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Uma Economia Circular No Brasil Uma Exploracao Inicial

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UMA

ECONOMIA
CIRCULAR NO
BRASIL:
Uma abordagem exploratória inicial

Produto da inteligência
coletiva dos membros da
rede CE100 Brasil

Janeiro de 2017

1
2
SOBRE A ELLEN MACARTHUR FOUNDATION E O
PROGRAMA CE100

A Ellen MacArthur Foundation trabalha com empresas, governos e academia


para construir um framework para uma economia que seja restaurativa e
regenerativa por princípio. Ela foi constituída em 2010, com o objetivo de
acelerar a transição para a economia circular.

Desde sua criação, a Fundação emergiu como uma líder global de


pensamento, inserindo a economia circular na agenda de tomadores de
decisão no mundo dos negócios, governo e academia. Seu trabalho se
concentra em cinco áreas interligadas: insight e análise, empresas e governos,
educação e treinamento, iniciativas sistêmicas e comunicação.

O Circular Economy 100 (CE100) é um programa de inovação no qual


concorrentes colaboram, concebido para possibilitar que organizações criem
novas oportunidades e realizem mais rapidamente suas ambições na economia
circular. O programa reúne grandes empresas, governos e cidades, instituições
acadêmicas, inovadores emergentes e afiliados em uma única plataforma multi
stakeholder. Elementos desenvolvidos especialmente para o programa CE100
ajudam os membros a aprender, desenvolver competências, formar redes e
colaborar com organizações chave em torno da economia circular.

SOBRE O PROGRAMA CE100 BRASIL

Lançado em outubro de 2015, o programa CE100 Brasil foi concebido


especialmente para organizações que tenham identificado oportunidades no
mercado brasileiro. O programa se desenvolve paralela e complementarmente
à rede global CE100. Ele oferece um programa de colaboração pré-
competitiva e inovação que reúne stakeholders chave de empresas, governos,
da academia e de organizações afiliadas para atuarem como um laboratório
vivo para a transição rumo à economia circular no Brasil. O programa CE100
Brasil possibilita às organizações membro desenvolver conhecimentos, superar
desafios e aproveitar oportunidades associadas às características únicas do
país.

3
REFLEXÕES A RESPEITO DA ECONOMIA CIRCULAR
NO BRASIL

“Precisamos reinventar a maneira como pensamos negócios. Evoluir de um modelo


de pensamento linear para sistêmico é fundamental para inovarmos rumo a
padrões de produção e consumo regenerativos. Só assim colocaremos os negócios
a serviço da geração de impacto social, ambiental e econômico positivos para a
sociedade.”
- Renata Puchala, Gerente Sênior de Sustentabilidade e Impacto Social
Estratégico, Natura

“Dentro do Grupo Tarkett estamos convencidos sobre a importância da economia


circular. Trata-se de um propósito que guia nossas decisões durante todos os dias.
Temos orgulho de trabalhar com a Ellen MacArthur Foundation na Europa, Estados
Unidos, e agora também no Brasil. Acreditamos que o CE 100 é uma poderosa
plataforma colaborativa para explorar novos modelos de negócio no Brasil e
desenvolver soluções criativas visando o crescimento sustentável. Além de trocar
experiências com empresas de outros setores, buscamos também dividir o nosso
conhecimento sobre economia circular, contribuindo para o desenvolvimento de
um novo modelo industrial.”
– Walter Gonçalves, Vice-presidente para a América Latina, Tarkett

“Economia Circular é um conceito abrangente, multidisciplinar e agregador. Os


esforços da sociedade para acelerar a transição irão envolver, necessariamente,
adaptações do conceito para a realidade de cada região, país ou município. Por
isso, a pesquisa foi fundamental para estabelecer os primeiros alicerces de uma
Economia Circular “tropicalizada”, uma transição à brasileira, que está sendo
construída coletivamente para um país com talento natural para a circularidade.”
– Luiz Ricardo Berezowski, Gerente Sênior da Unidade de Negócio Nat.Genius,
Embraco

“O caminho não é a conscientização universal, mas a criação de um novo


ecossistema industrial guiado por líderes com visão e capacidade de influenciar
mercados.”
– Carlos Ohde, Gerente Nacional, Sinctronics

4
“ Sabemos que organismos que apoiam a vida ao seu redor são mais resilientes e
mais sustentáveis ao longo do tempo. A prática da economia circular é crucial para
mantermos a geração de valor econômico sem necessitarmos aumentar a extração
de recursos naturais de nosso sistema. O Sistema B apoia integralmente a Ellen
MacArthur Foundation neste relevante estudo para a transição à um novo modelo
econômico, baseado nos princípios da interdependência, colaboração e baixa
emissão de carbono.”
– Tomás de Lara, Co-líder Sistema B Brasil

“Repensar o uso de materiais, respeitando os limites físicos do planeta, é


fundamental para desenvolvermos uma economia regenerativa e restaurativa.
E as empresas têm um papel fundamental na economia circular, seja a partir de
mudanças culturais e de processos internos, seja influenciando sua cadeia de
suprimentos. Dessa forma, otimiza-se a produção, a gestão do capital natural
existentes e a construção de um novo paradigma econômico”
– Marina Grossi, Presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o
Desenvolvimento Sustentável (CEBDS)

“A mudança de um modelo mental linear para um circular interfere em diversos


aspectos na forma como produzimos e consumimos em nossa sociedade.
O conceito de economia circular aponta para esta mudança, e pode trazer
oportunidades para a criação de novos empreendimentos e revisão dos modelos
de negócios atuais. A busca pela sustentabilidade econômica evidencia a
necessidade de criação de novas cadeias produtivas, que possam promover o
uso mais efetivo dos recursos em nossa sociedade, com o objetivo de eliminar
o conceito de resíduo desde o princípio e promover a qualidade de vida. Neste
sentido, é necessário revermos regulamentações, linhas de financiamento e
promovermos negócios mais restaurativos e regenerativos, para que o conceito de
economia circular possa sair do papel e virar realidade.”
– Shelley de Souza Carneiro, Gerente Executivo de Meio Ambiente e
Sustentabilidade, Confederação Nacional da Indústria (CNI)

5
INTRODUÇÃO

OBJETIVOS, ESCOPO E METODOLOGIA

Este estudo se propõe a apresentar uma introdução com a visão inicial de


atividades de economia circular já existentes no Brasil e identificar possíveis
oportunidades de dar escala a essas atividades.

O estudo se concentra em três setores importantes para a economia brasileira:


agricultura e ativos da biodiversidade, edifícios e construção e equipamentos
eletroeletrônicos. Além disso, inclui, em um apêndice de estudos de caso,
exemplos de empresas brasileiras operando modelos de negócio circulares.
Seu objetivo não é o de quantificar as possíveis oportunidades de negócio
em nível setorial e não há, no texto, qualquer análise macroeconômica da
economia brasileira. O ponto de partida do estudo são insights da Ellen
MacArthur Foundation. O trabalho se baseia na reunião de conclusões
extraídas de entrevistas aprofundadas com mais de 25 representante de
negócios, acadêmicos e formuladores de políticas no Brasil que estão
trabalhando nesse espaço e incorpora feedback da inteligência coletiva da
rede CE100 Brasil. O apêndice contém oito estudos de caso relatados para
respaldar este estudo.

Como um exercício exploratório, o estudo faz parte de um esforço


colaborativo de longo prazo empreendido pela rede CE100 Brasil visando à
exploração dos possíveis benefícios da aplicação dos princípios da economia
circular ao Brasil. O texto foi apresentado no 2° Workshop de Aceleração da
CE100 Brasil em outubro de 2016 e atualizado em janeiro de 2017, para refletir
associações com desdobramentos mais recentes das pesquisas da Ellen
MacArthur Foundation.

Nossa intenção com este trabalho é estimular a realização de pesquisas


adicionais sobre as oportunidades da economia circular no Brasil e oferecer
um ponto de partida útil para empresas, acadêmicos e formuladores de
políticas. Seja bem-vindo a este estudo exploratório!

6
AGRADECIMENTOS

Gostaríamos de agradecer às pessoas e organizações relacionadas abaixo, por


suas contribuições para o desenvolvimento deste trabalho.

Equipe de projeto
Luisa Santiago, Líder do Programa CE100 Brasil, Ellen MacArthur Foundation
Ashima Sukhdev, Líder do Programa de Governo & Cidades, Ellen MacArthur
Foundation
Victoria Almeida, Membro da Equipe de Projeto, Ellen MacArthur Foundation
Regi Magalhães, Consultor e Membro da Equipe de Projeto
François Souchet, Gerente de Projetos, Ellen MacArthur Foundation
Miranda Schnitger, Gerente de Projetos, Ellen MacArthur Foundation

Design gráfico
Sarah Churchill-Slough, Gerente de Design e Branding, Ellen MacArthur
Foundation
Rory Ian Waldegrave, Equipe de Design e Branding, Ellen MacArthur
Foundation

Texto
Ian Banks, Editor, Ellen MacArthur Foundation
Emma Parkin, Conker House Publishing Consultancy

Nosso agradecimento especial aos especialistas da academia, indústria e


agências de governo que forneceram valiosas perspectivas e expertise ao
longo do projeto.

Contribuintes às entrevistas com especialistas e estudos de caso


Abinee – Ademir Brescansin, Gerente de Sustentabilidade, e João Redondo,
Diretor de Sustentabilidade
Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) – Nilson Sarti, Presidente
da Comissão de Meio Ambiente
Cicla Brasil – Daniel Carvalho, Diretor Técnico, e Kellen Ribas, Diretora
Confederação Nacional das Indústrias (CNI) – Shelley de Souza Carneiro,
Gerente Executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade
Coca-Cola* – Thais Vojvodic, Gerente de Valor Compartilhado
Construcía – David Moura-George, Gerente Geral
Centro de Tecnologia de Edificações (CTE) – Daniel Ohnuma, Gerente de
Sustentabilidade
Deca/Duratex – Osvaldo Barbosa de Oliveira Junior, Engenharia de
Aplicações, e Erica Martins, Arquiteta

7
AGRADECIMENTOS (CONTINUAÇÃO)

Embraco/Nat.Genius* – Luiz Ricardo Berezowski, Gerente Sênior de Unidade


de Negócio
eStoks – Ricardo Salazar, CEO e cofundador
Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (FIRJAN) – Cristiane
Ramos Magalhaes, Analista Técnica Setorial
HP* – Kami Saidi, Diretor de Operações na América Latina e Suprimentos,
Rodrigo Rossi, Gerente de Operações, e Paloma Cavalcanti, Gerente Nacional
de Sustentabilidade
Imaflora – Mauricio Voivodic, Gerente de Projetos
MateriaBrasil* e Goma – Bruno Temer, Diretor de P&D e Sócio
Mercur – Jorge Hoelzel, Membro do Conselho
Native – Fernando Alonso, Gerente de Produtos Orgânicos
Natura* – Renata Puchala, Gerente Sênior de Sustentabilidade e Impacto
Social
Precon Engenharia – Marcelo Monteiro de Miranda, CEO, e Leonardo Couto,
Diretor de Desenvolvimento
Recicladora Urbana* – Ronaldo Stabile, Diretor Geral, e Luiz Carlos
Bertoncello, Gerente de Operações
Schneider Electric – Flavia Goldenberg, Gerente de Serviços de
Sustentabilidade
Sinctronics* – Carlos Ohde, Gerente Nacional, Brent Vickers, Gerente de
Programas Estratégicos, e Linda de Oliveira, Especialista em Comunicação e
Marketing
Grupo Tarkett * – Walter Gonçalves, Vice-presidente para a América Latina
Telefônica – Joao Francisco Linhares Zeni, Gerente de Sustentabilidade
Universidade de São Paulo – Ricardo Abramovay, Professor Titular
Vitacon – Danny Spiewak, Diretor de Operações
Votorantim Cimentos – Silvia Regina Soares da Silva Vieira, Gerente de P&D e
Qualidade
*Membro do programa CE100 Brasil

AVISO LEGAL

Este estudo é produto da expertise coletiva dos membros da rede CE100


Brasil, tendo sido redigido e coordenado por uma equipe da Ellen MacArthur
Foundation, e faz referência ao trabalho mais amplo de pesquisa da Fundação.
Embora os colaboradores mencionados nos agradecimentos tenham
participado significativamente do desenolvimento do estudo e dos estudos de
caso que o respaldam, a participação não implica endosso dos colaboradores
à íntegra do estudo e suas conclusões.

8
ÍNDICE:

SUMÁRIO EXECUTIVO

OPORTUNIDADES PARA O BRASIL: EXPLORANDO TRÊS


SETORES

AGRICULTURA E ATIVOS DA BIODIVERSIDADE

SETOR DE EDIFÍCIOS E CONSTRUÇÃO

EQUIPAMENTOS ELETROELETRÔNICOS

UM CHAMADO PARA PESQUISAS FUTURAS

9
SUMÁRIO EXECUTIVO

A economia circular está ganhando tração em nível global como alternativa


atraente à economia linear de extração, transformação e descarte, o que
oferece uma oportunidade para que a sociedade prospere ao mesmo tempo
em que reduz sua dependência de materiais finitos e fontes de energia não
renováveis. Uma pesquisa conjunta da Ellen MacArthur Foundation com o
McKinsey Centre for Business and the Enviroment e a SUN mostrou que,
com a adoção de princípios da economia circular, a Europa pode canalizar
a iminente revolução da tecnologia digital em um cenário de economia
circular para aumentar o PIB em € 1,8 trilhão até 2030.1 Uma análise similar,
também realizada pela Ellen MacArthur Foundation, indicou que, em 2050,
uma trajetória de desenvolvimento fundamentada na economia circular pode
proporcionar à Índia benefícios anuais de US$ 624 bilhões, o equivalente a
30% do atual PIB do país.2

Conclusões preliminares mostram que a transição para a economia


circular poderia gerar oportunidades de mais inovação e criação de valor
no Brasil. Com características mercadológicas e sociais únicas e capital
natural incomparável, o Brasil é um cenário atraente para a exploração de
oportunidades que a economia circular poderia trazer para a construção do
capital econômico, social e natural.

Uma economia circular é restaurativa e regenerativa por princípio. Seu


objetivo é manter produtos, componentes e materiais em seu mais alto nível
de utilidade e valor o tempo todo, distinguindo entre ciclos de materiais
técnicos e biológicos (veja a Figura 1). Essa abordagem busca, em última
instância, dissociar o desenvolvimento econômico do consumo de recursos
finitos e eliminar externalidades negativas da economia.

Os princípios por trás da economia circular não são completamente novos


no Brasil e começaram a surgir em bolsões de atividade em todas as regiões
do país. Empresas e outras organizações veem esses princípios como fatores
orientadores da inovação com potencial comprovado de criação de valor e
como uma oportunidade de se diferenciar no mercado, mesmo em tempos de
turbulência econômica e limitações orçamentárias.

1 Ellen MacArthur Foundation. ‘Growth Within: a circular economy vision for a competitive
Europe’, 2015
2 Ellen MacArthur Foundation. ‘Circular Economy in India: Rethinking Growth for Long-Term
Prosperity’, 2016

10
DEFINIÇõES DA ECONOMIA CIRCULAR
PRINCÍPIO

1
Preservar e aprimorar o capital Renováveis Materiais finitos
natural controlando estoques
finitos e equilibrando os fluxos
de recursos renováveis Regenerar Substituir materiais Virtualizar Restaurar
Alavancas ReSOLVE: regenerar,
virtualizar, trocar Gestão do fluxo de renováveis Gestão de estoques

CICLOS BIOLÓGICOS CICLOS TÉCNICOS

Agricultura/coleta1
Fabricante de peças

PRINCÍPIO Matérias-primas
bioquímicas Fabricante de
produtos Reciclar
Regeneração Biosfera
2
Otimizar o rendimento de
Prestador de
recursos fazendo circular Renovar/
serviços Compartilhar
produtos, componentes e
remanufaturar
materiais em uso no mais
alto nível de utilidade o
tempo todo, tanto no ciclo Reutilizar/redistribuir
técnico quanto no biológico.
Biogás Aproveitamento
Alavancas ReSOLVE: Manter/prolongar
em cascata
regenerar, compartilhar,
otimizar, promover a criação 6 2803 0006 9
FIGURA 1: DIAGRAMA DO SISTEMA DA ECONOMIA CIRCULAR

de circuitos Consumidor Usuário


Digestão
anaeróbica Coleta Coleta

Extração de
matérias-primas
bioquímicas2

PRINCÍPIO

Minimizar perdas
3
Estimular a efetividade sistêmicas e
do sistema revelando e externalidades
excluindo as externalidades negativas 1. Caça e pesca
negativas desde o princípio 2. Pode aproveitar tanto resíduos pós-colheita como pós-
Todas as alavancas consumo insumo
ReSOLVE
Fonte: Ellen MacArthur Foundation, SUN, and McKinsey Center
for Business and Environment; Drawing from Braungart &
McDonough, Cradle to Cradle (C2C).

11
OPORTUNIDADES PARA O BRASIL: EXPLORANDO TRÊS SETORES

Esta pesquisa identificou várias possíveis oportunidades de transição para a


economia circular em três setores de foco. Esses indicadores iniciais devem
ser compreendidos como áreas a serem mais exploradas por empresas,
instituições acadêmicas e formuladores de políticas.

Agricultura e ativos da biodiversidade


1. Ampliar esforços existentes em modelos de negócio regenerativos
em agricultura e ativos da biodiversidade. A aplicação de modelos
regenerativos na agricultura e em bioeconomias urbanas poderia restaurar
a grande reserva de capital natural do Brasil, aumentar a diversidade
biológica, fechar ciclos de nutrientes, aumentar o conteúdo nutricional
dos alimentos e, simultaneamente, aumentar a produção agrícola e sua
lucratividade.
2. Estimular o desenvolvimento do incipiente setor de biointeligência.
A combinação do grande capital natural e da diversidade social do
Brasil resultou na reunião de um amplo conhecimento sobre os ativos da
biodiversidade brasileira. Isso deve ser aproveitado para que o Brasil possa
aplicar essa biointeligência de forma mais ampla em seu território e em
cadeias de valor globais.
3. Alavancar a tecnologia digital para a destravar potencial de economia
circular na bioeconomia. É possível usar a tecnologia em cadeias
de suprimento digitalizadas para facilitar a troca de recursos e
conhecimentos, além de soluções de compartilhamento de ativos. Isso
aumenta a transparência nos mercados do setor e produz economias de
escala agrupadas para pequenos produtores rurais (sem que, para isso,
eles precisem dar escala às suas atividades).

Setor de edifícios e construção


4. Usar a lente da economia circular em investimentos em novos edifícios
para evitar entraves lineares. Isso representa uma chance de o Brasil
evitar ficar preso em um caminho de desenvolvimento linear no espaço
construído e transitar diretamente para uma economia circular, limitando
custos transacions que se apresentariam alternativamente.
5. Ampliar o acesso ao espaço construído ao aplicar princípios da
economia circular. Integrar conceitos como flexibilidade e modularidade,
mais eficiência no uso de recursos e redução do desperdício estrutural
poderia contribuir para reduzir os custos de edifícios habitacionais e
outros edifícios em toda a economia.
6. Canalizar a tecnologia digital e práticas inovadoras da economia circular
para criar mais valor no setor de edifícios e construção. Abordagens
de economia circular podem gerar modelos disruptivos e incentivar a
inovação abrindo novos horizontes para o desenvolvimento futuro do
setor.

12
Equipamentos eletroeletrônicos (EEE)
7. Aproveitar a dinâmica específica do mercado brasileiro de EEE para criar
novas oportunidades de negócio no contexto da economia circular. Essa
dinâmica de mercado inclui a proximidade entre mercados consumidores
em crescimento e centros de produção industrial, infraestrutura de ciclo
reverso já estabelecida e conhecimentos, habilidades e capacidade já
existentes.
8. Integrar a economia informal ao setor de EEE visando a uma colaboração
mutuamente vantajosa. Combinar o melhor de dois mundos: integrar a
eficiência e a capacidade operacional da indústria formal com a agilidade,
a escala e a capilaridade do setor informal.
9. Desenvolver novos modelos de negócio para ampliar o acesso e reduzir
os custos dos produtos do setor de EEE. Uma vez estabelecidas as
condições sistêmicas adequadas, modelos de negócio da economia
circular que promovam compartilhamento, modelos de serviços e produtos
recondicionados podem vir a oferecer aos usuários mercadorias de custo
mais acessível, com mais valor e mais modernos.
10. Criar mecanismos para influenciar processos de design. Uma abordagem
de baixo para cima na qual empresas brasileiras ofereçam feedback sobre
o processo de design de atores globais do setor de EEE pode ampliar os
conhecimentos gerados pelo mercado para aprimorar os processos de
design do setor.

13
AGRICULTURA E ATIVOS DA BIODIVERSIDADE

Ao longo das quatro últimas décadas, o Brasil deixou de ser um importador


de alimentos e se transformou em um dos maiores exportadores de alimentos
do mundo3. A economia brasileira hoje depende fortemente de dois de seus
mais importantes recursos renováveis: terra agriculturável e, mais amplamente,
biodiversidade.

O setor agropecuário (agricultura propriamente dita e pecuária) representa


22% do PIB do país4, sendo o único setor da economia brasileira que cresceu
em 20155. As cadeias de valor da agricultura global dependem fortemente
dos ecossistemas brasileiros – o país está entre os maiores produtores de
café, açúcar, cana-de-açúcar, etanol, suco de laranja e soja6. O setor também
é importante do ponto de vista social – 16,5 milhões de pessoas dependem
da agricultura para sobreviver. Do território brasileiro, 89% é coberto por
algum tipo de vegetação com diversos usos, de agricultura em larga escala a
florestas nativas.

O escopo deste estudo inclui a agricultura propriamente dita (excluindo,


portanto, a pecuária, que certamente merece ser pesquisada) e ativos da
biodiversidade (incluindo produtos não-madeireiros que fazem parte das
cadeias de valor de alimentos, bebidas, bioquímicas e cosméticos). Práticas
de produção agrícola urbana e biociclos urbanos não fazem parte do escopo
deste estudo. Contudo, pesquisas recentes demonstraram que a valorização
dos biociclos urbanos e a oportunidade de fechar ciclos de nutrientes nas
cidades e entre cidades e terras agriculturáveis pode apoiar a mudança rumo
à adoção de práticas regenerativas e restaurativas. O Fórum Econômico
Mundial estima que a receita global da cadeia de valor da biomassa –
incluindo insumos agrícolas, comércio de biomassa e produção de
biorrefinarias – poderá atingir US$ 295 bilhões até 2020.7

ATIVIDADE CIRCULAR EXISTENTE

Até hoje, a grande agricultura e a gestão florestal no Brasil têm sido, em


grande parte, dominadas por um modelo linear de produção. Contudo,
exemplos inovadores e promissores da transição para uma economia circular
estão surgindo e permeando o mercado. Algumas das tendências importantes
são:

3 The Economist, “The World’s Farm”, agosto de 2010. http://www.economist.com/


node/16913525
4 CEPEA/USP e CNA.
5 O setor agrícola cresceu 1,8% em 2015, quando os setores industrial e de serviços se retraíram
e o PIB brasileiro caiu 3,8%. IBGE. “Contas Nacionais Trimestrais”. Janeiro a março de 2016.
6 FAOSTAT. “Trade statistics”. 2013
7 World Economic Forum & Ellen MacArthur Foundation ”Project Mainstream Urban Biocycles”,
2017

14
Certificações ambientais estão sendo adotadas como uma primeira etapa
na transição para a economia circular. Como pré-requisitos de acesso ao
principal mercado internacional de commodities agrícolas8, estas certificações
têm atuado como um estímulo inicial para empresas se moverem em direção a
práticas agrícolas mais regenerativas. Por exemplo, a certificação “Roundtable
for Sustainable Palm Oil” (Mesa Redonda do Óleo de Palma Sustentável, em
tradução para o Português) requer práticas de manutenção da fertilidade
do solo (ou, onde possível, de melhoria da fertilidade do solo) a um nível
que garanta rendimento ótimo e sustentado, e mantenha a qualidade e a
disponibilidade de água superficial e de lençóis freáticos. O Imaflora (Instituto
de Manejo e de Certificação Florestal e Agrícola) tem visto estas certificações
cada vez mais como o início da jornada para produtores compreenderem a
importância de preservar e regenerar recursos naturais, na medida em que
começam a monitorar e medir, por exemplo, a produtividade do solo e o uso
de água.

Métodos regenerativos de cultivo estão começando a ser provados em


escala. Sistemas agrícolas regenerativos são desenhados para promover a
saúde do solo e regenerá-lo usando práticas como compostagem, rotação
de colheitas, cultivo de cobertura e do plantio direto. Em um sistema como
este, a integridade do sistema natural é preservada, materiais tóxicos não-
biodegradáveis são eliminados, e o vazamento de nutrientes é minimizado.
Por exemplo, o plantio direto é amplamente utilizado no Brasil – uma prática
na qual os resíduos agrícolas são deixados no solo, não se usa ferramentas
mecanizadas de preparo do solo, e ervas daninhas são controladas com
herbicidas não poluentes. Motivações para o uso deste método incluem
a redução de custos com ferramentas mecanizadas e insumos agrícolas
além de reduzida erosão do solo. De acordo com a Federação Brasileira de
Plantio Direto, em 2008 o Brasil tinha 62 milhões de acres de terra manejada
utilizando esta prática, representando 50% da terra cultivada naquele ano9.
Para um exemplo de práticas agrícolas regenerativas em larga escala, consulte
o estudo de caso da Native, no apêndice.

O processo de restauração de áreas degradadas está em curso. O governo


federal brasileiro está investindo na recuperação de 15 milhões de hectares
de áreas de pastagem degradadas com o objetivo de transformá-las em
novas áreas de plantio (de um total de 200 milhões de hectares de pastos
degradados)10. Pode-se entender a recuperação de áreas degradadas como
um forte estímulo à “transição” para a economia circular, considerando que,
uma vez recuperadas, as áreas devem ser mantidas mediante a aplicação de
práticas agrícolas regenerativas.

8 As commodities agrícolas aqui mencionadas incluem soja, algodão, cana-de-açúcar, etanol,


biodiesel, laranja, óleo de palma, café, cacau, madeira e carne bovina.
9 FEBRAPDP. http://febrapdp.org.br/area-de-pd
10 Ministério da Agricultura. http://www.agricultura.gov.br/desenvolvimento-sustentavel/
recuperacao-areas-degradadas

15
Produtores brasileiros estão extraindo valor adicional com o aproveitamento
em cascata de produtos agrícolas. O segmento de suco de laranja brasileiro
é um bom exemplo do aproveitamento em cascata de subprodutos e sua
destinação a outros usos. A Citrosuco, maior produtora de suco de laranja do
mundo, utiliza resíduos de polpa cítrica de seus processos produtivos como
ração animal que pode substituir o milho. Óleos essenciais obtidos através
da prensagem da casca da laranja pós-extração do suco são usados pelas
indústrias alimentícia, farmacêutica e química. O álcool obtido da fermentação
dos açúcares em resíduos de laranja também é usado como combustível e na
composição de bebidas e vinagre. 100% da laranja é aproveitada de alguma
forma.11

Empresas e comunidades tradicionais estão cooperando na valorização


de ativos da biodiversidade. Comunidades tradicionais detêm profundo
conhecimento sobre como valorizar ativos da biodiversidade e, ao mesmo
tempo, preservar o capital natural – uma habilidade que as empresas
podem aproveitar e integrar às suas práticas (consulte o estudo de caso da
Natura, no apêndice). Em 2016, o Imaflora e o Instituto Socioambiental (ISA)
criaram o Origens Brasil, um projeto com o objetivo de formar vínculos entre
comunidades tradicionais e grandes empresas. A rede de supermercados Pão
de Açúcar, a marca de pães Wickbold e a Mercur, fabricante de produtos de
consumo, foram as primeiras empresas a participar do projeto, comprando
mel, nozes, borracha e resina de óleo de copaíba artesanal de comunidades
tradicionais e povos indígenas12. As relações comerciais entre as empresas
e comunidades fundamentam-se na transparência, no uso responsável de
recursos e no respeito à diversidade e ao estilo de vida das comunidades
tradicionais.

O setor está começando a aplicar novas tecnologias. A tecnologia da


informação e a automação estão exercendo forte impacto positivo sobre as
práticas agrícolas, possibilitando a agricultura de precisão – uma abordagem
da produção que emprega TI, big data, sensoriamento remoto e dados de
posicionamento via satélite. Essas tecnologias estão facilitando a adoção de
práticas agrícolas eficientes e aumentando a eficiência do consumo de água,
fertilizantes e pesticidas nas propriedades rurais. O papel que a tecnologia
pode desempenhar em outros aspectos da agricultura também está evoluindo
em bolsões do setor. Um exemplo é a promoção, por organizações, do uso da
tecnologia da informação por pequenos produtores, o que facilita seu acesso
a informações de mercado e técnicas.

11 http://www.citrosuco.com.br/en/
12 Valor International. “Amazon products gain‘certificate of origin’”. Março de 2016. http://www.
valor. com.br/international/news/4486936/amazon-products-gain-certificate-origin

16
OPORTUNIDADES FUTURAS PARA O BRASIL

Para avançar a partir do progresso já realizado, esta pesquisa identificou três


oportunidades chave para exploração adicional.
1. Ampliar esforços atuais em modelos de negócio regenerativos no
setor agrícola e de ativos da biodiversidade. A aplicação da agricultura
regenerativa em larga escala poderia restaurar a grande reserva de
capital natural do Brasil, aumentar a diversidade biológica, fechar
ciclos de nutrientes, aumentar o conteúdo nutricional dos alimentos e
proporcionar economia de água – tudo isso enquanto aumenta a produção
agrícola e sua lucratividade. Essas práticas poderiam reduzir os custos
dos recursos utilizados para criar vantagens em relação aos métodos
agrícolas convencionais. A obtenção de escala exigirá a ampliação do
acesso a recursos financeiros de longo prazo, tanto em grandes operações
quanto em pequenas propriedades rurais, por meio de novos veículos
de financiamento e mais informação sobre retornos de longo prazo e
riscos dos sistemas regenerativos comparativamente aos dos sistemas
convencionais. Também demandará a disseminação de conhecimentos
para os produtores rurais do país inteiro para a divulgação dos benefícios
das abordagens regenerativas, além de informações detalhadas sobre sua
implementação em nível local. Outra exigência é uma ligação forte com
centros urbanos na medida em que as cidades empreenderem esforços
para recuperar o lixo orgânico urbano e adotarem estratégias para
valorizá-lo. Esse processo de captura do valor da bioeconomia urbana
pode fechar o ciclo de nutrientes devolvendo-os ao solo.13

2. Estimular o desenvolvimento do incipiente setor de biointeligência. A


combinação do grande capital natural e da diversidade social do Brasil,
que conta com diversas comunidades tradicionais (como as indígenas,
caiçaras, de seringueiros e quilombolas), resultou na reunião de um
amplo conhecimento sobre os ativos da biodiversidade brasileira. Esse
conhecimento mostra como gerar lucros com esses ativos de uma maneira
regenerativa (ou seja, como extrair valor não só evitando o esgotamento
dos ativos naturais e ecossistemas, mas também regenerando-os). O
conhecimento das comunidades tradicionais e outros precursores que
desenvolveram modelos regenerativos na agricultura e no uso dos ativos
da biodiversidade deve ser aproveitado para que o Brasil possa aplicar
essa biointeligência de forma mais ampla em seu território e em cadeias
de valor globais. Trata-se de uma área na qual o Brasil pode usar seus
conhecimentos especializados, conjuntamente com sua proeminência
como ator global no setor14, para alterar e influenciar sistemas globais de
produção. Isso também mudaria impressões sobre o país como exportador
de commodities agrícolas e matérias-primas biológicas, colocando-o na

13 World Economic Forum & Ellen MacArthur Foundation “Project Mainstream Urban Biocycles”,
2017
14 O país é o maior exportador de cinco commodities agrícolas negociadas internacionalmente e
o segundo maior em soja e milho. The Economist, “The World’s Farm”, agosto de 2010. http://
www. economist.com/node/

17
vanguarda da inovação e experimentação nessa área, compartilhando e
exportando seu conhecimento para o mundo. Além disso, os exemplos
estudados mencionam práticas que asseguram uma distribuição mais justa
dos benefícios ao longo das cadeias de valor, reconhecendo o papel das
comunidades tradicionais.

3. Alavancar a tecnologia digital para destravar potencial de economia


circular na bioeconomia. Ao aproveitar o conhecimento acumulado em
séculos de entendimento dos ecossistemas naturais, o Brasil também
pode alavancar desdobramentos tecnológicos para criar um setor
agrícola e de ativos da biodiversidade mais eficaz. A tecnologia pode ser
utilizada em cadeias de suprimento digitalizadas, possibilitando a troca
de conhecimentos e o surgimento de soluções de compartilhamento de
ativos, aumentando a transparência nos mercados do setor e produzindo
economias de escala agrupadas para pequenos produtores rurais (sem
que, para isso, eles precisem dar escala às suas atividades), além de
ganhos de eficiência. Esses fatores continuarão a possibilitar a otimização
do sistema como um todo e o aumento da produção agrícola.

BARREIRAS

Diversas partes do setor agrícola arável estão progredindo na adoção de


práticas regenerativas, mas ainda há barreiras à implantação de tais práticas
no setor como um todo e à passagem dos precursores para o próximo nível
de sofisticação dos sistemas agrícolas regenerativos. As barreiras identificadas
em entrevistas com atores desse espaço incluem dificuldade de transferência
de novos conhecimentos e habilidades através do setor, acesso a crédito para
a adoção de novos modelos regenerativos – o que é especialmente relevante
ao se considerar que o retorno do investimento ocorre em prazo muito
mais longo na agricultura regenerativa – e necessidade de plataformas para
facilitar investimentos em grupo, compartilhamento de ativos, distribuição de
subprodutos etc. para pequenos produtores (que representam 84% do número
total de unidades rurais produtivas)15.

15 IBGE. Agricultura Familiar. 2006

18
SETOR DE EDIFÍCIOS E CONSTRUÇÃO

Após rápido crescimento dos novos empreendimentos imobiliários na


primeira década deste século, o setor de construção vem apresentando níveis
reduzidos de atividade e de investimentos desde 201216.

O setor contribui com 7% na composição do PIB e representa 9% do mercado


de trabalho brasileiro17.Como ocorre em outros países, o setor de construção
brasileiro atualmente se baseia em grande parte no modelo linear, com nível
significativo de perdas estruturais. Atividades de demolição e construção
produzem de 50% a 70% do lixo encaminhado para aterros sanitários nas
cidades brasileiras, a um custo cada vez mais alto para os governos municipais
e as próprias construtoras18.

Como 85% da população do país atualmente se concentra em áreas urbanas,


um índice que deve atingir 91% até 2050, é importante que as cidades
desempenhem papel central nas vias de desenvolvimento econômico. Estima-
se que 20% dos brasileiros hoje moram em favelas ou em moradias informais
voltadas para a população de baixa renda. Além disso, muitos edifícios
industriais e de escritórios em regiões metropolitanas estão vazios, tendo
sido abandonados e vandalizados, e diversas áreas urbanas precisam de
revitalização e requalificação. De acordo com a UN Habitat, em 2008 o déficit
habitacional brasileiro correspondia a 10% do estoque de edifícios do mercado
e o número de unidades atingia percentual quase equivalente19.

A pesquisa se concentra em edifícios, sua construção, adaptação e uso. A


infraestrutura (estradas, pontes, túneis, abastecimento de água etc.) não
está incluída nesta abordagem exploratória inicial de atividades circulares e
oportunidades no ambiente construído, embora insights encontrados neste
estudo possam inspirar a inovação no setor inteiro.

Os princípios da economia circular, tal qual aplicados no setor de edifícios


e construção, incorporam todos os aspectos da criação de um edifício.
Entre eles, estão um projeto que leve em conta aspectos de modularidade
e flexibilidade, o suprimento de materiais eficazes, processos construtivos
eficientes, o compartilhamento de espaço e a operação eficaz dos edifícios,
incluindo onde serviços de edificação e a infraestrutura do entorno podem ser
projetados para apoiar a recuperação de resíduos orgânicos e não orgânicos e,
por fim, reforma, requalificação e desmontagem de edifícios. Para obter mais
informações e um framework abrangente para a economia circular no setor de
edifícios e construção, consulte o relatório “The Circular Economy in the Built

16 CBIC e CNI. “Sondagem Indústria da Construção”. Agosto de 2016.


17 IBGE. “Pesquisa Anual da Indústria da Construção”. 2013.
18 Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. “Diagnóstico dos Resíduos Sólidos da Construção
Civil”. 2012.
19 UN Habitat. “Scaling Up Affordable Housing Supply in Brazil”. 2013.

19
Environment” (2016), da Arup, Parceira de Conhecimento da Ellen MacArthur
Foundation.

ATIVIDADE CIRCULAR EXISTENTE

Embora o setor convencional de edifícios e construção no Brasil siga um


modelo linear de desenvolvimento, outra camada das empresas brasileiras
está começando a inovar em torno de temas da economia circular.

Considerações sobre projetos circulares começam a surgir no setor de


edifícios e construção. A Nossa Casa Planejada, uma start-up do estado do
Tocantins, desenvolveu uma tecnologia de recuperação de materiais a partir
de resíduos de construção e mineração para produzir blocos modulares
que, funcionando como grandes peças de lego, possibilitam a construção
de edifícios modulares a baixo custo. Sua estratégia de suprimento elimina
a necessidade de uso de cimento e, devido à estrutura modular, os edifícios
podem ser reformados e reconstruídos sob demanda. Projetar para a
modularidade e flexibilidade não é uma prática comum, mas começam a
surgir exemplos, como se viu em alguns locais dos Jogos Olímpicos do Rio de
Janeiro de 2016 (como a Arena do Futuro e o Estádio Aquático Olímpico), com
estruturas que poderiam ser removidas, reconstruídas ou redirecionadas20.

Práticas de construção circulares têm benefícios comprovados em casos


inovadores. Na fase de construção, a aplicação de metodologias lean e
abordagens industriais inovadoras para edifícios está revolucionando o setor.
A Precon Engenharia, fornecedora de pré-fabricados de concreto, criou
uma unidade de pré-fabricação que produz peças para a montagem de
edifícios. A empresa reduziu o tempo de construção à metade e eliminou 90%
dos resíduos do processo, comparativamente aos métodos de construção
tradicionais (consulte o estudo de caso da Precon Engenharia no apêndice).
No segmento de interiores, a Tarkett, líder mundial em pisos vinílicos e
superfícies para a prática de esportes, está introduzindo o design circular no
centro de sua estratégia global, com foco em princípios de ciclos fechados
e no design Cradle to Cradle® (consulte o estudo de caso da Tarkett no
apêndice).

Inovações importantes na fase de uso estão aumentando a utilização de


edifícios e destravando benefícios em espaços urbanos. O surgimento de
espaços de co-working e casas colaborativas em cidades brasileiras está
criando novas formas de utilização do espaço no ambiente urbano. Para
mencionar dois exemplos, na antiga área do Rio de Janeiro, a Goma, um
ecossistema de empresas e empreendedores, ocupa edifícios que estavam
abandonados e degradados. A Goma não só revitalizou esses prédios

20 Wired. “After the Games, Rio’s Stadiums Won’t Rot – They’ll Transform”, agosto de 2016.
https:// www.wired.com/2016/08/games-rios-stadiums-wont-rot-theyll-transform/

20
conforme princípios da economia circular no que diz respeito ao uso de
recursos e integração ao ambiente natural da cidade, mas também criou
uma atmosfera vibrante que revigorou a região. Em São Paulo, um mapa
colaborativo criado pela prefeitura a partir da ideia de “função social da
prosperidade urbana” 21 obtém, por meio de crowdsourcing, informações
da população sobre edifícios não utilizados, de modo que a cidade possa
começar a usá-los para fins que beneficiem a sociedade.

Formuladores de políticas e empresas estão reconhecendo a necessidade


de integrar sistemas urbanos. Por exemplo, a Vitacon, uma incorporadora
imobiliária brasileira, está lançando prédios residenciais com uma nova
proposta de valor: apartamentos pequenos projetados para integrar o espaço
residencial à mobilidade urbana. A Vitacon oferece planos de locação de
automóveis, motocicletas e bicicletas compartilhados para os residentes de
alguns de seus edifícios residenciais em São Paulo. Alguns prédios também
contam com serviços compartilhados, como áreas de co-working, lavanderia,
serviços de limpeza, espaço para ferramentas e armazenamento. Em São
Gonçalo do Amarante (CE), a Planet Idea, uma start-up italiana, está criando
a primeira “social smart city” do Brasil. A empresa está criando espaços
integrados com indústrias, residências e serviços de alta qualidade a baixo
custo. Neles, a tecnologia digital possibilita o compartilhamento de recursos
de mobilidade e outros serviços. Esses modelos geraram valor econômico
utilizando modelos de compartilhamento e proporcionando melhor qualidade
de vidas para comunidades de áreas que, tempos atrás, se ressentiam da falta
de atendimento de necessidades básicas.

OPORTUNIDADES FUTURAS PARA O BRASIL

Para aproveitar o progresso que já foi feito e superar as barreiras à adoção


de princípios da economia circular no setor de edifícios e construção, esta
pesquisa identificou três oportunidades chave a serem exploradas em maior
profundidade.

1. Utilizar princípios circulares em novos empreendimentos para evitar


entraves lineares. Com crescente urbanização e significativos níveis
esperados de investimento em imóveis e infraestrutura nos próximos 10-
15 anos, esta é uma chance de o Brasil evitar ficar preso em um caminho
linear de desenvolvimento, e transitar diretamente a uma economia
circular, limitando os custos transacionais que se apresentariam em um
desenvolvimento linear do setor. Será cada vez mais importante assumir
uma visão sistêmica em relação ao desenvolvimento urbano, explorando a

21 O projeto se baseia no fato definido na regulação de que um imóvel só cumpre sua função
social se o seu uso e ocupação, conforme determinados pelo proprietários, se orientarem
para os interesses (econômicos, sociais, ambientais, urbanísticos) da comunidade. Mais
informações: http:// mapacolaborativo.gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/funcao-social/

21
forma com que o espaço construído e a infraestrutura crescem em paralelo
a e se integram com outros sistemas urbanos tais como a bioeconomia, a
alimentação e a mobilidade.

2. Aumentar a acessibilidade no espaço construído através da aplicação


dos princípios da economia circular. Os princípios centrais da economia
circular podem resultar em um espaço construído que melhor atenda
às necessidades do cidadão e do usuário. Integrando conceitos como
flexibilidade e modularidade a moradias poderia torná-las mais acessíveis
para usuários e mais responsivas e adaptáveis às suas necessidades.
Maior eficiência de recursos (especialmente com o desenvolvimento, por
empresas e pesquisadores, de novas tecnologias que reduzam os custos,
tempo e materiais envolvidos na construção) e redução drástica de perdas
estruturais na economia (através da maior utilização de ativos) também
poderia contribuir para o aumento da acessibilidade de moradias e outras
construções na economia. Estas oportunidades podem ser especialmente
importantes para a população de baixa renda no Brasil, mas se aplica a
todos os cidadãos.

3. Alavancar as tecnologias digitais e inovar em práticas circulares para


gerar novos valores em edifícios e construções. Abordagens de economia
circular podem gerar modelos disruptivos e incentivar a inovação
abrindo novos horizontes para o desenvolvimento futuro do setor. Isto
inclui soluções digitais de compartilhamento e integração com sistemas
urbanos, inovação em materiais e no design para a modularidade, reuso
e flexibilidade e o uso de tecnologias como a impressão 3D. Pequenas
e médias empresas estão aproveitando os benefícios de aplicar tais
princípios e estão enxergando as vantagens de negócio.

BARREIRAS

Entrevistas com participantes dessas iniciativas geraram uma amostra inicial


de barreiras para a captura e escalada das oportunidades identificadas que
é altamente aplicável ao setor de edifícios e construção globalmente. Elas
incluem fatores sistêmicos que limitam a inovação em ciclos de negócios
de longo prazo, como a instabilidade econômica e a inércia destes setores
em adotar novas tecnologias. Barreiras específicas ao cenário econômico
brasileiro são campo e oportunidade de análise em pesquisas futuras.

22
EQUIPAMENTOS ELETROELETRÔNICOS (EEE)

O setor de EEE no Brasil abrange os mercados de produção, consumo e


pós-uso, diferentemente do que ocorre na Europa e nos EUA, onde a maior
parte dos mercados se volta para a importação de bens de consumo. O setor
de EEE tem alto valor agregado, sendo um dos setores mais inovadores da
economia brasileira. Ele abrange diferentes segmentos, como o de linha
branca (refrigeradores e a maior parte de utensílios de cozinha), o de linha
verde (dispositivos de informática e telecomunicações), o de linha marrom
(equipamentos de áudio e vídeo) e o de linha azul (eletrodomésticos portáteis
e ferramentas elétricas). Embora uma série de produtos seja inteiramente
fabricada no país, como é o caso de produtos da linha branca, outros,
como equipamentos de TI, são montados a partir de peças e componentes
importados, sendo que o design pertence a marcas originárias de outros
países22.

O boom do consumo de EEE no Brasil, em grande parte estimulado por


incentivos fiscais e de crédito nas últimas décadas23, aumentou a linearidade
do setor, como fica evidente no crescimento significativo de resíduos
eletrônicos no país. De acordo com uma pesquisa realizada pela United
Nations University24, 2 milhões de toneladas de EEE foram introduzidos
no mercado brasileiro em 2012, gerando 1,4 milhão de toneladas de lixo
eletrônico, o equivalente a 7 kg por pessoa. Isso faz do Brasil o segundo maior
gerador desse tipo de resíduo do mundo, só ficando atrás dos EUA. Apenas
cerca de 2% desse lixo gerado anualmente é reprocessado e valorizado
de algum modo25. Mesmo quando esses materiais são reintroduzidos em
cadeias de valor formal, materiais de alto valor, como metais preciosos e
semipreciosos que integram placas de produtos eletrônicos, escapam26
do mercado brasileiro, e a maior parte dele embarca para o exterior para
reciclagem industrial, enquanto as cadeias de reciclagem nacionais só
recebem materiais de menor valor, como plásticos.

O setor informal historicamente desenvolveu um número de iniciativas que


aplicam princípios de circularidade, através de mercados de reparo, reforma,
venda de produtos secundários e cadeias de reciclagem, sempre incorporados
de um forte fator social que movimenta essas atividades. Enquanto a

22 Por meio de contratos de terceirização da manufatura (entre marcas e fornecedores)


23 A Lei do Bem, de 2005, oferece incentivos fiscais para produtos com carga de inovação
tecnológica fabricados no Brasil. Trata-se de um incentivo fiscal para a indústria que reduz o
preço dos EEE para os consumidores. Além disso, a isenção de impostos sobre a importação
de EEE em vigor a partir de 2013, em conjunto a incentivos ao crédito ao consumidor,
aumentou significativamente o consumo de EEE no Brasil.
24 United Nations University. “The global e-waste monitor 2014: quantities, flows and resources”.
2015.
25 UNEP
26 Fugas de materiais retomam o valor dos materiais perdidos no sistema. Os modelos lineares
são permeados por desperdício estrutural e representam perdas econômicas, além de
externalidades ambientais possivelmente negativas.

23
informalidade é responsável pela recuperação de um grande volume
de equipamentos, partes e componentes, o setor sofre com vazamento
significativo de materiais já que essas atividades aplicam processos que fogem
aos padrões de qualidade da indústria para se manterem em novos ciclos de
uso. Um fator crítico é o design de produtos. Atualmente os designers tendem
a priorizar a otimização de produtos para a fase de uso. Porém, consideram
em muito menor grau a facilidade de desmontagem do produto após o uso
para recuperação de valor. Integrar o pensamento circular à fase de design
de equipamentos eletroeletrônicos pode contribuir significativamente para a
recuperação de valor e manter nutrientes técnicos em circulação em seu mais
alto valor possível. O recém-lançado Circular Design Guide (Guia do design
circular)27 oferece ferramentas de apoio a soluções criativas para a economia
circular.

Aplicar princípios da economia circular ao setor de EEE envolve o uso de


ciclos técnicos, ilustrados no diagrama tipo borboleta na Figura 1, cujo objetivo
é manter materiais, componentes e produtos em circulação em seu mais alto
valor e nível de utilidade o tempo todo. Outra área crescente de pesquisa e
inovação envolve o reconhecimento, valorização e recuperação da energia
incorporada em produtos industriais.28

ATIVIDADE CIRCULAR EXISTENTE

Nós últimos anos, inovadores incumbentes da indústria e alguns inovadores


emergentes vêm inovando em torno de modelos de negócio circulares para
capturar o valor perdido no setor de EEE. Um importante impulsionador desta
mudança tem sido a Política Nacional de Resíduos Sólidos, que aponta para a
aplicação de alguns princípios da economia circular no setor.

Certificações internacionais promovem ‘design para o meio ambiente’


e definem regras para a indústria no Brasil. As certificações Electronic
Product Environmental Assessment Tool (EPEAT) e Restriction of Hazardous
Substances (RoHS) são normas de mercado para qualquer empresa do setor
de EEE. A EPEAT trata de critérios ambientais ao longo de todo o ciclo de
vida dos produtos, incluindo design, produção, uso de energia e reciclagem,
e a RoHS especifica níveis máximos de substâncias perigosas sujeitas a
restrições. Grandes empresas que atuam no Brasil exigem essas certificações
ao comprar equipamentos eletroeletrônicos. Embora essas certificações levem
em conta aspectos da desmontagem e da escolha de materiais, seu escopo
ainda é limitado e não abrange todos os aspectos do design para a economia
circular.

Empresas que estão se movendo em direção aos ciclos internos estão

27 Circular Design Guide: uma publicasign GuEllen MacArthur Foundation em colaboraoão com a
IDEO, www.circulardesignguide.com
28 REMADE Institute www.rit.edu/remade/

24
capturando mais valor. Como tem se evidenciado em pesquisas da Ellen
MacArthur Foundation, iniciativas de reciclagem mais focadas nos ciclos
externos da criação de valor (veja a Figura 1) são as menos eficazes na
retenção da utilidade, do valor e da lucratividade dos materiais, componentes
e produtos. Inovadores precoces da circularidade no setor de EEE brasileiro
têm se movido em direção aos ciclos internos, que se orientam por modelos
de negócio em remanufatura, reforma e reutilização. A Recicladora Urbana,
uma pequena empresa com unidade industrial em Jacareí (SP), é um exemplo
claro disso: o valor gerado a partir de sua atuação no segmento de reforma
é aproximadamente 10 vezes maior do que o proveniente da reciclagem
(consulte o estudo de caso no apêndice). Outro exemplo inovador: a eStoks,
start-up constituída em 2015, está desenvolvendo um modelo de negócio para
capturar valor dos resíduos pré-consumo (equipamentos que nunca entraram
no mercado ou são recolhidos do mercado de consumo praticamente
sem ter sido usados). A eStoks otimiza a logística de coleta e recuperação
aproveitando a concentração de unidades produtivas de EEE nas regiões
sul e central do Brasil. Então, a empresa aplica um algoritmo para analisar a
condição do equipamento para redirecioná-lo aos mercados secundários por
50% a 70% do preço do produto novo.

A regulação foi um dos fatores que possibilitaram muitas dessas atividades.


Por exemplo, a Sinctronics (unidade de negócio da Flex, fabricante de
produtos eletrônicos com atuação global) foi criada em resposta à Política
Nacional de Resíduos Sólidos, que determina que as empresas descartem
equipamentos eletrônicos adequadamente ao fim de sua vida útil. A
Sinctronics oferece uma solução atraente para essas empresas (consulte o
estudo de caso no apêndice).

Alguma capacidade e infraestrutura para ciclos reversos já existe. Isso


se deve a dois principais tipos de atores do mercado: os informais, que
são dominantes e operam a maior parte das cadeias de logística reversa e
operações de reciclagem de materiais eletrônicos, e atores do setor que se
estabeleceram nos últimos anos, em parte estimulados (ou possibilitados)
pela regulação. Esse último grupo inclui a Sinctronics, uma nova empresa
criada a partir de uma parceria entre a HP e a fabricante Flex para inovar no
mercado de pós-uso de EEE (consulte o estudo de caso no apêndice) e a Nat.
Genius, nova unidade de negócio da Embraco, empresa brasileira que fabrica
compressores, com foco na remanufatura de EEE (consulte o estudo de caso
no apêndice).

Atores informais têm conseguido coletar volumes significativos de materiais


e competir no mercado com preços mais baixos. Para as empresas formais, a
logística reversa, que implica custos de transporte e impostos pagos na coleta
das mercadorias, representa a maior parte dos custos de reciclagem.
Uma análise do Banco Mundial29 mostrou que os fatores mais importantes para
o sucesso na gestão da logística reversa no setor são atingir escala, maximizar

29 World Bank. “Wasting No Opportunity: The case for managing Brazil’s electronic waste”. 2012.

25
volume e minimizar os custos, particularmente os de transporte.
No Brasil, modelos bem-sucedidos estão surgindo a partir de novas formas
de colaboração entre grandes atores da indústria, que operam com altos
padrões de qualidade, e organizações (antes) informais, que são responsáveis
por grandes fluxos de materiais e pela oferta de capacidade e infraestrutura.
O envolvimento de outros stakeholders, como a academia e as ONGs, pode
ajudar a estabelecer as condições viabilizadoras necessárias para o aumento
da capacidade de processamento e a formalização do mercado. Em abril de
2016, a Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica) e
seus 48 membros criaram uma organização dedicada à gestão de logística
reversa para as empresas do setor, a Green Eletron. O objetivo da organização
é ajudar a identificar e administrar as organizações responsáveis por logística
reversa no setor. Sistemas produto-serviço estão crescendo em mercados B2B
e surgindo em mercados B2C. Grandes corporações já prestam serviços de
impressão, TI, iluminação e condicionamento de ar com base em modelos de
desempenho, como contratos de arrendamento ou locação. Esses modelos de
pagamento por uso criam interações comerciais de mais longo prazo, reduzem
o nível de investimento inicial dos usuários e melhora os fluxos de caixa dos
prestadores de serviços. Por exemplo, o pacote de serviços gerenciados da
HP Brasil inclui serviços de TI. Esse modelo de desempenho otimiza o ciclo de
vida da tecnologia, reduz o risco de volumes desnecessários de serviços, reduz
os custos de compra e oferece um prazo mais flexível para o investimento
(consulte o estudo de caso no apêndice.) Modelos de desempenho ou de uso
ainda são novos nos mercados B2C, embora já haja iniciativas voltadas para
dispositivos móveis e domésticos. Um exemplo de modelo de desempenho
B2C que está sendo aplicado com sucesso no Brasil é o da Whirlpool,
fabricante de eletrodomésticos que oferece filtros de água como um serviço,
com manutenção e garantia vitalícia, retendo a propriedade dos filtros.

OPORTUNIDADES FUTURAS PARA O BRASIL


Para avançar a partir do progresso já feito e superar as barreiras à adoção
mais ampla de princípios da economia circular no setor de EEE, esta
pesquisa identificou três oportunidades chave a serem exploradas em maior
profundidade.

1. Alavancar as dinâmicas específicas ao mercado de EEE no Brasil


para criar novas oportunidades de negócio. No Brasil, a proximidade
de mercados de consumo crescentes e centros de manufatura podem
suportar modelos de negócio de remanufatura e reforma. Em segmentos
que operam como grandes linhas de montagem, alavancar a capacidade
instalada da indústria poderia criar um mercado de remontagem com
partes e componentes secundários, mantidos em altos padrões de
qualidade, alimentando modelos de remanufatura e remodelagem. Isto
seria viabilizado com capacidades de ciclos reversos e novas formas de
colaboração nas cadeias de valor.

2. Integrar a economia informal ao setor de EEE em uma colaboração


mutuamente vantajosa. Capacidade e infraestrutura de ciclo reverso
existentes poderiam ser melhoradas para recuperar valor adicional de

26
produtos, componentes e materiais. Formas estruturadas de formalização
dos stakeholders atualmente atuando na informalidade poderiam destravar
maiores volumes de materiais com maior padrão de qualidade que estão
atualmente vazando do sistema, e ao mesmo tempo promover inclusão
social. Colaboração multi setorial pode viabilizar que estas organizações
atendam a padrões e regras de qualidade e construam a apropriada
capacidade resultando, em consequência, em melhor restauração dos
fluxos materiais no setor. Trata-se de uma oportunidade de unir o melhor
de dois mundos: integrando a eficiência e a capacidade operacional da
indústria formal com a agilidade, volume e capilaridade do setor informal.

3. Desenvolver novos modelos de negócio para aumentar o acesso a


produtos EEE. Com as condições sistêmicas adequadas, modelos de
negócio de economia circular que promovam o compartilhamento,
modelos de produtos como serviço e produtos reformados podem
oferecer produtos mais acessíveis, de mais alto valor e mais atualizados
para os usuários, e ao mesmo tempo criar novas oportunidades de negócio
para prestadores de serviço. A economia circular também promove
produtos EEE que são projetados para durabilidade, desmontagem e
reuso e que superam a obsolescência prematura. Todos esses atributos
reduzirão o custo total da propriedade e entregarão maior conveniência
aos clientes já que evitariam o incômodo associado a  organização de
reparos e devoluções. Esta oportunidade é especialmente importante para
a população de baixa renda no Brasil, mas se aplica a todos os clientes.

4. Criar mecanismos para influenciar processos de design. Empresas


brasileiras que são bem informadas a respeito de processos de
desmontagem e coleta para o setor de EEE, como o Sinctronics, o Nat.
Genius e a Recicladora Urbana, poderiam oferecer tecnologia, informação
e conhecimento necessários para melhorar o design dos produtos e torná-
los mais fáceis de desmontar, reformar e remanufaturar. Uma abordagem
de baixo para cima, onde empresas brasileiras oferecem feedback para o
processo de design de atores globais de EEE, alavancando conhecimento
gerado no mercado para melhorar processos de design no setor.

BARREIRAS

Diversas partes do setor de EEE brasileiro estão progredindo na adoção de


práticas da economia circular, mas ainda há barreiras à obtenção de escala
para os precursores. Entrevistas com organizações que atuam nesse espaço
nos proporcionaram uma amostra inicial de barreiras ao aproveitamento e
expansão dessas oportunidades. Elas incluem políticas fiscais que incentivam
modelos da economia linear, a falta de mecanismos para aumentar a
formalização e a colaboração entre setores e organizações com atuação
informal nos ciclos reversos e questões relacionadas a propriedade intelectual
para novos modelos de negócio circulares.

27
UM CHAMADO PARA PESQUISAS FUTURAS

O Brasil está em um momento crucial de sua história econômica, diante


da oportunidade de desenvolver um novo modelo econômico que ofereça
prosperidade a seus cidadãos e funcione bem no longo prazo.

Embora forneça alguns insights iniciais a respeito das oportunidades da


economia circular em três setores chave da economia brasileira, esta pesquisa
não pretende quantificar benefícios em nível setorial nem analisar possíveis
ganhos para a economia como um todo. No entanto, como já observado,
pesquisas macroeconômicas anteriores realizadas em outros países indicaram
que a aplicação de princípios da economia circular beneficia o PIB e o nível
de emprego em geral. Além de oportunidades de criação de valor puramente
econômico, outro aspecto relevante é sua contribuição para o aumento da
resiliência socioeconômica.

Certas oportunidades, assim como certos desafios, são comuns a todas as


economias, como, por exemplo, a importância da alavancagem da tecnologia
digital para o aproveitamento de oportunidades da economia circular.
Contudo, em países como o Brasil, esse papel da tecnologia e das soluções
digitais é especialmente relevante, pois seus custos marginais podem exercer
um impacto transformador sobre o caminho de desenvolvimento do país. Uma
pesquisa recente da Ellen MacArthur Foundation com foco na Índia mostrou,
além disso, que países com setores informais expressivos têm potencial
significativo nessa área. As oportunidades sociais que o desenvolvimento
desses setores informais faz surgir também requerem mais análise. Outro
ponto que se destacou na pesquisa sobre o Brasil, assim como ocorreu no
estudo sobre a Índia, foi uma série de práticas de economia circular com
foco no fim da cadeia de produção. Expandir essas atividades e estendê-
las até a cadeia de valor contribuirá para transformar a economia circular
no modelo econômico predominante. A Fundação e seus parceiros seguem
desenvolvendo uma série de ferramentas para apoiar este movimento,
incluindo estruturas como a ReSOLVE, para a identificação de oportunidades
de negócio, o Circular Design Guide e o Toolkit for Policymakers, um kit de
ferramentas para formuladores de políticas.

As oportunidades iniciais apresentadas neste estudo apontam para


oportunidades de negócio com benefícios econômicos, sociais e ambientais.
Elas justificam uma análise mais completa da dimensão e do escopo das
oportunidades nas três áreas de foco aqui tratadas e para a economia
brasileira como um todo. Os autores esperam que este documento se
transforme em um primeiro passo para futura exploração dos benefícios
econômicos, ambientais e sociais que a transição para a economia circular
poderia proporcionar ao Brasil e encorajam o desenvolvimento de pesquisas
adicionais com esta finalidade.

28
29
30
www.ellenmacarthurfoundation.org
@circulareconomy

The Circular Economy 100 (CE100) is an Ellen MacArthur Foundation initiative.

Ellen MacArthur Foundation • Charity Registration No: 1130306


OSCR Registration No: SC043120 • Company No: 6897785

31

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