Processos e Problemas Na Urbanização Da América Latina: Teoria e História
Processos e Problemas Na Urbanização Da América Latina: Teoria e História
Processos e Problemas Na Urbanização Da América Latina: Teoria e História
Resumen
Este artculo analiza las condiciones de produccin del espacio en la ciudad
latinoamericana y tiene como referencia al desarrollo urbano de So Paulo. El debate
objetiva contribuir a la comprensin terica de las peculiaridades de los procesos de
urbanizacin y de acumulacin industrial en la construccin para enfatizar que las
relaciones no capitalistas estn en el origen de la acumulacin capitalista y que la
persistencia histrica de dichas relaciones en combinacin con las relaciones capitalistas
sirvi a la sobreexplotacin y supervivencia de los trabajadores de la ciudad y en la
actualidad este espacio resulta fundamental para la supervivencia del capitalismo
garantizando las ganancias elevadas com rentismo y las tasas de inters.
Palavra-chave: colonialismo, imobilirio, neoliberal
Introduo
A referncia cidade de So Paulo se justifica pelos conflitos e problemas urbanos
atuais, mas tambm por sua histria porque este ncleo urbano, fundado em meados do
sculo XVI, foi o primeiro assentamento colonial portugus a se localizar distante da faixa
litornea. Em sua fundao se expressava a inteno de levar adiante a conquista de
territrio e de gentes da terra utilizando os mtodos da chamada acumulao primitiva
de capital. caracterstica dessa forma de acumulao a utilizao de processos de
expropriao, desapropriao ou espoliao de pessoas vulnerveis que perdem
condies de vida e se veem impedidas de acessar os bens comuns, quando no so
elas mesmas privados da condio de pessoa e de sua liberdade. Historicamente, a
dinmica desses processos se manifesta de maneira distinta e apresenta particularidades
conforme regio, formao urbana, industrial e a maneira como concorreu constituio
dos estados nacionais. Apesar das diferentes dinmicas a crueldade dos mtodos foi um
ponto comum revelando a voracidade dos processos e como apesar das reaes geradas
no se conseguiu impedir a colonialidade como maneira de estabelecer e manter as
relaes entre os povos colonizados com os centros de poder. Nesse sentido, pretendese que a discusso terica e histrica desses processos da acumulao primitiva bem
como a identificao de problemas relativos construo, urbanizao e crescimento das
cidades latino-americanas permita reconhecer os fundamentos pelo qual o direito
cidade, esteve fragilizado e tornou persistente a dominao da Metrpole e o poder do
colonizador.
Considera-se que embora a urbanizao e a construo das cidades apresentem
situaes particulares importantes h processos aproximam suas histrias. Nessa mesma
conjuno, os problemas urbanos apresentam semelhanas e convergem para o trao
comum, que a desigualdade nas cidades latino-americanas. Essa constatao
relevante porque a urbanizao planejada, mesmo que capitalista, poderia minorar a
segregao ao imprimir outra dinmica construo dessas cidades e soluo do
problema habitacional. Vale a reter a dvida dessas primeiras consideraes at porque
nuestros patrones culturales parecen proveer ms oportunidades de integracin social
que las que solemos atribuirles (Sabatini & Trebilcock, 2013, p. 38) e certamente cabe s
polticas urbanas, mesmo que atendendo de maneira mercantil as diferenciadas
demandas sociais, tornar as cidades mais justas.
Chama ateno que as polticas pblicas e os programas habitacionais e de
qualificao urbna pouco impactam o direito cidade: as cidades latino-americanas
continuam sendo injustas e muito desiguais. Historicamente, embora a urbanizao tenha
apresentado avanos e muitos dos resultados possam ser considerados fatores de
integrao social preciso lembrar que recente relatrio sobre a condio dessas cidades
confirma a persistncias de problemas tradicionais e
que as desigualdades
socioeconmicas en la regin tambin se hacen evidentes en trminos de calidad de
viviendas y del acceso a servicios pblicos (ONU Habitat, 2014, p. 166) Por isso, cabe
ressaltar que esta mais uma publicao de importante organismo mundial a indicar que
a Amrica Latina se constitui na regio mais desigual do mundo ainda que, essa possa
fazer a ressalva de que, atualmente, o ritmo do crescimento da desigualdade esteja
diminuindo.
Amrica Latina e Caribe, historicamente, sempre tiveram cidades segmentadas social e
territorialmente. Esse artigo tem em vista aprofundar o conhecimento sobre a persistncia
dessa situao e pretende refinar a crtica sobre os processos que a produzem. Assim,
desigualdade urbana o objeto de estudo privilegiado dessa discusso que realizada sob
Para ele, a partir dos anos 1970 se destacam esses processos espoliativos, que acabam
por marcar a acumulao na passagem para o sculo XXI. Sabe-se que nesta passagem
de sculo na cidade latino-americana houve, simultaneamente, a generalizao da formacondomnio e a emergncia da incorporao imobiliria empresarial, como forma de
apropriao, produto imobilirio novo e forma indita da produo do espao (Pereira,
2006, 2011). Por isso, o objetivo de precisar o significado desses processos espoliativos
financeiro, urbano e imobilirio na produo do espao da cidade contempornea,
particularmente, para uso habitacional.
Quanto a discusso do significado desses processos ser relevante situar como as
formas de produo do espao para mercado desenvolvem prticas urbanas predatrias
tais como as praticadas pelo chamado urbanismo empresarial a partir das quais se
criaram modelos de comercializao, financiamento, produtos e negcios imobilirios
globalizados.
Estes ltimos, sobretudo, se apoiam na atual financeirizao e
reestruturao que disseminou a forma de propriedade condominial e, perversamente, a
associou ao endividamento das famlias. Todavia, importante notar que essas prticas
de agenciamento imobilirio atingiram, significativamente, cidades norte-americanas no
apenas as maiores, mas tambm aquelas como Baltimore, Detroit e outras onde muitas
famlias vulnerveis perderam a propriedade. Conforme Harvey (2014, 119) essas
prticas urbanas predatrias alm da excessiva explorao de trabalho e expropriao
dos bens dessa populao revelam a emergncia de uma condio que exige
organizao de toda cidade e uma resposta poltica de toda a cidade.
Trata-se da emergncia de um novo quadro da poltica urbana e de possibilidade de
refletir sobre a urbanizao. Por este motivo, interessa discutir o que esse quadro
emergente pode significar para a cidade latino-americana j que os mtodos da
acumulao primitiva persistiram na Amrica Latina, incitando e associando-se s
dinmicas da reproduo expandida do capital. E, indagar se sua maior relevncia nas
dcadas mais recentes altera histria da superexplorao do trabalho e as possibilidades
de combate-la na Amrica Latina. Assim, atento a essas preocupaes busca-se, neste
artigo, relevar porque a instrumentalizao do espao sempre foi significativa e porque na
globalizao essa instrumentalizao da terra pela construo se tornou uma condio
de sobrevida do capital. Enfim, considera-se que a anlise desses processos permitir
1.
Inserida nesse projeto de explorao colonial a fundao de cidades no espao iberoamericano respondia s necessidades da acumulao originria porque significava a
possibilidade de acesso a riquezas e conquista de um territrio, no qual seriam realizadas
atividades econmicas em grande escala sob a forma: a) de expropriao por empresa
estrangeira de um bem j existente, sobretudo mineral; b) explorao por estrangeiros de
grandes plantaes de produtos a serem exportados e c) produo agrcola e pecuria
para exportao realizada por grupos locais (Castells, 1973). Mas, nunca se limitou
apenas a essa dimenso da reproduo social, havia tambm a produo imediata de
construir a cidade com uma arquitetura e espaos institucionais novos e, ainda a
preocupao de criar o convvio das pessoas pelas quais se procurava transplantar o
evangelho e outros elementos para a formao da vida colonial. Nesse sentido, os
Nessa direo, observo que foi considerando a escala local e a produo imediata do
espao que se observou em diversas metrpoles, como do caso chileno de Santiago, que
se generalizam formas territoriais desiguais, to polarizadas em termos de valor quanto as
que foram caracterizadas enquanto formas urbanas surgidas da reestruturao pelos
nomes extremos de precaripolis estatal e privatpolis inmobiliaria.
Nessa
caracterizao, se assinalou para a necessidade de um esforo global e local de anlise
(vertical e horizontal) tanto que concluiu que as ciudades no responden de modo
homogneo. As los actores que actan a la escala global pueden ser los mismos pero no
en el mbito local, pues este es expresin adems de la relacin producin-capital, de
procesos histricos, culturales y sociales que transcienden esa problemtica y que
otorgan un marco fundamental para comprender las manifestaciones de la expansin
metropolitana en los pases latinoamericanos (Hidalgo, Borsdorf y Zunino, 2008, p. 190).
Assim, sem descartar as implicaes do reordenamento socioespacial das escalas para o
desenvolvimento de cada uma daquelas conformaes regionais cabe retomar a
importncia na perspectiva da hiptese desse artigo notando que h inflexes na
produo do espao latino-americano em que as cidades alteram o seu significado,
abrindo-se a possibilidade de no continuarem coloniais: So Paulo um espao parcial
do Brasil, originariamente irrelevante, posteriormente dominante (Novy, 2002, p. 190).
Ela, desde a fundao do assentamento colonial, significava politicamente a presena do
poder metropolitano para o qual deveria garantir a ordem e a conquista territorial, o que
significava controlar o uso econmico de um territrio para o qual ela servia como correia
de transmisso. Esse duplo significado poltico e econmico do assentamento colonial
tinha implicaes na organizao de um espao mais amplo do que as atividades que
ocorriam nos limites de seu espao. Assim, a cidade comeou como representao da
poltica, sobretudo, do poder econmico metropolitano para o qual deveria garantir
internamente a ordem e o domnio do territrio. Apenas aos poucos, no espao latinoamericano, a cidade, tal como So Paulo, se tornou lugar de vida plural e formao social
do povo. Embora, ainda, seja um espao incipiente para o cidado exercer seus direitos.
A cidade, no sculo XIX, passa por uma metamorfose urbana, quando comea a ser
produzida como mercadoria. Por isso, moderna e fragmentada em propriedades comea
a ser comercializada aos pedaos em lotes com preos maiores ou menores, conforme
o comrcio de aluguel. O avano desses negcios foi substituindo o de escravos
tornando-se comum alugar casinhas e cortios. Essa substituio inclui a formao do
mercado de compra e venda de terras e de edifcios estimulando a produo do espao
urbano como parte de um complexo de negcios imobilirios (Pereira, 2004). No
transcorrer desse sculo comearam a mostrar importncia os melhoramentos urbanos,
levando a realizao de obras de saneamento, arborizao, abertura de ruas e praas.
Em So Paulo, como em outras cidades essa transformao significou uma metamorfose
da riqueza que associada proibio do trfico de escravos sinaliza o fim da riqueza
baseada na propriedade de escravos e o comeo do que chamou de cativeiro da terra
(Martins, 1979). Trata-se de transformao profunda e no de mera passagem para uma
nova simbiose do trabalho e da tcnica de construo com a terra no desenvolvimento da
urbanizao (Pereira, 1988). Por que no uma revoluo imobiliria? Uma acomodao
da lgica maximizadora da renda capitalizada da terra correndo no sentido de negar no
espao latino-americano o tempo imposto pela Revoluo Industrial, tanto que essa
capitalizao da renda afirma a moderna propriedade da terra na generalizao da forma
mercadoria, mas negao do lucro na produo da mais valia.
2.
Outro aspecto dessa transio que tambm ganha materialidade social o notvel
branqueamento da populao urbana, que comea com a chegada de grandes levas de
europeus. Desde meados do XIX, a presena de imigrantes no Porto de Santos preparava
a Abolio e com os que permaneciam na Capital paulista procurando escapar do
trabalho nas fazendas de caf se montava na cidade tanto um mercado de trabalho como
de aluguel de casinhas significando alguma mudana no mercado de terras e na
encomenda para construir. Por isso, parte desses imigrantes, em sua maioria italianos,
acabava permanecendo nas atividades de construo e participando da realizao de
obras de qualificao urbana no centro e em diversos bairros de So Paulo. A
urbanizao floresceu tanto que a cidade recebeu nomes tais como Cidade dos italianos
ou So Paulo dos Fazendeiros, que expressavam a percepo extrema das diferenas
sociais. Todavia ficou conhecida a expresso: So Paulo quem te viu e quem te v,
que marcava a ruptura radical que ocorria na cidade, na construo e na arquitetura de
seus edifcios pblicos e privados (Pereira, 2004).
Essa expresso difundida em 1900, era uma imagem eficaz da impresso que causava o
dinamismo das obras urbanas e da construo imobiliria como projeto da elite cafeeira e
industrial que se urbanizava. Essa expanso fsica e econmica da cidade associava-se
a um aumento significativo da participao de europeus, particularmente de italianos, no
conjunto da populao que passou de pouco mais de 30 mil, em 1872, para cerca de 200
mil habitantes na virada do sculo. Essa movimentao de pessoas europeizava a
fisionomia da cidade, que revigorada pelo desenvolvimento dos negcios comerciais,
bancrios e industriais gestados no ordenamento capitalista da economia cafeeira atingiu
em 1930, o primeiro milho de habitantes.
No bojo desses processos de concentrao industrial, a atividade do complexo da
construo no se diferenciou das demais atividades da indstria e acompanhou a
reorganizao da produo de materiais e equipamentos da construo civil com carter
fabril. Assim, acabaram sendo criadas fbricas e oficinas embrionrias de um forte
segmento de materiais de construo, que gerava internamente produtos de madeira
cermicos, metlicos, e outros. A introduo de conhecimentos da tecnologia moderna
de construo se mostrou to expressiva como na indstria em geral, mas o progresso
nas construes beneficiou principalmente uma parte da cidade que ficou mais bem
servida por obras e servios urbanos e tendeu a concentrar a construo de edifcios mais
alto, que vieram se associar ao uso intensivo do cimento. A altura desses edifcios,
principalmente na rea central das cidades, contornava e implicava na alta dos preos
dos terrenos que j estavam em espaos adequadamente urbanizados. Por isso, vale
lembrar que os primeiros edifcios de apartamentos foram significativamente chamados de
gaiolas de ouro e as casas superlotadas e encortiadas de caxotins humanos.
As famlias de elite podiam continuar encomendando palacetes, mas criava-se um novo
contexto, em que famlias remediadas e menos abonadas puderam se beneficiar da
produo moderna de materiais de construo medida que estas mudanas industriais
barateavam a construo ou at criavam facilidades tcnicas para a construo da casa.
De certa maneira pode se considerar que estas famlias estavam em situao melhor do
que quando a nica opo do morador, por absoluta falta de recursos, era apenas
improvisar uma construo e ocupar de maneira absolutamente improvisada algum lote
disponvel. Na diversidade das solues de moradia criadas pela urbanizao e pela
industrializao a questo do acesso casa manteve-se como centro dos conflitos e item
das demandas nas lutas urbanas. A casa a ser adquirida pela compra ou aluguel se
tornou inacessvel, tendo sido problema sempre solucionado por acomodao com
Bibliografia
AMARAL, Aracy. A hispanidade em So Paulo. So Paulo: Nobel/Edusp, 1981.
ARRIGHI, Giovanni. O longo sculo XX. Dinheiro e poder e as origens de nosso
tempo. So Paulo: Unesp, 1996.