CENTRO UNIVERSITRIO FUNDAO SANTO ANDR FACULDADE DE FILOSOFIA, CINCIAS E LETRAS CURSO DE LETRAS

GABRIELA BENATTI GODINHO LIGIA PEREIRA DE ALMEIDA MARIA DE FATIMA DE OLIVEIRA FERNANDES MARILIA VEZZARO NAYARA ELISIA VIEIRA

ESTUDO DO POEMA: VALSA- CECLIA MEIRELES

SANTO ANDR

2012 GABRIELA BENATTI GODINHO LIGIA PEREIRA DE ALMEIDA MARIA DE FATIMA DE OLIVEIRA FERNANDES MARILIA VEZZARO NAYARA ELISIA VIEIRA

ESTUDO DO POEMA: VALSA- CECLIA MEIRELES

Monografia sobre o poema Valsa, de autoria da poetisa Ceclia Meireles, realizado pelas alunas cursistas de Letras do Centro Universitrio Fundao Santo Andr, na Faculdade de Filosofia Cincias e Letras, com a orientao do professor de Literatura Brasileira I; Jos Marinho.

SANTO ANDR

2012

Ao professor de Literatura Brasileira, Jos Marinho.

AGRADECIMENTOS:
Ao professor Jos Marinho que nos direcionou na pesquisa do trabalho, tirando dvidas e compreendendo as nossas necessidades. Ao Centro Universitrio Fundao Santo Andr que nos disponibilizou espao e materiais para a realizao da pesquisa.

"O escritor a pessoa que diz o que muitos sentem e no sabem express-lo. Nossa responsabilidade a de dizer essas coisas com clareza. E h, tambm, essas coisas que nem todas as pessoas sentem, mas que o escritor ensina a sentir" Ceclia Meireles

RESUMO
Este trabalho fala sobre o poema Valsa de autoria da poetisa Ceclia Meireles. Estudamos nesse poema, o tema principal: a Transitoriedade da Vida. Procuramos variaes sobre o assunto abordado citando versos de outros poemas escritos pela mesma autora para melhor exemplificar nosso estudo. Aps abordarmos o tema, desenvolvemos a compreenso e interpretao do poema, com o objetivo de comprovar as nossas pesquisas realizadas em cima do tema escolhido pelo grupo.

ABSTRACT
This coursework broaches the poem "Valsa" written by the poet Ceclia Meireles. We study the central theme of the poem wich is transience of life, and we researched variations about the subject, quoting verses of other poems also written by the authoress to exemplify our studies. After elaborating the main theme, we will lecture about the poem's comprehension and interpretation. All of this to comprove our researches about the topic chosen by the group.

SUMRIO INTRODUO..........................................................................................................9 1 Apresentao do poema.........................................................................................11 2 Estudo do tema do poema.....................................................................................11 3 Parfrase...............................................................................................................15 4 Anlise/ Compreenso do Poema Valsa...........................................................15 4.1 Metrificao.......................................................................................................15 4.2 Forma/ Contedo...............................................................................................16 5 Interpretao.........................................................................................................19 CONSIDERAES FINAIS......................................................................................26 REFERNCIAS BIBLIOGRAFICAS........................................................................27

INTRODUO
O poema escolhido como objeto de estudo deste trabalho Valsa que encontra-se no livro Viagem publicado no ano de 1939. Este perodo bastante significativo na trajetria literria de Ceclia Meireles, visto que esta produo recebeu, no ano anterior, o Prmio de Poesia da Academia Brasileira de Letras. Considerando que antes deste perodo suas publicaes so marcadas por traos neoparnasianos, portanto, no sendo reconhecidos pela autora, nem pela crtica literria. Deste modo, Viagem marca a vida de Ceclia Meireles e inicia-se um perodo de intensa produo literria em que publicou os livros: Vaga Msica, em 1942; Mar Absoluto, em 1945; Retrato Natural, em 1949, entre outros. Neste momento se volta para a Escola Modernista, apresentando caractersticas neosimbolistas, entretanto, desenvolve um estilo prprio, distanciando-se , em certa medida, dos autores que lhe eram contemporneos. Neste trabalho h o estudo da transitoriedade da vida no poema Valsa. Baseando-se em livros, estudo do tema, informaes sobre a vida da autora e suas obras, bem como pesquisa das publicaes realizados por outros estudiosos como Norma Seltzer Goldstein e Rita de Cssia Barbosa, pretendemos explicar e exemplificar o significado da passagem do tempo no poema. H tambm o estudo e a compreenso do poema atravs da parfrase, anlise da forma e contedo e interpretao do mesmo, com o objetivo de comprovar o assunto prevalente; a transitoriedade da vida. Objetivou-se, ento, estabelecer um dilogo desde o tema abordado at as consideraes finais. O estudo divide-se em duas partes: I. Primeira parte: Estudo do tema e transitoriedade da vida do poema Valsa, com citaes de outros poemas, escritos pela mesma autora; Ceclia Meireles, com o objetivo de encontrar contedos, em certa medida, semelhantes. Embasamento terico em escritores como da Norma Seltze Goldstein e Rita de Cssia Barbosa para dialogar com o poema e os acontecimentos da vida da autora. II. Segunda parte: Comprovao do tema atravs do estudo da compreenso do poema ( parfrase, anlise da forma e contedo, interpretao do poema Valsa) bem como as consideraes finais.

10 Analisamos o tema para encontrarmos a mensagem do poema , com a inteno de mostrar como Ceclia Meireles trabalha a transitoriedade da vida, a brevidade da existncia e o significado do tempo.

11

Poema: Valsa Ceclia Meireles

FEZ TANTO luar que eu pensei nos teus olhos antigos e nas tuas antigas palavras. O vento trouxe de longe tantos lugares em que estivemos que tornei a viver contigo enquanto o vento passava. Houve uma noite que cintilou sobre o teu rosto e modelou tua voz entre as algas. Eu moro, desde ento, nas pedras frias que o cu protege e estudo apenas o ar e as guas. Coitado de quem ps sua esperana nas praias fora do mundo... Os ares fogem, viram-se as guas, mesmo as pedras, com o tempo, mudam.

Transitoriedade da vida no poema "Valsa".

O poema escolhida para este trabalho Valsa que se encontra no livro Viagem. Antes vale ressaltar que esta obra, publicada em 1939, marca a trajetria literria de Ceclia Meireles por ter sido premiada pela Academia Brasileira de Letras. Some-se a isto o fato de que a prpria autora considera a relevncia da obra como um resultado de seu amadurecimento pessoal, refletido em suas produes. Portanto, tem-se aqui um novo contexto de produo potica que, no poema Valsa, evidenciado por seu tema principal: a transitoriedade da vida. Ceclia Meireles vale-se de vrios recursos para expressar tal contedo, dentre eles, observase a tcnica com qual o poema foi escrito, que enfatiza o tema por meio de apoios fonticos do verso como rima e aliterao. Quanto ao primeiro, pode ser observado nos versos 10 e 12 do poema, atravs da rima toante mundo e mudam.
9 10 11 12

Coitado de quem ps sua esperana nas praias fora do mundo... - Os ares fogem, viram-se as guas, mesmo as pedras, com o tempo, mudam.

Em relao aliterao pode-se citar como exemplo a repetio do som /S/ que simula a

12 passagem do vento, ressaltando a idia de transitoriedade que o mesmo apia por intermdio de seu movimento. Observe a presena frequente deste som consonantal na primeira estrofe:
1 2 3 4

FEZ TANTO luar que eu pensei nos teus olhos antigos e nas tuas antigas palavras. O vento trouxe de longe tantos lugares em que estivemos que tornei a viver contigo enquanto o vento passava Segundo o livro Literatura Comentada Ceclia Meireles escrito por Norma Seltzer Goldstein

e Rita de Cssia Barbosa, a percepo da realidade na poesia ceciliana se d pela captao sensorial, onde ocorre a transfigurao do real atravs da combinao de duas ou mais sensaes. Essa afirmao confirma-se nos versos cinco e seis:
5 6

Houve uma noite que cintilou sobre o teu rosto e modelou tua voz entre as algas. Ocorre aqui uma sinestesia quanto viso (cintilou) e a audio (tua voz) que transporta o

leitor ao passado antes de introduzi-lo realidade presente. Logo aps a apresentao desta realidade o eu-lrico convida o leitor reflexo quanto transitoriedade da vida. Toda tcnica utilizada por Ceclia Meireles no apenas uma preocupao esttica, e sim, graas ao seu esmero em conciliar a forma com o contedo, um reforo e complemento a este ltimo.

Cano do Efmero e do Eterno

sabido que alguns fatos da vida pessoal da autora influenciaram diretamente sua produo literria, dentre eles, a perda de seus pais, quando ainda criana, e o suicdio de seu primeiro esposo, conferiram-lhe intimidade com a morte e o sentimento de transitoriedade. Estes argumentos so reforados por Ceclia Meireles em entrevista Fagundes de Meneses, na revista Manchete, em 3 de outubro de 1953:
"... Essas e outras mortes ocorridas na famlia acarretaram muitos contratempos materiais, mas, ao mesmo tempo, me deram, desde pequenina uma tal intimidade com a morte que docemente aprendi essas relaes entre o Efmero e o Eterno que para outros constituem aprendizagem dolorosa e, por vezes, cheio de violncia. Em toda vida, nunca me esforcei por ganhar nem me espantei por perder. A noo ou sentimento da transitoriedade de tudo o fundamento mesmo da minha personalidade."

No poema "Valsa" esta noo est fortemente presente nos versos 7 ao 12 quando o eu-lrico retorna ao presente e comunha com o real na medida em que entende que tudo passageiro e, portanto, no h necessidade de se refugiar na iluso. Observe os verbos no presente, aps, a necessidade do real e a noo de transitoriedade:

13
7 8 9 10 11 12

Eu moro, desde ento, nas pedras frias que o cu protege e estudo apenas o ar e as guas. Coitado de quem ps sua esperana nas praias fora do mundo... - Os ares fogem, viram-se as guas, mesmo as pedras, com o tempo, mudam. Pode-se observar o sentimento de transitoriedade da vida em outros poemas da autora:

Motivo (de Viagem) (...) Irmo das coisas fugidias, no sinto gozo nem tormento. Atravesso noites e dias no vento (...) Neste poema nota-se que o eu-lrico, consciente da passagem do tempo, deseja preservar um momento. Encomenda (de Vaga Msica) Desejo uma fotografia como esta - o senhor v? - como esta: em que para sempre me ria com um vestido de eterna festa. (...) No meta fundos de floresta Nem de arbitrria fantasia... No... Neste espao que ainda resta, ponha uma cadeira vazia. A dicotomia efmero / eterno, tambm pode ser observada no poema "5 Motivo da Rosa" extrado do livro Mar Absoluto. Antes do teu olhar, no era, nem ser depois - primavera. Pois vivemos do que perdura, no do que fomos. ( ...) No sou eu, mas sim o perfume que em ti me conserva e resume

14 o resto, que as horas consomem. No poema a seguir, extrado do livro infantil de Ceclia Meireles; Ou Isto ou Aquilo, tambm se pode observar a temtica da transitoriedade e fugacidade da vida, bem como a valorizao das lembranas: As duas velhinhas (...) Uma diz: Como a tarde linda, no Marina? A outra diz: Como as ondas danam, no , Mariana? Ontem, eu era pequenina, diz Marina. Ontem, ns ramos crianas, diz Mariana. (...) T omam chocolate, as velhinhas, Mariana e Marina. E falam de suas lembranas, Marina e Mariana. Outra caracterstica da poesia de Ceclia Meireles a forte musicalidade, na qual o leitor, ao ter contato com o texto produzido, no sabe ao certo se trata-se de poesia ou de cano. A prpria autora afirma ter aprendido a lidar com a perda e a noo de transitoriedade das coisas de forma doce, e a maneira com que ela expressa seus sentimentos tristes um choro, mas to doce que nos parece uma cano. Este argumento reforado pelo contedo dos poemas, que dialogam com a misso de viver, a misso de cantar, a brevidade da vida e a memria dolorida, dentre eles, o objeto deste estudo; "valsa", apresenta esta caracterstica do choro cantando. Os diversos acontecimentos pela qual a autora passou ao longo da vida, conferiram-lhe tal sentimento de nostalgia, a ponto de desenvolver em Ceclia Meireles a capacidade de transformar a dor em poesia, uma poesia cantada. "E a Poeta cantou minuto por minuto de sua existncia. Cantou

15 (...) o tempo para que todos soubessem que tudo passa e que o homem um ser inconstante, passageiro." (Prof. BARRETO DA ROCHA, NELLY)

Parfrase
Primeira estrofe. O eu- lrico diz que a claridade da lua naquele dia f-lo relembrar dos olhos antigos e das palavras antigas de algum. O eu- lrico diz que o vento trouxe lugares em que ele e esse algum j estiveram juntos. O eu- lrico tem a impresso que tornou a viver com essa pessoa enquanto o vento passava. Segunda estrofe. O eu- lrico diz que houve uma noite que brilhou sobre o rosto deste algum e modelou a voz dessa pessoa entre as algas. O eu- lrico diz que desde esse acontecimento mora entre as pedras frias sob a proteo do cu e estuda somente o ar e as guas. Terceira estrofe. O eu- lrico diz que infeliz quem colocou sua confiana nas praias fora do mundo. O eu- lrico diz que os ares passam e que as guas transformam-se. O eu- lrico diz que, com passar do tempo, at mesmo as pedras mudam.

Anlise/ Compreenso do Poema "Valsa" - Ceclia Meireles.

Metrificao.
FEZ| TAN|TO| luar| que eu| pen|sei| nos| teus| o| lhos| an| ti| gos E.R. 13 (2, 7, 13)
1 1 1 1 1 1 1 1 2 2 2 2 2 2 2 3 3 3 2 3 3 3 3 4 4 4 5 5 5 6 3 4 4 4 4 5 5 6 5 4 5 6 6 7 6 7 6 7 6 7 5 7 8 8 8 7 8 8 7 8 8 9 9 9 10 11 12 13 14 9 10 11 12 13 14 9 10 15 16 17 6 7 8 9 10 11 12 13

e |nas| tuas| an| ti| gas| pa| la|vras. E.R. 8 ( 5, 8) O| ven|to| trou|xe| de| lon|ge| tan|tos| lu|ga|res| em| que es|ti |ve|mos E.R. 17 ( 9, 17) que| tor|nei a| vi|ver| con|ti|go en|quan|to o| ven|to| pa|ssa|va. E.R. 14 ( 7, 14)
11 12 13 14 12 13

Hou|ve u|ma| noi|te| que| cin|ti|lou| so|bre o| teu| ros|to E.R. 13 ( 7,13)
10 11

e| mo|de|lou| tua| voz| en|tre as| al|gas. E.R 9 ( 5, 9 ) Eu| mo|ro|, des|de en|to|, nas| pe|dras| frias| que o| cu| pro|te|ge E.R. 14 ( 8, 12, 14 ) e es|tu|do a|pe|nas| o ar| e as| |guas. E.R. 8 ( 4, 8 )

16 Coi|ta|do| de| quem| ps| sua es|pe|ran|a E.R. 9 ( 2, 9 )

1 1 1 1 2 2 3 2 2 3 3 4 3 4 4 5 4 5 5 6 6 6 5 7 6 8 7 8 9 9 7 8 9

nas| praias| fo| ra| do| mun|do... E.R. 6 (3, 6 ) Os| a|res| fo|gem|, vi|ram|-se as| |guas, E.R. 9 (4, 6, 9 ) mes|mo as| pe|dras|, com |o |tem|po|, mu|dam. E.R. 9 ( 3, 9 )

Anlise forma-contedo.
A primeira estrofe do poema apresenta o esquema rtmico irregular, no qual a alternncia de slabas fortes e fracas se d de maneira assimtrica. Esta caracterstica pode reforar a simulao do som da passagem do vento que se intensifica nos versos 3 e 4, mais extensos: O vento trouxe de longe tantos lugares em que estivemos E.R. 17(4,7,12 e 17) que tornei a viver contigo enquanto o vento passava E.R. 14(3,7,11 e 14). Alm do esquema rtmico, os versos desta estrofe apresentam a aliterao da consoante s, cujo som refora a idia de passagem do vento. No primeiro verso, particularmente, v-se a aliterao da vogal o, que devido grafia, reafirma a noo semntica de que o tanto luar sugere uma noite de lua cheia. Est frequentemente presente na primeira estrofe a repetio das unidades t e s. No entanto, no h apenas relao quanto sonoridade, mas quanto forma das letras tambm: a grafia do t d idia de indivduo, solido. Enquanto o s o plural, o ns. Vale lembrar: ambas so consoantes que, segundo as regras de nossa ortografia, nunca podero aparecer juntas, oferecendo pistas quanto ao contedo e atmosfera do poema. Observa-se, logo na primeira estrofe, a presena do pronome de primeira pessoa eu, acompanhado, no decorrer do poema, de verbos nesta mesma flexo conferindo este um tom de pessoalidade. V-se que h combinao sonora entre os versos 2 e 4. A rima garantida pelos vocbulos palavras, do verso 2, e passava, do verso 4, que sugere algumas consideraes: palavra: estabelece comunicao, contato com o outro. passava: verbo da 3 p. do pretrito imperfeito, ao ocorrida no passado mas no completamente encerrada ou cujas consequncias ainda se passam.

17 Ou seja, sugere uma aproximao ou contato passado com algum, j que palavra pressupe ser humano, mas no completamente encerrado ou esquecido, cujas consequncias ainda se fazem presentes. Na segunda estrofe aparecem novas relaes: ocorre rima consoante interna entre as palavras cintilou do verso 5 e modelou do verso 6. Ambas as aes ocorrem no pretrito e esto relacionadas aos vocbulos rosto e voz, respectivamente. Estes apresentam entre si rima toante: Cintilou modelou

rosto

voz

H um caso de sinestesia nesta relao, j que o rosto remete lembrana visual do eu- lrico e a voz lembrana auditiva. importante observar a ordem das aes: 1 a noite cintilou sobre o teu rosto, e somente aps este fato, que pr-requisito para o prximo, ocorre o 2 e modelou tua voz entre as algas. Inicialmente a noite cintilou sobre o rosto de quem se fala para, posteriormente, modelar-lhe a voz entre as algas. Semanticamente, o verbo cintilar pressupe a presena de luz, e esta carrega os significados simblicos: revelao, verdade, conhecimento. O vocbulo modelar , neste caso, tomar forma. Logo, quanto quele de quem se fala, primeiramente, recebeu a luz, uma revelao ou verdade e, posteriormente, sua voz foi modelada entre as algas, tomou a forma das algas. Esta passagem particularmente interessante, visto que, as algas; seres sem razes nem caule, no tm ligao com a terra, podendo representar liberdade e um desligamento daquilo que terreno. E o que acompanha esta passagem justamente a voz, que no constituda de matria. Observe: 1 cintilou (revelao) rosto (matria) 2 modelou ( tomou forma)

voz ( ausncia de matria)

algas ( no h ligao com a terra)

18 O mnimo que se pode concluir que este algum de que se fala no mais se encontra na presena do eu- lrico. Coerentemente a luz chega ns mais rpida do que o som. Portanto, a viso anterior audio: 1 cintilou, 2 modulou a voz. Continuando, no verso 7 o eu- lrico retorna ao presente, os verbos agora aparecem neste tempo verbal. Afirma viver, desde ento, ou seja, desde o ocorrido nas pedras frias que o cu protege. Temos a uma rima toante entre o vocbulo protege e estivemos, do 3 verso do primeira estrofe: estivemos: verbo na 3 pessoa do plural do pretrito perfeito= algum junto de outro em poca passada. protege: defende, acolhe, abriga. Verbo no presente. Assim, no mais a pessoa de quem se fala que acolhe o eu- lrico, essa j no se encontra mais na presena deste. Oposto terra, o cu, agora, que exercesse esse papel, como se nada mais na terra fosse capaz de faz-lo. E neste mesmo verso, o que o cu protege a atual morada do eu- lrico, que passou a ser aps o ocorrido narrado as pedras frias. A pedra possui um valor simblico de dificuldade de mudana e falta de vivacidade, bem como o adjetivo fria pressupes solido, ausncia do outro. O verso 8 apresenta uma rima consoante externa com o verso 6 do poema. As palavras so guas e algas respectivamente. gua: transparncia, reflexo. algas: planta sem raiz cujo habitat a gua. O estudo das guas poderia reapresentar a busca do conhecimento, por parte do eu- potico, quanto ao outro ou em que medida o outro est refletido em si, no prprio eu- lrico. O estudo do ar seria a conscincia de que o tempo passa. Nos versos 9 e 10 o eu- potico chama o leitor de volta realidade, negando a iluso quando diz que coitado aquele que ps sua esperana nas parais fora do mundo... Vale-se das reticncias como que convidando o leitor a fazer esta reflexo tambm. Isto porque, como concluem os versos 11 e 12 o tempo passa e, como explicita a rima toante presente nos versos 10 e 12, respectivamente:

19 Mundo.... Mudam. Ou seja, o tempo passa, as pessoas e as coisas mudam, ento, no permanea vivendo nas praias fora do mundo e comunhe com o real.

Interpretao do poema.
Interpretao do nome do poema: Valsa.

A valsa uma dana que ocorre em momentos especiais da vida e no em qualquer circunstncia, uma dana diferenciada das demais. O nome valsa sugere, alm de um momento nico, marcante, a idia de transitoriedade, pois a dana composta basicamente por giros, e esta mudana contnua de posio, nos remete a pensarmos que o autor compara a valsa com a vida sendo algo breve, de constante mudana. Devemos lembrar tambm, que a valsa uma dana que nunca volta a mesma posio, isto , o casal, visto que a valsa no realizada sozinha, nunca volta para o lugar de onde comeou, e sim sempre faz um movimento contnuo de giros tomando espao de quadrados diferentes. O poema recebe esse nome devido noo de transitoriedade que carrega, referindo-se aos momentos passageiros da vida, metaforicamente, atravs dos giros. FEZ TANTO luar que eu pensei nos teus olhos antigos e nas tuas antigas palavras. FEZ TANTO luar : A lua brilhou tanto neste presente dia que o eu- lrico comparou a claridade do luar com: - os olhos de algum que ficou na memria. Olhos que transmitiam luz, rosto que era a luz para o eulrico; - mais do as palavras trocadas com algum o eu-potico traz esta luminosidade tambm voz de quem se fala. Parece que essa pessoa falava gentilmente, docemente. Assim como um luar simples, mas toca-nos pela sua beleza, essas palavras ditas por esta tal pessoa tocavam o eu- lrico. ...olhos antigos, ...antigas palavras.:

20 Valorizao subjetiva e momentnea de acontecimentos passados.

O vento trouxe de longe tantos lugares em que estivemos

Neste verso, temos uma sinestesia. O eu- lrico usa a palavra vento como figura sinestsica. O vento em si, no pode trazer lugares, o vento apenas passa pelos lugares. O que o poeta diz que, como o prprio vento passageiro, houve uma passagem em sua memria que trouxe tona lugares em que o eu- lrico e esse algum j estiveram juntos. Tudo isso faz referncia ao luar, visto que, foi durante ele que o vento da memria, o vento que significa uma recordao momentnea dos fatos passados, que as lembranas do eu-lrico vieram tona. Parece, tambm, que foi somente durante a passagem do vento que o eu-potico tornou a viver com a pessoa de quem se fala, atravs das lembranas. Ou seja, o tempo, que parece o vento que passa, que mudou a vida do eu- lrico.

que tornei a viver contigo enquanto o vento passava. Durante essa recordao, durante a passagem desse vento, o eu- lrico reviveu o passado em sua memria, por isso que ele tornou a viver com essa pessoa. Era um momento que ele fez tornar to presente os acontecimentos passados, que parecia real em sua mente, e dessa forma, o eu- lrico teve a impresso que podia sentir a presena desse algum perto dele. ...tornei a viver... sensao de equilbrio passageiro, equilbrio transitrio. ...enquanto o vento passava... sensao fugs, de pouca durao, momentnea.

Houve uma noite que cintilou sobre o teu rosto

21 O eu- lrico recorda-se de uma noite em especial, uma noite na qual o brilho das estrelas e do luar era intenso, e faziam o poeta enxergar claramente o rosto dessa pessoa a qual se refere. Parece tambm que foi uma noite muito especial, que marcou a vida do eu- lrico, uma noite importantssima entre a pessoa e eu-potico. e modelou tua voz entre as algas. Significado da palavra alga: vegetal talfito e clorofilado, sem raiz nem caule, que vive na gua do mar, na gua doce ou no ar mido. Significado de talfito : no contm caule. Significado de clorofila : Pigmento verde das plantas que se formam unicamente com a presena de luz. Quando o eu- lrico diz que a voz dessa pessoa foi modelada entre as algas, podemos entender que a voz que o poeta se refere como uma alga. A referncia s algas, nesse caso, apenas uma forma de materializar aquilo que invisvel e intocvel, pois, como sabemos, a voz no constituda de matria, sonora, causada pelas ondas vibratrias que atingem nosso aparelho auditivo. O eu- lrico faz essa comparao entre alga e voz porque, como vimos, a alga um vegetal que no contem caule, e essa pessoa , a qual o eu- lrico se refere, algum que no est mais presente em sua vida, algum que partiu, algum que no criou razes, algum cuja voz vive somente na memria, sem sustentabilidade nenhuma, voz que est somente na lembrana, lembrana que no confivel, pois pode deixar de existir com o tempo. Vimos, tambm, que a alga um ser clorofilado que necessita de luz para fazer a fotossntese, e o momento que a voz dessa pessoa modelada entre as algas durante a noite e no durante o dia. A presena da luz pouca durante essa modelao, tendo somente a claridade da lua e das estrelas, porm temos de saber que h dois momentos fotossintticos: o momento da absoro da luz e o momento da transformao dessa absoro em glicose/energia. No verso nos referimos pode-se compreender que estamos no segundo momento fotossinttico, pois, por ser noite, no h claridade suficiente para ocorrer a primeira parte. E tambm

22 no momento noturno em que as plantas clorofiladas fazem essa transformao da absoro da luz em glicose/energia. O que necessrio compreender dessa comparao relacionada ao clorofilamento das algas com a voz dessa pessoa que o poeta se refere, que h um momento de transitoriedade na vida do eu- lrico, um momento em que parece que essa pessoa transforma-se em uma alga, e s se resta agora a voz na memria do poeta, voz que no pode ser mais ouvida, ou alimentada com a presena desse algum, voz que no mais proferida para poder ser transformada em realidade na vida do eu- lrico. Assim como a luz necessria para o clorofilamento da alga, tambm necessria a presena dessa pessoa para que o eu-lrico considere-o vivo no apenas na memria, porm essa pessoa no est mais fisicamente presente na vida do mesmo. Eu moro, desde ento, nas pedras frias que o cu protege Parece que nesse verso enfatiza a partida definitiva dessa pessoa, talvez fosse esta a ltima vez que ele viu esse algum. Parece tambm ter sido um momento muito marcante, uma coisa inesperada, que no deu tempo do eu- lrico preparar-se para o ocorrido, como um choque que causara uma reao espontnea . Eu moro, desde ento, nas pedras frias... Deixa implcito a mudana que o ocorrido operou no eu-lrico, no materialmente, mas interiormente. Foi um acontecimento to grande em sua vida que lhe modificou o interior. ...pedras frias... Durante a passagem do poema, o eu- lrico vai recordando-se dos momentos felizes que ele teve ao lado dessa pessoa, momentos marcantes que ficaram somente na memria. Quando ele diz que se mudou para as pedras frias, o eu-potico para de falar de suas memrias e comea a dizer como est interiormente. Ele se compara s pedras frias, iguala o seu corao dureza de uma pedra. Mas essa pedra tem uma especificao, no qualquer tipo, e sim uma pedra isolada e fria, semelhante s pedras que se encontram na superfcie das grandes montanhas cobertas de gelo. Um local pouco acessvel, devido altitude, tornando-se um espao quase inabitvel para seres humanos. dessa forma que ele se encontra, com uma dor imensa junto si, uma dor que o congela por dentro e o faz considerar a si mesmo como uma pedra de gelo e no mais um ser humano. O

23 eu-potico j no quer expressar seus sentimentos de solido aos demais. A nica coisa que ele sabe que sente-se s, vazio, e talvez seja o nico sentimento que ele consegue sentir plenamente dentro de si.

...que o cu protege Essa expresso mostra que apesar de tudo, o eu- lrico sente proteo sob o cu. Esse cu representa Deus que o protege, que cuida dele. Apesar de ser uma pedra quase inacessvel, devido a sua altitude, encontra-se sob a proteo de Deus, j que, aps a perda, nada mais na terra pode exercer esse papel. Parece tambm que ele expressa seus sentimentos esse Deus mostrando sua devoo implicitamente.. ...e estudo apenas o ar e as guas. Com essa expresso o eu- lrico tenta dizer que esse estudo relaciona-se sua vida, quilo que lhe passa a ter valor. ... o ar e as guas. Podemos perceber que o ar passageiro, assim como as guas tambm o so. As nicas coisas que so valorizadas pelo eu- lrico o passado. Pois apesar de nunca ser o mesmo ar (o mesmo momento), e nunca ser tocado pelas mesmas guas ( poder reviver os mesmos acontecimentos nos locais em que esteve com esse algum), o eu-potico tenta tornar esse passado realidade. A dor da perda tamanha que o eu- lrico vive dessas memrias, parecendo tambm que no deseja mais envolver-se em relaes humanas, como se fosse uma atitude de auto-defesa, pelo fato de no querer sentir a dor da perda novamente. O ar e as guas so as nicas coisas que ela tem contato como pedra isolada, fria e localizada em um ambiente alto. Coitado de quem ps sua esperana nas praias fora do mundo... O prprio eu- lrico reconhece que a forma de lidar melhor com o sofrimento voltando realidade, parece que ele tem a percepo de que est vivendo de passado, pois passa a sentir pena daqueles que pem sua esperana em uma praia fora do mundo.

24 ...nas praias fora do mundo. O eu- lrico refere-se iluso, s pessoas que colocam sua confiana em coisas imaginrias. Passa a sentir d de todos aqueles que no vivem dos momentos reais. Porm, quando ele se refere a quem sofre, fala indiretamente de si mesmo, passando, ento, a sentir d de si. A dor da perda parece ser maior quando se afasta das coisas reais e refugia-se na iluso (praias fora do mundo).

As reticncias utilizadas no final do verso significam um pensamento que ainda no foi concludo e um convite ao leitor reflexo.

- Os ares fogem, viram-se as guas, O eu- lrico utiliza o travesso para introduzir a sua voz como pessoa, como que fazendo um comentrio conclusivo sobre tudo o que escreveu. Os dois acontecimentos climticos que o eu- lrico se refere esto relacionados aos momentos da vida, os momentos transitrios que, com o tempo, viram passado e transformam-se em lembranas.

mesmo as pedras, com o tempo, mudam.

A comparao com as pedras, parece que abre uma certa esperana ao poeta. Pois at as pedras duras, que parecem ser imutveis, indestrutveis, com passar do tempo tambm transformamse.

O eu- lrico parece dizer que isso que ele est passando s um momento da vida, que ir passar como todos os outros e, com o passar dos anos, tambm s sobrar memrias, que podero com o tempo tambm desaparecer.

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CONSIDERAES FINAIS
O sofrimento vivenciado pela poetisa Ceclia Meireles, autora do poema Valsa, lhe confere a capacidade de transmitir a complexidade de lidar com as perdas de pessoas prximas a ela. A autora transforma suas dores em dons poticos na escrita de seus poemas e, ao citar cada elemento no poema Valsa, aborda os momentos passados. Em suas produes faz com que nos identifiquemos com a valorizao subjetiva dos bens transitrios em forma de saudade.

26 No poema estudado o eu-lrico lida com a realidade humana, sofredora com a mudana e a falta da presena de algum que partiu. possvel identificar, tambm, o sentimento de fugacidade e equilbrio passageiro nos acontecimentos climticos e na valorizao de lembranas/ memrias que so descritos no decorrer do poema. O eu-lrico, apesar da valorizao de acontecimentos passados, mostra-se ciente da necessidade de aprender a viver no momento presente, considerando que as sensaes, como a dor apresentada no poema, so passageiras. O eu-potico reflete que o prprio presente virar passado num futuro prximo, e convida o leitor a fazer o mesmo, na medida em que reconhece a necessidade de sair da vivncia do surreal. Do contrrio, a vida no ter valor e, a morte, no ser mais o ato do falecimento e sim o prprio ato de viver. Por meio do estudo e anlise do poema Valsa foi possvel realizar a reflexo quanto algumas das questes que norteiam a existncia humana, dentre elas: a perda, a solido, a fugacidade diante do sofrimento, como lidar com os acontecimentos da vida e ascender perante as inmeras dificuldades. Ao fim deste trabalho, por meio do aprofundamento literrio realizado, percebemos que o contedo do poema abre portas para futuros estudos em diversas reas do conhecimento como a Filosofia, Psicologia, Teologia, entre outros. Estas cincias, ao dialogarem com as questes aqui apresentadas partir da anlise poema, oferecem subsdios para os questionamentos da existncia e desenvolvimento humano.

REFRENCIAS BIBLIOGRFICAS

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