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Saúde Mental e Deficiência Visual Ebook PDF

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Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 1 )

Saúde mental e deficiência visual

SUMÁRIO 978-85-463-0187-4
Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 2 )
Saúde mental e deficiência visual

ÉRICO GURGEL AMORIM


JACILEIDE GUIMARÃES

Saúde mental e deficiência visual

Ideia – João Pessoa – 2017

SUMÁRIO 978-85-463-0187-4
Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 3 )
Saúde mental e deficiência visual

Todos os direitos dos autores.


A responsabilidades sobre textos e imagens são dos respectivos autores.

DIAGRAMAÇÃO/CAPA: Magno Nicolau

REVISÃO: Olívia Morais de Medeiros Neta.

Conselho Editorial
Marcos Nicolau – UFPB
Roseane Feitosa – UFPB – Litoral Norte
Dermeval da Hora – Proling/UFPB
Helder Pinheiro – UFCG
Elri Bandeira – UFCG

S255 Saúde mental e deficiência visual. Érico Gurgel Amorim, Jacileide


Guimarães. – João Pessoa: Ideia, 2017.
103p.
ISBN 978-85-463-0187-4
1. Deficiência visual - Dissertação. 2. Saúde mental. – Dissertação. 3.
Determinantes sociais de saúde - Dissertação. I. Guimarães, Jacileide. II.
Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título
CDU 614-056.262
______________________________________________________________

EDITORA LTDA.
(83) 222 –5986
www.ideiaeditora.com.br

Impresso no Brasil
Foi feito o depósito legal

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Saúde mental e deficiência visual

A todos os que convivem com a existência da “patologia”


ou da “anomalia” sem, contudo, perder a identidade do
ser singular numa sociedade plural.

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Saúde mental e deficiência visual

Agradecimentos

Aos professores e residentes do Ambulatório de oftalmologia do HUOL, pela


acolhida e auxílio durante a fase de campo, cruciais para a viabilização desta
pesquisa.
Aos atores participantes deste estudo, que, ao permitirem o acesso às suas
realidades vivenciais, colaboraram de modo singular com o alcance dos resultados
pretendidos.
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pelo
financiamento de bolsa de estudo para produção da dissertação “Saúde mental de
sujeitos com deficiência visual sob a ótica dos determinantes sociais de saúde” no
Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da UFRN, pois esse livro é
decorrente das pesquisas desenvolvidas para a referida dissertação.

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Saúde mental e deficiência visual

Minha esperança é imortal.


E eu repito, imortal!
Sei que não dá pra mudar o começo,
mas se a gente quiser, dá pra mudar o final.
(Elisa Lucinda)

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Saúde mental e deficiência visual

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO 8
1 INTRODUÇÃO 9
2 OBJETIVOS 15
3 REVISÃO DA LITERATURA 16
3.1 Concepções sócio-históricas da deficiência visual 16
3.2 A Deficiência visual na contemporaneidade 18
3.3 O normal, o patológico e o mito da normalidade 21
3.4 Saúde mental e os determinantes sociais de saúde 24
4 METODOLOGIA 32
4.1 Local do estudo 32
4.2 Critérios de inclusão e exclusão 33
4.3 Seleção da amostra 33
4.4 Instrumentos de coleta de dados 33
4.5 Aspectos éticos 34
4.6 Tratamento e análise dos dados 35
4.7 Procedimentos metodológicos 36
4.8 Caracterização dos sujeitos de pesquisa 38
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES 39
5.1 Saúde e sofrimento psíquico no encontro com o não ver e seus modos de andar a vida 40
5.2 A autonomia e seus desafios cotidianos 52
5.3 Interação social e suas redes de pertencimento 59
5.4 Os valores e a cultura nos processos de normalização e estigmatização 63
5.5 A educação, seus limites e possibilidades 69
5.6 A conjuntura do trabalho nos processos de inclusão e exclusão social 72
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 81
REFERÊNCIAS 84
APÊNDICES 95
APÊNDICE A – Roteiro de entrevista semiestruturada 96
APÊNDICE B – Termo de consentimento livre e esclarecido 98
APÊNDICE C – Caracterização dos entrevistados 100
A N E X O 101
ANEXO A – Parecer consubstanciado do Comitê de Ética em Pesquisa 102

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Saúde mental e deficiência visual

Esta pesquisa tem seus fundamentos estruturantes a partir da experiência da


deficiência visual, que se estabeleceu na trajetória de nossa existência. Em algum
momento deparamo-nos com a necessidade de desenvolver novos olhares sobre a
vida, refletindo acerca de seu sentido e as possibilidades de continuá-la. Isso nos fez
despertar para o universo das pessoas com deficiência a fim de encontrar, em seus
exemplares, alicerces capazes de inspirar novas atitudes, crenças e valores.
Surpreendemo-nos com retratos inspiradores de alguns, mas também
bastante insalubres para tantos – o que nos atraiu de imediato na tentativa de
compreender este paradoxo. Passamos, portanto, para uma fase de inquéritos e
busca incessante por atingir esta resposta, o que culminou na pergunta do presente
trabalho.
Percebemos que, nos tempos de inclusão em que estamos vivendo, novas
perspectivas de vida surgem para quem enfrenta a deficiência em seu cotidiano.
Entretanto, obstáculos rotineiros são evidenciados, inviabilizando ou dificultando,
muitas vezes, o processo de emancipação e realização pessoal.
Assim, pretendemos com esse estudo, sensibilizar os gestores, a comunidade
e as próprias pessoas com deficiência e seus familiares para um novo modo de
conceber a deficiência, a partir de suas possibilidades e novos modos de fazer. Para
isso, o engajamento de todos é necessário, balizando novos moldes nos quais a
sociedade possa se valer, a fim de incutir uma nova realidade promotora da inclusão
de todos.

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Saúde mental e deficiência visual

Apesar dos recursos técnico-científicos para prevenção da perda visual, a


cada dia muitas pessoas são acometidas por patologia ocular, por doenças ou
acidentes. Segundo o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
de 2010, a deficiência visual atinge 35 milhões de pessoas, o que equivale a 18,8%
da população brasileira. O estado do Rio Grande do Norte é o terceiro estado
brasileiro com maior prevalência desta condição, o que equivale a 22% da
população (IBGE, 2010).
No que se refere às aposentadorias por invalidez concedidas pelo Instituto
Nacional de Seguro Social (INSS), em 2013, a deficiência visual foi a sétima maior
causa no Brasil, com 5.497 novos beneficiários. Isso corresponde a um gasto anual
de 6,5 milhões de reais (BRASIL, 2013a).
As pessoas cegas são portadoras de uma deficiência sensorial: a ausência de
visão, que as limitam em suas possibilidades de apreensão do mundo externo,
interferindo em seu desenvolvimento e ajustamento às situações comuns da vida
(AMIRALIAN, 1997). Além disso, tanto o portador de cegueira total como o de visão
subnormal carece de recursos didáticos especiais, para garantir suas possibilidades
de desenvolvimento e participação na sociedade (ARAÚJO; MARQUES; OLIVEIRA;
SILVA, 2008).
Em consequência, a perda de visão pode levar ao comprometimento geral da
saúde mental, que predispõe às perdas emocionais, de habilidades básicas, de
atividade profissional e de comunicação (BRASIL, 2000a).
Quanto à atividade profissional das pessoas com deficiência na atualidade,
percebe-se que apesar dos esforços coletivos pela plena inserção no mercado de
trabalho, permanecem elevadas as taxas de inatividade entre os indivíduos deste
grupo (BRASIL, 2013b). Segundo os números divulgados pela Relação Anual de
Informações Sociais (RAIS), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), somente
0,3% dos brasileiros que têm deficiência visual está empregada.
Um dos motivos para tal fato é o de que a condição imposta pela ausência da
visão se traduz em um peculiar processo perceptivo, que se reflete na estruturação

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Saúde mental e deficiência visual

cognitiva e na organização e constituição do sujeito psicológico, com reflexo direto


na saúde mental (AMIRALIAN, 1997).
Deste modo, entre as problemáticas relacionadas à perda visual, destacam-se
o desencadeamento de um processo de alteração emocional e psicológica que se
caracteriza basicamente por desordem de ajustamento e depressão (BAZARGAN;
HAMM-BAUGH; LEINHAAS; HEDSTROM, 1994), taxas de suicídio mais elevadas
(NAUERT, 2008) e menor expectativa de vida (SUTHERLAND; COUCH; IACONO,
2002).
Ammerman, Van Hasselt e Hersen (1986) encontraram dados que apontam
para a existência de limitações cognitivas, perfis de personalidade mal adaptada,
probabilidades de comportamento e psicopatologia em uma população de crianças
cegas. Assim, verificam que uma grande percentagem de indivíduos com cegueira
está socialmente isolada. Por exemplo, idosos com deficiência visual são mais
propensos a ser internados em instituições ou abrigos de longa permanência.
A perda da visão, nesse sentido, não está associada apenas com a
depressão, mas também pode aumentar os sentimentos de ansiedade, de baixa
autoestima e negligência do autocuidado, acarretando aumento na probabilidade de
afastamento social, isolamento, quedas e erros de medicação (AUGUSTIN et al.,
2007).
Ammerman, Van Hasselt e Hersen (1986) observam elevados níveis de
ansiedade e depressão em indivíduos com cegueira em relação aos normovisuais.
Silveira e Sequeira (2002), comparando índices de saúde mental entre estudantes
com deficiência visual e normovisuais, verificam que os indivíduos com deficiência
visual apresentam maiores distúrbios na escala de auto-adaptação e uma maior
labilidade em termos de saúde mental. Ainda nessa perspectiva, Silveira e Sequeira
(2002) verificaram a existência de comprometimento psicológico em 53% de
indivíduos com cegueira e prevalência de 27,5% nos normovisuais.
Paralelamente, a correlação da doença ocular com a ansiedade e a
depressão em indivíduos com acesso limitado ao apoio da família foi constatada por
diversas pesquisas. Além disso, o efeito da perda da visão depende do grau de
acometimento, da idade e da velocidade de aparecimento da patologia. Desta forma,
o início precoce da perda visual significativa pode ter um efeito profundo sobre o
desenvolvimento infantil, com consequências adversas para a saúde mental, com

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Saúde mental e deficiência visual

repercussão na idade adulta (BURMEDI; BECKER; HEYL; WAHL; HIMMELSBACH,


2002; DU FEU; FERGUSSON, 2003).
Quanto à adaptação à perda visual, os autores Bernbaum, Albert e Duckro
(1988) estudaram os problemas visuais em diabéticos e constataram que as
alterações psicossociais são compensadas quando o déficit visual é estável. Em
outro estudo foi observado que a maioria dos sujeitos, avaliados sobre o impacto
psicológico da catarata, evidenciaram um processo de adaptação à situação de
deficiência visual (FAGERSTROM, 1991).
Em contrapartida, por meio de entrevistas em profundidade com idosos,
Heine e Browning (2004) identificaram que a má adaptação à perda visual implicou
na diminuição de socialização, com comprometimento do bem-estar físico e mental.
O comprometimento da saúde mental é um aspecto essencial da restrição de
participação na vida diária das pessoas com deficiência visual. Isso sugere que a
identificação e o tratamento de saúde mental podem contribuir para a maior
independência e envolvimento desses indivíduos nas demandas cotidianas.
De fato, há uma complexidade de problemas nos níveis psíquico, somático e
social que favorecem progressiva perda da capacidade de adaptação do indivíduo
ao meio ambiente (RIBEIRO, 2004). Por outro lado, a cegueira induz a ansiedade e
a depressão que prejudicam na adaptação social. Quando se prolongam, provocam
consideráveis níveis de dependência e isolamento.
Portanto, para as pessoas que nascem ou vem a adquirir uma deficiência, a
constituição de seu ser e sua identidade perpassam por sentimentos ambíguos e
novos conflitos compreensíveis, imersos em uma trama de relações sociais com o
meio em que estão inseridos.
Na busca por uma melhor compreensão do cotidiano do sujeito com
deficiência visual, os autores Rahi, Tadic, Keeley e Lewando-Hundt (2011)
propuseram uma entrevista de avaliação de qualidade de vida por meio de análise
temática de entrevistas com jovens deficientes visuais e foram extraídos os
seguintes domínios: relações sociais, aceitação e participação, independência e
autonomia, bem-estar psicológico e emocional, futuras aspirações e medos,
trabalho, lazer, família e o tratamento de doença ocular.
Neste direcionamento, autores como Klein, Klein, Moss e Cruickshanks
(1999), Wang et al. (2001) e Ribeiro (2004), dentre outros, abordaram fatores

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Saúde mental e deficiência visual

determinantes à saúde mental ou deficiência visual, no entanto, a correlação ainda é


um objeto que requer problematizações.
De acordo com Lamoureux et al. (2004) e Popescu (2012), o estudo de
determinantes sociais de saúde mental nessa população contribui para a efetiva
intervenção técnica e social. Além disso, fornece elementos para melhor
compreender o papel que a visão cumpre no desempenho dos processos de
autonomia e inserção social.
Nestes termos, as pessoas com deficiência situam-se como sujeitos com
necessidades particulares, deslocadas das suas relações sociais e muitas vezes
indiferenciadas no que diz respeito à sua inserção de classe. Assim sendo, as
instituições de reabilitação apresentam pouca resolubilidade em relação às
necessidades de saúde da população em estudo (SOUZA; PIMENTEL, 2012).
Apenas recentemente a problemática das pessoas com deficiência saiu da
esfera privada para a vida pública, tendo suas demandas reconhecidas como uma
questão de direitos humanos (DINIZ; BARBOSA; SANTOS, 2009). Contudo, ainda
hoje, são submetidas a processos de privação coletiva, ou exclusão social, o que
nos faz compreender que a problemática da deficiência não está dissociada do
contexto sociocultural.
Em tempos de modernidade líquida, Bauman (2001) faz uma análise crítica
ao apontar que a sociedade interpreta os sujeitos com deficiência como estranhos,
indivíduos expulsos do cotidiano das pessoas comuns; são indivíduos que provocam
surpresa, inquietação, incômodo no universo homogeneizador dos ditos normais,
dos nativos, exatamente, por serem diferentes no modo de viver e de estar no
mundo! E, estigmatizá-los parece constituir uma arma conveniente na defesa contra
a inoportuna ambiguidade, a incômoda diferença do estranho.
A cultura em que vivemos e as pessoas com quem convivemos são o
substrato sobre o qual os indivíduos se constituem. E para entendermos as pessoas
com deficiência e o processo de inclusão é importante que se possa refletir sobre
nossa cultura nas questões que estamos tratando.
Neste sentido, a inclusão é hoje, sem dúvida, uma questão central em todos
os ambientes em que vivemos: nas famílias, nas escolas, no mercado de trabalho,
nos esportes, nos espaços de lazer, enfim, em todas as situações da vida do ser
humano (AMIRALIAN, 2009).

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Saúde mental e deficiência visual

Em sintonia com esta diretriz, em julho de 2015, foi apresentada a Lei


Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com
Deficiência), a qual visa assegurar e promover, em condições de igualdade, o
exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência,
viabilizados a partir de ações efetivas do Estado, da sociedade e da família
(BRASIL, 2015).
Constatamos que esta é uma temática relevante, porém, ainda pouco
desenvolvida para a melhor resolubilidade de questões de Saúde Pública. Com isso,
o presente estudo pode colaborar para a discussão e a reflexão sobre o tema,
permitindo aos deficientes e profissionais envolvidos repensarem suas práticas,
contribuindo para transformações e inovações no campo. Outro aspecto relevante é
a pouca bibliografia disponível envolvendo a temática de saúde mental e pessoa
com deficiência visual em uma perspectiva qualitativa, como demonstramos a partir
de busca por termos como saúde mental, deficiência visual e método qualitativo, em
bases de dados eletrônicas: Medline, Lilacs, Science Direct e Scielo, no ano de
2013.
Assim, partimos do pressuposto de que as pessoas com deficiência visual
vivenciam situação de vulnerabilidade individual e social que pode predispor ao
comprometimento da sua saúde mental por vivenciarem contextos de exclusão ou
inclusão limitada para a realização de suas necessidades cotidianas.
Nesse bojo, os estudos e investigações sobre a saúde mental nestas
populações revelam-se importantes, face às dificuldades em identificar alguns
problemas comportamentais e por serem muitas vezes ignorados, estando em
desacordo com os rumos atuais por uma sociedade inclusiva de fato e de direito
(SILVEIRA; SEQUEIRA, 2002).
Considerar a inclusão social como uma condição que se fundamenta em uma
nova visão sobre o ser humano e suas interações sociais, implica mudanças de
atitudes, valores e hábitos. Trata-se de um processo complexo, lento, difícil e que
exige experimentações e discussões.
Assim, a deficiência faz parte do rol dos entre-lugares que “[...] fornecem
terreno para a elaboração de estratégias de subjetivação – singular ou coletiva – de
que decorrem novos signos de identidade e postos inovadores de colaboração e
contestação” (BHABHA, 1998, p. 20).

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Saúde mental e deficiência visual

Na esteira desses entre-lugares, “postos inovadores de colaboração e


contestação”, situamos a justificativa do presente estudo no âmbito da sociedade
atual, buscando conhecer o que favorece a perspectiva da inclusão social em
detrimento da histórica exclusão social vivenciada por pessoas com deficiência, em
particular, deficiência visual.
Em conformidade com a temática saúde mental e deficiência visual,
objetivamos conhecer os determinantes sociais de saúde que afetam o cotidiano de
sujeitos com deficiência visual, com ênfase na saúde mental, na perspectiva da
inclusão/exclusão social, através da investigação sobre definições técnicas e
vivências pessoais que permeiam os conceitos de normal e patológico à luz do
pensamento de Georges Canguilhem.
Este autor apresenta a noção de normatividade, segundo a qual, a partir das
infidelidades do meio, em que os organismos se inserem e interagem, novas normas
de conduta ou maneiras de engendrar os modos de andar a vida devem ser
viabilizados, a partir de um aparato jurídico normativo que garanta esta interação.
Deste modo, "homem e meio, considerados separadamente, não podem ser
normais. pois interagem em polaridade na qual a vida se constitui e subsiste”
(SANTOS; GOMES, p. 2012).
Nesta perspectiva, elencamos a seguinte questão de pesquisa: Qual a
contribuição dos determinantes sociais de saúde para entender e problematizar a
realidade social, em relação à vida das pessoas com deficiência visual, em suas
diferenças radicais na interação com a saúde mental?
O presente trabalho se estrutura a partir da delimitação de seus objetivos; em
seguida, percorre um resgate teórico dos principais elementos e arcabouços
estruturantes de uma compreensão apurada dos entornos teóricos; partindo, em
seguida, para a delimitação das etapas metodológicas utilizadas e, por fim,
apresenta os resultados encontrados e construídos a partir da pesquisa de campo.

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Saúde mental e deficiência visual

Objetivo Geral:
• Analisar a contribuição dos determinantes sociais de saúde para entender e
problematizar a saúde mental e a interação com a vida social no cotidiano de
sujeitos com deficiência visual.
Objetivos Específicos:
• Identificar as dificuldades encontradas por deficientes visuais no contexto
social;
• Descrever as estratégias de enfrentamento empregadas em relação às
adversidades cotidianas vivenciadas; e
• Conhecer o modo como a saúde mental e o contexto social interagem,
determinando aspectos da vida da pessoa com deficiência visual com base
em suas experiências singulares.

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Saúde mental e deficiência visual

Para compreender a saúde mental dos sujeitos com deficiência visual e suas
dificuldades cotidianas intimamente relacionadas, delimitamos um percurso
exploratório do estado da arte do conhecimento acerca dos temas afins. Neste
processo, partimos de um resgate dos significados sócio-históricos da cegueira e de
seus contornos culturais e ideológicos. Em seguida, estruturamos um debate a partir
do conhecimento vigente dos conceitos biomédicos da deficiência visual e a
legislação brasileira definidora e norteadora de ações inclusivas.
Em seguida, propomos um olhar aprofundado e crítico dos prenoções do
entorno social assumidas quanto ao lidar frente à anomalia e deficiência,
circunscrevendo um novo modo de olhar e atuar, ao conceber a deficiência como
uma realidade singular, permeada pela diversidade e pluralidade da vida.
Por fim, um olhar compreensivo dos conceitos de saúde mental e da realidade
social dos sujeitos com deficiência visual permitiu nos aprofundar nas múltiplas
determinações que corroboram para a persistência da segregação e marginalização
desses sujeitos, num ciclo vicioso gerador de iniquidades sociais inadmissíveis.

Para compreender os mecanismos a partir dos quais lidamos, ao nos


defrontar com uma pessoa com deficiência visual, imersa numa trama de interações
conscientes e inconscientes, faz-se necessário emergir um olhar sobre o modo pelo
qual a significação da deficiência visual se deu ao longo do percurso civilizatório, e
que fatores relacionam-se à esta prática valorativa. Ao longo do processo histórico,
diversas abordagens e crenças quanto às pessoas com deficiência foram sendo
assimiladas e perpetuadas, a depender de valores socioeconômicos, culturais e
ideológicos. Da mesma forma, a ocorrência da deficiência visual e os modos de
significação acompanham a história da humanidade e sua organização social,
ditando as atitudes e crenças (FRANCO; DIAS, 2005).
Para os povos da Antiguidade, a deficiência visual era causada por espíritos
maus, demônios ou castigo por pecados cometidos. Representava a degeneração
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Saúde mental e deficiência visual

da raça humana, no período em que a eugenia era princípio predominante. Deste


modo, deveriam ser abandonadas ou eliminadas. Trata-se do Paradigma de
exclusão social, o qual se fundamenta no modelo metafísico ou divino de explicação
da deficiência (SCLIAR, 2007; AMIRALIAN et al., 2000).
Na Idade Média, com o advento do Cristianismo, a pessoa com deficiência
visual passa a ser alvo de compaixão, proteção e caridade. Apesar disso, justifica-se
a deficiência como uma forma de pagar pelos pecados ou uma via de salvação. Por
este motivo, era isolado do convívio com a sociedade, confinado em instituições
asilares, hospitais de caridade ou no próprio domicílio, condutas estas balizadas
pelo paradigma da segregação social e pela institucionalização (FIGUEIRA, 2014;
PACHECO; ALVES, 2007; SILVA, 2009). Em 1260, foi fundado na França o asilo de
Quinze Vingts, instituição mais importante deste período e primeira destinada a
atender exclusivamente pessoas cegas refugiadas e abandonadas (FRANCO; DIAS,
2005).
Na Modernidade, o pensamento humanista, racional e científico e os anseios
capitalistas, frutos da Revolução Industrial, emergem de um enfoque organicista na
patologia do sujeito com deficiência visual, o qual deveria ser submetido a
tratamento e curado para ser integrado, ou reintegrado, na sociedade. Esse modo
de significação foi ancorado no modelo biomédico, o qual se relaciona ao princípio
da normalização e constitui paradigma da integração social ou de serviços. Também
foi nesse período que surgiram as primeiras preocupações com a educação dos
deficientes, a partir de mudanças nas atitudes dos grupos sociais estimuladas pelo
movimento de atendimento aos deficientes visuais em hospitais (BROGNA, 2005;
SILVA, 2009). Em 1784, foi fundado, na França, o Instituto Real dos Jovens Cegos
de Paris, considerado a primeira escola do mundo destinada à educação de pessoas
cegas (FRANCO; DIAS, 2005).
Na contemporaneidade, o ser deficiente visual adquire uma nova significação,
com base legal e filosófica, tendo como eixo norteador o modelo social da
deficiência que fez brotar o paradigma da inclusão social. A deficiência visual passa
a ser uma resultante de fatores não só mais do corpo lesado da pessoa, mas das
barreiras físicas, virtuais e atitudinais impostas pela sociedade. Ela deve preparar-se
para garantir a plena participação de todos no jogo democrático. (DINIZ, 2007;
PACHECO; ALVES, 2007; GESSER; NUREMBERG; TONELI, 2012).

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Saúde mental e deficiência visual

Essa nova postura por uma sociedade inclusiva é particularmente importante,


pois na medida em que as sociedades tornam-se, técnica e culturalmente, mais
complexas, novos impedimentos corporais e deficiências surgem, os quais se
incorporam em um segmento cada vez mais expressivo (FIGUEIRA, 2014). Além
disso, a estigmatização e o preconceito em relação às pessoas com deficiência
enrijecem as relações sociais, e perpetuam uma realidade excludente. A este
exemplo, uma pesquisa nacional revelou que 96,5% dos entrevistados referiam
atitudes preconceituosas relacionadas às pessoas com deficiência (INEP, 2009).
Sendo assim, o ser deficiente visual invoca uma condição a par de padrões elegíveis
de estética e funcionalidade, o que o torna particularmente vulnerável à condutas
preconceituosas em uma sociedade marcada pelo culto ao corpo e negação da
fragilidade humana (LOPES, 2013; SILVA, 2006).

O que vem a ser deficiência visual? A partir de padrões elegíveis de


funcionalidade, em uma visão biomédica, deficiência visual é definida como a perda
total ou parcial, congênita ou adquirida, da visão. Refere-se ao espectro que vai da
cegueira até a visão subnormal. (BRASIL, 1994, p. 13).
Considera-se deficiência visual (BRASIL, 1999; BRASIL, 2004):
a) cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor
olho, com a melhor correção óptica;
b) baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho,
com a melhor correção óptica;
c) os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os
olhos for igual ou menor de 60°;
d) a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores.
Em 2009, o Brasil ratificou a Convenção da Organização das Nações Unidas
(ONU) sobre os direitos da pessoa com deficiência, a qual foi incorporada sob status
de emenda constitucional ao conteúdo jurídico pátrio. Este instrumento incorpora à
categoria de deficiência visual a visão monocular, como previsto no artigo 2º
(BRASIL, 2009a).
A deficiência visual pode tanto ser congênita quanto adquirida em diferentes
épocas da vida; o que acarreta diferenças no processo cognitivo e na consequente

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Saúde mental e deficiência visual

estruturação das formas de relação para estes indivíduos. Assim, são classificados
em quatro grupos: os cegos congênitos ou de cegueira adquirida até os cinco anos,
os de cegueira adquirida depois dessa idade, os de visão subnormal congênita e os
de visão subnormal adquirida (MASINI, 1994).
Na Política Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência, é discutida a
importância de um adequado sistema de informações sobre incidência e prevalência
de deficiências no Brasil, visto que será essencial para o adequado equacionamento
das questões relativas à saúde da pessoa com deficiência (BRASIL, 2009b).
As causas mais frequentes de cegueira e visão subnormal são: retinopatia da
prematuridade, catarata congênita, glaucoma congênito, atrofia óptica,
degenerações retinianas e alterações visuais corticais. A cegueira e a visão
subnormal podem também resultar de doenças como diabetes, descolamento de
retina ou traumatismos oculares (BRASIL, 2000a).
Em 2014, foi realizado um levantamento multicêntrico com 5.000 pessoas,
objetivando aferir o grau de saúde ocular da população brasileira. Entre os
entrevistados, 52% referiam ter algum problema de visão, sendo os de refração os
mais frequentes (75%), seguidos por catarata (11%), retinopatia (3%), glaucoma
(2%) e 8% não souberam apontar qual o problema de visão (LEOPOLD, 2014).
Entretanto, como consequência da distribuição desigual dos profissionais pelo
território, 23% dos brasileiros não tem acesso a oftalmologistas (CBO, 2014). Isso
explica, em parte, porque pessoas com deficiência visual são particularmente
vulneráveis a falhas em serviços tais como saúde, reabilitação, apoio e assistência
(ONU, 2011).
Com vistas à reversão deste cenário, a ONU propõe uma série de medidas a
fim de assegurar um atendimento às demandas de saúde das pessoas com
deficiência e seus familiares, entre as quais incluem uma rede de serviços
articulados ao alcance de todos e uma equipe de saúde qualificada atenta às
necessidades individuais e coletivas e às iniquidades presentes (ONU, 2011).
Por meio desta diretriz e como marco legal na busca de efetivar os direitos à
saúde da pessoa com deficiência, a Lei nº 13.146 de 2015 estabelece que a
avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial; realizada por
equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará tanto a limitação no
desempenho de atividades quanto à restrição de participação na vida cotidiana
(BRASIL, 2015).

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Saúde mental e deficiência visual

Visando uma avaliação capaz de atender não somente aos aspectos


concernentes à biologia, mas também ao ambiente e à interação social, foi cunhada
a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) (WHO,
2001b). Esta classificação rompe com o modelo biomédico tradicional e incorpora
um olhar multidimensional e abrangente, congregando aspectos cotidianos e
situacionais da pessoa com deficiência, fornecendo um quadro mais amplo sobre a
saúde do indivíduo ou populações, por meio de uma abordagem biopsicossocial
(FARIAS; BUCHALLA, 2005), compatível com o modelo social de deficiência
contemporâneo. (GESSER; NUREMBERG; TONELI, 2012).
Na busca de se efetivar uma atenção integral voltada à pessoa com
deficiência, considerando a necessidade de iniciar precocemente as ações de
reabilitação e de prevenção de incapacidades, o Ministério da Saúde publicou a
Portaria nº 793, de 24 de abril de 2012, a qual institui a Rede de Cuidados à Pessoa
com Deficiência no âmbito do Sistema Único de Saúde. Os principais objetivos da
Rede de Atenção à Pessoa com Deficiência são: ampliar o acesso e qualificar o
atendimento às pessoas com deficiência; promover a vinculação das pessoas com
deficiência e suas famílias aos pontos de atenção; e garantir a articulação e a
integração dos pontos de atenção das redes de saúde no território, qualificando o
cuidado por meio do acolhimento e classificação de risco (BRASIL, 2012a).
Entre as diretrizes esculpidas na referida Portaria, destacam-se: a atenção
humanizada e centrada nas necessidades das pessoas por meio de cuidado integral
e assistência multiprofissional, sob a lógica interdisciplinar; a promoção da equidade;
a promoção do respeito aos direitos humanos e às diferenças e aceitação de
pessoas com deficiência, a partir do enfrentamento de estigmas e preconceitos
enraizados.
Entretanto, as evidências mostram que para as redes de atenção à saúde
funcionarem, um conjunto de atributos essenciais são indispensáveis, notadamente,
a existência de uma população e um território, definidos com amplo conhecimento
de suas necessidades e preferências, os quais determinam a oferta de serviços de
saúde e fortalecimento de ação intersetorial e abordagem dos determinantes da
saúde e da equidade em saúde (BRASIL, 2010b). Fundamentam-se, portanto, na
compreensão da atenção primária em saúde como primeiro nível de atenção,
enfatizando a função resolutiva dos cuidados primários sobre os problemas mais
comuns de saúde e a partir da qual se realiza e coordena o cuidado em todos os

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Saúde mental e deficiência visual

pontos de atenção, na perspectiva de superar a fragmentação sistêmica existente


(LAVRAS, 2011).

Um dos grandes entraves à consolidação dos direitos universais proclamados


pela legislação especial atual é a persistência dos ditos e entreditos do preconceito,
enraizado em um construto valorativo de um ideal de perfeição inatingível e
humanamente impossível.
Desde os primórdios da civilização, o homem convive com a construção da
presença do patológico, do anormal ou do desvio. Além disso, o modo como se dá
sua apreensão, significação e conceituação revela uma conjuntura de valores
introjetados ou apreendidos no seio social. Canguilhem (2009), no livro “O Normal e
o patológico”, faz uma abordagem discursiva e reflexiva acerca do ser humano e
suas dimensões do saudável e doente, a partir da ciência hegemônica e das novas
formas de conceber a vida, lançando luzes sobre a relação saúde e doença e a
normalização daí decorrente.
O livro “O Normal e o patológico” é decorrente da tese de doutorado em
Medicina de Georges Canguilhem intitulada Essais sur quelques problèmes
concernant le normal et le pathologique, publicada pela primeira vez em 1943. A sua
terceira edição, da qual existe uma tradução brasileira de 1966, apresenta
modificações importantes; a começar pelo título, simplificado para “O Normal e o
patológico”. Além disso, esta edição é dividida em duas partes. A primeira contém o
texto integral da tese de 1943. A segunda, intitulada Novas Reflexões Sobre o
Normal e o Patológico, apresenta três textos escritos entre 1963 e 1966 que
retomam o assunto à luz de novas contribuições para a epistemologia e história das
ciências e de avanços na biologia, em especial em biologia molecular (SERPA
JUNIOR, 2003).
Segundo a Teoria Ontológica da doença, a patologia é uma entidade
anatomo-clínica localizada no organismo. Neste cenário, a doença passa a ser vista
como o oposto qualificativo de saúde, um ser a parte, porém, intrínseco que deve
ser extirpado, e a procura de sua localização é o primeiro passo para agir
(CANGUILHEM, 2009).

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Saúde mental e deficiência visual

Por sua vez, para a concepção positivista as doenças são apenas sintomas
que refletem lesões de órgãos ou tecidos. Sua definição e divulgação baseiam-se
em números e na estatística. Deste modo, a patologia faz parte da fisiologia e a
doença deriva, quantitativamente, do estado normal, ou seja, da média da maioria
dos indivíduos (CANGUILHEM, 2009). Vejamos o que afirma Canguilem:

O estado patológico em absoluto não difere radicalmente do estado


fisiológico, em relação ao que ele só poderia constituir, sob um
aspecto qualquer, um simples prolongamento mais ou menos
extenso dos limites de variações, quer superiores, quer inferiores,
peculiares a cada fenômeno do organismo normal, sem jamais poder
produzir fenômenos realmente novos que não tivessem de modo
nenhum, até certo ponto, seus análogos puramente fisiológicos
(CANGUILHEM, 2009, p. 17).

A definição do anormal, a partir das ideias de desarmonia ou de oposição ao


quase considerável normal, segundo o pensamento acima mencionado, traz consigo
um apego valorativo expresso em um ideal de perfeição de saúde. Assim, “a saúde,
considerada de modo absoluto, é um conceito normativo assumido pela medicina e
que define um tipo ideal de estrutura e de comportamento orgânicos, ancorados no
processo sócio-histórico de normalização” (CANGUILHEM, 2009).
A normalização da saúde é a expressão de exigências coletivas cujo conjunto
define, em determinada sociedade histórica, seu modo de relacionar sua estrutura,
com o que ela considera seu bem particular, por meio de imposição à existência
humana o que não se aceita diferir (CANGUILHEM, 2009, p. 108-109). Esse
movimento fez brotar uma explosão de diagnósticos, em um processo conhecido
como patologização do normal (SERPA JUNIOR, 2003) ou patologização das
diferenças, naquilo que nos caracteriza em relação aos outros (GROISMAN, 2002).
Em contraste com o pensamento ontológico positivista, Canguilhem (2009)
destaca a teoria dinâmica da doença, que tem suas bases em pressupostos da
medicina grega, a partir dos escritos e práticas hipocráticas, em uma construção
sistêmica e totalizante. Segundo essa teoria, toda a natureza, seja no homem ou
fora deste, é expressão de harmonia e equilíbrio, sendo a doença perturbação
subjetiva deste equilíbrio. Outrossim, a doença não está mais em uma parte do
homem, mas em toda sua plenitude e exprime o esforço que a natureza exerce
sobre o homem para obter um novo equilíbrio.

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Saúde mental e deficiência visual

A esse novo enfoque é incorporado o conceito, denominado por Canguilhem


(2009), de normatividade vital. Essa traz uma noção de plasticidade individual e
coletiva, que inclui a capacidade de enfrentamento de novas situações, a exemplo
da experiência do adoecer, da patologia ou da anormalidade. Quanto à
normatividade proximal, Canguilhem destaca:

É pela anomalia que o ser humano se destaca do todo formado pelos


homens e pela vida. É ela que nos revela o sentido de uma maneira
de ser inteiramente singular, e o faz primitivamente, de um modo
muito radical e impressionante (CANGUILHEM, 2009, p. 45).

Em uma perspectiva coletiva, a normatividade alicerça um arcabouço


estruturante que alberga a possibilidade de padecimento e da diferença, sob uma
ótica de aproximação com as possibilidades de vida diante de tal fato, sem
negligenciá-lo. Em suma, isto revela o fato de que “a vida não é indiferente às
condições nas quais ela é possível, [...] a vida é polaridade e por isso mesmo,
posição inconsciente de valor, em resumo, [...] a vida é, de fato, uma atividade
normativa” (CANGUILHEM, 2009, p. 96).
Nesse horizonte, ter uma anomalia implica em poder assumir-se como normal
ou como enfermo, a depender da capacidade instituidora de novas normas de vida
social. Assim sendo, “não existe fato que seja normal ou patológico em si. A
anomalia e a mutação não são, em si mesmas, patológicas. Elas exprimem outras
normas de vida possíveis” (CANGUILHEM, 2009, p. 56).
Percebemos, com isso, que saúde é “certa disposição e reação de um
organismo individual em relação às doenças coexistentes. É a manifestação de
plasticidade funcional do indivíduo consigo e com o meio, num processo de
normatividade vital e dinâmica” (CANGUILHEM, 2009, p. 26).
Mas não somente o indivíduo deve buscar este direcionamento em busca de
um espaço e um modo de vida, também o meio que o cerca deve preparar-se para
este acolhimento e interação mútua, em um esforço multidimensional, minorando ou
sanando as adversidades. Em resumo, esse meio torna-se normal quando o ser
vivo, em sua individualidade e particularidade, consegue desenvolver melhor sua
vida e nele manter melhor sua própria norma em um processo de relação
intercambiável (CANGUILHEM, 2009).

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Saúde mental e deficiência visual

Ademais, “cada vez mais, a ideia de saúde ou de normalidade deixa de se


apresentar como a ideia de conformidade a um ideal externo (atleta para o corpo,
bacharel para a inteligência)” (CANGUILHEM, 2009, p. 65). Sobre esse tema,
Canguilhem, ainda, assevera:
A melhor definição do homem seria, creio, a de um ser insaciável,
isto é, que ultrapassa sempre suas necessidades. Eis uma boa
definição de saúde, que nos prepara para compreender sua relação
com a doença (CANGUILHEM, 2009, p. 65).

Para que se concretize o esforço individual, o homem deve se ancorar numa


estrutura social permeável ao seu soerguimento e atuação transformadora. Isto
significa que a "capacidade de tolerância para enfrentar as dificuldades está
diretamente vinculada a valores não só biológicos, mas também sociais" (CAPONI,
1997, p. 305). Diante do exposto, podemos indagar: Quais as necessidades do
sujeito deficiente visual devem ser atendidas em atenção à manutenção de sua
saúde? Que realidades micro e macrossociais podem obstaculizar essa
normatividade vital? A não observância pode trazer consequências para a saúde do
indivíduo?

Considerando o ser humano em suas diversas formas de ser e agir, imerso


em um contexto sociocultural que lhe é próprio e na busca por compreender os seus
modos de interação e suas formas de andar a vida, em situações de fragilidade ou
de padecimento; foi cunhada uma proposta elucidativa que busca responder aos
anseios e necessidades humanas frente às adversidades cotidianas. Trata-se de um
novo paradigma sanitário: o da produção social da saúde (MENDES, 1996), também
denominado paradigma biopsicossocial, alternativo ao paradigma curativista anterior
(SANTOS; WESTPHAL, 1999).
Neste enfoque, Mendes (1996, p. 237) define saúde como “o resultado de um
processo de produção social que expressa a qualidade de vida como uma condição
de existência dos homens no seu viver cotidiano, um viver desimpedido, um modo
de andar a vida prazeroso, seja individual, seja coletivamente.”
Essa definição traz essencialmente as dimensões subjetivas da produção de
saúde, afinando-se com as ideias e concepções atuais que caminham para a

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Saúde mental e deficiência visual

interdisciplinaridade, na medida em que ampliam o olhar sobre os diversos aspectos


do processo saúde-doença.
Segundo Belloch e Olabarria (1993), dentre os princípios do paradigma
biopsicossocial destacam-se:
a) O corpo humano é um organismo biológico, psicológico e social, ou seja,
recebe informações, organiza, armazena, gera, atribui significados e os transmite, os
quais produzem, por sua vez, maneiras de se comportar;
b) A saúde e a doença são condições que estão em equilíbrio dinâmico; estão
codeterminadas por variáveis biológicas, psicológicas e sociais, todas em constante
interação; e
c) A etiologia dos estados de doença é sempre multifatorial. Devem-se
considerar os vários níveis etiopatogênicos e que todos eles requerem uma
investigação adequada.
Este modelo, pautado nas dimensões biopsicossociais, refletiu em
transformações no conceito de saúde, na compreensão sobre o processo saúde-
doença, na organização do sistema brasileiro de saúde pública e nas práticas
profissionais em saúde (PEREIRA; BARROS; AUGUSTO, 2011).
Outra abordagem conceitual de saúde, designada holopatogênese, foi
cunhada, com vistas à sistematização de uma teoria geral da saúde-doença, refere-
se aos diversos processos de determinação de doenças e condições relacionadas,
compondo o todo integral, a partir da compreensão de suas múltiplas facetas,
manifestações e expressões, imersos em um contexto complexo cujos saberes se
almejam conhecer (ALMEIDA FILHO; ANDRADE, 2003, p. 109).
Em consonância a esta proposta, Souza (2004) apresentou a visão holística
da saúde em que esta passa a ser compreendida como um fenômeno
multidimensional, envolvendo aspectos físicos, psicológicos e sociais,
interdependentes entre si. Ancora-se na concepção sistêmica da vida, cuja
flexibilidade é a garantia para o indivíduo ser saudável, num processo dinâmico
entre as diversas naturezas: física, mental, social, econômica ou tecnológica.
Assim, fica cada vez mais evidente a relação estreita entre saúde física e
mental (WFMH, 2004), sendo esta aceita como um componente essencial de saúde
dos indivíduos, famílias, sociedades e comunidades. Constata-se, portanto, que
saúde mental e física são duas vertentes da vida que estão intimamente
entrelaçadas e profundamente interdependentes (WHO, 2001a).

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Saúde mental e deficiência visual

Neste direcionamento, de acordo com Swartz (1998), as condições físicas


têm sido consideradas reciprocamente relacionadas com a saúde emocional, social
ou espiritual da pessoa. Trata-se de uma relação complexa, na qual a saúde mental
afeta a saúde física, assim como as condições de saúde física afetam a saúde
mental (BRASIL, 2003, BRASIL, 2005). Além disso, saúde física e mental
compartilham muitos dos mesmos determinantes (RAPHAEL; SCHMOLKE;
WOODING, 2005). Todavia, ainda prevalece no mundo ocidental uma visão
dicotômica e artificial entre saúde física e mental, não compartilhada por muitas
culturas tradicionais (SWARTZ, 1998).
A explicitação dos determinantes sociais de saúde veio à tona no relatório
realizado em 1974 pelo Ministério da Saúde do Canadá, conhecido como Relatório
Lalonde e foi retomado na primeira Conferência Internacional sobre Atenção
Primária em Saúde, realizada em 1978, na VIII Conferência Nacional de Saúde; na
constituição da República Federativa do Brasil de 1988; na Lei Orgânica da Saúde,
Lei nº 8.080 de 1990 e na Comissão Nacional dos Determinantes Sociais da Saúde
– CNDSS (BRASIL, 2005b; BATISTELLA, 2007).
Os determinantes sociais da saúde incluem as condições socioeconômicas,
culturais e ambientais de uma sociedade, e se relacionam com as condições de vida
e trabalho de seus membros, como: habitação, saneamento, ambiente de trabalho,
serviços de saúde e educação, incluindo também a trama de redes sociais e
comunitárias (BATISTELLA, 2007).
O modelo de Dahlgren e Whitehead (1991) explica os mecanismos pelos
quais as interações entre os diferentes níveis de condições sociais produzem as
desigualdades em saúde, conforme ilustra a Figura 1. Tal modelo contempla desde
o individual até o nível das condições econômicas, culturais e ambientais que
predominam na sociedade como um todo, destacando a importância dos fatores não
clínicos sobre a situação da saúde dos indivíduos e das populações, permitindo a
análise da cadeia de produção social da saúde (BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2007;
GEIB, 2012). Além disso, é o modelo adotado pela Comissão Nacional sobre
Determinantes Sociais da Saúde (CNDSS), por sua simplicidade, fácil compreensão
e clara visualização gráfica (BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2007; GEIB, 2012).

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Saúde mental e deficiência visual

Figura 1 – Modelo de Determinação social da saúde

Fonte: Dahlgren e Whitehead (1991)

Tal modelo inclui os Determinantes Sociais de Saúde (DSS) dispostos em


diferentes camadas, desde uma camada mais próxima dos determinantes
individuais, que incluem os comportamentos e estilos de vida até uma camada distal,
onde se situam os macrodeterminantes, correspondentes às condições
socioeconômicas, culturais e ambientais gerais. No nível intermediário, os
determinantes são representados pelas condições de vida e trabalho e o papel da
coesão social (DAHLGREN; WHITEHEAD, 1991; BUSS; PELLEGRINI FILHO,
2007).
Relaciona-se, deste modo, à concepção ampliada de saúde e à compreensão
de que ações realizadas por outros setores têm efeito sobre a saúde individual e
coletiva (BRASIL, 2005b). Com isso, outras perspectivas de promoção e cuidado à
saúde, são originadas, clarificando a operacionalidade e atribuindo
responsabilidades sociais ao Estado no intuito de garantir saúde como direito de
cidadania (SOUZA, 2004).
Promover a saúde, desse modo, é atuar para mudar positivamente os
elementos considerados determinantes da situação de saúde/doença. Em outras

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Saúde mental e deficiência visual

palavras, envolve o reforço da capacidade individual e coletiva para lidar com a


multiplicidade de fatores que condicionam a saúde (CZERESNIA, 1999).
O interesse pela compreensão e promoção de saúde mental e o estudo de
seus determinantes tornam-se relevantes ao invocarmos suas importâncias
individual e social. Segundo a Organização Mundial de Saúde (WHO, 2001a, p.1), a
saúde mental pode ser compreendida como "[...] um estado de bem-estar no qual o
indivíduo realiza as suas próprias capacidades, pode fazer face ao estresse normal
da vida, trabalhar de forma produtiva e frutífera, e é capaz de dar um contributo para
a sua própria comunidade”.
Outras definições de saúde mental referem-se a sentimentos subjetivos do
indivíduo de bem-estar, otimismo e maestria, os conceitos de resiliência, ou a
capacidade de lidar com a adversidade, e a capacidade de ser capaz de formar e
manter relacionamentos significativos (LAVIKAINE; LAHTINEN; LEHTINEN, 2001).
Embora as expressões dessas qualidades sejam diferentes conforme o contexto
coletivo e individual, e a partir de cultura para cultura, as qualidades básicas
permanecem as mesmas (STURGEON, 2015).
O termo psicossocial tem sido utilizado para referir-se à grande variedade de
fatores psicológicos e sociais que se relacionam com a saúde e a doença mental
(BINIK, 1985). Considera o autor que não existe termo mais apropriado para
descrever as características da pessoa, nomeadamente traços de personalidade,
mecanismos de defesa, estados emocionais e cognitivos, e os fatores
socioambientais como, por exemplo, as situações indutoras de estresse.
A saúde mental para cada pessoa é afetada por fatores e experiências
individuais, interação social, estruturas sociais e os recursos e valores culturais. Ela
é influenciada por experiências em todos os dias, nas famílias e nas escolas, nas
ruas e no trabalho (LAHTINEN et al., 1999). A saúde mental de cada pessoa, por
sua vez, afeta a vida em cada um destes domínios e daí a saúde de uma
comunidade ou população (WHO, 2004).
Assim é que saúde mental e bem-estar são influenciados não só pelos
atributos individuais, mas também pelas circunstâncias sociais em que as pessoas
se encontram e do ambiente em que vivem. Esses determinantes interagem entre si
de forma dinâmica, e pode ameaçar ou proteger o estado de saúde mental de um
indivíduo (WHO, 2012).

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Saúde mental e deficiência visual

Neste direcionamento, os avanços na neurociência e medicina


comportamental demonstraram que, como muitas doenças físicas, distúrbios
mentais e comportamentais são resultantes de uma complexa interação entre
fatores biológicos, psicológicos e sociais (WHO, 2001a).
A evidência mais clara refere-se a riscos de doenças mentais, que no mundo
desenvolvido e em desenvolvimento estão associados com indicadores de pobreza,
incluindo os baixos níveis de educação. A associação entre pobreza e transtornos
mentais parece ser universal, ocorrendo em todas as sociedades,
independentemente do seu nível de desenvolvimento (WHO, 2001a).
Fatores como insegurança, desesperança, rápida mudança social, riscos de
violência física e problemas de saúde podem explicar a maior vulnerabilidade das
pessoas pobres em todo o país para doenças mentais (PATEL; KLEINMAN, 2003).
Problemas de saúde mental, sociais e comportamentais também podem
interagir para intensificar os efeitos de cada um no comportamento e bem-estar. O
uso de substâncias, violência e abusos de mulheres e crianças, por um lado, e os
problemas de saúde, tais como doença cardíaca, depressão, ansiedade, por outro,
são mais prevalentes e mais difíceis de lidar em condições de elevado desemprego,
baixa renda, educação limitada, condições de trabalho estressantes, discriminação
de gênero, estilo de vida pouco saudável, e violações dos direitos humanos
(DESJARLAIS; EISENBERG; GOOD; KLEINMAN, 1995).
Uma das escolhas mais importantes a serem feitas — e um fator
determinante no bem-estar de um indivíduo — diz respeito ao equilíbrio trabalho-
vida; em termos econômicos, a alocação do tempo entre a produção (pagos ou não)
e consumo (incluindo o tempo de lazer com a família e amigos). Estresse e
ansiedade são um resultado frequente para as pessoas que passam muito tempo
trabalhando, cuidando dos outros ou que operam em um ambiente de trabalho difícil
e inseguro, como o é para aqueles que são capazes e dispostos a trabalhar, mas
incapaz de fazê-lo por causa das circunstâncias socioeconômicas adversas (WHO,
2004).
O desemprego está associado com uma maior utilização de cuidados de
saúde e as taxas de mortalidade mais elevadas. A associação também funciona no
sentido oposto; ou seja, problemas de saúde mental são preditores significativos do
desemprego e, na sua esteira, de dívida ou de empobrecimento (OECD, 2011).
Deste modo, o desemprego é um fator de risco bem estabelecido para doenças

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Saúde mental e deficiência visual

mentais, enquanto que o começo ou reinício do trabalho são fatores de proteção


(LUND et al., 2011).
Outra dimensão do núcleo de bem-estar individual é a própria saúde, não só
pelo seu valor de habilitação (para a realização de atividades de trabalho e lazer),
mas também o seu valor intrínseco; ou seja, as pessoas preferem ser saudáveis a
doentes. Problemas de saúde ou deficiência constituem, portanto, outro fator de
risco importante para o bem-estar psicológico, em geral e depressão em indivíduos,
em particular (PRINCE et al., 2007).
Pessoas com doença crônica ou deficiência têm um risco elevado de
marginalização social ou comunitário de atividades, particularmente os mais
estigmatizados. Soma-se a isso o fato de possuírem uma carga psicológica devido
aos desafios de viver com a doença, a exemplo de um estilo de vida alterado, o fato
de possuir uma doença prolongada ou a possibilidade de morte prematura. Isso
contribui com restrição de oportunidades e redução na capacidade produtiva, com
impacto socioeconômico (WHO, 2012).
Existe um componente de sofrimento subjetivo associado a toda e qualquer
doença, às vezes atuando como entrave às práticas preventivas de vida mais
saudáveis. Como resultante, todo problema de saúde é também de saúde mental, e
toda saúde mental é também produção de saúde (BRASIL, 2005; BEDIN;
SCARPARO, 2011).
Com vistas à libertação deste sofrimento psicológico, o indivíduo que enfrenta
uma nova condição traumática, como a aquisição de uma deficiência visual.
experimenta fases de mudanças, em um processo de aceitação e de enfrentamento,
sobrepostas à lamentação, o que Kübler-Ross (1981) denominou fases do luto
normal. Esta autora descreve cinco estágios do luto pelos quais uma pessoa pode
passar: a) negação ou isolamento; b) ira; c) barganha; d) depressão; e) aceitação.
Tais reações quanto à perda da visão não são lineares e nem podem ser
generalizadas, pois cada indivíduo reage e se adapta à nova condição de forma
diferenciada, conforme sua história de vida, recursos psicológicos, apoio familiar e
social, compondo subsídio pessoal e intransferível para que o sujeito consiga
reorganizar-se psiquicamente (SIMÕES, 2014; AFONSO; MINAYO, 2013; BRITO,
2009; DOURADO; COSTA, 2006).
Como observada, a subjetividade é construída no decorrer da vida, a partir
das relações sociais com toda sua riqueza, possibilidades e limitações (BOCK;

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Saúde mental e deficiência visual

FURTADO; TEIXEIRA, 1999). Para esta compreensão e eficaz intervenção em


saúde mental é fundamental a centralidade nos usuários, como aqueles que gastam
sua vida de certos modos e não outros, que usam sua capacidade de viver para
produzir modos de caminhar na vida, sendo a saúde esta possibilidade de criar seus
mecanismos de gastar a potência de viver, logo, como produtores e portadores das
necessidades de saúde (MERHY, 2006).
Mais pesquisas sobre aspectos biológicos e sociais da saúde mental são
necessárias a fim de aumentar a compreensão de possíveis perturbações mentais e
desenvolver intervenções mais eficazes. Essa investigação deve ser realizada em
diversos contextos a fim de entender variações entre as comunidades e para
aprender mais sobre os fatores que influenciam a saúde mental de seus membros
(WHO, 2001a), a exemplo de pessoas com deficiência visual, conforme abordado na
presente pesquisa.

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Saúde mental e deficiência visual

Trata-se de uma pesquisa descritiva e exploratória, com abordagem


qualitativa, uma vez que compreendemos que o objeto de estudo circunscreve-se
ora em níveis da realidade, onde os dados se apresentam aos sentidos como níveis
ecológicos e morfológicos, ora como valores, crenças, representações, hábitos,
atitudes e opiniões (MINAYO, 2008).
Assim sendo, a pesquisa qualitativa volta-se ao aprofundamento da
complexidade de fenômenos, fatos e processos particulares e específicos de grupos
mais ou menos delimitados em extensão e capazes de serem abrangidos
intensamente (MINAYO; SANCHES, 1993).

A pesquisa ocorreu no ambulatório de oftalmologia do Hospital Universitário


Onofre Lopes (HUOL), na cidade de Natal/RN, no período de agosto e setembro de
2015. A escolha deste local deve-se ao fato de ser um centro de referência público
que acolhe pessoas de todo o estado do Rio Grande do Norte com patologias
oculares em estágios avançados.
O referido ambulatório teve seu funcionamento iniciado no ano de 1909,
voltado ao atendimento de pessoas com insuficiência de recursos financeiros, em
caráter filantrópico e assistencialista (CARLOS; GERMANO; PADILHA, 2013).
Atualmente a sua equipe é composta por médicos residentes e docentes e
realiza mensalmente atendimento clínico, exames complementares e procedimentos
cirúrgicos. Para ser atendido, é necessário que o paciente seja encaminhado pelas
Unidades Básicas de Saúde de Natal e Secretarias de Saúde dos municípios do Rio
Grande do Norte, através do sistema de Regulação da Gestão Municipal do
SUS/Natal.

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Saúde mental e deficiência visual

Foram incluídos na pesquisa os usuários com idade acima de 20 e abaixo de


60 anos, de ambos os sexos, com afecção crônica ocular congênita ou adquirida, e
com acentuado grau de acometimento visual, definido por acuidade visual máxima
em ambos os olhos e com a melhor correção óptica possível inferior a 20/200 (0,1
ou 20%) na escala de Snellen, ou por campo visual igual ou menor que 20º, no
melhor olho, ou a ocorrência simultânea de ambos. Esses critérios são definidores
de deficiência visual contida no inciso III, do artigo 4º, do Decreto nº 3.298/99
(BRASIL, 1999), que dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa
Portadora de Deficiência. Além disso, esses parâmetros informam graus acentuados
de acometimento visual, equivalente à cegueira (BRASIL, 2010a). Essa faixa etária
compreende 78,6% das pessoas com deficiência visual (IBGE, 2010), um período de
vida onde o sujeito depara-se com realidades vivenciais que exigem um maior grau
de autonomia e independência.

Para a elucidação do tamanho da amostra foi considerado o universo dos


usuários atendidos no ambulatório de oftalmologia do HUOL no período de agosto e
setembro de 2015 e que preenchessem os critérios de elegibilidade propostos.
O período elencado para a coleta dos dados considerou um intervalo de
tempo compatível com as fases de execução da pesquisa e as metas de conclusão,
em atendimento ao preconizado pelo regimento interno do Programa de pós-
graduação em saúde coletiva da UFRN. Deste modo, foram contemplados 16
sujeitos na presente pesquisa.

Foram realizadas entrevistas semiestruturadas (Apêndice I), que combinaram


perguntas fechadas ou estruturadas e abertas, proporcionando ao entrevistado a
possibilidade de discorrer sobre o tema proposto, sem resposta ou condições
prefixadas pelo pesquisador (MINAYO, 2008).

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Saúde mental e deficiência visual

Sobre esse eixo instrumental, Minayo (2008, p. 262) acrescenta que os


conteúdos advindos por meio das entrevistas semiestruturadas são informações que
tratam da reflexão do próprio sujeito sobre a realidade que vivencia e a que os
cientistas sociais costumam denominar subjetivos e só podem ser conseguidos com
a contribuição da pessoa. Constituem uma representação da realidade: ideias,
crenças, maneiras de pensar; opiniões, sentimentos, maneiras de sentir, maneiras
de atuar; condutas; projeção para o futuro; razões conscientes ou inconscientes de
determinadas atitudes e comportamentos, devendo contar com um roteiro de
questões ou assuntos a serem abordados de forma que as mesmas levem ao
atendimento do objetivo proposto.
As entrevistas foram gravadas por meio de aparelho de mp3 e,
posteriormente, transcritas na íntegra. Realizamos um estudo piloto com dois
sujeitos com deficiência visual grave, porém com faixa etária não contemplada pelos
critérios de elegibilidade de nossa pesquisa. Deste modo, foi possível testar, avaliar,
revisar e aprimorar os instrumentos e procedimentos de pesquisa (BAOÇER;
TOMITCH; D’ELY, 2011). Após o teste piloto, redigimos novamente algumas
perguntas, a fim de obter uma melhor compreensão e elucidação das mesmas pelos
entrevistados. Os sujeitos dessa fase não foram incluídos para análise, por
apresentarem idade inferior ao estabelecido nos parâmetros de inclusão.

O projeto foi submetido para apreciação e deliberação do Comitê de Ética em


Pesquisa do Hospital Universitário Onofre Lopes da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte e obteve aprovação, sob parecer de número 1557507, em 24 de
Julho de 2015, conforme regulamentação da pesquisa envolvendo seres humanos –
Resolução nº. 466, de 2012, do Conselho Nacional de Saúde. Ver Anexo A
(BRASIL, 2012b).
Previamente à realização da entrevista semiestruturada, foram esclarecidos
os objetivos da pesquisa e apresentado o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE), ver Apêndice B, que foi assinado pelos sujeitos da pesquisa.
Apenas um convidado, além dos 16 que anuíram em participar, recusou-se devido a
diligências particulares.

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Saúde mental e deficiência visual

A análise dos resultados foi feita com base no método de análise temática
proposto por Minayo (2008), que consiste em investigar grupos de significados que
compõem a comunicação referente ao objeto analítico almejado. A análise temática
se encaminha para a contagem de frequência das unidades de significação como
definidoras do caráter do discurso. A presença de determinados temas denota os
valores de referência e os modelos de comportamento presentes no discurso.
Operacionalmente a análise temática desdobra-se em três etapas: a) pré
análise: composta por leitura flutuante, constituição do corpus, formulação de
hipóteses e objetivos; b) exploração do material: por meio de codificação em
unidades de registros, construção de índices, classificação e agregação dos dados
em categorias teóricas ou empíricas; e c) tratamento dos resultados obtidos e
interpretação: trabalho com os significados obtidos e realização de interpretações
(MINAYO, 2008).
Deste modo, realizou-se inicialmente a leitura e releitura do material obtido na
entrevista. Para a organização e apresentação dos resultados, foram construídas
categorias, de acordo com as temáticas que foram surgindo das falas dos
participantes durante as entrevistas realizadas, tendo por base constitutiva as
unidades de registro inspiradas no modelo de Determinação social da saúde,
proposto por Dahlgren e Whitehead (1991). Essas unidades de registro permitiram
um ponto de partida para a convergência de temas afins, sucedendo-se as
subcategorizações afiliadas.
Para Minayo (2008), categorizações são empregadas para estabelecer
classificações, ou seja, agrupar elementos, ideias ou expressões em torno de um
conceito capaz de abranger de um modo geral qualquer tipo de análise em pesquisa
qualitativa.
Os resultados dos discursos obtidos foram analisados à luz das
conceituações de normal e patológico trazidas por Canguilhen (2006) e as
influências destas concepções no contexto sociocultural contemporâneo, com foco
nos determinantes sociais de saúde no cotidiano de sujeitos com deficiência visual.
Em suma, a saúde implica poder adoecer e sair do estado patológico. Em
outras palavras, a saúde é entendida por referência à possibilidade de enfrentar
situações novas, pela “margem de tolerância ou de segurança que cada um possui

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Saúde mental e deficiência visual

para enfrentar e superar as infidelidades do meio”, ou ainda “um guia regulador das
possibilidades de reação” (CANGUILHEM, 2009, p. 148-149).
Ao investigar os determinantes sociais de saúde mental, fazemos uma ponte
com a atualidade das políticas públicas, saberes e práticas de saúde mental na
atualidade e resgatamos a crítica ao excesso de patologização da vida tendo como
finalidade destacar as invenções de saúde como estratégias de inclusão social de
sujeitos historicamente rotulados e excluídos por deficiências. Nesse sentido,
Amarante (2007), no âmbito do movimento de Reforma Psiquiátrica brasileira, refere
que:

Se a doença é colocada entre parênteses, o olhar deixa de ser


exclusivamente técnico, exclusivamente clínico. Então, é o doente, é a
pessoa o objetivo do trabalho, e não a doença. Desta forma a ênfase
não é mais colocada no processo de cura, mas no processo de
invenção da saúde e de reprodução social do paciente (AMARANTE,
1996, p. 105).

Assim, reforça-se o elo da investigação pelos ditos e interditos da razão e a


contestação dos estranhos da sociedade e seus entre-lugares. Isso permite uma
abordagem reflexiva e crítica concernente à realidade contemporânea das pessoas
com deficiência visual e como elas reagem frente às infidelidades do meio, que lhes
são peculiares e os fatores de múltipla determinação neste processo, dos quais
sobressaem os determinantes sociais de saúde.

A pesquisa foi realizada no período de 30 de julho a 2 de setembro de 2015


no Ambulatório de Oftalmologia do Hospital Universitário Onofre Lopes, da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Foram considerados aptos a compor
o corpus do estudo os sujeitos com acuidade visual no melhor olho de 20/200 e com
idade compreendida entre 20 e 60 anos. Os pacientes que atendiam a esses
critérios eram convidados a participar da pesquisa, os quais eram submetidos à
apresentação formal do pesquisador, bem como a uma detalhada explicação sobre
a pesquisa, seus objetivos e metodologia. Após essa apresentação, os sujeitos
receberam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, assinando-o caso
concordassem em participar. Depois se deu início a coleta dos dados.

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Saúde mental e deficiência visual

As entrevistas foram realizadas pelo próprio pesquisador com os sujeitos


participantes, os quais eram acompanhados eventualmente por familiar ou amigo,
em uma sala anexa ao ambulatório. As entrevistas duraram de vinte a quarenta
minutos. Foram gravadas, em formato mp3, com a autorização dos sujeitos e,
posteriormente, transcritas. As gravações e transcrições das entrevistas foram
utilizadas para a análise e interpretação dos conteúdos.
O estudo piloto foi realizado com duas pessoas que obedeceram aos critérios
de inclusão propostos, sem levar em consideração o critério de idade, para a
testagem do instrumento de coleta e de sua aplicação. Tais sujeitos não integraram
a amostra por terem idade inferior à estabelecida neste estudo. Em seguida, foram
procedidos ajustes no questionário para melhor compreensão das perguntas pelos
entrevistados.
Na fase de campo, foram identificadas 17 pessoas que atendiam aos critérios
de elegibilidade, entretanto, um destes sujeitos recusou-se a participar por não
dispor de tempo hábil para a entrevista. Ao final, foram selecionadas 16 pessoas que
concordaram em participar da pesquisa e atendiam aos critérios de inclusão.
Na caracterização dos entrevistados, os mesmos foram identificados a partir
da nomenclatura adotada, a qual atribuiu o prefixo S, de sujeito de pesquisa,
seguida por número cardinal, considerando-se o sigilo dos entrevistados (vide
Apêndice C).
Os dados foram analisados e interpretados, buscando-se a construção do
conhecimento com base nos objetivos da pesquisa. Para tanto, foram
confeccionadas categorias temáticas a partir das leituras e releituras das entrevistas,
sob a ótica estruturante dos determinantes sociais de saúde, abarcados nas
unidades de registro.
Para confecção de tais unidades, foi adotado como marco conceitual o
modelo de determinação social da saúde, proposto por Dahlgren e Whitehead
(1991), por sua fácil visualização gráfica, compreensão e interpretação (BUSS;
PELLEGRINI FILHO, 2007; GEIB, 2012).
Por último, dentre os principais referenciais teóricos utilizados para a
interpretação dos conteúdos textuais provenientes das entrevistas dos sujeitos
pesquisados destacam-se: Canguilhem (2006), Goffman (1988), Küble-Ross (1981)
e Amiralian (1997).

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Saúde mental e deficiência visual

Participaram do estudo 16 pessoas com deficiência visual, congênita ou


adquirida, com idade compreendida entre 20 e 60 anos. Oito pessoas eram do sexo
masculino (S3, S4, S6, S7, S8, S9, S10 e S12) e oito eram do sexo feminino (S1,
S2, S5, S11, S13, S14, S15 e S16), conforme discriminados no Apêndice C. Das 16
(dezesseis) pessoas com deficiência visual que participaram desta pesquisa, um
tinha deficiência visual congênita (S9) e os demais possuíam deficiência visual
adquirida.
O tempo de início da deficiência visual variou de dois meses (S1) a 52 anos
(S9). Quanto ao local de moradia, oito pertencem à região metropolitana de Natal
(S1, S4, S7, S8, S10, S13, S15 e S16), cinco pertencem à mesorregião Agreste
Potiguar (S3, S5, S6, S9 e S11), dois à Mesorregião Central Potiguar (S2 e S14) e
01 (um) à Mesorregião Oeste Potiguar (S12).
O nível educacional variou de analfabeto (S4) a ensino superior completo
(S7), sendo que nove possuem ensino fundamental incompleto.
A ocupação dos entrevistados aponta para uma predominância de
aposentados (S3, S4, S5, S9, S10, S11, S16) e pessoas em inatividade (S1, S2,
S12, S13, S15).
Treze entrevistados apresentam renda média familiar entre um e dois salários
mínimos. Apenas três deles possuem renda entre dois e três salários mínimos.

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Saúde mental e deficiência visual

Conhecer a saúde mental dos sujeitos que convivem com uma deficiência
visual requer um olhar sensível frente ao contexto social em que estes sujeitos estão
inseridos, como são tratados no meio social e a maneira pela qual são
condicionados a agir.
Nesta abordagem, destaca-se a contribuição de fatores individuais e
contextuais como determinantes da saúde mental e suas repercussões nos modos
de ser e andar a vida, imersos em uma trama de relações intercambiáveis: saúde
física, trabalho, condições econômicas, aspectos educacionais, interação social,
lazer, autonomia, condições de acessibilidade e valores sociais.
Ao aproximar-se da realidade vivencial dos sujeitos com uma deficiência
visual, observamos que certas características fazem parte do processo de
determinação psicossocial: história de vida, organização social e familiar, aspectos
culturais, aspectos financeiros, dentre outros, abarcados pelas múltiplas formas de
viver com a deficiência.
Assim, é que a constituição do sujeito psicológico envolve as dimensões
individual e coletiva. No âmbito individual, interações entre saúde física e mental são
identificadas.
O diagnóstico e a assimilação de uma deficiência visual repercutem na
subjetividade e antecipa novas realidades existenciais que por sua vez, requerem
abordagens de enfrentamento.
Neste ínterim, o modo de instalação, idade do acometimento, presença de
comorbidades ou de dor, o grau da deficiência e a capacidade de lidar com a
adversidade são elementos chaves na maneira pela qual a perda visual é
vivenciada.
Tendo como substrato os determinantes sociais de saúde, a partir dos
discursos provenientes das entrevistas, foram delimitadas as seguintes categorias
temáticas: Saúde e sofrimento psíquico, abordando da clínica individual às reações
emocionais no encontro com o não ver; A autonomia e seus desafios cotidianos;
Interação social e suas redes de pertencimento; Os valores e a cultura nos

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Saúde mental e deficiência visual

processos de normalização e estigmatização; A educação, seus limites e


possibilidades; A conjuntura do trabalho nos processos de inclusão e exclusão
social.
Estas categorias foram construídas, buscando-se a compreensão dos modos
de vida dos sujeitos da pesquisa, com direcionamento capaz de atender com maior
fidedignidade possível aos objetivos propostos, contudo sem esgotar as múltiplas
determinações de saúde, devido à incompletude quanto à abrangência conceitual
extraída do material em análise.

De acordo com Almeida Filho e Andrade (2003), o tema saúde-doença,


enquanto objeto complexo, deve ser apreendido com base em suas diferentes
dimensões ou faces hierárquicas, partindo-se do nível microestrutural (molecular ou
celular), passando pelo subindividual (órgãos ou sistemas), pela clínica individual,
pela epidemiologia e por fim, pelas interfaces ambientais e simbólicas. Nesta
abordagem totalizadora e de múltiplas determinações, respeita-se a complexidade
dos fenômenos da vida, saúde, doença, sofrimento e morte (BATISTELLA, 2007).
Assim, parte-se de um nicho proximal ao indivíduo, no tocante à sua saúde,
tendo a saúde mental como objeto analítico. Em categorias subsequentes, os
entornos mesodistais do processo saúde-doença são contemplados na análise, a
partir da experimentação da deficiência visual, por meio do aprofundamento nas
dimensões determinantes da superestrutura saúde/enfermidade.
Nesse sentido, a deficiência visual pode ser vista em diferentes graus,
podendo ser caracterizada como cegueira congênita e cegueira adquirida. A primeira
refere-se àquela que a pessoa já nasce com ela, ou seja, ocorre antes ou durante o
nascimento. A segunda, a pessoa adquire em qualquer outro período da vida
(ALMEIDA, 2013).
Existem diferenças experienciais entre cegos congênitos e adquiridos, uma
vez que o cego congênito não apresenta sentimentos de perda, pois ele nunca teve
essa experiência, a cegueira para eles não é algo insuperável, trágico, pois se
desenvolveu e aprendeu sem esse sentido. Entretanto, a cegueira adquirida causa
uma ruptura nos padrões já constituídos de comunicação, mobilidade, trabalho,

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Saúde mental e deficiência visual

recreação e sentimentos, tornando-se uma experiência inevitavelmente traumática


(AMIRALIAN, 1997).
Fica explícito que, no caso de deficiências adquiridas, há uma ruptura na vida
subjetiva e cotidiana do sujeito:

É uma dificuldade, lógico, não vou tapar o sol com a peneira, eu


fiquei deficiente com quase 30 anos de idade, que eu vou fazer 29
agora e que é bastante difícil. [...] Eu fiquei com medo de ficar com
depressão, porque eu passei uma semana dentro de casa, sem
vontade de comer, sem vontade de falar com as pessoas, desejando
a morte. Pra mim o mundo tinha acabado (S1).

No caso de S5, apesar de ter iniciado a deficiência visual na infância, houve


agravamento na idade adulta, com repercussão na sua dinâmica de vida e bem-
estar e comprometimento de seu estado funcional.

Desde três anos de idade eu sou ruim da vista, quase cegava. Sei
que minha mãe fez umas promessas e eu melhorei. Aí agora
começou a ficar ruim. Faz mais de 10 anos que começou a piorar. Af
Maria! Tem dias que dá vontade de me enforcar num pé de coentro,
porque é ruim demais. [...] Lá eu só vivo nas calçadas olhando pro
mundo (S5).

Para S12, experimentar a deficiência visual no início da idade adulta envolve


uma insegurança em suas pretensões de vida e realização pessoal, munindo-se de
uma atitude reflexiva e contemplativa de sua situação prévia à deficiência.

No começo eu tinha 18 anos, foi bem difícil sim. Eu pensava que não
ia conseguir mais arrumar alguém. A gente que é novo pensa logo
ninguém vai querer mais namorar com a gente. Pensa logo que os
amigos vai ser mesmo aquele mesmo jeito com a gente. Parei de
jogar bola. [...] Aqui e acolá quando você fica sozinho no quarto, bate
aquela tristeza, sabe. Ela bate, você fica pensando como você
enxergava de primeira, aí é difícil, sabe (S12).

Segundo Pereira (2008), seja em deficiências congênitas ou adquiridas, a


ocorrência de uma deficiência altera – em maior ou menor grau – os modos de vida
da pessoa, considerando-se também o universo sociocultural no qual está imerso,
uma vez que nela estão colocadas as concepções, as explicações e os
comportamentos próprios daquele contexto.
Estudos realizados parecem mostrar que quanto mais cedo ocorre a cegueira
maior será sua influência sobre o desenvolvimento da personalidade e maior o peso

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Saúde mental e deficiência visual

concedido à ausência da visão, enquanto que, nas cegueiras adquiridas


posteriormente, os efeitos sociais e as condições do sujeito anteriores ao evento
frustrador tornam-se preponderantes (AMIRALIAN, 1997).
Há, entre os cegos, diferenças quanto à forma de instalação súbita ou
progressiva da deficiência. Fator de grande peso nos efeitos que a cegueira produz
no desenvolvimento dos sujeitos.
Nessa tônica, S3 e S8 vivenciaram condições de perda visual súbita, seja
com intensas reações emocionais ou com ruptura na vida cotidiana e retração social.
Vejamos:

Eu trabalhava na agricultura e uma carroça de boi virou por cima de


mim e cortou minha cabeça. Eu vi a visão diferente e fui bater ali na
clínica e cheguei lá e disse: Dr. tô vendo uma coisa diferente, quando
ele chegou lá, ele disse: sua retina tá descolada, amigo. Aquilo foi
um choque pra mim, eu sozinho, aí eu fiquei desesperado (S3).

Eu sofri um acidente, em 2003, fui atropelado por um ônibus, e com


um mês depois começou a dar o problema do descolamento de
retina no meu olho. Depois fiz várias cirurgias, mas não houve jeito:
cegueira completa. Eu tinha uma vida bem ativa, aí quando eu perdi,
eu fiquei muito dentro de casa, trancado, foi difícil pra mim aceitar.
Foi isso, eu passei nesse processo dois anos (S8).

Por outro lado, S2, ao se deparar com uma forma progressiva de instalação
da deficiência visual, expressa uma maior capacidade adaptativa e de
enfrentamento positivo.

Meu problema de visão começou de uns tempos pra cá, há pouco


tempo, uns três anos. Fui perdendo aos poucos. Enfrentei como
qualquer um enfrenta e possa enfrentar um dia (S2).

Diante do exposto, compreendemos que a pessoa, cuja perda da visão deu-


se forma súbita, reage inicialmente ao choque sofrido de modo intenso e, só
posteriormente, passa a lamentar as perdas percebidas, num processo de
conscientização. Já na cegueira progressiva, a ausência do choque é uma
característica comum, favorecendo a convivência com a ideia de que pode tornar-se
cego, permitindo um maior tempo para elaboração de estratégias de enfrentamento,
por meio de acesso à informação e apoio, mesmo que conviva com um estado de
contínua ansiedade pela ameaça de um perigo iminente (AMIRALIAN, 1997).

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Saúde mental e deficiência visual

Diferenças quanto à quantidade de visão residual são referidas também como


interferentes no modo de ajustamento do sujeito às demandas cotidianas, bem como
na sua percepção de sujeito deficiente. Como demonstrado por S1, o agravamento
da deficiência trouxe nítido prejuízo no seu planejamento de vida:

Agora que antes, quando eu ainda enxergava um pouco, eu não tive


um impacto que nem eu tive agora recente, que eu fiz a cirurgia pra
ver se colava a retina em maio de 2015, dia 12 de maio, só que a
retina descolou no dia 9 de Junho, menos de um mês. Agora que eu
vi mesmo que eu fiquei deficiente visual, porque até os 20% eu não
me considerava deficiente visual, eu queria ter uma vida normal,
queria ter filhos, tinha planos na minha vida, mas infelizmente agora
que caiu a consciência, assim, a ficha, como se diz, que eu fiquei
deficiente visual, e o pior foi o diagnóstico, que não tem mais como
reverter, ficou irreversível. Agora eu tô tentando superar, porque eu
ainda não superei não. (S1).

Segundo Santos (2004), cegueira pode se referir a vários graus de visão


residual e não significa, necessariamente, total incapacidade para enxergar, mas
sim, prejuízos que comprometem a execução das tarefas rotineiras.
Conforme o grau de visão residual, passam a existir diferenças de impacto
psicossocial, modulando a capacidade adaptativa, os modos de enfrentamento, a
aceitação e a reorganização, influências importantes sobre a gravidade da própria
incapacidade relacionada com a deficiência visual e preditores do estado de bem-
estar (GARCIA, 2014).
Desse modo, uma vez instalada a deficiência visual, o indivíduo passa a
enfrentar possíveis consequências, seja por sintomas decorrentes da patologia de
base, seja pelo surgimento de comorbidades decorrentes direta ou indiretamente da
condição visual.
Pessoas com deficiência visual apresentam uma redução no controle do
equilíbrio corporal, acarretando em dificuldades para deambular. Isso se
correlaciona a um maior grau de inatividade física e um maior risco de quedas
(JONES; CREWS; DANIELSON, 2010).
Algumas consequências adversas para a saúde física são manifestadas após
a perda visual e o convívio com a nova realidade de vida. São expressas por alguns
sujeitos quando inqueridos acerca das principais mudanças e limitações, advindas
após o diagnóstico, e os modos de enfrentamento recrutados, mitigando-se as
práticas de lazer, socialização, autonomia e disposição para a vida, além de uma

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Saúde mental e deficiência visual

maior vulnerabilidade à certas comorbidades, notadamente as cardiovasculares e


osteometabólicas. Seguem os exemplos:

Depois da deficiência, acabou-se minha força e meu fôlego (S4).

Eu gosto muito de jogo de futebol, eu já joguei muito, hoje eu não


jogo mais. Joguei até o ano passado, mas machuquei o joelho. Com
essa dificuldade eu ainda jogava (S7).

No momento eu não me considero mais com boa saúde não. Se eu


der uma carreirinha daqui pra porta do hospital se não me segurar eu
caio, não tenho mais fôlego. A força que eu possuía antigamente
quando eu trabalhava, eu não tenho mais. O preparo do meu corpo
acabou porque eu corria atrás de bola, 180 minutos e não cansava.
Muita coisa eu perdi. Aí as pessoas me chamam de gordo. Quero
tentar fazer o que eu fazia e não consigo mais. Não sou mais o que
eu era não! (S4).

Eu aumentei muito de peso, e tem que caminhar, mas eu não posso


tá caminhando. É muito ruim. Eu fico só dentro de casa, só (S10).

Só não varro casa, porque canso. Eu sofro de pressão também. Tem


dias que a pressão sobe muito de preocupação, desembesta mesmo.
Um dia deu um negócio na minha boca, ficou com a boca torta...
trombose (S5).

Além disso, segundo Valter et al. (2010), há alta prevalência de obesidade


entre pessoas com deficiência física e visual. Isto se dá devido a maior restrição no
desempenho normal de suas atividades cotidianas e ao sedentarismo, além de uma
inadequada ingestão alimentar, qualitativa e quantitativamente. Como consequência,
são mais propensos ao desenvolvimento de condições de risco, tais como
problemas ósseos e musculares, diabetes, hipertensão arterial, dislipidemia e
síndrome metabólica, acarretando em uma maior tendência de desenvolvimento de
doenças cardiovasculares (SERON et al., 2012).
Outro aspecto notado é que enquanto alguns pesquisadores centram suas
questões na análise das dificuldades decorrentes da ausência ou limitação da
percepção visual, outros consideram as condições sociais como causa das maiores
dificuldades enfrentadas pelos cegos (AMIRALIAN, 1997). Entretanto, na presente
pesquisa, tais situações se superpõem e interagem em reforço mútuo e
indissociável, delineando os aspectos psicossociais e afetivos dos sujeitos em
análise, numa trama de relações intercambiáveis.

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Destarte, a dor é uma experiência recorrente diante de uma alteração ocular e


expressa uma manifestação da patologia subjacente, diretamente (S11, S12 e S16)
ou em decorrência de sofrimento psíquico (S5).

Às vezes dá dor de cabeça que eu só falto correr doida. A dor de


cabeça pensando na vida... tem dia que eu penso: sei lá como é que
eu vou viver... morrer logo... (S5).

Eu sinto muita dor em cima dos olhos e os olhos é só correndo


lágrima e doendo (S11).

Se eu dormir pro lado do olho afetado ele dói. Aqui e acolá ele ainda
dói, tem pontos ainda dentro dele (S12).

Tem horas que a gente não se sente normal, porque quando bate
aquele... Aqui acolá fica doendo, aí você fica com aquilo pra você,
assim, pensando que aquilo vai ser pro resto da sua vida. Saber que
isso é pro resto da sua vida doendo desse jeito. Aí é bem difícil a
gente encarar (S12).

O que me deixa mais aflito hoje é a dor (S12).

A lente é importada, incomoda demais, porque coça muito. [...] Sinto


muita dor de cabeça por causa do glaucoma, dói muito (S16).

Eu lavo roupa, eu lavo meus pratos, eu varro a casa, eu passo pano


na casa. Tem dias que eu posso fazer, tem dias que eu não posso,
porque a dor de cabeça e a tontura às vezes não deixa (S16).

De acordo com Cunha e Mayrink (2011), há uma influência negativa na


qualidade de vida e nas relações sociais daqueles que experimentam uma dor
crônica. Isto se deve a uma maior associação de fatores como depressão,
incapacidade física e funcional, dependência, afastamento social, mudanças na
sexualidade, alterações na dinâmica familiar, desequilíbrio econômico,
desesperança e sentimento de morte, acarretando sofrimento físico e psíquico. Além
disso, observa-se uma maior incidência de sintomas como fadiga, anorexia,
alterações do sono, constipação, náuseas e dificuldade de concentração, entre
outros.
Apesar de não ser uma sintomatologia universal encontrada nos relatos,
percebemos que para os que apontam a dor crônica como uma manifestação
rotineira, esta se faz às custas de implicações para a subjetividade dos mesmos e
consequentemente para o seu bem-estar emocional e social. Deste modo, a dor

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Saúde mental e deficiência visual

crônica ocupa o centro da vida do indivíduo, uma vez que passa a limitar e
direcionar seus comportamentos e atitudes.
Segundo Fernandes (2009), não existe separação de fato, entre mente e
corpo, assim como se reconhece uma enorme influência do contexto social na saúde
e na doença. Deste modo, todo sintoma tem um componente físico, ao lado de
componentes emocionais e sociais, o que requer uma compreensão integral do ser
humano.
O conhecimento acerca de percepções de saúde mental e reações
emocionais vivenciadas por quem enfrenta uma deficiência visual permite
compreender melhor os comportamentos e suas influências na dinâmica social,
imersos num processo de retroalimentação.
Cabe ressaltar ainda a influência de história de vida, expectativas para o
futuro e a capacidade de aceitação como influenciadores na intensidade e qualidade
da apreensão emocional construída, particularmente, no tocante à deficiência
adquirida.
Para Barczinski (2001), do ponto de vista psicológico, mesmo o indivíduo
mais saudável mentalmente utilizará mecanismos importantes para a sua adaptação
à cegueira. Esses mecanismos são conhecidos como modos de enfrentamento.
Os entrevistados revelaram os sentimentos que os rondaram desde o início
do diagnóstico da deficiência até o presente, constatando, em alguns, a elaboração
de fases ou ciclos de transformação e, em outros, certo encarceramento em
sentimentos adversos, reflexos das influências recíprocas estabelecidas entre o
mundo interior e o mundo externo, perpassados pela marca de ser diferente ao se
deparar como deficiente visual. Esses foram apresentados como: choque,
desespero, raiva, ansiedade, medo, tristeza, angústia, depressão, sentimento de
inferioridade e desqualificação.
Küble-Ross (1981) descreve um modelo de enfrentamento no qual uma
pessoa pode experenciar diante de uma perda, luto ou tragédia sofrida. Este modelo
proporciona subsídios para que o sujeito psicológico consiga se reorganizar e é
composto por cinco estágios: choque e negação, raiva, barganha, depressão e
aceitação.
Um estado de choque pode ser uma das primeiras reações enfrentadas
diante de uma perda de visão e geralmente vem com o diagnóstico. O indivíduo

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Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 47 )
Saúde mental e deficiência visual

torna-se atônito, imóvel e letárgico temporariamente, por necessitar de tempo para


absorção da ideia. S3 e S14 exemplificam este momento:

Aquilo foi um choque pra mim, eu sozinho, aí eu fiquei desesperado


(S3);

O início pra mim foi um desespero. Os primeiros dias foram muito


ruins pra mim. Af Maria! é ruim uma escuridão só (S14).

Após o choque, segue-se uma subfase mais ou menos curta de negação,


momento este necessário para a compreensão, por parte do sujeito, daquilo que se
passa. Isso permite que o seu conteúdo psíquico elabore mecanismos ajustáveis ao
enfrentamento (KUBLER-ROSS, 1981).
Em seguida, o indivíduo percebe a perda sofrida e, portanto, é natural que ele
apresente reações orgânicas diante da agressão decorrente da perda de uma parte
sua. Ele pode apresentar sentimentos contraditórios e muitas vezes confusos, como:
raiva, medo, tristeza, culpa, depressão e dor. Com o tempo, a pessoa passa a
utilizar outras defesas. Surge, portanto, o segundo estágio, caracterizado pela raiva,
na qual o indivíduo vê-se mutilado de seus sonhos e planos, incomodado pelo
cenário externo às suas possibilidades momentâneas (KÜBLER-ROSS, 1981). S5,
S8 e S11 vivenciam este momento em seus cotidianos:

Sei lá, pra mim eu não tenho é juízo. Porque eu sou muito
alvoroçada... Se eu tiver raiva de uma coisa, dá vontade de eu logo
quebrar... Eu não tenho o juízo bem certo não (S5).

Chega um momento que você se estressa, você se explode. Mas é o


corpo que precisa disso, desabafar, explodir, até pra você
descarregar isso. E isso é bom o corpo. Acho que saúde mental é um
pouco de tudo. Você tem que explodir, tem que tirar o estresse (S8).

Tem hora que eu fico muito aperreada, fico sem sossego, é uma
agonia terrível. É uma coisa assim que não dá pra comparar. No dia
que eu fico preocupada com qualquer coisa, de noite eu não consigo
dormir, bolando, fico em claro. Eu fico muito preocupada, muito
nervosa porque eu não posso enxergar (S11).

Segundo afirma Kubler-Ross (1981), a raiva é o deslocamento do problema


para o outro, que passa a ser visto como o responsável por sua adversidade.
Outra fase de enfrentamento que pode estar presente no processo de
adaptação do indivíduo é a barganha. Esta se caracteriza pela ação do indivíduo de

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Saúde mental e deficiência visual

negociar trocas entre o inconsciente e o real através do fantasioso, ou seja, o


indivíduo acredita que vai eliminar o problema com uma resolução mágica, a
exemplo da pessoa que recorre a Deus para obter a restituição visual (KÜBLER-
ROSS, 1981).

Eu tenho fé em Deus que eu recupero minha visão. A fé remove


montanhas. Sou católica. Mas tenho fé em Deus. Nada pra Deus é
custoso. Tenho fé em Deus que minha vista volta ao normal. Eu não
perdi minha visão de uma vez? Ainda to vendo. Tenho muita fé em
Deus, mas vou voltar a vê normal (S16).

Se o sonho deles é ver, que eles lutem, que ele um dia consegue.
Que Deus não dorme (S14).

Eu vou passar por esse momento do transplante e to pedindo muito à


Deus que me restabeleça minha visão e que eu possa ver
normalmente, principalmente as coisas boas que as nossas vidas
nos oferece (S7).

Só Aquele mesmo pra me dar uma situação (S4).

Os relatos apontam um forte componente religioso no qual se ancoram


projeções, metas e sonhos, os quais permitem a elaboração de uma estratégia de
enfrentamento alicerçada na esperança, seja de voltar a enxergar, de estabilização
do quadro clínico, ou simplesmente de amparo.
A tristeza, angústia e depressão são marcas recorrentes em algum momento
na vida dos entrevistados. A maioria deles evidenciou estes sentimentos ao se
depararem com a perda visual, com prejuízo em suas qualidades de vida. Diversas
causas são apontadas: a perda visual em si, o desconhecimento de como enfrentá-
la, a falta de fé, a parada da vida profissional, o modo de comunicar a deficiência
pelo médico, o isolamento e a perda de autonomia. Seguem os relatos:

Eu fiquei com medo de ficar com depressão, porque eu passei uma


semana dentro de casa, sem vontade de comer, sem vontade de
falar com as pessoas, desejando a morte. Pra mim o mundo tinha
acabado (S1).

Alguns dias atrás, que eu não sei se tava entrando em depressão,


que era o que as pessoas mais tinham medo, porque o meu
pensamento era só desejo de morte (S1).

No início eu tinha medo, angústia (S2).

Eu fiquei muito preocupada, depressiva (S5).

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Saúde mental e deficiência visual

Dá depressão. Não tinha fé em nada. Nos primeiros anos dá


depressão, porque não tem conhecimento de nada (S6).

Esse problema eu comecei a enfrentar um pouco triste (S7).

Eu tinha uma vida bem ativa, eu trabalhava, aí quando eu perdi, eu


fiquei com depressão (S8).

O médico falou assim pá puf. Eu tava vendo tudo rosa, ele examinou
e disse... infelizmente, você vai perder a visão! Não sei se amanhã
ou daqui a uma semana... mas você vai perder a sua visão. Foi bem
traumático e ele foi logo duro. Se prepare psicologicamente e
aconselho procurar o instituto de cegos. E foi dessa forma. Eu acho
que eu fiquei mais depressivo por isso também, por não ter tido um
preparo, foi automático (S8).

Não é bom não. A pessoa fica desesperada. Tive depressão,


vontade de tomar todos os remédios de uma só vez, chorando muito.
Aquela angústia (S11).

No começo fiquei até depressivo um pouco também, mas ali fiquei


bem abatido mesmo, bem triste (S12).

Eu no início eu fiquei triste (S16).

Sentia desgosto de viver uma vida dessas, sem ter com quem
chamar, pra qualquer coisa né, a dor maior ainda (S9).

Eu senti desgosto, não vou mentir. Eu senti, a reação foi forte (S16).

Não podia mexer nas coisas. Me sentia muito triste (S14).

Passados esses momentos de enfrentamento da condição de cegueira, os


indivíduos passam a se deparar com duas possibilidades: prolongamento de um
estado de luto ou aceitação. Alguns relatos apontam a coexistência de sentimentos
de tristeza e angústia, após meses ou anos do diagnóstico (S4, S7, S13, S15). Em
outros casos, tais sentimentos são intermitentes e convivem com a possibilidade de
aceitação da deficiência (S5, S7, S11, S12). Entretanto, em ambas as situações,
determinantes sociais de saúde desfavoráveis influenciam negativamente na saúde
mental e na existencialidade, próprias de cada um, não devendo ser ignoradas.

A esposa muitas vezes diz que fico um pouco quieto, calado (S7).

Meu filho, a pessoa fica triste, né?. Fica pensando como era a vida
de ontem, assim, pra vida de agora né? (S13).

Agora to mais triste, calada. Tá sendo difícil (S15).

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Saúde mental e deficiência visual

Tando com a visão que Deus dá, a gente se sente mais elevado, e
na situação que eu to, me sinto um cabra recuado, morto (S4).

Afe Maria, tem dias que dá vontade de me enforcar num pé de


coentro, porque é ruim demais. Tem dia que eu penso: sei lá como é
que eu vou viver... morrer logo (S5).

Não é coisa boa não. Tenho sofrido muito por isso. Tem hora que me
dá um desengano, não dá vontade mais de comer. Tem dia que dá
vontade de subir num canto assim e desabar. É muito triste a pessoa
ter a sua visão e depois ser dependente de tudo (S11).

Pra falar a realidade, aqui e acolá eu ainda fico assim triste, sabe?
Aqui e acolá quando você fica sozinho no quarto, bate aquela
tristeza, sabe. Ela bate você fica pensando como você enxergava de
primeira, aí é difícil, sabe. Mas tem momento que você fica bem
triste, bem abatido. Às vezes eu cheguei até a chorar já (S12).

Quando alguém fala e eu não reconheço e a pessoa diz: tás ruim


heim, não tá reconhecendo não? Isso mexe diretamente com nosso
sentimento, com nossa cabeça mentalmente. Porque a gente fica se
sentindo, um pouco assim, pela metade. Isso mexe diretamente com
a nossa mente (S7).

Segundo Dalgalarrondo (2008), o medo é “caracterizado por referir-se a um


objeto mais ou menos preciso”. Deste modo, existe uma infinidade de fatores
desencadeantes do medo, que podem acometer pessoas em todas as faixas etárias,
a exemplo de se deparar com uma nova realidade visual deficitária intransponível.
Trata-se de um estado de progressiva insegurança e angústia, de impotência e
invalidez crescentes, ante a impressão iminente de que sucederá algo que se quer
evitar. Até certo ponto, também é fundamental para a autopreservação frente aos
obstáculos físicos e atitudinais que se deparam o sujeito deficiente visual. S13, S14
e S15 enfrentam o sentimento de medo em seus ajustamentos:

Meu principal medo é tá vivo, porque não é nunca como os tempos


atrás (S13).

Eu acho difícil frequentar esses locais porque eu tenho medo. A


pessoa fica com medo mais que a visão da gente normal (S14).

Tenho medo de nunca mais voltar a enxergar. Tá sendo difícil (S15).

O último estágio, de aceitação ou acomodação é descrita por Kübler-Ross


(1981) como uma possibilidade de compreensão do que foi perdido, em que porção
foi esta perda e como isto influenciará a vida deste indivíduo agora com limitações

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Saúde mental e deficiência visual

às suas ações. Desta maneira, o sujeito se torna capaz de conviver com as suas
limitações integrando-as em sua vida, como demonstrou o participante S4:

Vamos levando... E tem que sorrir, brincar... que chorar não dá jeito...
Tem que passar o dia assim mesmo, Eu tô satisfeito demais e quero
viver até quando os meus filhos já tiverem se virando... Eu só espero
isso aí, cada dia mais a rotina baixar. E a mulher diz: qualquer coisa
eu saio puxando você. E eu digo, pois eu vou precisar mesmo. Minha
força é Deus e ela é meu guia (S4).

O processo de aceitação pode também mobilizar aqueles que estão ao seu


redor: familiares, amigos, comunidade. S8 refere-se a dificuldades na compreensão
familiar de sua condição, o que pode retardar o processo de aceitação ou mesmo
inviabilizá-lo, tendo em vista a representatividade que o apoio familiar exerce neste
momento: “Eu já aceitei, mas eles ainda tem aquela dificuldade de perceber que tem
alguém cego dentro de casa ou na família... foi difícil pra mim aceitar...” (S8).
Para a vítima de cegueira adquirida na idade adulta, esta acomodação pode
ou não acontecer, pois dependerá da intensidade que a perda for sentida. S5
expressa um estado de aceitação parcial: “Eu demorei a aceitar esse problema da
visão. Eu acho que ainda não tô nem aceitando direito” (S5).
Santos (2004), afirma que a tarefa de aceitação das mudanças suscitadas
pela perda da visão não é um processo fácil, nem tampouco imediato. Segundo este
autor, em decorrência da perda de visão, outras perdas ocorrem como: seus
interesses, suas aspirações, sua posição social, sua capacidade, sua aparência e
seus amigos. No início, a pessoa pode reagir expressando seus sentimentos de ira,
depressão ou pesar e em seguida começar a se conscientizar sobre sua condição,
limites e possibilidades, que se relacionam intrinsecamente à história de cada um, e
a seus recursos internos e externos. São realidades estampadas por S7 e S1:

Para tudo nós temos nosso momento, e saber que há tempo para
tudo. Esse meu tempo eu tenho que aceitar que é um tempo mais
limitado (S7).

Aí foi quando eu comecei a enxergar com outros olhos, né? Os olhos


que não tão deficientes, né? E, aí eu penso dessa forma, que a vida
continua , e que é uma dificuldade, lógico, não vou tapar o sol com a
peneira, eu fiquei deficiente com quase 30 anos de idade, que eu vou
fazer 29 agora, e que é bastante difícil, mas se eu colocar toda hora
na minha mente que vai ser difícil, vai ser difícil, aí eu não vou
conseguir, mas se eu colocar que eu vou conseguir, vai ser um dia
após o outro, que é isso que eu tô vivendo, tô vivendo o hoje e

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Saúde mental e deficiência visual

amanhã vai ser outro dia e todos os dias eu to procurando me


adaptar à deficiência (S1).

Apesar de técnica e didaticamente válidas, as fases propostas por Kübler-


Ross (1981) estabelecem um panorama de existencialidade possível, no tocante às
manifestações psicológicas, inspiradas pelo processo de encarnação de uma
deficiência. Entretanto, essa realidade não se aplica à deficiência congênita,
representada por um sujeito da amostra. Assim, como medidas diretivas e não
imperativas, essas fases incorporam novos prismas psíquicos no enfrentamento
suscitado pela marca da diferença.
Enfrentar, deste modo, requer do sujeito uma postura de encontros com o
estranho em si mesmo, reaprendendo modos próprios de encarar-se. A aceitação,
nesta perspectiva, requer considerar instrumentos reforçadores de autoestima,
autoconfiança, apoio social e aparatos micro e macrossociais, nos quais o sujeito se
constitui e é constituído.

A perda ou comprometimento da autonomia para as atividades de vida diária


é recorrente na vida dos sujeitos da amostra. Trata-se de uma das habilidades ou
aptidões que são mais precocemente afetadas frente à perda visual, gerando
sentimentos de inutilidade, tristeza, desgosto, raiva e frustração, como vislumbrados
em S5, S11, S12, S13, S14, S15 e S16.

Eu deixei de fazer tudo. Não faço mais nada. Eu cuidava da minha


casa, lavava roupa, fazia as coisas, que agora não consigo fazer
nada. Passo o dia dentro de casa, andando pegada nas paredes. Se
a pessoa querer fazer as coisas e a pessoa dentro de casa não
consegue. Não sabe onde tem nada (S11).

É muito triste a pessoa ter a sua visão e depois ser dependente de


tudo. Pra vestir uma roupa, pra saber se tá a avessa, não é mole
não. Tenho sofrido muito. Se a pessoa querer fazer as coisas e a
pessoa dentro de casa não consegue. Não sabe onde tem nada. É
isso aí que o meu sofrimento agora é esse (S11).

Hoje, se for pegar um copo não pego direito, vou botar água no copo,
às vezes boto em outro lugar, derrubo na mesa. Agora não, que eu já
me adaptei mais, mas no começo eu batia na porta, era bem difícil
(S12).

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Saúde mental e deficiência visual

Costurar eu costurava, mas agora eu tô ruim demais. Se eu for botar


uma linha numa agulha eu passo o dia todinho pelejando e não
acerto, é difícil (S5).

Mas eu deixei mesmo o crochê, fazia crochê demais. Aí agora eu vou


fazer, tenho logo raiva, solto os pontos e não faço mais nunca (S5).

O terreiro, eu sempre abastecia sempre limpa, agora eu tenho


desgosto porque não tenho mais essa oportunidade, de varrer todo
dia. Eu quero poder fazer, mas não tenho como... levar aquela
poeira, receber aquele sol (S13).

A maior dificuldade é de cozinhar. Não posso mexer na cozinha, o


fogo (S14).

Antes eu arrumava casa, lavava uma louça, arrumava minha roupa


(S15).

Eu fazia as coisas, dava conta da casa toda, agora não posso fazer
tudo não (S16).

Meus dedos é tudo queimado, porque eu bato assim nas panelas. Só


vivo com os dedos queimados. Porque eu bato nas panelas, aí os
dedos tudo preto de queimadura (S5).

E dentro de casa, o fogão né? Que eu tento lá na marra, ver se eu


consigo fazer alguma coisa, e eu sinto muita dificuldade... que eu
tenho medo. O óleo já chapiscou em mim, eu tenho medo de virar.
Eu coloco muito a panela fora da boca. E às vezes meu esposo fica
brigando comigo porque ele trabalha e quando ele chega, eu já tenho
feito as coisas. Aí ele fica com essa preocupação de acidentar, uma
queimadura ou algo parecido (S1).

A perda da autonomia repercute no modo de vida do sujeito, que passa do


estado de independência para uma dependência relativa de apoio frente às
situações outrora concebidas, como se observa em S10 e S15. Apesar disso,
percebe-se em S11 o anseio pela retomada da autonomia frente a demandas
cotidianas de manutenção doméstica. Já S14 associa a perda de autonomia à
incapacidade de cuidado dos filhos.

O mais difícil é andar sozinha, comer uma coisa sozinha, de fazer as


coisas do dia a dia (S15).

A dificuldade é a gente tá precisando depender das pessoas. Eu não


gosto de tá... me dê isso, me dê aquilo, tem que sempre tá pedindo,
eu não gosto (S10).

Hoje eu desejo, que eu possa ao menos fazer minhas coisas dentro


de casa (S11).

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Saúde mental e deficiência visual

O principal obstáculo é cuidar dos meus filhos. A gente que não vê, a
melhor vontade que tem é ver e cuidar dos filhos, cuidar da casa
(S14).

Autonomia, para a pessoa com deficiência visual, caracteriza-se pela própria


regra ou autoridade para conduzir a vida pessoal e social. Pode ser avaliada em
atividades da vida diária, no lazer, na vida emocional, na independência do trajeto de
ir e vir, na vida profissional, entre outros (ACIEM; MAZZOTTA, 2013).
As pessoas com cegueira adquirida tendem a revelar maior vulnerabilidade
psicológica e menor capacidade de enfrentar adequadamente os desafios e as
fontes de estresse decorrentes da condição de cegueira. Deste modo, tornam-se
mais fragilizados quanto aos recursos psicológicos, facilitadores e promotores do
bem-estar emocional, autonomia e integração social (GARCIA, 2014).
O cenário assumido, ao se deparar com a condição de cegueira, alberga
situações impeditivas para alguns de atuar no ambiente externo com autonomia e
segurança. A isso se relaciona uma razoável perda de liberdade, direito este
conquistado como lema de revoluções clássicas, porém mitigado por aqueles que
não enxergam:

Sinto muita dificuldade de me locomover. Essa dificuldade eu sinto


bastante, principalmente à noite (S7).

Sinto muita dificuldade de andar na cidade por causa do claridão. Se


eu sair pra caminhar a pé sou sujeito a ser pego, por causa da
dificuldade da visão (S9).

As incapacidades resultantes da deficiência destacam a necessidade de


autonomia e independência, almejadas pelos entrevistados. Garcia (2014) salienta a
importância que a orientação e a mobilidade têm na vida de uma pessoa cega, pelos
benefícios de diversas ordens que apresentam: em nível psicológico, contribuem de
maneira positiva para melhorar o conceito de si próprio; no aspeto físico, permitem
toda uma exercitação corporal que vai desenvolver a capacidade motora e a
motricidade fina, tão importantes para o bem-estar geral; em termos sociais, criam
no indivíduo oportunidades de relacionamento e de realizar tarefas no seu dia-a-dia
de forma autônoma. Entretanto, essa busca de liberdade pretendida depara-se com
uma realidade histórica de falta de acessibilidade urbana, de prédios e espaços

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Saúde mental e deficiência visual

interiores; revelada, de modo reiterado pelos entrevistados, como um dos maiores


empecilhos de permeabilidade ao meio externo ao de seus locais de moradia.
Outro tema recorrente na fala dos sujeitos da amostra é o da falta de
acessibilidade urbana. Esta pode denunciar uma importante causa de restrição de
participação na vida social de pessoas com uma deficiência sensorial ou física, aqui
denunciadas:
São muitos os obstáculos: o nível das calçadas, reformas em ruas,
transportes mal adaptados, o que passa a gerar sentimentos de insegurança e medo
frente a essa realidade, além do risco iminente de acidentes. Disso resulta, em
certos casos, uma maior predisposição a um indesejável isolamento social, como
exemplificam alguns sujeitos:

A acessibilidade na minha cidade tá zero, não tem nada. Tem um


pouquinho em Natal (S6).

Mas é o fator físico mesmo na cidade, estrutural mesmo que eu


percebo, os transportes, o supermercado, as dificuldades são essas
(S8).

A rua que eu moro tão mexendo, não dá nem pra pessoa caminhar
(S10).

Sinto dificuldade com o nível das calçadas, você chega num certo
ponto que você pensa que o final dela já é aqui, mas não, já tem sido
antes, aqui acolá você finda quase caindo (S12).

Agora com essa parte da pessoa entrando pela frente complica,


porque a pessoa já não vê bem e ainda passa numa escada
estreitinha, ainda subir, aí uma demora medonha, atrapalha tudo.
Quando você vai entrar lá atrás tá tudo cheio, lotado, tá sufocado.
Mas é isso mesmo, são as barreiras que a gente tem que enfrentar
mesmo (S10).

Tinha medo de atravessar a pista, aí eu pedia ajuda (S1).

Eu acho dificuldade quando atravessar numa pista, assim, na BR


(S13).

Tenho dificuldade pra atravessar os carros. Teve um carro que jogou


o carro por cima de mim (S16).

Agora só vivo presa dentro de casa... quando saio é caindo pra aqui
pra acolá. (S5).

Agora que pra mim mesmo eu queria era andar, caminhar, eu não
tenho condições, pra ali onde eu moro não tem condições (S10).

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Saúde mental e deficiência visual

Tando com a visão que Deus dá, a gente se sente mais elevado, e
na situação que eu to, me sinto um cabra recuado, morto, porque eu
com minha visão atravesso um trânsito, faço muitas coisas, sem a
visão eu recuo, que não posso fazer nada (S4).

O tema da acessibilidade é regulamentado pela Lei Federal nº 10.098, de


2000, cujo objetivo é promover o acesso de pessoas deficientes ou com mobilidade
reduzida a locais públicos. A lei inclui no universo dos deficientes os físicos,
auditivos e visuais, já que necessitam da eliminação de barreiras que lhes assegure
acesso aos bens culturais e sociais, além de segurança na locomoção. Sendo
assim, estabelece normas e critérios básicos para que estes sujeitos tenham o
direito de ir e vir com segurança, mediante a eliminação “de barreiras e obstáculos
nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de
edifícios, nos meios de transporte e de comunicação” (BRASIL, 2000b). Contudo,
percebe-se uma realidade em que a inobservância da lei é uma constante, onde o
descuido, o descaso e a inércia se alternam, perpetuando um cenário pouco
favorável àquele que busca a sua emancipação como cidadão livre.
A situação de falta de acessibilidade adequada não é um problema apenas
dos espaços públicos da cidade. Prédios e espaços interiores também se deparam
com uma inconformidade de ajustamento aos padrões exigíveis de acessibilidade
para uma circulação efetiva e segura de transeuntes deficientes, como expressa S8.

Eu sempre to indo... ao shopping, sempre acompanhado. Preciso ter


a necessidade de tá andando com uma pessoa acompanhante, até
porque o shopping não tem acessibilidade, piso tátil. Eles até
colocam acessibilidade, mas não se informam para a acessibilidade
universal (S8).

Os setores públicos e privados têm que ser trabalhados a normas


internacionalmente, como a norma tá (S8).

No que se refere propriamente aos deficientes visuais, a lei prevê a


implantação de dispositivos sonoros nos semáforos para orientar a travessia de ruas
e avenidas com trânsito intenso. Também menciona que os projetos e traçados dos
elementos de urbanização públicos e privados de uso coletivo sigam os parâmetros
estabelecidos pelas normas técnicas de acessibilidade da Associação Brasileira de
Normas Técnicas – ABNT (ABNT, 2004).

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Saúde mental e deficiência visual

Deste modo, a determinação do uso dos parâmetros técnicos da ABNT,


especificada na lei, aponta a urgência da utilização de padrões nacionalmente
aplicáveis, com vistas a garantir a efetividade do direito de liberdade de locomoção,
corolário aos princípios de cidadania e justiça social. Nestes termos, a NBR 9050 de
2004, estabelece critérios técnicos e dispõem sobre os parâmetros de acessibilidade
a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos (ABNT, 2004).
Outra realidade perceptível é a falta de engajamento social nos modos de
interação com o sujeito deficiente, seja priorizando o acesso ou auxiliando uma
travessia. Esse comportamento ancora-se, muitas vezes, no desconhecimento ou na
insensibilidade para visualizar um público de invisibilidades históricas.

A falta de respeito dos motoristas, na faixa de pedestre, as calçadas,


a dificuldade maior é essa. Porque eu costumo dizer que a gente tá
numa selva de pedras... e a gente com deficiência, não só com
deficiência visual, mas os cadeirantes também... e as outras
deficiências... as pessoas não sabem lidar com a gente. A gente que
tem que tá o tempo todo explicando. E o que eu vejo é a falta de
informação, que não chega até essas pessoas. Eu vejo na mídia que
tem formação pra tudo, mas não tem formação pra orientar a
população com as pessoas que precisam. Porque tem propaganda
pra isso, pra aquilo, mas não tem pra dizer: olhe, quando tiver um
cadeirante, ajude... olhe, quando tiver um deficiente visual, ajude
(S8).

Do jeito que ele quer respeito, a gente deveria ter respeito também.
No semáforo, o sinal tá vermelho, e o carro já tá acelerando.
Ninguém perde dois minutos do seu tempo pra ajudar a atravessar a
rua. Eu tenho raiva disso (S8).

Eu não saio na rua sozinha. A primeira vez que eu saí uma moto ia
me matando (S14).

Segundo Gofman (1988), a sociedade ao estabelecer padrões de atributos


individuais, estampados numa relação categórica, passa a adotar, muitas vezes,
atitudes hostis e de inaparência quando se depara com uma pessoa estigmatizada,
considerada uma espécie menos desejável, uma pessoa completamente má,
perigosa ou fraca. Nisso sucede a desconsideração de criatura comum que se torna
uma pessoa estragada, diminuída e desacreditada. Esse traço se impõe a atenção e
pode afastar aqueles que ele encontra.
Na contramão dessa cena, como proposta inspiradora e reconciliadora, a Lei
francesa nº 102 de 11 de fevereiro de 2005 enuncia em seu artigo 2º: “Toda pessoa
deficiente tem o direito à solidariedade do conjunto da coletividade nacional, que lhe
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Saúde mental e deficiência visual

garanta, em virtude dessa obrigação, o acesso aos direitos fundamentais


reconhecidos a todos os cidadãos, assim como o pleno exercício de sua cidadania”
(FRANÇA, 2005).
Tal assertiva se justifica nos dizeres clarificadores de Habermas (1999 apud
TURCATTO 2010), “[...] à medida que a individuação avança, mais o sujeito
particular se envolve numa rede cada vez mais densa, e ao mesmo tempo sutil, de
dependências recíprocas e de necessidades expostas de proteção”.
Também a falta de acessibilidade urbana, de prédios e espaços interiores,
desagua nas práticas de lazer, minguando as suas possibilidades e retalhando um
elemento indispensável à promoção de saúde. São destacadas restrições para
participar de atividades de lazer, como apontam S5, S10 e S14:

Eu acho difícil frequentar esses locais porque eu tenho medo. A


pessoa fica com medo mais que a visão da gente normal (S14).

A gente sente aquele negócio. Porque eu sempre gostava de pescar,


eu gostava de andar, aí hoje eu não posso, não tenho como ir (S10).

Se eu tivesse a minha vista boa, visse o mundo direito, passeasse...


agora eu só vivo mais em casa (S5).

A cegueira adquirida provoca um corte radical nos padrões já aprendidos e


vivenciados em diferentes níveis, entre os quais incluem o lazer, a mobilidade, e a
sociabilidade, caracterizando uma experiência traumática e corrosiva em nível de
saúde mental ou bem-estar psicológico (GARCIA, 2014).
Para Garcia (2014), o lazer seria um domínio fundamental para a satisfação
com a vida, a qual por sua vez integra a dimensão cognitiva do bem-estar subjetivo.
Neste direcionamento, Santos (2004) considera que as atividades de lazer
são categorias que trazem benefícios e renovação às pessoas. Estas atividades
podem envolver tanto o contato com outras pessoas como o trabalho, e representam
coisas que a pessoa escolhe fazer porque se sente bem e não fazer por obrigação.
Além disso, Santos (2004) demonstrou que a vida social e o lazer são determinantes
que podem influenciar a forma como a perda da visão é enfrentada.

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Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 59 )
Saúde mental e deficiência visual

Prejuízos nas relações interpessoais são reiteradamente demonstradas nas


falas dos sujeitos. Passa a haver redução marcante nas interações com o outro,
subtraindo as trocas afetivas ou o sentimento de pertencimento a grupos sociais:
amigos, família, igreja, desporto, política, etc. Isto culmina no afastamento social
demarcando um contexto de rupturas ou atenuação de trocas experienciais. S1, S6,
S8 e S12 expressam preocupações ou consequências adversas demarcadas em
seus entornos afetivos.

No começo eu tinha 18 anos, foi bem difícil sim, eu pensava que não
ia conseguir mais arrumar alguém. A gente que é novo pensa logo
ninguém vai querer mais namorar com a gente. Pensa logo que os
amigos vai ser mesmo aquele mesmo jeito com a gente (S12).

Namorava muito, tinha 2, 3. Depois da deficiência mudou isso. Mas é


melhor por que aparecem outras (S6).

No início, quando eu perdi a visão, eu não tava nem querendo


conversar com meu esposo eu queria mais (S1).

A separação minha de minha esposa eu atribuo à falta em certas


coisas de necessidade feminina, e ela sentiu essa falta. E isso foi
depois de minha perda de visão (S8).

Na verdade a instalação da deficiência na idade adulta atinge tanto a pessoa,


quanto seus familiares e amigos e representa um sério prejuízo, pois além da perda
da visão ocorrem outras perdas associadas como das habilidades básicas, as quais
incluem as comunicacionais e de relacionar-se socialmente (MAIA; DEL PRETTE;
FREITAS, 2008), reveladas a seguir:

E uma das coisas que eu fiquei assim mais surpresa infelizmente, foi
uma surpresa negativa, foi em relação às minhas amizades, porque
todas ligavam pra mim, falavam comigo, na hora que eu fiquei... né?
que eu deveria ter um apoio. Para mim, um amigo, você escolheu um
irmão. Eu tinha meus amigos como se fossem irmãos. E eu disse até
a uma de minhas amigas parece que minha cegueira é contagiosa,
porque todo mundo se afastou de mim, sabe? Todo mundo tem esse
pensamento de que penalidade e eu fiquei muito triste, por ter
passado por essa sozinho, sem apoio, né, das pessoas que eu tinha
como amigos. E hoje a deficiência foi até bom, porque eu to revendo
a minha vida, revendo as pessoas que realmente me dão valor né?
Infelizmente nos dedos são poucos (S1).

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Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 60 )
Saúde mental e deficiência visual

E ali eu vejo todos os meus amigos praticando o que eu praticava, e


não posso mais chegar né? Eu me achei muito só. Acostumado a tá
no meio da turma, trabalhando, porque eles são meus amigos, mas
não é mais como era, porque eu tava no meio da comunidade
trabalhando e eu comecei a me sentir só. Para quem convive com a
sua turma se acha muito mais avançado (S4).

Acaba a vida de amizade, de festa, porque eu ia muito a festa. Saía


toda noite. Não tive muito apoio das pessoas (S6).

Hoje me reservo muito mais em casa, em razão até dessa visão. Eu


gosto muito de andar, pra mim, eu gosto muito de gente, e aí eu to
me reservando um pouco em razão dessa dificuldade de estar me
atingindo minha visão. E eu, em razão disso, às vezes eu até me
reservo um pouco, porque, por exemplo, teve umas pessoas com 15
metros de distância, eu não consigo enxergar quem é aquela pessoa
pra mim cumprimentar com mais precisão. Nisso aí eu não deixo
nem, muitas vezes, as pessoas perceberem. Que a minha pouca
saída é em razão disso (S7).

Mesmo jeito é a pessoa, tando bom, não quer ser acompanhado por
um doente. Porque pode ter algum problema e ele levar a culpa (S9).

Porque quando tava só eu andava uns 50 metros, porque eu ia na


oficina de um colega meu, aí eu ficava conversando e voltava. Agora
eu já não posso ir só pra casa (S10).

Porque aqueles que antigamente eram assim com a pessoa, e até


dependia de mim e tudo, hoje pouco aparece (S9).

Porque eles só me convidam pra cantos que eu sei que não dá pra
mim ir (S10).

Eu participo de muito evento. Às vezes quando eu chego eu fico


querendo me soltar, porque sou muito dinâmico, a minha idade já
não me permite muito. Mas eu ainda sou jovem. Eu chego com
vontade de me soltar, isso é de mim, e às vezes as pessoas acham
que eu não me solto porque eu to sendo orgulhoso, e não é. Eu
chego num canto e gosto logo de cumprimentar todo mundo pra eu
logo me enturmar. E essa dificuldade eu sinto bastante,
principalmente à noite. Se eu puder, a partir das 19hs, 20hs, to lá
tentando ao menos escutar a televisão, e procuro sempre me
resguardar (S7).

A S14 de antes era muito danada, muito festada, gostava muito de


festa, de beber, de ir pras baladas, brincar com meus amigos, correr,
dançar. Hoje não faço nada disso. Tô mais quieta, só dentro de casa
mesmo. Não saio pra canto nenhum mais, mas tenho vontade e
muito. Nunca tentei sair não, assim pra festa, essas coisas, eu nunca
tentei não. Sinto falta dessa vida de antes (S14).

Eu me fechei mais um pouco pra certo tipo de ambiente. Ambiente


que tem muita gente, muito barulho, eu já me distanciei. Não posso
tá em canto que tem muita gente, que tem som elevado, eu prefiro

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Saúde mental e deficiência visual

ficar mais em casa, num canto mais calmo. Eu já me fechei já pra


esse lado (S8).

Fica evidenciado que o comprometimento de habilidades sociais, por sua vez,


favorece o contexto de privações de vida comunitária e restrição de interações
sociais saudáveis, propiciando o afastamento social e as adversidades psicológicas
advindas desse cenário, e em última análise, o comprometimento de saúde mental.
Figueira (2014) sustenta que a família é a unidade de cuidado da pessoa que
adquiriu uma deficiência e a forma de lidar com este membro dependerá de
características da dinâmica familiar e de suas redes valorativas.
Nessa perspectiva, a família tanto pode servir como uma rede de apoio
quanto inibir o processo de inclusão social para o seu membro com uma deficiência.
Por se tratar de uma dinâmica mais transacional do que fixa, as relações familiares
precisam ser repensadas e elaboradas constantemente, na medida em que novas
funções sociais e profissionais de seus membros se instauram, readaptando-se a
cada momento (AMIRALIAN, 2009).
Entretanto, Mantoan (1997) salienta que é comum a falta de preparo por parte
das famílias para lidar com um membro com qualquer tipo de deficiência, por
constituir uma situação traumática e desestabilizante, propiciando mudanças
radicais no curso da vida e na organização familiar, como demonstra S4: “Os
familiares Deus já levou quase tudo, o que tá restando eu não considero nem como
irmão, porque não vem na minha casa. E muito pouco eu vou na dele, porque eu
não tenho condição” (S4).
Por sua vez, S14, em razão de sua deficiência visual, recorre ao apoio familiar
para representá-la em momentos de confraternização e homenagem na escola de
sua filha, esquivando-se de participar. Como podemos observar em: “Quando tem
festinha no dia das mães, eu boto a minha cunhada pra ir” (S14).
Para que o processo de inclusão se efetive, o sujeito com uma deficiência
deve poder assumir-se como indivíduo, construído ou reconstruído a partir de
relações com qualidade, desde o ambiente familiar, quanto escolar, amigos,
vizinhos, etc. num processo relacional dialeticamente construído entre os sujeitos.
Mas trata-se de uma realidade complexa esculpida na forma como nossa sociedade
é organizada, com seus princípios, valores e crenças, culturalmente introjetados e
disseminados (MANTOAN, 1997).

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Saúde mental e deficiência visual

A pessoa com deficiência visual apresenta maior isolamento social por meio
de dificuldades no relacionamento interpessoal, o que torna evidente a fragilidade
dos apoios sociais, muitas vezes reduzidos à família nuclear (MAIA; DEL PRETTE;
FREITAS, 2008; AOKI; OLIVER; NICOLAU, 2011).
Isto é ilustrado por S15, ao passo que S7 tenta suprir esta barreira mantendo,
mesmo que parcialmente, sua rede de coesão social.

É difícil pra mim ir sozinha à casa de minhas amigas, ir à igreja


(S15).

Sou religioso, participo do terço dos homens. Faz uns três meses
que eu não vou ao terço dos homens, exatamente porque é à noite,
aí eu fico um pouco meio acanhado diante da situação, porque me
chamam pra ler uma coisa. Mas eu participo de todos esses grupos,
de político, de futebol, religioso, católico, vou sempre à missa (S7).

Faltando o feedback saudável do intercâmbio social quotidiano com os outros,


a pessoa que se auto isola, possivelmente, torna-se desconfiada, deprimida, hostil,
ansiosa e confusa (GOFMAN, 1988).
O estudo de Kef (2002) comprovou que o ser humano, independentemente da
idade, é mais feliz e capaz de desenvolver suas potencialidades, quando se sente
seguro e sabe que existem uma ou mais pessoas que virão em seu auxílio sempre
que surjam dificuldades. O bom relacionamento com familiares e amigos contribui
para a superação e enfrentamento da cegueira e das limitações visuais, além de
favorecer o ajustamento social destas pessoas (SANTOS, 2004).
Dessa maneira, ter apoio social significa compartilhar informações, obter
auxílio nos momentos de crise, participar de eventos sociais com repercussões
positivas no aspecto psicossocial, como as melhorias da autoestima, da confiança
pessoal e da saúde mental (AOKI; OLIVER; NICOLAU, 2011).
Os entrevistados, em sua maioria, defrontam-se com o isolamento social nos
intercâmbios cotidianos, entretanto denotam laços familiares de apoio em seus
enfrentamentos. Os que obtêm a presença constante de amigos e familiares para
além de suas residências, tendem a apresentar uma postura mais dinâmica e
atuante frente às realidades que os cercam.

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Saúde mental e deficiência visual

Entre as marcas milenares interferentes dos modos próprios de andar a vida


com a liberdade da qual uma pessoa com deficiência requer, processos de
estigmatização e preconceitos latentes no seio comunitário avultuam-se diante da
estranheza a modelos elegíveis de estética e funcionamento orgânico ou psíquico.
A deficiência visual, por sua vez, congrega realidades físicas e funcionais que
suscitam diferentes reações neste convívio. São barreiras à inclusão de fato e à
saúde mental almejada, por meio do afastamento social ou hostilidade suscitada
pelo desconhecimento ou pela estigmatização (GOFMAN,1988).
Durante muito tempo, foi utilizado o termo “cego”; posteriormente, essa
expressão foi considerada por algumas pessoas como estigmatizante. Outras
expressões foram utilizadas para substituí-la, porém, dependendo do contexto e da
forma como são empregadas, apresentam características semelhantes (BRUMER;
PAVEI; MOCELIN, 2004). Isto é contextualizado por S12:

No começo eu senti preconceito das pessoas sim. Ficam apelidando


você, chamando você de cego, de ceguinho, ficam falando várias
coisas que a gente ali fica guardando só pra gente sabe? Aí a gente
chega nem a comentar com eles não. Mas eu já disse a eles que é
uma coisa bem difícil pra quem sofre com a doença. É bem difícil
uma pessoa cutucar e bater bem em cima da ferida ali. Acho que é
uma coisa bem desrespeitosa. A pessoa que é aleijado, a pessoa
chegar ali e chamar ela de aleijado não é bom. Que Nem eu que
tenho essa deficiência, chegam chamando você de cego, ceguinho,
aí ficam apelidando assim a gente direto (S12).

Segundo Goffman (1988, p. 85), o estigma é uma espécie de marca, uma


diferença de valor negativa, que tem por eixo o sujeito, seu corpo e sua experiência,
caracterizando o indivíduo que está inabilitado para a aceitação social plena.
É percebido como consequência de uma doença ou uma situação, objetos de
discriminação social, devendo ser pensado como um processo social, ligado ao
poder e à dominação, e, em última análise, ao funcionamento das desigualdades
sociais. A perspectiva do sofrimento passa a se revelar como um ponto chave neste
cenário (MONTEIRO; VILLELA, 2013, p. 82-84). Como podemos ver na fala de S12:

No início, até hoje, tem gente que fica assim quando vai olhar pra
você, o foco dele é olhar pra sua doença. Às vezes também no início

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Saúde mental e deficiência visual

tem amigos seus que vai tirar brincadeira com você, fica apelidando
você, tem vários tipos de coisa assim desse tipo (S12).

Segundo Amaral (1998, p. 16-17), o “contágio osmótico” é uma versão do


preconceito, que se caracteriza como o temor do contato e do convívio, numa
espécie de recusa em ser visto como um deficiente. Isso foi revelado no relato de
S9:

Os amigos às vezes não quer se encostar perto da pessoa, porque


acham que pode ser uma doença transmissível. E não querem ter
responsabilidade com ninguém. Quase todo mundo é assim (S9).

O indivíduo estigmatizado também pode reagir antecipadamente de maneira


defensiva, ao invés de se retrair, age com agressividade, provocando nos outros
algumas respostas também desagradáveis. Este processo pode gerar assim, a
marginalização da pessoa estigmatizada (MELO, 2000; MONTE et al., 2009),
conforme experiencia S8:

É claro que muita coisa estressa mesmo, os professores que não


dão atenção, esquecem que tem um cego dentro de sala de aula. Em
tanto você repetir, chega um momento que você se estressa, você se
explode (S8).

Pessoas estigmatizadas também podem se isolar, tornarem-se desconfiadas


e deprimidas: “Eu digo, ai meu Deus, será que eu vou ficar cega, mas antes tá
morto... aí o menino diz vó não diga isso não” (S5).
Segundo Amiralian (1997), o sujeito com uma deficiência visual confronta-se
cotidianamente com um fato perturbador: o mundo dos videntes, que alimenta
sentimentos de comparação suscitando a desqualificação, o isolamento, a solidão e
a inveja. S1 demonstra uma concepção de preconceito para com a sua nova
condição, adquirida há apenas 3 meses, suscitando uma autoimagem desconstruída
por meio de uma invisibilidade de seus atributos individuais.

Ai meu Deus, acho que é o preconceito comigo, né? Deu comigo


mesmo. Eu tenho vergonha de sair, tenho vergonha de admitir que
eu fiquei deficiente visual, porque pra mim é como sei lá, uma parte
de mim não existisse mais. Parece que eu perdi a personalidade, sei
lá, minhas qualidades, e foi tudo resumido nessa deficiência. Pra
mim eu não tenho mais as qualidades que eu tinha (S1).

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Saúde mental e deficiência visual

Eu mesmo pensava que eu era uma coitada, que eu não era mais
ninguém (S1).

A partir de um ideário de fragilidade, inferioridade e incapacidade estabelecido


em torno da pessoa com deficiência, suscita-se a noção de que o preconceito e
exclusão são considerados normais (SANTOS; OLIVEIRA, 2009).
Trata-se, portanto, de um mecanismo de negação social, já que as diferenças
encontradas são tidas como falta, carência ou impossibilidade. Este entendimento se
valida à medida que a sociedade demanda padrões de funcionalidade, metas e
resultados padronizados, desconsiderando as individualidades e novas
condicionalidades (SILVA, 2006). Além disso, a deficiência revela ao outro a
fragilidade e imperfeição humanas que se almejam negar (GOFMAN, 1988).
S1 e S6 denunciam esta realidade, encarcerada em normas sociais
estagnadas à aceitação da diferença:

Mas meus tios, meu irmão, minha sogra, tem esse v de me vê assim
como se eu fosse mesmo uma inválida (S1).

Quando eu disse, não, as pessoas tão pensando de mim hoje o que


eu um dia pensei de um deficiente, que era um coitado, que era um
tadinho. Eu tive essa penalidade no deficiente, só que eu não quero
aceitar que ninguém aja comigo da forma que eu agi com as pessoas
né, eu não quero porque, sei lá, é diferente, quando é com a gente.
Quando é com outra pessoa, a gente acha que nunca vai acontecer
com a gente. Quando acontece... (S1).

Tem a minoria que eu sinto que acham que eu não sou capaz de
nada (S6).

Antigos comportamentos perpetuam-se amontoando o espesso caule do


preconceito, mascarado por atitudes estereotipadas de compreensão e humanismo
(SANTOS; OLIVEIRA, 2009). Isso é percebido por S1, S9 e S14.

Daí quando as pessoas percebem, elas dizem: ah, você é deficiente


visual, ah coitadinha, tão nova. Aí tem essa penalidade (S1).

Eu acho que as pessoas, a forma como elas tratam o deficiente


visual, todo deficiente, mas como eu to na área de deficiente visual,
vou falar por mim, deficiente visual. Esse preconceito, de achar, sei
lá, que a gente morreu, que tá um morto vivo, sabe, é o que as
pessoas tratam: coitada, tadinha e já começa a dizer essas palavras
e eu já tô tentando me adaptar escutando isso, aí me ferra mais
ainda. Acho que os preconceitos das pessoas devia ter não sei se
psicólogo, sei lá, ou algo do tipo, pra orientar mais, divulgar mais,

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Saúde mental e deficiência visual

mais as qualidades do deficiente visual, do que a deficiência. Eu


acho que deveria as qualidades tá mais à vista do que a deficiência.
Que os meios de comunicação, rádio e TV divulgam tanto coisa que
não presta, fazendo apologia à bebida, cigarro, a um monte de coisa,
e por que não faz essas propagandas para ajudar o deficiente visual?
(S1).

Uns mudaram, ficam assim com dó da pessoa, porque a pessoa


tando doente sem ter jeito do que dá ali. Eu encaro com naturalidade,
porque se fosse ajeitar é pior, não dá jeito né? (S9).

Eu acho que eles veem que eu não vejo, aí eles criaram mais amor a
mim. Eu sinto pelo tom da voz deles, parece que eles têm pena de
mim, sabe? (S14).

As famílias e os amigos do deficiente visual tendem a adotar condutas de


superproteção, por perceberem a possibilidade de riscos reais socialmente
construídos. Isso reforça, cada vez mais, o isolamento e o medo de relacionar-se,
prejudicando a dinâmica de vida social, afetiva, cognitiva e emocional. É uma atitude
percebida por S12 ao se deparar com a condição de cegueira (JULIÃO; PAIVA;
SHIMANO; CONTI; SANTOS, 2013).

Algumas vezes sim, tem familiares meus que no início eles queriam
tratar diferente, só que eu não queria que eles me tratassem
diferente não. Eu queria que eles me tratassem normal, uma pessoa
normal. Me olhassem como uma pessoa normal. Eles tudo era com
cuidado em mim, não podia sair pra um canto que eram eles ali...
tratando uma pessoa mais especial. Não, eu queria ser igual a todo
mundo, queria ser tratado igual a todo mundo, visto como uma
pessoa normal (S12).

Segundo Castel (2008, p. 14), a discriminação negativa é a


instrumentalização da alteridade, constituída em favor da exclusão e marca seu
portador com um defeito quase indelével. Ser discriminado negativamente significa
ser associado a um destino embasado numa característica que não se escolhe, mas
que os outros devolvem como uma espécie de estigma. Isso se observa nas falas de
S1 e S10, gerando afastamento social.

E uma das coisas que eu fiquei assim mais surpresa infelizmente, foi
uma surpresa negativa, foi em relação às minhas amizades, porque
todas ligavam pra mim, falavam comigo, na hora que eu fiquei né,
que eu deveria ter um apoio... Para mim, um amigo, você escolheu
um irmão. Eu tinha meus amigos como se fossem irmãos. E eu disse
até a uma de minhas amigas parece que minha cegueira é
contagiosa, porque todo mundo se afastou de mim, sabe? todo

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Saúde mental e deficiência visual

mundo tem esse pensamento de que penalidade e eu fiquei muito


triste, por ter passado por essa sozinho, sem apoio, né, das pessoas
que eu tinha como amigos. E hoje a deficiência foi até bom, porque
eu to revendo a minha vida, revendo as pessoas que realmente me
dão valor né? Infelizmente nos dedos são poucos (S1).

Teve diferença na forma que os familiares de tratavam antes e


agora? Teve muita diferença. Eu não vou negar que tem, que sempre
tem. Porque aqueles que antigamente eram assim com a pessoa, e
até dependia de mim e tudo, hoje pouco aparece (S10).

S8 enfatiza a invisibilidade socialmente construída no entorno da deficiência,


notadamente a deficiência visual, em espaços públicos de circulação, nos quais a
solidariedade se impõe como uma importante ferramenta de inclusão e participação,
porém pouco revelada.

As pessoas não tão muito preocupadas com quem tá entrando


nesses ambientes. A falta de respeito dos motoristas, na faixa de
pedestre, as calçadas, a dificuldade maior é essa. Porque eu
costumo dizer que a gente tá numa selva de pedras... e a gente com
deficiência, não só com deficiência visual, mas os cadeirantes
também... e as outras deficiências... as pessoas não sabem lidar com
a gente. A gente que tem que tá o tempo todo explicando. E o que eu
vejo é a falta de informação, que não chega até essas pessoas. Eu
vejo na mídia que tem formação pra tudo, mas não tem formação pra
orientar a população com as pessoas que precisam. Porque tem
propaganda pra isso, pra aquilo, mas não tem pra dizer: olhe, quando
tiver um cadeirante, ajude...olhe, quando tiver um deficiente visual,
ajude. Eu só tenho raiva de quem enxerga, porque não respeita a
gente, porque ele acha que o tempo dele é mais curto que o da
gente. Porque ele tem que passar por a gente sem respeitar. Do jeito
que ele quer respeito, a gente deveria ter respeito também. No
semáforo, o sinal tá vermelho, e o carro já tá acelerando. Ninguém
perde dois minutos do seu tempo pra ajudar a atravessar a rua. Eu
tenho raiva disso (S8).

A incompreensão gerada no convívio com pessoas com uma deficiência


visual pode acarretar atitudes de hostilidade, críticas e desentendimentos nessa
interação, uma vez que a denúncia estética da imperfeição pode estar ausente. O
que também parece perturbar nos contatos com pessoas com deficiência é o
desconhecimento de como lidar com elas, posto que dentre as características das
relações sociais contemporâneas, a previsibilidade é um componente essencial
(SILVA, 2006). S4, S7, S8 e S12 vivenciam situações adversas de incompreensão
em suas relações sociais cotidianas.

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Saúde mental e deficiência visual

As pessoas olham pra mim e dizem: não tem quem diga. As pessoas
olham pra mim e não tem quem diga que a minha visão é desse
jeito... e dizem: rapaz, você tá mentindo? Aí eu fico calado e saio de
perto, não digo que tá certo ou tá errado não. Eu me sinto um pouco
constrangido, porque a pessoa tá se desfazendo... Aí eu saio de
perto e saio na brincadeira... saio sem esculhambar, eu fico na
minha... (S4).

Isso é uma barreira muito grande, pois as pessoas acham que eu to


muito besta, porque não cumprimento. Às vezes as pessoas acham
que eu não me solto porque eu to sendo orgulhoso, e não é. Eu
chego num canto e gosto logo de cumprimentar todo mundo pra eu
logo me enturmar. E essa dificuldade eu sinto bastante,
principalmente à noite (S7).

Quando alguém fala e eu não reconheço e a pessoa diz: tás ruim


heim não tá reconhecendo não? Isso meche diretamente com nosso
sentimento, com nossa cabeça mentalmente. Porque a gente fica se
sentindo, um pouco assim, pela metade. Isso meche diretamente
com a nossa mente (S7).

A gente, se chegar pra um amigo, que ta com uma visão boa, se eu


dialogar isso pra ele, ele vai mangar de mim, ele vai dizer: você tá do
mesmo jeito, tá se desfazendo. Eu digo, rapaz não é se desfazer.
Eles dizem assim: rapaz, quem era você que tá sendo agora? Eu
digo. Será o que Deus quiser (S4).

Mas no começo tinha, tinha deles que ficavam criticando (S12).

E ainda hoje, muitos dizem, olha, tá vendo... eles ainda não aceitam
a perda ainda (S8).

Uns ainda tem um pouco de sentimento, outros levam na graça, e eu


acompanho eles, que eu não vou fazer nada (S4).

Inicialmente os meus familiares não se importaram muito, porque na


minha opinião, eu avisei pra todos, mas nenhum procuraram, sei lá.
Achavam que era mentira, ou tava de brincadeira, ou que era um
problema simples, que não era pra tanto (S8).

Constatamos a necessidade de uma democratização profunda que supõe


novas regras de relacionamento que vão ao encontro da integração e da
multiculturalidade, tolerância e respeito pelas diferenças, dando resposta à enorme
diversidade cultural e étnica (MONTE, 2009).
O estigma e a discriminação podem ser combatidos por meio de intervenções
de longo prazo, do amplo envolvimento multissetorial e da inclusão daqueles que
possuem tal condição, favorecidos pelo contato pessoal direto e o marketing social
(OMS, 2012), reiterados por S7 e S8.

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Saúde mental e deficiência visual

Eu acho que deveria, à princípio, é fazer uma campanha educativa,


porque o problema é que a gente acha que o que tá acontecendo
comigo hoje, não pode acontecer com os outros amanhã. Eu antes,
eu não tinha essa visão. E o que a gente analisa de pessoas com
problema visual é alarmante (S7).

Deveria fazer uma campanha educativa, conscientizar o pessoal


(S7).

Eu acho que a dificuldade maior pra gente é essa, é não ter apoio
pra orientar as outras pessoas... (S8).

Porque tem muitas pessoas mal informadas, mal instruídas para


orientar a própria população (S8).

Segundo Castel (2008, p. 13), a discriminação positiva consiste em fazer mais


por aqueles que têm menos. Trata-se de desdobrar esforços suplementares em
favor de populações carentes de recursos a fim de integrá-las ao regime comum e
ajudá-las a reencontrar este regime. Entretanto, para Monteiro e Villela (2013, p. 17),
a compreensão entre condições de saúde, estigma e discriminação deve "ir além da
descrição das experiências individuais e levar em conta os marcadores sociais da
diferença que historicamente produzem desigualdades, como classe social, nível
educacional, condições de trabalho, dentre outros”.

A educação constitui um fator de ampla relevância na determinação da saúde,


uma vez que menores possibilidades de ingresso no mercado de trabalho se
associam a um menor rendimento escolar, acarretando oportunidades limitadas de
formação de capital humano, menos oportunidades de emprego e menor
produtividade durante a vida adulta. Disso decorre um ciclo-vicioso de pobreza e
miséria (BADZIAK, MOURA, 2010; OMS, 2012).
Dos dezesseis entrevistados, onze possuem ensino fundamental incompleto
ou são analfabetos; quatro possuem ensino médio e apenas um possui nível
superior (S7).
Destacamos, ainda, o fato de que, dos cinco entrevistados que habitam na
zona rural ou distrito, todos possuem baixa escolaridade, não ultrapassando o
ensino fundamental.

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Saúde mental e deficiência visual

Posto isso, delineamos a fala de S2 quando infere que a partir de dificuldades


para a leitura, revelou-se o diagnóstico da perda visual, que em seu caso foi
gradativa. Além disso, tal acometimento conduziu à interrupção dos estudos.
Conforme S2 registra:

Descobri o problema de visão quando eu não conseguia enxergar as


letras quando eu ia pra escola. Minha maior dificuldade é a de
enxergar as letras, de escrever, por isso parei os estudos. Só estudei
até a primeira série (S2).

Em geral, crianças com deficiência têm menos probabilidade de começar a


escola, além de índices mais baixos de permanência e aprovação. Além disso,
adultos com deficiência experimentam índices significativamente mais baixos de
término do Ciclo Fundamental e menor média de anos de escolaridade (OMS, 2012).
Um estudo, que avaliou o rendimento escolar de alunos com deficiência
visual, constatou a existência de associação entre baixa acuidade visual e baixo
rendimento escolar na amostra avaliada. Entre os escolares com baixa acuidade
visual, 25% dos alunos apresentaram rendimento escolar regular ou insatisfatório
(TOLEDO et al., 2010).
Jones, Crews e Danielson (2010), ao avaliar idosos com deficiência visual,
também constataram menores níveis educacionais no grupo avaliado. Em parte, isso
se deve ao fato das pessoas com deficiência enfrentarem barreiras no acesso a
materiais e serviços educacionais. Tamanha dificuldade é exacerbada nas
comunidades mais pobres (OMS, 2012).
No entanto, o desconhecimento de ferramentas e instrumentos de apoio para
o estudo frente a uma dificuldade de enxergar é notório em S6. Trata-se de mais um
entrave à manutenção do processo de ensino e aprendizagem de pessoas que
venham a adquirir uma deficiência visual, alimentando a exclusão educacional diante
de tal fato. Conforme exprimiu S6: “Quando eu perdi a visão eu não tinha
conhecimento de nada. Não sabia que tinha como eu estudar” (S6).
A conjuntura social na qual se inserem os sujeitos é uma interferente direta
das possibilidades e limitações para o estudo. A história de vida familiar e as
condições financeiras levam, muitas vezes, a uma busca por melhoria desta
realidade emancipando os sujeitos da vida escolar para uma vida de trabalho,
exemplificada por S3 e S4:

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Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 71 )
Saúde mental e deficiência visual

Eu nasci e me criei na agricultura. Estudo? Meu pai queria que eu


estudasse muito, mas não deu. Mas eu me dediquei na agricultura
(S3).

Eu cresci os olhos pro serviço pra ganhar logo dinheiro, aí acabou,


perdi a oportunidade (S4).

Agora tem uns que nascem com merecimento já vai melhor, né. Que
já nasce com berço de ouro, tem mais condições, tem mais ajuda e
já sobe mais no grau. Agora tem uns que já nascem com o pouco
que não tem condições, aí ele tem que seguir o rumo do pai... e finda
naquilo ali mesmo. O meu lado já foi mais curto, meu pai encostava
pedra e tive que seguir o rumo dele, porque o lado do estudo naquela
época não dava, porque ele teve dez filhos, e o que ele ganhava só
dava pra comer. E meu pai dizia, olhe eu quero que trabalhe e que
não entre na vida do mundo, e eu comecei a pegar o ritmo dele e
dediquei só ao trabalho (S4).

A educação é encarada por alguns sujeitos como uma ferramenta de


desenvolvimento pessoal, proporcionando o alcance de sonhos e objetivos, a
possibilidade de lidar com situações práticas do dia a dia ou a desenvoltura para as
habilidades de comunicação e expressão. Constatamos tal recorrência quando
afirmam S4 e S13:

Quem tem mais conhecimento, vai mais adiante. [...] Se eu fosse um


homem de leitura, eu acho que eu não tava nesse grau aqui não
(S4).

Às vezes a mulher precisa sair de casa, eu tenho que ficar em casa.


Ela ajeita um problema melhor, porque ela tem leitura (S4).

Porque a pessoa que não sabe ler não sabe explicar tanto. A pessoa
que sabe ler sabe explicar tudo que passa, tudo que sente (S13).

A educação alberga um horizonte no qual os sujeitos com uma deficiência


visual podem vislumbrar um caminho de emancipação da condição de luto e
afastamento social por meio da integração social, desenvolvimento intelectual,
reforço da autoestima e aquisição de novas habilidades e competências.

Minha cunhada falou que ia colocar eu no colégio, pra ver se eu


concluía o terceiro. Eu disse tá, foi quando eu fui mais me animando
(S1).

E fui em 2008, e comecei minha reabilitação. Meu objetivo era


aprender o braile e música. Foram as duas coisas que eu entrei com
o objetivo. Aí foi surgindo a necessidade de estudar, de voltar a

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Saúde mental e deficiência visual

estudar. Fiz tudo depois que perdi a visão, ensino fundamental e


ensino médio (S8).

Fica caracterizada a educação como determinante social vinculado tanto ao


nível proximal do indivíduo, quanto ao meso e distal. Isso porque permite uma
ressignificação do enfrentar a deficiência, oportunizando novos pilares no
soerguimento desta condição, bem como, propiciando integração microssocial tendo
as políticas públicas como articuladora e garantidora deste direito.

A relação da saúde com o trabalho pode ser vista sob dois enfoques: como
um problema ambiental, de acordo com a corrente clássica da Saúde Ocupacional; e
como um fenômeno coletivo, a partir das compreensões advindas pela
Epidemiologia Social (LAURELL, 1981). Neste último, segundo Possas (1989, p.
219), no centro dos elementos que contribuem para o perfil da morbimortalidade da
população, está a inserção socioeconômica, sendo essa, de um lado, mediada por
fatores vinculados ao modo de vida (estilo de vida e condições de vida) e, por outro,
pela participação na estrutura ocupacional (mercado de trabalho, condições de
trabalho e processo de trabalho).
O trabalho é uma das facetas da vida mais fortemente afetada ao se adquirir
uma deficiência, notadamente uma deficiência visual. Surgem sentimentos de
incapacidade, frustração, medo e insegurança, que combinados interferem nas
condições de ajustamento físico e psíquico à prática laboral. Por sua vez, a
inatividade retroalimenta o estado de impotência, comprometendo a saúde mental e
social.

O início pra mim foi um choque, Não poder trabalhar. Eu me dediquei


na agricultura. Sou muito trabalhador. E você parar de uma vez é um
choque (S3).

Eu era um homem que não rejeitava trabalho não, toda hora era
hora. Desse tempo pra cá eu fui caindo de produção. No meu serviço
a visão não dá mais pra trabalhar, a vontade eu tenho, mas não
posso mais trabalhar, que é trabalho na pedra né. E por outro lado
acabou-se minha força e meu fôlego (S4).

Antes de perder a visão eu levava a vida normal, estudava,


trabalhava como comerciante, vendedora autônoma e fazia serviço
de babá. Infelizmente agora me considero uma inválida (S1).

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Saúde mental e deficiência visual

Antes do agravamento eu cuidava da agricultura, Hoje, A principal


dificuldade é tá sem poder trabalhar (S9).

Eu era babá de uma criança. Agora eu não consigo fazer nada (S15).

Porque se fosse depender pra mim tá dando aula hoje diretamente,


eu ia sentir muita dificuldade (S7).

Estudos revelam que as taxas de emprego caem com o surgimento da


deficiência, e continuam a cair com a duração de deficiência, indicando que as
pessoas abandonam a força de trabalho precocemente quando se tornam
deficientes. Isso se relaciona a diversos motivos: falhas nos sistemas de transporte e
acessibilidade; falta de disposição em arcar com os custos e adaptação do local de
trabalho; falhas nos serviços profissionais de reabilitação e capacitação; falta de
acesso aos recursos tecnológicos; falta de qualificação profissional e discriminação
no ambiente de trabalho (OMS, 2012; BRUMER et al., 2004).
Por sua vez, a segregação profissional destes indivíduos perpetua seu papel
de excepcional (GLAT, 1995), já que o corpo deficiente é insuficiente para uma
sociedade que demanda dele o uso intensivo, tendo suas ações controladas e
corrigidas em função de uma estética corporal hegemônica (SILVA, 2006).
Às vezes, a consequência da aquisição de uma deficiência recai sobre os
demais membros da família, ao denotar a necessidade de cuidado. Isso leva a
privações conjuntas da capacidade para o trabalho, refletindo em um maior impacto
nas condições materiais de vida familiar, como se observa em S11:

Quando eu tinha minha vida eu ia pro roçado trabalhar, ajudar meu


marido. Agora meu marido quase que não trabalha, porque sempre
tá do meu lado, ele só fica junto comigo. Não pode trabalhar pra tá
cuidando de mim (S11).

Um importante custo indireto da deficiência está associado à perda de


produtividade no trabalho entre pessoas com deficiência e a relativa perda de
impostos. As perdas aumentam quando membros das famílias abandonam seus
empregos ou reduzem o número de horas trabalhadas para cuidar de algum
membro deficiente da família. A perda de produtividade pode resultar do acúmulo
insuficiente de capital humano, da falta de emprego ou do subemprego. Pessoas
com deficiência em idade de trabalhar apresentam baixas taxas de empregabilidade
e taxas muito mais altas de desemprego do que pessoas sem deficiências. Menores

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Saúde mental e deficiência visual

taxas de participação no mercado de trabalho são uma das principais vias através
da qual a deficiência pode levar à pobreza (OMS, 2012). Assim sendo, há
probabilidades de a família da pessoa deficiente descobrir-se ocupando uma
posição inferior àquela de que desfrutava anteriormente (GOLFMAN, 1988).
O emprego traz benefícios sociais e pessoais por se tratar de um ambiente
promotor de socialização e trocas experienciais, favorecendo o senso de coesão
social e de dignidade humana (OMS, 2012). Essa realidade é afetada quando uma
deficiência visual se instala, uma vez que o isolamento conduz a prejuízos concretos
na interação social e na qualidade de vida, redimensionando os espaços de
circulação.
Exceto por S2 e S6, ambos estudantes, e S14, do lar, os demais
entrevistados apresentaram efeitos adversos diretos da perda visual na prática do
trabalho, conduzindo-os à inatividade ou à readaptação (S7).

Para quem convive com a sua turma se acha muito mais avançado.
E se ficar sozinho, o senhor se acha um pouco caído, né, assim é o
meu caso. E ali eu vejo todos os meus amigos praticando o que eu
praticava, e não posso mais chegar, né. Eu me achei muito só.
Acostumado a tá no meio da turma, trabalhando. Porque eles são
meus amigos, mas não é mais como era, porque eu tava no meio da
comunidade trabalhando e eu comecei a me sentir só (S4).

Eu tinha uma vida bem ativa, eu trabalhava, era vendedor. Quando


eu perdi a visão fiquei muito dentro de casa, trancado (S8).

Porque quando eu tinha minha oficina, minha casa era cheia. Em dia
de domingo, dia de sábado, eu ia pra lá, terminava, botava almoço, a
turma comia. Todo mundo chegava do trabalho pra falar logo lá. Mas
hoje não vai ninguém (S10).

Também não posso mais trabalhar na agricultura [...]. Agora eu só


vivo mais em casa (S5).

Em 1991, eu trabalhava na firma, e sempre tinha dificuldade. Hoje eu


vivo só da minha rede pra sala. Eu fico só ali mesmo, não tem pra
onde ir. que eu sinto a dificuldade, sabe (S10).

Hoje eu fico só mais dentro de casa. Porque a pessoa vai querer


fazer outras coisas e não consegue, não pode (S13).

Outra perspectiva do trabalho é a capacidade dele atuar como elemento de


realização pessoal.

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Saúde mental e deficiência visual

Hoje não tô trabalhando mais porque não tem jeito, mas eu gosto de
trabalhar (S4).

Meu sonho é trabalhar (S2).

Não tô trabalhando, mas eu tenho vontade (S5).

Quero, de repente, se for pra voltar a sala de aula, pra mim fazer
uma coisa que eu sempre gostei de fazer, trocar conhecimento com
os alunos (S7).

A relação entre o homem e o trabalho se dá desde o início da existência,


reforçando que o processo de transformação gerado pela força orgânica do homem
é capaz de transformá-lo em um elemento incluso na sociedade e gerador da sua
própria vida. Deste modo, o empenho produtivo de pessoas com deficiência
aumenta o bem-estar individual (OMS, 2012), uma vez que faz referência à própria
utilidade da pessoa humana (TEIXEIRA; GUIMARÃES, 2006).
Em alguns casos, a necessidade psicológica de manter-se no trabalho
impulsiona a reconstrução da vida onde a invalidez não anula a capacidade
produtiva. Outros casos, a mudança de profissão funciona como uma mola
propulsora da própria existência, com vistas à reabilitação psicossocial.
A reabilitação foi identificada em S7, que se manteve atuando na área de sua
formação, porém redirecionado a uma prática mais condizente com seus limites e
possibilidades. Assim, S7 registrou: “Seis anos atrás eu era professor diretamente
de sala de aula. Hoje eu não to mais em sala de aula, porque peguei uma função na
educação, que desse mais essa liberdade, de tá mais ali, numa biblioteca, mais à
disposição” (S7).
Já S8 interrompeu sua atividade profissional e passou a aprender um novo
ofício:

Foi em 2008, e comecei minha reabilitação. Mas eu acredito que


futuramente eu vou poder fazer tudo. É tanto que eu to a caminho de
dá aula em escola pública, eu to procurando meios e estudando
meios pra eu conseguir futuramente quando eu terminar o meu
curso, em dar aula igual a uma pessoa dita normal em sala de aula
(S8).

Quando a deficiência ocorre na fase adulta produtiva, independente da


contribuição à seguridade social, o trabalhador que adquiriu a deficiência deverá
participar de um processo de habilitação e reabilitação e, consequentemente, a

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Saúde mental e deficiência visual

promoção de sua integração na vida comunitária, o que inclui o mercado de


trabalho.
Desse modo, a habilitação consiste na capacitação para o exercício de uma
função por meio das competências e habilidades reveladas e pela condição da
execução dos trabalhos com a meta precípua de resgate da independência e
autonomia (TEIXEIRA; GUIMARÃES, 2006).
Entretanto, quando são encontradas dificuldades de acesso a serviços
especializados de reabilitação, ao trabalho e educação, as pessoas com deficiência
passam a apresentar risco elevado de vulnerabilidade social, perpetuando índices
elevados de desigualdades e injustiça social (OMS, 2012). Esta realidade é
fortemente reiterada por Castel (1987), ao denunciar que o que se esconde atrás da
deficiência não é a erupção do patológico, mas o universo da desigualdade, uma vez
que a noção de deficiência coloca em saliência o desempenho coletivo, indutor de
desadaptação social, relacionada à segregação, marginalização e exclusão.
Nesta pesquisa, percebemos que as condições financeiras são o resultante
de fatores individuais, micro e macrossociais, os quais incluem a incapacidade para
o trabalho, o nível educacional, as condições prévias de existência dos pais, os
fatores resultantes do comprometimento da saúde mental e a situação de
vulnerabilidade por escassez de oportunidades, incentivos e reabilitação. Soma-se
ainda a falta de acolhimento inclusivo e sem barreiras dos indivíduos com deficiência
visual no contexto social. Nesse cenário, sobressaem os condicionantes que
acarretam prejuízos nas condições materiais, soterrando as possibilidades de vida
digna para além do cumprimento de necessidades mínimas de existência.
O Estado é fruto do desenvolvimento histórico e foi concebido para suprir as
necessidades da sociedade, entre as quais incluem as mediações dos conflitos
sociais (CASTEL, 2003, P. 344-345). Deve agir, portanto, sobre as causas dos
problemas sociais de modo estratégico, desarmando os pontos de tensão, evitando
as rupturas e reconciliando os que caíram aquém da linha de flutuação permitida.
Trata-se do Estado social, alternativa para os problemas gerados pelo capitalismo.
(CASTEL, 2003, p. 610). Sobre esse aspecto, os sujeitos S4 e S9 realçam:

As barreiras que eu encontro é o salarinho pouco, olho pra dentro de


casa, se a gente não puder regar, a gente passa necessidade. Se eu
tivesse com minha visão melhor e minha saúde, um pouco
salariozinho com Deus é muito. Eu podia arrumar outra coisinha por

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Saúde mental e deficiência visual

fora, pra ir melhorando, mas não pra mim, pros meus filhos, pra não
ver eles sofrendo. E o maiorzinho tem diabetes pesada, e tudo
depende desse meu salarinho... Porque eu não tenho condição.
Vamos levando a vida que Deus dá. O que Deus bota na mesa,
vamos comendo. O salário que Deus me dá, passar com tudo é
pesado. Aí vamos levando, no dia que a gente não poder comer o
ovo, come feijão. No dia que a gente não poder comer um pedacinho
de carne, vamos levando... (S4).

O principal obstáculo é tá sem poder trabalhar, querer comprar uma


coisa e não pode comprar (S9).

Agora tem uns que nascem com merecimento já vai melhor, né. Que
já nasce com berço de ouro, tem mais condições, tem mais ajuda e
já sobe mais no grau. Agora tem uns que já nascem com o pouco
que não tem condições, aí ele tem que seguir o rumo do pai...e finda
naquilo ali mesmo. O meu lado já foi mais curto, meu pai encostava
pedra e tive que seguir o rumo dele, porque o lado do estudo naquela
época não dava, porque ele teve dez filhos, e o que ele ganhava só
dava pra comer (S4).

O comprometimento dos aspectos físicos-materiais, a escassez e a


desigualdade de recursos econômicos ocupam lugar de destaque na produção da
saúde e da doença, como elemento promotor de iniquidade, estresse e perturbações
mentais (BUSS; PELLEGRINI, 2007; GARCIA, 2014).
Diversos estudos comprovam que as pessoas com deficiência são mais
pobres e tem maiores dificuldades de se beneficiarem do desenvolvimento, do que
as pessoas sem deficiências. Fiorati e Elui (2015) atribuem essa realidade a
processos marcantes de exclusão do mercado de trabalho, dos mecanismos de
geração de renda, da educação e do acesso às oportunidades sociais de modo
equitativo.
A isso se relaciona uma maior probabilidade de desemprego e menor renda,
mesmo quando empregadas, parecendo piorar com a gravidade da deficiência.
Soma-se o fato de que com certa frequência requerem mais recursos devido ao
tratamento médico, dispositivos assistivos, ou a necessidade de cuidado pessoal
(OMS, 2012).
Aoki, Oliver e Nicolau (2011), estudando as condições de vida em uma
população com deficiência no município de São Paulo, identificaram que a pobreza e
a desigualdade social foram fatores que dificultaram o acesso dessa população a
bens e serviços essenciais para a vida humana e, em alguns casos, fator que
contribuiu para a aquisição da deficiência.

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Saúde mental e deficiência visual

Tendo em vista as pessoas com deficiência cuja inclusão não seria promovida
pelas políticas de incentivo à entrada no mercado de trabalho apenas, o Benefício
de Prestação Continuada (BPC) foi criado como um instrumento de proteção básica
para beneficiar os deficientes e suas famílias da situação de vulnerabilidade social
em decorrência do desemprego, da pobreza e do emprego informal.
Essa política social de segurança e renda garante a percepção de um salário
mínimo mensal destinado aos idosos e às pessoas com deficiência de baixa renda,
com vista a construção de uma rede de proteção social como garantia de cidadania,
reduzindo a vulnerabilidade social (JULIÃO; PAIVA; SHIMANO; CONTI; SANTOS,
2013). Os relatos que se seguem contextualizam esta realidade infringente em suas
rotinas, minorando suas possibilidades de vida digna condizentes com aquilo que se
preconiza para o alcance das necessidades materiais e de saúde, intimamente
relacionados.

São muitos gastos. Tem o aluguel, tem o gás, tem a energia, e o


dinheiro quase não dá. Estou tentando conseguir essa aposentadoria
pra ajudar (S16).

Porque eu não tenho condições. Com o benefício eu vou levando o


resto da minha vida, meus filhos e minha família, minha mulherzinha.
[...] O serviço social foi lá em casa e disse que esse menino precisa
de muita coisa (S4).

Cuido de cinco filhos e um marido... Meu marido tem glaucoma e é


pior do que eu e não pode também trabalhar. [...] vivo de bolsa
família. Tô batalhando pra conseguir o benefício da assistência social
(S13).

Não há como se atingir a saúde preconizada pelos instrumentos normativos e


de regulamentação, já descritos e plenamente justificados, sem uma atenção voltada
ao alcance de resultados satisfatórios, capazes de sobrepor aos impasses e
adversidades, advindos do descuido para com os determinantes sociais de saúde.
Em última análise, a observância destes fatores contextuais promove saúde mental,
pois são peças chaves indissolúveis nas estruturas individuais, e também, micro e
macrossociais.
Como uma proposta de conciliação e síntese dos resultados e discussões
apresentados, a Figura 2, a seguir, caracteriza um panorama dos múltiplos
determinantes sociais de saúde da pessoa com deficiência sob um olhar conjugado
com vistas à atenção e garantia da saúde mental almejada.

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Saúde mental e deficiência visual

Figura 2 – Panorama das múltiplas determinações sociais para a saúde mental


do sujeito com deficiência visual

Fonte: Elaboração do autor.

A partir desse direcionamento, evidenciamos uma realidade sistêmica


multideterminada quando se fala em saúde mental e deficiência visual. O
atendimento desses vetores possibilita um trilhar de vida mais condizente com os
anseios e potencialidades humanas frente às infidelidades do meio que nos cerca,
minimizadas ao nível do inevitável e aceitável.
Como um campo bastante polissêmico e plural, saúde mental diz respeito ao
estado mental dos sujeitos e das coletividades, condições altamente complexas,
promotoras das possibilidades da existência humana e social (AMARANTE, 2007).
Esse terreno torna-se particularmente fértil ao cultivo de articulações de saberes e
práticas com o campo da deficiência, enquanto objeto científico capaz de subsidiar o
planejamento e a reorientação dos serviços de saúde mental. Esta objetiva a
incorporação e reorganização da subjetividade, favorecendo, em última análise, a
inclusão de fato e a saúde coletiva pleiteadas.

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Saúde mental e deficiência visual

Os atores, inseridos nessa trajetória de cuidado individual e coletivo, passam


a ser identificados como potência transformadora, capazes de esculpir com
particular significado os modos de andar a vida, tão particulares quanto à pluralidade
de fenótipos que a raça humana nos revela.

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Saúde mental e deficiência visual

A saúde mental, como parte indissolúvel da saúde de um indivíduo, se


estrutura por meio de um aparato normativo constituído de atributos individuais
dinâmicos e historicamente aprendidos, bem como de uma conjuntura social mais ou
menos favorável às competências que a vida nos impõe. Trata-se dos determinantes
sociais de saúde, os quais se circunscrevem e influenciam nas possibilidades de
vida, inclusive quando uma deficiência visual se instala e novas demandas surgem.
Nesse contexto, o sujeito deficiente visual depara-se com uma realidade
ambivalente num mundo de adversidades e contradições, ao mesmo tempo em que
é desafiado constantemente a soerguer novas normas de vida. Esse marco dual, por
sua vez, se aprofunda e se revela na medida em que a inércia na atenção às
necessidades humanas básicas, e atitudes excludentes e normalizantes, se
perpetuam no entorno comunitário.
Ainda vivemos numa sociedade na qual a pessoa com deficiência precisa se
adaptar ao meio e se reinserir, num esforço unidirecional. Isso reflete o fato de que a
vida social não se modifica em alinhamento necessário para os novos modos de
fazer a vida andar.
O presente estudo objetivou analisar a contribuição dos determinantes sociais
de saúde no cotidiano de sujeitos com deficiência visual, a partir da identificação das
dificuldades encontradas e das estratégias de enfrentamento empregadas, com
ênfase na saúde mental. A partir disto, foi possível conhecer aspectos peculiares da
vida da pessoa com deficiência visual, por meio da interação do contexto social na
saúde mental dos sujeitos pesquisados.
Constatamos que a vivência da deficiência visual suscita novas abordagens
cotidianas e modos de enfrentamento, peculiares a cada ser, influenciados por
determinantes sociais que lhes rodeiam: saúde, autonomia, relações sociais,
preconceito, educação, trabalho e renda. Por conseguinte, nesse processo de
relações recíprocas, o sujeito deficiente constrói-se ou desconstrói-se, influenciado
pelo arcabouço psicoemocional afluente.

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Saúde mental e deficiência visual

Entre os modos estruturantes de enfrentar a condição do não ver, por meio de


vivência de fases do luto, em um processo de reconstrução, ficou evidenciada essa
realidade apenas nos casos de perda visual adquirida, ao passo que na deficiência
congênita, o sujeito constrói sua identidade sem rupturas perceptíveis, naturalizando
a diferença sensorial.
Sucede do encontro entre a subjetividade e as representações sociais da
deficiência visual o construto singular de normalidade e anormalidade vinculadas à
conceitos arraigados de limitações e possibilidades. Depreende-se que a percepção
de inconformidade com o sentir-se normal na expressão de vida cotidiana se revela
nos discursos, balizados por ideários de saúde desalinhados com a presença da
diversidade humana que lhe confere a multiplicidade de tons e cores. Esta, por sua
vez, caracteriza a variabilidade da vida, que comporta irregularidades, diferenças e
anomalias.
A libertação do cárcere em torno da deficiência visual se estabelece
descortinando o sofrimento psíquico que enevoa a relação consigo e com o outro,
restabelecendo os vínculos e as rédeas da própria vida, descaracterizando-se como
patológico para ressurgir como normativo, no processo de inclusão social. Todavia,
essa inclusão, de fato, inadiavelmente almejada e juridicamente prevista, só poderá
se concretizar à medida que os direitos universais a uma vida digna e interativa se
instaurem, permitindo o escopo da diferença na igualdade dos seres humanos que
lhes confere a existência.
Desse modo, normatividade não é adaptação; é criação de novas normas de
vida, convocando todos os outros a experimentar a diferença. Dessa experiência,
constrói-se uma sociedade receptiva e sensível ao acolhimento e convivência com a
diferença. Não mais como impotência e incapacidade, mas como oportunidade de
experimentação de novos modos de viver, alimentando uma maior capacidade de
tolerância às infidelidades do meio, constantemente vigiadas.
Com vistas a esta efetivação, considerar a implementação de currículos
capazes de contemplar a temática da deficiência em todos os níveis de ensino
proporciona uma retomada valorativa frente à diferença que nos cerca. Também, os
serviços de saúde, inclusive de apoio psicossocial, devem acolher as demandas
relativas ao sofrimento psíquico e seus desdobramentos interferentes na
homeostase social daqueles que se constituem a partir de alguma deficiência. As
famílias, igualmente, como instrumentos de amparo, acolhida e sustento, devem

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Saúde mental e deficiência visual

esforçar-se para uma abordagem receptiva de um membro familiar com deficiência,


munindo-o de ferramentas promotoras da autoconfiança e emancipação.
Particularmente, os resultados saltaram aos nossos olhos, permitindo-nos
respostas, mesmo que inacabadas ao questionamento propósito de nossas
inquietações. Aferimos, em um grupamento de sujeitos, as possibilidades
inspiradoras de uma convivência pacífica com a deficiência, estampadas numa
cortina de autopercepção de normalidade e modos próprios de enfrentar os limites
individuais em uma sociedade preconceituosa.
O contributo advindo por meio de novas pesquisas poderá suprir lacunas no
tocante à compreensão de fenômenos de estigmatizações concorrentes à
deficiência visual, na perspectiva da saúde mental, tais como obesidade, pobreza,
racismo, diversidade sexual e de gênero, dentre outros.
Os desafios revelados nessa pesquisa recrutam esforços coletivos das
instâncias gestoras e de toda a sociedade, visando a promoção de saúde mental da
pessoa com deficiência visual, garantida a partir de sua plena participação no
entorno comunitário e do respeito às diferenças próprias de cada um.

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Saúde mental e deficiência visual

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Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 95 )
Saúde mental e deficiência visual

SUMÁRIO 978-85-463-0187-4
Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 96 )
Saúde mental e deficiência visual

Universidade Federal do Rio Grande do Norte


Centro de Ciências da saúde
Programa de Pós Graduação em Saúde Coletiva
Pesquisadores: Érico Gurgel Amorim (Mestrando) e Jacileide Guimarães
(Orientadora)

ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA


Projeto de Pesquisa: Saúde mental de sujeitos com deficiência visual sob a ótica dos
determinantes sociais de saúde

Identificação e aspectos socioculturais:


1. Entrevistado:
2. Sexo:
3. Idade:
4. Escolaridade:
5. Local de moradia:
6. Estado civil:
7. Mora com quem:
8. Tem filho(s)?:
9. Ocupação:
10. Religião:
11. Renda média familiar:
a. ( ) sem renda
b. ( ) menos de 1 Salário mínimo
c. ( ) 1 a 2 Salários mínimos
d. ( ) 3 a 5 Salários mínimos
e. ( ) Mais de 5 Salários mínimos
13. Ano de início ou diagnóstico da deficiência visual:
14. Causa da deficiência visual:
15. Forma de instalação da deficiência visual:
a. ( ) abrupta
b. ( ) insidiosa
16. Grau da deficiência visual atual:
a. ( ) visão subnormal
b. ( ) cegueira total

Questões norteadoras

Parte 1 - Lidando com a deficiência visual no cotidiano (Três questões):


1. Como você enfrentou o início da deficiência visual?
2. Você encontra alguma barreira ou dificuldade no seu dia-a-dia por causa da
deficiência?
3. Se sim, de que modo você lida com essas dificuldades?

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Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 97 )
Saúde mental e deficiência visual

Parte 2 - Contexto psicossocial (Sete questões):


4. Que locais você costuma frequentar em seu dia-a-dia?
5. Como você se sente ao frequentar tais ambientes?
6. Quem são as pessoas com quem você interage no seu cotidiano?
7. O que você acha da atitude dessas pessoas em relação à sua deficiência?
8. O que é ter boa saúde mental para você?
9. Como você considera o seu estado atual de saúde mental?
10. O que pode ser feito para garantir uma melhor saúde mental às pessoas
deficientes visuais?

SUMÁRIO 978-85-463-0187-4
Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 98 )
Saúde mental e deficiência visual

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN


CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA
CURSO DE MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO – TCLE

ESCLARECIMENTOS

Este é um convite para você participar da pesquisa intitulada "Determinantes


psicossociais no cotidiano de sujeitos com deficiência visual: do normal ao
patológico", cuja pesquisadora responsável é a Professora Dra. Jacileide
Guimarães. Esta pesquisa objetiva analisar a contribuição dos determinantes
psicossociais no cotidiano de sujeitos com deficiência visual.
A justificativa que estimula a realização deste estudo é a necessidade de
conhecer o que favorece a perspectiva da inclusão social em detrimento da histórica
exclusão social vivenciada por pessoas com deficiência, em particular, deficiência
visual.
Tais informações são cruciais para a reflexão sobre o papel que a visão
cumpre no desempenho dos processos de autonomia e inserção social e com isso
permitir aos deficientes e profissionais envolvidos repensem suas práticas,
contribuindo para transformações e inovações no campo científico.
Caso você decida participar, faremos uma coleta de dados através de
entrevista semiestruturada que será gravada em aparelho eletrônico e digital, como
forma de captar as informações de forma concisa. A sua participação não garantirá
benefícios individuais, mas contribuirá na produção de conhecimentos favoráveis à
sustentação dos compromissos sociais com a atenção à saúde da pessoa com
deficiência. Além disso, este procedimento poderá gerar pequenos desconfortos
devido ao acesso dos pesquisadores às suas informações compartilhadas e
oferecerá riscos mínimos à sua saúde. Caso ocorram, serão de responsabilidade da
pesquisadora minimizá-los.
Salientamos que os dados coletados serão mantidos em sigilo e utilizados tão
somente para fins científicos, otimizando o compromisso, por parte da pesquisadora,
em manter anonimato de sua participação e minimizar risco de exposição do seu
profissionalismo. Os dados das entrevistas serão transcritos em arquivo digital e,
após analisados na finalização do estudo, serão arquivados em local seguro na
UFRN sob a responsabilidade da coordenadora da pesquisa. A divulgação dos
resultados será feita de forma a não identificar os participantes.
Destacamos que ao se voluntariar na pesquisa você ficará com uma cópia
deste documento, proporcionando-lhe conveniência de desistir da pesquisa a
qualquer momento desejado, retirando seu consentimento, sem que lhe seja

SUMÁRIO 978-85-463-0187-4
Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 99 )
Saúde mental e deficiência visual

imputada penalidades e/ou prejuízos. Caso ocorram custos não previstos advindos
da sua participação na pesquisa e/ou danos eventuais, desde que comprovados
legalmente, serão devidamente ressarcidos e/ou indenizados pela pesquisadora
responsável.
Durante a coleta de dados será utilizado um instrumento específico para a
entrevista devidamente validado para os propósitos da pesquisa e coerente com os
preceitos éticos estabelecidos pela Resolução 466/12 do Conselho Nacional de
Saúde (CNS/MS).
Toda dúvida que você tiver a respeito desta pesquisa poderá perguntar
diretamente à Professora Dra. Jacileide Guimarães no Programa de Pós Graduação
em Saúde Coletiva (PPGSCol), localizado no Departamento de Odontologia da
UFRN, ou ainda pelo email ppgscol@dod.ufrn.br, ou através do telefone (84) 3215-
4133.
Dúvidas a respeito da ética dessa pesquisa poderão ser questionadas ao
Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL),
localizado no terceiro subsolo do hospital, ou por telefone/fax (84) 3342-5003.
Contando com a sua colaboração, agradecemos antecipadamente.

CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Eu,
____________________________________________________________, após ter
sido esclarecido(a) sobre os objetivos, importância e o modo como os dados serão
coletados nessa pesquisa, além de conhecer os benefícios, riscos, desconfortos e
todos os meus direitos, concordo em participar voluntariamente e autorizo a
divulgação das informações oferecidas em congressos e/ou publicações científicas,
desde que nenhum dado possa me identificar.
Natal/RN, ____ de ____________de 2015.

___________________________________________
Assinatura do participante da pesquisa

COMPROMISSO DA PESQUISADORA

Como pesquisadora responsável deste estudo, assumo o compromisso em


proceder com os direitos que foram esclarecidos e assegurados aos participantes,
assim como manter sigilo e confidencialidade sobre a identidade do mesmo. Declaro
ainda estar ciente que na inobservância do compromisso assumido, estarei
infringindo as normas da Resolução 466/12 do CNS/MS.
Natal/RN, ____ de ____________de 2015.

___________________________________________
Prof. Dra. Jacileide Guimarães
Orientadora/pesquisadora responsável

SUMÁRIO 978-85-463-0187-4
Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 100 )
Saúde mental e deficiência visual

Sujeitos Idade Localidade Zona Escolaridade Estado Renda Ocupação Início Forma de Grau
civil familiar da DV instalação da DV
S1 28 São Urbana Ensino União 2 Vendedora em 2 Abrupta Ceguei
Gonçalo do médio estável inatividade mese ra total
Amarante completo s
S2 20 Cerro Corá Rural Ensino Solteiro 1 Estudante 3 Insidiosa Visão
fundamental inativo amos subnor
incompleto mal
S3 52 Monte das Urbana Ensino Casado 3 Agricultor 20 Abrupta Visão
Gabeleiras fundamental aposentado anos subnor
completo mal
monoc
ular
S4 51 Macaíba Urbana Analfabeto União 1 Pedreiro 5 Insidiosa Visão
estável aposentado anos subnor
mal
S5 60 Campo Urbana Ensino Viúvo 3 Agricultora 10 Insidiosa Visão
Redondo fundamental aposentada anos subnor
incompleto mal
S6 26 Lagoa de Urbana Ensino Solteiro 1,5 Estudante 6 Insidiosa Visão
Pedras médio anos subnor
completo mal
S7 46 São Urbana Ensino Casado 3 Professor em 5 Insidiosa Visão
Gonçalo do superior - readaptação anos submo
Amarante Pedagogia rmal
S8 34 Natal Urbana Nível Solteiro 1,5 Estudante de 12 Abrupta Ceguei
superior licenciatura em anos ra total
incompleto Música
S9 52 Lages Distrito Ensino União 1 Agricultor 11 Insidiosa Visão
Pintada fundamental estável aposentado anos subnor
incompleto mal
S10 59 Natal Urbana Ensino Casado 2 Mecânico de 3 Abrupta Visão
fundamental refrigeração - anos subnor
incompleto Aposentado mal
S11 52 Santo Urbana Ensino Casado 2 Agricultora 6 Abrupta Ceguei
Antônio do fundamental aposentada mese ra total
Salto da incompleto s
Onça
S12 20 Serra do Rural Ensino Solteiro 1 Desempregado 2 Abrupta Visão
Mel fundamental anos subnor
incompleto mal
monoc
ular
S13 48 São José Distrito Ensino União <1 Agricultora em 3 Abrupta Visão
do Mipibu fundamental estável inatividade anos subnor
incompleto mal
S14 29 Jardim do Rural Ensino Casado 1 Do lar - BPC 4 Abrupta Ceguei
Seridó fundamental anos ra total
incompleto
S15 22 Natal Urbana Ensino Solteiro 1 Desempregada 6
fundamental - BPC mese
incompleto s
S16 54 Parnamirim Urbana Ensino União <1 Agricultor 1 ano Abrupta Visão
médio estável aposentado subnor
completo mal

SUMÁRIO 978-85-463-0187-4
Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 101 )
Saúde mental e deficiência visual

SUMÁRIO 978-85-463-0187-4
Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 102 )
Saúde mental e deficiência visual

HOSPITAL UNIVERSITÁRIO ONOFRE LOPES-HUOL/UFRN

PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP


DADOS DO PROJETO DE PESQUISA

Título da Pesquisa: Determinantes psicossociais no cotidiano de sujeitos com


deficiência visual: do normal ao patológico

Pesquisador: JACILEIDE GUIMARÃES


Área Temática:
Versão: 2
CAAE: 45730015.0.0000.5292
Instituição Proponente: Pós-Graduação em Saúde Coletiva Patrocinador
Principal: Financiamento Próprio

DADOS DO PARECER
Número do Parecer: 1.157.507 Data da Relatoria: 24/07/2015

Apresentação do Projeto:
A presente pesquisa caracteriza-se como uma pesquisa exploratória, descritiva de
abordagem qualitativa que tem como objetivo analisar a contribuição dos
determinantes psicossociais no cotidiano de sujeitos com deficiência visual. Os
sujeitos da pesquisa serão usuários do ambulatório de oftalmologia do Hospital
Universitário Onofre Lopes (HUOL), na cidade de Natal/RN. O procedimento
empregado para a coleta de dados será entrevista semiestruturada com questões
norteadoras do fenômeno investigado e a análise será realizada à luz do método de
análise temática

Objetivo da Pesquisa:
Objetivo Primário:
• Analisar a contribuição dos determinantes psicossociais no cotidiano de sujeitos
com deficiência visual. Objetivo Secundário:
• Identificar as dificuldades encontradas no contexto psicossocial por deficientes
visuais;
Descrever as estratégias de enfrentamento empregadas em relação às
adversidades cotidianas vivenciadas;
• Investigar a percepção de saúde mental de pessoas com deficiência visual com
base em suas experiências singulares.

SUMÁRIO 978-85-463-0187-4
Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 103 )
Saúde mental e deficiência visual

Avaliação dos Riscos e Benefícios:

Riscos:
O procedimento de coleta de dados, através da entrevista semiestruturada,
oferecerá riscos mínimos à saúde dos participantes e poderá gerar pequenos
desconfortos devido ao acesso dos pesquisadores às informações compartilhadas.
Caso ocorram, estes riscos serão minimizados através das seguintes providências:
haverá permissão do participante para retirar-se da pesquisa no momento em que
este achar conveniente sem nenhum prejuízo; intervenções pontuais do
entrevistador e retomada da questão norteadora da pesquisa, a fim de reduzir
possíveis desconfortos.

Benefícios:
Os benefícios garantidos aos sujeitos da pesquisa corresponderão à ampliação dos
conhecimentos através da reflexão acerca do problema em investigação. Além
disso, a participação do sujeito contribuirá na discussão sobre o processo de
trabalho instituído e despertará para a produção de novas práticas assistenciais,
favoráveis à sustentação dos compromissos sociais com a rede de atenção em
saúde de Natal/RN

Comentários e Considerações sobre a Pesquisa:


A pesquisa em análise encontra-se bem estruturada e possui relevância para o meio
acadêmico e social.

Considerações sobre os Termos de apresentação obrigatória:


Foram apresentados todos os termos obrigatórios.

Recomendações:
Em relatoria anterior, observou-se que o cronograma de execução apresentava
período de coleta de dados anterior a apreciação e aprovação pelo CEP/HUOL,
razão pela qual recomendou-se a pesquisadora que adequasse o cronograma, bem
como apresentasse carta de comprometimento.
Tais recomendações foram atendidas e as pendências sanadas.

Conclusões ou Pendências e Lista de Inadequações:


Sem pendências ou inadequações. Pugna-se pela aprovação.
Situação do Parecer: Aprovado
Necessita Apreciação da CONEP: Não
Considerações Finais a critério do CEP:

NATAL, 23 de Julho de 2015


Assinado por: HELIO ROBERTO HEKIS (Coordenador)

SUMÁRIO 978-85-463-0187-4
Érico Gurgel Amorim – Jacileide Guimarães ( 104 )
Saúde mental e deficiência visual

SUMÁRIO 978-85-463-0187-4

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