Publicidade e Efeito de Terceira Pessoa
Publicidade e Efeito de Terceira Pessoa
Publicidade e Efeito de Terceira Pessoa
produo cientfica
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Tatiana Aneas
Universidade Federal da Bahia
tatiana.aneas@gmail.com
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Resumo:
O presente artigo prope-se a realizar uma reviso da produo cientfica sobre o Efeito
de Terceira Pessoa que aborda os produtos da publicidade contempornea (publicidade
comercial, pblica e poltica). Foram levantados e revisados os artigos produzidos nos
ltimos dez anos, a fim de verificar o estado da investigao atual, em especial no que
diz respeito ao tratamento dado s mensagens publicitrias. Foi verificado que, a
despeito da grande quantidade de trabalhos que tratam desta espcie de produto
comunicacional, de modo geral a pesquisa sobre Efeito de Terceira Pessoa tende a
produzir resultados que mais auxiliam na compreenso do processamento das
mensagens do que produzem conhecimento relevante a respeito das mensagens
publicitrias como tais.
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Palavras-chave: publicidade, propaganda, efeito de terceira pessoa, media effects
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Nos ltimos dez anos, o campo da pesquisa em comunicao vem se aproximando do
extremo de um movimento que prega que a recepo deve ser o problema maior dos
trabalhos da rea. Enquanto Barthes e seus colegas buscavam entender o receptor na
chave lingstica, os lacanianos reviravam obras esperando encontrar indcios do
inconsciente e os Cultural Studies representavam o brao marxista dentro da academia.
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Mtodo
Foram utilizados alguns critrios objetivos para a seleo dos artigos revisados. O
primeiro deles a necessria abordagem de produtos ou temas ligados publicidade.
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Efeito de Terceira Pessoa: uma hiptese sobre persuaso e opinio pblica
O interesse pelas multides (ou pelos pblicos) to tpico da psicologia social como da
pesquisa em comunicao. Isso explica o fato de psiclogos e sobretudo as cincias
sociais preocuparem-se frequentemente com questes relativas aos meios de
comunicao, e em especial com suas conseqncias. Neste contexto, sustentar a
hiptese levantada pelo socilogo W. Phillips Davison em 1983, que previa que as
pessoas tendem a superestimar os efeitos da comunicao de massa nos outros, ainda
hoje o objetivo de um grande nmero de pesquisas. Passada a fase de comprovao da
tese, os esforos agora se concentram em test-la em diferentes cenrios e em
cruzamento com mltiplas variveis. Mas o texto inaugural permanece bastante
adequado para explicitar as bases dos trabalhos desta espcie:
This hypothesis predicts that people will tend to
overestimate the influence that mass communications
have on the attitudes and behavior of others. More
specifically, individuals who are members of an audience
that is exposed to a persuasive communication (whether
or not this communication is intended to be persuasive)
will expect the communication to have a greater effect on
others than on themselves. And whether or not these
individuals are among the ostensible audience for the
message, the impact that they expect this communication
to have on others may lead them to take some action. Any
effect that the communication achieves may thus be due
not to the reaction of the ostensible audience but rather
to the behavior of those who anticipate, or think they
perceive, some reaction on the part of
others. (DAVISON, 1983).
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interessante notar como, desde os seus primrdios, a hiptese do Efeito de Terceira
Pessoa apresenta a preocupao em desvendar os efeitos, perceptivos/cognitivos ou
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Publicidade e efeitos
Com tais preocupaes como guia, a pesquisa em ETP logo observou diferenas nos
produtos publicitrios com relao s demais espcies de mensagens circulantes nos
meios de comunicao. Uma das premissas derivadas de Davidson prev que, por se
tratarem de estmulos que objetivam explicitamente a persuaso do espectador, as
mensagens publicitrias produziriam efeitos de terceira pessoa mais intensos. O
indivduo, por mecanismo de auto-proteo da imagem prpria, tenderia a negar os
efeitos da publicidade sobre si e atribu-los mais fortemente aos outros, incrementando o
Banning (2008) outro exemplo que realiza uma comparao entre os efeitos
produzidos por contedo televisivo controverso (violncia), comerciais institucionais de
marcas e PSAs, utilizando a teoria da ao racional para sustentar a hiptese de que os
indivduos relatariam maior tendncia a agir de forma socialmente desejvel aps a
exposio s peas do tipo PSA, que deveria tambm provocar ETP reverso. O efeito de
primeira pessoa, ao contrrio do previsto, no verificado, mas a exposio aos PSAs,
em oposio aos outros tipos de estmulo, se mostra capaz de provocar tendncia ao
comportamento socialmente desejvel.
Outro conjunto de pesquisas, dentre as quais est o trabalho de Duck, Hogg e Terry
(1999) e o de Cho e Boster (2008), adotam como varivel o nvel de qualidade
percebida da propaganda pelo indivduo. No caso de Duck et al, os investigadores
estavam centrados em identificar diferenas na intensidade e direo dos efeitos na
relao com distintos grupos de comparao (os chamados others). Mas o fato de
considerar relevante o quanto os indivduos atribuem boa qualidade ao que assistem
pressupe que exista algo em algumas propagandas que no h em outras e que leva a
tal percepo. Sendo a qualidade um aspecto percebido da mensagem, origina-se da
interao entre caractersticas prprias do estmulo e propriedades cognitivas e
contextuais do indivduo. Importante notar que o interesse deste e de outros trabalhos
similares est localizado muito mais nas propriedades psico-cognitivas de quem recebe
o estmulo do que nas caractersticas do estmulo per se responsveis por produzir
respostas. Da mesma forma, porm, possvel partir da constatao de que determinado
tipo de produto apresenta nvel de qualidade percebida mais elevado para justificar uma
investigao acerca das propriedades internas que levam a tal percepo.
o que no confirmado, embora seja auferido ETP mais intenso no caso dos produtos
estigmatizados (que tambm podem se entendidos como socialmente indesejveis).
Neste caso, interessante notar que a pesquisa centra-se apenas no contedo restrito da
mensagem, ou seja, no produto que ela promove, deixando de lado a qualidade
argumentativa (relatada ou verificada na mensagem em si) das propagandas
estigmatizadas e neutras.
A pesquisa de Day (2008), por fim, faz uma comparao entre os efeitos produzidos por
trs tipos de publicidade comercial televisiva: comerciais de compromisso pblico,
institucionais e comerciais que promovem produtos e incitam o consumo propriamente
dito. Day aposta na desejabilidade do indivduo de ser influenciado por cada um dos trs
tipos de mensagem e no apelo emocional dos filmes como moderadores do impacto
percebido sobre si e tambm de efeitos comportamentais (neste caso, o consumo).
Conforme previsto, os resultados apontam ETP clssico para os comerciais
institucionais e promocionais e ETP reverso para os comerciais de compromisso
pblico, hipoteticamente considerados como socialmente desejveis. O apelo emocional
auferido pelo relato dos participantes do experimento, como de praxe, e verificado
que tal apelo mais elevado para o primeiro tipo de mensagem, assim como efeitos
comportamentais so verificados apenas neste conjunto de estmulos. Verificada
empiricamente a produo de efeitos de ordem emocional, seria possvel partir deste
ponto para a anlise mais atenta dos materiais em si, a fim de descobrir o que h em uns
e falta em outros que possibilite a diferena de efeitos.
Day (2008), entretanto, no foi o primeiro a notar a importncia da dimenso afetiva na
produo do ETP. Em 1999, Shah, Faber e Youn publicaram os resultados de uma
pesquisa que buscava entender a produo tanto de respostas cognitivas como de afetos
como um processo subjacente produo do efeito de terceira pessoa, assim como suas
conseqncias comportamentais, no caso de propagandas de cigarros, bebidas e jogos
de azar. Neste caso, porm, o foco estava nos sentimentos negativos gerados pela
mensagem como o medo e a preocupao de que outras pessoas fossem impactadas
pela propaganda e tomassem atitudes autodestrutivas por conta da exposio a ela.
Conforme previsto, os participantes da pesquisa relataram efeitos emocionais e
tendncia a apoiar a censura de tais mensagens.
Alm da publicidade de carter pblico, a propaganda poltica tambm foi investigada
por alguns estudiosos do efeito de terceira pessoa. o caso do trabalho de Meirick
(2004), que investigou a produo de efeito de terceira pessoa clssico e reverso pela
propaganda poltica considerando grupos de comparao socialmente prximos (do
mesmo partido) e distantes (de outro partido). Na pesquisa, tambm foi considerada
como varivel a posio do indivduo com relao fonte da mensagem se a fonte era
o candidato/partido apoiado ou o candidato/partido adversrio. Quanto maior a distncia
poltica (que pode tambm ser entendida nos termos da identificao social), maior seria
o ndice de discrepncia entre os efeitos percebidos sobre si e sobre os outros, de acordo
com a hiptese de Meirick. A primeira varivel foi confirmada como moderador
significante dos efeitos, tanto diretos como reversos, ao contrrio da segunda a fonte
da mensagem.
A propaganda utilizada para atacar adversrios polticos em perodos de campanha
eleitoral e os efeitos dela derivados so analisados por Paek et al (2005), com
implicaes interessantes. Na pesquisa, foi investigado o papel da distncia social do
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Concluso
Apesar da abundncia de produo no mbito da pesquisa sobre efeito de terceira
pessoa, uma reviso com esta revela que a preferncia recorrente por produtos
publicitrios est mais ligada possibilidade que esta espcie de mensagens oferece de
chegar-se a resultados significativos do que ao interesse em entender o funcionamento
delas enquanto tais. O que no ilegtimo, em absoluto. Se h uma crtica que possa ser
feita a este conjunto de trabalhos, ela no de natureza metodolgica. possvel
identificar, entretanto, uma certa tendncia instrumentalizao, e questionar porqu,
por exemplo, tantos esforos so dedicados a compreender conseqncias
comportamentais do ponto de vista da censura, do voto, do consumo, ou da adoo de
atitudes socialmente interessantes embora no haja tanta preocupao com possveis
conseqncias da publicidade especificamente com problemas de sade pblica,
violncia ou consumismo exacerbado.
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