas foi posteriormente
adaptado ao estudo da personalidade de crianas e adultos por Karen Machover, em 1949 (cit.
por Machover, 1978). Atravs da publicao dos resultados de diversas observaes clnicas
sobre a representao grfica de figuras humanas desenhadas por sujeitos com variados
problemas psicolgicos, Machover atribuiu um carcter projectivo prova. Como tal,
segundo a autora, ao desenhar uma pessoa, o sujeito representa no papel a sua auto-imagem
corporal, a relao fantasmtica que mantm com o ambiente, as suas aspiraes, imagem
ideal e pessoas significativas. Celi (2004) acrescenta que este teste revela as fixaes
22

precoces, o investimento particular das zonas ergenas, os locais de conflitos pulsionais e a


estrutura da organizao tpica do sujeito (pp. 268-269). Desta forma, a prova permite a
projeco das identificaes e conflitos da criana, que aliados avaliao dos aspectos
normativos implcitos ao processo de desenvolvimento humano transmitem informaes
pertinentes sobre o indivduo em avaliao (Machover, 1978).
Durante a administrao da prova entregue ao sujeito um lpis de carvo, lpis de
cor, uma folha de papel branco em formato A4 e, ainda, uma borracha (caso o sujeito a
solicite). Segue-se a seguinte instruo: Gostaria que desenhasses uma pessoa nesta folha.
Faz o melhor desenho que puderes e um inqurito quando o desenho estiver terminado.
Todos os comentrios proferidos pelo sujeito ao longo da prova devem ser anotados pelo
observador. Aps este primeiro desenho solicita-se ao sujeito que desenhe uma pessoa do
sexo oposto figura desenhada em primeira instncia, repetindo-se o processo de aplicao
utilizado no primeiro desenho (Machover, 1978). Neste estudo alm da verso integral da
prova proposta por Machover (1978) recorreu-se a um inqurito constitudo por trs questes
complementares por se considerarem adequadas e pertinentes face aos objectivos da prova
atendendo fase de desenvolvimento das crianas em estudo. Seguem-se as questes
utilizadas: Quem esta pessoa? Como se chama e que idade tem? Qual foi o dia mais feliz da
sua vida? E o dia mais triste? Conta-me uma boa recordao que tenha. E uma m recordao.

4.3. Desenho da Famlia

A prova do Desenho da Famlia segundo Corman (2003) um instrumento projectivo.


Deste modo, a partir da instruo Desenha uma famlia inventada por ti a criana
convidada a criar e a projectar livremente as suas tendncias inconscientes e conscientes,
revelando os sentimentos experienciados perante os elementos da sua famlia. Trata-se, pois,
de uma prova de personalidade onde so projectados os conflitos, afectos, sentimentos,
desejos, medos e identificaes da criana.
Aps a realizao do desenho solicitado criana que atribua um nome, idade e
papel ocupado na famlia por cada personagem desenhada e, ainda, a descrio do que se
encontram a fazer. Segue-se um inqurito denominado por Corman (2003) como mtodo das
Preferncias-Identificaes, no qual so questionadas as preferncias ou averses associadas
s personagens representadas e ao prprio desenho na sua globalidade (e.g., Quem o mais
feliz? Porqu? Quem o menos feliz? Porqu? Quem manda mais? Porqu? Quem manda
menos? Porqu? Se fossem todos dar um passeio de carro mas no houvesse lugar para uma
pessoa, quem ficaria em casa? Porqu?).
23

4.4. Inventrio de Depresso para Crianas

Este instrumento da autoria de Maria Kovacs (2004) tambm designado por CDI
(Childrens Depression Inventory) uma escala que pretende avaliar a gravidade dos
sintomas de depresso em crianas e adolescentes, dos 7 aos 15 anos de idade, no tendo
como objectivo o diagnstico de depresso. Trata-se, assim, de uma adaptao do teste BDI
(Beck Depression Inventory, Beck, Steer & Brown, 1996) amplamente utilizado na
autodescrio de sintomas depressivos em adultos. O CDI compreende sintomas ligados
caracterizao da depresso nas reas da cognio, afecto e comportamento: tristeza,
pessimismo, sentimentos de insucesso, insatisfao, culpa, auto-imagem baixa, suicdio,
indeciso, fatigabilidade, dificuldades escolares, anedonia, problemas de sono e de
alimentao (Kovacs, 2004; Marujo, 1995).
No presente estudo recorreu-se adaptao portuguesa da prova da autoria de Helena
Marujo (1995) aps a devida autorizao da autora. A escala contm 27 itens e pressupe o
preenchimento pela prpria criana ou por figuras relevantes na sua vida como a me, o pai
ou professor(a) atravs da escolha entre quatro opes de resposta por item com valores entre
0 e 3 pontos (total mximo de 81 pontos), sendo que zero corresponde opo que representa
a menor intensidade e frequncia e trs a mais elevada e, portanto, de depresso (e.g., Item 1:
Nunca me sinto triste, s vezes sinto-me triste, Sinto-me quase sempre triste, Sinto-me
sempre triste), tendo como referncia as duas ltimas semanas da criana/adolescente.
Assim, esta adaptao difere da verso original de Kovacs (2004) composta por apenas trs
opes de resposta por item, com valores entre 0 e 2 pontos (total mximo de 54 pontos).
Para a definio de caso deprimido e caso no deprimido frequente utilizar-se
um ponto de corte de 19 nas verses internacionais da prova, incluindo a verso de Kovacs
(2004). Contudo, na adaptao portuguesa optou-se por recorrer ao critrio estatstico
associado mdia (22.06) e desvio-padro (11.68). Assim, constituram-se quatro grupos com
as seguintes caractersticas (Marujo, 1995): Grupo 1 no deprimidos: resultados inferiores
mdia, menos um desvio-padro (valores inferiores a x-s=10.38); Grupo 2: resultados
inferiores mdia, sem se distanciarem dela mais do que um desvio-padro (valores entre
10.38 e 22.05); Grupo 3: resultados superiores mdia, sem se distanciarem dela mais do que
um desvio-padro (valores entre 22.07 e 33.74); Grupo 4 deprimidos: resultados
superiores mdia, mais um desvio-padro (valores superiores a x+s=33.74).
No que concerne s caractersticas psicomtricas do teste, segundo dados obtidos em
diversas investigaes, o teste fivel, obtendo um coeficiente Alfa de Cronbach de 0,86
quanto ao valor de consistncia interna no estudo original. Verifica-se, ainda, a existncia de
24

evidncia emprica sobre os valores de validade concorrente e de constructo da prova


(Kovacs, 2004). Contudo, como assinala Marujo (1995) os resultados contraditrios obtidos
ao nvel da validade discriminante colocam-na na posio da propriedade psicomtrica mais
criticada e discutida. Assim, em alguns estudos este instrumento no diferencia entre
populaes clnicas e no clnicas ou entre diferentes grupos clnicos, enquanto noutros
estudos demonstra distino. Este ltimo facto coloca nfase na sua aplicao enquanto
instrumento complementar sobre a sintomatologia e no como um instrumento de
diagnstico, para usar separadamente (p. 455).

4.5. Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas

O Teste de Relaes Familiares (TRF), Verso Crianas desenvolvido por Bene


(1985) caracteriza-se por uma prova projectiva que visa medir os sentimentos da criana
avaliada face aos membros da sua famlia e a percepo que a criana tem dos sentimentos
dos elementos da famlia relativamente prpria. Esta verso do teste contm duas formas
compostas por itens distintos: a forma para crianas mais novas (em idade pr-escolar) e a
forma para crianas mais velhas (em idade escolar), recorrendo-se na presente investigao
ltima forma. Esta forma composta por 86 itens, contendo cada item uma frase que dada
criana para a fazer corresponder a um dado membro familiar, onde a prpria criana se inclui
e uma figura introduzida pelo investigador, o Ningum (silhueta de costas), no qual podem ser
colocadas as mensagens/afectos recusados.
Na ausncia de aferio para a populao portuguesa, recorreu-se traduo do teste
realizada por Malpique (1990) num estudo composto por 90 crianas com idades
compreendidas entre os 8 e os 12 anos (quarenta e cinco de cada gnero).
Este instrumento permite avaliar as vertentes positivas, de amor (leves/de ternura e.g.,
06. Esta pessoa da famlia merece um bom presente; fortes/erotizadas e.g., 50. Esta pessoa
da famlia gosta de me dar beijinhos) e negativas, de dio (leves/de rejeio e.g., 27. Esta
pessoa da famlia nunca est satisfeita; fortes/agressivas e.g., 30. s vezes apetece-me
matar esta pessoa da famlia) dos sentimentos emitidos e recebidos pela criana face aos
elementos da famlia. E, ainda, o grau de dependncia atravs da superproteco materna,
como por exemplo, 82. A me preocupa-se que esta pessoa da famlia possa ser atropelada e
da superindulgncia parental paterna (e.g., 94. Esta a pessoa da famlia que o pai gosta
mais) e materna (e.g., 96. Esta a pessoa da famlia a quem a me d mais ateno).
Quanto s caractersticas psicomtricas o teste discrimina as diferenas significativas
nas relaes familiares entre crianas provenientes de diferentes populaes e os mecanismos
25

psicodinmicos de defesa destacados assumem particular importncia em crianas gravemente


perturbadas (Bene, 1985).

4.6. Teste de Relaes Familiares, Verso Casais


Relativamente ao instrumento Teste de Relaes Familiares (TRF), Verso Casais da
autoria de Bene (1976) pode-se descrev-lo como uma tcnica projectiva utilizada na
avaliao dos sentimentos que um indivduo casado ou em situao de unio de facto tem
sobre os elementos da famlia real, nomeadamente o cnjuge e filhos, assim como, destes
elementos perante o prprio indivduo, segundo a sua percepo. Deste modo, contribui de
forma determinante para a compreenso das interaces emocionais da famlia nuclear. Os
autores referem que esta tcnica pode, ainda, ser utilizada em adultos que tenham pelo menos
duas pessoas prximas a actuar como familiares (e.g., pais/mes solteiros/as com dois filhos).
Dado que se desconhece a aplicao desta prova em Portugal procedeu-se sua
traduo para o presente estudo.
As dimenses discriminadas no teste so as seguintes: Sentimentos positivos, de amor
(leves/de ternura e.g., 06. Esta pessoa da famlia merece ser feliz; fortes/erotizados e.g.,
11. Gosto que esta pessoa da famlia me beije) e sentimentos negativos, de dio (leves/de
rejeio e.g., 24. Esta pessoa da famlia por vezes tem mau feitio e fortes/agressivos e.g.,
32. s vezes odeio esta pessoa da famlia) emitidos e recebidos pelo sujeito em relao aos
elementos da famlia, sentimentos de proteco, como exemplo, 81. s vezes preocupo-me
que esta pessoa da famlia possa adoecer e, finalmente, atribuio de incompetncia ou
fraqueza, por exemplo, 91. Esta pessoa da famlia no consegue lidar suficientemente bem
com dificuldades. A prova constituda por 78 itens, contendo cada item uma frase que
dada ao sujeito para a fazer corresponder a um dado membro familiar, na qual o prprio se
inclui e, ainda, uma figura denominada Ningum composta por uma silhueta de costas onde
so colocados os afectos recusados (Bene, 1976).
Segundo o estudo original o teste discrimina adequadamente as diferenas existentes
entre a percepo das amostras clnicas e no-clnicas dos pais sobre as esposas, contudo no
se observa o mesmo resultado das esposas sobre os cnjuges. No caso da percepo familiar
alusiva aos filhos, na amostra no-clnica no se observaram diferenas significativas no
nmero de itens negativos/positivos atribudos aos filhos/as. No entanto, no caso da amostra
clnica, observou-se uma diferena significativa no nmero de itens negativos atribudos por
estes pais aos filhos pacientes em comparao com os restantes filhos, o que contribui para
as qualidades psicomtricas do teste (Bene, 1976).
26

4.7. As Aventuras de Pata-Negra


A tcnica projectiva As Aventuras de Pata-Negra (PN), da autoria de Louis Corman
(2001) foi desenvolvida com o intuito de avaliar a personalidade e os conflitos inerentes ao
funcionamento mental infantil a partir da abordagem psicanaltica, em crianas com idades
compreendidas entre os 4 anos e os 10 anos de idade. Trata-se de um prova composta por um
carto designado de Frontispcio, o qual introduz a prova, o carto Fada que a conclui e,
ainda, 17 cartes contendo imagens figurativas de um porco e da sua famlia, a preto e branco.
Perante as solicitaes manifestas e latentes contidas em cada carto, a criana convidada a
escolher os cartes que prefere e a narrar uma histria inventada por si, dispondo a ordem de
sucesso de cada imagem. Este procedimento permitir que a criana em situao de
avaliao projecte a sua realidade interna, defesas e registos de conflitualizao subjacentes
ao seu funcionamento psquico. Cada carto pode reactivar sucessiva ou simultaneamente
vrios registos de conflitualizao na mesma criana (Boekholt, 2000).
A aplicao da prova pressupe cinco etapas (Boekholt, 2000; Corman, 2001).
Primeira Etapa: O clnico apresenta o carto Frontispcio criana e convida-a a identificar
PN, atribuindo-lhe a idade e sexo, assim como das restantes figuras, determinado o grau de
parentesco entre estas. Este carto mantm-se visvel ao longo da prova. Segunda Etapa, os
temas: Todos os cartes com excepo do carto Fada so entregues criana para os
distribuir em dois grupos, os que deseja contar uma histria e os que no deseja. Antes de
passar fase seguinte o clnico questiona a criana se deseja acrescentar cartes ao grupo dos
que conta uma histria. Terceira Etapa, preferncias-identificaes: a criana convidada a
separar os cartes que gosta dos que no gosta. Em seguida, por ordem de preferncia no
grupo dos cartes que gosta, indica porque prefere cada carto e quem gostaria de ser em cada
imagem. No grupo inverso, ordena a partir do que menos gosta, justificando porque no gosta,
o que alterava na imagem para gostar dela e quem seria. Quarta Etapa, questes dirigidas:
Inqurito sobre perceptos evidentes que a criana poder ter omitido (e.g., urina no carto
Bebedouro e lama em Brincadeiras Sujas). Quinta Etapa, questes de sntese: Questes
complementares como: Quem o mais feliz? Porqu? Quem o menos feliz? Porqu? O que
que o PN pensa da sua pata-negra? No fim, apresenta-se o carto Fada e diz-se A fada
apareceu e disse ao PN que pode pedir trs desejos. Diz-me quais foram estes desejos.

27

RESULTADOS
1. Sntese do Estudo de Caso 1 Tom (10 anos e 5 meses) e do Estudo de Caso 2
Isabel (7 anos e 3 meses)

O Tom (Anexo L) frequenta o 4 Ano do 1 Ciclo do Ensino Bsico. Apresenta um


desenvolvimento estato-ponderal adequado ao seu grupo etrio e gnero, observando-se um
aspecto fsico harmnico, cuidado e limpo. Estabeleceu um contacto inibido, transparecendo
uma postura corporal pouco expressiva e um olhar triste, evitando manter contacto ocular.
Verbalizou pouco e maioritariamente atravs de monosslabos, num tom de voz baixo.
Colaborou nas provas aplicadas, mantendo uma conduta estvel, controlada e concentrada.
Foi encaminhado para a Unidade de pedopsiquiatria atravs da consulta num hospital
localizado na Grande Lisboa por ansiedade, dificuldades de aprendizagem e queixas de
cefaleias, principalmente quando no quer ir escola e, por vezes, nos dias em que tem jogos
de futebol. acompanhado em consultas teraputicas de frequncia semanal com a psicloga
da Unidade h oito meses e meio, beneficiando, ainda, de interveno familiar.
O Tom vive com os pais e com a irm Isabel. O pai chefe de oficina mecnica e a
me chefe de seco do servio de caixas de um hipermercado (tem horrio por turnos, com
dois dias de folga rotativos). Devido aos empregos, os pais dispem de pouco tempo para a
famlia, sendo apoiados pelos avs maternos do Tom e da Isabel que os conduzem escola,
s consultas na Unidade e servem-lhes o jantar, dormindo por vezes na casa dos avs. Aos
fins-de-semana quando o pai trabalha tambm ficam ao cuidado dos avs.
Anteriormente gravidez do Tom a me sofreu dois abortos espontneos aos dois
meses de gestao, com um ano de intervalo entre as trs gestaes (incluindo do Tom). A
gravidez foi planeada, ainda que a me se tenha sentido muito ansiosa e receosa devido aos
abortos anteriores. Para a av materna a me passou a sua ansiedade para o filho. O pai tinha
preferncia por uma menina. O Tom nasceu s trinta e seis semanas, de parto eutcico. A
me nega a possibilidade de ter sofrido uma depresso ps-parto.
Durante o primeiro ano de vida o Tom recordado como um beb calmo e reservado,
no se dando com todas as pessoas. No chorava muito e aos dois meses j dormia a noite
toda era comer e dormir, por vezes, era preciso acord-lo para comer. Para adormecer
gostava de mexer no nariz do adulto. Ficou no quarto dos pais at aos trs anos. A partir dos
sete anos comeou a partilhar o quarto com a irm, dormindo bem e com um peluche,
semelhana da irm. No se registaram intercorrncias no desenvolvimento psico-motor, na
linguagem e introduo da diversificao alimentar.
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Na entrada para o jardim-de-infncia aos cinco anos desenvolve encoprese secundria


com receio de no conseguir fazer a sua higiene sozinho uma vez que em casa pedia me e
av para o limparem. Uma vez na sanita, no conseguia ficar sentado durante todo o momento
da evacuao, sentando-se e levantando-se. Por indicao do pediatra fez um calendrio para
a encoprese e actualmente j no apresenta este sintoma.
Do nascimento at aos seis meses e meio o Tom ficou aos cuidados da me. A partir
desse momento at aos cinco anos ficou com a av materna at integrar um jardim-deinfncia onde chorou em silncio durante a primeira semana no momento da separao da
famlia. Com seis anos inicia o 1 Ano mantendo-se as dificuldades de separao da me e da
av materna: no quer ir para a escola e pede para esperarem com ele pela professora. Depois
fica bem na escola. Na presena do pai no manifesta dificuldades de separao.
Contudo, os pais associam o incio dos seus sintomas quando aos 7 anos a me foi
operada (s varizes), ficando em casa quinze dias com a Isabel parece que agora no capaz
de fazer o que antes fazia. O Tom comentava pois a menina fica em casa contigo. Assim,
o Tom comeou a no querer ir escola, chorando e dizendo no me deixes l. Sentem-no
desmotivado em relao aprendizagem escolar, tendo dificuldades em defender-se dos
pares, deixando-se agredir at por crianas mais novas, levando-o a isolar-se dos colegas no
recreio, sem brincar com medo de se aleijar (melhorou aps uma conversa com o pai).
Segundo os pais uma criana que est sempre espera da indicao dos pais, no tem
iniciativa nem opinio sobre alguma coisa que se lhe pergunte, ficando espera da opinio do
adulto, muito insegura e muito infantil, pouco autnoma em comparao com os colegas e
acrescentam no futebol no defende uma bola, tem muito medo de errar e de no conseguir
fazer as coisas, inibindo-se, o que prejudica muito a aprendizagem na escola. tmido e
reservado. Quando se sente frustrado desabafa s vezes eu no valho nada. Contudo, os pais
consideram que no uma criana que se queixe ou chore. Brinca com carrinhos imitando a
profisso do pai (mecnico). Gosta tambm de ajudar a famlia nas tarefas domsticas,
esperando reconhecimento (e.g., ajudar o av materno no quintal).
No 2 Ano de escolaridade iniciou apoio pedaggico. Segundo a professora do 3 Ano
o Tom relaciona-se bem com os adultos (professora e auxiliares) e com os colegas, embora
seja tmido e discreto. Precisa de ser constantemente valorizado pelo seu trabalho para ganhar
auto-estima e confiana. Gosta de participar nas actividades escolares () possui um ritmo de
trabalho lento o que prejudica a concluso das tarefas, continuando a precisar muito da ajuda
da professora. No 4 Ano mantm-se as dificuldades escolares apontadas no ano anterior.
Aps uma gravidez planeada a Isabel nasceu de parto prematuro s vinte e oito
semanas de gestao com 795g, cerca de trs meses antes da data prevista, por cesariana.
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Apesar de a me se sentir preocupada, na sua sade nada justificava a prematuridade. Aps o


nascimento a Isabel sofreu uma infeco por adenovrus, sem registo de sequelas. Permaneceu
dois meses e meio na incubadora e a me quinze dias internada, contactando com a me
passados oito dias do nascimento. Durante o internamento da Isabel os pais passavam o dia no
hospital at s vinte e duas horas durante a noite ela s conseguia estar bem ao colo. Quando
saiu do hospital tinha 1,5kg. O Tom parece que ficou ao abandono, ficava com a av
materna, partilha o pai. Na altura, o Tom tinha trs anos e via os pais apenas noite. Os pais
reconhecem a existncia de um ambiente emocional pesado em relao ao estado de sade da
filha, sentindo muita preocupao e ansiedade. Na altura no notaram alteraes no Tom mas
nota-se agora. No transmite aquilo que sente, reservado nas emoes referem os pais,
admitindo, ainda, que no estariam eventualmente atentos aos sinais do Tom.
A Isabel (Anexo M) frequenta o 1 Ano do 1 Ciclo do Ensino Bsico. Apresenta um
desenvolvimento estato-ponderal adaptado sua idade e gnero, contudo, de um modo global
traduz uma imaturidade que a faz parecer mais nova. Trata-se de uma criana harmnica, com
aspecto fsico investido e cuidado. Estabeleceu um contacto inibido, todavia registou-se uma
disponibilidade crescente para a relao e verbalizao no decorrer das sesses. Verbaliza, por
vezes, com espontaneidade, utilizando um tom de voz baixo e pronunciando as palavras de
forma imatura para a idade. Estabeleceu contacto ocular marcado por um olhar triste. Manteve
um comportamento estvel, controlado e concentrado nas provas realizadas.
Pela prematuridade a Isabel seguida na consulta de desenvolvimento de um hospital
da Grande Lisboa onde a me manifestou a sua preocupao relativamente ansiedade e
medos da filha (de animais, ladres, palhaos, deitar-se sozinha, acidentes, do perigo, etc.),
sendo encaminhada para a consulta de psicologia daquele hospital. Foi reencaminhada para a
Unidade de Pedopsiquiatria devido sua rea de residncia. Assim, h cerca de dois meses
que a Isabel iniciou o acompanhamento em consultas teraputicas de psicologia de frequncia
semanal beneficiando, tambm, de consultas familiares junto dos pais.
Para os pais as queixas de medo e ansiedade da Isabel agravaram-se h cerca de um
ano quando o carro do av materno foi assaltado e a Isabel encontrava-se com o av quando
descobriu o carro aberto, ainda que a Isabel no tivesse visto os ladres. Assim, o medo de
ces agravou-se nessa altura como a me tambm tem medo isso no ajuda. Ela trepa por
cima da me desesperadamente com medo de ces, revela o pai. A Isabel tem dificuldades
em adormecer (depois a noite corre bem) pois como a prpria diz tenho medo de ladres
quando me vou deitar. Tenho medo que eles me levem. Quando a me est em casa fica com
a Isabel at a filha adormecer. Caso contrrio, a Isabel chama a me ao quarto e se a me no
vai ela pede um copo de gua, mas no chora. Comigo ela no chama, mas j houve perodos
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de ela comear a choramingar mas eu digo que ela no tem motivos revela o pai e acrescenta
que de manh a me tenta acordar os filhos chamando-os vrias vezes at ficar irritada, mas
estes no obedecem acho que a me cede demais. Com o pai levantam-se logo. A Isabel no
consegue ficar sozinha numa diviso da casa, seguindo sempre a me, mesmo que a me a
tente tranquilizar dizendo-lhe que no viro ladres. Se for algum de quem ela goste a nossa
casa um choro. Porque tem pena que as pessoas se vo embora, confessa o pai.
Em beb o sono da Isabel era agitado, sendo difcil adormecer. No entanto,
adormecia facilmente no meu colo indica o pai. Nunca teve problemas ao nvel do
desenvolvimento psico-motor e lingustico associados prematuridade, comeando a andar e
a falar mais cedo que o irmo e sem dificuldades. Durante as refeies demora, por vezes,
duas horas para comer. Segundo o pai comigo come tudo, com a me mais difcil mas
quando eu repreendo a me tenta arranjar uma desculpa para a defender.
At aos cinco meses a me cuidou da Isabel e o Tom ficou com a av materna. Aps
este perodo ficou aos cuidados da av materna at aos seis anos, no frequentando a creche.
Na entrada para a escola registou uma boa adaptao. A professora refere que um pouco
lenta, embora j saiba ler. bem comportada e d-se bem com os colegas.
Na famlia alargada desconhecem-se casos de doena psiquitrica. Contudo, a me
revela que em pequena era muito tmida, muito reservada, parecida com o Tom. No recreio
no ia ter com os outros meninos. Por seu lado, o pai confessa que sempre fui uma pessoa
com dificuldades na escola e, por esse motivo, aos dez anos foi seguido em psicologia.
Os pais apresentam um aspecto fsico investido e cuidado e estabeleceram um contacto
adequado e expressivo. Revelaram interesse e entusiasmo em partilhar as suas vivncias e em
participar na investigao. Ambos mantiveram contacto ocular, ainda que, tenha observado
um olhar muito triste e vazio na me, o sentimento de culpabilizao, a necessidade de
prolongar as respostas s questes quando pareciam terminadas, verbalizando at ao momento
em que eu formulava uma nova questo, numa tentativa de preencher o espao vazio. A me
pareceu-me uma pessoa mais negativa que o pai, o qual pareceu assumir-se como a figura que
tenta equilibrar as situaes de forma mais positiva.
A figura materna apresenta uma auto-estima baixa ligada a uma vivncia depressiva
com afectos na linha da insegurana, inferioridade e culpabilizao na relao com os outros,
sobretudo, na relao com os filhos devido percepo de disponibilizar pouco tempo para a
famlia em detrimento da vida profissional. Sente-se desvalorizada e insegura em especial na
relao com os elementos exteriores famlia biolgica. Assim, parece ainda muito
dependente e pouco autonomizada do espao relacional com a sua figura materna e da prpria
famlia de origem. Utiliza como principais defesas a idealizao e a negao, permitindo-lhe
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reprimir os afectos depressivos e a projeco de agressividade nos elementos da famlia. A


idealizao da relao conjugal dos avs maternos: admiro os meus pais porque quando se
deitam como se nada tivesse acontecido e o dia a seguir novo expressa o desejo de
manter os conflitos recalcados atravs do recurso negao e fuga para a frente. O elevado
envolvimento no meio profissional pode tambm remeter para uma defesa na linha da mania.
Este tipo de vivncias aliadas reco de choro intenso durante a entrevista clnica
aps o pai caracterizar a relao de casal como conflituosa e o comentrio ao carto 45
Esta pessoa da famlia aprecia a minha companhia: neste momento sinto-me tmida e
isolada no meu mundo, que no sei bem quem aprecia a minha companhia na passagem da
prova TRF (Anexo N) podem remeter para depresso materna, semelhana da hiptese
avanada pela psicloga que acompanha os pais nas consultas teraputicas na Unidade,
tambm prevendo depresso ps-parto. A psicloga aconselhou a me a procurar ajuda
psicoteraputica para esta problemtica embora, a me tenha sempre recusado.
A figura paterna apresenta um elevado grau de neuroticismo, com forte bloqueio da
agressividade sobre os elementos da famlia, recorrendo a defesas na ordem da negao e
idealizao das relaes.
Quanto ao Tom sobressai a expresso de auto-agressividade atravs de uma autoestima insegura e culpabilizada. Revela-se emocionalmente dependente de ambos os pais,
com destaque para a figura materna. Os principais mecanismos de defesa utilizados so a
idealizao, evitamento do conflito, recalcamento, negao e formao reactiva, o que lhe
permite negar a expresso agressiva sobre os elementos da famlia.
A Isabel apresenta uma auto-estima insegura e percepciona-se como o elemento mais
dependente das figuras parentais, nomeadamente dos cuidados e proteco maternos. Os
principais mecanismos de defesa utilizados so o deslocamento, idealizao, formao
reactiva, negao, evitamento e recusa dos conflitos, bloqueando a expresso agressiva sobre
os elementos da famlia e a vivncia depressiva.
No mbito da percepo materna da relao conjugal sobressaem as dificuldades na
relao de casal associadas ao sentimento de carncia de apoio, compreenso e pouco
envolvimento nas funes conjugais/parentais do pai, mas tambm a interferncia de
sentimentos de insegurana e culpabilidade por parte da me. O pai ainda caracterizado de
forma autoritria, punitiva (associando ao ambiente familiar no qual se desenvolveu) e
dependente da proteco da me, podendo remeter para uma percepo desvalorizada desta
figura. O pai, por seu lado, tende a valorizar pouco a relao de casal, idealizando os afectos
positivos emitidos e sentindo os afectos recebidos como ambivalentes (no TRF). Esta
percepo permite antever conflitos na relao de casal por m interpretao das coisas,
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sentindo a me como uma pessoa pouco tolerante, insegura e com irritabilidade emocional,
transmitindo pouco afecto e erotizao relao. Exprime o desejo de a proteger.
Quanto relao me/Tom a figura materna percepciona esta relao de forma
dependente e idealizada, providenciando proteco e cuidado ao Tom, mas tambm sente
que o filho se preocupa com a me. Sente-o inibido na interaco que estabelece com a me.
Na percepo do Tom observa-se a presena de fantasias edipianas numa relao fortemente
idealizada, negando os aspectos negativos e a expresso agressiva, o que dificulta o processo
de separao emocional da figura materna pelo elevado grau de dependncia que mantm.
Sente que a me centra a sua ateno nele, seguindo-se a irm e, por ltimo, surge o pai com
pouca indulgncia materna. Revela o desejo de autonomizao desta figura. Na prova PN
sobressai a vivncia de desproteco, carncia e a funo de apoio representada de forma
precria, necessitando a prpria me de um auxiliador na sua funo materna e de conteno.
A interaco pai/Tom percepcionada pelo pai de forma idealizada e correspondida.
Sente que o filho pouco tolerante frustrao, achando-o deprimido e passivo. Para os
pais o Tom percepciona o pai como uma figura punitiva temendo a repreenso dos seus
erros. Na percepo do Tom destaca-se uma forte idealizao da relao, demonstrando o
desejo de aproximao e ateno do pai. Surge uma dependncia emocional do Tom face ao
pai que no supera a relao dependente que mantm com a me. Contudo, sente o pai como
uma personagem com pouca pacincia e agressivo.
A relao me/Isabel caracterizada pela figura materna como dependente e
idealizada, ainda que desperte afectos agressivos na me, sentindo-se irritada face s condutas
da filha. Os pais sentem a necessidade da Isabel agradar me: est sempre a dizer que gosta
muito da me. Quer ajud-la. A me sente-se culpada pela percepo de projectar na filha os
seus prprios medos internos, no conseguindo representar um modelo de conteno e
segurana para a filha. Na percepo da Isabel sobressai o desejo de agradar me, a procura
da sua proteco e indulgncia e, ainda, uma forte idealizao e dependncia emocional com
esta figura, o que dificulta o processo de separao. Ainda assim, a Isabel percepciona alguns
afectos negativos recebidos pela me (no TRF). A me sentida como uma figura chateada,
triste, aleijada e relativamente dependente, centrando apenas a sua ateno nos filhos.
A relao pai/Isabel idealizada e correspondida por parte da figura paterna. Sente
que a filha estabelece consigo um contacto fcil e sedutor, mas tambm que muito reservada
e receosa face atitude firme do estilo parental do pai. Segundo os pais a Isabel estabelece
apenas com o pai um discurso imaturo para a idade, ainda que, o pai a repreenda. Por parte da
Isabel esta relao pouco valorizada projectando sentimentos de insegurana e desproteco

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na relao com a figura paterna. Ainda assim, na prova PN o imago paterno associado
funo de alimentar e ao nascimento, realizando uma inverso dos papis parentais.
A relao fraterna percepcionada pelos pais atravs de uma relao prxima, ainda
que, marcada pela rivalidade fraterna onde a me faz uma identificao projectiva com a
relao que mantinha com o seu irmo (tio materno do Tom e Isabel). Sentem que o Tom
mais dependente da proteco materna e tende a proteger a irm enquanto a Isabel menos
dependente, defendendo-se sozinha e sendo mais astuta. Para o Tom a relao com a irm
marcada por sentimentos de inferioridade face a esta figura e pela rivalidade fraterna
transmitindo o desejo de obter a ateno/proteco exclusiva dos pais, sobretudo da me. Na
percepo da Isabel destaca-se a vivncia de rivalidade fraterna, sentindo-se tambm
protegida pelo irmo (pode remeter para a defesa pela formao reactiva no Tom).
Quanto relao do Tom com outros familiares os pais focam-se na interaco com o
av materno marcada por uma atitude submissa e passiva por parte do av e uma conduta de
provocao e desafio da autoridade do av no Tom.
Na relao da Isabel com outros familiares ou adultos sobressai a percepo parental
de um contacto fcil, sedutor, a necessidade de agradar e uma forte angstia de separao
mesmo de adultos com os quais no tem contacto frequente: agarra-se muito s colegas da
me, mesmo no as conhecendo, elas estranham. A Isabel percepciona o av materno como
uma figura autoritria e punitiva.
A relao com a famlia de origem da me percepcionada por esta de forma
idealizada, transmitindo pouco autonomia emocional sobretudo em relao av materna
com a qual mantm uma relao excessivamente prxima e dependente, sendo a mais
satisfatoriamente correspondida a minha me a minha melhor amiga. Ao av materno so
associadas caractersticas dependentes dos cuidados da me, podendo representar uma forma
de desvalorizao desta figura. A relao com o tio materno associa-se rivalidade fraterna e
carncia de apoio e desvalorizao por parte desta figura face me. A me sente-se
desvalorizada na relao com a tia materna. Ambos os pais consideram que a av materna
permissiva para o Tom e a Isabel, estimulando pouco a autonomia dos netos.
Na relao com a famlia de origem paterna a me sente-se pouco valorizada
sobretudo na relao com a tia paterna atribuindo-lhe sentimentos de incompetncia e
fraqueza e com a av paterna, da qual apenas recebe afectos agressivos, no se sentido aceite.
O pai projecta uma elevada dependncia emocional face av paterna, remetendo para
dificuldades no precesso de autonomizao desta figura. Expressa, ainda, o desejo de a
proteger. Contudo, a av paterna percepcionada de forma rgida, autoritria,
emocionalmente independente, exigindo receber mais afecto do que aquele que disponibiliza
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famlia. Na relao com o tio paterno apresenta um elevado grau de envolvimento afectivo,
dependendo muito desta figura. Todavia, sente-se desvalorizado. A relao com a tia paterna
(esposa do irmo) e com os primos gmeos (sobrinhos do pai) idealizada e pouco
correspondida.
Posto isto, numa famlia onde as figuras parentais demonstram uma relao
emocionalmente dependente e uma fraca autonomizao das famlias de origem, sobretudo a
me na relao que estabelece com a av materna, sobressai uma figura materna
aparentemente deprimida e permissiva e uma figura paterna que assume uma funo parental
mais firme e contentora. Os dois abortos espontneos da me e a prematuridade da Isabel
podem associar-se vivncia depressiva materna. Assim, na presena da me (e da av
materna) os filhos tendem a manifestar uma conduta mais imatura marcada pelas dificuldades
de separao, no observada na relao com o pai. O Tom e a Isabel parecem ter introjectado
a depresso materna atravs da interaco precoce com esta figura experienciando
dificuldades de separao e autonomizao do espao materno face falha de
confirmao/valorizao narcsica, receando a perda do amor do objecto. Ainda assim, ambos
os pais parecem sentir-se culpabilizados pelo forte envolvimento no mundo laboral e pela
projeco nos filhos das suas prprias dificuldades: no caso do pai, relacionadas com o fraco
desempenho escolar e, no caso da me, associadas aos prprios medos e ansiedade, inibio e
isolamento social na infncia e conscincia da precariedade da funo continente. A forte
rivalidade fraterna e o sentimento de inferioridade face irm no Tom podem ligar-se ao
sentimento de abandono experienciado durante a situao de prematuridade da Isabel e a
projeco da distino forte/fraco pelos pais, onde o Tom representa a parte fraca, passiva,
sem recursos para se defender e a irm o lado mais forte, capaz de se defender (provavelmente
tambm foi mais apoiada e protegida pelos pais devido prematuridade).
Aparentemente o Tom no ultrapassou o conflito edipiano pois ainda que expresse o
desejo de separao da figura materna regista-se uma relao dependente, idealizada e pouco
frustrante com esta figura marcada por uma vivncia carencial, desprotegida e de precariedade
dos suportes com culpabilidade onde a agressividade dirigida a si, remetendo para a falha
narcsica e angstia depressiva, dificultando o processo de separao/individuao. Esta
dificuldade de crescer encontra-se tambm implcita no sintoma de encoprese que simboliza a
problemtica de guardar e reter o imago materno e simultaneamente agredi-lo e autonomizarse. Posto isto, o Tom parece apresentar um ncleo depressivo primrio (anal) (Ferreira,
2002), o que contraria os resultados obtidos no CDI que indicam um nvel intermdio de
depresso e, portanto, no classificado no grupo de sujeitos deprimidos e no grupo de sujeitos
no deprimidos (pode explicar-se pela aco dos mecanismos de defesa durante o teste).
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A Isabel encontra-se ao nvel da relao dual com a figura materna, no permitindo a


separao emocional desta figura. Aparenta dificuldades no acesso diferenciao sexual e de
geraes. Estas tendncias traduzem o no estabelecimento do projecto identificatrio e,
assim, a no elaborao do conflito edipiano. A vivncia depressiva manifesta-se atravs do
sentimento de desproteco parental, de carncia oral e inibio da agressividade resultando
no sentimento de culpabilizao pela introjeco da agressividade. Assim, parece organizar-se
atravs do ncleo depressivo precoce (oral) (Ferreira, 2002), o que contraria o resultado
apurado no CDI que a situa no grupo de sujeitos no deprimidos. Este resultado pode ser
explicado atravs de uma forte defesa face ao instrumento durante a sua realizao.
2. Sntese do Estudo de Caso 3 Joo (9 anos e 6 meses)

O Joo (Anexo O) frequenta o 4 Ano do 1 Ciclo do Ensino Bsico. Trata-se de uma


criana com idade aparente coincidente com a idade real. Apresenta um aspecto cuidado e
investido, uma conduta frgil, ansiosa, insegura, perfeccionista, hipermatura e um olhar triste,
evitando, por vezes, manter contacto ocular. Todavia, estabelece um bom contacto,
verbalizando com fluncia e espontaneidade, ainda que sobressaia a necessidade de preencher
o espao, o vazio sentido no silncio e no branco das folhas de desenho. Utiliza um
vocabulrio muito rico, denotando um bom nvel cognitivo. Durante a passagem das provas
revelou alguma confuso e lentificao do pensamento. Com o evoluir das sesses apresentou
um comportamento mais agitado, pouco controlado e disperso, revelando-se, por vezes,
cansado. Observou-se ansiedade de separao face aos pais. Contra-transferencialmente senti
uma angstia muito forte no Joo, senti-o muito triste e em desassossego permanente.
A pedido da professora o Joo foi encaminhado pelo mdico de famlia do Centro de
Sade Unidade de Pedopsiquiatria com queixas de hiperactividade, dfice de ateno,
dificuldades escolares e baixa auto-estima. acompanhado em consultas teraputicas de
psicologia de frequncia quinzenal h cerca de oito meses, beneficiando, ainda, de
interveno familiar com os pais. Quinze dias antes do incio da recolha de dados foi
medicado com Concerta 18mg Comprimidos parando a medicao dois meses e meio depois.
O Joo vive com a irm de cinco anos e com os pais, ambos fisioterapeutas e com
Mestrado na rea (a me encontra-se a realizar o Doutoramento e trabalha num hospital
peditrico. O pai professor universitrio). Foi diagnosticada depresso tia paterna do Joo
e aparentemente a me tem dislexia, segundo a prpria.
Para a me as preocupaes com a conduta do Joo iniciaram-se por volta dos trs
anos, com a entrada no jardim-de-infncia. Na altura, a educadora alertou os pais sobre as
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dificuldades na articulao das palavras do Joo. Assim, acompanhado em terapia da fala


onde se conclui que se trata de uma dificuldade emocional, sendo encaminhando para uma
psicloga no privado. Esteve um ano e meio a ser acompanhado em psicoterapia semanal e,
para a me observou-se uma maior facilidade em expressar sentimentos: segundo a psicloga
ele tinha muitas capacidades. No entanto, desde cedo que mantm uma forte intolerncia
frustrao ele sempre foi assim, quando no capaz de fazer alguma coisa ou mnima
contrariedade guincha e chora. Ainda em beb fez uma endoscopia e j tinha ndulos nas
cordas vocais do esforo que fazia a guinchar indica a me. Nesta altura comearam tambm
as somatizaes: assim que entrava no jardim-de-infncia vomitava e a av levava-o de novo
para casa. Foram-lhe diagnosticados broncoespasmos, asma no alrgica e vrios problemas
de pele (estrfulos), sempre associados ao aumento de ansiedade. Recentemente a me
observou estereotipias faciais no Joo em situaes de maior ansiedade ou frustrao.
Para a me de h um tempo para c as capacidades tm vindo a baixar, apesar do
rendimento escolar se manter o Joo tem vindo a perder competncias, ele j foi bem melhor,
j escreveu melhor, j foi melhor a matemtica e agora tem de estar sentado com a professora
para fazer os trabalhos e chora, os cadernos esto cheios de buracos de ele chorar tanto.
Aparentemente estas dificuldades acentuaram-se no incio do 3 Ano foi um inferno. Era
chamada escola porque ele no faz sequer as tarefas mnimas nem com a professora ao lado,
chora assim que v o plano para o dia ou um problema no quadro, assim desde o 1 Ano,
mas agora pior. Sempre sofreu por antecipao e verbaliza vrias vezes que a soluo para
isto era a morte. Ao incio no liguei mas depois comecei a repreende-lo e a chatear-me com
ele quando dizia isto. O Joo costuma tambm lamentar no sou capaz porque que eu
vivo? e no consigo fazer as tarefas, a minha vida um inferno.
Na opinio da me o filho foi sempre hipermaturo, manifestando interesse e
preocupao por assuntos sociais comuns aos adultos j em pequeno se metia nas nossas
conversas. As pessoas amigas dizem que ele assim porque ns puxamos por ele e por isso
que to interessado mas, a minha filha recebe a mesma educao e no assim, muito
mais despreocupada, muito mais calma do que ele e adianta ainda: sinto que ele tem medo,
medo de no ser bom de no ser suficientemente bom e de nos desiludir. Em consulta com a
psicloga o Joo desabafa os meus pais so ptimos, comigo que so problemas, s vezes
fico triste, podia ser uma pessoa melhor, queria ser um bocado melhor e, ainda, os pais
dizem-me: melhor teres cuidado, no te lembras da ltima vez? Por favor hoje faz-nos sentir
bem. Penso que os meus pais vo ficar tristes ou no vo. Mas, no o suficiente para eu me
esforar. uma grande preocupao o 5 Ano, se eu no fizer nada irei chumbar o 5 Ano, vai
ser desconfortvel. Tambm no sei porque me distraio, mas no me compreendo.
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A professora assinala que o Joo um aluno que desde o primeiro ano de


escolaridade tem demonstrado um aproveitamento positivo mas aqum do seu potencial ()
por um lado, tem uma grande capacidade de auto-anlise e de compreenso dos seus intuitos e
aces mas, que por outro, demonstra uma grande imaturidade quando se depara com
situaes de frustrao. Na relao com os pares revela sentimentos de inferioridade e de
no-aceitao () uma criana com uma auto-estima frgil. O Joo revela que gozado
pelos colegas por chorar muito nas aulas. Para a professora premente que o Joo consiga
realizar os seus trabalhos no tempo estipulado para que nem a sua auto-estima, nem o seu
sucesso escolar fiquem comprometidos. Na sala de aulas apresenta dificuldade em estar
sentado e concentrado, distraindo-se com muita facilidade, ainda que sozinho, mas prximo
da professora e com os materiais reduzidos ao essencial. Em casa no pra quieto e no se
concentra nem um segundo, mesmo quando est a fazer uma coisa que gosta, indica a me.
A gravidez do Joo no foi planeada, embora muito desejada. Durante a gravidez a
me sentiu-se muito ansiosa. O Joo nasceu de parto eutcico, a termo. Aps o nascimento a
me sentia-se muito bem, era um beb com muitas competncias. Assim, a me recorda-o
no primeiro ano de vida como uma criana com elevada competncia motora, muito
observador e com muito interesse pelo meio, muito consciente mesmo do perigo, no se
magoa. Para o pai era muito curioso, activo, muito participativo com adultos. Facilmente
era o centro das atenes, causava espanto pelo seu interesse elevado para a mdia.
Aps o nascimento a me teve o apoio da av materna do Joo que cuidou do neto
enquanto a me estudava na faculdade. Ficou aos cuidados da av at ingressar no jardim-deinfncia aos trs anos. Os pais queixam-se que o Joo dormiu sempre pouco e que nunca tem
sono, ainda que, desde os oito anos durma nove horas dirias, acordando bem-disposto e com
energia. Nunca conseguiu dormir no jardim-de-infncia. No se registaram intercorrncias no
desenvolvimento psico-motor, lingustico e do controlo esfincteriano. Os pais queixam-se de
uma m alimentao. Nunca usou chucha nem levou nada boca.
A me do Joo pediu para ter acesso aos resultados no final da investigao e recusou
associar os sintomas descritos no consentimento informado ao Joo, alegando que os pais
consultaram o DSM-IV e os sintomas do filho inserem-se num diagnstico de hiperactividade
com dfice de ateno. Neste momento, estabeleceu um contacto reservado, desconfiado e
irritado, sem me olhar nos olhos. Com o evoluir da sesso este contacto tornou-se mais
disponvel e adequado. Utilizou um vocabulrio rico com termos tcnicos empregues na rea
da sade mental. O pai estabeleceu um contacto reservado. Senti-o inseguro, com o mesmo
olhar triste do Joo, sendo muito parecidos no aspecto fsico e no que me faziam experienciar
atravs da sua presena. Manifestou uma conduta agida ao longo da entrevista sobretudo
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enquanto a me falava. Ao contrrio da me que manteve pouco contacto ocular na entrevista,


o pai nunca estabeleceu contacto ocular comigo, olhando para o lado enquanto falava.
Na auto-estima da figura materna ainda que sobressaiam os afectos positivos observase a vivncia de culpabilizao na relao com o Joo. Projecta pulses agressivas sobre os
elementos da famlia recorrendo tambm defesa pela negao e idealizao das relaes
como forma de bloquear a expresso agressiva.
A auto-estima da figura paterna apresenta-se baixa, sendo marcada por sentimentos de
insegurana, inferioridade, irritabilidade, culpabilizao e dificuldades em lidar com os
problemas, colocando-se em hiptese um funcionamento depressivo. Observa-se um elevado
grau de neuroticismo no pai pela forte negao da expresso de agressividade sobre os
membros da famlia, recorrendo tambm idealizao.
O Joo exprime uma auto-estima baixa ligada a sentimentos de inferioridade,
pessimismo, insegurana, indeciso, auto-exigncia e culpabilizao. Percepciona-se como
uma figura dependente e carente da proteco/apoio/ateno parental, com poucos recursos
internos para se defender. Recorre a defesas manacas, ao evitamento, formao reactiva,
negao, racionalizao, intelectualizao, sobreinvestimento da realidade perceptiva e recusa
que permitem inibir o sofrimento depressivo e a expresso agressiva sobre os elementos da
famlia. Observa-se um grau acentuado de neuroticismo.
A relao conjugal experienciada pela me atravs da idealizao dos afectos
positivos emitidos e a vivncia de desvalorizao pelo pai. Destacam-se os conflitos na
relao de casal associados a um vivido de insegurana, dificuldades na gesto e resoluo
destes conflitos, na comunicao e na demonstrao de afectos dificuldades frente das
partes boas. O pai liga-se a uma figura passiva e a sentimentos de incompetncia/fraqueza
com dificuldades na adaptao social, em exprimir os seus sentimentos e pela insuficincia de
auxlio famlia. Por seu lado, o pai tende a idealizar os afectos positivos emitidos e a sentirse desvalorizado pela me. Assim, surgem conflitos na relao de casal associados ao
sentimento de insegurana e percepo da me como uma figura dominante e punitiva face
ao pai, podendo sentir-se inferiorizado e castrado, submetendo-se ao matriarcado familiar.
A relao me/Joo idealizada pela me, ainda que se culpabilize e denote a carncia
de afecto na relao. Alm dos afectos que traduzem uma forte ligao e dependncia materna
da parte do Joo, surgem afectos de rejeio associados ao desejo de transgresso do espao
materno. O Joo afigura-se como o elemento da famlia que carece de maior proteco dada a
elevada atribuio de sentimentos de incompetncia/fraqueza ligados a dificuldades em lidar
com as adversidades e na adaptao social. Por parte do Joo a me associa-se a uma figura
punitiva, autoritria e pouco disponvel para as suas necessidades afectivas.
39

Quanto relao pai/Joo destaca-se a percepo paterna de uma relao prxima e


idealizada, ainda que, culpabilizada e se observem dificuldades em lidar com os conflitos,
associando-se a uma figura autoritria e punitiva para o filho. O filho representado como
uma figura que valoriza e investe na relao com o pai, identificando-se com a figura paterna
no sentimento de incompetncia/fraqueza. O Joo percepciona uma relao pouco valorizada
e correspondida face aos seus desejos por parte do pai, representando-o de forma autoritria e
pouco disponvel. Ainda assim, parece assegurar uma funo de apoio importante para o Joo.
O pai surge como uma figura mais dependente que a me, beneficiando da proteco materna.
Na relao me/irm sobressai a percepo materna de idealizao da relao e um
forte envolvimento emocional. No entanto, os afectos negativos vivenciados podem remeter
para a necessidade de separao emocional do espao materno por parte da irm. O pai atribui
uma menor relevncia relao pai/irm. Contudo, percepciona afectos de cariz erotizado e
que exprimem dependncia afectiva na relao com a irm do Joo.
No mbito da relao fraterna sobressai para os pais a rivalidade do Joo embora,
apoie e proteja a irm. Por seu turno, o Joo percepciona uma relao prxima e afectuosa
marcada, todavia, por uma forte rivalidade fraterna e pelo sentimento de inferioridade face
irm, com quem disputa a proteco parental, sobretudo da figura materna.
A relao do Joo com outros familiares vivenciada pelos pais atravs de uma
atitude desafiante com os avs paternos e maternos e o tio materno surge como a figura
masculina de referncia para o Joo, embora no mantenham um contacto frequente.
Com a famlia de origem da me observa-se uma percepo muito distinta das suas
figuras parentais. Por um lado, a relao com o av materno reveste-se de um fraco
envolvimento emocional, ainda que idealizada quanto aos afectos positivos recebidos por
parte deste. E, por outro, uma relao muito prxima e dependente com a av materna, a qual,
transmite o desejo de prolongar a relao de dependncia com a me do Joo. No entanto,
uma relao conflituosa pelos sentimentos de rejeio e agressivos emitidos pela me,
remetendo para o desejo de separao e maior autonomia emocional desta relao sentida
como autoritria, pouco afectuosa, punitiva, insegura e depreciativa por parte da av materna
antes fazia comparao para os aspectos negativos.
A relao com a famlia de origem do pai percepcionada por este atravs do
sentimento de culpabilizao face autonomizao decorrente da sada de casa dos pais, o
que remete para dificuldades acentuadas no processo de separao/individuao na relao
com a av paterna, com quem mantinha uma relao de dependncia. Na relao com o av
paterno destaca-se uma relao autoritria, pouco afectuosa e assente na falha de valorizao

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narcsica no atingi o que o meu pai quis. Actualmente os avs paternos encontram-se em
processo de divrcio e o pai no est a lidar bem com esse facto.
Posto isto, na famlia assiste-se a uma relao prxima com uma figura materna flica,
dominante que contrasta com uma figura paterna passiva com afectos que transmitem a
vivncia de um sofrimento depressivo. Ambos os pais revelam uma fraca autonomizao
emocional das suas figuras parentais, transferindo para a relao com o Joo os modelos de
identificao interiorizados na relao com estas figuras assentes em relaes pouco
afectuosas, autoritrias, punitivas e inseguras, projectando, assim, as suas prprias falhas
narcsicas e a vivncia de culpa na relao com o Joo. Assim, verifica-se um forte
envolvimento parental nas questes de ordem racional valorizando a carreira profissional e as
competncias acadmicas do Joo em detrimento dos afectos, repercutindo-se no
empobrecimento da relao conjugal e na relao pais-filho. A ausncia de valorizao
narcsica do Joo por ambos os pais experienciada inconscientemente como uma falha, uma
castrao no lhe permitindo autonomizar-se emocionalmente da relao com o materno, com
risco de perda do amor do objecto. Este facto aliado identificao com um pai
aparentemente deprimido e tambm castrado pode reenviar para a angstia depressiva no
Joo. Torna-se importante mencionar a distino fraco/forte entre o Joo e a irm projectada
pelos pais, onde o Joo figura como o elemento fraco, inseguro, sem recursos internos para se
defender e a irm o elemento forte e seguro resultando na acentuada vivncia de rivalidade
fraterna e inferioridade no Joo.
Aparentemente o conflito edipiano no se encontra completamente ultrapassado no
Joo. Apesar de realizar uma diferenciao adequada dos sexos, papis parentais e geraes, a
integrao do Superego e demonstrar uma identificao figura paterna e, por vezes,
projectar o desejo de autonomizao da figura materna atravs da agressividade que lhe
dirigida, rivaliza com o pai e demonstra dificuldades na elaborao dos sentimentos de
solido face excluso do casal parental. Este facto aliado ausncia de valorizao narcsica
por ambos os pais e identificao figura paterna deprimida resulta num vivido de castrao e
falhas identitrias onde sobressai o sofrimento depressivo marcado pela angstia de perda do
amor do objecto, de desamparo, afectos ligados morte, baixa auto-estima, insegurana, falha
narcsica acentuada, culpabilidade atravs da introjeco da agressividade e dificuldades de
mentalizao (instabilidade psicomotora, somatizaes). Neste contexto, parece afigurar-se
uma depresso flica (Ferreira, 2002), o que contrasta com o resultado obtido no CDI que
associa o Joo ao nvel intermdio de depresso, no passvel de classificao como caso
depressivo e caso no depressivo, o que pode remeter para a aco de mecanismos
defensivos durante o teste.
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3. Sntese do Estudo de Caso 4 Mariana (9 anos e 9 meses)

A Mariana (Anexo P) encontra-se no 4 Ano do 1 Ciclo do Ensino Bsico. Apresenta


um desenvolvimento estato-ponderal adequado idade e um aspecto fsico cuidado.
Estabeleceu um contacto demasiado fcil e sedutor marcado por uma necessidade acentuada
de agradar. Muito comunicativa e expressiva, verbalizou espontaneamente e manteve contacto
ocular, aparentando um olhar triste ainda, que, vido. Revelou uma auto-estima baixa,
insegura, ansiedade de separao de ambos os pais, a necessidade de ateno, apoio, cuidado
e afecto constantes. Manifestou, por vezes, um comportamento agitado. Transparece uma
conduta imatura para a idade pelos risos frequentes e a utilizao de linguagem tpica de beb.
Na sequncia de um ano de interveno psicolgica no Centro de Sade sem
resultados aparentes foi encaminhada para a Unidade de Pedopsiquiatria pelo Mdico de
Famlia com queixas de dificuldades de concentrao e aprendizagem na escola.
Beneficia de consultas teraputicas de frequncia quinzenal em psicologia h sete
meses e de interveno familiar junto dos pais em pedopsiquiatria. Desde h cerca de nove
meses que a Mariana toma Risperdal soluo oral. Aps a interrupo da medicao no
Vero a me pede novamente a medicao para a filha por senti-la muito agitada.
A Mariana vive com os pais e o irmo de dezassete anos. A me tornou-se proprietria
de um caf h cerca de um ano com a sogra tenho muito mais tempo agora para estar com ela
(Mariana), refere. Contudo, desde esse momento que se sente muito nervosa, tendo
dificuldades em dormir (pede para ser acompanhada em consultas de psicologia/psiquiatria e
medicada com o antidepressivo Triticum AC). A av materna da Mariana faleceu com
Alzheimer h trs anos e a tia materna suicidou-se quando a Mariana tinha oito/nove meses. O
pai viveu em Frana dos cinco aos oito anos da filha, culpabilizando-se por esta ausncia. A
me tem por hbito dormir no sof da sala enquanto o pai dorme na cama do casal.
A me descreve a Mariana como uma criana muito socivel que se d bem com todas
as pessoas, fazendo amigos com facilidade. No entanto, compara o Joaquim (irmo) muito
diferente da Mariana, sempre foi muito mais calmo e organizado. Sempre gostou de ter o
quarto arrumado, mesmo quando os amigos iam brincar l a casa. A me sente que a filha
rivaliza muito com o irmo pela sua ateno. Faz birras, pede muito mimo e tenta sempre
agradar aos outros culpabilizando-se tambm com frequncia. Para a me em casa a Mariana
muito mais calma que na escola, acatando as regras.
Aos seis anos inicia a escola primria e segundo a professora do 2 Ano a Mariana
uma criana meiga mas com um excesso de actividade motriz () levanta-se (), mexe-se
constantemente na cadeira, senta-se sobre um p. Quando est sentada correctamente os ps
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so como um pndulo. Interrompe os colegas que tem volta. Durante as explicaes parece
no ouvir () comete erros nos exerccios por falta de ateno () no consegue acabar as
coisas que comea, o seu trabalho escolar fraco, sujo e confuso. Considera que a
dificuldade em realizar as actividades escolares da Mariana no se deve falta de capacidades
mas sim, de concentrao e ateno no consegue concentrar-se ou estar atenta durante
muito tempo, parece desorientada, desmotivada. Por alterao de residncia a Mariana
ingressou noutra escola no 3 Ano mantendo a conduta distrada e irrequieta, sendo retirada
das actividades extra-curriculares para ter mais tempo para estudar, passando a ficar com a
me todas as tardes a insistir para que faa os trabalhos-de-casa. No entanto, a me refere que
no ano passado era pior porque a professora escrevia muitos recados na caderneta e a
Mariana ficava muito triste e nervosa com isso. No 4 Ano a Mariana mantm as
dificuldades de aprendizagem devido falta de concentrao/ateno e uma auto-confiana
baixa, levando-a a no participar nas aulas, mesmo quando solicitada, refere a professora.
A gravidez da Mariana foi planeada. Nasceu de parto eutcico, a termo, sem
complicaes peri ou neonatais. A me recorda-a como uma beb muito amorosa e nada
rabugenta, no chorava muito. Em beb dormia bem, contudo actualmente, tem um sono
muito agitado e fala durante o sono. Adormece sem dificuldades e acorda bem-disposta.
Comeou a dormir sozinha aos dois anos. No se registaram intercorrncias no
desenvolvimento psicomotor, lingustico e no controlo esfincteriano. Quando deixou de ser
amamentada e iniciou a diversificao alimentar comeou a demonstrar pouco apetite come
de tudo mas faz grandes birras mesa, fica duas horas sentada a comer. Na escola chegam a
ter de lhe dar a comida boca para ela se despachar, indica a me. A Mariana ficou com a
me at aos trs meses de idade, sendo entregue aos cuidados de uma ama at ingressar na
creche aos trs anos e posteriormente na pr-primria, havendo sempre relatos de que era uma
criana muito mexida embora no mal-educada nem agressiva, sempre foi muito meiga.
A me apresenta um aspecto fsico envelhecido para a sua idade, a face encontra-se
um pouco estragada. Colaborou com interesse no estudo. Estabeleceu contacto ocular,
evidenciando-se um olhar triste e uma expresso abatida e cansada. Tambm no pai a face
encontra-se um pouco envelhecida para a idade. Inicialmente estabeleceu um contacto mais
reservado, tornando-se mais descontrado no decorrer da sesso. Mantm contacto ocular.
A auto-estima da figura materna apresenta-se baixa e dominada por sentimentos de
inferioridade, culpabilizao e irritabilidade. Sente dificuldades na resoluo dos conflitos e
surge como um dos elementos mais dependentes e que carece de maior proteco. Observa-se
um grau elevado de neuroticismo marcado pela negao dos afectos negativos, inibindo,
assim, a expresso agressiva sobre os elementos da famlia mas, tambm, dos afectos
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erotizados traduzindo uma diminuda disponibilidade emocional, optando por alhear-se do


contacto com os outros devido ao sentimento de insegurana e desconfiana face aos
elementos da famlia. A conduta observada durante a realizao do TRF marcada por choro
intenso durante praticamente toda a prova, os comentrios depreciativos sobre a sua condio
e diminuda disponibilidade para a partilha de afectos com os elementos da famlia aliados
solicitao para ser acompanhada em psicologia/psiquiatria e a medicao com o
antidepressivo podem associar-se a um funcionamento depressivo.
A auto-estima da figura paterna apresenta-se positiva, ainda que se culpabilize face
percepo de uma diminuda disponibilidade e apoio famlia. Apresenta um elevado grau de
neuroticismo associado defesa pela negao/recusa dos afectos negativos e idealizao das
relaes bloqueando, assim, a expresso de agressividade sobre os elementos da famlia.
A auto-estima da Mariana apresenta-se baixa, com sentimentos de inferioridade e
culpabilizao. Sobressai uma tendncia regressiva marcada por uma atitude egocntrica e
dependente, procurando valorizar-se atravs do forte desejo de proteco materna e de
ateno por parte de ambos os pais, reenviando para uma falha narcsica acentuada por esta
proteco nem sempre ser satisfeita podendo associar-se a uma dbil resposta de uma me
deprimida. Observa-se um grau considervel de neuroticismo no funcionamento psquico da
Mariana pelo recurso a defesas como a idealizao, recusa manaca, negao, evitamento,
formao reactiva e recusa que permitem reprimir as pulses agressivas dirigidas aos
elementos da famlia e a mentalizao do sofrimento depressivo.
Na relao conjugal a me culpabiliza-se pela agressividade dirigida ao pai sentindose, ainda, bastante desvalorizada e pouco correspondida face aos seus sentimentos e
necessidades pela dificuldade na resoluo dos problemas, falta de confiana na relao, falta
de compreenso e apoio do pai, verificando-se, tambm, uma tendncia paranide no
funcionamento psicolgico da me ainda que se sinta dependente do pai. Por seu lado, o pai
tende a idealizar a relao. Contudo, percepciona a me como uma figura punitiva, com
irritabilidade emocional e com dificuldades em lidar com os conflitos, resultando em
insegurana na relao de casal. A me associada a uma figura fortemente dependente e a
que mais carece de proteco, transparecendo uma fragilidade emocional elevada.
A relao me/Mariana representada pela me de forma idealizada e prxima,
transmitindo a ideia de que a filha estabelece uma forte dependncia emocional consigo. A
me aparenta sentir-se culpabilizada, sente que no tem pacincia e est doente. A Mariana
surge como uma das figuras mais dependentes e que carecem de maior proteco na famlia.
Para a Mariana sobressai uma vivncia de culpa, carncia, abandono, insegurana, aspectos
fbicos e agressivos num contexto regressivo que pode remeter para a relao pr-genital com
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o materno. Esta vivncia associa-se a uma falha narcsica acentuada e angstia depressiva.
A me , ainda, sentida como uma figura dependente com quem rivaliza pela ateno do pai.
O pai idealiza a relao pai/Mariana e percepciona uma atitude sedutora e de
rivalidade pela sua ateno na filha: ela no pode ver o pai a agarrar-se a ningum.
Seguindo-se me, a Mariana sentida como uma figura emocionalmente dependente,
carecendo de proteco. Para a Mariana a relao com o pai idealizada e dominada por
afectos erotizados. O pai a figura que assegura a funo de apoio e proteco, todavia, no
proporciona a conteno necessria para que as angstias da Mariana sejam ultrapassadas.
Sente a relao menos valorizada por parte do pai, percepcionando-o como uma figura
punitiva e pouco disponvel, considerando o seu desejo de ateno.
A me percepciona a relao me/irmo de forma idealizada, prxima e carinhosa.
Todavia, sente a relao menos valorizada por parte do irmo. A me sente-se culpabilizada e
associa ao irmo dificuldades na adaptao social e na gesto dos conflitos com os outros
caracterizando-o, ainda, como preguioso. A relao pai/irmo idealizada pelo pai
semelhana do observado na interaco com as restantes figuras. Surge como um dos
elementos mais dependentes e que necessita de maior proteco.
A relao fraterna percepcionada pelos pais de forma afectiva contudo, marcada pela
rivalidade fraterna por parte da Mariana. Na percepo da Mariana destaca-se uma forte
rivalidade fraterna intensificada pela vivncia carencial na relao com o materno e pelo
desejo de uma aproximao exclusiva a esta figura.
A relao da Mariana com outros familiares ou adultos percepcionada pelos pais
atravs de uma conduta carente e marcada pela necessidade de agradar e de ateno constante.
Por seu lado, a Mariana tende a idealizar as relaes destacando-se a tia e av paternas
sentidas como figuras afectuosas embora, tambm punitivas. A av percepcionada, ainda,
como uma figura dependente, com quem a Mariana rivaliza pela ateno do pai.
A relao com a famlia de origem materna, nomeadamente com o av materno
experienciada pela me de forma prxima, carinhosa e correspondida. O av materno
percepcionado como uma figura que mantm uma dependncia emocional face me,
necessitando da sua proteco. Contudo, a me parece sentir-se culpabilizada nesta relao.
Na relao com o tio materno a me sente-se desvalorizada.
A relao com a famlia de origem paterna, designadamente com a av paterna
sentida pela me de forma menos valorizada por parte da av, associando-lhe tendncias
punitivas, ainda que se sinta apoiada por esta figura. Surge como um dos elementos da famlia
mais dependentes e que necessitam de maior proteco. Na percepo da relao do pai com a
av paterna transparece a idealizao, sentido esta figura como punitiva ainda que
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emocionalmente dependente do pai. A relao com a tia paterna tambm idealizada, todavia
a menos significativa do ponto de vista do envolvimento emocional, associando sentimentos
de fraqueza/incompetncia a esta figura.
Posto isto, sobressai na famlia a problemtica da depresso materna que tende a
afectar a qualidade das relaes familiares, com nfase na relao conjugal e na relao
me/Mariana. Assim, numa fase precoce do desenvolvimento a Mariana parece ter-se
identificado depresso da me atravs da falha de confirmao narcsica primria que a
fizesse sentir valorizada na experincia de individuao e autonomia, pelo risco de perda do
amor do objecto organizando, deste modo, o falso-self manifesto atravs da avidez relacional,
contacto fcil e sedutor e pela necessidade marcada de agradar, como tentativa de colmatar a
falha narcsica. A me realiza, ainda, uma distino importante entre a Mariana e o irmo,
projectando a parte boa no irmo e a parte maligna na Mariana, o que permite acentuar o
sentimento de insegurana, culpa, carncia, abandono e rivalidade fraterna na Mariana. Ainda
que o pai surja como a figura que assegura a funo de apoio e proteco no proporciona a
conteno necessria para que as angstias da Mariana sejam ultrapassadas. Outros factores
como as sucessivas ausncias do pai por motivos de trabalho resultando num menor apoio
famlia e, em concreto, me da Mariana e no assegurar da sua funo parental, o falecimento
da av e tia maternas da Mariana e as dificuldades econmicas ligadas ao desemprego do pai
contribuem para acentuar o sofrimento depressivo na me e na Mariana.
Verifica-se uma forte angstia depressiva na Mariana marcada pela carncia afectiva e
falha narcsica acentuadas, sentimento de desvalorizao, insegurana, excluso, abandono e
desproteco na relao com as figuras parentais, sobretudo na relao com a figura materna
onde se observam aspectos fbicos e agressivos num contexto regressivo, acompanhado de
culpabilidade pelo retorno da agressividade/punio sobre si. Quanto ao conflito edipiano,
ainda que, expresse o desejo de autonomizao a Mariana parece encontrar-se, ainda, ao nvel
da relao dual, rivalizando com o pai e demonstrando dificuldades de separao na relao
com o materno pelo desejo de uma aproximao exclusiva a esta figura no renunciando,
assim, relao com o primeiro objecto. A Mariana parece organizar-se segundo o ncleo
depressivo precoce (oral) (Ferreira, 2002). Estes resultados contrastam com o resultado
apurado no CDI que remete para um nvel intermdio de sintomas depressivos, logo, no
passveis de classificar como caso depressivo e caso no depressivo, o que pode ser
explicado pela aco dos mecanismos de defesa.

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4. Sntese do Estudo de Caso 5 Gabriel (10 anos e 4 meses)

O Gabriel (Anexo Q) frequenta o 4 Ano do 1 Ciclo do Ensino Bsico. Apresenta um


desenvolvimento estato-ponderal adaptado ao seu grupo etrio. uma criana bonita e
harmnica, com aspecto fsico cuidado, investido e limpo. Estabelece um contacto inibido
revelando sentir-se mais vontade no decorrer das sesses, dialogando com espontaneidade.
Mantm um comportamento estvel e controlado e evidencia a necessidade de ser cuidado.
Atravs da consulta hospitalar de pneumologia peditrica (tem asma e rinite) foi
encaminhado para a Unidade de Pedopsiquiatria por dificuldades alimentares com anorexia
selectiva. Iniciou as consultas teraputicas de frequncia quinzenal com a psicloga da
Unidade h cerca de dois meses, beneficiando tambm de interveno familiar.
O Gabriel vive com os pais e com o meio-irmo (da parte da me) de dezoito anos. O
pai carpinteiro e a me assistente administrativa. Ambos os pais so ex-toxicodependentes
tendo-se conhecido num programa de desintoxicao que frequentaram. A me deixou de
consumir pelo meio-irmo do Gabriel quando este tinha cinco anos e cortou a ligao que
mantinha com o ex-companheiro e pai do meio-irmo do Gabriel, tambm na altura
toxicodependente, conhecendo o actual companheiro. At ao momento o Gabriel desconhece
o passado toxicodependente dos pais. Segundo a psicloga o meio-irmo do Gabriel muito
problemtico, isolando-se e a me culpabiliza-se por esta conduta devido ao seu afastamento e
consumos de droga durante a infncia do filho. Desta forma, desenvolveu uma forte ligao
com o Gabriel na tentativa de compensar e reparar a relao com o filho mais velho. A me
tem Hepatite C e, segundo a prpria, teve anorexia nervosa por volta dos vinte anos. O av
paterno faleceu quando o pai tinha sete anos.
Em beb o Gabriel no foi amamentado, no registando problemas alimentares at
data em que iniciou a diversificao alimentar. Nessa altura recusava tudo o que no fosse
esmagado s comia o que fosse passado pela varinha mgica, conta a me. Tambm no
comia carne, peixe ou ovos, apenas aceitava sopa passada, papa, iogurtes Danoninho e fruta
s dos boies. Segundo a me os mdicos sempre desvalorizaram esta caracterstica do
Gabriel, mas ele nunca queria provar nada e acrescenta que o Gabriel registou sempre uma
boa evoluo ponderal porque compensou com a sopa. Desenvolveu hipoglicmias e teve
gastroenterites. Aos quatro anos deixou o bibero e at aos cinco anos andava com trs
chupetas em cada mo foi muito difcil de o convencer a desistir delas, refere a me. Pelos
cinco/seis anos comeou a aceitar batatas de pacote e carne, mas nunca comeu arroz e
esparguete. Aceita certos tipos de peixe cozido/grelhado, ovo mexido, come sempre sopa e
po. No come fruta. Bebe Ice Tea ou Coca-Cola. No come chocolates, bolos e gelados.
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Gosta de chupa-chupas de coca-cola e de gomas, mas algumas coloca-as apenas na boca sem
as engolir. Para a me sempre que insistimos um circo em casa ele chora, berra, grita, nem
sequer prova e o Gabriel acrescenta de imediato no provo porque sei que no bom.
No come na escola porque no gosta da comida. Quando vai a festas de aniversrio
leva o prprio lanche e nas situaes em que janta em casa de amigos fazem-lhe uma comida
especial. Recusa-se a ir para qualquer lado onde saiba que tem que comer fora de casa ou
comida diferente na escola gozam comigo, sou o menino da sopa passada, refere o Gabriel.
A gravidez do Gabriel foi planeada e o parto eutcico, a termo, sem registo de
complicaes peri ou neonatais. Aps o nascimento a me sentiu-se bem mas por volta dos
dois meses senti um aumento de stress e preocupao devido s faltas de ar do Gabriel. A
me recorda o filho como um beb bem-disposto, muito dorminhoco. Segundo a me, o
Gabriel sempre dormiu bem apesar de at aos sete anos adormecer na cama dos pais e s
depois ia para a prpria cama. Ainda hoje, pede ao pai para o colocar na cama com a me
quando se levantar. O desenvolvimento psicomotor e o controlo esfincteriano ocorreram
dentro dos parmetros normais. Ao nvel lingustico substitui as consoantes b por p at
actualidade. O Gabriel ficou ao cuidado da av paterna at ingressar no infantrio aos cinco
anos, registando uma boa adaptao at ao momento em que recusa alimentar-se na escola:
foi um caos, dava-se mal com os colegas, roubavam-lhe o lanche. Sempre foi muito
irrequieto, tem que ficar sentado ao p da professora. muito reguila, mas muito bom
aluno indica a me, acrescentando tambm que o Gabriel apesar de no bater nos colegas
provoca-os, acabando por chegar todo negro a casa. Ele quer tudo maneira dele. Segundo
a me o Gabriel faz birras quando contrariado, respondendo mal muito nervoso. A me
ajuda-o a estudar eu estudo sempre com a minha me, digo que estou cansado mas acabo por
estudar. Eu no consigo estudar sozinho, estudo mal, estou entretido com outras coisas. Ela
acha que melhor eu estudar com ela para no ter ms notas, refere o Gabriel.
A me do Gabriel apresenta um aspecto fsico jovial face sua idade, harmnica,
bonita e aparenta uma atitude descontrada e simptica. Estabelece um contacto adequado e
verbaliza de forma fluente e espontnea. Manteve contacto ocular, apresentando uma postura
muito rica e expressiva. O pai do Gabriel apresenta um aspecto fsico cuidado e adaptado
idade. Estabelece um contacto adequado verbalizando de modo espontneo e fluente,
transmitindo simpatia. Apresenta uma postura rica e expressiva, mantendo contacto ocular.
A auto-estima da figura materna apresenta-se baixa e dominada por sentimentos de
inferioridade, culpabilizao e irritabilidade emocional. Recorre defesa pela negao dos
afectos negativos inibindo, assim, a expresso agressiva sobre os elementos da famlia.
Revela, ainda, uma percepo negativa e insegura sobre a famlia.
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A auto-estima da figura paterna apresenta-se baixa e dominada por sentimentos de


inferioridade, culpabilizao, irritabilidade emocional e desajustamento social. A par do
Gabriel surge como uma das figuras mais dependentes e que carece de maior proteco na
famlia ainda, assim, exprime o desejo de obter uma maior autonomia emocional. Utiliza
defesas na linha da negao dos afectos negativos inibindo, assim, a projeco da
agressividade dirigida aos elementos da famlia.
A auto-estima do Gabriel apresenta-se baixa, com sentimentos de tristeza e culpa,
sendo marcada por uma atitude egocntrica e regressiva pelo desejo acentuado de proteco
materna e de ateno por parte de ambos os pais. Observa-se um elevado grau de
neuroticismo no Gabriel pelo recurso a defesas como a negao, recalcamento, evitamento,
formao reactiva, idealizao e recusa manaca, reprimindo, assim, a agressividade dirigida
aos elementos da famlia e a vivncia depressiva.
Na relao conjugal sobressai a percepo materna de um maior investimento afectivo
na relao por parte do pai, ainda que se observem conflitos e insegurana na relao de casal
em parte, motivados por dificuldades na gesto dos conflitos e no controlo dos impulsos
agressivos por parte da me. Sente que a famlia obedece a um matriarcado familiar
semelhana da sua famlia de origem: ele manda l em casa mas quem manda mais sou eu.
Na relao com a me o pai sente-se pouco valorizado. Apesar da percepo de uma relao
prxima e carinhosa, observam-se conflitos na relao de casal associados dificuldade na
sua gesto e irritabilidade emocional em ambas as figuras, sendo a me percepcionada como
uma figura punitiva e carente de proteco.
A relao me/Gabriel representada pela me de forma satisfatria e correspondida,
ainda que se culpabilize talvez o tenha impedido de crescer. Observa-se a percepo de uma
forte dependncia emocional entre me e filho e o desejo de lhe proporcionar proteco em
certas coisas no cortou o cordo umbilical, ele queria-se manter beb. Para o Gabriel a
relao idealizada, pouco frustrante e percepcionada como fortemente investida por parte da
figura materna, podendo associar-se ao desejo de manter a dependncia emocional com o
Gabriel. Ainda assim, a me sentida como punitiva e a figura dominante na famlia. O
Gabriel rivaliza com esta pela ateno/proteco do pai.
O pai idealizada a relao pai/Gabriel, contudo, culpabiliza-se e percepciona um forte
investimento por parte do Gabriel podendo constituir-se como o modelo de identificao
sexual masculino para o filho. O Gabriel liga-se a uma das figuras mais dependentes e que
carece de maior proteco na famlia. O Gabriel idealiza a relao e realiza um forte
investimento positivo, ainda que no se sinta correspondido, sentindo-se pouco valorizado

49

pela figura paterna que simultaneamente percepcionada como punitiva. Ainda assim, o pai
parece constituir-se como uma figura protectora e o modelo de identificao do Gabriel.
Quanto relao me/irmo sentida pela me como fortemente desvalorizada e
insegura atravs da percepo de falta de apoio, uma atitude punitiva e agressiva por parte do
irmo, sendo marcada por conflitos acentuados associados a uma dificuldade na sua gesto
por ambas as partes, com irritabilidade emocional no irmo e dificuldade no controlo dos
impulsos agressivos por parte da me. A relao pai/irmo sentida pelo pai como
correspondida e satisfatria, apesar de sentir que esta figura deveria prestar mais apoio e
proteco famlia.
Na relao fraterna sobressai para os pais a rivalidade. Desvalorizam o irmo,
sentindo-o provocativo e pouco tolerante para o Gabriel. O Gabriel sente-se desvalorizado por
parte do irmo, rivalizando com este face ao desejo de ocupar um lugar prximo e
privilegiado na relao com a figura materna, obtendo a sua proteco exclusiva.
Quanto relao do Gabriel com outros familiares para os pais a av paterna uma
segunda me mantendo uma relao muito prxima, assim como, com o tio paterno de 40
anos. Como os avs maternos no lhe fazem todas as vontades gosta de estar com eles na
quantidade certa.
No mbito da famlia de origem da me sobressai a percepo de uma relao com a
av materna marcada por um forte envolvimento emocional positivo correspondido com
sentimento de dependncia mtua, idealizao da relao e desejo de proteco desta figura.
A relao com o av materno sentida de forma desvalorizada com conflitos associados a
sentimentos de insegurana, falta de apoio e punio dirigidos me, ainda assim, so
percepcionadas dificuldades na gesto destes conflitos e no controlo dos impulsos agressivos
por parte da me. A relao com a tia materna tambm sentida como desvalorizada por parte
desta figura. Observam-se conflitos relativos dificuldade na sua gesto por ambas as partes
manifesta atravs de irritabilidade emocional, dificuldades de adaptao social e uma atitude
punitiva na tia paterna, assim como, dificuldade no controlo dos impulsos agressivos na me,
podendo remeter para rivalidade fraterna.
Na relao com a famlia de origem do pai sobressai a vivncia de uma relao com a
av paterna negativa, insegura e conflituosa, sentindo-se desvalorizado e pouco
apoiado/protegido por esta figura. Com o tio paterno de 40 anos a relao percepcionada de
forma satisfatria. Ainda assim, o pai sente dificuldades na gesto dos conflitos por parte
desta figura e um conflito na relao que pode associar-se rivalidade fraterna.
Posto isto, sobressai uma organizao familiar onde as figuras parentais apresentam
conflitos acentuados na ordem da dependncia e falhas de valorizao narcsica na relao
50

com as suas famlias de origem, culminando nos consumos de droga como um substituto
simblico do objecto de amor perdido. A me surge como uma figura dominadora e flica,
identificando-se ao matriarcado da sua famlia de origem contrastando com uma figura
paterna submetida ao matriarcado familiar demitido-se da sua funo parental, o que aliado ao
deslocamento e tentativa de reparao da relao com o irmo do Gabriel por parte da me
resulta numa relao dependente, idealizada e pouco frustrante com o Gabriel, no o
valorizando narcisicamente. Assim, o Gabriel experiencia a separao do imago materno
como uma possibilidade de perda do amor do objecto, permanecendo dependente do poder
flico materno. A clivagem entre um filho bom associado ao Gabriel e um filho problemtico
ligado ao irmo permite acentuar a forte relao de dependncia na relao me/Gabriel.
Apesar de o Gabriel manifestar o desejo de autonomizao da figura materna,
sobressai a representao do desejo de uma aproximao exclusiva a esta figura e a rivalidade
face figura paterna, o que permite auferir dificuldades na resoluo do conflito edipiano e no
processo de separao/individuao. A instncia superegica parece integrada e a
agressividade projectada , em seguida, recalcada de forma a controlar a sua expresso,
desencadeando tambm culpabilidade pelo retorno da agressividade sobre si. Observa-se uma
falha narcsica marcada, uma vivncia carencial e desprotegida, de abandono e solido face ao
confronto com a angstia de separao e depressiva recorrendo s defesas antidepressivas na
linha da recusa manaca haver sol (PN) para lidar com este conflito. Deste modo, parece
afigurar-se uma depresso primria (anal) (Ferreira, 2002) contrariando os resultados obtidos
no CDI que situavam o Gabriel no grupo intermdio de sintomas depressivos e, assim, no
enquadrado como caso deprimido e caso no deprimido. Coloca-se em hiptese a
interferncia de mecanismos de defesa como a negao durante a realizao deste
instrumento.

51

DISCUSSO

A compreenso da criana enquanto ser activo e dinmico inserido em determinados


contextos de desenvolvimento com os quais interage influenciando e sendo influenciado
progressivamente defendida pelo Modelo Bio-Ecolgico do Desenvolvimento Humano de
Bronfenbrenner e Morris (2006) coloca em nfase a considerao de mltiplas dimenses na
anlise da problemtica de um indivduo. Neste sentido, destaca-se a importncia do contexto
familiar no mbito do desenvolvimento psicolgico da criana (Schaffer, 1996). Como
assinala Joo dos Santos (2007) para compreender os desvios do comportamento torna-se
necessrio compreender os problemas resultantes do sistema de relaes entre a me, o pai e a
criana. Foi a este propsito que se pretendeu dar resposta na presente investigao relativa
percepo das relaes familiares em crianas diagnosticadas com depresso, na me e no pai.
Na anlise que se segue ter-se- em conta os dados da tabela de resultados (Anexo R).
Nesta investigao participaram cinco crianas com diagnstico de depresso e as
respectivas figuras parentais. Trs crianas pertencem ao sexo masculino e duas ao sexo
feminino, com idades compreendidas entre os 7 e os 10 anos. Com excepo da menina mais
nova que frequenta o 1 Ano de escolaridade todas as outras crianas frequentam o 4 Ano do
1 Ciclo do Ensino Bsico, sem registo de reprovaes nos anos anteriores.
Na anlise do contacto destas crianas sobressaem dois tipos de condutas distintas: a
primeira marcada pela inibio, comportamento estvel, controlado e concentrado,
manifestando uma maior disponibilidade para a relao e verbalizao com o evoluir das
sesses; a segunda remete para uma conduta agitada, pouco controlada e dispersa,
transmitindo maior expressividade e um discurso fluente e espontneo. Neste ltimo grupo
observa-se uma maior expresso de afectos ligados depresso como a insegurana,
fragilidade, necessidade de ser cuidado, de ateno, apoio, de agradar, de preencher o vazio
(falha narcsica), contacto sedutor e ansiedade (de separao). Todavia, ao contrrio do que
defende Palacio-Espasa (2004) neste estudo no se observou uma associao entre uma menor
idade da criana e a manifestao de inibio. Com excepo de uma criana, o Gabriel, em
todas as outras sobressai a presena de um olhar triste, afigurando-se como o trao mais
comum entre os casos avaliados. Por vezes, o contacto ocular evitado e num caso (Mariana)
observou-se um olhar vido, tal como descrito na concepo do contacto de crianas
deprimidas por Teresa Ferreira (2002) e Pedro Strecht (1998, 2001).
A origem do pedido surge da consulta hospitalar ou por via do Mdico de Famlia do
Centro de Sade de referncia da criana. semelhana do apurado na literatura (Ferreira,
2002; Gueniche, 2005; Marcelli, 1995, 2005; Palacio-Espasa, 2004; Palacio-Espasa &
52

Dufour, 2002; Santos, 2000; Strecht, 1998, 2001; Vogel, 2012) os sintomas que conduzem
estas crianas consulta de psicologia/pedopsiquiatria so variados: ansiedade, medos, baixa
auto-estima, somatizaes (cefaleias), dificuldades alimentares (anorexia selectiva),
dificuldades de concentrao, hiperactividade, dificuldades escolares, destacando-se as
dificuldades de aprendizagem/escolares como a queixa mais frequentemente assinalada, o que
pode estar associado falha na capacidade precedente de interiorizar bons objectos capazes
de amar e proteger (Strecht, 1998, p. 199). Na Unidade de Pedopsiquiatria todos os casos
beneficiam de consultas teraputicas com os pais e de consultas teraputicas com as crianas,
em dois casos (Tom e Isabel) de frequncia semanal e, em trs casos (Joo, Mariana e
Gabriel) de frequncia quinzenal. O perodo de acompanhamento das crianas varia entre os
dois meses e os oito meses e meio. A prescrio de psicotrpicos regista-se apenas em dois
casos, o Joo e a Mariana, tratando-se das crianas que tendem a manifestar uma conduta
mais agida e marcada por uma expresso acentuada de afectos na linha depressiva.
No que concerne ao agregado familiar todos os progenitores so casados, encontrandose apenas uma famlia reconstruda com descendncia de uma relao anterior, sendo que as
restantes famlias so de tipo nuclear e todas as crianas tm apenas um(a) irmo/irm. Dois
casos, o Tom e a Isabel so irmos, perfazendo uma famlia nuclear completa em estudo. A
idade das mes varia entre os 37 e os 39 anos e a dos pais entre 38 e 46 anos. No caso dos
irmos/irms a idade varia entre os 5 e os 18 anos de idade. Relativamente classe social
segundo a Classificao Social Internacional de Graffard (Gomes Pedro, 1985) observa-se a
predominncia da Classe III (Mdia), seguindo-se a Classe I (Alta) e a Classe IV (Mdia
Baixa), com um caso cada. A nica figura parental (paterna) que se encontra desempregada
pertence a esta ltima classe social. Na anlise da anamnese das famlias sobressai a hiptese
de organizao depressiva em trs figuras parentais: nas mes do Tom/Isabel e Mariana e no
pai do Joo; e, ainda, um forte investimento na vida profissional, com ausncias frequentes
nestes mesmos casos. Verifica-se tambm a ocorrncia de perdas por falecimento importantes
para a famlia com destaque para os avs paternos/maternos e uma tia materna por suicdio
(caso da Mariana). H, ainda, a assinalar outros dados como a possibilidade da presena de
patologias psiquitricas na famlia para alm de depresso nas figuras parentais (anorexia
nervosa e dislexia maternas, dificuldades escolares paternas, depresso numa tia paterna), dois
abortos espontneos e a prematuridade de uma criana includa no estudo (Isabel), extoxicodependncia nos pais do Gabriel e Hepatite C na me desta criana.
No mbito da auto-estima materna sobressaem duas tendncias distintas: as mes com
hiptese de organizao depressiva apresentam uma auto-estima baixa, insegura, marcada por
sentimentos de inferioridade, desvalorizao, culpabilizao, irritabilidade emocional, forte
53

dependncia, carncia de proteco e diminuda disponibilidade emocional para a relao com


os outros; as mes onde no se coloca esta hiptese surgem como as figuras dominantes da
dade parental e no expressam afectos negativos de forma to acentuada, ainda que, a me do
Gabriel apresente uma auto-estima baixa, marcada por irritabilidade emocional, sentimentos
de inferioridade e uma percepo negativa e insegura da famlia. A culpabilizao a nica
caracterstica comum a todas as mes, assim como, o recurso a defesas como a negao e
idealizao, como forma de bloquear a expresso agressiva dirigida aos elementos da famlia.
Na percepo da relao conjugal materna sobressai a presena de conflitos
acentuados ligados ao sentimento de desvalorizao e pouco envolvimento nas funes
conjugais/parentais por parte do pai, insegurana, dificuldades na gesto e resoluo dos
conflitos, na comunicao, na demonstrao de afectos e culpabilizao sobretudo pela
agressividade dirigida ao pai. As mes com hiptese de depresso sentem-se pouco apoiadas e
compreendidas pelo pai. A me do Tom e da Isabel percepciona o pai como uma figura
autoritria e punitiva, ainda que, dependente da sua proteco. A me da Mariana sente-se
dependente do pai. Por outro lado, as figuras maternas com caractersticas dominantes
atribuem caractersticas passivas aos pais, desvalorizando-os: a me do Joo associa
sentimentos de incompetncia/fraqueza por dificuldades na adaptao social e em exprimir
sentimentos. J a me do Gabriel percepciona um maior investimento afectivo na relao por
parte do pai e afirma o matriarcado familiar.
A percepo da relao me/criana pela figura materna tende a ser idealizada,
caracterizada como dependente e marcada por sentimentos de culpabilizao. Assiste-se,
ainda, ao desejo de proteger e cuidar dos filhos. A me do Tom/Isabel percepciona a
emergncia de impulsos agressivos na relao com a filha e ambos os pais sentem a
necessidade de agradar me por parte da Isabel. Na relao com o Tom a me sente que
este se preocupa consigo e demonstra-se inibido. Por seu turno, a me do Joo tende a sentir a
relao como carente a nvel afectivo, percepcionando afectos de rejeio por parte do filho.
Atribui-lhe, ainda, sentimentos de incompetncia/fraqueza ligados a dificuldades em lidar
com as adversidades e na adaptao social. A me da Mariana reconhece a interferncia da
sua vivncia depressiva na relao com a filha, sentindo-se doente e sem pacincia. Na
relao me/irmo tanto a me do Joo como a me da Mariana idealizam a relao,
revelando um forte envolvimento emocional com os filhos. Contudo, a me do Joo
percepciona a ocorrncia de afectos agressivos por parte da irm que podem remeter para a
necessidade de separao do espao materno e, por seu lado, a me da Mariana sente-se
desvalorizada, culpabilizada e associa ao irmo dificuldades na adaptao social e na gesto
dos conflitos com os outros. A me do Gabriel destaca-se face s restantes por apresentar uma
54

percepo fortemente desvalorizada, insegura e conflituosa na relao com o irmo,


atribuindo-lhe uma atitude punitiva e agressiva.
Na relao com as prprias figuras parentais maternas sobressai a presena de uma
relao dependente e pouco autnoma marcada, por vezes, pela idealizao, sobretudo na
relao com as avs. Na relao com os tios/as maternos/as destaca-se o sentimento de
desvalorizao e conflitos que podem reenviar para a presena de rivalidade fraterna. Importa,
ainda, ressalvar que as mes com caractersticas dominantes percepcionam as suas figuras
parentais de forma muito distinta: por um lado, identificam atributos dominantes nas figuras
maternas, com as quais mantm relaes dependentes e, por outro, desenvolvem um fraco
envolvimento emocional com as figuras paternas, aos quais atribuem caractersticas menos
dominantes. Ainda assim, percepcionam relaes conflituosas marcadas por sentimentos de
insegurana, desvalorizao, punio, falta de apoio e afecto dirigidos s mes, no caso da
me do Joo pela av e no caso da me do Gabriel por parte do av. Apenas as mes ligadas
hiptese de depresso referem-se relao com os elementos pertencentes famlia de origem
paterna sentindo-se desvalorizadas, remetendo para o sentimento de insegurana e menor
disponibilidade emocional na relao com os outros, sobretudo exteriores famlia biolgica.
No que concerne representao da auto-estima paterna verifica-se uma
predominncia de afectos negativos que traduzem uma maior fragilidade emocional nos pais
em que a figura materna assume uma funo dominante na famlia (casos do Joo e Gabriel).
Assim observa-se uma auto-estima baixa, composta por sentimentos de insegurana,
inferioridade,

irritabilidade,

culpabilizao,

dependncia,

carncia

de

proteco,

desajustamento social e dificuldades em lidar com os problemas. Coloca-se em hiptese uma


organizao depressiva no pai do Joo. O pai da Mariana culpabiliza-se face percepo de
uma diminuda disponibilidade e apoio famlia. As figuras paternas tendem a revelar um
elevado grau de neuroticismo pela forte negao da expresso de agressividade sobre os
membros da famlia e o recurso idealizao.
As caractersticas que mais sobressaem na percepo paterna da relao conjugal so o
sentimento de desvalorizao e insegurana, registando-se conflitos acentuados, semelhana
da percepo materna. Os pais tendem a percepcionar as mes como figuras pouco tolerantes,
inseguras, punitivas e com irritabilidade emocional. O pai do Joo percepciona, ainda, a me
como dominante, podendo sentir-se inferiorizado e castrado pela submisso ao matriarcado
familiar. O pai do Tom/Isabel sente que a me transmite pouco afecto e erotizao relao,
reenviando para a diminuda disponibilidade emocional para as relaes identificada pela
prpria me, decorrente da possibilidade de se encontrar deprimida. Os pais do Tom/Isabel,
da Mariana e do Gabriel representam, ainda, as mes como carentes de proteco.
55

A relao pai/criana idealizada pelos pais. Os pais com caractersticas menos


dominantes culpabilizam-se e percepcionam um forte investimento na relao por parte dos
filhos.

Para

pai

do

Joo

filho

identifica-se

consigo

no

sentimento

de

incompetncia/fraqueza. O pai do Tom/Isabel e do Joo percepcionam-se como punitivos na


relao com os filhos. As crianas tendem a ser caracterizadas como dependentes e carentes
de proteco e, no caso do Tom descrito como pouco tolerante frustrao, deprimido e
passivo. Na interaco com as filhas os pais percepcionam, ainda, um contacto sedutor. Na
relao pai/irmo observa-se uma relao dependente no caso do pai do Joo e Mariana. No
caso do pai do Gabriel (no pai do irmo do filho) apesar de manter uma relao satisfatria
e correspondida projecta a carncia de apoio e proteco famlia por parte do irmo.
Tendencialmente os pais percepcionam uma relao dependente com as suas figuras
maternas, ainda que, as representem como figuras punitivas, sentindo-se inseguros,
desvalorizados, pouco apoiados e protegidos, com excepo do pai do Joo que associa estas
caractersticas ao av paterno do filho ( a nica figura paterna com o pai ainda vivo). Na
relao com os tios/as paternos/as sobressai a presena de rivalidade fraterna.
Por seu lado, as crianas tendem a apresentar uma auto-estima baixa marcada por
sentimentos de insegurana, inferioridade, pessimismo, culpabilidade, tristeza, afectos ligados
morte, indeciso e dificuldades de mentalizao (instabilidade psicomotora, somatizaes)
acentuando-se a sua expresso nas crianas que exibem uma conduta menos inibida (Joo e
Mariana). Todas estas crianas percepcionam uma forte dependncia emocional das figuras
parentais, com destaque para os cuidados e proteco maternos. Entre os principais
mecanismos de defesa utilizados encontram-se: idealizao, recusa manaca, evitamento,
recalcamento, recusa, negao e formao reactiva, permitindo reprimir a expresso de
agressividade dirigida aos elementos da famlia e a mentalizao do sofrimento depressivo, na
linha do que foi observado por vrios autores (Cmara, 2005; Ferreira, 2002; Gueniche, 2005;
Lustin, 2004; Marcelli, 2005; Palacio-Espasa, 2004; Santos, 2000; Strecht, 1998, 2001).
No mbito da relao me/criana sobressaem dois tipos de percepo: por um lado,
uma relao idealizada, dependente e pouco frustrante e, por outro, a representao da me
como uma figura autoritria, punitiva e pouco disponvel face s necessidades afectivas da
criana. Neste contexto emergem os afectos depressivos que remetem para a vivncia de uma
falha narcsica acentuada, desproteco, carncia, abandono, culpa, insegurana e funo de
apoio e conteno maternas precrias, evidenciando-se nas crianas com mes deprimidas,
semelhana do observado na literatura (Carvalho et al., 2006; Garber et al., 2009; Goodman &
Gotlib, 1999; Hughes, et al., 2008; Stark et al., 2012) e, em particular nas meninas. Importa,
ainda, referir que o Gabriel percepciona a me como a figura dominante da famlia, o Tom
56

revela o desejo de autonomizao e a Isabel exprime o desejo de agradar me, tal como,
observado pelos pais.
semelhana da percepo das figuras paternas, o Joo e o Gabriel sentem-se pouco
valorizados e correspondidos por parte dos pais face aos seus desejos e a Mariana projecta
afectos erotizados na relao com o pai. O Tom tambm manifesta o desejo de aproximao
e ateno por parte do pai. Os pais tendem a assegurar uma funo importante de apoio e
proteco a estas crianas, todavia, observam-se sentimentos de insegurana associados
percepo destes pais como figuras punitivas e pouco disponveis.
Quanto relao fraterna sobressai a rivalidade intensificada face vivncia carencial
na relao com o materno e pelo desejo de obter a ateno/proteco exclusiva dos pais,
sobretudo da figura materna. Ainda que a Isabel se sinta protegida pelo Tom, este
experiencia sentimentos de inferioridade face irm, semelhana do Joo que tambm
percepciona uma relao prxima e afectiva com a irm, o que pode remeter para uma defesa
pela formao reactiva no Tom e no Joo. Por outro lado, o Gabriel sente-se desvalorizado
pelo irmo. Estes dados correspondem aos observados pelos pais. Aparentemente os meninos
atribuem uma menor relevncia relao com outros elementos da famlia visto que apenas as
meninas se referiram relao com estas figuras. Assim, a Isabel percepciona o av materno
como uma figura punitiva e autoritria, paralelamente, a Mariana atribui estas caractersticas
av e tia paternas, ainda que, tambm as sinta como afectuosas. Na percepo dos pais
importa destacar o contacto fcil, sedutor, marcado pela necessidade de agradar e forte
angstia de separao na Isabel semelhana dos pais da Mariana que observam uma conduta
carente, a necessidade de agradar e de ateno constante na relao da filha com outras
figuras significantes.
Posto isto, nestas famlias sobressai uma relao emocionalmente dependente e uma
fraca autonomizao das famlias de origem por parte das figuras parentais, sobretudo na
relao que estabelecem com as suas figuras maternas transferindo para a relao com os
filhos os modelos de identificao interiorizados na relao com estas figuras, projectando,
assim, as suas prprias falhas narcsicas. Gera-se o sentimento de culpa tambm aliado ao
forte investimento no mundo laboral observado nos casos do Tom, Isabel e Joo, o que
resulta num empobrecimento das interaces familiares. Outros factores como o falecimento
de figuras significativas aos elementos da famlia e as dificuldades econmicas ligadas ao
desemprego de um dos progenitores (pai da Mariana) parecem acentuar as problemticas no
sistema familiar e contribuir, assim, para o agravamento da depresso infantil, tal como
sugerem Carvalho et al. (2006), Ferreira (2002), Gueniche (2005), Marcelli (2005) e Schwartz
et al. (1998). Como referido anteriormente, em duas famlias (Tom/Isabel e Mariana)
57

observa-se aparentemente a presena de depresso materna, afectando a qualidade das


relaes familiares, com nfase na relao conjugal e na relao me/filhos (Carvalho et al.,
2006; Garber et al., 2009; Gartstein & Bateman, 2008; Goodman & Gotlib, 1999; Hughes, et
al., 2008; Lau et al., 2007; Stark et al., 2012). E nas restantes duas famlias (Joo e Gabriel)
observa-se um desequilbrio entre a dade parental atravs da presena de uma figura materna
flica e dominante que contrasta com uma figura paterna passiva e demitida da sua funo
parental (no caso do Joo apresenta afectos que transmitem a vivncia de um sofrimento
depressivo), semelhana da constelao depressgena da autoria de Coimbra de Matos
(2002). Ainda assim, nos casos em estudo observa-se que as figuras paternas tendem a
assumir uma funo de apoio e proteco importante, todavia, no proporcionam a conteno
necessria para que as angstias das crianas sejam ultrapassadas pela presena de
sentimentos de insegurana na relao pais/crianas associados percepo destes pais como
figuras punitivas e pouco disponveis.
Assim, segundo a acepo de Teresa Ferreira (2002) e de Coimbra de Matos (2002,
2003, 2007) a falha de confirmao narcsica vivenciada no contacto com uma figura materna
deprimida ou flica aliada a uma figura paterna demitida da sua funo parental e/ou
deprimida no permite criana sentir-se valorizada na experincia de individuao e
autonomia, pelo risco de perda do amor do objecto, permanecendo dependente da relao com
a figura materna. Em todos os casos analisados observa-se, ainda, a clivagem parental entre
um filho associado a caractersticas positivas como a capacidade de mobilizar estratgias
internas de defesa e outro que remete para afectos negativos ligados percepo de maior
fragilidade, insegurana, passividade e escassos recursos internos de defesa. No primeiro
grupo situam-se o Gabriel e a Isabel, o que permite acentuar a relao dependente me/criana
e, no segundo, encontram-se o Tom, o Joo e a Mariana intensificando a rivalidade fraterna,
o sentimento de inferioridade face aos irmos e de abandono na relao com os pais/mes.
Todas as crianas avaliadas encontram-se ao nvel da relao pr-edipiana, ainda que,
aparentemente a instncia superegica se encontre integrada e a maioria aceda diferenciao
sexual, de geraes e triangulao edipiana, porm, revelam dificuldades na aceitao da
excluso do casal parental. O conceito de famlia tambm se encontra integrado. Dependendo
da modalidade depressiva avanada por Teresa Ferreira (2002) aproximada ao sofrimento
psquico da criana observa-se: uma relao dual com a figura materna marcada por carncias
orais que no permitem a separao emocional desta figura (ncleo precoce) Isabel e
Mariana; uma relao dual com a figura materna acompanhada de dificuldades no processo de
separao/individuao (ncleo primrio) Tom e Gabriel; e, por fim, uma relao
triangular onde a angstia depressiva se acentua face ao experienciar da castrao e falhas
58

identitrias resultantes da ausncia de valorizao narcsica por ambas as figuras parentais


(ncleo flico) Joo. Todavia, perante as dificuldades vivenciadas no confronto com a
angstia depressiva pela possibilidade de perda do amor do objecto sobressaem nestas
crianas problemticas como: uma relao dependente, idealizada e, por vezes, pouco
frustrante com a figura materna, expressando o desejo de uma aproximao exclusiva a esta
figura; carncia afectiva e falha narcsica acentuadas, sentimento de desvalorizao,
insegurana, excluso, solido, abandono, desproteco e de precariedade dos suportes na
relao com as figuras parentais, sobretudo na relao com a figura materna acompanhado de
culpabilidade pelo retorno da agressividade/punio sobre si. Estes resultados divergem
significativamente dos obtidos no CDI que apontam para uma intensidade intermdia ou
diminuda de sintomas depressivos e, por isso, no classificados no grupo de casos
deprimidos, o que pode ser explicado pela interferncia dos mecanismos de defesa como a
negao durante a realizao deste instrumento. Assim, observa-se que as crianas com uma
conduta mais exteriorizada obtiveram resultados mais elevados e, assim, mais prximos de se
enquadrarem no grupo de casos deprimidos, j as crianas com conduta inibida associam-se
a resultados menos significativos na expresso de intensidade depressiva. Estes resultados
apoiam a advertncia de Marujo (1995) relativamente utilizao do teste enquanto
instrumento complementar de diagnstico, incidindo apenas sobre os sintomas de depresso.
Importa, ainda, assinalar que esta investigao apresenta uma limitada uniformizao
no processo de recolha de dados, tendo-se optado por ajustar s necessidades especficas
apresentadas por cada criana e relativas s condies do espao, tempo, disponibilidade
horria dos pais e da prpria investigadora, o que pode ter condicionado os resultados obtidos.
Deste modo, sugere-se a replicao deste estudo obedecendo a uma ordem comum na
aplicao dos diversos instrumentos; utilizando um nmero mais elevado de crianas/famlias;
incluindo todos os elementos que compem o agregado familiar ou a famlia nuclear, neste
ltimo caso, os irmos; recorrendo a tipos de famlias distintos, como as famlias
monoparentais, alargadas, entre outros; em crianas que apresentam diagnsticos clnicos
diferentes de depresso ou sem diagnstico clnico (i.e., amostra normativa) para efeitos de
comparao com os resultados obtidos na presente investigao; investigar o objectivo deste
estudo com recurso utilizao de uma metodologia distinta da utilizada, possivelmente de
foro quantitativo; e, utilizar o Teste de Relaes Familiares, Verso Adultos (Bene, 1965)
conjuntamente com as restantes verses deste teste destinadas s crianas e aos casais de
forma a obter uma perspectiva contnua da famlia que acompanhe as vivncias relativas
infncia com as famlias de origem das figuras parentais, os sentimentos experienciados na
vida conjugal e com os filhos e a vivncia familiar das prprias crianas.
59

CONCLUSO

O objectivo principal do presente estudo consistia em identificar e descrever a


percepo das relaes familiares em crianas diagnosticadas com depresso, na me e no pai,
de forma a contribuir para uma melhor compreenso do funcionamento familiar destas
crianas. Deste modo, participaram nesta investigao cinco crianas, trs meninos e duas
meninas com idades compreendidas entre os 7 e os 10 anos e as respectivas figuras parentais.
Utilizou-se o mtodo de Estudo de Caso mltiplo, exploratrio e os seguintes
instrumentos: Desenho Livre, Desenho da Figura Humana (Machover, 1978), Desenho da
Famlia (Corman, 2003), Inventrio de Depresso para Crianas (Marujo, 1995), Teste de
Relaes Familiares, Verso Crianas (Bene, 1985), Teste de Relaes Familiares, Verso
Casais (Bene, 1976), As Aventuras de Pata-Negra (Corman, 2001) e duas entrevistas semidirectivas, uma destinada aos pais e outra s crianas.
Os resultados indicam a percepo de uma relao dependente com uma figura
materna deprimida ou flica aliada a uma figura paterna demitida da sua funo parental e/ou
deprimida, ambas culpabilizadas, sentidas como punitivas e pouco disponveis face s
necessidades afectivas da criana, resultando numa falha de confirmao narcsica, no
permitindo criana sentir-se valorizada na experincia de individuao e autonomia,
acentuando-se nos casos de crianas com mes deprimidas e, em particular, nas meninas.
Assim, estas crianas tendem a apresentar uma auto-estima baixa marcada por sentimentos de
insegurana, inferioridade, pessimismo, culpabilidade, tristeza, afectos ligados morte,
indeciso e dificuldades de mentalizao (instabilidade psicomotora, somatizaes)
acentuando-se a sua expresso nas crianas que exibem uma conduta menos inibida.
No mbito da relao conjugal sobressai a percepo de conflitos acentuados ligados
ao sentimento de desvalorizao e insegurana, em ambas as figuras parentais. Na relao
fraterna sobressai a percepo de rivalidade intensificada face vivncia carencial na relao
com o materno e pelo desejo de obter a ateno/proteco exclusiva dos pais, sobretudo da
figura materna. Observa-se, ainda, que as figuras parentais tendem a manter uma relao
emocionalmente dependente e uma fraca autonomizao das suas famlias de origem. O
falecimento de figuras significativas famlia e as dificuldades econmicas parecem acentuar
as problemticas familiares e contribuir, assim, para o agravamento da depresso infantil.
Termino com a seguinte reflexo da autoria de Pedro Strecht (2001): Porque ser que
vemos cada vez mais crianas e adolescentes com estruturas depressivas? Depois de tudo, a
mensagem final simples: temos de recuperar a capacidade de amar os outros. E isso no est
nos livros, no se ensina. Tm-se e vive-se (p. 149).
60

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70

ANEXOS

71

Anexo A: Pedido de Autorizao para Recolha de Dados

Exmo. Sr. Presidente


Do Conselho de Administrao
Dr. Joaquim Daniel Lopes Ferro
Hospital, E.P.E.

Lisboa, 18 de Janeiro de 2011

Exmo. Senhor,

Na qualidade de estudante do Mestrado Integrado em Psicologia, rea de Psicologia


Clnica do Instituto Superior de Psicologia Aplicada Instituto Universitrio e estagiria
curricular da Unidade de Pedopsiquiatria, Servio de Pediatria solicito a Vossa Excelncia a
necessria autorizao para a recolha de dados de investigao com os pais e respectivas
crianas diagnosticadas com um funcionamento depressivo pelos tcnicos da Unidade de
Pedopsiquiatria (Pedopsiquiatras/Psiclogos).
A presente investigao insere-se no mbito da elaborao da minha tese de
dissertao de Mestrado Integrado em Psicologia Clnica do ISPA IU, sob a orientao do
Prof. Doutor Emlio Salgueiro.
O objectivo principal do presente estudo identificar e descrever as percepes das
relaes familiares em crianas com funcionamento depressivo e nos respectivos pais.
Pretende-se, deste modo, obter resultados com efeitos ao nvel da preveno e
interveno da prtica clnica, atravs do enriquecimento dos conhecimentos dos tcnicos que
interagem frequentemente com crianas e/ou famlias de modo a que se possa intervir
atempadamente, apoiando as famlias nas dificuldades encontradas. Espera-se, ainda,
contribuir para o desenvolvimento de uma interveno psicoteraputica (individual e/ou
familiar) mais centrada e atenta s necessidades especficas destas crianas e das suas
famlias, nomeadamente das figuras parentais.
Na realizao deste estudo sero utilizadas as seguintes provas avaliativas: Desenho
Livre; Desenho da Figura Humana (Machover, 1978); Desenho da Famlia (Corman, 2003);
As Aventuras de Pata-Negra (Corman, 2001); Teste de Relaes Familiares, Verso Casais
(Bene, 1976); Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas (Bene, 1985); Inventrio de
Depresso para Crianas (Marujo, 1995).
72

Ser garantida a total confidencialidade e anonimato dos dados recolhidos, os quais


sero guardados num local seguro, apenas acessvel aos investigadores do estudo e
destinando-se exclusivamente a fins de investigao. Somente as crianas que obtiverem a
carta de consentimento informado assinada pelos pais participaro no estudo. Comprometome, ainda, a referir a instituio hospitalar em eventuais comunicaes e publicaes
realizadas.

Junto remeto o Projecto de Investigao, anexando a Carta de Consentimento


Informado que ser entregue aos pais das crianas includas no estudo, uma cpia integral dos
instrumentos a utilizar na investigao e, por fim, o meu Curriculum Vitae.

Agradeo, desde j, a disponibilidade prestada,

Com os melhores cumprimentos,

Margarida Pereira das Neves.

73

Anexo B: Projecto de Investigao

PROJECTO DE INVESTIGAO
Instituto Superior de Psicologia Aplicada
Mestrado Integrado em Psicologia rea de Psicologia Clnica

Tema: A Depresso na Criana: Percepo das Relaes Familiares na Criana, na Me e


no Pai 5 Estudos de Caso

Investigador: Margarida Pereira das Neves

Orientador: Prof. Doutor Emlio Salgueiro


2011

INTRODUO

Modelo Bio-Ecolgico do Desenvolvimento Humano


O Modelo Bio-Ecolgico do Desenvolvimento Humano (Bronfenbrenner & Morris,
2006) concebe a criana como uma entidade em crescimento, dinmica e activa face ao
ambiente que a rodeia. As interaces so bi-direccionais (i.e., entre o organismo e ambiente)
e progressivamente mais complexas, assim como, regulares ao longo de extensos perodos de
tempo. Tanto o ambiente imediato como o mais remoto podem exercer influncia no sujeito.
Desta forma, o modelo rejeita explicitamente a assumpo de que os processos
desenvolvimentais so de carcter universal (Verssimo & Santos, 2008, p. 392).
O meio ambiente ecolgico organiza-se em cinco estruturas concntricas, cada uma
contida na seguinte, representando um nvel diferente de influncia sobre o desenvolvimento
da criana: Micro-sistema, Meso-sistema, Exo-sistema, Macro-sistema e Chrono-sistema.
Na primeira estrutura, o Micro-sistema, dada nfase aos relacionamentos
interpessoais, papis e actividades desenvolvidos pela criana em interaco activa e directa
com os elementos que constituem o ambiente circundante (familiar, escolar, pares,
creche/jardim-de-infncia e vizinhana). dada tambm uma importncia relevante

74

experincia subjectiva decorrente dessas interaces sistema de valores, cognies, crenas,


atitudes, entre outros.
A seguinte estrutura, o Meso-sistema integra as inter-relaes existentes entre dois
ambientes ou mais (e.g. relaes entre a famlia, a escola e pares). O sujeito em
desenvolvimento participa activamente nesses ambientes.
A terceira estrutura denomina-se Exo-sistema, o qual compreende os processos
existentes entre dois ou mais ambientes, em que pelo menos um no envolve a pessoa em
desenvolvimento, mas os eventos que ocorrem neste influenciam indirectamente processos do
ambiente em que a pessoa em desenvolvimento vive (Bronfenbrenner, 1993 cit. por
Bronfenbrenner & Morris, 2006, p. 818).
O Macro-sistema a estrutura que se segue, segundo Cole, Cole e Lightfoot (2005)
refere-se existncia de consistncias quanto forma e contedo de sistemas inferiores, mas
existentes na sub-cultura ou cultura como um todo, assim como, crenas e ideologias
dominantes subjacentes s consistncias.
Por ltimo, a estrutura Chrono-sistema ou Tempo tem implicaes sobre os outros
sistemas, atravs das mudanas histricas que ocorrem na sociedade. Esta estrutura contempla
trs nveis distintos: Microtempo, o qual integra os fenmenos de continuidade versus
descontinuidade no decorrer dos episdios dos proximal processes; Mesotempo, indica a
frequncia desses episdios em intervalos de tempo mais amplos (e.g. dias e semanas); e,
Macrotempo, referindo-se mudana de expectativas, valores, crenas e eventos na sociedade
geral, dentro da mesma gerao, assim como, entre as sucessivas geraes, constatando-se
como estas tm influncia e so influenciadas por processos e resultados do desenvolvimento
humano ao longo da vida, nomeadamente, reflectem-se no desenvolvimento da criana
(Bronfenbrenner & Morris, 2006).

Depresso na Criana
Actualmente a depresso na Criana vista como uma realidade, todavia, s a partir
da segunda metade do sculo XX obteve o devido reconhecimento (Cmara, 2005). Cmara
(2005) caracteriza a depresso na criana como um estado resultante de uma decepo
precoce na relao primria, originando sucessivas decepes posteriores. O vazio criado na
criana remete-a para a procura da aconflitualidade, da regresso. Cmara (2005) indica ainda
que uma criana em sofrimento, que vive em constante conflito interno e na busca
incessante de confirmao e valorizao narcsica. No se sente amada pelo que e as suas
aspiraes so sentidas como inteis ou reprovveis porque no reforadas positivamente (p.
75

55). Tendencialmente as crianas deprimidas manifestam-se apticas e sem curiosidade,


mostrando-se inibidas na explorao que exercem sobre o meio pois toda a sua caminhada
marcada pela insegurana, pelo medo, pela vivncia antecipatria do falhar (p. 55).
As principais defesas utilizadas por estas crianas so a tendncia ao agir, pela reduo
da mentalizao e a inibio, atravs da procura de aconflitualidade, expressando-se
geralmente num fraco rendimento escolar, intelectual e social (Cmara, 2005).

Relaes Familiares
Quanto ao contexto familiar para Schaffer (1996) a famlia o primeiro e o mais
importante contexto para o crescimento fsico e psicolgico (p. 204). O processo de
socializao ocorre primeiramente no mbito das famlias e visa adaptar a criana s
caractersticas da sociedade em que est inserida. Como sistema, a famlia organiza-se como
um todo, assim, no se pode tentar compreend-la pelo somatrio das suas partes. A famlia
integra subsistemas inter-relacionados e governados por regras definidas: os membros
familiares e as interaces que estabelecem entre si, gerando-se um padro de influncia
circular onde as mudanas que ocorrem numa parte da famlia repercutem-se nas restantes.
Como sistema aberto, a famlia est sujeita continuidade e mudana (Schaffer, 1996).

As Famlias de Crianas com Depresso


Segundo Sander e McCarty (2005) na gnese da depresso na infncia actuam
mltiplos factores de ordem parental e familiar, tais como, clima familiar; interaces paiscriana; tipo de vinculao existente; psicopatologia parental (viz., depresso parental); estilo
cognitivo parental; temperamento da criana e a maneira como esta lida com o ambiente
familiar. Variveis como stress, conflito conjugal e suporte social interagem de forma
determinante com os factores mencionados anteriormente.
A partir de um estudo comparativo realizado por George, Herman e Ostrander (2006)
observou-se uma associao entre sintomas depressivos na infncia e ambientes familiares
pouco coesos e intelectuais, com elevados conflitos. Por outro lado, Gullone, Ollendick e
King (2006) ao analisar o papel da representao da vinculao em 326 crianas verificaram
que uma representao da vinculao que indique disfuno correlaciona-se aos sintomas
depressivos. Num estudo longitudinal com uma amostra de 83 pais de crianas com idades
inferiores a 18 meses conduzido por Gartstein e Bateman (2008) verificou-se uma correlao
entre maiores nveis de depresso materna, de afectos negativos da criana e de sintomas
depressivos na criana. A investigao longitudinal de Lau, Rijsdijk, Gregory, McGuffin e
76

Eley (2007) obteve resultados semelhantes aos observados no estudo anterior, ao verificar
uma associao entre a depresso materna, estilo cognitivo negativo da criana e a ocorrncia
de sintomas depressivos na infncia, agravados face a eventos de vida negativos. Num estudo
longitudinal ODonnell, Moreau, Cardemil e Pollastri (2010) observaram que os estilos
parental e cognitivo actuam como moderadores na relao entre o conflito inter-parental e a
depresso na infncia. Por fim, Mezulis, Hyde e Abramson (2006) atravs de um estudo
longitudinal obtiveram uma correlao entre o temperamento negativo da criana, eventos de
vida negativos e vulnerabilidade para a depresso, atravs do estilo cognitivo, agravado pelos
comportamentos maternos de feedback negativo face criana e expresso de zanga.

Problema
Tal como referem Jewell e Beyers (2008) facilmente se compreende que os efeitos da
interaco de variveis do ambiente familiar para distinguir e prever psicopatologia na
infncia so complexos e exigem maior ateno (p. 88). Assim, o presente estudo prope-se
estudar esta temtica que tem sido menos abordada na literatura comparativamente com a
depresso na adolescncia e adultcia; no se observam estudos significativos que procurem
conhecer o funcionamento familiar da populao que este estudo se prope estudar e, mais
raramente, de forma abrangente e integrada, isto , articulando numa mesma investigao os
sentimentos e emoes familiares, tipo de alianas, coeso, vinculao, entre outros
fenmenos familiares; o tipo de abordagem utilizada para compreender e analisar o fenmeno
em causa inovador, usando simultaneamente o Modelo Bio-ecolgico do Desenvolvimento
Humano (Bronfenbrenner & Morris, 2006) e a teoria psicanaltica; inova tambm na temtica
que se prope estudar face ao contexto scio-cultural em que se insere, Portugal; o tipo de
metodologia utilizada destaca-se da restante literatura por no se encontrarem estudos de tipo
qualitativo, incluindo o mtodo de Estudo de Caso e raramente se utiliza o instrumento Teste
de Relaes Familiares, Verso Crianas (Bene, 1985) combinado com a prova Teste de
Relaes Familiares, Verso Casais (Bene, 1976).

Objectivos
O objectivo principal do presente estudo identificar e descrever as percepes das
relaes familiares em crianas com funcionamento depressivo e nos respectivos pais.
Em cada famlia, comparam-se as percepes familiares da criana, da me e do pai,
de modo a analisar as semelhanas e as diferenas existentes.

77

Por fim, elabora-se uma comparao geral dos resultados obtidos em cada uma das
famlias com os das restantes famlias, de forma a aceder a uma leitura compreensiva das
percepes familiares presentes nas famlias de crianas com funcionamento depressivo.
Ao caracterizar as relaes familiares de crianas com organizao depressiva,
segundo as percepes da criana, da me e do pai numa perspectiva psicodinmica e bioecolgica, espera-se contribuir para o conhecimento dos factores familiares implicados na
depresso da infncia, permitindo, deste modo, o desenvolvimento de resultados em dois
nveis distintos, ainda que, complementares prtica clnica: a preveno e a interveno. No
que concerne ao contributo desta investigao para a preveno dos casos de depresso na
infncia, pretende-se enriquecer os conhecimentos dos tcnicos que interagem frequentemente
com crianas e/ou famlias face a determinados padres de relacionamento ou interaco
familiar susceptveis ao desenvolvimento deste tipo de funcionamento psicolgico, de modo a
que se possa intervir atempadamente, apoiando as famlias nas dificuldades encontradas. Ao
nvel da interveno espera-se contribuir para o desenvolvimento de uma interveno
psicoteraputica (individual e/ou familiar) mais centrada e atenta s necessidades especficas
das crianas com depresso e das suas prprias famlias, nomeadamente das figuras parentais.

MTODO

Delineamento
De modo a responder questo de investigao quais as percepes das relaes
familiares em crianas com diagnstico de depresso e respectivas figuras parentais? Optouse pela utilizao do mtodo de Estudo de Caso mltiplo, exploratrio, com metodologia
qualitativa por se colocar a questo o qu? sem que sejam delineadas a priori uma teoria e
hipteses precisas, visto que o objectivo principal desenvolver hipteses que possam ser
testadas em pesquisas confirmatrias. Esta metodologia aborda fenmenos contemporneos a
partir do seu contexto real, onde as variveis so dificilmente manipulveis pelo
experimentador (Yin, 1984). Assim, os Estudos de Caso so generalizveis a proposies
tericas e no a populaes ou universos (Yin, 1984, p. 21), ou seja, pressupe-se a
generalizao analtica com vista a corroborar, fortalecer ou refutar uma teoria e no a
generalizao estatstica. Perante a utilizao de mltiplas fontes de evidncia e a
representao dos fenmenos atravs da perspectiva do prprio sujeito, este mtodo permite,
ainda, descries e anlises mais intensivas dos fenmenos (Shaughnessy, Zechmeister &
Zechmeister, 2006; Stark & Torrance, 2005).
78

Participantes
Esta investigao constituda por cinco crianas identificadas com funcionamento
depressivo pelos psiclogos da Unidade de Pedopsiquiatria (Servio de Pediatria) do Hospital
e os respectivos pais. Pretendem-se crianas do sexo feminino e masculino. Estas crianas
devem frequentar a escola primria e encontrar-se no perodo de Latncia, com idades
compreendidas entre os 7 e os 10 anos.

Procedimento
Inicialmente ser enviado o consentimento informado ao Presidente do Conselho de
Administrao do Hospital e Direco do Servio de Pediatria deste hospital.
Em seguida, sero identificadas cinco crianas avaliadas e diagnosticadas com um
funcionamento depressivo pelos tcnicos (Psiclogos) da Unidade de Pedopsiquiatria
(Servio de Pediatria) do Hospital.
A recolha dos dados ter incio atravs de uma sesso com ambos os pais, previamente
marcada para a mesma hora em que a criana ter consulta de Pedopsiquiatria/Psicologia.
Num primeiro momento ser apresentado o consentimento informado aos pais, no qual se
explicar sumariamente o mbito da investigao, o nmero de encontros necessrios
recolha dos dados e os cuidados ticos implicados (e.g., carcter voluntrio de participao,
confidencialidade, proteco dos dados). Apenas as crianas que obtiverem o devido
consentimento por escrito dos pais participaro nesta investigao. Em seguida, ser realizada
uma entrevista semi-directiva aos pais com o objectivo de recolher os dados necessrios
elaborao da anamnese da criana, genograma familiar e, ainda, para a classificao social
internacional de Graffard (durao relativa de 40 minutos). Com apenas um dos pais presente
na sala, realizar-se- a passagem da prova Teste de Relaes Familiares, Verso Casais
(Bene, 1976).
Aps a consulta de Pedopsiquiatria/Psicologia da criana ser realizada a primeira
sesso apenas com a criana. Esta sesso iniciar-se- com uma entrevista semi-directiva
(durao aproximada de 30 minutos) com o intuito de recolher informaes associadas
histria e percepo familiar da criana como, tambm, permitir que esta se expresse de forma
espontnea, favorecendo, assim, a criao de uma relao de aliana com a observadora, de
modo a facilitar a passagem das provas projectivas que se seguem. Assim, sero
administrados os testes Desenho Livre e Desenho da Figura Humana (Machover, 1978).
Na sesso seguinte ser aplicada a prova Teste de Relaes Familiares, Verso Casais
(Bene, 1976) figura parental que no realizou esta prova, enquanto a criana se encontra na
79

consulta da Unidade de Pedopsiquiatria. Quando esta consulta terminar, em situao


individual com a criana, aplicam-se os instrumentos Desenho da Famlia (Corman, 2003),
Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas (Bene, 1985) e Inventrio de Depresso para
Crianas (Marujo, 1995).
Por fim, na ltima sesso com a criana realizar-se- a passagem da tcnica projectiva
As Aventuras de Pata-Negra (Corman, 2001), logo aps a finalizao da consulta de
Pedopsiquiatria/Psicologia na Unidade.
Deve-se, ainda, referir que a passagem dos instrumentos supramencionados ser
realizada pelo mesmo examinador e numa sala pertencente Unidade de Pedopsiquiatria
(Servio de Pediatria) do Hospital. Durante a passagem das provas enfatizar-se- a
importncia da participao voluntria de cada sujeito, tal como, o facto de no existirem
respostas correctas ou incorrectas nas provas aplicadas, visto que o interesse est no que o
indivduo considera mais verdadeiro para si mesmo.

Instrumentos

Desenho Livre

A tcnica grafo-motora do Desenho Livre usualmente utilizada na clnica infantil


como forma privilegiada de aceder ao mundo fantasmtico da criana. No espao da
transferncia a criana projecta no desenho de forma inconsciente as suas escolhas de temas,
objectos, mecanismos de defesa, medos e angstias (Celi, 2004). No fundo, a sua realidade
psquica. Para a criana o desenho sentido como um meio natural de se expressar, pois
mesmo na latncia frequente uma criana ultrapassar a inibio verbal comunicando pelo
desenho, onde expressa o conflito latente que a trouxe consulta, a vida fantasmtica, as
defesas o funcionamento mental (Ferreira, 2002, p. 358). atravs do desenho espontneo
que se distingue de forma particular a organizao de figuras no espao, a relao entre os
objectos, os pormenores, a utilizao e escolha das cores, assim como, as formas e os
elementos incongruentes. criana possibilitada a escolha do seu modo de expresso e de
deslocar para o desenho o que sente durante a sesso (Celi, 2004).
Posto isto, durante a avaliao psicolgica dada a seguinte instruo criana:
gostaria que fizesses um desenho nesta folha, disponibilizando-se uma folha branca, um
lpis de carvo, lpis de cor e canetas de feltro. Caso a criana necessite, incluir uma
borracha. Aps a finalizao do desenho surge a fase de inqurito, onde deve ser pedido

80

criana para descrever o que desenhou (e.g., quem so as pessoas que desenhou e o que esto
a fazer) e contar uma histria alusiva ao desenho.

Desenho da Figura Humana (Machover, 1978)

O Desenho da Figura Humana, originalmente criado por Goodenough em 1926 como


instrumento de medida do desenvolvimento intelectual de crianas foi posteriormente
adaptado ao estudo da personalidade de crianas e adultos por Karen Machover, em 1949 (cit.
por Machover, 1978). Atravs da publicao dos resultados de diversas observaes clnicas
sobre a representao grfica de figuras humanas desenhadas por sujeitos com variados
problemas psicolgicos, Machover atribuiu um carcter projectivo prova. Como tal,
segundo a autora, ao desenhar uma pessoa, o sujeito representa no papel a sua auto-imagem
corporal, a relao fantasmtica que mantm com o ambiente, as suas aspiraes, imagem
ideal e pessoas significativas. Celi (2004) acrescenta que este teste revela as fixaes
precoces, o investimento particular das zonas ergenas, os locais de conflitos pulsionais e a
estrutura da organizao tpica do sujeito (pp. 268-269).
Durante a administrao da prova entregue ao sujeito um lpis de carvo, lpis de
cor, uma folha de papel branco em formato A4 e, ainda, uma borracha (caso o sujeito a
solicite). Segue-se a seguinte instruo: Gostaria que desenhasses uma pessoa nesta folha.
Faz o melhor desenho que puderes e um inqurito quando o desenho estiver terminado.
Todos os comentrios proferidos pelo sujeito ao longo da prova devem ser anotados pelo
observador. Aps este primeiro desenho solicita-se ao sujeito que desenhe uma pessoa do
sexo oposto figura desenhada em primeira instncia, repetindo-se o processo de aplicao
utilizado no primeiro desenho (Machover, 1978).

Desenho da Famlia (Corman, 2003)


A prova do Desenho de Famlia segundo Corman (2003) um instrumento projectivo.

Deste modo, a partir da instruo Desenha uma famlia inventada por ti a criana
convidada a criar e a projectar livremente as suas tendncias inconscientes e conscientes,
revelando os sentimentos experienciados perante os elementos da sua famlia. Trata-se, pois,
de uma prova de personalidade onde so projectados os conflitos, afectos, sentimentos,
desejos, medos e identificaes da criana.
Aps a realizao do desenho so colocadas algumas questes criana como a
atribuio de um nome, idade e papel ocupado na famlia por cada personagem desenhada, a
81

descrio do que se encontram a fazer e, ainda, a histria sobre a famlia desenhada. Segue-se
um inqurito denominado por Corman (2003) como mtodo das Preferncias-Identificaes,
no qual so questionadas as preferncias ou averses associadas s personagens representadas
e ao prprio desenho na sua globalidade (e.g., Quem o mais simptico? Porqu?; Quem o
menos simptico? Porqu?; Quem o mais feliz? Porqu?; Quem o menos feliz? Porqu?;
Quem manda mais? Porqu?; Quem manda menos? Porqu?; Se tivesses que escolher uma
pessoa desta famlia, quem que preferias ser? Porqu?; Se fossem todos dar um passeio de
carro mas no houvesse lugar para uma pessoa, quem ficaria em casa? Porqu?; Se algum
no se tivesse comportado bem quem seria? Que castigo teria? quem que o dava?; Se
pudesses mudar alguma coisa no teu desenho o que que mudarias? Porqu?).

Inventrio de Depresso para Crianas (Marujo, 1995)

Este instrumento da autoria de Kovacs (2004) uma escala que pretende avaliar os
sintomas de depresso em crianas e adolescentes, dos 7 aos 15 anos de idade. Na presente
investigao recorre-se adaptao portuguesa da prova da autoria de Helena Marujo (1995).
Assim, a escala contm 27 itens e pressupe o preenchimento pela prpria criana ou por
figuras relevantes na sua vida como o caso da me, pai, professor(a) e outros educadores ou
cuidadores, atravs do tipo de resposta de 0 a 3 pontos (e.g., Item 1: Nunca me sinto triste,
s vezes sinto-me triste, Sinto-me quase sempre triste, Sinto-me sempre triste) tendo como
referncia as duas ltimas semanas da criana/adolescente.
No que concerne s caractersticas psicomtricas do teste, segundo dados obtidos em
diversas investigaes, o teste fivel, obtendo um coeficiente Alfa de Cronbach de 0,86
quanto ao valor de consistncia interna no estudo original (Kovacs, 2004). Verifica-se, ainda,
a existncia de evidncia emprica sobre os valores de validade concorrente, de critrio e de
constructo da prova (Kovacs, 2004).

Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas (Bene, 1985)


O TRF, Verso Crianas desenvolvido por Bene (1985) caracteriza-se por uma prova

projectiva que visa medir os sentimentos da criana avaliada face aos membros da sua famlia
e a percepo que a criana tem dos sentimentos dos elementos da famlia relativamente
prpria. Mais concretamente, este instrumento permite avaliar as vertentes positivas (leves/de
ternura Esta pessoa da minha famlia merece um presente bonito; fortes/erotizadas Esta
pessoa da minha famlia gosta de me dar beijinhos) e negativas (leves/de rejeio Esta
82

pessoa da minha famlia nunca est satisfeita; fortes/agressivas s vezes apetecia-me matar
esta pessoa da minha famlia) dos sentimentos emitidos e recebidos pela criana face aos
elementos da famlia, a superproteco materna A minha me preocupa-se que esta pessoa
da famlia possa ser atropelada e, por fim, a superindulgncia parental (paterna Esta a
pessoa da minha famlia de quem o pai gosta mais e materna A me d ateno demais a
esta pessoa da minha famlia). A verso para crianas do teste contm duas formas
compostas por itens distintos: a forma para crianas mais novas (em idade pr-escolar) e a
forma para crianas mais velhas (em idade escolar) utilizando-se na presente investigao a
ltima forma. Assim sendo, esta forma composta por 86 itens, contendo cada item uma frase
que dada criana para a fazer corresponder a um dado membro familiar. Quanto s
caractersticas psicomtricas o teste discrimina as diferenas significativas nas relaes
familiares entre crianas provenientes de diferentes populaes e os mecanismos
psicodinmicos de defesa destacados assumem particular importncia em crianas gravemente
perturbadas (Bene, 1985).

Teste de Relaes Familiares, Verso Casais (Bene, 1976)


Relativamente ao instrumento TRF, Verso Casais da autoria de Bene (1976) pode-se

descrev-lo como uma tcnica projectiva utilizada na avaliao dos sentimentos que um
indivduo casado tem sobre o cnjuge e filhos, assim como, destes elementos perante o
prprio indivduo, segundo a sua percepo. Deste modo, contribui de forma determinante
para a compreenso das interaces emocionais da famlia nuclear. Os autores referem que
esta tcnica pode, ainda, ser utilizada em adultos que tenham pelo menos duas pessoas
prximas a actuar como familiares (e.g., pais solteiros com dois filhos).
As dimenses discriminadas no teste so as seguintes: Sentimentos positivos (leves/de
ternura Esta pessoa da minha famlia merece ser feliz; fortes/erotizados Eu gosto de ser
beijado por esta pessoa da minha famlia) e sentimentos negativos (leves/de rejeio Esta
pessoa da minha famlia, por vezes, tem mau feitio e fortes/agressivos s vezes sinto que
odeio esta pessoa da minha famlia) emitidos e recebidos pelo sujeito em relao aos
elementos da famlia, sentimentos de proteco s vezes preocupo-me que esta pessoa da
famlia possa adoecer e, finalmente, atribuio de incompetncia ou fraqueza Esta pessoa
da minha famlia no consegue lidar bem com dificuldades. A prova constituda por 78
itens, contendo cada item uma frase que dada ao sujeito para a fazer corresponder a um dado
membro familiar (Bene, 1976).

83

As Aventuras de Pata-Negra (Corman, 2001)

A tcnica projectiva PN, da autoria de Louis Corman (2001) foi desenvolvida com o
intuito de avaliar a personalidade e os conflitos inerentes ao funcionamento mental infantil a
partir da abordagem psicanaltica, em crianas com idades compreendidas entre os 4 anos e os
10 anos de idade. Trata-se de um prova composta por um carto designado de Frontispcio, o
qual introduz a prova, o carto Fada que a conclui e, ainda, 17 cartes contendo imagens
figurativas de um porco e da sua famlia, a preto e branco. Perante as solicitaes manifestas e
latentes contidas em cada carto, a criana convidada a escolher os cartes que prefere e a
narrar uma histria inventada por si, dispondo a ordem de sucesso de cada imagem. Este
procedimento permitir que a criana em situao de avaliao projecte a sua realidade
interna, defesas e registos de conflitualizao subjacentes ao seu funcionamento psquico.
Cada carto pode reactivar sucessiva ou simultaneamente vrios registos de conflitualizao
na mesma criana (Boekholt, 2000).

RESULTADOS

Aps a recolha dos dados proceder-se- anlise e descrio qualitativa dos contedos
constantes nas entrevistas semi-directivas realizada com os pais e com a criana, de modo a
formular a anamnese da criana, genograma familiar, classificao social internacional de
Graffard e aceder s percepes familiares da criana, da me e do pai. Em seguida, sero
avaliadas as provas aplicadas criana e respectivas figuras parentais: nas provas do Desenho
Livre, Desenho da Figura Humana (Machover, 1978) e Desenho da Famlia (Corman, 2003)
sero analisadas as modalidades de desenho utilizadas durante a realizao da prova,
atendendo fase de desenvolvimento em que a criana se encontra. O Inventrio de
Depresso para Crianas (Marujo, 1995) ser analisado do ponto de vista quantitativo.
Quanto s provas Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas (Bene, 1985), Teste de
Relaes Familiares, Verso Casais (Bene, 1976) e As Aventuras de Pata-Negra (Corman,
2001) sero cotados os procedimentos alusivos s respostas em cada uma das provas e
avaliado o seu valor qualitativo. Estes resultados sero integrados aos resultados obtidos nas
entrevistas semi-directivas, de modo a aceder a uma leitura compreensiva das percepes
familiares presentes em cada uma das famlias de crianas com organizao depressiva
constantes na presente investigao.

84

Anexo C: Consentimento Informado

No mbito da elaborao da tese de dissertao de Mestrado Integrado em Psicologia


Clnica do ISPA IU, decorre actualmente um estudo sobre crianas com instabilidade,
comportamentos agressivos e/ou inibio motora e social, com possveis repercusses a nvel
escolar, dificuldades do sono, alimentares, gastrointestinais e/ou do controlo esfincteriano.
Mais concretamente, esta investigao incidir sobre a maneira como estas crianas e as suas
figuras parentais percepcionam as prprias relaes familiares. Pretende-se obter resultados
com efeitos ao nvel da preveno e interveno da prtica clnica, atravs do enriquecimento
dos conhecimentos dos tcnicos que interagem frequentemente com crianas e/ou famlias de
modo a que se possa intervir atempadamente, apoiando as famlias nas dificuldades
encontradas. Espera-se, ainda, contribuir para o desenvolvimento de uma interveno
psicoteraputica (individual e/ou familiar) mais centrada e atenta s necessidades especficas
destas crianas e das suas famlias, nomeadamente das figuras parentais. Esta investigao
est a ser conduzida pela aluna Margarida Neves sob a responsabilidade do Prof. Doutor
Emlio Salgueiro.
Na concretizao da investigao ser necessria a realizao de cerca de trs
encontros previamente marcados para a mesma hora em que a criana tem consulta na
Unidade de Pedopsiquiatria (Servio de Pediatria) do Hospital e/ou aps esta consulta, com o
objectivo de se proceder recolha dos dados. No caso de impossibilidade em comparecer no
horrio pr-estabelecido para a recolha de dados poder-se- marcar a sesso para um horrio
conveniente famlia e investigadora.
O primeiro encontro inicialmente contar com a presena de ambos os pais, onde ser
realizada uma entrevista relativa histria e funcionamento familiar (durao varivel de 40
minutos). Segue-se uma sesso apenas com um dos pais para efeitos de administrao de um
teste sobre relaes familiares com durao aproximada de 30 minutos. Por fim, uma sesso
onde somente a criana estar presente, na qual ser realizada uma breve entrevista e
administradas provas associadas ao contexto familiar e pessoal (cerca de 60 minutos de
durao).
O segundo encontro, num primeiro momento, contar com a presena do pai/me que
no realizou a ltima sesso sozinho(a) para realizao da prova sobre relaes familiares,
durante 30 minutos aproximadamente e, num segundo momento, apenas com a criana sero
utilizadas tcnicas avaliativas da sua situao clnica e familiar (cerca de 60 minutos de
durao).

85

Por fim, a ltima sesso ser realizada unicamente com a criana, de forma, a que se
proceda passagem de uma prova projectiva infantil (aproximadamente 60 minutos de
durao).
O local de realizao destes encontros ser numa sala da Unidade de Pedopsiquiatria.
Deste modo, solicitamos a sua colaborao e do seu filho(a), pois para que esta investigao
se realize necessitamos de contar com a presena de participantes disponveis. A vossa
participao reveste-se da maior importncia para ns.
H que referir ainda, que a sua participao e a da criana tm um carcter
completamente voluntrio, podendo desistir do estudo a qualquer momento sem qualquer tipo
de penalizao para ambos. Se no pretender que faam parte deste estudo pode desistir agora
ou como referido anteriormente, em qualquer outra altura.
Ao aceitar participar nesta investigao garantimos-lhe total confidencialidade e a
devida proteco dos dados que sero guardados num local seguro, apenas acessvel aos
investigadores do estudo, destinando-se apenas a fins de investigao.
S as crianas que obtiverem o presente documento assinado pelos pais participaro
no estudo.
Se sentir necessidade de esclarecer alguma informao, por favor, entre em contacto
connosco atravs do seguinte endereo electrnico:
Margarida Neves:
E-mail: margarida.pereiraneves@gmail.com

Muito obrigado pela sua disponibilidade e colaborao.

Compreendi o que li e estou de acordo,

_______________________________________________

_____________, ____de________________de 2011.

86

Anexo D: Autorizao para Recolha de Dados

87

Anexo E: Guio de Entrevista dos Pais

Identificao da Criana

Nome: ______________________________________ Gnero: __________________

Idade: ________________________

Data de Nascimento: ____/____/____

Naturalidade: ____________________

Nacionalidade: __________________

Ano de escolaridade: _____________________

Reprovou algum ano? ______ Se sim, qual (quais)? __________

Motivo(s):___________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________

Caracterizao Scio-Demogrfica da Famlia

Quem so os elementos que compem o agregado familiar (elementos que vivem na mesma
casa)?
(Constituio do genograma familiar)

88

Me
Idade: ________
Naturalidade: ____________________
Estado Civil: ___________________

Data de Nascimento: ____/____/____


Nacionalidade: ____________________
Habilitaes Literrias: _______________

Profisso: ____________________________ Situao Profissional: _______________

Quais so os seus principais papis na famlia?

Quais so os seus principais gostos e interesses pessoais?

Pai
Idade: ________
Naturalidade: ____________________
Estado Civil: ___________________

Data de Nascimento: ____/____/____


Nacionalidade: ____________________
Habilitaes Literrias: _______________

Profisso: ____________________________ Situao Profissional: _______________

Quais so os seus principais papis na famlia?

Quais so os seus principais gostos e interesses pessoais?

Irmo()
Gnero: ___________________
Idade: ________
Naturalidade: ____________________
Estado Civil: ___________________

Data de Nascimento: ____/____/____


Nacionalidade: ____________________
Habilitaes Literrias: _______________

Ao cuidado de/Creche/Infantrio/Escola (ano frequentado): ______________________


Profisso: ____________________________ Situao Profissional: _______________
89

Irmo()
Gnero: ___________________
Idade: ________
Naturalidade: ____________________
Estado Civil: ___________________

Data de Nascimento: ____/____/____


Nacionalidade: ____________________
Habilitaes Literrias: _______________

Ao cuidado de/Creche/Infantrio/Escola (ano frequentado): ______________________


Profisso: ____________________________ Situao Profissional: _______________

Irmo()
Gnero: ___________________
Idade: ________
Naturalidade: ____________________
Estado Civil: ___________________

Data de Nascimento: ____/____/____


Nacionalidade: ____________________
Habilitaes Literrias: _______________

Ao cuidado de/Creche/Infantrio/Escola (ano frequentado): ______________________


Profisso: ____________________________ Situao Profissional: _______________

Irmo()
Gnero: ___________________
Idade: ________
Naturalidade: ____________________
Estado Civil: ___________________

Data de Nascimento: ____/____/____


Nacionalidade: ____________________
Habilitaes Literrias: _______________

Ao cuidado de/Creche/Infantrio/Escola (ano frequentado): ______________________


Profisso: ____________________________ Situao Profissional: _______________

Outro membro do agregado familiar


Grau de Parentesco face criana: __________________
Idade: ________
Naturalidade: ____________________
Estado Civil: ___________________

Gnero: ______________

Data de Nascimento: ____/____/____


Nacionalidade: ____________________
Habilitaes Literrias: _______________

Ao cuidado de/Creche/Infantrio/Escola (ano frequentado): ______________________


Profisso: ____________________________ Situao Profissional: _______________

Outro membro do agregado familiar


Grau de Parentesco face criana: __________________
Idade: ________

Gnero: ______________

Data de Nascimento: ____/____/____


90

Naturalidade: ____________________
Estado Civil: ___________________

Nacionalidade: ____________________
Habilitaes Literrias: _______________

Ao cuidado de/Creche/Infantrio/Escola (ano frequentado): ______________________


Profisso: ____________________________ Situao Profissional: _______________

Relaes Familiares

Qual a situao familiar actual (apoios sociais e/ou familiares, existncia de doenas fsicas
e/ou psicolgicas, problemas sociais, econmicos, exposio a fontes de stress, entre outros)?

Algum membro da famlia necessita de se ausentar ou ausentou-se no passado


temporariamente ou com frequncia, por motivos de trabalho, estudo, ou outros? Quando?
Durante quanto tempo? Como que a criana reagiu a essa(s) separao(es)? E os restantes
membros da famlia?

Algum membro da famlia faleceu, separou-se ou divorciou-se desde a gravidez da criana?


Quem? Qual o possvel impacto na famlia?

91

Como a relao da criana com a me?

Como a relao da criana com o pai?

Como a relao da criana com os irmos (com cada um)?

E com os restantes membros da famlia?

Gostaria que me descrevessem a vossa relao (relao do casal parental).

Como a relao da me com a sua famlia de origem?

E como a relao do pai com a sua famlia de origem?

92

Sintomas da Criana e Impacto Familiar

Quais so as principais preocupaes actuais sentidas face criana (Comportamento


alimentar, sono, linguagem, controlo esfincteriano, atitude face a outras crianas e adultos,
medos, entre outros)?

Qual o impacto sentido na famlia?

93

Anexo F: Classificao Social Internacional de Graffard

CLASSIFICAO SOCIAL INTERNACIONAL ESTABELECIDA PELO


PROFESSOR GRAFFAR
(Bruxelas)

Este mtodo baseia-se no estudo, no apenas de uma caracterstica social da famlia,


mas num conjunto de cinco critrios, a saber:

1. A profisso;
2. Nvel de instruo;
3. Fontes de rendimento familiar;
4. Conforto do alojamento;
5. Aspecto do bairro habitado.

Numa primeira fase, dever atribuir-se a cada famlia observada uma pontuao para
cada um dos cinco critrios enumerados e, numa segunda fase, obter-se- com a soma destas
pontuaes o escalo que a famlia ocupa na sociedade.

1. A PROFISSO

Classificar-se-o as famlias em cinco categorias, segundo a profisso exercida pelo


pai. Se a me exercer uma profisso de nvel mais elevado do que a do pai, neste caso, servir
de base para a classificao da famlia.

1. Grau: Directores de bancos, directores tcnicos de empresas, licenciados, engenheiros,


profissionais com ttulos universitrios ou de escolas especiais e militares de alta patente.
2. Grau: Chefes de seces administrativas ou de negcios de grandes empresas,
subdirectores de bancos, peritos, tcnicos e comerciantes.
3. Grau: Ajudantes tcnicos, desenhadores, caixeiros, contra-mestres, oficiais de primeira,
encarregados, capatazes e mestres-de-obras.
4. Grau: Ensino primrio completo. Motoristas, polcias, cozinheiros, etc. (operrios
especializados).
5 Grau: Jornaleiros, mandaretes, ajudantes de cozinha, mulheres de limpeza, etc.
(trabalhadores manuais ou operrios no especializados).
94

2.

NVEL DE INSTRUO

As categorias estabelecidas so as seguintes:

1. Grau: Ensino universitrio ou equivalente (+ 12 anos de estudo).


2. Grau: Ensino mdio ou tcnico superior (10 a 11 anos de estudo).
3. Grau: Ensino mdio ou tcnico inferior (8 a 9 anos de estudo).
4. Grau: Ensino primrio completo (6 anos de estudo).
5. Grau: Ensino primrio incompleto ou nulo.

Exemplos de graus de instruo

1. Grau: Catedrticos e assistentes, doutores ou licenciados, ttulos universitrios ou de


escolas superiores ou especiais, diplomados, economistas, notrios, juzes, magistrados,
agentes do Ministrio Pblico, militares de Academia.
2. Grau: Tcnicos e peritos.
3. Grau: Cursos de liceu, industrial ou comercial, militares de baixa patente ou sem
Academia.
4. Grau: Ensino primrio completo.
5. Grau: Um ou dois anos de escola primria, saber ler e escrever ou analfabetos.

3. FONTES DE RENDIMENTO FAMILIAR

Segundo a principal fonte de rendimento da famlia, adoptam-se as cinco categorias


seguintes:

1. Grau: A fonte principal fortuna herdada ou adquirida.


2. Grau: Os rendimentos consistem em lucros de empresas, altos honorrios, lugares bem
remunerados, etc.
3. Grau: Os rendimentos correspondem a um vencimento mensal fixo. Tipo funcionrio.
4. Grau: Os rendimentos resultam de salrios; ou seja remunerao por semana, por jorna,
por horas ou tarefa.
5. Grau: O indivduo ou famlia so sustentados pela beneficncia pblica ou privada. No
se incluem, neste grupo, as penses de desemprego ou de incapacidade para o trabalho.

95

Exemplos de rendimentos familiares

1. Grau: Pessoas que vivem de rendimentos, proprietrios de grandes indstrias ou grandes


estabelecimentos comerciais.
2. Grau: Encarregados e gerentes, lugares com adio de rendimentos igual aos
encarregados e gerentes, representantes de grandes firmas comerciais. Profisses liberais com
grandes vencimentos.
3. Grau: Empregados do Estado, Governo Civil ou Cmaras Municipais, oficiais de
primeira, subgerentes ou cargos de responsabilidade em grandes empresas. Profisses liberais
de mdio rendimento. Caixeiros-viajantes.
4. Grau: Operrios, empregados de comrcio e escriturrios.
5. Grau: Sem rendimentos.

4. CONFORTO DO ALOJAMENTO

Trata-se de dar uma impresso de conjunto, ainda que um pouco subjectiva.


Estabelecem-se cinco categorias:

Grupo 1.: Casas ou andares luxuosos e muito grandes, oferecendo aos seus moradores o
mximo conforto.
Grupo 2.: Categoria intermdia casas ou andares que sem serem to luxuosas como as da
categoria precedente so, no obstante, espaosos e confortveis.
Grupo 3.: Casas ou andares modestos, bem construdos e em bom estado de conservao,
bem iluminadas e arejadas, com cozinha e casa de banho.
Grupo 4.: Categoria intermdia entre 3 e 5.
Grupo 5.: Alojamentos imprprios para uma vida decente, choas, barracas ou andares
desprovidos de todo o conforto, ventilao, iluminao ou tambm aqueles onde moram
demasiadas pessoas em promiscuidade.

5. ASPECTO DO BAIRRO HABITADO

Grupo 1.: Bairro residencial elegante, onde o valor do terreno ou os alugueres so elevados.
Grupo 2.: Bairro residencial bom, de ruas largas com casas confortveis e bem conservadas.
Grupo 3.: Ruas comerciais ou estreitas e antigas, com casas de aspecto geral menos
confortvel.
96

Grupo 4.: Bairro operrio, populoso, mal arejado ou bairro em que o valor do terreno est
diminudo como consequncia da proximidade de oficinas, fbricas, estaes de caminho-deferro, etc.
Grupo 5.: Bairros de lata.

CLASSIFICAO SOCIAL

A soma total dos pontos obtidos na classificao dos cinco critrios d-nos uma
pontuao final que corresponde classe social, conforme a classificao que se segue:

Classe 1

Famlias cuja soma de pontos vai de 5 a 9.

Classe II

Famlias cuja soma de pontos vai de 10 a 13.

Classe III

Famlias cuja soma de pontos vai de 14 a 17.

Classe lV

Famlias cuja soma de pontos vai de 18 a 21.

Classe V

Famlias cuja soma de pontos vai de 22 a 25.

(Gomes Pedro, 1985)


97

Anexo G: Itens do Instrumento Teste de Relaes Familiares, Verso Casais (Bene,


1976)

Sentimentos emitidos pelo sujeito em relao s pessoas da famlia

Sentimentos positivos leves (de ternura)


00. Esta pessoa da famlia muito simptica.
01. Esta pessoa da famlia muito alegre.
02. Esta pessoa da famlia muito prestvel.
03. Gosto de escutar o que esta pessoa da famlia tem para dizer.
04. Esta pessoa da famlia nunca me desaponta.
05. Esta pessoa da famlia muito divertida.
06. Esta pessoa da famlia merece ser feliz.
07. Esta pessoa da famlia amigvel.
08. Esta pessoa da famlia uma boa companhia.
09. Esta pessoa da famlia muito bondosa.

Sentimentos positivos fortes (erotizados)


10. Gosto de acarinhar esta pessoa da famlia.
11. Gosto que esta pessoa da famlia me beije.
12. Gosto de estar sozinho(a) com esta pessoa da famlia.
13. Gostava que esta pessoa da famlia estivesse sempre ao p de mim.
14. Sinto-me muito prximo(a) desta pessoa da famlia.
15. Estou disposto(a) a fazer tudo por esta pessoa da famlia.
16. Estou muito orgulhoso(a) desta pessoa da famlia.
17. Gosto de abraar esta pessoa da famlia.

Sentimentos negativos leves (de rejeio)


20. s vezes esta pessoa da famlia demasiado picuinhas.
21. s vezes esta pessoa da famlia chata.
22. Esta pessoa da famlia desmancha-prazeres.
23. s vezes esta pessoa da famlia irrita-se muito depressa.
24. Esta pessoa da famlia por vezes tem mau feitio.
25. s vezes esta pessoa da famlia queixa-se demais.
26. s vezes esta pessoa da famlia fica chateada sem ter razo para isso.
98

27. Esta pessoa da famlia resmunga demasiado.


28. s vezes esta pessoa da famlia no tem muita pacincia.
29. s vezes esta pessoa da famlia fica zangada demais.

Sentimentos negativos fortes (agressivos)


30. s vezes apetece-me matar esta pessoa da famlia.
31. s vezes gostava que esta pessoa da famlia se fosse embora.
32. s vezes odeio esta pessoa da famlia.
33. s vezes apetece-me bater nesta pessoa da famlia.
34. s vezes penso que seria mais feliz se esta pessoa no fosse da nossa famlia.
35. s vezes esta pessoa da famlia d-me a volta ao juzo.
36. s vezes desprezo esta pessoa da famlia.
37. Esta pessoa da famlia consegue fazer-me sentir muito irritado(a).

Sentimentos recebidos pelo sujeito por parte das pessoas da famlia

Sentimentos positivos leves (de ternura)


40. Esta pessoa da famlia aprecia-me muito.
41. Esta pessoa da famlia muito simptica para mim.
42. Esta pessoa da famlia gosta muito de mim.
43. Esta pessoa da famlia d-me ateno.
44. Esta pessoa da famlia gosta de me ajudar.
45. Esta pessoa da famlia aprecia a minha companhia.
46. Esta pessoa da famlia compreende-me mesmo.
47. Esta pessoa da famlia escuta o que eu tenho para dizer.

Sentimentos positivos fortes (erotizados)


50. Esta pessoa da famlia gosta de me beijar.
51. Esta pessoa da famlia gosta de me abraar.
52. Esta pessoa da famlia quer mesmo o meu amor.
53. Esta pessoa da famlia gosta de estar sozinha comigo.
54. Esta pessoa da famlia muito carinhosa comigo.
55. Esta pessoa da famlia ama-me muito.
56. Esta pessoa da famlia quer estar sempre ao p de mim.
57. Esta pessoa da famlia gosta mais de mim do que dos outros.
99

Sentimentos negativos leves (de rejeio)


60. s vezes esta pessoa da famlia fica ressentida comigo.
61. Esta pessoa da famlia gosta de gozar comigo.
62. s vezes esta pessoa da famlia nem sempre faz o que eu gostaria que fizesse.
63. s vezes esta pessoa da famlia faz coisas nas minhas costas.
64. Esta pessoa da famlia nem sempre me ajuda quando preciso.
65. s vezes esta pessoa da famlia resmunga comigo.
66. s vezes esta pessoa da famlia fica zangada comigo.
67. Esta pessoa da famlia faz-me sentir frustrado(a).

Sentimentos negativos fortes (agressivos)


70. Esta pessoa da famlia diz coisas s para magoar os meus sentimentos
71. Esta pessoa da famlia faz a minha vida miservel.
72. Esta pessoa da famlia faz-me sentir sem valor.
73. Esta pessoa da famlia faz-me sentir intil.
74. Esta pessoa da famlia malcriada para mim.
75. Esta pessoa da famlia no precisa do meu amor.
76. Esta pessoa da famlia est sempre contra mim.
77. Esta pessoa da famlia no gosta de mim.

Sentimentos de proteco

80. s vezes preocupo-me que esta pessoa da famlia se possa constipar.


81. s vezes preocupo-me que esta pessoa da famlia possa adoecer.
82. s vezes preocupo-me que esta pessoa da famlia possa sofrer um acidente.
83. s vezes preocupo-me que esta pessoa da famlia possa sofrer um esgotamento nervoso.
84. s vezes preocupo-me que possa acontecer alguma coisa a esta pessoa da famlia.

Atribuio de incompetncia ou fraqueza

90. Esta pessoa da famlia no tem uma personalidade suficientemente forte.


91. Esta pessoa da famlia no consegue lidar suficientemente bem com dificuldades.
92. Esta pessoa da famlia no consegue enfrentar suficientemente bem as outras pessoas.
93. Esta pessoa da famlia deveria ajudar mais em casa.
94. Esta pessoa deveria desempenhar um papel mais importante na vida da famlia.
100

Anexo H: Guio de Entrevista da Criana

Identificao da Criana

Nome:_____________________________________ Idade:______________

Interesses/Actividades

O que que tu gostas de fazer nos teus tempos livres?

Frequentas alguma actividade desportiva ou cultural (dana, teatro, msica, etc.)? Qual?

Tens animais de estimao? Quais?

Amigos

Quem so os teus amigos(as) (nome e idade)?

De onde os(as) conheces?

O que que costumam fazer juntos(as)?

Tens um(a) amigo(a) preferido(a) (melhor amigo/a)? Quem ?

101

Escola

Em que ano andas?

O que que gostas mais na escola? Porqu?

O que que gostas menos na escola? Porqu?

Se pudesses mudar alguma coisa na escola, o que seria?

Como preferias que fosse?

Onde que costumas fazer os teus trabalhos de casa?

Tens ajuda de algum? De quem?

102

Famlia

Quem so as pessoas da tua famlia?

Com quem vives (nome, idade, grau de parentesco face criana)?

Como a tua me?

Como o teu pai?

Como so os teus irmos(s) (ou outras pessoas da famlia mencionadas)?

Como que os teus pais se do um com o outro? O que pensas/sentes com isso?

Dormes com algum ou partilhas o quarto com algum? Se sim, com quem?

Se pudesses mudar alguma coisa na tua famlia, o que seria?

Como preferias que fosse?

103

Fantasias/Sonhos/Medos

O que que gostarias de ser quando fores grande? Porqu?

Quais so os teus maiores sonhos/desejos?

Se pudesses mudar alguma coisa em ti, o que seria?

Como preferias ser?

Costumas sonhar? Se sim, com o qu?

Quais so os teus medos? O que fazes quando te sentes assim?

E as tuas preocupaes? O que fazes quando te sentes assim?

104

Anexo I: Itens da Forma para Crianas em Idade Escolar do Teste de Relaes


Familiares, Verso Crianas (Bene, 1985)

Sentimentos emitidos pela criana em relao s pessoas da famlia

Sentimentos positivos leves (de ternura)


00. Esta pessoa da famlia muito simptica.
01. Esta pessoa da famlia muito alegre.
02. Esta pessoa da famlia ajuda sempre os outros.
03. Esta pessoa da famlia tem boas maneiras.
04. Esta pessoa da famlia nunca me desaponta.
05. Esta pessoa da famlia muito divertida.
06. Esta pessoa da famlia merece um bom presente.
07. Esta pessoa da famlia boa pessoa.
08. muito bom brincar com esta pessoa da famlia.
09. Esta pessoa da famlia muito bondosa.

Sentimentos positivos fortes (erotizados)


10. Gosto de fazer festinhas a esta pessoa da famlia.
11. Gosto que esta pessoa da famlia me d beijinhos.
12. s vezes gostava de poder dormir na mesma cama com esta pessoa da famlia.
13. Gostava que esta pessoa da famlia estivesse sempre ao p de mim.
14. Gostava que esta pessoa da famlia gostasse mais de mim do que dos outros.
15. Quando me casar gostava que fosse com uma pessoa parecida com esta pessoa da famlia.
16. Gosto que esta pessoa da famlia me faa ccegas.
17. Gosto de abraar esta pessoa da famlia.

Sentimentos negativos leves (de rejeio)


20. s vezes esta pessoa da famlia demasiado picuinhas.
21. s vezes esta pessoa da famlia chata.
22. Esta pessoa da famlia desmancha-prazeres.
23. s vezes esta pessoa da famlia irrita-se muito depressa.
24. Esta pessoa da famlia por vezes tem mau feitio.
25. s vezes esta pessoa da famlia queixa-se demais.
26. s vezes esta pessoa da famlia fica chateada sem ter razo para isso.
105

27. Esta pessoa da famlia nunca est satisfeita.


28. s vezes esta pessoa da famlia no tem muita pacincia.
29. s vezes esta pessoa da famlia fica zangada demais.

Sentimentos negativos fortes (agressivos)


30. s vezes apetece-me matar esta pessoa da famlia.
31. s vezes gostava que esta pessoa da famlia se fosse embora.
32. s vezes odeio esta pessoa da famlia.
33. s vezes apetece-me bater nesta pessoa da famlia.
34. s vezes penso que seria mais feliz se esta pessoa no fosse da nossa famlia.
35. s vezes fico farto desta pessoa da famlia.
36. s vezes quero fazer coisas s para chatear esta pessoa da famlia.
37. Esta pessoa da famlia consegue fazer-me sentir muito irritado(a).

Sentimentos recebidos pela criana por parte das pessoas da famlia

Sentimentos positivos leves (de ternura)


40. Esta pessoa da famlia carinhosa para mim.
41. Esta pessoa da famlia muito simptica para mim.
42. Esta pessoa da famlia gosta muito de mim.
43. Esta pessoa da famlia d-me ateno.
44. Esta pessoa da famlia gosta de me ajudar.
45. Esta pessoa da famlia gosta de brincar comigo.
46. Esta pessoa da famlia compreende-me mesmo.
47. Esta pessoa da famlia escuta o que eu tenho para dizer.

Sentimentos positivos fortes (erotizados)


50. Esta pessoa da famlia gosta de me dar beijinhos.
51. Esta pessoa da famlia gosta de me abraar.
52. Esta pessoa da famlia gosta de me dar festinhas.
53. Esta pessoa da famlia gosta de me ajudar quando estou a tomar banho.
54. Esta pessoa da famlia gosta de me fazer ccegas.
55. Esta pessoa da famlia gosta de estar na cama comigo.
56. Esta pessoa da famlia quer estar sempre ao p de mim.
57. Esta pessoa da famlia gosta mais de mim do que dos outros.
106

Sentimentos negativos leves (de rejeio)


60. s vezes esta pessoa da famlia faz-me uma cara zangada.
61. Esta pessoa da famlia gosta de gozar comigo.
62. s vezes esta pessoa da famlia manda-me embora.
63. Esta pessoa da famlia no brinca comigo quando eu gostaria que brincasse.
64. Esta pessoa da famlia nem sempre me ajuda quando estou em apuros.
65. s vezes esta pessoa da famlia ralha comigo.
66. s vezes esta pessoa da famlia fica zangada comigo.
67. Esta pessoa da famlia est muito ocupada para ter tempo para mim.

Sentimentos negativos fortes (agressivos)


70. Esta pessoa da famlia bate-me muito.
71. Esta pessoa da famlia castiga-me muito.
72. Esta pessoa da famlia faz-me sentir burro.
73. Esta pessoa da famlia mete-me medo.
74. Esta pessoa da famlia m para mim.
75. Esta pessoa da famlia faz-me sentir infeliz.
76. Esta da famlia est sempre a queixar-se de mim.
77. Esta pessoa da famlia no gosta o suficiente de mim.

Sentimentos de superproteco materna

80. A me preocupa-se que esta pessoa da famlia se possa constipar.


81. A me preocupa-se que esta pessoa da famlia possa adoecer.
82. A me preocupa-se que esta pessoa da famlia possa ser atropelada.
83. A me preocupa-se que esta pessoa da famlia se possa magoar.
84. A me preocupa-se que alguma coisa possa acontecer a esta pessoa da famlia.
85. A me tem medo de deixar esta pessoa da famlia andar demasiado por a.
86. A me tem medo de deixar esta pessoa da famlia brincar com crianas brutas.
87. A me preocupa-se que esta pessoa da famlia no coma o suficiente.

Sentimentos de superindulgncia parental

Sentimentos de superindulgncia paterna


90. Esta a pessoa da famlia com quem o pai se preocupa mais.
107

91. Esta a pessoa da famlia a quem o pai d mais ateno.


92. Esta a pessoa da famlia a quem o pai d mimos demais.
93. Esta a pessoa da famlia com quem o pai passa mais tempo.
94. Esta a pessoa da famlia que o pai gosta mais.

Sentimentos de superindulgncia materna


95. Esta a pessoa da famlia com quem a me se preocupa mais.
96. Esta a pessoa da famlia a quem a me d mais ateno.
97. Esta a pessoa da famlia a quem a me d mimos demais.
98. Esta a pessoa da famlia com quem a me passa mais tempo.
99. Esta a pessoa da famlia que a me gosta mais.

108

Anexo J: Inventrio de Depresso para Crianas

CDI

Nome____________________________________
Sexo_____________________________________
Data de Nascimento_________________________
Escola____________________________________
Ano de Escolaridade_________________________
Data da Aplicao___________________________

As crianas e os adolescentes s vezes pensam e sentem de maneira diferente uns dos


outros.
Este questionrio apresenta vrias ideias e sentimentos arrumados em grupos.
De cada grupo, escolhe uma frase que melhor mostre aquilo que tens pensado e
sentido nas ltimas duas semanas. S depois de teres escolhido uma frase de um grupo que
avanas para o grupo seguinte.
No h respostas certas nem erradas; Escolhe apenas a frase que melhor descreve a tua
forma de sentir e de pensar, nos ltimos tempos. Faz uma cruz (X) no quadrado que
corresponde frase que escolheste.

Tens em baixo um exemplo para aprender a preencher o questionrio; Coloca a cruz


na frase que melhor te descreve.

Exemplo:

Estou sempre a ler livros.


Leio livros muitas vezes.
Leio livros de vez em quando.
Nunca leio livros.

109

Lembra-te que deves escolher as frases que melhor mostram os teus sentimentos e
ideias das ltimas duas semanas.

1.

Nunca me sinto triste.


s vezes sinto-me triste.
Sinto-me quase sempre triste.
Sinto-me sempre triste.

2.

Nunca nada me vai correr bem.


S algumas coisas me vo correr bem.
Muitas coisas me vo correr bem.
As coisas vo-me sempre correr bem.

3.

Fao quase tudo bem.


Fao algumas coisas bem.
Fao muitas coisas mal.
Fao tudo mal.

4.

Tudo me d alegria.
H muitas coisas que me alegram.
Tenho poucas coisas que me alegrem.
Nada me d alegria.

5.

Sou quase sempre mau.


Sou mau muitas vezes.
Sou mau de vez em quando.
Nunca sou mau.
110

6.

Nunca penso nas coisas ms que me podem acontecer.


De vez em quando penso nalguma coisa m que me possa acontecer.
Preocupo-me muito com as coisas ms que me vo acontecer.
Estou sempre a pensar que me vo acontecer coisas terrveis.

7.

Detesto-me.
H muitas coisas em mim de que no gosto.
H s algumas coisas em mim de que eu no gosto.
Gosto muito de mim.

8.

Todas as coisas ms so culpa minha.


Muitas coisas ms acontecem por minha culpa.
Algumas coisas ms acontecem por minha culpa.
As coisas ms que acontecem no so culpa minha.

9.

No penso em matar-me.
Penso s vezes em matar-me mas nunca o farei.
Penso muito em matar-me e sei que sou capaz de o fazer.
Quero matar-me.

10.

Todos os dias tenho vontade de chorar.


Muitas vezes tenho vontade de chorar.
S de vez em quando que tenho vontade de chorar.
Nunca tenho vontade de chorar.

111

11.

Tudo me aborrece imenso.


Aborreo-me com muitas coisas.
Algumas coisas aborrecem-me.
Nada me aborrece.

12.

Gosto de estar com pessoas.


De vez em quando no gosto de estar com pessoas.
Quase nunca quero estar com pessoas.
Nunca quero estar com pessoas.

13.

Nunca consigo tomar decises.


Muitas vezes no consigo tomar decises.
De vez em quando -me difcil tomar decises.
Tomo decises facilmente.

14.

Gosto do meu aspecto.


H algumas coisas no meu aspecto de que no gosto muito.
H muitas coisas no meu aspecto de que no gosto nada.
Sou feio e tenho mau aspecto.

15.

Tenho sempre que me esforar muito para fazer os trabalhos da escola.


Muitas vezes tenho de me esforar para fazer os trabalhos da escola.
Fazer os trabalhos da escola no me custa muito.
Consigo fazer facilmente os trabalhos da escola.

112

16.

Todas as noites me custa muito a dormir.


Muitas noites tenho dificuldade em dormir.
De vez em quando no durmo bem.
Durmo sempre muito bem.

17.

Nunca me sinto cansado.


De vez em quando sinto-me cansado.
Sinto-me cansado muitas vezes.
Sinto-me sempre cansado.

18.

Nunca me apetece comer.


Muitas vezes tenho dificuldade em comer.
De vez em quando no me apetece comer.
Como muito bem.

19.

No me preocupo com a minha sade.


Por vezes preocupo-me um pouco com a minha sade.
Preocupo-me muito com a minha sade.
Ando sempre terrivelmente preocupado com a minha sade.

20.

No me sinto s.
De vez em quando sinto-me s.
Sinto-me quase sempre muito s.
Sinto-me sempre muito s.

113

21.

Nunca me divirto na escola.


De vez em quando divirto-me na escola.
Divirto-me muitas vezes na escola.
Divirto-me sempre muito na escola.

22.

Tenho imensos amigos.


Tenho alguns amigos mas gostava de ter mais.
Tenho poucos amigos e no preciso ter mais.
No tenho amigos nenhuns.

23.

As minhas notas so boas.


As minhas notas j foram melhores.
Estou com notas fracas.
Tenho notas muito ms.

24.

Nunca vou conseguir ser to bom como os outros.


S nalgumas coisas que consigo ser to bom como os outros.
Consigo ser to bom como os outros em muitas coisas.
Consigo ser to bom como os outros em tudo.

25.

Tenho a certeza que ningum gosta de mim.


Tenho a certeza que a maioria das pessoas no gosta de mim.
Tenho a certeza que s algumas pessoas no gostam de mim.
Tenho a certeza que todos gostam de mim.

114

26.

Fao sempre o que me dizem.


Geralmente fao o que me dizem.
Na maioria das vezes no fao o que me dizem.
Nunca fao o que me dizem.

27.

Dou-me bem com os outros.


Quase nunca ando em brigas.
Ando muitas vezes em brigas.
Ando sempre em brigas.

Copyright: Maria Kovacs Ph. D., 1982.


Traduo e adaptao: Helena gueda Marujo, 1995.

115

Anexo K: Contedo Manifesto e Latente dos Cartes do PN Segundo Chabert (1982) e


Corman (2001)

1. Bebedouro
Contedo Manifesto A cena passa-se no interior. No primeiro plano, PN urina no
bebedouro maior de dois bebedouros. No segundo plano, os dois porcos e os dois leites esto
deitados em lados diferentes de uma barreira.
Contedo Latente Expresso da agressividade para com os imagos parentais.

2. Beijo
Contedo Manifesto No primeiro plano, proximidade de dois porcos. Em segundo
plano, encontra-se um leito atrs de um muro.
Contedo Latente Problemtica edipiana.

3. Batalha
Contedo Manifesto O PN e um dos leites brancos mordem-se. O terceiro leito
afasta-se. Em segundo plano, situa-se o casal de porcos.
Contedo Latente Tema sdico oral de rivalidade fraterna. Agressividade e
sentimentos de culpabilidade que lhe esto associados.

4. Carroa
Contedo Manifesto PN deitado na palha. Dentro de um balo um homem coloca
um leito na carroa enquanto dois porcos e dois leites observam a cena.
Contedo Latente Angstia de separao e/ou para a agressividade nas relaes
familiares.

5. Cabra
Contedo Manifesto PN mama numa cabra.
Contedo Latente Relao com um substituto materno.

6. Partida
Contedo Manifesto Um leito numa estrada em contexto campestre.
Contedo Latente Relao de dependncia e angstia de separao.

116

7. Hesitao
Contedo Manifesto esquerda, o porco com a mancha negra amamenta um leito
branco. direita, o porco branco e um leito branco bebem no bebedouro. PN est ao meio.
Contedo Latente Tema de ambivalncia, rivalidade fraterna ou de excluso.
Conflito entre regresso e maturao no contexto de escolha do objecto privilegiado.

8. Ganso
Contedo Manifesto esquerda, um ganso apanha a cauda de um leito. direita,
outro leito meio escondido por detrs de um muro.
Contedo Latente Relao de agressividade versus castrao.

9. Brincadeiras Sujas
Contedo Manifesto Dois leites divertem-se na gua suja. Um deles atira gua para
a cara de um porco. O terceiro leito fica de fora da brincadeira.
Contedo Latente Agressividade face a um imago parental num contexto anal.

10. Noite
Contedo Manifesto Cena interior. Um estbulo iluminado pela lua dividido em
duas partes por um tabique de tbuas: de um lado, dois porcos juntos, do outro lado, dois
leites deitados e um terceiro em p encostado ao tabique.
Contedo Latente Curiosidade sexual e fantasmas da cena primitiva.

11. Ninhada
Contedo Manifesto Trs recm-nascidos mamam na porca que bebe o contedo do
bebedouro cheio por um dos caseiros. Ao fundo, outro caseiro agarra em palha. No primeiro
plano, por detrs de uma vedao encontram-se trs leites, com PN ao centro.
Contedo Latente Tema do nascimento e das relaes precoces com o imago
materno, possivelmente num contexto de rivalidade fraterna.

12. Sonho Me
Contedo Manifesto PN est deitado. No balo encontra-se o porco com a pata
negra.
Contedo Latente Relao com o imago materno.

117

13. Sonho Pai


Contedo Manifesto PN est deitado. No balo encontra-se o porco branco.
Contedo Latente Relao com o imago paterno.

14. Mamada 1
Contedo Manifesto PN est a mamar no porco com a pata negra.
Contedo Latente Aproximao com o imago materno num contexto de relao
privilegiada.

15. Mamada 2
Contedo Manifesto Em primeiro plano, PN est a mamar no porco com a pata
negra. No segundo plano, dois outros leites.
Contedo Latente Aproximao com o imago materno num contexto de rivalidade
fraterna.

16. Buraco
Contedo Manifesto PN num buraco com gua noite.
Contedo Latente Receio da separao num contexto de perigo. Solido, excluso
e/ou punio.

17. Pequena Escada


Contedo Manifesto PN em p nos ombros de um porco encostado a uma rvore.
Por cima, passarinhos num ninho situado num ramo.
Contedo Latente Funo de holding de um dos imagos parentais.

118

Anexo L: Estudo de Caso 1 Tom (10 anos e 5 meses)

O Tom, de dez anos e cinco meses frequenta o 4 Ano do 1 Ciclo do Ensino Bsico.
uma criana que apresenta um desenvolvimento estato-ponderal adequado ao grupo etrio e
gnero a que pertence. Apresenta um aspecto fsico harmnico, cuidado e limpo, com
vesturio adaptado idade. Estabeleceu um contacto inibido com a observadora,
transparecendo uma postura corporal pouco expressiva e um olhar triste. Evitou manter
contacto ocular com a observadora. Verbalizou pouco e, quando o fez, foi maioritariamente
atravs de monosslabos, num tom de voz baixo. Observou-se uma dificuldade particular na
articulao do fonema /r/. Colaborou nas provas aplicadas, mantendo uma conduta estvel,
controlada e concentrada, sem a presena de indcios de ansiedade face situao de
observao/avaliao. Na ltima sesso (nica vez em que a me o acompanhou por estar de
frias), aps me despedir do Tom e o conduzir sala de espera onde se encontrava a me, o
Tom sentou-se ao seu lado e abraou-a fortemente.
Atravs da consulta num hospital localizado na Grande Lisboa foi encaminhado para a
Unidade de pedopsiquiatria por ansiedade, dificuldades de aprendizagem e queixas de
cefaleias, principalmente quando no quer ir escola e, por vezes, nos dias em que tem jogos
de futebol. acompanhado em consultas teraputicas de frequncia semanal com a psicloga
da Unidade h oito meses e meio, beneficiando, ainda, de interveno familiar.
O Tom vive com os pais e com a irm de sete anos, a Isabel, tambm presente nesta
investigao. O pai de quarenta e seis anos chefe de oficina mecnica e a me com trinta e
nove anos chefe de seco de um hipermercado, mais precisamente, coordenadora do
servio de caixas (tem horrio por turnos, com dois dias de folga rotativos). No final de 2008,
quando o Tom tinha sete anos, a famlia mudou-se para a casa de frias dos avs paternos, na
Pennsula de Setbal, no entanto, o Tom e a Isabel mantm a mesma escola na antiga rea de
residncia, na Grande Lisboa. Devido aos empregos, os pais dispem de pouco tempo para a
famlia, sendo apoiados pelos avs maternos do Tom e da Isabel. Deste modo, quem assume
a funo de levar as crianas escola a av materna quando a me no est de folga e o av
materno vai busc-los escola e acompanha-os s consultas na Unidade. Como o pai trabalha,
por vezes, ao Sbado o Tom e a Isabel ficam com os avs maternos e, mesmo ao Domingo,
quando no esto com o pai, ficam com os avs. Posto isto, o dia-a-dia do Tom distribui-se
da seguinte forma: entra na escola s nove horas, almoa no ATL onde permanece at s
dezoito e trinta/dezanove horas, hora em que o av o vai buscar. Janta nos avs. Os pais
chegam a casa dos avs por volta das vinte horas ou dorme nos avs. Frequenta o futebol duas
vezes por semana e tem os escuteiros ao sbado. Anteriormente tambm tinha aulas de
119

natao mas o Tom deixou de querer ir, queixando-se de dores de barriga e de cabea. De
manh acordava a chorar para no ir tarde natao. Os pais no compreendem esta
desistncia.
O Tom muito ligado me, solicitando muito o seu apoio (e.g., para vestir). Com o
pai gosta de brincar. Como figura disciplinadora na famlia, com o pai o Tom obedece logo
primeira ordem, enquanto com a me dificilmente obedece. Com a irm protector, pois
segundo os pais o Tom um corao doce para a irm, no se lhe pode ralhar porque ela
pequena, diz ele, no entanto, avanam ela mais spera para o Tom. Quanto aos avs,
referem que a av materna permissiva, estimulando pouco a autonomia dos netos. Com
cerca de um ano, por vezes, passou a dormir em casa dos avs e tem o hbito de passar frias
com estes, correndo tudo bem. Na famlia alargada dos pais do Tom desconhecem-se casos
de doena psiquitrica. Contudo, a me revela que em pequena era muito tmida, muito
reservada, parecida com o Tom. No recreio no ia ter com os outros meninos. Por seu lado,
o pai confessa que sempre fui uma pessoa com dificuldades na escola e, por esse motivo,
aos dez anos foi seguido em psicologia. Como nunca gostou de ir escola fazia chantagem
com a me: no ia escola se no tivesse um carrinho. O av paterno faleceu um ano antes do
Tom nascer, com 65 anos, por Cirrose devido ao alcoolismo e a av paterna tem epilepsia.
Nas sesses de recolha de dados com os pais, observou-se que apresentam um aspecto
fsico investido, cuidado e limpo, com vesturio adaptado ao seu grupo etrio. Estabeleceram
um contacto adequado com a observadora, utilizando linguagem rica e espontnea. Senti que
ambos eram pessoas simples e muito expressivas, revelando interesse e entusiasmo em
partilharem comigo as suas vivncias e em participar na investigao. Verbalizaram de modo
equilibrado, transmitindo os pontos de vista prprios, por vezes, discordantes. Ambos
mantiveram contacto ocular comigo, ainda que, tenha observado um olhar muito triste e vazio
na me, o sentimento de culpabilizao, a necessidade de prolongar as respostas s questes
quando pareciam terminadas, verbalizando at ao momento em que eu formulava uma nova
questo, numa tentativa de preencher o espao vazio. A me pareceu-me uma pessoa
significativamente mais negativa que o pai, o qual pareceu assumir-se como a figura que tenta
equilibrar as situaes de forma mais positiva e sem atribuir grande importncia a factos
menos pertinentes.
Quando os questionei sobre a relao de casal o pai respondeu-me de imediato que era
conflituosa e especificou espontaneamente o que queria dizer com esta resposta. A partir
deste momento a me comeou a chorar intensamente, tentando-se controlar, embora, sem
efeito. Assim, prossegui a entrevista com o pai at a me se recompor (passei frente a
questo seguinte relativa relao da me com a famlia de origem). Durante a passagem da
120

prova TRF me, destaca-se ainda o comentrio que fez quando reflectia a colocao do
carto 45 Esta pessoa da famlia aprecia a minha companhia: neste momento sinto-me
tmida e isolada no meu mundo, que no sei bem quem aprecia a minha companhia.
A irm do Tom nasceu de parto prematuro s vinte e oito semanas com 795g,
permanecendo dois meses e meio no hospital e a me quinze dias internada. Na altura, o
Tom tinha trs anos e ficou aos cuidados dos avs maternos durante o tempo de
internamento da me. Contudo, enquanto a irm permaneceu no hospital os pais passavam o
dia com ela, estando com o Tom apenas noite. Os pais reconhecem a existncia de um
ambiente emocional pesado em relao ao estado de sade da filha, sentindo muita
preocupao e ansiedade. Na altura no notaram alteraes no Tom mas nota-se agora. No
transmite aquilo que sente, reservado nas emoes. Como exemplo, este fim-de-semana
ficou com a av e cortou demonstrao de afecto durante a despedida, referem os pais,
admitindo, ainda, que no estariam eventualmente atentos aos sinais do Tom.
Desde o nascimento at aos seis meses e meio o Tom ficou aos cuidados da me. A
partir desse momento at aos cinco anos ficou com a av materna. Aos cinco anos integra um
jardim-de-infncia onde chorou em silncio durante a primeira semana no momento da
separao da famlia. Com seis anos inicia o 1 Ano mantendo-se as dificuldades de separao
da me e da av materna. O Tom insiste que no quer ir para a escola e pede av para
esperar pela professora com ele. Depois de a professora chegar fica bem na escola. Com o pai
dirige-se logo para a aula sem se despedir. Contudo, registou uma boa adaptao e
aprendizagem at Abril de 2008 parece que agora no capaz de fazer o que antes fazia.
Em Maro do mesmo ano a me foi operada s varizes, ficando em casa com a filha quinze
dias. O Tom comentava pois a menina fica em casa contigo. Assim, o Tom comeou a
no querer ir escola, chorando e dizendo no me deixes l. Quando antes os pais sentiam
que fazia os trabalhos-de-casa com entusiasmo, passou a adiar e a desinteressar-se. Sente
dificuldades na memorizao de informao.
Pouco tempo aps a operao da me, no final do 1 Ano, um colega empurrou o
Tom na escola e este abriu o lbio, tendo indicao mdica para no brincar nos prximos
quinze dias. No entanto, o Tom levou muito a srio a indicao, mantendo-se parte no
recreio. Terminados os quinze dias continuou a no ir brincar com medo de se voltar a aleijar,
at que o pai teve uma conversa com ele e, assim, voltou a brincar. Actualmente tem amigos
na escola e um amigo preferencial (menino com dificuldades de aprendizagem). Sempre foi
uma criana muito tmida, reservada e com dificuldades em defender-se dos pares, deixandose agredir at por crianas mais novas.

121

Segundo os pais uma criana que est sempre espera da indicao dos pais, no
tem iniciativa nem opinio sobre alguma coisa que se lhe pergunte, ficando espera da
opinio do adulto, muito insegura e muito infantil, pouco autnoma em comparao com os
colegas e acrescentam no futebol no defende uma bola, tem muito medo de errar e de no
conseguir fazer as coisas, inibindo-se, o que prejudica muito a aprendizagem na escola.
Quando se sente frustrado desabafa s vezes eu no valho nada. Contudo, os pais
consideram que no uma criana que se queixe ou chore, sendo pouco reactivo dor (e.g.,
queimaduras), assim, quando se aleija apenas olha para os pais. Em casa, no existem
cuidados com a exposio da nudez na famlia. Desta forma, ainda que por vezes, o Tom
tome banho sozinho, noutras a me d-lhe banho em conjunto com a irm.
Com a entrada para o jardim-de-infncia e escola o Tom deixou de ir casa-de-banho
com receio de no conseguir fazer a sua higiene sozinho, desenvolvendo encoprese diria (a
partir dos cinco anos). Uma vez na sanita, no conseguia ficar sentado durante todo o
momento da evacuao, sentando-se e levantando-se. Em Maio de 2008 frequentou um
acampamento sem casa-de-banho onde tentou no evacuar, resultando num episdio de
encoprese. Assim, por indicao do pediatra fez um calendrio para a encoprese e desde essa
altura registaram-se quatro episdios de encoprese. Nas frias seguintes com a diminuio da
ansiedade melhorou. Actualmente j no apresenta este sintoma.
No 2 Ano de escolaridade iniciou apoio pedaggico, contudo, sem resultados
significativos, a me pediu professora para que o filho ficasse retido nesse ano. O Tom
esforou-se muito no final do ano e a professora sentiu que devia transitar para o 3 Ano.
Num relatrio escolar do 3 Ano possvel ler que o Tom relaciona-se bem com os adultos
(professora e auxiliares) e com os colegas, embora seja tmido e discreto. Precisa de ser
constantemente valorizado pelo seu trabalho para ganhar auto-estima e confiana. Gosta de
participar nas actividades escolares () possui um ritmo de trabalho lento o que prejudica a
concluso das tarefas, continuando a precisar muito da ajuda da professora. No 4 Ano
regista-se que continua a demorar muito tempo a executar as tarefas e destacam-se as
dificuldades nos domnios de portugus, matemtica e estudo-do-meio.
Anteriormente gravidez do Tom, a me sofreu dois abortos espontneos aos dois
meses de gestao, com um ano de intervalo entre as trs gestaes (incluindo do Tom). A
gravidez foi planeada, ainda que a me se tenha sentido muito ansiosa e receosa devido aos
abortos anteriores. Para a av materna a me passou a sua ansiedade para o filho. A gravidez
ocorreu sem intercorrncias fsicas, com excepo de dor citica no final da gestao. Para a
me o sexo do beb era indiferente, j o pai tinha preferncia por uma menina. O Tom
nasceu s trinta e seis semanas, de parto eutcico. O pai cortou o cordo umbilical. Aps o
122

nascimento do Tom, a me teve apoio da av materna, ainda que pouco, uma vez que a av
cuidava da neta. A me nega a possibilidade de ter sofrido uma depresso ps-parto.
No que concerne ao desenvolvimento do Tom, durante o primeiro ano de vida
recordado como um beb calmo e reservado, no se dando com todas as pessoas. No chorava
muito e aos dois meses j dormia a noite toda era comer e dormir, por vezes, era preciso
acord-lo para comer. Para adormecer gostava de mexer no nariz do adulto. Ficou no quarto
dos pais at aos trs anos. A partir dos sete anos, com a mudana de casa comeou a partilhar
o quarto com a irm, dormindo bem. Desde esta idade passou tambm a dormir com um
boneco, semelhana da irm. O Tom comeou a andar aos treze/catorze meses e a dizer as
primeiras palavras com oito/nove meses (mam, pap, d,). O controlo dos esfncteres
uretrais diurno e nocturno ocorreu aos dois anos e seis meses. No caso dos esfncteres anais,
apesar de no se sentar na sanita continuadamente, em casa pede me e av para lhe
limparem o rabinho (actualmente recusam-se a faz-lo por indicao da psicloga). Contudo,
com a entrada no jardim-de-infncia aos cinco anos desenvolve encoprese secundria. O
Tom foi amamentado at aos seis meses e meio e usou chucha at aos trs anos. A
diversificao alimentar implementou-se sem registo de problemas.
Habitualmente o Tom gosta de jogar Playstation, computador, ver tourada e futebol
(chora quando o Benfica perde). Brinca com carrinhos imitando a profisso do pai
(mecnico). Gosta tambm de ajudar a famlia nas tarefas domsticas, esperando
reconhecimento (e.g., ajudar o av materno no quintal).

123

Guio de Entrevista dos Pais

Identificao da Criana

Nome: Tom

Gnero: Masculino

Idade: 10 Anos e 5 Meses

Data de Nascimento: 2001

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Ano de escolaridade: 4 Ano

Reprovou algum ano? No

Se sim, qual (quais)? __________

O Tom apresenta dificuldades escolares e por isso a me neste momento encontra-se


a ponderar a possibilidade de o filho ficar retido no presente ano. Actualmente o Tom tem
apoio extra-curricular com uma professora de ensino especial (explicao).
(Mais tarde soube que o Tom passou para o 5 Ano).

Caracterizao Scio-Demogrfica da Famlia

Quem so os elementos que compem o agregado familiar (elementos que vivem na mesma
casa)?
(Constituio do genograma familiar)

1999
73

40

46

63

62

41

39

38

38

11

10

124

Me
Idade: 39 Anos

Data de Nascimento: 1971

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: Casada

Habilitaes Literrias: 12 ano

Profisso: Chefe de Seco de um hipermercado coordenadora do servio de caixas


Situao Profissional: Empregada.

Quais so os seus principais papis na famlia?


Tudo. D banho Isabel (por vezes, toma banho sozinha), prepara as refeies,
acompanha os filhos nos estudos, leva-os escola quando est de folga e quando no est a
av materna que assume essa funo.

Quais so os seus principais gostos e interesses pessoais?


Tem pouco tempo livre. Gosta de ir praia, fazer caminhadas junto ao mar o mar
transmite calma, ler um livro, brincar com os filhos (jogar cartas, entre outros).

Pai
Idade: 46 Anos

Data de Nascimento: 1965

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: Casado

Habilitaes Literrias: 9 Ano

Profisso: Chefe de oficina mecnica

Situao Profissional: Empregado

Quais so os seus principais papis na famlia?


Lev-los s actividades extra-curriculares, principalmente o Tom. Arranja carros e
faz pequenas reparaes quando so necessrias.

Quais so os seus principais gostos e interesses pessoais?


Quando tem tempo anda de moto 4, passear, conviver com as pessoas, fazer desporto.

Irmo()
Gnero: Feminino
Idade: 7 Anos

Data de Nascimento: 2004

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: ___________________

Habilitaes Literrias: _______________

Ao cuidado de/Creche/Infantrio/Escola (ano frequentado): 1 Ano


125

Profisso: ____________________________ Situao Profissional: _______________

Relaes Familiares

Qual a situao familiar actual (apoios sociais e/ou familiares, existncia de doenas fsicas
e/ou psicolgicas, problemas sociais, econmicos, exposio a fontes de stress, entre outros)?
A av materna a segunda me deles e o av materno quem os traz s consultas.
Ao domingo ficam com os avs ou com o pai. O pai s vezes trabalha ao sbado. Sentem
stress na famlia mais pela falta de tempo. Como chefe de seco a me assume uma grande
responsabilidade profissional e, como tal, sente que pode penalizar a famlia.

Algum membro da famlia necessita de se ausentar ou ausentou-se no passado


temporariamente ou com frequncia, por motivos de trabalho, estudo, ou outros? Quando?
Durante quanto tempo? Como que a criana reagiu a essa(s) separao(es)? E os restantes
membros da famlia?
No.

Algum membro da famlia faleceu, separou-se ou divorciou-se desde a gravidez da criana?


Quem? Qual o possvel impacto na famlia?
Um ano antes do Tom nascer faleceu o av paterno, por cirrose. Esta doena
decorreu de forma prolongada. A empresa em que trabalhava deixou de lhe pagar e deixou
de trabalhar a partir de Junho de 1999. Em Janeiro de 2000 faleceu. O pai do Tom/Isabel
no era muito ligado ao prprio pai (av do Tom/Isabel), embora se dessem bem.

Como a relao da criana com a me?


protector e preocupado com a me. Do-se bem mas ele muito fechado. A me
puxa por ele e ele fecha-se. Agora conta mais o dia dele, desde que comeou a psicoterapia.
Puxa pela me para o acompanhar e brincar. O factor tempo entre outros no permite que a
me esteja presente. O Tom e a irm estudam numa rea suburbana de Lisboa, a me
trabalha em Lisboa e o pai trabalha na Margem Sul do Tejo.

Como a relao da criana com o pai?


Tem medo que o pai o repreenda dos erros que faz (procura o pai quando est a jogar
futebol). Distrai-se do jogo enquanto procura o pai. Anda em biquinhos de ps no jogo e o
pai chama-o ateno a correr parece que est deprimido, diz o pai. Desiste muito e
126

quando perde fica muito desanimado. No responde aos outros colegas quando o chamam
ateno e defende-se pouco, acrescenta a me. Nem com os primos, mesmo se o estiverem a
aleijar. A irm tambm se lhe bater ele no se defende.

Como a relao da criana com os irmos (com cada um)?


s vezes um pouco s turras. Ela faz as coisas de maneira que os pais pensam que o
Tom o culpado. mais arisca. Eles no podem estar um sem o outro (me). Brincam
um com o outro, mas tambm andam s turras. A me conta que tambm com o prprio
irmo (tio do Tom/Isabel) era assim. Ela firme nas decises. Ele pede apoio me quando
no se sabe defender. Ela defende-se logo.

E com os restantes membros da famlia?


Tem uma boa relao com os avs mas responde ao av como se fosse da mesma
idade. O av fica chateado e sem pacincia com ele e sai de casa. O Tom leva na
brincadeira provoca-o com chapadinhas na testa e chama-o de velho. Nas primeiras vezes
o av no repreendeu logo, agora mais difcil de terminar este tipo de comportamentos. O
av muito nervoso. O Tom faz isto quando os pais no esto presentes. Pede aos avs para
no contarem aos pais, principalmente ao pai que mais rgido.

Gostaria que me descrevessem a vossa relao (relao do casal parental).


Pai: Conflituosa, por m interpretao das coisas. Para o pai as coisas podem ser
banais e a me responde de forma mais agressiva e ficam chateados, sente-se
inferiorizada, diz o pai sobre a me. A me comea a chorar e apenas responde nem
comento. Pai: eles vo buscar a parte mais fraca e depois isso reflecte-se num conjunto de
coisas.

Como a relao da me com a sua famlia de origem?


Muito boa. Com os pais do-se diariamente, v-os todos os dias a minha me a
minha melhor amiga. Com o irmo so mais distantes, ele vive mais longe e cada vez falam
menos, falam mais sobre os filhos. Comunicam mais por telefone. O irmo tambm est mais
distante dos pais e fala com estes mais pelo telefone. Admiro os meus pais porque quando se
deitam como se nada tivesse acontecido e o dia a seguir novo.

127

E como a relao do pai com a sua famlia de origem?


Com a me um bocado conflituosa (av paterna do Tom/Isabel) v as coisas como
h trinta anos. Anteriormente ao nascimento da Isabel a famlia residia numa rea
suburbana de Lisboa, passando a viver numa casa pertencente av paterna do Tom/Isabel
na Margem Sul do Tejo. A av paterna vendeu a casa deles e com esse dinheiro comprou uma
casa para ela viver sem dizer nada a ningum. Tenta fazer tudo a correr. muito poupada,
pouco flexvel, muito ligada igreja, sacrificando-se muito em vez de viver mais a vida. A
relao da av paterna com o irmo do pai no diverge tanto. muito individualista. A
relao da me com a sua famlia mais carinhosa, h mais contacto e afecto. Quando vai
para o hospital no diz nada a ningum e depois queixa-se que no lhe ligam, s sabem
depois de ter alta. muito fechada. Sentem que afasta os outros. muito activa, at se for
preciso faz obras numa casa sozinha, corta o prprio cabelo, renova as coisas. No vem
comer quase nunca a casa deles, mas se eles no vo l chateia-se. Como a av paterna faz
diferena entre o tio do Tom e o pai, no entram tanto em conflito, desculpa mais o tio
paterno do Tom.

Sintomas da Criana e Impacto Familiar

Quais so as principais preocupaes actuais sentidas face criana (Comportamento


alimentar, sono, linguagem, controlo esfincteriano, atitude face a outras crianas e adultos,
medos, entre outros)?
Podia-se defender mais, defender mais a sua opinio. Nos ltimos 15 dias chamou a
me para o tapar ou com sede. No convvio com os colegas da escola tambm no est muito
vontade, no fala muito com eles. Tem um amigo de Lisboa que s vezes vem para esta
margem ao fim-de-semana e com quem est mais vontade. Quando est com os colegas
nos treinos fica a olhar para o pai em vez de interagir com eles. A auto-estima do Tom o
que preocupa mais a me. negativo e acha que no consegue, diz logo para a me fazer por
ele queria que ele fosse mais dinmico. A Isabel diz que vai tentar, ele acha que no
consegue, por exemplo, fazer os laos nos tnis.

Qual o impacto sentido na famlia?


Preocupam-se ao nvel do desenvolvimento dele. A me preocupa-se que ele tenha
confiana nele prprio. Quando veio para aqui era pior (anteriormente s consultas
teraputicas) chorava para ir para a escola, tinha ansiedade para ir para a escola, recusavase a fazer quase tudo.
128

Guio de Entrevista da Criana

Identificao da Criana

Nome: Tom

Idade: 10 Anos e 5 Meses

Interesses/Actividades

O que que tu gostas de fazer nos teus tempos livres?


Jogar futebol (?) jogo na escola e ao p de casa.

Frequentas alguma actividade desportiva ou cultural (dana, teatro, msica, etc.)? Qual?
Jogo futebol (treina na escola do Benfica, o pai do Sporting). Escuteiros (?) vou aos
encontros dos escuteiros. Natao.

Tens animais de estimao? Quais?


Tenho uma caturra (?) chama-se de caturra.

Amigos

Quem so os teus amigos(as) (nome e idade)?


Joaquim (9 anos), Ndia (10 anos), Carolina (10 anos), Joo (6 anos), Joo (10
anos), Guilherme (8 anos), Fbio (9 anos), Gabriel (10 anos), Quaresma (8 anos).

De onde os(as) conheces?


Alguns do ATL e outros da escola.

O que que costumam fazer juntos(as)?


Jogar bola, aos Pikatchus, aos Beyblades, apanhada e escondidas. Brincamos
tambm tropa (aos disparos).

Tens um(a) amigo(a) preferido(a) (melhor amigo/a)? Quem ?


Joaquim (9 anos), da mesma turma que o Tom desde o 3 Ano de escolaridade.

129

Escola

Em que ano andas?


4 Ano.

O que que gostas mais na escola? Porqu?


De aprender estudo do meio. Porque gosto muito da guerra e da histria de Portugal.

O que que gostas menos na escola? Porqu?


De aprender matemtica. Porque est cheio de nmeros e eu no percebo nada
daquilo.

Se pudesses mudar alguma coisa na escola, o que seria?


De meter mesas para eu ficar sozinho.

Como preferias que fosse?


Fosse que ficasse cada um numa mesa sozinho. Porque h meninos que esto sempre
a copiar, j copiaram as minhas coisas e eu disse professora e no lhe fizeram nada (os
colegas).

Onde que costumas fazer os teus trabalhos de casa?


No ATL.

Tens ajuda de algum? De quem?


Das educadoras de ATL.

Famlia

Quem so as pessoas da tua famlia?


Av (64 anos) e av (65 anos) maternos, av paterna (74 anos), padrinho tio
paterno (40 anos), me (39 anos), pai (46 anos), irm (7 anos), prima filha do tio materno
(11 anos), tio materno, tia esposa do padrinho, dois primos gmeos filhos do padrinho (2
anos).

130

Com quem vives (nome, idade, grau de parentesco face criana)?


Me, pai, irm.

Como a tua me?


Tem um irmo, bonita. Trabalha (nome de hipermercado) e tem trinta e nove anos.

Como o teu pai?


Trabalha (nome de marca de carros), bonito, tem quarenta e seis anos. Tem um
irmo e no sei mais.

Como so os teus irmos(s) (ou outras pessoas da famlia mencionadas)?


bonita, tem sete anos e anda no primeiro ano.

Como que os teus pais se do um com o outro? O que pensas/sentes com isso?
Bem. s vezes h uma discusso. (?) No penso muito nisso.

Dormes com algum ou partilhas o quarto com algum? Se sim, com quem?
Dorme no mesmo quarto que a irm, num beliche.

Se pudesses mudar alguma coisa na tua famlia, o que seria?


Ter o meu av, faleceu antes de eu nascer. Gostava de o conhecer (?) l em
casa dizem que engraado.

Como preferias que fosse?

Fantasias/Sonhos/Medos

O que que gostarias de ser quando fores grande? Porqu?


Futebolista. Porque gosto de ver os jogos e gostava de imitar os outros. do Benfica.

Quais so os teus maiores sonhos/desejos?


Ter um Porsche e ser o melhor jogador do mundo.

131

Se pudesses mudar alguma coisa em ti, o que seria?


Ter umas novas chuteiras (?) Nada (nele prprio).

Como preferias ser?

Costumas sonhar? Se sim, com o qu?


No.

Quais so os teus medos? O que fazes quando te sentes assim?


No.

E as tuas preocupaes? O que fazes quando te sentes assim?


No.

Desenho Livre

132

Inqurito

1) O que que desenhas-te? O que que est a acontecer no teu desenho?


Um barco e est quase a chegar ilha e o tesouro est aqui enterrado (acrescenta uma
cruz no local do tesouro).
(Que tesouro esse?) Tesouro cheio de ouro.

2) Histria
Era uma vez o pirata das Carabas estava a viajar e depois quando viu no mapa estava
no oeste, mas o tesouro no norte. S havia era areia por volta. Mas ele s via a areia
do oeste. Passados dias e noites chegou a uma ilha e viu uma palmeira uma
palmeira e depois viu uma cruz no cho, escavou, escavou e depois voltou para a sua
terra que era o Brasil com o tesouro. E depois no queria partilhar com ningum e ele
foi para o seu castelo que estava cheio de entrevistas, ele depois noite pensou,
pensou e depois disse: eu no posso ficar com o tesouro todo, vou partilhar e
partilhou. E depois quando foi dar a todos fizeram uma grande festa.

Anlise da prova

O Tom apresenta lateralidade direita e exerce uma presso adequada no lpis, embora
desenhe com alguma rapidez. No Desenho Livre acima enunciado observam-se transparncias
nas rvores pelo preenchimento de cor dado areia. As transparncias so prprias da fase de
Realismo Intelectual (i.e., crianas dos 4 aos 7 anos, aproximadamente) e, por isso, menos
esperadas na idade do Tom segundo Luquet (1984). O desenho retrata uma cena marinha
com um barco (pode remeter para o fenmeno do nascimento atravs da gua, contedo
regressivo associado vida intra-uterina e o barco, associado ao feminino, ao materno) e
representa simbolicamente a descoberta de um tesouro cheio de ouro numa ilha (smbolo
feminino) sob um poderoso sol (smbolo masculino). No barco, ainda que deriva sobre um
mar com elementos marinhos ligados vida, peixes e algas, destaca-se a ausncia do desenho
de uma figura humana, podendo enunciar dificuldades na projeco da auto-imagem corporal.
A narrativa evoca o conflito associado ao desejo de manter uma relao exclusiva, dual com o
imago materno e a sua resoluo e possibilidade de crescimento atravs da partilha que
indicia o acesso triangulao edipiana.

133

Desenho da Figura Humana de Machover

1 Desenho

Inqurito

Quem esta pessoa? Como se chama e que idade tem?


Joaquim, 18 anos.

Qual foi o dia mais feliz da sua vida?


No dia de anos dele. Porque foi uma grande festa.
(acrescenta os sapatos figura).

E o dia mais triste?


Quando levou uma vacina. Porque quer dizer que doeu muito.

Conta-me uma boa recordao que tenha.


No primeiro dia em que ele nasceu.
134

E uma m recordao?
Quando ele morreu.

Conta-me uma histria sobre esta pessoa.


Era uma vez o Joaquim que estava num navio a lutar contra as invases francesas e um dia
viu que os outros estavam a atacar. E ele disse ao marinheiro: estou a ver inimigos. Certo
dia viram que tavam ao p da areia com o barco trancado e com a areia presa e com cinco
piratas dentro do barco. Chegaram l, um pegou no sapato, o outro pegou numa espingarda e
o outro num capacete, o da espingarda conseguiu safar-se e os outros foram ao mar. O
Joaquim tornou-se marinheiro (tinha a espingarda) e meteu o barco a navegar. Um dia ele caiu
ao mar e depois passado um tempo foi para o hospital e depois foi ter com a me e desistiu de
ser marinheiro e escolheu ser futebolista e tornou-se no melhor jogador do mundo. Acho que
mais nada.

1) O que que ele/ela est a fazer? Est a olhar para o cu.


2) Que idade tem? 18 Anos.
3) casado/a? No.
4) Tem filhos? No.
5) Rapazes ou raparigas?
6) Qual o seu trabalho? Futebolista.
7) Se ainda estuda, em que ano est?
8) Qual o seu maior desejo? Chegar lua.
9) saudvel? .
10) Tem bom aspecto? Sim.
11) Qual a parte do seu corpo que est mais bem feita? As pernas.
12) E qual a menos bem feita? A cabea.
13) feliz? .
14) Quais so os seus aborrecimentos? Quando perde um jogo.
15) O que o/a faz zangar? Ver que os jogadores no esto a jogar nada, tem ele de jogar
sozinho.
16) Quais so as suas manias? Ser o melhor.
17) Quais so os seus trs piores defeitos? H um que est a fazer e ele quer que faa de
outra maneira.
18) Quais so as suas melhores qualidades? rematar.
19) Tem muitos amigos? Tem.
135

20) Mais velhos ou mais novos? Mais velhos.


21) O que que dizem dele/a? Que ele muito bom jogador.
22) Ele/a gosta da famlia? Gosta.
23) E da escola? Tambm.
24) Sai muito com os amigos? Sim.
25) Quando que diz que se divertiu muito? No primeiro aniversrio.
26) Quer casar? No.
27) Com que idade?
28) Que gnero de mulher quer casar?
29) Quais so os seus trs principais projectos/sonhos? Chegar lua, ser o melhor
jogador e nunca errar.
30) Com quem se parece? Com o pai.
31) Gostarias de te parecer com ele/a? No.
32) Se pudesses, mudarias alguma coisa no teu desenho? No mudava nada.

2 Desenho

136

Inqurito

Quem esta pessoa? Como se chama e que idade tem?


Ndia, 10 anos.

Qual foi o dia mais feliz da sua vida?


O primeiro aniversrio. Porque estava cheio de gente.

E o dia mais triste?


Quando teve de levar uma vacina, porque no gostava muito de levar vacinas.

Conta-me uma boa recordao que tenha.


No primeiro dia que ela nasceu.

E uma m recordao?
Ela toda a chorar quando era beb.

Conta-me uma histria sobre esta pessoa.


Era uma vez uma menina que andava na escola e gostava muito de aprender mas um dia a
professora disse: quem esforar-se e aprender vai passar e ela estava sempre a estudar.
Quando ela ia passar para o 5 ano a professora disse: tu passas e a partir da comeou a
gostar mais da escola. Final.

1) O que que ele/ela est a fazer? Est a olhar para o cho.


2) Que idade tem? 10 Anos.
3) casado/a?
4) Tem filhos?
5) Rapazes ou raparigas?
6) Qual o seu trabalho?
7) Se ainda estuda, em que ano est? 5 Ano.
8) Qual o seu maior desejo? Ser a estrela de televiso da Lua Vermelha.
9) saudvel? Sim.
10) Tem bom aspecto? Sim.
11) Qual a parte do seu corpo que est mais bem feita? A cara.
12) E qual a menos bem feita? As pernas.
137

13) feliz? Sim.


14) Quais so os seus aborrecimentos? quando a me e o pai zangam-se.
15) O que o/a faz zangar? O pai.
16) Quais so as suas manias? Ser a melhor.
17) Quais so os seus trs piores defeitos? Ser pior que os outros.
18) Quais so as suas melhores qualidades? A dana.
19) Tem muitos amigos? Sim.
20) Mais velhos ou mais novos? Mais novos.
21) O que que dizem dele/a? Que ela a melhor estrela do mundo.
22) Ele/a gosta da famlia? Sim.
23) E da escola? Sim.
24) Sai muito com os amigos? No.
25) Quando que diz que se divertiu muito? No primeiro aniversrio.
26) Quer casar? No.
27) Com que idade?
28) Que gnero de homem quer casar?
29) Quais so os seus trs principais projectos/sonhos? Pisar a lua, ter uma casa e ter
um jacuzzi.
30) Com quem se parece? Com o irmo.
31) Gostarias de te parecer com ele/a? No.
32) Se pudesses, mudarias alguma coisa no teu desenho? No.

Anlise da prova

No primeiro desenho encontra-se uma figura masculina relativamente pouco investida


e/ou imatura do ponto de vista grfico: nas mos os dedos encontram-se em nmero
insuficiente face realidade objectiva atravs do traado de apenas quatro dedos, nos olhos
vazios denota-se a ausncia de pupilas ( semelhana da segunda figura desenhada). Na boca
acentua-se um sorriso superficial e de certa forma agressivo pelo desenho dos dentes. Posto
isto, no geral, ambas as figuras aparentam-se com um boneco, um espantalho, rgido,
prostrado, frgil, no primeiro caso pouco concordante com a idade atribuda pelo Tom na
fase de inqurito, 18 anos. No pescoo o Tom desenhou o pormenor dos pelos no peito,
numa aluso identificao sexual masculina com o paterno, o que aliado ao vesturio e
diferena no traado dos cabelos entre a primeira e a segunda figura sugerem a integrao da
diferena de sexos.
138

Na fase de inqurito de ambas as figuras e na narrativa do primeiro desenho surge


novamente a temtica do nascimento e o conflito inerente dificuldade de crescer: de
regressar dependncia simbitica com o materno ou em se autonomizar deste espao.
Apesar de iniciar a histria num cenrio marinho com a encenao de uma luta da qual sai
vitorioso atravs do uso de uma espingarda (smbolo masculino), que pode remeter para a
projeco das suas pulses agressivas como forma de combater os seus medos internos e
colmatar a sua falha narcsica mas, tambm, a destruio do objecto, representando o desejo
de separao, crescimento e autonomia. Contudo, regride para a relao dual com o imago
materno. Assim, surgem, ainda, respostas que indiciam dificuldades de separao (E uma m
recordao? Quando ele morreu) intolerncia frustrao, falha narcsica acentuada (Quais
so os seus aborrecimentos? Quando perde um jogo; Quais so as suas manias? Ser o/a
melhor; Quais so os seus trs piores defeitos? Ser pior que os outros; Quais so os seus
trs principais projectos/sonhos? Chegar lua, ser o melhor jogador e nunca errar; O que
que dizem dele/a? Que ela a melhor estrela do mundo), dificuldades no relacionamento
com os pares e egocentrismo infantil (Quais so os seus trs piores defeitos? H um que est
a fazer e ele quer que faa de outra maneira), competio e rivalidade com a figura paterna
(O que o/a faz zangar? O pai; ser o/a melhor e ser pior que os outros).

Desenho da Famlia

139

Aps a realizao do desenho questiono o Tom sobre o desenho que riscou na


camisola da terceira figura: a fingir que era uma bandeira que ele no gostava (?) j
comprou a camisola assim, riscada. Questiono-o sobre as calas: tipo cowboy, rasgado.

Inqurito

1) Quem so essas pessoas que desenhas-te, como se chamam e que idade tm? (da
esquerda para a direita)
O pai, Francisco, 18 anos;
A me, Madalena, 29 anos;
O filho, Nuno, 18 anos. No pode ser 18, tem 10 anos.

2) O que est a acontecer no teu desenho? Porqu?


Esto a ir passear. Porque estavam fartos de ficar em casa.

3) Quem o mais feliz? Porqu?


O filho. Porque a me d-lhe tudo o que ele quer.

Quem o menos feliz? Porqu?


Pai. Chega sempre tarde do trabalho.

4) Quem o mais simptico? Porqu?


A me. Porque ela trabalha com pessoas no (nome do hipermercado onde trabalha a
me do Tom).

Quem o menos simptico? Porqu?


Pai. Porque quando o filho chega a casa no se descala (o filho).

5) Quem manda mais? Porqu?


Pai. Porque o mais forte.

Quem manda menos? Porqu?


O filho! Porque mais novo.

140

6) Se tivesses que escolher uma pessoa desta famlia, quem que preferias ser?
Porqu?
O filho. Porque ele est na moda.

7) Se fossem todos dar um passeio de carro mas no houvesse lugar para uma
pessoa, quem ficaria em casa? Porqu?
A me. Por causa que ela tinha que arrumar as coisas.

8) Se algum no se tivesse comportado bem quem seria? Como seria castigada?


Quem que dava o castigo?
Filho. No jogava playstation. O pai e a me davam o castigo (?) o pai.

9) Se pudesses mudar alguma coisa no teu desenho o que que mudarias? Porqu?
Nada. Porque acho que eles esto fixes.

Anlise da prova

Sem realizar comentrios verbais ao longo da prova, o Tom desenhou as figuras com
rapidez, sem demonstrar cuidado no modo como pintava as figuras (especialmente a figura
que representa a me). Enquanto desenhava fez algumas expresses faciais particulares, como
tiques, especialmente ao nvel da boca.
Posto isto, ao observar o desenho sobressai a excluso do filho do casal parental. A
me surge como a personagem menos investida e valorizada (pouco cuidado ao pintar,
ausncia de pormenores, sem ps) e o filho como o mais investido (recurso utilizao de
mais cores e pintadas com mais cuidado, olhos permanecem brancos ao contrrio das
restantes figuras, pormenores nas calas e camisola). A figura materna parece triste e
semelhana das figuras do Desenho da Figura Humana, todas as figuras assemelham-se a
espantalhos, bonecos pouco firmes (o filho particularmente parece que vai cair), com os olhos
vazios e sem pupilas, os dedos das mos em nmero insuficiente face ao contexto real o que
pode associar-se imaturidade ou pouco cuidado no desenho das figuras. O roxo escolhido
para preencher a pele das figuras faz com que paream doentes, sem vida, desfalecidas.
No inqurito que acompanha o desenho surgem aspectos ligados desvalorizao e
rivalidade com o imago paterno e uma relao prxima, idealizada e pouco frustrante com a
me porque ela d-lhe tudo o que ele quer, dificultando, assim, o processo de
separao/individuao. Contudo, a resposta stima questo indicia o acesso triangulao
141

edipiana ao ser capaz de se separar da me para estar com o pai. A diferena de geraes
parece integrada, apesar de inicialmente o Tom colocar o filho ao mesmo nvel etrio do pai
(por via da desvalorizao e rivalidade com esta figura), recua e concede maior poder ao pai
(ainda que apenas oito anos os separe). Do ponto de vista grfico, no se verificam variaes
entre as figuras a este nvel, com o filho a surgir do mesmo tamanho que os pais. Por seu
turno, a diferenciao sexual parece suficientemente integrada atravs do traado dos cabelos
e da evocao de esteretipos tipicamente ligados separao dos papis sexuais pela
referncia me que arruma, o que pode tambm associar-se importncia que o Tom
atribui ordem (formao reactiva). Por fim, ainda que o Tom no tenha representado a
famlia real de forma directa, importa, ainda, salientar a ausncia da irm no desenho atravs
do mecanismo de defesa negao, o que pode remeter para uma problemtica na linha da
rivalidade fraterna.

Inventrio de Depresso para Crianas

Anlise inter-individual

O Tom obteve um total de 17 pontos, resultado este que o situa no Grupo 2 quanto
gravidade dos sintomas de depresso apurados no teste. Classifica-se, assim, num nvel
intermdio de sintomas de depresso, ainda que, inferior mdia e, portanto, fora do Grupo 1
(sujeitos no deprimidos) e do Grupo 4 (sujeitos deprimidos).

Anlise intra-individual

Intensidade do Item

Perfil de Itens
3
2
1
0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27

Itens

142

A partir da anlise do grfico acima representado verifica-se que a maioria dos itens
distribui-se na intensidade menor (14 itens) e mdia-inferior (11 itens). Sobressaem, desta
forma, os itens associados a uma preocupao excessiva, problemas de sono, isolamento
social, pessimismo, baixa auto-estima, tristeza e sentimentos de insucesso.
Atendendo distribuio dos itens no grfico parece afigurar-se uma conflitualizao
entre a expresso fantasmtica e a defesa que aliada tendncia para a interiorizao do
comportamento (inibio) observada no Tom no contexto da recolha de dados, podem
sugerir a interferncia de mecanismos de defesa como a negao nos resultados do teste.

Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas


Tabela 1 Nmero de itens emitidos e recebidos positivos/negativos (leves/fortes) atribudos
aos membros da famlia.
Emitidos
Emitidos
Recebidos
Recebidos
Total de
Positivos
Negativos
Positivos
Negativos
Envolvimento
Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes
Ningum

26

Tom

Pai

21

Me

19

Irm

21

Durante a realizao da prova TRF observaram-se caractersticas defensivas no Tom:


na maioria dos cartes constatou-se que primeiramente pensava em coloc-los numa
determinada pessoa, em seguida, ficava indeciso entre vrias pessoas ou acabava por me dar o
carto, atribuindo-o a vrias figuras simultaneamente; quando surgiam itens negativos,
independentemente de tipo leve ou forte, tendia a coloc-los de imediato no Ningum, como
que para afastar a sua presena.
Ao observar a Tabela 1 verifica-se que o Tom decidiu incluir na prova apenas os
elementos pertencentes famlia nuclear. O nmero de afectos emitidos ou recebidos
positivos fortes superam o nmero de afectos positivos leves apenas na figura do Ningum e
da irm. Este facto, aliado negao de todos os afectos negativos fortes pela colocao no
Ningum contribui para a observao do carcter defensivo do Tom na prova.

143

30
25
20
15
10
5
0
Ningum

Tom

Pai

Me

Irm

Figura 1 Nmero total de itens associados a cada membro da famlia.

Na apreciao dos valores correspondentes ao total de envolvimento emocional


(Tabela 1 e Figura 1) sobressai o recurso defesa pelo nmero significativo de itens
colocados no Ningum (26). Entre os membros da famlia destaca-se uma relao mais
prxima com o pai e a irm, seguindo-se a me com uma diferena pouco significativa de dois
itens. Por ltimo, surge o prprio Tom, como esperado segundo o autor da prova (Bene,
1985).

10
9
8
7
6
Positivos

Negativos

4
3
2
1
0
Ningum

Tom

Pai

Me

Irm

Figura 2 Nmero de itens positivos e negativos emitidos a cada membro da famlia.

144

Na anlise dos sentimentos positivos/negativos percepcionados como emitidos pelo


Tom face aos vrios elementos da famlia (Figura 2) destaca-se uma forte idealizao das
figuras parentais, sobretudo da me esta pessoa da famlia nunca me desaponta, no lhe
atribuindo afectos negativos, o que pode dificultar o processo de separao desta figura. Entre
os itens positivos fortes destaca-se a atribuio de gostava que esta pessoa da famlia
gostasse mais de mim do que dos outros e gosto que esta pessoa da famlia me faa
ccegas ao pai, revelando o desejo de aproximao e competio pela ateno desta figura
parental. Contudo, entre os afectos negativos surge a falta de pacincia por parte do pai.
Observa-se tambm a expresso de auto-agressividade no prprio Tom movida por
sentimentos de culpa e insegurana s vezes esta pessoa da famlia irrita-se muito depressa
e s vezes esta pessoa da famlia fica chateada sem ter razo para isso, visto que obteve dois
itens negativos e nenhum positivo. Com a irm parece estabelecer uma relao ambivalente
marcada pela rivalidade fraterna uma vez que obteve apenas dois itens de afectos positivos
face a cinco negativos atribudos em exclusivo a esta figura. Por fim, o Tom defende-se no
Nigum pela negao dos aspectos negativos fortes no colocados nos membros da famlia
mas tambm demonstra a necessidade de autonomizao ao rejeitar os seguintes afectos
positivos fortes: s vezes gostava de poder dormir na mesma cama com esta pessoa da
famlia e quando me casar gostava que fosse com uma pessoa parecida com esta pessoa da
famlia.

12
10
8
Positivos

Negativos

4
2
0
Ningum

Tom

Pai

Me

Irm

Figura 3 Nmero de itens positivos e negativos sentidos como recebidos por cada membro
da famlia.
145

Quanto aos afectos positivos e negativos sentidos como recebidos por cada elemento
da famlia (Figura 3) semelhana do observado na figura anterior, destaca-se uma forte
idealizao das figuras parentais, desta feita sem qualquer tipo de afecto negativo atribudo a
ambas as figuras. Entre os afectos positivos fortes destacam-se esta pessoa da famlia gosta
de estar na cama comigo me, o que pode remeter para fantasias edipianas e, ainda, gosta
de me dar beijinhos, gosta de me ajudar quando estou a tomar banho e gosta de me fazer
ccegas ligados ao pai, como forma de investimento numa nova relao de objecto. No que
concerne ao prprio Tom apenas contm um afecto positivo, no se auto-atribuindo qualquer
tipo de afecto negativo. Assim, os afectos negativos foram apenas atribudos irm (relao
ambivalente) e personagem Ningum. Na irm este facto pode ter um valor na linha da
rivalidade fraterna e no sentimento de inferioridade do Tom face a esta figura: faz-me uma
cara zangada, nem sempre me ajuda quando estou em apuros, ralha comigo e fica
zangada comigo. No Ningum reenvia para uma forte negao dos afectos negativos.

10

Emitidos Positivos

Recebidos Positivos
Emitidos Negativos

-5

Recebidos Negativos

-10

-15
Ningum

Tom

Pai

Me

Irm

Figura 4 Direco dos afectos emitidos e recebidos positivos/negativos.

A partir da avaliao dos afectos positivos/negativos emitidos e recebidos pelo Tom


face aos membros da famlia (Figura 4) observa-se uma relao idealizada com as figuras
parentais, sobretudo com a figura materna sem a atribuio de afectos negativos a esta figura
e apenas um afecto negativo emitido pelo Tom figura paterna. Com a figura materna
verifica-se uma ligeira desigualdade com os afectos positivos emitidos e recebidos,
destacando-se os primeiros com a diferena de apenas um item. A relao com a irm
146

ambivalente e pela diferena de um item destacam-se os afectos negativos emitidos face aos
afectos negativos recebidos. Quanto ao prprio Tom sobressaem os afectos negativos
emitidos, o que pode reenviar para uma auto-estima insegura e culpabilizada. Na figura do
Ningum surgem os afectos negativos essencialmente de cariz forte e alguns afectos positivos
rejeitados e negados como forma de defesa.
Tabela 2 Nmero de itens associados a sentimentos de dependncia (superproteco
materna e superindulgncia paterna/materna).

Ningum
Tom
Pai
Me
Irm

Superproteco
materna
0
6
1
0
8

Superindulgncia
Paterna
Materna
0
0
5
5
0
1
3
0
4
3

Total de
Dependncia
0
16
2
3
15

A anlise da Tabela 2 permite apurar os sentimentos de dependncia face s figuras


parentais. Deste modo, entre os elementos familiares que apresentam maior dependncia
destacam-se o Tom e a irm, com um nmero equivalente de itens que remetem para a
dependncia materna. Contudo, o Tom destaca-se por um item atravs da relao mais
dependente que mantm com a figura paterna. curioso, ainda, observar, a atribuio de mais
itens referentes superproteco materna irm, podendo remeter para uma maior
dependncia ligada proteco e cuidados, visto ser mais nova. Enquanto o Tom obteve o
maior nmero de itens de superindulgncia paterna e materna, associando-se possivelmente
rivalidade fraterna com a irm, mas tambm a uma maior dependncia emocional face a estas
figuras. A me vista como uma figura mais dependente em comparao com a figura
paterna.

Sntese da Anlise do Teste de Relaes Famliares (TRF)

Atravs da figura do Ningum o Tom defende-se de colocar sobretudo os afectos


negativos fortes nas figuras relativas aos membros da famlia inibindo, assim, a expresso
agressiva. Ainda que constitua uma negao excessiva destes afectos, traduz uma forma de
gerir as angstias e os conflitos experienciados internamente, idealizando, por sua vez as
figuras parentais ao rejeitar os aspectos negativos.

147

Quanto ao prprio Tom sobressai a expresso de auto-agressividade atravs de uma


auto-estima insegura e culpabilizada. Revela-se emocionalmente dependente de ambos os
pais, com destaque para a figura materna.
Na relao com a figura paterna destaca-se uma forte idealizao, demonstrando o
desejo de aproximao e competio pela ateno desta figura parental. Surge uma
dependncia emocional do Tom face ao pai que no supera a relao dependente que
mantm com a me. Contudo, sente o pai como uma personagem com pouca pacincia,
percepcionando-se como o foco de indulgncia do pai, seguindo-se a irm e a me,
respectivamente.
Com a figura materna observa-se a presena de fantasias edipianas numa relao
fortemente idealizada, negando os aspectos negativos e a expresso agressiva, o que dificulta
o processo de separao emocional desta figura pelo elevado grau de dependncia que
mantm. Sente que a me centra a sua ateno nele, seguindo-se a irm e, por ltimo, surge o
pai com pouca indulgncia materna. Revela o desejo de autonomizao desta figura.
Na relao com a irm destaca-se uma relao ambivalente marcada pela rivalidade
fraterna e por sentimentos de inferioridade do Tom face a esta figura.

As Aventuras de Pata-Negra
1 Etapa Frontispcio

PN:
Porque tem a pata negra.
Menina.
1 Ano. No, para a uns 10 anos.

Dois porquinhos:
So primos do PN.
Menino, 5 anos (da esquerda).
Menino, 5 anos (da direita).
So irmos, tipo gmeos.

Porcos Grandes:
Em cima pai, 20 anos.
Em baixo me, 22 anos.
148

Quanto ao PN o Tom projecta por um lado, uma idade prxima da sua, o que refora
a identificao com o heri da histria mas, por outro, realiza uma inverso de sexos em
comparao ao seu, identificando-se a uma menina, o que pode remeter para conflitos
edipianos e uma tendncia para o evitamento dos conflitos.
Nos dois porquinhos assinala-se a representao de dois primos do PN, no
identificando uma relao de tipo fraterno face ao PN o que pode remeter para o desejo de ser
filho nico e assim obter a ateno/proteco exclusiva dos pais, sobretudo da me, anulando
a rivalidade fraterna.
Os porcos grandes foram identificados de forma adequada aos pais, com a me a
destacar-se pela maior maturidade projectada.
2 Etapa Os Temas

Brincadeiras Sujas
Era uma vez quatro porcos que estavam na lama a brincar. A me deles estava c
fora para no ficar suja, mas os trs filhos nos saltos dos porcos sujaram a me toda.
Quando o dono viu os porcos teve-lhes de molhar com a mangueira.

Nesta resposta o Tom acede ao contedo latente do carto que remete para a
agressividade face a um imago parental num contexto de analidade. Iniciando-se por uma
situao ldica, a figura materna a escolhida como alvo da agressividade, podendo associarse ao desejo de separao na relao com esta figura, ainda que os porquinhos pequenos
surjam de forma annima, evitando identificar-se ao responsvel do acto agressivo. Introduz
uma personagem na histria que no figura na imagem o dono podendo remeter para uma
figura superegica que coloca em cena a defesa pela formao reactiva.

Cabra
Era uma vez um porco negro, pata negra que pensava que a sua me era uma cabra e
por isso foi mamar numa cabra. Quando a me viu chateou-se e levou o filho para o seu
curral. Quando o dono chegou viu que uma cabra estava dentro do curral, tirou a cabra e
meteu-a na sua quinta.

Na resposta ao presente carto que reenvia para a relao com um substituto materno
encontra-se subjacente o sentimento de culpabilidade no Tom, no permitindo a substituio
materna, a separao deste imago, face ao receio da retaliao materna. A introduo da
149

figura superegica dono vem reforar os interditos ao desejo de separao da me,


reafirmando a relao de dependncia com a me.

Bebedouro
Era uma vez trs porcos pequenos e o pai e a me estavam a dormir no palheiro. Os
porcos pequeninos estavam junto a eles que era a casa dos porcos. Os filhos estavam sempre
a comer. Quando o dono chegou viu que a tigela j estava vazia, meteu-lhes mais os pais
levantaram-se e foram comer com eles.

O contedo latente do carto associado agressividade face s figuras parentais


evitado e negando pelo Tom atravs do escotoma do jacto de urina. Assim, o conflito
agressivo expressa-se num contexto oral e de precariedade dos suportes, numa vivncia
carencial e desprotegida simbolizada na necessidade de os filhos estarem sempre a comer e na
percepo da tigela vazia.

Buraco
Era uma vez um porco pata negra que caiu num buraco cheio de lama e no
conseguia sair de l. Por isso o dono viu que faltava-lhe um porco, o da pata negra e o dono
disse: falta-me um porco e o dono foi na sua carrinha procurar o porco. Num instante
passou num buraco e pensou que era um porco, mas era um pato, passou noutro que tinha
sido um co. Passou num, viu o porco, meteu-o dentro da carrinha e levou-o para a sua casa.

Num carto que apela ao receio da separao num contexto de perigo, o Tom
introduz uma figura na histria que no se observa na imagem evitando, desta forma, o
confronto (punitivo) com as figuras parentais face transgresso da relao desencadeada
pela separao. Em todo o caso, o desenlace da histria d-se atravs do apoio desta figura,
no conseguindo socorrer-se de forma autnoma.

Como terminam as aventuras?


Bem. Os outros filhos crescem, ficam adultos e criam filhos.
(?) O PN ele depois fica pelo campo mais os seus irmos e a sua me e depois seguem
a sua vida.

150

Inicialmente observa-se um evitamento/recusa em abordar a situao futura do PN.


Com a interveno da investigadora surge a aluso ao PN contudo, apenas na relao com a
figura materna e irmos, excluindo a figura paterna.

Acrescentou os cartes:

Ninhada
Era uma vez trs porquinhos. A me dos porquinhos ficou grvida e teve mais quatro
filhos. Os outros filhos estavam l junto da me, a me comia, os outros quatro bebiam o leite
e os outros trs comiam tambm. Os donos dos porcos meteram palha e comida, gua para a
me e os seus filhos para ficarem confortveis.

Num carto que remete para o tema do nascimento e da rivalidade fraterna o Tom no
aborda o conflito da rivalidade fraterna, optando por o evitar apegando-se ao contedo
manifesto do carto, ainda que acrescente um porco recm-nascido histria que no figura
no carto.

Pequena Escada
Era uma vez o porco PN queria comer ervas em cima de uma rvore. A me
experimentou na primeira vez caiu, na segunda vez caiu, terceira vez subiu, viu que tava
ervas e comeu, comeu, comeu, o PN. Quando acabou de comer as ervas queria sair, no
conseguia. O dono dos porcos encostou a me a uma rvore, o filho s cavalitas e levou o seu
filho PN para o curral e a sua me numa carrinha grande. Ficou juntamente com os seus
filhos e o porco PN junto com os seus irmos e os seus primos. O filho PN gostou muito deste
dia.

Num carto que remete para a funo de holding de uma das figuras parentais, o Tom
projecta uma vez mais, a problemtica oral podendo reenviar para um vivido de carncia na
relao com o materno. A funo de apoio associada ao materno, ainda que, se represente de
forma precria pelas sucessivas quedas at conseguir auxiliar o filho e introduo do dono
dos porcos na histria como auxiliador da funo materna.

151

3 Etapa Preferncias-identificaes

Cartes de que gosta (A)

Cabra
A1) Porque o porco PN enganou-se na me. O PN.

Pode remeter para o desejo de relao com um substituto materno.

Pequena Escada
A2) Porque nunca vi um porco a subir s cavalitas de uma me. O PN.

A me representa a figura parental que assegura a funo de holding.

Ganso
A3) Gosto porque nunca vi um pssaro ( menina) a atacar um porco. O primo
(porquinho do lado esquerdo no frontispcio).

Reenvia para a temtica da agressividade, no se identificando ao heri da histria, o


PN.

Ninhada
A4) Os senhores estavam a tratar dos filhos da porca e dos trs tambm. O senhor.

Evita a referncia rivalidade fraterna, no se identificando com o PN.

Batalha
A5) Porque a me no est desinteressada, ai, est muito interessada com os filhos e
nunca vi um porco a correr desta maneira. O pai.
Ainda que reforce o que disse no incio da frase com est muito interessada o Tom
sente que refere o contrrio e, por isso, tenta negar a vivncia da desproteco materna. A
agressividade num contexto de rivalidade fraterna no evocada, evitando-a.

152

Cartes de que no gosta (nA)

(comea a agitar os ps)

Noite
nA1) Porque esto a separar os filhos da me.
Os filhos e a me todos juntos. O PN.

Num carto que apela para a curiosidade sexual e para os fantasmas da cena primitiva,
o Tom revela-se sensvel ao sentimento de excluso e separao da relao de dependncia
com o materno.

Mamada 2
nA2) Por causa que os outros querem mamar mas o outro no deixa (o PN).
Todos a mamar na me. O PN.

Face relao com a me num contexto de rivalidade fraterna o Tom tenta anular
essa rivalidade, ainda que se identifique ao PN.

Hesitao
nA3) Por causa que o PN queria estar a comer e o pai no estava a deixar.
O PN a comer a comida tambm junto dos outros filhos e da sua me. O pai.

Ainda que expresse o desejo de uma aproximao figura paterna, no prescinde da


relao com o primeiro objecto, a me. A rivalidade fraterna , uma vez mais, evitada.

Beijo
nA4) Porque l eles no tinham comida para eles comerem.
Metia uma coisa de comida para os porcos pequenos e para os grandes. O PN.

Assiste-se a uma perseverao do tema oral de tipo carencial num carto que apela
problemtica edipiana, no abordando este conflito.

Bebedouro
nA5) O PN estava a fazer coc na comida dos outros.
153

Todos a comer e o PN no fazer coc para a comida. O pai.

Verifica-se uma abordagem ao conflito do carto na ordem da agressividade face s


figuras parentais, representando um avano face ao evitamento do conflito presente na 2
Etapa.

Partida
nA6) O filho perdeu-se, o PN.
Que todos encontrassem o PN. O PN.

O tema da solido associado angstia de separao.

Carroa
nA7) Por causa que estavam a levar os porcos para outra quinta e eles no gostavam,
a me, o pai, o PN estavam todos a ser levados.
A me e o pai e os seus filhos ficaram na mesma quinta. O pai.

Num carto que evoca a angstia de separao este conflito evitado, mantendo a
agressividade nas relaes familiares reprimida.

Buraco
nA8) Por causa que o filho est perdido e caiu num buraco, o PN.
O porco juntamente com os outros. O PN.

A temtica da solido/separao num contexto de perigo reconhecida.

Brincadeiras Sujas
nA9) Os filhos esto a sujar a me e a me no quer.
Os porcos no sujarem a me com os saltos deles. O PN (est fora da lama).

A temtica da agressividade face a uma figura parental, neste caso, a me acedida,


todavia, evita identificar-se com o autor do acto agressivo colocando o PN fora da lama, o que
remete para uma defesa na linha da formao reactiva (interiorizao superegica).

154

Mamada 1
nA10) Porque a me no deixava os outros comerem, s deixava o PN.
Todos a comerem. O PN.

Num carto que remete para uma relao privilegiada com o materno introduz os
outros (irmos) na frase negando a aproximao exclusiva me e a rivalidade fraterna.

Sonho Me
nA11) Porque a me estava a ver o seu filho a dormir e estava a levar com o cheiro
do seu filho.
O filho no deitar cheiro para a me. O PN.

Num carto que remete para a relao com a imagem materna a fico sugerida pelo
balo no reconhecida, remetendo para imaturidade no Tom. A problemtica inscreve-se
na projeco de agressividade face me.

Sonho Pai
nA12) O pai estava a deitar cheiro para o filho.
O pai no deitar cheiro para o filho. O PN.

Num carto que remete para a relao com a imagem paterna a fico sugerida pelo
balo no reconhecida, remetendo para a presena de imaturidade no Tom. A problemtica
inscreve-se na projeco de agressividade do pai para o filho.
4 Etapa Questes Dirigidas

Beijo
No.

Noite
No.

155

5 Etapa Questes de Sntese

1) Quem o mais feliz? Porqu?


O pai. Porque gostava sempre de ter um filho pata negra.

Quem o menos feliz? Porqu?


O primo (porquinho da esquerda no frontispcio). Porque tem o rabo torcido, no
como os outros.

2) Quem o mais simptico? Porqu?


O PN. Porque responde sempre bem s pessoas.

Quem o menos simptico? Porqu?


O primo (porquinho da direita no frontispcio). Porque est sempre a cheirar mal.

3) Quem que gostarias de ser?


O PN.

4) O que achas que vai acontecer ao PN?


Vai ter filhos quando crescer.

5) O que que o PN pensa da sua pata-negra?


Que pensava que era uma coisa de mal mas era uma coisa boa.
(?) Porque assim o porco sabe que tem uma pata negra e o mais forte.

6) Carto Fada:
Desejo 1: Que a sua famlia corra bem.
Desejo 2: O seu dono deia muita comida.
Desejo 3: E pedia que no deixasse de dar comida.

156

Sntese da Anlise da Prova

Preferncias-identificaes

Cartes

Os Temas

Preferncias

Identificaes

Aceite (A)/No

Agradvel

Assumida

Aceite (nA)

(A)/No

(A)/No

Agradvel (nA)

Assumida (nA)

Total

Bebedouro

nA

nA

1A

Beijo

nA

nA

1A

Batalha

nA

nA

1A

Carroa

nA

nA

nA

3nA

Cabra

3A

Partida

nA

nA

1A

Hesitao

nA

nA

nA

3nA

Ganso

nA

nA

1A

Brincadeiras

nA

2A

Noite

nA

nA

1A

Ninhada

nA

nA

1A

Sonho Me

nA

nA

1A

Sonho Pai

nA

nA

1A

Mamada 1

nA

nA

1A

Mamada 2

nA

nA

1A

Buraco

nA

2A

Pequena

nA

2A

Sujas

Escada

O Tom colaborou durante a realizao da prova PN, transparecendo interesse e


empenho na prova. No proferiu comentrios verbais adicionais prova, mantendo um
comportamento estvel, controlado e atento tarefa que se encontrava a desenvolver.
Atendendo anlise da tabela que resume o modo de expresso das temticas
inerentes prova verifica-se uma maior censura dos temas associados angstia de separao
(Carroa), oralidade e rivalidade fraterna (Carroa, Hesitao), podendo dar conta da
existncia de conflitos nestas temticas.
157

Ao longo do protocolo sobressai uma forte tendncia represso dos conflitos


registando apenas quatro cartes onde as pulses se expressam de forma menos controlada
(Cabra, Brincadeiras Sujas, Buraco, Pequena Escada). Posto isto, os principais mecanismos de
defesa utilizados pelo Tom so o evitamento do conflito, recalcamento, negao e formao
reactiva. Estas defesas integram, assim, as defesas de tipo neurtico utilizadas sobretudo para
inibir a expresso ou identificao ao acto agressivo na relao com as figuras parentais e
fraternas. Nesta sequncia, instala-se de forma dominante a temtica oral face a uma vivncia
carencial marcada, desprotegida e de precariedade dos suportes atravs do sentimento de
culpabilidade onde a agressividade dirigida a si, aludindo angstia depressiva.
Ao nvel da triangulao edipiana parece que este conflito no se encontra totalmente
ultrapassado. Deste modo, ainda que expresse o desejo de separao da figura materna e
demonstre ter o superego integrado, regista-se uma forte relao de dependncia com a me,
excluindo a figura paterna. Nesta relao com a me intervm os interditos ao desejo de
separao face ao receio de retaliao materna. A temtica edipiana do carto Beijo evitada
e deslocada para uma vivncia carencial de tipo oral e no carto Noite a curiosidade sexual e
fantasmas da cena primitiva do lugar ao sentimento de excluso na relao dual com o
materno. Por fim, o Tom realiza uma inverso de sexos ao nvel da identificao com o PN,
o que pode associar-se a dificuldades na identificao com a figura paterna.
A relao com a figura materna experienciada atravs do sentimento de desproteco
e carncia, na qual a funo de apoio representada de forma precria, necessitando a prpria
me de um auxiliador na sua funo materna e de conteno.
Na relao com a figura paterna destaca-se a projeco de agressividade sobre o filho.
Na relao de tipo fraterna sobressai a supresso dos irmos o que pode remeter para o
desejo de ser filho nico e, assim, obter a ateno/proteco exclusiva dos pais, sobretudo da
me, negando a rivalidade fraterna.

158

Anexo M: Estudo de Caso 2 Isabel (7 anos e 3 meses)

A Isabel tem sete anos e trs meses e frequenta o 1 Ano do 1 Ciclo do Ensino Bsico.
Apresenta um desenvolvimento estato-ponderal adaptado sua idade e gnero, contudo, de
um modo global traduz uma imaturidade que a faz parecer mais nova. Trata-se de uma criana
harmnica, com aspecto fsico investido, cuidado e com vesturio limpo e adaptado ao grupo
etrio. Estabeleceu um contacto inibido com a observadora, todavia registou-se um crescente
estado de vontade e maior disponibilidade para a relao e verbalizao no decorrer das
sesses. Verbaliza, por vezes, com espontaneidade, utilizando um tom de voz baixo e
pronunciando as palavras de forma imatura para a idade. Estabeleceu contacto ocular e no seu
olhar transpareceu o sentimento de tristeza. Manteve um comportamento estvel, controlado e
concentrado nas provas realizadas. Por vezes, empoleirou-se na cadeira, permanecendo sobre
a mesa da secretria a observar o que eu escrevia. A Isabel indicou aceitar bem a separao
face me, no momento em que se dirigiu comigo para a sala de consulta (chegou sempre na
companhia da me).
Pela prematuridade a Isabel seguida na consulta de desenvolvimento de um hospital
da Grande Lisboa. Na sequncia deste tipo de consultas, a me manifestou a sua preocupao
relativamente ansiedade e medos (de animais, ladres, palhaos, deitar-se sozinha,
acidentes, do perigo, etc.) da filha, sendo encaminhada para a consulta de psicologia daquele
hospital. No entanto, foi reencaminhada para a Unidade de Pedopsiquiatria devido sua rea
de residncia. Deste modo, h cerca de dois meses que a Isabel iniciou o acompanhamento em
consultas teraputicas de psicologia de frequncia semanal beneficiando, tambm, de
consultas familiares junto dos pais.
Tal como descrito na Anamnese do Tom, a Isabel vive com os pais e com o irmo.
Segundo o pai a Isabel tem uma maneira mais doce de falar com a me. Comigo ela
diferente, o que eu pedir para fazer ela faz e com a me no. Quando chego a casa ouo a voz
dela mais alta do que quando estou em casa. A Isabel e o Tom apreciam a companhia um do
outro, no entanto, ela defende-se em relao ao irmo. Por vezes, a Isabel dorme em casa do
tio paterno (padrinho do Tom) e fica bem, tal como em casa dos avs maternos. Contudo
recusa-se a ficar em casa da av paterna. Para o pai sempre foi uma criana muito reservada e
se for algum de quem ela goste a nossa casa um choro. Porque tem pena que as pessoas se
vo embora.
Segundo o pai, a Isabel sente dificuldades em dormir porque como a prpria diz
tenho medo de ladres quando me vou deitar. Tenho medo que eles me levem. Depois de
adormecer a noite corre bem. No entanto, como o pai refere quando est comigo digo que
159

est na hora de deitar e ela l vai, sem protesto. Depois eu deito-os e at lhe digo que vou
fechar a porta do quarto. Fica com uma luz acesa e quando s vezes volto ao quarto para v-la
est a pensar de olhos abertos: diz que no tem sono e no consegue dormir. Agora quando foi
com a trovoada eu deitei-me na cama de cima e eles na de baixo. Contudo, quando a me
est em casa fica com a Isabel at a filha adormecer. Caso contrrio, a Isabel chama a me ao
quarto e se a me no vai ela pede um copo de gua, mas no chora. Comigo ela no chama,
mas j houve perodos de ela comear a choramingar mas eu digo que ela no tem motivos.
O pai acrescenta tambm que quando a me est a passar-a-ferro ela vai para o nosso quarto
para estar mais perto. De manh a me tenta acord-los, chamando-os vrias vezes at ficar
irritada, mas os filhos ficam na cama sem se levantarem acho que a me cede demais,
confessa o pai. Com o pai levantam-se logo, sem haver problemas.
Para os pais estes comportamentos de medo e ansiedade da Isabel agravaram-se h
cerca de um ano quando o carro do av materno foi assaltado e a Isabel encontrava-se com o
av quando este descobriu o carro aberto, ainda que a Isabel no tivesse visto os ladres. O
medo de ces tambm se agravou nessa altura como a me tambm tem medo isso no ajuda.
Ela trepa por cima da me desesperadamente com medo de ces, revela o pai. Na opinio da
me, recentemente a filha deu um passo em frente nos medos ao aproximar-se e brincar
com uma cadela que o tio materno adquiriu h pouco tempo, andando entusiasmada. A
Isabel no consegue ficar sozinha numa diviso da casa, seguindo a me para a casa-debanho, cozinha e qualquer outra diviso, mesmo que a me lhe pea para ficar na diviso
anterior e a tente tranquilizar dizendo-lhe que no viro ladres.
A Gravidez da Isabel foi planeada no primeiro filho eu at gostava de ter tido uma
menina e depois no aconteceu e tentmos novamente, indica o pai. No se tratou de uma
gravidez complicada e, apesar de a me se sentir preocupada, na sua sade nada justificava
aparentemente a prematuridade da Isabel (nasceu s vinte e oito semanas de gestao com
795g, cerca de trs meses antes da data prevista, por Cesariana). Aps o nascimento a Isabel
sofreu uma infeco por adenovrus, sem registo de sequelas. Permaneceu dois meses e meio
na incubadora e a me quinze dias internada, ainda que apenas tenha contactado com a filha
passados oito dias do nascimento. Durante o internamento da Isabel os pais passavam o dia no
hospital at s vinte e duas horas durante a noite ela s conseguia estar bem ao colo. Quando
saiu do hospital tinha 1,5kg. O Tom parece que ficou ao abandono, ficava com a av
materna, partilha o pai.
Em beb o sono da Isabel era agitado, sendo difcil adormecer. No entanto,
adormecia facilmente no meu colo indica o pai. Demorou um ms at regular o sono. Nunca
teve problemas ao nvel do desenvolvimento psico-motor e lingustico associados
160

prematuridade, comeando a andar e a falar mais cedo que o irmo (o pai no sabe precisar o
momento) e sem dificuldades. Ao nvel do comportamento alimentar no esquisita, mas
lenta e demora, por vezes, duas horas para comer. Para o pai comigo come tudo, com a me
mais difcil mas quando eu repreendo a me tenta arranjar uma desculpa para a defender.
Nos primeiros tempos em casa, a me cuidou sozinha da Isabel at aos cinco meses
enquanto o Tom ficava, por vezes, com a av materna. Segundo o pai esse perodo foi
crtico para a me, eu sempre fui mais animador. Em seguida, a Isabel ficou aos cuidados da
av materna at aos seis anos, no frequentando a creche. Com a entrada na escola aos seis
anos, registou uma boa adaptao. A professora refere que um pouco lenta, embora j leia
com alguma calma, gosta de pintar, bem comportada e d-se bem com os colegas.

161

Guio de Entrevista dos Pais

Identificao da Criana

Nome: Isabel

Gnero: Feminino

Idade: 7 Anos e 3 Meses

Data de Nascimento: 2004

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Ano de escolaridade: 1 Ano

Reprovou algum ano? No

Se sim, qual (quais)? __________

Caracterizao Scio-Demogrfica da Famlia

Quem so os elementos que compem o agregado familiar (elementos que vivem na mesma
casa)?
(Constituio do genograma familiar)

1999
73

40

46

63

62

41

39

38

38

11

10

162

Me
Idade: 39 Anos

Data de Nascimento: 1971

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: Casada

Habilitaes Literrias: 12 ano

Profisso: Chefe de Seco de um hipermercado coordenadora do servio de caixas


Situao Profissional: Empregada.

Quais so os seus principais papis na famlia?


Tudo. D banho Isabel (por vezes, toma banho sozinha), prepara as refeies,
acompanha os filhos nos estudos, leva-os escola quando est de folga e quando no est a
av materna que assume essa funo.

Quais so os seus principais gostos e interesses pessoais?


Tem pouco tempo livre. Gosta de ir praia, fazer caminhadas junto ao mar o mar
transmite calma, ler um livro, brincar com os filhos (jogar cartas, entre outros).

Pai
Idade: 46 Anos

Data de Nascimento: 1965

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: Casado

Habilitaes Literrias: 9 Ano

Profisso: Chefe de oficina mecnica

Situao Profissional: Empregado

Quais so os seus principais papis na famlia?


Lev-los s actividades extra-curriculares, principalmente o Tom. Arranja carros e
faz pequenas reparaes quando so necessrias.

Quais so os seus principais gostos e interesses pessoais?


Quando tem tempo anda de moto 4, passear, conviver com as pessoas, fazer desporto.

Irmo()
Gnero: Masculino
Idade: 10 Anos

Data de Nascimento: 2001

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: ___________________

Habilitaes Literrias:_______________

Ao cuidado de/Creche/Infantrio/Escola (ano frequentado): 4 Ano


163

Profisso: ____________________________ Situao Profissional: _______________

Relaes Familiares

Qual a situao familiar actual (apoios sociais e/ou familiares, existncia de doenas fsicas
e/ou psicolgicas, problemas sociais, econmicos, exposio a fontes de stress, entre outros)?
A av materna a segunda me deles e o av materno quem os traz s consultas.
Ao domingo ficam com os avs ou com o pai. O pai s vezes trabalha ao sbado. Sentem
stress na famlia mais pela falta de tempo. Como chefe de seco a me assume uma grande
responsabilidade profissional e, como tal, sente que pode penalizar a famlia.

Algum membro da famlia necessita de se ausentar ou ausentou-se no passado


temporariamente ou com frequncia, por motivos de trabalho, estudo, ou outros? Quando?
Durante quanto tempo? Como que a criana reagiu a essa(s) separao(es)? E os restantes
membros da famlia?
No.

Algum membro da famlia faleceu, separou-se ou divorciou-se desde a gravidez da criana?


Quem? Qual o possvel impacto na famlia?
Um ano antes do Tom nascer faleceu o av paterno, por cirrose. Esta doena
decorreu de forma prolongada. A empresa em que trabalhava deixou de lhe pagar e deixou
de trabalhar a partir de Junho de 1999. Em Janeiro de 2000 faleceu. O pai do Tom/Isabel
no era muito ligado ao prprio pai (av do Tom/Isabel), embora se dessem bem.

Como a relao da criana com a me?


Ela agora anda tipo cola. Gosta do pai e da me, mas agora anda mais ao p da
me. Ela precisa muito que durmam com ela para adormecer. s vezes vai o pai, outras a
me, geralmente prefere a me. Est sempre a dizer que gosta muito da me. Quer ajud-la.
Tem medo de ir para outros stios e anda sempre atrs da me, dentro de casa segue a me
para a mesma diviso.

Como a relao da criana com o pai?


Estou bem com ela. Ela muito receosa de fazer as coisas, por saber que lhe chamo
a ateno mais afincado, revela o pai. Ela no pode sentir que est sozinha, diz-me a
me. Fala abebezada s com o pai, com a me fala bem. O pai diz que no quer que ela fale
164

assim e ela continua. A me acha que pelo tom de voz que o pai utiliza eles ficam receosos. A
me acha que tem a ver com a educao que o pai recebeu.

Como a relao da criana com os irmos (com cada um)?


s vezes um pouco s turras. Ela faz as coisas de maneira que os pais pensam que o
Tom o culpado. mais arisca. Eles no podem estar um sem o outro (me). Brincam
um com o outro, mas tambm andam s turras. A me conta que tambm com o prprio
irmo (tio do Tom/Isabel) era assim. Ela firme nas decises. Ele pede apoio me quando
no se sabe defender. Ela defende-se logo.

E com os restantes membros da famlia?


D-se bem com todos. Abraa-se aos outros, pede beijinhos. Agarra-se muito s
colegas da me, mesmo no as conhecendo, elas estranham. Sempre foi assim, muito
meiguinha e carinhosa. Tem uma amiga na escola que se d bem.

Gostaria que me descrevessem a vossa relao (relao do casal parental).


Pai: Conflituosa, por m interpretao das coisas. Para o pai as coisas podem ser
banais e a me responde de forma mais agressiva e ficam chateados, sente-se
inferiorizada, diz o pai sobre a me. A me comea a chorar e apenas responde nem
comento. Pai: eles vo buscar a parte mais fraca e depois isso reflecte-se num conjunto de
coisas.

Como a relao da me com a sua famlia de origem?


Muito boa. Com os pais do-se diariamente, v-os todos os dias a minha me a
minha melhor amiga. Com o irmo so mais distantes, ele vive mais longe e cada vez falam
menos, falam mais sobre os filhos. Comunicam mais por telefone. O irmo tambm est mais
distante dos pais e fala com estes mais pelo telefone. Admiro os meus pais porque quando se
deitam como se nada tivesse acontecido e o dia a seguir novo.

E como a relao do pai com a sua famlia de origem?


Com a me um bocado conflituosa (av paterna do Tom/Isabel) v as coisas como
h trinta anos. Anteriormente ao nascimento da Isabel a famlia residia numa rea
suburbana de Lisboa, passando a viver numa casa pertencente av paterna do Tom/Isabel
na margem sul do Tejo. A av paterna vendeu a casa deles e com esse dinheiro comprou uma
casa para ela viver sem dizer nada a ningum. Tenta fazer tudo a correr. muito poupada,
165

pouco flexvel, muito ligada igreja, sacrificando-se muito em vez de viver mais a vida. A
relao da av paterna com o irmo do pai no diverge tanto. muito individualista. A
relao da me com a sua famlia mais carinhosa, h mais contacto e afecto. Quando vai
para o hospital no diz nada a ningum e depois queixa-se que no lhe ligam, s sabem
depois de ter alta. muito fechada. Sentem que afasta os outros. muito activa, at se for
preciso faz obras numa casa sozinha, corta o prprio cabelo, renova as coisas. No vem
comer quase nunca a casa deles, mas se eles no vo l chateia-se. Como a av paterna faz
diferena entre o tio do Tom e o pai, no entram tanto em conflito, desculpa mais o tio
paterno do Tom.

Sintomas da Criana e Impacto Familiar

Quais so as principais preocupaes actuais sentidas face criana (Comportamento


alimentar, sono, linguagem, controlo esfincteriano, atitude face a outras crianas e adultos,
medos, entre outros)?
Medos que ela tem que a impedem de crescer e ser uma criana normal. No
consegue estar sozinha em casa, mesmo que a famlia esteja no jardim de casa (vivem em
vivenda). Entra em pnico. Tem medo dos ladres. A casa foi assaltada antes de ela nascer.
Quando ouve falar em ladres comea a chorar. Os pais no sentem ansiedade na Isabel
para ir para a escola, sempre quis ir e adora. Comeou estes medos no ano passado. A me
no associa escola porque a Isabel gosta de aprender.

Qual o impacto sentido na famlia?


Preocupam-se. A me tenta falar com ela e ela no fica sossegada sobre os ladres
(h dias em que fica mais calma e noutros no). A me no sabe se porque v os Morangos
com Acar. Tem um colega que foi assaltado com a me sada da escola e o mido agora
tambm tem medo dos ladres. A Isabel piorou com o assalto do carro do av, ela estava l.
Ela antes no tinha este medo. Tem medo dos animais e a me tambm tem, por isso sente
que pode ter passado o medo aos filhos. Tem um verdadeiro medo dos palhaos (numa festa
chorou o tempo todo). Medo de deitar-se e ficar sozinha (porque pode vir um ladro pela
porta ou janela). Medo de ficar sozinha numa diviso. Quando a me a tenta sossegar sente
que a pode pr mais inquieta porque a me tambm no se sente tranquila. A me sente pena
dela coitadinha por ter medo dos animais e a me tambm tem.

166

Guio de Entrevista da Criana

Identificao da Criana

Nome: Isabel

Idade: 7 Anos e 3 Meses

Interesses/Actividades

O que que tu gostas de fazer nos teus tempos livres?


Brincar (jogar bola). Jogo Nintendo DS.

Frequentas alguma actividade desportiva ou cultural (dana, teatro, msica, etc.)? Qual?
Ando na natao e gosto de l andar.

Tens animais de estimao? Quais?


Tenho um peluche.

Amigos

Quem so os teus amigos(as) (nome e idade)?


Leonor (6 anos), Joana (7 anos), Carolina (6 anos) e o Bruno (7 anos).

De onde os(as) conheces?


So da escola e do ATL.

O que que costumam fazer juntos(as)?


Brincamos apanhada e s escondidas.

Tens um(a) amigo(a) preferido(a) (melhor amigo/a)? Quem ?


A Leonor.

Escola

Em que ano andas?


Passei para o 2 Ano.
167

O que que gostas mais na escola? Porqu?


Aprender a ler e a escrever. Porque gosto.

O que que gostas menos na escola? Porqu?


De brincar. Porque gosto mais de estudar.
(?) No me sinto bem no recreio porque esto sempre a bater (Quem que te bate?) o
mano. s vezes o meu colega (no o Bruno). (o que costumas fazer nessas alturas?) diz
auxiliar de educao.

Se pudesses mudar alguma coisa na escola, o que seria?


No sei.

Como preferias que fosse?


No sei.

Onde que costumas fazer os teus trabalhos de casa?


ATL e em casa.

Tens ajuda de algum? De quem?


s vezes sim, Lurdes, Cristina ou Alexandre (ATL). Em casa no ajudam.

Famlia

Quem so as pessoas da tua famlia?


Tom, me, pai, av, av, av, av.

Com quem vives (nome, idade, grau de parentesco face criana)?


Pai, me, Tom. s vezes vo l os primos.

Como a tua me?


Gosto muito dela (e como que ela ?) tambm gosta muito de mim.

168

Como o teu pai?


Leva-me a muitos stios, a ver os avies, os barcos... e no sei mais. Tambm muito
meu amigo. Tambm sou muito amiga dele.

Como so os teus irmos(s) (ou outras pessoas da famlia mencionadas)?


Gosto de jogar com ele bola e jogar a jogos. muito meu amigo.

Como que os teus pais se do um com o outro? O que pensas/sentes com isso?
s vezes discutem, outras vezes no. (?) Sinto que estou triste.

Dormes com algum ou partilhas o quarto com algum? Se sim, com quem?
Partilho o quarto com o mano. Adormeo com a me no meu quarto e depois a me
vai para o quarto dela. Fao isto todos os dias.

Se pudesses mudar alguma coisa na tua famlia, o que seria?


No sei.

Como preferias que fosse?


No sei.

Fantasias/Sonhos/Medos

O que que gostarias de ser quando fores grande? Porqu?


Professora de Estudo do Meio, Portugus e Matemtica. (Porqu?) No sei, ensino os
meninos.

Quais so os teus maiores sonhos/desejos?


No sei.

Se pudesses mudar alguma coisa em ti, o que seria?


No sei.

169

Como preferias ser?

Costumas sonhar? Se sim, com o qu?


No.

Quais so os teus medos? O que fazes quando te sentes assim?


Dos ladres. Chamo a me, sinto-me segura quando a me vem. Medo de ces, de
fantasmas, bruxas e de morcegos. De monstros tambm. Choro quando tenho estes medos.

E as tuas preocupaes? O que fazes quando te sentes assim?


No.

Desenho Livre

170

Inqurito

1) O que que desenhas-te? O que que est a acontecer no teu desenho?


A borboleta est a ver as formigas e as flores e a rvore e o sol tambm.

2) Histria
Era uma vez uma borboleta que estava a ver as flores, rvore e a formiga e o sol
tambm. As flores ficaram felizes e as formigas e a rvore.

Anlise da prova

A Isabel apresenta lateralidade esquerda e realiza uma presso adequada no lpis


durante o desenho, sem verbalizar com a investigadora. No plano grfico observa-se um
grafismo adequado para a idade, com movimento e pouco simbolismo. Ainda que desenhe
figuras em tamanho grande, sobressai a presena de inibio atravs do nmero reduzido de
elementos desenhados e o recurso a um discurso restrito e descritivo, prximo do factual,
apenas com afecto positivo no final da narrativa na linha da negao das dificuldades
emocionais experienciadas. Ainda assim, a Isabel parece projectar-se na figura da borboleta, o
elemento mais investido do ponto de vista grfico e aquele que surge na posio activa de
observar os restantes elementos. Observa-se, ainda, o desenho das flores prximo das
dimenses da rvore, afastando-se do realismo visual (Luquet, 1984).

171

Desenho da Figura Humana de Machover

1 Desenho

Inqurito

Quem esta pessoa? Como se chama e que idade tem?


Me. Anabela, 39 anos.

Qual foi o dia mais feliz da sua vida?


No natal.

E o dia mais triste?


No sei (?) No sei.
172

Conta-me uma boa recordao que tenha.


No sei (?) De nos ver feliz.

E uma m recordao?
De nos ver tristes.

Conta-me uma histria sobre esta pessoa.


Era uma vez a me gostava das borboletas e apanhou uma e guardou-a e depois mostrou aos
filhos e ao pai e mais nada.

1) O que que ele/ela est a fazer? Est a saltar.


2) Que idade tem? 39 Anos.
3) casado/a? Sim.
4) Tem filhos? Sim.
5) Rapazes ou raparigas? Os dois, um menino e uma menina.
6) Qual o seu trabalho? (Hipermercado onde a me trabalha).
7) Se ainda estuda, em que ano est?
8) Qual o seu maior desejo? De estar feliz.
9) saudvel? Sim.
10) Tem bom aspecto? Sim.
11) Qual a parte do seu corpo que est mais bem feita? Todo (?) o vestido.
12) E qual a menos bem feita? Ps.
13) feliz? Sim.
14) Quais so os seus aborrecimentos? Chateada e triste.
15) O que o/a faz zangar? O trabalho.
16) Quais so as suas manias? No sei.
17) Quais so os seus trs piores defeitos? Chateada, triste e aleijada.
18) Quais so as suas melhores qualidades? Feliz.
19) Tem muitos amigos? Sim.
20) Mais velhos ou mais novos? Os dois.
21) O que que dizem dele/a? Para ela no ficar chateada e triste.
22) Ele/a gosta da famlia? Gosta.
23) E da escola?
24) Sai muito com os amigos? s vezes vai almoar com eles.

173

25) Quando que diz que se divertiu muito? No dia de estar feliz com os colegas, a
divertir-se.
26) Quer casar?
27) Com que idade?
28) Que gnero de homem quer casar?
29) Quais so os seus trs principais projectos/sonhos? No sei.
30) Com quem se parece? Comigo.
31) Gostarias de te parecer com ele/a?
32) Se pudesses, mudarias alguma coisa no teu desenho? No.

2 Desenho

174

Inqurito

Quem esta pessoa? Como se chama e que idade tem?


10 Anos, chama-se Martim.

Qual foi o dia mais feliz da sua vida?


A me fez anos.

E o dia mais triste?


De tirarem os brinquedos.

Conta-me uma boa recordao que tenha.


Gosta muito de brincar com o peluche dele.

E uma m recordao?
De lhe tirarem o peluche.

Conta-me uma histria sobre esta pessoa.


Era uma vez um menino que estava a brincar com o peluche e tiraram o peluche, mais nada.
(?) Ele ficou a chorar.

1) O que que ele/ela est a fazer? Est a pular na gua.


2) Que idade tem? 10 Anos.
3) casado/a?
4) Tem filhos?
5) Rapazes ou raparigas?
6) Qual o seu trabalho?
7) Se ainda estuda, em que ano est? 4 Ano.
8) Qual o seu maior desejo? Brincar.
9) saudvel? .
10) Tem bom aspecto? Sim.
11) Qual a parte do seu corpo que est mais bem feita? Camisola.
12) E qual a menos bem feita? Cabelo.
13) feliz? .
175

14) Quais so os seus aborrecimentos? que lhe tirem os brinquedos.


15) O que o/a faz zangar? No sei.
16) Quais so as suas manias? De querer uma coisa.
17) Quais so os seus trs piores defeitos? De chorar e de ficar chateado.
18) Quais so as suas melhores qualidades? De brincar com os amigos.
19) Tem muitos amigos? Tem.
20) Mais velhos ou mais novos? Alguns mais novos e outros mais velhos.
21) O que que dizem dele/a? Que ele o melhor amigo.
22) Ele/a gosta da famlia? Sim.
23) E da escola? Tambm.
24) Sai muito com os amigos? Sai.
25) Quando que diz que se divertiu muito? Quando foi ao parque com os amigos.
26) Quer casar? No.
27) Com que idade?
28) Que gnero de mulher quer casar?
29) Quais so os seus trs principais projectos/sonhos? Nenhum.
30) Com quem se parece? Me.
31) Gostarias de te parecer com ele/a? No.
32) Se pudesses, mudarias alguma coisa no teu desenho? No.

Anlise da prova

A nvel grfico o primeiro e o segundo Desenho da Figura Humana contrastam


significativamente quanto ao investimento e cuidado que a Isabel dedicou s figuras. Em
comparao com a primeira figura, a segunda figura foi desenhada com mais rapidez, pouca
ateno aos pormenores, sem traado dos dedos (na primeira figura a Isabel desenhou o
nmero de dedos dos ps e das mos correcto. Os ps descalos podem remeter para a
projeco de agressividade), sem pupila, dando a sensao de uma figura pouco estvel, a
pairar no ar, com investimento desigual entre a cabea e o corpo, prevalecendo a primeira. O
sorriso das duas figuras forado e superficial, demasiado longo. Comparativamente com o
Desenho Livre estes desenhos obtiveram um menor investimento ao nvel da cor.
Na fase de inqurito e da narrativa sobressaem os mecanismos de negao e recusa dos
aspectos negativos como forma de os evitar. A inibio tambm prevalece ao ser necessrio o
reforo de algumas questes por parte da investigadora para obter as respostas. As diferenas
sexuais surgem integradas atravs do desenho do vesturio e cabelos e a identificao sexual
176

feminina tambm est assegurada. Na primeira figura observa-se uma clara identificao com
o imago materno, projectando-o de forma chateada, triste e aleijada, segundo a resposta a
trs questes do inqurito. No caso da segunda figura, retratada de forma imatura e
dependente da relao dual com o imago materno. Ambas as narrativas so restritas,
descritivas e assentes no factual e concreto, sem recurso ao simblico.

Desenho da Famlia

Inqurito

1) Quem so essas pessoas que desenhas-te, como se chamam e que idade tm? (da
esquerda para a direita)
Lua, 19 anos, irm;
Sol, 20 anos, irmo.

2) O que est a acontecer no teu desenho? Porqu?


O sol est a olhar para eles. (?) Eles esto ao sol.
177

3) Quem o mais feliz? Porqu?


O Sol. Porque tem o sorriso maior.

Quem o menos feliz? Porqu?


A Lua. Porque tem o sorriso mais pequeno.

4) Quem o mais simptico? Porqu?


A Lua. Porque pede-nos para brincar.

Quem o menos simptico? Porqu?


O Sol. Porque no nos pede para brincar.

5) Quem manda mais? Porqu?


O Sol. Brinca com a irm apanhada.

Quem manda menos? Porqu?


A Lua. Porque no brinca s escondidas com ele.

6) Se tivesses que escolher uma pessoa desta famlia, quem que preferias ser?
Porqu?
A Lua. Porque gosto da Lua. (?) Porque gosto de brincar com a Lua.

7) Se fossem todos dar um passeio de carro mas no houvesse lugar para uma
pessoa, quem ficaria em casa? Porqu?
O Sol. Porque ele quis.

8) Se algum no se tivesse comportado bem quem seria? Como seria castigada?


Quem que dava o castigo?
O Sol. Ir para a cama. A Lua dava o castigo.

9) Se pudesses mudar alguma coisa no teu desenho o que que mudarias? Porqu?
No.

178

Anlise da prova

Ao desenhar a Isabel empregou pouco cuidado, fazendo-o com relativa rapidez. A


figura feminina surge mais investida pela utilizao parcial das cores e a relva junto aos ps.
Por outro lado, a figura masculina apresenta-se mais frgil e menos coesa. No geral, as figuras
encontram-se estticas, sem movimento e desproporcionais pela cabea demasiado grande
face ao resto do corpo (a cabea a via principal de comunicao social e, por isso, de
dependncia face ao outro). As nuvens foram traadas de forma contgua o que pode remeter
para os aspectos ligados dependncia com o imago materno. O presente desenho foi menos
investido que o Desenho Livre e o primeiro Desenho da Figura Humana.
No inqurito a Isabel utiliza o recurso descrio e ao factual como observado nos
desenhos precedentes e a explicao racional como defesa para no assumir a sua preferncia
(Quem o mais feliz? Porqu? O Sol. Porque tem o sorriso maior. Quem o menos feliz?
Porqu? A Lua. Porque tem o sorriso mais pequeno). Verifica-se uma identificao sexual
com o feminino. A figura masculina apesar de se afigurar como a que contm mais poder
desvalorizada. Contudo, o conceito de famlia e de diferena de sexos parecem assegurados.
Importa, ainda, salientar o facto de a Isabel ter optado por desenhar apenas dois irmos
prximos da idade adulta, com idades semelhantes, provavelmente, representado os pais
negando-lhes o lao ntimo e amoroso que os une, projectando, assim, o desejo da sua
separao amorosa (Quem o mais simptico? Porqu? A Lua. Porque pede-nos para
brincar. Quem o menos simptico? Porqu? O Sol. Porque no nos pede para brincar).

Inventrio de Depresso para Crianas

Anlise inter-individual

Neste instrumento a Isabel obteve um total de 4 pontos, inserindo-se no Grupo 1


(sujeitos no deprimidos) quanto gravidade de sintomas depressivos.

179

Anlise intra-individual

Intensidade do Item

Perfil de Itens
3
2
1
0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27

Itens

Na anlise do grfico acima representado sobressai, desde logo, uma forte defesa face
ao instrumento, em especial at ao item dezassete da prova, registando-se apenas a
intensidade mnima de sintomas depressivos. Na intensidade intermdia surgem os problemas
com a alimentao e isolamento social.
Face ao diagnstico clnico de depresso e a uma maior tendncia para a interiorizao
do comportamento (inibio) observada na Isabel, coloca-se a hiptese da menor incidncia
de sintomas depressivos apurados no instrumento resultar da emergncia de mecanismos de
defesa como a negao durante a realizao da prova. H que assinalar que devido s
dificuldades que a criana revelou na leitura dos itens durante a passagem do instrumento este
foi o nico caso em que a investigadora procedeu leitura dos itens, ainda que, a criana
registasse as suas respostas na folha. Este ltimo facto pode tambm ter condicionado os
resultados obtidos devido ao maior contributo e proximidade da investigadora com a criana e
com as suas respostas no teste.

Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas


Tabela 1 Nmero de itens emitidos e recebidos positivos/negativos (leves/fortes) atribudos
aos membros da famlia.
Emitidos
Emitidos
Recebidos
Recebidos
Total de
Positivos
Negativos
Positivos
Negativos
Envolvimento
Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes
Ningum

21

Isabel

180

Pai

Me

12

Irmo

13

Av
Materna
Av
Materno
Av Paterna

Durante a realizao da prova a Isabel proferiu alguns comentrios verbais, como a


preocupao pelo facto de a figura materna conter muitos cartes e no item de superproteco
materna: a me preocupa-se que esta pessoa da famlia no coma o suficiente comentou o
Tiago come muito, parece que tem bicha-solitria, como possvel aluso rivalidade
fraterna. Na fase inicial da prova expressou o desejo de incluir o av paterno que nunca
conheceu por ter falecido no ano anterior ao nascimento do irmo eu no sei como o cabelo
dele, ele j morreu. Eu gostava muito dele em criana mas ele morreu e s conheceu o Tom.
Contudo, preferi excluir esta figura e incluir apenas as figuras do contexto actual da Isabel.
Ao longo da prova verificou-se que a Isabel necessitou de meditar durante algum tempo antes
de colocar os itens na(s) figura(s) correspondente(s) e revelou uma maior expressividade ao
sorrir com frequncia numa atitude relacional com a investigadora.
Atendendo Tabela 1 observa-se que a Isabel inclui na prova os avs maternos e a av
paterna, alm da famlia nuclear. Os afectos negativos fortes surgem apenas distribudos na
figura do Ningum, do irmo e do av materno, o que remete para uma tendncia defensiva
considervel.
25
20
15
10
5
0

Figura 1 Nmero total de itens associados a cada membro da famlia.


181

Na anlise do total de itens atribudos a cada membro da famlia (Figura 1) destaca-se


um forte envolvimento emocional com o irmo (relao ambivalente com prevalncia dos
afectos negativos por um item de diferena face aos afectos positivos) e a me (relao
idealizada pelo elevado nmero de itens positivos e apenas dois negativos). Segue-se um
maior envolvimento na relao com o av materno, av paterna, pai, av materna e com a
prpria Isabel, respectivamente. O diminudo envolvimento com a figura paterna pode ser
justificado atravs da forte dependncia que parece manter com a figura materna. Surge,
ainda, uma forte defesa pela negao dos afectos negativos personificados no Ningum.

9
8
7
6
5
4

Positivos

Negativos

2
1
0

Figura 2 Nmero de itens positivos e negativos emitidos a cada membro da famlia.

A avaliao dos afectos positivos e negativos emitidos pela Isabel face aos diferentes
elementos da famlia (Figura 2) permite destacar uma forte idealizao da figura materna,
com todos os itens atribudos positivos e a ausncia de afectos negativos. O pai, por outro
lado, surge como a figura menos investida a nvel emocional, com a atribuio de apenas um
item positivo leve ajuda sempre os outros tambm colocado na figura materna. Esta
distribuio pode remeter para uma forte dependncia com a figura materna gostava que esta
pessoa da famlia estivesse sempre ao p de mim pouco permevel ao investimento numa
relao de objecto de tipo edipiano e autonomia emocional da Isabel. Na relao com o
irmo, com a prpria Isabel e de certa forma tambm na relao com os avs destacam-se
sentimentos ambivalentes, com destaque para uma auto-estima insegura por parte da Isabel
queixa-se demais e nunca est satisfeita e o irmo que apresenta um maior nmero de
182

itens negativos que podem reenviar para a rivalidade fraterna fico farto desta pessoa da
famlia, consegue fazer-me sentir muito irritado(a), ainda que tambm estabelea uma
relao dependente com esta figura gostava de poder dormir na mesma cama com esta
pessoa da famlia. O Ningum utilizado sobretudo para a negao dos afectos negativos
no colocados nos elementos da famlia.

9
8
7
6
5
4

Positivos

Negativos

2
1
0

Figura 3 Nmero de itens positivos e negativos sentidos como recebidos por cada membro
da famlia.

A partir da anlise dos itens positivos e negativos sentidos como recebidos pelos
elementos da famlia (Figura 3) destaca-se uma idealizao do pai, da av materna e da av
paterna pelo nmero elevado de afectos positivos face aos afectos negativos (no caso das avs
os afectos negativos so inexistentes). Contudo, a relao com o pai surge afectada por
sentimentos de insegurana e desproteco nem sempre me ajuda quando estou em apuros.
Na relao com a me apesar da maior incidncia dos afectos positivos de cariz dependente
gosta de me dar beijinhos, gosta de me ajudar quando estou a tomar banho e gosta de
estar na cama comigo vislumbram-se afectos negativos leves ralha comigo e fica zangada
comigo. Com o av materno sobressaem os afectos negativos recebidos numa linha
autoritria faz-me uma cara zangada e castiga-me muito. A relao com o irmo
percepcionada de forma ambivalente e quanto prpria Isabel no foram atribudos quaisquer
itens. Na figura Ningum so remetidas as defesas dos afectos positivos fortes e negativos
leves/fortes.
183

6
4
2
0
Emitidos Positivos

-2

Recebidos Positivos

-4

Emitidos Negativos

-6

Recebidos Negativos

-8
-10

Figura 4 Direco dos afectos emitidos e recebidos positivos/negativos.

Observando a direco dos afectos emitidos e recebidos nas vertentes positiva e


negativa (Figura 4) sobressai a percepo do investimento de ambos os pais na Isabel muito
semelhante, com o mesmo nmero de afectos positivos e mais um item nos afectos negativos
por parte da me em comparao com o pai, neste plano, a percepo da relao com ambos
surge idealizada. Todavia, o factor diferencial encontra-se na percepo do prprio
investimento feito pela Isabel em relao a cada figura, sentindo que transmite mais afectos
positivos em relao aos recebidos pela me e menos afectos positivos em relao aos que
recebe do pai, o que pode ser explicado pela necessidade de agradar me e manter uma forte
relao de dependncia com esta, sentindo-se insegura na relao com o pai. Com o irmo
surge uma relao ambivalente nos afectos emitidos e recebidos, com uma maior incidncia
de afectos positivos e negativos emitidos face aos recebidos, podendo associar-se rivalidade
fraterna. Quanto prpria Isabel o nmero de afectos positivos e negativos emitidos similar.
No caso dos avs, com a av materna h uma troca equivalente de afectos positivos, emitindo
tambm afectos negativos que no so recebidos. Com o av materno e av paterna surge um
maior investimento ao nvel dos afectos positivos emitidos, no entanto, no caso do primeiro
recebe mais afectos negativos em relao aos enviados e com a av paterna apenas emite
afectos negativos. No Ningum destacam-se os afectos negativos fortemente negados.

184

Tabela 2 Nmero de itens associados a sentimentos de dependncia (superproteco


materna e superindulgncia paterna/materna).

Ningum
Isabel
Pai
Me
Irmo
Av Materna
Av Materno
Av Paterna

Superproteco
materna
0
7
0
1
5
0
0
0

Superindulgncia
Paterna
Materna
0
0
4
4
0
0
1
0
4
5
0
0
0
0
0
0

Total de
Dependncia
0
15
0
2
14
0
0
0

No que concerne s caractersticas dependentes (Tabela 2) a Isabel avalia-se como o


elemento da famlia mais dependente face necessidade de superproteco materna. Segue-se
o irmo com a diferena de menos um item no total de dependncia e mais um item de
superindulgncia materna. Na superindulgencia paterna os itens foram distribudos de forma
homognea entre a Isabel e o irmo. A me surge com aspectos dependentes associados
preocupao de se magoar e como uma das pessoas em que o pai centra a sua ateno esta
a pessoa da famlia que o pai gosta mais. curioso assinalar que o item correspondente a
este ltimo ligado superindulgncia materna destinou-se Isabel e ao irmo, excluindo o pai
do foco de ateno da me, o que se associa a uma maior dependncia dos filhos na relao
com a me.

Sntese da Anlise do Teste de Relaes Famliares (TRF)

Na figura do Ningum a Isabel colocou os afectos positivos fortes e negativos


leves/fortes como forma de defesa pela negao deste tipo de caractersticas na famlia. Esta
defesa excessiva serve tambm como forma de lidar com as suas angstias internas e permitir
a idealizao de alguns elementos da famlia como a figura materna.
Quanto prpria Isabel, observa-se uma vivncia ambivalente e uma auto-estima
insegura. Surge como o elemento mais dependente das figuras parentais, nomeadamente dos
cuidados e proteco maternos.
A relao com a figura paterna pouco valorizada por parte da Isabel
comparativamente com o investimento atribudo pelo pai, onde se incluem sentimentos de
insegurana e desproteco na relao com esta figura.

185

Na relao com a figura materna sobressai o desejo de agradar me, a procura da sua
proteco e indulgncia e, ainda, uma forte idealizao e dependncia emocional com esta
figura, o que dificulta o processo de separao atravs do investimento numa relao objectal
de tipo edipiano e a consequente autonomizao da Isabel. Ainda assim, a Isabel percepciona
alguns afectos negativos recebidos desta figura. A me sentida como uma figura
relativamente dependente pela preocupao de se magoar, centrando apenas a sua ateno nos
filhos.
A relao com o irmo vista de forma ambivalente com sentimentos que reenviam
para a rivalidade fraterna, mas tambm na linha dependente. semelhana da Isabel o irmo
tambm surge como um elemento emocionalmente dependente dos pais.
Na relao com a av materna surge uma relao equilibrada quanto aos afectos
positivos emitidos e recebidos, com a Isabel a emitir tambm afectos negativos que no so
recebidos por parte da av.
Com o av materno surge uma discrepncia entre os afectos positivos emitidos e
recebidos, destacando-se os primeiros e os afectos negativos emitidos e recebidos, com
destaque para os segundos. Deste modo, esta figura percepcionada como autoritria.
Por fim, com a av paterna observa-se um maior investimento na relao por parte da
Isabel ao nvel dos afectos positivos, mas tambm dos afectos negativos que no so sentidos
como recebidos a partir da av.

As Aventuras de Pata-Negra
1 Etapa Frontispcio

PN:
Porque tem uma pata que preta;
Um menino;
19 Anos.

Dois porquinhos:
Irmos;
Esquerda - Uma menina, 11 anos.
Direita - E um menino, 12 anos.

186

Porcos grandes:
Pais;
Em Cima me, 11 anos.
Em Baixo pai, 14 anos.

Quanto ao PN a Isabel atribui-lhe o sexo masculino, no correspondendo ao seu


prprio sexo, o que pode remeter para uma tendncia na linha do evitamento da identificao
com o PN durante os vrios registos de conflitualizao. Ainda assim, atribui-lhe uma idade
significativamente superior sua, proporcionando-lhe maturidade.
Os dois porquinhos so associados relao de tipo fraterna, atribuindo mais idade ao
elemento do sexo masculino.
Os porcos grandes ligam-se relao com as figuras parentais embora, se observe uma
inverso nos papis atribudos aos pais, com o pai a surgir como o elemento que alimenta. A
idade no se adequa face idade dos filhos, podendo associar-se a dificuldades na
diferenciao de geraes. Contudo, mais uma vez, a figura masculina representada de
forma mais madura que a feminina.
2 Etapa Os Temas

Sonho Pai
Era uma vez a me que foi ver o filho a dormir e tava a deitar fumo e a me tava
dentro do fumo.

Num carto associado relao com o imago paterno, a Isabel mantm a tendncia da
inverso de papis e sexos na figura paterna e materna verificada no frontispcio o que aliado
ao no reconhecimento da fico sugerida pelo balo traduz imaturidade no seu
funcionamento.

Beijo
Depois a filha e o filho foram abraar e a e o outro filho estava atrs do muro a vlos.

Num carto que remete para a temtica edipiana a diferena de geraes retratada na
imagem no reconhecida, deslocando a relao parental e de tipo edipiano para uma relao
fraterna.
187

Mamada 1
Depois o pai estava a olhar para o filho e a pata negra estava a mamar no pai.

Num carto que apela relao privilegiada com a figura materna, a Isabel mantm a
inverso de papis parentais, representando o pai como a figura com a funo alimentar.

Partida
Depois a filha foi andar a correr.

Este carto representa a angstia de separao. Contudo, a Isabel defende-se atravs de


um discurso restrito e no conflitual.

Hesitao
E depois a pata negra, o pai, a filha e a me foram beber gua e esta foi passear o
outro filho que faltava (aponta para o carto Partida).

Num carto que remete para a escolha do objecto privilegiado a Isabel no aborda este
conflito. Reagindo ao contedo latente do carto precedente a Isabel no permite a solido e a
separao face figura materna.

Batalha
Depois o PN, o filho e a filha estavam a brincar guerra e os pais estavam a comer e
a olhar ao mesmo tempo.

A Isabel acede ao contedo latente do carto que reenvia para a rivalidade fraterna.
Assim, ao referir-se a brincar guerra defende-se da projeco de agressividade macia na
relao fraterna tentando transmitir-lhe uma faceta ldica.

Mamada 2
Depois o porco e o PN e o pai estava a mamar outra vez.

semelhana do referido para o carto Mamada 1, a Isabel mantm a inverso de


papis parentais, percepcionando o pai como a figura que alimenta. A rivalidade fraterna
evocada pelo carto no abordada.
188

Sonho Me
Depois o pai foi ver o filho a dormir e estava dentro de uma bolha de fumo, o pai.

A inverso de papis parentais evidencia-se nesta histria face temtica do carto


que aliada ao no reconhecimento do aspecto ficcional representado pelo balo reenvia para
imaturidade na Isabel.

Cabra
Depois passou uma cabra, estava a comer e o PN foi mamar nela.

Num carto cujo contedo simblico remete para a relao com um substituto
materno, a Isabel defende-se atravs de um discurso restrito e assente no contedo manifesto
do carto.

Como terminam as aventuras?


No sei.
(?) Vo ficar todos felizes e vo brincar juntos.

Aps a recusa inicial e o incentivo da investigadora a Isabel defende-se novamente,


recorrendo idealizao.

Acrescentou:

Buraco
Era uma vez estava de noite e o PN caiu para a gua e depois comeou a gritar para
os pais e os pais no ouviram.

Num contexto depressivo marcado pela sensibilidade ao tom preto do carto pela
referncia noite a vivncia de perigo acentua-se atravs da desproteco parental.

Ganso
Depois a filha estava a correr e depois acho que uma gaivota puxou o rabo e ela
comeou a chorar e o outro filho estava a olhar a sair detrs do muro.

A inter-relao agressiva reconhecida pela Isabel.


189

Noite
Tava de noite e depois o pai e a me estavam a comer e os filhos estavam a comer
deste lado, estava um porto e os filhos estavam deste lado. O PN ou outro porco estava
deste lado e a irm ou outro porco estavam a dormir. O pai e a me estavam a comer e ele
est a ver (o PN).

A problemtica associada curiosidade sexual e fantasmas da cena primitiva


substituda pela temtica oral.

Bebedouro
Depois a me e o pai estavam a dormir e o PN estava ao p deles e depois foi a correr
ao p dos irmos para comer e depois aleijou-se na pata negra, na comida dos pais.

A expresso de agressividade no contexto da relao com as figuras parentais


evitada atravs do escotoma da urina. Neste sentido, a agressividade surge voltada contra si,
numa possvel aluso culpabilizao.

Ninhada
Depois os senhores tavam a dar comida ao porco, o senhor estava sentado a fazer e o
outro estava a dar. Depois os filhos estavam a ver e descobriram que o pai teve mais trs
filhos bebs.

A inverso dos papis e sexos parentais acentua-se nesta histria pela representao de
uma figura paterna que alimenta e, simultaneamente, que concebe filhos atravs do
nascimento. A rivalidade fraterna no abordada.

Pequena Escada
Depois eles ficaram felizes e a me, o PN foi para cima da me e foi para cima da
rvore e depois ficaram todos felizes.

A figura materna a figura parental escolhida para desempenhar a funo de holding.


A repetio da palavra felizes remete para a defesa pela idealizao da relao me-filho.

190

3 Etapa Preferncias-identificaes

Cartes de que gosta (A)

Cabra
A1) Porque giro.
(?) Porque a cabra estava a comer e o porco pensou que era a me ou o pai. A cabra.

Refere-se relao com um substituto materno, ainda que faa referncia indefinio
ao nvel dos papis parentais.

Sonho Pai
A2) Porque ele, o filho estava a dormir e depois o pai dentro de uma bola de sabo. A
me, que esta a me. Parecia que era o pai mas era a me, o pai tem estas coisas (aponta
para o carto Sonho Me, para as tetas). O PN.

A negao da percepo da figura paterna d lugar inverso de papis parentais, com


o pai a surgir na posio de figura que alimenta.

Sonho Me
A3) Porque o pai tem uma bola na barriga e est dentro de uma bolha. O PN.

Assiste-se inverso de papis parentais, onde a figura paterna adquire a funo de


alimentar.

Mamada 2
A4) Porque esto a brincar todos com o pai. A irm (est a olhar mais perto do meio).

Alm da inverso de papis parentais onde o pai figura na imagem em alternativa


me, o tema oral no abordado, sendo substitudo por uma situao ldica.

Mamada 1
A5) Porque a PN est a mamar no pai. O pai.

191

Destaca-se a inverso de papis parentais, com o pai a ocupar o lugar materno de


propiciar alimentao ao filho.

Partida
A6) Porque uma floresta e a irm foi passear. A irm.

O carcter solitrio da imagem abordado contudo, a conflitualizao no se encontra


presente na frase acima transcrita.

Pequena Escada
A7) Porque a me a pegar no filho. O PN.

A relao com uma figura parental num contexto de holding associado figura
materna.

Hesitao
A8) Porque so, o PN est a comer, a irm tinha chegado e estava a beber gua e o
irmo estava a mamar no pai. A me.

A inverso dos papis parentais sobressai, com o pai a desempenhar o papel de


alimentar o filho. A resposta no traduz uma escolha de objecto privilegiado uma vez que
coloca o PN a desempenhar uma funo diferente das figuras parentais.

Beijo
A9) Porque o PN e o irmo esto a dar um abrao e a irm estava a ver atrs do
muro. A irm.

A referncia ao contexto edipiano e de diferena de geraes no reconhecida,


fazendo ligao ao contexto fraterno.

Noite
A10) Porque a me e o filho, a me e o pai esto a comer, o filho a olhar e a irm e
o outro esto a dormir. A irm.

192

Descreve um contexto oral num carto que apela para a curiosidade sexual e fantasmas
da cena primitiva.

Ganso
A11) Porque uma gaivota a puxar o rabo da irm e ela est a chorar e o irmo est
a ver. A irm.

Observa-se o acesso ao contedo latente do carto que remete para uma inter-relao
de tipo agressivo.

Ninhada
A12) Porque o pai com filhotes bebs. A irm.

A temtica do nascimento associada relao com o paterno, atravs da inverso de


papis parentais.

Bebedouro
A13) Porque os pais esto a dormir e o PN foi para a cama dos irmos. O PN.

O contedo latente do carto relativo agressividade face s figuras parentais no


reconhecido, escotomizando e evitando presena da urina sobre o bebedouro.

Buraco
A14) O PN caiu na gua e depois gritou me e o pai e os irmos. O PN.

A temtica da solido num contexto de perigo reconhecida, apelando ao apoio das


figuras parentais e fraternas.

Carroa
A15) Porque to a levar os porcos para a carroa para levarem-nos e o PN est a
dormir.
(?) Uns no sei quem so que j foram buscar outros. A irm ( a primeira que est a
olhar para a carroa).

193

O contedo manifesto do carto claramente reconhecido contudo, recusa-se a


identificar os porcos colocados na carroa, evitando a projeco de agressividade e de
separao nas relaes familiares.

Cartes de que no gosta (nA)

Brincadeiras Sujas
nA1) Porque eles andam a atirar tinta uns para os outros.
Tarem limpos. A irm (a que est a atirar lama).

Ainda que o aspecto agressivo do carto seja reconhecido pela Isabel, na sua resposta
no figura uma imagem parental alvo dessa agressividade defendendo-se, assim, deste tipo de
projeco. No final opta pela formao reactiva, ainda que se identifique com a personagem
que atira a lama.

Batalha
nA2) Porque eles, os filhos esto guerra.
Que eles fossem brincar apanhada, ou s escondidas, ou s corridas, a qualquer
coisa sem ser brincar luta. A irm, porque ela a nica que no est a fazer, est a fugir da
confuso.

Verifica-se o reconhecimento do contedo latente do carto que reenvia para a


rivalidade fraterna. Esta rivalidade alvo de defesa procurando recalcar este tipo de pulso
atravs dos jogos ldicos e identificando-se ao porco que foge do contacto agressivo.
4 Etapa Questes Dirigidas
Gaivota menino.

Bebedouro
No.

Beijo
A darem beijinhos.
194

5 Etapa Questes de Sntese

1) Quem o mais feliz? Porqu?


Todos.
(?) O PN. Porque ele est sempre a comer e gosta de brincar.

Quem o menos feliz? Porqu?


Ningum.
(?) O pai. Porque est a olhar para os filhos.

2) Quem o mais simptico? Porqu?


A me. Porque ela que d os comeres.

Quem o menos simptico? Porqu?


O irmo. Porque ele s brinca s corridas sozinho.

3) Quem que gostarias de ser?


A irm.

4) O que achas que vai acontecer ao PN?


Que vai comer as ervas, vai brincar com os amigos da escola.

5) O que que o PN pensa da sua pata-negra?


Que lhe vai acontecer alguma coisa.
(?) Que vai ter que ir ao mdico.

6) Carto Fada:
Desejo 1: Foi curar a pata.
Desejo 2: No pensar que vai ter que ir ao mdico.
Desejo 3: O outro tar sempre feliz e brincar com os amigos.

195

Sntese da Anlise da Prova

Preferncias-identificaes

Cartes

Os Temas

Preferncias

Identificaes

Aceite (A)/No

Agradvel

Assumida

Aceite (nA)

(A)/No

(A)/No

Agradvel (nA)

Assumida (nA)

Total

Bebedouro

nA

2A

Beijo

nA

2A

Batalha

nA

nA

1A

Carroa

nA

nA

1A

Cabra

nA

2A

Partida

nA

2A

Hesitao

nA

2A

Ganso

nA

nA

1A

Brincadeiras

nA

nA

nA

3nA

Noite

nA

nA

1A

Ninhada

nA

nA

1A

Sonho Me

3A

Sonho Pai

3A

Mamada 1

nA

2A

Mamada 2

nA

2A

Buraco

nA

2A

Pequena

nA

2A

Sujas

Escada

A Isabel colaborou ao longo da aplicao da prova Pata Negra, mantendo um


comportamento estvel, controlado e concentrado ao longo da prova, com excepo da 5
Etapa Questes de Sntese, na qual revelou um comportamento mais agitado, possivelmente
devido ao cansao acumulado ao longo da passagem desta prova, visto ter investido nas
etapas anteriores narrando a maioria das histrias dos cartes.

196

Na tabela relativa aos temas francos e camuflados verificam-se dificuldades mais


acentuadas na elaborao das temticas relativas agressividade (Batalha, Carroa, Ganso,
Brincadeiras Sujas, Ninhada) culpabilidade (Batalha, Brincadeiras Sujas e Ninhada) e no
acesso ao conflito edipiano (Ninhada, Noite, Ganso).
Ao longo do protocolo sobressai a presena de imaturidade funcional na Isabel,
verificando-se dificuldades na diferenciao sexual atravs da inverso de sexos na
identificao com o PN e nos papis parentais (pai que alimenta. Na 5 Etapa verifica-se uma
evoluo com a atribuio da funo alimentar figura materna), assim como, na
diferenciao de geraes, no distinguindo hierarquicamente diferenas entre a idade dos
pais e dos filhos na famlia. Ainda assim, as figuras masculinas so representadas de forma
mais madura que as femininas. A temtica edipiana simbolizada no carto Beijo deslocada
para a relao fraterna e a curiosidade sexual vinculada no carto Noite substituda pela
temtica oral. A Isabel parece encontrar-se ao nvel da relao dual com a figura materna, no
permitindo a separao emocional desta figura. Estas tendncias traduzem o no
estabelecimento do projecto identificatrio e, assim, a no elaborao do conflito edipiano.
A vivncia depressiva manifesta-se atravs do sentimento de desproteco parental
(carto Buraco), de carncia oral (Quem o mais feliz? () O PN. Porque ele est sempre a
comer) e inibio da agressividade face s figuras parentais e fraternas, resultando no
sentimento de culpabilizao pela introjeco da agressividade. A representao da pata negra
doente pode simbolizar a culpabilizao.
Os principais mecanismos de defesa utilizados so o deslocamento, idealizao,
formao reactiva, negao, evitamento e recusa dos conflitos.
A relao com o imago materno idealizada, representando a figura que desempenha
a funo de holding.
A relao com o imago paterno associada funo de alimentar e ao nascimento,
realizando uma inverso dos papis parentais.
A relao fraterna associa-se presena de rivalidade ainda, que por vezes, seja
evitada.

197

Anexo N: Teste de Relaes Familiares, Verso Casais Pais do Tom e Isabel

Me
Tabela 1 Nmero de itens emitidos e recebidos positivos/negativos (leves/fortes) atribudos
aos membros da famlia.
Emitidos
Emitidos
Recebidos
Recebidos
Total de
Positivos
Negativos
Positivos
Negativos
Envolvimento
Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes
Ningum

15

Me

Pai

24

Tom

21

Isabel

21

Av
Materno
Av
Materna
Tio Materno

16

30

16

Tia Materna

Tio Paterno

Tia Paterna

11

Av Paterna

A me do Tom e da Isabel colaborou durante a realizao da prova. Todavia,


observou-se um olhar triste e verbalizou alguns comentrios verbais como neste momento
sinto-me tmida e isolada no meu mundo, que no sei bem quem aprecia a minha companhia
expressado no momento em que reflectia a colocao do carto Esta pessoa da famlia
aprecia a minha companhia. Teve alguma dificuldade em seleccionar as pessoas mais
importantes e presentes da famlia alargada, tendo optado por incluir um total de sete pessoas
nesta categoria: av materno, av materna, tio materno, tia materna, tio paterno, tia paterna,
av paterna. Na famlia nuclear incluem-se a prpria me, o pai, o Tom e a Isabel.
Na anlise da Tabela 1 sobressai um forte envolvimento com a av materna do Tom e
da Isabel com afectos maioritariamente positivos de ternura e erotizados. Segue-se o pai, o
198

Tom e a Isabel com a maioria de afectos numa linha erotizada associados aos filhos. Em
seguida surgem os restantes elementos da famlia situando-se na ltima posio a prpria me
e a tia materna, registando apenas afectos positivos de tipo leve. No Ningum so colocados
os afectos positivos fortes e negativos rejeitados e negados.

30
25
20
15
10
5
0

Figura 1 Nmero total de itens associados a cada membro da famlia.

Atendendo leitura da Figura 1 destaca-se uma relao muito forte da me com a av


materna do Tom e da Isabel, o que pode remeter para uma fraca autonomizao em relao a
esta figura. Apenas a seguir surge a relao com o pai e os filhos, Tom e Isabel, seguindo-se
a relao com o av materno e o tio materno (irmo da me). Entre as figuras da famlia com
as quais no estabelece laos biolgicos surge a tia paterna numa posio mais destacada, em
parte, devido ambivalncia no nmero de afectos positivos e negativos atribudos, seguindose a av paterna, o tio paterno (irmo do pai) e, por fim, a tia materna com o mesmo nvel de
envolvimento registado na prpria me. A utilizao da figura do Ningum permite a defesa
de afectos positivos fortes e negativos rejeitados da colocao nos membros da famlia.

199

16
14
12
10
8
Positivos

Negativos

4
2
0

Figura 2 Nmero de itens positivos e negativos emitidos a cada membro da famlia.


A avaliao dos afectos positivos e negativos emitidos pela me (Figura 2) permite
destacar um forte envolvimento emocional com a av materna, parecendo ainda dependente e
pouco autonomizada do espao relacional com a sua figura materna e da prpria famlia de
origem. Deste modo, a relao com os membros da famlia nuclear, com os avs maternos, tia
materna e a sua auto-estima surgem de forma idealizada, inibindo a expresso de
agressividade dirigida a estas figuras (utilizando o Ningum). Destes, apenas o pai e a Isabel
contm afectos negativos. Irrita-se muito depressa, tem mau feitio, no tem muita
pacincia (afectos de rejeio) e consegue fazer-me sentir muito irritado(a) (afectos
agressivos) no caso do pai, sendo curioso observar a excluso desta figura na colocao do
item gosto de estar sozinho(a) com esta pessoa da famlia atribuindo-o ao Tom, Isabel e
av materna, o que pode dar conta de dificuldades na relao de casal e das caractersticas
dependentes da me face s figuras em questo. No caso da Isabel surge d-me a volta ao
juzo (afectos agressivos), o que pode remeter para uma maior irritabilidade da me face s
condutas da filha. A relao com o tio materno composta por afectos positivos e negativos
como desmancha-prazeres, resmunga demasiado e no tem muita pacincia, numa
possvel aluso rivalidade fraterna. Na relao com as trs ltimas figuras, tio paterno, tia
paterna e av paterna prevalecem os afectos positivos face aos negativos, observando-se uma
relao ambivalente com a av paterna.

200

14
12
10
8
Positivos

Negativos

4
2
0

Figura 3 Nmero de itens positivos e negativos sentidos como recebidos por cada membro
da famlia.
A observao da Figura 3 permite destacar uma vez mais, um forte envolvimento
emocional da me com a av materna, desta feita com um afecto negativo percepcionado
como recebido fica zangada comigo (durante a colocao deste item ao pai e av materna
comenta por coisas que eu digo) colocando-se numa posio inferiorizada e culpabilizada
face prpria me. Contudo a relao com esta figura, assim como com o Tom, Isabel e av
materno volta a ser sentida de forma idealizada, negando os afectos negativos colocados na
figura Ningum. A relao com o pai e com o tio materno apresenta-se ambivalente. Os itens
nem sempre faz o que eu gostaria que fizesse, nem sempre me ajuda quando preciso,
resmunga comigo e fica zangado comigo associam-se relao com o pai, podendo dar
conta de dificuldades em lidar com os problemas da relao conjugal, sentimentos de
insegurana, inferioridade e culpabilidade e gosta de gozar comigo, nem sempre me ajuda
quando preciso surgem ligados ao tio materno, podendo remeter tambm para sentimentos de
insegurana e desvalorizao na relao com esta figura. Com a tia paterna e av paterna
destacam-se os afectos negativos recebidos diz coisas s para magoar os meus sentimentos
no caso da primeira e no precisa do meu amor e no gosta de mim no caso da av
paterna, parecendo sentir-se pouco aceite e valorizada na relao com estas figuras. Quanto
prpria me, tia materna e tio paterno no se registam quaisquer afectos recebidos, surgindo
uma indefinio dos afectos esperados por parte destas pessoas.
201

15
10
5
Emitidos Positivos
Recebidos Positivos

Emitidos Negativos
Recebidos Negativos

-5
-10

Figura 4 Direco dos afectos emitidos e recebidos positivos/negativos.


Atendendo anlise da direco dos afectos positivos/negativos emitidos e recebidos
(Figura 4) sobressai a percepo de um maior investimento positivo da me face aos membros
da famlia comparativamente com o investimento positivo recebido, que pode associar-se ao
desejo de agradar os outros, mas tambm ao sentimento de inferioridade e insegurana nestas
relaes. Ainda assim, a relao com a av materna alm de se constituir como a mais
significativa do ponto de vista do envolvimento total, tambm a relao melhor
correspondida ao nvel dos afectos positivos, registando apenas um afecto negativo (recebido)
devido culpabilizao da me. Os afectos negativos com o pai surgem equivalentes e com a
filha Isabel e o tio materno aparecem em nmero reduzido ainda que com superioridade dos
emitidos. Na relao com as figuras com as quais no estabelece laos biolgicos: tia materna,
tio paterno, tia paterna e av paterna, intensifica-se o sentimento de desvalorizao,
insegurana e falta de correspondncia afectiva positiva, surgindo um aumento de afectos
negativos recebidos por parte da tia paterna e um nmero recproco de itens negativos com a
av paterna. A auto-estima da me parece idealizada e na figura do Ningum so descartados
os itens maioritariamente de cariz negativo, bloqueando a expresso agressiva nos elementos
da famlia.

202

Tabela 2 Nmero de itens associados a sentimentos de proteco e atribuio de


incompetncia ou fraqueza.
Sentimentos
de Proteco
Ningum
Me
Pai
Tom
Isabel
Av Materno
Av Materna
Tio Materno
Tia Materna
Tio Paterno
Tia Paterna
Av Paterna

0
2
4
3
3
4
3
2
1
1
1
1

Atribuio de
Incompetncia ou
Fraqueza
0
2
2
0
0
0
0
0
0
0
2
0

A anlise dos sentimentos de proteco e atribuio de incompetncia ou fraqueza pela


me (Tabela 2) traduz a percepo de caractersticas mais dependentes no pai e no av
materno, manifestando o desejo de os proteger (pode associar-se a uma desvalorizao destas
figuras masculinas). Seguem-se o Tom, a Isabel e a av materna com trs afectos deste tipo e
a prpria me e o tio materno com dois afectos cada. Por ltimo, surgem os elementos da
famlia com os quais a me no tem ligaes biolgicas (tia materna, tio paterno, tia paterna e
av paterna). Nos afectos de incompetncia ou fraqueza surgem apenas as figuras da me
no tem uma personalidade suficientemente forte, no consegue lidar suficientemente bem
com dificuldades tambm associado tia paterna, tal como no consegue enfrentar
suficientemente bem as outras pessoas, revelando sentimentos de insegurana e
culpabilizao e, ainda, o pai deveria ajudar mais em casa e deveria desempenhar um
papel mais importante na vida da famlia, reenviando para dificuldades na gesto da relao
de casal, sentindo-se pouco apoiada e o pai demitido das suas funes conjugais/parentais.

Sntese da Anlise do Teste de Relaes Famliares (TRF)

A me utiliza a figura do Ningum para a negao dos afectos positivos fortes e


sobretudo dos afectos negativos inibindo, assim, a projeco de agressividade nos elementos
da famlia.
A auto-estima da me surge de forma predominantemente idealizada, mas tambm
com afectos depressivos na linha da insegurana, inferioridade e culpabilizao na relao
203

com os outros. Sentindo-se desvalorizada e insegura em especial com os elementos exteriores


famlia biolgica. Parece ainda muito dependente e pouco autonomizada do espao
relacional com a sua figura materna e da prpria famlia de origem.
Com o pai verifica-se um forte envolvimento emocional (no superior ao mantido com
a av materna) sustentado por uma percepo idealizada da relao quanto aos afectos
emitidos e ambivalente no plano dos afectos recebidos. Assim, sobressaem as dificuldades na
relao de casal associadas ao sentimento de carncia de apoio, compreenso e pouco
envolvimento nas funes conjugais/parentais do pai, mas tambm a interferncia de
sentimentos de insegurana e culpabilidade por parte da me. O pai ainda caracterizado de
forma dependente da proteco da me, podendo associar-se a uma percepo desvalorizada
desta figura.
A relao com o Tom percepcionada essencialmente de forma muito prxima,
dependente e idealizada, procurando a sua proteco e cuidado.
A relao com a Isabel obteve um nvel de envolvimento elevado, caracterizando-se
como dependente e idealizada, ainda que desperte afectos agressivos na me, sentindo-se
irritada face a determinadas condutas da filha (o que pode constituir-se como um sintoma
depressivo na me).
Com o av materno a me projecta uma relao idealizada e pouco autonnoma,
associando-lhe caractersticas dependentes dos cuidados da me, podendo representar uma
forma de desvalorizao desta figura.
Na relao com a av materna observa-se uma relao excessivamente prxima,
dependente e idealizada, ainda que seja tambm a mais satisfatoriamente correspondida.
A relao com o tio materno marcada por sentimentos ambivalentes relacionados
com a rivalidade fraterna, assim como pela carncia de apoio e desvalorizao por parte desta
figura face me.
A relao com a tia materna, ainda que investida de forma positiva pela me sentida
como desvalorizada pela indefinio e falta de correspondncia ao nvel dos afectos recebidos
por parte desta figura.
Com o tio paterno assiste-se projeco de uma relao pouco investida e valorizada
pela indefinio e ausncia de correspondncia ao nvel dos afectos recebidos por parte desta
figura.
No que se refere tia paterna a relao vista igualmente de forma pouco investida e
valorizada, contudo a me sente-se mal-aceite por esta figura, atribuindo-lhe sentimentos de
incompetncia e fraqueza.
204

Por fim, na relao com a av paterna so emitidos afectos ambivalentes, recebendo


apenas afectos agressivos desta figura, sentindo-se desvalorizada e no-aceite.

Pai
Tabela 1 Nmero de itens emitidos e recebidos positivos/negativos (leves/fortes) atribudos
aos membros da famlia.
Emitidos
Emitidos
Recebidos
Recebidos
Total de
Positivos
Negativos
Positivos
Negativos
Envolvimento
Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes
Ningum

25

Pai

Me

20

Tom

22

Isabel

22

Av Paterna

34

Tio Paterno

21

Tia Paterna

17

Primo
Gmeo
Primo
Gmeo

18

18

O pai do Tom e da Isabel colaborou durante a passagem da prova TRF realizando


poucos comentrios verbais. Opta por incluir na prova os seguintes elementos da famlia: o
prprio pai, a me, Tom, Isabel, av paterna, tio paterno, tia paterna e primos gmeos (filhos
dos tios paternos). Estes dois ltimos elementos so referidos sem qualquer tipo de distino
entre eles visto que obtiveram exactamente os mesmos afectos (ainda que ao primeiro dar-se-
o nome de Mrio e ao segundo Diogo). Ao escolher as figuras onde so colocados os itens
curioso observar que o pai atribuiu uma figura com fisionomia de jovem-adulto ao Tom.
Na Tabela 1 figuram os itens atribudos a cada membro da famlia. Sobressai um
elevado mecanismo defensivo atravs da utilizao do Ningum para a colocao dos afectos
de cariz agressivo, bloqueando a expresso deste tipo de pulso. No total de envolvimento
destacam-se as figuras da av paterna ( tambm o elemento que contm mais afectos de
205

rejeio), do Tom e da Isabel (apenas com afectos positivos, obtendo o maior nmero de
afectos erotizados entre os vrios elementos, sobressaindo a Isabel), tio paterno e s depois
surge a me (ambos com afectos de rejeio semelhana da av paterna).

35
30
25
20
15
10
5
0

Figura 1 Nmero total de itens associados a cada membro da famlia.

Ao analisar o total de envolvimento do pai com cada elemento da famlia (Figura 1)


destaca-se a av paterna, seguindo-se os filhos Tom e Isabel com o mesmo nmero de
afectos positivos, o tio paterno, a me, os primos gmeos com os mesmos itens, a tia paterna
e, por ltimo, o pai. Este tipo de configurao permite-nos observar uma forte ligao com a
famlia de origem, nomeadamente com a prpria me (av paterna), parecendo continuar a
desempenhar um papel importante na vida afectiva do pai, podendo remeter para dificuldades
no processo de autonomizao desta figura. O menor envolvimento afectivo com a me pode
associar-se a este ltimo facto, mas tambm a conflitos na relao de casal atenuados com a
utilizao do Ningum para a colocao dos afectos recusados e negados bloqueando, assim, a
expresso agressiva dirigida aos outros.

206

16
14
12
10
8
Positivos

Negativos

4
2
0

Figura 2 Nmero de itens positivos e negativos emitidos a cada membro da famlia.


A leitura da Figura 2 permite apurar, desde logo, uma forte defesa na ordem da
idealizao de todos os elementos da famlia, incluindo na auto-estima do pai estou
disposto(a) a fazer tudo por esta pessoa da famlia e estou muito orgulhoso(a) desta pessoa
da famlia (afectos positivos fortes). Assim, na figura do Ningum so colocados os afectos
de cariz negativo negados e recusados, inibindo a expresso da agressividade. As figuras com
as quais estabelece um maior envolvimento afectivo do ponto de vista dos afectos emitidos, a
av paterna e o tio paterno so tambm as nicas s quais so emitidos afectos negativos de
rejeio. No caso da av paterna so chata, irrita-se muito depressa, resmunga
demasiado, no tem muita pacincia e fica zangada demais percepcionando-a de forma
austera/rgida e autoritria, sendo que os nicos afectos positivos no associados a esta figura
so muito alegre e muito divertida. O nico afecto negativo emitido ao tio paterno
por vezes tem mau feitio.

207

12
10
8
6
Positivos
4

Negativos

2
0

Figura 3 Nmero de itens positivos e negativos sentidos como recebidos por cada membro
da famlia.

A anlise dos afectos sentidos como recebidos (Figura 3) permite destacar um forte
mecanismo defensivo na linha da idealizao de todas as figuras da famlia, excepto o prprio
pai (no obteve itens), a me e a av paterna. Com a me sente uma relao ambivalente,
registando-se a presena de afectos negativos como fica ressentida comigo, resmunga
comigo e fica zangada comigo parecendo transmitir a ideia de uma pessoa pouco tolerante
e com irritabilidade emocional. A me situa-se entre os trs elementos (tio paterno e tia
paterna) dos quais o pai recebe menos afectos erotizados, o que pode associar-se percepo
de uma relao pouco erotizada e afectuosa por parte da me. Por outro lado, dos filhos Tom
e Isabel sente que recebe mais afectos positivos fortes, nomeadamente da filha onde se
destaca o item referente a gosta de me beijar apenas atribudo a esta, podendo traduzir um
contacto sedutor com o pai por parte da Isabel. Com a av paterna apesar de sentir que quer
mesmo o meu amor, muito carinhosa comigo e ama-me muito (afectos erotizados que
traduzem uma forte dependncia emocional ao materno) percepciona-a como uma pessoa
ressentida, nem sempre faz o que eu gostaria que fizesse, resmunga e fica zangada,
ligando-a a uma figura austera e punitiva. O tio paterno registou um afecto negativo
resmunga comigo. Na personagem Ningum so remetidos, uma vez mais, os afectos
negados, inibindo a projeco de agressividade nos elementos da famlia.

208

20
15
10
5

Emitidos Positivos

Recebidos Positivos
Emitidos Negativos

-5

Recebidos Negativos
-10
-15

Figura 4 Direco dos afectos emitidos e recebidos positivos/negativos.


Avaliando a direco dos afectos emitidos e recebidos (Figura 4) observa-se o
sentimento de correspondncia apenas na relao com os filhos, Tom e Isabel. Com o resto
dos elementos da famlia sente que emite mais afectos positivos do que aqueles que recebe,
podendo sentir-se pouco valorizado. Esta diferena acentua-se na relao com a av paterna e
com o tio paterno, sendo as figuras com as quais mantm maior envolvimento emocional e,
portanto, maior ligao famlia de origem comparativamente com a nuclear, o que pode
reenviar para um fraco processo de autonomizao destes elementos, sobretudo da av
paterna. Por outro lado, no mbito dos afectos negativos emitidos/recebidos verifica-se uma
correspondncia com estes dois elementos (av e tio paterno), contudo, com a me apenas
recebe afectos negativos. No Ningum destacam-se as defesas ao nvel dos afectos negativos
rejeitados.

209

Tabela 2 Nmero de itens associados a sentimentos de proteco e atribuio de


incompetncia ou fraqueza.
Sentimentos
de Proteco
Ningum
Pai
Me
Tom
Isabel
Av Paterna
Tio Paterno
Tia Paterna
Primo
Gmeo
Primo
Gmeo

0
1
2
1
1
3
0
0
0

Atribuio de
Incompetncia ou
Fraqueza
5
0
0
0
0
0
0
0
0

Atendendo Tabela 2 observa-se uma forte defesa na atribuio de afectos de


incompetncia ou fraqueza aos elementos da famlia, defendendo-se atravs da utilizao da
figura Ningum. Assim, revela, uma vez mais, um elevado grau de neuroticismo, com forte
bloqueio da agressividade. Na atribuio de sentimentos de proteco surgem a av paterna, a
me, o pai, o Tom e a Isabel, respectivamente, com os trs ltimos elementos a apresentar
um menor desejo de proteco. Encontra-se uma vez mais patente a forte ligao afectiva que
mantm com a av paterna.

Sntese da Anlise do Teste de Relaes Famliares (TRF)

A figura Ningum utilizada para rejeitar e negar sobretudo os afectos negativos ou


que transmitam afectos de incompetncia ou fraqueza face aos membros da famlia. Assim,
apresenta um elevado grau de neuroticismo, com forte bloqueio da agressividade.
A auto-estima do pai surge de forma defensiva, atravs do recurso idealizao.
Na relao com a me destaca-se uma vivncia pouco valorizada por parte do pai,
idealizando os afectos positivos emitidos e sentindo os afectos recebidos como ambivalentes.
Esta percepo permite antever conflitos na relao de casal, sentindo a me como uma
pessoa pouco tolerante e com irritabilidade emocional, transmitindo pouco afecto e erotizao
relao. Exprime o desejo de a proteger.
Com o Tom a relao percepcionada de forma idealizada, ainda que correspondida.
210

A relao com a filha Isabel idealizada e correspondida. Sente que a filha estabelece
um contacto fcil e sedutor com o pai.
Com a av paterna assiste-se projeco de um forte envolvimento que pode traduzir
uma dependncia emocional elevada face a esta figura e dificuldades no precesso de
autonomizao do espao materno. Expressa, assim, o desejo elevado de proteger esta figura.
A av paterna , ainda, percepcionada de forma austera e autoritria.
A relao com o tio paterno apresenta um elevado grau de envolvimento afectivo,
dependendo ainda muito desta figura a nvel emocional, ainda que emita e receba afectos
negativos. O pai parece sentir-se desvalorizado emitindo mais afectos positivos do que
aqueles que recebe do tio paterno (irmo do pai).
A relao com a tia paterna apresenta-se pouco significativa face relao que
mantm com os restantes elementos da famlia. Contudo, surge de forma idealizada e pouco
correspondida quanto ao maior nmero de afectos positivos emitidos pelo pai.
Com os primos gmeos a relao idealizada e pouco correspondida, assinalando-se
um maior nmero de afectos positivos emitidos pelo pai.

211

Anexo O: Estudo de Caso 3 Joo (9 anos e 6 meses)

O Joo encontra-se com nove anos e seis meses e frequenta o 4 Ano do 1 Ciclo do
Ensino Bsico. Trata-se de uma criana com idade aparente coincidente com a idade real.
Apresenta um aspecto cuidado e investido, vestindo-se de acordo com o gnero e idade.
Utiliza culos. O Joo pareceu-me uma criana frgil, ansiosa, insegura, perfeccionista,
hipermatura com um olhar triste, evitando, por vezes, manter contacto ocular. No entanto,
estabelece um bom contacto com a observadora, verbalizando com fluncia e espontaneidade,
ainda que sobressaia a necessidade marcada de preencher o espao, o vazio sentido no
silncio e nas folhas de desenho. Utiliza um vocabulrio muito rico, denotando um bom nvel
cognitivo. Durante a realizao das provas faz diversos comentrios verbais com cariz de
auto-desvalorizao est um bocado mal pintado, indeciso ou que expressam a necessidade
de apoio por parte da observadora, queixando-se de dores num brao enquanto preenchia o
Desenho de Famlia. Manifestou tambm a carncia de apoio e ateno por parte dos pais o
meu pai est sempre a trabalhar, quase s chega a casa hora do jantar () a minha me
trabalha muito em casa, a minha me est sempre no computador, faz reunies no Skype e no
podemos incomodar e, ainda, rivalidade fraterna o meu quarto mais pequeno que o quarto
da minha irm. Durante a passagem das provas revelou, tambm, alguma confuso e
lentificao do pensamento.
Com o evoluir das sesses apresentou um comportamento mais agitado, pouco
controlado e disperso, revelando-se, por vezes, cansado. No entanto, manteve-se atento nas
provas propostas e no que lhe era dito, respondendo adequadamente.
Durante a entrevista com os pais o Joo que se encontrava sozinho numa sala ao lado,
sentiu a necessidade de bater porta e entrar, podendo remeter para ansiedade de separao.
Os pais demonstraram-se pouco receptivos a este comportamento do filho, revirando os olhos
e pedindo-lhe que continuasse os desenhos (principalmente a me), pelo que o Joo aceitou
sair da sala de entrevista.
Contra-transferencialmente senti uma angstia muito forte no Joo. Senti-o muito
triste e em desassossego permanente.
A pedido da professora da escola o Joo foi encaminhado pelo mdico de famlia do
Centro de Sade de referncia Unidade de Pedopsiquiatria com queixas de hiperactividade,
dfice de ateno, dificuldades escolares e baixa auto-estima. acompanhado em consultas
teraputicas de psicologia de frequncia quinzenal h cerca de oito meses, beneficiando,
ainda,

de

interveno

familiar

com

os

pais

em

consultas

de

pedopsiquiatria.

Aproximadamente quinze dias antes do incio da recolha dos dados para a presente
212

investigao foi medicado com Concerta 18mg Comprimidos, parando a medicao cerca de
dois meses e meio depois (no incio do Vero).
O Joo vive com a irm de cinco anos e com os pais, ambos fisioterapeutas e com
Mestrado na rea (a me encontra-se a fazer o Doutoramento e trabalha num hospital
peditrico. O pai professor universitrio). A relao do Joo com os pais descrita pela me
como boa, apesar de nunca ter gostado de contacto fsico, no uma criana que pea
mimos. Quanto relao do Joo com a irm a me assinala que quando eu estava grvida
ele no se interessava muito pela beb, no a queria em casa. Mas assim que ela nasceu
adorou-a e acrescenta que o Joo revela-se muito protector, muito responsvel e integra-a
na escola. No que designa a relao do Joo com outros adultos os pais reconhecem como
sendo sempre muito boa, porm, com outras crianas, apesar de ter amigos preferenciais no
convida ningum da escola para a festa de anos, apenas os filhos dos amigos dos pais e os
avs. Foi diagnosticada depresso tia paterna do Joo, enquanto na famlia alargada da me
desconhecem-se casos de patologia psiquitrica. Aparentemente a me tem dislexia, segundo
a prpria.
A me do Joo encontra-se fisicamente investida e cuidada, com vesturio adequado
sua faixa etria e gnero. Concordou participar no estudo contudo, pediu para ter acesso aos
resultados no final da investigao. Inicialmente, ao ler o consentimento informado mostrouse reactiva investigao quanto temtica do diagnstico do filho, criticando o facto de
considerar que o problema do filho no corresponde a qualquer um dos sintomas descritos na
folha, parecendo irritada e desconfiada com esse facto. Eu pergunto-lhe quais so ento os
sintomas que o filho apresenta. A me indica-me que o filho tem dificuldade em concentrarse numa tarefa, em concluir uma tarefa. Tem falta de motivao tambm. Eu explico-lhe que
esse tipo de sintomas enquadram-se no pretendido para o estudo e a me continua a insistir
que no o que eu tenho escrito no consentimento informado o meu filho no tem
instabilidade, no agressivo, nem inibido com problemas escolares, do sono, alimentares,
ou estes que tem aqui!. Respondo-lhe que no precisa de ter todos esses, pode at apresentar
apenas um, so sintomas alargados. A me confessa-me que no tem a ver com o que tenho
escrito porque os pais consultaram o DSM-IV e o comportamento/sintomas do filho insere-se
num diagnstico de hiperactividade com dfice de ateno. Neste momento, senti que
estabeleceu um contacto reservado comigo, sem me olhar nos olhos. Com o evoluir da sesso
este contacto tornou-se mais disponvel e adequado, verbalizando com maior espontaneidade.
Apresenta um vocabulrio rico, utilizando termos tcnicos empregues na rea da sade
mental. Mais adiante, enquanto acompanhava o Joo para uma sesso do presente estudo, nas
213

escadas, ouvi a me criticar o processo demorado de andar em consultas de psicologia e que


no tem muita pacincia para isso.
O pai do Joo apresenta um aspecto fsico adequado ao grupo etrio, encontrando-se
investido e cuidado. Estabeleceu um contacto reservado, no mantendo contacto ocular.
Pessoalmente senti o pai do Joo inseguro (por vezes, baixava a cabea), com o mesmo olhar
triste que sinto no filho. Achei-os muito parecidos no aspecto fsico (pela face e cabelos
semelhantes e ambos utilizam culos) e no que me faziam experienciar atravs da sua
presena. Utilizou um discurso rico e espontneo aps o questionar sobre o filho. Senti-o
muito disposto a colaborar no estudo, permitindo que aps a consulta com a psicloga, o Joo
ficasse cerca de quarenta minutos comigo, mesmo no lhe sendo conveniente no momento,
por motivos de tempo.
Os pais colaboraram ao longo da entrevista, revelando-se muito interessados em
participar. Ambos utilizam uma linguagem rica e espontnea, verbalizando sobre os pontos
em que esto de acordo e as suas divergncias, revelando opinies crticas e prprias.
Frequentemente, a me iniciava as respostas s questes colocadas e insistia para que o
marido desse a prpria opinio que, por vezes, era contrria, acabando por verbalizar com
menos frequncia que a companheira. Algumas vezes, o casal pedia-me para especificar as
questes colocadas. O pai do Joo manifestou uma conduta agida ao longo da entrevista,
mexendo em folhas e na minha agenda que se encontravam sua frente, ao meu lado em cima
da mesa, principalmente durante o tempo em que escutava a esposa falar e este encontrava-se
em silncio. Ao contrrio da me do Joo que, ainda assim, manteve pouco contacto ocular, o
pai do Joo nunca estabeleceu contacto ocular comigo, olhando para o lado enquanto fala.
Segundo a me as preocupaes com o comportamento do Joo iniciaram-se por volta
dos trs anos, com a entrada no jardim-de-infncia. Na altura, a educadora alertou os pais
sobre as dificuldades na articulao das palavras do Joo (os pais j tinham observado este
problema, no entanto pensaram que o filho recuperaria com o desenvolvimento). Assim, com
quatro anos acompanhado em terapia da fala, no entanto, cerca de um ano depois conclui-se
que se trata de uma dificuldade essencialmente emocional, sendo encaminhando para uma
psicloga no privado. Esteve um ano e meio a ser acompanhado em psicoterapia semanal e,
para a me, at data da alta clnica observaram-se muitas melhorias como uma maior
facilidade em expressar os seus sentimentos. Segundo a psicloga ele tinha muitas
capacidades, confessa a me. No entanto, desde cedo que mantm uma forte intolerncia
frustrao ele sempre foi assim, quando no capaz de fazer alguma coisa ou mnima
contrariedade guincha e chora. Ainda em beb fez uma endoscopia e j tinha ndulos nas
cordas vocais do esforo que fazia a guinchar indica a me.
214

Com a entrada para o jardim-de-infncia comearam as somatizaes: assim que


entrava no jardim-de-infncia vomitava e a av levava-o de novo para casa, tendo-se
regularizado a situao em meados do Natal desse ano. Foram-lhe diagnosticados tambm
broncoespasmos, asma no alrgica e vrios problemas de pele (estrfulos), sempre
associados ao aumento de ansiedade. Recentemente a me observou estereotipias faciais no
Joo em situaes que exigem que esteja quieto, sentado e de maior ansiedade ou frustrao,
ainda que no sejam muito frequentes.
Durante o 1 e o 2 Ano de escolaridade, apesar da intolerncia frustrao e da
conduta irrequieta, adquiriu as competncias necessrias e a professora assinalou os seus
marcados conhecimentos de cultura geral.
Para a me o Joo sempre foi muito interessado, muito atento, muito consciente at
mesmo do perigo e sempre teve imensas capacidades e facilidade em aprender. Mas de h um
tempo para c as capacidades tem vindo a baixar, apesar do rendimento escolar se manter o
Joo tem vindo a perder competncias, ele j foi bem melhor, j escreveu melhor, j foi
melhor a matemtica e agora tem de estar sentado com a professora para fazer os trabalhos e
chora, os cadernos esto cheios de buracos de ele chorar tanto. Segundo a me, estas
dificuldades acentuaram-se no incio do 3 Ano foi um inferno. Era chamada escola porque
ele no faz sequer as tarefas mnimas nem com a professora ao lado, chora assim que v o
plano para o dia ou um problema no quadro, assim desde o 1 Ano, mas agora pior.
Sempre sofreu por antecipao e verbaliza vrias vezes que a soluo para isto era a morte.
Ao incio no liguei mas depois comecei a repreende-lo e a chatear-me com ele quando dizia
isto. O Joo costuma tambm lamentar no sou capaz porque que eu vivo? e no
consigo fazer as tarefas, a minha vida um inferno. Na ptica do pai o Joo fica
valentemente angustiado na escola e se h algum problema fica muito, muito ansioso. Este
ano acho que no houve um dia em que tivesse cumprido o plano.
Na sala de aulas apresenta tambm dificuldade em estar sentado e concentrado,
distraindo-se com muita facilidade, ainda que sozinho, mas prximo da professora e com os
materiais reduzidos ao essencial (tendem a estar desorganizados). Em casa no pra quieto e
no se concentra nem um segundo, mesmo quando est a fazer uma coisa que gosta, indica a
me.
Na opinio da me o filho foi sempre muito hipermaturo, manifestando interesse e
preocupao por assuntos sociais comuns aos adultos j em pequeno se metia nas nossas
conversas. As pessoas amigas dizem que ele assim porque ns puxamos por ele e por isso
que to interessado mas, a minha filha recebe a mesma educao e no assim, muito
mais despreocupada, muito mais calma do que ele. Por ltimo confessa ainda: sinto que ele
215

tem medo, medo de no ser bom de no ser suficientemente bom e de nos desiludir. Sozinho,
em consulta com a psicloga o Joo desabafa os meus pais so ptimos, comigo que so
problemas, as vezes fico triste, podia ser uma pessoa melhor, queria ser um bocado melhor e,
ainda, os pais dizem-me: melhor teres cuidado, no te lembras da ltima vez? Por favor
hoje faz-nos sentir bem. Penso que os meus pais vo ficar tristes ou no vo. Mas, no o
suficiente para eu me esforar. uma grande preocupao o 5 Ano, se eu no fizer nada irei
chumbar o 5 Ano, vai ser desconfortvel. Tambm no sei porque me distraio, mas no me
compreendo.
Num relatrio escolar do 3 Ano pode-se ler o Joo um aluno que desde o primeiro
ano de escolaridade tem demonstrado um aproveitamento positivo mas aqum do seu
potencial. A rea da lngua portuguesa aquela em que o aluno revelou mais dificuldades
inicialmente. Desenvolveu as competncias de leitura e de escrita, mostrando dificuldades no
que concerne ortografia e caligrafia, embora registe melhorias. Este processo tem sido mais
lento uma vez que nos dois primeiros anos de escolaridade o aluno fez uma grande resistncia
aos trabalhos de consolidao da escrita () uma criana que tem revelado alguma
ambiguidade pois, por um lado, tem uma grande capacidade de auto-anlise e de compreenso
dos seus intuitos e aces mas, que por outro, demonstra uma grande imaturidade quando se
depara com situaes de frustrao. No que concerne relao com os pares revela
sentimentos de inferioridade e de no-aceitao; contrariamente aos seus desejos, no
consegue liderar as brincadeiras, o que tenta compensar fazendo as diabruras que os colegas
pedem que faa por eles. Quando confrontado com os seus actos diz que no queria ter feito
mas que lhe tinham dito para o fazer (este comportamento tem-se verificado cada vez menos).
frequente encontrar o Joo a acompanhar crianas que so de algum modo mais frgeis,
podendo assim liderar e evitar confrontar-se com situaes de frustrao () , na minha
opinio, uma criana com uma auto-estima frgil que necessita de aumentar os seus tempos de
concentrao para que a avaliao dos seus trabalhos faa justia ao esforo que o aluno tem
feito. Em consultas com a psicloga o Joo revela que gozado pelos colegas por chorar
muito nas aulas.
Segundo a informao presente no relatrio escolar do 4 Ano as dificuldades de
concentrao nas tarefas propostas mantm-se, ficando muitas vezes por concluir. Esta
situao faz com que o Joo se sinta mais frustrado, agravando o desenvolvimento e aplicao
dos seus conhecimentos. Deste modo, a professora assinala: premente que o Joo consiga
realizar os seus trabalhos no tempo estipulado para que nem a sua auto-estima, nem o seu
sucesso escolar fiquem comprometidos.
216

A gravidez do Joo no foi planeada, embora tivesse sido muito desejada. Durante a
gravidez a me sentiu-se muito ansiosa, tendo contraces desde as dezoito semanas. O Joo
nasceu de parto eutcico, a termo (com trinta e nove semanas). Pesava 3,950kg e media 50cm.
Aps o nascimento do filho a me sentia-se muito bem, era um beb com muitas
competncias. Assim, a me recorda o filho no primeiro ano de vida como uma criana com
elevada competncia motora, muito observador e com muito interesse pelo meio, muito
consciente mesmo do perigo, no se magoa. Para o pai o Joo muito curioso, activo,
muito participativo com adultos. Facilmente era o centro das atenes, causava espanto pelo
seu interesse elevado para a mdia.
No que concerne aos aspectos do desenvolvimento, em beb o Joo no fazia sestas
durante o dia e, mais tarde, nunca conseguiu dormir no jardim-de-infncia. Os pais queixamse que sempre dormiu pouco e que nunca tem sono, ainda que, desde os oito anos que dorme
aproximadamente nove horas dirias, acordando bem-disposto e com energia. Comeou a
dormir em quarto prprio a partir dos quatro meses. Porm, quando a irm nasceu passaram a
partilhar o quarto (quando o Joo tinha cerca de quatro anos). Voltou a dormir sozinho h um
ano. Comeou a gatinhar com cerca de oito meses e a andar sem apoio aos dez meses. As
primeiras palavras do Joo foram proferidas aps os dezoito meses. O controlo esfincteriano
diurno ocorreu aos vinte e oito meses embora, por vezes, j manifestasse a preocupao de
acordar durante a noite para ir casa-de-banho. Contudo, o controlo dos esfncteres nocturno
consuma-se aos trs anos de idade. Ao nvel alimentar os pais queixam-se de uma m
alimentao. Nunca usou chucha nem levou nada boca.
Aps o nascimento, a me teve o apoio da av materna do Joo que cuidou do neto
enquanto a me tinha aulas na faculdade e estudava. Ficou aos cuidados desta av at aos trs
anos, idade a partir da qual ingressou no jardim-de-infncia e desenvolveu variadas
somatizaes (acima referidas).

217

Guio de Entrevista dos Pais

Identificao da Criana

Nome: Joo

Gnero: Masculino

Idade: 9 Anos e 6 Meses

Data de Nascimento: 2001

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Ano de escolaridade: 4 Ano

Reprovou algum ano? No

Se sim, qual (quais)? __________

Caracterizao Scio-Demogrfica da Famlia

Quem so os elementos que compem o agregado familiar (elementos que vivem na mesma
casa)?
(Constituio do genograma familiar)

68

41

64

39

60

38

58

37

218

30

30

Me
Idade: 37 Anos

Data de Nascimento: 1974

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: Casada

Habilitaes Literrias: Mestrado, a realizar Doutoramento

Profisso: Fisioterapeuta

Situao Profissional: Empregada

Quais so os seus principais papis na famlia?


Partilho com o meu marido as tarefas com os filhos (trabalhos de casa) e
documentao. Organizao domstica: alimentao, roupa. Estimulo mais para actividades
de aprendizagem.

Quais so os seus principais gostos e interesses pessoais?


Interesses culturais, como viajar.

Pai
Idade: 38 Anos

Data de Nascimento: 1973

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: Casado

Habilitaes Literrias: Mestrado

Profisso: Professor do Ensino Superior. Fisioterapeuta. Situao Profissional: Empregado

Quais so os seus principais papis na famlia?


Tarefas partilhadas com a esposa.

Quais so os seus principais gostos e interesses pessoais?


Actividades relacionadas com cinema, msica, ler. Tambm desporto e quero incluir o
Joo.

Irmo()
Gnero: Feminino
Idade: 5 Anos

Data de Nascimento: 2006

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: ___________________

Habilitaes Literrias: _______________

Ao cuidado de/Creche/Infantrio/Escola (ano frequentado): Pr-Primria.


Profisso: ____________________________ Situao Profissional: _______________
219

Relaes Familiares

Qual a situao familiar actual (apoios sociais e/ou familiares, existncia de doenas fsicas
e/ou psicolgicas, problemas sociais, econmicos, exposio a fontes de stress, entre outros)?
Os pais encontram-se muito envolvidos na profisso, ocupando muito o seu tempo.
Sentem que tm muita dificuldade com a situao do Joo pois transferem para ele o stress
que sentem, vm nele um espelho das suas incapacidades e fraquezas. Por isso existe stress
na relao com ele, no conseguindo implementar estratgias para sair da situao. Com a
Maria (irm do Joo) no sentem isso. As questes monetrias no os afectam tanto pois
investem e organizam-se bem. A me acha que o filho tem dislexia, apesar de ter realizado
vrios testes e no acusar. A professora diz que ele s vezes d erros e outras vezes no. O
Joo confronta a me dizendo-lhe que ela tambm comete erros a escrever, como se fosse por
influncia da me. O Joo manipula pelo interesse.

Algum membro da famlia necessita de se ausentar ou ausentou-se no passado


temporariamente ou com frequncia, por motivos de trabalho, estudo, ou outros? Quando?
Durante quanto tempo? Como que a criana reagiu a essa(s) separao(es)? E os restantes
membros da famlia?
Ambos os pais ausentam-se esporadicamente s sextas-feiras e num ms permanecem
dois ou trs dias fora, por motivos de trabalho. Em trabalho, comum o pai ficar ausente por
um perodo de uma, duas, trs semanas ou um ms fora. A me dava aulas no Instituto
Politcnico de Castelo Branco. Desde o nascimento do Joo que isto acontece. O Joo reage
bem mas fica ansioso (pergunta se j chegaram). Ele no quer dormir em casa dos avs. A
irm fica mais tranquila.

Algum membro da famlia faleceu, separou-se ou divorciou-se desde a gravidez da criana?


Quem? Qual o possvel impacto na famlia?
A bisav materna faleceu faz um ano. Foi a primeira morte na famlia para o Joo.
Ele no verbaliza sobre este assunto, enquanto a irm quer ir ao cemitrio. A causa da morte
deve-se a um cancro que avanou de forma rpida. Foi pesado para a me do Joo, a bisav
era uma pessoa com muita autonomia e era um suporte da famlia materna e as coisas
desmoronaram-se mais. Por outro lado, os avs paternos encontram-se em processo de
separao e o Joo tambm no verbaliza sobre este assunto parecido com o pai,
acrescenta o pai. O pai no est a lidar bem com esse facto. A irm do Joo confronta os
220

avs com a situao, testa-os (diz-lhes que um diz uma coisa e o outro diz outra). A me do
Joo encara a situao com estranheza e tenta-se pr parte.

Como a relao da criana com a me?


(Aps colocar a questo a me pede-me para precisar o que pretendo saber). Me
protectora, exigente. Transfere para ele a relao que teve com os prprios pais,
automtico. D mais feedback negativo, comparao negativa com a irm, colegas do Joo.
Tenta que seja uma relao mais autnoma. Com afecto nunca , desde beb ele no aceita
afecto. Dificuldade nos afectos nunca o conseguimos abraar e dar beijinhos, mas pede
para o ir tapar noite. (Peo me para me descrever os aspectos positivos da sua relao
com o filho e do prprio filho e a me apercebe-se que se centrou nos aspectos negativos).
Fala com a me. A me tambm partilha os mesmos interesses, os mesmos desafios. Ele
compreende bem as necessidades da me e a me no to assim. Embora ele no as
respeite tanto (necessidades da me).

Como a relao da criana com o pai?


Dicotmica. Proximidade e envolvimento ou autoritrio e paternalista. O Joo no
percebe bem o lado que est a pender. Ele comea a exigir o porqu de o pai reagir mal. Tem
a ver com o pai no estar bem, ou com tarefas em que est envolvido. O Joo tenta perceber
qual o foco. O pai protector da pior maneira, acha que ele no consegue e faz por ele.
Considera que o Joo tem boas ideias. Os pais acham que o condicionaram dificuldades no
meio-termo e fazer compromissos, da parte do pai.

Como a relao da criana com os irmos (com cada um)?


To depressa queixa-se irm dela ter nascido e chama-lhe nomes, como a pessoa
que mais d afecto, protege a irm, preocupa-se com a parte educativa da irm. Competem
muito. Ensina-lhe coisas. Com a presena dos avs mais agressivo e provocativo com a
irm. Com os pais respeita mais. Controla as amizades da irm.

E com os restantes membros da famlia?


Bem. Testa os avs maternos e paternos. Com o av paterno tenta cativ-lo, no o
prejudicar, aproveita mais o tempo, no est tanto tempo com ele, est menos vontade. A
tia paterna no v muito e o tio materno tambm no v com tanta frequncia, mas o
modelo dele, gosta muito dele, v tio como adolescente, brincam.
221

Gostaria que me descrevessem a vossa relao (relao do casal parental).


(Aps colocar a questo a me pede-me para precisar o que pretendo saber com a
questo). Me: No tm demonstrao de afectos, os poucos que tm os filhos condenam.
No gerem bem a comunicao. s vezes dizem aos filhos para dizer x ao pai/me. O pai
mais passivo, verbaliza menos, menos afectos, dificuldade em transmitir o que pensa.
Dificuldade em fazer compromissos e em hierarquizar a importncia das coisas. Por
comunicarem mal, geram-se mal-entendidos. A me fala mais, assumindo mais importncia
s coisas. Pesos diferentes relevncia da comunicao. No incio sintonizavam-se mais, no
tinham que pensar tanto. Agora mais conscincia, dificuldades frente das partes boas. Pai:
investimento na carreira profissional prejudicou-nos.

Como a relao da me com a sua famlia de origem?


Vivem em proximidade com os avs maternos. Os avs tm a necessidade de manter
grande proximidade com os filhos, a me acha que no devia ser assim, mas cede porque
poderia ser penoso para os seus pais. Antes a av materna era mais autnoma e fazia o que
achava, agora precisa de apoio. Os seus pais investiram muito nos filhos, foi o seu nico
investimento e interesse e a av materna quer prolongar esse investimento. A av materna
antes fazia comparao para os aspectos negativos. uma pessoa pouco afectuosa ao nvel
da demonstrao de afectos, mas liga todos os dias. A me e o irmo nunca foram muito
prximos. Antes no era afectuosa e agora sente a necessidade de proteger o irmo.

E como a relao do pai com a sua famlia de origem?


Mudou muito nos ltimos anos. Quando vivia com os pais era muito prximo, com
respeito e autoritarismo. Agora afastou-se e est mais autnomo. Tinha relao prxima com
a me e agora no se sente to bem quanto a isto, sente-se culpado e no consegue gerir isso.
Com o pai havia respeito e autoritarismo, mais distante, no atingi o que o meu pai quis.
Mais distante e frieza com o pai. Com a irm existe companheirismo, nunca sentiu que fosse
muito mais velha, desde que a irm se casou esto mais afastados. Agora no h esforo de
reaproximao porque esto bem, esto vontade, falam bem.

222

Sintomas da Criana e Impacto Familiar

Quais so as principais preocupaes actuais sentidas face criana (Comportamento


alimentar, sono, linguagem, controlo esfincteriano, atitude face a outras crianas e adultos,
medos, entre outros)?
Barreiras auto-impostas que o impedem de atingir o potencial dele. Quanto aos
outros no preocupa muito. Est a melhorar a socializao, ainda que nunca vai ser um
animal social (me). No parte dele a iniciativa. Ele tem muitas competncias mas tem as
tais barreiras como a baixa auto-estima, receios que o impedem de as atingir. Ele tanto pode
escolher o caminho do bom ou do mau, mas receio que seja assim, ficar centrado nisto (mau,
barreiras, baixa auto-estima, receios. Neste momento a me quase que chora, falando
comovida).

Qual o impacto sentido na famlia?


A irm j o desculpa. Impacto grande, condiciona a famlia pelo medo dos prximos
momentos, pensam muito nisto, mas no conseguem agir. Culpam-se por no fazerem outras
coisas e estarem focados nele. O pai pensa que o problema com ele dentro do contexto da
famlia. A me acha que no fica mais de cinco minutos a falar com algum sem falar dele. O
pai no fala muito e no gosta de fazer comparaes. Neste momento a me confronta-o com
uma comparao que fez do Joo com a irm: o pai disse-lhe que a irm era mais nova e no
fazia o que ele faz. O pai responde que faz isto j por influncia da me, sem pensar e a me
responde que tambm no pensa nesses momentos, age.

Teste de Relaes Familiares, Verso Casais Me


Tabela 1 Nmero de itens emitidos e recebidos positivos/negativos (leves/fortes) atribudos
aos membros da famlia.
Emitidos
Emitidos
Recebidos
Recebidos
Total de
Positivos
Negativos
Positivos
Negativos
Envolvimento
Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes
Ningum

12

Me

Pai

28

223

Joo

33

Irm

31

Av
Materno
Av
Materna

17

31

A me do Joo colaborou durante a realizao do TRF embora tenha preferido adaptar


a instruo que lhe dei s suas caractersticas pessoais: como atribua a maior parte dos
cartes a mais que uma pessoa, passou a coloc-los todos num monte em cima da mesa
dizendo-me a quem se destinavam (em vez de os colocar nas caixas apropriadas). Por vezes,
realizou alguns comentrios verbais como ler a mensagem e reflectir em voz alta para quem
se destinaria.
Ao analisar a Tabela 1 verifica-se que alm da famlia nuclear, me, pai, Joo e irm, a
me optou por incluir os seus prprios pais, o av materno e a av materna. No total de
envolvimento com cada membro da famlia destacam-se os filhos Joo e a irm, av materna
(com mais afectos negativos que positivos) e pai. No Ningum foram colocados sobretudo os
afectos negativos fortes recusados, manifestando-se relativamente defensiva. Observa-se,
assim, alguma expresso de agressividade sobre os vrios elementos da famlia.

35
30
25
20
15
10
5
0
Ningum

Me

Pai

Joo

Irm

Av
Materno

Av
Materna

Figura 1 Nmero total de itens associados a cada membro da famlia.

224

A observao do nmero total de afectos atribudos a cada membro da famlia (Figura


1) permite destacar um forte envolvimento emocional com o Joo, seguindo-se a irm e a av
materna (com o mesmo nmero de afectos) e, ainda, o pai. O av materno e a prpria me
obtiveram menos afectos. O recurso utilizao do Ningum foi pouco significativo, sendo
ultrapassado apenas pela prpria me quanto ao menor nmero de itens atribudos. Surge,
assim, espao para alguma expresso das pulses agressivas face aos elementos da famlia.

16
14
12
10
Positivos

Negativos

6
4
2
0
Ningum

Me

Pai

Joo

Irm

Av
Av
Materno Materna

Figura 2 Nmero de itens positivos e negativos emitidos a cada membro da famlia.


Avaliando os afectos emitidos pela me do Joo (Figura 2) observa-se um forte
envolvimento emocional com o filho Joo, seguindo-se a irm e o pai, respectivamente. A
relao que mantm com estas figuras encontra-se, porm, idealizada. Todos os afectos que
traduzem erotizao foram associados a estas trs figuras, com excepo do item sinto-me
muito prximo(a) desta pessoa da famlia no atribudo ao pai, que aliado aos afectos
agressivos d-me a volta ao juzo, desprezo esta pessoa e consegue fazer-me sentir
muito irritado(a) (o primeiro e o ltimo surgem tambm ligados ao Joo) pode remeter para
conflitos na relao de casal, irritabilidade na me e uma dificuldade na gesto destes
conflitos por parte da me, optando por tentar ignorar os problemas na relao com o marido.
Com a irm so emitidos afectos negativos apenas de cariz leve como demasiado
picuinhas, tem mau feitio, queixa-se demais e no tem muita pacincia que podem
associar-se fase de desenvolvimento da irm (5 anos) e necessidade de separao
225

emocional do espao materno por parte da irm. Na relao com a av materna so emitidos
mais afectos negativos que positivos, parecendo expressar o desejo de obter maior autonomia
emocional face a esta figura, ainda que se sinta muito ligada e dependente sinto-me muito
prximo(a) desta pessoa e estou disposto(a) a fazer tudo por esta pessoa, sendo uma
relao um pouco ambivalente. A relao com o av materno dominada por afectos
positivos e negativos, assim como, a prpria auto-estima da me, que se revesta ainda de
culpabilizao queixa-se demais. No Ningum so colocados apenas os afectos agressivos
negados e recusados de se expressarem nos elementos da famlia.

12
10
8
Positivos

Negativos
4
2
0
Ningum

Me

Pai

Joo

Irm

Av
Av
Materno Materna

Figura 3 Nmero de itens positivos e negativos sentidos como recebidos por cada membro
da famlia.
Na anlise dos afectos recebidos destaca-se uma relao mais prxima com os filhos
Joo e a irm, encontrando-se, no entanto, idealizada. Os afectos negativos leves como nem
sempre faz o que eu gostaria que fizesse, resmunga comigo e faz-me sentir frustrado(a)
surgem ligados ao Joo, o que pode associar-se ao desejo de transgresso do espao materno,
ainda, que se sinta muito ligado e dependente desta relao, pois alm da me e do pai, o Joo
obteve o item gosta de estar sozinho comigo. Com a irm, apesar de uma maior atribuio
de afectos positivos fortes, so associados os itens negativos leves: faz coisas nas minhas
costas e resmunga comigo, podendo remeter para a necessidade de separao emocional
face me. O pai a figura que se segue ao nvel do maior envolvimento emocional e alm
226

dos afectos erotizados associados e partilhados por outros elementos da famlia, destaca-se o
afecto agressivo apenas relativo ao pai diz coisas s para magoar os meus sentimentos o que
traduz insegurana na relao e dificuldades na resoluo dos conflitos conjugais. Segue-se a
relao sentida como ambivalente com a av materna marcada por um ligeiro avano dos
afectos positivos como quer mesmo o meu amor (apenas atribudo av materna e aos
filhos Joo e irm) e quer estar sempre ao p de mim (apenas atribudo av materna), o
que pode remeter para o desejo de prolongar a relao de dependncia com a filha por parte
da av materna. Contudo, os afectos negativos faz-me sentir sem valor, faz-me sentir
intil, faz coisas nas minhas costas, fica zangada comigo e faz-me sentir frustrado(a)
traduzem a vivncia de uma relao autoritria, punitiva, insegura e desvalorizada por parte
da av materna. Com o av materno a relao idealizada. Na auto-estima da me surge uma
maioria de afectos positivos, ainda que, se culpabilize nem sempre faz o que eu gostaria que
fizesse. No Ningum figuram as defesas dos afectos negativos recusados de se expressarem
nos elementos da famlia.

15
10
5
Emitidos Positivos
Recebidos Positivos

Emitidos Negativos
Recebidos Negativos

-5
-10

Figura 4 Direco dos afectos emitidos e recebidos positivos/negativos.

Na Figura 4 situa-se a direco dos afectos positivos/negativos emitidos e recebidos


pela me do Joo. Destaca-se um forte envolvimento emocional com o Joo, a irm e o pai,
sentindo-os como figuras s quais emite um maior nmero de afectos de amor face aos
recebidos. Com os filhos emite tambm mais afectos negativos relativamente aos recebidos,
227

no entanto, com o pai sente que os afectos negativos recebidos superam os afectos negativos
emitidos. Na relao ambivalente com a av materna os afectos positivos recebidos superam o
nmero de afectos positivos emitidos, por outro lado, os afectos negativos emitidos acentuamse face aos afectos negativos recebidos, o que pode antever o desejo de separao e maior
autonomia emocional desta figura. Com o av materno observa-se uma correspondncia nos
afectos positivos, nos afectos negativos apenas se registam os emitidos. Na auto-estima da
me sobressaem os afectos positivos face aos negativos. No Ningum so colocados os
afectos negativos rejeitados, negando sobretudo a expresso da agressividade recebida pelos
elementos da famlia.
Tabela 2 Nmero de itens associados a sentimentos de proteco e atribuio de
incompetncia ou fraqueza.
Sentimentos
de Proteco
Ningum
Me
Pai
Joo
Irm
Av Materno
Av Materna

0
4
3
5
4
3
3

Atribuio de
Incompetncia ou
Fraqueza
1
1
2
3
0
0
0

Na anlise dos sentimentos de proteco e de incompetncia ou fraqueza (Tabela 2)


destaca-se o Joo como o membro da famlia que carece de maior proteco materna dada a
elevada atribuio de incompetncia/fraqueza associada a dificuldades em lidar com as
adversidades e na adaptao social. O pai surge como a segunda figura ligada a sentimentos
de incompetncia/fraqueza, neste caso, associados a dificuldades na adaptao social e na
insuficincia de auxlio famlia. irm e me foi atribudo um nmero equivalente de
sentimentos de proteco, com a me a surgir como uma das figuras com sentimentos de
incompetncia, o que pode remeter para uma vivncia de culpabilizao possivelmente na
relao com o filho Joo. Os avs maternos e o pai obtiveram o mesmo nmero de afectos de
proteco e no Ningum foi colocado um item de atribuio de incompetncia/fraqueza
recusado face aos elementos da famlia.

228

Sntese da Anlise do Teste de Relaes Famliares (TRF)

Ainda que surja espao para a expresso das pulses agressivas face aos elementos da
famlia, a utilizao da figura Ningum permitiu a defesa pela negao/recusa sobretudo dos
afectos negativos fortes/agressivos.
Na auto-estima da me ainda que sobressaiam os sentimentos positivos, observa-se a
vivncia de culpabilizao possivelmente na relao com o filho Joo.
Com o pai a relao representada de forma idealizada quanto aos afectos emitidos
pela me face ao destaque dos afectos de amor sobre os afectos de dio. No entanto, considera
que recebe um maior nmero de afectos negativos do pai face aos afectos negativos que lhe
envia. Desta forma, coloca-se em hiptese conflitos na relao de casal associados a um
vivido de insegurana na relao e dificuldades na gesto e resoluo destes conflitos. O pai
surge, ainda, ligado a sentimentos de incompetncia/fraqueza que remetem para dificuldades
na adaptao social e para a insuficincia de auxlio famlia.
A relao com o Joo reveste-se de um forte envolvimento emocional e encontra-se
idealizada. Alm dos afectos que traduzem uma forte ligao e dependncia materna da parte
do Joo, surgem afectos de rejeio que podem associar-se ao desejo de transgresso do
espao materno. Contudo, o Joo afigura-se como o elemento da famlia que carece de maior
proteco dada a elevada atribuio de sentimentos de incompetncia/fraqueza associados a
dificuldades em lidar com as adversidades e na adaptao social.
Com a irm a relao igualmente associada a um forte envolvimento emocional e
idealizada. No entanto, os afectos negativos de cariz leve podem remeter para a necessidade
de separao emocional do espao materno por parte da irm.
A relao com o av materno reveste-se de um fraco envolvimento emocional, ainda
que surja idealizada quanto aos afectos positivos recebidos por parte desta figura.
A relao com a av materna traduz um forte envolvimento emocional sentindo-se
muito ligada e dependente desta figura que, por sua vez, parece transmitir o desejo de
prolongar a relao de dependncia com a me. No entanto, uma relao marcada por
conflito atravs da presena de ambivalncia e sentimentos de dio na linha da rejeio e
agressivos, sobretudo emitidos pela me, o que pode remeter para o desejo de separao e
maior autonomia emocional desta relao sentida como autoritria, punitiva, insegura e
depreciativa por parte da av materna.

229

Teste de Relaes Familiares, Verso Casais - Pai


Tabela 1 Nmero de itens emitidos e recebidos positivos/negativos (leves/fortes) atribudos
aos membros da famlia.
Emitidos
Emitidos
Recebidos
Recebidos
Total de
Positivos
Negativos
Positivos
Negativos
Envolvimento
Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes
Ningum

23

Pai

Me

19

Joo

12

Irm

11

Colaborou favoravelmente ao longo da passagem da prova TRF. Compreendeu desde


logo a instruo, revelando uma atitude muito directa na deciso do local de colocao dos
itens. Contudo, demonstrou maior indeciso na escolha das figuras semelhantes famlia para
colocar em jogo. Quando lhe solicitei que me dissesse a idade da filha ficou muito pensativo,
baixou a cabea entre os braos e respondeu Ai, agora est-me a dar uma branca!. No
realizou comentrios verbais adicionais ao longo da aplicao.
A leitura da Tabela 1 permite destacar um forte movimento defensivo no pai do Joo
atravs da recusa/negao sobretudo dos afectos negativos dirigidos aos elementos da famlia
recorrendo colocao destes itens na figura Ningum. Observa-se um maior envolvimento
emocional com a me, seguindo-se o Joo e a irm. O pai surge na ltima posio com a
atribuio de apenas afectos negativos.

230

25

20

15

10

0
Ningum

Pai

Me

Joo

Irm

Figura 1 Nmero total de itens associados a cada membro da famlia.

Analisando o total de envolvimento do pai com cada membro da famlia (Figura 1)


destaca-se uma forte relao com a me, seguindo-se o filho Joo e a irm (com a diferena
de um item para o Joo), por fim, o prprio pai. Observa-se, ainda, um elevado grau de
neuroticismo atravs de uma forte inibio sobretudo ao nvel da expresso dos afectos
negativos.

7
6
5
4

Positivos
Negativos

3
2
1
0
Ningum

Pai

Me

Joo

Irm

Figura 2 Nmero de itens positivos e negativos emitidos a cada membro da famlia.


231

Atendendo ao nmero de itens positivos e negativos emitidos a cada membro da


famlia pelo pai (Figura 2) sobressai uma relao idealizada com a me e o Joo, contendo
cada uma destas figuras apenas um item de cariz agressivo d-me a volta ao juzo no caso
da me e apetece-me bater nesta pessoa da famlia, no caso do Joo, o que pode remeter
para dificuldades na gesto dos conflitos familiares com estas pessoas da famlia. Com o filho
Joo pode associar-se, ainda, a uma relao autoritria e punitiva por parte do pai. A relao
com a irm apresenta-se um pouco ambivalente, com afectos positivos fortes de cariz
erotizado e que exprimem alguma dependncia afectiva como gosto de acarinhar esta pessoa
da famlia, gosto que esta pessoa da famlia me beije, gostava que esta pessoa da famlia
estivesse sempre ao p de mim (itens apenas atribudos irm) e os afectos negativos leves
chata, resmunga demasiado e no tem muita pacincia. A auto-estima do pai
apresenta-se baixa, sendo dominada por sentimentos de insegurana, inferioridade,
culpabilizao e dificuldades em lidar com os problemas (irritabilidade): demasiado
picuinhas, desmancha-prazeres, irrita-se muito depressa, tem mau feitio, fica
chateada sem ter razo para isso e fica zangada demais. Na figura Ningum surgem os
afectos sobretudo de cariz negativo forte, bloqueando, assim, a expresso da agressividade
face aos elementos da famlia.

12
10
8
Positivos

Negativos

4
2
0
Ningum

Pai

Me

Joo

Irm

Figura 3 Nmero de itens positivos e negativos sentidos como recebidos por cada membro
da famlia.

232

Observando os itens positivos e negativos sentidos como recebidos por parte dos
elementos da famlia (Figura 3) verifica-se uma relao ambivalente com a me, ainda que se
destaquem os afectos positivos recebidos como gosta de me abraar e ama-me muito que
traduzem cumplicidade e carinho na relao conjugal. Contudo, a presena dos afectos
negativos leves fica ressentida comigo, nem sempre me ajuda quando preciso, resmunga
comigo e fica zangada comigo pode remeter para conflitos na relao de casal associados
ao sentimento de insegurana na relao e a percepo da me como uma figura dominante e
punitiva face ao pai. Na relao com o Joo acentuam-se os afectos positivos fortes recebidos
quer mesmo o meu amor, gosta de estar sozinha comigo e quer estar sempre ao p de
mim representando-o como uma figura que o valoriza e investe na relao com o pai. Na
relao com a irm surgem apenas dois afectos positivos fortes que remetem para a erotizao
da relao por parte desta figura: gosta de me beijar e muito carinhosa comigo. No
Ningum figuram os afectos sobretudo de cariz negativo forte negados de se expressarem nos
elementos da famlia, apresentando um elevado grau de defesa.

8
6
4
2
Emitidos Positivos

Recebidos Positivos

-2

Emitidos Negativos

-4

Recebidos Negativos

-6
-8
-10
-12
Ningum

Pai

Me

Joo

Irm

Figura 4 Direco dos afectos emitidos e recebidos positivos/negativos.

Atendendo anlise da direco dos afectos positivos/negativos emitidos e recebidos


(Figura 4) observa-se uma equivalncia na percepo dos afectos positivos emitidos e
recebidos por parte da me. No entanto, no plano negativo acentuam-se os afectos recebidos.
Na relao com os filhos, Joo e a irm, surge um nmero superior de afectos positivos
233

emitidos face aos recebidos. Com o Joo o nmero de afectos negativos emitidos e recebidos
equivalente, enquanto na irm apenas se registam os afectos negativos emitidos pelo pai. Na
auto-estima do pai figuram apenas os afectos negativos que remetem para uma baixa autoestima. No Ningum destacam-se os afectos negativos recusados bloqueando, assim, a
expresso da agressividade sobre os elementos da famlia.
Tabela 2 Nmero de itens associados a sentimentos de proteco e atribuio de
incompetncia ou fraqueza.
Sentimentos
de Proteco
Ningum
Pai
Me
Joo
Irm

3
0
1
0
1

Atribuio de
Incompetncia ou
Fraqueza
2
1
0
1
1

Relativamente aos sentimentos de proteco e atribuio de incompetncia ou


fraqueza face aos elementos da famlia (Tabela 2) predomina uma forte atitude defensiva no
sentido da recusa/negao de dependncia e atribuio de fraqueza aos elementos da famlia,
recorrendo figura Ningum. Posto isto, a me e a irm surgem ligadas a sentimentos de
proteco, negando a presena deste tipo de sentimentos no pai e Joo, o que pode ser
considerado uma defesa na ordem da formao reactiva dadas as reais caractersticas destas
figuras e a percepo revelada pelo pai atravs desta prova. Na atribuio de incompetncia
ou fraqueza figuram todos os elementos da famlia com excepo da me que aliado ao item
no consegue enfrentar suficientemente bem as outras pessoas atribudo ao pai pode
associar-se a uma me dominadora na relao de casal, onde o pai sente dificuldades na
gesto dos conflitos conjugais. O item no consegue lidar suficientemente bem com
dificuldades associa-se ao Joo e refora o mecanismo de identificao com o pai. A irm
obteve o item deveria desempenhar um papel mais importante na vida da famlia que
remete para uma vivncia pouco valorizada e exigente na relao do pai com esta figura.

234

Sntese da Anlise do Teste de Relaes Famliares (TRF)

No Ningum so colocados sobretudo os afectos negativos e que expressem


sentimentos de dependncia ou fraqueza inibindo, assim, a expresso da agressividade
dirigida aos membros da famlia. Observa-se um elevado grau de neuroticismo no pai.
A auto-estima do pai apresenta-se baixa, sendo marcada por sentimentos de
insegurana, inferioridade, irritabilidade, culpabilizao e dificuldades em lidar com os
problemas.
A relao com a me surge ligada a um forte envolvimento emocional dominado por
uma relao idealizada quanto aos afectos positivos emitidos pelo pai e ambivalente face aos
afectos positivos/negativos recebidos pela me. Assim, apesar dos afectos positivos que
transmitem a presena de carinho na relao de casal, o pai sente que recebe mais afectos
negativos da me do que os que lhe emite, os quais traduzem conflitos na relao de casal
associados ao sentimento de insegurana na relao e a percepo da me como uma figura
dominante e punitiva face ao pai.
Com o Joo destaca-se a percepo de uma relao idealizada quanto aos afectos
positivos emitidos pelo pai, ainda que, se observem dificuldades em lidar com os conflitos
nesta relao, podendo o pai associar-se a uma figura autoritria e punitiva para o filho. O
filho representado como uma figura que valoriza e investe na relao com o pai,
identificando-se com este quanto ao sentimento de incompetncia/fraqueza.
A relao com a irm surge de forma ambivalente quanto aos afectos
positivos/negativos emitidos pelo pai, manifestando uma certa desvalorizao da relao na
fase que precede a prova ao esquecer-se da idade da filha. Todavia, assinalam-se afectos de
cariz erotizado e que exprimem dependncia afectiva na relao com esta figura.

235

Guio de Entrevista da Criana

Identificao da Criana

Nome: Joo

Idade: 9 Anos e 6 Meses

Interesses/Actividades

O que que tu gostas de fazer nos teus tempos livres?


Se tiver em casa vejo tv, jogo wii, brinco de bicicleta. Em casa da av materna fico a
brincar com a mana e em casa da av paterna brinco com os primos, ando de skate. Em casa
tenho um amigo que vive no mesmo prdio e da minha turma e eu brinco com ele.

Frequentas alguma actividade desportiva ou cultural (dana, teatro, msica, etc.)? Qual?
Karat (duas vezes por semana).
J andei na natao (saiu porque asmtico), escuteiros e catequese.

Tens animais de estimao? Quais?


Tartaruga. J tive um peixe.

Amigos

Quem so os teus amigos(as) (nome e idade)?


Montes de amigos, quase todos da sala. Tiago (10 anos), o Rodrigo (10 anos), Antero
(9 anos), Mnica (9 anos) fez anos em Dezembro, Fbio (9 anos), Filipe (10 anos), Duarte
(10 anos) faz anos uns dias depois dos anos do Joo, Sofia (10 anos), Diogo (10 anos), Vasco
(10 anos).

De onde os(as) conheces?


Da turma da escola.

O que que costumam fazer juntos(as)?


Brincamos apanhada, escondidas, jogamos a coisas.

236

Tens um(a) amigo(a) preferido(a) (melhor amigo/a)? Quem ?


No sei amiga tenho a certeza, a minha irm. Com quem eu passo mais tempo
com a minha tartaruga, brinco muito com ela.

Escola

Em que ano andas?


4 Ano.

O que que gostas mais na escola? Porqu?


No sei. Gosto muito de estar com os meus amigos.

O que que gostas menos na escola? Porqu?


No acabo as coisas, alguns amigos gozam comigo e eu fico chateado. Gosto de
brincar com mais pessoas do que com menos. Os amigos ficam chateados comigo, podem
magoar-me, psicologicamente, fisicamente quase nunca.

Se pudesses mudar alguma coisa na escola, o que seria?


Isso difcil. As reas, aumentar o espao.

Como preferias que fosse?


Mais espaoso e com divises diferentes, o recreio com mais espao, mas... e com
com vrios stios com entradas ou janelas. As condies. Depois os professores ou a diviso
dos espaos do 4 Ano, liceu, pr-primria, meter a melhor matria para o 9 Ano.

Onde que costumas fazer os teus trabalhos de casa?


Em casa ou de vez em quando na biblioteca da escola.

Tens ajuda de algum? De quem?


Para j no, primeiro fao as coisas, seno peo ajuda ao meu tio, ao meu pai ou
me. Todos, a tartaruga e mana.

237

Famlia

Quem so as pessoas da tua famlia?


Pai, me, irm, tartaruga, av, av, co da av, av, av, tio, tia, tia, tio, tm um co
e uma filha que a minha prima e da parte do meu pai tenho umas primas e da minha me
tenho uns primos no Iraque. Tia bisav.

Com quem vives (nome, idade, grau de parentesco face criana)?


Me, Carolina, 36 anos; Pai, Augusto, 37 anos; Mana, Maria, 5 anos.

Como a tua me?


muito simptica, insiste muito em que eu estudo e que desperte as minhas
capacidades. Ajuda com os problemas da vida, matemtica no.

Como o teu pai?


Simptico, quando sabe que eu preciso de ajuda, ajuda. s vezes est muito ocupado e
no pode.

Como so os teus irmos(s) (ou outras pessoas da famlia mencionadas)?


A mana um bocado parecida comigo: teimosa, tem medo, andamos luta. Outras
vezes ela defende-me e carinhosa.

Como que os teus pais se do um com o outro? O que pensas/sentes com isso?
Do-se bem. Todos os dias chegam a casa e cumprimentam-se. Mas de vez em quando
chateiam-se um bocadinho. Sinto coisas boas, ainda bem que tenho uns pais que se do bem
comigo e com eles prprios.

Dormes com algum ou partilhas o quarto com algum? Se sim, com quem?
Antes partilhava com a mana. A tartaruga est no quarto.

Se pudesses mudar alguma coisa na tua famlia, o que seria?


Hum... no sei. Quando as pessoas desentendem-se, resolvem-se logo e que todos
estejam de boa sade.

238

Como preferias que fosse?


Ela est boa como est, quem eu queria que mudasse era eu, gostava de ser a mesma
pessoa, mas com coisas diferentes. Tenho que me concentrar e estudar.

Fantasias/Sonhos/Medos

O que que gostarias de ser quando fores grande? Porqu?


Ser da cincia. Trabalhar na rdio tambm.

Quais so os teus maiores sonhos/desejos?


Que no haja poluio, andar de balo de ar quente e ver extraterrestres. Depois h
coisas boas

Se pudesses mudar alguma coisa em ti, o que seria?


Tentava mudar a minha cabea para ela trabalhar melhor e concentrar-se melhor.
Fisicamente preciso de treinar um pouco mais de karat para me defender, no me sei muito
defender.

Como preferias ser?


Mais forte e tentar ignorar as coisas mal e as coisas que me chamam. Passar para
trs das costas e concentrar-me no que tenho que fazer e em mais nada.

Costumas sonhar? Se sim, com o qu?


De vez em quando. Sonhos esquisitos, estranhos. J sonhei com um animal chamado
Pingalinha (pinguim + galinha), este o sonho que eu nunca irei esquecer na minha vida.
Veio um co e mordeu-lhe num stio num stio que os homens no gostam muito de levar
nesse stio.

Quais so os teus medos? O que fazes quando te sentes assim?


Coisas que quase muitas pessoas tm medo. Uma granada que casse em cima de
mim, medo que as pessoas se chateiem comigo e depois batem-me. Magoar-me, tambm no
gosto nada. Fujo ou fao alguma coisa em minha defesa.

E as tuas preocupaes? O que fazes quando te sentes assim?


A escola. A amizade com os amigos. Fico um bocado triste.
239

Desenho Livre

Inqurito
Aps a instruo para realizar um desenho o Joo fez o seguinte comentrio: eu no
sei bem o que vou desenhar quase nunca costumo desenhar.

1) O que que desenhas-te? O que que est a acontecer no teu desenho?


Est a acontecer as coisas que de vez em quando acontecem no mar um tubaro
est a passar, depois est aqui a espinha de um peixe a cair, porque um papagaio-domar tinha acabado de o comer (acrescenta gotas de gua). Uma medusa est aqui com
a parte de fora a parte de cima, no sei como se chama, no tem olhos nem cara,
uma enguia, uns papagaios-do-mar, um sol e umas nuvens. Vou s desenhar uma
pedra com um caranguejo em cima (acrescenta estes elementos no desenho). H um
caranguejo em cima de uma rocha.

240

2) Histria
Era uma vez no Vero ao p das ilhas Fiji havia uma ilha com ilhas, tinha um rapaz
filho do chefe que via o o mar, os pssaros e os tubares que andavam por a e as
barreiras de coral. Um dia foi com o pai procura de outras terras habitadas para ver
se conseguia comercializar e depois voltar para o seu pas sem ningum saber de onde
que ele era. Depois ele foi mas, o filho queria ir com ele mas, o chefe no deixava.
Depois durante a noite, a noite antes da partida, o barco j estava feito, no mar
atracado. Durante a noite construiu uma espcie de cave com uma porta transparente
que conseguia ver, feita de resina pura. Uma vez estava a andar, partiu e tambm tinha
uma conduta para respirar e passou l o tempo e viu tudo o que estava aqui e tambm
tinha na jangada. O barco era assim desta mesa at ali (exemplifica com as mos).
Depois tinha um buraco para ele ver o que estava a acontecer na parte de fora. Depois
eles notaram que o barco estava um bocado mais pesado e comearam a investigar
para ver o que acontecia e atiraram umas lanas gua, olharam para baixo e viram as
coisas normalmente. O rapaz conseguiu montar a cabina. Entretanto olharam para trs
e para a frente. Olharam o buraco de respirar e ver, o pai olhou para a popa e viu e
como o mido tambm estava a olhar ao mesmo tempo viram o olho um do outro e
assustaram-se. Atracaram numa ilha deserta e logo depois o pai viu que o mido
estava dentro do barco e o pai disse para ele nunca mais voltar a fazer aquilo e ele ir
para casa, mas no, continuaram a sua viagem, foram para outro stio para no
perderem a oportunidade, alis o filho disse que viu coisas muito bonitas l de baixo, o
pai espreitou e at gostou tambm. Depois o pai perguntou onde est a comida e as
coisas que vo comercializar e o filho diz: porque me deste ouvidos, bolas! Porqu?
Agora iremos passar dias e dias sem comer e iremos falecer!. Agora o barco j est
na areia, assim depois comercializaram, eles comeram, dormiram l e passaram pela
ilha e comeram mais ou menos hora do almoo. O problema que depois de terem
comido o filho que no gostava de estar na cabina vomitou e depois o pai olhou e
perguntou: ests bem?. No, no estou. Ah ainda bem que ali a ilha. Vamos
meter ns no podemos estar sempre a tirar coisas da ilha. Armas no barco suspensas
para se protegerem (termina a histria e continua a falar enquanto se afasta da mesa e
se aproxima dos carrinhos de brincar).

241

Anlise da prova

Durante o Desenho Livre o Joo realiza uma presso adequada no lpis e revela-se
muito meticuloso, com muito cuidado e ateno ao pormenor. Todavia, exprime sentimentos
de pessimismo (e.g., isto no est a sair muito bem), insegurana e auto-exigncia (e.g.,
no consigo desenhar muito bem peixes), nos comentrios verbais. Pede-me a borracha e
apaga muitas vezes o desenho (e.g., tubaro, mar, alforreca). Revela uma necessidade
marcada de preencher o vazio da folha e o silncio, atravs da sucessiva verbalizao
espontnea e pedidos de apoio sobre o que deve desenhar a seguir. Por vezes, manifestou uma
atitude mais pensativa (com lentificao do pensamento) e indecisa quanto ao que desenhar,
evidenciando-se alguma confuso do pensamento durante a narrativa. No final, demonstrou
uma grande resistncia em deixar de falar, acabando por sair da secretria e dirigir-se para a
pista dos carros enquanto narrava a histria (pareceu-me um movimento inconsciente pela
maneira subtil como o Joo se dirigiu para a pista). S terminou a histria quando eu
perguntei pela segunda vez se a histria terminou. Demormos 30 minutos nesta prova,
acabando por ocupar a sesso por completo.
Aps a instruo do Desenho Livre o Joo fez o seguinte comentrio: eu no sei bem
o que vou desenhar quase nunca costumo desenhar, o que pode remeter para uma defesa
na relao com o outro para se proteger da crtica e no elevar muito as expectativas da
investigadora face ao seu desempenho na prova.
No plano grfico o Joo faz um desenho adequado para a idade, correspondente
etapa do Realismo Visual (Luquet, 1984). Trata-se de um desenho simbolicamente investido e
rico em termos grafo-perceptivos, com movimento. Num cenrio marinho (regressivo) como
pano de fundo observam-se alguns elementos de cariz agressivo (tubaro, peixe comido por
um papagaio-do-mar, caranguejo).
O contedo da narrativa afasta-se do contexto do desenho, dando lugar a uma viagem
onde exprime o desejo de se aproximar do imago paterno, de crescer, de se autonomizar,
mudar e modificar as relaes com os outros voltar para o seu pas sem ningum saber de
onde que ele era, mas ainda tem reservas e sente-se culpabilizado porque me deste
ouvidos, bolas! Porqu? Agora iremos passar dias e dias sem comer e iremos falecer! () o
problema que depois de terem comido o filho que no gostava de estar na cabina vomitou e
depois o pai olhou e perguntou: ests bem? e o filho: no, no estou. A culpabilidade
(superego) surge, assim, associada curiosidade e explorao do exterior e ao desejo de
transgresso na relao de dependncia com o materno. O pai chefe associado a uma
figura de poder, superegica, hierarquizando a relao com este. Observa-se tambm o desejo
242

de agradar ao pai alis o filho disse que viu coisas muito bonitas l de baixo, o pai espreitou
e at gostou tambm. Na narrativa sobressai um discurso, por vezes, confuso e, ainda, a
dificuldade de mentalizar, recorrendo ao agir o barco era assim desta mesa at ali
(exemplifica com as mos). A narrativa termina com armas no barco suspensas para se
protegerem, as dificuldades internas no esto ultrapassadas, preciso ficar atento e
prevenido.

Desenho da Figura Humana de Machover

1 Desenho

243

Inqurito
Aps a instruo para que realizasse um desenho de uma pessoa o Joo comenta: no
sou l muito bom a desenhar pessoas. Posso desenhar uma pessoa qualquer, mesmo que no
exista? (podes) Ento posso desenhar um Alien?

Quem esta pessoa? Como se chama e que idade tem?


Tem 7 anos, Rafael.

Qual foi o dia mais feliz da sua vida?


O 25 de Abril, porque ele no tinha muitos direitos, queria fazer coisas mas no tinha muitos
direitos, com a revoluo j podia fazer as coisas todas que queria. No tem 7 anos, tem 51
anos.

E o dia mais triste?


Quando comeou, quando soube que no podia fazer as coisas que queria.

Conta-me uma boa recordao que tenha.


O dia 25 de Abril, depois da revoluo dos cravos. Juntou a famlia toda e foram todos
festejar para o Algarve (levanta-se e brinca com os carros).

E uma m recordao?
Um dia em que j ia caindo do penhasco abaixo, foi passar umas frias Amrica e ia caindo
do Grand Canyon.

Conta-me uma histria sobre esta pessoa.


Ele nasceu no ms em que todas as pessoas de 51 anos nascem. Quando era mido vivia no
campo e tratava do gado. Depois foi para Lisboa, como viveu l muito tempo, teve filhos e
uma mulher. Depois comeou a revoluo, na famlia s os irmos, ele e o filho estavam l
em Lisboa, o resto estavam todos noutro stio, na terra deles a revoluo dos cravos foi em
Lisboa? Onde comeou? E depois ele comeou a viver e agora tem 51 anos.
(o que aconteceu a essa pessoa?) No sei aposto que essa pessoa continua a viver.

1) O que que ele/ela est a fazer? Est a dizer ol muito feliz.


2) Que idade tem? 51 Anos.
244

3) casado/a? Sim.
4) Tem filhos? Sim.
5) Rapazes ou raparigas? Um rapaz e uma rapariga.
6) Qual o seu trabalho? Antes trabalhava no banco, depois foi trabalhar para uma
fbrica e agora taxista e tambm est na guerra do ultramar.
7) Se ainda estuda, em que ano est?
8) Qual o seu maior desejo? que quando ele morrer todos continuem a ter uma vida
boa, que a famlia dele permanea at ao fim do mundo.
9) saudvel? Sim.
10) Tem bom aspecto? Sim.
11) Qual a parte do seu corpo que est mais bem feita?...no sei. So mais as mos,
apesar de ter quatro dedos. Todos os bonecos tm quatro dedos. Mas imagina que tem
cinco dedos em cada mo.
12) E qual a menos bem feita? Eu no sei, esta parte do tronco (direita).
13) feliz? .
14) Quais so os seus aborrecimentos? No tem nenhum. difcil eu no gosto muito
das pessoas tristes. que o mundo acabe antes que ele morra. Eu tambm penso isso.
Pode acabar em 2012.
15) O que o/a faz zangar? Quando sabe que as pessoas ou stio que as pessoas que ele
mais gosta est a ter problemas por causa dele mesmo.
16) Quais so as suas manias? Tem a mania de ser o mais esperto.
17) Quais so os seus trs piores defeitos? um bocadinho resmungo, s isso.
18) Quais so as suas melhores qualidades? No sei. fazer as pessoas muito felizes.
19) Tem muitos amigos? Tem.
20) Mais velhos ou mais novos? Uns mais velhos, outros mais novos. Muitos amigos
foram com ele para Lisboa.
21) O que que dizem dele/a? Que ele muito simptico, mas tambm um bocadinho
resmungo.
22) Ele/a gosta da famlia? Gosta.
23) E da escola?
24) Sai muito com os amigos? No os deve encontrar muito, mas d-se bem com eles.
25) Quando que diz que se divertiu muito? Quando era criana e partiu para uma nova
cidade, divertiu-se a brincar com os amigos durante a viagem e a chegar a Lisboa.
26) Quer casar?
27) Com que idade?
245

28) Que gnero de mulher quer casar?


29) Quais so os seus trs principais projectos/sonhos? Conseguir ir lua.
30) Com quem se parece? No sei... da minha famlia? S conheo uma pessoa com 51
anos, um pai de uma colega minha.
31) Gostarias de te parecer com ele/a? Hum... no sei no, no apetece, estou muito
bem como estou.
32) Se pudesses, mudarias alguma coisa no teu desenho? Est tudo bem, s menos o
brao.

2 Desenho

246

Inqurito

Aps a instruo para que realizasse um desenho de uma pessoa do sexo oposto ao
desenhado no primeiro desenho o Joo comenta: desta vez vou mudar o sonho. Em vez de ir
lua vai ser andar de pnei, que o que eu gostava quando era pequeno () eu no sei
desenhar pessoas, muito difcil desenhar pessoas.

Quem esta pessoa? Como se chama e que idade tem?


Chama-se Matilde, tem 50 anos.

Qual foi o dia mais feliz da sua vida?


Foi o mesmo, o 25 de Abril, era amiga do Rafael.

E o dia mais triste?


Quando comeou a ditadura. Porque quando ela ia para fazer uma coisa planeava muito mas
no havia direitos para aquilo e, por isso, no podia fazer.

Conta-me uma boa recordao que tenha.


Quando andou de pnei pela primeira vez.

E uma m recordao?
Soube que houve uma exploso perto de casa de um parente seu, do seu primo.

Conta-me uma histria sobre esta pessoa.


Era uma vez uma pessoa chamada Matilde que nasceu em Dezembro, 16 de Dezembro
trabalhava no campo, essa Matilde era amiga do Rafael, trabalha no campo com ele e foi
tambm com ele para Lisboa e com o resto dos amigos, todos juntos, com 15 anos. Teve a
trabalhar, foi hospedeira de um hotel, depois foi bancria e agora recepcionista quero
dizer agora empresria de uma empresa.

1) O que que ele/ela est a fazer? Tambm a dizer ol.


2) Que idade tem? 50 Anos.
3) casado/a? .
4) Tem filhos? Trs.
5) Rapazes ou raparigas? Dois rapazes e uma menina.
247

6) Qual o seu trabalho? recepcionista, quero dizer, ela trabalha numa empresa.
7) Se ainda estuda, em que ano est?
8) Qual o seu maior desejo? ... dar uma volta ao mundo.
9) saudvel? .
10) Tem bom aspecto? Sim.
11) Qual a parte do seu corpo que est mais bem feita? ...As mos.
12) E qual a menos bem feita? O resto! S as mos esto bem feitas, a cabea, tronco e
membros esto todos horrveis.
13) feliz? , muito feliz.
14) Quais so os seus aborrecimentos? que as pessoas a chateiem.
15) O que o/a faz zangar? As pessoas fazerem coisas ms, so um bocado mal-educadas.
16) Quais so as suas manias? De ser muito bonita.
17) Quais so os seus trs piores defeitos? de ser teimosa.
18) Quais so as suas melhores qualidades? De ser muito paciente.
19) Tem muitos amigos? Sim.
20) Mais velhos ou mais novos? Muitos da sua idade, mais velhos tambm.
21) O que que dizem dele/a? Que um bocado teimosa e muito vaidosa, mas que
muito paciente, que conseguiu no sei quanto tempo para apanhar um sapo.
22) Ele/a gosta da famlia? Sim.
23) E da escola?
24) Sai muito com os amigos? Sim.
25) Quando que diz que se divertiu muito? Um dia quando os amigos construram
uma grande casa numa rvore e logo a seguir quando foram pescar pescaram o peixe
mais grande que j tinham visto na aldeia.
26) Quer casar?
27) Com que idade?
28) Que gnero de homem quer casar?
29) Quais so os seus trs principais projectos/sonhos? O primeiro que eu tive foi andar
de pnei, o outro ser a pessoa mais paciente do mundo, o terceiro foi nunca morrer.
30) Com quem se parece? De facto com ningum.
31) Gostarias de te parecer com ele/a? No.
32) Se pudesses, mudarias alguma coisa no teu desenho? Sim alterava o corpo, fiz
muito, e os ps.

248

Anlise da prova
Aps a instruo do Desenho da Figura Humana o Joo comenta: no sou l muito
bom a desenhar pessoas. Posso desenhar uma pessoa qualquer, mesmo que no exista?
(podes) Ento posso desenhar um Alien? (defende-se pela recusa) e no segundo desenho: eu
no sei desenhar pessoas, muito difcil desenhar pessoas, o que aliado ao empobrecimento
do nvel grfico e investimento observado nesta prova em comparao com o Desenho Livre,
tal como, s respostas ao inqurito das figuras como Gostarias de te parecer com ele/a?
hum... no sei no, no apetece, estou muito bem como estou e antes trabalhava no
banco, depois foi trabalhar para uma fbrica e agora taxista e tambm est na guerra do
ultramar, teve a trabalhar, foi hospedeira de um hotel, depois foi bancria e agora
recepcionista quero dizer agora empresria de uma empresa podem antever dificuldades
em se projectar atravs da figura desenhada, em lhe atribuir uma identidade, em suma, ao
nvel da auto-imagem corporal. Durante a realizao do primeiro desenho o Joo manifestase, ainda, inseguro e auto-exigente est um bocado mal pintado, o que tambm se
manifestou na fase de inqurito das duas figuras s as mos esto bem feitas, a cabea,
tronco e membros esto todos horrveis.
Quanto ao grafismo, verifica-se um maior investimento na primeira figura em
detrimento da segunda, atravs da utilizao das cores, propores mais adequadas, traado
do cabelo e detalhes nos sapatos. Ainda assim, a diferenciao de sexos encontra-se
assegurada (apenas pelas diferenas no cabelo), tal como a identificao sexual ao masculino.
O contorno anguloso das figuras sugere um maior controlo das emoes e expresso
agressiva. So figuras de aparncia rgida, imvel e assustada, apesar do sorriso pouco
expressivo. Ainda que tenha desenhado apenas quatro dedos em cada mo, na fase de
inqurito da primeira figura corrige este facto Qual a parte do seu corpo que est mais bem
feita? ...no sei. So mais as mos, apesar de ter quatro dedos. Todos os bonecos tm quatro
dedos. Mas imagina que tem cinco dedos em cada mo, o que pode traduzir-se como um
menor investimento nos desenhos.
No que concerne fase de inqurito surge uma deslocao da prpria
necessidade/desejo de mudana, de crescer e autonomizar-se da relao dependente que
mantm com a figura materna para a revoluo do 25 de Abril, com recurso
intelectualizao. Este ltimo mecanismo de defesa manifesta-se tambm na frase Um dia
em que j ia caindo do penhasco abaixo, foi passar umas frias Amrica e ia caindo do
Grand Canyon que pode remeter para a angstia de desamparo, de perda de objecto e de
aniquilamento depressivo. Utiliza defesas na linha da negao da realidade objectiva est a
249

dizer ol muito feliz, difcil eu no gosto muito das pessoas tristes, afectos depressivos
ligados morte, receio da separao e perda de objecto o terceiro (projecto/sonho) foi nunca
morrer, que o mundo acabe antes que ele morra. Eu tambm penso isso. Pode acabar em
2012, quando ele morrer todos continuem a ter uma vida boa, que a famlia dele permanea
at ao fim do mundo. A culpabilidade tambm marca presena na resposta seguinte: quando
sabe que as pessoas ou stio que as pessoas que ele mais gosta est a ter problemas por causa
dele mesmo. Ao desejar ser a pessoa mais paciente do mundo pode significar que no se
sente suficientemente forte para suportar as dificuldades experienciadas.

Desenho da Famlia

Inqurito
Aps a instruo para a realizao do desenho o Joo questiona-me Fao um pai, um
filho e uma me ou uma rvore genealgica? (o que que te parece melhor?) No sei. Vou
fazer uma rvore genealgica.

250

1) Quem so essas pessoas que desenhas-te, como se chamam e que idade tm? (da
esquerda para a direita)
A famlia Moto, no Carandao, como indica estes lpis.
1 Fila: - Andr, 9 anos, filho do Andr e da sua mulher;
- Cludia, 2 meses, irm do Joo e filha do Raul e da Maria;
- Joo, 8 anos, irmo da Cludia e filho do Raul e da Maria;
- Ins, 1 ano, filha do Rui e mulher do Raul.
2 Fila: - Mulher do Andr, 36 anos;
- Andr, no Andr irmo da Maria, 36 anos;
- Maria, 35 anos;
- Raul, 33 anos, casado com Maria;
- Irmo do Raul, que o Rui, 36 anos;
- Casada com o Rui, 35 anos.
3 Fila: - Nuno, 63 anos, irmo da Emlia;
- Emlia, 62 anos;
- Casado com a Emlia, 2 anos mais novo, 60 anos.
4 Fila: - Sei l, Joo, 83 anos, irmo da Maria da Conceio;
- Maria da Conceio, 91 anos, mulher do Egas Moniz;
- Pai da Emlia, Egas Moniz, a nica coisa que me lembrei, at pode ser 93
anos.
5 Fila: - Sofia, 133 anos, me da Maria da Conceio;
- Marido da Sofia, Oslavaco, era de outro pas, 134 anos.
6 Fila; - Irmo da Mnica, 163 anos, Duarte;
- Mnica, 154 anos;
- Eduardo, 154 anos, marido da Mnica.
7 Fila: - Matilde, 183 anos;
- Marido da Matilde, Mrio, 185 anos.
Comenta: Eu tenho um livro igual quele l em casa, que diz Juan Mir

2) O que est a acontecer no teu desenho? Porqu?


Isto suposto ser imvel. Estes aqui esto a fazer alguma coisa, a tirar frias (da 3
gerao a baixo). Os avs esto na terra, so to velhos que mais difcil fazer as
coisas.
251

3) Quem o mais feliz? Porqu?


O beb, brinca com uma das coisinhas e por isso fica feliz.

Quem o menos feliz? Porqu?


No sei. Eu acho que um destes dos bisavs, so velhinhos, j t perto do fim, deve
estar um pouco infeliz.

4) Quem o mais simptico? Porqu?


Pai do meio. Porque tem uma grande famlia e aprendeu a ser muito simptico com
eles todos.

Quem o menos simptico? Porqu?


No sei. Acho que no h, difcil. Ok este aqui, est a fazer partidas aos outros
(figura da 1 Fila esquerda, Andr, 9 anos).

5) Quem manda mais? Porqu?


No sei. Os bisavs 4 gerao. So os mais velhos, quase toda a gente tem respeito
por eles.
(?) Os mais velhos j pifaram.

Quem manda menos? Porqu?


O bebezinho, porque muito novinho.
No existem aqui manipuladores (aponta para a 1 Fila, figuras direita).
Mais egosta (aponta para a 2 Fila, esquerda, mulher do Andr).
Mais coragem (aponta para a 2 Fila, Maria, mulher ao meio).

6) Se tivesses que escolher uma pessoa desta famlia, quem que preferias ser?
Porqu?
O Andr, 9 anos. Porque eu gosto de pregar algumas partidas, mas tambm deve ter
outras mais coisas, ser mais no consigo! Ter mais personalidades, porque no
l muito mais novo nem mais velho, consegue subir pedregulhos como eu! E no cair!
Principalmente se tiver uma coisa no topo.

7) Se fossem todos dar um passeio de carro mas no houvesse lugar para uma
pessoa, quem ficaria em casa? Porqu?
252

Este (3 Fila direita, casado com a Emlia). Devia de ser uma das bisavs que era
muito velhinha e tinha que tratar bem da outra (4 Fila, direita, pai da Emlia, Egas
Moniz).

8) Se algum no se tivesse comportado bem quem seria? Como seria castigada?


Quem que dava o castigo?
O Andr, porque ele faz muitas partidas. O pai dele ou a me. (?) O pai. Eu no sei,
to difcil! Lavar a loia e arrumar o quarto.

9) Se pudesses mudar alguma coisa no teu desenho o que que mudarias? Porqu?
Devia meter olhos e bocas nos bonecos. No tenho pacincia para fazer assim
(gesticula na mesa).

Anlise da prova

O Joo demorou algum tempo a realizar o desenho. Ao longo da prova realizou


inmeros comentrios verbais parecendo sentir a necessidade de preencher o espao
experienciado como vazio. Alguns destes comentrios expressavam a necessidade de apoio
por parte da observadora e tinham um cariz de auto-desvalorizao e indeciso (e.g., Olha j
fiz isto mostra-me a folha No se percebe nada; isto est muito mal pintado () est
mal pintado de certeza!). Queixou-se de dores num brao aps pintar o desenho com mais
fora foi at s artrias. Vejo as veias do sangue a passar. Eu fiz-lhe festas no brao e
perguntei-lhe se assim j se sentia melhor. O Joo passou a queixar-se menos, dizendo-me
que precisava de descansar o brao por causa do esforo de pintar e acrescenta enquanto
recomea a pintar: Ah agora a articulao! () Agora j estou melhor () No consigo
pintar muito bem, s desenhar.
Aps uma hesitao inicial o Joo opta por desenhar uma rvore genealgica e
escolher o nome da famlia colando-se ao nome da marca impressa no lpis. Deste modo,
defende-se de fazer escolhas, posicionar os elementos da famlia segundo as suas
preferncias, projectar no desenho os seus desejos, sentimentos, pulses agressivas e/ou
libidinais uma vez que os elementos/relaes j se encontram pr-definidos, imveis na
prpria rvore genealgica. Ainda assim, o conceito de famlia e a diferenciao de geraes
surgem integrados. semelhana do Desenho da Figura Humana observa-se um menor
investimento no plano grfico em comparao com o Desenho Livre, o que pode indiciar
algumas resistncias em provas de cariz mais projectivo.
253

Na fase de inqurito expressa o desejo de ser pequeno (Quem o mais feliz? Porqu?
O beb, brinca com uma das coisinhas e por isso fica feliz), dificuldades de separao e de
perda do objecto ligadas morte (Quem o menos feliz? Porqu? No sei. Eu acho que um
destes dos bisavs, so velhinhos, j t perto do fim, deve estar um pouco infeliz), recusa dos
aspectos negativos (Quem o menos simptico? Porqu? No sei. Acho que no h, difcil.
Ok este aqui, est a fazer partidas aos outros). Aparentemente o Joo identifica-se com o
elemento Andr, de 9 anos, um menino que tal como o Joo gosta de pregar algumas partidas
aos outros, segundo o prprio, o que pode remeter para um vivido de culpa. Neste contexto, a
personagem que representa a me do Andr que o Joo identificou espontaneamente como
egosta pode associar-se ao imago materno. Observa-se, ainda, o recurso a mecanismos de
defesa na linha do evitamento, optando por um dos elementos da famlia alargada para ficar
em casa na stima questo e formao reactiva ao colocar o Andr de castigo pelo pai em
actividades de limpeza e arrumao. No final, surgem, uma vez mais, sentimentos de
insegurana e auto-exigncia relacionados com o desempenho no desenho.

Inventrio de Depresso para Crianas

Anlise inter-individual

O Joo obteve um total de 21 pontos no instrumento, o que o situa no Grupo 2 (nvel


intermdio) face intensidade de sintomas depressivos que apresenta. Assim, estes resultados
no so passveis de uma classificao como caso depressivo e caso no depressivo de
acordo com a adaptao portuguesa da prova.

Anlise intra-individual

Intensidade do Item

Perfil de Itens
3
2
1
0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27

Itens

254

Observando o grfico alusivo ao perfil de itens verifica-se uma maior incidncia de


itens na intensidade mnima (12) e mdia-inferior (11 itens). Na intensidade mdia-superior
(3) e superior (1) encontram-se itens associados a dificuldades escolares, pessimismo,
preocupao excessiva e sentimentos de insucesso.
Considerando o diagnstico clnico de depresso e as caractersticas do funcionamento
psquico do Joo observadas nos restantes instrumentos aplicados coloca-se em hiptese o
emprego de mecanismos de defesa como a negao ao longo da passagem da prova, o que
pode ter condicionado os resultados obtidos.

Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas


Tabela 1 Nmero de itens emitidos e recebidos positivos/negativos (leves/fortes) atribudos
aos membros da famlia.
Emitidos
Emitidos
Recebidos
Recebidos
Total de
Positivos
Negativos
Positivos
Negativos
Envolvimento
Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes
Ningum

21

Joo

Pai

16

Me

18

Irm

30

O Joo colaborou durante a realizao da prova TRF manifestando um comportamento


mais estvel e concentrado no incio da prova que com o evoluir da sesso tornou-se mais
agitado e disperso. Ao colocar o item 63. Esta pessoa da famlia no brinca comigo quando
eu gostaria que brincasse nas figuras que representam os pais acrescenta eles esto muito
ocupados.
Atendendo aos itens positivos/negativos emitidos e recebidos pelos membros da
famlia (Tabela 1) observa-se um forte envolvimento emocional com a irm, seguindo-se a
me, o pai e o Joo, respectivamente. Por esta ordem foram tambm distribudos os afectos
negativos, sendo a irm a figura que obteve mais afectos negativos e o Joo o nmero menos
significativo deste tipo de afectos. No Ningum foram colocados os afectos negativos e os
afectos positivos fortes recusando e negando a sua atribuio aos elementos da famlia
inibindo, assim, a expresso agressiva e erotizada nas relaes.
255

30
25
20
15
10
5
0
Ningum

Joo

Pai

Me

Irm

Figura 1 Nmero total de itens associados a cada membro da famlia.

A leitura da Figura 1 permite destacar um forte envolvimento emocional com a irm


do Joo (30 itens), seguindo-se a me (18 itens) e pai (16 itens). O Joo surge na ltima
posio com a atribuio de apenas sete afectos. Atravs da colocao dos afectos negativos e
dos afectos positivos fortes na figura Ningum observa-se um movimento defensivo
substancial na linha da negao e da recusa.

9
8
7
6
5

Positivos

Negativos

3
2
1
0
Ningum

Joo

Pai

Me

Irm

Figura 2 Nmero de itens positivos e negativos emitidos a cada membro da famlia.

Atendendo anlise dos afectos positivos e negativos emitidos pelo Joo (Figura 2)
sobressai um forte envolvimento emocional com a irm marcado por uma relao
256

ambivalente, contudo os afectos positivos como gosto que esta pessoa da famlia me d
beijinhos, gostava que esta pessoa da famlia estivesse sempre ao p de mim e gosto de
abraar esta pessoa da famlia destacam-se face aos afectos negativos como apetece-me
bater nesta pessoa da famlia, fico farto desta pessoa da famlia e quero fazer coisas s
para chatear esta pessoa da famlia, o que pode reenviar para uma relao prxima e
afectuosa, contudo, marcada pela rivalidade fraterna. A relao com o pai encontra-se
idealizada e a relao com a me apesar da prevalncia de afectos positivos surge ligada aos
afectos negativos no tem muita pacincia e fica zangada demais, podendo associar-se ao
vivido de uma figura materna punitiva e autoritria. A auto-estima do Joo representa-se de
forma ambivalente e em conflito, com apenas mais um item de afectos positivos face aos
negativos. Assim, foram atribudos afectos positivos leves que traduzem defesas manacas
muito alegre e muito divertida (itens apenas atribudos ao Joo) e afectos negativos
associados a sentimentos de inferioridade e culpabilizao irrita-se muito depressa, queixase demais e fica chateada sem ter razo para isso. Na figura Ningum foram colocados os
afectos positivos fortes, mas sobretudo os afectos negativos de forma a negar a expresso da
agressividade e erotizao sobre os elementos da famlia. Neste ltimo grupo de afectos
situam-se os itens gostava de poder dormir na mesma cama com esta pessoa da famlia,
gostasse mais de mim do que dos outros e quando me casar gostava que fosse com uma
pessoa parecida com esta pessoa da famlia, o que pode remeter para o desejo de
autonomizao do Joo e possvel superao do complexo edipiano.

12
10
8
Positivos

Negativos
4
2
0
Ningum

Joo

Pai

Me

Irm

Figura 3 Nmero de itens positivos e negativos sentidos como recebidos por cada membro
da famlia.
257

Na anlise dos afectos positivos/negativos recebidos pelo Joo face aos elementos da
famlia (Figura 3) sobressai novamente um forte envolvimento emocional com a irm, desta
vez de forma relativamente idealizada face ao nmero elevado de afectos positivos atribudos
a esta figura em detrimento dos afectos negativos. Entre os afectos positivos sobressaem os
erotizados como gosta de me dar beijinhos, gosta de me abraar, gosta de estar na cama
comigo e quer estar sempre ao p de mim. Nos afectos negativos surgem os itens faz-me
uma cara zangada, manda-me embora, fica zangada comigo e bate-me muito, podendo
remeter para a percepo de rivalidade fraterna com a irm, mas tambm para o sentimento de
inferioridade na relao com esta. A relao com a figuras parentais apresenta-se ambivalente,
com a me a obter um maior nmero de afectos positivos face aos negativos com destaque
para o afecto positivo erotizado gosta de me dar beijinhos apenas atribudo me e irm.
O pai, por sua vez, obteve um nmero superior de afectos negativos face aos afectos
positivos. Assim, foram atribudos os mesmos itens negativos a estas duas figuras, tais como,
faz-me uma cara zangada, no brinca comigo quando eu gostaria que brincasse, ralha
comigo, fica zangada comigo e est muito ocupada para ter tempo para mim, o que pode
remeter para a representao da relao com estas figuras numa linha autoritria e pouco
disponveis para as necessidades do Joo. O Joo utiliza a figura Ningum para a atribuio
dos afectos positivos fortes e negativos negados e recusados de serem associados aos
elementos da famlia. Os afectos erotizados negados foram gosta de me ajudar quando estou
a tomar banho e gosta mais de mim do que dos outros ligando-se ao desejo de
autonomizao e possvel acesso resoluo do complexo edipiano.

12
10
8
6
4

Emitidos Positivos

Recebidos Positivos

Emitidos Negativos

-2

Recebidos Negativos

-4
-6
-8
-10
Ningum

Joo

Pai

Me

Irm

Figura 4 Direco dos afectos emitidos e recebidos positivos/negativos.


258

Avaliando a direco dos afectos positivos/negativos emitidos e recebidos pelos


elementos da famlia (Figura 4) observa-se a percepo de um nmero superior de afectos
positivos recebidos na relao com a me e com a irm, ainda que a diferena face aos afectos
positivos emitidos no seja significativa. Quanto aos afectos negativos, na relao com a me
destacam-se os afectos recebidos, podendo sentir esta relao como pouco valorizada por
parte desta figura. Com a irm sente que emite mais afectos negativos face aos recebidos,
ainda que a diferena no seja significativa. Por outro lado, na relao com o pai surge um
nmero acentuado de afectos positivos emitidos em detrimento dos recebidos, que aliado
atribuio de afectos negativos apenas recebidos remete para a percepo de uma relao
pouco valorizada e correspondida face aos desejos do Joo por parte do pai. A auto-estima do
Joo surge de forma ambivalente, com um nmero prximo de afectos positivos e negativos.
O Joo recorre figura Ningum para a colocao sobretudo dos afectos negativos
negados/recusados de se expressarem nos elementos da famlia bloqueando, assim, a
agressividade.
Tabela 2 Nmero de itens associados a sentimentos de dependncia (superproteco
materna e superindulgncia paterna/materna).

Ningum
Joo
Pai
Me
Irm

Superproteco
materna
0
6
5
3
8

Superindulgncia
Paterna
Materna
0
0
5
4
1
4
5
0
5
5

Total de
Dependncia
0
15
10
8
18

A anlise da Tabela 2 permite-nos aceder aos sentimentos de dependncia dos


membros da famlia relativos superproteco materna e superindulgncia parental. Desta
forma, verifica-se a percepo da irm como a figura mais dependente da famlia e com a qual
o Joo rivaliza pela proteco dos pais (sobretudo da me), situando-se na posio seguinte. O
pai a figura que se segue atravs da atribuio de proteco e indulgncia materna e, por
ltimo, a me, disputando com os filhos a proteco paterna.

Sntese da Anlise do Teste de Relaes Famliares (TRF)

Na figura do Ningum o Joo defende-se colocando os afectos positivos erotizados e


negativos recusados/negados de se expressarem nos elementos da famlia bloqueando, assim,
259

a agressividade e erotizao das relaes. Desta forma, manifesta o desejo de autonomizao


e o possvel acesso resoluo do complexo edipiano. Observa-se um grau acentuado de
neuroticismo.
A auto-estima do Joo surge de forma ambivalente e em conflito atravs da presena
de afectos positivos que remetem para defesas manacas e afectos negativos que traduzem
sentimentos de inferioridade e culpabilizao. semelhana da irm uma das figuras da
famlia mais dependente e que mais carece da proteco dos pais.
A relao com o pai percepcionada de forma idealizada quanto aos afectos emitidos
pelo Joo, atravs da atribuio exclusiva de afectos positivos. No plano dos afectos recebidos
pela figura paterna a relao encontra-se ambivalente com um nmero superior de afectos
negativos face aos positivos. Posto isto, afigura-se a percepo de uma relao pouco
valorizada e correspondida face aos desejos do Joo por parte do pai, representando esta
figura de forma autoritria e pouco disponvel para o Joo. O pai surge como uma figura mais
dependente que a me, beneficiando da proteco materna.
Com a me a relao surge de forma ambivalente quanto aos afectos recebidos, ainda
que, sobressaiam os afectos positivos face aos negativos e o nmero de afectos positivos
emitidos/recebidos seja quase equivalente, com prevalncia dos recebidos. No plano dos
afectos negativos destacam-se os recebidos, sentindo esta figura como punitiva, autoritria e
pouco disponvel para as necessidades do Joo. A me partilha com os filhos o sentimento de
proteco paterna.
A irm a figura com a qual o Joo estabelece um forte envolvimento emocional,
embora dispute com ela a proteco dos pais, sobretudo da me. Assim, esta relao surge de
forma ambivalente quanto aos afectos emitidos pelo Joo e de forma relativamente idealizada
face aos afectos recebidos por parte da irm, com a presena de afectos erotizados que
traduzem uma relao prxima e afectuosa com esta figura, contudo, marcada pela rivalidade
fraterna e pelo sentimento de inferioridade do Joo face irm.

As Aventuras de Pata-Negra
1 Etapa Frontispcio

PN:
Porque tem uma pata preta.
No seimacho.
Leito de 11 meses.
260

Dois porquinhos:
So os seus irmos.
Esquerda menina.
Direita menino.
Todos tm a mesma idade. O PN o mais velho, a seguir a irm, o irmo segue-se.

Porcos grandes:
Pais.
Em baixo me, 16 anos.
Em cima pai, 16 anos.
Os porcos vivem um bocado menos. Devem ser um bocado mais velhos com 16 anos,
devem ser tipo os ces.

Ao PN o Joo atribuiu uma idade ligada realidade objectiva, no recorrendo


simbolizao, o que remete para defesas rgidas. A identidade sexual revela-se ainda pouco
definida, no entanto, opta por atribuir-lhe o mesmo sexo que o seu, o que remete para uma
tendncia de maior identificao com o personagem da histria.
Os dois porquinhos representam a relao com os irmos, atribuindo-lhes a mesma
idade, o que reenvia para a defesa pela ancoragem realidade objectiva. Contudo, distingueos tornando o PN como o irmo mais maduro (conferindo-lhe mais poder), seguindo-se a irm
(semelhante famlia real do Joo) e o irmo, por ltimo.
Os dois porcos grandes associam-se relao com as figuras parentais, obtendo ambos
a mesma idade, sem definir por esta via a figura de maior autoridade. A atribuio dos sexos e
papis parentais percepcionada de forma adequada. Por ltimo, introduz um comentrio que
remete para a defesa pela racionalizao da idade dos porcos.
2 Etapa Os Temas

Ninhada
A me teve trs filhotes... no sei ai isto muito confuso! Estes aqui acho que so os
trs irmos. O PN estava no nascimento dos seus outros trs irmos e foi s isto.
(?) A seguir eles cresceram um bocadinho. No sei se isto s os irmos do PN

261

O Joo acede problemtica do carto alusiva ao nascimento e relao precoce com o


imago materno no abordando a rivalidade fraterna. O seu discurso curto e marcado por
silncios intra-relato, recusas no sei e evitamento do conflito no final da histria,
revelando-se muito defensivo.

Pequena Escada
O PN queria apanhar umas mas e ento pediu ao pai para se empoleirar na rvore
para apanhar mas, no bolotas. Depois ele apanhou as bolotas.

Num carto que reenvia para a funo de holding de uma das figuras parentais o Joo
associa-a ao pai, revelando uma funo de apoio slida. A identificao ao imago paterno
parece afigurar-se.

Noite
Era uma vez naquela noite o PN viu que ningum estava acordado e saiu do celeiro.

Nesta histria sobressai o sentimento de excluso relativamente ao casal parental e o


evitamento do conflito atravs do deslocamento da curiosidade para o exterior, perante as
solicitaes fantasmticas de um carto que apela para a curiosidade sexual e fantasmas da
cena primitiva.

Buraco
E depois andou a passear durante a noite e perdeu-se e depois encontrou o caminho
de volta.

Seguindo-se ao sentimento de excluso do casal parental e deslocamento da


curiosidade para o exterior surge a ligao a um carto que apela justamente para a excluso,
solido e punio perdeu-se num contexto de perigo (culpabilizao). Ainda assim, a
capacidade de reparao parece assimilada e depois encontrou o caminho de volta.

Batalha
Depois eles os dois comearam a brincar, o PN e os seus irmos. Depois comearam
luta, o PN e o seu irmo mais novo, depois fizeram as pazes.

262

O contedo simblico do carto relativo rivalidade fraterna e sentimentos de


culpabilidade subjacentes so reconhecidos, remetendo para a interiorizao dos interditos
superegicos.

Brincadeiras Sujas
E o PN e os seus irmos foram brincar para a lama e sem querer o PN atirou um
bocadinho de lama para a cara da me.

Perante um contexto anal que apela agressividade face a uma figura parental o Joo
acede ao contedo latente do carto, optando por dirigir o acto agressivo me, demonstrando
o desejo de separao do primeiro objecto de amor. O recurso a um contexto ldico e s
expresses sem querer e atirou um bocadinho reenviam para a interiorizao dos
interditos superegicos.

Bebedouro
Depois o PN a meio da noite quis fazer coc e fez no stio da comida, coc no
(?) Eu no disse coc no

O Joo reconhece a expresso de agressividade sobre as figuras parentais atribuindolhe uma dimenso anal, ainda que tente negar a representao agressiva por fora dos
mecanismos defensivos ligados ao superego.

Como terminam as aventuras?


Ele vai crescer e depois tambm vai ter filhos e depois quando for muito, muito, muito
velhinho ir morrer.

Representao de continuidade e evoluo ao longo da vida, ainda que se assista a


uma angstia depressiva associada ideia de morte acentuada pela repetio muito, muito,
muito velhinho permitindo distanciar a presena da morte, smbolo da separao.

Acrescentou:

Sonho Me
O PN sonhou com a me disse que gostava muito, muito dele e deu-lhe um beijinho.
263

Num carto que traduz a relao com o imago materno o Joo projecta o desejo de
uma relao prxima e afectiva com o filho por parte me. A capacidade de diferenciar o sexo
e os papis parentais parece, assim, integrada.

Sonho Pai
E com o pai sonhou que ia buscar mas e bolotas com ele e... deu-lhe um beijinho.

Num carto que apela para a relao com o imago paterno o Joo projecta uma relao
afectiva onde partilha uma actividade com o pai e se identifica funo paterna, neste caso de
obter comida.
3 Etapa Preferncias-identificaes

Cartes de que gosta (A)

Bebedouro
A1) Porque o PN est a fazer coc, acho engraado. O irmo mais novo.

Ainda que reconhea o contedo latente do carto que remete para a agressividade
face s figuras parentais e lhe associe uma dimenso anal no se identifica com o PN,
remetendo para uma defesa na ordem da formao reactiva.

Ganso
A2) Porque est a ser mordido no rabo por um ganso (?) um dos irmos, a irm.
O ganso acho que macho. No, acho que fmea. O que est a ver, PN.

O tema da agressividade acedido pelo Joo representando, todavia, a agressividade


no contexto das relaes na fratria (rivalidade fraterna).

Brincadeiras Sujas
A3) Porque atirou lama para a cara do pai. O que est a atirar lama, PN.

Ao colocar o pai na posio de receptor da agressividade dirigida pelo PN traduz um


conflito que remete para a rivalidade de tipo edipiana, o que simboliza um recuo face
264

narrativa do carto na etapa precedente onde a me figurava como a figura parental receptora
da pulso agressiva.

Batalha
A4) Porque os irmos andam luta, a morder um ao outro. O PN.

A problemtica da rivalidade fraterna reconhecida pelo Joo.

Partida
A5) giro que o PN esteja a passear pelo campo, a ir. O PN.

Esta resposta aborda a temtica da solido em situao de independncia, ainda que a


palavra giro utilizada para classificar esta aco pode remeter para uma negao da
angstia de separao experienciada.

Pequena Escada
A6) Porque o pai est a ajudar o PN a ir buscar as bolotas. O PN.

O pai afigura-se como o imago parental encarregue de assegurar a funo de holding


ao filho.

Buraco
A7) Porque giro quando o PN anda noite a ver as coisas.
(?) Est a passear pela noite escura. O PN.

Mais uma vez, num carto que apela solido, desta vez, num contexto de perigo o
Joo revela-se defensivo e nega as dificuldades experienciadas ao nvel da angstia de
separao e face ao confronto com a angstia depressiva, qual se revela sensvel noite
escura.

Noite
A8) Porque o PN est a ver o que est l fora.
(?) A lua. O PN.

265

A curiosidade sexual e relativa aos fantasmas da cena primitiva deslocada para o


exterior, evitando, deste modo o confronto com o sentimento de excluso relativamente ao
casal parental.

Sonho Pai
A9) Porque gosto de ver que o PN gosta muito do pai e de sonhar com ele. O PN.

A diferenciao de sexos e de funes parentais parece assegurada, numa resposta que


reenvia para uma relao afectiva com a figura paterna.

Sonho Me
A10) Porque gosto... o PN gosta muito da me e at sonha com ela. O PN.

Mais uma vez, a capacidade de diferenciar os sexos e as funes parentais parece


assegurada. A resposta reenvia para uma relao afectiva com o imago materno.

Cartes de que no gosta (nA)

Beijo
nA1) Porque um bocadinho piegas nesta parte do beijinho.
Em vez deles estarem a dar um beijinho deviam estar a comer erva, a passear. O
porquinho que est aqui a ver, PN.

Num carto que remete para a problemtica edipiana o Joo acede ao contedo
simblico, ainda que, desvalorize a proximidade libidinal entre as figuras parentais e defendase recorrendo ao evitamento e deslocamento do conflito para a esfera do fazer deviam estar a
comer erva, a passear podendo sentir-se excludo da relao de casal.

Mamada 1
nA2) Porque o porco est a mamar.
A me podia estar a dar festinhas ao filho. Uma das ervinhas.

Esta resposta traduz uma defesa face problemtica oral atravs do deslocamento para
o contacto libidinal na relao privilegiada com o materno.
266

Mamada 2
nA3) A mesma coisa, por causa do porco a mamar (ri-se).
A me estar a fazer festinhas ao PN e depois os irmos iam a correr para tambm
terem festinhas. O irmo mais novo.

semelhana da resposta ao carto anterior, a relao com o materno, neste caso, num
contexto de rivalidade fraterna deslocada da temtica oral para o contacto libidinal.

Cabra
nA4) Esta acho um bocado esquisito, um porco estar a mamar de uma cabra.
A cabra podia ser professora dele. Uma ervinha.

O Joo acede ao contedo latente do carto, ainda que, no aceite o substituto


materno.

Hesitao
nA5) Porque est outra vez um porco a mamar e podia estar a beber gua.
Este estivesse a beber gua, o irmo mais novo. O PN.

Observa-se uma reaco s questes associadas oralidade e representao da figura


materna como primeiro objecto parecendo optar pela renncia a este tipo de relao para
investir no processo identificatrio.

Carroa
nA6) Porque o PN est a sonhar que os seus outros trs irmos esto a ser levados.
Os porcos, os irmos mais novinhos estivessem a morder o homem. O PN.

O Joo acede ao contedo latente do carto e encena a agressividade face aos irmos
numa aluso rivalidade fraterna. Por fora da censura superegica tenta reprimir este desejo
com a possibilidade de os irmos se defenderem e escaparem ao homem que os quer afastar
da famlia.

Ninhada
nA7) um bocado confusa, no sei se aqueles so os outros trs irmos e baralha-me
um bocado.
267

Gostaria que em vez de serem aqueles trs irmos fossem os trs irmos antigos a
nascerem, o PN e os dois irmos. O PN.

A resposta remete para a rivalidade fraterna atravs da supresso dos irmos,


ocupando o seu lugar privilegiado e exclusivo junto da figura materna.
4 Etapa Questes Dirigidas

Noite
Sim, acho que isto aqui uma ovelha, a sombra de uma ovelha.
5 Etapa Questes de Sntese

1) Quem o mais feliz? Porqu?


O PN. Porque acontece muitas... depois h o irmo mais velho e a outra, depois tem
um pai e uma me que ele adora e adora a sua vida.

Quem o menos feliz? Porqu?


Eu acho que no h.
(?) O irmo mais novo porque mais pequeno e a irm e o irmo mandam nele, no
mandam, quer dizer, eles podem fazer mais coisas que ele e ele no pode fazer tantas coisas.

2) Quem o mais simptico? Porqu?


O pai. Porque ele ofereceu-se para o PN subir aos seus ombros e para o PN ir buscar
bolotas.

Quem o menos simptico? Porqu?


A irm, a do meio. Acha-se muito convencida, acha-se a mais esperta.

3) Quem que gostarias de ser?


O PN.

268

4) O que achas que vai acontecer ao PN?


Ele vai ter uma vida muito, muito boa. Ir crescer, ter filhos e depois ir fazer o que
as pessoas mais velhinhas fazem. Depois tambm ir contar as histrias da sua vida a outros
porquinhos e vo todos adorar.

5) O que que o PN pensa da sua pata-negra?


Pensa que muito importante. Porque ele o nico da sua famlia que tem uma pata
negra.

6) Carto Fada:
Desejo 1: Que tivesse uma longa vida.
Desejo 2: Trs filhos.
Desejo 3: E que a sua patinha negra desse-lhe muita, muita sorte.

Sntese da Anlise da Prova

Preferncias-identificaes

Cartes

Os Temas

Preferncias

Identificaes

Aceite (A)/No

Agradvel

Assumida

Aceite (nA)

(A)/No

(A)/No

Agradvel (nA)

Assumida (nA)

Total

Bebedouro

nA

2A

Beijo

nA

nA

1A

Batalha

3A

Carroa

nA

nA

1A

Cabra

nA

nA

nA

3nA

Partida

nA

2A

Hesitao

nA

nA

1A

Ganso

nA

2A

Brincadeiras

3A

Noite

3A

Ninhada

nA

2A

Sujas

269

Sonho Me

nA

2A

Sonho Pai

nA

2A

Mamada 1

nA

nA

nA

3nA

Mamada 2

nA

nA

nA

3nA

Buraco

3A

Pequena

3A

Escada

O Joo colaborou na prova Pata Negra, revelando alguma insegurana e indeciso nas
respostas dadas. Realizou comentrios verbais ricos e adicionais prova. Manifestou sentir-se
cansado a partir, sensivelmente, do meio da prova, aumentando o comportamento de
irrequietude na 5 Etapa Questes de sntese, onde se levantou da cadeira e comeou a
vaguear pela sala observando-a atentamente, continuando a responder-me s questes
colocadas.
Atravs da tabela que resume o modo de expresso das temticas inerentes prova
pode-se observar uma maior censura dos temas ligados oralidade (Cabra, Mamada 1,
Mamada 2 e Hesitao), agressividade (Hesitao e Carroa) e triangulao edipiana (Beijo),
podendo remeter para dificuldades na elaborao destes conflitos. Assim, entre os
mecanismos de defesa utilizados ao longo da prova destacam-se o evitamento, formao
reactiva, negao, racionalizao, sobreinvestimento da realidade perceptiva e recusa.
Aparentemente o conflito edipiano no se encontra completamente ultrapassado.
Apesar de realizar uma diferenciao adequada dos sexos, papis parentais e geraes e
demonstrar uma identificao figura paterna e, por vezes, projectar o desejo de separao da
figura materna atravs da agressividade que lhe dirigida, rivaliza com o pai e demonstra
dificuldades na elaborao dos sentimentos de solido face excluso do casal parental. Desta
forma, no contexto da angstia de separao surge o sentimento de culpabilidade e uma
vivncia depressiva. No entanto, revela a integrao do Superego.
A relao com a figura materna representada de forma afectiva.
A figura paterna assegura uma funo de apoio slida, permitindo a identificao do
filho e uma relao afectiva com este.
Na relao com os irmos sobressai a presena de rivalidade fraterna acentuada,
representando a supresso dos irmos mais novos de forma a ocupar o seu lugar privilegiado e
exclusivo junto da figura materna.

270

Anexo P: Estudo de Caso 4 Mariana (9 anos e 9 meses)

A Mariana de nove anos e nove meses uma menina que se encontra no 4 Ano do 1
Ciclo do Ensino Bsico. Apresenta um desenvolvimento estato-ponderal adequado sua idade
e gnero e um aspecto fsico cuidado e investido. Estabeleceu um contacto fcil, revelando
uma atitude muito interessada e colaborante ao longo das provas administradas, ainda que, por
vezes, manifeste uma conduta agitada e necessite de apoio da observadora. Demonstrou a
necessidade de agradar e constituir uma relao com a observadora atravs de elogios e de
sucessivas perguntas relativas ao contexto pessoal. Muito comunicativa e expressiva,
verbalizou com frequncia de forma espontnea. Manteve contacto ocular, aparentando um
olhar triste. Demonstrou uma auto-confiana baixa, ansiedade de separao de ambos os pais
e a necessidade de ateno e mimo constantes por parte destes. Durante a entrevista aos pais
comeou a chorar quando a me respondeu questo sobre falecimentos, separaes ou
divrcios na famlia, queixando-se de dores de barriga (acalmou-se quando passou do colo da
me para o colo do pai recusou sentar-se numa cadeira durante toda a entrevista). Na
terceira e ltima sesso conta-me que se constipou, tem tosse e cortou-se num dedo, o que
pode remeter para a necessidade de ser cuidada. Transparece, ainda, alguma imaturidade na
sua conduta atravs de risos frequentes e da utilizao de linguagem abebezada.
Na sequncia de um ano de interveno psicolgica no Centro de Sade sem
resultados aparentes, foi encaminhada para a Unidade de Pedopsiquiatria pelo Mdico de
Famlia, com queixas de dificuldades de concentrao e aprendizagem na escola.
Actualmente beneficia de consultas teraputicas de frequncia quinzenal em psicologia
h aproximadamente sete meses, assim como de interveno familiar junto dos pais com a
pedopsiquiatra da Unidade. Desde h cerca de nove meses que a Mariana toma
psicofrmacos: durante os primeiros cinco meses -lhe administrado Risperdal soluo oral
(Risperidona) 0,5ml (neste momento a me tambm seguida em consultas de psiquiatria e
medicada com um antidepressivo e ansioltico), seguindo-se um perodo de cerca de trs
meses de Risperdal soluo oral 0,25ml e, por fim, no dia em que se inicia a recolha dos
dados associados a esta investigao, retoma a dose de 0,5ml de Risperdal por cerca de um
ms (interrompe a medicao no Vero para avaliao da sua situao. Sem reconhecer as
melhorias na conduta da Mariana mencionadas pela psicloga, a me pede novamente a
medicao para a filha por a sentir muito agitada).
A Mariana vive com os pais e o irmo de dezassete anos, com os quais mantm uma
boa relao. A me descreve-a como uma criana muito socivel que se d bem com todas as
pessoas, incluindo os colegas da escola, fazendo amigos com facilidade. No entanto, refere
271

que o Joaquim (irmo) muito diferente da Mariana, sempre foi muito mais calmo e
organizado. Sempre gostou de ter o quarto arrumado, mesmo quando os amigos iam brincar l
a casa. A me sente que a filha muito ciumenta e rivaliza com o irmo pela ateno da me.
Faz birras, pede muito mimo e tenta sempre agradar aos outros, culpabilizando-se tambm
com frequncia. Em comparao com o comportamento na escola, para a me, em casa a
Mariana uma criana muito mais calma que acata as regras.
At h cerca de um ano, a me era costureira, tendo abdicado desta profisso para se
tornar proprietria de um caf em conjunto com a sogra tenho muito mais tempo agora para
estar com ela (Mariana), refere. Contudo, a me considera que se sente muito nervosa desde
que deu incio ao emprego no caf, tendo dificuldades em dormir (pede para ser acompanhada
em consultas de psicologia/psiquiatria e medicada com o antidepressivo Triticum AC). A
av materna da Mariana faleceu com Alzheimer h cerca de trs anos e a tia materna
suicidou-se quando a Mariana tinha oito/nove meses. O pai da Mariana viveu trs anos em
Frana (entre os cinco e os oito anos da filha) devido ao trabalho, sentindo-se culpado com
esta ausncia. No que concerne relao do casal, a me tem por hbito dormir no sof da
sala enquanto o pai dorme na cama do casal.
Fisicamente a me da Mariana apresenta um aspecto envelhecido face sua idade. A
face encontra-se um pouco estragada, com rugas. Apresentou-se com vesturio limpo e
cuidado, adequado sua idade e gnero. Estabeleceu um contacto adequado, aceitando
colaborar no presente estudo com aparente interesse. Manteve contacto ocular, evidenciandose um olhar triste, um ar abatido e cansado na sua expresso facial. Ainda assim, verbalizou
de forma espontnea com a observadora.
O pai da Mariana um senhor que se apresentou fisicamente cuidado e investido, com
vesturio adequado sua faixa etria e gnero. A face encontra-se um pouco envelhecida
considerando a sua idade. Inicialmente estabeleceu um contacto mais reservado, passando a
sentir-se mais descontrado e verbalizando com mais espontaneidade no decorrer da sesso.
Mantm contacto ocular.
Ambos os pais colaboraram ao longo da entrevista. A me respondeu maioritariamente
s questes, embora o pai tambm transmitisse a sua opinio espontaneamente e, outras vezes,
solicitado por mim. Senti que os dois conversaram muito abertamente sobre os principais
problemas que afectam a famlia, mostrando-se interessados em partilhar comigo a sua
vivncia familiar.
A Mariana ficou aos cuidados da me at aos trs meses de idade, altura a partir da
qual foi entregue aos cuidados de uma ama (at aos trs anos). Assim, com trs anos
ingressou na creche e posteriormente na pr-primria, havendo sempre relatos de que a
272

Mariana era uma criana muito mexida embora, no mal-educada nem agressiva, sempre
foi muito meiga.
Aos seis anos ingressou no ensino primrio onde ficou na mesma escola at terminar o
2 Ano de escolaridade. Segundo a professora do 2 Ano a Mariana uma criana meiga mas
com um excesso de actividade motriz () levanta-se (), mexe-se constantemente na
cadeira, senta-se sobre um p. Quando est sentada correctamente os ps so como um
pndulo. Interrompe os colegas que tem volta. Durante as explicaes parece no ouvir ()
comete erros nos exerccios por falta de ateno () no consegue acabar as coisas que
comea, o seu trabalho escolar fraco, sujo e confuso. Considera que a dificuldade em
realizar as actividades escolares da Mariana no se deve falta de capacidades mas sim, de
concentrao e ateno no consegue concentrar-se ou estar atenta durante muito tempo,
parece desorientada, desmotivada, acrescenta.
A partir do 3 Ano a Mariana ingressou noutra escola por motivos de alterao de
residncia. A me indica que a filha se adaptou bem nova escola, fazendo amigas. Porm,
durante o primeiro e o segundo perodos registou um comportamento melhor
comparativamente com o terceiro perodo, no qual a professora considera que a Mariana se
encontra mais distrada e irrequieta, tendo sido retirada das actividades extra-curriculares para
ter mais tempo para estudar. Deste modo, a me passou a ficar com a Mariana todas as tardes,
insistindo para que faa os trabalhos-de-casa, dizendo-lhe s vais brincar depois dos
trabalhos. No entanto, refere que no ano passado era pior porque a professora escrevia
muitos recados na caderneta e a Mariana ficava muito triste e nervosa com isso.
Actualmente, no 4 Ano, segundo a professora a Mariana mantm as dificuldades de
aprendizagem devido falta de concentrao/ateno e uma auto-confiana baixa, levando-a a
no participar nas aulas, mesmo quando solicitada. Em portugus a Mariana regrediu
apresentando uma leitura silbica nos casos de leitura. Escreve com muitos erros ortogrficos
e apresenta frases no aceitveis e de difcil compreenso. No caso de Matemtica
apresenta dificuldades em memorizar, compreender e consolidar os contedos. Assim
sendo, considera benfica a integrao na equipa de educao especial obtendo apoio
especializado a partir do 5 Ano de escolaridade.
Segundo a me, a gravidez da Mariana foi planeada, sem registo de intercorrncias.
Nasceu de parto eutcico, a termo, sem complicaes peri ou neonatais.
A me recorda a Mariana no primeiro ano de vida como uma beb muito amorosa e
nada rabugenta, no chorava muito. Em beb dormia bem, contudo actualmente, apresenta
um sono muito agitado, mexendo-se com muita frequncia na cama e falando durante o sono.
Adormece sem dificuldades e acorda bem-disposta (dorme cerca de nove horas dirias).
273

Comeou a dormir sozinha em quarto prprio com cerca de dois anos de idade e a andar com
um ano e dois meses. Apesar de no se recordar do momento em que a Mariana comeou a
falar, para a me ocorreu dentro dos parmetros normais. Quanto ao controlo esfincteriano, a
Mariana deixou de utilizar fraldas com cerca de trs anos de idade. Por fim, at deixar de ser
amamentada e iniciar a diversificao alimentar a Mariana no apresentava dificuldades no
comportamento alimentar. A partir deste momento comeou a demonstrar pouco apetite
come de tudo mas faz grandes birras mesa, fica duas horas sentada a comer. Na escola
chegam a ter de lhe dar a comida boca para ela se despachar, indica a me.
Recentemente a Mariana foi submetida a uma avaliao psicolgica por parte da
psicloga que a acompanha, segundo a qual, os resultados obtidos no teste WISC-III no
revelam comprometimento a nvel cognitivo que justifique as dificuldades de aprendizagem
referidas, sugerindo a hiptese de uma perturbao emocional na base destas dificuldades.

274

Guio de Entrevista dos Pais

Identificao da Criana

Nome: Mariana

Gnero: Feminino

Idade: 9 Anos e 9 Meses

Data de Nascimento: 2001

Naturalidade: Pennsula de Setbal

Nacionalidade: Portuguesa

Ano de escolaridade: 4 Ano

Reprovou algum ano? No

Se sim, qual (quais)? __________

A me no sabe se a filha vai passar para o 5 Ano. Pediu filha para dar o mximo
que pode e esforar-se durante os dezoito dias que faltam para terminar a escola.

Caracterizao Scio-Demogrfica da Famlia

Quem so os elementos que compem o agregado familiar (elementos que vivem na mesma
casa)?
(Constituio do genograma familiar)

2008
72

70

2002
46
51

42

39

17

275

Me
Idade: 39 Anos

Data de Nascimento: 1971

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: Casada

Habilitaes Literrias: 6 Ano.

Profisso: Gerente de caf

Situao Profissional: Empregada.

Quais so os seus principais papis na famlia?


Papelada (documentos), limpeza. O filho muito preguioso.

Quais so os seus principais gostos e interesses pessoais?


Ver televiso, sair para bares e jantar fora.

Pai
Idade: 42 Anos

Data de Nascimento: 1969

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: Casado

Habilitaes Literrias: 5 Ano

Profisso: Carpinteiro.

Situao Profissional: Desempregado.

Quais so os seus principais papis na famlia?


Arranja coisas quando se avariam em casa, ajuda no caf.

Quais so os seus principais gostos e interesses pessoais?


Futebol, v no caf.

Irmo()
Gnero: Masculino
Idade: 17 Anos

Data de Nascimento: 1994

Naturalidade: Pennsula de Setbal

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: Solteiro

Habilitaes Literrias: 9 Ano.

Ao cuidado de/Creche/Infantrio/Escola (ano frequentado): 11 Ano.


Profisso: ____________________________

276

Situao Profissional: _______________

Relaes Familiares

Qual a situao familiar actual (apoios sociais e/ou familiares, existncia de doenas fsicas
e/ou psicolgicas, problemas sociais, econmicos, exposio a fontes de stress, entre outros)?
A me est com um esgotamento o que est a afectar a famlia. Dificuldades
econmicas com o desemprego do pai.

Algum membro da famlia necessita de se ausentar ou ausentou-se no passado


temporariamente ou com frequncia, por motivos de trabalho, estudo, ou outros? Quando?
Durante quanto tempo? Como que a criana reagiu a essa(s) separao(es)? E os restantes
membros da famlia?
O pai esteve fora seis meses e agora ausenta-se quando tem trabalho fora da rea de
residncia, normalmente no Norte, cerca de uma semana. A me ficou pior, a Mariana entrou
na escola. H seis meses a me ficou pior, quando tudo estava mais estabilizado. Eles sofrem
por causa disto.

Algum membro da famlia faleceu, separou-se ou divorciou-se desde a gravidez da criana?


Quem? Qual o possvel impacto na famlia?
Faleceu a av materna da Mariana, h trs anos e a tia materna suicidou-se quando a
Mariana tinha oito/nove meses. Nessa altura a me andou num psiclogo. Foi um impacto
forte, mas para assegurar a famlia a me no se foi abaixo. O av paterno faleceu antes da
Mariana nascer.

Como a relao da criana com a me?


boa, mas prefere o pai porque brinca mais, a me no tem pacincia. A me est
doente.

Como a relao da criana com o pai?


O pai mais os miminhos. Ela no pode ver o pai a agarrar-se a ningum, contame o pai.

Como a relao da criana com os irmos (com cada um)?


Eles adoram-se mas no demonstram, diz a me. Para o pai eles no podem estar
um com o outro. Ela faz queixa dele, brincam, ele vai busc-la quando a me pede. Ele
nunca lhe bateu.
277

E com os restantes membros da famlia?


Muito meiga, quer mimos de todos. No podemos ter uma conversa como deve ser
quando ela est ao p porque tem sempre necessidade de ateno.

Gostaria que me descrevessem a vossa relao (relao do casal parental).


J foi muito boa e tenho esperanas que seja boa, eu sou muito agressiva, ele no
tem pacincia e pe-se porta fora. Ele calmo e para no ouvir sai, diz a me.

Como a relao da me com a sua famlia de origem?


Est afastada do irmo, ele vive em Setbal. Quando a me da Mariana liga eles
falam. D-se bem com o av materno da Mariana, v-o todas as semanas.

E como a relao do pai com a sua famlia de origem?


boa, um espectculo, d-se bem com a av paterna da Mariana, com a tia. Os
primos da Mariana tambm. Com o marido da tia que no se d to bem, no m pessoa,
mais casmurro.

Sintomas da Criana e Impacto Familiar

Quais so as principais preocupaes actuais sentidas face criana (Comportamento


alimentar, sono, linguagem, controlo esfincteriano, atitude face a outras crianas e adultos,
medos, entre outros)?
Falta de concentrao na escola, est melhor desde que toma gotas passadas pela
pedopsiquiatra. Maria vai com as outras e por isso os pais esto preocupados com a
passagem para o 5 Ano porque influenciada pelas companhias. A brincadeira cega-a.
muito responsvel com as compras, fazer recados.

Qual o impacto sentido na famlia?


Preocupao. D-se com gente mais velha. Uma rapariga com 12 anos disse-lhe para
fumar e ela disse me que no quis. A me ficou contente por ela contar. A Mariana e o
irmo so o oposto quanto responsabilidade.

278

Teste de Relaes Familiares, Verso Casais - Me


Tabela 1 Nmero de itens emitidos e recebidos positivos/negativos (leves/fortes) atribudos
aos membros da famlia.
Emitidos
Emitidos
Recebidos
Recebidos
Total de
Positivos
Negativos
Positivos
Negativos
Envolvimento
Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes
Ningum

21

Me

Pai

15

Irmo

11

Mariana

13

Av Paterna

11

Av
Materno

11

A me da Mariana colaborou durante a realizao do TRF evidenciando a necessidade


de apoio por parte da investigadora. Comentou: no estou a perceber o que esta frase quer
dizer aps a leitura do item 75. Esta pessoa da famlia no precisa do meu amor.
Expliquei-lhe o significado e a me diz-me que no sabe em quem colocar o item e refere eu
que no estou bem (com humor depressivo). Repete este ltimo comentrio aps colocar
outro item no Ningum. Com o item 12. Gosto de estar sozinho(a) com esta pessoa da
famlia a me da Mariana comea a chorar e repete eu que no estou bem, pela terceira
vez. Por ltimo, no item 51. Esta pessoa da famlia gosta de me abraar surge o comentrio
neste momento no consigo. A me da Mariana chorou praticamente desde o incio do
teste at ao final parando, por vezes, para limpar as lgrimas dos olhos e o nariz. Pediu-me
desculpa por chorar e eu tranquilizei-a dizendo-lhe que era natural visto que esta prova tende
a reactivar estados emocionais fortes pois apela aos sentimentos e emoes das pessoas.
Quase no final da prova a psicloga traz a Mariana sala de regresso da consulta teraputica e
a criana corre para abraar a me, muito agitada e ansiosa com a separao. A me manteve
o olhar para baixo, evitando receber a filha. Quando peo para aguardar mais um pouco que
estamos quase a terminar a Mariana diminuiu o seu comportamento agitado e pareceu ficar
com uma expresso facial triste.

279

Ao observar a Tabela 1 constata-se que a me decidiu incluir na prova alm da famlia


nuclear constituda pela prpria me, o pai, o irmo e a Mariana, a av paterna e o av
materno. Verifica-se um forte movimento defensivo atravs da utilizao da figura Ningum
para a negao/recusa dos afectos positivos fortes, mas sobretudo, dos afectos negativos de
forma a bloquear a expresso da agressividade sobre os elementos da famlia.

25

20

15

10

0
Ningum

Me

Pai

Irmo

Mariana

Av
Paterna

Av
Materno

Figura 1 Nmero total de itens associados a cada membro da famlia.

A anlise do total de envolvimento com cada membro da famlia (Tabela 1 e Figura 1)


permite avanar que o pai a figura mais destacada obtendo, no entanto, um nmero superior
de afectos negativos face aos positivos. Segue-se a Mariana, o irmo, a av paterna e o av
materno (estas trs ltimas figuras com a mesma quantidade de itens) e, por fim, a me,
registando um nmero mais acentuado de afectos negativos face aos positivos, semelhana
do pai. Na figura Ningum foram colocados os afectos negados/recusados, evitando a sua
distribuio pelos elementos da famlia. Observa-se assim, um grau elevado de neuroticismo
na me da Mariana.

280

10
9
8
7
6
5

Positivos

Negativos

3
2
1
0
Ningum

Me

Pai

Irmo

Mariana

Av
Paterna

Av
Materno

Figura 2 Nmero de itens positivos e negativos emitidos a cada membro da famlia.

Avaliando os afectos positivos e negativos emitidos pela me da Mariana (Figura 2)


observa-se uma relao idealizada com os filhos, a Mariana e o irmo, contendo o mesmo
nmero de afectos positivos destacando-se os afectos positivos fortes gosto de acarinhar esta
pessoa no caso da Mariana e, no caso do irmo estou muito orgulhoso(a) desta pessoa
apenas atribudos a estas figuras. Estas figuras obtiveram apenas um afecto negativo
semelhana da av paterna, com quem a relao tambm se encontra idealizada. Este afecto
negativo de cariz agressivo consegue fazer-me sentir muito irritado(a) foi atribudo a todos
os elementos da famlia, incluindo a prpria me, podendo remeter para irritabilidade no
funcionamento da me. A relao com o pai surge de forma ambivalente, com um nmero
equivalente de afectos positivos e negativos, destacando-se entre os afectos erotizados o item
gostava que esta pessoa da famlia estivesse sempre ao p de mim atribudo apenas ao pai e
entre os itens negativos irrita-se muito depressa, d-me a volta ao juzo e desprezo esta
pessoa da famlia apenas atribudos ao pai, o que pode reenviar para dificuldades na relao
de casal associadas dificuldade na gesto dos conflitos por parte de ambos os pais, ainda que
a me se sinta emocionalmente dependente do pai. A auto-estima da me apresenta-se baixa,
com um nmero acentuado de afectos negativos como queixa-se demais, no tem muita
pacincia e fica zangada demais que remetem para sentimentos de inferioridade e
culpabilizao. Com o av materno a relao surge de forma quase ambivalente, ainda que os
afectos positivos se destaquem face aos negativos nos quais se assinala o item demasiado
281

picuinhas. Na figura Ningum so colocados os afectos negativos recusados e negados, mas


tambm os afectos erotizados gosto que esta pessoa da famlia me beije e gosto de abraar
esta pessoa da famlia remetendo para uma diminuda disponibilidade emocional por parte da
me, optando por alhear-se do contacto com os outros.

7
6
5
4
Positivos
3

Negativos

2
1
0
Ningum

Me

Pai

Irmo

Mariana

Av
Paterna

Av
Materno

Figura 3 Nmero de itens positivos e negativos sentidos como recebidos por cada membro
da famlia.

A anlise dos afectos positivos e negativos recebidos por parte dos elementos da
famlia (Figura 3) permite destacar uma forte projeco de afectos negativos sobre o pai como
fica ressentida comigo, nem sempre faz o que eu gostaria que fizesse, faz coisas nas
minhas costas, nem sempre me ajuda quando preciso, faz-me sentir frustrado(a), diz
coisas s para magoar os meus sentimentos e faz-me sentir sem valor remetendo para
conflitos na relao de casal associados dificuldade na resoluo dos problemas, falta de
confiana na relao, percepo da desvalorizao da relao e falta de compreenso das
necessidades da me por parte do pai verificando-se, tambm, uma tendncia paranide no
funcionamento psicolgico da me. Com a Mariana, o av materno e o irmo a relao
encontra-se idealizada, projectando apenas afectos positivos sobressaindo os afectos
erotizados com maior incidncia na Mariana gosta de me beijar, gosta de estar sozinha
comigo e ama-me muito que transmitem uma relao de forte dependncia emocional da
filha com a me e, ainda, os afectos erotizados muito carinhosa comigo e quer estar
282

sempre ao p de mim associados ao av materno e gosta de me abraar ligado ao irmo


revelando uma relao prxima e carinhosa com estas figuras, demonstrando dependncia
emocional do av materno face me. A relao com a av paterna encontra-se ambivalente
com afectos negativos leves resmunga comigo e fica zangada comigo que podem remeter
para a percepo de uma figura com tendncias punitivas face me. No Ningum figuram os
afectos negativos sobretudo de cariz agressivo, mas tambm os afectos positivos erotizados
como quer mesmo o meu amor podendo remeter para a vivncia de sentimentos de
insegurana e desconfiana face aos elementos da famlia.

8
6
4
2
0

Emitidos Positivos

-2

Recebidos Positivos

-4

Emitidos Negativos

-6

Recebidos Negativos

-8
-10

Figura 4 Direco dos afectos emitidos e recebidos positivos/negativos.

Atendendo direco dos afectos positivos/negativos emitidos e recebidos pelos


membros da famlia (Figura 4) observa-se a percepo de que a me da Mariana emite mais
afectos positivos do que aqueles que recebe na relao com o pai, o irmo, a av paterna e a
Mariana, intensificando-se este sentimento na relao com as trs primeiras figuras evocadas,
com destaque para o pai no qual se registam apenas afectos positivos emitidos, podendo sentir
estas relaes como pouco valorizadas por parte destas figuras. Por outro lado, no caso do av
materno a me sente que recebe mais afectos positivos do que aqueles que emite, ainda que a
diferena seja pouco substancial. No plano dos afectos negativos observa-se a percepo de
apenas emitir afectos deste gnero na relao com o irmo, a Mariana e o av materno,
podendo associar-se ao sentimento de culpabilizao na me. Na relao com a av paterna
283

verifica-se uma correspondncia neste tipo de afectos. Contudo, na relao com o pai
sobressaem os afectos negativos recebidos face aos emitidos, o que acentua a vivncia de uma
relao desvalorizada e pouco correspondida face aos afectos da me por parte do pai. Na
auto-estima da me destacam-se os afectos negativos emitidos, revelando uma auto-estima
baixa. Na figura Ningum so colocadas as defesas principalmente associadas aos afectos
negativos inibindo, assim, a expresso da agressividade sobre os elementos da famlia.

Tabela 2 Nmero de itens associados a sentimentos de proteco e atribuio de


incompetncia ou fraqueza.
Sentimentos
de Proteco
Ningum
Me
Pai
Irmo
Mariana
Av Paterna
Av Materno

0
2
1
1
2
2
2

Atribuio de
Incompetncia ou
Fraqueza
0
1
3
1
0
0
0

A anlise dos sentimentos de proteco e de atribuio de incompetncia ou fraqueza


face aos membros da famlia (Tabela 2) permite observar que a me, a Mariana, a av paterna
e o av materno foram associados a figuras mais dependentes e que carecem de maior
proteco colocando o pai e o irmo numa posio de menor destaque. Todavia, no mbito da
atribuio de sentimentos de fraqueza o pai surge como a figura mais destacada com os itens
no tem uma personalidade suficientemente forte, deveria ajudar mais em casa e deveria
desempenhar um papel mais importante na vida da famlia, podendo associar-se percepo
do pai como um elemento pouco presente na famlia, sentindo-se pouco apoiada por este. A
prpria me e o irmo com apenas um item cada seguem-se nesta categoria. No caso da me
no consegue lidar suficientemente bem com dificuldades associa-se a uma auto-estima
baixa, inferiorizada e culpabilizada, revelando dificuldades na resoluo dos conflitos e no
consegue enfrentar suficientemente bem as outras pessoas no caso do irmo, remetendo para
dificuldades na adaptao social e na gesto dos conflitos com os outros.

284

Sntese da Anlise do Teste de Relaes Famliares (TRF)

Na figura Ningum a me da Mariana coloca os afectos negativos sobretudo de cariz


agressivo recusados/negados (inibindo, assim, a expresso da agressividade) mas tambm os
afectos positivos erotizados, traduzindo uma diminuda disponibilidade emocional por parte
da me, optando por alhear-se do contacto com os outros e, ainda, o sentimento de
insegurana e desconfiana face aos elementos da famlia. Observa-se assim, um grau elevado
de neuroticismo na me da Mariana.
A auto-estima da me apresenta-se baixa e dominada por sentimentos de inferioridade,
culpabilizao e irritabilidade. Sente dificuldades na resoluo dos conflitos e surge como um
dos elementos da famlia mais dependentes e que carece de maior proteco. A conduta
observada durante a realizao da prova marcada por choro intenso at ao final e os
comentrios depreciativos sobre a sua condio actual e diminuda disponibilidade para a
partilha de afectos com os elementos da famlia podem associar-se a um funcionamento
depressivo.
A relao com o pai aquela que traduz um maior envolvimento emocional. Contudo,
sentida de forma bastante desvalorizada e pouco correspondida por parte do pai face aos
sentimentos e necessidades manifestadas pela me. Assim, assiste-se a uma forte projeco de
afectos negativos recebidos pelo pai reenviando para conflitos na relao de casal associados
dificuldade na resoluo dos problemas, falta de confiana na relao, falta de compreenso
e apoio s necessidades da me por parte do pai, verificando-se, tambm, uma tendncia
paranide no funcionamento psicolgico da me ainda que se sinta emocionalmente
dependente do pai.
Com o irmo a relao percepcionada de forma idealizada, revelando uma relao
prxima e carinhosa com esta figura. No entanto, sente a relao menos valorizada por parte
do irmo, ao emitir um nmero significativo de afectos positivos no correspondidos face aos
recebidos. A me parece, ainda, sentir-se culpabilizada nesta relao e percepciona o irmo
como um elemento que apresenta dificuldades na adaptao social e na gesto dos conflitos
com os outros.
A relao com a Mariana representa-se de forma idealizada e prxima, transmitindo a
ideia de que a filha estabelece uma relao de forte dependncia emocional com a me. A
perecepo de uma maior incidncia de afectos positivos emitidos pela me face aos
recebidos pela Mariana pode traduzir a atribuio de menor valorizao relao por parte da
filha, observando-se ainda a vivncia de culpabilizao na relao por parte da me. A
285

Mariana surge como uma das figuras mais dependentes e que carecem de maior proteco na
famlia.
Com a av paterna assiste-se a uma relao sentida como menos valorizada por parte
da av uma vez que a me emite um nmero significativo de afectos positivos face aos
recebidos desta figura. A av paterna percepcionada como uma figura com tendncias
punitivas face me, ainda que se sinta apoiada por esta figura. Surge como um dos
elementos da famlia mais dependentes e que necessitam de proteco.
A relao com o av materno sentida de forma prxima, carinhosa e valorizada por
parte do av, recebendo mais afectos positivos do que aqueles que emite, ainda que a
diferena seja pouco significativa. Assim, o av materno percepcionado como uma figura
que mantm uma dependncia emocional face me, necessitando da sua proteco. Contudo,
a me parece sentir-se culpabilizada nesta relao.

Teste de Relaes Familiares, Verso Casais - Pai


Tabela 1 Nmero de itens emitidos e recebidos positivos/negativos (leves/fortes) atribudos
aos membros da famlia.
Emitidos
Emitidos
Recebidos
Recebidos
Total de
Positivos
Negativos
Positivos
Negativos
Envolvimento
Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes
Ningum

30

Pai

Me

26

Irmo

16

Mariana

21

Av Paterna

21

Av
Materno
Tia Paterna

14

12

O pai da Mariana colaborou de forma favorvel durante a passagem do TRF,


denotando-se alguma lentificao e indeciso no momento de escolher as figuras para colocar
os cartes. Realizou alguns comentrios verbais que justificavam as opes realizadas (e.g., o

286

facto de ao filho no dar abraos, mas fazerem mais coisas de homens) e relacionados com
crticas presena de determinados cartes.
Analisando a Tabela 1 observa-se que alm dos elementos que constituem a famlia
nuclear: o pai, a me, o irmo e a Mariana, o pai decidiu incluir trs membros da famlia
alargada: a av paterna, o av materno e a tia paterna. Sobressai um elevado grau de
neuroticismo no pai atravs da negao/recusa dos afectos negativos colocados na figura
Ningum, inibindo a expresso da agressividade sobre os elementos da famlia.

30
25
20
15
10
5
0

Figura 1 Nmero total de itens associados a cada membro da famlia.

A anlise do total de itens associados a cada membro da famlia (Figura 1) permite


destacar um forte envolvimento emocional com a me, seguindo-se a Mariana e a av paterna
com o mesmo nmero de afectos atribudos. Numa posio menos destacada surgem o irmo,
o av materno e a tia paterna. O recurso utilizao do Ningum para a colocao dos afectos
negativos rejeitados foi significativo, demonstrando uma forte inibio da agressividade face
aos elementos da famlia.

287

16
14
12
10
8
Positivos

Negativos

4
2
0

Figura 2 Nmero de itens positivos e negativos emitidos a cada membro da famlia.

Avaliando os afectos positivos e negativos emitidos pelo pai da Mariana aos elementos
da famlia (Figura 2) verifica-se um forte mecanismo defensivo na linha da negao dos
afectos negativos recorrendo figura Ningum bloqueando, assim, a expresso agressiva
sobre os elementos da famlia, tornando-os figuras idealizadas. A me foi a nica figura qual
o pai atribuiu afectos negativos irrita-se muito depressa, fica chateada sem ter razo para
isso e fica zangada demais que traduzem a percepo de irritabilidade na me, dificuldades
em lidar com os conflitos por parte desta e, ainda, insegurana na relao de casal. As figuras
s quais o pai associa afectos positivos fortes so a me (todos os afectos deste tipo, oito), o
irmo, a Mariana e a av paterna (estes trs ltimos com os mesmos afectos, cinco).

288

14
12
10
8
Positivos

Negativos

4
2
0

Figura 3 Nmero de itens positivos e negativos sentidos como recebidos por cada membro
da famlia.

A anlise dos afectos positivos e negativos recebidos pelos elementos da famlia


(Figura 3) permite destacar um forte movimento defensivo na linha da negao dos afectos
negativos colocados na figura Ningum de forma a bloquear a expresso agressiva sobre os
elementos da famlia. Deste modo, as figuras surgem de forma idealizada observando-se,
ainda assim, a atribuio de um afecto negativo leve me fica zangada comigo e outro
av paterna fica ressentida comigo podendo sentir estas figuras como punitivas e, no caso
da me, como algum com irritabilidade emocional. A me e a Mariana surgem como as
figuras s quais atribui um maior nmero de afectos erotizados (quatro), seguindo-se o irmo
e a av paterna tambm com o mesmo nmero de afectos deste tipo, dois. No caso da Mariana
assinala-se a atribuio do item gosta de me abraar apenas partilhado com a me e o item
quer estar sempre ao p de mim colocado apenas na Mariana, o que pode remeter para a
percepo de fantasias edipianas por parte da filha na relao com o pai. Por outro lado, a
atribuio do item ama-me muito apenas av paterna pode traduzir a vivncia de uma
relao emocionalmente dependente com esta figura.

289

15
10
5
Emitidos Positivos

Recebidos Positivos
-5

Emitidos Negativos
Recebidos Negativos

-10
-15

Figura 4 Direco dos afectos emitidos e recebidos positivos/negativos.

Atendendo direco dos afectos positivos/negativos emitidos e recebidos pelos


elementos da famlia (Figura 4) verifica-se a percepo de um nmero significativo de afectos
positivos emitidos pelo pai face aos recebidos por parte dos elementos da famlia, podendo
sentir-se menos valorizado. Esta diferena acentua-se na relao com a av paterna e o av
materno, atravs da diferena de oito itens e, atenua-se na relao com a Mariana pela
diferena de cinco itens. No plano dos afectos negativos o pai sente que os emitidos
sobressaem aos recebidos na relao com a me, podendo sentir-se culpabilizado e, no caso
da av paterna, os afectos negativos recebidos so os nicos registados. No Ningum figuram
sobretudo os afectos negativos negados/recusados face aos elementos da famlia, bloqueando
a expresso da agressividade.
Tabela 2 Nmero de itens associados a sentimentos de proteco e atribuio de
incompetncia ou fraqueza.
Sentimentos
de Proteco
Ningum
Pai
Me
Irmo
Mariana

0
3
5
4
4
290

Atribuio de
Incompetncia ou
Fraqueza
1
2
1
0
0

Av Paterna
Av Materno
Tia Paterna

4
3
3

0
0
1

A anlise dos sentimentos de proteco e de fraqueza ou incompetncia (Tabela 2)


permite apurar a representao da me como o elemento da famlia mais dependente e que
necessita de maior proteco, obtendo todos os itens desta categoria destacando-se o item
sofrer um esgotamento nervoso apenas associado me, podendo remeter para uma
fragilidade emocional nesta figura. Seguem-se o irmo, a Mariana e a av paterna com o
mesmo tipo de sentimentos de proteco e, por ltimo, ainda que apresentem um nvel
significativo de dependncia, o pai, o av materno e a tia paterna. Nos sentimentos de
fraqueza destaca-se o prprio pai com deveria ajudar mais em casa e deveria desempenhar
um papel mais importante na vida da famlia reenviando para o sentimento de culpabilizao
face percepo de uma diminuda disponibilidade e apoio famlia. Segue-se a me com
no consegue lidar suficientemente bem com dificuldades remetendo para a dificuldade na
resoluo dos conflitos nesta figura e a tia paterna no tem uma personalidade
suficientemente forte.

Sntese da Anlise do Teste de Relaes Famliares (TRF)

A utilizao da figura Ningum permite um forte mecanismo defensivo na linha da


negao/recusa dos afectos negativos bloqueando, assim, a expresso de agressividade sobre
os elementos da famlia. Apresenta um elevado grau de neuroticismo.
A auto-estima do pai apresenta-se de forma positiva, ainda que se observe o
sentimento de culpabilizao relacionado com a percepo de uma diminuda disponibilidade
e apoio famlia.
A relao com a me reveste-se de um forte envolvimento emocional e surge de forma
idealizada. Ainda assim, os afectos negativos atribudos permitem antever a percepo de uma
figura punitiva face ao pai, com irritabilidade emocional, dificuldades em lidar com os
conflitos por parte da me e insegurana na relao de casal. A me associada a uma figura
fortemente dependente e a que mais carece de proteco, transparecendo uma fragilidade
emocional elevada.
A relao com o irmo encontra-se idealizada, semelhana do observado na relao
com as restantes figuras. Surge como um dos elementos mais dependentes e que necessita de
maior proteco (a seguir me).
291

Com a Mariana a relao idealizada e mantida atravs de um elevado envolvimento


emocional, no qual, so percepcionadas fantasias edipianas por parte da filha. Seguindo-se
me, a Mariana sentida como uma figura emocionalmente dependente, carecendo de
proteco.
Na relao com a av paterna transparece um elevado envolvimento emocional e
idealizao da relao, sentido esta figura como punitiva ainda que emocionalmente
dependente do pai.
Com o av materno sobressai uma relao idealizada ainda que pouco significativa do
ponto de vista do envolvimento emocional mantido.
Por fim, com a tia paterna observa-se uma relao idealizada, todavia a menos
significativa do ponto de vista do envolvimento emocional (excluindo o prprio pai) e
relacionada a sentimentos de fraqueza/incompetncia.

292

Guio de Entrevista da Criana

Identificao da Criana

Nome: Mariana

Idade: 9 Anos e 9 Meses

Interesses/Actividades

O que que tu gostas de fazer nos teus tempos livres?


Jogar computador, brincar com as amigas (apanhada, escondidas, corridas de
bicicleta e joga bola. Brinca na escola e no Clube Recreativo onde a me trabalha) e ver
televiso (Disney Channel).

Frequentas alguma actividade desportiva ou cultural (dana, teatro, msica, etc.)? Qual?
No ando em nada. Jogo futebol com os meninos e meninas sou como o pai, gosto de
futebol.

Tens animais de estimao? Quais?


S em casa da av paterna, uma cadela chamada Luna e dois passarinhos. O av
materno tem um co.

Amigos

Quem so os teus amigos(as) (nome e idade)?


Da escola: Carolina (9 anos, 4 Ano), Catarina (8 anos, 3 Ano), Raquel (8 anos),
Beatriz (8 anos), Jssica (8 anos).
Fora da escola: muitos prima Joana (10/11 anos), Toms (12/13/14 anos), Duarte
(10 anos), Miguel (8 anos), Manuel (10/11/12 anos). No sei muito bem a idade dos grandes.
Antnio (12 anos), Andreia (10 anos).

De onde os(as) conheces?


Escola e do Clube Recreativo.

293

O que que costumam fazer juntos(as)?


Brincar (jogar bola, s escondidas, macaquinho de chins, apanhada). No posso ir
para casa deles seno tambm ficava a jogar (faz gesto de jogar consola).

Tens um(a) amigo(a) preferido(a) (melhor amigo/a)? Quem ?


Andreia (10 anos) e a Dbora (8 anos).

Escola

Em que ano andas?


4 Ano.

O que que gostas mais na escola? Porqu?


Brincar e expresses plsticas e Matemtica gosto mais ou menos. Estudo do Meio
tambm gosto e Portugus tive bom e antes era muito m porque posso brincar, posso
saltar etc. e na sala no posso. Estudo do Meio gosto de aprender as experincias, o estudo
da gua, os reis.

O que que gostas menos na escola? Porqu?


De brincar com uma amiga e estudar Matemtica. De Matemtica. E no gosto da
comida da escola, fria e tem picante.

Se pudesses mudar alguma coisa na escola, o que seria?


Mudaria o comer.

Como preferias que fosse?


Que fosse batatas fritas com bife. Para o comer que eu gosto, como salada russa no
recreio mudaria uma pedra que est l para ns treparmos e um mido j partiu a cabea.

Onde que costumas fazer os teus trabalhos de casa?


Na explicao.

Tens ajuda de algum? De quem?


Na explicao tenho ajuda das explicadoras.
294

Famlia

Quem so as pessoas da tua famlia?


Me, pai, mano, av, av, prima e primo (paternos), tia e tio, padrinho, padrinha ou
madrinha, a minha outra prima Luna, filha dos padrinhos.

Com quem vives (nome, idade, grau de parentesco face criana)?


Me, pai e mano e comigo prpria, mais ningum. A minha av dorme sozinha noutra
casa porque o meu av faleceu ainda no me tinha conhecido, era muito nova.

Como a tua me?


boa, gira. Eu imitei o cabelo dela porque ela tem franja e eu fiz assim,
escademos o cabelo. Quando o pai quer ir dar um passeio ela vai.

Como o teu pai?


Brinca muito comigo, simptico, s vezes quando eu no obedeo ele grita-me e
zanga-se. Um dia ele quis fazer-me assim no cu e eu fiquei com uma bolha aqui (bater-lhe).

Como so os teus irmos(s) (ou outras pessoas da famlia mencionadas)?


Brinca comigo de vez em quando. Fazemos uma corrida para entrar no Clube. Ele
ganha sempre, mas um dia eu ganhei-lhe.

Como que os teus pais se do um com o outro? O que pensas/sentes com isso?
Penso que eles esto ptimos. Zangam-se de vez em quando mas agora no se esto a
zangar. Mas de vez em quando, quando o pai chega a casa a me comea logo a gritar e eu
no consigo dormir.

Dormes com algum ou partilhas o quarto com algum? Se sim, com quem?
Durmo sozinha. O meu pai construiu uma parede para separar o meu quarto para o
do mano, quando era muito pequenina.

Se pudesses mudar alguma coisa na tua famlia, o que seria?


No, est tudo bem. Mudava que o pai e a me se dessem bem, mas agora j esto a
comear a dar. Que a me no estivesse doente. Tambm no gostava que a av vivesse
295

sozinha, mas ela agora tem a cadela para a proteger, ela no deixa entrar ningum, s o
mano, o primo

Como preferias que fosse?

Fantasias/Sonhos/Medos

O que que gostarias de ser quando fores grande? Porqu?


Duas coisas: professora ou cabeleireira. Ou massagista porque o meu pai diz que eu
fao bem massagens, a av tambm. Cabeleireira porque fao penteados no pai, um dia fizlhe um penteado igual ao que ele teve quando foi casado. Professora no sei. Por causa das
reunies antes quando chego a casa.

Quais so os teus maiores sonhos/desejos?


Que eu tivesse um mano mais pequenino, mas depois reparei que os manos mais
grandes tinham que aturar os pequeninos e receber mais mimos e eu no quero, quero ter a
ateno toda para mim, j no tenho esse sonho. Gostava de estar no 12 Ano, gostava de
viver perto do Clube Recreativo e um sonho j foi concretizado que foi ir Serra da Estrela.

Se pudesses mudar alguma coisa em ti, o que seria?


Nada. A minha vida perfeita.

Como preferias ser?

Costumas sonhar? Se sim, com o qu?


Sim (abana a cabea). Um dia vi as fotos do meu pai e ele estava a descer uma
prancha de gua e eu estava a descer a prancha de gua, j sei o que acontece nos filmes no
tem gua, mas o meu tinha gua.
Pesadelo: no tinha tomado as gotas, eu agora tenho medo da gua do mar. Estava l
um tubaro. Sonhei que tinha levado uma mordidela na barriga, do tubaro.

296

Quais so os teus medos? O que fazes quando te sentes assim?


Tubares, cobras, crocodilos. No fao nada, se ele no se aproximar, vou-me
embora.

E as tuas preocupaes? O que fazes quando te sentes assim?


Quando a me est a chorar. (quando que isso costuma acontecer?) De vez em
quando. Sinto-me triste.

Desenho Livre

Inqurito

1) O que que desenhas-te? O que que est a acontecer no teu desenho?


Uma caveira que alrgica a flores, coraes meio pintados com uma seta, com uma
seta no que no fiz. E Margarida s querida e era surpresa.

297

2) Histria
Era uma vez uma caveira que apareceu ao p de flores e era alrgico, ele no sabia que
era alrgico. E ele tinha uma parede to branca, to branca que decidiu desenhar
coraes, quatro coraes em cada canto. Depois viu que l dentro dos coraes, no
meio no tinha nada, ele depois lembrou-se que gostava de uma pessoa e depois
resolveu escrever no meio Margarida s querida. Depois lembrou-se que faltava uma
coisa, mas o qu, depois o seu esprito disse: falta-te desenhar no meio de dois
coraes, em cima e depois desenhou a dizer a toda a gente que alrgico a cores.
A parte que eu mais gosto de dizer a histria porque assim estou sempre a falar.

Anlise da prova

Esta prova realizou-se no mbito da primeira sesso e, como tal, constituiu o primeiro
contacto de avaliao psicolgica com a Mariana. Todavia, ao longo da prova a Mariana
revelou o desejo de me agradar, demonstrando-se, desta forma, insegura e com contacto
superficial. Esta transferncia positiva com a investigadora pode-se traduzir no desejo de
estabelecer uma relao dual na linha do cuidar, como uma forma de carncia: chamas-te
Margarida certo? que eu quero desenhar aqui uma coisa e tu no podes ver () para ti!
Quais so as tuas cores preferidas? () quantos anos tens? () Em que ano que ests do
curso? () s de que clube? Do Benfica, Sporting? Tens cara de ser do Sporting, Porto. A
Mariana expressou, ainda, a necessidade de apoio marcada por parte da investigadora e fez
algumas crticas negativas ao modo como desenhou determinados atributos: depois vou fazer
uma coisa que aprendi com o meu padrinho. Sabes o que isto ? Uma caveira (ri-se) Eu no
sabia desenhar caveiras! No est l muito perfeita. Depois com um lpis pintava um dente, s
um dente a dizer que ele estava amarelo () igual a uma flor! Ele alrgico a flores, v, vou
p-lo a pensar.
A nvel grfico trata-se de um desenho imaturo para a idade e sem simbolismo, com
elementos dispersos e sem ligao entre si, recorrendo escrita para exprimir o que deseja. O
desenho da caveira pode ser entendido como uma forma de colagem e adaptao ao social
visto que actualmente este elemento ganhou alguma fama entre as crianas e adolescentes. A
narrativa assenta no concreto e factual, descrevendo apenas os elementos desenhados.
Sobressai, no entanto, a sensibilidade ao tom branco tinha uma parede to branca, to
branca e ao vazio do silncio a parte que eu mais gosto de dizer a histria porque assim
estou sempre a falar e da folha no meio no tinha nada () faltava uma coisa, mas o qu,
298

depois o seu esprito disse: falta-te desenhar no meio de dois coraes, em cima, o que
reenvia para questes ligadas a dificuldades ao nvel da falha narcsica.

Desenho da Figura Humana de Machover

1 Desenho

Inqurito

Quem esta pessoa? Como se chama e que idade tem?


Sei l. Pode ser Margarida e tem quantos anos que tens? 20 e qualquer coisa? 23. 24
Anos. Quando que nasceste? Ok, vou escrever aqui.

299

Qual foi o dia mais feliz da sua vida?


Foi quando se casou. J te casaste? Tens um anel.
E o dia mais triste?
Nenhum.

Conta-me uma boa recordao que tenha.


Av fez uma camisola para ela e ela vai guard-la para o resto da sua vida, mo. A minha
av (materna) fez-me uns sapatos quando eu era pequenina.

E uma m recordao?
Nenhuma.

Conta-me uma histria sobre esta pessoa.


Era uma vez uma menina chamada Margarida que tinha 24 anos e andava na faculdade a tirar
um curso. O dia mais feliz da sua vida foi ter casado. O dia menos feliz da sua vida ela nunca
teve. Uma boa recordao que a av dela lhe deu foi uma camisola feita mo, umas pantufas
e uma coisa para pr no cabelo e principalmente fez um gancho e uma mola. O que ela mais
gostou foi ter ficado com a casa da av, mas tinha pena porque a av tinha falecido. O
namorado dela e ela foi viver para casa da av porque a me deixou. Foram felizes para
sempre.

1) O que que ele/ela est a fazer? Nada. Est parada. Est a jogar ao jogo 1,2,3
Macaquinho do Chins.
2) Que idade tem? 24 Anos.
3) casado/a? Sim.
4) Tem filhos? Sim.
5) Rapazes ou raparigas? Raparigas, duas.
6) Qual o seu trabalho? Cabeleireira.
7) Se ainda estuda, em que ano est? No.
8) Qual o seu maior desejo? Ir Serra da Estrela.
9) saudvel? Sim.
10) Tem bom aspecto? Sim.
11) Qual a parte do seu corpo que est mais bem feita? O cabelo e a camisola.
12) E qual a menos bem feita? A cabea, o pescoo, a boca, os olhos, nariz.
13) feliz? Sim.
300

14) Quais so os seus aborrecimentos? As filhas.


15) O que o/a faz zangar? Quando elas se portam mal.
16) Quais so as suas manias? Quer sempre doces.
17) Quais so os seus trs piores defeitos? Servir mesa.
18) Quais so as suas melhores qualidades? Cabeleireira e fazer o jantar.
19) Tem muitos amigos? Sim.
20) Mais velhos ou mais novos? Mais velhos.
21) O que que dizem dele/a? Que ela fixe.
22) Ele/a gosta da famlia? Sim.
23) E da escola? Sim.
24) Sai muito com os amigos? Sim.
25) Quando que diz que se divertiu muito? Quando vai discoteca e quando vai jantar
fora.
26) Quer casar?
27) Com que idade?
28) Que gnero de homem quer casar? Sei l, bonito.
29) Quais so os seus trs principais projectos/sonhos? Ir Serra da Estrela, ir a Frana,
ir a Espanha.
30) Com quem se parece? Com ningum. Contigo no se parece, fiz diferente.
31) Gostarias de te parecer com ele/a? No, est esquisita.
32) Se pudesses, mudarias alguma coisa no teu desenho? Sim, a cabea, os olhos, a
boca, o nariz e estas bolinhas que corada. A parte toda da cara menos as orelhas que
no tem orelhas.

No final do inqurito comeou a queixar-se de fome (era hora do almoo) e comentou que se
calhar os pais foram comer e deixaram-na ali comigo. A sesso terminou neste momento.

301

2 Desenho

Inqurito

Quem esta pessoa? Como se chama e que idade tem?


Fbio (ri-se). J usa gravata ento pode ter 13 anos.

Qual foi o dia mais feliz da sua vida?


Quando foi Kidzania, eu tambm fui.

E o dia mais triste?


Quando perdeu a sua chave (?) de casa.

302

Conta-me uma boa recordao que tenha.


O seu anel que a me lhe deu para se lembrar todos os dias.

E uma m recordao?
quando a sua av morreu.

Conta-me uma histria sobre esta pessoa.


preciso ter ttulo? Era uma vez um menino que andava a passear na Kidzania mais que
foi ao avio, o avio falso da Kidzania. Perdeu as chaves porque esqueceu-se de dar me.
Depois ficou muito triste, s quando chegou l em baixo que se lembrou que se tinha
esquecido na escada, voltou para cima e andou cima/abaixo, abaixo/cima procura da chave e
no encontrou a chave de casa. Depois a sua mana foi l acima e encontrou a chave, mas
como ela muito malandra no quis dar ao mano, mas como o mano to esperto tinha uma
pulseira e tinha umas mquinas ali frente e encontrava a foto, encontrava ela onde ela
estava, encontrou ela, a chave e foi buscar. Distraiu ela e tirou a chave do bolso, depois foi dar
me e queixou-se. Como o mano to bom que foi fazer dois crepes, dois bolos, um para a
irm e um para ele, a irm papou e gostou, acaba a.

1) O que que ele/ela est a fazer? Est a ir para dentro do carro.


2) Que idade tem? 13 Anos.
3) casado/a?
4) Tem filhos?
5) Rapazes ou raparigas?
6) Qual o seu trabalho?
7) Se ainda estuda, em que ano est? Ai isso agora... 6 Ano.
8) Qual o seu maior desejo? Ter um carro novo.
9) saudvel? Sim.
10) Tem bom aspecto? Sim.
11) Qual a parte do seu corpo que est mais bem feita? Cabelo.
12) E qual a menos bem feita? Os braos e a gravata.
13) feliz? .
14) Quais so os seus aborrecimentos? Quando ele quer fazer uma coisa e no pode.
15) O que o/a faz zangar? A sua me.
16) Quais so as suas manias? Sair de casa.
17) Quais so os seus trs piores defeitos? chato, no sabe fazer os trabalhos de casa.
303

18) Quais so as suas melhores qualidades? bom em matemtica.


19) Tem muitos amigos? Sim.
20) Mais velhos ou mais novos? Mais velhos.
21) O que que dizem dele/a? Que ele um rapaz porreiro, como se diz.
22) Ele/a gosta da famlia? Sim.
23) E da escola? Mais ou menos, sim gosta.
24) Sai muito com os amigos? Sim.
25) Quando que diz que se divertiu muito? Saiu com os amigos para ir para a
discoteca.
26) Quer casar? No.
27) Com que idade?
28) Que gnero de mulher quer casar?
29) Quais so os seus trs principais projectos/sonhos? Agora que vem elas... quer ser
carpinteiro.
30) Com quem se parece? Com o meu pai, com o seu pai.
31) Gostarias de te parecer com ele/a? No (ri-se).
32) Se pudesses, mudarias alguma coisa no teu desenho? No.

Anlise da prova

semelhana da prova anterior a Mariana realiza variados comentrios verbais que


exprimem a necessidade de apoio por parte da investigadora e algumas crticas negativas aos
desenhos que remetem para insegurana e auto-exigncia: est a sair um bocadinho mal ()
olha aqui a cabea, parece um E.T (primeira figura) ainda agora comecei e j preciso de
apagar () No sei desenhar gravatas, mas vou desenhar como sei (segunda figura).
Na primeira figura surge, uma vez mais, uma transferncia positiva com a observadora
que reenvia para o desejo de agradar e estabelecer uma relao dual na linha do cuidar.
Embora numa fase inicial a Mariana se defenda e recuse-se a enunciar os aspectos negativos
bloqueando a agressividade, para esta figura casada (ainda que dependente da me para se
autonomizar e sair de casa) que pode reenviar para o imago materno, os seus aborrecimentos
so as filhas e o que a faz zangar quando elas se portam mal, o que pode estar associado
a um vivido de culpabilizao na Mariana e a um imago materno frustrado, pouco gratificante
e tolerante. Observa-se uma ligao ao contexto real ao evocar a av materna j falecida e
dificuldades de separao e de internalizao desta relao a av fez uma camisola para ela e
ela vai guard-la para o resto da sua vida, mo. A minha av (materna) fez-me uns sapatos
304

quando eu era pequenina e o que ela mais gostou foi ter ficado com a casa da av, mas tinha
pena porque a av tinha falecido.
No plano grfico o desenho encontra-se adaptado ao grupo etrio da Mariana, com
excepo da legenda que identifica a figura, caracterstica da fase de Realismo Intelectual
(Luquet, 1984). Por seu turno, a narrativa pobre do ponto de vista simblico, assenta num
discurso descritivo, factual e concreto.
No final do inqurito relativo ao primeiro Desenho da Figura Humana a Mariana
comenta que sente fome e que se calhar os pais foram comer e deixaram-na ali comigo, o que
pode remeter para a angstia de abandono e de perda do objecto. Terminou-se a sesso neste
momento.
Quanto ao segundo Desenho da Figura Humana, na fase de inqurito a Mariana
apresentou uma conduta agitada atravs dos movimentos repetitivos de balanceamento da
cadeira, queixou-se de sono e pediu-me para ir brincar com uma pista de carrinhos. Realizou
um desenho adequado idade, investido, com o pormenor do traado de uma gravata, como
smbolo sexual masculino e, semelhana do primeiro Desenho da Figura Humana, uns
botes, que podem remeter para a dependncia materna. Este tipo de relao dual e
dependente com o materno encontra-se tambm presente atravs das dificuldades em crescer,
autonomizar-se perdeu as chaves porque esqueceu-se de dar me, depois foi dar me e
queixou-se. As chaves surgem assim aqui como um representante de poder, de
responsabilidade, autonomia e crescimento. Na sequncia do desejo de transgresso da
relao com o materno e de curiosidade face ao meio externo desencadeia-se um vivido de
culpa e de carncia afectiva acentuada pela necessidade de fazer bolos, ainda que exclua a
figura materna. Assim, parece projectar sentimentos agressivos face ao imago materno o que
o/a faz zangar? A sua me. Todavia, as dificuldades de separao e de internalizao da
relao com o materno subsistem conta-me uma boa recordao que tenha. O seu anel que a
me lhe deu para se lembrar todos os dias. A resposta quais so os seus aborrecimentos?
Quando ele quer fazer uma coisa e no pode reenvia para intolerncia frustrao.
No geral, surge a representao de uma imagem corporal ambivalente, entre um
adolescente de 13 anos que utiliza gravata e deseja sair de casa, mas que frequenta um
parque de diverses para crianas e necessita de manter uma relao dependente com a me.
A histria deste desenho apresenta-se mais simbolizada, ainda que, assente no factual. A
figura associada pela Mariana figura paterna quais so os seus trs principais
projectos/sonhos? Agora que vem elas... quer ser carpinteiro e com quem se parece? Com
o meu pai, com o seu pai. A diferenciao de sexos parece integrada.
305

Desenho da Famlia

Inqurito

1) Quem so essas pessoas que desenhas-te, como se chamam e que idade tm? (da
esquerda para a direita)
Famlia Loureno.
Margarida, 13 Anos, filha;
Diogo, 12 Anos, filho;
Luna, me, 49 Anos;
Pai, Lus, 42 Anos.

2) O que est a acontecer no teu desenho? Porqu?


A famlia vai subir o escorrega, vai descer o escorrega e vai descer na piscina, s que a
piscina no cabia aqui.

306

3) Quem o mais feliz? Porqu?


Margarida, Luna, toda a famlia.
(?) A Margarida. Est sempre com sorte e tem tudo o que quiser.

Quem o menos feliz? Porqu?


Diogo. Porque est sempre com azar.

4) Quem o mais simptico? Porqu?


Luna. No sei. Porque anda a tomar um remdio.

Quem o menos simptico? Porqu?


Ningum. A aranha. O Diogo, o meu pap no muito mau.
(?) O Diogo. Porque est sempre com azar.

5) Quem manda mais? Porqu?


O pai e a me. Porque eles so pai e me, so adultos.

Quem manda menos? Porqu?


O Diogo e a Margarida. Porque eles so filhos e so pequeninos.

6) Se tivesses que escolher uma pessoa desta famlia, quem que preferias ser?
Porqu?
A me. Porque adulta e eu gosto de ser adulta, posso lavar a loia, posso trabalhar e
ganhar dinheiro e essas coisas todas.

7) Se fossem todos dar um passeio de carro mas no houvesse lugar para uma
pessoa, quem ficaria em casa? Porqu?
A me ou o pai.
(?) A me que fica a limpar a casa.

8) Se algum no se tivesse comportado bem quem seria? Como seria castigada?


Quem que dava o castigo?
O Diogo. No jogar computador e no jogar bola. A me e o pai.

307

9) Se pudesses mudar alguma coisa no teu desenho o que que mudarias? Porqu?
O escorrega. Porque est mal desenhado e devia ser da porta vinha um tubo que eles
vinham a descer, a descer e vinham ter piscina.

Anlise da prova

Durante a realizao do Desenho da Famlia a Mariana sente uma necessidade


marcada de verbalizar e de procurar apoio por parte da observadora revelando-se insegura
(isto uma rapariga, o cabelo est giro? () olha est giro? () diz-me l isto parece mais
com um menino ou com uma menina? Para mim parece mais com uma menina a me,
igualzinha filha () ai o cabelo, esqueci-me do cabelo do pai, o meu pap, o meu pai tem
42 anos e esqueci-me do cabelo () j acabei, est giro?).
O desenho apresenta um grafismo pouco adequado idade da Mariana, onde o
escorrega apresenta-se visto do alto, isto , como percebido e no como realmente visvel,
a chamin na diagonal (e no na vertical), segundo a inclinao do tecto e com uma legenda a
identificar cada figura. Estas trs caractersticas integram a fase de Realismo Intelectual
descrita por Luquet (1984).
Por baixo do escorrega curiosa a presena de uma aranha, animal fbico de
caractersticas arcaicas que reenvia para a relao com o imago materno pr-genital perigoso.
O traado do fumo a sair da chamin pode remeter para uma casa com vida e a maaneta na
porta e a campainha estabelecem a possibilidade de contacto entre a realidade interna e
externa. Quanto s figuras, no geral aparentam um aspecto rgido. A filha afigura-se como a
mais investida, com aspecto mais harmonioso e mos (smbolo de relacionamento e
comunicao com o outro). Por outro lado, o filho surge como a figura menos investida, com
um aspecto pouco estvel e harmonioso que aliado atribuio de uma idade menor que a
filha, invertendo a tendncia da famlia real e a atribuio das respostas ao inqurito de cariz
negativo pode remeter para uma desvalorizao na linha da rivalidade fraterna. Ao nvel da
colocao das figuras, o irmo desenhado prximo do imago materno, filha e pai
respectivamente, encontram-se mais afastados destas duas figuras. A diferenciao sexual
apenas visvel atravs dos cabelos, sem haver discriminao atravs do vesturio das figuras.
A diferenciao de geraes e o conceito de famlia surgem integrados.
Com a resposta questo Quem o mais feliz? Porqu? Margarida, Luna, toda a
famlia (?) A Margarida. Est sempre com sorte e tem tudo o que quiser a Mariana defendese, negando as dificuldades emocionais experienciadas e revelando uma possvel intolerncia
frustrao. O imago materno associado simpatia com a justificativa de se encontrar a
308

tomar um remdio, como se estivesse doente e naturalmente no apresentasse esta


capacidade. Neste ponto, faz-se a ligao com a me real que se encontra medicada com
psicotrpicos. O imago materno predominantemente associado aos aspectos funcionais
relacionados com a limpeza, trabalho e ganhar dinheiro. Neste sentido, surge uma
identificao com o materno. Contudo h que assinalar o desejo e a aceitao de se separar da
figura materna para estar junto do pai, sugerindo a triangulao edipiana.

Inventrio de Depresso para Crianas

Anlise inter-individual

A Mariana obteve um total de 24 pontos no inventrio, situando-se no Grupo 3 quanto


intensidade de sintomas depressivos que apresenta. Estes resultados, ainda que, superiores
mdia, inserem-se num nvel intermdio, logo, no passveis de classificar como caso
depressivo e caso no depressivo face populao estudantil portuguesa abrangida pelo
teste.

Anlise intra-individual

Intensidade do Item

Perfil de Itens
3
2
1
0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27

Itens

A partir do grfico acima representado observa-se uma maior distribuio de itens na


intensidade mnima (12) e mdia-inferior (8). Na intensidade mdia-superior (5) e alta (2)
sobressaem itens que traduzem dificuldades do sono, alimentao e escolares, excesso de
preocupao, pessimismo, anedonia e baixa auto-estima.
Estes resultados podem ter sido condicionados pelos mecanismos de defesa empregues
durante a prova, sobretudo ao nvel da negao.
309

Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas


Tabela 1 Nmero de itens emitidos e recebidos positivos/negativos (leves/fortes) atribudos
aos membros da famlia.
Emitidos
Emitidos
Recebidos
Recebidos
Total de
Positivos
Negativos
Positivos
Negativos
Envolvimento
Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes
Ningum

29

Mariana

10

Pai

26

Me

20

Irmo

Tia Paterna

17

Tio Paterno

12

Prima

Primo

10

Av
Materno
Av Paterna

12

20

Ainda que a Mariana tenha colaborado ao longo da passagem da prova de forma


concentrada, em alguns momentos revela uma conduta mais agitada. Fez alguns comentrios
s frases da prova como o desabafo quase ningum ao item 43. Esta pessoa da famlia dme ateno, podendo remeter para o facto de se sentir pouco valorizada, para uma carncia
emocional significativa e, ainda, o comentrio a av lava o cabelo ao item 53. Esta pessoa
da famlia gosta de me ajudar quando estou a tomar banho.
A anlise da Tabela 1 permite observar que alm das figuras pertencentes famlia
nuclear: Mariana, pai, me e irmo, a Mariana decidiu incluir seis membros da famlia
alargada: tia paterna, tio paterno (so um casal), prima, primo (irmos e filhos dos tios
paternos), av materno e av paterna. A defesa pela negao dos afectos negativos atravs da
utilizao da figura Ningum sobressai face ao envolvimento com as restantes figuras, o que
remete para um forte bloqueio na expresso da agressividade dirigida aos membros da famlia
e um grau elevado de neuroticismo.

310

30
25
20
15
10
5
0

Figura 1 Nmero total de itens associados a cada membro da famlia.

Observando o total de envolvimento com cada elemento da famlia (Figura 1)


sobressai um forte mecanismo defensivo atravs da colocao dos itens negados/recusados na
figura Ningum. Quanto aos membros da famlia verifica-se um forte envolvimento
emocional com o pai, seguindo-se a me e a av paterna com o mesmo nmero de afectos
atribudos. A figura que se segue a tia paterna. Entre os elementos que obtiveram uma
menor expresso ao nvel do envolvimento total situam-se por ordem decrescente de
importncia: o tio paterno e o av materno (com o mesmo nmero de itens), o primo e a
Mariana (com o mesmo nmero de itens), a prima e, por fim, o irmo.

311

12
10
8
6
Positivos
4

Negativos

2
0

Figura 2 Nmero de itens positivos e negativos emitidos a cada membro da famlia.

Atendendo avaliao dos afectos positivos e negativos emitidos pela Mariana


(Figura 2) sobressai o recurso defensivo idealizao de todos os elementos da famlia, com
excepo da prpria Mariana, colocando no Ningum os afectos positivos fortes, mas
sobretudo os negativos reprimindo, deste modo a agressividade dirigida aos elementos da
famlia. A auto-estima da Mariana encontra-se relativamente ambivalente destacando-se a
atribuio dos afectos negativos demasiado picuinhas, chata e queixa-se demais que
podem remeter para sentimentos de inferioridade e culpabilizao. A par da Mariana, a me e
a tia paterna tambm receberam afectos negativos. No caso da me fica chateada sem ter
razo para isso e no tem muita pacincia reenviam para a percepo de irritabilidade
emocional na me e, no caso da tia paterna fica zangada demais associa-se a uma figura
autoritria/punitiva. No mbito dos afectos positivos de cariz erotizado as figuras da me, tia
paterna e av paterna destacam-se na atribuio dos itens gosto de fazer festinhas a esta
pessoa da famlia e gosto de abraar esta pessoa da famlia que reenviam para uma relao
prxima e carinhosa por parte da Mariana. Contudo, na relao com o pai os afectos
erotizados encontram maior expresso e alm destes dois ltimos itens, o pai obteve ainda
gosto que esta pessoa da famlia me d beijinhos, gostava que esta pessoa da famlia
estivesse sempre ao p de mim e gosto que esta pessoa da famlia me faa ccegas (apenas
atribudos ao pai) o que pode reenviar para a existncia de fantasias edipianas na relao da
Mariana com o pai. Importa, ainda, salientar a recusa/negao na figura Ningum dos itens
s vezes gostava de poder dormir na mesma cama com esta pessoa da famlia, gostava que
312

esta pessoa da famlia gostasse mais de mim do que dos outros e quando me casar gostava
que fosse com uma pessoa parecida com esta pessoa da famlia, reforando a sua autonomia.

12
10
8
6
Positivos
4

Negativos

2
0

Figura 3 Nmero de itens positivos e negativos sentidos como recebidos por cada membro
da famlia.

A avaliao dos afectos positivos e negativos recebidos pela Mariana (Figura 3) revela
uma forte defesa pela negao dos afectos negativos atravs do recurso figura Ningum, o
que permite a idealizao da relao com os elementos da famlia. As figuras que traduzem
um maior envolvimento emocional ao nvel dos afectos recebidos, o pai, a av paterna, a me
e a tia paterna, so tambm aquelas com afectos negativos atribudos e maior expresso nos
afectos positivos de cariz erotizado. Posto isto, quanto aos afectos negativos o pai a figura
que se destaca com os seguintes itens faz-me uma cara zangada, ralha comigo e est
muito ocupada para ter tempo para mim que podem remeter para a percepo de uma figura
punitiva e pouco disponvel para a Mariana, tendo em conta o seu desejo de ateno. Segue-se
a me com dois afectos ralha comigo e fica zangada comigo denotando a percepo de
uma figura punitiva, tal como a tia paterna e a av paterna que obtiveram o item ralha
comigo, semelhana do pai e da me. Nos afectos erotizados o pai a figura que se salienta
atravs dos itens gosta de me dar beijinhos, gosta de me abraar, gosta de me dar
festinhas, gosta de me fazer ccegas e quer estar sempre ao p de mim remetendo para a
percepo de fantasias edipianas na relao com o pai. me, tia e av paterna foram
atribudos os itens gosta de me abraar e gosta de me fazer ccegas reenviando para uma
313

relao composta por momentos de troca de afectos com estas figuras. av paterna a
Mariana associou, ainda, o item gosta de me ajudar quando estou a tomar banho remetendo
para dificuldades no processo de autonomia. Por outro lado, a negao dos afectos erotizados
gosta de estar na cama comigo e gosta mais de mim do que dos outros remete para o
desejo de autonomizao.

15
10
5
Emitidos Positivos

Recebidos Positivos
-5

Emitidos Negativos
Recebidos Negativos

-10
-15

Figura 4 Direco dos afectos emitidos e recebidos positivos/negativos.

Na anlise da direco dos afectos positivos/negativos emitidos e recebidos pelos


membros da famlia (Figura 4) destaca-se uma forte defesa pela negao sobretudo dos
afectos negativos que figuram no personagem Ningum, observando-se um elevado grau de
neuroticismo no funcionamento da Mariana. Observa-se uma relativa correspondncia ao
nvel dos afectos positivos emitidos e recebidos, ainda que sobressaiam os primeiros na
relao com todas as figuras excepo da av paterna com quem a Mariana percepciona um
aumento dos afectos positivos recebidos face aos emitidos e na relao com a figura materna
que obteve um nmero equivalente de afectos. No plano dos afectos negativos a Mariana
sente apenas que os recebe na relao com o pai e com a av paterna, podendo sentir-se
desvalorizada, sobretudo na relao com o pai. Na relao com a me e tia paterna estes
afectos encontram-se em nmero equivalente.

314

Tabela 2 Nmero de itens associados a sentimentos de dependncia (superproteco


materna e superindulgncia paterna/materna).

Ningum
Mariana
Pai
Me
Irmo
Tia Paterna
Tio Paterno
Prima
Primo
Av Materno
Av Paterna

Superproteco
materna
0
8
2
2
2
2
2
2
2
2
2

Superindulgncia
Paterna
Materna
0
0
5
5
1
1
3
1
2
0
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
2
1

Total de
Dependncia
0
18
4
6
4
4
4
4
4
4
5

A Tabela 2 permite a anlise dos itens associados aos sentimentos que traduzem
dependncia. Posto isto, verifica-se uma tendncia bastante regressiva no funcionamento da
Mariana atravs de uma forte auto-valorizao alcanada atravs dos itens de dependncia
que concentra sobre si, revelando uma atitude egocntrica, o desejo de proteco da me e de
ateno por parte de ambos os pais. Desta forma, rivaliza com a me, o irmo e a av paterna
pela ateno do pai. As figuras com as quais se identifica, a me e a av paterna seguem esta
tendncia dependente.

Sntese da Anlise do Teste de Relaes Famliares (TRF)

Na figura Ningum so colocados os afectos negados sobretudo de cariz negativo


reprimindo, deste modo, a agressividade dirigida aos elementos da famlia. Observa-se um
grau considervel de neuroticismo no funcionamento da Mariana. Os afectos erotizados
negados/recusados remetem para o desejo de autonomizao.
A auto-estima da Mariana apresenta-se de forma relativamente ambivalente com
sentimentos de inferioridade e culpabilizao. Contudo, sobressai uma tendncia regressiva
marcada por uma atitude egocntrica e dependente, procurando valorizar-se atravs do forte
desejo de proteco materna e de ateno por parte de ambos os pais (o que pode colocar em
hiptese o sentimento de falta por esta proteco nem sempre ser satisfeita podendo associarse a uma dbil resposta de uma me deprimida).
A relao com o pai a mais significativa do ponto de vista do envolvimento
emocional, apresentando-se de forma idealizada e dominada por fantasias edipianas. No que
315

concerne aos afectos recebidos a relao sentida como menos valorizada por parte do pai,
percepcionando-o como uma figura punitiva e menos disponvel, tendo em conta o desejo de
ateno da Mariana.
Com a me sobressai uma relao forte ao nvel do envolvimento emocional,
idealizada e com trocas de afectos. Contudo, a me sentida como uma figura punitiva, com
irritabilidade emocional e dependente com quem rivaliza pela ateno do pai.
A relao com o irmo idealizada, ainda que se afigure como o envolvimento
emocional menos significativo onde a rivalidade pouco acentuada, com excepo da disputa
pela ateno do pai.
A relao com a tia paterna surge como uma das mais destacadas face ao
envolvimento emocional, sendo percepcionada de forma idealizada e composta por trocas de
afectos ainda que, por vezes, a tia seja sentida como uma figura punitiva.
A relao com o tio paterno idealizada manifestando-se de forma pouco significativa
ao nvel do envolvimento emocional.
Com a prima assiste-se a uma relao idealizada e pouco significativa quanto ao
envolvimento emocional.
Na relao com o primo surge a defesa pela idealizao, ainda que, a relao se
apresente como pouco significativa a nvel emocional.
Com o av materno a relao idealizada, contudo, pouco significativa do ponto de
vista do envolvimento emocional.
A relao com a av paterna alm de idealizada figura como uma das que mais se
destaca do ponto de vista do envolvimento emocional, suportando tambm as dificuldades de
autonomizao da Mariana. Esta figura representa-se de forma punitiva e dependente, com
quem a Mariana rivaliza pela ateno do pai, ainda que, percepcione trocas de afecto na
relao.

As Aventuras de Pata-Negra
1 Etapa Frontispcio

PN:
Porque tem a pata negra, seno tivesse no era Pata Negra. Se tivesse a mancha na barriga
era o barrigo negra. Seno tivesse nada era o porquinho.
Jesus deve-me estar a castigar porque estou sempre a ficar doente
316

Tenho que ver melhor (aproxima carto). Tem cara de homem (compara com outro porco sem
pata negra). 4 Anos.

Dois porquinhos:
Esquerda menina, 3 anos.
Depende da cauda.
Direita um homem, 4 anos.
So irmos do Pata Negra.
Deve ter levado com uma coisa para ser Pata Negra, coitado

Porcos grandes:
Em cima pai, 42 anos.
Em baixo me, 39 anos.

A partir das respostas e comentrios adicionais prova observa-se um forte impacto


fantasmtico da pata negra sobre a Mariana, sentindo este pormenor como uma falha que pode
associar-se culpabilidade experienciada.
Ao PN atribui o sexo masculino, inverso ao seu, podendo remeter para uma tendncia
de maior evitamento dos conflitos, no se identificando tanto com o heri da histria. A idade
inferior sua atribuda ao PN tambm reflecte esta ltima tendncia, tal como, pode reenviar
para imaturidade no seu funcionamento.
Os dois porquinhos associam-se a relaes familiares de tipo fraternas, obtendo idades
aproximadas do PN.
Nos porcos grandes projectada a relao com as figuras parentais, identificando de
forma adequada os papis parentais e sexos. A idade destes porcos corresponde idade dos
seus prprios pais, reforando a identificao relao com as figuras parentais.
2 Etapa Os Temas
Este muito complicado (comenta ao ver o carto Brincadeiras Sujas)

Reaco s questes ligadas expresso agressiva face s figuras parentais, podendo


suscitar na Mariana o sentimento de culpabilidade atravs do retorno da agressividade contra
si. Assim, recusa e evita abordar este conflito.
317

Pequena Escada
Era uma vez uma famlia que tinha trs filhos e um chamava-se Pata Negra. Um dia o
pai e o filho e o PN quiseram ir busca de mas. O pai disse: vamos trepar s rvores.
Mas o PN como esperto disse que no conseguimos trepar, tinha que o pai ficar em baixo e
o PN em cima, depois o PN comeou a escalar, a escalar e viu um ninho de pssaros, um
esquilo e um pica-pau.

Num carto que remete para a funo de holding numa das figuras parentais, o pai a
figura escolhida, abdicando do primeiro objecto, a me. Esta relao com a figura paterna
pode associar-se transgresso na relao com o materno e possibilidade de novas
descobertas, de crescimento mas, tambm, a uma capacidade de apoio pouco slida na me.

Bebedouro
Quando chegou a noite estavam todos a dormir mas o PN tinha vontade de ir casa
de banho e foi pronto, a casa de banho era aqui (aponta no carto). E alevantou o seu irmo.
Depois ele foi dormir mas ficou com fome e ele foi comer e depois ele foi acordar a me e o
pai para porem comer porque ele tinha comido tudo e depois quando os porquinhos
alevantaram-se cheiraram e foram comer. O PN tinha fome e no ficou com nada. Depois o
PN foi dormir.

A Mariana acede ao contedo simblico do carto que reenvia para a agressividade


face s figuras parentais. Contudo, o impacto fantasmtico deste contedo provoca na
Mariana o recurso ao agir, ao fazer, regredindo para as questes orais revelando no
apresentar recursos suficientes para lidar com este conflito. Assim, a vivncia carencial
impe-se porque ele tinha comido tudo () o PN tinha fome e no ficou com nada, tal
como, o evitamento do conflito depois o PN foi dormir como defesa angstia depressiva
instalada e sentimento de culpa pelo retorno da agressividade sobre si.

Sonho Me
Ele sonhou que a me lhe estava a dizer meu menino no te portes mal, deixa comer
para a tua irm, para o teu irmo. Depois o PN acordou assustado porque a voz da me era
assustadora.

318

Num carto que remete para a relao com o imago materno a Mariana projecta uma
vivncia de culpa num contexto carencial. Sobressai, ainda, o sentimento de insegurana e
medo na relao com a figura materna, a um nvel arcaico a voz da me era assustadora.

Sonho Pai
Depois o beb, o PN adormeceu. E depois sonhou com o pai a dizer-lhe cuidado com
a gua, cuidado com a gua e o beb disse mas a gua no faz mal e o pai disse tem
tubares! e o beb acordou a chorar.

Na sequncia do carto anterior a Mariana projecta sentimentos de insegurana e


aspectos fbicos e agressivos num contexto regressivo (beb e gua) que pode remeter
para a relao pr-genital com o materno. No se observam estratgias para lidar com a
angstia experienciada. A figura paterna pode desempenhar a funo de proteco, todavia,
no proporciona a conteno necessria para que a angstia seja ultrapassada.

Hesitao
Quando era de manh foram todos para o relvado. Estavam todos com sede. Como o
pai ocupava quase o stio que eles bebiam gua o PN no podia beber gua e a porquinha
podia beber. E ele (PN) disse grande injustia, ela pode beber e eu no!.

A Mariana acede ao contedo simblico do carto. Sobressai a vivncia de carncia e


o sentimento de excluso e rivalidade na relao com o pai (possivelmente face ao lugar
ocupado junto da figura materna) e irmo.

Ganso
Depois a irm foi correr pelo campo, o irmo foi vigiar a irm porque o pai e a me
pediram. O PN ficou a rebolar na relva. Depois o irmo viu a irm ser mordida por um
ganso o que isto?. Depois o irmo viu a irm a chorar e foi dizer aos pais.
Ganso: menino. As meninas no mordem as meninas.

A temtica da agressividade reconhecida pela Mariana remetendo, contudo, a


narrativa para o contexto da rivalidade fraterna.

319

Partida
O PN chateou-se porque ningum brincava com ele e foi seguir o caminho at uma
casa. Os pais foram procura dele e encontraram. Depois trouxeram pelo mesmo caminho,
mas apanharam umas mazinhas.

Nesta narrativa sobressai o sentimento de excluso e o desejo de proteco e


recompensa na relao com as figuras parentais.

Batalha
Depois o PN zangou-se com o irmo e depois o PN comeou a morder a perna do
irmo e o irmo a morder a orelha do PN e depois a irm foi a correr at aos pais, os pais
estavam a fazer exerccio fsico. E depois eles treinaram, foram a correr ao p-coxinho, mas
a me no conseguia ir ao p-coxinho e o pai foi ao p-coxinho para os meninos pararem a
luta.

A Mariana acede ao conflito simbolizado no carto. Num contexto de rivalidade


fraterna observa-se a necessidade da funo continente (pela espiral agressiva o PN comeou
a morder a perna do irmo e o irmo a morder a orelha do PN) e o sentimento de
desproteco na relao com as figuras parentais, principalmente na relao com a figura
materna vivenciada como incapacitada, doente na sua funo de proteco e apoio.

Noite
Quando chegou a noite o PN, aqui no se v muito bem mas eu estou a dizer, o PN
no conseguiu dormir e fugiu de casa, mas levou uma mochila com comer. Ele foi a correr!

O sentimento de excluso da relao de casal e fantasmas da cena primitiva


desencadeiam na Mariana uma resposta de fuga e evitamento do conflito. Mais uma vez, as
referncias orais encontram-se presentes numa aluso ao vivido carencial.

Buraco
Depois o PN foi a correr to rpido que caiu numa poa de lama, gritou socorro,
socorro, socorro trs vezes, at a lua olhou e deu a luz mais forte.

320

A narrativa reenvia para uma forte angstia depressiva e de separao face ao exterior
fobognico intensificada com o recurso repetio e procura de apoio num objecto
inanimado, a lua.

Ninhada
E ele chegou a casa. Depois viu que a me dele, dele e dela teve mais trs
irmozinhos e os homens estavam a pr gua e feno e eles ficaram tristes porque j tinham
mais irmos e no tinham ateno.

Num contexto de rivalidade fraterna acentua-se a vivncia carencial na relao com o


materno pelo desejo de uma aproximao exclusiva a esta figura.

Como terminam as aventuras?


Felizes. Depois a me explicou-lhe que mais trs irmos podem brincar todos juntos e
ele ficou feliz porque iam comprar mais brinquedos.

A Mariana recorre defesa pela idealizao para evitar deparar-se com a angstia
depressiva. Suprime a falta de ateno, avidez relacional e sentimento de desproteco
materna atravs do deslocamento para a relao fraterna e nos objectos (anulando a rivalidade
fraterna).

Acrescentou:

Carroa
Este o mais difcil. O PN sonhou que tinham posto por engano quatro porquinhos
dentro da carroa onde eles pensaram que eram cabras, est ali uma cabrinha, e o PN
sonhou que tinha um pesadelo e a famlia ficou triste porque pensava que ele tinha-se ido
embora, que eles tinham-no posto por engano.

Assiste-se a um forte sentimento de desvalorizao e excluso da famlia


acompanhado de culpabilizao pelo retorno da agressividade/punio sobre si.

Mamada 2
Depois o PN ficou to contente que quis ficar ao p da me, depois os irmos viramno que foram a correr a rebolar pela relva, depois o PN achou uma graa e rebolou pela
321

relva e tinha cado numa poa de lama. Quando chegou a casa estava todo sujo que teve que
ir tomar um banho.

Na sequncia das solicitaes latentes do carto anterior que reactivaram a angstia de


separao, nesta narrativa procura a aproximao figura materna. A temtica oral com o
materno deslocada para a analidade, ainda que, manifesta pela vivncia de culpabilidade
pelo retorno da agressividade sobre si. A defesa pela formao reactiva impe-se inibindo,
assim, a expresso agressiva. A rivalidade fraterna no abordada.
3 Etapa Preferncias-identificaes

Cartes de que gosta (A)

Pequena Escada
A1) No sei, porque mais engraado. O PN.

Esta resposta, ainda que defensiva pela utilizao da recusa, surgindo como o carto
preferido remete para a importncia de se sentir apoiada e valorizada pelas figuras parentais.

Bebedouro
A2) Porque (ri-se e aponta) est a fazer chichi, engraado. O PN.

Exprime agressividade sobre as figuras parentais.

Noite
A3) Porque est s escuras e engraado e queria ser o PN.
Revela-se sensvel tonalidade escura do carto, podendo associar-se angstia
depressiva contudo, negada engraado.

Buraco
A4) Porque ele caiu numa poa de lama e engraado. O PN.

Defende-se do confronto com a angstia depressiva atravs da sua negao.

322

Mamada 2
A5) Porque este felicidade, porque eles estavam a rebolar. O PN.

Idealiza e nega as dificuldades ao nvel da expresso agressiva manifestas no


sentimento de culpabilizao na relao com o materno e rivalidade fraterna.

Batalha
A6) Porque eles andaram luta, a puxarem. O PN.

Reconhece a temtica da agressividade na relao fraterna.

Partida
A7) Porque ele vai-se embora. O PN.

Nega as dificuldades sentidas ao nvel da angstia de separao.

Hesitao
A8) Porque ele no bebe. O PN.

Defende-se pela negao do sentimento de excluso, desvalorizao e carncia


afectiva.

Sonho Me
A9) Porque ele est a sonhar com a me porque a me est a reclamar. O PN.

Esta resposta a um carto que apela relao com o materno remete para uma figura
punitiva.

Sonho Pai
A10) engraado, o pai est a reclamar. O PN.

Num carto associado relao com a figura paterna surge um pai punitivo, ainda que
se defenda desta vivncia pelo recurso negao engraado.

323

Ganso
A11) Porque ele est a morder. Eu queria ser o ganso.

A Mariana identifica-se com a figura que representa o forte, o agressor, optando por
controlar a situao de forma a no reconhecer a impotncia e a depresso que esta poderia
despoletar.

Beijo
A12) Porque ele est a vigiar eles enquanto eles esto a (imita o gesto de beijar). O
PN.

Ainda que reconhea a dimenso libidinal da cena, no atribui uma identidade aos
personagens, evitando ou no acedendo problemtica edipiana que o carto simboliza.
Tambm o recurso ao agir pode remeter para uma defesa pelo evitamento da verbalizao do
conflito ou para dificuldades de simbolizao.

Ninhada
A13) Porque eles esto amuados porque a me teve trs filhos e eles esto a tratar
deles. O PN.

Manifesta o sentimento de rivalidade fraterna e o desejo de ocupar um lugar


privilegiado na relao com o materno.

Cartes de que no gosta (nA)

Cabra
nA1) Porque ele est a beber leite de cabra e ele no bebe leite de cabra.
Mudava a imagem toda para pr mais alegre. Ningum.

Esta resposta traduz o sentimento de abandono e de perda na relao com o materno e


a angstia depressiva que essa vivncia comporta mudava a imagem toda para pr mais
alegre.

Carroa
nA2) Porque ele est a sonhar com uma coisa m.
324

Pensamento, a famlia ficar feliz. O PN.

Reflecte o sentimento de excluso, culpabilidade e angstia de separao que a


imagem desencadeou em si utilizando estratgias de defesa na linha da negao e idealizao.

Brincadeiras Sujas
nA3) Porque ele est na lama e mandou lama para o pai.
O petrleo, que lama. Queria ser mais limpo. O PN.

Acede ao contedo latente do carto que reenvia para a expresso agressiva face a uma
figura parental optando, neste caso, pelo pai, no renunciando relao dual com o primeiro
objecto, a me. De forma a bloquear a expresso agressiva recorre defesa pela formao
reactiva.

Mamada 1
nA4) No sei, porque est muito vazia, no tem muita histria para contar.
Mais alegre, com mais pessoas e pensamentos. O PN.

A resposta da Mariana reflecte uma falha narcsica acentuada e angstia depressiva na


relao prxima com o materno, expressando a necessidade de preencher este vazio vivido
internamente atravs do recurso a modalidades antidepressivas como a recusa manaca mais
alegre, com mais pessoas e pensamentos e evidncia da precariedade do meio est muito
vazia, no tem muita histria para contar.
4 Etapa Questes Dirigidas

Noite
No.
5 Etapa Questes de Sntese

1) Quem o mais feliz? Porqu?


O PN porque recebe sempre doces (ri-se). Eu s vezes no tenho vontade de comer
doces, mas antes comia.
325

Quem o menos feliz? Porqu?


O pai. Porque o pai mete-se sempre em sarilhos.
(?) Andar luta.

2) Quem o mais simptico? Porqu?


O PN. Porque ele cuida bem sempre dos seus irmos.

Quem o menos simptico? Porqu?


O irmo. Porque ele trata mal os seus irmos.

3) Quem que gostarias de ser?


O PN.

4) O que achas que vai acontecer ao PN?


Vai ser feliz para sempre.

5) O que que o PN pensa da sua pata-negra?


Que vai melhorar, que vai ficar com a pata branca, como o seu corpo.

6) Carto Fada:
Desejo 1: Melhorar a pata.
Desejo 2: Ser feliz, ter uma namorada.
Desejo 3: Ter filhos. E viver feliz para sempre.

Sntese da Anlise da Prova

Preferncias-identificaes

Cartes

Os Temas

Preferncias

Identificaes

Aceite (A)/No

Agradvel

Assumida

Aceite (nA)

(A)/No

(A)/No

Agradvel (nA)

Assumida (nA)

Total

Bebedouro

3A

Beijo

nA

2A

Batalha

3A

326

Carroa

nA

nA

1A

Cabra

nA

nA

nA

3nA

Partida

3A

Hesitao

3A

Ganso

nA

2A

Brincadeiras

nA

nA

1A

Noite

3A

Ninhada

3A

Sonho Me

3A

Sonho Pai

3A

Mamada 1

nA

nA

1A

Mamada 2

nA

2A

Buraco

3A

Pequena

3A

Sujas

Escada

A Mariana colaborou na passagem da prova Pata Negra. Manteve um comportamento


um pouco agitado, tendo-se baixado com frequncia e deitado sobre a cadeira que se
encontrava ao seu lado (contou-me que gostava de brincar s escondidas e que a
procurassem). Ria-se quando se tornava a endireitar. Tambm me indicou que gostaria de se
deitar na cadeira para dormir. Na fase final da prova evidenciou algum cansao (aps narrar
as histrias), ficando mais agitada (levantou-se enquanto falava e comeou a explorar a sala.
Quando lhe solicitei que se sentasse a Mariana acedeu favoravelmente ao meu pedido e no se
voltou a levantar). No entanto, manteve-se concentrada ao longo da prova. Procurou o apoio e
estmulo por parte da observadora ao questionar-me sobre a espcie de alguns personagens e
atravs de alguns comentrios verbais que proferiu. Riu-se com frequncia dos prprios
comentrios relativos s imagens ou histrias narradas. Sempre que tinha os cartes sua
frente pedia-me para os ordenar. Organizou-os segundo as solicitaes da prova (ordenar
pela ordem de preferncia dos que mais gosta, ordenar os que menos gosta) e no final permitilhe organizar segundo a numerao constante no verso de cada carto.
Relativamente anlise da tabela que resume o modo de expresso das temticas
inerentes prova verifica-se uma maior censura dos temas associados oralidade e relao
com o imago materno (Mamada 1 e Cabra) e agressividade (Carroa e Brincadeiras Sujas)
327

podendo remeter para dificuldades na elaborao destes conflitos. Entre os principais


mecanismos defensivos utilizados pela Mariana encontram-se o recurso idealizao, recusa
manaca, negao, evitamento, formao reactiva e recusa.
Verifica-se uma forte angstia depressiva na Mariana marcada pela carncia e falha
narcsica acentuada, sentimento de desvalorizao, excluso e desproteco na relao com as
figuras parentais (sobretudo na relao com a figura materna) acompanhado de culpabilidade
pelo retorno da agressividade/punio sobre si. A agressividade face s figuras parentais
frequentemente reprimida e dirigida prpria Mariana, contribuindo para a vivncia de culpa.
Quanto ao conflito edipiano a Mariana parece encontrar-se, ainda, ao nvel da relao dual,
rivalizando com o pai e demonstrando dificuldades de separao na relao com o materno
no renunciando, assim, relao com o primeiro objecto, a me. A diferenciao de geraes
e sexos parece assegurada.
Na relao com a figura materna sobressai uma vivncia de culpa, carncia, abandono,
insegurana, aspectos fbicos e agressivos num contexto regressivo que pode remeter para a
relao pr-genital com o materno. Esta vivncia associa-se a uma falha narcsica acentuada e
angstia depressiva. Aparentemente a Mariana no implementa estratgias suficientes para
lidar com a angstia experienciada.
A figura paterna, ainda que punitiva, percepcionada como aquela que assegura a
funo de apoio e proteco, todavia, no proporciona a conteno necessria para que as
angstias da Mariana sejam ultrapassadas.
Na relao com os irmos revela uma forte rivalidade fraterna intensificada pela
vivncia carencial na relao com o materno e pelo desejo de uma aproximao exclusiva a
esta figura.

328

Anexo Q: Estudo de Caso 5 Gabriel (10 anos e 4 meses)

O Gabriel um menino de dez anos e quatro meses que frequenta o 4 Ano do 1 Ciclo
do Ensino Bsico. Apresenta um desenvolvimento estato-ponderal adaptado ao seu grupo
etrio. Trata-se de uma criana bonita e harmnica, apresentando-se fisicamente cuidado,
investido e limpo. Geralmente traz um bon na cabea, que retira quando se senta junto
secretria. Estabelece um contacto inibido com a observadora, ainda que no decorrer das
sesses revele sentir-se mais vontade, conversando com espontaneidade. Mantm um
comportamento estvel e controlado, no evidenciando sinais de ansiedade ou dificuldades de
concentrao/ateno. No final da segunda sesso queixa-se e mostra-me uma ferida no p, o
que pode remeter para a necessidade de ser cuidado.
Atravs da consulta hospitalar de pneumologia peditrica (tem asma e rinite) foi
encaminhado para a Unidade de Pedopsiquiatria por dificuldades alimentares com anorexia
selectiva. Iniciou as consultas teraputicas de frequncia quinzenal com a psicloga da
Unidade h cerca de dois meses, beneficiando tambm de interveno familiar.
O Gabriel vive com os pais e com o meio-irmo (da parte da me) de dezoito anos. O
pai carpinteiro e a me assistente administrativa. Ambos os pais so ex-toxicodependentes
tendo-se conhecido num programa de desintoxicao que frequentaram. A me deixou de
consumir pelo meio-irmo do Gabriel quando este tinha cinco anos (at ento esta criana
esteve maioritariamente ao cuidado da av materna) e cortou a ligao que mantinha com o
ex-companheiro e pai do meio-irmo do Gabriel, tambm na altura toxicodependente
(continua a consumir at actualidade), conhecendo o actual companheiro. At ao momento o
Gabriel desconhece o passado toxicodependente dos pais. Segundo a psicloga, o meio-irmo
do Gabriel muito problemtico (isola-se passando muito tempo no quarto ou com a
namorada, toca guitarra elctrica) e a me culpabiliza-se por este comportamento devido ao
seu afastamento e consumos de droga durante a infncia do filho. Desta forma, desenvolveu
uma forte ligao com o Gabriel na tentativa de compensar e reparar a relao com o filho
mais velho. A psicloga acrescenta, ainda, que o Gabriel mantm uma relao de forte
rivalidade com o meio-irmo. Segundo a me o Gabriel faz birras quando contrariado,
respondendo mal, muito nervoso. A me tem Hepatite C e, segundo a prpria, teve
anorexia nervosa por volta dos vinte anos.
A me do Gabriel uma mulher que apresenta um aspecto fsico jovial face sua
idade, tratando-se de uma pessoa aparentemente descontrada e simptica. harmnica e
bonita, encontrando-se cuidada e com vesturio adequado. Estabelece um contacto adequado
com a observadora, predispondo-se, desde o incio, a participar na investigao com
329

empenho, interesse e aparente satisfao. Verbaliza de forma fluente e espontnea, indiciando


sentir-se adaptada situao de observao/avaliao. Manteve contacto ocular, apresentando
uma postura muito rica e expressiva.
No que concerne ao pai do Gabriel, apresenta um aspecto fsico cuidado e adaptado
idade. Estabelece um contacto adequado com a observadora, verbalizando de modo
espontneo e fluente, transmitindo simpatia, empenho e interesse em participar no estudo.
Apresenta uma postura rica e expressiva, mantendo contacto ocular.
Em beb o Gabriel no foi amamentado, no registando problemas alimentares at
data em que iniciou a diversificao alimentar. Nessa altura recusava tudo o que no fosse
esmagado s comia o que fosse passado pela varinha mgica, conta a me. Tambm no
comia carne, peixe ou ovos, apenas aceitava sopa passada, papa, iogurtes Danoninho e fruta
s dos boies. Segundo a me os mdicos sempre desvalorizaram esta caracterstica do
Gabriel, mas ele nunca queria provar nada e acrescenta que o Gabriel registou sempre uma
boa evoluo ponderal porque compensou com a sopa. Desenvolveu hipoglicmias e teve
gastroenterites. Aos quatro anos deixou o bibero e at aos cinco anos andava com trs
chupetas em cada mo foi muito difcil de o convencer a desistir delas, refere a me. Pelos
cinco/seis anos comeou a aceitar batatas de pacote e carne, mas nunca comeu arroz e
esparguete. Para a me sempre que insistimos um circo em casa ele chora, berra, grita, nem
sequer prova e o Gabriel acrescenta de imediato no provo porque sei que no bom.
No come na escola porque diz que no gosta da comida. Quando vai a festas de
aniversrio leva o prprio lanche e nas situaes em que janta em casa de amigos fazem-lhe
uma comida especial. Recusa-se a ir para qualquer lado onde saiba que tem que comer fora de
casa ou comida diferente (e.g., no vai ao campo de frias) na escola gozam comigo, sou o
menino da sopa passada, refere o Gabriel.
Actualmente a ementa diria habitual do Gabriel a seguinte: ao pequeno-almoo
come papa (bebe com uma palhinha). Ao meio da manh come bolachas Maria ou Tosta Rica
ou po com fiambre de peru, bebe leite de morango. Deixou de comer iogurtes porque diz que
o sabor do Danoninho diferente. Ao almoo ou jantar pode comer salsichas, bife de peru,
peito de frango, carne de vaca e de porco, determinados tipos de peixe cozido/grelhado, ovo
mexido, come sempre sopa, batatas fritas e po. No come fruta. Bebe Ice Tea de limo ou
manga, sumo de manga e Coca-Cola. No que se refere a doces, o Gabriel no come
chocolates, bolos e gelados. Gosta de chupa-chupas de coca-cola e de gomas, mas algumas
coloca-as apenas na boca sem as engolir.
A gravidez do Gabriel foi planeada e o parto eutcico, a termo, sem registo de
complicaes peri ou neonatais. Aps o nascimento do Gabriel a me sentiu-se bem mas por
330

volta dos dois meses senti um aumento de stress e preocupao devido s faltas de ar do
Gabriel. Durante a primeira infncia a me teve o apoio da av paterna do Gabriel,
recordando o filho como um beb bem-disposto, muito dorminhoco.
Segundo a me, o Gabriel sempre dormiu bem, apesar de at cerca dos sete anos de
idade adormecer na cama dos pais e s depois ia para a prpria cama. Neste momento no se
registam problemas a este nvel.
O desenvolvimento psico-motor e o controlo esfincteriano desencadearam-se dentro
dos parmetros normais. Porm, ao nvel lingustico assinala-se a substituio da consoante
b por p, at actualidade.
O Gabriel ficou ao cuidado da av paterna at aos cinco anos, idade a partir da qual
ingressa no infantrio com boa adaptao at ao momento em que recusa alimentar-se na
escola (almoa todos os dias em casa desta av). Aos seis anos inicia a escola foi um caos,
dava-se mal com os colegas, roubavam-lhe o lanche. Sempre foi muito irrequieto, tem que
ficar sentado ao p da professora. muito reguila, mas muito bom aluno indica a me,
acrescentando tambm que o Gabriel apesar de no bater nos colegas, provoca-os, acabando
por chegar todo negro a casa. Ele quer tudo maneira dele. Tem dificuldades a portugus
porque escreve com muitos erros ortogrficos. A me envolve-se muito no processo educativo
do Gabriel, insistindo e acompanhando-o no estudo eu estudo sempre com a minha me,
digo que estou cansado mas acabo por estudar. Eu no consigo estudar sozinho, estudo mal,
estou entretido com outras coisas. Ela acha que melhor eu estudar com ela para no ter ms
notas, refere o Gabriel.

331

Guio de Entrevista dos Pais

Identificao da Criana

Nome: Gabriel

Gnero: Masculino

Idade: 10 Anos e 4 Meses

Data de Nascimento: 2002

Naturalidade: Pennsula de Setbal

Nacionalidade: Portuguesa

Ano de escolaridade: 4 Ano

Reprovou algum ano? No

Se sim, qual (quais)? __________

Muito inteligente, mas preguioso, mais erros a portugus. Pai: acho que tem dfice
de ateno. Me desvaloriza mais este aspecto e compara com o filho mais velho, irmo do
Gabriel.

Caracterizao Scio-Demogrfica da Famlia

Quem so os elementos que compem o agregado familiar (elementos que vivem na mesma
casa)?
(Constituio do genograma familiar)
1979
70

46

65

64

40

32

39

39

13

10

18

332

Me
Idade: 39 Anos

Data de Nascimento: 1971

Naturalidade: Grande Lisboa

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: Casada

Habilitaes Literrias: 12 Ano

Profisso: Assistente Administrativa

Situao Profissional: Empregada

Quais so os seus principais papis na famlia?


Todos. Mdico, reunies da escola, ajuda nos trabalhos de casa do filho Gabriel,
dividem tarefas da casa. Burocracia com a me.

Quais so os seus principais gostos e interesses pessoais?


Ginstica, fazer desporto, praia (faz ginsio). Ler, ouvir msica.

Pai
Idade: 39 Anos

Data de Nascimento: 1972

Naturalidade: Pennsula de Setbal

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: Casado

Habilitaes Literrias: 8 Ano

Profisso: Carpinteiro

Situao Profissional: Empregado

Quais so os seus principais papis na famlia?


Tarefas domsticas divididas com a me, tento ajudar o Gabriel com as coisas da
escola. Gostava de ter mais tempo e pacincia, mas s vezes no tenho. O Gabriel est mais
com a me (tem um horrio mais flexvel). Esta sempre com os pais o Gabriel.

Quais so os seus principais gostos e interesses pessoais?


Fao desporto, ando de bicicleta, praia, ginsio. Fiz yoga, mas neste momento no
fao.

Irmo()
Gnero: Masculino
Idade: 18 Anos

Data de Nascimento: 1993

Naturalidade: Pennsula de Setbal

Nacionalidade: Portuguesa

Estado Civil: Solteiro

Habilitaes Literrias: 9 Ano

Ao cuidado de/Creche/Infantrio/Escola (ano frequentado): 12 Ano


Profisso: ____________________________
333

Situao Profissional: _______________

Relaes Familiares

Qual a situao familiar actual (apoios sociais e/ou familiares, existncia de doenas fsicas
e/ou psicolgicas, problemas sociais, econmicos, exposio a fontes de stress, entre outros)?
Podamos ter mais dinheiro. Vivemos como a maioria das pessoas, no falta nada,
sem extravagncias. O ano passado, durante dois anos o pai esteve desempregado aps doze
anos de estar na mesma empresa, depois esteve em stios no certos e agora tem que faltar ao
trabalho por causa de problemas no ouvido esquerdo com os cristais do ouvido (anda h um
ano e tal assim). Dificultando o dinheiro em casa. Stressava com isto e a mulher tambm
sentia isso, afectando todos. A mulher sente que tem de dar muita fora ao marido e sobra
pouco para ela. Problemas do pai no trabalho com o patro, uma pessoa difcil o patro.

Algum membro da famlia necessita de se ausentar ou ausentou-se no passado


temporariamente ou com frequncia, por motivos de trabalho, estudo, ou outros? Quando?
Durante quanto tempo? Como que a criana reagiu a essa(s) separao(es)? E os restantes
membros da famlia?
O pai ponderou ir para Angola, tratou de tudo, mas na altura no o deixaram ir.

Algum membro da famlia faleceu, separou-se ou divorciou-se desde a gravidez da criana?


Quem? Qual o possvel impacto na famlia?
A tia da parte da me separou-se. Acho que no influenciou o Gabriel, mas os avs
maternos ficaram muito afectados. Havia ameaas do ex-marido da tia e ela saiu da casa
dele e foi viver com os avs maternos do Gabriel.
A bisav materna faleceu, teve um AVC e foi complicado porque quiseram met-la em
casa, depois foi para um lar. O Gabriel no gostava de lhe dar beijinhos, tinha na altura
quatro anos, mais ou menos.

Como a relao da criana com a me?


A me entende-se melhor com o Gabriel do que com o outro filho, entende-se bem.
Sempre acompanhou-o muito em certas coisas no cortou o cordo umbilical, diz. Impese em certas coisas. mais tolerante com o filho, para no complicar.

334

Como a relao da criana com o pai?


boa. So teimosos. Tenta acompanh-lo. Gostava de ter mais tempo para estar com
ele mas a vida no permite. menos tolerante que a mulher, d demasiada importncia a
certas coisas, no tem tanta pacincia.

Como a relao da criana com os irmos (com cada um)?


Complicada, porque o irmo chato, pela diferena de idades. No tolerante com o
Gabriel. Chateia o Gabriel e o Gabriel fica sentido com ele e o Gabriel quer tudo maneira
dele e ficam chateados.

E com os restantes membros da famlia?


A av paterna uma segunda me, foi a pessoa que esteve mais prxima dele com
excepo da me. Ele acha seca estar em casa da av paterna. Com os avs maternos gosta
de estar com eles na quantidade certa porque no lhe fazem todas as vontades. D-se bem
com o tio paterno do meio, vai busc-lo escola. Com o tio paterno mais velho no tem
muito contacto porque vive longe. Com a tia materna, quando esto juntos no nada de
especial.

Gostaria que me descrevessem a vossa relao (relao do casal parental).


Me: j foi muito complicada, em quase tudo m. Choque de personalidades, parece
que cada um rema para um lado. A me tem uma personalidade vincada, senhora do seu
nariz, me e av materna matriarca. Ele manda l em casa, mas quem manda mais sou eu.
Pai: ao incio foi difcil adaptarem os feitios. Muitas vezes meteram em causa o
casamento. Agora, passados treze anos sentem que as coisas esto melhores.
A me acha que as expectativas iniciais no se enquadraram com o marido.
Aprenderam a aceitar-se um ao outro. De volta e meia tm uma crise, mas no como de
antes.

Como a relao da me com a sua famlia de origem?


Tem coisas boas e ms. So uma famlia unida. A do marido mais afastada. Na
famlia da me acha que se metem demais na vida uns dos outros. H muitos choques de
personalidade, ela e irm so opostas e com a av materna o mesmo, a av matriarca e
chocam. Vem-se todos os dias ou telefonam-se. Com o av materno do Gabriel
presente/ausente, a av assume mais controlo.
335

E como a relao do pai com a sua famlia de origem?


No se do mal, mas no tm muito contacto. Vivem perto. Sente que no h muita
ligao. No h afinidade, se precisarem esto l, mas sem muito contacto. Sempre houve
muita competio uns com os outros. A av paterna do Gabriel ficou com os filhos nova, sem
o marido, o pai tinha sete anos quando faleceu o prprio pai. No h abertura para certo
tipo de conversas. Sente que a av paterna no lhe d muita ateno, mesmo quando est
doente, mas fala das coisas dele. A av com o neto diferente, mais afectiva.

Sintomas da Criana e Impacto Familiar

Quais so as principais preocupaes actuais sentidas face criana (Comportamento


alimentar, sono, linguagem, controlo esfincteriano, atitude face a outras crianas e adultos,
medos, entre outros)?
No come como deve ser, desde sempre e no prova antes. No quer ir a certos stios
com receio de no comer e ser criticado pelos outros passava dias inteiros sem comer. Na
primeira classe a integrao foi difcil, era difcil com os colegas no gosta muito da
escola, no quer ir para a faculdade. Nos trs primeiros anos tinha saudades da professora
e no dos colegas, sentava-se ao lado da professora. Dormiu muito tempo com os pais, para
adormecer tinha que ser na cama dos pais. Aos sete/oito anos de idade passou a adormecer e
ficar na cama dele. Todas as noites o Gabriel pede ao pai quando sair da cama para o
colocar na cama com a me. Demorou muito tempo a largar a chucha, foi mais ou menos aos
cinco anos. De manh bebia o leite no bibero com uma palhinha. Pai: o Gabriel neste
momento no quer fazer nada, j teve na natao, karat. Tem jeito para danar. Tinha
problemas respiratrios. s vezes brinca com amigos em casa.

Qual o impacto sentido na famlia?


Em certas coisas acabaram por dar mais ateno ao Gabriel, a me acha que ele
queria-se manter beb. A falta de ar um problema. A me sente que talvez o tenha impedido
de crescer, no se sentia preparada para estes problemas do filho. No tinha ajuda de
ningum, no sabia como ajudar mais o filho. Com a comida tambm se sentia em
dificuldades para lidar com ele, estava sozinha e os mdicos desvalorizavam a situao.

336

Teste de Relaes Familiares, Verso Casais - Me


Tabela 1 Nmero de itens emitidos e recebidos positivos/negativos (leves/fortes) atribudos
aos membros da famlia.
Emitidos
Emitidos
Recebidos
Recebidos
Total de
Positivos
Negativos
Positivos
Negativos
Envolvimento
Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes
Ningum

18

Me

Pai

16

Irmo

16

Gabriel

14

Av
Materna
Av
Materno
Tia Materna

18

15

11

A me do Gabriel colaborou ao longo da realizao da prova com aparente


investimento e entusiasmo. Verbalizou de forma fluente e espontnea, confessando, no incio
da prova que uma pessoa muito especial era a bisav do Gabriel, a minha av, mas j
faleceu. Manteve contacto ocular com a observadora, no indicando sentir-se ansiosa face
situao de observao e avaliao.
A observao da Tabela 1 permite verificar que a me decidiu incluir na prova alm
dos elementos que compem a famlia nuclear: me, pai, irmo e Gabriel, trs elementos
pertencentes famlia alargada materna: a av, o av e a tia. A utilizao da figura Ningum
para a colocao dos afectos negados foi mais significativa nos itens negativos recebidos
inibindo, desse modo, a expresso da agressividade dirigida aos membros da famlia.

337

18
16
14
12
10
8
6
4
2
0
Ningum

Me

Pai

Irmo

Gabriel

Av
Av
Tia
Materna Materno Materna

Figura 1 Nmero total de itens associados a cada membro da famlia.

Atendendo ao envolvimento total com cada membro da famlia (Figura 1) verifica-se


que a av materna destaca-se face aos restantes elementos da famlia. Seguem-se o pai e o
irmo com o mesmo nmero de afectos, o av materno, o Gabriel, a tia materna e, por ltimo,
a me. O recurso figura Ningum para a atribuio das defesas face aos elementos da
famlia foi significativo.

9
8
7
6
5
4

Positivos

Negativos

2
1
0

Figura 2 Nmero de itens positivos e negativos emitidos a cada membro da famlia.


338

A anlise do afectos positivos e negativos emitidos pela me do Gabriel (Figura 2)


permite apurar um forte envolvimento emocional com o Gabriel e a av materna marcado
pela idealizao destas relaes, sendo as figuras que obtiveram mais afectos positivos de tipo
erotizado, seguindo-se o irmo. Neste sentido, destacam-se os itens gosto de estar sozinho(a)
com esta pessoa da famlia (tambm atribudo ao irmo) e sinto-me muito prximo(a) desta
pessoa da famlia que podem remeter para uma relao de forte dependncia emocional com
o Gabriel e a av materna, sobretudo no caso da ltima figura, a quem foi atribudo, ainda, o
item gostava que esta pessoa da famlia estivesse sempre ao p de mim. A relao com o
irmo, o av materno e a tia materna apresenta-se de forma ambivalente. Assim, ao irmo a
me percepciona a emisso dos seguintes afectos negativos: demasiado picuinhas,
desmancha-prazeres e irrita-se muito depressa e, na tia materna queixa-se demais e fica
chateada sem ter razo para isso que podem remeter para a percepo de irritabilidade
emocional e dificuldade na gesto das dificuldades por parte destas figuras. Com o av
materno observaram-se os seguintes: d-me a volta ao juzo e consegue fazer-me sentir
muito irritado(a), que aliado atribuio do item apetece-me matar esta pessoa da famlia
a estes trs elementos da famlia e ao pai, neste ltimo caso juntamente com o afecto
agressivo apetece-me bater nesta pessoa da famlia reenvia para conflitos na relao com
estas quatro figuras dominados por dificuldades na sua gesto por parte da me e no controlo
dos impulsos agressivos. A auto-estima da me encontra-se baixa, recolhendo o maior nmero
de afectos negativos chata, irrita-se muito depressa, tem mau feitio, resmunga
demasiado, no tem muita pacincia e fica zangada demais ligados a sentimentos de
inferioridade, culpabilizao e irritabilidade emocional. No Ningum figuram os afectos
agressivos rejeitados, mas sobretudo, os afectos positivos de ternura como muito
simptica, muito alegre, muito prestvel, nunca me desaponta e muito
divertida podendo associar-se sobreposio de sentimentos negativos e de insegurana
relativos sua famlia.

339

9
8
7
6
5
4

Positivos

Negativos

2
1
0

Figura 3 Nmero de itens positivos e negativos sentidos como recebidos por cada membro
da famlia.
Avaliando os afectos positivos e negativos recebidos pela me do Gabriel (Figura 3)
destaca-se uma forte negao dos afectos negativos dirigidos aos elementos da famlia atravs
da utilizao da figura Ningum reprimindo, assim, a expresso de agressividade nos
elementos da famlia o que, por sua vez, permite idealizar as relaes com a av materna, o
Gabriel e o pai, tratando-se das nicas figuras a obter afectos positivos erotizados. Deste
modo, os afectos gosta de me beijar e quer mesmo o meu amor surgem associados ao pai,
os afectos gosta de me abraar e quer estar sempre ao p de mim ligam-se apenas ao
Gabriel, podendo traduzir o desejo de proteco e de conservar a dependncia do Gabriel face
me, o item ama-me muito foi atribudo av materna podendo remeter para a percepo
de uma relao dependente da av com a me. Os itens gosta de estar sozinha comigo e
muito carinhosa comigo associam-se a estas trs figuras e traduzem uma forte ligao
afectiva com a me. Ao pai foram, ainda, atribudos dois afectos negativos de rejeio nem
sempre faz o que eu gostaria que fizesse e nem sempre me ajuda quando preciso
reenviando para conflitos e insegurana na relao de casal. Na relao com o irmo, a tia
materna e o av materno (relao ambivalente) os afectos negativos sobressaem face aos
afectos positivos, antevendo, conflitos na relao com estas figuras. Posto isto, foram
atribudos os itens resmunga comigo e fica zangada comigo a estas trs figuras podendo
senti-las como punitivas, o item nem sempre me ajuda quando preciso ao irmo e ao av
340

materno associando-se vivncia de insegurana na relao com estas figuras e nem sempre
faz o que eu gostaria que fizesse ao av materno e tia materna. A atribuio dos itens
gosta de gozar comigo, faz-me sentir frustrado(a) e malcriada para mim ao irmo
refora a ideia de insegurana na relao com este elemento da famlia.

10
8
6
4
2

Emitidos Positivos

Recebidos Positivos

-2

Emitidos Negativos

-4

Recebidos Negativos

-6
-8

Figura 4 Direco dos afectos emitidos e recebidos positivos/negativos.

A avaliao da direco dos afectos positivos/negativos emitidos e recebidos (Figura


4) permite destacar a percepo de uma relao satisfatria e correspondida com o Gabriel e a
av materna, ainda que, idealizada. A relao com o pai sentida como mais investida por
parte deste face ao nmero superior de afectos positivos recebidos perante os emitidos e
equivalente nos afectos negativos emitidos/recebidos. Por outro lado, a relao com o irmo,
av materno e tia materna sentida como desvalorizada por estas figuras, emitindo a me
mais afectos positivos face aos recebidos e recebendo mais afectos negativos face aos
emitidos, destacando-se a relao com o irmo onde esta diferena se acentua. A auto-estima
da me encontra-se baixa, com um valor superior de afectos negativos comparativamente com
os positivos. No Ningum figuram sobretudo os afectos negativos recebidos por parte dos
elementos da famlia.

341

Tabela 2 Nmero de itens associados a sentimentos de proteco e atribuio de


incompetncia ou fraqueza.
Sentimentos
de Proteco
Ningum
Me
Pai
Irmo
Gabriel
Av Materna
Av Materno
Tia Materna

0
0
0
1
2
2
0
1

Atribuio de
Incompetncia ou
Fraqueza
0
0
0
2
0
0
1
3

Na anlise da Tabela 2 onde figuram os sentimentos de proteco e de atribuio de


incompetncia/fraqueza face aos elementos da famlia observa-se a percepo do Gabriel e da
av materna como as figuras mais dependentes e que carecem de maior proteco, seguindose o irmo e a tia materna, no caso desta ltima a atribuio do item possa sofrer um
esgotamento nervoso aliado aos sentimentos de incompetncia no tem uma personalidade
suficientemente forte, no consegue lidar suficientemente bem com dificuldades e no
consegue enfrentar suficientemente bem as outras pessoas traduzem a percepo de uma
figura frgil do ponto de vista emocional, com dificuldades na adaptao social e nos conflitos
podendo remeter tambm para a presena de rivalidade fraterna na me. Segue-se o irmo
com no consegue lidar suficientemente bem com dificuldades e deveria ajudar mais em
casa e o av materno com esta pessoa deveria desempenhar um papel mais importante na
vida da famlia na atribuio de incompetncia/fraqueza podendo remeter para a percepo
de insegurana nestas relaes e a me sentir-se pouco apoiada por estas figuras, vendo o
irmo como um elemento com dificuldades na gesto dos conflitos.

Sntese da Anlise do Teste de Relaes Famliares (TRF)

A figura Ningum utilizada sobretudo para a colocao dos afectos negativos


recebidos negando e inibindo, assim, a expresso agressiva sobre os elementos da famlia.
Contudo, verifica-se, ainda, a atribuio substancial de afectos positivos nesta figura
revelando uma percepo negativa e insegura sobre a famlia.
A auto-estima da me apresenta-se baixa e dominada por sentimentos de inferioridade,
culpabilizao e irritabilidade emocional.
342

Na relao com o pai surge a percepo de um maior investimento afectivo na relao


por parte desta figura, ainda que se observem conflitos e insegurana na relao de casal em
parte, motivados por dificuldades na gesto dos conflitos e no controlo dos impulsos
agressivos por parte da me.
Com o irmo a relao sentida como fortemente desvalorizada por parte desta figura
e insegura atravs da percepo de falta de apoio e uma atitude punitiva e agressiva por parte
do irmo, sendo marcada por conflitos acentuados associados a uma dificuldade na sua gesto
por ambas as partes, com irritabilidade emocional no irmo e dificuldade no controlo dos
impulsos agressivos por parte da me.
A relao com o Gabriel representada de forma satisfatria e correspondida, ainda
que idealizada. Observa-se a percepo de uma forte dependncia emocional entre me e filho
e o desejo de lhe proporcionar proteco.
A relao com a av materna marcada por um forte envolvimento emocional
positivo correspondido onde o sentimento de dependncia mtua, idealizao da relao e
desejo de proteco desta figura sobressaem.
Com o av materno a relao surge de forma desvalorizada por parte desta figura,
sendo marcada por conflitos associados a sentimentos de insegurana, falta de apoio e
punio dirigidos me, ainda assim, so percepcionadas dificuldades na gesto destes
conflitos e no controlo dos impulsos agressivos por parte da me.
Por fim, a relao com a tia materna percepcionada como desvalorizada por parte
desta figura. Observam-se conflitos relativos dificuldade na sua gesto por ambas as partes
manifesta atravs de irritabilidade emocional, dificuldades de adaptao social e uma atitude
punitiva na tia paterna, assim como, dificuldade no controlo dos impulsos agressivos na me.
Perante este cenrio, poder-se- colocar em hiptese a presena de rivalidade fraterna na me.

Teste de Relaes Familiares, Verso Casais - Pai


Tabela 1 Nmero de itens emitidos e recebidos positivos/negativos (leves/fortes) atribudos
aos membros da famlia.
Emitidos
Emitidos
Recebidos
Recebidos
Total de
Positivos
Negativos
Positivos
Negativos
Envolvimento
Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes
Ningum

15

Pai

11

343

Me

22

Gabriel

Irmo

Av Paterna

Tio Paterno
40 Anos
Tio Paterno
46 Anos

O pai do Gabriel colaborou ao longo da realizao da prova TRF interagindo com a


investigadora e realizando alguns comentrios verbais adicionais, mantendo uma conduta
adequada e expressiva.
A Tabela 1 permite observar que o pai do Gabriel optou por incluir na prova alm dos
elementos da famlia nuclear: pai, me, Gabriel e irmo (no filho do pai do Gabriel), trs
elementos pertencentes famlia paterna: av, tio de 40 anos e o tio de 46 anos. O recurso
figura Ningum para a colocao dos afectos negados foi mais significativo nos afectos de
cariz negativo recebidos permitindo bloquear a expresso de agressividade dirigida aos
elementos da famlia.

25

20

15

10

0
Ningum

Pai

Me

Gabriel

Irmo

Av
Paterna

Tio
Paterno
40 Anos

Tio
Paterno
46 Anos

Figura 1 Nmero total de itens associados a cada membro da famlia.

344

Analisando o total de envolvimento do pai do Gabriel com cada elemento da famlia


(Figura 1) verifica-se um forte envolvimento emocional com a me, seguindo-se o prprio
pai, o Gabriel, o irmo, a av e o tio paterno de 40 anos com um nmero de afectos reduzido,
ainda que, equivalente e, por ltimo, o tio paterno de 46 anos sem qualquer tipo de item
atribudo. A utilizao do Ningum para a colocao das defesas foi significativa.

8
7
6
5
4
3

Positivos

Negativos

1
0

Figura 2 Nmero de itens positivos e negativos emitidos a cada membro da famlia.


Atendendo aos afectos positivos e negativos emitidos pelo pai do Gabriel (Figura 2)
observa-se um forte envolvimento emocional com a me ainda que esta relao se apresente
de forma relativamente ambivalente, o que permite antever conflitos na relao de casal.
Posto isto, a me destaca-se como a figura que obteve o maior nmero de afectos erotizados
como gosto que esta pessoa da famlia me beije, gostava que esta pessoa da famlia
estivesse sempre ao p de mim e sinto-me muito prximo(a) desta pessoa da famlia que
remetem para uma relao prxima e carinhosa com a me. Todavia, no plano negativo
obteve os afectos chata, fica chateada sem ter razo para isso, resmunga demasiado e
consegue fazer-me sentir muito irritado(a) que se associam percepo de dificuldades na
gesto dos conflitos na relao e irritabilidade emocional em ambas as figuras. A relao com
o irmo e com o tio paterno de 40 anos surge tambm de forma ambivalente, embora no caso
do primeiro sobressaiam os afectos positivos como estou muito orgulhoso(a) desta pessoa da
famlia face aos negativos no tem muita pacincia. No caso do tio paterno de 40 anos
345

observa-se o afecto agressivo apetece-me bater nesta pessoa da famlia podendo remeter
para a rivalidade fraterna. A relao com o filho Gabriel marcada apenas por afectos
positivos como estou disposto(a) a fazer tudo por esta pessoa da famlia. Na relao com a
av paterna surge apenas um afecto negativo desmancha-prazeres remetendo para
conflitos na relao com esta figura. A auto-estima do pai apresenta-se baixa pela
superioridade dos afectos negativos face aos positivos. Assim, nos afectos negativos
encontram-se: demasiado picuinhas, irrita-se muito depressa, tem mau feitio, queixase demais, fica zangada demais e d-me a volta ao juzo que traduzem sentimentos de
inferioridade, culpabilizao e irritabilidade emocional. Entre os afectos positivos destaca-se
o afecto forte gosto de estar sozinho(a) com esta pessoa da famlia que remete para o desejo
de autonomizao. No Ningum figuram sobretudo as defesas na linha da negao dos afectos
agressivos inibindo, deste modo, a projeco da agressividade dirigida aos elementos da
famlia.

9
8
7
6
5
4
3

Positivos

Negativos

1
0

Figura 3 Nmero de itens positivos e negativos sentidos como recebidos por cada membro
da famlia.

Avaliando os afectos positivos e negativos recebidos pelo pai do Gabriel (Figura 3)


destaca-se um forte movimento defensivo no sentido da negao dos afectos negativos atravs
da utilizao da figura Ningum, o que permite bloquear a expresso da agressividade sobre
os elementos da famlia, assim como, idealizar a relao com o Gabriel. Deste modo, o
346

Gabriel sobressai como a figura que obteve um maior nmero de afectos positivos erotizados
gosta de me beijar, gosta de me abraar, quer mesmo o meu amor, ama-me muito,
quer estar sempre ao p de mim remetendo para a percepo de uma relao prxima e
possivelmente constituindo-se como o modelo de identificao sexual masculino para o filho.
A relao com a me surge de forma ambivalente, ainda que os afectos positivos como gosta
de estar sozinha comigo e muito carinhosa comigo sobressaiam face aos negativos fica
ressentida comigo, gosta de gozar comigo, resmunga comigo e fica zangada comigo
reenviando, todavia, para a percepo de uma figura punitiva. A relao com o irmo e o tio
paterno de 40 anos surgem de forma positiva, com os itens aprecia-me muito e aprecia a
minha companhia associados ao irmo e gosta mais de mim do que dos outros atribudo ao
tio paterno, sentindo a sua relao com estas figuras muito valorizada por parte destes
elementos da famlia. Para o irmo pode representar, ainda, um modelo de identificao
sexual masculino significativo. Por outro lado, a relao com a av paterna surge dominada
pelos afectos negativos nem sempre me ajuda quando preciso e faz-me sentir sem valor
remetendo para uma relao insegura e desvalorizada por parte desta figura. Assim, a autoestima do pai apresenta-se mais uma vez baixa e dominada por sentimentos de culpabilizao
atravs do item negativo nem sempre faz o que eu gostaria que fizesse.

8
6
4
2
0
-2

Emitidos Positivos

-4

Recebidos Positivos

-6

Emitidos Negativos

-8

Recebidos Negativos

-10

Figura 4 Direco dos afectos emitidos e recebidos positivos/negativos.

347

Atendendo direco dos afectos positivos/negativos emitidos e recebidos pelo pai do


Gabriel (Figura 4) observa-se a percepo de um forte investimento na relao com o pai por
parte do Gabriel, ainda que surja de forma idealizada. A relao com a me sentida como
menos valorizada por parte desta figura perante o menor nmero de itens positivos recebidos
face aos emitidos pelo pai. No plano dos afectos negativos a relao encontra-se
correspondida. O sentimento de correspondncia nos afectos positivos vivenciado na relao
com o irmo e com o tio paterno de 40 anos, ainda que lhes emita afectos negativos sem
receber afectos deste gnero, podendo sentir-se culpabilizado. Na relao com a av paterna
registam-se apenas afectos negativos, com maior incidncia para os recebidos, podendo
sentir-se bastante desvalorizado nesta relao. A auto-estima do pai apresenta-se baixa e
quanto ao tio paterno de 46 anos no registou qualquer tipo de afectos positivos/negativos
atribudos. No Ningum figuram sobretudo os afectos negativos recebidos bloqueando, assim,
a expresso de agressividade dirigida aos elementos da famlia.

Tabela 2 Nmero de itens associados a sentimentos de proteco e atribuio de


incompetncia ou fraqueza.
Sentimentos
de Proteco
Ningum
Pai
Me
Gabriel
Irmo
Av Paterna
Tio Paterno
40 Anos
Tio Paterno
46 Anos

0
2
1
2
0
0
0

Atribuio de
Incompetncia ou
Fraqueza
0
2
0
0
1
1
1

Atravs da anlise dos sentimentos de proteco e de atribuio de incompetncia ou


fraqueza (Tabela 2) verifica-se a percepo do pai e do Gabriel como as figuras que carecem
de maior proteco e, portanto, mais dependentes, seguindo-se a me. No plano da atribuio
de incompetncia ou fraqueza surge o pai como a figura mais destacada com os itens no
tem uma personalidade suficientemente forte e no consegue enfrentar suficientemente bem
as outras pessoas podendo remeter para sentimentos de inferioridade, culpabilizao e
desajustamento social. A associao dos itens deveria ajudar mais em casa e deveria
desempenhar um papel mais importante na vida da famlia ao irmo e av paterna,
348

respectivamente, remetem para a percepo da falta de apoio e proteco famlia, mais


concretamente, face ao prprio pai. No tio paterno de 40 anos o pai colocou o item no
consegue lidar suficientemente bem com dificuldades reenviando para dificuldades na gesto
dos conflitos nesta figura.

Sntese da Anlise do Teste de Relaes Famliares (TRF)

No Ningum figuram sobretudo as defesas na linha da negao dos afectos negativos


inibindo, deste modo, a projeco da agressividade dirigida aos elementos da famlia.
A auto-estima do pai apresenta-se baixa e dominada por sentimentos de inferioridade,
culpabilizao, irritabilidade emocional e desajustamento social. A par do Gabriel surge como
uma das figuras mais dependentes e que carece de maior proteco na famlia ainda, assim,
exprime o desejo de obter uma maior autonomia emocional.
A relao com a me marcada por um forte envolvimento emocional ainda que, seja
sentida de forma menos valorizada por esta figura face ao investimento do pai. Apesar da
percepo de uma relao prxima e carinhosa com a me, observam-se conflitos na relao
de casal associados dificuldade na sua gesto e irritabilidade emocional em ambas as
figuras, sendo a me percepcionada como uma figura punitiva e carente de proteco.
Com o Gabriel observa-se a percepo de um forte investimento na relao com o pai
por parte do Gabriel, ainda que a relao seja representada de forma idealizada, podendo
constituir-se como o modelo de identificao sexual masculino para o filho. O Gabriel
percepcionado como uma das figuras mais dependentes da famlia e que carece de maior
proteco.
A relao com o irmo sentida como correspondida no plano dos afectos positivos e
satisfatria no geral, apesar de sentir que esta figura deveria prestar mais apoio e proteco
famlia.
A relao com a av paterna sentida de forma negativa, insegura e conflituosa,
podendo o pai sentir-se desvalorizado e pouco apoiado/protegido por esta figura.
Com o tio paterno de 40 anos a relao percepcionada de forma satisfatria. Ainda
assim, observa-se a percepo de dificuldades na gesto dos conflitos por parte desta figura e
um conflito na relao que pode associar-se rivalidade fraterna.
Ao tio paterno de 46 anos no foram atribudos quaisquer itens de ndole
positiva/negativa ou referentes a sentimentos de proteco/incompetncia ou fraqueza que
remetam para um envolvimento emocional com esta figura. Contudo, a sua incluso na prova
349

torna-se significativa e pode contrariar a ausncia de envolvimento emocional com esta figura
atravs do recurso a uma forte represso emocional durante a prova.

Guio de Entrevista da Criana

Identificao da Criana

Nome: Gabriel

Idade: 10 Anos e 4 Meses

Interesses/Actividades

O que que tu gostas de fazer nos teus tempos livres?


Jogar computador, brincar (Legos, joga Playstation). Brinco sozinho normalmente.
s vezes brinco com os colegas e o primo.

Frequentas alguma actividade desportiva ou cultural (dana, teatro, msica, etc.)? Qual?
Fiz Karat e natao. Vou voltar para a natao.

Tens animais de estimao? Quais?


Dois ces, scar e Ox.

Amigos

Quem so os teus amigos(as) (nome e idade)?


Bruno (10 anos), Afonso (9 anos), Diogo (10 anos). s vezes da sala brincam todos.

De onde os(as) conheces?


Escola (mesma turma).

O que que costumam fazer juntos(as)?


Brincam apanhada, escondidas, muitas coisas.

Tens um(a) amigo(a) preferido(a) (melhor amigo/a)? Quem ?


Afonso e o Bruno (amigos desde o 1 Ano, andaram juntos na turma).
350

Escola

Em que ano andas?


4 Ano, j passei para o 5 Ano. Tive C a Portugus e B a Matemtica.

O que que gostas mais na escola? Porqu?


TIC (aprendem informtica), actividades extra-curriculares e ginstica. Porque
mais engraado, a professora de ginstica deixa-nos fazer o que ns queremos, jogar
bola

O que que gostas menos na escola? Porqu?


Gosto de tudo.

Se pudesses mudar alguma coisa na escola, o que seria?


Agora esto a fazer duas escolas, uma ao lado da outra, era melhor mudarem a
pintura do que mudar de escola.

Como preferias que fosse?


Preferia ficar na mesma.

Onde que costumas fazer os teus trabalhos de casa?


Na cozinha quase sempre e no quarto, s vezes (em casa).

Tens ajuda de algum? De quem?


Uns dias da minha me, outros do meu pai.

Famlia

Quem so as pessoas da tua famlia?


Irmo, me, pai.

Com quem vives (nome, idade, grau de parentesco face criana)?


Irmo, me, pai.

351

Como a tua me?


amiga, ajuda-me a fazer coisas que eu no consigo. carinhosa.

Como o teu pai?


amigo, s vezes um bocadinho rabugento. Tambm me ajuda nas coisas que eu
no consigo.

Como so os teus irmos(s) (ou outras pessoas da famlia mencionadas)?


rabugento quando acorda. Ele ajuda-me. Mais nada.

Como que os teus pais se do um com o outro? O que pensas/sentes com isso?
So amigos. Sinto que se do bem.

Dormes com algum ou partilhas o quarto com algum? Se sim, com quem?
Antes o meu quarto e do meu irmo era uma sala, agora o meu irmo est na sala e
eu no outro lado (dividiram a sala ao meio).

Se pudesses mudar alguma coisa na tua famlia, o que seria?


No mudava nada.

Como preferias que fosse?

Fantasias/Sonhos/Medos

O que que gostarias de ser quando fores grande? Porqu?


Mecnico. Porque gosto de carros.

Quais so os teus maiores sonhos/desejos?


Isso muito complicado. Gostava de ter a coleco toda do Lego. s vezes compro
com a minha semanada.

Se pudesses mudar alguma coisa em ti, o que seria?


Nada.
352

Como preferias ser?

Costumas sonhar? Se sim, com o qu?


Sim. Coisas muito esquisitas (mexe muito nos olhos). muito complicado explicar.
Tava a andar para uma cidade e caiu uma coisa mesmo minha frente (?) nem eu percebi,
parecia um monte de metal agarrado. Tinha cado de um prdio, veio um carro e foi contra
esse monte, captou e teve um acidente. Veio um pssaro e caiu mesmo em cima da minha
cabea, depois veio um camio TIR e foi contra o prdio e depois o prdio caiu e fez explodir
o camio TIR porque era daqueles de gasolina. (?) Eu fiquei com um galo na cabea porque
o pssaro caiu na minha cabea.

Quais so os teus medos? O que fazes quando te sentes assim?


No tenho, tenho muito poucos medos. Medo de um da minha escola que pensa que
o maior. Ele no me faz nada, faz aos outros, mas um dia pode-me fazer tambm. Ele do 4
Ano, j chumbou duas vezes. Chama-se lvaro. Ele neste momento est na nossa sala. Fico
chateado por no puder fazer nada.

E as tuas preocupaes? O que fazes quando te sentes assim?


As pessoas no cuidarem do planeta terra, andarem mais de carro do que de bicicleta.

353

Desenho Livre

Inqurito

1) O que que desenhas-te? O que que est a acontecer no teu desenho?


Fiz aqui uma cidade ( direita), houve um acidente e fiz um carro da polcia e uma
ambulncia ao lado. Depois tem uma portagem para a zona industrial. Depois fiz uma
fbrica a deitar lixo para o rio que vai dar ao mar. Fiz o mar poludo. Fiz o cruzeiro a
sair pessoas (acrescenta pessoas). Depois fiz uma fbrica de barcos (ao lado das
pessoas que saem do barco). Depois fiz uns peixinhos mortos. Um coiso de
publicidade, ar condicionado e umas chaminezinhas (em cima dos prdios).
(Desenha o sol e as nuvens) As nuvens a poluio, o sol est tapado pela poluio.

2) Histria
Era uma vez uma cidade que polua muito. Havia muitas fbricas e muito trnsito e
com esse trnsito havia muitos acidentes. Um dia a fbrica principal estava cheia e
teve que deitar lixo pelo cano mas o cano estava ligado ao esgo ah, a um rio e esse
354

rio ia dar ao mar. O mar ficou todo poludo: peixes mortos, aves doentes, muitos
animais com doenas. Um dia veio um inspector cidade ver como que estava tudo,
mas ele no ficou contente. Viu tanta poluio que decidiu ir falar com o presidente:
senhor presidente j viu o que fez sua cidade, est toda poluda. Voc devia parar
as fbricas e devia fazer mais ruas. O senhor presidente j sabia que aquilo estava a
piorar e disse-lhe assim: como que pode fazer isso? Sem termos dinheiro? o
inspector disse logo: pea dinheiro aos outros pases que eles ajudam. Acha?,
responde o senhor presidente. Claro que sim. Ento o presidente l foi fazer isso.
Quando ele chegou Amrica foi falar com o presidente americano: senhor
presidente empresta-nos dinheiro para construir novas estradas, tapar as fbricas e
arranjar novas fbricas para tirar lixo do mar?. Talvez, voc precisa de quanto?.
No sei, muito dinheiro, venha viajar comigo para ver como est a nossa cidade.
Quando eles chegaram l passados dois dias o presidente ficou espantado com aquela
cidade e respondeu: a cidade est mesmo muito poluda, est cheia de acidentes, s
tem uma estrada principal, est sempre a deitar resduos, voc precisa mesmo de muito
dinheiro. Ento todos os presidentes do mundo emprestaram a mesma quantia de
dinheiro para arranjarem aquela cidade. Muitas pessoas e de outras nacionalidades
tambm ajudaram. Primeiro taparam as fbricas e mandaram vir uns 500 barcos para
tirarem os resduos do mar, depois tiveram a construir uma estrada nova (acrescenta
no desenho). E depois de tudo isso feito comevamos a ver outra vez o sol e foi assim
que uma cidade super poluda tornou-se numa cidade super limpa.

Anlise da prova

O Gabriel apresenta lateralidade esquerda e exerce uma presso adequada no lpis. O


desenho encontra-se rico do ponto de vista simblico, com movimento e adequado face ao
grupo etrio do Gabriel.
Ao iniciar o Desenho Livre o Gabriel comenta: eu no costumo desenhar, todavia,
verifica-se um elevado investimento ao longo da prova, realizando-a de forma minuciosa,
com ateno aos pormenores. Por vezes, fez uma curta pausa para pensar enquanto observava
o desenho, voltando em seguida, a desenhar acrescentando pormenores ou apagando
elementos desenhados, aperfeioando-o. Demorou algum tempo na realizao da prova,
podendo indiciar inibio pela necessidade de controlar o tempo de avaliao. Estes
elementos aliados esquematizao observada no traado dos detalhes como as janelas dos
prdios, fbrica e barcos podem associar-se a traos de cariz obsessivo.
355

O desenho apresenta aspectos depressivos marcados que no global traduzem uma


viso sombria, frgil, carente, doente e pouco cuidada da cidade representada: o sol encoberto
por nuvens de poluio, lixo no rio e poluio no mar, peixes mortos, aves doentes, muitos
animais com doenas, acidente de carros (ainda que exista a capacidade de reparao atravs
da presena da polcia e da ambulncia). A estrada partida, ainda em fase de construo, pode
remeter para a falha narcsica. Na narrativa rica do ponto de vista simblico surge uma figura
superegica, o inspector, que contribui de forma determinante para o desenlace positivo da
histria. Assim, no final, recorrendo ao apoio das pessoas surge a capacidade de reparao,
numa possvel transferncia da relao teraputica estabelecida entre terapeuta e criana.

Desenho da Figura Humana de Machover

1 Desenho

356

Inqurito

Quem esta pessoa? Como se chama e que idade tem?


Afonso, 9 Anos.

Qual foi o dia mais feliz da sua vida?


Quando entrou para a escola.

E o dia mais triste?


Quando saiu da escola.

Conta-me uma boa recordao que tenha.


Teve muitos amigos.

E uma m recordao?
No vai ver alguns amigos porque no vo para a escola que ele vai.

Conta-me uma histria sobre esta pessoa.


Era uma vez um menino chamado Afonso que andava na escola do 1 Ciclo. Um dia estava
quase a chegar s frias e fizeram a festa de final de ano. O Afonso ficou contente porque ia
ter novos amigos mas ia perder muitos amigos. At a professora deles chorou porque no ia
ver mais os alunos. O Afonso no ltimo dia danou um cantar alentejano e depois cantou uma
msica em ingls da professora de ingls. O Afonso tirou uma fotografia com a professora
para ela no se esquecer dele e depois tirmos todos uma fotografia com a professora. Ele
gostou muito daquela escola, mas ele tinha que mudar de escola para aprender coisas novas. E
assim se aprende novas coisas, mesmo ficando tristes ou contentes por sairmos da antiga
escola.

1) O que que ele/ela est a fazer? Est num recreio a brincar.


2) Que idade tem? 9 Anos.
3) casado/a?
4) Tem filhos?
5) Rapazes ou raparigas?
6) Qual o seu trabalho?
7) Se ainda estuda, em que ano est? 5 Ano, agora.
357

8) Qual o seu maior desejo? Aprender coisas novas.


9) saudvel? .
10) Tem bom aspecto? Sim.
11) Qual a parte do seu corpo que est mais bem feita? Todo o corpo est bem feito.
12) E qual a menos bem feita?
13) feliz? Sim.
14) Quais so os seus aborrecimentos? No ter os mesmos colegas.
15) O que o/a faz zangar? Nada.
16) Quais so as suas manias? Mania que esperto.
17) Quais so os seus trs piores defeitos? No tem nenhum (?) no consigo.
18) Quais so as suas melhores qualidades? esperto, sabe muitas coisas e tem muitos
amigos.
19) Tem muitos amigos? Sim.
20) Mais velhos ou mais novos? Das duas.
21) O que que dizem dele/a? Dizem que amigo, gosta de brincar.
22) Ele/a gosta da famlia? Sim.
23) E da escola? Tambm.
24) Sai muito com os amigos? s vezes.
25) Quando que diz que se divertiu muito? Quando brinca com os amigos.
26) Quer casar? Talvez.
27) Com que idade? 20 e tal.
28) Que gnero de mulher quer casar? Bonita.
29) Quais so os seus trs principais projectos/sonhos? Quer ser mecnico, quer ter
uma casa boa e quer ter um trabalho.
30) Com quem se parece? Com o pai.
31) Gostarias de te parecer com ele/a? talvez.
32) Se pudesses, mudarias alguma coisa no teu desenho? Punha-o mais alto, j
crescido, j tinha trabalho.

358

2 Desenho

Inqurito

Quem esta pessoa? Como se chama e que idade tem?


Irina, 10 Anos.

Qual foi o dia mais feliz da sua vida?


Quando nasceu.

359

E o dia mais triste?


Quando partiu a perna.

Conta-me uma boa recordao que tenha.


Do irmo.

E uma m recordao?
Quando o irmo morreu.

Conta-me uma histria sobre esta pessoa.


Era uma vez uma menina chamada Irina que quando nasceu tinha um irmo que j era adulto.
Ela gostava muito do irmo mas um dia o irmo estava a ir para o trabalho quando teve um
acidente de carro. Ele foi logo para o hospital e os pais dele e a irm tambm foram ver como
que ele estava. Mas as feridas que ele tinha eram muito graves e no conseguiram p-lo a
viver. Os pais e a irm choraram muito porque tinham perdido um filho.

1) O que que ele/ela est a fazer? Est na sala de aula.


2) Que idade tem? 10 Anos.
3) casado/a?
4) Tem filhos?
5) Rapazes ou raparigas?
6) Qual o seu trabalho?
7) Se ainda estuda, em que ano est? 4 Ano.
8) Qual o seu maior desejo? Querer ter o irmo outra vez.
9) saudvel? .
10) Tem bom aspecto? Sim.
11) Qual a parte do seu corpo que est mais bem feita? Esto todas bem feitas.
12) E qual a menos bem feita? No nenhuma.
13) feliz? Sim, mais ou menos.
14) Quais so os seus aborrecimentos? No ter o irmo.
15) O que o/a faz zangar? Nada.
16) Quais so as suas manias? No tem nenhuma.
17) Quais so os seus trs piores defeitos? No gosta de brincar muito com os amigos,
anda sempre levantada na sala de aula e demora muito a fazer os tpcs que a professora
manda.
360

18) Quais so as suas melhores qualidades? Faz os trabalhos de casa, amiga e chega
cedo escola.
19) Tem muitos amigos? Sim.
20) Mais velhos ou mais novos? Mais novos.
21) O que que dizem dele/a? Dizem coisas boas dela.
22) Ele/a gosta da famlia? Sim.
23) E da escola? Tambm.
24) Sai muito com os amigos? Sim.
25) Quando que diz que se divertiu muito? Quando saiu com os amigos.
26) Quer casar? Sim.
27) Com que idade? 20 e tal. 25.
28) Que gnero de homem quer casar? Com um homem bonito.
29) Quais so os seus trs principais projectos/sonhos? Quer ter uma boa casa, emprego
e quer ser mdica.
30) Com quem se parece? Com a me.
31) Gostarias de te parecer com ele/a? No.
32) Se pudesses, mudarias alguma coisa no teu desenho? No.

Anlise da prova

O Gabriel colaborou ao longo da passagem do Desenho da Figura Humana sem


realizar comentrios verbais adicionais, nem manifestar a necessidade de suporte ou apoio por
parte da observadora. Manteve um comportamento estvel, controlado e concentrado e
revelou uma atitude exigente e meticulosa ao corrigir determinados elementos da figura, pelo
recurso borracha. Demonstrou, ainda, uma boa capacidade emptica, ao narrar a histria dos
desenhos atento ao tempo de escrita da investigadora.
A primeira figura desenhada apresenta-se pouco adequada face ao grupo etrio do
Gabriel devido transparncia no desenho do bon, avistando-se a cabea, caracterstica
tpica do Realismo Intelectual (Luquet, 1984) e a ausncia de pescoo. A ausncia de cabelo
pode antever um reduzido investimento no desenho. Contudo, importante assinalar as
particularidades da posio dos dedos e do bon na cabea, atribuindo personalidade figura.
Atravs de um menino da mesma idade, o Gabriel representa uma problemtica que o
prprio enfrenta no contexto real ligada dificuldade em crescer, transitar do 4 ano para o 5
ano e as mudanas que essa passagem acarreta como a separao de alguns amigos e
361

professores e a possibilidade de desenvolver outras relaes, obter novas experincias. Assim,


observa-se um desejo de crescer, evoluir e autonomizar-se Qual o seu maior desejo?
Aprender coisas novas, encontrando uma resoluo adequada para a sua problemtica: ele
gostou muito daquela escola, mas ele tinha que mudar de escola para aprender coisas novas. E
assim se aprende novas coisas, mesmo ficando tristes ou contentes por sairmos da antiga
escola. Torna-se, ainda, relevante mencionar a existncia de uma identificao sexual ao
imago paterno e uma recusa dos aspectos negativos como enunciar trs defeitos e o que faz
zangar a figura em causa, impedindo a expresso agressiva.
No que concerne segunda figura apresenta alguns aspectos menos esperados face
idade do Gabriel como um insuficiente nmero de dedos numa das mos e a ausncia de
pescoo. Trata-se de uma figura na qual surge representado o desejo de ser pequeno, pela
atribuio do dia mais feliz ao dia de nascimento. Sobressaem, ainda, alguns afectos
depressivos associados morte (do irmo) decorrente de um acidente de viao e
dificuldade em fazer o luto e separar-se do objecto amado, carncia e necessidade de cuidados
atravs da perna partida. Mais uma vez, observa-se uma defesa na linha da recusa dos
aspectos negativos que bloqueiam a expresso agressiva. A figura identificada com o imago
materno.
Desenho da Famlia

362

Inqurito

1) Quem so essas pessoas que desenhas-te, como se chamam e que idade tm? (da
esquerda para a direita)
Andr, 10 anos, filho;
Lusa, 38 anos, me;
Afonso, 15 anos, filho;
Francisco, 40 anos, pai este parece-se mesmo com o meu pai, mas t mesmo quase
igual ao meu pai.

2) O que est a acontecer no teu desenho? Porqu?


Esto a passear juntos. Porque querem fazer um piquenique (acrescenta cesto de
piquenique ao desenho).

3) Quem o mais feliz? Porqu?


So todos felizes.
(?) O Andr. Porque nunca fez um piquenique na vida e ento est contente.

Quem o menos feliz? Porqu?


Ningum .
(?) Andr tambm, s vezes. Porque s vezes no lhe apetece ir escola e tem que ir.

4) Quem o mais simptico? Porqu?


Me e o pai.
(?) A me. Porque mais amiga, faz as vontades ao Andr e ao Afonso.

Quem o menos simptico? Porqu?


Afonso, um bocadinho. Porque implica com o Andr.

5) Quem manda mais? Porqu?


A me e o pai.
(?) A me (desenha uma rvore). Porque faz mais tarefas em casa.

Quem manda menos? Porqu?


O Andr. Porque criana, um menino ainda.
363

6) Se tivesses que escolher uma pessoa desta famlia, quem que preferias ser?
Porqu?
Andr. Porque ele tem a mesma idade que eu, brinca com a famlia, est no mesmo
ano que eu.

7) Se fossem todos dar um passeio de carro mas no houvesse lugar para uma
pessoa, quem ficaria em casa? Porqu?
Era o pai ou a me. Mas se o Afonso no quisesse ir ficava em casa. (conta-me que
quando vo de frias ele e o irmo levam muitas bagagens em cima). Se quisesse
podia ficar (acrescenta o sol ao desenho).

8) Se algum no se tivesse comportado bem quem seria? Como seria castigada?


Quem que dava o castigo?
Afonso. Ficava uma semana sem Playstation e pc e se fosse mais vezes, ficava mais
tempo. A me ou o pai.
(?) A me.

9) Se pudesses mudar alguma coisa no teu desenho o que que mudarias? Porqu?
No mudava nada. Porque o desenho est bem feito.

Anlise da prova

No que concerne ao Desenho da Famlia antes de comear a desenhar o Gabriel pediu


de imediato a borracha, talvez como forma de se sentir mais seguro, pela possibilidade de
defensa, controlando o resultado final do desenho. Durante o desenho expressa uma atitude
exigente e meticulosa, utilizando a borracha com acentuada frequncia. Demonstra um
comportamento estvel, controlado e muito concentrado na prova, deitando, por vezes, a
cabea sobre a mesa enquanto desenha. Tambm suspirou com frequncia, indiciando um
afecto na linha depressiva. Demora tempo a desenhar, podendo indicar uma forma de
controlar o tempo da sesso, defendendo-se. Realizou o desenho sem proferir comentrios
verbais adicionais, com excepo do final, onde levantou a cabea e interrompeu o desenho
para dizer sabes que ontem noite foi o funeral do Anglico? (Ai foi e ento?) Ento, ontem
o meu pai disse-me que estavam l ao p da igreja muitas pessoas e muitos carros
estacionados (E o que que tu pensas disso?) Olha que prxima as pessoas j sabem que
tm que usar o cinto! (Pois , j percebi que ests muito atento a essas notcias) Pois estou,
364

olha a minha me quando estamos a comer pe sempre nas notcias, revelando-se, uma vez
mais, sensvel questo dos acidentes de viao e possveis danos da resultantes, como a
morte.
Quanto ao grafismo, o desenho apresenta-se investido e cuidado, contudo contm
alguns aspectos pouco esperados face idade do Gabriel como a ausncia de pescoo nas
figuras e quatro dedos nas mos direitas das figuras, com excepo da figura que representa o
filho mais novo que apresenta os dedos completos. A figura mais investida aparenta ser o pai
pelo maior nmero de detalhes como o cinto, os sapatos mais pormenorizados e diferentes das
restantes figuras, maior cuidado no traado da cara, na barba e cabelo, seguindo-se o filho
mais novo que semelhana do pai apresenta um aspecto mais harmonioso que a me e o
filho mais velho (figura menos investida). O sorriso da me, ainda que mais acentuado pelo
lpis surge como o mais superficial, j o do pai atribui-lhe um aspecto mais descontrado e
natural. O filho mais novo aparenta sentir-se triste, apesar do sorriso tnue. Importa, ainda,
salientar o posicionamento das figuras, onde a me se situa no meio dos dois filhos e o pai ao
lado do irmo mais velho. semelhana do primeiro Desenho da Figura Humana o Gabriel
desenha elementos, neste caso nas camisolas, que podem remeter para a personalidade de
cada figura. A diferenciao sexual e de geraes encontram-se integradas, assim como, o
conceito de famlia.
No questionrio destaca-se a defesa pela recusa dos afectos negativos, bloqueando a
expresso da agressividade face aos elementos da famlia. A figura na qual o Gabriel se
identifica, o Andr comporta simultaneamente os aspectos positivos e negativos da famlia
(ambivalncia na identidade), sentindo dificuldade em separar-se do ambiente familiar.
Observa-se uma forte rivalidade fraterna, com a projeco de agressividade no irmo mais
velho e a me a figura dominante da famlia, idealizada e pouco frustrante para os filhos
porque mais amiga, faz as vontades ao Andr e ao Afonso. O pai pouco abordado,
parecendo esquecido.

Inventrio de Depresso para Crianas

Anlise inter-individual

O Gabriel obteve um total de 18 pontos quanto intensidade de sintomas depressivos


apurados na prova, o que o situa no Grupo 2 (intermdio). Este resultado no permite uma
classificao como caso deprimido e caso no deprimido considerando o universo
populacional em estudo.
365

Anlise intra-individual

Intensidade do Item

Perfil de Itens
3
2
1
0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27

Itens

Ao analisar o grfico relativo ao perfil de itens observa-se uma maior incidncia de


itens na intensidade mdia-inferior (13) e mnima (12). Sobressaem, assim, como principais
sintomas depressivos no teste as dificuldades escolares e de alimentao, uma preocupao
excessiva, sentimentos de tristeza e culpa, baixa auto-estima e anedonia.
Atendendo ao diagnstico clnico de depresso e s caractersticas do funcionamento
psquico do Gabriel que apontam para uma maior tendncia inibio, coloca-se em hiptese
a interferncia de mecanismos de defesa como a negao nos resultados obtidos neste
instrumento.

Teste de Relaes Familiares, Verso Crianas


Tabela 1 Nmero de itens emitidos e recebidos positivos/negativos (leves/fortes) atribudos
aos membros da famlia.
Emitidos
Emitidos
Recebidos
Recebidos
Total de
Positivos
Negativos
Positivos
Negativos
Envolvimento
Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes Leves Fortes
Ningum

33

Gabriel

Pai

24

Me

28

Irmo

366

O Gabriel colaborou ao longo da passagem da prova TRF sem realizar comentrios


verbais, nem manifestar a necessidade de suporte ou apoio por parte da observadora. Manteve
um comportamento estvel, controlado e concentrado na prova. Destaca-se, particularmente, a
ordenao das figuras na mesa: irmo, me, pai, Gabriel.
Ao observar a Tabela 1 verifica-se que o Gabriel decidiu incluir na prova apenas as
figuras pertencentes famlia nuclear: Gabriel, pai, me e irmo. O recurso defesa foi muito
significativo atravs da colocao dos afectos negados, sobretudo de cariz negativo na
personagem Ningum, reprimindo a agressividade dirigida aos elementos da famlia. Verificase, assim, um elevado grau de neuroticismo no funcionamento do Gabriel.

35
30
25
20
15
10
5
0
Ningum

Gabriel

Pai

Me

Irmo

Figura 1 Nmero total de itens associados a cada membro da famlia.

Atendendo ao nmero total de afectos associados a cada membro da famlia pelo


Gabriel (Figura 1) observa-se um maior envolvimento emocional com a me, seguindo-se o
pai. O envolvimento total com o irmo e o prprio Gabriel surge de forma menos acentuada,
com o Gabriel a ocupar a ltima posio. No Ningum figuram as defesas dos afectos
negados/recusados, inibindo a sua distribuio aos elementos da famlia.

367

16
14
12
10
Positivos

Negativos

6
4
2
0
Ningum

Gabriel

Pai

Me

Irmo

Figura 2 Nmero de itens positivos e negativos emitidos a cada membro da famlia.

Na anlise dos afectos positivos e negativos emitidos pelo Gabriel (Figura 2) sobressai
um forte mecanismo defensivo atravs da atribuio sobretudo dos afectos de cariz negativo
na figura Ningum, o que permite bloquear a expresso de agressividade sobre os elementos
da famlia e idealizar as relaes com estas figuras. A colocao no Ningum dos itens
gostava de poder dormir na mesma cama com esta pessoa da famlia e gostava que esta
pessoa da famlia gostasse mais de mim do que dos outros reenvia para o desejo de
autonomizao no Gabriel. Posto isto, no plano dos afectos emitidos a figura que mais se
destaca o pai obtendo tambm um maior nmero de afectos positivos erotizados nos quais se
destaca a atribuio do item quando me casar gostava que fosse com uma pessoa parecida
com esta pessoa da famlia apenas associado ao pai, o que pode remeter para o sentimento de
admirao do pai, podendo constituir-se como um modelo de identificao para o filho. O
afecto negativo emitido pelo Gabriel ao pai e me foi chata, sendo a me a figura que se
segue no mbito do maior nmero de afectos emitidos pelo Gabriel, registando os mesmos
afectos erotizados que o pai, com excepo do item supramencionado. Com o irmo sobressai
o afecto positivo gosto de abraar esta pessoa da famlia associando-se a uma relao
carinhosa, ainda assim, os afectos negativos tem mau feitio e no tem muita pacincia
permitem antever conflitos nesta relao que podem ligar-se rivalidade fraterna. A autoestima do Gabriel apresenta-se positiva.

368

14
12
10
8

Positivos
Negativos

6
4
2
0
Ningum

Gabriel

Pai

Me

Irmo

Figura 3 Nmero de itens positivos e negativos sentidos como recebidos por cada membro
da famlia.

Atendendo avaliao dos afectos positivos e negativos recebidos pelo Gabriel


(Figura 3) sobressai novamente a presena de uma forte negao dos afectos negativos atravs
da utilizao da figura Ningum, o que permite inibir a projeco de agressividade sobre os
elementos da famlia e idealizar as relaes com as figuras parentais. A colocao dos afectos
erotizados gosta de estar na cama comigo e gosta mais de mim do que dos outros no
Ningum reenvia para o desejo de autonomizao emocional no Gabriel. Posto isto, a me
sobressai como a figura da qual o Gabriel recebe um nmero significativo de afectos
positivos, recolhendo todos os afectos erotizados com excepo dos recusados na figura
Ningum. Assim, apesar de obter os mesmos afectos erotizados que o pai destaca-se deste
pelo item gosta de me ajudar quando estou a tomar banho apenas associado me, o que
pode remeter para uma relao de dependncia com a figura materna. Os afectos negativos
ralha comigo e fica zangada comigo foram ambos associados aos pais e podem remeter
para a percepo do sentimento de punio nestas figuras. A relao com o irmo apresenta-se
de forma insatisfatria e ligada ao afecto negativo no brinca comigo quando eu gostaria que
brincasse que reenvia para a vivncia de falta de ateno/apoio por parte da figura fraterna.

369

15
10
5

Emitidos Positivos
Recebidos Positivos

Emitidos Negativos
Recebidos Negativos

-5
-10
-15
Ningum

Gabriel

Pai

Me

Irmo

Figura 4 Direco dos afectos emitidos e recebidos positivos/negativos.

Atendendo direco dos afectos positivos/negativos emitidos e recebidos pelo


Gabriel (Figura 4) observa-se um forte investimento da criana na relao com a figura
paterna, ainda que no se sinta correspondida pelo pai face ao nmero inferior de afectos
positivos recebidos e superior de afectos negativos recebidos por parte do pai
comparativamente com os emitidos pelo Gabriel, podendo sentir-se pouco valorizado. Por
outro lado, com a me surge um maior investimento na relao por parte da figura materna
face ao nmero acentuado de afectos positivos recebidos, o que pode reenviar para a
percepo do desejo de manter uma forte dependncia emocional com o filho por parte da
me. Ainda assim, o Gabriel sente que recebe um nmero superior de afectos negativos face
aos emitidos me, podendo sentir-se desvalorizado. A percepo de desvalorizao da
relao pode tambm associar-se ao irmo, figura da qual apenas recebe afectos negativos,
ainda que os afectos negativos emitidos sobressaiam face a estes ltimos, podendo reenviar
para a rivalidade fraterna. No Ningum figuram sobretudo os afectos negativos recusados
reprimindo, assim, a expresso de agressividade dirigida aos elementos da famlia.

370

Tabela 2 Nmero de itens associados a sentimentos de dependncia (superproteco


materna e superindulgncia paterna/materna).

Ningum
Gabriel
Pai
Me
Irmo

Superproteco
materna
0
7
3
3
6

Superindulgncia
Paterna
Materna
0
1
4
4
1
1
3
0
2
0

Total de
Dependncia
1
15
5
6
8

Quanto aos itens associados a sentimentos de dependncia (Tabela 2) sobressai uma


auto-valorizao no Gabriel atravs dos itens de dependncia que concentra sobre si,
revelando uma atitude egocntrica e regressiva no seu funcionamento psquico. Deste modo,
observa-se o desejo de proteco materna e de ateno por parte de ambos os pais. Ainda
assim, disputa com o irmo a proteco materna e com a me a proteco/ateno paterna. O
item de superindulgncia materna esta a pessoa da famlia que a me gosta mais foi
colocado no Ningum, o que pode representar uma forma de o negar s figuras com quem
rivaliza, embora tambm possa traduzir o desejo de autonomia.

Sntese da Anlise do Teste de Relaes Famliares (TRF)

O recurso figura Ningum foi utilizado para a colocao dos afectos negados
sobretudo de cariz negativo reprimindo, assim, a agressividade dirigida aos elementos da
famlia. Observa-se um elevado grau de neuroticismo no funcionamento psquico do Gabriel.
A recusa/negao dos afectos erotizados pode reenviar para o desejo de autonomizao.
A auto-estima do Gabriel apresenta-se de forma positiva, ainda que o nmero elevado
de itens de dependncia concentrado sobre si reenvie para uma atitude egocntrica e
regressiva, assim como, para o desejo de proteco materna e de ateno por parte de ambos
os pais.
Com o pai a relao surge de forma idealizada e observa-se um forte investimento
positivo do Gabriel nesta relao, ainda que no se sinta correspondido, podendo sentir-se
pouco valorizado pela figura paterna que simultaneamente percepcionada como punitiva.
Ainda assim, o pai parece constituir-se como o modelo de identificao do Gabriel.
A relao com a me idealizada e percepcionada como fortemente investida por
parte da figura materna, podendo associar-se ao desejo de manter uma forte dependncia

371

emocional com o Gabriel. Ainda assim, a me sentida como punitiva. O Gabriel rivaliza
com esta pela ateno/proteco do pai.
A relao com o irmo sentida como desvalorizada por parte desta figura,
rivalizando com o irmo pela proteco materna.

As Aventuras de Pata-Negra
1 Etapa Frontispcio

PN:
Porque tem a pata negra. Menino. Tem 4 Anos.

Dois porquinhos:
Irmos, 2 meninos. Esquerda 2 Anos; Direita 3 Anos.

Porcos Grandes:
Em cima pai, 6 Anos.
Em baixo me, 8 Anos.

Quanto ao PN o Gabriel atribui-lhe o seu prprio sexo, o que pode acentuar a


identificao ao heri da histria. A idade inferior sua pode remeter para imaturidade
funcional.
Aos dois porquinhos associada a relao fraterna, na qual, o PN sobressai como o
elemento com mais idade, atribuindo-lhe maior poder.
Os porcos grandes representam a relao com as figuras parentais, correspondendo de
forma adequada o sexo e papis parentais aos personagens. A me sobressai como o elemento
com mais idade na famlia, podendo remeter para a atribuio de maior autoridade a esta
figura.
2 Etapa Os Temas

Sonho Pai
Era o Pata Negra que estava a sonhar com o pai. Ia buscar o filho que estava a ser
apanhado pelo caador, mais nada.
(?) Conseguiu salv-lo.
372

Num carto que reenvia para a relao com o imago paterno o Gabriel projecta uma
situao de perigo na qual o pai intervm como protector, podendo idealizar a figura paterna.

Sonho Me
Era o Pata Negra a sonhar com a me. E ele descobriu no seu sonho que a me
que lhe fez a pata negra porque ela tambm tinha uma mancha negra.

A narrativa remete para a identificao com a figura materna, privilegiando a relao


dual com o primeiro objecto.

Ganso
Isto o PN? que a pata negra pode estar do outro lado. Este o irmo o de 2
anos. O irmo dele estava a brincar com o outro irmo de 3 anos, quando veio um grande
pato e ento o porquinho pequenino tentou fugir mas o pato pegou-lhe na cauda. Quando o
irmo de 3 anos viu isto foi logo morder-lhe e o pato aleijado fugiu logo. J t tudo.

O Gabriel acede ao contedo simblico do carto referente a uma inter-relao


agressiva verificando-se a castrao na figura agredida, o irmo mais novo e a defesa face ao
agressor encenada pelo irmo mais velho, podendo associar-se tambm a uma defesa na linha
omnipotente.

Batalha
O PN est a fazer uma briga com o irmo de 3 anos e o irmo de 2 anos estava l no
meio deles, fugiu logo para o p dos pais e foi dizer aos pais. Os pais quando viram aquilo
foram logo a correr para o meio deles e separaram-nos. O irmo do meio ficou coxo, e o PN
ficou sem ver de um lado e ficou com a orelha toda inchada. T tudo.

O Gabriel acede ao contedo simblico do carto referente temtica da agressividade


no contexto da relao fraterna. Perante a pulso agressiva desencadeia estratgias de defesa
na linha do recalcamento de forma a inibir a sua expresso, o que pode remeter para a
interiorizao superegica. Instala-se o sentimento de culpabilizao o PN ficou sem ver de
um lado e ficou com a orelha toda inchada.

373

Como terminam as aventuras?


Acabou sempre bem, uns aleijados, outros contentes. Houve brigas e um pato
descarado a tentar roubar um porquinho mas tudo acabou bem porque os seus irmos e o PN
querem sempre ajudar os outros quando no h brigas.

O impacto fantasmtico da problemtica agressiva continua presente, mesmo sem os


cartes visveis, dando lugar defesa pela formao reactiva de forma a controlar e bloquear a
expresso de agressividade tudo acabou bem porque os seus irmos e o PN querem sempre
ajudar os outros quando no h brigas.

(No quer contar mais histrias, no lhe interessa mais nenhuma).


3 Etapa Preferncias-identificaes

Cartes de que gosta (A)

Ganso
A1) Porque engraado. O porquinho de 3 anos (o que est a ver).

Identifica-se ao irmo a quem concedeu maior poder e omnipotncia na resoluo do


conflito agressivo.

Pequena Escada
A2) Porque o PN est a aprender a escalar, a subir uma rvore. Gostava de ser o
esquilinho.

No aborda o contedo latente do carto que remete para a funo de holding de uma
das figuras parentais e evita identificar-se ao heri da histria recusando, possivelmente, o
carcter transgressor que a cena veicula.

Batalha
A3) Porque andam briga e os pais vo resolv-la. O pai.

Reconhece o conflito associado rivalidade fraterna implementando estratgias de


recalcamento para lidar com a expresso agressiva.
374

Bebedouro
A4) Porque ele est a fazer chichi para a comida. O PN.

O Gabriel acede ao conflito associado agressividade dirigida s figuras parentais.

Mamada 2
A5) Gosto do PN primeiro que os irmos porque o PN est a beber o leite da me e os
irmos ficaram cheios de inveja. O PN.

Esta resposta traduz o desejo de ocupar um lugar prximo e privilegiado na relao


com a figura materna num contexto marcado pela rivalidade fraterna.

Brincadeiras Sujas
A6) Porque tens os porquinhos na gua e sem querer sujaram o pai e ele ficou super
irritado. Aqui no consigo bem ver quem o PN porque esta gua est toda preta. O que
est a atirar a gua, PN.

O Gabriel reconhece o contedo simblico do carto e a figura parental agredida o


pai, remetendo para a rivalidade edipiana com esta figura.

Ninhada
A7) Porque a me do PN tem mais porquinhos e os homens esto a aconcheg-la. Um
porquinho pequenino, tanto faz, so todos iguais.

Num carto que reenvia para o fenmeno do nascimento num contexto de rivalidade
fraterna, o Gabriel faz uma identificao regressiva com um dos irmos mais pequenos, o que
permite anular a reaco agressiva (rivalidade fraterna) e projectar, assim, o desejo de uma
aproximao exclusiva figura materna.

Beijo
A8) Porque o pai a beijar a me do PN. O PN.

O Gabriel acede ao contedo latente do carto que remete para o conflito edipiano.

375

Sonho Me
A9) Porque o PN est a sonhar com a me. O PN.

Reconhece o contedo simblico do carto que apela relao com o materno.

Sonho Pai
A10) Porque o PN est a sonhar com o pai. Pai, para no repetir.

Reconhece o simbolismo do carto que remete para a relao com o imago paterno,
optando por se identificar a esta figura.

Cabra
A11) O PN est a beber leite de uma cabra em vez de beber leite da sua me e ele
pensava que era a sua me. O PN.

O Gabriel acede ao conflito imposto simbolicamente pelo carto que reenvia para a
relao com um substituto materno.

Mamada 1
A12) A me est a dar leite ao PN. O PN.

Verifica-se o reconhecimento da temtica relativa aproximao com a imagem


materna num contexto privilegiado.

Cartes de que no gosta (nA)


Estes complicado de ver nestas pretas, s se v assim um risquinho.

O Gabriel revela-se sensvel aos cartes de fundo negro, o que pode associar-se ao
experienciar da angstia depressiva.

Noite
nA1) Porque se v mal, no se percebe o que est ali fora.
Punha-a de dia. O sol. (?) A lua ento (afasta logo o carto aps responder-me a cada
uma destas questes).
376

Num carto onde o contedo latente remete para a curiosidade sexual e fantasmas da
cena primitiva o Gabriel no reconhece ou evita confrontar-se com esta temtica sobressaindo
a forte reaco tonalidade preta do carto, o que se associa angstia depressiva procurando
evitar e negar esta vivncia atravs de modalidades antidepressivas como o sol (no figura no
carto), lua (fonte de luz) e afastando rapidamente o carto.

Buraco
nA2) O PN no v nada e est preso, no consegue sair.
Mudava o PN conseguisse sair e haver sol. O PN j salvo.

Num carto que reenvia para a temtica da solido num contexto de perigo o Gabriel
revela-se, uma vez mais, hipersensvel ao tom preto do carto, o que pode traduzir um
equivalente de afecto depressivo, recorrendo s defesas antidepressivas na linha da recusa
manaca haver sol para lidar com este conflito.

Hesitao
nA3) O PN no sabe para onde ir, se ir para a me beber leite ou ir para o pai comer.
Que todos fizessem a mesma coisa juntos. A me.

O Gabriel identifica adequadamente o conflito inerente ao presente carto, contudo,


defende-se pelo evitamento da escolha do objecto privilegiado. Ainda assim, a identificao
me pode remeter para a prevalncia da relao com o primeiro objecto.

Partida
nA4) Porque o PN est perdido.
Que ele soubesse o caminho de volta. Uma rvore.

A situao de solido evocada no carto induz a angstia de separao no Gabriel,


impedindo-o de se identificar com o personagem da histria de forma a evitar o confronto
com o sofrimento.

Carroa
nA5) Porque o PN est a sonhar que est a ser separado dos pais.
O PN conseguisse fugir. O senhor, estes porquinhos aqui (dentro da carroa) no
gostava
377

O Gabriel reconhece a angstia de separao, no se identificando ao PN de forma a


evitar o confronto com a vivncia desta angstia.
4 Etapa Questes Dirigidas

Noite
Parece que vejo uma ovelha aqui e depois a me a dormir e depois v-se o PN a
olhar.
5 Etapa Questes de Sntese

1) Quem o mais feliz? Porqu?


O PN. Porque tem irmos e tem famlia.

Quem o menos feliz? Porqu?


No h nenhum menos feliz, so todos felizes.
(?) O irmo de 2 anos, porque ainda no pode fazer coisas que os irmos mais velhos
fazem.

2) Quem o mais simptico? Porqu?


A me. Porque faz a vontade aos filhos.

Quem o menos simptico? Porqu?


O pai. Porque est sempre chateado.

3) Quem que gostarias de ser?


O PN.

4) O que achas que vai acontecer ao PN?


Vai ter muitas aventuras.
(?) Brigas, vai trepar uma rvore, perde-se, salva o irmo, etc.

5) O que que o PN pensa da sua pata-negra?


Pensa que engraada porque faz dele um porco especial.
378

6) Carto Fada:
Desejo 1: Queria que o pai se zangasse menos.
Desejo 2: Queria que os irmos obedecessem a ele.
Desejo 3: Queria ter mais trs desejos, tou a brincar. Gostava que a me desse mais
miminhos a ele do que aos outros.
Na Vila Moleza (desenhos animados) ele pede sempre mais trs desejos quando
aparece a fada e assim tem sempre mais desejos.

Sntese da Anlise da Prova

Preferncias-identificaes

Cartes

Os Temas

Preferncias

Identificaes

Aceite (A)/No

Agradvel

Assumida

Aceite (nA)

(A)/No

(A)/No

Agradvel (nA)

Assumida (nA)

Total

Bebedouro

nA

2A

Beijo

nA

2A

Batalha

nA

2A

Carroa

nA

nA

nA

3nA

Cabra

nA

2A

Partida

nA

nA

nA

3nA

Hesitao

nA

nA

nA

3nA

Ganso

nA

2A

Brincadeiras

nA

nA

1A

Noite

nA

nA

nA

3nA

Ninhada

nA

nA

1A

Sonho Me

3A

Sonho Pai

nA

2A

Mamada 1

nA

2A

Mamada 2

nA

2A

Buraco

nA

nA

1A

Sujas

379

Pequena

nA

nA

1A

Escada

Durante a passagem da prova Pata Negra o Gabriel manifestou uma conduta estvel,
controlada e concentrada, com excepo da fase final da prova, mais precisamente na 5 Etapa
intitulada Questes de Sntese, na qual, manifestou um comportamento mais agitado,
balanceando a cadeira.
Perante a anlise dos resultados constantes na tabela verifica-se uma maior censura
dos cartes associados s temticas do tema edipiano (Ninhada e Noite), rivalidade fraterna
(Carroa, Hesitao e Ninhada) e ligados vivncia de abandono e solido face ao confronto
com a angstia de separao e depressiva (Partida, Buraco e Carroa) podendo remeter para
dificuldades na resoluo destas problemticas. Os mecanismos defensivos que se destacam
so a negao, recalcamento, evitamento, formao reactiva, idealizao e recusa manaca.
A representao do desejo de uma aproximao exclusiva figura materna e a
rivalidade face figura paterna permitem auferir dificuldades na resoluo do conflito
edipiano. Todavia, a instncia superegica encontra-se integrada e a agressividade projectada
, em seguida, recalcada de forma a controlar a sua expresso, desencadeando tambm
culpabilidade pelo retorno da agressividade sobre si (no contexto da rivalidade fraterna).
Aparentemente a diferenciao de geraes e sexos parece assegurada. O Gabriel revela-se
sensvel aos cartes de fundo negro, o que pode associar-se ao experienciar da angstia
depressiva recorrendo s defesas antidepressivas na linha da recusa manaca haver sol para
lidar com este conflito. A temtica de abandono e solido face ao confronto com a angstia de
separao revela-se tambm difcil de experienciar para o Gabriel, no se identificando ao
personagem da histria de forma a evitar o confronto com esta angstia.
A figura materna representada de forma idealizada e pouco frustrante, identificandose com a me. Surge como a figura dominante na famlia.
A figura paterna percepcionada como uma figura protectora.
Na relao com os irmos destaca-se a rivalidade fraterna sobretudo face ao desejo de
ocupar um lugar prximo e privilegiado na relao com a figura materna.

380

Anexo R: Tabela de Resultados

Caso

Gnero

Idade

Ano de

Contacto

Escolaridade
Tom

Masculino

10 Anos

4 Ano

- Inibido;

e5

- Postura corporal pouco expressiva;

Meses

- Olhar triste, evita manter contacto


ocular;
- Verbaliza pouco e atravs de
monosslabos, num tom de voz baixo;
- Conduta estvel, controlada e
concentrada.

Isabel

Feminino

7 Anos e

1 Ano

3 Meses

- Imaturo;
- Inibido;
- Com o evoluir das sesses maior
disponibilidade para a relao e
verbalizao;
- Verbaliza, por vezes,
espontaneamente. Utiliza um tom de
voz baixo, pronunciando as palavras de
forma imatura para a idade;
- Mantm contacto ocular, olhar triste;
- Conduta estvel, controlada e
concentrada.

Joo

Masculino

9 Anos e

4 Ano

6 Meses

- Frgil;
- Ansioso;
- Inseguro;
- Perfeccionista;
- Hipermaturo;
- Olhar triste, evita manter contacto
ocular;
- Necessidade de preencher vazio;
- Bom contacto;
- Verbaliza com fluncia e

381

espontaneidade. Vocabulrio muito


rico;
- Confuso e lentificao do
pensamento;
- Conduta agitada, pouco controlada e
dispersa. Cansado;
- Ansiedade de separao dos pais;
- Angstia forte, muito triste e em
desassossego permanente.
Mariana

Feminino

9 Anos e

4 Ano

9 Meses

- Demasiado fcil;
- Sedutor;
- Necessidade de agradar;
- Comunicativa e expressiva, verbalizou
espontaneamente;
- Manteve contacto ocular, olhar triste e
vido;
- Auto-estima baixa;
- Insegurana;
- Ansiedade de separao dos pais;
- Necessidade de ateno, apoio,
cuidado e afecto constantes;
- Conduta agitada;
- Imaturidade: risos frequentes e
linguagem tpica de beb.

Gabriel

Masculino

10 Anos

4 Ano

e4

- Inibido;
- No decorrer das sesses maior

Meses

vontade;
- Verbaliza espontaneamente;
- Conduta estvel, controlada e
concentrada;
- Necessidade de ser cuidado.

382

Perodo
Caso

Tom

Origem

Motivo do

Acompanhamento

de Trata

Psicotrpi

do Pedido

Pedido/Sintomas

/Frequncia

-mento

-cos
No

Hospital
da Grande
Lisboa

- Ansiedade;

- Consultas

8 Meses

- Dificuldades de

teraputicas de

e 15 dias.

aprendizagem;

frequncia

- Cefaleias;

semanal;

- Teve encoprese

- Consultas

secundria.

teraputicas com os
pais.

Isabel

Consulta

- Ansiedade;

- Consultas

- Medos:

teraputicas de

Psicologia

Animais, ladres,

frequncia

de

palhaos, deitar-

semanal;

se sozinha,

- Consultas

acidentes, do

teraputicas com os

perigo.

pais.

de

Hospital
da Grande
Lisboa
Joo

Mdico de - Hiperactividade;

- Consultas

Famlia do - Dfice de

teraputicas de

Centro de

ateno;

frequncia

- Dificuldades

quinzenal;

escolares;

- Consultas

- Baixa auto-

teraputicas com os

estima;

pais.

Sade

2 Meses

No

8 Meses

Concerta
18mg
Comprimidos

- Somatizaes:
broncoespasmos
asma no
alrgica,
problemas de pele
(estrfulos),
estereotipias
faciais.
Mariana

Mdico de - Dificuldades de

- Consultas

Famlia do concentrao e

teraputicas de
383

7 Meses

Risperdal
soluo oral

Centro de
Sade

aprendizagem na

frequncia

escola.

quinzenal;
- Consultas
teraputicas com os
pais.

Gabriel

Consulta

- Dificuldades

- Consultas

hospitalar

alimentares com

teraputicas de

de

anorexia

frequncia

pneumolo

selectiva;

quinzenal;

- Tem asma e

- Consultas

rinite.

teraputicas com os

-gia
peditrica

2 Meses

No

pais.

Caso

Tom

Agregado

Classe

Familiar/Idades

Social

- Me, 39 Anos;

Classe

- Pai, 46 Anos;

III

- Tom, 10

Isabel

(Mdia)

Dados Importantes sobre a Famlia

- Pais investem muito tempo no emprego;


- Apoio dos avs maternos quando os pais no
esto presentes;

Anos;

- Me sofreu dois abortos espontneos antes da

- Isabel, 7 Anos.

gravidez do Tom;
- A Isabel nasceu prematura;
- Me possivelmente deprimida;
- Pai foi seguido em psicologia na infncia por
dificuldades escolares.

Joo

- Me, 37 Anos;

Classe I

- Pai, 38 Anos;

(Alta)

- Tia paterna com depresso;


- Me dislxica, segundo a prpria;

- Joo, 9 Anos;

- Pai possivelmente deprimido;

- Irm, 5 Anos.

- Pais ausentam-se com frequncia por motivos de


trabalho. O pai chega a estar 1 ms ausente.

Mariana

- Me, 39 Anos;

Classe

- Pai, 42 Anos;

IV

- Me possivelmente deprimida. Medicada com


antidepressivo Triticum AC;

- Irmo, 17

(Mdia

- Av materna faleceu com Alzheimer h 3 anos;

Anos;

Baixa)

- Tia materna suicidou-se quando a Mariana tinha

- Mariana, 9

8/9 meses;
384

Anos.

- O pai viveu em Frana dos 5 aos 8 anos da


Mariana, por motivos de trabalho;
- Pai desempregado;
- Me dorme no sof da sala.

Gabriel

- Me, 39 Anos;

Classe

- Pai, 39 Anos;

III

- Meio-Irmo,

(Mdia)

- Os pais so ex-toxicodependentes;
- A me deixou de consumir pelo meio-irmo do
Gabriel quando este tinha 5 anos;

18 Anos (da

- O Gabriel desconhece o passado

parte da me);

toxicodependente dos pais;

- Gabriel, 10

- O meio-irmo do Gabriel problemtico,

Anos.

isolando-se;
- A me tem Hepatite C;
- A me teve anorexia nervosa aos 20 anos;
- O av paterno faleceu aos 7 anos do pai.

Figura Materna
Caso
Tom

Isabel

Auto-estima

Relao Conjugal

- Baixa;

- Dificuldades associadas ao sentimento

- Insegurana;

de carncia de apoio, compreenso e

- Sentimentos de inferioridade;

pouco envolvimento nas funes

- Culpabilizao;

conjugais/parentais do pai. Mas tambm

- Sente-se desvalorizada e insegura na

aos sentimentos de insegurana e

relao com os elementos exteriores

culpabilidade por parte da me;

famlia biolgica;

- Pai: autoritrio, punitivo (associando

- Muito dependente e pouco

ao ambiente familiar no qual se

autonomizada da relao com a sua

desenvolveu) e dependente da proteco

figura materna e da prpria famlia de

da me, podendo remeter para uma

origem;

percepo desvalorizada desta figura.

- Defesas: idealizao e negao;


- Hiptese de funcionamento
depressivo.
Joo

- Sobressaem os afectos positivos;

- Idealizao dos afectos positivos

- Culpabilizao na relao com o

emitidos;

Joo;

- Sente-se desvalorizada;
385

- Projecta pulses agressivas sobre os

- Conflitos na relao de casal

elementos da famlia;

associados a insegurana, dificuldades

- Defesas: negao e idealizao.

na gesto e resoluo dos conflitos, na


comunicao e na demonstrao de
afectos dificuldades frente das partes
boas;
- Pai: passivo, sentimentos de
incompetncia/fraqueza com
dificuldades na adaptao social, em
exprimir os seus sentimentos e
insuficincia de auxlio famlia.

Mariana

- Baixa;

- Culpabiliza-se pela agressividade

- Sentimentos de Inferioridade;

dirigida ao pai;

- Culpabilizao;

- Sente-se bastante desvalorizada e

- Irritabilidade;

pouco correspondida face aos seus

- Dificuldades na resoluo dos

sentimentos e necessidades;

conflitos;

- Dificuldade na resoluo dos

- Forte dependncia;

problemas;

- Carncia de proteco;

- Falta de confiana na relao;

- Grau elevado de neuroticismo

- Falta de compreenso e apoio do pai;

marcado pela negao dos afectos

- Tendncia paranide no

negativos e dos afectos erotizados;

funcionamento psicolgico da me;

- Diminuda disponibilidade

- Dependente do pai.

emocional, alheando-se do contacto


com os outros devido ao sentimento de
insegurana e desconfiana face aos
elementos da famlia;
- Hiptese de funcionamento
depressivo.

386

Gabriel

- Baixa;

- Maior investimento afectivo por parte

- Sentimentos de inferioridade;

do pai;

- Culpabilizao;

- Conflitos e insegurana na relao de

- Irritabilidade emocional;

casal motivados por dificuldades na

- Defesas: negao;

gesto dos conflitos e no controlo dos

- Percepo negativa e insegura da

impulsos agressivos por parte da me;

famlia.

- Sente que a famlia obedece a um


matriarcado familiar semelhana da
sua famlia de origem.

Figura Materna
Relao da
Caso

Relao Me/Criana

Relao

Relao

Criana com

Me/Irmo

Fraterna

Outras Figuras
Relevantes

Tom

Isabel

- Dependente;

Pais:

Pais:

- Idealizada;

- Prxima;

- Relao com o

- Providencia proteco

- Rivalidade

av materno:

e cuidado;

fraterna;

atitude submissa

- Tom: preocupa-se

- Tom: mais

e passiva do

com a me. Inibido.

dependente da

av, provocao

proteco

e desafio da

materna e

autoridade do

tende a

av no Tom.

- Dependente;

proteger a

Pais:

- Idealizada;

irm;

- Contacto fcil;

- Desperta afectos

- Isabel: menos - Sedutor;

agressivos na me e

dependente,

- Necessidade de

irritabilidade;

defende-se

agradar;

- Culpa por projectar os

sozinha, mais

- Forte angstia

seus medos internos na

astuta.

de separao

filha, no representando

mesmo de

um modelo de

adultos com os

conteno e segurana

quais no tem
387

para a Isabel;

contacto

- Pais: Necessidade da

frequente.

Isabel agradar me.


Joo

- Idealizada;

- Idealizada;

Pais:

Pais:

- Culpabilizada;

- Forte

- Rivalidade

- Avs paternos

- Carncia de afecto na

envolvimento

fraterna no

e maternos:

relao;

emocional;

Joo;

atitude

- Forte ligao e

- Afectos

- O Joo apoia

desafiante;

dependncia materna da negativos podem

e protege a

- Tio materno:

parte do Joo;

remeter para a

irm.

figura masculina

- Afectos de rejeio do

necessidade de

de referncia

Joo associados ao

separao

para o Joo,

desejo de transgresso

emocional do

embora no

do espao materno;

espao materno

mantenham um

- Joo: elemento da

por parte da irm.

contacto

famlia que carece de

frequente.

maior proteco.
Elevada atribuio de
sentimentos de
incompetncia/fraqueza
ligados a dificuldades
em lidar com as
adversidades e na
adaptao social.
Mariana

- Idealizada;

- Idealizada;

Pais:

Pais:

- Prxima;

- Prxima;

- Afectiva;

- Carente;

- Culpabilizada;

- Carinhosa;

- Rivalidade

- Necessidade de

- No tem pacincia;

- Sente-se menos

fraterna por

agradar e de

- A me est doente;

valorizada por

parte da

ateno

- Mariana: estabelece

parte do irmo.

Mariana.

constante.

uma forte dependncia

- Culpabilizao;

emocional consigo.

- Irmo:

Uma das figuras mais

dificuldades na

dependentes e que

adaptao social e
388

carecem de maior

na gesto dos

proteco na famlia.

conflitos com os
outros.
Preguioso.

Gabriel

- Satisfatria;

- Fortemente

Pais:

Pais:

- Correspondida;

desvalorizada e

- Rivalidade

- Av paterna:

- Culpabilizada;

insegura;

fraterna;

uma segunda

- Forte dependncia

- Irmo: falta de

- Irmo:

me;

emocional entre me e

apoio me.

provocativo e

- Av e tio de 40

filho;

Atitude punitiva e

pouco

anos paternos:

- Desejo de proteger o

agressiva;

tolerante para

muito prxima;

Gabriel.

- Conflitos

o Gabriel.

- Avs

acentuados

maternos: no

associados a uma

lhe fazem todas

dificuldade na sua

as vontades

gesto por ambas

gosta de estar

as partes, com

com eles na

irritabilidade

quantidade

emocional no

certa.

irmo e
dificuldade no
controlo dos
impulsos
agressivos por
parte da me.

Figura Materna
Caso

Relao com a Famlia de Origem Materna

Relao com a Famlia


de Origem Paterna

Tom

- Idealizada;

- Sente-se pouco

- Pouca autonomia emocional;

valorizada;

- Av materna: relao prxima e dependente. Relao - Tia paterna (esposa do

Isabel

mais satisfatoriamente correspondida;

tio): atribui-lhe

- Av materno: dependente dos cuidados da me,

sentimentos de

389

podendo remeter para uma desvalorizao do av;

incompetncia/fraqueza;

- Tio materno: rivalidade fraterna, carncia de apoio e

- Av paterna: apenas

desvalorizao por parte do tio;

recebe afectos

- Tia materna (esposa do tio): desvalorizao por parte

agressivos da av, no

da tia;

se sente aceite.

- Pais: av permissiva para os netos, estimula pouco a


autonomia.
Joo

Percepo muito distinta das suas figuras parentais:


- Av materno: fraco envolvimento emocional.
Idealizada quanto aos afectos positivos recebidos por
parte deste;
- Av materna: muito prxima e dependente. Desejo
da av prolongar a relao de dependncia com a me.
Relao conflituosa pelos sentimentos de rejeio e
agressivos emitidos pela me atravs do desejo de
separao e maior autonomia emocional. Relao com
av: autoritria, pouco afectuosa, punitiva, insegura e
depreciativa antes fazia comparao para os aspectos
negativos.

Mariana

- Av materno: prxima, carinhosa e correspondida. O

Av paterna: menos

av materno mantm uma dependncia emocional face valorizada por parte da


me, necessitando da sua proteco. A me sente-se

av. A av sentida

culpabilizada;

como punitiva, ainda

- Tio materno: sente-se desvalorizada.

que apoie a me. Um


dos elementos da
famlia mais
dependentes e que
necessitam de maior
proteco.

Gabriel

- Av materna: forte envolvimento emocional positivo


correspondido com sentimento de dependncia mtua,
idealizao e desejo de proteco da av;
- Av materno: sente-se desvalorizada. Conflitos
associados a sentimentos de insegurana, falta de
390

apoio e punio dirigidos me. Dificuldades na


gesto destes conflitos e no controlo dos impulsos
agressivos por parte da me;
- Tia materna: sente-se desvalorizada. Conflitos
associados dificuldade na sua gesto por ambas as
partes manifesta atravs de irritabilidade emocional,
dificuldades de adaptao social e uma atitude
punitiva na tia paterna, assim como, dificuldade no
controlo dos impulsos agressivos na me. Rivalidade
fraterna.

Figura Paterna
Caso
Tom

Auto-estima

Relao Conjugal

- Elevado grau de neuroticismo, forte

- Valoriza pouco a relao de casal;

bloqueio da agressividade sobre os

- Sente-se desvalorizado;

elementos da famlia;

- Conflitos na relao de casal por m

- Defesas: negao e idealizao.

interpretao das coisas;


- Me: pouco tolerante, insegura e com

Isabel

irritabilidade emocional. Transmite


pouco afecto e erotizao relao;
- Desejo de proteger a me.
Joo

- Baixa;

- Idealiza os afectos positivos emitidos;

- Insegurana;

- Sente-se desvalorizado;

- Sentimentos de inferioridade;

- Conflitos na relao de casal

- Irritabilidade;

associados ao sentimento de

- Culpabilizao;

insegurana e percepo da me como

- Dificuldades em lidar com os

uma figura dominante e punitiva,

problemas;

podendo sentir-se inferiorizado e

- Elevado grau de neuroticismo pela

castrado, submetendo-se ao matriarcado

forte negao da expresso de

familiar.

agressividade sobre os membros da


famlia e recurso idealizao;
- Hiptese de funcionamento
depressivo.
391

Mariana

- Positiva;

- Idealizada;

- Culpabilizao face percepo de

- Me: punitiva, com irritabilidade

uma diminuda disponibilidade e apoio emocional e com dificuldades em lidar


famlia;

com os conflitos, resultando em

- Elevado grau de neuroticismo;

insegurana na relao de casal.

- Defesas: negao e idealizao.

Fortemente dependente. A figura que


mais carece de proteco,
transparecendo uma fragilidade
emocional elevada.

Gabriel

- Baixa;

- Sente-se pouco valorizado;

- Sentimentos de inferioridade;

- Prxima;

- Culpabilizao;

- Carinhosa;

- Irritabilidade emocional;

- Conflitos na relao de casal

- Desajustamento social;

associados dificuldade na sua gesto e

- Forte dependncia;

irritabilidade emocional em ambas as

- Carece de proteco;

figuras parentais;

- Desejo de obter uma maior

- Me: punitiva e carente de proteco.

autonomia emocional;
- Defesa: negao.

Figura Paterna
Relao da
Caso

Relao Pai/Criana

Relao

Relao

Criana com

Pai/Irmo

Fraterna

Outras Figuras
Relevantes

Tom

- Idealizada;

Pais:

Pais:

- Correspondida;

- Prxima;

- Relao com o

- Tom: pouco tolerante

- Rivalidade

av materno:

frustrao,

fraterna;

atitude submissa

deprimido e passivo.

- Tom: mais

e passiva do

- Pais: o Tom sente o

dependente da

av, provocao

pai punitivo temendo a

proteco

e desafio da

repreenso dos seus

materna e tende

autoridade do

erros.

a proteger a

av no Tom.

392

Isabel

Joo

Mariana

- Idealizada;

irm;

Pais:

- Correspondida;

- Isabel: menos

- Contacto fcil;

- Isabel: contacto fcil e

dependente,

- Sedutor;

sedutor com o pai.

defende-se

- Necessidade de

Muito reservada e

sozinha, mais

agradar;

receosa face atitude

astuta.

- Forte angstia

firme do estilo parental

de separao

do pai;

mesmo de

- Pais: a Isabel

adultos com os

estabelece apenas com

quais no tem

o pai um discurso

contacto

imaturo para a idade.

frequente.

- Prxima;

- Pouco

Pais:

Pais:

- Idealizada;

envolvimento

- Rivalidade

- Avs paternos

- Culpabilizao;

afectivo;

fraterna no Joo; e maternos:

- Dificuldades em lidar

- Afectos

- O Joo apoia e

atitude

com os conflitos;

erotizados;

protege a irm.

desafiante;

- Pai: autoritrio e

- Dependncia

- Tio materno:

punitivo para o filho;

afectiva.

figura masculina

- Joo: valoriza e

de referncia

investe na relao com

para o Joo,

o pai, identificando-se

embora no

com a figura paterna no

mantenham um

sentimento de

contacto

incompetncia/fraqueza.

frequente.

- Idealizada;

- Idealizada;

Pais:

Pais:

- Mariana: atitude

- Irmo:

- Afectiva;

- Carente;

sedutora e de rivalidade

dependente.

- Rivalidade

- Necessidade de

pela ateno do pai.

Necessita de

fraterna por

agradar e de

Emocionalmente

proteco.

parte da

ateno

Mariana.

constante.

dependente. Carece de
proteco.
Gabriel

- Idealizada;

- Correspondida; Pais:

Pais:

- Culpabilizao;

- Satisfatria;

- Av paterna:

393

- Rivalidade

- Forte investimento por

- Irmo: deveria

fraterna;

uma segunda

parte do Gabriel

prestar mais

- Irmo:

me;

podendo constituir-se

apoio e

provocativo e

- Av e tio de 40

como o modelo de

proteco

pouco tolerante

anos paternos:

identificao sexual

famlia.

para o Gabriel.

muito prxima;

masculino para o filho;

- Avs

- Gabriel: forte

maternos: no

dependncia. Carece de

lhe fazem todas

proteco.

as vontades
gosta de estar
com eles na
quantidade
certa.

Figura Paterna
Relao com
Caso

a Famlia de

Relao com a Famlia de Origem Paterna

Origem
Materna
Tom

Isabel

- Pais: av

- Av paterna: elevada dependncia emocional face a esta figura.

permissiva

Desejo de a proteger. percepcionada como rgida, autoritria,

para os netos,

emocionalmente independente, exigindo receber mais afecto do

estimula

que aquele que disponibiliza famlia;

pouco a

- Tio paterno: elevado grau de envolvimento afectivo, depende

autonomia.

muito desta figura. Sente-se desvalorizado;


- Tia paterna (esposa do irmo) e primos gmeos (sobrinhos do
pai): idealizada e pouco correspondida.

Joo

- Culpabilizao face autonomizao decorrente da sada de


casa dos pais, remetendo para dificuldades acentuadas no
processo de separao/individuao na relao com a av;
- Av paterna: dependncia;
- Av paterno: relao autoritria, pouco afectuosa e assente na
falha de valorizao narcsica no atingi o que o meu pai quis;
- Actualmente os avs paternos encontram-se em processo de
394

divrcio e o pai no est a lidar bem com esse facto.


- Av paterna: idealizada. Sente a av punitiva ainda que

Mariana

emocionalmente dependente do pai;


- Tia paterna: idealizada. Menos significativa do ponto de vista
do envolvimento emocional. Associa sentimentos de
fraqueza/incompetncia tia.
- Av paterna: relao negativa, insegura e conflituosa. Sente-se

Gabriel

desvalorizado e pouco apoiado/protegido pela av;


- Tio paterno de 40 anos: relao satisfatria. Dificuldades na
gesto dos conflitos por parte do tio. Rivalidade fraterna.

Criana
Caso
Tom

Auto-estima

Relao Me/Criana

- Insegura;

- Fantasias edipianas;

- Culpabilizada;

- Forte idealizao;

- Emocionalmente dependente

- Elevado grau de dependncia;

de ambos os pais, com

- Sente que a me centra a sua ateno nele,

destaque para a figura materna;

seguindo-se a irm e, por ltimo, surge o pai

- Mecanismos de defesa:

com pouca indulgncia materna;

idealizao, evitamento,

- Desejo de autonomizao da me;

recalcamento, negao e

- Desproteco;

formao reactiva.

- Carncia;
- Funo de apoio precria, necessitando a
prpria me de um auxiliador na sua funo
materna e de conteno.

Isabel

- Insegura;

- Desejo de agradar me;

- Forte dependncia das figuras

- Procura da proteco e indulgncia materna;

parentais, nomeadamente dos

- Forte idealizao e dependncia emocional da

cuidados e proteco maternos;

me;

- Mecanismos de defesa:

- Afectos negativos recebidos da me;

deslocamento, idealizao,

- Me: chateada, triste, aleijada, dependente.

formao reactiva, negao,

Centra a sua ateno apenas nos filhos.

evitamento e recusa.
Joo

- Baixa;

- Me: punitiva, autoritria e pouco disponvel


395

- Sentimentos de inferioridade;

para as suas necessidades afectivas.

- Pessimismo;
- Insegurana;
- Indeciso;
- Auto-exigncia;
- Culpabilizao;
- Dependente e carente da
proteco/apoio/ateno
parental, com poucos recursos
internos para se defender;
- Mecanismos de defesa:
mania, evitamento, formao
reactiva, negao,
racionalizao,
intelectualizao,
sobreinvestimento da realidade
perceptiva e recusa. Grau
acentuado de neuroticismo.
Mariana

- Baixa;

- Culpa;

- Sentimentos de inferioridade;

- Carncia;

- Culpabilizao;

- Abandono;

- Tendncia regressiva: atitude

- Insegurana;

egocntrica e dependente

- Aspectos fbicos e agressivos num contexto

procurando valorizar-se atravs regressivo que pode remeter para a relao prdo forte desejo de proteco

genital com o materno;

materna e de ateno por parte

- Falha narcsica acentuada;

de ambos os pais;

- Angstia depressiva;

- Falha narcsica acentuada;

- Me: dependente. Rivaliza com a me pela

- Grau considervel de

ateno do pai.

neuroticismo;
- Mecanismos de defesa:
idealizao, recusa manaca,
negao, evitamento, formao
reactiva e recusa.
396

Gabriel

- Baixa;

- Idealizada;

- Tristeza;

- Pouco frustrante;

- Culpa;

- Fortemente investida por parte da figura

- Atitude egocntrica e

materna, podendo associar-se ao desejo de

regressiva pelo desejo

manter a dependncia emocional com o

acentuado de proteco

Gabriel;

materna e de ateno por parte

- Me: punitiva e a figura dominante da

de ambos os pais;

famlia. Rivaliza com esta pela

- Elevado grau de

ateno/proteco do pai.

neuroticismo;
- Defesas: negao,
recalcamento, evitamento,
formao reactiva, idealizao
e recusa manaca.

Criana
Relao da
Criana
Caso

Relao Pai/Criana

Relao Fraterna

com
Outras
Figuras
Relevantes

Tom

- Forte idealizao;

- Sentimentos de

- Desejo de aproximao e ateno

inferioridade face irm;

do pai;

- Rivalidade fraterna,

- Dependncia emocional face ao pai transmitindo o desejo de

Isabel

que no supera a relao dependente

obter a ateno/proteco

que mantm com a me;

exclusiva dos pais,

- Pai: pouca pacincia e agressivo.

sobretudo da me.

- Valoriza pouco a relao;

- Rivalidade fraterna;

- Av

- Insegurana;

- Sente-se protegida pelo

materno:

- Desproteco;

irmo.

autoritrio e

- Na prova PN o imago paterno


associado funo de alimentar e ao
397

punitivo.

nascimento, realizando uma inverso


dos papis parentais.
Joo

- Pouco valorizado e correspondido

- Prxima;

por parte do pai face aos seus

- Afectuosa;

desejos;

- Forte rivalidade fraterna;

- Pai: autoritrio e pouco disponvel.

- Sentimento de

Assegura uma funo de apoio

inferioridade face irm;

importante para o Joo. Mais

- Com a irm disputa a

dependente que a me, beneficiando

proteco parental,

da proteco materna.

sobretudo da figura
materna.

Mariana

- Idealizada;

- Forte rivalidade fraterna

- Idealizada;

- Afectos erotizados;

intensificada pela vivncia

- Tia e av

- Pai: assegura a funo de apoio e

carencial na relao com o

paternas:

proteco, todavia, no proporciona

materno e pelo desejo de

afectuosas e

a conteno necessria para que as

uma aproximao exclusiva punitivas;

angstias da Mariana sejam

me.

Av

ultrapassadas. Sente a relao menos

paterna:

valorizada por parte do pai. Sente o

dependente,

pai punitivo e pouco disponvel.

com quem
rivaliza pela
ateno do
pai.

Gabriel

- Idealizada;

- Sente-se desvalorizado

- Forte investimento positivo na

por parte do irmo;

relao;

- Rivaliza com o irmo face

- No se sente correspondido,

ao desejo de ocupar um

sentindo-se pouco valorizado pela

lugar prximo e

figura paterna;

privilegiado na relao com

- Pai: punitivo. Figura protectora e o

a figura materna, obtendo a

modelo de identificao do Gabriel.

sua proteco exclusiva.

398

Caso
Tom

Organizao Familiar
Figuras parentais:
- Relao emocionalmente dependente e uma fraca autonomizao das famlias
de origem, sobretudo a me na relao que estabelece com a av materna;
- Figura materna aparentemente deprimida e permissiva;
- Figura paterna assume uma funo parental mais firme e contentora;
- Culpabilizao pelo forte envolvimento no mundo laboral e pela projeco nos
filhos das suas prprias dificuldades;
Tom/Isabel:
- Na presena da me (e da av materna) manifestam uma conduta mais imatura
marcada pelas dificuldades de separao no observada na relao com o pai;

Isabel

- Introjeco da depresso materna atravs da interaco precoce com esta figura


experienciando dificuldades de separao e autonomizao do espao materno
face falha de confirmao/valorizao narcsica, receando a perda do amor do
objecto;
Tom:
- Forte rivalidade fraterna e sentimento de inferioridade face irm podem ligarse ao sentimento de abandono experienciado durante a situao de prematuridade
da Isabel e a projeco da distino forte/fraco pelos pais: o Tom representa a
parte fraca, passiva, sem recursos para se defender e a irm o lado mais forte,
capaz de se defender.

Joo

Figuras parentais:
- Figura materna flica, dominante;
- Figura paterna passiva com afectos que transmitem a vivncia de um sofrimento
depressivo;
- Fraca autonomizao emocional das suas figuras parentais, transferindo para a
relao com o Joo os modelos de identificao interiorizados na relao com
estas figuras assentes em relaes pouco afectuosas, autoritrias, punitivas e
inseguras, projectando, assim, as suas prprias falhas narcsicas e a vivncia de
culpa na relao com o Joo;
- Forte envolvimento nas questes de ordem racional valorizando a carreira
profissional e as competncias acadmicas do Joo em detrimento dos afectos,
repercutindo-se no empobrecimento da relao conjugal e na relao pais-filho;
Joo:
399

- Relao prxima com a figura materna;


- Ausncia de valorizao narcsica por ambos os pais experienciada
inconscientemente como uma falha, uma castrao no lhe permitindo
autonomizar-se emocionalmente da relao com o materno, com risco de perda
do amor do objecto;
- Identificao com um pai aparentemente deprimido e tambm castrado pode
reenviar para a angstia depressiva no Joo;
- Acentuada vivncia de rivalidade fraterna e inferioridade podendo associar-se
distino fraco/forte entre o Joo e a irm projectada pelos pais, onde o Joo
figura como o elemento fraco, inseguro, sem recursos internos para se defender e
a irm o elemento forte e seguro.
Mariana

- Depresso materna afecta a qualidade das relaes familiares, com nfase na


relao conjugal e na relao me/Mariana;
- Falecimento da av e tia maternas da Mariana;
- Dificuldades econmicas ligadas ao desemprego do pai;
Mariana:
- Numa fase precoce do desenvolvimento parece ter-se identificado depresso
da me atravs da falha de confirmao narcsica primria que a fizesse sentir
valorizada na experincia de individuao e autonomia, pelo risco de perda do
amor do objecto organizando, deste modo, o falso-self manifesto atravs da
avidez relacional, contacto fcil e sedutor e pela necessidade marcada de agradar,
como tentativa de colmatar a falha narcsica;
- Sentimento de insegurana, culpa, carncia, abandono e rivalidade fraterna
acentuado pela distino materna entre a Mariana e o irmo, projectando a parte
boa no irmo e a parte maligna na Mariana;
Pai:
- Assegura a funo de apoio e proteco contudo, no proporciona a conteno
necessria para que as angstias da Mariana sejam ultrapassadas;
- Sucessivas ausncias por motivos de trabalho resultando num menor apoio
famlia e, em concreto, me e no assegurar da sua funo parental.

Gabriel

Figuras parentais:
- Conflitos acentuados na ordem da dependncia e falhas de valorizao narcsica
na relao com as suas famlias de origem, culminando nos consumos de droga
como um substituto simblico do objecto de amor perdido;
400

- Figura materna dominadora e flica, identificando-se ao matriarcado da sua


famlia de origem;
- Figura paterna submetida ao matriarcado familiar demitido-se da sua funo
parental;
Figura materna:
- Deslocamento e tentativa de reparao da relao com o irmo resulta numa
relao dependente, idealizada e pouco frustrante com o Gabriel, no o
valorizando narcisicamente;
Gabriel:
- Experiencia a separao do imago materno como uma possibilidade de perda do
amor do objecto, permanecendo dependente do poder flico materno;
- Forte dependncia na relao me/Gabriel acentuada pela clivagem materna
entre um filho bom associado ao Gabriel e um filho problemtico, o irmo.

Conflito Edipiano
Aceita a
Caso

Resoluo

Diferena

Diferena

Sexual

de

Superego

Triangula

Excluso

-o

do Casal

Geraes
Tom

No

Parental

Reconhece Reconhece

Integrado

Acede

No

No

Reconhece

No

Integrado

No acede

No

ultrapassado

parcial

reconhece

Reconhece Reconhece

Integrado

Acede

No

Reconhece Reconhece

Integrado

Acede

No

Reconhece Reconhece

Integrado

Acede

No

ultrapassado
Isabel

-mente
Joo

Parcialmente
ultrapassado

Mariana

No
ultrapassado

Gabriel

No
ultrapassado

401

Conceito
Caso

de

Ncleo
Problemticas da Criana

CDI

Depressivo

Grupo 2

Ncleo

(nvel

depressivo

intermdio de

primrio

pouco frustrante com a figura materna;

sintomas de

(anal)

- Vivncia carencial, desprotegida e de

depresso)

Famlia
Tom

Integrado - Desejo de separao da figura


materna;
- Relao dependente, idealizada e

precariedade dos suportes;


- Culpabilidade onde a agressividade
dirigida a si;
- Falha narcsica;
- Angstia depressiva;
- Dificuldades no processo de
separao/individuao.
Isabel

Integrado - Relao dual com a figura materna,

Grupo 1

Ncleo

no permitindo a separao emocional

(sujeitos no

depressivo

desta figura;

deprimidos)

precoce

- Vivncia depressiva manifesta no

(oral)

sentimento de desproteco parental,


de carncia oral e inibio da
agressividade;
- Culpabilizao pela introjeco da
agressividade.
Joo

Integrado - Identificao figura paterna;


- Desejo de autonomizao da figura
materna;

Grupo 2

Ncleo

(nvel

depressivo

intermdio de

flico

- Rivaliza com o pai;

sintomas de

- Dificuldades na elaborao dos

depresso)

sentimentos de solido face excluso


do casal parental;
- Ausncia de valorizao narcsica
por ambos os pais;
- Identificao ao pai deprimido;
402

- Castrao e falhas identitrias;


- Sobressai o sofrimento depressivo:
angstia de perda do amor do objecto,
de desamparo, afectos ligados morte,
baixa auto-estima, insegurana, falha
narcsica acentuada, culpabilidade pela
introjeco da agressividade e
dificuldades de mentalizao
(instabilidade psicomotora,
somatizaes).
Mariana

Integrado - Forte angstia depressiva: carncia

Grupo 3

Ncleo

(nvel

depressivo

intermdio de

precoce

insegurana, excluso, abandono e

sintomas de

(oral)

desproteco na relao com as figuras

depresso)

afectiva e falha narcsica acentuadas,


sentimento de desvalorizao,

parentais, sobretudo na relao com a


figura materna onde se observam
aspectos fbicos e agressivos num
contexto regressivo, acompanhado de
culpabilidade pelo retorno da
agressividade/punio sobre si;
- Rivaliza com o pai;
- Dificuldades de separao da figura
materna, ainda que, expresse o desejo
de autonomizao emocional;
- Desejo de uma aproximao
exclusiva figura materna.
Gabriel

Integrado - Desejo de autonomizao da figura

Grupo 2

Ncleo

(nvel

depressivo

intermdio de

primrio

aproximao exclusiva figura

sintomas de

(anal)

materna e a rivalidade face figura

depresso)

materna;
- Sobressai o desejo de uma

paterna;
- Dificuldades no processo de
403

separao/individuao;
- Culpabilidade pelo retorno da
agressividade sobre si;
- Falha narcsica marcada, vivncia
carencial e desprotegida, de abandono
e solido face ao confronto com a
angstia de separao e depressiva
recorrendo s defesas antidepressivas
na linha da recusa manaca para lidar
com este conflito.

404

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