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Abandono Afetivo

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Informativo 08 - Responsabilidade Civil por Abandono Afetivo

Curitiba, 21 de maio de 2012. Caros colegas, No presente informativo, trataremos de Recurso Especial (REsp n 1159242) que versa sobre a possibilidade de ressarcimento por danos morais decorrentes da omisso no dever de cuidado dos pais com a prole. O recurso chegou ao Superior Tribunal de Justia aps o Tribunal de Justia de So Paulo, em sede de Recurso de Apelao, reconhecer o abandono afetivo praticado pelo recorrente em prejuzo da filha e fixar, a ttulo de ressarcimento pelos danos morais, o quantum de R$ 415.000,00 (quatrocentos e quinze mil reais). No julgamento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justia, por maioria de votos vencido o Min. Massami Uyeda, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da relatora, Min. Nancy Andrighi. Inicialmente, sustentou a relatora que no h impedimento legal para a aplicao do instituto da Responsabilidade Civil no Direito de Famlia. Nesse sentido, esclareceu que a perda do poder familiar, apontada pelo recorrente como a nica punio legal para os pais que se eximem do dever de criao e educao dos filhos (cf. art. 1638, inciso II, do Cdigo Civil), no afasta a possibilidade de compensao pelos prejuzos materiais e imateriais eventualmente sofridos pela prole. Discorreu, na sequncia, a respeito dos vnculos que unem pais e filhos, destacando o liame legal que impe garantias e obrigaes mnimas. Aduziu que, alm das necessidades bsicas de alimento, abrigo e sade, o ser humano precisa de apoio imaterial para uma adequada formao, ou seja, a integridade fsica e psquica de um adulto depende essencialmente do zelo dos pais durante o seu processo de formao. A partir disso, ressaltou que o poder familiar exercido pelos pais abrange os deveres de convvio, cuidado, criao e educao, bem como que o cumprimento desses encargos depende da transmisso de ateno aos filhos e do acompanhamento do seu desenvolvimento scio psicolgico. Destacou que o cuidado, como obrigao legal decorrente do poder familiar, est

previsto implicitamente na Constituio Federal, em seu art. 227 . Com base nisso, exps o entendimento de que o cuidado um dever jurdico que pode ser mensurado por elementos objetivos e no se confunde com amor, o qual, segundo a relatora, posiciona-se no campo da motivao para o exerccio do poder familiar questo intrnseca ao ser humano e que extrapola os limites da cincia jurdica. Nessa linha, reconheceu que a inobservncia do dever de cuidado imposto aos pais implica em violao ao bem jurdico tutelado pela norma, isto , a criao, educao e desenvolvimento dos filhos sendo perfeitamente possvel a ocorrncia de ilcito civil por omisso, desde que caracterizada a existncia de dolo ou culpa, o dano e o nexo de causalidade. Ponderou que a defesa da garantia constitucional dos filhos no deve perder de vista as hipteses de impossibilidade prtica do exerccio do dever de cuidado pelos pais. Ou seja, considerou que tambm aqui incumbe ao julgador analisar o binmio necessidade e possibilidade, tal como ocorre em relao s necessidades materiais da prole. Exemplificou como causas excludentes de ilicitude a alienao parental praticada pelo outro genitor, limitaes financeiras e distncias geogrficas. Consignou a Min. Nancy Andrighi a impossibilidade de se estabelecer um conceito de dano moral, nesses casos, porquanto existem inmeras formas de manifestao do prejuzo, desde o reconhecimento da dor e do sofrimento suportados pelo filho at a constatao de determinada patologia clnica desenvolvida em razo do abandono afetivo. Amparada pelos argumentos acima, reconheceu, na hiptese em epgrafe, a ocorrncia de abandono afetivo sofrido pela recorrida e, ao final, considerou demasiadamente elevado o quantum fixado pelo tribunal de origem para o dano moral, reduzindo o montante para R$ 200.000,00 (duzentos mil reais). Acompanhando o Voto da relatora, o Min. Sidnei Beneti acrescentou o entendimento de que a quantificao do dano moral deve ser proporcional ao ou omisso do agente de modo que a postura agressiva da genitora em relao a aproximao da filha com o recorrente deve ser levada em conta como fator de diminuio da responsabilidade do pai. O Min. Paulo de Tarso Sanseverino, a sua vez, pontuou que o reconhecimento do dano moral em matria de Direito de Famlia deve ser excepcional, tendo em vista que as frustraes no mbito familiar so prprias da vida e contribuem para o crescimento pessoal do indivduo. Afirmou, contrariamente a posio apresentada pela relatora, que o dever de cuidado

tem contedo extremamente subjetivo, pois no possvel estipular um parmetro de comportamento adequado para a educao e criao dos filhos, sendo que desvios e falhas so inerentes a relao familiar. Desse modo, defendeu o entendimento particular de que apenas o abandono total e flagrante do filho tem o condo de gerar a responsabilidade civil dos pais. Entretanto, mesmo diante de motivaes distintas, acompanhou o Voto da relatora, pois entendeu que, no caso apresentado corte, houve abandono total e flagrante. Divergindo do Voto da relatora, o Min. Massami Uyeda justificou que a posio adotada pela Min. Nancy Andrighi representaria uma potencializao, pelo Judicirio, das mgoas ntimas decorrentes do convvio familiar. Disse que a tese pioneira adotada pela relatora repercutir no pas como parmetro de unificao jurisprudencial, causando instabilidade dentro da instituio familiar. Pontuou, ainda, que o conceito de negligncia no exerccio do poder familiar incerto, bem como que muito embora possa existir leso estima do filho: a vida feita de perdas e ganhos, talvez at mais de perdas do que de ganhos. O tema foi objeto do Informativo n 0496, de 04.05.2012, do Superior Tribunal de Justia, cujo link segue indicado ao final da matria. Convm observar que a divergncia verificada no julgamento do REsp n 1.159.242 se estende Quarta Tuma do Superior Tribunal de Justia, a qual possui entendimento acerca da matria em sentido contrrio quele seguido pela Min. Nancy Andrighi e destacado acima: CIVIL E PROCESSUAL. AO DE INVESTIGAO DE PATERNIDADE. RECONHECIMENTO. DANOS MORAIS REJEITADOS. ATO ILCITO NO CONFIGURADO. I. Firmou o Superior Tribunal de Justia que "A indenizao por dano moral pressupe a prtica de ato ilcito, no rendendo ensejo aplicabilidade da norma do art. 159 do Cdigo Civil de 1916 o abandono afetivo, incapaz de reparao pecuniria" (Resp n. 757.411/MG, 4 Turma, Rel. Min. Fernando Gonalves, unnime, DJU de 29.11.2005). II. Recurso especial no conhecido. (REsp 514350/SP, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 28/04/2009, DJe 25/05/2009). Grifou-se. O relator do REsp n 514350 acima citado, Min. Aldir Passarinho Junior, faz referncia nas razes do Voto ao julgamento do REsp n 757.411, de relatoria do Min. Fernando Gonalves, como condutor do posicionamento da Quarta Turma do STJ a respeito da indenizao por abandono afetivo.

Filia-se a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justia, segundo Voto do Min. Fernando Gonalves relator do REsp n 757.411, a uma corrente que defende a impossibilidade de ressarcimento civil por abandono afetivo. Isso porque o ordenamento jurdico brasileiro previu - tanto no Estatuto da Criana e do Adolescente, em seu art. 24, quanto no Cdigo Civil, em seu art. 1.638, inciso II - a mais grave punio na esfera civil aos pais que descumprem o dever de cuidado para com os filhos, qual seja: a perda do poder familiar. Ou seja, a perda do poder familiar, como medida punitiva, j garantiria, per si, uma resposta jurdica adequada para proteo dos direitos dos filhos. Sob outro ngulo, expe o Min. Fernando Gonalves que eventual indenizao por abandono afetivo poderia fulminar qualquer possibilidade de reaproximao entre pais e filhos. No mbito deste Eg. Tribunal de Justia do Estado do Paran possvel encontrar decises amparadas tanto no entendimento da Min. Nancy Andrighi (Terceira Turma do STJ) quanto do Min. Fernando Gonalves (Quarta Turma do STJ) sendo imperioso ressaltar que a deciso da 10 Cmara Cvel anterior a manifestao da Terceira Turma do STJ a respeito da possibilidade de reparao civil pelo abandono afetivo: APELAO CVEL. AO DE INDENIZAO POR DANOS MORAIS DECORRENTE DE ABANDONO AFETIVO. SENTENA QUE JULGA IMPROCEDENTE O PEDIDO INICIAL SOB O FUNDAMENTO DE AUSNCIA DE ATO ILCITO. II CERTIDO NO DISTRIBUIDOR ONDE CONSTA DIVERSAS AES DE ALIMENTOS AJUIZADAS PELA AUTORA. III ATO ILCITO CARACTERIZADO. DIREITO DA CRIANA E DO ADOLESCENTE CONVIVNCIA FAMILIAR. ART. 227 DA CONSTITUIO FEDERAL. PRINCPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. IV DANO MORAL. DEVER DE INDENIZAR. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL. V VALOR DA INDENIZAO FIXADO EM R$5.000,00. VI - RECURSO PROVIDO. (TJPR - 8 C.Cvel - AC 7685249 - Foz do Iguau - Rel.: Jorge de Oliveira Vargas - Unnime - J. 26.01.2012). RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. ABANDONO MORAL. REPARAO NO CARACTERIZADA. "A indenizao por dano moral pressupe a prtica de ato ilcito, no rendendo ensejo aplicabilidade da norma do art. 159 do Cdigo Civil de 1916 o abandono afetivo, incapaz de reparao pecuniria. 2. Recurso especial conhecido e provido. Por sua vez, outra corrente defende que no existe obrigao legal de companhia e afeto". (STJ Resp n 757411/MG Rel. Ministro Fernando Gonalves Quarta Turma DJ 27.3.2006) APELAO NO PROVIDA. (TJPR - 10 C.Cvel - AC 639544-4 - Foro Central da Comarca da Regio Metropolitana de Curitiba - Rel.: Nilson Mizuta - Unnime - J. 04.03.2010). O Tribunal de Justia do Estado do Rio Grande do Sul tem reconhecido a possibilidade

de reparao de danos por omisso afetiva, porm com a ressalva de que ela exige uma interpretao restritiva e uma avaliao criteriosa de cada caso: APELAO CVEL. FAMLIA. INVESTIGAO DE PATERNIDADE INDENIZAO POR DANOS MORAIS. ABANDONO AFETIVO NO DEMONSTRADO. DOUTRINA E JURISPRUDNCIA. A reparao de danos que tem por fundamento a omisso afetiva, no mbito do direito de famlia, sabidamente de interpretao restritiva, pois que, visando a traduzir o afeto humano em valor monetrio, marcada por enorme subjetividade, e no se configura pelo simples fato de os pais no terem reconhecido, de pronto, o filho. APELAO DESPROVIDA. (Apelao Cvel N 70041619511, Stima Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, Relator: Roberto Carvalho Fraga, Julgado em 02/04/2012). APELAO CVEL. AO DE INDENIZAO POR ABANDONO MATERIAL, MORAL E AFETIVO. ABALO EMOCIONAL PELA AUSNCIA DO PAI. O pedido de reparao por dano moral no Direito de Famlia exige a apurao criteriosa dos fatos e o mero distanciamento afetivo entre pais e filhos no constitui situao capaz de gerar dano moral, nem implica ofensa ao (j vulgarizado) princpio da dignidade da pessoa humana, sendo mero fato da vida. Embora se viva num mundo materialista, nem tudo pode ser resolvido pela soluo simplista da indenizao, pois afeto no tem preo, e valor econmico nenhum poder restituir o valor de um abrao, de um beijo, enfim de um vnculo amoroso saudvel entre pai e filho, sendo essa perda experimentada tanto por um quanto pelo outro. RECURSO DESPROVIDO. (SEGREDO DE JUSTIA) (Apelao Cvel N 70045481207, Stima Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro, Julgado em 28/03/2012). Por outro lado, o Tribunal de Justia de Minas Gerais, ao enfrentar a questo, vem se posicionando no sentido de que o abalo moral causado por abandono afetivo dos pais no tem o condo de gerar responsabilidade civil, pois no configura ato ilcito passvel de reparao. Confira-se: AO DE INDENIZAO POR ABANDONO MORAL E MATERIAL - REVELIA EFEITOS - PRESUNO RELATIVA DE VERACIDADE - COMPENSAO REQUERIDA PELO FILHO AO PAI - MANIFESTAO DE AMOR E RESPEITO ENTRE PAI E FILHO - SENTIMENTOS IMENSURVEIS - AUSNCIA DE ILICITUDE -NO CABIMENTO. - Revela-se inconteste a dor tolerada por um filho que cresce sem o afeto do pai, bem como o abalo que o abandono causa ao infante; entendo, no entanto, que a reparao pecuniria alm de no acalentar o sofrimento, ou suprir a falta de amor paterno poder provocar um abismo entre pai e filho, na medida em que o genitor, aps a determinao judicial de reparar o filho por no lhe ter prestado auxlio afetivo, talvez no mais encontre ambiente para reconstruir o relacionamento. (Acrdo n 1014508475498-8, Relator: Osmando Almeida, 30.01.2012).

DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ABANDONO AFETIVO. REPARAO POR DANOS MORAIS. RECURSO NO PROVIDO. - O tardio reconhecimento de paternidade, se no estabelecido vnculo de convivncia entre pai biolgico e filho, depois de muitos anos de vida distanciados no tempo e espao, ainda que essa situao de fato possa ser cunhada de abandono afetivo, no configura ato ilcito passvel de reparao por danos morais. - Mesmo que possa ser moralmente reprovvel a conduta do pai, a falta de relacionamento afetivo com o filho no configura ato ilcito passvel de reparao por danos morais. (Acrdo n 1072009052727-9, Relator: Jos Flvio de Almeida, 30.01.2012). Para aprofundamento sobre o caso, seguem ao final deste informativo links que permitem acesso direto s veiculaes na pgina do Superior Tribunal de Justia e a alguns artigos pertinentes ao tema selecionados no stio virtual do Instituto Brasileiro de Direito de Famlia

APELAO CVEL. INDENIZAO DANOS MATERIAIS E MORAIS. ABANDONO DO FILHO. FALTA DE AMPARO AFETIVO E MATERIAL POR PARTE DO PAI. HONORRIOS ADVOCATCIOS. REDIMENCIONAMENTO. A responsabilidade civil, no Direito de Famlia, subjetiva. O dever de indenizar decorre do agir doloso ou culposo do agente. No caso, restando caracterizada a conduta ilcita do pai em relao ao filho, bem como o nexo de causalidade e o dano, cabe indenizao por danos materiais e morais. Nas demandas condenatrias, a verba honorria deve incidir sobre o valor da condenao. Inteligncia do art. 20, 3, do CPC. RECURSO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDO. APELAO DO REQUEIRDO IMPROVIDO. (Apelao Cvel N 70021427695, Oitava Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, Relator: Claudir Fidelis Faccenda, Julgado em 29/11/2007)

APELAO CVEL. AO DE INVESTIGAO DE PATERNIDADE CUMULADA COM AO DE REPARAO DE DANOS MORAIS DECORRENTES DE ABANDONO AFETIVO. INOCORRNCIA. Sendo subjetiva a responsabilidade civil no Direito de Famlia, o dever de indenizar pressupe o ato ilcito. No se pode reputar como ato ilcito o abandono afetivo de quem desconhecia a qualidade de pai, porquanto no h nos autos qualquer prova de que o pai haja sido comunicado de tal possibilidade antes da citao na ao ajuizada pelo investigante quando j contava com mais de 25 (vinte e cinco) anos, devendo ser valorado o comportamento processual do pai, enquanto investigado, pois colaborativo com a elucidao da paternidade.

APELO NO PROVIDO. (SEGREDO DE JUSTIA) (Apelao Cvel N 70024047284, Oitava Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, Relator: Alzir Felippe Schmitz, Julgado em 20/06/2008)

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMLIA. ABANDONO AFETIVO. COMPENSAO POR DANO MORAL. POSSIBILIDADE. 1. Inexistem restries legais aplicao das regras concernentes responsabilidade civil e o consequente dever de indenizar/compensar no Direito de Famlia. 2. O cuidado como valor jurdico objetivo est incorporado no ordenamento jurdico brasileiro no com essa expresso, mas com locues e termos que manifestam suas diversas desinncias, como se observa do art. 227 da CF/88. 3. Comprovar que a imposio legal de cuidar da prole foi descumprida implica em se reconhecer a ocorrncia de ilicitude civil, sob a forma de omisso. Isso porque o non facere, que atinge um bem juridicamente tutelado, leia-se, o necessrio dever de criao, educao e companhia - de cuidado - importa em vulnerao da imposio legal, exsurgindo, da, a possibilidade de se pleitear compensao por danos morais por abandono psicolgico. 4. Apesar das inmeras hipteses que minimizam a possibilidade de pleno cuidado de um dos genitores em relao sua prole, existe um ncleo mnimo de cuidados parentais que, para alm do mero cumprimento da lei, garantam aos filhos, ao menos quanto afetividade, condies para uma adequada formao psicolgica e insero social. 5. A caracterizao do abandono afetivo, a existncia de excludentes ou, ainda, fatores atenuantes - por demandarem revolvimento de matria ftica - no podem ser objeto de reavaliao na estreita via do recurso especial. 6. A alterao do valor fixado a ttulo de compensao por danos morais possvel, em recurso especial, nas hipteses em que a quantia estipulada pelo Tribunal de origem revela-se irrisria ou exagerada. 7. Recurso especial parcialmente provido. (REsp 1159242/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/04/2012, DJe 10/05/2012)

Resumo

APELAO CVEL. ABANDONO AFETIVO. GENITOR. DANOS MORAIS. DEVER DE INDENIZAR. Inobstante as controvrsias existentes sobre o tema,

inclusive no mbito do STJ, o abandono afetivo por parte do genitor, capaz de gerar dor, vergonha e sofrimento, caracteriza dano moral passvel de indenizao. O valor arbitrado a ttulo de indenizao, deve atender aos parmetros do razovel e proporcional. Recursos aos quais se nega provimento. Resumo do contedo do documento. Fragmento

Processo n 0154617 de Tribunal de Justia do Rio de Janeiro, Decima 2 Camara Civel, 29 de Junho de 2012 (G) Apelao Cvel n' 0000289-75.2004.8.19.0037 fls. 1 Tribunal de Justia 12' Cmara Cvel Apelao Cvel n' 015461761.2010.8.19.0001 Apelante 1: DANIEL CZAPNIK Apelante 2: ELIE SAUL SALTOUN Apelados: OS MESMOS Relator: Desembargador CHERUBIN SCHWARTZ APELA O CVEL. ABANDONO AFETIVO. GENITOR. DANOS MORAIS. DEVER DE INDENIZAR. Inobstante as controvrsias existentes sobre o tema, inclusive no mbito do STJ, o abandono afetivo por parte do genitor, capaz de gerar dor, vergonha e sofrimento, caracteriza dano moral passvel de indenizao. O valor arbitrado a ttulo de indenizao, deve atender aos parmetros do razovel e proporcional. Recursos aos quais se nega provimento. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelao em que so apelantes DANIEL CZAPNIK e ELIE SAUL SALTOUN, sendo apelados OS MESMOS. ACORDAM os Desembargadores que integram a Dcima Segunda Cmara Cvel do Tribunal de Justia do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade de votos, em conhecer dos recursos e (G) Apelao Cvel n' 0000289-75.2004.8.19.0037 fls. 2 negar provimento aos mesmos, nos termos do voto do Desembargador Relator. Custas na forma da lei. Rio de Janeiro, 03 de maio de 2012. Desembargador CHERUBIN HELCIAS SCHWARTZ J NIOR Relator (G) Apelao Cvel n' 0000289-75.2004.8.19.0037 fls. 3 VOTO Trata-se de Apelaes interpostas contra a r. sentena que julgou procedente o pedido de indenizao por danos morais formulado por DANIEL CZAPNIK em face de ELIE SAUL SALTOUN, condenando este ao pagamento de R$ 100.000,00 (cem mil reais) pelos danos morais sofridos, com

incidncia de juros de 1% ao ms a partir da data da citao e de correo monetria a contar da data desta sentena. Custas pelo ru, bem como a verba honorria de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenao. A causa de pedir da pre...

Indenizao por abandono afetivo-TJSC


Deciso comentada (Revista 25) Indenizao por abandono afetivo-TJSC Rodrigo da Cunha Pereira ________________________ Resumo: No a primeira vez, e nem ser a ltima que um filho vai s barras do tribunal buscar resposta (direito) a clssica e bblica pergunta: Pai, por que me abandonastes? Tambm no a primeira vez que o Tribunal de Justia de Santa Catarina julgou caso de indenizao por abandono afetivo e material. Vrios outros tribunais estaduais j se posicionaram favoravelmente sobre o tema. A sustentao e compreenso do fundamento jurdico que autoriza incluir o abandono afetivo como fonte de responsabilidade civil entender o afeto. No apenas como um sentimento, mas principalmente como cuidado, amparo e o ato de educar, instruir, formar, colocar limites, dar assistncia moral e material, enfim dar feio a forma e formao ao filho. No atribuir responsabilidades e sanes aos pais que se negam a dar afeto aos filhos compactuar e desresponsabiliz-los pela educao de seus filhos. Palavra chave: Dano moral por abandono afetivo e material. Responsabilidade parental. Perda de uma chance. Ementa: Responsabilidade civil. Filiao. Abandono material, moral e intelectual do pai em relao ao filho. Tratamento anti-isonmico entre os filhos. Dano moral configurado. Excepcionalidade do caso concreto. Recurso desprovido. (TJSC, Apelao Cvel n 2011.043951-1, Rel Des. Maria do Rocio Luz Santa Ritta, 3 Cmara de Direito Civil, pub. 26/09/2011) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelao Cvel n. 2011.043951-1, da comarca da Capital (1 Vara Cvel), em que apelante A. F. A., e apelado V. P. A.: A Terceira Cmara de Direito Civil decidiu, por maioria, negar provimento ao recurso. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Fernando Carioni, com voto vencido, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Marcus Tulio Sartorato. Florianpolis, 6 de setembro de 2011. Maria do Rocio Luz Santa Ritta Relatora RELATRIO V. P. A. mandou citar em juzo A. F. A. para haver dele indenizao por danos morais. Alegou, em sntese, que o ru, seu pai, sonegou-lhe amparo moral e material durante toda a sua vida. Apresentada a resposta e instrudo o feito, a sentena acostada s folhas 307/314 julgou improcedente a ao quanto ao abandono moral e acolheu o pedido no que tange ao abandono material, para, neste ponto, condenar o ru ao pagamento de R$ 40.000,00 a ttulo de danos morais, por no ter auxiliado o autor enquanto este era menor de idade. Irresignado, o ru apelou, aduzindo, em resumo, que dos fatos descritos na inicial no resultam danos morais, no apenas porque prestou auxlio material ao seu filho, como tambm porque, na linha de pacfica jurisprudncia, a falta de amor e carinho no enseja reparao por leso anmica (fls. 319/334). Apresentadas as contrarrazes (fls. 338/342), vieram os autos. Este o relatrio. VOTO 1. A sentena dividiu a petio inicial em duas aes bem identificadas: a primeira dizendo com pedido de dano moral por abandono afetivo; a segunda, com pleito de dano moral substanciado em abandono material. Quanto primeira, acompanhou a jurisprudncia do STJ no sentido de inexistir dano moral em caso de falta de amor, ateno e carinho do pai em relao ao filho. Veja-se: CIVIL E PROCESSUAL. AO DE INVESTIGAO DE PATERNIDADE. RECONHECIMENTO. DANOS MORAIS REJEITADOS. ATO ILCITO NO CONFIGURADO. I. Firmou o Superior Tribunal de Justia que A indenizao por dano moral pressupe a prtica de ato ilcito, no rendendo ensejo aplicabilidade da norma do art. 159 do Cdigo Civil de 1916 o abandono afetivo, incapaz de reparao pecuniria (Resp n. 757.411/MG).

II. Recurso especial no conhecido (STJ Resp 514350, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, sem destaque no original). E ainda: RESPONSABILIDADE CIVIL. ABANDONO MORAL. REPARAO. DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE. 1. A indenizao por dano moral pressupe a prtica de ato ilcito,no rendendo ensejo aplicabilidade da norma do art. 159 do Cdigo Civil de 1916 o abandono afetivo, incapaz de reparao pecuniria. 2. Recurso especial conhecido e provido (STJ Resp 757411, Rel. Min. Fernando Gonalves, sem destaque no original). A matria no foi devolvida a esta Corte, falta de recurso por parte do autor da demanda, e passou em julgado. Quanto segunda ao, a sentena condenou o ru ao pagamento de danos morais por entender que ele se negou a fornecer ao autor o auxlio material (no o afetivo ou o moral) de que necessitava para viver por ocasio de sua menoridade, nos termos dos seguintes fundamentos: [...]. Quanto ao pedido de dano moral pelo abandono material, o qual revela-se pela ausncia do que se considera o mnimo material ao homem mdio, levando em conta que o requerido teria condies de proporcionar ao filho uma vida dentro dos padres medianos, no caso em tela, toma outros contornos. Entrementes, da detida anlise das provas colacionadas aos autos, o ru em seu prprio depoimento s fls. 134/135 afirmou que as vezes o depoente dava dinheiro para as ex cunhadas comprarem bens de uso do autor; (); que nunca pagou penso para o autor; (). A testemunha F. S. A., irm do autor e filha do requerido, fl. 184 disse que inicialmente o requerido negou a paternidade, mas no dia da audincia admitiu a mesma; que o requerido tambm no aceitou dar um terreno para o autor construir uma casa; (). E a testemunha M. C. A.l declarou fl. 185 que quem ajuda V. F.; que Volnei Mora com Flvia; que o autor no tem emprego; (). A paternidade provoca o surgimento de deveres, tendo fundamento normativo, como o art. 1.634, incisos I e II, do Cdigo Civil, que estabelecem deveres, dentre os quais est o dever do pai e da me de ter o filho em sua companhia e educ-lo, o chamado dever de convivncia. Da mesma forma, no Estatuto da Criana e do Adolescente, em seus artigos 3, 4 e 5, o dever da famlia de assegurar o desenvolvimento fsico, mental, moral e espiritual e

social do menor, em condies de dignidade, referindo expressamente a convivncia familiar como direito da criana e do adolescente e a punio em caso de omisso quanto preservao de seus direitos da personalidade. [...]. Nesses termos, o abandono material do filho, desde que seja voluntrio e injustificado, configura violao ao dever antes especificado. Conduta essa que afronta ao art. 1.634, II, do Cdigo Civil. A residindo a ao ou a omisso, um dos requisitos da responsabilidade civil. E se dessa conduta resultam danos ao filho, estaro preenchidos os outros requisitos: nexo causal e dano. [...] (fls. 312/313, sem destaque no original). 2. A questo posta apreciao desta Cmara extremamente polmica. Aps reflexo, penso que a sentena deve ser mantida, apesar de reconhecer que relevantssimas objees podem ser levantadas contra ela. Em linha de princpio, o direito de famlia, possuindo regras prprias, tratando dos assuntos mais caros e delicados vida pessoal e familiar das pessoas, como que impede o traslado simplista de diretrizes de responsabilidade civil para a resoluo dos inmeros conflitos que invariavelmente surgem na ambincia das relaes de parentesco e filiao, nem sempre redutveis a meras questes pecunirias. Assim que a jurisprudncia, por exemplo, no concede indenizao a ttulo de danos morais em favor de filhos que comparecem em juzo brandindo a s ausncia de amor e carinho de seus pais. Nesses casos, o pai (ou a me, ou ambos) at se desincumbe do dever de prestar auxlio material ao filho, mas no d a este o carinho, a ateno e o amor necessrios. Aqui pacfico a inexistncia de abalo moral indenizvel, tendo em vista a mxima segundo a qual no se pode obrigar a gostar de quem quer que seja, nem mesmo dos prprios filhos. Noutro giro, o descumprimento do dever de prestar alimentos, sem outras conotaes, autoriza a priso civil do devedor, alm de outras formas de ingerncia patrimonial e de coero psicolgica, mas no, via de regra, a condenao do pai ou da me faltosos ao pagamento de uma indenizao por danos morais. Outra objeo manuteno da sentena recorrida est no momento do reconhecimento da filiao. Como relata o prprio autor da demanda, a filiao foi estabelecida somente aps a sua maioridade, quando o ru, citado em ao de investigao de paternidade, reconheceu a procedncia do pedido. Consequentemente, raciocinando em termos puramente formais, no se afiguraria heterodoxo assentar que at o advento desse reconhecimento o ru no possua qualquer dever jurdico para com o autor e que, portanto, na linha dessa premissa, no poderia a sentena conden-lo ao pagamento de indenizao por danos morais em virtude do descumprimento de deveres que nem sequer existiam no tempus considerado pela sentena (cf: TJSC ACv 2006.012075-7, Rel.: Mazoni Ferreira).

3. Ainda assim, apesar desses relevantes fundamentos, tenho que as particularidades da espcie autorizam a manuteno da sentena, que, penso, fez justia no caso concreto. incontroverso que o ru, proprietrio de vrios terrenos, como aponta a prova documental, nenhures impugnada, apesar de no ter registrado o autor como seu filho, conhecia a sua condio de pai e nunca a contestou, seja judicial ou extrajudicialmente. Tanto assim que, segundo alega em depoimento pessoal, o acionante, quando criana, esporadicamente visitava a sua casa, ocasio em que lhe entregava alguns presentes, como calados e agasalhos (fl. 134). Alm disso, e mais importante, tambm incontroverso que o autor foi concebido na constncia da unio de sua me com o ru, tanto que a famlia permaneceu unida durante trs anos aps o nascimento daquele (cf: depoimento pessoal do ru, fl. 134). Dessa forma, embora o ru no tenha registrado o autor, permanecendo em posio cmoda, furtando-se s responsabilidades do poder familiar e limitando-se a dar ao acionante apenas uma lembrana ou outra quando lhe convinha, tenho que a providncia (registro) se afigurava andina para o efeito de liber-lo j quela poca dos deveres inerentes paternidade, no somente vista do conhecimento que tinha do estado de filiao, mas sobretudo em funo da presuno (juris tantum) de paternidade que decorreu do nascimento do autor na constncia da unio que estabeleceu com a me deste, ento sua mulher. Portanto, nesse quadro, o reconhecimento judicial da paternidade, embora efetuado somente aps o advento da maioridade do autor, serviu apenas confirmao tanto da sapincia que o ru j possua do estado de filiao, quanto da presuno de paternidade que alcana os filhos concebidos na constncia do casamento ou da unio estvel. Superado esse ponto e analisando detidamente a petio inicial e a prpria contestao apresentada pelo ru, possvel apreender que a espcie no se resume mera denncia de um pai faltoso com os deveres inerentes ao poder familiar. O que se alega na inicial (e se prova na instruo, at pelas prprias declaraes do ru) o descumprimento de tais deveres mesmo quando o ru podia regularmente adimplilos, deixando seu filho mngua de apoio material, instruo, educao, lazer e inmeros direitos anlogos de que era titular. E, mais que isso, a prova produzida nos autos demonstra que o ru, em desateno ao comando constitucional que estabelece ampla isonomia de tratamento entre os filhos (art. 227, 6, CF/88), vedando qualquer espcie de discriminao entre eles (art. 227, caput, CF/88), concedeu tratamento distinto ao autor e a seus outros filhos, tratando aquele qual um agregado, destinando-lhe no os insumos necessrios a sua regular criao, e que poderiam ser prestados, mas apenas algumas esmolas, favores diminutos, em quadro de total indiferena em relao a filho que sabia ser seu. Sintomtico dessa diferena de tratamento est na afirmao no impugnada e portanto admitida como verdadeira de que o acionante foi analfabeto at os 22 anos (fl. 277), ao passo que outro filho do ru graduando em Direito por universidade particular. Sem falar na ausncia de oferecimento regular de alimentos, contentando-se o ru a apenas dar alguns presentes ao acionante de quando em quando.

Como se v, a razo pela qual o decreto condenatrio deve ser mantido no est na ausncia de carinho e amor, mas no fato objetivo, primeiro, de o ru ter deixado o autor mngua de qualquer apoio material mesmo podendo prest-lo e, segundo, no fato, no menos objetivo, da discriminao havida entre os seus filhos. Em sociedade cada vez mais competitiva, em que as crianas se desigualam j quando nascem (ou antes ainda), com os estmulos cognitivos prestados pelos genitores, presumvel o abalo anmico sofrido pelo filho sabedor de que poderia ter recebido instruo formal e de qualidade, preparando-se adequadamente para o mercado de trabalho, mas, por inrcia injustificvel de seu pai, arrosta a condio de analfabeto durante grande parte de sua vida justamente na era da informao. Diante disso possvel assentar que a indenizao aqui solicitada encontra sustentculo jurdico tambm a partir dos insumos doutrinrios da responsabilidade civil por perda de uma chance, diante da frustrao de obter uma vantagem futura por fato ou ato antijurdico praticado por outrem (cf: NORONHA, Fernando. Direito das Obrigaes. So Paulo, Saraiva, 2003, v. I, p. 665). certo que o recebimento de educao formal por parte dos pais no configura garantia absoluta de sucesso profissional. Mas a chamada perda de uma chance no tem por objetivo indenizar fatos dessa natureza, isto , o prmio da chegada, o sucesso que no veio, mas sim constituir lenitivo pela oportunidade perdida, pela ponte que foi queimada e que no pode mais ser erguida, pelo caminho que poderia ter sido trilhado mas que foi fechado justamente por ato ilcito e injustificado cometido por quem tinha o dever jurdico de abri-lo. Tambm rigorosamente presumvel o abalo que sente o filho ao ver que seu pai, mesmo sabendo-se seu pai, trata-o no como filho, mas como agregado, mero destinatrio de trastes de pouco ou nenhum valor, em total menoscabo regra constitucional de isonomia entre os filhos. Portanto, a indenizao no est sendo deferida aqui por falta de amor, carinho e ateno do ru em favor do autor. indiscutvel que no existe dano moral por fatos dessa natureza. A razo de ser da presente indenizao deita no fato objetivo de o ru saber que o autor era seu filho e, ainda assim, negar-se a trat-lo como tal, discriminando-o em relao aos demais de sua prole, tendo ele condies financeiras para assim no agir. Finalmente, a quantia arbitrada pelo juzo a quo (R$ 40.000,00) para os danos morais suficiente para minimizar os efeitos deletrios da violao ao bem jurdico e dissuadir o ru da prtica de ato ilcito anlogo, levando-se em conta principalmente que este furtou-se ao dever de auxlio material de seu filho por toda a menoridade dele. Por essas razes, realando as peculiaridades do caso concreto, e remarcando que a espcie no cuida de pedido de dano moral surgido de falta de amor e carinho do pai em relao ao filho, nego provimento ao recurso. Este o voto.

Declarao de Voto Vencido do Excelentssimo Desembargador Fernando Carioni Ousei divergir da douta maioria, pelas razes que passo a expor. A presente inconformao tem por objeto a sentena de primeiro grau que julgou procedente os pedidos formulados nos autos da ao de indenizao por danos morais e, em consequncia, condenou o ru ao pagamento de indenizao a ttulo de danos morais pelo abandono material no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais). A indenizao pelo abalo moral decorrente do abandono afetivo e material paterno sofrido durante a infncia e a adolescncia, alm de ser novidade no Direito Brasileiro, envolve questo polmica ao se permitir que uma certa quantia pecuniria compense os transtornos decorrentes da rejeio do pai ou da me pela sua prole. Alcanar uma soluo reclama o enfrentamento de um dos problemas mais incitantes da responsabilidade civil, qual seja, determinar quais danos extrapatrimoniais so passveis de indenizao. A respeito, Nehemias Domingos de Melo enfatiza: Recentemente, o Judicirio foi instado a se manifestar sobre a questo de abandono moral, tendo surgido algumas decises condenando pais que, independentemente de ter se desincumbido do nus alimentar, faltaram com o dever de assistncia moral aos seus filhos na exata medida em que se fizeram ausentes e, por via de conseqncia, no prestaram a devida assistncia afetiva e amorosa durante o desenvolvimento da criana. A questo polmica e controvertida, razo porque preciso cautela e prudncia para se analisar cada caso concreto. No se pode esquecer que as separaes de casais, no mais das vezes, se processam num clima de dio e vingana. Nestas circunstncias, a experincia cotidiana tem demonstrado que aquele que fica com a guarda isolada da criana, quase sempre cria bices e dificuldades para que o pai, ou a me, que no detm a guarda, no tenha acesso criana. Comumente so transferidos criana os sentimentos de dio e vingana daquele que detm a sua guarda, de tal sorte que, em muitos casos, a prpria criana que passa a no querer ver a me ou o pai, supostamente responsvel pelas mazelas que a outra parte incute em sua cabea. Somente por essas razes, j se recomendaria cuidado na anlise de procedncia de pedido de indenizao por dano moral com fundamento no abandono moral, porquanto no se pode transformar o Judicirio num instrumento to somente de vingana pessoal, disfarado sob o manto da necessidade de punir a falta de assistncia moral criana (Abandono moral: fundamentos da responsabilidade civil Artigos. Revista sntese de direito civil e processual civil, Sntese v. 34, mar. 2005. p. 31-34) Carlos Roberto Gonalves, discorrendo acerca do tema assevera que a questo delicada, devendo os juzes ser cautelosos na anlise de cada caso, para evitar que o Poder Judicirio seja usado, por mgoa ou outro sentimento menos nobre, como instrumento de vingana contra os pais ausentes ou negligentes no trato com os filhos (Responsabilidade civil. 9. ed. So Paulo: Saraiva, 2005. p. 649-650).

Sabe-se que a reparao civil por dano moral possui um carter compensatrio, a fim de dar ao lesado um lenitivo pela dor sofrida, bem como um carter punitivo ao gerador do dano. Quanto ao carter punitivo, no mbito do direito de famlia, o ordenamento jurdico j prev a reprimenda para o pai que abandona o filho ou descumpre injustificadamente o dever de sustento, guarda e educao, punindo-o com a perda do poder familar, tal como previsto no artigo 24 do Estatuto da Criana e do Adolescente e no artigo 1.638, II, do Cdigo Civil. No tocante ao carter compensatrio, salienta-se que no se nega a dor tolerada por um filho que cresce sem o afeto e amparo material do pai, bem como o abalo que o abandono causa ao infante; porm a reparao pecuniria alm de no acalentar o sofrimento do filho ou suprir a falta de amor paterno, poder provocar um abismo entre pai e filho, na medida que o genitor, aps a determinao judicial de reparar o filho por no lhe ter prestado auxlio afetivo, talvez no mais encontre ambiente para reconstruir o relacionamento. Por bvio, a demanda restringe a chance de o autor receber, ainda que de modo tardio, o afeto do ru. Aqui merece um aparte, visto que o autor nasceu no dia 19-12-1970, sendo que at o ano de 2002 no havia confirmao da sua filiao, momento em que, aps o ajuizamento de ao de investigao de paternidade, o pai reconheceu a filiao. Conforme se extrai do processado, o pai, ao tempo do reconhecimento da paternidade, passou a dar amparo ao filho, tendo o levado para residir em sua casa. de bom alvitre lembrar que poca do reconhecimento de paternidade, o autor j contava com mais de 30 (trinta) anos de idade, no sendo exigido do pai, nessas condies, que d amparo financeiro ao filho. Diante desse contexto, no h como fixar indenizao nos moldes do artigo 186 do Cdigo Civil para compensar o abandono moral e tampouco o material sofrido pelo autor, razo pela qual entendo que merece reforma a deciso objurgada. Ouso ainda afirmar que o valor deferido pela Magistrada a quo a ttulo de indenizao por danos morais decorrente do abandono material R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), trar mais danos do que benefcios ao autor. Isso porque, a quantia por certo se esvair rapidamente e levar a relao parental a um distanciamento difcil de ser recuperado. Penso que a indenizao pecuniria, em casos como o presente, importa em evidente prejuzo as duas partes envolvidas, na medida em que fomenta o sentimento de vingana pessoal, daquele que foi privado de afeto e amparo material, e dificulta a construo de uma relao alicerada no afeto e no respeito mtuo por aquele que foi condenado ao pagamento da verba indenizatria. Eram essas as consideraes necessrias para amparar o meu posicionamento, no sentido de dar provimento ao recurso para julgar improcedente o pedido inicial. Florianpolis, 13 de setembro de 2011.

Fernando Carioni DESEMBARGADOR Gabinete Desa. Maria do Rocio Luz Santa Ritta Comentrios 1- Introduo Embora a deciso tenha reconhecido a indenizao por dano moral em virtude do abandono material, deixou a desejar por no reconhecer a possibilidade de indenizao por danos morais, em decorrncia do abandono afetivo. No a primeira, e nem ser a ltima vez que um filho vai s barras do tribunal para buscar respostas e amparo a clssica e bblica pergunta: Pai, por que me abandonastes? Deciso como esta poderia conduzir banalizao e monetarizao do afeto? Claro que no! O afeto tornou-se um valor jurdico, e um princpio fundamental norteador do Direito de Famlia , passando a ocupar o centro da cena jurdica e proporcionando uma revoluo paradigmtica na organizao jurdica das famlias. Ele pressupe, tambm, o dio, que sua polaridade necessria. Afinal, amor e dio constituem uma polaridade, isto , tenso e satisfao, desejo e hostilidade, alegria e dor. A afetividade no campo jurdico vai alm do sentimento, e est diretamente relacionada responsabilidade e ao cuidado. Por isto o afeto pode se tornar uma obrigao jurdica e ser fonte de responsabilidade civil. O princpio da afetividade , aliado ao da paternidade responsvel que autorizam o estabelecimento da responsabilidade civil. A paternidade/maternidade fundada no afeto e no cuidado, caracterizada pelo seu verdadeiro exerccio, deve ser construda no dia a dia, independente da situao jurdica em que os pais se encontrem: solteiros, casados ou divorciados. O exerccio da paternidade e da maternidade e, por consequncia, do estado de filiao um bem indisponvel para o Direito de Famlia, cuja ausncia propositada ou o seu desleixo e descompromisso, tem repercusses e consequncias psquicas srias, devendo a ordem legal/constitucional amparar, inclusive, com imposio de sanes, sob pena de transformar os direitos e deveres do poder familiar em meras regras e princpios morais, desprovidos de jurisdicidade. 2- Entendendo o caso Trata-se de ao indenizatria fundada na sonegao de amparo moral e material de um filho por toda a vida. Ou seja, so dois pedidos objetivando a uma s vertente, que a indenizao por dano moral, em decorrncia do descumprimento dos deveres parentais. Apresentada a resposta e instrudo o feito, a sentena julgou improcedente o pedido quanto indenizao por abandono afetivo, e acolheu o pedido indenizatrio por abandono material, condenando o ru ao pagamento de indenizao a ttulo de danos morais pelo abandono material no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais). Inconformado o ru apelou, aduzindo, em resumo, que dos fatos descritos na inicial no resultam danos morais, no apenas porque prestou auxlio material ao seu filho, como

tambm porque, na linha de pacfica jurisprudncia, a falta de amor e carinho no enseja reparao por leso anmica. A Terceira Cmara de Direito Civil decidiu, por maioria, negar provimento ao recurso, confirmando que a quantia arbitrada pelo juzo a quo (R$ 40.000,00) para os danos morais suficiente para minimizar os efeitos deletrios da violao ao bem jurdico e dissuadir o ru da prtica de ato ilcito anlogo, levando-se em conta principalmente que este furtou-se ao dever de auxlio material de seu filho por toda a menoridade dele. 3- A perda de uma chance utilizada no cuidado ao prximo A deciso inovou por reforar a necessidade da responsabilidade parental, e retrocedeu por no reconhecer a possibilidade de indenizao por dano moral, em virtude do abandono afetivo. Ora, se uma das fundamentaes jurdicas para condenar o abandono material foi o uso da teoria da perda de uma chance , porque no pelas mesmas razes no se aplicou para condenar por abandono afetivo, utilizando a mxima do cuidado ao prximo: () o cuidado, na lio de Leonardo Boff, representa uma atitude de ocupao, preocupao, responsabilizao e envolvimento com o outro; entra na natureza e na constituio do ser humano. O modo de ser cuidado revela de maneira concreta como o ser humano. Sem cuidado ele deixa de ser humano. Se no receber cuidado desde o nascimento at a morte, o ser humano desestrutura-se, definha, perde sentido e morre. Se, ao largo da vida, no fizer com cuidado tudo o que empreender, acabar por prejudicar a si mesmo por destruir o que estiver sua volta. Por isso o cuidado deve ser entendido na linha da essncia humana (apud Pereira, Tnia da Silva. Op. cit. p. 58). Com fundamento na paternidade responsvel, o poder familiar institudo no interesse dos filhos e da famlia, no em proveito dos genitores e com base nessa premissa deve ser analisada sua permanncia ou destituio. Citando Laurent, o poder do pai e da me no outra coisa seno proteo e direo (Principes de Droit Civil Franais, 4/350), segundo as balizas do direito de cuidado a envolver a criana e o adolescente. (STJ, Resp n 1106637 / SP, Rel Min Nancy Andrighi, 3 turma, pub. 01/07/2010) Nesse entrelaar do cuidado com a teoria da perda de uma chance, podemos concluir ser inegvel uma leso s justas expectativas da criana e do adolescente, que hoje se encontra na fase adulta. No houve essa atitude de ocupao, preocupao, responsabilizao e envolvimento do pai com relao ao filho. Da mesma forma, a chance que se buscava era uma convivncia familiar, sendo obstada por conduta irresponsvel e negligente do pai. Com isto, os irmos tiveram convivncia com o pai, e esse filho excludo no teve. Tal fato afrontou os princpios da responsabilidade, solidariedade, afetividade, melhor interesse da criana e adolescente, igualdade entre os filhos e da convivncia familiar, justificando a possibilidade da indenizao por dano moral, inclusive, por abandono afetivo. 3- Decises que reconheceram a indenizao por abandono afetivo O primeiro julgamento sobre abandono afetivo foi do Tribunal de Justia de Minas Gerais, cuja fundamentao esteiou-se no princpio constitucional da dignidade: a dor sofrida pelo filho, em virtude do abandono paterno, que o privou do direito convivncia, ao amparo afetivo, moral e psquico, deve ser indenizvel, com fulcro no

princpio da dignidade da pessoa humana . Essa deciso do Tribunal de Alada de Minas Gerais condenou o ru a pagar 44 mil reais, por entender configurado nos autos o dano sofrido pelo autor em sua dignidade, bem como por reconhecer a conduta ilcita do genitor ao deixar de cumprir seu dever familiar de convvio e afeto com o filho, deixando assim de preservar os laos da paternidade. O Superior Tribunal de Justia no confirmou a deciso do Tribunal a quo sob a alegao de que a punio ao abandono paterno deveria ser a destituio do poder familiar. Equvoco! Na verdade essa sano torna-se um prmio ao pai que abandonou, pois no assumiu e no assumir suas responsabilidades parentais. Por outro lado, o voto vencido, no afastou a possibilidade de condenao: Esses fatos so incontroversos. Penso que da decorre uma conduta ilcita da parte do genitor que, ao lado do dever de assistncia material, tem o dever de dar assistncia moral ao filho, de conviver com ele, de acompanh-lo e de dar-lhe o necessrio afeto. () Penso tambm, que a destituio do poder familiar, que uma sano do Direito de Famlia, no interfere na indenizao por dano moral, ou seja, a indenizao devida alm dessa outra sano prevista no s no Estatuto da Criana e do Adolescente, como tambm no Cdigo Civil anterior e no atual. (Voto do Min. Barros Monteiro vencido) STJ, Recurso Especial n 757.411 MG (2005/0085464-3), 4 T., Rel. Fernando Gonalves, DJ de 27.3.2006. O Tribunal de Santa Catarina j decidiu caso semelhante, inclusive com uma posio mais assertiva sobre o abandono afetivo: () Ora, julgar-se inexistente ilcito quando um ou ambos os pais, comprovadamente e de forma omissiva, deixam seus filhos em abandono moral e material no garantir a eficcia do prprio direito no ordenamento jurdico, o que levaria ao ceticismo jurdico, incluindo-se a a ceticemia, consistente na doena moral que corri todo o sistema jurdico que nos envolve. Para que no haja essa ceticemia jurdica decorrente de ofensas (positivas ou negativas) lei, ao direito e justia, tenho necessidade de entender que o abandono afetivo ilcito capaz de gerar danos morais e ensejar a sua reparao. Nesse diapaso, indispensvel afirmar-se que a responsabilidade civil do requerido est patenteada no somente contra a pessoa do seu filho, mas tambm contra a requerente, por via reflexa, pelo que desnecessria a perquirio sobre o elemento subjetivo da culpa, por ser esta presumida s escncaras.() (TJSC, Apelao Cvel n. 2006.015053-0, Relator Designado: Des. Monteiro Rocha, 2 Cmara de Direito Civil, j. 10/12/2008) No mesmo sentido, tivemos duas decises do TJRS: A educao abrange no somente a escolaridade, mas tambm a convivncia familiar, o afeto, amor, carinho, ir ao parque, jogar futebol, brincar, passear, visitar, estabelecer paradigmas, criar condies para que a criana se auto-afirme. Desnecessrio discorrer acerca da presena do pai no desenvolvimento da criana. A ausncia, o descaso e a rejeio do pai em relao ao filho recm nascido ou em desenvolvimento violam a sua honra e a sua imagem. Basta atentar para os jovens drogados e ver-se- que grande parte deles derivam de pais que no lhe dedicaram amor e carinho; assim tambm em relao aos criminosos. () Por bvio que o Poder Judicirio no pode obrigar ningum a ser pai. No entanto, aquele que optou por ser pai e o caso do autor deve desincumbir-

se de sua funo, sob pena de reparar os danos causados aos filhos. Nunca demais salientar os inmeros recursos para evitar a paternidade (vasectomia, preservativos etc.). Ou seja, aquele que no quer ser pai deve precaver-se. () Assim, no estamos diante de amores platnicos, mas sim de amor indispensvel ao desenvolvimento da criana. () A funo paterna abrange amar os filhos. Portanto, no basta ser pai biolgico ou prestar alimentos ao filho. O sustento apenas uma das parcelas da paternidade. preciso ser pai na amplitude legal (sustento, guarda e educao). Quando o legislador atribui aos pais a funo de educar os filhos, resta evidente que aos pais incumbe amar os filhos. Pai que no ama filho est no apenas desrespeitando funo de ordem moral, mas, principalmente, de ordem legal, pois no est bem educando seu filho. (Ao de Indenizao n 141/1030012032-0, 2 Vara da Comarca de Capo da Canoa/RS, julgado em 15.9.2003, in Revista Brasileira de Direito de Famlia, Porto Alegre: Sntese, IBDFAM, vol. 25, p. 149, ago./set. 2004.) A responsabilidade civil, no Direito de Famlia, subjetiva. O dever de indenizar decorre do agir doloso ou culposo do agente. No caso, restando caracterizada a conduta ilcita do pai em relao ao filho, bem como o nexo de causalidade e o dano, cabe indenizao por danos materiais e morais. TJRS. Apelao Cvel n 70021427695. Des. Relator Claudir Fidelis Faccenda. 8 Cmara Cvel. Comarca de So Gabriel. Data de julgamento: 29.11.2007. Dirio de Justia 7.12.2007. A fixao do quantum indenizatrio requer prudncia, pois, alm de se valer para recuperar quando possvel o status quo ante, tem funo pedaggica e compensatria, com o intuito de amenizar a dor do ofendido. TJRS. Apelao Cvel n 70021592407. Des. Rel. Ricardo Raupp Ruschel. 7 Cmara Cvel. Comarca de So Leopoldo. Data de julgamento: 14.5.2008. Dirio de Justia: 23.5.2008. Em raciocnio semelhante o TJSP julgou: Responsabilidade civil. Dano moral. Autor abandonado pelo pai desde a gravidez da sua genitora e reconhecido como filho somente aps propositura de ao judicial. Discriminao em face de irmos. Abandono moral e material caracterizados. Abalo psquico. Indenizao devida. Sentena reformada. Recurso provido para este fim. () O pai teve oportunidades reiteradas de aproximao, inclusive quando da mudana do filho para aquela Comarca, ou mesmo, o que seria de se esperar, quando do nascimento do neto, em condio de sade abalada definitivamente. Omitiu-se de forma consciente responsabilidade, nada obstante tenha sofrido declarao judicial e, hoje, comprovada cientificamente, atravs do exame que, durante anos se negou a submeter. () Se o pai no alimenta, no d amor, previsvel a deformao da prole. Isso pode acontecer, e acontece, com famlias regularmente constitudas. () o afastamento, o desamparo, com reflexos na constituio de abalo psquico, que merecem ressarcidos, diante do surgimento do nexo de causalidade. TJSP. Apelao Cvel n 511.903-4/7-00. Des. Relator Caetano Lagrasta. 8 Cmara de Direito Privado. Comarca de Marlia. Data de julgamento 12.3.2008. Data do registro: 17.3.2008. Indenizao por danos morais. Alegado abandono afetivo imputado ao requerido,genitor da autora, reconhecida como filha aps ao de investigao de paternidade.Sentena de improcedncia. Peculiaridade da indenizao pleiteada que torna imprescindvel a prova pericial.Necessidade de se perquirir acerca da extenso e repercusso do dano psicolgico. Sentena anulada para prosseguimento da instruo. Recurso provido.

(TJSP, APL 3004256572009826 SP 3004256-57.2009.8.26.0506, Rel Des. Caetano Lagrasta, 8 Cmara de Direito Privado, j. 25/10/2011) - Ao intentada pela filha em face do genitor Alegao de abandono afetivo Prescrio Inocorrncia Conduta imputada ao apelado que se repetiu ao longo dos anos (desde a separao com a me da apelante) e que no foi cessada quando a autora atingiu a maioridade Prazo prescricional (art. 177 do Cdigo Civil) que, por conta disso, no se iniciou com a maioridade da autora Invivel supor que os alegados danos tenham ocorrido apenas durante a menoridade da apelante Afastada a prescrio, devem os autos retornar origem para dilao probatria (permitindo que a autora demonstre a alegada instabilidade emocional advinda do abandono paterno, bem como seus reflexos ao longo da vida) Sentena anulada Recurso provido. (TJSP, Processo:CR 6111284900 SP, Rel Des. Salles Rossi, 8 Cmara de Direito Privado, pub. 12/01/2009) O Tribunal de Justia do Esprito Santo: (). O pedido de reparao por danos morais sofridos um pedido juridicamente possvel e reconhecido pelo nosso ordenamento jurdico. 2. No caso de pedido de indenizao por danos moral em decorrncia de abandono moral e falta de afeto por parte do genitor, necessria a caracterizao dos elementos ensejadores da responsabilidade civil, quais sejam, o dano experimento pela filho, o ato ilcito praticado pelo pai, e liame causal que conecta os referidos elementos. 3. Impe-se a remessa dos autos instncia de origem, a fim de propiciar a angularizao do processo, citando-se o ru/apelado para exercer o contraditrio e a ampla defesa, bem como proceder a dilao probatria necessria ao deslinde da quaestio. 4. Recurso conhecido e provido. TJES, Classe: Apelao Civel, 15096006794, Relator: lvaro Manoel Rosindo Bourguignon Relator Substituto : Fernando Estevam Bravin Ruy, rgo julgador: Segunda Cmara Cvel, Data de Julgamento: 21/09/2010, Data da Publicao no Dirio: 11/11/2010) 3- As normas jurdicas do compromisso do amor paterno/materno-filial bem verdade que no se pode obrigar ningum a amar outrem, mas a relao paternomaterno-filial exige responsabilidades e compromissos, sendo fonte de obrigao jurdica. A afetividade geradora de direitos e deveres a que depende mais do brao, do ombro e da razo do que do corao. Pela supremacia axiolgica da Constituio Federal, tem-se o comando da responsabilidade e obrigao, por meio do princpio da dignidade humana, do princpio da solidariedade, do princpio da paternidade responsvel, e, obviamente, do princpio do melhor interesse da criana e adolescente . preciso compreender que a ausncia de um pai/me pode trazer consequncias desestruturantes ao sujeito. Esta ausncia da funo paterna/materna j se apresenta como um fenmeno social alarmante com crianas de rua e na rua, aumento da delinqncia e prostituio juvenil, violncia nas cidades, trfico de drogas, balas perdidas, todos esses sinais de violncia e desafio ao Poder Estado-Pai/me que o cotidiano nos escancara e revela, em essncia, o declnio da autoridade paterna e o enfraquecimento do Estado-Pai. No caso em tela, embora o requerente j estivesse na fase adulta, no se pode negar que seu passado tenha lhe gerado dor, por ausncia paterna. Alm disso, com relao aos

irmos, no houve a dita igualdade entre os filhos pela imposio da Constituio da Repblica de 1988. E mais, no se pode esquecer das responsabilidades parentais, pois os pais tm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores e pela reciprocidade, os filhos tambm tem essa imposio de ajudar e amparar os pais na velhice, como estabelece o artigo 229 da CR/1988: Os pais tm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores tm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carncia ou enfermidade. No se trata, pois, de monetarizar o afeto, ou indenizar o sofrimento, mas acima de tudo, de ancorar a responsabilidade pelos atos praticados e nas escolhas que fazemos a cada dia. A paternidade/maternidade deixou de ser apenas um conjunto de competncias atribudas aos pais, convertendo-se em um conjunto de deveres para atender ao melhor interesse do menor/adolescente, principalmente, no que tange convivncia familiar, que deve ser vista de forma independente da existncia ou no do tipo de relacionamento entre os pais. No se deve restringir to somente ao auxlio material, porque nem s de po vive o homem. necessria a assistncia afetiva, no sentido de cuidado como fora motriz na busca da felicidade e realizao enquanto sujeito. O Cdigo Civil dispe nos artigos 1.634, inciso II, e 1.566, inciso IV , que os pais so responsveis pela criao e educao dos filhos. Tambm o Estatuto da Criana e do Adolescente traduz em regras e desdobra os princpios constitucionais essa responsabilidade em seus artigos 3, 4, , 19 , 22 e 33. Logo, o descumprimento do exerccio do poder familiar (art. 1.634/CCB) por qualquer um dos genitores configura um ilcito, sendo, portanto, o fato gerador da indenizao. Qualquer pessoa, qualquer criana, para se estruturar como sujeito e ter um desenvolvimento saudvel necessita de alimentos para o corpo e para a alma. O alimento imprescindvel para a alma o amor, o afeto. E afeto significa afeio por algum, dedicao. Afeioar significa tambm instruir, educar, formar, dar feio, forma ou figura. Esta uma diferena entre afeto e amor. O afeto no somente um sentimento, mas sim uma ao. cuidado no sentido de ocupao, preocupao, responsabilizao e envolvimento com o outro, como bem explicitado pela deciso supracitada do Superior Tribunal de Justia. Sem esse cuidado, ele deixa de ser humano . toda norma jurdica, obviamente, deve corresponder uma sano, sob pena de se tornar mera regra ou princpio moral. Por isso a necessidade de responsabilizao dos pais pelo no cuidado e, principalmente, pelo abandono dos filhos. A responsabilidade a essncia do afeto e do cuidado, como competente e sabiamente j descreveu Kant: Aquilo que eu reconheo imediatamente como lei para mim, reconheo com um sentimento de respeito que no significa seno a conscincia da subordinao da minha vontade a uma lei, sem interveno de outras influncias sobre a minha sensibilidade. () Uma vez que despojei a vontade de todos os estmulos que lhe poderiam advir da obedincia a qualquer lei, nada mais resta do que a conformidade a uma lei universal das aces em geral que possa servir de nico princpio vontade, isto : devo proceder sempre de maneira que eu possa querer tambm que a minha mxima se torne uma lei universal. Aqui pois a simples conformidade lei em geral (sem tomar como base qualquer lei destinada a certas aces) o que serve de princpio vontade, e tambm o que tem de lhe servir de princpio, para que o dever no seja por toda parte uma v

iluso e um conceito quimrico; e com isto est perfeitamente de acordo a comum razo humana nos seus juzos prticos e tem sempre diante dos olhos este princpio. Logo, o carter punitivo e preventivo, aliados a uma necessidade pedaggica da reparao civil, significam um freio a tal ato danoso quele que no escolheu nascer. 4- Concluso A deciso do TJSC acertou ao condenar o pai por ter abandonado o filho. Entretanto o pressuposto da indenizao no foi corajoso o suficiente para abordar o abandono afetivo como o ensejador do dano causado, preferindo sustentar-se em argumento mais fcil e cmodo, que o abandono material. Se tivesse explorado a ausncia paterna como fonte de obrigao jurdica, sustentada na regra do art. 1634 do CCB e nos princpios Constitucionais da paternidade responsvel, melhor interesse da criana/adolescente, solidariedade, dignidade humana, certamente incluiria na condenao o fundamento do abandono afetivo, corroborando a to bem lembrada perda de uma chance.

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