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Meteorologia
Previsão de
Tempo e Clima
Rita Yuri Ynoue
Michelle S. Reboita
Tércio Ambrizzi
Gyrlene A. M. da Silva
Nathalie T. Boiaski
12.1 Introdução
12.2 Breve histórico
12.3 Princípios da previsão do tempo e do clima
12.4 Etapas da previsão de tempo e de clima
12.5 Tipos de Modelos
12.6 Previsão de tempo
12.7 Previsão do clima
Referências
12.1 Introdução
Nos textos anteriores, foram apresentados alguns dos sistemas de tempo que atuam na
atmosfera, bem como a definição de clima a partir da média dos registros das variáveis atmosféricas
(temperatura, precipitação etc.) que sofrem a influência de tais sistemas. Através de equações
físicas e métodos matemáticos e computacionais, é possível prever numericamente tanto o
tempo quanto o clima. Por exemplo, prognosticar se daqui a 3 ou 6 dias choverá ou não
(previsão do tempo) ou se uma dada estação do ano será mais quente ou mais fria do que a
média climat lógica (previsão do clima). Diante do expos, o objetivo deste texto é apresentar
uma introdução sobre a previsão numérica de tempo e de clima.
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Então, como é possível fazer uma previsão climática em que é preciso deixar o
modelo resolvendo as equações prognósticas para semanas, anos ou séculos?
A resposta dessa questão é que na previsão climática não se tem interesse em prever com exati-
dão o local e o momento da ocorrência de um sistema atmosférico como na previsão do tempo
e, sim, que o fenômeno seja simulado pelo modelo. Por exemplo, se o objetivo é prever como
será a precipitação no outono austral, uma simulação é feita para essa estação; depois é calculado
o total acumulado de precipitação e, por fim, este é comparado com o valor climatológico
(que é proveniente da média de um longo período de precipitação observada). Assim, é possível
saber se tal estação será mais úmida ou mais seca do que a climatologia observada.
A principal ferramenta utilizada para as previsões de tempo e de clima são os modelos
numéricos conhecidos como Modelos Numéricos de Circulação Geral – MCG, que são
constituídos por um conjunto de equações físicas descritas em forma numérica e resolvidas
com o auxílio de computadores. Para entender o que um modelo numérico faz, considere a
equação da aceleração média:
∆v
a= 12.1
∆t
A equação apresentada é uma equação física e pode ser escrita numericamente como:
∆v v − v0
a= = 12.2
∆t t − t0
onde v0 é a velocidade inicial de um objeto no instante de tempo inicial t0 e v é a sua veloci-
dade final no instante de tempo final t. Nos modelos numéricos, as equações são representadas
como acima e são fornecidos os valores para as variáveis; o computador é utilizado para realizar
os cálculos. No exemplo, considere que um carro esteja parado (v0 = 0) no instante de tempo
t0 (t0 = 0) e que começou a se movimentar e adquiriu velocidade de v = 5 m s-1, 5 segundos
após iniciar o movimento (t = 5 s). Dessa forma, a aceleração corresponde a 1 m s-2:
∆v 5 − 0
a= = = 1 ms −2 12.3
∆t 5 − 0
O que poderia acontecer com a aceleração média 10 segundos depois? O valor que queremos
conhecer é o valor proveniente de uma previsão.
É possível prever o tempo e o clima com base no seguinte princípio: a partir de um estado
inicial (condições iniciais e de contorno), é possível obter um estado futuro (previsão) através
de um conjunto de equações que representam os processos físicos e dinâmicos da atmosfera
(modelo numérico).
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Figura 12.1:
Representação
esquemática das etapas
envolvidas nas previsões
de tempo e de clima.
a. Análise
Na fase da análise, as observações meteorológicas são fornecidas a programas computacionais,
que preparam os dados para os modelos de previsão. Uma vez que a rede de observações
global de dados não cobre regularmente a superfície da Terra, as observações meteorológicas
são submetidas a métodos matemáticos para se tornarem uniformes, isto é, valores iniciais com
espaçamento horizontal regular. Embora isso seja somente um passo preparatório, a tarefa é
difícil, pois há milhões de dados provenientes de diferentes fontes (satélites, navios, estações
meteorológicas de superfície etc.) e que não necessariamente foram medidos no mesmo
horário. Além disso, nenhuma das medidas é completamente livre de erros. Assim, é necessário
o máximo possível dos erros para produzir campos atmosféricos consistentes.
O procedimento da análise também inclui a junção de condições iniciais observadas e previsões
do modelo numérico para a elaboração de condições iniciais para esse modelo. Em síntese, a
fase da análise tem como objetivo criar um conjunto de dados com espaçamento horizontal
uniforme para ser fornecido aos modelos de previsão como condição inicial.Terminada a etapa
da análise, o modelo pode ser executado para produzir as previsões.
b. Previsão
O trabalho de um modelo numérico é resolver as equações básicas que descrevem o
comportamento da atmosfera. A Tabela 12.1 sumariza tais equações.Vale a pena lembrar que o
vento possui 3 componentes nas direções ortogonais x, y e z, ou seja, V = (u, v, w). Informações
detalhadas dessas equações podem ser obtidas em Kalnay (2003).
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Tabela 12.1: Breve enumeração das equações que descrevem os processos fundamentais que ocorrem na atmosfera.
Equação Descrição
Conservação do movimento:
∂V ∇p Força = massa . aceleração
+ V .∇V = − − 2Ω × V + g + Fv Descreve como o movimento horizontal do ar (o vento
∂t ρ meridional: norte-sul e o vento zonal: leste-oeste) evolui ao
longo do tempo cronológico.
Conservação da energia:
∂T 1 dp entrada de energia = aumento da energia interna +
Cp + V .∇T =
+ Q + FT trabalho realizado
∂t ρ dt Descreve quais mudanças na temperatura do ar resultam da
adição/subtração de calor ou devido à expansão/compressão do ar.
Conservação da massa:
∂ρ A soma dos gradientes do produto da densidade e velocidade
+ V .∇ρ = −ρ∇.V do vento nas 3 direções ortogonais é zero.
∂t Descreve que a massa do volume de ar não muda, ou seja, a
massa que entra no volume de ar é igual à massa que sai.
Conservação da água:
∂q S Descreve o complexo transporte de água em
+ V .∇q= q + Fq suas diversas formas
∂t ρ e estágios dentro do ciclo hidrológico.
Conservação do estado:
p = ρ.R.T Descreve a relação entre a pressão, o volume, a temperatura
e quantidade de um gás ideal.
As equações nos modelos de previsão de tempo e clima são resolvidas em pontos de grade,
isto é, a superfície do planeta é dividida em latitudes e longitudes e a intersecção delas fornece
os pontos de grade. Já a distância entre 2 pontos de grade vizinhos fornece a resolução hori-
zontal do modelo (Figura 12.2). A atmosfera também é dividida em níveis verticais, a chamada
resolução vertical. No lado esquerdo da Figura 12.2a é mostrado um volume utilizado para
representar parte da atmosfera, e o conjunto deles é mostrado na Figura 12.2b, representando
toda a extensão horizontal e vertical da atmosfera no globo. Em cada um dos vários volumes
são calculados os valores de temperatura, pressão, umidade, componentes do vento etc. para um
determinado intervalo de tempo futuro.
Para uma previsão do futuro, o modelo é iniciado com as condições iniciais observadas
e a previsão para aquele momento. Também é informado no intervalo de tempo (resolução
temporal previamente determinada), que ele vai fazer a integração das equações até chegar ao
final do tempo desejado (por exemplo, 24 h, 48 h, 72 h). As condições da atmosfera observadas
são utilizadas apenas na primeira integração, pois nas demais o modelo utilizará a previsão feita
anteriormente como condição inicial. Com isso, é elaborado um conjunto de previsões: para
algumas horas, um dia ou alguns dias etc.
Figura 12.2: a. Lado esquerdo: volume representando parte da atmosfera; lado direito: ponto de grade e
observações vizinhas; b. Vários volumes representando toda a extensão horizontal e vertical da atmosfera no globo.
c. Pós-processamento
Embora os modelos numéricos façam cálculos para intervalos de tempo de minutos, os
arquivos de saída com os resultados dos cálculos são reduzidos para intervalos regulares de horas
(por exemplo, a cada 12 horas) e em pontos de grade. Com os arquivos de saída dos modelos,
os meteorologistas elaboram mapas de diferentes variáveis atmosféricas e, após o estudo desses
mapas, elaboram os boletins da previsão de tempo e clima, dependendo do modelo utilizado.
Essas atividades são chamadas de pós-processamento. Os boletins são imporantes para o plane-
jamento de várias atividades como ilustra a Figura 12.1.
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a b
Figura 12.4: a. Previsão de chuva acumulada em 24 horas do modelo MBAR válido para 12 UTC de 08/6/2011 ; b. Previsão de chuva
acumulada em 24 horas e PNMM do modelo regional para 00 UTC de 25/5/2004. / Fonte: a. INMET; b. CPTEC/INPE.
a b
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ainda que essa TSM se mantenha mais quente do que a climatologia por cerca de
meses. A situação descrita está associada à ocorrência de um vento El Niño e já é
sabida que esse causa alteração na circulação em várias regiões do globo. Entre essas
tem-se a subsidência do ar sobre o norte da região norte do Brasil e na região
nordeste. Logo, a precipitação é alterada nessas regiões e, portanto, as condições
climáticas. Ainda é importante lembrar que os modelos climáticos necessitam de
condições iniciais e de contorno inferior . A topografia, tipo de cobertura do solo é a
TSM. De forma geral as duas primeiras são consideradas estáticas enquanto a TSM é
variável ao longo do tempo. Portanto, em geral, são utilizados modelos de circulação
oceânica para prever essa variável e fornece-lá aos modelos atmosféricos.
As Figuras 12.6 e 12.7 exemplificam as etapas envolvidas na previsão climática trimestral
do CPTEC/INPE para a América do Sul. Suponha que o objetivo seja a previsão de chuva
para a estação do verão (de dezembro a fevereiro). A previsão para essa estação será inicializada
em novembro (ver canto superior esquerdo da Figura 12.6). Para minimizar os efeitos do caos
atmosférico, várias simulações são realizadas para o mesmo período. A seguir, a média dessas
simulações é calculada a fim de fornecer a previsão sazonal do conjunto (de simulações).
O resultado obtido com a previsão sazonal do conjunto é apresentado através de mapas de
anomalias (por exemplo, anomalia de chuva mostrada no canto direito da Figura 12.6), isto é,
a diferença entre previsão sazonal e a climatologia do modelo. Esta última (ver canto inferior
esquerdo da Figura 12.6) é obtida executando o modelo para um período passado longo, por
exemplo, os últimos 30 anos. Entretanto, também são realizadas várias simulações a fim de obter
a climatologia do conjunto (de simulações).
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a b c
Figura 12.9: a. Previsão de precipitação acumulada (mm) para o outono de 1998; b. climatologia da precipitação simulada pelo modelo
para o outono; e c. previsão da anomalia de precipitação acumulada (mm) para o outono de 1998. / Fonte: CPTEC/INPE.
O CPTEC/INPE utiliza a técnica de previsão por conjunto para avaliar em que regiões um
modelo possuí menor ou maior habilidade de um dado modelo prever o clima. Por exemplo, um
modelo climático é iniciado várias vezes para gerar múltiplas saídas (membros). É possível avaliar
para quais regiões houve menor ou maior previsibilidade com base na dispersão de cada membro em
relação à média de todos eles. A seguir tem-se a comparação de uma avaliação para a previsão
de precipitação nas regiões sudeste e norte do nordeste do Brasil entre outubro de 1998
e maio de 1999 (Figura 12.10a e 12.10b, respectivamente). A linha tracejada em preto
representa a média das saídas do modelo e as linhas coloridas, os 25 membros para o período.
A maior dispersão entre os membros (linhas coloridas mais afastadas da linha preta tracejada)
na região sudeste (Figura 12.10a) indica menor previsibilidade para essa região; e a menor
dispersão entre os membros (Figura 12.10b) na região norte do nordeste, maior previsibilidade.
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a b
Figura 12.10: Exemplo de avaliação da previsibilidade climática da previsão de precipitação para as regiões a. sudeste e
b. norte do nordeste. / Fonte: CPTEC/INPE.
Com o intuito de minimizar os efeitos da natureza caótica da atmosfera nas previsões numéricas,
alguns centros de meteorologia realizam previsões de consenso que têm caráter qualitativo.
Por exemplo, os grupos de cientistas do CPTEC/INPE, INMET e GrEC comparam as previsões
climáticas de diferentes modelos e, juntamente com seus conhecimentos sobre a evolução
observada das condições atmosféricas e oceânicas globais e regionais dos últimos meses,
elaboram a previsão de consenso. Um exemplo está na Figura 12.11, referente à previsão de
consenso do CPTEC/INPE e INMET para os meses de novembro de 2011 a janeiro de 2012
sobre o Brasil, a qual é mostrada através da probabilidade de ocorrência de chuva em torno,
acima ou abaixo da média climatológica. No extremo sul do país, há cerca de 45% de probabi-
lidade de ocorrer chuva abaixo da média climatológica, 35% de ocorrer o valor climatológico
e 25% de ser maior do que a climatologia. Já no norte do Brasil, as porcentagens são de 25.35
e 40%, respectivamente. Esses valores indicam que há maior chance de ocorrência de chuva
abaixo do valor climatológico. As áreas em cinza na Figura 12.11 indicam falta de informações
concordantes entre os modelos e, portanto, falta de confiabilidade na previsão.
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Glossário
Condições de fronteira lateral: modelos numéricos regionais (também chamados de modelos de área
limitada) representam apenas porções do globo. Assim, esses modelos a cada tempo de integração
(resolução das equações) necessitam ser “alimentados” nas fronteiras (laterais) por dados provenientes
de modelos globais.
Condições iniciais: dados de atmosfera (pressão, temperatura, umidade, ventos e altura geopotencial,
por exemplo) espaçados em pontos de grade e em vários níveis verticais de um determinado
instante que são fornecidos aos modelos numéricos para poderem realizar as previões do estado
futuro da atmosfera.
Modelo numérico global: simulam as condições atmosféricas de todo o planeta.
Modelo numérico: conjunto de equações matemáticas que representam os processos físicos na natureza.
Previsão de clima: prever, por exemplo, se uma dada estação do ano será mais seca ou chuvosa, quente
ou fria comparada ao valor médio climatológico.
Previsão do tempo: previsão de até uma semana das condições atmosféricas. O objetivo é saber quando
e onde irá chover, por exemplo.
Previsão por conjunto: no inglês recebe o nome de ensemble; corresponde a várias simulações
executadas para um mesmo período, mas condições iniciais ligeiramente diferentes em cada simulação.
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