Eutanasia e Distanasia
Eutanasia e Distanasia
Eutanasia e Distanasia
distansia.
A problemtica da
Biotica
Texto extrado do Jus
Navigandi
http://jus2.uol.com.br/doutrina
/texto.asp?id=1862
Antonio Soares Carneiro, Maria Edilma Cunha, Jeane Maria Rodrigues Marinho,
Alexandre rico Alves da Silva1
01 - INTRODUO
Atravs do presente seminrio pretendemos fazer uma abordagem jusfilosfica da
problemtica acerca da Biotica e mais especificamente sobre o Instituto da Eutansia
e suas implicaes no cotidiano humano.
Uma analise analtica sobre os aspectos fundamentais desse novo ramo do
conhecimento filosfico que a Biotica o qual teve surgimento depois do grande
avano da tecnologia cientfica de modo abrangente. Seu histrico e seus princpios.
Uma abordagem conceitual, tipolgica e histrica sobre a eutansia.
Analisaremos o direito comparado frente o instituto da Eutansia com todos os seus
aspectos diante das diversas legislaes.
Exemplificando com casos famosos que acirraram as discusses acerca do tema
teremos uma idia ampla das questes que envolvem a eutansia desde a anlise do
caso at a deciso a ser tomada.
Teremos, ainda, uma abordagem mais abrangente sobre a tica frente os problemas
que envolvem o instituto em tela, bem como um quadro comparativo das religies e as
diversas posies teolgicas acerca do tema.
Longe de querer esgotar o assunto e emitir uma opinio definitiva sobre a aceitao ou
no do instituto, esperamos contribuir com o nosso trabalho para aprimorar a gama de
conhecimentos que serviro se argumentos para uma possvel tomada de posio.
valorativo e volitivo, ou seja, o agente tico deve estar consciente do que seja o bem
ou o mal, o bom ou o mau dentro dos valores contidos naquele meio social.
J a moral se coloca dentro do campo prtico. Etimologicamente deriva do termo
MORES, vocbulo de origem latina que significa "costume". st intimamente ligado
ao fator prtico, o comportamento prtico-moral; Est ligada a ao humana e pode
ser definida como um conjunto de normas de conduta adotadas por uma coletividade
de acordo com os valores ali vigentes.
Nas palavra dos Prof. Jos Roberto Goldim, da UFRS:
A tica, a Moral e a Lei se referem s aes desenvolvidas pelos seres humanos.
Enquanto que a tica busca as justificativas para as aes, a Moral e a Lei
estabelecem regras para as mesmas. A regras morais tm, em geral, carter universal,
enquanto que as leis se aplicam, de forma compulsria, a uma determinada
comunidade organizada . As inter-relaes da tica com a Moral e a Lei podem, s
vezes, gerar confuses ou conflitos, porm todas as trs so diferentes vises sobre o
comportamento humano.
Feita essa distino j analisamos uma parte do contedo inicial de nosso trabalho
cujos conceitos sero de muita serventia para a melhor compreenso da problemtica
que enfrentaremos adiante.
Outro ponto deveras importante que no podemos deixar de abordar nessas
consideraes preliminares diz respeito ao bem cuja proteo o objeto de nosso
seminrio, qual seja: o direito a vida.
Segundo o dicionrio Aurlio:
"vida o conjunto de propriedades e qualidades graas as quais animais e plantas se
mantm em continua atividade."
Esse bem, de valor inestimvel, merece a mxima proteo.
ROBERTO VIDAL DA SILVA MARTINS, citado por Antnio Chaves em sua obra
Direito a Vida e ao Prprio Corpo, em matria Publicada no ESTADO DE S. PAULO
sob o ttulo Direito de viver merece maior proteo das leis , datada de 22.3.91 critica
a constituio Federal dizendo, em suma, que ela consagrou 245 artigos regulando a
proteo de direitos mais diversos para trabalhadores, meio ambiente, ndios, animais
em extino, reforma agrria, privatizaes, estatizaes, etc. Direitos, sem dvida,
importantes, porm, no to importantes quanto o direito vida desde a concepo. E
conclui afirmando que "o direito vida, desde a concepo, paradoxalmente, no foi
protegido e vale muito mais do que os Direitos Patrimoniais."
Na verdade a C.F. em seu art. 5 faz referncia ainda que superficial inviolabilidade
do direito vida.
uma se referindo ao tratamento dos indivduos como agentes autnomos; e outra, que
as pessoas com a autonomia diminuda devem ser tratadas com maior proteo.
Entendendo-se como pessoa autnoma, como j frisado, aquela capaz de deliberar
sobre sua vontade e objetivos. Ao contrrio de heteronomia, a autonomia significa ser
governado por si prprio.
Essa capacidade de se auto-governar pode ser maculada total ou parcialmente pela
existncia de fatores do prprio ser ou diante de circunstancias externas. o exemplo,
do menor, do incapaz, do presidirio, do doente mental, etc,
Em suma, as teorias acerca da autonomia concordam quanto a essncia que envolve
um conceito de liberdade aliado ao de volitividade. Liberdade no sentido de iseno de
qualquer influencia na tomada de deciso e volitividade no sentido de capacidade de
agir intencionalmente.
PRINCPIO DA BENEFICNCIA:
Hipcrates, por volta do ano 430 AC, em sua obra Epidemia j aconselhava a classe
mdica usando esse principio:
"Pratique duas coisas ao lidar com as doenas: auxilie ou no prejudique o paciente"
O Juramento mdico consagra implicitamente esse principio:
"Usarei o poder para ajudar os doentes com melhor de minha habilidade e julgamento;
abster-se-ei de causar danos ou de enganar a qualquer homem com ele."
Defende justamente a ao mdica procurando maximizar o bem e minimizar o mal,
agindo sempre em beneficio do paciente. Estabelece a obrigao moral de agir em
beneficio dos outros.
PRINCPIO DA JUSTIA:
O principio da justia est muito prximo do conceito de isonomia usado pelos juristas.
Seria a justia distributiva do bem e do mal. Em caso de dois pacientes em condies
semelhantes qual o tratamento seria dispensado a um ou a outro. Quais os critrios
que devem ser usados para o emprego dos meios disponveis visando o tratamento
desses pacientes? Alguns foram proposta por William Frankena (1963):
"1-A justia considera, nas pessoas, as virtudes e os mritos;
2-A justia trata os seres humanos como iguais, no sentido de distribuir igualmente
entre eles, o bem e o mal, exceto, talvez, nos casos de punio;
3-Trata as pessoas de acordo com suas necessidades, suas capacidades ou tomando
em considerao tanto uma quanto outras."
O Relatrio Belmonte sobre tica mdica conclui com algumas propostas visando a
distribuio igualitria da justia:
"a cada pessoa uma parte igual;
a cada pessoa de acordo com a sua necessidade;
a cada pessoa de acordo com o seu esforo individual;
a cada pessoa de acordo com a sua contribuio sociedade;
a cada pessoa de acordo com o seu mrito." (7)
03 - EUTANSIA
03.1 - CONCEITO:
A palavra eutansia foi criada no sculo XVII, pelo filsofo ingls Francis Bacon. Na
sua etimologia esto duas palavras gregas eu, que significa bem, e
thanasiaequivalente a morte. Em sentido literal, eutansia significa "boa morte", "morte
apropriada", "morte tranqila". O seu antnimo distansia, definida como morte lenta,
ansiosa e com muito sofrimento. (8)
Hodiernamente, o termo eutansia passou a designar a morte deliberadamente
causada a uma pessoa que sofre de enfermidade incurvel ou muito penosa, para
suprimir a agonia demasiado longa e dolorosa, o chamado paciente terminal. O seu
sentido ampliou-se passando a abranger o suicdio, a ajuda a bem morrer, o homicdio
piedoso etc.
O primeiro trao importante desta definio que ela agrega a idia de causar
conscientemente a morte de algum, por motivo de piedade ou compaixo,
introduzindo outra causa, que por si s, seja suficiente para desencadear o bito. A
morte por eutansia considerada uma morte "no natural".
A eutansia leva discusso sobre o direito de uma pessoa por fim prpria vida,
valendo-se de outra pessoa. Podemos indagar se haveria apenas uma faculdade, ou
um direito juridicamente tutelado, isto , que possa ser coercitivamente exigido. No
mundo jurdico, se algum tem um direito, pode socorrer-se do processo, para faz-lo
valer. Para que uma pessoa que no consegue por seus prprios meios extinguir a
prpria vida possa ter concretizado o seu intento, outra precisa ter o dever de realizlo.
Surge, ento, a questo: a quem caberia realizar essa ao destinada a eliminar o
sofrimento de um doente, causando sua morte? Na concepo de Bacon, que cunhou
o termo eutansia, seria dever do mdico acalmar os sofrimentos e as dores, mesmo
quando esse alvio sirva para trazer uma morte doce e tranqila. (9)
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A histria nos faz lembrar tambm que em Esparta, o homicdio no era considerado
crime, desde que praticado em honra dos deuses; e o assassinato dos velhos, pedido
muitas vezes por eles mesmos, era uma obra de piedade filial.
Em Atenas, o Senado tinha poderes de facultar a eliminao dos velhos e incurveis,
dando-lhes conium maculatum - bebida venenosa - em banquetes especiais.
Os Celtas, alm de matarem as crianas deformadas ou monstruosas, eliminavam
tambm os velhos, uma vez que os julgavam desnecessrios sociedade, tendo em
vista que os mesmos no contribuam para o enriquecimento da nao.
oportuno lembrar, que esse costume ainda praticado, atualmente, por alguns
povos como por exemplo, os batas e os neocalednios.
Os Germanos matavam enfermos. Na Birmnia, eram enterrados vivos os doentes
incurveis, enquanto que os Eslavos e Escandinavos, apressavam a morte de seus
pais enfermos.
Os povos caadores e errantes, matavam seus pares velhos, doentes, feridos, para
que os mesmos no ficassem abandonados sorte e s feras, nem tampouco fossem
trucidados pelos inimigos. Atitude esta, movida pelo carinho e ateno que
dispensavam a seus entes queridos, sendo que tal atitude foi largamente imitida pelos
ndios brasileiros.
Segundo Giuseppe Del Vecchio, os gestos dos Csares, voltando para Baixo o
polegar (pollice verso) nos circos romanos, eqivalia prtica eutansica. Os infelizes
gladiadores, mortalmente feridos nos combates viam, assim, abreviados os
sofrimentos pela compaixo real.
Fustel de Coulanges, comentando o que se passava em Roma, observa: "O Estado
tinha o direito de no permitir cidados disformes ou monstruosos. Por conseqncia,
ordenava ao pai a quem nascesse semelhante filho que o matasse" (13).
Ainda em Roma, os condenados crucificao tomavam uma bebida que produzia um
sono profundo, para que no sentissem as dores dos castigos e iam morrendo
lentamente.
Nas pginas bblicas, encontramos morte do Rei Saul, de Israel, que, ferido na
batalha, e a fim de no cair prisioneiro, lanara-se sobre a sua espada, e j ferido
pedira a um amalecita que lhe tirasse a vida. Teria sido a primeira eutansia da histria
(Bblia Sagrada, Samuel, Captulo 31, versculos 1 a 13).
J, o patriarca da pacincia, acometido das maiores desgraas por provao de Deus,
coberto da cabea aos ps por repelente chaga, em agonia fsica e moral, teria
chamado sua mulher de tola quando esta lhe insinuara ser melhor suicidar-se para
encurtar os padecimentos. Mas Deus se foi apiedando de J, dando-lhe as bnos
da recuperao.
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TIPO
Eutansia ativa
2300
1000
3300
Suicdio assistido
400
400
4941
8100
Total
5941
11800
5859
Em 1990, foram feitas 9000 solicitaes de eutansia ativa, mas somente 2300 foram
atendidas por preencherem os critrios estabelecidos.
EUTANSIA NO URUGUAI:
O Uruguai, talvez, tenha sido o primeiro pas do mundo a legislar sobre a possibilidade
de ser realizada eutansia no mundo. Em 1o. de agosto de 1934, quando entrou em
vigor atual Cdigo Penal uruguaio, foi caracterizado o "homicdio piedoso", no artigo
37 do captulo III, que aborda a questo das causas de impunidade.
De acordo com a legislao uruguaia, facultado ao juz a exonerao do castigo a
quem realizou este tipo de procedimento, desde que preencha trs condies bsicas:
ter antecedentes honrveis;
ser realizado por motivo piedoso, e
a vtima ter feito reiteradas splicas.
A proposta uruguaia, elaborada em 1933, muito semelhante a utilizado na Holanda,
a partir de 1993. Em ambos os casos, no h uma autorizao para a realizao da
eutansia, mas sim uma possibilidade do indivduo que for o agente do procedimento
ficar impune, desde que cumpridas as condies bsicas estabelecidas. Esta
legislao foi baseada na doutrina estabelecida pelo penalista espanhol Jimnez de
Asa.
Vale destacar que, de acordo com o artigo 315 deste mesmo Cdigo, isto no se
aplica ao suicdio assistido, isto quando uma pessoa auxilia outra a se suicidar.
Nesta situao h a caracterizao de um delito, sem a possibilidade de perdo
judicial.
EUTANSIA NA COLMBIA:
Segundo notcia recentemente publicada no Jornal a Folha de So Paulo, em
22.05.97, a Corte Constitucional da Colmbia autorizou a eutansia em casos de
doentes terminais e com o consentimento prvio do envolvido.
Segundo pesquisa publicada pelo Jornal "El Tiempo", de Bogot(capital colombiana),
84% dos entrevistados apoiam a legalizao da Eutansia. (15)
EUTANSIA NO BRASIL:
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05 - CASUSTICA
Segundo a Declarao de Veneza sobre doena terminal, o dever do mdico consiste
em tratar e, quando possvel, aliviar o sofrimento e atuar na proteo do melhor
interesse do paciente, no devendo haver excees a esse princpio, mesmo no caso
de doenas incurveis ou malformaes.
A declarao de Veneza permite o alvio, por parte do mdico, do sofrimento de um
paciente terminal atravs da no utilizao de um tratamento com o consentimento do
paciente ou de sua famlia imediata, caso aquele no possa expressar a sua vontade.
O mdico deve, ainda, abster-se de utilizar medidas extraordinrias que no tragam
benefcios aos pacientes.
Assim procedeu o Dr. Bem Zylics (16), quando examinou uma mulher de 50 anos e
constatou que lhe restava pouco tempo de vida, em virtude de um cncer de mama
que se espalhava para os ossos, fgado e pulmo.
Cuidadosamente, o oncologista da Holanda, polons de nascimento, explicou
senhora que seu sofrimento poderia ser aliviado e ofereceu-lhe um quarto no hospital.
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Um livro foi escrito para mostrar ao mundo a batalha que estava sendo travada,
mostrando, tambm, a agonia dos pais. O livro Karen Ann, publicado pela Doubleday,
em uma de suas passagens diz que a "moa Karen, como uma bela adormecida vivia
ligada a um aparelho respiratrio e isto estava muito longe da verdade e da realidade
dos fatos. A moa, diz o casal Quinlan, se agitava, suava, gemia e abria os olhos
durante o estado de coma. Com a perda de peso, seu corpo comeou a se encolher,
tomando a grotesca posio fetal".
O estado de Karen comeou a piorar e todos perderam as poucas esperanas que
existiam. A me de Karen pediu conselhos ao vigrio de sua parquia, padre Thomas
Trapasso e este lhe disse que, segundo a doutrina catlica, no existe obrigao moral
de prolongar a vida de uma pessoa.
A famlia Quinlan e o capelo do hospital se reuniram com o mdico assistente do
hospital S. Clare, quando Joseph Quinlan, pai de Karen, decidiu e disse que queria
que o aparelho respiratrio fosse retirado e que ela voltasse ao seu estado natural. A
famlia assinou uma declarao e o mdico concordou. Muitos mdicos se opuseram.
O primeiro pedido para desligamento do aparelho respiratrio deu entrada na justia e
foi perdido em outubro de 1975. Os Quinlan, com a ajuda do jovem advogado Paul
Armstrong, levaram o caso para o Supremo Tribunal do Estado de Nova Jersei, e este,
em 31.03.76, decidiu que o aparelho fosse retirado, o que ocorreu em 22.05.76.
Karen no morreu, vivendo penosamente durante 10 longos anos.
Foi publicado o livro "Histria de Karen", em 1977, por Ernesto Frers, contando a triste
realidade de ver-se uma filha disposio do Estado, nas mos do hospital e de
mdicos, e mostrando a aflio da famlia.
No se poderia, ainda, deixar de mencionar a existncia do chamado Doutor Morte
(18). Jack Kevorkian, patologista de Michigan, influenciado por uma visita aos pases
baixos, decidiu ajudar pacientes terminais a se suicidarem. Em 1989 construiu sua
primeira mquina de suicdio.
A partir de ento, o Doutor Morte, como denominado, por intermdio de sua
mquina, matou cerca de 45 pessoas. Muitos no eram pacientes terminais, outros,
examinados por legistas, no manifestavam qualquer sinal de doena e ainda existiam
os portadores de deficincia.
Segundo Kevorkian, em declarao feita em 1993, o pedido de algum para suicidarse trata-se de procedimento mdico a respeito do qual apenas os profissionais da
medicina poderiam decidir.
Os eventuais candidatos eutansia, para Kevorkian, so indivduos com "trauma
grave", vtimas de "ansiedade intensa ou tortura psquica", alm de "fetos, bebs,
crianas, assim como qualquer ser humano incapaz de consentir, por si s, ou de fazlo com conhecimento de causa".
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A licena mdica de Kevorkian foi suspensa em 1991, mas, mesmo assim, a mdia
continua chamando-o de Dr. Morte, legitimando suas atividades. Ultimamente, livre da
fiscalizao, Kevorkian fornece drogas letais e transporta cadveres.
Outra questo onde reside polmica consiste em aplicar-se ou no a eutansia em
casos de aidticos em estgios avanados da doena incurvel.
Um grupo de 19 mdicos de Londres, todos membros de um grupo que defende a
legalizao da eutansia voluntria para vtimas de doenas incurveis, segundo a
machete do Dirio Catarinense, Florianpolis- SC, 22.11.87, p. 32 (19), fizeram um
apelo para a permisso da eutansia voluntria em aidticos "bem informados" e em
estgio final da doena. Porm, essa opinio no unnime entre o corpo mdico de
Londres.
Traz-se a destaque, tambm, o caso de idosos e bebs com malformaes ou
doenas incurveis. Baby Doe, por exemplo, foi um beb nascido em 1982, em
Bloomington, no estado de Indiana/EEUU, com mltiplas malformaes (trissomia do
21 e fstula traqueoesofgica). Apesar de ter 50% de chances de sua vida ser salva
por meio de uma cirurgia corretiva da fstula, seus pais se negaram a autorizar a
realizao, alegando que a criana era muito comprometida. Os pais tinham dois
outros filhos sadios e solicitaram, ainda, que a alimentao e os demais tratamentos
fossem suspensos. A equipe mdica postulou a autorizao para realizar a cirurgia
Justia, suspendendo o ptrio poder por determinado tempo, o que foi negado em
primeira instncia. A promotoria apelou Suprema Corte do Estado de Indiana, que se
negou a apreciar o caso. Foi feita a tentativa de se apelar para a Suprema Corte dos
Estados Unidos, mas o beb morreu aos seis dias de vida, no permitindo que se
fizessem novas tentativas. O advogado da famlia afirmou que "no foi um caso de
abandono, mas de amor ". (20)
Por fim, o caso anjo da morte retrata a histria de uma enfermeira, Michaela Roeder,
que matava pessoas idosas, aplicando injeo mortal nos pacientes idosos e doentes,
por pena de seus sofrimentos. O juiz da Alemanha condenou-a a 11 anos de priso,
considerando-a culpada em cinco casos de homicdio e de uma tentativa de homicdio,
alm de culpada por negligncia que causou a morte de outro paciente, e foi vaiado,
causando indignao ao pblico. Um homem na galeria disse: "estou chocado, vou
embora. Ns, pessoas idosas, no temos mais a coragem de ir para um hospital". (21)
Alternativa eutansia so os cuidados paliativos, que pouco existem na Holanda. O
Dr. Zylicz, em caso citado no incio do trabalho, depois de ter um paciente seu sido
morto por eutansia aplicada por um colega de trabalho, passou a se dedicar ao
trabalho em abrigos, oferecendo conforto espiritual e controle da dor fsica e mental,
sem precisar adiantar a morte.
Esses so apenas alguns dos casos dos quais se tm notcias pelo mundo,
permanecendo, sempre, a indagao: "At que ponto pode-se dar fim vida humana?
O estado vegetativo de um paciente e o sofrimento da famlia devem ser abreviados?
E os bebs, como Baby Doe, que sequer tm o direito a uma tentativa de vida? A
eutansia vai continuar como uma questo polmica e, talvez, a dificuldade de
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legalizao esteja ligada questo de que cada caso pede anlise e regras
singulares.
06 - TICA E EUTANSIA:
H, pelo menos, uma noo intuitiva, em todos, do que seja tica; sua explicao ,
contudo, tarefa difcil. Ademais, tentar defini-la seria nos privar de toda a amplitude de
seu significado que pode ainda advir do desenvolvimento do pensamento humano.
Etimologicamente, o termo tica deriva do grego ethos que significa modo de ser,
carter. Designa a reflexo filosfica sobre a moralidade, ou seja, acerca das regras e
cdigos morais que norteiam a conduta humana. Sua finalidade esclarecer e
sistematizar as bases do fato moral e determinar as diretrizes e os princpios abstratos
da moral. Neste caso, a tica uma criao consciente e reflexiva de um filsofo
sobre a moralidade, que , por sua vez, criao espontnea e inconsciente de um
grupo.
Pode ser entendida como uma reflexo sobre os costumes ou sobre as aes
humanas em suas diversas manifestaes, nas mais diversas reas. Tambm, pode
ser ela compreendida como a existncia pautada nos costumes considerados corretos,
ou seja, aquele que se adequar aos padres vigentes de comportamento numa classe
social, de determinada sociedade e que caso no seja seguido, passvel de coao
ao cumprimento por meio de punio. Em resumo, tem-se a tica como o estudo das
aes e dos costumes humanos ou a anlise da prpria vida considerada virtuosa.
possvel, ainda, consider-la como a parte da filosofia que tem como objeto o deverser no domnio da ao humana. Distingue-se da ontologia cujo objeto o ser das
coisas. Prope-se, portanto, a desvendar no aquilo que o homem de fato , mas
aquilo que ele "deve fazer". Seu campo o do juzo de valor e no o do juzo de
realidade, ou da existncia. Estuda as normas e regras de conduta estabelecidas pelo
homem em sociedade, procurando identificar sua natureza, origem, fundamentao
racional. Em alguns casos, conclui por formular um conjunto de normas a serem
seguidas; em outros, limita-se a refletir sobre os problemas implcitos nas normas que
de fato foram estabelecidas.
As noes decorrentes de aes advindas de uma ou mais opes entre o bom e o
mau, ou entre o bem e o mal, relacionam-se com algo a mais: o desejo que todos tm
de serem felizes, afastando a angstia, a dor; da, ficamos satisfeitos conosco e
recebemos a aceitao geral.
Para que exista a conduta tica, necessrio que o agente seja consciente, ou seja,
que possua capacidade de discernir o bem e o mal. A conscincia moral possui a
capacidade de discernir entre um e outro, avaliar, julgando o valor das condutas, e agir
conforme os padres morais. Por isso, responsvel pelas suas aes e emoes,
tornando-se responsvel tambm pelas suas conseqncias.
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condies, j ocorreu. Resta apenas repassar esse conceito sociedade e exigir que
os critrios utilizados nesse tipo de diagnstico sejam idneos e incapazes de
qualquer outro interesse. Isso muito importante, no s por razo de segurana
jurdica, mas como forma de disciplinar a inclinao pessoal, resguardar o interesse
pblico e manter a ordem social.
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e dores do corpo em que reside, embora na ndia Antiga terem sido prescritas medidas
particulares para por termo vida de pessoas afetadas por molstias incurveis.
07.5 - Religio Budista
Para o budismo, nossa personalidade deriva da interao de cinco atividades: a
atividade corporal, as sensaes, as percepes, a vontade e a conscincia. De todas,
a vontade a mais importante, porquanto representa a capacidade de escolha, de
orientar a conscincia: a morte de algum, assim, ocorre quando algum no mais
possa exercer uma vontade consciente, quando seu encfalo perdeu definitivamente a
capacidade de viver, quando o ltimo trao de atividade eltrica o abandonou.
O sofrimento tem grande importncia no pensamento de Buda: as Quatro Verdades
Nobres para obter a Iluminao so sua verdadeira causa.
Destarte, a eutansia ativa e a passiva podem ser aplicadas em numerosos casos,
admitindo o budismo que a vida vegetativa seja abreviada ou facilitada.
08 - CONCLUSO:
Longe de emitir uma opinio definitiva sobre o instituto em questo deixamos as
argumentaes acima expostas para uma minunciosa anlise visando uma possvel
tomada de posio por parte daqueles que se interessam pelo assunto.
Assunto por demais atual e inerente a condio de ser humano na medida em que o
direito a vida, ou a morte, se pe sob a tica de bens indisponveis.
At que ponto valores ticos, morais, religiosos devero influenciar na manuteno da
"vida" de um moribundo de quadro irreversvel?
Toda e qualquer anlise acerca de temas ligados Biotica dever contar com
opinies de profissionais de diversas reas (multidisciplinar) do conhecimento
humano, analisando casualisticamente toda situao e orientados pelos princpios j
consagrados pela disciplina.
certo que essa discusso no vai se encerra por aqui e, com muita satisfao,
esperamos ter contribudo para o engrandecimento do conhecimento acerca do tema.
NOTAS
1.
31
2.
CONFLITOS TICOS E JURDICOS. LIMITES MORAIS, Tese apresentada na VI Conferncia Nacional da Associao
Brasileira de Mulheres de Carreira Jurdica;
3.
4.
CHAVES, Antonio, DIREITO VIDA E AO PRPRIO CORPO, So Paulo, 1994, Ed.Revista dos tribunais,
pg.50;
5.
6.
The Belmont Report: Ethical Guidelines for the Protection of Human Subjects. Washington: DHEW
Paulo, 1992, Ed. Saraiva; c/c GOLDIM, Jos Roberto, in PROBLEMAS DE FIM DE VIDA:PACIENTE TERMINAL,
MORTE E MORRER, IN http://ufrgs.br/HCPA/gppg/casos.htm
11.
12.
BIZATTO, Jos Ildefonso. Eutansia e Responsabilidade Mdica. Porto Alegre: Sagra, 1990, p. 23.
13.
14.
15.
16.
17.
BISATO, Jos Ildefonso, EUTANSIA E RESPONSABILIDADE MDICA, Porto Alegre, 1990, Ed. Sagra;
18.
19.
BISATO, Jos Ildefonso, EUTANSIA E RESPONSABILIDADE MDICA, Porto Alegre, 1990, Ed. Sagra;
20.
21.
BIBLIOGRAFIA:
MACEDO, Silvio de, HISTRIA DO PENSAMENTO JURDICO, Porto Alegre, 1997,
Srgio Antnio Fabris Editor, 2 ed.;
MAGNO, Dicionrio Brasileiro da Lngua Portuguesa, So Paulo, Editora Edipar;
RIBEIRO, Max Gimenez, Eutansia, in Horse Business, Ed. 30, Ago/97, p. 56-9.
GOLDIM, Jos Roberto, in Problemas de Fim de Vida: Paciente Terminal, Morte e
Morrer, http//orion.ufrgs.br/HCPA/gppg/casos.htm.
SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite, TRANSPLANTE DE RGOS E EUTANSIA,
Ed. Saraiva, So Paulo, 1992;
32
DA
LNGUA
Sobre o texto:
Texto inserido no Jus Navigandi n24 (04.1998)
Informaes bibliogrficas:
Conforme a NBR 6023:2000 da Associao Brasileira de Normas Tcnicas (ABNT), este texto cientfico publicado
em peridico eletrnico deve ser citado da seguinte forma:
33