Rito Escocês Retificado3
Rito Escocês Retificado3
Rito Escocês Retificado3
Minha experincia prpria me fez perceber que se pode ser um maom antigo
sem que se conhea bem a Maonaria, uma vez que fui maom durante 18
anos, presidi uma Loja numerosa e absolutamente regular em seus trabalhos,
acumulei mesmo ao menos 60 graus manicos, alguns bastante raros e
preciosos em diferentes sistemas, tudo isso antes de conhecer a primeira
palavra da Maonaria essencial (...).
Jean-Baptiste Willermoz, 1784
1
Trabalho apresentado ARLS Collegia Fabrorum n 4304, do Grande Oriente do Distrito Federal, como requisito
parcial elevao ao grau de Companheiro.
2/33
2
Ursin autor de duas obras fundamentais para os que queiram dar os primeiros passos no RER: Instructions
lusage des Apprentis au Rite cossais Rectifi (Paris: ditions Dervy, 1997), e Cration et Histoire du Rite cossais
Rectifi (Paris: ditions Dervy, 2004).
3
Dachez, Presidente do Instituto Manico da Frana, e Ptillot, antigo Grande Mestre da Grande Loge
Traditionnelle et Symbolique Opra, tm-se dedicado h dcadas aos estudos manicos (e ao RER em particular),
e publicaram a obra introdutria Le Rite cossais Rectifi (Paris: Presses Universitaires de France, 2010), na coleo
Que sais-je?.
4
Padre da Igreja Ortodoxa, maom e professor de teologia, Jean-Franois Var escreveu, entre outras obras, La
franc-maonnerie la lumire du Verbe (Paris: ditions Dervy, 2013), uma coletnea de suas conferncias sobre
misticismo cristo, maonaria e RER. H, ainda, um trabalho seu intitulado A Obra de Jean Baptiste Willermoz
(LOeuvre de Jean-Baptiste Willermoz), traduzido para o portugus pela Sociedade das Cincias Antigas e
disponvel online em http://www.sca.org.br/news/420/57/A-Obra-de-Jean-Baptiste-Willermoz.html (acesso em
20/04/2015).
5
Vivenza um dos principais autores dos ltimos cem anos sobre Martinismo, Martinezismo e Regime Escocs
Reitificado, com destaque para as obras Les lus cons et le Rgime cossais Rectifi: de linfluence de la doctrine
de Martins de Pasqually sur Jean-Baptiste Willermoz (Paris: ditions Mercure Dauphinois, 2013) e Le Martinisme:
lEnseignement secret des Matres Martins de Pasqually, Louis-Claude de Saint-Martin et Jean-Baptiste Willermoz,
fondateur du Rgime cossais Rectifi (Paris: ditions Mercure Dauphinois, 2013).
6
Jean-Claude Sitbon responsvel por uma obra recente (a primeira edio data de 2012), mas de grande
importncia para o RER: LAventure du Rite cossais Rectifi, cujo Tomo I (Approche historique suivie de ltude de
deux correspondances e dun discours de Jean-Baptiste Willermoz. Paris: Les ditions de la Tarante, 2015) traz
excelente retrospectiva sobre a Histria do Regime desde suas origens.
7
http://www.modestia-cum-libertate.ch/.
8
http://www.solepro.com.br.
9
http://www.gpih.org/.
10
http://www.gprerbrasil.org.br/.
11
http://www.gob.org.br/.
12
http://www.regius-glnf.fr/.
3/33
A denominao do Rito
Aqueles que desconhecem o RER podem se equivocar ao supor que esse Rito
busca alguma forma de reviso do Rito Escocs Antigo e Aceito (REAA). Importante que fique
claro, antes de tudo, que essa suposio no tem fundamento.
Rito ou Regime?
13
Entre as grandes convenes do RER destacam-se: o Convento de Unwrde (1754), o Convento de Altenberg
(1764), o Convento de Kohlo (1772), o Convento de Brunswick (1775), o Convento de Lyon ou "das Glias" (1778),
e o Convento de Wilhelmsbad (1782). Enquanto os primeiros ocorreram ainda sob a gide da Estrita Observncia
Templria, os dois ltimos foram decisivos para o estabelecimento do RER.
4/33
14
As citaes de obras estrangeiras so todas, salvo observao expressa em contrrio, livre-traduo.
15
Figueiredo, por sua vez, no diferencia rito de regime, pois explica que rito tambm pode ser entendido como o
conjunto de cerimnias e instrues primitivas de cada sistema, como tambm o governo manico dos altos
corpos dirigentes d Maonaria em cada pas.
5/33
asseveram os autores, pois aspectos histricos fariam com que se empregasse o termo rito
para determinados regimes, como o Moderno e o Escocs Antigo e Aceito, enquanto no RER,
desde o incio, essa distino fora objeto de preocupao entre aqueles que o conceberam. Nos
primrdios da Maonaria especulativa, observam Dachez e Ptillot, o termo usado era Rito
(ou sua forma arcaica em francs, Rit), aparecendo nas Patentes de 1774 das Lojas escocesas
de Saint-Jean Dcosse, no Oriente de Marselha, e Saint-Jean Dcosse, no Oriente de Avignon
(esta ltima a Loja-Me Escocesa). E citam os Regulamentos dos Captulos Escoceses
(Rglements des Chapitres cossais) adotados em 26 de agosto de 1774 (26 dia do 8 ms de
5774), disponveis atualmente na Biblioteca Municipal de Avignon, em cujo art. 1 est
expresso que todos os maons do Rito Escocs [Rit cossais] tero em cada Estado um ponto
de reunio; e este ser uma assembleia geral que ter o ttulo de Soberano Captulo
Metropolitano (...)16.
Sobre o RER, Dachez e Ptillot observam que, desde 1778, o termo Regime foi
escolhido pelos fundadores porque de fato se tratava de um sistema manico dirigido e
governado pelos graus mais elevados, e completam que nos dias de hoje se diz, de forma
usual, apesar de inadequadamente, Rito Escocs Retificado e no Regime (que seria mais
apropriado) exatamente porque nos outros regimes no se atenta a essa distino
consagrando-se a terminologia Rito: Rito Escocs Antigo e Aceito, Rito de Misraim, Rito de
Memphis, etc. E concluem lembrando que o termo Rito, em maonaria, refere-se atualmente a
um certo esprito, um certo vocabulrio levado a cabo na execuo ritualstica, mas tambm
escala e natureza especfica dos graus que compem determinado sistema manico
(Dachez e Ptillot 2014: 7)17.
Surgido no sculo XVIII na Frana, o RER tem suas origens no Escocismo das
primeiras Lojas especulativas daquele pas, na chamada Estrita Observncia Templria (EOT) e
16
Esse documento importante, inclusive, para assinalar que a expresso Rito Escocs origina-se do nome do
grau de Escocs, grau vermelho superior na maonaria azul, destacam Dachez e Ptillot (2014: 6).
17
Observao que vai ao encontro do assinalado por Figueiredo.
6/33
na doutrina teosfica crist e cabalista do sistema dos lus Cons18 desenvolvida por Martinez
(ou Martins) de Pasqually (Martinezismo) sobre essas origens, tratar-se- mais adiante. Da
Frana, o RER expandiu-se para a Alemanha, Itlia, Sua e outros pases da Europa chegando
ao Brasil na dcada de 1870. Apesar de adormecido na Frana ao longo da segunda metade do
sculo XIX (permanecendo vivo na Sua), o RER foi restabelecido entre os franceses no incio
do sculo XX, tornando-se, junto com o REAA, o rito mais praticado na Grande Loja Nacional
Francesa (GLNF) durante muitos anos.
18
O termo Con (tambm grafado Cohen ou Kohen) vem do hebraico, significando sacerdote
( , pl. cohanim), e referncia expressa influncia do misticismo judaico-cristo na formao de
Martinez de Pasqually, este mesmo de origem judaica. Optou-se neste trabalho pela grafia francesa (con).
19
Nos trabalhos est presente o Evangelho de So Joo, aberto no Prlogo.
20
Martines de Pasqually, Tratado de Reintegrao dos Seres em sua primeira propriedade, virtude e potncia
espiritual divina. (Primeira edio autntica segundo o manuscrito de Louis-Claude de Saint-Martin. Organizao e
apresentao de Robert Amadou). Curitiba: Ordem Rosacruz, 2008.
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Observe-se que esta simbologia do RER toma por base a EOT, na qual o
Escudeiro Novio aspirava a chegar a Cavaleiro do Templo. A simplificao de 1778, dentro do
processo de retificao, alterou o essa denominao para Cavaleiro Benfeitor da Cidade Santa
(CBCS), alterao considerada a mais importante do Convento das Glias22 e que sinaliza a
afiliao no direta e institucional Ordem do Templo, mas simblica e espiritual (Dachez e
Ptillot 2014: 100).
(...) A qualidade de Escudeiro Novio se confere pela cerimnia de investidura. Esta qualidade ,
sem embargo, revogvel. O Escudeiro Novio tem como nica tarefa preparar-se, durante o
prazo de pelo menos um ano, para converter-se em Cavaleiro; mas se durante este perodo de
tempo no mostra a preparao requerida, pode e inclusive deve, segundo o disposto no Cdigo
dos C.B.C.S., ser retrocedido a sua condio de Mestre Escocs de Santo Andr. A segunda etapa
a de Cavaleiro Benfeitor da Cidade Santa (C.B.C.S.). Esta etapa no um grau, seno uma
qualidade que se confere em cerimnia de armamento. O Cavaleiro tem o dever de obrar
ativamente na Ordem e no mundo, para por em prtica os ensinamentos morais, religiosos e
doutrinais recebidos nas Lojas de So Joo e de Santo Andr, Lojas que no abandona e onde
deve agora mais do que nunca, dedicar-se ao servio de seus irmos e ao de todos os homens,
particularmente, o exerccio da beneficncia.23
21
Extrado de Informaes sobre o Rito Escocs Retificado a Maons convidados a participar do R.E.R., separata
produzida pela ARLS Solidariedade e Progresso n 3078, do Rito Escocs Retificado e disponvel em
http://solepro.com.br/RER/Artigos/RITO%20ESCOC%C3%8AS%20RETIFICADO.pdf (acesso em 20/03/2015).
22
Foi j no segundo dia de sesses do Convento das Glias, uma sexta-feira, 27 de novembro de 1778, em que se
decidiu pela mudana no nome da Ordem para Ordem dos Cavaleiros Benfeitores da Cidade Santa. Nesse dia foi
tambm adotada a nova matrcula nacional francesa. Edmond Mazet, 1985: Les Actes du Convent des Gaules,
in: Travaux de la Loge nationale de Recherches Villard de Honnecourt, N 11, pp. 57-106.
23
Informaes sobre o Rito Escocs Retificado a Maons convidados a participar do R.E.R. (op. cit.).
8/33
a) o aperfeioamento do indivduo pela prtica das virtudes com o fim de aprender a vencer as
paixes, corrigir os defeitos e progredir na via da realizao espiritual;
b) a total dedicao Ptria e ao servio ao prximo;
c) a prtica constante de uma beneficncia ativa e esclarecida a todos os homens, sem importar
24
qual seja a sua raa, nacionalidade, situao, religio e suas opinies polticas ou filosficas.
Alm do CBCS, haveria outra classe ou crculo ainda mais interno e restrito, o da
Ordem dos Grandes Professos (lOrdre des Grands Profs), invocada nos dois documentos
fundamentais do Regime (o Code maonnique des Loges runies et rectifies e o Code gnral
des rglements de lOrdre des CBCS), mas cuja documentao a respeito escassa. Reunia um
grupo muito restrito de iniciados, aos quais Jean-Baptiste Willermoz (fundador do RER) teria
transmitido os ensinamentos e a doutrina dos lus Cons, e que compunha o misterioso
cenculo dirigente da Ordem. A Grande Profisso, constituda dos Professos e dos Grandes
Professos assim descrita por Dachez e Ptillot (2014: 111):
Reservado a um nmero pequeno de eleitos, entre os quais Willermoz introduziu logo seu
crculo mais prximo, essa classe suprema ficou de pronto conhecida como o cenculo escolhido
para preservar a doutrina con aplicada maonaria, e na qual se constituiu a falange secreta
que, sem se mostrar como tal, assegurava-se da perenidade dos princpios espirituais do Regime
perante todos os nveis da Ordem retificada.
24
Extrado do stio na internet do Grande Priorado do Brasil da Ordem dos Cavaleiros Benfeitores da Cidade
Santa (http://www.gprerbrasil.org.br/historia-geral, acesso em 01/03/2015).
25
Sobre o assunto, vide, de Maharba, A propos du R.E.R. e de la Grande Profession, in Le Symbolisme 391. 63-
67 (1969).
9/33
Origens: o Escocismo
O sculo XVIII foi marcado por uma profuso de ritos, regimes e ordens ditos
manicos26. E foi nesse contexto que se desenvolveu o Rito Escocs Retificado, cujas origens
esto no escocismo francs, mais especificamente em seu ramo introduzido na Alemanha por
meio da Ordem da Estrita Observncia Templria [fundada pelo Baro Karl Gotthelf von Hund
(1722-1776) em 1751], e no Martinezismo [doutrina desenvolvida por Martinez de Pasqually
(1710?-1774) e transmitida a seus discpulos por intermdio da chamada Ordem dos Cavaleiros
Maons Eleitos Cohens do Universo, ou, simplesmente, Ordem dos Sacerdotes Eleitos (lus
Cons)]27. Destaque-se, ainda, o papel fundamental de um destacado maom e mstico do
sculo XVIII, a quem coube, de fato, estabelecer a estrutura e os fundamentos do RER: Jean-
Baptiste Willermoz (1730-1824).
26
Obra interessante a respeito Tuiler Gnral de la Francmaonnerie ou Manuel de LIniti, de J.-M. Ragon (Paris:
Collignon, 1861), em que o autor apresenta as nomenclaturas de 75 maonarias, 52 ritos, 34 ordens ditas
manicas, 26 ordens andrginas (sic), 6 academias manicas, etc., e mais de 1.400 graus e isso em meados do
sculo XIX!
27
Sobre a Ordem dos lus Cons, vide, de Jean-Marc Vivenza, Les lus cons et le Rgime cossais Rectifi : de
linfluence de la doctrine de Martins de Pasqually sur Jean-Baptiste Willermoz, op. cit..
10/33
entre a aristocracia francesa e a nobreza escocesa exilada, tendo sido preceptor de nobres
franceses. Em 1723, foi sagrado, pelo Rei da Frana, Cavaleiro da Ordem de So Lzaro,
tradicional ordem de cavalaria originria das cruzadas. No ano seguinte, foi chamado a Roma
como preceptor de Charles Edward e Henry, os filhos do rei deposto da Inglaterra, Jaime III,
quando fortaleceu-se seu vnculo com os jacobitas. Em viagem Inglaterra em 1729, foi
admitido na Royal Society, tendo sido iniciado na maonaria em 1730, na Horn Lodge. De volta
a Paris, teria sido um dos responsveis pelo estabelecimento do escocismo em solo francs,
com seu famoso Discurso de Ramsay lido e discutido em vrias Lojas da Europa continental.
Faleceria em 1743, sendo sepultado em Saint-Germain-em-Laye, centro do escocismo e da
corte dos Stuart durante muitos anos.
"No tempo das Cruzadas na Palestina, muitos prncipes, senhores e cidados se associaram e
prometeram restaurar o templo dos cristos na Terra Santa e se empregar para fazer retornar
sua arquitetura primeira instituio. Eles concordaram sobre vrios antigos sinais e palavras
simblicas extradas do fundo da religio, para reconhecer uns aos outros entre os infiis e os
sarracenos. Comunicavam-se esses sinais e palavras apenas a aqueles que prometiam
solenemente, e muitas vezes at mesmo diante do altar, nunca os revelar. Esta promessa sagrada
no era, portanto, um juramento execrvel, como tem sido chamado, mas um lao respeitvel
para unir os cristos de todas as nacionalidades em uma mesma Fraternidade. Algum tempo
32
Em Nascidos do Sangue: os Segredos Perdidos da Maonaria (So Paulo: Madras, 2005) John J. Robinson
transcreve alguns trechos do Discurso de Ramsay. H, ainda, uma verso desse discurso disponvel no stio na
internet da ARLS Solidariedade e Progresso n 3078
(http://solepro.com.br/Artigos/Maconaria/O%20discurso%20de%20Ramsay.pdf acesso em 28/03/2015),
intitulado O Discurso de Ramsay, 1738. Verso Impressa (sic).
33
"Nossa Ordem, portanto, no deve ser considerada uma renovao das Bacanais, mas uma ordem moral,
fundada em tempos imemoriais, e renovada na Terra Santa por nossos antepassados, para lembrar a memria das
mais sublimes verdades em meio aos prazeres da Sociedade." Discurso de Ramsay, disponvel em
http://solepro.com.br/Artigos/Maconaria/O%20discurso%20de%20Ramsay.pdf acesso em 28/03/2015.
34
Discurso de Ramsay, op. cit..
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depois, nossa Ordem formou uma unio ntima com os Cavaleiros de So Joo de Jerusalm. A
partir daquele momento, nossas Lojas assumiram o nome de Lojas de So Joo. Esta unio se fez
de acordo com o exemplo dos israelitas quando eles ergueram o segundo templo. Enquanto
lidavam com a trolha e a argamassa com uma mo, na outra eles tinham a espada e o escudo.
(...) Os Reis, prncipes e senhores, voltando da Palestina, fundaram vrias lojas em seus Estados.
Desde o tempo das ltimas Cruzadas, j vimos vrias Lojas erguidas na Alemanha, na Itlia, na
Espanha e na Frana, e da para a Esccia, devido estreita aliana entre escoceses e franceses.
James, Lord Steward da Esccia foi Gro-Mestre de uma Loja estabelecida em Kilwinning, no
oeste da Esccia, no ano 1274 pouco depois da morte de Alexandre III, rei da Esccia, e um ano
antes de John Baliol ter subido ao trono. Este senhor recebeu os maons em sua Loja, os condes
de Gloucester e Ulster, um ingls e o outro irlands. (...) Pouco a pouco, nossas lojas e nossas
solenidades foram negligenciados na maioria dos lugares. Por isso que assim muitos
historiadores, os da Gr-Bretanha, so os nicos que falam de nossa ordem. No entanto, ela se
manteve em seu esplendor entre os escoceses, a quem os reis (da Frana) confiaram durante
35
muitos sculos, a guarda de suas pessoas sagradas.
Assim, referindo-se aos regimentos escoceses que serviam h muito aos reis da
Frana (e continuariam a faz-lo, repita-se, at a queda da monarquia com Revoluo
Francesa), Ramsay destacava o escocismo como vinculado s tradies da cavalaria, mais que
s corporaes de ofcio dos construtores medievais. Isso ocorria em um momento em que a
Maonaria especulativa presenciava uma grande heterogeneidade de grupos e ideias, e em que
os maons franceses cada vez mais se envolviam com questes polticas, em um sistema
descentralizado de lojas, ritos e regimes, que culminariam no estabelecimento dos Diretrios
Escoceses e do Grande Oriente da Frana, em 1773.
"O discurso de Ramsay foi repetido inmeras vezes em vrias Lojas e houve uma tremenda
repercusso entre os iniciados e tambm na sociedade em geral. Muitos novos graus foram se
estabelecendo ao Rito Escocs, e em vrios pases outras formas de trabalho iam aparecendo.
Chegou-se a computar a existncia de mais de 1.400 ritos diferentes, sendo que quase todos
adotavam linguagem pertinente ao Velho Testamento e a inmeras ordens de cavaleiros. (...) Um
dos modos de trabalho que eclodiram em terreno francs, a partir das falas de Ramsay, foi
denominado de cossaise, ou Rito Escocs. Formado por 33 graus, foi exportado para os Estados
Unidos e ficou conhecido como Rito Escocs Antigo e Aceito, tendo grande similaridade simblica
36
com a antiga Ordem Arbica dos Nobres do Santurio Mstico, ou Shriners."
35
Discurso de Ramsay, op. cit..
36
Carlos Alberto Carvalho Pires, M.I., Gr 25 (REAA), O Cavaleiro Ramsay e a Origem da Maonaria, op. cit..
13/33
Foi exatamente em Paris que teria acontecido, nas palavras do prprio Von
Hund, o encontro que mudaria sua vida. O Baro contava que, em 1743, teria estado com o
prprio Charles Edward Stuart, Eques a Penna Rubra (Cavaleiro da Pena Rubra)37, pretendente
ao trono ingls exilado na Frana, o qual teria conferido a Von Hund o ttulo de Mestre da VII
Provncia da Maonaria Templria e o encarregado de reformar, retificar, a Maonaria. Essa
misso seria transmitida por Charles Edward ao Baro por ordem daqueles que o prprio Von
Hund denominava superiores incgnitos (Dachez e Ptillot 2014: 24-26; Ursin 2004: 54-56).
37
Charles Edward Stuart (1720-1788), Conde de Albany, relembre-se, era neto de Jaime II (1633-1700), derrubado
do trono ingls em 1688 pela Revoluo Gloriosa e exilado na Frana juntamente com seus partidrios, os
jacobitas.
14/33
Observe-se que nunca houve comprovao deste encontro entre Von Hund e o
pretendente ao trono ingls. Ao contrrio, h registros de que este ltimo no estivera em Paris
no ano de 1743 (Dachez e Ptillot 2014: 25). De fato, aps a morte do Baro, em 1777, seu
sucessor, o Duque Ferdinand de Brunswick, enviou a Roma o Chanceler da VIII Provncia, Baro
von Waetcher, com a misso de se informar com Charles Edward sobre as relaes dos Stuart
com a Ordem do Templo. O neto de Jaime II respondeu ento que nunca pertencera
Maonaria e que seu pai, James-Edward Stuart, conhecido como o Cavaleiro de So Jorge,
tinha-lhe negado permisso para iniciar-se (Ursin 2004: 95). De toda maneira, o Baro von
Hund afirmou at o fim da vida que o encontro com Charles Edward Stuart havia acontecido,
atribuindo a legitimidade da EOT e a tarefa de reformar a Franco-maonaria misso que lhe
fora incumbida em 1743.
[Von Hund] criou esse sistema assim designado sob o nome de Maonaria Retificada entre
1751 e 1755. A Ordem s passou a ser denominada EOT em 1764, por ocasio do Convento de
Altenberg. Diz-se que a EOT era assim chamada devido a uma disciplina rigorosa ali reinante e
porque reclamava a herana Templria (Sitbon 2015:58).
38
A organizao geogrfica da EOT reproduzia a antiga subdiviso em Provncias da Ordem do Templo. As nove
Provncias, por sua vez, dividiam-se em Priorados que, por sua vez, eram compostos de Prefeituras e estas de
Comendadorias, das quais faziam parte as Lojas Escocesas e em Lojas simblicas exatamente a estrutura que
seria aproveitada pelo RER e mantida at os dias atuais.
15/33
agrupadas sob a gide dos Diretrios Escoceses, no crculo exterior, composio manica
clssica, mas que, no crculo interior, davam lugar a uma estrutura militar, hierrquica e
cavaleiresca, misteriosa mesmo aos olhares dos maons de ento: a Ordem da Estrita
Observncia Templria (Dachez e Ptillot 2014: 25). Assim, ao estabelecer um ideal e uma
herana da cavalaria medieval, a EOT mostrava-se muito mais atraente a nobres e militares que
se estivesse associada a pedreiros e construtores de catedrais.
A Guerra dos Sete Anos (1756-1763) teve efeitos diretos sobre os trabalhos da
EOT, que foram quase que paralisados, uma vez que o conflito mobilizou parte importante da
aristocracia militar que formava a ossatura da Ordem. Passados aqueles anos turbulentos,
porm, e especialmente a partir de 1764, a organizao recuperou suas foras e, sob a
liderana de Von Hund, em pouco tempo converteu a grande maioria das Lojas, dominando a
Maonaria na Alemanha por mais de uma dcada com sua proposta de restabelecer a grandeza
do passado da gloriosa ordem de cavalaria, reclamando mesmo a herana material (inclusive os
bens que teriam pertencido aos templrios 500 anos antes) da Ordem do Templo (Dachez e
Ptillot 2014: 25).
Inegvel o xito da EOT como organizao que, entre outras coisas, satisfazia aos
anseios de membros da elite europeia do sculo XVIII, devido a sua pompa e circunstncia, sua
estrutura militarizada, aristocrtica e hierrquica, seus rituais em latim e cerimnias que
imitavam atos litrgicos. Entre os alemes, a organizao contribua para o fortalecimento de
um sentimento nacional, mostrando-se determinante para a unificao da Maonaria alem
(Sitbon 2015:60). De seus quadros fizeram parte personagens clebres como Goethe e Mozart
16/33
e, ao alcanar outros pases como a Rssia, a Holanda, a Sua e a Frana, a EOT concorreu por
trs dcadas com a Franco-maonaria de origem inglesa estabelecida no continente a partir de
1721.
39
Interessante observar que 1773 tambm o ano da proclamao do Grande Oriente da Frana.
40
Pode-se entender misticismo como uma sntese do que a filosofia, a cincia espiritualista e a religio, em seu
sentido, em seu sentido mais nobre, tm de melhor para oferecer em resposta s perguntas que o ser humano de
hoje se faz a respeito e Deus. tambm a unificao com o Absoluto, e tem por finalidade a expanso da
conscincia e o despertar de faculdades latentes do ser humano (...). Essas definies foram extradas do
Glossrio de Termos e Conceitos da Tradio Rosacruz da AMORC (Curitiba: Grande Loja da Jurisdio de Lngua
Portuguesa, 2011).
17/33
francesa de Bordeaux. Suas origens, envoltas em muitos mistrios, parecem ser de cristos-
novos espanhis da a forte influncia judaica. As correspondncias de Pasqually e os relatos
de poca assinalam que ele escrevia mal em francs (que no deveria ser sua lngua materna) e
falava com sotaque. H quem defenda que dominava o hebraico e que, ao contrrio de
Willermoz, no vivera sempre na Frana, tendo viajado por toda a Europa e at para o Oriente.
Foi em uma dessas viagens que seguiu para Santo Domingos (hoje Haiti), onde viria a falecer
em 1774, mas at hoje se desconhecesse o local de sua sepultura.
(...) Infelizmente, a autenticidade de uma patente como essa, de uma irrealidade absoluta,
totalmente inaceitvel. Ela parece bem fazer parte de uma impressionante coleo de falsos
documentos manicos dos quais os charlates e os cavaleiros de indstria fizeram grande abuso
no sculo XVIII.
18/33
Chama ateno a similitude entre Pasqually e Von Hund no que diz respeito
lenda Stuartista para legitimar suas atividades manicas. Porm, assim como Von Hund,
apesar de toda essa controvrsia, o grande legado de Pasqually foi exatamente a Ordem dos
lus Cons, sua doutrina e seus ensinamentos, considerados de grande valor por homens como
Jean-Baptiste Willermoz e Louis-Claude de Saint-Martin, de reputao ilibada e de
conhecimento mstico e filosfico inquestionvel. Ademais, a obra-prima de Pasqually, ditada
por ele a Saint-Martin, seu secretrio pessoal, o Tratado de Reintegrao dos Seres em sua
primeira propriedade, virtude e potncia espiritual divina, ou simplesmente, Tratado de
Reintegrao dos Seres, reconhecida como uma das grandes obras do misticismo ocidental
dos ltimos 500 anos.
41
Comentrios interessantes sobre Pasqually, Willermoz e Saint-Martin so feitos por Papus em sua obra
Martinsisme, Willermosisme, Martinisme et Franc-Maonnerie (Paris: dition de LInitiation, 1899).
19/33
Entre 1755 e 1760, Pasqually circulou por diversas Lojas manicas em toda a
Frana, em busca de adeptos para sua Ordem. Rejeitado em algumas cidades, como Toulouse,
acolhido em outras, como Foix, foi apenas a partir de sua mudana para Bordeaux, em 1762,
onde se filiou Loja La Franaise (a nica em atividade na cidade), que Pasqually teria xito em
reunir um grupo significativo de iniciados para sua Ordem. Foi nessa poca tambm que
conheceu a Saint-Martin, o qual se tornaria seu amigo e secretrio pessoal e o ajudaria a
escrever o Tratado.
42
Martinez buscava ento desenvolver cada um dos membros de sua ordem pelo trabalho pessoal e lhes
concedendo toda a liberdade e responsabilidade por seus atos. Ele selecionava com o maior zelo cada um de seus
membros e no conferia os graus que a um real aristocrata de inteligncia. Enfim, ele iniciava mulheres da mesma
forma que os homens e com as mesmas garantias. (Papus 1899: 10-11)
20/33
Foi a partir de Bordeaux que, durante dez anos, ele [Pasqually] exerceu sua influncia sobre e
trabalhou sem cessar pela construo de sua Ordem dos Cavaleiros Maons lus Cons do
Universo, da qual se proclamou Grande Soberano. Em nome de seu Tribunal Soberano, que regia
toda a Ordem, [Pasqually] concedia patentes constitutivas que permitiram a criao na Frana de
ao menos uma dezena de templos Cons, cujos primeiros foram estabelecidos em Bordeaux,
Toulouse e Marselha. Em 1767, ele deu a sua Ordem uma forma administrativa criando o
Supremo Tribunal de Paris, com Bacon de la Chevalerie como substituto. Os lus Cons
formavam uma classe secreta de iniciados superiores, ignorada pelos maons comuns. (Sitbon
2015: 45-46)
Necessrio se faz um estudo mais aprofundado da Ordem dos lus Cons, o que
foge aos objetivos deste trabalho. O que se pode resumir sobre a organizao fundada por
Martinez de Pasqually que era uma sociedade mstica e inicitica, estruturada em torno de
um sistema teosfico bastante peculiar e com caractersticas enigmticas. Assim como Von
Hund, Pasqually tambm fazia referncia a iniciadores misteriosos, os Superiores Incgnitos, e a
seres de outros planos que lhe teriam transmitido as bases de sua doutrina. A esse respeito,
Sitbon (2015: 46) comenta que a Ordem era apresentada como uma nova sociedade
manica, como a verdadeira Franco-maonaria, diferente da maonaria de sua poca
considerada por ele apcrifa, ou seja, de autenticidade duvidosa, e que se propunha a
retornar s razes de uma doutrina especfica.
43
Estrutura retirada de Sitbon 2015: 47.
21/33
Uma quarta classe composta de apenas um grau: a dos Raux-Croix. Este era
o ltimo e mais elevado grau da Ordem, restrito a um grupo muito seleto de
iniciados.
Est ligado [o RER] Doutrina de Martinets de Pasquallys [sic], que encerra a revelao de
verdades primordiais, a maneira de transpor a barreira que separa o Homem da Divindade,
trazendo uma mensagem oculta, conservada alegoricamente nas Escrituras Sagradas, sob o vu
do smbolos, que diz-se transmitida pelos tempos atravs das sociedades secretas, uma tradio
perdida pela maonaria, reencontrada pela Doutrina de Martinets de Pasquallys. Esta doutrina
explica a histria da humanidade nas consequncias do pecado original e na subdiviso do
Homem Primitivo. Da condio de Ado seduzido pelos espritos perversos, querendo ter sua
prpria posteridade espiritual, resultado numa forma material (Eva) que constitui sua prpria
priso o privando da comunicao com a Divindade e exposto aos ataques de espritos perversos.
A posterioridade de Seth para obter sua reconciliao e entrar em contato com a Divindade. O
Elus Cohen (uma Ordem no manica constituda por maons) deveria seguir rigorosamente o
ritual e renunciar o que existe neste baixo mundo e resignar a receber a graa no seu devido
tempo. O contedo essencial da doutrina esotrica de Martinez de Pasqually versa sobre a
origem primeira, a condio atual e o destino ltimo do homem e do universo. relatado que a
22/33
doutrina de Martinez de Pasqually esta relacionada com a tradio crist indivisvel, dita como
secreta, recebida pelos ensinamentos dos padres da Igreja44.
44
Informaes sobre o Rito Escocs Retificado a Maons convidados a participar do R.E.R., Comunicao Oficial da
Loja de M.E.S.A. Cavaleiros Unidos do Sul n 018-011/2012, de 30/07/2012. Disponvel em
<http://xa.yimg.com/kq/groups/11494701/985908883/name/018-011-2012%20-
%20InformacaoaconvidadosaoRER>, acesso em 01/05/2015.
45
No catecismo do Grau de Aprendiz, h a questo sobre o significado do emblema, para o qual a resposta de
que o homem foi degredado, mas lhe restam meios suficientes para retornar a seu estado original, devendo o
maom aprender a empregar tais meios. H uma referncia, tambm, doutrina da EOT no emblema do Grau de
Aprendiz. A coluna simbolizaria a Ordem do Templo que foi decapitada por ordem de Felipe, o Belo, e Clemente V,
mas que permaneceria com sua base firme e que um dia (por meio da Franco-Maonaria), viria a reerguer-se e
voltar atividade em toda sua glria.
23/33
A obra de Jean Baptiste Willermoz deveria ser totalmente conhecida, ser objeto das mais
profundas reflexes e mesmo consistir no autntico livro de cabeceira de todo maom do Rito
Retificado. H uma tal quantidade de documentos, de cartas, de manuscritos que iluminam o
entendimento de sua Arte, o que no ocorre com muitos outros Ritos de origens obscuras e de
autores annimos.
necessitados, inclusive durante o cerco da cidade pelas foras revolucionrias em 1793 (entre
08/08 e 09/10), quando, assinala Jean Ursin (2004: 144-145), mais 700 pessoas foram
executadas (a maioria guilhotinada), entre os quais 102 maons (entre eles 15 Cavaleiros
Benfeitores da Cidade Santa e o irmo mais novo de Willermoz, Antoine, de 52 anos). Ocupou
mesmo funes pblicas em Lyon, antes, durante e depois da Revoluo Francesa e do perodo
napolenico, e com a Restaurao (ou seja, mesmo os diferentes regimes polticos da
conturbada Frana da virada do sculo XVIII e incio do sculo XIX reconheciam em Jean-
Baptiste Willermoz um homem de bem e um cidado de destacado em sua regio).
Filho mais velho de uma famlia muito catlica, estudando em escola jesuta at
os 12 anos, o mestre de Lyon foi sempre um devoto praticante, envolvido com um ativo e
fervoroso servio pela Igreja Catlica Romana, assduo nas atividades de sua parquia, mas ao
mesmo tempo tolerante e amigo de pastores protestantes, pois entendia entre suas misses
uma de difundir os valores maiores do cristianismo, um cristianismo puro e universal,
integrando homens de diferentes profisses religiosas. Quando da visita do Papa Pio VII a Lyon,
em 1805, foi um dos convidados a se encontrar com Sua Santidade. Em seu funeral, em 29 de
maio de 1824, em Lyon, onde residira praticamente durante toda a vida, o cortejo fnebre foi
acompanhado de 12 ancies de La Charit, portando tochas, enquanto 18 padres oficiaram em
suas exquias. Por instrues expressas do prprio Willermoz, missas foram celebradas em sua
inteno, em datas por ele fixadas, durante trs anos aps sua morte (Dachez e Ptillot 2014:
47).
Uma ltima observao sobre a vida profana de Willermoz diz respeito a sua
situao familiar e afetiva. Durante parte importante de sua vida viveu com a irm, Claudine-
Thrse (Madame Provenal aps o casamento), que se tornou grande amiga, confidente e
discpula (tendo mesmo sido iniciada na Ordem dos lus Cons). Aps se tornar viva, os dois
irmos passaram a viver juntos, um cuidando do outro at a morte daquela. E foi com uma rf
25/33
que havia sido adotada por sua irm com a idade de trs anos, e 42 anos mais jovem que ele,
que Willermoz viria a se casar, em 1796, quando ele prprio estava com 66 anos.
A vida de casado trouxe mais vigor a Willermoz. Consta que vivia um casamento
feliz, e da unio proveio um filho, nascido em 1805, o que trouxe grande alegria ao pai
septuagenrio. Trs anos depois, porm, a tragdia se abateu sobre a famlia: a esposa de
Willermoz, Jeanne-Marie, foi acometida de grave doena e veio a falecer. O Mestre de Lyon viu-
se vivo e com um menino de 3 anos para criar. H registros de cartas de Willermoz a amigos
em que expressa grande preocupao com a criao do filho: chegou mesmo a escrever uma
srie de instrues que deveriam ser transmitidas ao garoto quando atingisse a maturidade. O
pequeno viria ele prprio a falecer prematuramente, idade 7 anos, em 1812. Em quatro anos,
Willermoz seria privado de seus trs entes mais queridos: a esposa, o filho e a irm, que
falecera em 1810. Mas todo esse sofrimento no o impediria de dedicar-se ao servio altrusta:
continuaria firme em seu trabalho de beneficncia e como homem pblico em Lyon. E com o
mesmo zelo da vida profana, tambm seguiria na obra manica.
O destaque de Jean-Baptiste Willermoz como maom foi ainda maior que aquele
de sua vida profana. Chamado por Dachez e Ptillot (2014: 47) de patriarca da maonaria
iluminista e mstica, o envolvimento com a Ordem dominou sua vida desde muito cedo: foi
iniciado em 1750, aos vinte anos, e comeou em rito que viria a se tornar o Rito Francs.
Insatisfeito com as frivolidades e com a indisciplina (Sitbon 2015:25) de sua Loja-Me, onde
se tornou Venervel dois anos depois de iniciado, resolveu, em 1753, junto com outros nove
irmos, fundar uma nova Loja, chamada La Parfaite Amiti, onde se tornaria tambm
Venervel, permanecendo com o malhete por oito anos, e iniciando seus dois irmos mais
novos (Pierre-Jacques e Antoine, em 1759).
(Aprendiz, Companheiro, Mestre, Mestre Eleito, Mestre Perfeito, Mestre Escocs, e Cavaleiro
do Oriente), aos quais se acrescia um oitavo, denominado Grande Mestre Escocs, Cavaleiro
da Espada e da Rosa-Cruz(grau este praticado em uma Grande Loja Escocesa, composta por
Venerveis e Ex-Mestres de Loja). Nota-se, assim, a forte influncia do escocismo na Maonaria
de Lyon.
Foi no ano de 1767 que Willermoz, durante uma de suas viagens de negcios a
Paris, foi apresentado (por Bacon de La Chevalerie, Mestre Maom lions e o nmero 2 da
Ordem Con) a Martinez de Pasqually. Pouco tempo depois, foi iniciado na Ordem dos lus
Cons pessoalmente por Pasqually, no templo do Tribunal Soberano da Ordem, em Versalhes.
As ideias e o magnetismo do Soberano dos Sacerdotes Eleitos fascinaram Willermoz. Tendo
alcanado o mais alto grau daquela Ordem em 1768, tentou o lions durante quatro anos, de
maneira incessante, estabelecer uma Loja Con em Lyon. Entretanto, apesar da insistncia de
Willermoz, Pasqually resistia em lhe enviar os rituais, catecismos e outros subsdios que havia
prometido. Foi somente com a partida deste para Santo Domingos que Willermoz teve acesso
ao material, graas a Louis-Claude de Saint-Martin, discpulo e secretrio de Pasqually e que se
tornou grande amigo do Mestre lions.
Incomodado com a adeso de Willermoz EOT, mas sem querer se indispor com
aquele, Saint-Martin acabou deixando Lyon, indo seguir por uma senda prpria e distinta
daquela do amigo lions (organizaria seu grupo de estudiosos dos ensinamentos de Pasqually e
um sistema de instruo que, um sculo depois, seria utilizado por Papus para o
estabelecimento da Ordem Martinista). Os dois continuaram em contato, e Saint-Martin seria
mesmo iniciado, em 1785, na Loja La Bienfaisance, fundada por Willermoz no Oriente de Lyon.
Em 1790 solicitaria seu desligamento definitivo da Maonaria, para seguir a sua via cardaca e
aprofundar os estudos da obra de Jacob Boehme (1575-1624), que descobrira em 1788.
46
Saint-Martin, Louis-Claude de. Dos Erros e da Verdade. Curitiba: Ordem Rosacruz, AMORC, 1994.
47
Essas instrues aos lus Cons foram reunidas e publicadas por Robert Amadou na obra Les Leons de Lyon aux
lus Cons un cours de martinisme au XVIIIe sicle par Louis-Claude de Saint-Martin, Jean-Jacques du Roy
dHauterive et Jean-Baptiste Willermoz (Paris: ditions Dervy, 2011).
48
Comentrios muito interessantes referentes parceria Saint-Martin-Willermoz e a respeito da influncia
daquele sobre este, podem ser encontrados na obra de Jean Ursin (2004: 76-81) sobre a Histria do RER.
28/33
Assim, os irmos lioneses, em sua maioria catlicos e de origem burguesa, uniram-se a uma
Ordem qual pertencia grande parte da nobreza alem e prussiana, a compreendidos reis e
prncipes regentes, em sua maioria de confisso protestante. (Sitbon 2015: 61)
Superiores Incgnitos que o haviam investido, perdeu seus poderes na EOT, mantendo apenas
uma posio honorfica, e se retirou para suas terras, onde viria a falecer no ano seguinte. Em
seu lugar, foi instalado como novo Gro-Mestre o Duque Ferdinand de Brunswick (1735-1806).
Consideraes Finais
Sob perspectiva puramente histrica, as origens do RER e sua trajetria por mais
de 250 anos por si s j bastariam para despertar o interesse daqueles que com o Regime
31/33
entram em contato. Afinal, trata-se de um dos mais tradicionais que ainda persistem na
Maonaria da atualidade, com seus rituais redigidos h dois sculos e preservados exatamente
como eram praticados poca em que o Brasil ainda era colnia de Portugal. bem provvel
que seja o RER um dos sistemas manicos mais bem documentados, com seus arquivos
preservados em bibliotecas manicas e profanas. Registre-se que tradio historiogrfica
francesa e o fato de ser o RER um dos ritos mais praticados hoje no pas de Willermoz muito
contriburam para publicaes bem fundamentadas sobre o que Sitbon chamou de a aventura
do RER. Assim que se tem nas obras de Ursin, Vivenza, Var, Dachez e Ptillot, do prprio
Sitbon e de outros pesquisadores maons e profanos estudos respeitveis que muito se
distanciam de obras em que se costuma privilegiar a especulao infundamentada.
Bibliografia
1. AMADOU, Robert. Les Leons de Lyon aux lus Cons un cours de martinisme au XVIIIe
sicle par Louis-Claude de Saint-Martin, Jean-Jacques du Roy dHauterive et Jean-Baptiste
Willermoz. Paris: ditions Dervy, 2011.
2. ANTIGA E MSTICA ORDEM ROSACRUZ, AMORC. Glossrio de Termos e Conceitos da
Tradio Rosacruz da AMORC. Curitiba: Grande Loja da Jurisdio de Lngua Portuguesa,
2011.
3. ARLS Solidariedade e Progresso n 3078, do Rito Escocs Retificado. Informaes sobre o
Rito Escocs Retificado a Maons convidados a participar do R.E.R., separata
http://solepro.com.br/RER/Artigos/RITO%20ESCOC%C3%8AS%20RETIFICADO.pdf (acesso
em 20/03/2015).
4. DACHEZ, Roger; PTILLOT, Jean-Marc. Le Rite cossais Rectifi. Paris: Presses Universitaires
de France, 2010. Coleo Que sais-je?.
5. FIGUEIREDO, Joaquim Gervsio de. Dicionrio de Maonaria seus mistrios, seus ritos, sua
filosofia , sua histria. So Paulo: Editora Pensamento, 1970.
6. Informaes sobre o Rito Escocs Retificado a Maons convidados a participar do R.E.R.,
Comunicao Oficial da Loja de M.E.S.A. Cavaleiros Unidos do Sul n 018-011/2012, de
30/07/2012. Disponvel em
<http://xa.yimg.com/kq/groups/11494701/985908883/name/018-011-2012%20-
%20InformacaoaconvidadosaoRER>, acesso em 01/05/2015.
7. LIGOU, Daniel (dir.),Dictionnaire de la franc-maonnerie. Paris: Presses Universitaires de
France - PUF, coll. Quadrige , 2012.
8. MAHARBA, A propos du R.E.R. e de la Grande Profession, in Le Symbolisme 391. 63-67
(1969).
9. MAZET, Edmond. Les Actes du Convent des Gaules, in: Travaux de la Loge nationale de
Recherches Villard de Honnecourt, N 11, 1985, pp. 57-106.
33/33
10. O Discurso de Ramsay, 1738. Verso Impressa. Verso disponvel no stio na internet da
ARLS Solidariedade e Progresso n 3078
(http://solepro.com.br/Artigos/Maconaria/O%20discurso%20de%20Ramsay.pdf acesso em
28/03/2015).
11. PAPUS (Grard Encausse). Martinsisme, Willermosisme, Martinisme et Franc-Maonnerie.
Paris: dition de LInitiation, 1899.
12. PASQUALLY, Martins de. Tratado de Reintegrao dos Seres em sua primeira propriedade,
virtude e potncia espiritual divina. (Primeira edio autntica segundo o manuscrito de
Louis-Claude de Saint-Martin. Organizao e apresentao de Robert Amadou). Curitiba:
Ordem Rosacruz, 2008.
13. PIRES, Carlos Alberto Carvalho M.I., Gr 25 (REAA), O Cavaleiro Ramsay e a Origem da
Maonaria, trabalho produzido para a ARLS Accia de Ja n 308 REAA, da GLESP.
Disponvel em https://maconariabrasil.wordpress.com/ramsay-e-as-origens/ (acesso em
02/04/2015).
14. RAGON, J.-M.. Tuiler Gnral de la Francmaonnerie ou Manuel de LIniti. Paris: Collignon,
1861.
15. ROBINSON, John J.. Nascidos do Sangue: os Segredos Perdidos da Maonaria. So Paulo:
Madras, 2005.
16. SAINT-MARTIN, Louis-Claude de. Dos Erros e da Verdade. Curitiba: Ordem Rosacruz,
AMORC, 1994.
17. SITBON, Jean-Claude. LAventure du Rite cossais Rectifi, Tome I: Approche historique
suivie de ltude de deux correspondances e dun discours de Jean-Baptiste Willermoz. Paris:
Les ditions de la Tarante, 2015.
18. URSIN, Jean. Cration et Histoire du Rite cossais Rectifi. Paris: ditions Dervy, 2004.
19. URSIN, Jean. Instructions lusage des Apprentis au Rite cossais Rectifi. Paris: ditions
Dervy, 1997.
20. VAR, Jean-Franois. La franc-maonnerie la lumire du Verbe. Paris: ditions Dervy, 2013.
21. VAR, Jean-Franois. A Obra de Jean Baptiste Willermoz (LOeuvre de Jean-Baptiste
Willermoz), trabalho traduzido para o portugus pela Sociedade das Cincias Antigas e
disponvel online em http://www.sca.org.br/news/420/57/A-Obra-de-Jean-Baptiste-
Willermoz.html (acesso em 20/04/2015).
22. VIVENZA, Jean-Marc. Le Martinisme: lEnseignement secret des Matres Martins de
Pasqually, Louis-Claude de Saint-Martin et Jean-Baptiste Willermoz, fondateur du Rgime
cossais Rectifi. Paris: ditions Mercure Dauphinois, 2013.
23. VIVENZA, Jean-Marc. Les lus cons et le Rgime cossais Rectifi: de linfluence de la
doctrine de Martins de Pasqually sur Jean-Baptiste Willermoz. Paris: ditions Mercure
Dauphinois, 2013.
http://www.gob.org.br/.
http://www.gpih.org/.
http://www.gprerbrasil.org.br/.
http://www.modestia-cum-libertate.ch/.
http://www.regius-glnf.fr/.
http://www.solepro.com.br.
1/31
Assim, a EOT comeava os anos setenta do sculo XVIII em crise, marcada pela
falta de credibilidade na histria de Von Hund sob seu contato com os Superiores Incgnitos e a
1
Trabalho apresentado ARLS Collegia Fabrorum n 4304, do Grande Oriente do Distrito Federal, em 27/02/2016.
2
Todas as citaes de bibliografia publicada em outros idiomas foram objeto de livre-traduo por este autor.
2/31
misso que lhe fora atribuda de restabelecer a Ordem dos Cavaleiros Templrios. A
radicalizao religiosa de Von Hund e seus vnculos com alguns falsrios que o acabariam
enganando para se beneficiar das riquezas da EOT (os autores convergem no sentido de que
Von Hund atuara de boa-f) tambm prejudicariam o desenvolvimento da Ordem at o incio
da dcada de 1770.
3
Note-se, portanto, que o termo retificado remonta a 1772, com o estabelecimento dessa designao para as
chamadas lojas escocesas vinculadas EOT. A informao sobre o acontecimento, um dado factual, elimina
qualquer especulao sobre o nome do Regime e sua antiguidade no seio da Maonaria especulativa.
4
Jean-Marc Vivenza. Historia del Gran Priorato de las Galias - El Rgimen Escocs Rectificado desde el siglo XVIII
hasta nuestros das. Oviedo: Editorial Masonica, 2014 (edio digital).
5
Henry Raccasi. La S.O.T. Rform en Ordre des C.B.C.S., au Convent de Lyon, en 1778. Montelimar: ditions
Maonniques, 2011, p. 20.
6
Jean Ursin. Cration et Histoire du Rite cossais Rectifi. Paris: ditions Dervy, 2004, p. 58.
3/31
De fato, o que ocorreu em Kohlo foi a destituio de Von Hund de suas atribuies de dirigente
da Ordem, sendo-lhe relegadas apenas funes honorficas7:
(...) Desde sua abertura [do Convento de Kohlo], a autenticidade das declaraes de
Hund no Convento de Altenberg, em maio de 1764, sobre a origem de seus poderes
manicos foi posta em questo. Ele s repetiu o que j havia dito sobre as
circunstncias de sua recepo e sobre a pessoa de seu iniciador, o Eques a Penna
Rubra, Cavaleiro da Pena Vermelha, o pretendente ao trono [britnico] Charles Eduard
Stuart. [Von Hund] produziu o mesmo documento indecifrvel [a carta-patente
supostamente recebida de Stuart].8
7
Evidentemente, a fragilizao de seu fundador se transferiria para a prpria Ordem na Alemanha, que perdia
membros e achava-se em graves problemas financeiros. Muitas cises ocorreriam nos anos seguintes, acabando
por dar origem a outros ritos manicos adotados entre os alemes, holandeses, suecos, austracos, suos, e
russos, entre outros. De certa maneira, o prprio estabelecimento do RER de acordo com a orientao dos
franceses constitui uma reao s ideias tradicionais de Von Hund na EOT.
8
Ursin, 2004, op. cit., p. 89.
9
Raccasi, op. cit., p. 20.
10
Preferimos usar alguns toponmicos em seu idioma original, por serem mais conhecidos dos brasileiros que sua
traduo para o portugus castio. Assim, nossa preferncia por Bordeaux a Bordus, e por Lyon a Lion ou Leo,
por exemplo.
4/31
Frana e um dcimo da Itlia. (...) No mesmo ano foi organizada a III Provncia da
Occitnia, cuja sede foi fixada em Bordeaux que transbordava para a Espanha. Dessa
Provncia dependia tambm um Gro-Priorado situado em Montpellier. Os templrios
de Montpellier se separaram em seguida da Provncia da Occitnia e foram reagrupados
no seio da Provncia de Septimnia.11
Em dois anos, Von Weiler, Vigrio Geral de Dresden designado pelo Gro-Mestre,
conseguiu estabelecer trs provncias francesas da EOT12. E seria por intermdio do Cavaleiro
da Espiga Dourada que Willermoz se aproximaria de Von Hund e dos outros dirigentes alemes
da EOT e acabaria sendo admitido na Ordem Templria, sendo armado Cavaleiro em 1774,
junto com outros irmos de Lyon:
11
Jean-Claude SITBON. LAventure du Rite cossais Rectifi, Tome I: Approche historique suivie de ltude de deux
correspondances e dun discours de Jean-Baptiste Willermoz. Paris: Les ditions de la Tarante, 2015, pp. 61-62.
12
Franz von Baader, comenta Sitbon (2015, p. 62), estima que Von Weiler estabeleceu em menos de quatro
meses, no trs provncias, mas quatro, em razo da Septimnia que ele tambm teria criado. Tornou-se
importante interlocutor de Willermoz na EOT.
13
Sitbon, 2015, op. cit., p. 61.
14
Ursin, 2004, op. cit., p. 94.
15
Sitbon, 2015, op. cit., p. 62.
5/31
que teria nomeado a Von Hund Gro-Mestre Provincial da VII Provncia (reunindo a XIII e a
XIV Provncias da antiga Ordem do Templo)16.
Se em 1776 a EOT perdia seu fundador, naquele ano tambm ganhava flego por
meio do homem que refundaria a Ordem. Desde sua instalao como alto dignitrio do Regime
Retificado na Frana, Willermoz mostrou-se atuante para expandir a organizao nas terras
gaulesas, sempre contando com ajuda de seus irmos maons. Teria um papel importante para
apaziguar os nimos na Maonaria francesa contra uma Ordem de origem alem e protestante.
Na condio de Grande Orador da Maonaria Escocesa Reformada na Frana, foi ele ativo
protagonista para a concluso do Tratado de Unio entre os Diretrios Retificados e o Grande
Oriente da Frana (GODF) em 1776, o que possibilitou a prtica do RER juntamente com o Rito
Francs no seio daquela Obedincia18.
16
Vivenza, 2014 (edio digital).
17
Roger Dachez; Jean-Marc Ptillot. Le Rite cossais Rectifi. Paris: Presses Universitaires de France, 2010. Coleo
Que sais-je?, p. 26.
18
Pelo tratado, o Grande Oriente incorporava o Rito Retificado, que passava, segundo Sitbon (2015, p. 63) a ter
um p no GODF e outro na Alemanha na EOT.
6/31
O ano de 1778 de extrema importncia para o RER. Afinal, foi entre os dias 25
de novembro e 10 de dezembro de 1778 que ocorreu, na cidade de Lyon, sob organizao da
Loja Retificada lionesa La Bienfaisance, o Convento Nacional das Trs Provncias das Glias19.
O Convento das Glias, como ficou conhecido, reuniu 22 irmos20 oriundos das provncias da
Auvrnia e da Borgonha (os irmos da Occitnia no estiveram presentes)21. Nele se
reformulou a Estrita Observncia Templria (EOT), com o estabelecimento de novo
regulamento para as provncias francesas da Ordem.
Nos primeiros dias do Convento, Jean de Trckheim deu o tom, exaltando os mritos
do [novo] sistema proposto, que abria mo dos propsitos do hermetismo e da
alquimia, mas cuja ambio era reencontrar os caminhos reais da Maonaria: a virtude,
a caridade e a f crist.22
19
As Atas do Convento das Glias esto contidas no arquivo Ms 5482 da Biblioteca Municipal de Lyon, disponveis
para consulta no local.
20
A lista dos participantes do Convento das Glias encontra-se no Anexo I deste trabalho.
21
Sitbon (2015, op. cit., p. 69) fala em 25 irmos, com um representante da Lombardia (VIII Provncia Alta
Alemanha), mas na lista de participantes obtida na Ata constam apenas 22 delegados presentes.
22
Sitbon, 2015, op. cit., p. 69. Observe-se que aqui esto os fundamentos do RER: um regime de orientao crist,
baseado na caridade e na virtude. Cabe destacar tambm o abandono de qualquer estudo direto hermtico ou
alqumico no mbito do Regime.
23
Vivenza, 2014 (edio digital).
24
Palavras de Jean de Trckheim, apud Le Forestier (La Franc-maonnerie templire et occultiste aux XVIIIe et XIXe
sicles. Paris : Aubier Montaigne, 1970), p. 482.
7/31
Convm lembrar que Willermoz havia ingressado na EOT alguns anos antes.
Entretanto, j dispunha de vasta formao manica e experincia, pois fora iniciado na
Maonaria em 1750, e dedicava sua vida a conhecer e estudar os distintos ritos, regimes e
sistemas da Franco-maonaria no sculo XVIII. Dentre as diversas ordens de que fez parte,
Willermoz encontrara na Ordem dos Cavaleiros Maons Eleitos Cohens do Universo, ou,
simplesmente, Ordem dos Sacerdotes Eleitos (lus Cons) estabelecida por Martinez de
Pasqually e que teve Louis-Claude de Saint-Martin (1743-1803) como um dos cones um
25
Sitbon, 2015, op. cit., p. 69.
26
Sitbon, 2015, op. cit., p. 70.
27
Sitbon, 2015, op. cit., p. 69.
8/31
28
Vide o trabalho de nossa autoria intitulado O Regime Escocs Retificado - Fundamentos e Breve Histrico (das
origens s vsperas do Convento das Glias), apresentado ARLS Collegia Fabrorum n 4.304, do Grande Oriente
do Distrito Federal, como requisito parcial elevao ao grau de Companheiro (Braslia, 2015).
29
Alain Bernheim (Eques a Quaestione studiosa). Notes propos du Rite cossais Rectifi . Acta Macionica,
Bruxelles, vol. 11 (2001), pp. 79-145. (Disponvel em http://www.ordo-ab-chao.org/ordo/Docs/rer.pdf, acesso em
20/12/2015).
30
Dachez & Ptillot, op. cit., pp. 82-83.
31
Um quadro com a disposio das Provncias francesas encontra-se no Anexo II deste trabalho.
32
Code Gnral des Rglement de LOrdre des Chevaliers Bienfaisants de la Cit Sainte, disponvel online em
http://www.ordre-de-lyon.com/biblioteq/textMasonic/code-general.htm (acesso em 02/02/2016).
9/31
33
Code Maonnique des Loges runies et rectifies de France, approuv par les dputs des Directoires de France
au Convent National de Lyon en 1778, disponvel online em
http://29421.free.fr/supports_site/code_maconnique_rer_1778.pdf (acesso em 02/02/2016).
34
Sitbon, 2015, op. cit., p. 70.
35
Sitbon, 2015, op. cit., p. 70. Observe-se que a Ordem de Malta referida no texto a Ordem Soberana e Militar de
Malta (ou Ordem Soberana e Militar Hospitalria de So Joo de Jerusalm, de Rodes e de Malta), ltima das
ordens de cavalaria medievais que chegou a nossos dias, existindo hoje (aps os Cavaleiros de Malta terem sido
expulsos por Napoleo, em 1798, da ilha que governavam h sculos) sob a proteo do Papa e sediada em Roma.
36
Sitbon, 2015, op. cit., p. 71.
10/31
37
Sitbon, 2015, op. cit., p. 71.
11/31
Mas se havia essa distino de Cavaleiros em razo de sua origem (ou do estado
a que pertenciam), a inovao do Convento das Glias em relao EOT foi exatamente a de
permitir a Irmos que no fossem oriundos da nobreza ser admitidos na organizao (veja-se
que aqui no se trata da Franco-maonaria em si, fundamentada em seus graus simblicos, mas
na Ordem de Cavalaria estabelecida para os graus superiores). Assim, o Artigo II do Cdigo
enfatizava o princpio fundamental da igualdade: enquanto a EOT reservava o ttulo de
Cavaleiro apenas a irmos nascidos de pais nobres de nome e armas (ou seja, da nobreza),
38
O original do Cdigo est disponvel em formato eletrnico disponibilizado pelo Google Play em
https://play.google.com/store/books/details/Code_g%C3%A9n%C3%A9ral_des_R%C3%A8glements_de_l_Ordre_d
es_Chevali?id=0CcnwBE84c0C (acesso em 02/02/2016).
39
A estrutura do Cdigo encontra-se no Anexo III deste trabalho.
40
Code General des Rglements de L'Ordre des Chevaliers Bienfaisants de La Cit Sainte Arrt au Convent National
des Gaules tenu en novembre 1778-465, Titre I, Article I, 1: Diffrentes classes de l'Ordre.
12/31
o Convento das Glias declarava que no se poderia excluir sem injustia [dos quadros da
Ordem] a todos os candidatos teis, plenos de talento e zelo pelo bem pblico, mas menos
favorecidos pelo azar do nascimento (...), uma vez que a verdadeira nobreza consiste na
41
virtude . Tinha-se a o fundamento para se receber todos os gentis-homens que se
mostrassem nobres de esprito e merecedores do ttulo de CBCS. A esta classe de Cavaleiros
Civis pertenceriam os prprios irmos Willermoz, oriundos, repita-se, da burguesia, que
poderiam ombrear-se com os nobres de origem, e tambm com os homens de armas (Milites) e
com aqueles provenientes do clero (Clerici):
41
Code General des Rglements de L'Ordre des Chevaliers Bienfaisants de La Cit Sainte Arrt au Convent National
des Gaules tenu en novembre 1778-465, Titre I, Article II: Des qualits requises pour tre reu.
42
Code General des Rglements de L'Ordre des Chevaliers Bienfaisants de La Cit Sainte Arrt au Convent National
des Gaules tenu en novembre 1778-465, Titre I, Article I, 5: Diffrentes classes de l'Ordre. Uma vez que o estilo do
texto aquele do final do sculo XVIII, buscou-se proceder a uma traduo que fosse mais palatvel ao portugus
do sculo XXI. No obstante, o texto original reproduzido nesta nota, para que os falantes de francs possam
conhec-lo em sua plenitude: On comprend parmi les Chevaliers civils, tous les Frres nobles ou non, qui n'ont
pas servi pendant l'espace de temps prescrit et qui ont un tat honorable dans la socit, tel qu'il est dfini ci-aprs.
Les Magistrats et gens de Loi font voeu de dfendre le faible et l'opprim; les Mdecins d'assister gratuitement les
pauvres de leurs conseils, les Gens de Lettres de vouer leurs veilles des ouvrages qui tendent l'empire de la vertu
et de la vrit,; les Ngociants d'entretenir la circulation des besoins mutuels et de procurer du travail et du pain
des citoyens pauvres et honntes, les Agriculteurs, gens de finances et autres bourgeois honntes, placs dans un
tat moins assujettissant des devoirs civils, sont d'autant plus mme de vouer leurs loisirs au bien de
l'humanit; tous en gnral secondent les vues bienfaisantes de l'Ordre .
43
Vivenza, 2014 (edio digital).
13/31
44
Tous les Chevaliers, qui ont t une fois admis la profession de leurs voeux sont parfaitement gaux. Ni une
naissance plus illustre, ni un rang plus lev dans la Socit civile, ne donnent la moindre prrogative relle aux
Frres. Les Princes mmes, qui veulent renoncer volontairement aux prestiges de la vanit et l'ingalit politique
des hommes, pour goter des plaisirs purs dans le sein de l'amiti et de la bienfaisance, respecteront la loi
prcieuse de l'galit, base fondamentale de tout ordre, dont les membres se consacrent l'exercice pnible, mais
satisfaisant de la charit chrtienne (). (Code General des Rglements de L'Ordre des CBCS, op. cit., Titre I, Article
II, 7).
45
Code General des Rglements de L'Ordre des CBCS, op. cit., Titre III, Article II, 16-19.
46
Toute Loge est sous lautorit dun Commandeur, qui peut en runir plusieurs sous son maillet, dont il est alors
le Chef titulaire ou Dput-Matre. Chaque Loge lui adjoint tous les trois ans un Vnrable pour la gouverner sous
son autorit. (Code Gnral des Rglement de LOrdre des CBCS, op. cit. Titre II, Article II, 4)
47
Le Gouvernement de l'Ordre est aristocratique, les Chefs ne sont que les Prsident des Chapitres respectifs. Le
Grand Matre gnral ne peut rien entreprendre sans les avis des Provinciaux. Le Matre provincial sans celui des
Prieurs et des Prfets, les Prfets sans celui des Commandeurs et ceux-ci sans en avoir confr avec les Chevaliers
de leur district. Tous les Prsidents d'assembles, Matres provinciaux, grands Prieurs et Prfets ont toujours le
droit aprs l'expos de la matire fait par le Chancelier, la 1" voix consultative et la dernire dlibrative. (Code
General des Rglements de L'Ordre des CBCS, op. cit., Titre IV, Article I, 1)
14/31
interiores)48. Observe-se que os textos dos rituais da Ordem Interior da EOT foram objeto de
uma primeira reviso que ficou a cargo de Jean de Trckheim.
48
La Franc-maonnerie Conservatrice de notre St. Ordre en est la ppinire, o lon lve et prpare les sujets
quon croit propres y entrer; elle doit donc tre dans une liaison intime avec le gouvernement intrieur du St.
Ordre. [...] Le Convent a arrt les statuts et rglements gnraux de la Maonnerie, qui servent de rgle invariable
tous ceux, qui suivent la rforme du T. St. O. (Code Gnral des Rglement de LOrdre des CBCS, op. cit. Titre IX,
Article I, 1).
49
Dachez & Ptillot, op. cit., p. 81.
50
A estrutura desse Cdigo encontra-se no Anexo IV do presente trabalho.
51
La Maonnerie rectifie ne reconnat que quatre grades ; savoir ceux d'Apprenti, de Compagnon, de Matre et
de Matre cossais. (Code Maonnique des Loges runies et rectifies de France, approuv par les dputs des
Directoires de France au Convent National de Lyon en 1778, op. cit., Chapitre X).
52
Dachez & Ptillot, op. cit., pp. 81-82.
15/31
Enquanto os trs primeiros graus do RER esto sob a gide das Lojas Azuis, o
quarto grau (que pode ser entendido como a consolidao dos trs primeiros e a ponte para a
Ordem Interior, na qual tambm est inserido) encontra-se sob os auspcios das chamadas
Lojas Verdes. Os trs primeiros graus so conferidos pelo Venervel Mestre de uma Loja,
enquanto o quarto o pelo Deputado Mestre (ou, na sua ausncia ou se for de seu desejo, pelo
Venervel Mestre54).
Tabela 1
A Estrita Observncia Templria e o Regime Escocs Retificado
Graus/Classes
EOT RER
1. Aprendiz 1. Aprendiz
2. Companheiro 2. Companheiro
3. Mestre 3. Mestre
53
Sitbon, 2015, op. cit., pp. 72-73.
54
Les trois premiers grades seront confrs par le Vnrable Matre de la Loge, conformment aux cahiers qui lui
en auront t fournis par le Directoire cossais. Le grade de Matre cossais est rserv au Dput Matre, s'il est
prsent ; son dfaut, ou s'il le dsire, il est confr comme les autres par le Vnrable Matre. (Code
Maonnique des Loges runies et rectifies de France, op. cit., Chapitre X).
55
No Convento das Glias, a denominao adotada para o Grau foi de Mestre Escocs (o termo Mestre Escocs de
Santo Andr s ser empregado a posteriori).
56
Tous les autres grades, sous quelque dnomination qu'ils soient connus, principalement toute espce d'lu, de
Chevalier Ks. (Kadosch) et des grades qui leur ressemblent, sont expressment dfendus dans toutes les Loges
16/31
Assim como o Cdigo da Ordem dos CBCS dispunha sobre a Ordem Interior, o
Cdigo das Lojas Reunidas e Retificadas da Frana estabelecia a estrutura organizacional da
Maonaria Simblica, a qual era governada por um Gro-Mestre Geral, por Gro-Mestres
nacionais e Administradores provinciais, e pelos Diretrios Escoceses e Grandes Lojas
Escocesas. Cada Grande Loja deveria ser composta por um Chefe ou Presidente (e seus oficiais)
e por Deputados-Mestres, encarregados de inspecionar as Lojas de seu distrito em particular e
de prestar contas Grande Loja Escocesa.
runies sous les peines les plus graves, comme dangereux et contraires au but et l'esprit de la franc-maonnerie.
(Code Maonnique des Loges runies et rectifies de France, op. cit., Chapitre X).
57
Apprentis ont le tablier de peau blanche sans doublure ni bordure, la bavette haute; les Compagnons ont le
mme tablier, avec des rubans bleus ; les Matres ont le tablier doubl et bord de bleu, la bavette abattue ; les
Matres cossais ont le tablier comme il sera expliqu plus au long dans la suite de ce chapitre. (Code Maonnique
des Loges runies et rectifies de France, op. cit., Chapitre X).
58
Aucun profane ne peut tre reu Franc Maon s'il ne professe la religion chrtienne, s'il n'a pas l'ge de vingt et
un ans, moins qu'il soit fils de Maon, ou muni de dispenses, et s'il n'est n de parents libres. (Code Maonnique
des Loges runies et rectifies de France, op. cit., Chapitre X).
59
Apenas no sculo XX que se permitiria o ingresso de irmos de outras religies no RER e, mesmo assim, com
limitaes a partir do 4 Grau do Regime.
60
Vivenza, 2014 (edio digital).
61
Le grade de Matre cossais est exclusivement affect au rgime rectifi. C'est par cette raison que, lorsqu'on le
confre, ou qu'on tient Loge d'instruction de ce grade, on n'ose y faire assister aucun visiteur d'un autre rgime,
quelque grade qu'il ait. (Code Maonnique des Loges runies et rectifies de France, op. cit., Chapitre X)
62
Lorsqu'un Frre aura t reu rgulirement Matre cossais, le Vnrable Matre de la Loge, ou tel autre Frre
qu'il commettra pour cela, pourra lui communiquer sans aucuns frais ni crmonies tous les grades dnomms
suprieurs dans les autres rgimes, qui seront sa connaissance, sans que pour cela le Frre, auquel ils seront ainsi
communiqus, puisse se dcorer en Loge des attributs et couleurs desdits grades. (Code Maonnique des Loges
runies et rectifies de France, op. cit., Chapitre X)
17/31
Ademais, cada Diretrio Escocs era composto, conforme o Cdigo, por seu
Presidente, por oficiais representantes das Grandes Lojas e por oficiais necessrios
administrao do seu distrito. Os Grandes Diretrios nacionais tinham em sua composio um
Administrador-Geral, um Visitador, um Chanceler, alm de representantes dos Diretrios e das
Grandes Lojas. Finalmente, o Grande Diretrio Nacional era presidido por um Gro-Mestre
nacional, como chefe principal da nao, e tinha em sua estrutura administradores
provinciais, presidentes dos Diretrios, e conselheiros e oficiais necessrios a sua gesto.
63
Code Maonnique des Loges runies et rectifies de France, op. cit., Prcis.
64
Dachez & Ptillot, op. cit., p. 83.
18/31
Outros aspectos que evidenciam essa convergncia dos dois Cdigos so, ainda
segundo Bernheim:
65
Dachez & Ptillot, op. cit., pp. 83-84.
66
Bernheim, op. cit..
19/31
A Profisso
67
Dachez & Ptillot, op. cit., p. 83.
68
Robert Ambelain, em Le Martinisme Histoire et Doctrine (Paris : ditions Niclaus, 1946, pp. 129-130) comenta
que Saltzmann, que chegou a Lyon em 1777, foi o iniciador de Saint-Martin e de Goethe na Sociedade dos
Superiores Incgnitos, sendo Mestre dos Novios do Diretrio de Estrasburgo da EOT. Originrio de uma famlia
protestante da Alscia, Saltzmann foi, nas palavras de Ambelain, um homem extremamente religioso, tendo
realizados fortes estudos teolgicos na Universidade de Goettingue, e, assim como Willermoz, decepcionou-se
com a natureza puramente manica da Estrita Observncia, identificando-se sobremaneira com a doutrina dos
lus Cons e sendo o introdutor dessa doutrina na Alemanha.
69
Bernheim, op. cit..
20/31
A Ordem dos Cavaleiros Escoceses se divide em seis classes distintas, a saber, aquelas
dos Cavaleiros, Socii [Novios], Escudeiros, Clrigos, Servos dArmas, e Valetes de Armas.
Os conhecimentos da Ordem so absolutamente completos, e os mesmos para as cinco
primeiras [classes]; cada uma das classes de Cavaleiros, Escudeiros e Servos dArmas se
divide em duas outras, a saber, Professo e no Professo. (...) Chamam-se Professos
aqueles que tenham feito sua ltima Profisso, chamada de maior; esta Profisso no
um grau que aumente seus conhecimentos, mas um ato livre e unicamente voluntrio
daquele que a faz, por meio do qual ele se compromete irrevogavelmente perante a
Ordem a observar todas as leis, regras e estatutos, a submeter-se completamente
autoridade de seus chefes.
A Grande Profisso da Ordem dos CBCS o ato por meio do qual os Cavaleiros que
tenham passado pelas devidas provas e os Irmos das classes inferiores da mesma
Ordem que tenham sido considerados dignos sero iniciados no conhecimento dos
mistrios da antiga e primitiva Maonaria, e so considerados aptos a receber a
explicao e o desenvolvimento final dos emblemas, smbolos e alegorias manicos.
70
Documento disponvel na Biblioteca Municipal de Lyon sob o nmero MS 5775, pice 1, citado por Bernheim
(op. cit.).
71
Sitbon, 2015, op. cit., p. 73.
72
Sitbon, 2015, op. cit., p. 74, e Ambelain, op. cit., p. 130.
21/31
(...) tudo que inseri [nos ensinamentos aos Professos] referente parte cientfica [da
Maonaria primitiva], no foi inventado por mim. Baseei-me nos conhecimentos que
adquiri na Ordem sobre a qual j me referi diversas vezes a Vossa Alteza.73
Aps o Convento das Glias, observa Sitbon75, seis outros Colgios de Grandes
Professos foram estabelecidos junto s principais Lojas Escocesas que haviam aceitado as
decises daquele Convento. Na Frana (em Lyon, Estrasburgo, Chambry, e Montpellier), na
Itlia (em Turim e Npoles), e mesmo em outros Orientes na Alemanha, a classe dos Professos
contava com algo em torno de seis dezenas de membros, sendo o Colgio de Lyon o mais
importante em nmero.
73
Carta de J-B Willermoz a Charles de Hesse, apud Sitbon, op. cit., p. 74.
74
Cpia manuscrita da prancha original do Captulo Metropolitano de Lyon (Chapitre Mtropolitain de Lyon),
devidamente certificada por Christophe Aubanel, Eques a Gladio et Manu (coleo particular de Alain Bernheim).
75
Sitbon, 2015, op. cit., p. 75.
76
Bernheim, op. cit..
22/31
A Histria recordar que este Priorado (...) ser o que velar fielmente pela
conservao do Regime Retificado, aps sua extino na Frana no sculo XIX, e que
contribuir para o seu despertar e retorno a sua terra de origem no incio do sculo XX,
transmitindo em 1910 a Camille Savoire e Pierre de Ribaucourt os elementos iniciticos
indispensveis a sua reedificao. 77
77
Vivenza, 2014 (edio digital).
78
A Prefeitura da Basilia cessou suas atividades em 1784, retomando os trabalhos em 1809. J Zurique
adormeceu em 1786, despertando em 1812.
79
A histria do Grande Priorado da Helvcia contada por Bernheim, em Notes a propos du Rite cossais Rectifi
(op. cit.).
80
Marhaba, A propos du R.E.R. e de la Grande Profession, in Le Symbolisme 391. 63-67 (1969)
23/31
Podemos dizer ento que o Convento das Glias, por suas decises que de fato
representavam uma autntica ruptura com a Estrita Observncia, estabelecia e
constitua uma maonaria simblica fundada, no em trs Graus como fora at ento,
mas em quatro, conduzindo a uma Ordem de Cavalaria dita Ordem Interior, formada
por Escudeiros Novios e por Cavaleiros Benfeitores da Cidade Santa, cujo objetivo
inicitico original ficava, a partir de ento, preenchido pelas orientaes elaboradas e
decididas quando das lies de Lyon que cristianizaram a doutrina da reintegrao de
Martinez; Ordem Interior qual viria a somar-se a antiga classe dos Professos da Estrita
Observncia, mas dotada agora de um contedo completamente novo, uma 3 classe
secreta de Cavaleiros Professos e Grandes Professos, ainda que s se dera conta de sua
existncia no Convento como uma eventualidade ento provvel e desejvel, diferida a
um futuro indeterminado. 84
81
Sitbon, 2015, op. cit., p. 75.
82
Essa Regra Manica faz parte dos textos que compem o Ritual do Grau de Aprendiz do RER, publicado em
portugus pelo Grande Oriente do Brasil, pp. 226-241 (Grande Oriente do Brasil. Ritual do 1 Grau: Aprendiz-
Maom do Rito Escocs Retificado. So Paulo, 2013.).
83
Sitbon, 2015, op. cit., p. 75.
84
Vivenza, 2014 (edio digital).
24/31
maonaria sada do bero mesmo da autntica Tradio (...).85 Esse era o esprito
reformador do Convento, cujo o objetivo era, portanto, organizar aquele caleidoscpio de
sistemas e regimes manicos na Frana do ltimo quartel do sculo XVIII, e apresentar aos
homens livres e de bons costumes da poca uma alternativa de retorno unidade primitiva e
Tradio. Assim, por meio daqueles ensinamentos e das novas prticas, dos rituais, do estudo e
da orao, e da prtica constante da beneficncia, o homem de desejo alcanaria a
Reintegrao e chegaria Jerusalm Celeste.
Todo esse conjunto de alteraes realizadas por ocasio do Convento das Glias
ficaria conhecido como A Reforma de Lyon. E naquele memorvel 10 de dezembro de 1778,
data do encerramento do congresso, um novo regime manico, concebido e elaborado
principalmente por Willermoz, foi ento instaurado com suas atas, cdigos, rituais, graus,
instrues e regulamentos86. E o Convento das Glias transformaria os Diretrios franceses da
EOT em uma organizao bastante distinta e distante daquela instituio alem da qual se
diziam fazer parte. Com rituais, graus, denominaes e uma doutrina diferente do que era
adotado pela Ordem de Von Hund, a seo francesa da EOT mostrava-se praticamente livre do
controle alemo.
Com plenos poderes que lhes foram outorgados no Convento de Lyon, que
alcanavam a totalidade das provncias francesas da EOT, Jean-Baptiste Willermoz tornou-se,
de fato, o Gro-Mestre de uma nova Ordem Manica. Nos meses seguintes, enquanto a
Ordem se fortalecia na Frana, Willermoz manteria intensa correspondncia com os altos
dignitrios da EOT, particularmente com o Duque de Brunswick e com Prncipe Charles de
Hesse-Cassel87, que sucederia Brunswick como Gro-Mestre Geral da Ordem: preparavam-se as
bases para um novo Convento, este geral e que alcanaria toda a Estrita Observncia.
85
Vivenza, 2014 (edio digital).
86
Sitbon, 2015, op. cit., p. 76.
87
O Prncipe Charles de Hesse-Cassel (1744-1836), Eques a Leone Resurgente, seria o novo Gro-Mestre de todas
as Lojas Escocesas, substituindo o Duque de Brunswick em 1792, em razo de seu falecimento. E permaneceria
nesse cargo at seu falecimento em 1836, sendo o ltimo Gro-Mestre Geral da Ordem. Algumas tentativas foram
feitas no final do sculo XX para restabelecer um Gro-Mestrado Geral (e internacional, portanto), mas todas
fracassaram.
25/31
Consideraes Finais
Todo maom que se interesse pelo RER (e, sobretudo, aqueles Irmos
pertencentes ao Regime) deve conhecer a histria e a doutrina desse sistema cristo. E
impossvel se compreender o Escocismo Retificado sem o conhecimento do que foi o Convento
das Glias, do que se fez naqueles dias em Lyon e, principalmente, dos documentos produzidos
naquele encontro de maons ilustres. Os alicerces, portanto, desse fascinante Templo do RER,
foram estabelecidos naquela Conveno de 1778.
BIBLIOGRAFIA
1. AMADOU, Robert. Les Leons de Lyon aux lus Cons un cours de martinisme au XVIIIe
sicle par Louis-Claude de Saint-Martin, Jean-Jacques du Roy dHauterive et Jean-Baptiste
Willermoz. Paris: ditions Dervy, 2011.
2. AMBELAIN, Robert. Le Martinisme Histoire et Doctrine. Paris : ditions Niclaus, 1946.
3. BERNHEIM, Alain (Eques a Quaestione studiosa). Notes propos du Rite cossais Rectifi.
Acta Macionica, Bruxelles, vol. 11 (2001), pp. 79-145. (Disponvel em http://www.ordo-ab-
chao.org/ordo/Docs/rer.pdf, acesso em 20/12/2015)
4. Code General des Rglements de L'Ordre des Chevaliers Bienfaisants de La Cit Sainte Arrt
au Convent National des Gaules tenu en novembre 1778-465.
5. Code Maonnique des Loges runies et rectifies de France, approuv par les dputs des
Directoires de France au Convent National de Lyon en 1778.
6. DACHEZ, Roger; PTILLOT, Jean-Marc. Le Rite cossais Rectifi. Paris: Presses Universitaires
de France, 2010. Coleo Que sais-je?.
7. GONALVES, Joanisval Brito. O Regime Escocs Retificado: Fundamentos e Breve Histrico
(das origens s vsperas do Convento das Glias), trabalho apresentado ARLS Collegia
Fabrorum n 4.304, do Grande Oriente do Distrito Federal, como requisito parcial
elevao ao grau de Companheiro. Braslia, 2015.
8. GRANDE ORIENTE DO BRASIL. Ritual do 1 Grau: Aprendiz-Maom do Rito Escocs
Retificado. So Paulo, 2013.
9. LE FORESTIER, Ren. La Franc-maonnerie templire et occultiste aux XVIIIe et XIXe sicles.
Paris : Aubier Montaigne, 1970.
10. MAHARBA, A propos du R.E.R. e de la Grande Profession, in Le Symbolisme 391. 63-67
(1969).
11. MAZET, Edmond. Les Actes du Convent des Gaules, in: Travaux de la Loge nationale de
Recherches Villard de Honnecourt, N 11, 1985, pp. 57-106.
26/31
Anexo I
CONVENTO NACIONAL DAS TRS PROVNCIAS DAS GLIAS
(Lyon, 25 de novembro a 10 de dezembro de 1778)
88
LISTA DOS PARTICIPANTES
Nome Nome na Ordem P = Presente Qualificao Representante Poderes Poderes
A = Ausente de delegados a
Auvrnia II
Prost de Royer, Aquila, P Presidente Provncia de
Antoine Antonius ab Gro-Prior da Auvrnia
Frana
Administrador da
II Provncia
Lescot, Conde de Leone Coronato, P Prior do Clero da Provncia de Prisse-
(Fanois de Sales A. August[in]us a II Auvrnia Duluc
Barbier) (27/11)
88
Tabela produzida por Joanisval Gonalves a partir da traduo da Tabela publicada por Bernheim (op. cit.).
28/31
Borgonha V
Drckheim, Arcu, A Mestre Provincial
Franz Christian Christianus ab da V
Eckbrecht, Baro de Comissrio Geral
das Provncias
Francesas na
Alemanha
Klinglin, Abade de, Torque, A Prior do Clero da Conde de
Augusto Augustinus a V Cordon
Anexo II
CONVENTO NACIONAL DAS TRS PROVNCIAS DAS GLIAS
(Lyon, 25 de novembro a 10 de dezembro de 1778)
NOVA MATRCULA DAS 3 PROVNCIAS FRANCESAS89
Provncia Auvrnia Occitnia Borgonha
II III V
89
Tabela produzida por Joanisval Gonalves. Alguns topnimos em francs foram mantidos pela familiaridade com
os nomes originais no Brasil.
30/31
Anexo III
CDIGO GERAL DOS REGULAMENTOS DA ORDEM DOS CBCS
(Aprovado no Convento Nacional das Glias em Novembro de 465/1778)
ESTRUTURA DO CDIGO90
Ttulos Artigos
1 Das Diferentes Classes da Ordem e das I Diferentes Classes da Ordem
Qualidades Necessrias para ser nela II Qualidades necessrias para ser nela recebido
Recebido III Os companheiros darmas
2 Deveres dos Irmos
3 Composio da Ordem em Geral
4 Governo Geral da Ordem I Natureza do Governo
II Convento Geral
III Gro-Mestre Geral
5 O Governo Nacional da Ordem I Convento Nacional
II Gro-Mestre Nacional
III Conselho de Administrao Nacional
6 Governo Provincial I Dos Captulos Provinciais
II Do Mestre Provincial
III Do Visitador Geral da Provncia
IV Do Chanceler da Provncia
V Conselheiros de Honra
VI Comit de Administrao
7 Governo Prioral
8 Governo Prefeitural
Captulo I I Composio dos Captulos Prefeiturais
Das Prefeituras II Do Prefeito
III Do Decano do Captulo
IV Do Prior Eclesistico
V Do Senior do Captulo
VI Do Chanceler Prefeitural
VII Do Tesoureiro
VIII Do Elimosinrio
IX Do Inspetor dos Novios ou Escudeiros
X Do Mestre de Cerimnias
Captulo II I Dos Comandantes
Das Comanderias II Das Lojas Manicas
9 Objetos Econmicos I Da Comisso do Tesouro
II Dos Dotes pagos por todos os Cavaleiros
III Do Benefcio Rural
IV Caixa Prefeitural
V Caixa das Comanderias
VI Caixas Manicas das Lojas
VII Planos Econmicos
Fonte: Cdigo Geral dos Regulamentos dos CBCS
90
Quadro produzido por Joanisval Gonalves a partir da estrutura do Cdigo.
31/31
ANEXO IV
CDIGO MANICO DAS LOJAS REUNIDAS E RETIFICADAS DA FRANA
(Como aprovado pelos Deputados dos Diretrios da Frana no Convento Nacional de Lyon, em 5778)
ESTRUTURA DO CDIGO91
Introduo
Resumo
Do Governo Geral da Ordem dos Francomaons, de Acordo com as Leis
Fundamentais, Observadas no Regime Reformado e Retificado.
Captulo v Do Deputado-Mestre
91
Quadro produzido por Joanisval Gonalves a partir do Cdigo.
1
1
Apesar de haver distino clara entre os termos Regime e Rito, estes sero usados como
sinnimo no presente trabalho.
2
Os primeiros esboos oficiais dos rituais foram elaborados em 1778 no Convento das
Glias, sendo definitivamente formulados, ao menos no que concerne aos trs
primeiros graus, alguns anos mais tarde, durante o Convento de Wilhelmsbad, em
1782: os ltimos retoques foram feitos em 1802. A Ordem Interior e sobretudo o
quarto grau passaram ainda por diversas evolues nos ltimos anos do sculo, e no
incio do sculo XIX (1809 para o quarto grau). O curto perodo durante o qual
conjunto dos rituais foi elaborado, e o fato de que todos foram redigidos pelo mesmo
grupo de homens, valeu-lhes [aos rituais] de extrema coerncia e lhes permitiu serem
encadeados segundo uma lgica que prpria do Rito. Esta coerncia foi
preservada, uma vez que eles foram mantidos em seu estado primitivo do sculo
2
XVIII (...) .
2
Roland Bermann. Le grade de Compagnon au Rite cossais Rectifi sa nature et son sotrisme.
Paris : Editions Dervy, 2009, pp. 10-11 (livre traduo).
3
Isso no ocorre maneira to significativa em lngua portuguesa. Ressalvadas as diferenas
ortogrficas, textos do sculo XVIII escritos em portugus so inteligveis sem maiores dificuldades.
4
Bermann, op. cit., pp. 12-13.
5
A principal biografia de Willermoz foi escrita por Alice Joly em 1938. Intitulada Un Mystique Lyonnais
et les secrets de la Franc-Maonnerie 1730-1824, a obra de Joly referncia quase um sculo depois
de sua publicao, com uma edio recente publicada pelas Editions Equinoxis, em 2014. Ainda no
h traduo em portugus da obra de Joly. Willermoz tambm pode ser conhecido pelos seus
prprios escritos, de instrues e cartas aos irmos do RER a cartas a autoridades, profanas e
manicas, muitas compiladas em colees em Paris, Lyon, Genebra e na Haia. Cita-se, ainda, os
3
I A LOJA
Onde trabalhamos?
- Em uma Loja
1. A Bblia
2. O Esquadro e o Compasso
textos escolhidos e apresentados por Jean-Marc Vivenza, no livro Jean-Baptiste Willermoz Fondateur
du Rgime cossais Rectifi (St Martin de Castillon: Editions Signatura, 2012).
4
3. As Luzes
4. O Malhete
5. A Trolha
6. O Dossel ou Baldaquino
7. O Tapete da Loja
9. O Tringulo Luminoso
6
Bermann, op. cit., p. 43.
8
V O CHAPU
VI A ESPADA
IX ENTRADA EM LOJA
1- Preparao do Cortejo
2 Entrada em Loja
Depois de colocar sua espada sobre a Bblia (com a ponta voltada para
o Norte), o VM pega com a mo direita a vela que se encontra esquerda do
candelabro de trs braos (sendo inaceitvel qualquer outro meio de iluminao).
Ele desce do Oriente por sua esquerda (pelo sul) e vai, sozinho, acender as trs
chamas.
- o Irmo se levanta;
- se pe ordem;
- se descobre;
XV A ATA DA SESSO
2 Cadeia de Unio
No fique exposta
5 Sada
CONCLUSES
Joanisval Gonalves
BIBLIOGRAFIA
Na cabea,
Mo direita, apontada para
1 e 2 VV descobrindo-se para Na bainha.
baixo, afastada direita.
saudar o VM.
Na cabea,
descobrindo-se para
Irmos M:.M:. Na bainha. saudar o VM Na bainha.
(chapu na mo
direita).
Cabea descoberta
Irmos C:.M:.
Na bainha. (chapu na mo Na bainha.
e A:.M:.
direita)