Direito Dos Animais
Direito Dos Animais
Direito Dos Animais
Rosangela M. A. Gomes
Mery Chalfun
RESUMO
O direito dos animais desponta como um novo e fundamental ramo do direito,
protegendo os animais como forma de proteger no apenas o meio ambiente, mas
tambm seus direitos fundamentais como a vida e o respeito, coibindo atos de violncia,
crueldade, maus tratos e conseqente extino de muitas espcies. A filosofia, a moral,
tica, virtudes como compaixo e benevolncia so a essncia do movimento dos
direitos dos animais, despertando no ser humano a luta pelos direitos de outras espcies.
Os grandes filsofos bem como estudiosos do direito sempre destacaram a importncia
do homem, utilizando os animais sempre em benefcio daqueles, como seres inferiores e
em proveito do ser humano. A religio, e o pensamento cartesiano com entendimento do
animal sem alma, sem direitos, contriburam para a utilizao dos animais como
propriedade e objetos de direito. Entretanto, caminha-se para um comportamento moral
e tico em relao aos animais, entendendo que juntamente com o direito devem
proporcionar- lhes uma vida digna, respeitosa, pois assim como o homem so capazes
de sentimentos, percepes e sensibilidades. No aspecto normativo e documental o feito
mais louvvel quanto proteo dos animais a Declarao Universal dos Direitos dos
Animais, proclamada pela UNESCO em 1978, com reconhecimento do valor da vida de
todo ser vivo, de sua dignidade, respeito e integridade dos animais. No Brasil destaca-se
a Constituio Federal de 1988 em seu artigo 225 proibindo atos de crueldade contra os
Graduao em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (1990), mestrado em Direito pela
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (1996) e doutorado em Direito pela Universidade do Estado do
Rio de Janeiro (2001). Atualmente professora adjunta da UERJ e UNI-Rio, e professora permanente do
Programa de Ps-graduao em Direito da UNESA e colaboradora da FDC.
A autora advogada graduada pela PUC-RJ, Ps Graduada em Direito Civil pela Universidade Estcio
de S, mestranda no programa de Ps Graduao em Direito na Universidade Estcio de S RJ, na linha
de pesquisa Direitos Fundamentais e Novos Direitos, orientada pela prof Dra. Rosangela Gomes,
dissertao/tema Direito Animal. Patrocinou a primeira ao contra o Decreto 37.921 de 05/07/05
(decreto que restringia horrio de passeio de algumas raas de ces).
847
animais e a Lei n 9605 de 1998 que define os Crimes Ambientais, alm de algumas
leis esparsas, demonstrando o interesse crescente pelos direitos dos animais.
Juridicamente e tradicionalmente os animais so definidos como objeto de direito,
entretanto h uma tendncia atual no sentido de consider-los sujeitos de direito,
podendo ser representados em aes civis pblicas pelo Ministrio Pblico. Por outro
lado a Constituio lhes conferiu natureza difusa e coletiva, portanto, bem scioambiental de toda a humanidade, demonstrando o crescente interesse na proteo destes
seres, entendimentos diversos e reforo da importncia do direito dos animais, como
novo ramo do direito a ser estudado. Tema vasto, e com diversas peculiaridades a serem
estudadas, pretende-se no presente trabalho destacar a importncia e alguns
entendimentos sobre este direito e sobre sua evoluo.
ABSTRACT
The animals rights are a new and important area of law. Animals protection intends to
assure their fundamental rights as life and respect, and also the environment. This is a
way to avoid cruel and violent acts; witch could result in species extinction. At animals
law or rights, the essence of the discussion is the philosophy, the moral, the ethics and
qualities as compassion and benevolence. Its important that human beings are
conscious about other species rights. The most important thinkers, just like law
operators, have always aimed at human beings supremacy; witch would justify animals
use on their own benefit. The old understanding of religion and some philosophers, that
animals had no soul and no rights, is machine, did contribute to animals use as property
and law object. Other thinkers pointed out the importance of the moral and the ethics
related to animals. Law also must assure animals the right to live with dignity. Animals
have feelings and fundamental rights. The most important rule and document on
animals protection is Animals Rights Universal Declaration (UNESCO, 1978). It
recognizes lifes value of every being. This Declaration also assures dignity and respect
for the animals. In Brazil, the Federal Constitution (1988) prohibits cruel acts against
the animals. The law 9605/1998 witch defines the crimes against environment, and also
some other laws, show us the growing interest on animals law. Our law still defines
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animals as laws objects. The civil law and law thinkers consider them as property.
However, there is a group who understands they are possessors of rights. The Federal
Constitution has also assured to animals rights the diffuse and collective nature, witch
means we are talking about a good of all humanity. Definitely, this is a deep discussion.
We intend herein to show the importance of the subject and different opinions. There is
a long way on the defense of animals rights; however there is no doubt that people are
more conscious about it. This is a new area of law developing day by day, certainly
important to environment, human being and specially, for animals.
INTRODUO:
A Constituio Federal da Repblica de 1988 em seu artigo 225 e a Lei de crimes Ambientais n
9.605/98 nos artigos 29 a 37, demonstram preocupao com o meio ambiente, mas tambm visam evitar
maus tratos e extino. Algumas leis apesar de falhas tentam proteger os animais, podendo ser citadas no
Brasil entre outras: o Decreto 16.590/1924 proibindo rinhas de galo, decreto 24.645 de 1934 definindo
figuras tpicas de maus tratos aos animais, Cdigo de Pesca ou Decreto lei 221/67, Cdigo de Caa ou Lei
5.197/67 posteriormente alterada pela lei 7653/88.
Mais recentemente o projeto de lei n 973/03, e recente resoluo n 877 de 19/03/08 publicada no DOU
pelo Conselho de Medicina Veterinria probe diminuio de orelhas (conchectomia) em ces, retirada de
unhas de gatos (onictomia) e recomenda no cortar caudas, j que no traz qualquer benefcio para o
animal, expondo o a riscos desnecessrios por questes estticas, o que demonstra a preocupao
crescente com os animais no apenas como forma de proteger o meio ambiente, mas como forma
exclusiva de proteger o prprio animal, com seu bem estar, demonstrando a tendncia de transform-lo
em sujeito de direito.
849
tica em relao aos animais, que juntamente com o direito devem proporcionar- lhes
uma vida digna, respeitosa, pois assim como o homem so capazes de sentimentos,
percepes e sensibilidades.
Scrates, Plato e Aristteles, debruaram-se sobre as questes filosficas tendo o homem como
preocupao principal, a vida dos animais no possua grande valor, e Aristteles cuja obra filosfica
base do Direito Ocidental, afirmava que os animais serviam ao homem, e esta influncia do direito
romano no Ocidente acaba por inserir o animal como coisa, propriedade privada. Posteriormente outros
filsofos como Thomas Hobbes, Jonh Locke entre outros acabam por incentivar a interveno do homem
na natureza, e a primazia do homem como o centro do Universo.
Oliveira, Nelci Silveira de. Curso de Filosofia do Direito. 2 Ed. Goinia: AB Editora, 2001.
O santos padres, entre eles Santo Agostinho (354-430) e So Tomas de Aquino (1225-1272) entendiam
que havia uma hierarquia entre as criaturas, inexistindo pecado ao matar um animal. Em entendimento
contrrio So Francisco de Assis (1182-1226) considerado como o santo protetor dos animais. (site:
http://www.sosanimalmg.com.br/ acessado em dezembro de 2007)
Pitgoras, Plutarco, Porfrio so filsofos antigos que adotavam alimentao vegetariana e eram
piedosos com os animais. Outros mais recentes podem ser citados como o filsofo francs Montaigne,
Leonardo Da Vinci, Jeremy Benthan, Charles Darwin ...
"Vir o dia em que a matana de um animal ser considerada crime tanto quanto o assassinato de um
homem." (Leonardo da Vinci)
"Enquanto o homem continuar a ser destruidor impiedoso dos seres animados dos planos inferiores, no
conhecer a sade nem a paz. Enquanto os homens massacrarem os animais, eles se mataro uns aos
outros. Aquele que semeia a morte e o sofrimento no pode colher a alegria e o amor." "Os animais
dividem conosco o privilgio de terem uma alma." (Pitgoras)
"A compaixo para com os animais das mais nobres virtudes da natureza humana." (Charles Darwin)
"Em termos de evoluo, bem maior o dbito da Humanidade para com os animais do que o crdito
que lhes temos dispensado para seu bem-estar e progresso." (Eurpedes Kuhl)
850
1. O HOMEM e o ANIMAL:
851
852
RODRIGUES, Danielle Tetu. O direito e os animais. Uma abordagem tica, filosfica e normativa. 4
ed. Juru, Curitiba, p. 55.
"No h diferenas fundamentais entre o homem e os animais nas suas faculdades mentais...os animais,
como os homens, demonstram sentir prazer, dor, felicidade e sofrimento." (Charles Darwin)
7
O Projeto dos Grandes Primatas trata-se de um movimento internacional com a finalidade de garantir
aos chimpanzs, gorilas, orangotangos e bonobos, direitos bsicos, tais como direito a vida, proteo da
liberdade individual e proibio de tortura.
8
Deste questionamento nasceu o termo especismo, ou seja, discriminao em relao espcie em geral
no humana.
853
2. EVOLUO FILOSFICA:
Nos Estados Unidos, aproximadamente 70 escolas de direito, dentre 180 existentes incluem cursos
sobre a lei animal, sendo defendida por diversos professores como Alan Dershowitz e Laurence Tribe da
Havard Law School. (dados da internet site http//www. Wikipdia org. acessado em maro de 2008)
854
11
Aristteles, Plato, Kant (submisso animal), Pitgoras, Jeremy Benthan ( defesa dos animais)
SAFRANSKI, Rudiger. Nietzche: Biografia de uma tragdia. Traduo Lya Lett Luft. So Paulo:
Gerao Editoria, 2001.
12
Aristteles A Poltica Coleo Fundamentos de filosofia, cone, 2007
13
SAFRANSKI, Rudiger. Nietzche: Op.cit.
14
Aristteles A Poltica - Op. cit.
11
855
15
Kant, Emmanuel. Fundamentos da metafsica dos costumes. Trad. De Paulo Quintela. Lisboa: Edies
70.200,
16
Ibidem, p. 68
17
Montaigne, Michel de. Ensaios. Trad. Srgio Millet. So Paulo:Nova Cultural, 2000.
18
Descartes, Ren. O Discurso do Mtodo. Coleo Universitria, Ediouro, 1986
19
VOLTAIRE, Franois Marie Arouet. Dicionrio Filosfico. Coleo Obra Prima de cada autor. Ed.
Martin Claret
856
argumenta que Deus a alma que anima a vida e argumenta a mxima conhece-te a ti
mesmo, contesta o pensamento de Descartes.
Jean Jacques Rousseau20 igualmente contesta o pensamento do animal
mquina, defendendo o tema liberdade, que homens e animais em estado de natureza
eram belos e saudveis, quando a propriedade privada foi instituda a idade do ouro
comeou a corromper-se, a sociedade instituiu as desigualdades e injustias, entende
que a diferena entre os animais e o homem que o primeiro escolhe por instinto e o
homem por liberdade. Sua obra Devaneios de um Caminho Solitrio, expressa seu
amor aos animais, plantas, pela natureza.
..Parece, com efeito, que, se sou obrigado a no fazer nenhum mal a meu
semelhante, menos porque ele um ser racional do que porque um ser
sensvel, qualidade que, sendo comum ao animal e ao homem, deve ao
menos dar a um o direito de no ser maltratado inutilmente pelo outro...21
23
24
A compaixo pelos animais est intimamente ligada a bondade de carter, e pode ser seguramente
afirmado que quem cruel com os animais no pode ser um bom homem." (Arthur Schopenhauer)
857
apesar
desta
viso
predominante,
alguns
filsofos
demonstraram preocupao com os animais, e esta filosofia animal, direito dos animais,
preocupao tica, moral e legal vem se fortalecendo e progredindo.
Na verdade, h um crescente discurso filosfico, tico, repleto de
princpios morais a nortearem a conduta humana em prol da dignidade e respeito da
vida animal, impondo aos humanos, os direitos dos animais bem como deveres em
relao a estes, obrigaes moral e jurdica de se absterem de prticas abusivas,
violenta, cruel, degradante para com estes seres vivos.
O homem como ser racional tem dever e obrigao para com os animais,
entretanto muitos conflitos de interesses ainda ocorrem envolvendo estes seres, o
caminho e luta por seus direitos ainda tmido, no obstante, muitos avanos so
25
858
notados, e cada vez mais o homem adquire conscincia de seu dever em relao s
demais espcies.
29
LEVAI, Laerte Fernando. Artigo : Os animais sob a viso da tica. In Revista brasileira de Direito
Animal
859
30
DREW. David. Processos Interativos homem meio ambiente. Traduo de Joo Alves dos Santos. 4
ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998
31
Ibidem
860
32
861
DIAS, Edna Cardozo. A tutela jurdica dos animais. Belo Horizonte: Mandamentos, 2000, p.333
SIRVINKAS, Luis Paulo. Manual de direito ambiental. So Paulo: Saraiva, 2002, p. 194-195
862
4. CONSIDERAES FINAIS:
863
35
ACKEL Filho, Diomar. Direito dos Animais. So Paulo: Themis Livraria e Editora, 2001. 296 p
864
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