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GUIMARÃES, Manoel Luis Salgado. A História Da Historiografia Brasileira e Suas Evidências.

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A histria da historiografia brasileira e suas evidncias

The history of Brazilian historiography and its evidences


GUIMARES, Manoel Luiz Salgado. Livro de fontes de historiografia
brasileira. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2010, 266 p.
______________________________________________________________________
Maria da Glria de Oliveira
mgloriaprof@gmail.com
Professora adjunta
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
Campus de Seropdica - BR 465 (Antiga Rio-So Paulo) - Km 7
23890-000 - Seropdica - RJ
Brasil

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Palavras-chave

Histria da historiografia; Fonte histrica; Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro.

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Keywords

History of historiography; Historical source; Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro.

Enviado em: 30/4/2012


Aprovado em: 30/5/2012

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A histria da historiografia brasileira e suas evidncias


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A emergncia dos estudos historiogrficos costuma ser compreendida


como sintoma de um momento peculiar de crise da disciplina nas dcadas finais
do sculo XX, marcada por uma guinada reflexiva dos historiadores acerca de
seu ofcio e pressupostos de pesquisa. Mais do que expediente pontual frente
s inquietaes do campo disciplinar, o que se observa que o advento de
uma conscincia historiogrfica, para usarmos a expresso de Pierre Nora,
contribuiu decisivamente para o entendimento da historiografia como lugar
de memria e, por conseguinte, como objeto, entre outros, da investigao
dos historiadores. Na busca por desfazer a identificao do conhecimento
do passado com o exerccio de rememorao, a histria da histria, afinada
s demandas dessa nova etapa epistemolgica da disciplina, passou a se
orientar por uma srie de indagaes acerca dos procedimentos e categorias
conceituais que tornam possvel a sua elaborao, bem como das mediaes
sociais de sua difuso.
No entanto, para alm dessa aproximao recente com a epistemologia,
a histria da historiografia no pode ser considerada um empreendimento
absolutamente novo. Basta lembrarmos que, entre os trabalhos que contriburam
para a demarcao desse campo, esto os clebres artigos em torno dos
problemas da historiografia antiga e moderna, de Arnaldo Momigliano, escritos
a partir dos anos de 1950.1 No contexto brasileiro, aos estudos de Jos Honrio
Rodrigues, costuma-se atribuir um carter pioneiro para a historicizao da
produo historiogrfica nacional (GUIMARES 1995). Em suma, desde que
passou a ser concebida como dotada de historicidade, ou seja, condicionada
pelo ponto de vista de seu autor, pelo tempo e lugar de sua elaborao, a
pesquisa e a escrita da histria passaram a demandar a abordagem crtica das
produes historiogrficas precedentes.2
Nas pginas introdutrias do Livro de fontes da historiografia brasileira,
Manoel Luiz Salgado Guimares apresenta um ensaio vigoroso acerca das
articulaes entre os estudos de historiografia e o trabalho de reflexo terica
acerca do conhecimento histrico, entendendo esses estudos como campo
especfico de investigao e, de modo mais abrangente, como componente
fundamental da formao dos historiadores. A escrita da histria, uma das
formas possveis de elaborao da experincia do tempo, vinculada s prticas
sociais de reconstruo do passado e de sua memorizao, tambm se inscreve
em uma cultura histrica, expresso que denota a dimenso sistmica dos
dispositivos coletivos de produo de sentido para o passado, que se manifestam
em diferenciados campos da vida social. A historiografia, como corpus de textos
dados leitura de uma coletividade como parte de seu prprio esforo de
construo identitria, seria a evidncia mais tangvel das operaes intelectuais
que transformam os tempos pretritos em narrativa e objeto de conhecimento,

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O artigo emblemtico, neste sentido, Ancient history and the antiquarian, cuja primeira publicao data
de 1950. Cf. MOMIGLIANO 1983.
2
De fato, o advento de um conceito reflexivo de histria corresponde conscincia de que a historiografia est
condicionada pelo ponto de vista de quem a elabora. Reinhart Koselleck atribui a Chladenius (1710-1759) a
demarcao epistemolgica na qual o perspectivismo o estar vinculado a uma situao ou ponto de vista
transforma-se em pressuposto do conhecimento histrico. Cf. KOSELLECK 2006, p. 173-191.
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visando s demandas de um tempo presente e aos anseios de projeo do


futuro. Da o seu estatuto de fonte (esse recurso imperativo que circunscreve
o trabalho do historiador desde sempre) e vestgio material privilegiado para a
compreenso dos modos com que a histria se constituiu como gnero discursivo
e disciplina, dotada de procedimentos especficos e regras de validao prprias.
Se considerarmos que o trabalho do historiador comea com o gesto de
reunir, selecionar e transformar as marcas do passado em fontes documentais,
no ser difcil reconhecer a relevncia da edio crtica de documentos no
espectro diversificado de tarefas que compem a operao historiogrfica. A
necessidade de ultrapassar a confeco de catlogos de autores e obras ou de
balanos bibliogrficos que, tradicionalmente, se confundiram com os estudos
de historiografia, tornou imprescindvel uma demarcao dos seus objetos, a
formulao de problemas e de pautas especficas de investigao, como parte
de um processo que Paul Ricoeur denominou de momento do arquivo, patamar
inaugural de todo percurso investigativo.
Em territrio brasileiro, sempre foram tmidos os investimentos em
publicaes de edies crticas e comentadas de textos historiogrficos e/ou
de teoria da histria, sobretudo para circulao mais ampla entre alunos de
graduao e de ps-graduao, na rea das humanidades. Recentemente, esse
nicho editorial comeou a ser preenchido por iniciativas como as de Estevo de
Rezende Martins, com a edio da antologia A histria pensada: teoria e mtodo
na historiografia europeia do sculo XIX (MARTINS 2010) e de Jurandir Malerba,
com Lies de histria: o caminho da cincia no longo sculo XIX (MALERBA
2011). Como parte dos esforos promissores de publicaes do gnero, tambm
se destacam as tradues comentadas das obras dos alemes Johann Gustav
Droysen (DROYSEN 2009) e Gervinus (GERVINUS 2010), empreendidas por
Sara Baldus e Julio Bentivoglio.
A coletnea organizada por Manoel Salgado, cuja publicao se materializou
logo aps a sua prematura morte em 2011, deve ser saudada como uma das
iniciativas precursoras no mbito da edio de fontes textuais para a histria da
historiografia no Brasil. Sua tese sobre o Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro
(IHGB), A escrita da histria no sculo XIX: historiografia e nao no Brasil
(1838-1857), defendida em 1987, na Universidade de Berlim e, em especial, o
artigo que a condensa, Nao e civilizao nos trpicos (1988), esto situados
hoje entre os trabalhos de leitura obrigatria para os pesquisadores da histria
da historiografia brasileira, campo de investigao dentro do qual se evidencia
um volume crescente e renovado de teses e dissertaes.
O Livro de fontes composto por discursos, dissertaes e memrias,
originalmente publicados na revista do IHGB, ao longo do sculo XIX, e nomeados
por Manoel Salgado como textos de fundao por dois aspectos entrecruzados:
so textos que inauguram uma forma peculiar de escrita, ou seja, a escrita da
histria do ponto de vista nacional, e sinalizam o surgimento de uma nova
especialidade no mundo das atividades letradas a figura do historiador do
Brasil, como aquele que organiza a narrativa do passado da nao a partir
de protocolos discursivos especficos. Dito de outro modo, tais textos podem

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ser lidos como fundadores por remeterem a formas possveis de representao


do passado, cujo valor no est na atualidade nem tampouco na invalidao
definitiva de seu contedo, mas porque, neles, podemos reconhecer modos de
pesquisar e escrever a histria.
Os nove documentos historiogrficos, estampados em sua ortografia
e pontuao originais e acrescidos de elucidativas notas do organizador,
representam emblematicamente o processo de disputa em torno do passado
desejado no Oitocentos brasileiro, momento marcado por debates em torno
das formas necessrias para uma adequada escrita da histria nacional, quando
no se havia fixado ainda um modelo cannico para a sua elaborao. Assim,
no clebre Discurso [1839], proferido na inaugurao do IHGB, por Janurio
da Cunha Barbosa, possvel flagrar certo tipo de conscincia histrica que
se expressa em consonncia com as demandas de consolidao do Estado
monrquico imperial, no apenas pela defesa da finalidade magisterial para
o conhecimento do passado, mas tambm no esboo de prescrio de certos
procedimentos normativos. As reflexes acerca dos modos de se escrever
a histria do Brasil permaneceriam presentes em uma srie de trabalhos
apresentados pelos scios do Instituto, nas dcadas seguintes sua criao.
A preocupao perpassa a Dissertao acerca do sistema de escrever a
histria antiga e moderna do Imprio do Brasil [1840], na qual Raimundo da
Cunha Matos define a histria como a cincia cujo objetivo primeiro seria o de
descrever os acontecimentos do presente e do passado. Transformada em tema
de concurso, a questo acerca de como se deveria escrever a histria nacional
daria origem a outra Dissertao, desta vez, de autoria do naturalista bvaro
Carl Friedrich Phillip von Martius, premiado pelo IHGB em 1847. O nico texto
concorrente, a Memria sobre o melhor plano de se escrever a histria antiga
e moderna do Brasil, do diplomata prussiano Henrique Wallenstein, juntamente
com o Parecer acerca das memrias sobre o modo pelo qual se deve escrever
a histria do Brasil no qual se justificou a escolha do plano de Martius,
apresentam-se como peas documentais importantes para a reconstituio dos
termos do debate. Por fim, entre os documentos coligidos na coletnea, o artigo
Indicaes sobre a histria nacional [1894], de Tristo de Alencar Araripe,
recicla a frmula da historia magistra vitae, j em pleno contexto republicano,
para defender a utilidade da histria em explicar o que a ptria e o que pode
vir a ser, porquanto sem a narrao dos acontecimentos do passado, no seria
possvel decifrar a condio presente e futura do Brasil.
Ao longo do Oitocentos, distintas vises acerca da pesquisa e
escrita histricas sempre foram tacitamente acolhidas entre os scios do
IHGB, em nome dos objetivos estabelecidos para a agremiao, desde
a formulao dos seus estatutos fundamentais. Os textos reunidos e
anotados por Manoel Salgado apresentam-se como fontes genunas para
o estudo dessa histria intelectual, so evidncias documentais de um
debate cujos vencedores no estavam definidos de antemo e, em seus
desdobramentos, prefiguraram respostas possveis para o problema da
representao do passado da nao.

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Referncias bibliogrficas
DROYSEN, J. Gustav. Manual de teoria da histria. Traduo de Sara Baldus
e Julio Bentifoglio. Petrpolis: Vozes, 2009.
GERVINUS, Georg G. Fundamentos de teoria da histria. Traduo de Sara
Baldus e Julio Bentifoglio. Petrpolis: Vozes, 2010.
GUIMARES, Manoel Luiz Salgado. Historiografia e cultura histrica: notas para
um debate. gora: revista de histria e geografia, Santa Cruz do Sul,
vol.1, n.1, maro 1995.
KOSELLECK, R. Futuro passado: contribuio semntica dos tempos
histricos. Rio de Janeiro: PUC-Rio / Contraponto, 2006.
MALERBA, Jurandir (org.) Lies de histria: o caminho da cincia no longo
sculo XIX. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2010.
MARTINS, Estevo de Rezende (org.). A histria pensada: teoria e mtodo na
historiografia europeia do sculo XIX. So Paulo: Editora Contexto, 2010.
MOMIGLIANO, Arnaldo. Problmes dhistoriographie ancienne et moderne.
Paris: Gallimard, 1983.

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