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(Silvio Macedo) Paisagismo e Paisagem - Introduzindo Questões

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PAISAGISMO E PAISAGEM

INTRODUZINDO QUESTOES

As qucstGes sobre paisagismo e paisagcm sac emergentcs. Na


atualidade as drasticas transforma~oes impressas nos tres ultimos
seculos sobre 0 planeta criaram e recriaram lugares, eliminaram
importantes e curiosas formas de vida c extinguiram recursos
naturais significativos.

Ern urn contexto de expansao populacional, em especial a urbana, tipica deste


periodo, os conl1itos sociais sac inumeros. Existe uma crise real de qualidade de
vida que perpassa por praticamcnte todos os aglomcrados urbanos c cada vez
sao maiores as necessidades de espa~os para a produ~ao agricola, a gera9ao de
energia, a capta9ao de aguas, etc., enfim para a produ9ao de insumos a socie-
dade humana,

Neste universe de transforma90es 0 Paisagismo surge como uma forma de co-


nhecimento e um instrumento indicador de a90cs que procuram dar algumas
respostas que objetivam contornar uma serie de problemas detectados nas dife-
rentes fonnas de organiza9ao espacial produzidas: Seriam estes por destrui9ao e
elimina9ao de vegeta9ao nativa ou replantada, a elimina9ao de elementos cons-
truidos "caras" a comunidade, como velhos e queridos ediffcios, a degrada9ao
dos solos e outros mais.

Na forma que hoje conhecemos 0 paisagisIllo surge, ainda a nlvel embrionario,


na InglatelTa, do infcio do see, XIX e se consolida nos Estados Unidos da se-'
gunda metade deste seculo, em especial, devido ao trabalho dos integrantes do
denominado "Park Movement", encabe9ados por Olmestead. A partir do final
do sec. XIX, surgem ainda as primeiras escolas de paisagistas e a profissao se
consolida pelo pais.

No Brasil, 0 trabalho de arquitetos paisagistas, ainda que isolados surge a partir


do meio do mesmo seculo e profissionais como Glaziou, no Rio de Janeiro. tra-
balham para a corte em trabalhos como 0 Pa90 Imperial e 0 Campo de Santana.
No see. xx v:lrios profissionais surgem no merc:.ldo de trabalho produzindo di-
vers:.lS e importantes obras. em especial de carateI' urbano. C0l110Bouvard (Sao
Paulo - 19L1). Dieberguer (S:IO Paulo - 1910-1(40). Zimber (Sao Paulo - 1910-
1(30) e outros mais. sempre atendendo ;IS solicit:.l~Oes do poder publico - pra~as.
parques e houlemu/s ou de particul:u'es (jardins e p:u'que de residcncias).

Nos anos 30 e 40. Roberto Bude Marx inlroduz seus prillleiros lrabalhos. revo-
lueionando 0 modo de projelar os eSIXl\OSlivres principallllentc as pra~as e jar-
dins. confcrindo a cles forlllas e volumes derivados de sua expericncia C0l110ar-
lista pl:\slico. Pode-se consider:u' que surge pela primeira vez no pais uma forma
tipicamente brasileira de projel:.lr em paisagismo, que apesar de muito pessoal
do au lor. que revoluciona os modos de conce~ao plastica dos espa~os livres c
cria-se uma escola projcluaI. que se fundamenta enlre outros princfpios no usa
extensivo da vegeta\ao brasilcira (antes prcterida nos projetos dos bons arquitc-
tos paisagistas). na utiliza\ao de formas organicas em pisos de mosaico portu-
1'010 1 ' Vista acrea de gucs e no trabalho com a agua.
Sao Paulo, no caso
° Yale d,> 1;0 Ticlc
no S~lI ll\.'(ho
l1lCll'op(llil:UHl, area
itllcll~all\ellll'

prol'L'~~;Hla de
IlHld() a ~l' adeqll:u
ao usn humano

1'010 3 - Os projclos conccbidos por Burle Marx c sua cquipc conferelll lima marca especial a cada
Foto 2 _ 0 Campo de Santarb. atual pra"a da l{epuhlica na cidade do Rio dc J anciro ainda manttm espa,o. No caso. os pisos em 11l0saico. de curvas sinuosas da pra"a do Shopping Wcsl Plaza Clll Sao
inlacto seu antigo descnho. COIllcantciros sinuosos. an'orcdos. lagos c gramados tfplcos do cclcllsmo no
Paulo
paisagislllo hrasilciro
Os princfpios adotados por Burlc Marx oricnlam a partir dos :1Il0S50 ~ ()() 1mb
uma nova gcra~ao de arquitelos paisagistas que se forma em especial nos esta-
dos do Sui do pafs (Sao Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sui) I. A aplica~ao dos prcssupostos cspecificados no item antcrior se da da seguinte
forma nos dois nfveis apontados:

I. Nos processos de ocupa~ao c aliena~ao do terril6rio. estabelecendo-se crile-


Pode ser entendido como "um processo conscientc de manejo. plancjamcnto c
rios de onde e como urbanizar ou ocupar c linhas de implemcnla~ao deslas for-
mudan~a ffsica da paisagcm envolvendo 0 seu manejo e 0 projclo t1~ lugares
mas de assenlamenlo.
(aqui considerados como segmentos especfficos de uma paisagem total)2".
Esta defini~ao de John Motloch praticamente explicita a postura mais atual da Basicamente sao trabalhos executados em equipe e que visam ao eSlabelecimen-
A.SLA - American Society of Landscape Architecls. ESla, cm 1983. aprescnla lO de pIanos de manejo, areas de prole9ao ambiental, pianos e seus zoneamentos
o lrabalho do paisagista como "A profissao que uliliza princfpios artfsticos e ci- de carater paisagfstico/ambiental, parques, areas de conserva9ao e preserva9ao,
enlfficos na constru~ao de ambienles3u• ESla poslura sucede-sc a oulras anterio- polfticas de atua~ao, etc.
res. que atribufam ao paisagismo exc\usivamente 0 caraler dc arlc. conferindo
depois de de cad as 'um cadter tccnico a profissao. portanlo menos subjctivo pe- Quanto maior for a escala de atua~ao, 0 porte do territorio a ser atingido. mais
ranle a sociedadc. gencricas serao as posturas a serem adoladas, que passam a ler urn carater indi-
cativo para polfticas gerais e para pl:mos e interven~5es seloriais e ponluais. que
Como universo de lrabalho 0 paisagista atua em dois nfvcis diSlintos:
terao scmpre como objetivo central a conslru9ao ou manulen~ao de paisagens.
_ sobre os espar;os lin'es de urballi:ar;ao - na escala de um tcrrit6rio. dc uma
rcgiao, sugcrindo e indicando fonnas de avalia~ao e atua~ao. 2. Dcnlro das estruluras urbanas tado 0 trabalho se alicer9a na figura dos de-
nominados espa~os livres de edifica~ao, que sao objetos cenlrais de trabalho do
_ sobre os espar;os Ii\'res de C(/ificar;ao - na escala da cicladc. utilizando-os paisagista5. Estes espa~os san tados aqueles nao contidos dentro das edifiea~oes
como urn inslrumcnlo para a discussao da configura9ao C ,da qualidadc de vida e englobam ruas, patios, largos, pra~as. parques, lerrenos baldios. etc.
urbana.
As atividades do paisagista san apoio direto a pianos urban os. projelos de dese-
Tanto em uma, como em outra escala dc abordagem. 0 trabalho com a paisagem nho urbano e pralicamentc definem crilerios e posturas de projeto para tais es-
visa a cria9ao de lugares, espa90s humanos para urn fUluro proximo au dislanle. pa90s.
Esta visao de trabalho com a paisagem esla ligada a uma conceitua~ao do que
ou quais seriam os lugares ideais de vida. de moradia da socicdade Clll um de- Todo 0 enfoque sc centra sobre a conslilui9ao morfologica destes lugares e seus
tcrminado espa90-lempo. crilcrios dc organiza~ao e distribui~ao.

Cada proposla de interven9ao ou alua~ao, eada projeto dcvc enlao. dcnlro da No Brasil a a~ao do paisagismo eSlll em geral reslrita ao projeto das denomina-
otica do paisagisla respeitar tres princfpios basicos quc seriam: das arcas "verdes" como jardins. pra9as. parques. cal~adoes e na coiabora9Jo
csporadica em pIanos diretores ou dc manejo ambient a\. scndo a forma~ao b:lsi-
a) a observa9ao e a procura ~_~manutcn~ao da dinamica ccologica do lugar: ca do profissional. advinda de areas diversas como agronomia. arquitetura e en-
b) 0 alendimento(pr~06ta';iO aSI~?c\isS~dades da P?~u.\a9ao" l?nlO elll tcrmos gcnharia floresta\.
qualilalivos (em lermos __
~~_f-!~~r~o amblenlal, acesslbllIdade a agua IImpa, elc.)
como quanlo funcionais: l. Por este falo seu cnlcndimenlo social esla cxlremamente vinculado
jardim, do lrabalho com a vegeta9a06.
a ideia do
c) obedecer. criar e recriar ladroes eSlcticos adequados ~Ipopula~ao local (fulura
ou presenle) e ao lugar. Ii
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1'0105 . Visla de campos cultivados no Rio Grande do NOI1e. uma paisagem buc6lica. mas allamente
processada hit dCcadas e por gel~\,(ies para a produ~ao ag.ricola

OUlras interpreta<;oes sobre a paisagem confirmam de urn modo direlo tais


posiC;Ocs:

"A paisagell1 co rellexo da dinamica dos sistemas sociais e naturais ... e varia
de acordo corn as caracteristicas fisiogriificas e ambientais e corn as inlerven-
1'010~ . 0 espa,o fora das editica,6es . denominado de espa,o livre. VaI.io ou de qualquel' oull'a forma·
c;oes humanas sobre ela implcmenladas"s. sendo estas posi<;oes rcfon;adas pOl'
no caso llllla l1Ia do bairro de lIigien61XlIis em Sao !'aulo Motloch que afirma que "no entendimento conlemporanco paisagem C Ulll lcrmo
abrangenle. que inclui 0 que se denomina espac;os naturais e urbanos"'J.

Para uma compreens:io e avaliac;:io mais apui'ada da paisagem. denlro de uma


vis:io sistcmica se cosluma dividi-Ia em algumas calegorias de elementos. que
Constilui-se no univcrsb de trabalho do paisagista e de falo uma eSlrutura na associados entre si. dentro do cilado processo dinamico de mUla<;:io. permiteln
qual esle s6 em siluac;6es especiais alua. Possui diversas acep<;()es entre as quais ao estudioso a criac;:io de mClodos e lccnicas de avaliac;:io.
adotamos a seguinle:

Paisagem - a expressao morfol6gica em um delerminado tempo. do processo


constante de ac;ao dos seres vivos sobre os diversos pont as do planela associados
ao movimento conlinuo das diferentes estruturas geol6gicas e aguas.

A paisagem nao e estatica e pode ser considerada como um sistema compkxo de


relac;oes que para ser compreendida necessita de muilo mais infonna<;oes que 0
mere olhar nos pode oferecer7.
- Comunidades de seres vivos: podcndo-sc no casu criar urn subilCIll cspccial (7) "Paisage~n nao ~ est[llica, pois todos os seus elementos constituintes sao possiveis de
para a comunidade humana, seus vefculos e instiluic,:ocs 10. t.1 ,Ulslormaeroes propnas, como tambcm se altcram mutuamcntc e um territ6rio c
lormado por um nUI.nero infinito de paisagcns, parcialmcnle justapostas". In: Marx,
Cada um destes elementos s6 pode entflo ser dissociado em processos iniciais de Roberto B. AI'/e e Parsagem, p. 55 e 57.
cnlcnclimcnto, sendo entao posterionnentc reassociados cntrc si. (8) LAURIE, Michael.. An introdllction to landscape architecture. p. I.
(9) VIde SANTOS, Milton. Espm;o e metodo.
(10) idem.
ESla divisao direciona as formas de atuac,:ao do paisagista, que ao claborar sobre
(II) Vide LYLE. John. Design with /lIlman ecosystens.
qualquer lugar, tem obrigatoriamente que considerar tais elementos nas suas
difcrcntes formas e niveis de interac,:ao, de modo a alcanc,:ar os princfpios ex-
plicitados anteriormente (vide item Paisagismo p. 3)

Nao se privilegia no estabelecimento de pianos e projetos somente eslc ou


aquele elemento, como agua ou solos adequados no estabelecimento dc pIanos e
projelos paisagisticos, mas sim a dinam ica de cada lugar e, suas possibilidades PELLEGRrNO, Paulo R. A paisagem possive!. In: Paisagem e 1\l1Ibiente _ Ensaios II/ ')1
de interac,:ao com 'novas estruturas espaciais 1 '. ed. Sao Paulo: FAUUSP, 1991. ,-

Como resultado. as leenieas paisagfslicas de analise e avaliac,:ao de lugares c su- LEITE, Maria Angela F. P. NOI'os mlores: destrtlil;iio Oil desconstrtl~iio? Sao Paulo,
1992. Tese (Doutorado) - FAUUSP.
as paisagens. retletern em suas estruturas este tipo dc enfoque, como sc podc ob-
servar por excmplo nos trabalhos mais reeentes dc John Lyle e seus seguidorcs.
LAURIE, M. An introduction to landscape design. NelV York: Van Nostrand Reinhold
1991. '

(I) Vide MACEDO, Silvio S. A Vegetar,:ao como elcmento de projeto. In: /'o;.I"o,l;e/lle
MACEDO, Silvio S. Paisagem, Urbani:af:iio e Litoral - do ddell a cidade. Sao Paulo,
1993. Tcse (Livre-Doccncia) - FAUUSP.
A/Ilbien/e - Ensaio.l' IV, Sao Paulo: FA UUSI', 1992, p. 11-41.
(2) Vide MOTLOCH. Introduction to land.l'C(l/ie design. p. 2.
(3) Para maiores detalhes e diseussao das posturas diferentes da ASLA consultar: MAGNOLI. Miranda M.E.M. Notas de allia e seminarios das disciplinas AUP-J10 e
AUP-:!.:!.:!..Sao Paulo: FAUUSp.
LEITE. Maria Angela Faggin Pereira. NO\'os \'alores: de.l'truir;iio ou de,lcoII.I·lrIIS·(io:'p.
36-40.
(4) "A forma pcla qual a paisagem c projetada e construida rellele uma c1aboraq:io
filos6fiea e cultural, que resulta tanto da observaqao objetiva do ambientc. quanlo cia
expericncia individual ou eoletiva em rclaqao a cia". Em LEITE, Maria Angela F. 1'.
1\'0\'0.1'I'alores; destrui~iio 011descolIstrll(;iio:> p. 23.
(5) Vide para maiores eselarecimentos os lexlos produzidos pela Profa. Ora. tvliranda M.
~'1agnoli, que desenvolveu toda uma concciluaqiio sobre 0 assunlo, em especial na sua
tese de livre-doecncia, na qual dcdiea lun capitulo especial para 0 assunto.
(6) As pr6prias posturas divulgadas por B uric Marx, nosso mais importante paisagisla
nos reporlam freqUentemcnte a figura do jardim, como 0 foco e a panaceia dos
problemas dos assentamentos humanos.
"A larga e muito ampla expericneia do meu lrabalho de paisagista, criando, reali/.ando c
conservando jardins, parques e grandes areas urbanas. permile-lIle agora fonnular a
conceituaqao que faqo do problema jardim, como s;1I01li11l0de adequl/\:iio (grifo nosso)
do meio eeol6gico para atender as exigcneias naturais da civilil:a<;iio. Ill: Ivlarx, Ro·
berto B. Arte e Paisagem, p. II.

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