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UNIVERSIDADE METODISTA DE PIRACICABA

FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

Uma leitura sociológica da relação da Igreja


Metodista com suas Instituições de Ensino
a partir de Max Weber

NILSON DA SILVA JÚNIOR

Piracicaba, SP

2015
Uma leitura sociológica da relação da
Igreja Metodista com suas Instituições de
Ensino a partir de Max Weber

NILSON DA SILVA JÚNIOR

Orientadora: Profa. Dra. Raquel Pereira Chainho Gandini

Tese apresentada à Banca Examinadora do


Programa de Pós-Graduação em Educação
da UNIMEP como exigência parcial para
obtenção do título de Doutor em Educação.

Piracicaba, SP

2015

2
Ficha Catalográfica elaborada pelo Sistema de Bibliotecas da UNIMEP
Bibliotecária: Carolina Segatto Vianna CRB-8/7617

Silva Junior, Nilson da


S586L Uma leitura sociológica da relação da igreja metodista
com suas instituições de ensino a partir de Max Weber /
Nilson da Silva Junior. – 2015.
168 f. : il. ; 30 cm.

Orientador: Profa. Dra. Raquel Pereira Chainho Gandini.


Tese (doutorado) – Universidade Metodista de Piracicaba,
Educação, 2015.

1. Igrejas metodistas – Educação. 2. Weber, Max, 1864-


1920. I. Gandini, Raquel Pereira Chainho. II. Título.

CDU – 37:287
BANCA EXAMINADORA

Orientadora: Profa. Dra. Raquel Pereira Chainho Gandini


Titular 1/ Instituição: Profa. Dra. Maria Angélica Penatti
Pipitone (Esalq/USP)
Titular 2/ Instituição: Prof. Dr. Clóvis Pinto de Castro / Ex-
Reitor UNIMEP
Titular 3/ Instituição: Prof. Dr. Cesar Romero A. Vieira /
UNIMEP
Titular 4/ Instituição: Prof. Dr. Josué Adam Lazier /
UNIMEP

3
AGRADECIMENTOS

Ao meu grande amor, Márcia, refúgio de toda paz e felicidade,

À Rebecca e Gabriel, fontes inesgotáveis de vida, dedicação e carinho,

À minha família, berço e referência,

Aos mestres da vida (in memorian) José Carlos de Moraes e Elias Boaventura,

Aos amigos Marcos e Sérgio,

À minha sempre orientadora, Raquel Gandini,

Aos provocadores do pensar, professores

Dr. José Maria Paiva, Dr. Cesar Romero Amaral Vieira, Dr. Bruno Pucci, Drª. Roseli

Pacheco Schnetzler, Dr. Cleiton de Oliveira, Dr. Josué Adam Lazier, Drª. Maria

Angélica Penatti Pipitone, Dr. Clóvis Pinto de Castro (banca mestrado e doutorado).

4
RESUMO

Nosso trabalho é um exercício acadêmico que contempla uma leitura da relação da Igreja
Metodista com suas Instituições de Ensino a partir da sociologia, tendo como
pressupostos a sociologia de Max Weber. O problema levantado se refere à falta de
pesquisa acadêmica da relação Igreja – Escola através da sociologia, considerando que a
grande maioria desses trabalhos, senão sua totalidade, vem sendo desenvolvida através
de pressupostos históricos, teológicos ou pedagógicos. Nosso objetivo é demonstrar a
possibilidade da análise sociológica envolvendo o contexto da educação confessional
metodista, especificamente a relação da Igreja Metodista com suas Instituições de Ensino
tendo como base a teoria weberiana e os documentos oficiais balizadores destas
instituições. No primeiro capítulo expomos as fundamentações teóricas weberianas, pelas
quais analisamos nosso objeto de estudo. No segundo capítulo caracterizamos cada
instituição a partir da fundamentação apresentada, com a finalidade de buscar um
enquadramento teórico que as classifique segundo as perspectivas do autor. No terceiro
capítulo aprofundamos esses conceitos para perceber quais são as aproximações e
distanciamentos entre estas instituições a partir de suas características mais próprias. Por
ser sociológica, esta elaboração não tem como objetivo a constatação de possíveis acertos
e desacertos da relação, mas demonstrar a partir do referencial teórico as características
que as motivam e, portanto, que legitimam seus valores, propósitos e finalidades. Desta
maneira demonstramos que seus encontros e desencontros podem se dar primordialmente
a partir de valores intrínsecos às situações de interesses que molduram esta relação.

Palavras-chave: Igreja Metodista – Instituições de Ensino - Legitimidade – Dominação


– Carisma – Burocracia – Tradição.

5
ABSTRACT

This paper is an academic exercise that covers a reading of the relationship of the
Methodist Church with its educational institutions through sociology, having as
assumptions the sociology of Max Weber. The problem raised concerns the lack of
academic research of the Church - School relationship through sociology, considering
that the vast majority of these works, if not its entirety, are being developed through
historical, theological or pedagogical assumptions. The goal is to demonstrate the
possibility of sociological analysis involving the context of the methodist confessional
education, specifically the relationship of the Methodist Church with its Educational
Institutions considering the weberian theory and the official documents underpinning
these institutions. In the first chapter are exposed the weberian theoretical fundamentals,
by which the object of study is analyzed. In the second chapter, each institution is
characterized from the given fundaments, with the purpose of seeking a theoretical
framework that classifies them according to the perspectives of the author. In the third
chapter these concepts are deepened to understand what are the similarities and diferences
between these institutions from its most distinctive characteristics. As this paper is
sociological, it is not meant to find possible rights and wrongs of the relationship, but
demonstrate from the theoretical framework the features that motivate and therefore
legitimate their values , purposes and objectives. That way it is shown that their
agreements and disagreements can occur primordially from intrinsic values to the
situations of interests that molds this relationship.

Keywords: Methodist Church - Educational Institutions - Legitimacy - Domination -


Charisma - Bureaucracy - Tradition.

6
SUMÁRIO

Agradecimentos ................................................................................................................ 4
Resumo ............................................................................................................................. 5
Abstract ............................................................................................................................ 6
Sumário ............................................................................................................................ 7
Introdução ........................................................................................................................ 8
Capítulo 1 – Fundamentos teóricos: Burocracia, carisma, disciplina, religião e os três tipos
puros de legitimação de autoridade .............................................................................. 18
1.1 Burocracia ................................................................................................................. 18
1.2 Carisma ..................................................................................................................... 28
1.3 Disciplina .................................................................................................................. 31
1.4 Religião ..................................................................................................................... 34
1.4.1 Sofrimento ............................................................................................................. 35
1.5 Os Tipos Puros de Dominação Legítima .................................................................... 42
Capítulo 2 – Características da Igreja Metodista e das Instituições de Ensino Metodistas
brasileiras a partir do Plano de Vida e Missão e das Diretrizes para a Educação da Igreja
Metodista – Uma leitura Weberiana .............................................................................. 57
2.1 Igreja ......................................................................................................................... 58
2.1.1 Plano de Vida e Missão (PVM) ............................................................................... 60
2.1.2 O Plano de Vida e Missão como referência das características da Igreja Metodista
brasileira ......................................................................................................................... 69
2.2 Diretrizes para a Educação da Igreja Metodista (DEIM) ............................................ 73
2.2.1 As Diretrizes para a Educação como referência das características das Instituições de
Ensino da Igreja Metodista brasileira .............................................................................. 79
Capítulo 3 – A Relação entre a Igreja Metodista e suas Instituções de Ensino: Uma leitura
por meio dos tipos puros de dominação legítima ............................................................ 92
3.1 Tipos de dominação legítima .................................................................................... 97
3.2 Dominações a partir das situações, circunstâncias e interesses .............................. 121
3.3 A Igreja Metodista e suas Instituições de Ensino a partir dos três tipos puros de
dominação legitima – um retrato ................................................................................. 126
Considerações Finais ..................................................................................................... 128
Referências Bibliográficas ............................................................................................. 132
ANEXO 1 – Plano para a Vida e Missão ......................................................................... 136
ANEXO 2 – Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista .......................................... 157

7
INTRODUÇÃO

Inicialmente consideramos adequada a definição do nosso objeto de estudo, a


Igreja Metodista brasileira e suas Instituições de Ensino. A Igreja, implantada por
missionários da Igreja Metodista americana só alcançou sua autonomia a partir de 1930,
deste então se desenvolveu chegando a uma estrutura que, segundo os dados apresentados
em seu último Concílio Geral, é de 215 mil adeptos distribuídos em oito regiões
eclesiásticas organizadas segundo delimitações geográficas do país sendo a 1ª Região
representada pelo Estado do Rio de Janeiro, a 2ª Região pelo Estado do Rio Grande do
Sul, a 3ª Região por parte do Estado de São Paulo, compreendendo a Capital e
adjacências, a 4ª Região pelo Estado de Minas Gerais e Espírito Santo, a 5ª Região pelo
interior do Estado de São Paulo além de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Distrito
Federal, Goiás e Tocantins. A 6ª Região abrange os Estados do Paraná e Santa Catarina,
a Região Missionária do Nordeste compreende os Estados do nordeste e a Região
Missionária do Amazonas engloba as regiões Norte e Amazônica.

Em números, os membros estão distribuídos em 105.632 na 1ª região, 11.922 na


2ª, 18.278 na 3ª, 26.521 na 4ª, 21.463 na 5ª, 22.850 na 6ª, 4.063 na Região Missionária
do Nordeste e 3.086 na Região Missionária da Amazônia, sendo 1038 Igrejas
organizadas, além de 373 congregações e 400 pontos missionários no país. São 1073
pastores presbíteros, 35 pastores suplentes, 209 pastores e 10 diáconos e diaconisas. A
Igreja organiza seu clero segundo o grau de formação acadêmica e eclesiástica. Pastores
Presbíteros são aqueles que dispõem de toda a formação exigida, ou seja, preparo
acadêmico que requer além da formação inicial de um ano no Seminário Regional – cada
região dispõe de um seminário – o Curso de Bacharel em Teologia na Faculdade de
Teologia da Igreja Metodista, um período de dois anos como aspirante ao Presbitério, em
exercício pastoral numa igreja local, que compreende na avaliação da comunidade
pastoreada, do Superintendente Distrital, seguido de prova escrita e entrevista com uma
banca de clérigos designada pela Região Eclesiástica. Depois desse processo o candidato
se submete a uma nova avaliação através de eleição pelo Concílio Regional, sinalizando
o reconhecimento da Igreja para seu ingresso na Ordem Presbiteral que acontece através
de cerimônia presidida pelo bispo diante do Concílio reunido.

8
Os pastores, ou seja, aqueles que não são Presbíteros, não contam com a formação
total exigida pela Igreja. Diáconos são leigos que recebem o reconhecimento pastoral para
o exercício de uma tarefa específica nos diversos ministérios da Igreja.

Além da estrutura das Regiões Eclesiásticas a Igreja conta com uma Sede Geral,
administrada por um Colégio Episcopal, composto por sete bispos e uma bispa que são
Pastores Presbíteros eleitos a cada cinco anos pelo Concílio Geral, designados por este
para presidir as referidas regiões. A Sede Geral organiza e gere tanto o caráter eclesiástico
quanto o administrativo através de assessorias e câmaras representadas pelas regiões,
dispondo de sede própria situada na cidade de São Paulo-SP.

Quanto às Instituições de Ensino, é necessário esclarecer que, segundo os


documentos da Igreja Metodista, o tema da Educação envolve três áreas: a Educação
Cristã, a Educação Teológica e a Educação Secular. A Educação Cristã compreende o
espaço eclesiástico comunitário, dedicada ao estudo sistemático da bíblia e dos
documentos da Igreja como referência de fé e prática cristã sendo destinada à formação,
doutrinamento e preparo da membresia. É desenvolvida no ambiente informal através de
reuniões dominicais nos templos, sem rigor acadêmico, pelos próprios membros com o
auxílio e orientação dos pastores. Embora se reconheça que a Educação Cristã não exerce
caráter pedagógico, a Igreja Metodista dedica a este segmento valor expressivo através
do preparo minucioso de material didático único para todas as regiões do país, orientado
por professores e especialistas que formam uma câmara nacional designada pela direção
da Igreja.

A Educação Teológica Metodista merece destaque especial considerando que


desde o seu surgimento, no final do século XIX, através dos internatos dos Colégios
Piracicabano em Piracicaba-SP e Granbery em Juíz de Fora-MG (Matos, 2010), teve
atenção cuidadosa por parte da Igreja. A Faculdade de Teologia da Igreja Metodista no
Brasil tem reconhecimento acadêmico e histórico, sendo organizada oficialmente em
1938 como resultado da fusão das escolas teológicas metodistas existentes na época em
Minas Gerais e no Rio Grande do Sul. Segundo Matos:

O Granbery (...) em 1928 foi elevado à categoria de Faculdade de


Teologia d’O Granbery. Logo, Derly Chaves, que havia retornado de seus
estudos de pós-graduação nos Estados Unidos, assumiria a reitoria da
Faculdade inaugurando a época de ouro daquela que foi criada para ser a
nossa “casa de profetas”.
Com a fundação do Colégio Porto Alegre, o metodismo do sul do país
passou a aspirar também a sua própria escola teológica, que finalmente

9
foi organizada em 1923 como Escola Bíblica para formação de
candidatos ao ministério pastoral metodista. Em 1928 foi elevada à
categoria de Faculdade de Teologia do Sul, como parte do Colégio Porto
Alegre, e em 1930 equiparada à Faculdade d’O Granbery. Em 1934,
assumiu sua reitoria Santo Uberto Barbieri, que havia regressado dos
Estados Unidos após o término de seus quatro anos de estudos pós-
graduados em teologia. Barbieri se dedicou à sua nova função com a
decisão de, em suas próprias palavras na carta de sua despedida do Brasil
em 1939, formar um corpo bem treinado e suficiente de obreiros
metodistas para os três estados mais sulinos do Brasil. Em outubro de
1937, em meio a uma crise institucional envolvendo a Faculdade de
Teologia do Sul, o Colégio Porto Alegre e líderes da Igreja, Barbieri,
segundo ele autorizado pelo Bispo, tomou a decisão de mudar a
instituição teológica de Porto Alegre para Passo Fundo, onde a Igreja já
fazia funcionar o Instituto Ginasial Passo Fundo. Quatro meses depois,
no III Concílio Geral da Igreja, em fevereiro de 1938,
surpreendentemente o Bispo César Dacorso Filho, que estava terminando
o seu primeiro mandato episcopal, recomendou em seu relatório a criação
de uma nova instituição teológica, mediante a fusão das duas Faculdades
então existentes e a consequente extinção (Mattos, 2010, p. 48).
A fusão das duas faculdades concentrou todos os esforços num mesmo lugar
fazendo nascer o projeto da Faculdade de Teologia da Igreja Metodista brasileira, o que
posteriormente motivaria o surgimento da Universidade Metodista de São Paulo. Isto
demonstra seu forte caráter acadêmico que se destina não somente a formar sacerdotes
para o exercício eclesiástico, mas, também, oferecer-lhes capacitação técnica, crítica e
acadêmica reconhecida pelos órgãos oficiais de Educação.

A história da educação secular metodista brasileira necessitaria de um capítulo à


parte pela sua expressão e reconhecimento, basta citar algumas instituições para entender
seu valor histórico, como o Colégio Piracicabano em Piracicaba-SP, o Instituto Porto
Alegrense Americano em Porto Alegre-RG, o Isabela Hendrix em Belo Horizonte-MG
ou o Instituto Granbery em Juíz de Fora-MG. São escolas que se destacaram
nacionalmente pela sua importância no processo educativo brasileiro. No entanto, a título
de situar esta rede metodista de educação secular, apresentamos uma relação das escolas
metodistas instaladas no Brasil, com ano de fundação:

1. Colégio Piracicabano - 1881


2. Colégio Americano - 1885
3. Colégio Americano de Taubaté - 1889 até 1894
4. Escola do Alto - 1892 até 1895
5. Instituto Granbery - 1890
6. Colégio Americano Fluminense - 1892 até 1815
7. Colégio Americano de Petrópolis - 1895 até 1920
8. Colégio Mineiro - 1891 até 1914 (Juiz de Fora)
9. Colégio Metodista de Ribeirão Preto - 1899
10. Colégio Izabela Hendrix - 1904
11. Colégio União Uruguaiana - 1870 -

10
12. Colégio Noroeste - 1918 (Birigui)
13. Instituto Porto Alegre - 1919
14. Instituto Passo Fundo - 1920
15. Colégio Bennett - 1921
16. Colégio Centenário 1922 (Santa Maria)
17. Instituto Americano de Lins - 1928
18. Instituto Rural Metodista de Alegrete - 1960
19. Instituto Metodista de Ensino Superior - 1966
Além destas escolas, a história registra a existência de outras que foram fechadas,
sendo: Ginásio de Capivari-SP, de Taubaté-SP, de Marília-SP, Americano de Petrópolis-
RJ, Fluminense-RJ e Instituto Rural Evangélico de Itapira-ES. Atualmente, a Rede
Metodista de Educação conta com 43 instituições, sendo:

I) Instituto Educacional Piracicabano da Igreja Metodista (IEP)


fundação: 13 de setembro de 1881
1 – Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP)
Decreto de Reconhecimento: 17 de Dezembro de 1975 (Ensino Superior)
2 – Colégio Piracicabano
Fundação: 13 de Setembro de 1881
3 – Escola de Música de Piracicaba “Maestro Ernst Mahle”
Fundação: 9 de março de 1953
4 – Centro Cultural Martha Watts
Fundação: 27 de Junho de 2003
5 – Centro de Estudos e Pesquisas sobre Educação e
Metodismo (CEPEME)
Fundação: 2 de Agosto de 1999

II) Instituto Metodista de Ensino Superior (IMS)


Fundação: 21 de Julho de 1970
6 – Universidade Metodista de São Paulo (UMESP)
Decreto de Reconhecimento: 03 de Julho de 1997 (Ensino Superior)
Faculdade de Exatas e Tecnologia
7 – Colégio Metodista Unidade I – São Bernardo do Campo
Fundação: 25 de Janeiro de 1985
8 – Colégio Metodista Unidade II – Bertioga
Fundação: 22 de Fevereiro de 1992
9- Colégio Metodista Unidade III – Itapeva
Fundação: 21 de Outubro de 1998
III) Instituto Educacional Metodista de Passo Fundo (IE)
Fundação: 15 de Março de 1920
10 – Colégio Metodista IE
Fundação: 15 de Março de 1920

IV) Instituto Metodista Bennett (IMB)


Fundação: 12 de Outubro de 1888
11 – Centro Universitário Metodista Bennett
Decreto de Reconhecimento: 2 de Setembro de 2004 (Ensino Superior)
12 – Colégio Metodista Bennett
Fundação: 12 de Outubro de 1888

V) Instituto Porto Alegre da Igreja Metodista (IPA)


Fundação: 15 de Março de 1923

11
13 – Centro Universitário Metodista IPA
Decreto de Reconhecimento: Portaria do MEC nº 3.186 de 08/10/2004
(DOU de 11/10/2004) (Ensino Superior)

VI) Instituto União de Uruguaiana da Igreja Metodista (IU)


Fundação: 8 de Junho de 1870
14 – Colégio Metodista União
Fundação: 8 de Junho de 1870

VII) Instituto Metodista de Educação e Cultura (IMEC)


Fundação: 19 de Outubro de 1885
15 – Colégio Metodista Americano
Fundação: 19 de Outubro de 1885

VIII) Instituto Metodista Centenário (IMC)


Fundação: 8 de Novembro de 1975
16 – FAMES – Faculdade Metodista de Santa Maria
Fundação: 27 de Abril de 1998 (Ensino Superior)
17 – Colégio Metodista Centenário
Fundação: 27 de Março de 1922

IX) Instituto Metodista Izabela Hendrix (IMIH)


Fundação: 05 de Outubro de 1904
18 – Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix
Decreto de Reconhecimento: Portaria nº88, de 16 de janeiro de 2002
(Ensino Superior)
18.1 – Campus Praça da Liberdade
Rua da Bahia, 2020 – Lourdes
18.2 – Campus Venda Nova
18.3 – Campus Nova Lima

X) Instituto Metodista Granbery (IMG)


Fundação: 8 de setembro de 1889
20 – Faculdade Metodista Granbery
Decreto de Reconhecimento: Portaria MEC nº 461, de 26.04.2011 – DOU
de 27.04.2011 (pg. 15, seção 1) (Ensino Superior)
21 – Colégio Metodista Granbery
Fundação: 8 de setembro de 1889

XI) Instituto Metodista de Educação (IMED)


Fundação: 28 de Fevereiro de 1928

22 – Instituto Americano de Lins (IAL)


Fundação: 28 de Fevereiro de 1928
22.1 – Polo Lins de EAD da UMESP
(Ensino Superior)
23 – Instituto Noroeste de Birigüi
Fundação: 18 de janeiro de 1918
24 – Faculdade Metodista de Ciências Humanas e Exatas de Birigüi
Decreto de Reconhecimento: Portaria Ministerial nº 530, de 12 de junho
de 1998,( D.O.U. 16-06-98, Seção I) (Ensino Superior)
25 – Colégio Metodista de Ribeirão Preto
Fundação: 5 de Setembro de 1889
(Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio)
25.1 – Polo Ribeirão Preto de EAD da UMESP

12
(Ensino Superior)

XII) Instituto Metodista da Amazônia (IMAm)


Fundação: 26 de Julho de 2002
26 – Faculdade Metodista de Teologia e Ciências Humanas
Fundação: 26 de Julho de 2002
26.1 – Polo de Porto Velho de EAD da UMESP
(Ensino Superior)

XIII) Instituto Metodista Educacional de Altamira (IMEA)

27 – Colégio Metodista IMEA

XIV) Instituto Metodista de Petrópolis (IMEP)


Fundação: 1º de Fevereiro de 1981
28 – Colégio Metodista IMEP
Fundação: 01 de fevereiro de 1981
28.1 – Polo de Petrópolis de EAD da UMESP
(Ensino Superior)

XV) Instituto Metodista Arca de Noé (IMAN)


Fundação: 13 de Março de 1988
(Educação Infantil e Ensino Fundamental)
29 – Escola de Educação Infantil e Ensino Fundamental “Arca de Noé”
Fundação: 14 de Junho de 1996
30 – O Semeador – Escola Metodista de Educação Especial
Fundação: 11 de Novembro de 1974
XVI) Fundação Metodista de Ação Cultural e Social

31 – Projeto Sombra e Água Fresca


Fundação: Fevereiro de 2000 (Educação Suplementar)
São Paulo-SP

XVII) SASIMG – Serviço de Ação Social da Igreja Metodista em


Guaratinguetá
Fundação do SASIMG: 13 de agosto de 1973.
32 – Centro Educacional Metodista de Atendimento à Infância (CEMAI)
Fundação: 11 de abril de 1992

XVIII) Instituto Metodista de Ação Social (IMAS)


Fundação: 13 de Maio de 1906
33 – Instituto Central do Povo (ICP)
Rio de Janeiro – RJ
34 – Escola Metodista Nehyta Ramos
Osório – RS
35 – Escola Metodista de Educação Infantil Emma de Bem Garcia
Cachoeira do Sul – RS
36 – Creche Dona Josefina G. Silva
Birigui – SP
37 – Creche Mamãe Albininha
São Bernardo do Campo – SP

XIX) Associação Metodista de Ação Social (AMAS)


Rio de Janeiro – RJ
38 – Instituto Metodista de Ensino Suzana Wesley

13
Rio de Janeiro – RJ

XX) Associação Metodista de Ação Social (AMAS)


Curitiba – PR
39 – Centro Educacional Infantil Tia Bety

XXI) Associação Metodista de Assistência Social (AMAS)


Bandeirantes – PR
40 – Centro de Educação Infantil Paulo Meneguel

XXII) Sociedade Metodista de Educação Infantil de Carazinho


(SOMAIC)
Carazinho – RS
41 – Centro de Educação Infantil SOMAIC

XXIII) Associação Metodista de Assistência Social (AMAS)


Fundação: 1969
42 – Creche Marshlea Dawsey – AMAS
Piracicaba – SP
43 – Escola Metodista de Educação Infantil – IRMA
Alegrete – RS

DEMONSTRATIVO DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO DA IGREJA METODISTA 1

IMB IMG IMIH IMED IMS IPA IEP Total


Alunos 444 3.814 4.755 3.201 23.377 7.796 12.089 55.476
Funcionários 116 326 531 315 1788 968 1003 5.047
Administrativos 71 154 261 154 1121 490 467 2.718
Docentes 45 172 270 161 667 478 536 2.329

Demonstrado o objeto de nosso trabalho devemos salientar que a relação do


metodismo com a educação se confunde com sua própria história, iniciada na Inglaterra
a partir de 1738, quando seu precursor, o Rev. John Wesley, Pastor Anglicano, depois de
passar por uma experiência espiritual, inspirou o surgimento do movimento chamado
metodista. Esta interação se desenvolveu a partir da concepção deste primeiro grupo,
comprometido com a promoção do evangelho integral, que buscou desde seu surgimento,
oferecer mais do que assistência espiritual, através de uma atenção à concretude da vida,
no atendimento às necessidades mais básicas, dentre elas a educação. Foi esse espírito
que orientou o surgimento do metodismo e o fez disseminar na América e em outras partes
do mundo Igrejas e escolas.

1
Dados informados pela Assessoria de Marketing da Rede Metodista de Educação em fevereiro de 2015.

14
Diante da conjuntura metodista brasileira, que também é caracterizada pela
combinação Igreja-escola, nossa impressão é que tanto a Instituição Eclesiástica como
suas Instituições de Ensino continuam aptas para outras abordagens e perspectivas
capazes de auxiliar na compreensão mais abrangente dos pressupostos que influenciaram
e ainda influenciam esta relação. A problemática apresentada se refere aos tipos de análise
acadêmica utilizados para a compreensão desta relação, comumente baseados em
pesquisa historiográfica, teológica ou pelo exame pedagógico dos currículos destas
instituições. Em nossa perspectiva, a sociologia também deveria ser utilizada.

Neste propósito, consideramos conveniente sublinhar que para Weber a análise


científica está vinculada a categorias de “fim” e “meios”, ou seja, cada contexto apresenta
particularidades distintas, chamadas por ele de “virtudes de seu próprio valor” (Weber
2001, p. 109). Desta maneira, nos propomos a elencar os conceitos da teoria weberiana,
os valores internos das instituições para, em contraposição ao conceito dos tipos puros de
dominação legítima, verificar aproximações e distanciamentos institucionais que
facilitam ou complicam as interações entre os dois contextos.

O autor esclarece que:

Para uma abordagem científica dos juízos de valor não é suficiente


apenas compreender e reviver os fins pretendidos e os ideais que estão
no seu fundamento, mas também e, acima de tudo, ensinar a “avaliá-los
criticamente”. Esta crítica, no entanto, só pode ter caráter dialético; isto
significa que só pode consistir numa avaliação lógico-formal do material
que se apresenta nos juízos de valor e nas ideias historicamente dadas, e
num exame dos ideais, no que diz respeito ao postulado da ausência de
uma contradição interna do desejado. Enquanto se propõe a este fim, ela
pode proporcionar ao homem que quer a consciência dos últimos
axiomas, que estão na base do conteúdo do seu querer, a consciência dos
critérios últimos de valor que se constituem de maneira inconsciente o
ponto de partida – dos quais, para ser consequente, deveria partir.
Realmente, chegar à consciência destes critérios últimos que se
manifestam nos juízos de valor concretos é o máximo que ela pode fazer
sem entrar no terreno da especulação. Se o sujeito que emite juízos de
valor deve professar estes critérios últimos, isso é um problema pessoal,
uma questão de sua vontade e de sua consciência; não tem nada a ver com
o conhecimento empírico. (WEBER, 2001, p. 110 e 111).
Neste sentido, nosso objetivo é de classificar algumas características sociológicas
destas instituições a partir dos apontamentos teóricos de Max Weber, atribuindo a elas
condição para análise dialética sem, contudo, atribuir juízo de valor. Queremos destacar
em que medida uma e outra instituição possuem afinidades ou incompatibilidades que
possibilitem ou dificultem seu relacionamento. Não pretendemos, contudo, qualificar

15
uma ou outra característica, mas vislumbrar quais pressupostos as fundamentam,
compreendendo suas limitações e facilidades.

Quanto ao método, a partir de Abramo in Hirano (1988), podemos dizer que nosso
trabalho é monográfico e de profundidade, ou seja, limitado a um tema ou a um problema
especifico (pg. 39). Quanto ao procedimento metodológico, de "consulta bibliográfica e
documental”, através de pesquisa em livros, artigos, jornais ou documentos (p. 40). O
autor enfatiza que as pesquisas em ciências humanas podem ser monodisciplinares
(econômicas, históricas, sociológicas, antropológicas, administrativas, psicológicas, etc.).
A nossa é predominantemente sociológica (p. 34). Quanto ao método de análise,
consideramos o nosso caso como “combinações internamente congruentes de tipos e
modelos, permitindo a comparação, por semelhanças e diferenças, entre fenômenos
correlatos” (p. 42). Em síntese, entendemos este trabalho como uma análise sociológica,
por comparação de semelhanças e diferenças de fenômenos correlatos, envolvendo o
contexto educacional específico da relação entre a Igreja Metodista brasileira e suas
instituições de Ensino, por meio de consulta bibliográfica e documental.

Com isto, no primeiro capítulo, expomos as fundamentações teóricas weberianas,


ou, os pressupostos pelos quais analisamos nosso objeto de estudo. A partir deles é que
podemos destacar da história e conduta de cada instituição, particularidades que
possibilitem a análise sociológica. Apontamos aqui conceituações do autor sobre temas
que lhe são próprios como burocracia, carisma, disciplina, religião, além dos três tipos
puros de legitimação de autoridade. Não se trata de apreciação dos conteúdos do autor,
mas de uma exposição mais apurada daquilo que referencia seu pensamento e
compreensão sobre cada um dos tópicos desta construção teórica. Buscamos saber o que
Weber compreende sobre cada tema de modo a estabelecê-lo como referencial teórico.

No segundo capítulo caracterizamos cada instituição a partir dos pressupostos


expostos no primeiro capítulo, com a finalidade de buscar um enquadramento teórico que
as classifique segundo as perspectivas do autor. As aproximações, desta forma, ocorrem
considerando os documentos que as normatiza como os Cânones, o Plano de Vida e
Missão, no caso da Igreja e as Diretrizes para a Educação da Igreja Metodista, no caso
das Instituições de Ensino, entre outros. Destacamos assim de que forma, por exemplo, a
Igreja pode ser considerada uma instituição com características burocrática, tradicional,
ou carismática. Elencamos através dos documentos pontos que sinalizam estas e outras
características apontadas por Weber em busca de uma classificação teórica que nos

16
possibilite a posterior, a análise através dos tipos de legitimação pura. Ressaltamos em
seus documentos e apontamentos oficiais as propriedades que nos dão condição de
estabelecer valor sociológico para a pesquisa.

No terceiro capítulo a tarefa é de aprofundar a compreensão de conceitos como


dominação, legitimidade, tipos de dominação legitima, com a finalidade de perceber
quais são as aproximações e distanciamentos entre estas instituições a partir de suas
características mais próprias.

Nossa elaboração, no entanto, não visa juízo de valor sobre uma ou outra
instituição e, por consequência, sobre possíveis acertos e desacertos desta relação, mas
demonstrar através da análise sociológica weberiana, as características que as motivam e,
portanto, que legitimam seus valores, propósitos e finalidades. Desta maneira
demonstramos que seus encontros e desencontros podem se dar primordialmente a partir
de valores intrínsecos à vocação particular de cada uma delas e não somente por situações
de interesses.

17
CAPÍTULO 1
Fundamentos teóricos: Burocracia, carisma, disciplina,
religião e os três tipos puros de legitimação de autoridade

É nossa intenção neste capítulo apresentar o pensamento de Max Weber sobre os


temas subscritos, como base teórica à nossa tese, sem com isso fazer juízo ou análise da
aplicação que terão para a elaboração deste trabalho acadêmico. O que pretendemos é
estabelecer um cenário de valores capazes de localizar sua construção teórica,
esclarecendo a partir do que pensa e com quais pressupostos, indicando seu pensamento,
alegações, questionamentos e motivações. Com isso, a recorrência ao texto original e a
constante apresentação teórica devem ser esperadas, já que haverá tão somente a procura
pela gênese teórica weberiana.

1.1 - Burocracia

O conceito weberiano de burocracia se baseia na constatação de uma estrutura


específica composta por vínculos entre comandantes e comandados, elaborada através de
cargos e relações de retribuição financeira por serviços prestados, e da existência de um
organograma hierárquico e funcional em um determinado segmento caracterizado por
especificidades distintas, referentes ao propósito próprio daquela área de atuação. Assim,
pretendemos, a partir de Weber, analisar as propriedades do que chamaremos de
burocracia religiosa e burocracia educacional, estabelecendo as particularidades de cada
um desses modelos através de sua forma de ação na sociedade contemporânea e dos
interesses que os envolvem.

Weber sistematiza a burocracia moderna, primeiramente, caracterizando seu


funcionamento, ao constatar que ela se reconhece a partir de uma estrutura concebida por
áreas de jurisdição fixas e oficiais sustentada por preceitos e regras rígidas pelas quais
seus colaboradores exercem deveres preestabelecidos, executados de maneira rigorosa.
Dessa forma, tanto a autoridade para ordenar quanto o dever de executar são delimitados
pelas normas verificadas nos vários meios de coerção localizados nos diversos contextos
sociais que se burocratizam, ou seja, se organizam em armações estáticas regidas por

18
força de códigos preconcebidos em relações que envolvem esferas de mandatários e
dirigidos, em níveis, necessariamente, ocupados por indivíduos que obedecem a uma
determinada qualificação reconhecida pelo sistema organizacional específico que os
abrange. Weber enfatiza que esse “molde”, ou seja, este sistema de estruturas elaboradas
por regulamentos e normas em que se envolvam mando e subordinação, constitui a
maioria das organizações modernas, sejam elas governamentais, empresariais,
educacionais, religiosas, designadas por ele como “administração burocrática”. O
estabelecimento escrito, num ambiente onde se contemplam deveres e direitos, mais do
que ordenar os aspectos particulares da função de cada membro da organização,
normatiza níveis hierárquicos ou de importância, e o lugar do gestor ou do empresário se
instala na função de exemplo maior, denominado pelo autor como “primeiro
funcionário”. A esse respeito é necessário observar que ele enfatiza o pressuposto da
especialização na administração burocrática moderna, na qual a exigência de uma
formação específica sinaliza não somente o perfil do administrador, mas, sobretudo,
qualifica-o para a execução de tarefas restritas ao seu ambiente de trabalho e que permite
exercer seu cargo segundo as regras preestabelecidas pela estrutura burocrática.

O lugar ocupado pelo “funcionário” nessa organização se refere a uma profissão,


o que é comprovado pela necessidade de formação adequada que transpareça no exercício
prático de funções e nos exames especiais de suas tarefas. Outro apontamento menciona
que a posição do funcionário tem a natureza de um dever, assinalando mais uma vez uma
composição de relações, considerando que:

A ocupação de um cargo não é considerada como uma fonte de rendas ou


emolumentos a ser explorada, como ocorria normalmente durante a Idade
Média e frequentemente até recentemente. Nem é a ocupação do cargo
considerada como uma troca habitual de serviço e por equivalentes, como
é o caso dos contratos livres do trabalho. O ingresso num cargo, inclusive
na economia privada, é considerado como a aceitação de uma obrigação
específica de administração fiel, em troca de uma existência segura. É
decisivo para a natureza especifica da fidelidade moderna ao cargo que,
no tipo puro, ele não estabeleça uma relação pessoal, como era o caso da
fé que tinha o senhor ou patriarca nas relações feudais ou patrimoniais.
A lealdade moderna é dedicada a finalidades impessoais e funcionais.
Atrás das segundas, estão habitualmente, é claro: “ideias de valores
culturais”. São o ersatz do senhor sobrenatural o terreno, mas pessoal:
ideias como “Estado”, “igreja”, “comunidades”, “partido” ou “empresa”
são consideradas como peculiares à comunidade: proporcionam uma
áurea ideológica para o senhor (WEBER, 2008, p. 140).
Esse sistema desloca as antigas relações entre mando e subordinação, uma vez que
se sustenta, ao contrário do que ocorria anteriormente, a partir de finalidades específicas

19
de interesses que passam a não ser mais pessoais, e que estão a serviço de objetivos
peculiares às finalidades da estrutura. Mesmo os espaços tradicionais, como o
eclesiástico, ganham novas significações e graus de importância, o que rearticula os
relacionamentos entre o clero e o laicato de maneira significativa, chegando a níveis
profissionais, uma vez que as próprias organizações religiosas se tornam grandes
estruturas empresariais com objetivos específicos, como numa organização secular
normal. Isto realoca seu papel e seu propósito, chegando a deixar seu caráter filosófico e
ideológico em segundo plano:

Hoje, o bispo, o sacerdote e o pregador já não são, como nos tempos


cristãos antigos, detentores de um carisma exclusivamente pessoal. Os
valores supramundanos e sagrados que eles oferecem são
proporcionados a todos os que parecem dignos deles e que os solicitam.
Antigamente, esses líderes agiam sob a ordem pessoal de seu senhor: em
princípio, só eram responsáveis perante ele. Hoje em dia, apesar da
sobrevivência parcial da velha teoria, esses líderes religiosos são
funcionários a serviço de um propósito objetivo, que na ‘igreja’ da
atualidade se tornou rotineiro e, por sua vez, ideologicamente oco
(WEBER, 2008, p. 140).
Dessa maneira, o sociólogo visualiza, na estrutura burocrática, interações que
organizam socialmente seus atores, na qual as funções, obrigações e deveres, não somente
estabelecem postos hierárquicos, mas também classificam as pessoas no que denomina
de estima social. Um funcionário que tenha uma determinada qualificação ou
especialidade pode, desta forma, ser diferenciado ou privilegiado socialmente segundo a
importância que representa para a estrutura. Isso ilustra o valor representativo de uma
instrução característica, de um diploma, que evidencie certo destaque ou preparo, “essas
certidões ou diplomas fortalecem o “elemento estamental” na posição do funcionário”
(Weber, 2008, p. 141). Ao contrário, o valor aferido a um determinado profissional pode
ser minimizado caso o grau do que lhe é exigido ou seu preparo seja considerado de menor
significância.

O que se torna fundamental nessa análise é a imagem do tipo puro de funcionário


burocrático, que é caracterizado pela nomeação de um superior, diferentemente de uma
situação em que o funcionário é eleito, apesar de Weber considerar que nem sempre uma
eleição pode estar desassociada de uma nomeação, ao lembrar as situações onde forças
partidárias têm o poder de influenciar uma escolha social, o que apenas confirmaria uma
designação preestabelecida pelo partido. Contudo, salienta que, mesmo não
representando uma decisão partidária direta, o cargo concebido por eleição altera a

20
relação de subordinação, por caracterizar em sua forma uma escolha de baixo e não de
cima. Essa forma de escolha interfere na atuação específica da função, que passa a
depender não somente da interação com a chefia ou mesmo das questões técnicas, mas,
também, do poder de representação atribuído ao cargo. Diferentemente, o funcionário que
não é eleito depende em maior proporção de sua atuação técnica e do bom relacionamento
com seu superior. Isso também se refere à ocorrência da condição vitalícia para o
funcionário público ao contrário do que ocorre com o trabalhador de empresa privada,
que é mantido no cargo por questões técnicas ou meramente administrativas. Com esses
parâmetros, Weber atribui ao desenvolvimento da economia monetária e, sobretudo, à
ocorrência de compensação financeira do trabalhador pelo serviço prestado, o
pressuposto da burocracia. É oportuno observar que a elaboração de estruturas
organizacionais torna-se mais necessária quando o fator monetário moldura as relações
de trabalho. Dessa maneira, os níveis de mando e submissão são viabilizados e, da mesma
forma, garantidos. Mesmo com o que o autor chama de remuneração in natura – quando
a retribuição pelo trabalho não é em dinheiro, mas em produto - a dimensão econômica
da relação exerce forte influência e organiza direitos e deveres. Nesse sentido avalia que:

Segundo a experiência histórica, sem uma economia monetária a


estrutura burocrática dificilmente evita as mudanças internas
substanciais, ou, na verdade, a transformação em outro tipo de estrutura.
A concessão aos funcionários de uma renda fixa in natura, tirada dos
armazéns do senhor ou de sua renda corrente, significa um primeiro
passo no sentido da apropriação das fontes de tributação e sua exploração
como propriedade privada. Esse tipo de concessão foi normal no Egito e
China durante milhares de anos e desempenhou um papel importante em
fins de monarquia romana, bem como em outras partes (WEBER, 2008,
p. 144).
Com isso podemos entender que a remuneração, seja ela em espécie ou direitos,
representa um importante pressuposto para a ocorrência de uma estrutura burocrática,
porém esse não é o único. Outro fator apontado nessa dinâmica teria relação com a
demanda de tarefas administrativas, ou seja, com o surgimento da necessidade de um
trabalho organizativo em uma determinada área de ação. Weber aponta como exemplo
dessa demanda a criação de processos administrativos nas estruturas políticas, estatais e
eclesiásticas. O Estado, afirma o autor, é cada vez mais dependente de uma “base
burocrática” que garanta sua ação administrativa e, mesmo que possa haver resistência ao
engessamento de sua estrutura, a mera relação internacional entre os países requer um
procedimento minimamente burocrático. Nesse sentido, afirma: “Entre os fatores
exclusivamente políticos, a crescente exigência a uma sociedade habituada à pacificação

21
absoluta, por meio da aplicação da ordem e da proteção (“polícia”) em todos os campos,
exerce uma influência especialmente perseverante no sentido da burocratização” (Weber,
2008, p. 149). Essa ilustração demonstra que a organização moderna rearticulou o
simbolismo da segurança e da organização anteriormente representadas pelas relações de
pertença aos clãs ou comunidades familiares que garantiam a vida social, agora sinalizada
por leis e estatutos, de uma estrutura burocrática rege o bem estar geral. Há outros fatores
que também figuram como promotores da burocratização, como os meios de
comunicação e transporte, que precisam ser organizados e regidos por uma sistematização
estatal.

Dessa forma, segundo o autor, a utilização de uma estrutura burocrática se dá pela


sua superioridade técnica em relação a outras formas de organização, sobretudo pela
“precisão, velocidade, clareza, conhecimento dos arquivos, criatividade, descrição,
cuidado, subordinação rigorosa, redução do atrito e dos custos de material e pessoal”.
(Weber, 2008, p. 150). Nesse sentido, a organização burocrática prevalece em relação às
formas de trabalho informal, pois as relações de exigência e desempenho são
acompanhadas por um cargo superior e normatizadas por objetivos diretos, não sujeitos
somente ao interesse pessoal do trabalhador ou do patrão. A partir daí, o desempenho
funcional da estrutura burocrática se torna mais barato e menos instável, ao contrário do
“trabalho organizado pelos órgãos colegiados que provocam atrito e demora e exigem
compromisso entre interesses e opiniões de conflito. A administração, portanto, se faz
menos precisamente e em mais independência em relação aos superiores, daí ser menos
unificada e mais lenta” (Weber, 2008, p. 150).

As vantagens da organização burocrática surgem, sobretudo, pela existência de


uma economia capitalista que requer de seus participantes ações cada vez mais ágeis e
pontuais asseveradas pelos processos de modernização dos meios de comunicação. Um
dado importante dessa demanda, salientado por Weber, é a decorrente desumanização dos
processos do trabalho, uma vez que a burocratização das estruturas não somente organiza
funções, mas também especializa o trabalho pela repetição sucessiva das mesmas
funções. Os funcionários, por desempenhar um papel individualizado na estrutura,
integram-se num ambiente de “regras calculáveis” e “sem relação em pessoas”, questões
que podem ilustrar o sentido de um contexto enfatizado pela apresentação de revoltados,
em sua maioria, econômicos. Nesse sentido, o autor afirma que:

22
Quanto mais complicada e especializada se torna a cultura moderna,
tanto mais seu aparato de apoio externo exige o perito despersonalizado
e rigorosamente “objetivo”, em lugar do mestre das velhas estruturas
sociais, que era movido pela simpatia e preferência pessoais, pela graça
e gratidão. A burocracia oferece as atitudes exigidas pelo aparato externo
da cultura moderna, na combinação mais favorável (WEBER, 2008,
p.151).
Como se percebe, o sociólogo constata não somente a ocorrência da adoção de
estruturas burocráticas como estilo da gestão profissional em empresas e organizações,
mas também uma influência, ou reorganização conceitual, dos diversos segmentos da
sociedade moderna. No Direito, por exemplo, o autor considera que essa forma “racional”
estabelece novos parâmetros para execução do ato judicial, ao comparar a forma moderna,
ao tipo de adjudicação – ligado principalmente às tradições sagradas – que não pode ser
resolvido sem ambiguidades pela tradição e solucionado pela “revelação concreta
(oráculo, profecia ou ordálio – isto é pela justiça carismática)” (Weber, 2008, p.152).
Essa alegação se baseia no entendimento de que as relações que envolvem poder e
autoridade necessitam minimamente de certa “objetividade” formal e racional, que
garanta a não ocorrência da arbitrariedade e, ao mesmo tempo, se oponha a informalidade
do velho domínio patrimonial.

Para Weber, a organização burocrática, além de influir na organização do trabalho,


na vida social, traz certo caráter de nivelamento das diferenças econômicas e sociais com
respeito à oportunidade dada a qualquer classe da assunção de funções. Ele considera que:

A burocracia acompanha inevitavelmente a moderna democracia de


massa em contraste com o Governo autônomo democrático das
pequenas unidades homogêneas. Isso ressalta do principio
característico da burocracia: a regularidade abstrata da execução da
autoridade que, por sua vez resulta da procura da “igualdade perante a
lei” no sentido pessoal e funcional – e, daí, do horror ao “privilégio” e
a rejeição ao tratamento dos casos individualmente. Essa regularidade
também decorre de condições sociais preliminares da origem das
burocracias. A administração não burocrática de qualquer estrutura
social repousa de certa forma, no fato de que as preferências e
classificações sociais, materiais ou honoríficas existentes estão ligadas
às funções e deveres administrativos. Isso habitualmente significa que
uma exploração econômica ou “social”, direta ou indireta, de uma
posição que toda atividade administrativa proporciona aos seus
realizadores, equivale à assunção de funções administrativas
(WEBER, 2008, p.157).
Essa questão, segundo Weber, não acontece somente em relação aos cargos
públicos, mas também nas relações políticas que, uma vez organizadas sob a forma de
estrutura burocrática, abrangem a possibilidade de participação e ascensão de camadas

23
socialmente desfavorecidas. Weber considera que “o processo de burocratização (...) é
um fenômeno paralelo da democracia”, (Weber, 2008, p.158), por isso não assegura
claramente que um tenha influência direta sobre o outro. Em termos gerais, acredita o
sociólogo, a burocracia é quando bem estabelecida, uma estrutura indestrutível, uma vez
que cada um de seus membros passa a depender dela para continuar a ser parte do todo.
Não somente o funcionário que se burocratiza através do seu treinamento metódico, é
submisso à organização, mas também os cargos superiores, uma vez que são garantidos
pelo movimento contínuo da estrutura. Assim, qualquer integrante da engrenagem torna-
se, ao mesmo tempo, sua força motriz e dependente do dinamismo dela. Como numa
máquina, cada peça precisa estar bem colocada em sua função e ativa para considerar-se
parte, sem que haja caráter pessoal ou individual.

Diante do que se apresenta, Weber entende que, como toda organização, a


burocracia tem implicações econômicas para a sociedade, ao considerá-la instrumento de
diversos contextos estruturais, como o político, por exemplo. No entanto, esta influência
estará associada aos objetivos de seu serviço, ou seja, dependente “da direção que os
poderes que usam o aparato lhe derem” (Weber, 2008, p.161). O que ele expressa é que
a estrutura burocrática em si mesma não provoca nenhuma consequência social e,
portanto, não está a serviço de nenhum bem maior do que o de organizar e estruturar
deveres e funções. Afirma a esse respeito que:

A simples existência da organização burocrática não nos revela suas


ambiguidades a direção concreta de seus efeitos econômicos que estão
sempre presentes de alguma forma. Pelo menos não nos revela tanto
quanto provável sobre o seu efeito relativamente nivelados socialmente.
Sob esse aspecto, devemos lembrar que a burocracia como tal é um
instrumento de precisão que se pode colocar à disposição de interesses
de domínio muito variados – exclusivamente políticos, bem como
exclusivamente econômicos, ou qualquer outro tipo. Portanto, a medida
do seu paralelismo com a democratização não deve ser exagerada, por
mais típica que seja. Em certas condições, as camadas dos senhores
feudais também colocaram a burocracia a seu serviço. Há também a
possibilidade – e em frequência isto se tornou realidade, como por
exemplo no principado romano em certas formas de estruturas estatais
absolutistas – de que uma burocratização da administração esteja
deliberadamente ligada ao regime estamental, ou seja combinado com
eles pela força dos agrupamentos do poder social existentes. (WEBER,
2008, p.162).
A conclusão sobre o papel da estrutura burocrática como forma de organização
estamental se refere ao meio de poder e não ao poder em si mesmo, considerando que
pode organizar qualquer estrutura política, acadêmica, industrial, sem com isso imprimir,

24
por si só, uma condição de poder independente ou característica que lhe garanta poder.
Apesar disso, Weber entende que o modo burocrático é “tecnicamente o meio de poder
mais altamente desenvolvido nas mãos de homens que o controla” (Weber, 2008, p. 162)
levando em conta que esse sistema desarticula uma das principais características da
organização antiga, a “indispensabilidade”. Analisa o sociólogo, que nos modelos
passados as peças que garantiam as estruturas sempre foram consideradas indispensáveis
e insubstituíveis no funcionamento organizacional. Contudo na burocracia, isso é
reorganizado, uma vez que a capacidade de movimento das dinâmicas de cada segmento
é maior e mais importante do que a particularidade de cada indivíduo, uma vez que seu
funcionamento trata de substituir qualquer deficiência que venha ocorrer. Dessa maneira,
o poder está na estrutura e não na operação individual e, mais ainda, no conhecimento
teórico que na capacidade política. O funcionário qualificado é valorizado por sua técnica,
mais do que por qualquer outra questão e, portanto, substituível. Por outro lado, o
funcionário que domina o conhecimento burocrático pode dispor de um poder
considerável na estrutura, mesmo que haja uma figura hierárquica superior. Weber evoca,
para demonstrar essa questão, a figura do Governo constitucional que compreende a
existência do monarca e do primeiro-ministro. O monarca, mesmo ocupando o cargo
máximo da organização, necessita da ação de um funcionário técnico, o primeiro-
ministro. O monarca, apesar de ser o chefe do governo e, presumidamente, o dirigente
maior, depende do chefe da burocracia, figurado pelo primeiro-ministro. Desta maneira,
a burocracia apresenta um poder distinto em sua elaboração, na figura do conhecimento
especializado e, neste caso, a indispensabilidade prevalece.

Com essa compreensão, pode-se concluir que o poder burocrático se mantém na


relação das várias funções de uma mesma estrutura. Mesmo assim, o sociólogo visualiza
outra possibilidade de poder, como no caso do parlamento, no constitucionalismo, que
sugere uma rede ainda mais trabalhada, na relação entre o chefe do governo, o chefe
burocrático e uma “comunidade de interesses”, representada pelos partidos políticos.
Nesse ponto, constata que a capacidade técnica e o conhecimento especializado adquirem
maior grau de reconhecimento na estrutura. Nesse sentido, o que se considera
indispensável é o conhecimento técnico, independentemente de quem ocupe o cargo e
independentemente de quem o detenha. Isso altera o critério para a escolha do governante,
que necessita de algo além do trânsito político. Para garantir a estabilidade no comando,

25
o governante se utiliza do recurso de assessorias técnicas, cercando-se de membros de um
órgão colegiado que:

Reúnem-se com o governante, e todas as questões importantes são


encaminhadas de vários pontos de vista nos trabalhos dos respectivos
peritos e assistentes, e pelos votos dos outros membros. A questão é
então solucionada por uma resolução que o governante sancionará ou
rejeitará através de um edito. Esse tipo de órgão colegiado é a forma
típica pela qual um governante, que é cada vez mais um “diletante”,
explora ao mesmo tempo o conhecimento especializado e – o que
frequentemente passa despercebido – busca enfraquecer o peso
esmagador do conhecimento especializado e manter sua posição
dominante frente aos peritos. Mantém um perito sob a observação dos
outros através de medidas canhestras procura obter uma visão global,
bem como a certeza de que ninguém o pressiona a tomar decisões
arbitrárias. Com frequência o príncipe espera assegurar-se um máximo
de influência pessoal, menos com a presidência pessoal dos órgãos
colegiados do que pelo estudo dos memorandos escritos que manda
prepararem. (WEBER, 2008, p. 165).
Esse exercício sinaliza uma forma de convivência, na estrutura burocrática, entre
o poder político e em qualquer tipo de administração: empresarial, governamental,
eclesiástico – de maneira que o comandante possa decidir, sem, contudo, desconsiderar
ou desrespeitar a importância e o poder técnico. Essa forma de interação entre
comandantes e comandados passa a influenciar todo o funcionamento das organizações,
pois assim como nas instâncias mais altas, a criação de pequenos colegiados torna-se
frequente nas camadas menores, no mesmo exercício de ampliar a participação dos
diversos setores nas decisões. Para Weber, essa questão ganha significados maiores ao
considerar que, através da participação coletiva nas decisões de assuntos comuns – cada
vez mais presente nas organizações modernas – haverá importante fortalecimento do
poder da burocracia, uma vez que isto valoriza os cargos e o conhecimento advindo deles.

Um destaque importante no modelo weberiano está relacionado à questão da


formação acadêmica ao mencionar que o diploma universitário, no contexto da estrutura
burocrática ganha um significado especial não somente na possibilidade de ascensão
hierárquica dentro das empresas, mas também nas relações existentes além dela,
influenciando até interesses matrimoniais, já que essa questão está diretamente ligada à
segurança de um bom salário e a certa garantia quanto ao futuro. Além disso, a motivação
pelo preparo técnico simboliza bem mais do que uma “sede de educação”, pois a
exigência de “currículos regulares em exames especiais” representa uma maneira de
restringir o livre acesso às posições mais elevadas das estruturas. A esse respeito o autor
afirma que:

26
Hoje, o “exame” é o mais universal desse monopólio e, portanto, os
exames avançaram irresistivelmente. Como a educação é necessária à
aquisição do título exige despesas consideráveis e um período de espera
de remuneração plena, essa luta significa um recuo para o talento
(carisma) em favor da riqueza, pois os custos “intelectuais” dos
certificados de educação são sempre baixos, e com o crescente volume
desses certificados os custos intelectuais não aumentam, mas decrescem.
(WEBER, 2008, p. 169).
Esse dado ilustra o significado do modelo burocrático não somente para a
composição da organização administrativa das empresas, mas também como fator de
reorganização social e política da sociedade moderna, já que suas representações e valores
acabam por influenciar outros espaços da sociedade. O autor aponta que “a burocracia
(...) luta em toda parte por um ‘direito ao cargo’” e isso rearticula todas as formas de
mando, uma vez que o direito de liderar passa a ser estabelecido pelo poder técnico
administrativo de racionalizar e mesmo de organizar procedimentos, deveres e direitos.
Essa questão indica outra característica importante da burocracia: “a minimização do
domínio”, ou seja, a partilha de decisões, ações e projeções sobre o trabalho a ser
realizado, que nesse molde, passa a ser mérito e responsabilidade do grupo e não somente
do chefe. Esse é um alicerce da democracia e, ao mesmo tempo, uma de suas condições,
pois, apesar de se pautar pela participação coletiva, não considera prerrogativa principal
para ocupação dos cargos somente o preparo técnico, mas, sobretudo, o reconhecimento
e a articulação política.

A democracia reage precisamente contra o inevitável caráter estamental


da burocracia. A democracia procura substituir a nomeação de
funcionários pela eleição para curtos mandatos; procura substituir um
processo regulamento de disciplina pela substituição de funcionários
pela eleição. Assim, a democracia procura substituir a disposição
arbitrária do “senhor” hierarquicamente superior pela autoridade,
igualmente arbitrária, dos governados e dos chefes políticos que os
dominam. (WEBER, 2008, pg. 169).
Talvez pudéssemos considerar de maneira ampla, que a burocracia se caracteriza
por uma estrutura organizacional onde a relação das pessoas tem objetivos comuns e se
estabelece através de hierarquia, direitos e deveres, sinalizada pela capacitação específica
de funções que devem ser ocupadas pelo critério de instrução formal. Essa estrutura é
regida por retribuição monetária vinculada ao desempenho da atividade. Dessa maneira,
ela age racionalmente, estabelecendo limites, espaços e obrigações, em que o
comprometimento de cada peça garante o movimento da estrutura.

A burocracia tem um caráter “racional”: regras, meios, fins e direitos


dominam sua posição. Em toda parte a sua origem e sua divisão tiveram,
até agora, resultados “revolucionários”, num sentido especial, que ainda

27
não foi discutido. É a mesma influência que o avanço do racionalismo
teve em geral. A marcha da burocracia destruiu as estruturas de domínio
que não tinham caráter racional, no sentido especial da palavra (WEBER,
2008, p. 170).
Possivelmente a burocracia, através de seu sistema organizacional, tenha
influenciado a sociedade como um todo ao estabelecer certa classificação social através
da implantação do modelo hierárquico, já que os indivíduos passam a representar não
somente a si mesmos, mas também os postos que ocupam. Com isso ela ganha significado
social ainda maior, articulando as relações através de interesses afins entre a sociedade
comum e o ambiente interno das empresas. As aspirações do jovem estudante se voltam
à conquista de um preparo que o leve a ocupar cargos na estrutura burocrática, bem como
capacitá-lo a desenvolver-se através deles, galgando níveis mais elevados. A burocracia
não reorganiza somente o mercado de trabalho, mas também a formação acadêmica e
técnica, a convivência entre as famílias, a composição e a ação política, o modo de
governo, o sentido de cidadania, as interações do direito, a gestão das igrejas e, até
mesmo, a vida religiosa.

O apontamento de Weber ao observar o surgimento de uma estrutura


organizacional demonstra, como ele mesmo considera, uma revolução que poderia ser
tida como social. Mais à frente, pretendemos ilustrar como a implementação do sistema
burocrático adentrou outros ambientes de sentido diverso como a educação e a religião.
Para tanto, há outras análises necessárias, que o próprio sociólogo considera essenciais
para se compreender a dinâmica burocrática, como o carisma.

1.2 - Carisma

Em sua análise sobre a questão do carisma, Weber reflete, inicialmente, sobre a


autoridade carismática, ponderando que tanto a estrutura burocrática quanto a patriarcal
têm como característica a permanência, ou seja, existem através de um poder rígido e
impregnado na rotinização e na normatização de empresas, instituições, bem como na
sociedade como um todo. Considera, portanto, o que está além do tramite organizacional
dessas estruturas como carisma, ou seja, aquilo que remete à variedade de sentidos e
formas, que não se limita e não depende da orientação de estatutos e convenções. Para o
autor, é nesse espaço que reside o carisma, na transcendência da estrutura. Esse

28
apontamento não isenta a importância ou a existência das estruturas, mas localiza um
campo à parte, que está desassociado do poder organizacional. O sociólogo indica que:

Isto significa que os líderes “naturais” – em épocas de dificuldades


psíquicas, físicas, econômicas, éticas, religiosas ou políticas – não foram
os ocupantes de cargos nem os titulares de uma “ocupação” no sentido
atual da palavra, isto é, homens que adquiriram um conhecimento
especializado e que servem em troca de uma remuneração. Os líderes
naturais nas dificuldades foram os portadores de dons específicos do
corpo e do espírito, dons esses considerados como sobrenaturais, não
acessíveis a todos (WEBER, 2008, p.171).
Assim, reconhece-se um novo espaço de autoridade, que não se localiza numa
estrutura hierárquica ou se adéqua a uma lógica metódica, tampouco se vincula à
retribuição ou pagamento, porém, se orienta por fatores incomuns, considerados
sobrenaturais, à parte, ou além do ambiente burocrático convencional. Diferentemente da
burocracia, o carisma não se norteia por balizas estáticas, como vínculos, estatutos,
obrigações, ordens ou nomeações. Não há, nesse conceito, a perspectiva burocrática, pois
não está referenciado por alguma norma ou orientação, antes, pauta-se por objetivos
puros, segundo uma virtude própria. Seu critério de avaliação está relacionado ao
reconhecimento e aceitação do que diz e faz, e é caracterizado pela condição de atrair
seguidores.

Se o aceitamos, ele é o senhor deles – enquanto souber como manter essa


aceitação, ‘provando-se’. Mas não obtém seu ‘direito’ por vontade dos
seguidores, como numa ‘eleição’, mas acontece o inverso: é o dever
daqueles a quem dirige sua missão reconhecê-lo como seu líder
carismaticamente qualificado (WEBER, 2008, p. 172).
A autoridade carismática, segundo o autor, se dá em espaço restrito, delimitado
por um determinado grupo e que, na maioria dos casos, está particularizada àquele
ambiente, ou seja, é adequada, aceita e assimilada por um nicho ético, moral ou social.
Na questão econômica o carisma não depende da remuneração normal, como na
burocracia, antes, refuta qualquer regularidade ou garantia de pagamento formal. “O
carisma vive neste mundo, embora não seja deste mundo” (Weber, 2008, p. 172). Para o
autor essa característica retrata um sentido ainda mais profundo da autoridade
carismática: o de rejeitar qualquer forma de comportamento econômico, muito embora
reconheça alguns líderes carismáticos em “um genial pirata” ou nos “heróis políticos
carismáticos” como exemplos avulsos, mas carismáticos.

A questão primordial é a constatação de que o carisma em seu sentido puro se


contrapõe ao sistema tradicional, patriarcal, de organização social, econômica,

29
hierárquica, como uma negação sumária aos encantos, necessidade e padrões “deste
mundo”.

(...) os portadores do carisma, o mestre bem como seus discípulos e


seguidores, devem manter-se distantes dos laços deste mundo, distantes
das ocupações rotineiras, bem como distantes das obrigações rotineiras
da vida de família. Os estatutos da ordem dos jesuítas impedem a
aceitação de cargos na igreja; os membros da ordem estão proibidos de
possuir bens ou, segundo a regra original de São Francisco, a ordem
como tal é proibida de ter posses. O sacerdote e o cavaleiro de uma ordem
têm de viver no celibato, e numerosos portadores de um carisma
profético ou artístico são, na realidade, solteiros. Tudo isso indica uma
separação inevitável desse mundo a que são levados os que partilham do
carisma. Sob tais aspectos, as suas condições econômicas podem ter um
aspecto aparentemente antagônico, dependendo do tipo de carisma –
artístico ou religioso, por exemplo – é o modo de vida que flui do
significado (WEBER, 2008, p. 173).
Outra propriedade da autoridade carismática está relacionada à instabilidade. Por
não estar ligada a uma estrutura específica com atribuições regulamentadas por estatutos,
deveres e direitos, a concepção carismática de um líder requer atributos pessoais que estão
à prova constantemente, portanto, dependente de resultados visíveis, práticos e que
sinalizem um grau de excepcionalidade. Em geral, o que se observa, no chefe carismático,
é que “sua missão divina deve ser ‘provada’, fazendo que todos os que se entregam
fielmente a ele se saiam bem. Se isso não acontecer, ele evidentemente não será o mestre
enviado dos deuses” (Weber 2008, p. 174). Esse fato também distingue o carisma da
burocracia por desvincular o líder de um papel institucional em uma determinada
estrutura. O dirigente carismático tem relação e obrigações com seus seguidores e suas
necessidades, não se pautando por códigos e regras que, a seus olhos e aos olhos de seus
seguidores, estão nele e podem ser, a qualquer momento, modificados como bem entenda,
já que está imbuído de uma autoridade mística, por ter sido escolhido de Deus.

O domínio carismático autêntico não conhece, portanto, os códigos


jurídicos abstratos e os estatutos e nenhum modo “formal” de
adjudicação. Sua lei “objetiva” emana concretamente da experiência
altamente pessoal da graça celestial e da força divina do herói. A
dominação carismática significa uma rejeição de todos os laços em
qualquer ordem externa, em favor da glorificação exclusiva da
mentalidade genuína do profeta e herói. Daí sua atitude ser
revolucionária e transpor todos os valores; faz com que um soberano
rompa todas as normas tradicionais ou racionais: “Está escrito, mas eu
vos digo”. (WEBER, 2008, p. 174).
Com essa lógica, o domínio carismático veste-se de um poder superior para julgar,
sob sua própria ética e moral na crença de que suas decisões correspondem em exatidão
e poder ao deus que, por revelação, o inspira.

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Há de se enfatizar que Weber não se restringe, em sua análise sobre o carisma,
somente ao líder carismático religioso, mas também ao político e mesmo ao artístico. Ao
caracterizar o carisma como elemento de um poder próprio, o sociólogo evidencia um
sistema imaterial, desassociado de qualquer estruturação administrativa padrão e
dependente do carisma de uma determinada pessoa.

1.3 - Disciplina

Uma probabilidade frequente no mundo moderno é o encontro do carisma com a


instituição, ou seja, a inserção de personalidades carismáticas na estrutura burocratizada
de qualquer instituição. Nesse caso, Weber salienta como processo lógico o
desaparecimento do carisma devido à força da socialização racional e a consequente
diminuição da importância da ação individual. O sociólogo evidencia, nesse ponto, a
manifestação da disciplina como inibidora do carisma pessoal afirmando que:

O conteúdo da disciplina é apenas a execução da ordem recebida,


coerentemente racionalizada, metodicamente treinada, e exata, na qual
toda crítica pessoal é incondicionalmente eliminada e o agente se torna
um mecanismo preparado exclusivamente para a realização da ordem
(WEBER, 2008, p. 177).
Conforme o autor, esta característica impede a livre ação do carisma em seu
sentido puro, dominador e irrefutável, dada a necessidade da disciplina como fator
estruturante de uma socialização racional e rotinizada. Contudo, reconhece que em certas
estruturas carismáticas é igualmente a disciplina que garante obediência e, portanto, a
sustentação. Apesar de supor uma dicotomia de caráter, a disciplina que, segundo o autor
é impessoal, alicerça tanto a estrutura carismática como a burocrática, pois nela está o
senso de dever, requerido por uma ou por outra organização. Em sequência lógica, a
disciplina seria plenamente conveniente ao ambiente burocrático por sistematizar
friamente um vínculo de obrigações e deveres, contudo. Contudo, Weber entende que há
um condicionamento subjetivo na sociedade capaz de conduzir grandes massas as várias
formas de submissão. Ele aponta que mesmo “o entusiasmo e a dedicação sem reservas
podem, decerto, ter um lugar na disciplina; toda conduta moderna de guerra pesa com
frequência mais do que qualquer outra coisa, os elementos ‘morais’ da resistência de um
soldado” (Weber, 2008, p. 178). Exemplificando, ele afirma que até mesmo uma liderança

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militar, que simbolicamente retrata o temperamento racional do mando, pode ser exercida
por meios emocionais, como no contexto religioso, influenciando seus comandados a se
manterem em sintonia com a vontade do chefe.

Nesse sentido, Weber faz menção à relação da disciplina com a guerra, apontando
para a guerra e suas estratégias como fatores primários para o desenvolvimento dela. Para
ele, o fato de se necessitar de elementos táticos para vencer uma batalha, fez com que
fosse necessária a implementação da disciplina como elemento tático, pouco importando
a qualidade e a característica de suas armas. Assim, a disciplina agregou-se ao
planejamento e à criação das ações coletivas ou individuais que proporcionassem o bom
êxito do grupo, sendo incorporada também como força bélica. O sociólogo indica que
determinadas formas disciplinadas de atuação, em certos casos, causam melhores efeitos
do que o uso de armas. Dessa forma, acredita que a influência da disciplina sobre a guerra
e seus resultados práticos, sinalizados pelas conquistas e aquisição de poder,
repercutiram, da mesma maneira, na organização das sociedades.

Quando o treinamento da infantaria foi aperfeiçoado ao ponto da


virtuosidade (Esparta), a polis adquiriu uma estrutura inevitavelmente
“aristocrática”. Quando as cidades se baseiam na disciplina naval, têm
estruturas “democráticas” (Atenas). A disciplina deu origem à
“democracia” sobre os metecos bem como sobre os hilotas territoriais,
numa época em que mercenários suíços se alistavam em exércitos
estrangeiros. O domínio do patriarcado romano, dos egípcios, assírios e
finalmente das modernas organizações estatais burocráticas da Europa –
isso tudo tem a sua origem na disciplina.
A disciplina de guerra pode ir de mãos dadas com condições econômicas
totalmente diferentes, como o mostram esses exemplos. A disciplina,
porém, sempre afetou a estrutura do Estado, a economia e,
possivelmente, a família, pois no passado um exército bem disciplinado
era, necessariamente, profissional, e, portanto o problema básico era
sempre o de como prover a manutenção dos guerreiros. (WEBER, 2008,
p. 180).
Da mesma forma, porém, que aborda a disciplina a partir de organizações
militarizadas, sejam elas originadas nas mais diversas comunidades e com os mais
variados objetivos, Weber amplia este alcance ao lembrar que, da mesma maneira,
sociedades reclusas e sem contato com o mundo exterior como os mosteiros, por exemplo,
sugerem uma organização disciplinada, com objetivos exclusivos e devotada a um único
senhor, mesmo que este esteja no além-mundo. Contudo, mesmo ao considerar a
evidência da disciplina no ambiente religioso, o que hipoteticamente remete à paz e à
harmonia, o sociólogo, ainda assim, faz relação dela com a organização militar. Ele atribui
a existência da disciplina secular a influência da guerra e dos grandes comandantes que

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não somente se serviram dela para a realização de suas conquistas, como também, com
isso, constituíram a necessidade para a concretização de seus objetivos.

A partir disso é que Weber constitui o modo de um capitalismo privado e da


estruturação política e econômica da sociedade moderna. Sua hipótese é que “a disciplina
do exército deu origem a toda a disciplina” (Weber, 2008, p. 182). Assim como os
comandantes, por essa ótica, o patrão é quem conduz o empregado para a captação de
resultados práticos, com o diferencial de que este, agora, é econômico. Com a mesma
austeridade de antes, requerendo a mesma submissão e compromisso, o chefe orienta seus
comandados no trabalhado braçal de um campo ou na linha de produção de uma indústria.
A mesma disciplina da guerra impulsiona e garante o trabalho que é executado no
andamento secular da sociedade. Segundo ele,

Nenhuma prova especial é necessária para mostrar que a disciplina


militar e o modelo ideal para a moderna fábrica capitalista, tal como o
foi para a plantação antiga. Em contraste com esta, a disciplina orgânica
na fábrica estrutura-se em bases complementares racionais. Com a ajuda
de métodos de mensuração adequados, a lucratividade ótima do
trabalhador individual é calculada como a de qualquer meio material de
produção. À base desse calculo, o sistema americano de “administração
científica” obteve os maiores triunfos no condicionamento e treinamento
racional do comportamento de trabalho. As consequências finais são
obtidas com a mecanização e disciplina da fábrica, e o aparato psicofísico
do homem se ajusta completamente às exigências do mundo exterior, das
ferramentas, das máquinas – em suma, a uma “função” individual. O
indivíduo é destituído de seu ritmo natural, determinado pela estrutura
de seu organismo; seu aparato psicossocial é adaptado a um novo ritmo
através de uma especialização metódica de músculos que funcionam
separadamente, e estabelece uma economia ótima de forças
correspondente às condições de trabalho. Todo esse processo de
racionalização, na fábrica como em toda parte, e especialmente na
máquina estatal burocrática, é paralelo à centralização dos implementos
materiais de organização no poder discricionário do senhor.
O avanço sempre crescente da disciplina processa-se irresistivelmente
com a racionalização do atendimento das necessidades econômicas e
políticas. Esse fenômeno universal restringe cada vez mais a importância
do carisma e da conduta diferenciada individualmente (WEBER, 2008,
p. 183).

Para Weber a sociedade moderna está racionalizada pela imposição do rigor


capitalista, que gere, com rigor militar, um sistema disciplinado de produção. Mais ainda,
essa estrutura econômica repercute não somente na capacidade de sua produção industrial
e comercial, mas também na sociedade que militariza o imaginário comum suprimindo,
quando possível, qualquer potencialidade carismática. Contudo, Weber admite a
possibilidade de uma adequação que possibilite a convivência dos poderes carismático e

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racional-burocrático com o surgimento da “rotinização do carisma”, ou seja, quando o
carisma é adequado às estruturas disciplinares, mesmo que essa acomodação o transgrida
de alguma maneira.

1.4 - Religião

A partir das principais religiões mundiais – confuciana, hinduísta, budista, cristã,


islamita e judaica – Weber analisa a sociologia das religiões através da compreensão de
uma ética econômica, mesmo admitindo que essa tarefa torna-se imprecisa ao considerar
a variedade de fatores envolvidos, que perpassam a cultura, o momento histórico, a
geografia e as motivações sociais de cada contexto específico. Em sua percepção, o
exercício de identificação do que denomina a “ética econômica de uma religião” deve
considerar inicialmente a existência de uma grande estrutura social, composta por
camadas distintas que conjuntamente influenciam na elaboração de uma ética geral. Essa
compreensão necessita de uma análise que abranja particularidades de espaços
característicos, onde se acomodam vários modos próprios de conduta. A religião, para
Weber, ocupa um desses espaços ou camadas, sendo, portanto, um dos vários elementos
que integram essa composição. Desta forma, uma leitura interessada em enxergar um só
ponto desse cenário diverso e complexo, pouco apreenderá de sua real imagem.

Fato importante a destacar nesta análise é que na dinâmica de seus movimentos


cada camada tanto provoca como é provocada, ou seja, gera transformação e ao mesmo
tempo se transforma pela provocação alheia mesmo considerando, no caso do cenário
religioso, que a força de sua pregação exerça um poder capaz de transcender a maior parte
dos acendimentos sociais. E não que seu discurso seja estático ao longo do tempo e da
história, mas que passe por contextualizações diante do desenvolvimento natural da
sociedade. Essas atualizações contendem constantemente entre o movimento social da
ética geral e o da ética própria que historicamente referencia cada religião.

Por mais incisivas que as influencias sociais, determinadas econômica e


politicamente, possam ter sido sobre uma ética religiosa num
determinado caso, ela recebe sua marca principalmente das fontes
religiosas e, em primeiro lugar, do conteúdo de sua anunciação e
promessa. Frequentemente, a geração seguinte reinterpreta essas
anunciações e promessas de modo fundamental, ajustando as revelações
às necessidades da comunidade religiosa. Quando isto ocorre, então, é
comum que as doutrinas religiosas se ajustem às necessidades religiosas.

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Outras esferas de interesse só poderiam ter uma influência secundária;
com frequência, porém, tal influencia é muito obvia e, por vezes,
decisiva.
Veremos que, em toda religião, uma modificação nas camadas
socialmente decisivas foi, quase sempre, de profunda importância. Por
outro lado, o tipo de uma religião, uma vez marcado exerceu
habitualmente uma influência de amplas consequências sobre o modo de
vida de camadas muito heterogêneas. De várias formas, as pessoas
buscaram interpretar a ligação entre ética religiosa e as situações de
interesse, de tal modo que a primeira surge como simples “função” da
segunda (WEBER, 2008, p. 191).
A partir dessa compreensão, Weber faz apontamentos sobre a participação da
religião no processo de influência psicológica da conduta social.

1.4.1 - O sofrimento

O primeiro destaque como fator de influência social da religião assinalado pelo


sociólogo faz alusão à atitude frente ao sofrimento que ganhou repercussão a partir das
festividades religiosas, de maneira especial, quando no enfrentamento de situações de
crise pessoal ou comunitária. A interpretação religiosa de que essas situações poderiam
ser explicadas pela ação de entidades demoníacas ou mesmo pelo desagrado a um deus,
fazia com que a causa do sofrimento fosse, de alguma forma, esclarecida e, desta maneira,
possível de ser contornada, ou tratada. Com isso, “tolerar esses homens em meio da
comunidade de culto poderia provocar prejuízos. De qualquer modo, eles não tinham
permissão de participar nas festas e sacrifícios de culto, pois os deuses não gostavam de
vê-los e poderiam irritar-se” (Weber, 2008, p. 192). Assim sendo, talvez, se possa
entender que esse referendo de pertença a uma religião simbolizaria não somente alusão
à lisura espiritual, mas também à isenção de sofrimento, o que garantiria aceitação social
e prestígio.

De sua forma, a religião interpretou as causas do sofrimento humano, elaborando


teorias que responderam à demanda psicológica das mais diversas questões. Uma delas é
que os afortunados, angustiados pela consciência da desigualdade social que os
privilegiava, encontraram resposta para anuir com naturalidade perante as injustiças
sociais, encontrando na religiosidade razões para aceitar “que têm direito à sua boa sorte”
(Weber, 2008, p. 192) e de seu merecimento diante da divindade.

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Se a expressão geral “fortuna” cobrir todo o bem representado pelas
honras, poder, posses e prazer, será então a formula mais geral a serviço
da legitimação, que a religião teve para realizar os interesses externos e
íntimos dos homens dominantes, os proprietários, os vitoriosos e os
sadios. Em suma, a religião proporciona a teodiceia da boa fortuna para
os que são afortunados. Essa teodiceia está ancorada em fortes
necessidades (“farisaicas”) do homem e, portanto, é facilmente
compreendida, mesmo que não se atente bem, com frequência, para os
seus efeitos (WEBER, 2008, p. 192).
De alguma maneira, o que Weber aponta remete a certo utilitarismo da religião,
no sentido de amoldá-la a interesses imediatos de quem dela se aproxima. Com isso, a
religião se torna acessível a uma camada ampla da sociedade, podendo ser identificada
com qualquer realidade. No aspecto do sofrimento, apontado pelo sociólogo, ela justifica
tanto a riqueza do abastado quanto os dilemas do necessitado, o que, na maioria das
situações tem como pressuposto uma relação enganosa entre riqueza e aprovação divina
e, em contrapartida, miséria e reprovação de Deus. Esse fato é assentado pelo escritor ao
anotar a glorificação do sofrimento, salientando a utilização de várias formas de punições
como status daquele que está a caminho da purificação. Por essa razão, determinadas
formas de abstinência, autoflagelos, passaram a sinalizar certo sinal de santidade ou
piedade, elevando o caráter do sofrimento a um nível de glória e não de dor.

Numerosas formas de punições e de abstinência em relação à dieta e


sono, bem como de relações sexuais, despertam, ou pelo menos
facilitam, o carisma extático, visionário, histórico, em suma, de todos os
estados extraordinários considerados “sagrados”. Sua produção,
portanto, constitui o objeto do ascetismo mágico. O prestígio dessas
punições resultou da noção de que certos tipos de sofrimento e estados
anormais provocados pelas punições são caminhos para se alcançar
poderes supra-humanos, isto é, mágicos. As prescrições antigas de tabus
e abstinências no interesse da pureza do culto, que se seguem da crença
de demônios, funcionou na mesma direção. O desenvolvimento dos
cultos de “redenção” juntou-se a essas prescrições, abstinências e
interesses. Em princípio, tais cultos ocuparam uma posição independente
e nova frente ao sofrimento individual. O culto primevo, e acima de tudo
o culto das associações políticas, deixaram fora de consideração todos os
interesses individuais. (WEBER, 2008, p. 192).
O que se faz notar aqui é que a proposta da religião na forma de lidar com o
sofrimento, incidiu fortemente sobre o modo de vida social, inclusive, no sentido de
organizar um imaginário coletivo, uma vez que isso reposicionou, como salienta o autor,
o significado do interesse individual em relação ao comunitário. As necessidades comuns
foram enaltecidas, porque teriam o poder de atenuar os sofrimentos gerais. É neste ponto
que Weber enfatiza o surgimento de comunidades religiosas capazes de suplantar outras
desigualdades, como as éticas. As pessoas, mais do que se preocupar consigo mesmas,

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passaram a se ocupar com questões amplas, como a chuva, o sol, a caça e a capacidade
de vencer os inimigos que ameaçavam a comunidade. Por consequência, os guias
religiosos são valorizados, afinal, são eles que orientam sobre o que fazer diante do
sofrimento, além de serem os únicos capazes de atrair a proteção dos céus. Com isso, o
mágico, ou o líder da religião, adquire posição de distinção, assim como sua
descendência, surgindo, por isso, dinastias hereditárias, consideradas supra-humanas,
profetas ou porta-vozes e agentes de seu deus. Os sacerdotes passam a ter a
responsabilidade de tratar com o sofrimento, procurando compreendê-lo ou justificá-lo, e
também de dar conselhos, e intermediar a confissão de pecados. Surge com isso a imagem
de um “redentor”. Em decorrência, fatores práticos da vida passam a se relacionar com a
dimensão religiosa, o sacerdote é inserido nos embates e dilemas diários e convocado a
decifrar manifestações da natureza, do clima. A figura de um deus ressurreto também
ganha força, uma vez que isto simboliza a possibilidade do retorno da boa sorte. A luta
diária é inspirada pelas lutas heroicas dos personagens da religião e a batalha ganha status
de glorificação ao salvador.

Esse ambiente demonstra que a religião e sua maneira de conceber o sofrimento,


através da relação direta entre aprovação ou reprovação de um deus, fizeram com que,
sobretudo as classes menos favorecidas, recorressem a ela na busca de uma explicação
para sua dor ou, ainda mais, para a realização de um ritual que lhes trouxesse redenção
de seu sofrimento. Com menos intensidade, as classes mais abastadas buscaram se
aproximar da religião, especialmente por esta relação entre religião e sofrimento, religião
e carência, religião e necessidade de libertação. Weber detecta nesse cenário o surgimento
do que denomina “estados carismáticos”, na figura daqueles que são capazes de coagir
magicamente espíritos maus através da oração.

Foi, portanto, à procura de uma significação sobre a ética da “distribuição das


fortunas entre os homens” e de outros desdobramentos do sofrimento no mundo que a
racionalidade questionou a teodiceia do sofrimento. “Era demasiado frequente o
sofrimento individualmente ‘imerecido’; não eram os homens ‘bons’, mas os ‘maus’ que
venciam – mesmo quando a vitória era medida pelos padrões da camada dominante, e não
pela ‘moral dos escravos” (Weber 2008, p.194). Essas inquirições racionais, segundo o
autor, basearam a interpretação de várias religiões como o hinduísmo, o zoroastrismo, o
judaísmo e até mesmo a teologia paulina. Perguntas assim podem supor diversas
hipóteses sobre a fundamentação da real representação do espírito religioso, entre elas, o

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sociólogo levanta temas como o ressentimento e o ascetismo, considerando que nenhum
dos dois pode caracterizar o princípio básico desse espírito, embora tenham sido, em
ambos os casos, alvos do interesse da liderança de diversas correntes religiosas. Para
tanto, Weber destaca outros elementos essenciais à religião de salvação: o renascimento
e a redenção. O renascimento, como sinal da possibilidade mágica do retorno e do resgate
de valores e sentimentos perdidos. Weber aponta este renascimento como a possibilidade
da “aquisição de uma nova alma”.

O tipo de estado empírico de bem-aventurança ou experiência de


renascimento buscado como valor supremo por uma religião variou,
óbvia e necessariamente, de acordo com o caráter da camada que o adotou
de forma mais destacada. A classe dos guerreiros cavalheirescos, as
classes camponesas e comerciantes, e os intelectuais de educação literária
tiveram, naturalmente, tendências religiosas diferentes. Como se tornará
evidente, essas tendências, por si mesmas, não determinam o caráter
psicológico da religião, embora sobre ele exercessem uma influência
muito duradoura. O contraste entre as classes guerreira e camponesa, as
classes intelectuais e comerciantes, é de especial importância. Desses
grupos, os intelectuais foram sempre os expoentes de um racionalismo
que, em seu caso, foi relativamente teórico. As classes comerciantes
(mercadores e artesãos) foram, pelo menos, possíveis expoentes do
racionalismo de uma espécie prática. O racionalismo dos dois tipos teve
características muito diferentes, mas exerceu uma grande influência
sobre a atitude religiosa (WEBER, 2008, p. 197).
O destaque do autor demonstra a forte influência da localização social do
indivíduo sobre seu modo de interpretar o fato religioso e a necessidade da formação de
uma percepção do mundo de onde se pretende salvar. A religião e seu propósito salvífico
necessitam, antes de tudo, saber onde está em relação ao objeto de sua perdição. Isso
significa que ela só pode se salvar ou mesmo almejar a salvação, a partir de uma imagem
concebida de mundo. Para se saber se é redimida, há necessidade de se responder a
pergunta que referenciará essa salvação, ou seja, redimida de quê? Por isso “a redenção
só alcançou significação específica quando expressou uma ‘imagem de mundo’
sistemática e racionalizada e representou uma posição face ao mundo, pois o significado,
bem como a qualidade pretendida e real da redenção, dependeu dessa imagem e posição”
(Weber, 2008, p. 197). O que Weber pontua demonstra que a religião, em sua tarefa de
estabelecer o distanciamento entre o pecado e o indivíduo, fez surgir a necessidade de
uma racionalização sobre o mundo e, mesmo, sobre a própria religião. O sociólogo
denomina esse fato de “racionalismo religioso”, desenvolvido, de maneira mais evidente,
pela intelectualidade da sociedade. O resultado direto dessa racionalização se deu por uma
realocação da religião, que foi transferida para o mundo irracional.

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Essa transferência da religião para o reino do irreal ocorreu por uma
operação perfeita, na qual não houvesse restos. Na música, a ‘coma’
pitagórica resistiu a uma racionalização completa orientada para a física
tonal. Os vários grandes sistemas de música de todos os povos e idades
diferiram na forma pela qual cobriam, ou ultrapassaram a irracionalidade
inevitável ou, por outro lado, colocaram a irracionalidade a serviço da
riqueza de tonalidades. O mesmo parece ter ocorrido com a concepção
teórica do mundo, apenas mais acentuadamente. Acima de tudo, pareceu
acontecer com a racionalização da vida prática. As várias grandes formas
de levar uma vida racional e metódica foram caracterizadas pelas
pressuposições irracionais, simplesmente aceitas como ‘dadas’, e que
foram incorporadas a esses modos de vida. Quais foram essas
pressuposições está, histórica e socialmente, determinado, pelo menos
em grande parte, através da peculiaridade das camadas que foram
portadoras dos modos de vida durante seu período formativo e decisivo.
A situação de interesse dessas camadas, determinada social e
psicologicamente, levou a peculiaridade, tal como aqui a entendemos
(WEBER, 2008, p. 198).
O autor se refere a uma racionalização efetiva dos modos e valores da religião
que, uma vez, fora do espaço da vida cotidiana se tornaram inexplicáveis para a
naturalidade da vida comum, já que se acomodou na irracionalidade, ou seja, num espaço
mais adequado à falta de compreensão do indivíduo comum. Contudo, essa transferência
da religião para o campo não racional fez com que o mundo se parecesse destituído de
irracionalidade. Desta maneira, a concepção de experiência sobrenatural e mística foi
realocada para o céu, no “além”, e o mundo passou a ser um espaço sem deuses. Weber
salienta que esse fato se deu pela influência do racionalismo intelectualista progressivo
que idealiza uma sociedade regida por regras estáticas e que marcaram de maneira mais
efetiva as religiões formadas por camadas mais intelectualizadas, que desenvolveram uma
visão mais pragmática da vida. Essas religiões deram à contemplação o status de
possibilidade única de religiosidade.

Nesse ponto o autor salienta que esta forma de religiosidade, que aproximou a
racionalidade da religião, promoveu o surgimento da hierocracia, ou seja, dos governos
exercidos por eclesiásticos e, ainda mais, o racionalismo da hierocracia, através de um
acento mais enfático nos ritos, inclusive com a “cura das almas, ou seja, a confissão do
pecado e o conselho aos pecadores” (Weber, 2008, p. 197). A religião procurou, assim,
“monopolizar a administração dos valores religiosos”. Esse fato resultou numa
desvalorização do rito, pelo menos, em relação ao quadro de funcionários políticos que
passaram a considerá-lo sem utilidade prática, resumido a mera obrigação da organização
social regida pela religião. Weber destaca aqui algo importante para a análise religiosa
diante das formações burocráticas, que, “o ritual respondeu a regras e regulamentos, e,

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portanto, sempre que uma burocracia determinou sua natureza, a religião assumiu caráter
ritualista” (Weber, 2008, p. 199). Esse aparte talvez seja necessário ao contribuir para
uma interpretação futura sobre as relações da estrutura burocrática secular com a estrutura
eclesiástica, burocratizada ou não. Essa relação será objeto de nossa reflexão mais à
frente.

O desdobramento prático do pensamento weberiano sobre as doutrinas religiosas


se refere às implicações sociais, contextuais, que as orientaram no decorrer da história. É
dessa maneira que o autor entende o desenvolvimento da racionalização na religião e na
sociedade. A formação de um determinado ambiente social culmina numa doutrina
apropriada que atenda anseios e necessidades daqueles que o constituem. A religião não
somente traduz a situação, mas, à sua maneira, dá respostas aos imperativos que ela
requer. Para ele, os eventos sociais são interpretados pela religião, assim como os
religiosos, pela sociedade. Isto representaria o racionalismo religioso, ou seja, o meio
racional de interpretar a sociedade por meio da religião. Nessa direção, a organização da
Igreja racionalizou a mística, através da criação de ritos e doutrinas que, ao mesmo tempo,
sinalizava a situação social e as normatizava através da rejeição. Isso resultou na
burocratização da religião, instituindo comunidades organizadas por funcionários que se
propunham a dirigir ritualmente a fé de uma determinada comunidade. Essa organização,
de alguma maneira, representou uma negação à religião virtuosa, autônoma, baseada em
carisma e personalismo. Uma das teses centrais de Max Weber está pautada na
racionalização. Para ele a religião deu uma contribuição importante para o processo de
racionalização da sociedade.

A sociedade religiosa, por supor-se uma reunião de iguais, sinalizaria a


possibilidade da democracia, ao propor uma fé universal, onde todos fossem atingidos
pela graça, portanto, igualados religiosa e socialmente. No entanto, esse processo de
institucionalização não foi tão perfeito assim, antes, acendeu uma disputa, mesmo que
informal, entre a religião institucionalizada e a chamada virtuosa, composta por uma
religiosidade mais pragmática, ligada às massas, livre de uma organização burocrática,
dependente de cargos, ritos e estruturas. Os virtuosos influenciaram tanto a sociedade
quanto a própria religião institucionalizada.

Os virtuosos religiosos viram-se obrigados a ajustar suas exigências às


possibilidades da religiosidade da vida cotidiana a fim de conseguir e
manter a preferência ideal e material das massas. A natureza de suas
concessões foi, naturalmente, de significado primordial para a forma pela

40
qual afluíam religiosamente na vida diária. Em quase todas as religiões
orientais, os virtuosos permitiram que as massas permanecessem
mergulhadas na tradição. Assim, a influência dos virtuosos religiosos foi
infinitamente menor do que a observada quando a religião empreendeu,
ética e geralmente, a racionalização da vida cotidiana. Isso aconteceu
quando a religião visou precisamente às massas e cancelou, porém,
muitas de suas exigências ideais. Além das relações entre a religiosidade
dos virtuosos e a religião das massas, que finalmente resultou dessa luta,
a natureza peculiar da religiosidade concreta dos virtuosos foi de
importância decisiva para o desenvolvimento do modo de vida das
massas. Esta religiosidade virtuosa também foi, assim, importante para a
ética econômica da respectiva religião. A religião do virtuoso foi a
religião autenticamente “exemplar” e prática. Segundo o modo de vida
que a religião prescrevia ao virtuoso, houve várias possibilidades de se
estabelecer uma ética racional da vida cotidiana. A relação entre religião
virtuosa com a vida diária de trabalho no centro da economia variou,
especialmente segundo a peculiaridade dos valores sagrados desejados
por essas religiões. (WEBER, 2008, p. 203).
Em geral, as religiões se mantiveram distantes dos assuntos relativos à vida diária,
variando, como afirma o autor, segundo seus interesses. No entanto, o distanciamento
entre os assuntos místicos e transcendentes e os mundanos sempre foi marcado por
lacunas profundas. Em sua maior parte, os atos religiosos ganharam o significado
simbólico do “sagrado”, numa clara separação entre as pessoas comuns – os leigos – e os
funcionários da fé organizada, denominados pelo sociólogo como virtuosos. Dessa
maneira, a imagem do virtuoso em relação ao povo comum, passou a ganhar destaque.
Ele tem o poder da “bênção” e a ele é atribuído o poder mágico da mística. Por isso, não
se ocupa dos trabalhos seculares, que o poderiam corromper, sobrevivendo de impostos
pagos pelo povo comum. Seu papel social é o de trabalhar pela salvação espiritual do
povo, ele é quem regulamenta o padrão ético da população, sendo seu conselheiro,
exercendo com isso uma forte influência sobre o mundo profano. “O carisma do ‘místico’
puro só serve a ele. O carisma do verdadeiro mágico serve aos outros” (Weber, 2008, p.
203).

A análise do sociólogo ressalta que a religião trouxe forte influência sobre o


pensamento da sociedade no que se refere à construção de seus conceitos morais e éticos,
seja em sua maneira de racionalizar o mundo, seja em sua característica de compreender
as coisas a partir de dimensões palpáveis ou transcendentes. É a partir dessa constatação
que podemos avançar em nosso exame sobre os conceitos que relacionam o racionalismo
religioso ao racionalismo econômico e social, e que demonstra, segundo o autor, uma
circunstância importante para a compreensão do que seja a “racionalização da vida civil”.
Weber considera que o conceito de racionalização pode ter significados diversos, pode

41
sinalizar a análise sistemática de um pensador sobre o mundo ou a execução específica e
metódica de um determinado trabalho, mas deve ficar clara, sobretudo, a compreensão de
que o racionalismo deve ser analisado em suas muitas formas, em seus variados contextos,
conceitos e culturas, caso contrário a apreciação poderá ser equivocada ou imprecisa.

Por isso, Weber entende que essa influência religiosa gere a prática comum das
sociedades modernas, racionalizando a conduta da vida, sobretudo no que se refere ao
reconhecimento da autoridade. Isso se dá quando ela produz certo tipo de ética
relacionada à maneira de estabelecimento da legitimidade da autoridade, ao valorizar
somente o que lhe é peculiar, reconhecendo como importante apenas o valor moral que
autentica uma determinada autoridade diante de um público ou contexto. O teórico
considera que esses valores estabelecem um parâmetro de referência que legitima ou
desconsidera a autoridade a partir da proximidade ou do distanciamento que a liderança
tiver deles. Weber denomina esses valores como tipos puros, ideais para aquele
determinado nicho social e, portanto, reconhecidos e satisfatórios para analisar e valorar
aquela determinada autoridade.

Nessa lógica, o sociólogo elabora uma estrutura que demonstra a dinâmica da


legitimidade da autoridade ante a demanda conjuntural da diversidade social, que em sua
compreensão abrange a dimensão religiosa ou secular.

1.5 - Os tipos puros de dominação legítima

Consideremos esse o ponto teórico central de nossa tese, portanto, merecedor de


um aprofundamento mais consistente. Por essa razão, pretendemos expandir nosso foco
de análise para acolher outras contribuições além de fontes primárias. Gabriel Cohn
aborda o tema entendendo que Weber introduz uma discussão sobre a obediência e os
processos que a envolvem. Cohn acredita que a legitimidade de uma determinada
autoridade acontece para além de uma imposição social ou por mero preparo ideológico
ou político, mas que ele ilustra como uma “constelação de interesses” que perpassam os
diversos sentidos de um momento histórico. A partir disso ele visualiza os apontamentos
de Weber, ao considerar que a legitimidade pode ocorrer por motivos diversos como as
questões “utilitárias de vantagens e inconvenientes por parte daquele que obedece”
(Cohn, 2008, p. 128), relacionadas a processos de sobrevivência, dependência ou
42
interesse de contextos ou eventos específicos. Nesse âmbito poder-se-iam avaliar ações
ligadas às relações institucionais, em que os parâmetros legais fossem os balizadores dos
processos de convivência, desempenho e ascensão, privilegiando o formato legal,
estatutário, acordado legalmente, entre mandatários e comandados. Desta forma, o
processo legal estabeleceria afinidades e procedimentos normatizando a legitimidade da
autoridade e a submissão do liderado.

Da mesma maneira, o reconhecimento do domínio poderia ocorrer a partir do que


Cohn chama de “costume”, baseado no apontamento de Weber ao retratar o evento da
dominação desenvolvida com a metodologia da tradição, ou seja, no hábito impregnado
no cotidiano que não se guia somente pelo sentido prático de normas, mas especialmente
pela subjetividade da memória e que se firma no peso do tempo. Esse fato poderia ser
ilustrado através das interações religiosas ou familiares, em que o significado simbólico
das ações e dos procedimentos acontece através de relações ligadas à rotinização da vida,
a despeito da concretude dos eventos substanciais. Aqui, a autoridade está firmada no
hábito e não na norma, não importando o preparo, o reconhecimento político, a habilidade
ou mesmo a opinião dos comandados. A legitimidade, ao contrário, é fruto da dialética
tradicional, que impõe sua força pelo costume. O interesse, nesse caso, fica a serviço da
manutenção da reminiscência, pouco não obstante quem lidere ou a quem se sirva.

Outro apontamento de Cohn se baseia na ementa weberiana que atribui ao afeto o


fator de legitimação da autoridade. Nesse caso, está a cargo do sentimento pessoal e do
reconhecimento emocional atribuir o poder de domínio a um determinado líder. Essa
forma de liderança não se relaciona, pelo menos de forma plena, com os formatos de
autoridade legal ou tradicional. O que baseia essa legitimação é o poder de sensibilização,
que toca a emotividade do comandado, pouco valorizando o caráter administrativo,
institucional ou burocrático que ele possa sinalizar. É a empatia e o reconhecimento
simbólico que concretizam a liderança. A partir disso, pode-se compreender a
legitimidade da liderança política e também eclesiástica, a partir da qual as relações de
caráter emocional e sensitivo ganham acuidade substancial para garantir o
reconhecimento de um comando. O chefiado, então, não segue somente a norma, ou o
costume, mas, sobretudo, se curva ao que o fascina e inspira, ficando em menor grau a
acepção normativa e institucional, bem como a influência da memória e do costume.

É, portanto, em decorrência dessas constatações que Weber configura as bases da


legitimidade pura, que, segundo Cohn, se realizam entrelaçadas com um quadro

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sociológico que demonstra a demanda administrativa moderna: sendo “Dominação
Legal”, “Dominação Tradicional” e “Dominação Carismática”.

A dominação legal seria descrita pela restrita ligação e dependência ao formato


estatutário, contratual, firmado entre partes por meio de acordo e tecido diante de um
cenário regimental. Seu pressuposto é este: de que “qualquer direito pode ser criado e
modificado mediante um estatuto sancionado corretamente quanto à forma” (Cohn, 2008,
p. 128). Sua referência máxima seria o arquétipo burocrático, respeitados os parâmetros
hierárquicos, de poder e submissão que estejam balizados por normas definidas pela
estrutura de um mandato resultante de eleição ou nomeação. Nessa composição, o
funcionário não está sujeito à pessoa, mas à norma, estabelecida através de um documento
legal, que rege procedimentos, processos, funções, direitos e deveres. Não obstante, o
chefe, assim como o comandado, não dispõe de alvedrio, estando sujeito ao mandato da
regra. Sua ordem não é sua, mas da lei que lhe impõe o ofício e sua função maior que seu
poder pessoal.

A legitimidade do detentor do poder de dar ordens baseia-se em regras


estabelecidas racionalmente por decretação, acordo ou imposição. A
legitimação desses resultados baseia-se, por sua vez, numa
“constituição” racionalmente decretada ou interpretada. As ordens são
dadas em nome da norma impessoal, e não em nome da autoridade
pessoal; e liberdade, um favor ou privilégio arbitrários.
A “autoridade” é o detentor do poder de mandar; jamais o exerce por
direito próprio; conservado como um depositário da “instituição
compulsória” e impessoal. Essa instituição é constituída de padrões
específicos de vida de uma pluralidade de homens, definidos ou
indefinidos, e, não obstante, especificados segundo regras. Seu padrão
de vida conjunto é governado normativamente pelos regulamentos
estatutários.
A “área de jurisdição” é um setor, funcionalmente delimitado, de
possíveis objetos de comando e assim delimita a esfera do poder legítimo
da autoridade” (WEBER, 2008, p. 207).

Aquele que dá ordens é categorizado como “superior”, porém, seu poder de mando
está restrito a um determinado ambiente, que lhe é designado pela norma. Fora dali não
há mando, pois este está restrito ao espaço de “competência concreta”, ligado a um fim e
a uma utilidade circunscrita. Por isso, da mesma maneira que o subalterno, seu cargo
também o limita a um espaço distinto, com um fim determinado pela regra.

Funcionário é aquele que está preparado para o desempenho de determinado ofício


com uma formação específica, profissional, que trabalha respaldado por contrato,
pagamento fixo e tem seu desempenho avaliado por objetivos concretos de produção. Sua

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probabilidade de ascender também está determinada pelo estatuto e reconhecida pela
capacidade de exercer os afazeres estabelecidos pelas regras. O trabalho é impessoal, “em
virtude do dever objetivo do cargo. Seu ideal é: proceder sine ira ET Studio, ou seja, sem
a menor influência de motivos pessoais e sem influências sentimentais de espécie alguma,
livre de arbítrio e capricho e, particularmente, ‘sem consideração da pessoa’, de modo
estritamente formal segundo regras racionais” (Cohn, 2008, p. 129). A obediência
também é regimental, determinada pelos níveis hierárquicos e estabelecida com critérios
específicos.

A caracterização prática desse cenário sugere a estrutura do Estado que se move


através do eixo burocrático configurado em sua estrutura hierárquica e seus códigos legais
e, também, pelo molde capitalista do empresariado moderno, mesmo que não haja
identificação de propósitos entre ambos. A existência de estrutura organizada, regida por
forma estatutária, com níveis estabelecidos de comandantes e comandados, com
retribuição pecuniária, caracteriza a existência de dominação legal.

O fato de o ingresso na associação dominante ter-se dado de modo


formalmente voluntário nada muda no caráter do domínio, posto que a
exoneração e a renúncia são igualmente “livres”, o que normalmente
submete os dominados às normas da empresa, devido às condições do
mercado de trabalho. O parentesco sociológico da dominação legal com
o moderno domínio estatal manifestar-se-á ainda mais claramente ao se
examinarem os seus fundamentos econômicos. A vigência do “contrato”
como base da empresa capitalista impõe-lhe o timbre de um tipo
eminente da relação de dominação “legal” (COHN, 2008, p. 130).
Há uma distinção necessária no que toca à compreensão do conceito de tipo puro
de dominação legal com respeito à burocracia. Apesar de simbolizar a essência da
legitimação da autoridade através da legalidade, a burocracia não deve ser considerada
padrão do conceito de dominação. Cohn avalia que, mesmo as estruturas estritamente
administrativas não devem ser consideradas puramente burocráticas. Com isso, avalia o
sociólogo, que “a burocracia não é o único tipo de dominação legal”. Existem, da mesma
forma, ambientes diversos que não dispõem de estruturas rígidas específicas, como “a
administração pelos parlamentos e pelos comitês, assim como todas as modalidades de
corpos colegiados de governo e administração correspondem a esse conceito e que o
exercício do direito de domínio seja congruente com o tipo de dominação legal” (Cohn,
2008, p. 130).

Pode-se, diante dessa exposição, compreender que a legitimação de uma


autoridade através do parâmetro legal é caracterizada pela ocorrência da norma como

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referência, que garante e sustenta as relações funcionais de uma determinada estrutura
empresarial ou administrativa. Sua distinção primária seria a impessoalidade e a
hierarquia, estando, processos e demandas, sujeitos à diretriz de regras preestabelecidas
por estatuto ou contrato. Esse tipo de autoridade não concede privilégios a seus membros,
por isso, sendo comandantes e comandados regidos pelas regras que lhes impõem
sistemas e ações. Diante disso o caráter da autoridade é garantido e determinado pela
regra e não por critério pessoal, assim como a submissão, regida pela obrigação do
cumprimento da norma e pelo desempenho segundo o regulamento.

A dominação tradicional é compreendida como o tipo de legitimação da


autoridade proveniente da atribuição da santidade aos poderes senhorais decorrentes da
tradição, tendo como tipo puro a dominação patriarcal. Referencia-se pelos valores da
crença no hábito e no que foi adquirido graças à rotinização transformada em normas de
conduta. Esse tipo de autoridade advém de um caráter comunitário, já que o valor
simbólico do dominante foi atribuído pela tradição e não pela imposição de normas ou
estatutos. Quem manda é o “senhor” e os comandados são servidores. A figura do
“senhor” está embasada numa dignidade própria, chancelada pela tradição e pela
fidelidade devida a ela e diante dessa figura “santificada” pela tradição, é inaceitável
modificar as normas. O poder, exercido pelo direito de dignidade pessoal, se pauta pelo
critério pessoal e sensitivo do líder, “onde age conforme seu prazer, sua simpatia ou sua
antipatia e de acordo com pontos de vista puramente pessoais, sobretudo suscetíveis de
se deixarem influenciar por preferências também pessoais” (Cohn, 2008, p. 131). Nesse
caso as demandas e processos estão subordinados à averiguação moral e ética da tradição
e do reconhecimento pessoal do líder, distantes de caráter formal, regido por regras
estabelecidas, como no caso da dominação legal.

Em virtude desse tipo de autoridade estar sujeito de maneira expressiva ao estilo


pessoal do líder, a legitimação do mando torna-se dependente de vínculos de fidelidade,
transformando a estrutura em uma relação de afinidades e parentescos. Segundo Cohn,
“falta aqui o conceito burocrático de ‘competência’ como esfera de jurisdição
objetivamente delimitada. A extensão do poder ‘legítimo’ de mando do servidor
particular é cada caso regulado pela discrição do senhor, da qual ele é também
completamente dependente no exercício desse poder nos cargos importantes mais altos”
(Cohn, 2008, p. 132). Criam-se, então, vínculos de dependência e afetividade mútua entre

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comandante e comandados, não obstante a valorização de procedimentos de capacidade
ou disciplina.

Cohn entende que existem duas formas de concepção dessa modalidade: a


estrutura puramente patriarcal de administração e a estrutura estamental. A autoridade
patriarcal, que sugere a legitimação da autoridade tradicional é elaborada através de
processos sujeitos à livre escolha do “senhor” que podem estar ligados a moldes sociais
que indiquem a escravidão ou a existência do serviçal. Pode-se também sugerir a
ocorrência de camadas ou castas. A administração não requer do “senhor” qualquer
obrigatoriedade ou dependência institucional, já que não é regido por lei. No entanto, isso
tem implicações diretas no quadro funcional estabelecido. Por ser resultado de uma
escolha pessoal, o funcionário não recebe o reconhecimento formal da sociedade que
serve, tampouco, possui qualquer estabilidade ou garantia, uma vez que sua relação é de
dependência, pois está no “senhor” o direito de instituir ou destituir, segundo seu livre
arbítrio. Não há regra ou norma que não estejam sujeitam sujeitas à vontade do “senhor”
e por isso, não há estabilidade institucional, direitos ou segurança.

Diferentemente, a estrutura estamental supõe certa autonomia aos comandados,


que são instituídos por cargos estabelecidos, com grau de legitimidade reconhecida,
contudo, detém, da mesma forma que na estrutura patriarcal, o estigma do privilégio e da
concessão do senhor. Podem, no mesmo sentido, possuir um “direito do próprio cargo”,
graças a determinada prestação de serviço ou exercício de uma profissão, nesse caso a
atividade profissional não está relacionada a um cargo, mas a um direito ou a um ofício
permitido pelo “senhor”. Nesse molde, o cenário de direitos e deveres – do senhor e de
seus comandados – se movimenta através de jogos políticos e de interesses em que
nomeações e concessões são responsáveis pelas oscilações de hierarquias e privilégios.

O que se percebe, portanto, é que a legitimidade da autoridade tradicional está


intensamente ligada ao modelo patriarcal. Weber assegura que este:

(...) é, de longe, o tipo mais importante de domínio da legitimidade,


baseada na tradição. Significa a autoridade do pai, do marido, do mais
velho na casa, do parente mais idoso sobre os membros da casa e do clã;
o domínio do senhor e patrono sobre os servos e os libertos; do senhor
sobre os servos domésticos e funcionários da casa; do príncipe sobre os
funcionários da casa e da corte, os nobres que ocupam cargos, os clientes,
vassalos; do senhor patrimonial e príncipe soberano (landesvater) sobre
‘súditos’.
É característico da autoridade patriarcal e da patrimonial, que representa
uma variedade da primeira, que o sistema de normas invioláveis seja

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considerado sagrado. Uma infração delas resultaria em males mágicos
ou religiosos. Lado a lado com este sistema há um setor de livre
arbitrariedade e preferência do senhor, que em princípio julga apenas em
termos de relações ‘pessoais’, e não ‘funcionais’. Nesse sentido, a
autoridade tradicionalista é irracional (WEBER, 2008, p. 208).
A constatação de Weber de um tipo de autoridade irracional, ligada à tradição,
contrapõe o arquétipo burocrático estudado anteriormente, sobretudo porque no modelo
tradicional, questões como o privilégio e os vínculos de afinidade podem suplantar
valores como disciplina e competência. A autoridade tradicional patriarcal, antes de tudo
valorizará a fidelidade e a boa vontade do serviçal, não obstante, seu compromisso com
seu dever funcional. Esse padrão de autoridade nasce no interior das famílias, na relação
de pais e filhos, de parentes próximos, em que a influência do provedor gere as regras, os
direitos e os deveres de todos os membros. Portanto, os valores pessoais, de preferências
e afinidade é que estabelecem os critérios. Cohn entende que essa questão tem profunda
importância, uma vez que a ausência dessa norma legal, regimental, que baliza e orienta
comportamentos e funções, influenciou intensamente, por exemplo, o sistema econômico
e jurídico da sociedade.

O patriarca, assim como o senhor patrimonial, rege e decide segundo


princípios da “justiça do Cadi” [islâmico], ou seja: por um lado preso
estritamente à tradição, mas por outro e na medida em que esse vínculo
deixa a liberdade, conforme pontos de vista juridicamente informais e
irracionais de equidade e justiça em cada caso particular, e “com
consideração da pessoa”. Todas as codificações e leis da dominação
patrimonial respiram o espírito do chamado “Estado-providência”:
predomina uma combinação de princípios ético-sociais e utilitário-
sociais que rompe toda rigidez jurídica formal (COHN, 2008, p. 133).
Como se observa, o tipo puro de dominação tradicional se refere à legitimação de
uma liderança personalista, reconhecida pela legalidade adquirida através da tradição
desenvolvida na conduta de vida social. Esse tipo de dominação está diretamente
relacionado ao modelo patriarcal, oriundo de relações familiares ou de ligações de
privilégio e afinidade. Nesse sistema a regra estabelecida está à mercê do “senhor” e a
seu critério pode ser mudada ou suplantada. Não há vínculos legais entre o servo e o
senhor, como no modelo burocrático, já que as garantias estão comprometidas com a
afinidade e a lealdade. Por isso, o funcionário não dispõe de reconhecimento social
formal, mas de direitos adquiridos por nomeação. O senhor não depende formalmente de
um estatuto, contudo, sua liderança depende do grau de fidelidade e boa vontade dos
liderados. As relações não se baseiam em regimentos capazes de garantir segurança, mas
em movimentos de confiança e proximidade. Em face disso, a sociedade não é regida pela

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formalidade ou pela clareza das leis, mas pela sensibilidade e comando de quem lidera,
numa ordem preestabelecida pela tradição. Nesse ponto, vale salientar que a dominação
tradicional se divide em dois tipos: a tradicional patriarcal – que quando se instala como
regime político é chamado de patrimonial, de regime patrimonialista – e a tradicional
estamental, mais conhecida como feudal. A primeira se legitima pela piedade – afeto e
devoção – e a segunda pela lealdade – uma espécie de contrato pessoal, que antecede o
contrato social.

A Dominação Carismática é o tipo autoridade designada pela legitimação através


do reconhecimento de fatores sobrenaturais ou extraordinários de quem lidera. A
dominação carismática resulta da aceitação coletiva de que determinada pessoa possui
um dom fora do comum, ligado a fatos admiráveis como a bravura, o poder intelectivo,
uma habilidade admirável ou facilidade de comunicação que despertem admiração
excepcional, emotividade capazes de promover afeição ou dedicação pessoal.

(...) refere-se a um domínio sobre os homens, seja predominantemente


externo ou interno, a que os governados se submetem devido à sua crença
na qualidade extraordinária da pessoa específica. O feiticeiro, o mágico,
o profeta, o chefe de expedições de caça e saque, o chefe guerreiro, o
governante dito “cesarista” e, em certas condições, o chefe pessoal
de um partido são desses tipos de governantes para os seus discípulos,
seguidores, soldados, partidários etc. a legitimidade de seu domínio
baseia-se na crença e na devoção ao extraordinário, desejado porque
ultrapassa as qualidades humanas normais e originalmente considerado
como supernatural. A legitimidade do domínio carismático baseia-se,
assim, na crença nos poderes mágicos, revelações e culto do herói. A
fonte dessas crenças é a “prova” das qualidades carismáticas através de
milagres, de vitórias e outros êxitos, ou seja, através do bem-estar dos
governados (WEBER, 2008, p. 207).
A obediência ao líder carismático se dá pelo reconhecimento de sua capacidade
incomum, que é justificada na legitimação de um dom sobrenatural, digno de respeito e
devoção. Seu poder está diretamente ligado ao caráter esplêndido de sua atuação quanto
à crença das pessoas que o seguem. A existência do dom especial é associada à “graça”
de um deus de quem está próximo, portanto, a devoção ao líder simboliza a devoção ao
deus, e a submissão a este está atrelada à obediência àquele. Seus “súditos” o reverenciam
e seguem seu comando que subsiste, somente, enquanto perdurar a excepcionalidade de
seu carisma. Caso perca seu carisma, por consequência, perderá também seu prestígio,
reconhecimento e a lealdade de seus seguidores, sob a suposição de ter sido abandonado
por seu deus. Desta forma, a autoridade carismática depende da constante atualização em
sua excepcionalidade e de valoração por parte de seus seguidores.

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Cohn aponta como tipos puros desse tipo de autoridade, “a autoridade do profeta,
do herói guerreiro e do grande demagogo” (Cohn, 2008, p. 135). A estrutura
administrativa formada por essa liderança está ligada a critérios do carisma e da vocação
pessoal, desconsiderando questões como preparo profissional ou competência. Isso
remete ao cenário do apóstolo que é convocado pelo senhor ou ao missionário que, em
nome da obediência, se submete à determinação do líder. Apesar de se tratar de nomeação,
a autoridade carismática pode se servir de regras e estatutos, contudo, o senso balizador
desse tipo de administração é pautado pela “revelação ou a criação momentâneas, a ação
ou o exemplo, as decisões particulares, ou seja, em qualquer caso, – medido com a escala
das ordenações estatuídas – o irracional” (Cohn, 2008, p. 135). Com isso, contrariamente
ao tipo de dominação legal, que elabora todas as ações a partir da dialética racional,
demonstrada através de posturas e procedimentos, o tipo carismático se conduz pela
imprecisão de eventos que ocorrem de acordo com a necessidade e do interesse de manter
a legitimidade de sua autoridade.

Esse tipo de autoridade não está voltado ao cumprimento de regras ou estatutos,


estáticos, mas a “criações momentâneas” e irracionais, sem compromisso com qualquer
coerência racional, que procuram livrá-la de cair no descrédito social ao transparecer que
a “graça” ou o “dom” que a autentica não lhe pertence mais. O líder carismático se coloca,
assim, acima das convenções, transmutando a norma a seu tempo e gosto

(...) vale para o profeta, enquanto herói guerreiro as ordenações legítimas


desaparecem diante da nova criação pela força da espada e, para o
demagogo, em virtude do “direito natural” revolucionário que ele
proclama e sugere. A forma genuína da jurisdição e a conciliação de
litígios carismáticos é a proclamação da sentença pelo senhor ou pelo
“sábio” e sua aceitação pela comunidade (de defesa ou de crença) e esta
sentença é obrigatória, sempre que não se lhe oponha outra corrente, de
caráter também carismático. Neste caso, encontramo-nos diante de uma
luta de líderes, que em última instância somente pode ser resolvida pela
confiança da comunidade e na qual direito somente pode estar de um dos
lados, ao passo que para o outro somente pode existir justiça merecedora
do castigo. (COHN, 2008, p. 135).
Pelo reconhecimento social de que sua autoridade é constituída e representa o
próprio Deus, o líder carismático crê que seu poder sobrepõe-se a qualquer instituição
humana, legal ou tradicional, estando a seu alcance a faculdade de reconhecer ou relevar,
submeter-se ou ignorar qualquer preceito. Contudo, a legitimação dessa autoridade não
advém da comunidade somente como reconhecimento de seu dom, mas como um dever

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de fé e sinal de compromisso espiritual, por esse motivo, cabe o castigo, configurando o
caráter dominador e autoritário desse tipo de autoridade.

Por liderança carismática, no contexto aqui apresentado, pode-se compreender a


liderança que necessite “fazer-se acreditar”. Weber aponta para esta dinâmica ao se referir
ao líder que precisa levar outras pessoas a crerem que, por seu dom especial, representa
Deus. A isso se pode atribuir, tanto o carisma do apóstolo como o do conquistador, pois
ambos estão imbuídos da responsabilidade de representar um dom maior que lhes garanta
êxito em seu serviço, fazer milagres ou conquistar um país. Não obstante, a legitimação
da autoridade carismática ocorre ainda por uma crença, por parte dos subordinados, de
que há uma atribuição mágica na ação daquele que lidera. Por isso, são fatores simbólicos,
mas essenciais, o evento de rituais que ilustrem estes sentimentos, como a consagração,
a unção ou as invocações de bênçãos. Esse fator elabora uma constatação importante para
a compreensão deste cenário: de que a manifestação do carisma não está somente na ação
da autoridade, mas também no cumprimento de ritos específicos que passam a ter em si
mesmos a ação do carisma.

A legitimação dessa autoridade pode demonstrar sinais do autoritarismo, contudo,


também pode sugerir uma interpretação oposta se analisada sob o prisma de sua eleição,
ou seja, do conceito público de que uma determinada pessoa está qualificada a liderar em
função do carisma que apresenta. O reconhecimento desse prestígio, que perpassa pela
percepção popular, supõe “legitimidade democrática”. Cohn acredita que esse fator pode
localizar a autoridade como “eleição” e o senhor, recebedor de uma graça que é concedida
por súditos e não unicamente pela ação divina.

Tanto a designação pelo séquito como a aclamação pela comunidade


(militar ou religiosa), como o plebiscito adotaram frequentemente na
História o caráter de uma eleição efetuada por votação, convertendo deste
modo o senhor, escolhido em virtude de suas pretensões carismáticas,
num funcionário eleito pelos súditos conforme sua vontade livre.
E de forma análoga converte-se facilmente o princípio carismático,
segundo o qual uma ordem jurídica carismática deve ser anunciada à
comunidade de defesa ou religiosa) e ser reconhecida por esta, de modo
que a possibilidade de que concorram ordens diversas e opostas possa ser
decidida por meios carismáticos e, em última instância, pela adesão da
comunidade à ordenação correta, na representação – legal – segundo a
qual os súditos decidem livremente mediante a manifestação da sua
vontade sobre o direito que prevalecerá, sendo cômputo das vozes o meio
legítimo para isso (princípio majoritário) (COHN, 2008, p. 140).
Esse aparente antagonismo permeia o ambiente carismático ao supor que a
autoridade não tem em si mesma, autonomia plena de governo, mesmo que em

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determinadas circunstâncias, possa transparecer um caráter autoritário e personalista. Ao
contrário da autoridade legal que é regida por estatutos, regras e convenções, a liderança
carismática necessita comprovar invariavelmente o carisma que lhe garante o poder, sob
pena de perdê-lo. A resposta permanente ao anseio comunitário representa este comando
conjunto que se movimenta entre as demonstrações de carisma e o reconhecimento
comunitário de que, não somente a vontade de Deus, mas também o consenso será
respeitado. O antagonismo se dá pela mútua dependência entre comandantes e
comandados, já que ambos, indissociavelmente, detêm o poder.

Apesar de sugerir certo tipo de “classificação” dos tipos de legitimação da


dominação através dos três modelos apresentados, Weber concorda que eles não
poderiam ser considerados suficientes para abranger ou qualificar de forma plena as
particularidades da estrutura social e sua significação social, por serem conceitos. Para
ele, isso seria possível somente a partir da compreensão de uma “combinação ou estado
de transição entre vários desses tipos puros” (Weber, 2008, p. 210). Pode-se assim,
concluir que, de forma estática, nenhum dos tipos apresentados poderia ser considerado
suficiente em si mesmo para qualificar um ou outro estado de dominação. Isso é plausível
se for considerada a possibilidade de um movimento entre eles, capaz de compreender
momentos, estados e circunstâncias que os fazem transitar entre os tipos apresentados
pelo autor. Trata-se de uma realidade dinâmica, organizada através de estruturas sociais
complexas e em movimento, sujeitas às nuances históricas, econômicas e políticas. Assim
surge a concepção de que os três tipos puros de dominação legítima, caracterizados por
Weber, figuram como balizas práticas e puras de um contexto móvel e intenso que pode
ser entendido a partir de exercícios flexíveis capazes de perceber os movimentos da
sociedade analisada.

Considerando estas questões, o autor ressalta que até mesmo a terminologia


utilizada para sua elaboração necessita de certo cuidado, já que pode, nalgum momento,
não expressar com exatidão a definição de um contexto social ou histórico. É possível,
dessa forma, concluir que uma análise sociológica mais cuidadosa pode se cercar de
construções terminológicas para abranger algumas situações específicas. Considerando
seu próprio contexto, Weber exemplifica:

(...) Seremos forçados, repetidamente, a criar expressões como


‘burocracia patrimonial’ para deixar claro que os traços característicos do
respectivo fenômeno pertencem em parte à forma racional de domínio,
ao passo que outros traços pertencem à forma tradicionalista de domínio,

52
neste caso à dos estamentos. Também reconhecemos formas, muito
importantes que se difundiram universalmente através da História, como
a estrutura feudal do domínio. Aspectos importantes dessas estruturas,
porém, não podem ser classificados tranquilamente sob qualquer das três
formas que distinguimos (WEBER, 2008, p. 210).
Weber enfatiza a ocorrência de dois casos específicos, a saber: o “estamento” e a
“situação de classe”. Ele define estamento por “um grupo socializado através de seus
estilos de vida especiais e noções especificas de honras, e as oportunidades econômicas
que monopoliza legalmente. Um estamento é sempre um tanto socializado, mas nem
sempre organizado em associação” (Weber, 2008, p. 210). Para o autor, além da
concepção dos tipos de dominação, é indispensável perceber a existência de agregações
provenientes do que ele chama de “estilos de vida” e “noções e honra”, ou seja, por
questões ligadas a outros valores que não somente os sociais, como religiosos, filosóficos,
humanitários, ou que envolvam estima mútua.

No caso das “situações de classe”, Weber entende como afinidades provenientes


das “oportunidades de obter manutenção e renda, primordialmente determinadas pelas
situações típicas, economicamente relevantes; a propriedade de certo tipo, ou a
habilitação adquirida na execução de serviços procurados, é decisiva para às
oportunidades de renda” (Weber, 2008, p. 211). Nesse caso consideremos as associações
de classes profissionais que tem necessidades específicas inerentes às atuações comuns e
que se solidarizam e se unem na defesa de seus próprios interesses. O sociólogo esclarece
que, neste caso, pode acontecer uma “situação estamental” – de relações de honra e
consideração mútua – ocasionada por motivação de classe.

Como se percebe, as muitas variações e nuances das organizações sociais podem


sugerir elaborações complexas em seus variados segmentos. Não obstante, é possível
estabelecer características distintas, mas não exclusivas, nas diversas composições em
que as estruturas indicam. Por esse motivo, Weber não se permite engessar as
classificações estruturais da sociedade, mas entende que elas podem ser distintas e
diversas. Assim, não é possível enquadrar qualquer estrutura dentro de um só perfil, já
que numa mesma estrutura podem ocorrer diversos contextos e situações, que poderíamos
chamar de “estratificações” presentes em uma dada estrutura. Por essa razão é preciso
considerar cada situação.

Talvez, neste momento, seja oportuno salientar que a maior atenção de Max
Weber se volta para a questão do poder e seus desdobramentos. Neste sentido, Kuper

53
afirma que “la inquietud por explicar el ejercicio del poder y la dominación social
constituye una preocupación constante en el pensamiento de Max Weber. “Sus
planteamientos sobre la toma de deciciones y sobre los motivos que sustentan las diversas
formas de autoridad” (Kuper,1994, p. 17), enfatizando que em toda a obra do sociólogo
é possível reconhecer a sociologia da dominação como uma referência, desenvolvida
sempre em relação a outras sociologias, como a religiosa, econômica e jurídica.

Para Kuper, os “tipos ideais” que orientam o estudo da dominação em Weber,


devem ser compreendidos como realidades sociológicas e não sociais por não poderem
observar a realidade empírica como “ordens realmente válidas”, ou seja, devem ser
considerados como elaborações históricas, por esse motivo, segundo ele, Weber, ao
abordar os tipos ideais, o faz com base em dados históricos.

Weber considera que las formas de dominación que se dan historicamente


son una mezcla de tres tipos: tradicional, carismática y burocrática. Esta
tipología responde a una sistematización conceptual de patrones
institucionales generalizados. Cada forma de dominación representa una
condensación de los principios organizativos que han sido el fundamento
de las instituciones políticas.
Las concepciones weberianas sobre los tipos de autoridad explican um
proceso característico del desarrollo de cada uno de ellos en el transcurso
del tiempo. Se trata de un enfoque dinámico de las sociedades políticas –
incluso de las más “tradicionalistas”. Son conceptos que han sido
desarrollados con la idea de entender el movimiento de la vida social,
tanto de las personas y los grupos como de los sistemas institucionales.
Weber no concibe “la sociedad como una maquina en la cual los hombres
se hallan cautivos ni como la suma de las acciones de individuos que
ejercen su libre arbitrio, sino más bien como un lugar donde los hombres
se hallan mientras deciden lo próximo que van hacer (KUPER, 1994, p.
22).
Com isso, a compreensão adequada dos tipos ideais estaria mais próxima de um
conjunto de possibilidades capaz de se apresentar a partir de uma infinidade de
combinações. Essa interpretação se relacionaria à existência de situações e contextos
sujeitos tanto à referência advinda dos dados históricos sublinhados por Kuper, como com
à dinâmica da atividade social.

La tipología de la autoridad cumple una importante función organizadora


en la sociología histórica de Weber. Permite integrar, al mismo tiempo,
para definir las diferencias de los procesos de cambio que Weber
considera más significativos desde el punto de vista de la evolución
histórica de la sociedad – diferencias entre lo tradicional y lo racional,
entre lo rutinario y lo excepcional (KUPER, 1994, p. 22).
É, por isso, possível perceber que a construção dos conceitos weberianos não se
resume à tentativa de enquadrar as diversas situações sociais nos tipos puros ou tipos

54
ideais apresentados, mas na utilização deles como “pontos de orientação conceituais”
capazes de encaminhar a análise de certas situações sociais.

La tipologia sociológica ofrece al trabajo histórico-concreto la vantaja de


pode señalar como se aproximan em el caso particular de una forma de
dominación, lo que em ella hay de “carismático”, de “carisma
hereditário”, de “carisma institucional”, de “patriarcal”, de
“burocrático”, de “estamental”, etc., o bien en lo que se aproximan a uno
de estos tipos.
Weber clasifica los diferentes tipos de dominación con base en los
diferentes motivos de legitimidad. La legitimidad le proporciona un
principio de organización y de diferenciación particulares de gobierno
(burocrático patrimoniales, de liderazgo burocrático, etc.) (KUPER,
1994, p. 24).
A partir dessas ponderações, talvez seja possível concluir que o sistema weberiano
que classifica a estrutura social a partir dos tipos de dominação legítima – estabelecendo
critérios estruturais de domínio de acordo com estilo de dominação distinta das diversas
formas de organização social – significa, mais que uma composição estática, o
reconhecimento da existência de possibilidades distintas e móveis, que se formam e se
deformam conforme o movimento natural das diversas probabilidades de organização.
Neste sentido Weber rejeita qualquer referência a esse conceito como algo inflexível e
absoluto, lógico e concluso. Ao contrário disso, ele mesmo afirma que “a grande maioria
dos casos empíricos representa uma combinação ou estado de transição entre vários
desses tipos puros” (Weber, 2008, p. 210), ou seja, há de se compreender que qualquer
tentativa de classificação de tipos ideais ou de dominação, necessita de uma composição
de fatos e impressões que sejam capazes de configurar realidades específicas e situações
distintas.

Weber acredita que somente a criação de composições terminológicas é capaz de


circunscrever com maior precisão o universo de possibilidades encontradas. O autor
entende que alguns estados sociais

Só podem ser compreendidos como combinações que envolvem vários


conceitos (...). Há também formas que devem ser compreendidas, em
parte, em termos de princípios outros que os de “domínio”, e em parte
em termos das variações peculiares do conceito de carisma. Exemplos:
os funcionários da democracia pura com rotações de cargos honoríficos
e formas semelhantes, de um lado, e o domínio plebiscitário, do outro, ou
certas formas de Governo dos notáveis que são formas especiais de
domínio tradicional. Tais formas, porém, pertenceram certamente aos
fermentos mais importantes para a manifestação do racionalismo
político. Pela terminologia sugerida aqui, não desejamos forçar
esquematicamente a vida histórica infinita e multifária, mas
simplesmente criar conceitos úteis para finalidades especiais e para
orientação (WEBER, 2008, p. 210).

55
Nosso trabalho, portanto, tratará dessa dimensão imprecisa das composições
sociais, recorrendo ao manuseio das elaborações sociológicas, como sugere o autor.
Dentro de cenários distintos serão estas composições terminológicas necessárias para
determinar com maior precisão os quadros formados pelos movimentos estruturais de
cada ambiente. Faz-se necessário, aqui, apelar para Cohn (2008, p. 128), ao se referir à
ocorrência de constelações de interesses, ao discorrer sobre a probabilidade da obediência
no contexto da dominação. Da mesma maneira, haveremos de visualizar as diversas
possibilidades de nossa tese a partir da perspectiva de constelações, que se movem
constantemente e nem sempre se formam da mesma maneira. Esse é o parâmetro
necessário para a análise sociológica das conjunturas de dominação, objeto de nossa
análise, sobretudo por se tratar de uma relação que entendemos ser entre dois tipos puros
e distintos que se dispõem conjuntamente em algumas situações, a saber, a Igreja
Metodista e suas Instituições de Ensino.

Nossa pretensão se faz a partir da metodologia weberiana, concebendo distinções


e, ao mesmo tempo, interações. Nossa percepção é que a classificação weberiana dos
tipos puros e o entendimento do conceito de legitimação da autoridade poderão balizar
esta elaboração. Não se trata de organizar ementas, sugestões ou conclusões, mas de
estabelecer quais evidências distingue uma e outra estrutura. Os conceitos de burocracia,
carisma, disciplina, apontamentos sobre religião, certamente sinalizarão os caminhos
possíveis para este exame, contudo, serão os conceitos de dominação carismática,
tradicional e legal, que nos auxiliarão, de maneira segura e adequada, na elaboração dos
parâmetros necessários para verificarmos as divergências e as convergências desses dois
espaços sociais.

56
CAPÍTULO 2
Características da Igreja Metodista e das Instituições de
Ensino Metodistas brasileiras a partir do Plano de Vida e
Missão e das Diretrizes para a Educação da Igreja metodista
– uma leitura Weberiana

Nosso objetivo neste capítulo é estabelecer quais serão as características que


referenciarão a análise da Igreja Metodista e de suas instituições de Ensino. Para tanto,
será necessário considerar que o pensamento sociológico de Weber se dá através das
relações do indivíduo com a sociedade, que se constitui, primordialmente, como um
mecanismo fundamentado na “ação social”. Para o sociólogo, “a relação social consiste
na probabilidade de que os indivíduos comportar-se-ão de uma maneira
significativamente determinável. É completamente irrelevante o porquê de tal
probabilidade, mas onde ela existe pode-se encontrar uma relação social” (Weber, 2002,
p. 45). O autor entende que essas relações são estabelecidas por critérios variados, que
ocorrem na distinção de cada conjuntura e por motivações diversas, podendo resultar de
acordos ou desacordos, interesses afins ou por concorrência, por cognações ou por
diferenças. Também nas interações de subordinação e mando, observa-se a relação social,
evidenciando que podem ser dissociadas de concordâncias ou interesses. Apesar de nem
sempre caracterizar a relação de agentes de um único contexto, a relação social pode
distinguir a ação de um espaço restrito:

É sempre um caso, se usado neste contexto, de sentido imputado aos


indivíduos envolvidos numa dada situação concreta, seja na média ou
num tipo puro construído teoricamente, mas nunca um caso de sentido
normativamente “correto” ou metafisicamente “verdadeiro”. A relação
social consiste, mesmo no caso de tais “organizações sociais” como
“Estado”, “Igreja”, “associação” ou “casamento”, no fato de que existiu,
existe ou existirá uma conduta provável, de alguma maneira definida,
apropriada a este sentido (WEBER, 2002, p. 46).
Isso aponta para o fato de que as relações sociais não somente viabilizam as
interações necessárias ao processo social, mas também organizam a sociedade a partir de
redutos de sentido advindos de interações de objetivos congêneres, que demonstram
relações transcendentes aos interesses referentes às necessidades cotidianas, evidenciadas
pelo estilo de vida, preferências, pontos de vista, além de conceitos morais e éticos. Os

57
valores são elaborados pessoal e comunitariamente (interna e externamente) a partir da
relação do indivíduo com o meio em que vive:

Por “ação” (incluindo a omissão e a tolerância) entendemos sempre um


comportamento compreensível com relação a “objetos”, isto é, um
comportamento especificado ou caracterizado por um sentido (subjetivo)
“real” ou “mental”, mesmo que ele não seja quase percebido. [...] a ação
que especificamente tem importância para a sociologia compreensiva é,
em particular, um comportamento que: 1. Está relacionado ao sentido
subjetivo pensado daquele que age com referência ao comportamento dos
outros; 2. Está codeterminado no seu decurso por esta referência
significativa e, portanto, 3. Pode ser explicado pela compreensão a partir
deste sentido mental (subjetivo). (WEBER, 1913 apud RODRIGUES
2001, p. 54).
Dessa maneira, cada grupo ou segmento elabora uma característica própria, que
seria compreendida por Weber como um “tipo ideal” de conduta. Em outras palavras,
cada instituição se individualiza a partir de suas próprias motivações. É necessário para a
análise, considerar o procedimento de cada grupo conforme seus próprios valores. Como
salienta o sociólogo, “o tipo (ideal) [...] é um exagero de perfeição que nunca será achado
na prática” (Weber, 1913 apud RODRIGUES, 2001, p. 56), exagero que pode ocorrer
tanto na construção de quem investiga como na conduta de quem é investigado, portanto,
passível de distanciamento e isenção de sentido. Com isto, nossa abordagem será
realizada segundo a perspectiva da caracterização para não incorrer em erro conceitual ou
metodológico.

2.1 – Igreja

Para Weber a análise sociológica das religiões deve compreender a multiplicidade


dos fatores envolvidos como cultura, momento histórico, geografia, além de motivações
sociais dos contextos específicos onde ela se localiza. O autor entende a necessidade de
conceber a existência de uma grande estrutura social, composta por estruturas menores,
representadas por lugares distintos que, conjuntamente, influenciam na construção de
uma ética geral. É necessário verificar e considerar todas as ocorrências desses espaços
característicos, onde se acomodam vários modos próprios de conduta. Para ele, a religião
ocupa um desses espaços, caracterizando um único fator de uma elaboração social maior
e mais abrangente:

58
A ética econômica tem, decerto, uma grande margem de autonomia,
certos fatores de Geografia e Historia determinam essa medida de
autonomia no mais alto grau. A determinação religiosa da conduta da
vida, porém, é também um e – note-se isso – apenas um dos elementos
determinantes da ética econômica. É claro que o modo de vida
determinado religiosamente é, em si, profundamente influenciado pelos
fatores econômicos e políticos que operam dentro de determinados
limites geográficos, políticos, sociais e nacionais. Iríamos perder-nos
nessas discussões, se tentássemos demonstrar essas dependências em
toda a sua singularidade. Só podemos, no caso, tentar retirar os elementos
diretivos na conduta de vida das camadas sociais que influenciaram mais
fortemente a ética prática, as características que distinguem uma ética das
outras; e, ao mesmo tempo, foram importantes para a respectiva ética
econômica.
De forma alguma devemos focalizar apenas uma camada. As camadas
que são decisivas na formação dos aspectos característicos de uma ética
econômica podem variar no curso da História. E a influência de uma
camada apenas jamais é exclusiva. Não obstante, em geral, podemos
determinar as camadas cujo estilo de vida foram pelo menos
predominantemente decisivos para certas religiões (WEBER, 1982, p.
190).
Por essa razão, a leitura interessada em distinguir um só ponto desse panorama
diverso e complexo, pouco alcançará sua realidade particular. Importante ainda é salientar
que na dinâmica da movimentação social, as camadas influenciam e são influenciadas
mutuamente, transformando e sendo transformadas. Disso a necessidade de compreender
momentos e camadas, histórica, geográfica e socialmente, visando localizar situações
específicas. Desta maneira, para uma análise que pretenda caracterizar a Igreja Metodista,
faz-se necessário referenciá-la historicamente como herdeira do cristianismo e da Igreja
Anglicana Inglesa, iniciada como um movimento em 1738, por John Wesley, pastor
anglicano, que desenvolveu métodos de disciplina pessoal e cultivo espiritual. Com o
decorrer do tempo, este movimento cresce e se estrutura como denominação religiosa nos
Estados Unidos, criando a Igreja Metodista que chega ao Brasil em 1867 com os primeiros
missionários americanos – vindos do sul dos Estados Unidos da América do Norte – que
se instalam no litoral fluminense. Em 02 de setembro de 1930, a Igreja Metodista do
Brasil torna-se autônoma da igreja americana. Para tanto, caracterizar uma Igreja que
desde sua implantação no país se expandiu por todo o território nacional e encontrou lugar
nas diversas regiões e culturas, é tarefa complexa. Contudo, sua estrutura e organização
documental dão condições de uma apreciação plausível já que a existência de uma única
“Constituição” possibilita clareza sobre questões administrativas e doutrinárias, tornando
possível a compreensão do que seria, na concepção weberiana, um “tipo puro”, a partir
de documentos aprovados em seus Concílios, portanto, com a legitimidade necessária
para expressar sua linha teológica, filosófica e burocrática.

59
A Igreja Metodista brasileira sempre foi pautada por referências documentais que
regeram legalmente suas ações. Isso se dá pela herança da igreja americana – Igreja
Metodista Episcopal do Sul, nos Estados Unidos da América – que aprovou a autonomia
da Igreja brasileira em 02 de setembro de 1930, ocasião em que foi elaborada e aprovada
a primeira “Lei Ordinária” da Igreja Metodista brasileira”. Desde então os “Cânones” da
Igreja Metodista – nome dado ao documento que referencia regimentalmente todas as
áreas e ações da Igreja, especificando doutrinas, missão, governo, administração,
organização, realização dos Concílios, das Ordens ministeriais, sobre como deve ocorrer
a estrutura e o andamento das Igrejas Locais, sobre a conduta dos Membros Leigos e
Clérigos, de sua organização jurídica, das representações legais, dos critérios e normas a
serem seguidos e das vigências de cargos e atribuições. Os Cânones estabelecem como
“elementos básicos” para sua caracterização, sete aspectos principais, a saber: 1.
Doutrinas do Metodismo; 2. Costumes do Metodismo; 3. Credo Social; 4. Normas do
Ritual; 5. Plano para a Vida e a Missão; 6. Diretrizes para a Educação; 7. Plano Diretor
Missionário, advertindo que “em nenhuma circunstância, qualquer Igreja Local, Órgão
ou Instituição pode planejar, decidir ou executar, ou, ainda, posicionar-se contra os
elementos indicados neste artigo, porque deles decorre a característica metodista”
(Cânones, 2012, p. 36). Pode-se entender que o compêndio desses documentos
compreende o “espírito” da Igreja, seu pensamento e modo de ser, portanto, referências
razoáveis para a configuração de um “tipo ideal”. Contudo, consideramos que uma análise
abrangente, contemplando a totalidade dessas normas e procedimentos pouco
acrescentará à nossa elaboração, pela riqueza de particularidades regimentais reguladoras
das instâncias, funções, obrigações e direitos de cada setor. Dessa forma, elegeremos
como referencial de nossa análise um documento que sintetiza um “espírito”, uma
conduta, através de motivações filosóficas e ideológicas da Igreja, o “Plano para a Vida
e a Missão”.

2.1.1 – Plano de Vida e Missão (PVM)

Em sentido figurado, podemos afirmar que o “Plano de Vida e Missão” (PVM) e


as “Diretrizes para a Educação da Igreja Metodista” (DEIM) são irmãos gêmeos já que
nasceram ao mesmo tempo – Concílio de 1982 – e com as mesmas motivações. Ambos
foram elaborados a partir de um cenário político interno e externo tenso. As discussões

60
sobre a missão da Igreja e da Educação já vinham sendo realizadas através dos “Planos
Quadrienais” da Igreja e de outros documentos importantes como o “Credo Social da
Igreja Metodista”. Lazier (2012) aponta alguns documentos anteriores que sinalizaram o
momento da criação destes: O Credo Social; As Regras Gerais; O 1º Plano Quadrienal –
1975 – 1978; O 2º Plano Quadrienal – 1979 - 1982.

A fim de exemplificar a conjuntura desses documentos, observamos que Credo


Social sempre indicou a responsabilidade da Igreja diante das demandas sociais,
pontuando o que seria ou o que deveria ser a conduta institucional e ideológica da Igreja
e de seus membros frente à sociedade e seus problemas. A primeira versão, de 1930, foi
aprovada por ocasião da autonomia da Igreja, como parte do 1º Cânones, indicando, já
naquele momento:
(...) direitos iguais para todos; justiça para todos e em todas as camadas
sociais; cuidado com a família; abolição da exploração de crianças
através do trabalho; oferecimento de uma educação que propicie o
desenvolvimento das crianças; regulamentação do trabalho para as
mulheres; proteção do indivíduo e da sociedade contra os males da bebida
alcoólica e tóxicos, bem como contra os prejuízos causados pelo
comércio dessas substâncias e da prática do jogo e da prostituição;
sustento para o operário em sua velhice ou em caso de invalidez ou
desemprego; descanso semanal e horas de trabalho razoável; salário que
sustente a família do trabalhador; repúdio à guerra; direito de voto
(CÂNONES, 1934).
É evidente a percepção, deflagrada na promulgação do primeiro documento
nacional, da preocupação dos membros daquele Concílio com questões sociais
importantes que pontuariam os desdobramentos expressos em futuros documentos com
forte atenção às questões sociais. Lazier (2012) destaca que nas versões de 1960, 1970 e
1977, verifica-se constante contextualização, salientando que “assim, podemos apreender
que a doutrina social professada pela Igreja Metodista indicou, ao longo de seus concílios
gerais, os caminhos pelos quais seguiram os idealizadores do Plano para a Vida e a Missão
da Igreja e das Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista” (p. 33).

As frequentes alusões aos direitos humanos e a busca de uma qualidade de vida


adequada, constantes nos documentos daquele momento histórico estão de acordo com o
cenário político por que passava a Igreja e seus membros. Maia e Leite (2012) afirmam
que:

(...) a elaboração do documento em tela aconteceu dentro de um cenário


político de grande efervescência em nosso país, quando os movimentos
sociais reivindicavam a redemocratização depois de um período de
grande decepção motivado pelo regime da ditadura militar. Era o que os

61
analistas sociais chamaram de “a década perdida”. Essa efervescência se
reproduzia em todo o continente latino-americano.
Nesse contexto de insatisfação, polarização política, social, teológica,
religiosa etc., a Igreja foi convocada a fazer uma leitura e releitura de sua
tarefa missionária, através de suas igrejas locais, instituições
educacionais, sociais, órgãos (p.48).
Pucci (2003) considera o PVM um “divisor de águas” para a Igreja Metodista e
sua missão, ao declarar de maneira incisiva seu desejo por autonomia e pela construção
de uma teologia brasileira. “O documento Vida e Missão representa um marco histórico
no interior da Igreja Metodista brasileira. É um grito de liberdade contra o domínio da
cultura alienígena, imposta historicamente às comunidades e às instituições formativas.”
(p. 36).

Como afirmamos anteriormente, o PVM foi aprovado no mesmo Concílio Geral


do DEIM. Isso reflete a proximidade entre ambos, mais caracterizada pelo ambiente
político e social vivido pela igreja e pela nação naquele contexto histórico. Nele se
expressam preocupações direcionadas à vida prática e à condição básica da população
brasileira, bem como enfatiza a participação social como meio de promoção dos direitos
à cidadania. Para tanto, a Igreja reunida em 1982 entendeu a necessidade de elaborar um
plano, que lhe servisse de orientação e substituísse os antigos planos quadrienais que se
limitavam a períodos restritos por uma referência, que inspirasse sua vivência prática e
cotidiana, como descreve o próprio texto, “linhas gerais que deverão orientar toda a ação
da Igreja nos próximos anos, enquanto necessário, devendo ser avaliadas periodicamente”
(Cânones, 2012, p. 80).

Com esta ênfase na missão, ou seja, em sua efetiva atuação na vida das próprias
comunidades metodistas e da sociedade, o documento reconhece que a espiritualidade
preconizada pelo metodismo não se restringe somente ao cultivo de uma conduta piedosa
e mística, mas também ao envolvimento concreto nos problemas e tensões gerados no
exercício social do país. “Certamente, aqui estamos diante da necessidade de revisar
profundamente nossa prática de piedade pessoal e a necessidade de rever nossos atos de
misericórdia, entendidos como ação concreta de amor a favor dos outros. Esses são os
dois caminhos que traduzem a visão de Wesley sobre a santificação na Bíblia.” (Cânones,
2012, p. 80). Noutra direção, as discussões conciliares que resultaram no PVM
ressaltaram que a missão deve agir como instrumento de mediação e unidade diante da
diversidade natural, tanto no interior da Igreja, quanto externamente, expressa na

62
multiplicidade de ações requeridas a ela, quer pelo trabalho efetivamente eclesiástico,
quer por sua atuação social e comunitária.

O documento é dividido em oito linhas mestras, a saber: a) A Herança


Wesleyana2; b) Entendendo a Vontade de Deus; c) Necessidades e Oportunidades; d) O
que é trabalhar na Missão de Deus? e) Como participar da Missão de Deus? f) Situações
na quais acontece a Missão; g) Os frutos do trabalho na Missão de Deus; h) Esperanças e
vitória na Missão de Deus. Em linhas gerais, esses tópicos pormenorizam a
fundamentação bíblica e teológica para uma atuação coerente com o metodismo histórico,
a forma e a localização da missão no desdobramento prático da atuação da Igreja, os
objetivos e resultados que são esperados dessa tarefa missionária. Subsequente a estas
divisões, o plano especifica áreas denominadas “de vida e trabalho” da Igreja, sendo: a)
A Área de Ação Social; b) Área de Comunicação Cristã; c) Área de Educação; d) Área
de Ministério Cristão; e) Área de Evangelização; f) Área de Patrimônio e Finanças; g)
Área de Promoção da Unidade Cristã. De modo geral, esses tópicos enfatizam um caráter
prático na atuação da Igreja, que se volta de maneira efetiva para questões urgentes da
vida social.

É o esforço da Igreja para que na Terra seja feita a vontade do Pai. Isso
acontece quando, sob a ação do Espírito Santo, nos envolvemos em
alternativas de amor e justiça que renovam a vida e vencem o pecado e a
morte, conforme a própria experiência e vida de Jesus Cristo [...]
Participar da solução de necessidades pessoais, sociais, econômicas, de
trabalho, saúde, escolares e outras fundamentais para a dignidade
humana. Propugnar por mudanças estruturais da sociedade que permitam
a desmarginalização social dos indivíduos e das populações pobres.
(CÂNONES, 2012, p. 99 e 100).
Com isso, a Igreja sinaliza a intenção de se libertar de um espaço restrito e atuar
na sociedade de maneira prática:

- em qualquer situação em que a opressão e a morte negaram a realidade


da vida com a qual Deus se comprometeu desde o começo do mundo;
- nas estruturas sociais que se tornaram obsoletas e desumanizantes,
opressoras e injustas;
- na pessoa visando à restauração da sua integridade e do seu ambiente
de vida;
- nos sofrimentos humanos, participando de soluções para sua superação;
- nos conflitos humanos, buscando promover a paz, combater a guerra e
toda violência;
- na educação integral da pessoa (CÂNONES, 2012, p. 99 e 100).

2
Herança Wesleyana é uma referência à prática dos princípios e regras instituídos por John Wesley,
fundador do Metodismo.

63
Assim, aquele Concílio priorizou, registrando no documento, o envolvimento da
Instituição Igreja Metodista em situações de crise, onde a Igreja passa a agir numa
proposta transformadora e humanitária, que deveria estar inserida nos diversos contextos
para se conhecerem e se entenderem processos e relações. Para tanto, ele conclama a
Igreja para:

(...) conhecer o bairro, a cidade, o campo, o país, o continente, o mundo


e os acontecimentos que os envolvem, por que e como ocorrem e suas
consequências. Isso inclui conhecer a maneira como as pessoas vivem e
se organizam, são governadas e participam politicamente, e como isso
pode ajudar ou atrapalhar a manifestação da vida abundante;
(CÂNONES, 2012, p. 101).
Como objeto de nossa atenção, destacaremos, além do direcionamento pela
atuação social da Igreja, a atividade educacional, subdividida em duas vertentes: a
Educação Teológica e a Educação Secular3. O PVM destaca:

A educação, como parte da Missão, é o processo que visa a oferecer à


pessoa e à comunidade uma compreensão da vida e da sociedade,
comprometido com uma prática libertadora, recriando a vida e a
sociedade segundo o modelo de Jesus Cristo e questionando os sistemas
de dominação e morte à luz do Reino de Deus (CÂNONES, 2012, p. 106).
Em documento a Igreja decidiu4 que a Educação acontece como consequência de
um processo de contínuo aprendizado diante da realidade confrontada com os valores do
Reino de Deus, sendo a transformação da pessoa e da comunidade um resultado prático.
Neste intuito, a Igreja espera que o lar, a própria Igreja, suas Instituições e comunidade
em geral sejam instrumentos de uma formação libertadora e crítica, capaz de tornar cada
cidadão agente de sua ação. A Educação Teológica, por sua vez, visa compreender o
mundo e sua realidade através do olhar histórico bíblico e metodista, segundo as tradições
do cristianismo e da Igreja Metodista, sendo a reflexão considerada como importante
elemento na missão da Igreja. O documento indica os objetivos principais dessa
formação:

- criar instrumentos para a reflexão teológica que propiciem a ação


pastoral de todo o povo de Deus;
- preparar pastores e pastoras, bem como leigos e leigas para a Missão;
- capacitar o/a pastor/a para o preparo dos membros com vistas à Missão;

3
Os documentos estudados, PVM e DEIM utilizam o termo “Educação” para se referir à sua missão
educacional, caracterizada nas instituições de Ensino da Igreja Metodista. Assim, quando utilizado, ele se
reportará a este sentido e aplicação.
4
Quando se utiliza o termo “Igreja” no contexto de “A Igreja entende”, “A Igreja decidiu”, queremos nos
referir às decisões conciliares que regimentam certo direcionamento para a vivência eclesiástica e
educacional da Igreja Metodista.

64
- analisar os fundamentos bíblico-teológicos das doutrinas cristãs
enfatizadas pelo metodismo, à luz da sociedade brasileira;
- preparar obreiros para exercer ministérios em áreas especiais;
- manter o ministério pastoral e leigo atualizado para a Missão;
- aprofundar a pesquisa teológica no contexto brasileiro e latino-
americano;
- integrar a Educação Teológica em um programa nacional de educação
teológica (CÂNONES, 2012, p. 110).
A “Educação Secular” é compreendida pela Igreja como uma ação que oferece
formação qualificada em seus vários níveis de maneira a promover consciência crítica de
forma que seus agentes sejam capacitados para auxiliar na transformação da sociedade na
perspectiva cristã. O PVM estabelece como objetivos da Educação Secular Metodista:

- capacitar a comunidade para cooperar no processo de transformação da


sociedade, na perspectiva do Reino de Deus;
- ser a instituição educacional agente para atuar na sociedade na
perspectiva do Reino de Deus;
- apoiar todas as decisões que promovam a vida, denunciar e combater
todas as ações que destruam a vida;
- responder às necessidades do povo pela criação de escolas em áreas
geográficas em desenvolvimento e em áreas carentes;
- propiciar possibilidades de estudos a alunos carentes;
- deixar claro o chamado de Jesus Cristo para o comprometimento da fé
num espírito não sectarista (CÂNONES, 2012, p. 112).
Podemos dizer a partir do plano que a tarefa missionária da Igreja Metodista vai
além dos templos, compreendendo o trabalho de dignificar a vida das pessoas e da
comunidade através de uma formação crítica e racional ligada aos valores cristãos, no
cumprimento do objetivo bíblico de promover vida plena. Mais que formar adeptos, o
Concílio de 1982 indicou através do PVM que a Igreja deve promover lucidez social
aliada à competência profissional, fato que pode gerar para a sociedade, indivíduos
capazes de agir solidária e humanamente.

Depois de três décadas, o PVM continua vigente para a Igreja Metodista desde
sua elaboração em 1982, como parte de sua “carta magna”, os Cânones. Esse fato tem o
importante significado de considerar seus propósitos atuais e de continuar sendo uma
diretriz filosófica e teológica para o metodismo brasileiro. Nesse espírito, por ocasião dos
trinta anos do PVM, o departamento de Comunicação da Sede Geral da Igreja Metodista
entrevistou dois professores/pastores que fizeram parte da elaboração do documento e
participaram ativamente de seu processo de aprovação. Os professores Ely Eser Barreto
Cesar e Rui Josgrilberg, deram suas impressões sobre o teor do texto, além de analisar
sua contextualização na Igreja contemporânea.

65
Barreto Cesar lembra que a espiritualidade wesleyana5 está diretamente ligada à
ação prática, expressa pelo que John Wesley chamava de “atos de piedade” e “obras de
misericórdia”, relacionados à vivência mística e à atuação prática de auxílio aos
necessitados:

O reencontro com o John Wesley inglês, independente da mediação dos


missionários, mostrou que o Wesley original recusou toda experiência
religiosa tida como “quietista” ou como “busca exclusiva de experiência
interior”. Busca da santidade é viver “atos de piedade” e “obras de
misericórdia”. A piedade não existirá sem as obras de amor
(misericórdia).
A misericórdia, para Wesley, não brota de mim mesmo. Ela é despertada
pela visão do outro que sofre, graças à sensibilidade gerada por nossa
comunhão piedosa com Deus. Wesley cultivou este processo de
santificação desde seus tempos de estudante em Oxford, quando passou
a visitar semanalmente os presos na Prisão da Torre, para atender às
necessidades concretas e materiais daqueles presos. Ele pedia esmolas
regularmente nas ruas de Londres para os pobres. Sua última carta, uma
semana antes de sua morte, foi um apelo a William. Wilberforce,
parlamentar inglês, para que não esmorecesse em sua luta contra a
escravidão. (IGREJA METODISTA, 2012).
Para o professor, a experiência espiritual não se resume à experiência litúrgica,
transcendendo a mística, estando totalmente comprometida com a realidade humana.
Nesse sentido, ele acredita que o documento transmite com propriedade a essência da
teologia metodista. Na mesma direção, ele sinaliza que o PVM instiga a Igreja ao
envolvimento com as questões mais íntimas da sociedade, pois, para integrar-se a ela, há
necessidade de conhecê-la com profundidade. Barreto Cesar afirma que:

O documento afirma que como a Missão de Deus visa o mundo, há


necessidade de conhecer o bairro, a cidade, o campo, o país, o continente
e os acontecimentos que os envolvem, por que e como ocorrem e suas
consequências. Isso inclui conhecer a maneira como as pessoas vivem e
se organizam, são governadas e participam politicamente, e como isto
pode ajudar ou atrapalhar a manifestação da vida abundante. Pois, se a
Missão de Deus é o mundo, precisamos dedicar tempo e estudo para
conhecer, criticamente e em detalhes, como este mundo funciona
(IGREJA METODISTA, 2012).
Ainda mais, entende que a tarefa missionária da Igreja implica em reconhecer os
apelos sociais a partir da ótica bíblico-metodista e, se necessário, confirmá-las, apoiando
e colocando-se como referencial profético. Barreto Cesar salienta também que os
princípios religiosos não estão restritos aos templos ou aos adeptos, mas presentes nas
solicitações que envolvam os direitos humanos, o direito à vida e à dignidade que ela deve

5
Atribuída à tradição iniciada por John Wesley.

66
oferecer. Isso requer um relacionamento com a comunidade em geral que vá além dos
limites da religiosidade institucionalizada. O professor afirma que:

O PVMI vai mais fundo: há necessidade de apoiar todas as iniciativas -


não importando qual a natureza do grupo, se cristão ou não, que
preservem e valorizem a vida humana. Trabalhar na Missão de Deus é
somar esforços com outras pessoas e grupos que também trabalham na
promoção da vida, exatamente como ensina Jesus. Pelo plano espera-se
que a igreja local e cada um de nós, de modo organizado, saiamos das
quatro paredes do templo, relacionemo-nos profunda e eficazmente com
a sociedade e o sofrimento humano, para contribuir na construção da vida
plena para todos (IGREJA METODISTA, 2012).
Quanto à dificuldade de tornar o PVM prático na vivência da Igreja, Barreto Cesar
considera que a diversidade de interesses e perspectivas presentes no interior da Igreja
dificulta um olhar coeso e institucional para o documento:

A questão é de que lugar estamos lendo nossa Bíblia, e de como a lemos.


Não temos dado atenção suficiente a isso. Se lemos a Bíblia como
consumidores que esperam o tempo todo receber bênçãos pessoais,
corremos o sério risco de não enxergar o Deus missionário, interessado
na felicidade/salvação de todas as filhas e filhos por ele criados, [...] O
Plano para a Vida e a Missão é um documento missionário enraizado na
Bíblia e na tradição wesleyana, com foco nas demandas concretas do
povo de nosso Brasil. Parece que nosso equívoco comum se prende a
nosso “vício de leitura”: procuramos basicamente “os nossos interesses”,
a “nossa salvação pessoal”, as “bênçãos a que julgamos ter direitos como
seguidores de Jesus” e não o lugar do Deus missionário, puro amor pela
humanidade, que nos convida a nos envolvermos como comunidade em
amor entranhável por nossos contemporâneos. Espiritualizamos demais
o evangelho a ponto de não conseguirmos entender o processo de
construção deste Reino de Deus aqui e agora (IGREJA METODISTA,
2012).
Barreto Cesar acredita que o PVM cumpriu, num primeiro momento, o papel de
unificar a Igreja e de dar a ela a possibilidade de aproximar-se de sua verdadeira
identidade. Relata que nos primeiros anos após sua aprovação, os diversos grupos,
formados por tendências variadas, comungaram de um só propósito. Ao sair do templo,
todos se uniram em torno da Missão da Igreja, visando atuar vivamente como integrantes
da sociedade a partir de sua crença. Contudo, relata que pouco tempo depois, a Igreja se
rendeu aos modismos religiosos, retornando a uma espiritualidade mística e excludente.
“Pouco a pouco, face à poderosa influência dos muitos movimentos pentecostais e
carismáticos, ‘retornamos ao conforto do templo’, nos fascinamos com uma excessiva
concentração no ‘louvor’, voltamos à busca da bênção pessoal” (Igreja Metodista, 2012).

Para o professor Josgrilberg, a proposta fundamental do PVM foi despertar a


Igreja para a ação prática, para o serviço, e uma das conquistas mais relevantes foi a

67
aprovação e implantação de “dons e ministérios”6. No entanto, ele reconhece que, na
prática:

(...) o Plano para Vida e Missão está sempre como um alerta para as
igrejas que se acomodam e vivem a missão mais voltada para si. O Plano
é sempre um alerta para mostrar que a missão de Deus é no mundo e não
internalizada. Neste sentido, há muitos aspectos positivos. Mas, é claro,
o documento ficou longe daquilo que se pensou que pudesse realizar na
vida da igreja (IGREJA METODISTA, 2012).
Josgrilberg acredita que um dos obstáculos para esse distanciamento entre o que
se pretendia com o documento e o que se obteve com ele, foi o fato de que a formação do
metodismo brasileiro se deu pelos missionários americanos, de acordo com uma tradição
pietista e puritana, caracterizada por uma espiritualidade mística, litúrgica, centrada na
celebração e no templo. O PVM, por sua vez, se baseou no metodismo inglês e na tradição
dos primeiros metodistas, voltada ao evangelho prático, humanista e social:

A gente percebeu que Wesley não era o pietista dos americanos, ele tinha
um perfil mais inglês. Isto fez que com que o próprio Plano para Vida e
Missão tivesse uma introdução que reforçava um novo perfil wesleyano.
Mas, foi difícil, pois a formação deixada pelos americanos era muito
pietista. O Plano talvez não tivesse a intenção clara de reforçar a tradição,
nem foi voluntariamente assumido nesta direção, mas acabou refletindo
esta preocupação de propagar uma teologia wesleyana mais encarnada
(IGREJA METODISTA, 2012).

Outro fator, levantado por Josgrilberg é que a Igreja instituída, através do Colégio
Episcopal7, não assumiu como deveria a responsabilidade de efetivar o PVM. “Faltou
realmente a Área Geral tomar a frente e publicar o Plano com uma palavra forte do
Colégio Episcopal, símbolo da igreja. Faltou isto [...] Infelizmente parte da igreja não
presta muito a atenção para os seus documentos” (Igreja Metodista, 2012). Esse fato,
segundo o professor, descaracterizou o plano e ao longo do tempo deixou-se perder da
própria essência teológica metodista.

Perguntado sobre a atualidade do plano, o professor Josgrilberg entende que a


Igreja está dividida entre sua vocação, que é representada pelo PVM e a influência de
novas teologias que enfatizam o crescimento numérico. Desta maneira:

6
Dons e Ministérios foi um novo modo de organização do serviço desenvolvido pela membresia da Igreja,
com a substituição do modelo de cargos e comissões.
7
Colégio Episcopal é a reunião colegiada dos bispos metodistas brasileiros, que têm a responsabilidade de
gerir a Igreja em todas as suas áreas.

68
A Igreja Metodista cai vítima da fronteira com outras igrejas e não sabe
discernir qual a melhor influência. Hoje eu conheço igrejas pentecostais
que estão bem mais seriamente envolvidas profeticamente com a vida
social do que a Igreja Metodista. E a igreja, acho, que não percebe isto.
Prefere-se caminhar em uma direção – que é administrar a experiência
teológica – pregar o que as pessoas querem ouvir, uma pregação que
parece mais com autoajuda e que é contrária a mensagem bíblica. Temos
que discernir bem o nosso quadro religioso e não podemos deixar que os
pastores agarrem aqui e ali influências que vão facilitar o ministério deles
num momento (IGREJA METODISTA, 2012).

2.1.2 – O Plano de Vida e Missão como referência das


características da Igreja Metodista brasileira

Mesmo diante das constatações de Barreto Cesar e Josgrilberg, podemos entender


o PVM como referencial ideológico oficial da Igreja Metodista no Brasil por dois
motivos: a) ele compõe o código de normas gerais da Igreja, ou seja, o documento
normativo principal, que rege sua conduta, missão e administração; b) é um documento
legitimado pela aprovação conciliar máxima da Instituição, ou seja, é chancelado, através
de votação, pela instância maior da Instituição Igreja Metodista brasileira. Portanto, não
há outra forma de análise documental possível para estabelecer o tipo ideal oficial do
metodismo brasileiro. Nesse sentido é importante a lembrança de que a concepção
weberiana de tipo ideal transcende a realidade, podendo se localizar numa construção
ideológica e filosófica ou num mero exagero da realidade, como aponta Max Weber.

Isso posto, destacamos o estilo burocrático do documento, demonstrado por sua


composição estrutural, através de uma fundamentação teológica, descrita nos doze itens
apresentados, nos quais se enfatiza a herança wesleyana, ou seja, os princípios
preconizados pelo fundador do metodismo, John Wesley. A seguir, o texto delineia, num
aspecto mais amplo, os conceitos gerais da teologia metodista em outros dez subitens que
são embasados por texto bíblicos. No terceiro tópico, o PVM oferece uma série de
recomendações quanto às necessidades palpáveis para sua implantação, elaborando em
seus sete tópicos a metodologia de trabalho. Dessa forma, o documento oferece
recomendações teóricas e práticas do dever e do proceder de membro leigo e clérigo
necessários para sua efetivação. Perguntas como “O que é trabalhar na missão de Deus?”,
“Como participar da missão de Deus?”, bem como os procedimentos esperados pela
Igreja, são detalhados em todo o texto. Há também preocupação com os locais onde serão

69
implantados esses projetos, expressa em recomendações pontuais para a realização de
análises sociológicas, econômicas, visando “conhecer o bairro, a cidade, o campo, o país,
o continente, o mundo e os acontecimentos que os envolvem, por que e como ocorrem e
suas consequências” (Cânones 2012, p. 103).

O PVM, através do que ele denomina “áreas de atuação”, descreve os meios a


serem utilizados pela Igreja para o exercício de suas propostas. Áreas como Educação
Secular, Educação Cristã, Comunicação, Educação Teológica8, Área de Ministério
Cristão, Área de Evangelização, Área de Patrimônio e Finanças, Área de Promoção da
Unidade Cristã, são elencadas como ambientes de efetivação do plano. O documento
apresenta sistematicamente a fundamentação teórica e a metodologia de aplicação para
cada uma de suas indicações, caracterizando-se como um manual pormenorizado da
missão da Igreja e da conduta de cada um de seus membros. É oportuno salientar que ele
está inserido no contexto dos Cânones, que estabelece, burocraticamente, toda a forma de
organização da Igreja, seus cargos, responsabilidades, direitos, funções e atribuições,
instâncias, órgãos, competências e procedimentos. Isso dá clareza de que o tipo ideal da
Igreja Metodista brasileira pode ser considerado burocrático, uma vez que sua estrutura
organizacional, por si mesma, remete a essa constatação.

A partir da teoria weberiana, consideraremos a Igreja Metodista uma associação


carismática, sobretudo por sua vocação eclesiástica, que remete à transcendência mística.
Para Weber é a suplantação do mundo real, por meio de relações que excedem a estrutura
formal de uma determinada associação, que caracteriza o carisma. Ele acredita que a
maior parte das religiões foi influenciada por uma “ética religiosa da negação do mundo”.
O sociólogo entende que as religiões constroem “esferas individuais de valor” com uma
“coerência racional” dificilmente encontrada no mundo real. A aceitação de um “Deus
supramundano”, já mencionada, aponta para a compreensão mística de outra ética que
não a real:

Para o verdadeiro místico, continua sendo válido o princípio: a criatura


deve estar calada, de modo que Deus possa falar. Ele “está” no mundo e
se “acomoda” externamente às suas ordens, mas apenas para adquirir a
certeza do seu estado de graça em oposição ao mundo, resistindo à
tentação de levar a sério os seus processos. Como podemos ver Lao-tsé,
a atitude típica do místico é de humildade específica, uma minimização

8
A Igreja entende como Educação Cristã, o preparo informal e leigo oferecido em estudos destinados às
suas comunidades. A Educação Teológica se refere à formação Acadêmica de Pastores e Leigos na área
Teológica Científica.

70
da ação, uma espécie de existência religiosa incógnita no mundo. Ele se
coloca à prova contra o mundo, contra sua ação no mundo. O ascetismo
deste mundo, pelo contrário, prova-se através da ação. Para o asceta deste
mundo, a conduta do místico é um gozo indolente do eu; para o místico
a conduta do asceta (voltado para o mundo) é uma participação nos
processos do mundo, combinada com uma hipocrisia complacente. Com
esse “fanatismo abençoado”, habitualmente atribuído ao puritano típico,
o ascetismo deste mundo executa as resoluções positivas e divinas cujo
sentido final continua oculto. O ascetismo executa tais resoluções como
dadas nas ordens nacionais da criatura, ordenadas por Deus. Para o
místico, pelo contrário, o que importa para sua salvação é apenas a
compreensão do significado último e completamente irracional, através
da experiência mística. As formas pelas quais ambos os modos de
conduta fogem do mundo podem ser distinguidas através de confrontos
semelhantes (WEBER, 2008, p. 228).
Portanto, a verificação da transcendência como orientação de conduta, torna a
religião, pelo seu sentido místico supramundano, um espaço típico do carisma, onde
normas e regimentos “humanos” podem e devem ser suplantados pelos sinais do “dom
divino”, ou da ligação espiritual com a irrealidade do divino. Esse caráter da religiosidade
faz com que a existência de uma liturgia ou de uma homilia transforme a humanidade do
líder na representação de Deus. Da mesma maneira, o carisma é relacionado ao poder
privilegiado de um contato direto com a irrealidade da vida que se torna poder na pessoa
do líder. A sociedade religiosa convive com a dicotômica relação com o mundo real, que
está baseada, como afirma Weber, numa esfera metafísica. Apesar de ser mística, essa
esfera não é irracional, pelo contrário, ela dispõe de outra racionalidade, que é própria e
abrangente. Por isso, o místico não está submetido somente à moral mundana, mas
também à do carisma de uma sociedade específica, no caso, a religiosa.

A partir desta fundamentação, seria possível concluir que a Igreja Metodista,


como comunidade específica, possui racionalidade própria, portanto, um próprio carisma,
que rege sua sociedade interna, respaldada por uma moral própria. Pelo seu caráter
religioso, tão somente, a Igreja tramita num universo supramundano e particular, baseado
em códigos distintos de sentido, que regem seus valores mais íntimos. Ela está no mundo,
mas não se guia por ele. É influenciada pela sociedade, no entanto, norteia-se por uma
conduta característica. A Igreja constitui uma sociedade carismática e nela se pauta para
sua atuação social.

Quanto à dimensão das Instituições de ensino da Igreja, é necessário


primeiramente lembrar que para Weber, a educação é o meio mais adequado de
possibilitar ao indivíduo a capacidade de exercer as atividades requeridas pelos desafios
da racionalização. Com as transformações sociais advindas da vida racional, que se baseia

71
na submissão às leis e normas burocráticas de conduta, ela representa não somente o
preparo para a convivência, mas um meio de obter ascensão e vantagens.

A Educação sistemática, na análise de Weber, tornou-se um “conjunto”


de conteúdos e regras direcionadas para a qualificação de pessoas que
demonstrassem reais possibilidades de gerenciar o Estado, as empresas e
a política, de maneira “Racional”. Um dos pressupostos básicos na
formação do Estado moderno é a constituição de uma administração
burocrática racional. Esse “processo” só ocorreu na sua totalidade no
Ocidente, com a substituição gradual de trabalhadores sem qualificação,
por trabalhadores qualificados, e com orientação política fundamentada
em normas racionais. (SILVA & AMORIN, 2012, p. 5).
Como afirmado, a função de adequar o indivíduo ao meio social, confere ao
processo educacional grande importância não somente como preparo intelectual, mas
também como forma de acesso a instâncias sociais mais elevadas. Nesse sentido, Weber
entende que a Educação se destina socialmente a três finalidades principais (Weber,
2008): a) despertar o carisma – ao potencializar o que ele chama de “qualidades heroicas
ou dons mágicos” – e transmitir o conhecimento especializado. “O primeiro tipo
corresponde à estrutura carismática do domínio; o segundo corresponde à estrutura
(moderna) de domínio, racional e burocrático” (Weber, 2008, p. 295). Ele considera que
não há divergências entre os dois modelos, mesmo reconhecendo a inexistência de ligação
entre eles. b) Preparar o aluno para uma conduta de vida – o que ocorreria
independentemente do “caráter mundano ou religioso” que isso pudesse significar. O
mais importante nesta finalidade, seria educar para, ou seja, construir uma capacidade de
submissão e adequação à conduta estabelecida, como um condicionamento que o capacite
a manter-se coerente às formas de comportamento específico de uma determinada
conduta. c) transmitir conhecimento especializado – o que estaria diretamente ligado ao
propósito da racionalização e da adequação ao processo burocrático social da vida
moderna, ligado à formação de especialistas funcionais.

Assegurar a existência de um “tipo puro” que caracterize a sua totalidade e


complexidade de educação metodista brasileira significa cometer grave erro,
considerando a diversidade de pensamentos, ideais e comportamentos que isto possa
sugerir. No entanto, podemos encontrar respaldo teórico ao considerarmos que a Igreja
Metodista brasileira estabeleceu, ao longo de sua história, parâmetros baseados em seus
documentos para balizar filosoficamente suas instituições de ensino, a saber: as
“Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista”. Dessa forma, estabeleceremos esse
documento como base teórica para constituir o que seja o tipo ideal da educação metodista

72
no Brasil como reconhecimento de sua vigência legal e seu valor prático na condução e
no desenvolvimento destas instituições.

Para tanto, julgamos necessária a percepção das motivações, ensejos e anseios que
o levaram até a aprovação pelo XIII Concílio Geral da Igreja Metodista em 1982 na cidade
de Belo Horizonte.

2.2 - Diretrizes para a Educação da Igreja Metodista (DEIM)

O DEIM deve ser compreendido como resultado das tensões recorrentes do


desafio metodista de trabalhar a educação. Neste sentido, Boaventura9 esclarece que o
cenário que precedeu a elaboração do documento, compreendeu o avanço urbanístico e
industrial do governo Juscelino Kubitschek, na década de 1950, e a implantação do
regime militar em 1964 que deflagrou momentos difíceis para o metodismo brasileiro,
como um pequeno crescimento numérico; a saída de uma parte da juventude, descontente
com a proximidade da cúpula da Igreja com o governo militar; o fechamento da Faculdade
de Teologia e a dispersão de muitos seminaristas, além das divisões internas causadas
pela radicalização ideológica de algumas lideranças, o que causou o surgimento da Igreja
Metodista Wesleyana em meados dos anos 60. Para ilustrar a relação entre a Igreja e suas
instituições de educação, naquele momento, Boaventura cita um relatório da época,
elaborado pelo Conselho Geral das Instituições Metodistas – (COGEIME, 1971, p. 26,
27, 44), onde se afirmava:

(...) já não é necessário usar instituições de ensino para adentrar a nossa


sociedade [...] que “a Igreja não precisa mais dos seus colégios” [...]
temos que reconhecer que muitos dos propósitos iniciais da instituição,
embora nobres e válidos em seu tempo, não servem para o presente [...]
deve a Igreja possuir a necessária coragem para determinar que seja
extinto, ou mudado o curso que não tenha mais razão de ser. Ela deve
criar aquilo que o presente e o futuro indiquem ser necessário.
Salienta Boaventura, que esse cenário provocou discussões, debates, o que
anteriormente dificilmente aconteceria. Ao mesmo tempo, o governo militar recém-
empossado, com a necessidade de avançar no preparo de mão de obra qualificada,
motivou o surgimento de cursos superiores por todo o país, o que contribuiu para o

9
BOAVENTURA, Elias. sbhe.org.br/novo/congressos/cbhe2/pdfs/Tema4/4106.pdf - acesso em
07/02/2014

73
progresso de instituições particulares no ensino superior e, consequentemente, as
Instituições Metodistas de Educação. “A Igreja Metodista aproveitou os flancos abertos
e entrou fortemente neste nível de ensino, abrindo diversos cursos em suas instituições
em Piracicaba, Rio, Belo Horizonte, Porto Alegre e São Bernardo do Campo”
(Boaventura, p.4).

Embora esse pequeno relato histórico, por um lado, não abranja todo o contexto
político e ideológico daquele momento, pode ilustrar o ambiente que precedeu o
surgimento do DEIM10; por outro lado, há de se considerar que essas crises promoveram
outros encaminhamentos através de documentos que passaram a nortear a Igreja
Metodista. Lazier (2012) destaca o Credo Social da Igreja Metodista como um dos mais
proeminentes. Apontado como a doutrina Social da Igreja Metodista, o Credo Social,
aponta para o entendimento de responsabilidade da Igreja e sua membresia diante das
questões sociais brasileiras. Simboliza o que seria o código doutrinal social de uma
instituição religiosa, no qual se contempla a visão da Igreja frente à sociedade e sua
responsabilidade religiosa de responder às suas demandas. “O Credo Social apresenta o
que poderia ser designado de doutrina social, onde se evidenciam aspectos da
compreensão e da leitura que a Igreja Metodista tem do mundo e da sociedade e a sua
responsabilidade na imersão no contexto social”.

A primeira versão desse documento data de 1930 e acontece por ocasião da


autonomia da Igreja brasileira, que era até então vinculada à Igreja Metodista americana,
tendo sido promulgado apenas na elaboração do primeiro Cânones11 em 1934. A primeira
edição indica qual seria o código de conduta metodista, remetendo a:

(...) direitos iguais para todos; justiça para todos; justiça para todos em
todas as camadas sociais; cuidado com a família; abolição da exploração
de crianças através do trabalho; oferecimento de uma educação que
propicie o desenvolvimento das crianças; regulamentação do trabalho
para as mulheres; proteção do indivíduo e da sociedade contra os males
da bebida alcoólica e tóxicos, bem como conta os prejuízos causados
pelo comercio dessas substâncias e da prática do jogo e da prostituição;
sustento para o operário em sua velhice ou em caso de invalidez ou
desemprego; descanso semanal e horas de trabalho razoável; salário que

10
Para uma compreensão mais aprofundada do contexto sugerimos a leitura de “Antecedentes das
Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista” do Prof. Josué Adam Lazier, constante em nossa
bibliografia.
11
Cânones é o documento que normatiza a Igreja Metodista do Brasil em todas as suas dimensões,
eclesiástica, missionária, educacional e administrativa.

74
sustente a família do trabalhador; repúdio à guerra; direito de voto
(CÂNONES, 1934).
Essa versão se manteve até 1960, quando a Igreja incluiu ao documento sua
preocupação com justiça social, política e a economia. “Para a época era um documento
de grande abrangência e de uma abertura no interior da Igreja metodista, no sentido de
conceber a sua missão de forma contextualizada, profética, sinalizadora da vida,
educativa e formadora da cidadania” (Lazier, 2012, p. 30). Esse documento tem base nos
primórdios do metodismo e enaltece de maneira evidente um comprometimento histórico
e teológico de uma conduta responsável e cidadã, na promoção de uma sociedade mais
justa e fraterna. Lazier, citando os Cânones, salienta atenção dada à Educação, indicando
que ela deve remeter a um programa que desperte no indivíduo a consciência de suas
relações com Deus, com o meio ambiente, a família, a Igreja e o bem estar da sociedade.

As duas versões que se sucedem, 1970 e 1977, trazem ao documento, e


consequentemente à maneira de ser da Igreja Metodista, uma visão ainda mais pragmática
de missão, incluindo tópicos como democracia, compromisso com os marginalizados e
oprimidos, além de um comprometimento com a promoção dos direitos humanos:

(...) a doutrina social professada pela Igreja Metodista indicou, ao longo


de seus concílios gerais, os caminhos pelos quais seguiram os
idealizadores do Plano para a Vida e a Missão da igreja e das Diretrizes
para a Educação na Igreja Metodista. Entre as alterações feitas nessa
(última) versão do Credo Social estão uma ampliação da participação
ecumênica da Igreja metodista e o resgate da preocupação de John
Wesley em unir ciência e piedade (LAZIER, 2012, p. 33).
Segundo Pucci (2003) o DEIM pode ser entendido como uma decorrência do
“Plano para a Vida e a Missão da Igreja”, ou seja, o resultado de um documento
progressista em que a Educação é concebida como um instrumento capaz de transformar
o indivíduo e a sociedade, coerente com uma Igreja que tem em sua agenda preocupação
ativa com questões sociais e políticas do país:

Expressões como “educação comprometida com uma prática


libertadora”; “diretrizes educacionais voltadas para a libertação das
pessoas e da sociedade”; “apoiar os movimentos que visem à libertação
dos oprimidos dentro do espírito do Evangelho libertador de Jesus
Cristo”; “toda a ação educativa da Igreja deverá proporcionar aos
participantes condições para que se libertem as injustiças e males sociais
que manifestem na organização da sociedade”, caracterizam a tônica
social das diretrizes educacionais e a firme crença no potencial
expressivo de libertação que a Igreja Metodista tem em mãos no
atendimento de sua proposta básica “Ite et docete”. (PUCCI, 2003 p.
38).

75
Pode-se considerar o DEIM como resultado do meio, de num ambiente de debates
e tensões provocados pelo desejo de entender quais os verdadeiros papeis de uma Igreja
preocupada com temas como justiça, direito e dignidade de vida. Portanto, o documento
não pode ser considerado somente como algo que rege procedimentos acadêmicos, ou
como um referencial pedagógico, mas como sinal da ação missionária da Igreja Metodista
por meio da Educação. Com esse pressuposto, passaremos para a análise do documento,
conscientes de que ele não acontece por acaso na vida da Igreja, mas como consequência
de uma reflexão sobre seu sentido mais profundo.

Destaque importante, demonstrado no histórico inicial do DEIM, remete ao fato


de ter sido elaborado a partir de sucessivas consultas e debates envolvendo não somente
os personagens que lideravam a Educação Metodista da época, mas também a membresia.
Foram redigidos textos, frutos de Câmaras de discussão, que eram publicados no
Expositor Cristão12 para acolhimento de sugestões. Essas propostas alimentavam novas
reuniões e novos documentos para debate:

Com esta finalidade, em janeiro de 1982 reuniu-se o Seminário Diretrizes


para um Plano Nacional de Educação, no Instituto Metodista de Ensino
Superior. Foram convocados os bispos, os membros do Conselho Geral,
representantes dos Conselhos Regionais, das Federações Regionais de
Homens, Senhoras, Jovens e Juvenis, bem como das respectivas
Confederações. Cada instituição de ensino (secular e teológico) foi
convidada a enviar dos representantes. Os alunos de cada instituição de
ensino teológico também foram convidados a enviar um representante
(CÂNONES, 2012 p. 128 e 129).
Nesta dinâmica, o DEIM foi tecido como consequência de apontamentos amplos.
Dentre os documentos que o precederam, o histórico cita “A Educação Cristã, um
posicionamento metodista” e “Fundamentos, Diretrizes, Políticas e Objetivos para o
Sistema Educacional Metodista”. A atenção da Igreja para com esses debates visava duas
realidades distintas: a Educação Teológica e a Educação Secular. A Igreja definia, depois
de franca discussão, o que entendia como educação, qual seu propósito e como ela deveria
se dar.

Em seus primeiros apontamentos, o DEIM reconhece que a Educação é um


instrumento presente na ação da Igreja Metodista brasileira, com a finalidade primordial
de transformar a sociedade com da implantação do Reino de Deus. O documento afirma

12
O Expositor Cristão é um jornal tradicional da Igreja Metodista brasileira, com circulação nacional para
membros da Igreja.

76
que a Educação deve agir “como instrumento de transformação social, ela é parte
essencial do envolvimento da Igreja no processo da implantação do Reino de Deus.”
(Cânones, 2012, p. 129). E acrescenta que a Igreja é comunidade educadora em todas as
suas ações, seja através da liturgia ou da homilia numa celebração ou em sua ação secular,
numa sala de aula:

Levando em conta o evangelho e sua influência sobre todos os aspectos


da vida, a ação educativa metodista trouxe muitas contribuições
positivas. Por meio especialmente da igreja local, muitas pessoas foram
convertidas e transformadas, modificando suas vidas e seu modo de agir.
Por intermédio das instituições a Igreja buscou a democratização e a
liberalização da educação Brasileira. Suas propostas educacionais eram
inovadoras e humanizantes, pois ofereciam um tipo de educação
alternativa aos rígidos sistemas jesuíta e governamental (CÂNONES,
2012, p. 130).
É importante destacar que o documento entende tanto a educação teológica como
a educação secular institucional como agentes de transformação social através da
humanização de pessoas para a promoção de mudanças que cheguem aos sistemas
governamentais. O tema da salvação, recorrente no ambiente eclesial, é apontado pelo
DEIM como “resultado da ação de Deus na História e na vida das pessoas e dos povos.
Biblicamente ela não se limita à ideia da salvação da alma, mas inclui a ação de Deus na
realidade de cada povo e de cada indivíduo”. Desta maneira, a Educação transcende o
ambiente eclesiástico sugerindo que a evangelização, mais que arrolar membresia, deve
libertar o indivíduo na promoção de dignidade da vida. “A salvação é o processo pelo
qual somos libertados por Jesus Cristo para servir a Deus e ao próximo e para participar
da vida plena no Reino de Deus” (Cânones, 2012, p. 133).

O DEIM afirma que todo procedimento pedagógico é respaldado por uma


filosofia, um referencial, e que a Educação Metodista, teológica ou secular, deve ser
referenciada pela fé. “Em nosso caso, a filosofia é iluminada pela fé”. O documento alerta
também que a filosofia presente na sociedade remete a determinados valores:
preocupação individualista e ascensão social; acentuação do espírito de competição;
aceitação do utilitarismo como forma de vida; colocação do lucro como base das relações
econômicas. Contudo, a Educação na perspectiva cristã deve se pautar em outros valores,
afirmando que:

A partir dessas diretrizes a Igreja desenvolverá sua prática educativa, de


tal modo que os indivíduos e os grupos:
- Desenvolvam consciência crítica da realidade;
- Compreendam que o interesse social é mais importante que o
individual;

77
- Exercitem o senso e a prática da justiça e solidariedade;
- Alcancem a sua realização como fruto do esforço comum;
- Tomem consciência de que todos têm direito de participar de modo justo
dos frutos do trabalho;
- reconheçam que, dentro de uma perspectiva cristã, útil é aquilo que tem
valor social (CÂNONES, 2012, p. 136).
A partir desses pressupostos, a Igreja estabelece suas diretrizes para a Educação
Metodista brasileira, ressaltando que:

1 - Toda e qualquer iniciativa educacional da Igreja, especialmente a


organização de novos cursos e projetos, levará sempre em consideração
os objetivos da Missão, de acordo com os documentos oficiais da Igreja
e as necessidades locais;
2 - Quanto aos cursos, currículos e programas já existentes, as agências
da Igreja se empenharão para que, no menor prazo possível, estejam de
acordo com as orientações estabelecidas neste documento;
3 - Será buscado um estreito relacionamento com as comunidades onde
nossos trabalhos estão localizados, compartilhando com elas os seus
problemas;
4 - Em todos os lugares em que a Igreja atua serão colocados à disposição
da comunidade, das organizações de classe e das entidades comunitárias,
as instalações de que dispomos, tanto para a realização de programas,
quanto para a discussão de temas de interesses comunitário, de acordo
com os objetivos da Missão;
5 - As igrejas e instituições devem atuar também através de programas
de educação popular, para isto destinando recursos financeiros
específicos;
6 - Toda a ação educativa da Igreja deverá proporcionar aos participantes
condições para que se libertem das injustiças e males sociais que se
manifestam na organização da sociedade, tais como: a deterioração das
relações na família e entre as pessoas, a deturpação do sexo, o problema
dos menores, dos idosos, dos marginalizados a opressão à mulher, a
prostituição, o racismo, a violência, o êxodo rural resultante do mau uso
da terra e da exploração dos trabalhadores do campo, a usurpação dos
direitos do índio, o problema da ocupação desumanizante do solo urbano
e rural, o problema dos toxicômanos, dos alcoólatras, e outros;
7 - A educação da criança deverá merecer especial atenção, notadamente
na faixa do pré-escolar (de 0 a 6 anos), e de preferência voltada para os
setores mais pobres da população;
8 - Visando à unidade educacional da Igreja em sua missão, as igrejas
locais e instituições se esforçarão no sentido de uma ação conjunta em
seus projetos educacionais;
9 - A Igreja e suas instituições estabelecerão programas destinados à
formação de pessoas capacitadas para todas as tarefas ligadas à ação
educacional e social;
10 - Todas as agências de educação da Igreja Metodista, tanto ao nível
local quanto ao nível de instituição, procurarão orientar os participantes
de seu trabalho sobre as diretrizes ora adotadas, empenhando-se
igualmente para que elas sejam vividas na prática (CÂNONES, 2012, p.
138-140).
E no caso específico da Educação Secular, a Igreja requer que:

78
1 - O ensino formal praticado em nossas instituições não se limitará a
preparar para o mercado de trabalho, mas, além disso, igualmente, deverá
despertar uma percepção crítica dos problemas da sociedade.
2 - As instituições superarão a simples transmissão repetitiva de
conhecimentos, buscando a criação de novas expressões do saber, a partir
da realidade e expectativa do povo.
3 - Terá prioridade a existência de pastorais escolares que atuem como
consciência crítica das instituições, em todos os seus aspectos, exercendo
suas funções profética e sacerdotal dentro e fora delas.
4 - Toda prática das instituições se caracterizará por um contínuo
aperfeiçoamento no sentido de democratizar cada vez mais as decisões.
5 - Os órgãos competentes farão com que estas diretrizes sejam
cumpridas em suas instituições.
6 - As instituições participarão em projetos da Igreja compatíveis com
suas finalidades estatutárias atendendo aos fins da Missão (CÂNONES
2012, p. 141 e 142).
Nossa observação é que a Igreja Metodista, através do DEIM, aponta para um
modelo de Educação efetivamente confessional, que se faz coerente com a teologia
metodista e com a teologia bíblica. Também, estabelece uma ação missionária atenta a
valores culturais e regionais, através de ações relacionadas com as pessoas e sua condição
de vida. Certamente, esse documento, que é o referencial metodista da conduta educativa,
contém o valor necessário para o intento de caracterizar a Educação Metodista
brasileira13.

2.2.1 – As Diretrizes para a Educação como referência das


características das instituições de ensino da Igreja Metodista
brasileira

É importante considerar inicialmente que, segundo os Cânones, ou seja, de acordo


com as leis da Igreja Metodista do Brasil, toda Instituição de Ensino, seja ela de qualquer
nível e grau, é regida pelo DEIM, que deve nortear todos os procedimentos e projetos,
planejamentos e objetivos, atuações e pedagogia. Desta maneira, reiteramos sua

13
O termo “Educação Metodista brasileira” se refere ao complexo de escolas, institutos de ensino superior
e universidades mantidas pela Igreja Metodista do Brasil. Entendemos a importância desta observação já
que a Igreja Metodista, mundialmente, dispõe da mesma forma, de instituições de ensino, sendo o nosso
objeto de análise, somente o contexto brasileiro. Apesar de considerar a terminologia “Educação”
demasiadamente abrangente para se referir às instituições, será utilizada seguindo o tratamento dado pela
própria Igreja em seus documentos ao se referir ao assunto.

79
propriedade como parâmetro documental do nosso interesse, ainda por sua atualidade,
estando vigente, aprovado no último Concílio Geral da Igreja Metodista no Brasil 14.

Como já demonstrado, o DEIM expressa claramente que o modelo de Educação


Metodista no Brasil é regido por lei, instituída, aprovada, aceita e validada por órgão
superior – a Igreja – através de decisão conciliar. Portanto, ela é normatizada, devendo
obediência a uma estrutura e à autoridade superior. Faz parte de hierarquia constada em
organograma, demonstrada através de instâncias de comandantes e comandados a quem
se deve satisfação. É regida por pessoas de quem se requer preparo intelectual para a
composição dos cargos, que devem estar coerentes não somente com as leis orgânicas da
Igreja, mas também com as leis que regulamentam o processo educacional do país. Seus
gestores são remunerados por salários, nomeados ou vinculados por contrato de trabalho
que segue as normas trabalhistas do país. O quadro docente é composto por profissionais
habilitados, academicamente e adequadamente preparados por instituição de ensino
reconhecida pelos órgãos oficiais do governo. O corpo discente obedece a normas,
procedimentos e depende do cumprimento de objetivos específicos, que atendam aos
conteúdos distintos. Os currículos são elaborados segundo fundamentação científica e
conforme orientação acadêmica. Os funcionários, de igual modo, são estabelecidos
segundo um plano de cargos e funções, devendo a cada um corresponder a tarefas
específicas, com remuneração segundo acordo trabalhista obediente às leis instituídas.

Segundo Weber, um modelo burocrático é caracterizado pela existência de


estrutura específica, composta por vínculos entre comandantes e comandados, regido por
estatutos predefinidos, elaborado a partir de cargos e relações de retribuição financeira
por serviços prestados. Da configuração de um organograma hierárquico e funcional em
um determinado segmento caracterizado por especificidades distintas, referentes ao
propósito de uma área de atuação. Em vista disso, verifica-se que a Educação Metodista
secular institucionalizada e, respeitadas as variações, também a Teológica, obedece a um
modelo burocrático, não devendo ser considerada, por ser confessional, como uma
Educação leiga, improvisada ou isenta de preparo intelectual e administrativo. Nossa
primeira conclusão, portanto, é que o tipo puro de Educação Metodista remete a um
arquétipo educacional burocrático, que se estabelece a partir de uma burocracia própria,
demonstrada em processos pedagógicos e organizacionais.

14
19º Concílio Geral

80
Outra evidência demonstrada pelo documento é a de que o modelo educacional
metodista brasileiro é filantrópico, no sentido de entender a educação como um meio de
promoção de igualdade social e de transformação da forma e condição de vida:

3- Será buscado um estreito relacionamento com as comunidades onde


nossos trabalhos estão localizados, compartilhando com elas os seus
problemas;
4 - Em todos os lugares em que a Igreja atua serão colocados à disposição
da comunidade, das organizações de classe e das entidades comunitárias,
as instalações de que dispomos, tanto para a realização de programas,
quanto para a discussão de temas de interesses comunitário, de acordo
com os objetivos da Missão;
5 - As igrejas e instituições devem atuar também através de programas
de educação popular, para isto destinando recursos financeiros
específicos; (CÂNONES, 2012, p. 139).
A citação demonstra que a forma de educação regimentada no DEIM determina o
envolvimento das Instituições Metodistas em demandas populares, desenvolvendo
currículos e procedimentos que contribuam para a melhoria efetiva de vida, não somente
de seus alunos, mas também da sociedade que as cerca, mesmo a dos grupos e
comunidades que estiverem distantes de sua localização geográfica. Com esse propósito
as instituições devem exercer de forma ativa seu papel extensionista, buscando, através
do plano pedagógico uma educação engajada com as carências sociais. “A Igreja e suas
instituições estabelecerão programas destinados à formação de pessoas capacitadas para
todas as tarefas ligadas à ação educacional e social” (Cânones 2012, p. 140).

Lopes (2012) lembra que o envolvimento com as questões sociais pela educação
metodista tem relação com seus mais antigos princípios. Ele observa que antes de haver
uma escola metodista, Wesley15 reiterava o compromisso social como um dever de quem
professasse o cristianismo.

O compromisso com a educação no movimento metodista, pelo fato de


ter surgido num ambiente universitário, não ficou apenas nas reflexões
acadêmicas, pois ‘com relação à perspectiva social e educacional,
Wesley observou com interesse a educação nas comunidades morávias,
especialmente em Hernhut, e a tradição pietista na Universidade de
Halle’. Assim o metodismo compreendeu cedo a importância de
promover a educação como instrumento para a melhoria da qualidade de
vida, tanto do indivíduo quanto da sociedade. (LOPES, 2012, p. 46).
Lopes demonstra que a vocação para o trabalho social está presente no ambiente
educacional metodista desde sua formação.

15
John Wesley, pastor anglicano e professor universitário, considerado o precursor do movimento
metodista que viria a formar a Igreja Metodista.

81
Outro aspecto é que o DEIM estabelece que cada Instituição de Educação
Metodista deve dispor de Pastoral Universitária ou Escolar16 com a finalidade de atuar
com coerência, cumprindo as determinações da Igreja Metodista, a saber: uma atuação
que procure, em todas as suas ações, agir “como consciência crítica [...] em todos os seus
aspectos, exercendo suas funções profética e sacerdotal dentro e fora delas” (Cânones
2012, pg. 141), ou seja, estimulando – em devocionais, em participações nos órgãos
colegiados, em reuniões de direção, formaturas, acolhimento de funcionários ou em cultos
– uma reflexão profunda sobre os valores do Reino de Deus, atenta à diversidade
acadêmica, social e religiosa que esses ambientes contemplam. Também no exercício
pastoral de acompanhamento a pessoas problematizadas por doenças, crises familiares,
que estejam enlutadas ou com dificuldades acadêmicas e econômicas, bem como na
participação de Conselhos internos ou externos ligados aos direitos humanos ou à
promoção da vida:

(...) toda a ação educativa da Igreja deverá proporcionar aos


participantes condições para que se libertem das injustiças e males
sociais que se manifestam na organização da sociedade, tais como: a
deterioração das relações na família e entre as pessoas, a deturpação do
sexo, o problema dos menores, dos idosos, dos marginalizados a
opressão da mulher, a prostituição, o racismo, a violência, o êxodo rural
resultante do mau uso da terra e da exploração dos trabalhadores do
campo, a usurpação dos direitos do índio, o problema da ocupação
desumanizante do solo urbano e rural, o problema dos toxicômanos, dos
alcoólatras (CÂNONES, 2012 p. 139 e 140).
O documento indica que a Pastoral Universitária e Escolar deve exercer uma ação
profética e sacerdotal, de denúncia daquilo que não se enquadra nos valores apregoados
pela Igreja, influenciando a vida comunitária no sentido de tornar a Instituição uma
agência de promoção desses valores, pela convivência ecumênica, espiritualista, sem
proselitismo, preocupada com a dimensão máxima dos valores do cristianismo. Em
virtude disso, ela sugere a harmonia de uma coexistência humanizada e respeitosa entre
a diversidade do ambiente acadêmico e a universalidade da instituição universitária, como
assevera o texto ao enfatizar que “toda a prática das instituições se caracterizará por um
contínuo aperfeiçoamento no sentido de democratizar cada vez mais as decisões”
(Cânones, 2012, p. 142). Portanto, a presença de pastorais escolares sinaliza a da própria
Igreja no ambiente educacional, como simbolismo do carisma religioso. É importante

16
As Pastorais Universitárias e Escolares são formadas por Pastores e Leigos nomeados pela a Igreja
Metodista para atuar nas Instituições de Educação fomentando espiritualidade e consciência crítica.

82
relembrarmos nesse contexto o entendimento de Weber sobre carisma. Ele o considera
além do trâmite organizacional das estruturas formais, relacionado à variedade de
sentidos e formas, não limitado e não dependente da orientação de estatutos e convenções.
Para o autor, é nesse espaço que reside o carisma, na transcendência da estrutura. Esse
apontamento não isenta a importância ou a existência das estruturas, mas localiza um
campo à parte, que está desassociado do poder organizacional. Desta forma, surge um
novo espaço de autoridade, que não se localiza numa estrutura hierárquica ou se adéqua
a uma lógica metódica, tampouco se vincula à retribuição ou pagamento, porém, se
orienta por fatores incomuns, considerados sobrenaturais, à parte, ou além do ambiente
burocrático convencional. Diferentemente da burocracia, o carisma não se norteia por
balizas estáticas, como vínculos, estatutos, obrigações, ordens ou nomeações. Não há,
nesse conceito, a perspectiva burocrática, pois não está referenciado por alguma norma
ou orientação, antes, pauta-se por objetivos puros, segundo uma virtude própria. Seu
critério de avaliação está relacionado ao reconhecimento e aceitação do que diz e faz, e é
caracterizado pela condição de atrair seguidores:

Se o aceitamos, ele é o senhor deles – enquanto souber como manter essa


aceitação, ‘provando-se’. Mas não obtém seu ‘direito’ por vontade dos
seguidores, como numa ‘eleição’, mas acontece o inverso: é o dever
daqueles a quem dirige sua missão reconhecê-lo como seu líder
carismaticamente qualificado (WEBER, 2008, p. 172).
Com isso, a Pastoral pode ser compreendida como ação prática da dimensão
carismática da educação metodista. No entanto, é preciso considerar que no campo da
docência o mesmo fato é possível. Além do espaço burocrático ao qual está submetida, a
atividade do professor, assim como a do sacerdote, transcende a função estrutural da
instituição, tocando a dimensão pessoal, psíquica, emocional a que se refere Weber. Dessa
maneira, é possível compreender que o Tipo Ideal da Educação Metodista no Brasil
sugere uma Educação Carismática.

Outra questão passível de verificação é que o DEIM aponta uma direção


totalmente contrária ao sistema tradicional verificado por Weber. Sua abordagem
vislumbra o rompimento de paradigmas e a superação de modelos estabelecidos. Eles se
referem a um sistema educacional que se lança em direção ao novo e se propõe a
transformar e se transformar. Nesse sentido, Pucci (2003) considera que o PVM, significa
um marco para a história da Igreja metodista e um referencial de rompimento com o
metodismo americano, o que é fortemente demonstrado pelo tom progressista, ligado a
um projeto de comprometimento social:

83
Ao mesmo tempo, Vida e Missão é a afirmação de um compromisso com
os pobres, com os oprimidos, com a igreja local, sob a inspiração
evangélica. Em um grito de liberdade contra os valores capitalistas
dominantes: individualismo; espírito de competição; utilitarismo;
assistencialismo etc. nesse sentido, o documento constitui em uma crítica
persistente e funda ao sistema econômico-político de então, com o
propósito de “denunciar por palavras e pela prática todas as forças e
instrumentos que oprimem e destroem a vida humana”. É a presença da
voz profética no interior da Igreja. Simultaneamente, é a afirmação de
valores outros a serem construídos como realização de uma promessa
primeira presente desde sempre na ideia de Cristianismo: solidariedade,
o poder como serviço, justiça social. Assim diz o documento: “(...)
fazemos uma escolha clara pela vida, manifesta em Jesus Cristo, em
oposição à morte e a todas as forças que a produzem”.
O Vida e Missão expressa, nos inícios dos anos 80, um movimento de
renovação no interior da Igreja Metodista brasileira. Ao contrário dos
movimentos carismáticos e/ou pentecostais, apresenta um caráter
progressista. Configura-se como um indicativo de retorno ao
Cristianismo primitivo, ao início do movimento inovador de John Wesley
no interior da Igreja anglicana e, teologicamente, se assemelha a
movimentos outros, cristãos ou não, que, naquele momento, apontavam
a direção de uma sociedade justa e autônoma. (PUCCI, 2003, p. 36).
Nesse ponto, entendemos necessária a lembrança de que o PVM e o DEIM,
surgem no mesmo contexto, inspirados pelo ambiente descrito por Pucci. Isso comprova
o caráter inovador de um sistema educacional que se propõe ao movimento natural da
vida e da ciência, adequado aos desafios contemporâneos e disposto a percebê-los como
realidade prática da elaboração acadêmica. Pode-se afirmar que:

O “Plano para a Vida e a Missão da Igreja” e as “Diretrizes para a


Educação na Igreja Metodista” são documentos contemporâneos de seu
tempo e, simultaneamente, anacrônicos em seu tempo. Contemporâneos
por que refletem as tensões históricas de um período fecundo e turbulento
e como essas tensões foram oportuna e hegemonicamente canalizadas na
perspectiva de uma mudança radical da educação formal e da própria
sociedade. Os germens de uma profunda transformação educacional e
social estavam presentes e atuantes na militância e nas reflexões de
setores significativos da sociedade. E por isso vieram à tona e
alimentaram teorias e ações utópicas e, ao mesmo tempo, tópicas, de um
momento pleno de graça e de vida. (PUCCI 2003, p. 39).
Para Weber o tipo de autoridade tradicional provém de uma tradição referenciada
pelo reconhecimento de uma “santidade”, no sentido de que o poder é indiscutível. Weber
relaciona este tipo de mando ao regime patriarcal. O autor salienta que esta autoridade
dispõe de um valor simbólico atribuído pela rotinização transformada em normas. Como
afirmamos anteriormente, de acordo com a concepção do tradicionalismo entende-se que
quem manda é o “senhor” e os comandados são servidores. A figura do “senhor” está
embasada numa dignidade própria, chancelada pela tradição e pela fidelidade devida a

84
ela. Diante desta figura “santificada” pela tradição, é inaceitável modificar as normas, já
que estas são atribuídas pelo reconhecimento e pelo direito. O poder, exercido pelo direito
de dignidade pessoal, se pauta pelo critério pessoal e sensitivo do líder. Esse modelo
requer uma constante averiguação moral e ética da tradição e do reconhecimento pessoal
do líder.

Isso nos dá condições de verificar que o tipo puro de Educação Metodista


brasileiro não se refere a um modelo tradicional. Ele não se referencia por uma liderança
única, nem se pauta por qualquer “santidade” pessoal. Da mesma forma, não há
dependência de qualquer tradição ou crivo que remeta a uma autoridade arbitrária
normatizada por critério personalista. Antes, se propõe a uma dinâmica comunitária,
social e comprometida com a dimensão profética da Igreja.

Como afirmamos anteriormente, cada grupo desenvolve características


particulares de conduta. Por isso, é necessário considerar o procedimento de cada grupo
a partir de seus próprios valores, sem a interferência de conceituações particulares.
Segundo o pensamento de Weber, o “tipo ideal”, ou “tipo puro” não é algo que se pode
encontrar facilmente na prática com a mesma perfeição na idealização do grupo que o
elabora. Talvez por esse motivo, Cohn (2003) adverte que o mais importante para a
aplicação da metodologia weberiana é que o pesquisador construa tipos adequados às
situações específicas de sua pesquisa, lembrando que para Weber “não são as qualidades
objetivas de uma realidade já dada que comandam a construção e utilização dos tipos,
mas os interesses específicos do conhecimento, em condições e com pressupostos
também específicos” (Cohn, 2003, p. 204). Ele também adverte que podem ocorrer pelo
menos três equívocos na tentativa de aplicação dos tipos ideais:

(1) supor que apenas um único tipo possa ser construído para cada objeto,
esquecendo-se de que, afinal, o tipo é constitutivo do objeto e de que,
para cada segmento da realidade, tantos tipos podem ser construídos
quantos forem os interesses da pesquisa envolvidos;
(2) operar com um tipo isolado, esquecendo-se de que se trata de
instrumento caracterizador e comparativo útil para formular hipóteses e
de que isso implica operar com pelo menos dois deles, para poder
estabelecer as relações hipotéticas entre fenômenos relevantes para o
caso;
(3) confundir o conceito de tipo com o de modelo, ou seja, tomá-lo como
se fosse um sistema de variáveis que, pela manipulação dos seus valores
quantitativos, permite a simulação das características do objeto real.
(COHN, 2003, p. 204).

85
Cohn destaca também que a análise que opera com premissas weberianas
necessita utilizar o recurso dos “tipos ideais”, por isso nosso exercício de estabelecer um
“tipo puro” de educação metodista brasileira que demonstre seus parâmetros ideológicos
e conceituais. Desta forma, nossa elaboração considera de forma conjunta algumas linhas
mestras como o retrato objetivo da estrutura burocrática do Sistema de ensino metodista
brasileiro que está nos Cânones da Igreja Metodista e regulamenta sistematicamente sua
composição organizacional.

O documento dispõe de um capítulo específico intitulado “Das Instituições” onde


se estabelecem as características gerais, atribuições e responsabilidades em cada nível e
posto. Essa norma institui que toda Instituição de Educação da Igreja é pautada pelo Plano
para a Vida e a Missão da Igreja Metodista, devendo constar de uma Assembleia Geral
que “é o órgão deliberativo superior a constar, na forma da lei civil, no estatuto de cada
Instituição Metodista, com personalidade jurídica, organizada na forma de associação
com fins não econômicos...” (Cânones 2012, p. 339 e 340). E que subordinado a essa
assembleia, deve haver um Conselho Diretor que tem por finalidade reger a instituição
como representante legítimo desta, devendo fazê-lo em conformidade com as diretrizes
da Igreja.

Os Cânones, de igual modo, normatizam a existência da Rede Metodista de


Educação que é constituída a partir das Instituições Metodistas de Ensino. Segundo o
documento, a Rede tem por finalidade oferecer uma educação de boa qualidade com as
marcas da confessionalidade metodista, segundo as leis do país e as Diretrizes para a
Educação da Igreja Metodista. O documento contempla também a existência do
COGEIME – Instituto Metodista de Serviços Educacionais – que planeja, coordena,
supervisiona, integra, apoia, acompanha e controla obrigatoriamente, todas as unidades
da Rede Metodista de Educação, em qualquer nível ou natureza, subordinando-se ao
Concílio Geral. Observa-se também a existência do CONSAD – Conselho Superior de
Administração –, que é o órgão deliberativo do COGEIME e Conselho diretor para a Rede
Metodista de Educação. O CONSAD é composto por doze membros votantes que são
membros professos da Igreja Metodista. Há, ainda, o COESU, órgão colegiado das
Instituições e de assessoramento do CONSAD, composto pelos membros do CONSAD e
pelos diretores gerais e reitores das Instituições Metodistas de Educação. Como
indicamos anteriormente, os Cânones regulamentam o trâmite organizacional,
estabelecendo deveres e direitos dos cargos, responsabilidades, e normatiza os

86
procedimentos legais de cada nível. Demonstra em detalhes a forma e o propósito da
Educação Metodista no Brasil, seu referencial ideológico e regimental. Da mesma forma
que isso ocorre orientando o Ensino Regular, os Cânones regem o Ensino Teológico,
estabelecendo detalhadamente sua maneira e propósito.
Dessa feita, pela constatação de uma estrutura organizada e regimentada por leis
de conduta, direitos e obrigações, consideramos a Educação Metodista Brasileira como
uma instituição burocrática.

Na mesma direção, Weber considera que a ação carismática se verifica por


interações que transcendem a estrutura organizacional de um determinado grupo ou
instituição, não estando sujeita à regulamentação normativa de regra estatutária. Para o
autor, o carisma está além da estrutura burocrática, estabelecida por um ambiente próprio,
sem dependência hierárquica ou a procedimento metódico. Nesse contexto, a Igreja
entende que sua tarefa educativa “se baseia numa filosofia, isto é, numa visão a respeito
do mundo e das pessoas. [...] iluminada pela fé, estando por isso sempre relacionada com
a reflexão teológica à luz da revelação bíblica, em confronto com a realidade” (Cânones,
2012, p. 135). Isso nos esclarece sobre a dimensão supra estrutural do propósito
educacional metodista, que amplia o caráter educativo, propondo-se a “oferecer à pessoa
e à comunidade uma compreensão da vida e da sociedade, comprometida com uma prática
libertadora, recriando a vida e a sociedade segundo o modelo de Jesus Cristo e
questionando os sistemas de dominação e morte à luz do reino de Deus” (Cânones, 2012,
p. 136), ou seja, buscando oferecer formação integral da pessoa que perpassa a dimensão
acadêmica, espiritual e social, devendo ser expressa através da formação de uma
consciência crítica capaz de torná-la um meio de implantação dos valores éticos, na
construção de uma sociedade com mais justiça e igualdade.

Segundo Schützer (2003), as primeiras experiências pastorais em instituições de


ensino se deram com os próprios missionários americanos que se dividiam em tarefas
administrativas, educacionais e pastorais. Nas escolas, sempre foi cultivado o espírito
religioso. “Havia aulas de religião, cultos especiais, e as famosas assembleias, onde se
cantavam hinos, lia-se a Bíblia e ouviam-se sermões. Nos internatos essa presença era
ainda mais marcante, com sua rotina de devocionais, frequência à escola dominical e o
convívio permanente com os missionários” (Schützer, 2003, p. 74). Segundo a
pesquisadora, depois dos missionários, vieram os pastores que acumulavam a tarefa da
direção administrativa e pastoral das escolas, expressa através de aconselhamentos,

87
organização de cultos e pastoreio geral da comunidade. Schützer relata que somente a
partir de uma nova compreensão da missão da Igreja na Educação, surgem os primeiros
grupos de pastores e leigos, organizados para o exercício de uma Pastoral Escolar.

O grande diferencial dessas equipes, era não só o compromisso com as


funções sacerdotais, mas também um envolvimento nas esferas
eminentemente pedagógicas, inicialmente mediado com aproximações
com a orientação educacional, depois por meio da participação em
colegiados administrativo-pedagógicos das escolas. Entre os anos de
1974 e 1978 vão surgindo equipes de pastoral nas instituições maiores,
tanto no Rio Grande do Sul como em São Paulo, Minas Gerais e Rio de
Janeiro. Em algumas escolas as equipes estavam sob a orientação do
bispo da Região Eclesiástica onde se inseria a instituição; em outras
foram formadas a partir de escolhas da direção geral, trabalhando de
maneira mais ou menos independente da Região. Não havia – é bom
lembrar – nenhuma orientação canônica para esta atividade; em cada
escola o grupo vai fazendo um caminho próprio, de acordo com as
circunstancias, prioridade e exigências da comunidade interna e externa
(SCHÜTZER, 2003, p. 74 e 75).
Silva (2007) destaca que o DEIM estabelece como função das Pastorais Escolares:
1) desenvolver consciência crítica; 2) atuar profeticamente; 3) atuar sacerdotalmente; 4)
compreender seu espaço de atuação o ambiente interno e externo da instituição. Para
tanto, o pesquisador entende como tarefa pertinente a ela, promover em sua ação o debate
de uma sociedade mais justa e ética; denunciar toda forma de injustiça; simbolizar em
seus atos o acesso à espiritualidade e gerar no ambiente escolar uma relação entre essa
espiritualidade e a sociedade em geral. Essas considerações têm conformidade com as
linhas gerais, estabelecidas pela Igreja Metodista, para a atuação das Pastorais ao afirmar
que sua missão é:

Fermentar a consciência crítica em todas as áreas da vida institucional;


Fortalecer todas as ações que despertem o sentido da confessionalidade
metodista; Estar presente na construção e avaliação do saber pedagógico,
nos respectivos colegiados decisórios internos e marcar com dimensão
ética do Evangelho todas as atividades e atitudes institucionais (IGREJA
METODISTA, 1993).
Dessa maneira é possível concluir que a Pastoral Escolar procura estabelecer,
dentro das instituições educacionais da Igreja, um carisma religioso expandido que não
se restringe ao ambiente eclesiástico, preso somente aos ritos, tampouco, se resume ao
caráter pedagógico da escola, atuando no estímulo de uma formação cidadã, crítica e, ao
mesmo tempo, comprometida com os valores da religião, na promoção do que o
evangelho indica como Reino de Deus. Desta maneira, o aspecto carismático da educação
se concretiza, seja na transcendência da capacitação técnica ou na deferência simbólica
da conduta mística e religiosa.

88
Contudo, atribuir o caráter carismático da Educação Metodista somente à presença
da Pastoral Escolar em suas instituições de ensino, seria estar desatento a outros fatores
que, igualmente, sinalizam a confessionalidade e simbolizam a Igreja. Podemos ressaltar
que a Igreja se faz presente ao legitimar a autoridade do Reitor, dos Pró-Reitores, dando
base filosófica aos documentos e direcionamentos das Instituições, uma vez que a Política
Acadêmica, seus estatutos e as regras que regem a Educação são baseados nos
documentos eclesiásticos por ela aprovados.

Em outro aspecto, anteriormente, assinalamos que o Sistema Educacional


Metodista representa um modelo de educação humanística com ênfase na questão social,
promovendo direitos humanos e cidadania. Esse apontamento que está documentado no
DEIM encontra embasamento na “teologia” da Igreja, além de dar suporte ideológico
institucional à tarefa educacional das instituições de ensino da Igreja. Da mesma forma,
pelo seu caráter comunitário, reconhecido pelos órgãos oficiais como o Ministério da
Educação e Cultura, as instituições metodistas de ensino cumprem exigências
relacionadas à elaboração e execução de projetos pedagógicos de extensão como forma
de unir pesquisa e prática. No caso de universidades, deve existir a indissociabilidade
entre ensino, pesquisa e extensão. No caso das confessionais, comunitárias e filantrópicas,
a extensão acaba sendo uma das principais características, em função do compromisso
social e responsabilidade em atuar nas comunidades. Mesmo em instituições de ensino
fundamental e básico acontece o incentivo pedagógico por ações de cunho social e
humanista. Em pesquisa realizada via internet17 verificou-se que todas as Instituições
Metodistas de Ensino desenvolvem projetos acadêmicos voltados ao serviço social. Seja
escola, Centro Universitário ou Universidade, cada instituição tem em seu perfil clara
ênfase social. Em termos documentais, ou seja, a partir de informações oficiais publicadas
nos sites de cada instituição, consideramos mais consistente a política de extensão da
Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP que oferece em sua página virtual18,
no apêndice da Assessoria de Extensão e Assuntos Comunitários seis documentos
relativos ao tema, a saber: 1) “O processo de construção da Política de Extensão da
UNIMEP”; 2) “A Extensão como Mediadora da relação Universidade de Sociedade”; 3)
“A Extensão no Contexto das Universidades Públicas e Particulares”; 4) “A Trajetória da

17
Em 12 e 13.03.2014
18
www.unimep.br

89
Extensão na UNIMEP”; 5) “A Extensão como Elemento Constitutivo da Política
Acadêmica”; 6) “Perspectiva da Extensão na UNIMEP”.

O texto “Perspectiva da Extensão na UNIMEP”19 sugere que uma das tarefas da


extensão seria a de legitimar a universidade perante a sociedade, contudo, considera que
a construção dessa tarefa simboliza o contrário, ou seja, o reconhecimento do
distanciamento entre ensino e extensão. Com essa preocupação, no documento se afirma
que isso incentiva os
(...) docentes a pensarem e a praticarem a extensão como atividade
acadêmica e pedagógica, isto é, como um momento do processo de
construção do conhecimento. Nesse momento, docentes e discentes
entram em contato direto com a realidade, independentemente de seus
matizes, buscando explicá-la sob a ótica da ciência e transformá-la sob a
ótica política. Na interação com a realidade, os docentes e discentes
encontram a matéria-prima para suas pesquisas e podem efetivar, nesta
relação, a socialização do conhecimento científico e técnico que
traduzam a cultura de gerações, a qual a universidade deve preservar e
socializar (UNIMEP, 1995).
Essa referência imprime uma ação pragmática à extensão, que faça relacionar a
teoria e a prática, a pesquisa e a necessidade social. Dessa maneira, o documento relata
que o tema ganhou, ao longo de sua elaboração, repercussão nacional sendo objeto de
discussão no Fórum Nacional dos Pró-Reitores de Extensão que estabeleceu um perfil do
que seja extensão, ao pontuar que ela deve:

1. Articular o ensino e a pesquisa com as demandas da sociedade,


buscando o compromisso da comunidade universitária com interesses e
necessidades da sociedade organizada, em todos os níveis (sindicatos,
órgãos públicos, empresas, categorias profissionais, organizações
populares e outros organismos).
2. Estabelecer mecanismos de integração entre o saber acadêmico e o
saber popular, visando uma produção de conhecimento resultante do
confronto com a realidade, com permanente interação entre teoria e
prática.
3. Democratizar o conhecimento acadêmico e a participação efetiva da
sociedade na vida da universidade.
4. Incentivar a prática acadêmica que contribua para o desenvolvimento
da consciência social e política, formando profissionais-cidadãos.
5. Participar criticamente das propostas que visem o desenvolvimento
regional, econômico, social e cultural.
6. Contribuir para reformulações nas concepções e práticas curriculares.
7. Favorecer a reformulação do conceito de “sala de aula”, que deixa de
ser o lugar privilegiado para o ato de aprender, adquirindo uma estrutura
ágil e dinâmica, caracterizada pela interação recíproca de professores,

19
http://www.unimep.br/viceacad/assessorias/extensao/politicaext/6perspec.html , Conselho de Extensão e
Pesquisa e Conselho Universitário. UNIMEP, novembro de 1995.

90
alunos e sociedade, ocorrendo em qualquer espaço e momento, dentro e
fora dos muros da universidade (UNIMEP, 1995).

Certamente esse documento não contempla a particularidade de todas as


Instituições Metodistas de Ensino e, apesar de relatar a experiência de uma única
Instituição, consideramos que a UNIMEP, por sua história e tradição, dentro e fora do
contexto confessional metodista, é capaz de sintetizar a prática do princípio confessional
requerido pela Igreja, seja através das “DEIM”, “Plano de Vida e Missão” ou do “Credo
Social da Igreja Metodista”, documentos analisados neste trabalho. Da mesma forma,
consideramos adequado salientar que, a partir dos documentos oficiais da Igreja, as
Instituições de Ensino devem ser agências de promoção humana, voltadas às questões
humanitárias e de direitos humanos. A partir disso, concluímos que outra característica
das instituições metodistas de ensino remonta a uma ação educacional voltada às questões
sociais.

91
CAPÍTULO 3
A relação entre a Igreja Metodista e suas instituições de
ensino: Uma leitura por meio dos tipos puros de dominação
legítima

Neste capítulo iremos desenvolver o principal objetivo deste trabalho, ou seja,


analisar as características da Educação e da Igreja Metodista através dos três tipos puros
de dominação legítima elencados por Weber, a saber: legal, tradicional e carismática. Para
tanto temos como pressuposto indispensável à compreensão de alguns conceitos
weberianos, como “dominação” e “legitimidade”, bem como o aprofundamento das
concepções de dominação legal, tradicional e carismática. Isso posto, passaremos a
analisar os procedimentos educacionais e eclesiásticos a partir desses conceitos,
procurando identificar quais são os tipos de dominação próprios de a cada área analisada.
Desta forma, nosso intuito será o de estabelecer quais são as interações possíveis dentro
da distinção de cada instituição, bem como de compreender pontos facilitadores e
complicadores dessa relação.

Ao definir “dominação”, o autor estabelece um comparativo entre “poder” e


“dominação”. Para ele, “poder” é a possibilidade de uma determinada pessoa ou condição
impor suas ideias e pretensões sobre outrem, mesmo que haja resistência. “Dominação”
se refere à “probabilidade de encontrar obediência a uma ordem de determinado conteúdo,
entre determinadas pessoas indicáveis” (Weber, 1991, p. 33). Weber, com isso, entende
que enquanto o “poder” em certos casos representa uma atitude absolutista e arbitrária,
respaldada por imposição e até violência, a “dominação” remete à obediência, quase
voluntária, não somente a uma pessoa, mas também às ordens e procedimentos que sejam
estabelecidos ou acordados segundo uma compreensão ou conscientização. Há de se
esclarecer que nem sempre a “dominação” poderá ser considerada como manifestação
voluntária, por ser tênue e complexa a percepção de dominação com caráter emocional
ou psíquico, como veremos à frente, no caso das dominações religiosas.

Weber salienta que a “dominação” pode ser referenciada pela estrutura


administrativa, porém, não necessariamente. Para ele, “temos uma associação de
dominação na medida em que seus membros, como tais, estejam submetidos a relações

92
de dominação, em virtude da ordem vigente” (Weber, 1991, p. 33), ou seja, não é o quadro
burocrático por si mesmo que caracteriza a ocorrência da “dominação”, mas a existência
de uma ordem à qual haja obediência:

O pai de família domina sem quadro administrativo. O chefe beduíno,


que levanta contribuições junto às caravanas, pessoas e bens que passam
por sua fortaleza nas rochas, domina todas aquelas pessoas diversas e
indeterminadas que não formam associação alguma, apoiando-se em seu
séquito, que, dado o caso, lhe serve como quadro administrativo para
impor-se coativamente. (teoricamente imaginável seria também
semelhante dominação por parte do um indivíduo desprovido de quadro
administrativo) (WEBER, 1991, p. 33).
Dessa maneira, fica clara a concepção de que o vínculo característico da
“dominação” se concentra na existência de obediência a uma ordem ou pessoa, ou
pessoas. Nesse ponto, é possível observar que tanto a Igreja quando a instituição
educacional são regidas por quadros de “dominação”, uma vez que, em ambos os casos,
existem ordens demonstradas em estatutos, normas e regimentos que estabelecem uma
“lei” a ser seguida. Também, que a obediência a essas normas garante a manutenção dos
vínculos de pertença. O que distingue, no entanto, uma “dominação” de outra é o
princípio pelo qual ela se dá. Weber esclarece:

A uma associação de dominação denominamos associação política,


quando e na medida em que sua subsistência e a vigência de suas ordens,
dentro de determinado território geográfico, estejam garantidas de modo
contínuo mediante ameaça e a aplicação de coação física por parte do
quadro administrativo. Uma empresa com caráter de instituição política
denominamos Estado, quando e na medida em que seu quadro
administrativo reivindica com êxito o monopólio legítimo da coação
física para realizar ordens vigentes. Uma ação social, e especialmente a
de uma associação, é “politicamente orientada”, quando e na medida em
que tenha por fim a influência da direção de uma associação política,
particularmente a apropriação ou expropriação, a nova distribuição ou
atribuição de poderes governamentais [de forma não violenta].
Uma associação de dominação denomina-se associação hierocrática
quando e na medida em que se aplique coação psíquica, concedendo-se
ou recusando-se bens de salvação (coação hierocrática). Uma empresa
hierocrática com caráter de instituição é denominada igreja quando e na
medida em que seu quadro administrativo pretenda para si o monopólio
da legítima coação hierocrática (WEBER, 1991, p. 34).
Em virtude disso é possível estabelecer que a instituição religiosa, igreja, se
distingue da instituição educacional, escola, pelo que denominamos anteriormente de
princípio, ou seja, pela sua forma de “dominação”. Mesmo havendo na Igreja uma
estrutura administrativa burocrática, como foi descrito no capítulo anterior, sua
característica mais clara de “dominação” está pautada no que Weber chama de coação

93
hierocrática20, ou seja, a partir de critérios e comportamentos místicos ligados à
espiritualidade e à transcendência. Desta forma, a “dominação” eclesiástica contém duplo
poder, o institucional, que se refere às normas de conduta estabelecidas nos códigos de
ética e moral e o da obediência espiritual, como referência de submissão ao próprio Deus:

De acordo com a tendência normal da instituição eclesiástica, esta se


caracteriza por dominação territorial hierocrática e articulação territorial
(em paróquias), sendo uma questão de cada caso particular a de quais
sejam os meios adequados para dar força a essa pretensão de monopólio.
Mas historicamente o monopólio de dominação territorial não foi tão
essencial para a Igreja quanto para a associação política, e hoje o é muito
menos ainda. O caráter de “instituição” e especialmente a circunstância
de que já se “nasce” dentro de uma Igreja a distingue da “seita”, cuja
característica consiste em ser uma “união” e em só aceitar como membros
os religiosamente qualificados que pessoalmente se associam (WEBER,
1991, p. 35).
A instituição educacional, por sua vez, igualmente está submetida à obediência e,
portanto, a um regime de “dominação”, contudo, essa obediência não se vincula a uma
situação ou pessoa, mas a estatutos e normas que são regimentados e, particularmente no
caso das instituições metodistas de ensino, através de participação coletiva, representadas
na estrutura de órgãos colegiados. Essa participação comunitária dá à estrutura um caráter
de que a conduta e os procedimentos devam ser obedecidos a partir de um consenso lógico
e de critérios distintos e próprios inerentes ao ambiente acadêmico. Contrapondo o
princípio da organização eclesiástica, nas instituições metodistas de ensino as discussões
sobre o que seja adequado partem de um critério técnico, pautado por referenciais
científicos e pedagógicos. Não há, portanto, como na Igreja, menção a uma única pessoa,
um único líder, mas a um colegiado, em que membros de igual valor se reúnem e decidem
sobre as conveniências da instituição. Mesmo diante de uma hierarquia que remeta à
figura de um líder, a burocracia acadêmica respeita a participação coletiva, sendo o líder
responsável pela presidência das reuniões e execução das decisões, como um facilitador
e executor da vontade colegiada. Na Igreja, mesmo havendo concílios que efetivem
legalmente as decisões institucionais, paira o prisma da mística e da espiritualidade que é
sempre expressa pela figura e palavra do líder. Essa é a expressão mais evidente da

20
Hierocracia: governo dos sacerdotes ou a sua influência nos negócios do Estado.
hierocracia In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2014. [Consult. 2014-06-03].
http://www.infopedia.pt/lingua-portuguesa/hierocracia;jsessionid=rmYi-
NZ0OCvYb4KBtYIo4w__>. Consulta realizada em 03.06.2014 09h10.

94
coação hierocrática denominada por Weber. A vontade do líder ganha status de vontade
divina na medida em que ele é quem, supostamente, tem a representação de Deus, por
isso, a vontade do líder é sempre observada, aceita e preferida. A dominação mística
caminha lado a lado com a dominação burocrática e administrativa.

Essas observações iniciais são importantes para a análise de ambas as instituições,


já que o domínio da transcendência estará sempre presente nas demandas da Igreja, o que,
de certa maneira, relativiza o valor da estrutura organizacional. Em contrapartida, o
caráter pragmático referenciará fortemente o ambiente acadêmico, nada mais do que a
relação dicotômica entre fé e ciência. Para ilustrar esta ideia, Boaventura se refere à
“natureza” de cada segmento, afirmando que:

A Igreja por sua natureza é o templo da fé, da convicção, da certeza, do


respeito aos fundamentos em sua essência tomados como imutáveis e
estáticos. Dela duvidar é fraqueza intolerável, por isso ela descansa na
afirmação “conhecereis a verdade e ela vos libertará”.
Em contraposição, para a universidade a dúvida é virtude, qualidade
imprescindível do seu existir; a verdadeira teoria só pode ser aceita se
tomada como desagradável e capaz de ser controvertida, posta em
questão e testada em seus pressupostos. Portanto, a universidade é o
templo da dúvida (BOAVENTURA, 2010, p. 37).
Outra questão levantada por Weber e significativa para nossa elaboração se refere
à legitimidade. O autor entende que, mesmo diante do interesse, os processos de
dominação não se sustentam, ou seja, não encontram um subsídio de obediência
satisfatório sem que haja uma “crença” na legitimidade do líder. A partir disso, ele afirma
que:

Nem toda “pretensão” convencional ou juridicamente garantida pode ser


chamada “relação de dominação”. De outro modo, o trabalhador, na
proporção de sua pretensão salarial, seria “senhor” do empregador, já que
a seu pedido pode ser-lhe posto à disposição em executor de medidas
judiciais. Na verdade, formalmente, ele é, em relação ao outro, parceiro
numa troca, com “direito” a receber determinadas prestações. No
entanto, o conceito de relação de dominação não exclui a possibilidade
de esta ter surgido em virtude de um contrato formalmente livre: assim,
a dominação do patrão sobre o trabalhador, que se manifesta nos
regulamentos e instruções de trabalho, ou do senhor sobre o vassalo, que
entra voluntariamente na relação feudal (WEBER, 1991, p. 140).
Para o sociólogo a legitimidade deve ser, em todos os casos, considerada como
uma possibilidade, já que nem toda obediência a uma determinada dominação pode estar
relacionada à dignidade concreta, ou seja, a uma sincera “crença” no líder:

A obediência de um indivíduo ou de grupos inteiros pode ser dissimulada


por uma questão de oportunidade, exercida na prática por interesse
material próprio ou aceita como inevitável por fraqueza e desamparo

95
individuais. Mas isso não é decisivo para identificar uma dominação [...]
“Obediência significa, para nós, que a ação de quem obedece ocorre
substancialmente como se este tivesse feito do conteúdo da ordem e em
nome dela a máxima de sua conduta, e isso unicamente em virtude da
relação formal de obediência, sem tomar em consideração a opinião
própria sobre o valor ou desvalor da ordem como tal (WEBER, 1991, p.
140).
Diante disso, a análise dos processos ligados à Igreja deverá contemplar uma
realidade de legitimidade com diversos desdobramentos, como legitimidade tradicional,
legitimidade carismática e, de maneira mais distante, a legitimidade racional, como
veremos à frente. Essa compreensão trará implicações significativas, uma vez que no
contexto eclesiástico nem sempre a legitimidade se referenciará por construções
racionais, relacionadas a interesses materiais ou elaboradas através da lógica racional. A
legitimidade nesse caso poderá estar ligada à representação simbólica e tradicional do
líder, isenta de relação histórica de sua pessoa com a comunidade, através de uma
aceitação mística da representatividade do caráter divino. Isso se relaciona, de maneira
próxima com as implicações do caráter carismático, transcendente e venerado pela Igreja.

A legitimidade da Igreja está relacionada em maior grau com a mistificação do


posto, mais do que com a pessoa que o ocupa. Nesse sentido é oportuno lembrar a
compreensão de Weber sobre obediência na absorção de qualquer ordem ou regra na
“máxima de sua conduta” pessoal, sem com isso expressar crítica que avalie de maneira
racional a ordem ou a lei. Percebe-se, portanto que a legitimidade na Igreja acontece, em
certos casos, sem crítica, baseada somente na espiritualização de processos e ações e na
piedade como uma conduta obediente à ordem estabelecida. Há de se considerar ainda a
dimensão do interesse na estrutura eclesiástica que pode facilitar a ocorrência de
obediência dissimulada, como afirma o autor, que não é crítica nem obediente por não se
pautar pelo caráter da legitimidade do líder, mas pelo que a fidelidade à sua dominação
pode resultar, ou seja, obtenção de bênçãos e favores divinos.

De outra maneira, o sistema educacional21 processa a legitimidade por meios


burocráticos. Mesmo que haja carisma capaz de dar ao líder maior validade, ele não
garantirá, por si só, a manutenção do posto. Os procedimentos educacionais estarão
voltados a uma ordem legal, estabelecida em estatutos e regras, portarias e determinações.
Da mesma maneira, o sistema educacional requer determinado currículo com preparo

21
A referência ao “sistema educacional” diz respeito ao ambiente acadêmico secular, caracterizado neste
trabalho pelas Instituições Metodistas de Ensino.

96
acadêmico comprovado e reconhecido que valide a condição de liderança. Não é mérito
pessoal somente, tampouco condição de conquistar obediência ao mando, mas de
comprovar merecimento intelectual reconhecido, através de documentos e registros. Em
dado momento é possível reconhecer certo valor tradicional, caso se possa admitir algum
nível de “crença na virtude de uma tradição” que postula ao preparo acadêmico condições
para ocupação da liderança. Dessa forma, assim como a Igreja idealiza a ocupação do
cargo, por si mesmo, como pressuposto de legitimidade, será possível compreender que
o sistema educacional conceberá, igualmente, que o preparo acadêmico é capaz de validar
a legitimidade do líder.

No entanto, mais evidente nesse contexto, a legitimidade nas instituições de


ensino se dará por processo legal, dependente, portanto, da chancela racional e
burocrática de uma estrutura que reconhecerá a capacitação específica para a ocupação
de cada função.

3.1 - Tipos de dominação legítima

Como já apresentado anteriormente, Weber idealiza a validade da legitimidade


expressa em três tipos de caráter: racional, tradicional e carismático. É necessário
perceber que ele não pretende qualificar um “tipo ideal” de dominação, mas admitir que
a legitimação acontece através de vínculos específicos e restritos a cada tipo próprio. Isso
sinaliza a existência de tipos adequados de legitimação que convalidam a dominação de
determinada estrutura. Em nosso caso é importante essa verificação, sobretudo, pelo
interesse de estabelecer os vínculos e as distinções entre tipos particulares de domínio,
eclesiástico e educacional. Com isso, mais necessário será captar com profundidade a
definição de cada um dos três tipos.

Para Weber, o caráter racional da legitimidade é constatado quando há uma


crença de que há determinada autenticidade na ordem estabelecida, ou seja, há valor e
reconhecimento de certa coerência e amparo ético, moral, com a estrutura e o contexto
em que esta se impõe, de forma racional, reflexiva e lógica. O autor baseia essa
constatação no modelo moderno que, segundo ele, é tecido por uma teia de “ideias”, a
saber:

97
1. que todo direito, mediante pacto ou imposição, pode ser estatuído de
modo racional – racional referente a fins ou racional referente a valores
(ou ambas as coisas) – com a pretensão de ser respeitado pelo menos
pelos membros da associação, mas também, em regra, por pessoas que,
dentro do âmbito de poder desta (em caso de associações territoriais:
dentro do território), realizem ações sociais ou entrem em determinadas
relações sociais, declaradas relevantes pela ordem da associação;
2. que todo direito é, segundo sua essência, um cosmos de regras
abstratas, normalmente estatuídas com determinadas intenções; que a
judicatura é a aplicação dessas regras ao caso particular e que a
administração é o cuidado racional de interesses previstos pelas ordens
da associação, dentro dos limites das normas jurídicas e segundo
princípios indicáveis de forma geral, os quais encontra aprovação ou pelo
menos não são desaprovados nas ordens da associação;
3. que, portanto, o senhor legal típico o “superior”, enquanto ordena e,
como isso, manda, obedece por sua parte à ordem impessoal pela qual
orienta suas disposições;
4. que – como se costuma expressá-lo – quem obedece só o faz como
membro da associação e só obedece “ao direito”;
5. que se aplica, em correspondência com o tópico 3, a ideia de que os
membros da associação, ao obedecerem ao senhor, não o fazem à pessoa
deste mas, sim, àquelas ordens impessoais e que, por isso, só estão
obrigados à obediência dentro da competência objetiva, racionalmente
limitada, que lhe foi atribuída por essas ordens. (WEBER, 1991, p. 141).
Nessas bases, Weber delimita o caráter da relação regida e legitimada por vínculos
legais, representada por uma atividade de atitude constante, regida por normas e regras
delimitadas numa “competência” específica, onde os serviços e obrigações são
desempenhados a partir de uma obrigatoriedade, através da designação de “poderes de
mando”. É esse tipo de autoridade que o autor relaciona as estruturas de mando de
instituições privadas, partidos, exército, Estado e, até mesmo a Igreja. O vínculo peculiar
dessa legitimidade é a instituição, regida, segundo o autor, pelo princípio da hierarquia
oficial:

O princípio da hierarquia oficial, isto é, de organização de instâncias


fixas de controle e supervisão para cada autoridade institucional, com o
direito de apelação ou reclamação das subordinadas às superiores.
Regula-se de forma diversa a questão de se e quando a própria instância
de reclamação repõe a disposição a ser alterada por outra “correta” ou dá
as respectivas instruções à instância subordinada à qual se refere a
reclamação (WEBER, 1991, p. 143).
A respeito dessas instâncias, Weber salienta que podem ser de cunho técnico ou
organizacional, portanto, requerem tanto do chefe quanto do funcionário, qualificação
particular para fazerem parte de um determinado quadro administrativo determinado. O
preparo técnico ou especializado é que viabiliza a admissão ou a permanência do
empregado.

98
Abrindo um parêntese para analisar as estruturas da Igreja Metodista e de suas
instituições de ensino, pode-se verificar que, de maneira geral, ambas sugerem em sua
organização o caráter legal como estilo administrativo, uma vez que o poder da norma
instituída dá legalidade tanto à autoridade como à subordinação. Assim como pontua
Weber, a existência de instâncias de regulação determina o poder e a funcionalidade do
cargo que é sujeito a regulamentos balizadores de conduta, responsabilidades e direitos
inerentes a cada função. Nos dois casos pode-se observar a ocorrência destas instâncias
que simbolizam a hierarquia oficial soberana, que norteia a instituição sem necessária
representação pessoal, já que a norma, por si mesma, convenciona as ações e limites de
cada tarefa. No entanto, numa apreciação mais específica, poderá se observar que as
altercações entre Igreja e instituições de ensino se darão não somente pela constatação de
evidência ou ausência de determinado caráter, mas pela intensidade com que este ou
aquele influencia cada estrutura. Portanto, isso se mostrará com mais clareza à medida
que avançarmos nas conceituações do autor em contraposição com às estruturas
consideradas.

Voltando à análise, é necessário entender que Weber adota um tipo puro de


dominação legal para comprovar com mais nitidez o desdobramento prático dessa
legitimidade. Para ele, esse tipo puro se mostra através do modelo administrativo
burocrático. Neste arquétipo, como já mencionado, existe a figura de um dirigente, que
ocupa a posição de “senhor” através de processos administrativos legais como
assimilação mercantil, eleição ou sucessão. Contudo, esse “senhorio” é regido por
competências legais, previstas em normas vigentes de regulação. O funcionário, por sua
vez, obedece a obrigações objetivas, voltadas à execução de seu posto, podendo ser
nomeado, no contexto de uma hierarquia, a partir de “competências funcionais fixas”,
estabelecidas em contrato. Da mesma forma, a escolha desse funcionário não é isenta de
normas, mas a partir da comprovação de qualificação especial. Weber salienta que na
administração burocrática, uma evidência clara da dominação racional é a exigência de
prova escrita para a comprovação da qualificação requerida. A remuneração é feita por
salários fixos, escalonados segundo o nível hierárquico de função, com previsão de
aposentadoria. Nesse sentido, ele entende que:

O desenvolvimento de formas de associação “modernas” em todas as


áreas (Estado, Igreja, exército, partido, empresa econômica, associação
de interessados, união, fundação e o que mais seja) é pura e simplesmente
o mesmo que o desenvolvimento e crescimento contínuos da
administração burocrática: o desenvolvimento desta constitui, por

99
exemplo, a célula germinativa do moderno Estado ocidental. Que
ninguém se deixe enganar, nem por um momento, por quaisquer
instâncias aparentemente contrárias, sejam estas representações
colegiadas de interessados ou comissões parlamentares ou “ditaduras de
comissários” ou funcionários honoríficos ou juízes leigos (ou até
resmungos contra “São Burocrácio”), ao fato de que todo trabalho
continuo dos funcionários realiza-se em escritórios. Toda nossa vida
cotidiana está encaixada nesse quadro. Pois uma vez que a administração
burocrática é por toda parte – ceteris paribus – a mais racional do ponto
de vista técnico-formal (de pessoas ou objetos) (WEBER, 1991, p 146).
Essa observação demonstra que em qualquer nível, forma e estrutura, a
sociedade moderna é influenciada pelo tipo de dominação burocrática, uma vez que se
estabelece quase que totalmente, através da formalização de instituições, elaboradas
através de hierarquias dispostas por cargos exercidos a partir de habilitação específica.
Essa característica social influencia de maneira intensa, qualquer organização moderna.
Portanto, o cumprimento dessa solicitação significa, de maneira clara, que a legitimação
de qualquer dominação contemporânea deverá se pautar pelo caráter legal, mesmo que
em algum grau os outros tipos de caráter possam ter algum grau de validade sobre ela.

Assim, com maior ou menor influência – o que veremos posteriormente – tanto o


sistema educacional quanto a Igreja reconhecem o caráter legal da dominação em sua
estrutura administrativa. Nas instituições de ensino, de maneira evidente, os vínculos de
dominação estão voltados à administração burocrática, isso já evidenciado por Weber ao
afirmar que o professor moderno “depende do diretor do instituto tanto quanto o
empregado de uma fábrica depende de seu patrão – já que o diretor do instituto pensa,
com total boa-fé, que aquele é seu instituto. Daí que dirige-o a seu bel prazer” (Weber,
2001, p. 28), o que caracteriza o aspecto burocrático, transformando, de certa maneira,
professor em operário, escola em empresa, ensino em comércio. De outra forma, ele
reforça a afinidade entre esse caráter e o sistema educacional ao dizer que:

Administração burocrática significa: dominação em virtude do


conhecimento; este é seu caráter fundamental especificamente racional.
Além da posição de formidável poder devida ao conhecimento
profissional, a burocracia (ou o senhor que dela se serve) tem a tendência
de fortalecê-la ainda mais pelo saber prático de serviço: o conhecimento
de fatos adquirido na execução das tarefas ou obtido via “documentação”.
O conceito (não só, mas especificamente) burocrático do “segredo
oficial” – comparável em sua relação ao conhecimento profissional, aos
segredos das empresas comerciais no que concerne aos técnicos – provém
dessa pretensão de poder (WEBER, 1991, p. 147).
A relação das instituições de ensino com a administração burocrática e legal
acontece não somente pela adoção do modelo em sua própria rotina, mas também na

100
promoção de conhecimento, que é produto básico para a formação profissional técnica,
potencializando a valorização do preparo acadêmico como pressuposto de legitimidade
para a ocupação de cargos e exercício de poder. As instituições de ensino atribuem ao
conhecimento a legitimidade do domínio para si mesmas e para a sociedade. Esse
reconhecimento é esperado, uma vez que para ela o conhecimento é o substrato de
capacitação e produtividade. Conforme verificado no capítulo anterior, as instituições
metodistas de ensino, como parte do sistema educacional secular, conferem legitimidade
nos processos de dominação legal. Por serem instituídas e administradas através de
normas e procedimentos pautados em contratos e regimentos, elas não somente requerem
legitimidade de domínio pela capacitação técnica profissional de seus executivos,
funcionários e professores, como em seus documentos institucionais, que oficializam o
que Weber chama de hierarquia oficial, ao estabelecer critérios administrativos
burocráticos legais em suas relações internas e, da mesma forma, nas relações com outras
instituições, estatais ou eclesiásticas.

Como vimos, os documentos oficiais da Igreja Metodista que balizam suas


instituições de ensino são claros quanto às regras de convivência institucional, bem como
com as solicitações acadêmicas e políticas22 daqueles que as dirigirão. Segundo os
documentos balizadores da Igreja, o sistema metodista de educação vê, na disseminação
do conhecimento e do preparo intelectual, a tarefa de legitimar pessoas para o bom
desempenho profissional, capacitando-as para tornarem-se agentes de construção de
cidadania e promotoras de uma sociedade mais justa.

É necessário perceber que a caracterização da dominação burocrática não se


baseia somente em sua relação com o conhecimento. Weber amplia seu significado ao
observar que ela, geralmente, manifesta:

1. a tendência ao nivelamento no interesse da possibilidade de


recrutamento universal a partir dos profissionalmente mais
qualificados;
2. a tendência à plutocratização no interesse de um processo muito
extenso de qualificação profissional (frequentemente quase até o fim
da terceira década da vida);
3. a dominação da impessoalidade formalista: sine ira et studio, sem
ódio e paixão, e, portanto, sem “amor” e “entusiasmo”, sob a pressão
de simples conceitos de dever sem considerações pessoais, de modo

22
Denominamos aqui solicitações políticas o fato de que para alguns cargos de gestão das Instituições
Metodistas de Ensino, como direção, reitoria, pró-reitoria, é necessário estar arrolado como membro da
Igreja Metodista no Brasil. Em nosso entendimento, essa exigência se refere a uma política da Igreja que
adentra as políticas internas de suas Instituições de Ensino.

101
formalmente igual para “cada qual”, isto é, cada qual dos interessados
que efetivamente se encontram em situação igual – é assim que o
funcionário ideal exerce seu cargo (WEBER, 1991, p.147).
Desta forma, o caráter burocrático remete ao preparo acadêmico e à formação
profissional um elemento importante na organização social e mesmo no estilo de conduta
pessoal. Em certa medida, uma estrutura de formação acadêmica seguirá o prisma da
impessoalidade formalista orientada pelo dever e requerida na formação profissional,
como assevera Weber. Portanto, nas instituições de ensino da Igreja Metodista,
resguardada a dimensão confessional, não se fará de maneira diferente, uma vez que isso
acontece de modo histórico no sistema educacional instituído.

A instituição Igreja Metodista se relaciona com esses conceitos, de maneira


próxima à estrutura de suas instituições de ensino, ou seja, é possível constatar em sua
organização documental direcionamentos que evidenciam o caráter racional de
legitimação. Em primeira instância, a Igreja dispõe daquilo que Weber considera como
crença na ordem instituída. Isso se dá através do reconhecimento de normas estatuídas
em seus concílios e câmaras, o que é demonstrado, como já afirmamos, pela existência
de um código máximo de referência legal, os Cânones, além de estatutos que referenciam
cada região e distrito eclesiástico. A própria maneira de organização da Igreja, que é
organizada por cargos e representações distintas, demonstra o caráter dessa crença.
Portanto, a obediência à ordem estabelecida se concretiza de forma natural e respeitosa,
não havendo possibilidade documental de rompimento com esta ordem. A Igreja
Metodista é gerida por um organograma pormenorizado que estabelece competências e
deveres de cada órgão e cargo. Desta forma, ela, além de sinalizar, obediência à ordem
estabelecida, demonstra o que Weber denomina de hierarquia oficial, ou seja, a
existência de um domínio que não está contido na figura de um cargo ou pessoa, mas no
contexto de procedimentos institucionais, normatizados em lei, acima de vontade ou
parecer pessoal, ou de um grupo distinto. A instituição Igreja, em si mesma, através de
órgãos decisórios e representativos, estabelece as regras e a legitimidade do domínio que
deve ser reconhecido e respeitado. Dessa maneira a obediência não é devida a uma
pessoa, de forma restrita, mas a um conjunto de normas compostas pela
representatividade dos membros. O líder, em si mesmo, não tem legitimidade própria e
satisfatória para dominar, devendo, assim como os demais, obediência à regra, que
representa a vontade oficial.

102
É necessário abrir novo parêntese para esclarecer que no caso de uma Igreja o
caráter da legitimidade não pode ser considerado estável e único, uma vez que sobre ela
incidem outras formas de legitimidade, como veremos à frente, em maior ou menor grau.
É possível estabelecer que no caso específico da Igreja Metodista, o caráter da
legitimidade legal, pela característica de sua organização e cuidado documental, ocorre
de maneira substancial, mas não de forma exclusiva.

Weber também elenca a valorização do conhecimento e do preparo profissional


como uma das características da legitimidade legal, o que pode ser observado de maneira
significativa no contexto da Igreja Metodista. Conforme afirmação anterior, o preparo
acadêmico figura como um pressuposto importante para a composição do quadro
administrativo e pastoral da Igreja. Em órgãos burocráticos clérigos, ou seja, que figuram
no contexto interno da gestão da Igreja, como comissões de Justiça e Administração, são
estabelecidos por decisão conciliar determinados percentuais de profissionais
academicamente habilitados para sua composição, como advogados, administradores e
contabilistas. Da mesma maneira, na formação do quadro de clérigos, é exigida
capacitação acadêmica regular, avaliada por órgãos oficiais de educação em Instituições
de Ensino devidamente reconhecidas. Os Cânones estabelecem que:

Art. 26. O padrão de formação profissional estabelecido para o ingresso


na Ordem Presbiteral exige, do /a candidato/a, a graduação de Bacharel
em Teologia ou graduação no Curso Teológico Pastoral, prioritariamente
obtida em instituição da Igreja Metodista, credenciada pela CONET.
§ 1º. Para ingressar no Curso de Bacharel em Teologia, programa de
formação de Presbítero/a, é indispensável que o/a candidato/a seja
membro da Igreja Metodista por, pelo menos, 3 (três) anos consecutivos,
cumprindo mais 1 (um) ano de Programa de Orientação Vocacional
(POV), oferecido por Instituição
Teológica Regional;
§ 2º. O Curso de Bacharel em Teologia, na Igreja Metodista, é oferecido
por instituições teológicas metodistas que integram o Sistema Metodista
de Educação, nos termos das normativas da CONET devidamente
aprovadas pelo Colégio Episcopal. (CÂNONES, 2012, p. 192 e 193).
Note-se que a formação clériga23 posta para a Igreja Metodista recebe, segundo os
Cânones, atribuição “profissional”, ou seja, requerida através de formação acadêmica,
universitária, voltada ao preparo científico e crítico. A mesma observação feita
anteriormente com relação à Igreja cabe aqui. Mesmo que o clérigo remeta, em certo grau,

23
Termo relativo à categoria ministerial da Igreja, pastores e bispos.

103
à imagem mística da dominação carismática, está de muitas formas, na estrutura
metodista, regido por critérios legais.

De certa forma, essa composição burocrática, baseada em conhecimento,


legalidade e profissionalismo, remete ao que Weber pontua como impessoalidade formal.
Mesmo que o caráter eclesiástico não deva, por sua concepção humanitária e solidária,
sinalizar qualquer traço impessoal, a burocracia vigente na estrutura institucional
determinará certa postura formal, em virtude da dependência natural de juízo regimental
e hierárquico. Com isso será possível conceber que as relações fraternas da vivência
eclesiástica não poderão suplantar as regras institucionais que regulam a estrutura da
Igreja. Daí nossa afirmativa de que, em bem maior grau na Igreja, o caráter da
legitimidade será diverso, não podendo ser estabelecido de maneira simples e única.

A teoria weberiana indica que a legitimidade tradicional ocorre quando se verifica


“crença na santidade de ordens e poderes senhoriais tradicionais” (Weber, 2012, p. 148),
ou seja, quando a legitimidade do domínio está baseada no que Weber chama de
“dignidade própria” proveniente da tradição, diferentemente, por exemplo, do domínio
legal que se baseia numa regra ou lei. Essa realidade de domínio está diretamente
relacionada à tradição, mais do que a normas ou mesmo ao carisma de quem domina.
Neste caso, a relação entre dominantes e dominados se caracteriza por uma sujeição e não
por uma relação funcional, como numa organização burocrática. A estrutura não está
organizada em direitos e deveres, mas em submissão e fidelidade:

Não se obedece a estatutos mas à pessoa indicada pela tradição ou pelo


senhor tradicionalmente determinado. As ordens são legitimadas de dois
modos:
a) em parte em virtude da tradição que determina equivocadamente o
conteúdo das ordens, e da crença no sentido de alcance destas, cujo abalo
por transgressão dos limites tradicionais poderia pôr em perigo a posição
tradicional do próprio senhor;
b) em parte em virtude do livre arbítrio do senhor, ao qual a tradição
deixa espaço correspondente.
Esse arbítrio tradicional baseia-se primordialmente na ausência de
limitações que por princípio caracteriza a obediência em virtude do dever
de piedade.
Existe, portanto o duplo reino:
a) da ação do senhor materialmente vinculada à tradição e
b) da ação do senhor materialmente independente da tradição. (WEBER,
2012, p. 148).
As relações de domínio e obediência desse caráter de legitimidade estão muito
mais sujeitas à benignidade pessoal do senhor do que à estrutura, propriamente dita.
Figura em maior grau, a decisão do líder, segundo critérios pessoais, os níveis de simpatia

104
ou antipatia entre senhor e súdito. Weber aponta, a partir disso, para a ocorrência de uma
relação onde:

A natureza efetiva do exercício de dominação está determinada por


aquilo que habitualmente o senhor (e seu quadro administrativo) podem
permitir-se fazer diante da obediência tradicional dos súditos, sem
provocar sua resistência. Essa resistência, quando surge, dirige-se contra
a pessoa do senhor (ou servidor) que desrespeitou os limites tradicionais
do poder, e não contra o sistema como tal (“revolução tradicionalista”)
(WEBER, 2012, p. 148).
Fica evidente que a dominação tradicional se pauta por normas estabelecidas pela
tradição, sendo praticamente impossível a sugestão de qualquer mudança legal através de
estatutos. Esse tipo de dominação baseia-se na “sempre existência”, ou seja, em critérios
que recorrem à virtude de uma “regra” “vigente desde sempre”.

Segundo Weber, nesse tipo, é ausente o critério da “competência”, uma vez que a
escolha de quem ocupa os cargos depende da decisão do senhor, independentemente de
critérios ou parâmetros. Disso recorre a existência de competitividade particular pela
simpatia do senhor, o que representa a possibilidade de condições adequadas de trabalho
e ascensão; da mesma forma, inexiste a dimensão de uma “hierarquia racional fixa”, já
que a estrutura não está sujeita a critérios técnicos ou profissionais, mas à boa vontade e
parecer do senhor. A composição de cargos e funções está sujeita àquilo que pretende o
senhor que elege e cassa o direito e o status de seus servos, segundo sua vontade pessoal
e não a partir do cumprimento de deveres; Outro quesito não contemplado é a “nomeação
regulada por contrato livre”, ou seja, a contratação ou a vinculação através de juízo legal,
amparada por lei vigente. Isso acontece porque na dominação tradicional as queixas e
decisões cabem apenas ao senhor, dependendo totalmente de seu juízo ou da própria
tradição que sinaliza através daquilo que é “vigente desde sempre”, qual o
encaminhamento cabível; no mesmo sentido, Weber observa, nesse tipo de dominação,
inexistência de preocupação com a “formação profissional”, mesmo que haja algum
preparo doméstico e intuitivo no desempenho das funções; Outro ponto elencado pelo
sociólogo, como faltante nesse tipo de estrutura, é “o salário fixo”, ou “o salário pago em
dinheiro”, vestígio da relação dos antigos senhores que serviam seus servos de sua própria
mesa.

Consideramos necessário neste momento lembrar, mesmo que de forma


simplificada, que Weber, em sua análise sociológica das religiões, salienta a importância
de uma ética religiosa da negação do mundo. Trata-se de um esquema elaborado como

105
“ideal típico de orientação” para o estudo científico, que contempla a existência de
“esferas individuais de valor” que, segundo o autor, possuem uma “coerência racional”
própria que delimita a localização histórica de determinado “fenômeno”. O sociólogo
entende que a concepção de um “Deus e criador supramundano” foi importante para a
construção de um processo de salvação em que o indivíduo deve permanecer em estado
distinto e separado, que lhe garanta a salvação. Essa separação se dá como negação aos
valores “mundanos”. Dessa maneira:

(...) tomamos como certo e pressuposto que uma grande fração,


especialmente importante para o desenvolvimento histórico de todos os
casos de religiões proféticas e redentoras viveu não só num estado agudo
como permanente de tensão em relação com o mundo e suas ordens.
Desnecessário mencionar este aspecto, de religiões de salvação, tanto
maior foi a sua tensão. Isso se segue do significado da salvação e da
substância dos ensinamentos proféticos, tão logo eles evoluem para uma
ética. A tensão também foi maior, quanto mais racional foi em princípio
a ética e quanto mais ela se tenha orientado para valores sagrados
interiores como meios de salvação. Em linguagem comum, isto significa
que a tensão tem sido maior quanto mais a religião se tenha sublimado
do ritualismo, no sentido do “absolutismo religioso”. Na verdade, quanto
mais avançou a racionalização e sublimação da posse exterior e interior
das “coisas mundanas” – no sentido mais amplo – tanto mais forte tornou-
se a tensão, por parte da religião, pois a racionalização e sublimação
consciente das relações do homem com as varias esferas de valores
exteriores e interiores, bem como religiosas e seculares, pressionaram no
sentido de tornar consciente a autonomia interior e lícita das esferas
individuais, permitindo, com isso, que elas se inclinem para as tensões
que permanecem ocultas na relação, originalmente ingênua, com o
mundo exterior (WEBER, 2008, p. 229).
Assim, será necessário evocar constantemente, para a garantia de uma boa análise,
a existência das tensões entre “valores exteriores e interiores”, ou seja, dos conflitos que
permeiam o cenário religioso internamente e daqueles que remetem à sua relação com a
sociedade.

Dessa maneira, com relação à crença na santidade de ordens e poderes senhoriais


tradicionais, apontada por Weber como ideia primordial do tipo de dominação
tradicional, a Igreja, por ter a transcendência mística como referência de sua conduta,
acatará as ordens e poderes a partir dessa crença:

O indivíduo, afim de evitar, ou eliminar, os males relacionados com ele


– acima de tudo a enfermidade – não se voltou para o culto da
comunidade, mas como indivíduo, procurou o feiticeiro como o
“conselheiro espiritual” mais velho e pessoal. O prestígio dos mágicos
particulares, e dos espíritos ou divindades em cujos nomes eles
realizavam seus milagres, angariou-lhes proteção, a despeito de sua
filiação local ou tribal. Em condições favoráveis, isso levou á formação

106
de uma “comunidade” religiosa, que foi independente de associações
étnicas. Alguns dos “mistérios”, embora nem todos, seguiram esse curso.
Prometeram a salvação dos indivíduos, como indivíduos, em relação à
enfermidade, pobreza e todas as formas de sofrimento e perigo. Assim, o
mágico transformou-se no mistagogo; ou seja, surgiram as dinastias
hereditárias dos mistagogos, ou organizações de pessoal treinado por um
chefe de acordo com regras. Esse chefe tinha que ser aceito como
encarnação de um ser supramundano ou simplesmente como um profeta,
ou seja, como o porta-voz e agente de seu deus (WEBER, 2008, p. 192).
Guardadas as proporções, a Igreja contemporânea24, seja na escolha de seus
líderes, seja na condução de seus cargos, conta com o poder místico de “porta-voz” da
divindade. A crença na santidade de ordens e poderes senhoriais tradicionais exerce
forte influência nos processos e nas estruturas eclesiásticas, mesmo que organizadas
burocraticamente, mesmo que evoquem a racionalidade como procedimento funcional.
Desta maneira, evidencia-se outra premissa da dominação tradicional, a servidão ou a
submissão e fidelidade, que não se refere diretamente ao senhor e chefe da estrutura, mas
ao que esta representa como simbolismo da “vontade” divina. Nesse conceito, a
obediência figura como regra espiritual e transgredi-la constitui desobediência ao sagrado
e não somente à hierarquia. A imagem do chefe carrega uma representatividade espiritual
que foge à lógica burocrática. Com isso, outra evidência da tradição se mostra, a negação
dos estatutos. O líder passa a ter poder místico capaz de questionar a lei. A lei está nele,
que sinaliza a vontade soberana de Deus, portanto “tem” legitimidade para fazer
mudanças e reorganizar a norma, segundo seus próprios critérios. Mesmo numa
organização burocrática, esse “poder” é suficiente para suplantar, de forma política,
qualquer forma de regimento ou contrato prévio. É o poder inquestionável da divindade
que se impõe à estrutura, através do domínio tradicional. É importante destacar neste
momento que nossa análise não visa o poder do carisma, que será visto à frente.
Consideramos aqui somente o fator tradicional como articulador de nossa proposição. É
desta maneira que ganha importância o livre-arbítrio do senhor ou a benignidade do
senhor. Uma vez que a lei é suplantada pela tradição do cargo e do status do líder, está
nele qualquer possibilidade de ascensão ou favor. A seu critério, julga e concede direitos.
A regra o serve, beneficiando e prejudicando quem lhe apraz prejudicar. Com isso,
desfaz-se o caráter da hierarquia oficial, própria do tipo burocrático, em negação ao
reconhecimento de direitos, de preparo intelectual ou experiência. Entram em cena o
favoritismo e a prebenda. A satisfação pessoal do senhor torna-se importante, uma vez

24
Referimos-nos ao contexto religioso contemporâneo, no qual a Igreja Metodista está inserida.

107
que o sistema está em suas mãos. Neste ambiente é complexa qualquer sugestão nos
estatutos, a não ser que esta seja de interesse do senhor, pois o seu cargo e condição
remetem ao que Weber entende como força da regra vigente desde sempre. Submetem-se
o contexto, as necessidades e motivações, ao poder da tradição do cargo e da
representação que este tem. A estrutura burocrática, nesse caso, se curva ao domínio
tradicional, que dá legitimidade a quem se assenta na cadeira de senhor.

Weber vê nesse tipo de domínio o que chama de “ausências”, ou seja, fatores não
verificados. Contrariamente ao sistema de ensino, na Igreja, em determinadas situações,
algumas delas podem ser contempladas, como o caso da competência. Mesmo sendo
requerida de forma generalizada na sociedade, é possível conceber que a competência não
figura como fator limitador do exercício funcional eclesiástico. Se elaborada pelo prisma
intelectual e acadêmico, nem sempre seus membros serão suprimidos. A mística religiosa
é capaz de superar qualquer deficiência de determinado membro em relação à
competência, por não dar à competência importância maior do que à mística. Na mística,
mais que capacidade para o desempenho de uma função ou a soma de conhecimento e
habilidades, será requerido prestígio espiritual e, sobretudo, anuência do líder, o que ainda
mais enfatizará o poder do domínio tradicional na estrutura. Isso acontece também devido
à ocorrência de outra “ausência” elencada por Weber, a falta de hierarquia racional fixa.
Uma vez que a estrutura burocrática – racional – é enfraquecida diante da vontade pessoal
do senhor, ganham mais valia os vínculos de obediência e fidelidade do que a
competência, evidenciando outro fator, a nomeação regulada por contrato livre.
Desfazem-se os vínculos de obrigatoriedade e legalidade diante das relações de favores e
interesses. Portanto, fatores como formação profissional e salário fixo em dinheiro ficam
em segundo plano, mesmo que figurem em contratos trabalhistas e exigências legais.

É possível compreender com isso que a Igreja Metodista não está isenta das
características apresentadas. Com governo episcopal, ou seja, regida por um colégio de
bispos e bispas que, canonicamente, tem a atribuição de reger todos os seus aspectos,
conforme descrito nos Cânones da Igreja Metodista (p. 309 – 315), a Igreja é regulada
por diretrizes burocráticas, contidas em termo de lei, contudo, é possível considerar que
a chancela do cargo episcopal, mesmo obediente a processos estabelecidos em suas
normas e regras, simboliza certa incumbência espiritual e, nos termos weberianos, de
domínio tradicional. Há detalhes expressos na lei da Igreja que revelam um poder maior
do que os demonstrados na redação dos Cânones, como é o caso do item VI do artigo

108
119, onde se lê que uma das competências do colégio25 é a de “estabelecer a filosofia,
objetivos e metas” (Cânones 2012, pg. 310) da instituição. O estabelecimento da filosofia,
portanto, sugere que os bispos podem governar a Igreja além da sujeição ao concílio,
órgão máximo da Igreja. Oficialmente, o Concílio Geral é quem dá as regras, contudo,
canonicamente, quem dá o tom do Concílio, são os bispos. Entendemos aqui uma clara
evidência de domínio tradicional, onde, segundo Weber, é o cargo que dá o poder e não
o carisma ou a hierarquia burocrática. Logicamente, na Igreja Metodista, essas três
dimensões se confundem, já que é possível compreender o poder episcopal sobre todas
elas, contudo, nosso intuito é fazer perceber-se a força do poder tradicional nesse
emaranhado. O cargo do bispo na Igreja Metodista, oficialmente, é administrativo, sujeito
à eleição de um mandato, por assembleia que se reúne periodicamente, porém, de maneira
pragmática, o bispo é o senhor. É ele quem escolhe pessoas para a composição de cargos
expressivos, ordena para ministérios importantes, institui ou destitui pessoas e, mesmo
que não seja por suas próprias mãos, decide sobre a direção de processos. A força do
profeta e do porta-voz se confunde com a do diretor geral e administrativo. A imagem do
súdito é ilustrada por colegiados que, apesar de compreenderem sua função técnica e
administrativa, não ousam questionar o direcionamento espiritual da voz divina. Apesar
da lei que rege a Igreja, característica de um sistema burocrático, a energia das relações
pessoais, espiritualizadas pelo contexto religioso, reflete um organismo tradicional, onde
a investidura da “encarnação de um ser supramundano” convive com a organização
empresarial.

É oportuno observar que a imagem da liderança episcopal pode desencadear


processos similares de domínio tradicional nos diversos níveis da organização, assim,
outros níveis podem, independentemente, desenvolver seu próprio senhorio. A estrutura
que é burocrática em sua organização formal, distribuída em instâncias de governo, terá,
com maior ou menor influência, caráter de dominação patrimonial, segundo o exemplo
das instâncias maiores. Também é adequado ponderar que o caráter de domínio poderá
não estar ligado unicamente a um tipo de dominação, ou seja, dependendo de quem ocupe
a função de senhor, a Igreja será mais burocrática do que patrimonial, ou, mais
carismática do que burocrática, ou mais Patrimonial do que carismática. Apesar de

25
Leia-se: Colégio Episcopal da Igreja Metodista

109
considerarmos necessária essa observação aqui, pretendemos discorrer sobre essa
dinâmica mais à frente.

Devemos considerar em que medida o sistema de educação secular pode ser


percebido através da legitimidade de domínio relacionada à tradição. Em primeiro plano,
elencamos algumas as considerações de Weber sobre a racionalização da Educação em
Ensaios de Sociologia (2008). Para o autor, a vida moderna é dominada por certo
“racionalismo” que fortalece uma cultura baseada na formação profissional através de
treinamento e educação, desencadeando o que ele aponta como “o desenvolvimento de
uma ‘objetividade racional’” (Weber, 2008, p. 167). Devido a isso, a educação moderna
se rende aos valores da burocracia moderna, enaltecendo não somente a organização e a
democracia, mas, principalmente, a questão da racionalização. Nesse sentido, Weber
assevera que:

O desenvolvimento do diploma universitário, das escolas de comércio e


engenharia, e o clamor universal pela criação dos certificados
educacionais em todos os campos levam à formação de uma camada
privilegiada nos escritórios e repartições. Esses certificados apoiam as
pretensões de seus portadores, de intermatrimônios com famílias notáveis
(nos escritórios comerciais, as pessoas esperam naturalmente a
preferência em relação à filha do chefe), as pretensões a serem admitidas
em círculos que seguem “códigos de honra”, pretensões de progresso
garantido e pensões na velhice e, acima de tudo, pretensões de
monopolizar cargos social e economicamente vantajosos. Quando
ouvimos, de todos os lados, a exigência de uma adoção de currículos
regulares e exames especiais, a razão disso é, decerto, não uma “sede de
educação” surgida subitamente, mas o desejo de restringir a oferta dessas
posições e sua monopolização pelos donos dos títulos educacionais.
(WEBER, 2008, p. 168 e 169).
O que se verifica, portanto, é que o sistema educacional contemporâneo, além de
disponibilizar o treinamento necessário para a habilitação profissional do indivíduo,
contribui para sua inserção numa “esfera” capaz de oferecer certa “autonomia” social,
econômica e, especialmente, intelectual. Os direitos passam a sinalizar os limites das
relações sociais que são atribuídas através de méritos e capacidades.

A aquisição de um diploma dá ao indivíduo mais que convencimento


técnico, levando-o à busca por um direito ao cargo, pela adoção de um
processo disciplinar regular e pela eliminação da autoridade totalmente
arbitrária do ‘chefe’ sobre o funcionário, o seu progresso ordenado e a
provisão pela velhice (WEBER, 2008, p. 169).
Com isso a condição de uma pessoa com formação acadêmica sugere não somente
o direito à ascensão profissional, mas também o direito à autonomia de pensamento,

110
segundo as regras da burocracia de cada contexto e a formação de consciência crítica e
analítica.

A partir disso, voltemos ao tema da legitimidade do domínio tradicional, agora


contraposto ao contexto educacional contemporâneo, lembrando que uma das balizas
mestras para o conceito de dominação tradicional é a crença na santidade de ordens e
poderes senhoriais tradicionais. Nesse sentido, apesar de se conceber certo
tradicionalismo, caracterizado por rituais e cargos, é possível afirmar que essa crença,
geralmente, se contrapõe às bases da educação como conhecimento científico, uma vez
que a construção acadêmica sugere exatamente a possibilidade do rompimento com
ordens e poderes estabelecidos, na projeção de informações desconhecidas, portanto,
passíveis de pesquisa e análise. Assim como na burocracia, podemos dizer que a
educação:

(...) tem um caráter “racional”: regras, meios, fins e objetivos dominam


sua posição. Em toda parte a sua origem e sua divisão tiveram, até agora,
resultados “revolucionários”, num sentido especial, que ainda não foi
discutido. É a mesma influência que o avanço do racionalismo teve em
geral. A marcha da burocracia (e diríamos da educação) destruiu
estruturas de domínio que não tinham caráter racional no sentido especial
da palavra (WEBER, 2008, p. 170). Grifos nossos.
Assim, é complexa a aceitação de outra questão imposta pelo domínio tradicional,
a dimensão de servidão ou submissão e fidelidade. No sistema educacional formal, o
exercício dialético é constante, não havendo ambiente que viabilize um clima de
submissão ou fidelidade servil. O conhecimento científico remete à possibilidade da
contestação, da cogitação crítica e do debate calcado em pressupostos teóricos. A
pessoalidade da relação servil e passiva não reflete a possibilidade de questionamento e
indagação, características clássicas de qualquer descoberta científica. A pesquisa se guia
pela necessidade de romper pressupostos e estabelecer novos paradigmas. Portanto, a
tarefa educação formal será inviável diante de outra suposição da dominação tradicional,
a condução de processos segundo o livre-arbítrio e benignidade do senhor, ou seja, ao
contrário disso, ela se dará pela direção de normas e regras, estabelecidas através de
critérios, com sentido real para a contextualização de procedimentos e a formalização de
condutas, estas, estabelecidas através de debates, analisadas por órgãos de representação
e colegiados. É pertinente a observação de que a estrutura educacional moderna,
formalizada burocraticamente, sugere a elaboração e a aprovação de normas que podem
ser alteradas segundo a compreensão dos órgãos competentes, segundo o bom-senso e a
viabilidade de meios facilitadores ao desempenho acadêmico, em negação ao conceito de
111
impossível sugestão nos estatutos, vigente no panorama da dominação tradicional. Com
isso, o sistema educacional replica outro fundamento desta dominação, o conceito da
regra vigente desde sempre, na compreensão de que a tradição não deve se sobrepor aos
desafios do desenvolvimento humano e científico, mas se adequar às novas demandas.

Como já exposto, Weber verifica certos valores ausentes nesse domínio, que
refletem diretamente no que ele chama de educação moderna, como: competência – fator
de extrema valia ao processo acadêmico contemporâneo; hierarquia racional física – sem
a qual se inviabiliza qualquer iniciativa acadêmica, uma vez que esta decorre a
necessidade de reconhecimento legal e institucional competente; nomeação regulada por
contrato livre – pressuposto essencial para qualquer estrutura burocrática
institucionalizada; formação profissional – sem a qual nada se dará em termos
educacionais; remuneração fixa em dinheiro – vínculo básico de qualquer procedimento
funcional regularizado.

O sistema educacional metodista está inserido no contexto burocrático


educacional do país que é regido por estatutos e reconhecimentos, adequados às análises
apresentadas. Mesmo que de caráter confessional e sujeito aos princípios de um credo
religioso, ele não se isenta das prerrogativas da educação secular, reguladas por órgãos
burocráticos do Estado. Mesmo diante de critérios éticos religiosos, o sistema metodista
de educação se sustenta através da autonomia acadêmica que não se restringe à Igreja,
mas aos procedimentos pedagógicos e metodológicos, particulares ao sistema
educacional.

É dessa forma que o sistema educacional da Igreja, em conformidade com a


educação secular, pouco se legitimará pelo caráter da dominação tradicional, ou seja,
refutará a crença de um domínio pessoal, arbitrário, não racional, anti-herárquico e
dependente de decisões de um senhor inquestionável. Ao contrário, promoverá a relação
dialética a partir de pressupostos documentais, regras e normas de conduta.

Como já apontado, a denominação de carisma para Max Weber remete à


existência ou comprovação de uma virtude pessoal com origem “extracotidiana”,
transcendente à vida comum, com efeito místico ou mágico, ligado ao sobrenatural,
relativo ou não à divindade. É a qualidade atribuída a uma pessoa com “poderes ou
qualidades sobrenaturais, sobre-humanos ou, pelo menos, extracotidianos específicos ou
então se a toma como enviada por Deus, como exemplar e, portanto, como ‘líder’”
(Weber, 2012, p. 159). A autoridade deste caráter, segundo o sociólogo, se dá
112
espontaneamente a partir de evidências naturais, comprovadas e reconhecidas livremente
pelos dominados. Contudo, a legitimidade dessa autoridade é garantida não somente pela
constatação de provas, mas, sobretudo, pela manutenção desses sinais.

Se por muito tempo não há provas do carisma, se o agraciado carismático


parece abandonado por seu deus ou sua força mágica ou heroica, se lhe
falha o sucesso de modo permanente e, sobretudo, se sua liderança não
traz nenhum bem-estar aos dominados, então há a possibilidade de
desvanecer sua autoridade carismática. Este é o sentido carismático
genuíno da dominação “pela graça de Deus” (WEBER, 2012, p. 159).
Cabe, portanto, ao portador do carisma manter atualizado o reconhecimento
público de seu dom através de manifestações que configurem o carisma em si, bem como
sua continuidade. Weber entende que esse domínio tem caráter emocional, diferente dos
apresentados anteriormente, ligados à dominação de uma composição legal ou à
dependência pessoal, sendo elaborado através da formação de uma estrutura emocional
subjetiva, sujeita a “qualidades carismáticas: ao ‘profeta’ correspondem os ‘discípulos’;
ao ‘príncipe guerreiro’, o ‘séquito’; ao ‘líder’, em geral, os ‘homens de confiança’”
(Weber, 2012, p. 160). Com isso, não há hierarquia, mas interações entre o líder e seus
subordinados, nem necessidade de competência formal ou preparo e, da mesma maneira,
ausência de poderes funcionais ou privilégios hierárquicos. Não existe remuneração
protocolar, já que os vínculos são comunitários em interdependência e “camaradagem”.
Não há “autoridades institucionais fixas”, mas “carismas” que se mantêm através do
status de “emissário”; nem mesmo a existência de normas ou estatutos, mas “o
formalmente decisivo são criações de direito, para cada caso individual, e originalmente
somente juízos de Deus e revelações”. Weber esclarece ainda que, materialmente:

(...) aplica-se a toda dominação carismática genuína a frase: “Está escrito


– mas em verdade vos digo”. O profeta genuíno, bem como o príncipe
guerreiro e todo líder genuíno em geral, anuncia, cria, exige
mandamentos novos – no sentido originário do carisma: em virtude de
revelação, do oráculo, da inspiração, ou então de sua vontade criadora
concreta, reconhecida, devido a sua origem, pela comunidade religiosa,
guerreira, de partido ou outra qualquer. O reconhecimento é um dever
(WEBER, 2012, p. 160).
O carisma figura como um bem que é sempre transitório, necessitando de
renovação constante que o valide e garanta o reconhecimento público do dom que
capacita e legitima. Por isso é característica nesse tipo, a liderança inovadora, que propõe
mudanças radicais e questionáveis que têm a pretensão de acentuar o poder de uma
revelação. Desta maneira, o líder carismático requer para si o direito de ser
inquestionável, não admitindo réplicas, sob a alegação de ser sua pregação constatação

113
legítima da vontade divina. Quando questionada, a disputa se dará por “meios mágicos”
ou pelo “reconhecimento” da comunidade, “luta em que, de um lado, somente pode estar
o direito e, do outro, somente a infração sujeita a expiação”

Por estar baseada na transcendência da normalidade e da razão, a dominação


carismática se opõe a qualquer burocracia por não estar, em seu modo genuíno, sujeita a
regras e normas discutíveis e racionais. O carisma se caracterizara pelo contínuo
questionamento ao estatuto, já que não se conduz por lógica humanamente estabelecida,
mas pela sublimidade da direção divina de modo excepcional. Weber conclui que essa
oposição acontece por serem, a dominação burocrática e a tradicional, expressas pela vida
cotidiana enquanto que a carismática sobrepuja a concretude da vida:

A dominação burocrática é especificamente racional no sentido da


vinculação no sentido da vinculação a regras discursivamente
analisáveis; a carismática é especificamente irracional no sentido de não
conhecer regras. A dominação tradicional está vinculada aos precedentes
do passado e, nesse sentido, é também orientada por regras; a carismática
derruba o passado (dentro de seu âmbito) e, nesse sentido, é
especificamente revolucionária. Esta não conhece a apropriação do poder
senhoral ao modo de uma propriedade de bens, seja pelo senhor seja por
poderes estamentais. Só é “legítima” enquanto e na medida em que
“vale”, isto é, encontra reconhecimento, o carisma pessoal, em virtude de
provas; e os homens de confiança, discípulos ou sequazes só lhe são
“úteis” enquanto tem vigência sua confirmação carismática (WEBER,
2012, p. 160).
No tipo puro, a dominação carismática remete a uma negativa da realidade, porém
sua relação com os bens econômicos e materiais diverge da burocracia e do
tradicionalismo, na medida em que evidencia seu prestígio como bênção e favor
extraordinário. Dessa maneira, a economia tradicional contraria o princípio carismático
por significar contato direto com os valores e conceitos cotidianos. Em sua forma genuína,
a dominação do carisma concebe a receita através de doações, mendicância, ou mesmo
por extorsão violenta, como o caso de guerreiros carismáticos. Contudo, o sociólogo
aponta que, inserido no contexto comunitário, o carisma, necessariamente, se altera para,
segundo Weber, tradicionalizar-se ou racionalizar-se e, de certa maneira, legalizar-se.
Essas alterações são destacadas ao considerar algumas características dessas
comunidades, como:

a) o interesse ideal ou material dos adeptos na persistência e


reanimação contínua da comunidade;
b) o interesse ideal e o material, ambos mais fortes, do quadro
administrativo: dos sequazes, discípulos, homens de confiança de
um partido etc., em
1. continuar a existência da relação, e isto

114
2. de tal modo que esteja colocada, ideal e materialmente, a
posição própria sobre um fundamento cotidiano duradouro;
externamente, o estabelecimento da existência familiar ou,
pelo menos, da existência saturada, em lugar das “missões”
estranhas à família e à economia, e isoladas do mundo
(WEBER, 2012, p. 162).
A secularização ou rotinização normatiza o carisma desencadeando processos
diversos relativos à manutenção de determinada relação carismática. Desta forma é
admitida a regra como via de escolha de novos líderes que obtêm legitimidade não
somente de seu próprio carisma, mas também de normas de adequação da própria
comunidade para a continuidade da relação. Weber remete esta adequação na escolha do
novo Dalai-Lama como exemplo que indica uma criança a partir de indícios da
encarnação do divino. Com isso “a legitimidade do novo portador do carisma está ligada
a características, isto é, “regras” para as quais existe uma tradição (tradicionalização),
retrocedendo, portanto, o caráter puramente pessoal” (WEBER, 2012, p. 162).

Assim, confundem-se os tipos e a legitimidade do domínio, já que o carisma torna-


se objeto de designação, através do reconhecimento comunitário, contudo, segundo o
sociólogo, isso não deve ser confundido com “eleição”, por não se caracterizar como
escolha livre, mas vinculada a um processo pautado pelo cumprimento de deveres
específicos que demonstrem claramente o acerto da escolha.

Isso demonstra que os tipos de domínio podem se movimentar segundo a ocasião


e os interesses dos contextos que estabelecem sua legitimidade, fato que veremos ainda
neste capítulo quando fizermos a análise dos diversos movimentos de domínio do sistema
educacional e da Igreja.

Pelo seu caráter místico, a fé, por si mesma, remete a certa submissão do carisma.
O ideário transcendente exercido pela figura de um profeta, um “homem de Deus”, que o
invoca e d’Ele traz mensagens, remete à figura do líder uma imagem que valida o poder.
Mais que o líder, a simbologia utilizada na religião, a liturgia, os paramentos, os
simbolismos do templo, a oração, a invocação do transcendente, a música, estabelecem
um contexto que, por si mesmo, legitima a dominação. Como afirma Weber, a invocação
do Eterno, traz ao líder o poder do semideus, já que está agraciado pelo dom
extraordinário que o qualifica e o autentica como autoridade diante do grupo. O poder
carismático, portanto, não está somente na representação do líder que impõe o domínio,
mas na própria aceitação voluntária do crente que, diante da mística, submete-se ao
cenário simbólico da transcendência. A fé está sujeita à crença, à anuência espontânea,

115
individual, ligada a um conjunto de fatores abstratos que tocam o estado emocional,
físico, social e até intelectual, configurando um momento específico, situacional, de cada
pessoa.

Dessa maneira, qualquer análise estática sobre o alcance e a medida de domínio


exercido pelo carisma, corre o risco da imprecisão. Mesmo que, no interior da instituição
eclesiástica, qualquer classificação racional do que legitima o poder, incorre numa
variada categoria de fatores, que podem transitar entre o interesse político e a realização
econômica, por exemplo. O que parece possível é procurar entender que, mesmo
relacionada à mística e ao carisma, a Igreja e a fé nem sempre são regidas, dominadas ou
legitimadas por dominação carismática pura. Como exemplo disto, citamos a abordagem
de Weber ao verificar a sincronia de valores religiosos com questões econômicas no início
do século XX nos Estados Unidos da América. Apesar de não ter a pretensão de analisar,
em si mesmos, princípios religiosos, econômicos ou sociais, o autor descreve um
fenômeno social e econômico, com motivação religiosa, organizado através de
“combinações de circunstâncias”, usando a expressão do próprio autor. Trata-se, ainda
mais, da averiguação de um “espírito”, fundado em condutas religiosas, capaz de
favorecer o desempenho econômico daquele momento histórico. Nesse intento, Weber
inicia seu exame definindo o capitalismo não como o “impulso para o ganho, a persecução
do lucro, do dinheiro, da maior quantidade possível de dinheiro” (Weber, 2001, p. 26),
mas como uma ação econômica capaz de perceber oportunidades de troca que propiciem
lucro, salientando, porém, “possibilidades formalmente pacíficas de lucro” (grifo do
autor). Nessa linha, sua apreciação credita a alguns fatores a viabilidade da moderna
organização, citando como exemplo a “separação dos negócios da moradia da família” e
a adoção de uma “contabilidade racional”, destacando a matemática, as ciências exatas, a
administração, a estrutura legal, a racionalização como contribuições decisivas do
processo, porém, somado a isso, ressalta a maior delas, as “influências formativas da
conduta”, referindo-se a questões religiosas e éticas, sem as quais, o impulso econômico
moderno não existiria. Para Weber, está aí o “ethos de um sistema econômico”, o que em
seu estudo, é a relação entre “espírito da moderna vida econômica” e a “ética racional da
ascese protestante”. Essas primeiras impressões são aprofundadas pela constatação de que
os registros históricos apontam para a associação entre bons êxitos econômicos e
protestantismo. Segundo Weber:

Este fato não se verifica apenas onde a diferença da região coincide com
uma nacionalidade, e portanto com seu desenvolvimento cultural, como

116
é o caso dos poloneses e dos alemães da Alemanha Oriental. Observamos
a mesma coisa na estatística de filiação religiosa de qualquer parte em
que o capitalismo, na época de sua grande expansão, pôde alterar a
distribuição social conforme suas necessidades e determinar a estrutura
ocupacional. Quanto maior for a liberdade de ação, mais claro o efeito
apontado (WEBER, 2001, p. 39).
Assim, o autor constata uma “empatia” entre protestantismo e capitalismo
supondo que a experiência protestante da quebra de tradições religiosas e seu distintivo
questionador, tenham contribuído para esse processo. Weber argumenta que a Reforma
Protestante:

(...) significou de fato o repúdio de um controle que na época era muito


tênue e praticamente imperceptível, pouco mais que formal, em favor de
uma regulamentação da conduta como um todo que, penetrando em todos
os setores da vida pública e privada, era infinitamente mais opressiva e
severamente imposta (WEBER, 2001, p. 40).
A Reforma acontece por um espírito libertário e racional, favorável ao
rompimento das várias formas do conservadorismo que, além da dimensão eclesiástica e
doutrinária atinge a prática social. O autor, por isso, procura delinear as peculiaridades
do protestantismo americano que adaptam os matizes capitalistas à sua filosofia religiosa,
ou vice-versa, considerando suas especificidades de formação, como a conduta mais
pragmática e técnica, contraposta à preferência humanística católica. A esse respeito,
considera que:

Em uma análise superficial, e com base em certas impressões comuns,


poderíamos ser tentados a admitir que a menor mundanidade do
catolicismo e o caráter ascético de seus mais altos ideais tenha induzido
seus seguidores a uma maior indiferença para com as boas coisas deste
mundo. E tal explicação reflete a tendência de julgamento popular de
ambas as religiões. Do lado protestante, ela é usada como base das
críticas de tais ascéticos (reais ou imaginários) do modo de viver católico,
enquanto os católicos respondem com a acusação de que o materialismo
resulta da secularização de todos os ideais pelo protestantismo.
Um escritor contemporâneo tentou definir a diferença de atitudes diante
da vida econômica da seguinte maneira: “O católico é mais quieto, tem
menor impulso aquisitivo; prefere uma vida mais segura possível, mesmo
tendo menores rendimentos, a uma vida mais excitante e cheia de riscos,
mesmo que esta possa lhe proporcionar a oportunidade de ganhar
honrarias e riquezas. Diz o provérbio, jocosamente: ‘Coma ou durma
bem’. Neste caso, o protestante prefere comer bem, e o católico, dormir
sossegado” (WEBER, 2001, p. 42 e 43).
Assim, podemos verificar que Weber sinaliza, de forma expressiva, sua percepção
de que o fator diferencial entre as duas orientações doutrinárias é caracterizado pela
alegria e liberalidade materialista protestante, simbolizada pelo prazer na aquisição de

117
bens e na satisfação dos benefícios da prosperidade material, contraposta ao desapego
católico, enfatizado em seu espírito devoto ao mundo espiritual.

Nessa mesma direção, ele analisa um documento de Benjamin Franklin,


considerado por ele como “um documento desse espírito, que contém, em uma pureza
quase clássica, aquilo que buscamos” (Weber, 2001, p. 48). Nele, Franklin, num tom
religioso, tece recomendações relacionadas à conduta pessoal, ao proceder social e, em
especial, às relações comerciais e financeiras. Algumas de suas citações: “Lembra-te que
tempo é dinheiro”; “Lembra-te que crédito é dinheiro”, “Lembra-te que o dinheiro é de
natureza prolífica e geradora. O dinheiro pode gerar dinheiro, e seu produto gerar mais, e
assim por diante”; “Lembra-te do ditado: O bom pagador é dono da bolsa alheia”; “Não
te permitas pensar que tens de fato tudo o que possuis, e viver de acordo com isso. Esse
é um erro que caem muitos dos que têm crédito”. Para ilustrar sua percepção, Weber cita
comentários sobre o documento, como o de Freinard Künberger no Picture of American
Culture: “Não há o que duvidar de que é o espírito do capitalismo que aqui se expressa
de modo característico, conquanto estejamos longe de afirmar que tudo o que possamos
entender como pertencente a ele esteja contido nisso (...) Eles tiram sebo do gado e
dinheiro dos homens” (Weber, 2001, p. 49 e 50). Weber destaca aí o ethos, a essência de
sua pesquisa. Como ele mesmo pondera:

A peculiaridade dessa filosofia da avareza parece ser o ideal dos homens


honestos, de crédito reconhecido e, acima de tudo, a ideia de dever que o
indivíduo tem no sentido de aumentar o próprio capital, assumido como um
fim em si mesmo. De fato, o que nos é aqui pregado não é apenas um meio de
fazer a própria vida, mas uma ética peculiar. A infração de suas regras não é
tratada como uma tolice, mas como um esquecimento do dever. Essa é a
essência do exposto. Não se trata de mera astucia de negócios, o que seria algo
comum, mas de um ethos e esta é a qualidade que nos interessa (WEBER, 2001,
p. 50).
Pode-se perceber que mesmo a conduta mais religiosa, no sentido piedoso, está
carregada de outras motivações que não somente o carisma. Mesmo que a religião evoque
um espírito contrito e místico, a religiosidade, propriamente, pode estar vinculada a outros
fatores de interesse secular, portanto, não legitimados unicamente por esse poder.

Essas variações são explicáveis sociologicamente através daquilo que estamos


chamando de movimentos, ou seja, do contexto que molda cada momento social, capaz
de influenciar na maior ou menor legitimidade desse ou daquele domínio. E a Igreja não
está isenta disso, como veremos à frente.

118
Diante das considerações apresentadas, é possível analisar de que forma e com
qual intensidade o sistema educacional contemporâneo se apresenta frente à concepção
weberiana de legitimação do domínio carismático, ou seja, em que proporção a estrutura
educacional pode ser reconhecida por um domínio carismático. Cabe relembrar que o
sistema educacional formal deve ser analisado através da elaboração de conceitos e
organizado por balizamento metodológico e pedagógico, com forte caráter burocrático
racional. Com isso seria possível concluir que ela não se adequaria ao tipo de domínio do
carisma, no entanto, Weber ao conceituar a dominação carismática, observou que em
conjunturas de domínio tradicional a educação formal (apresentada por ele como
intelectualização) pode se mostrar como força carismática:

O carisma é a grande força revolucionária nas épocas com forte


vinculação à tradição. Diferentemente da força também revolucionária
da ratio, que ou atua de fora para dentro – pela modificação das
circunstâncias e problemas da vida e assim, diferentemente, das
respectivas atitudes –, ou por intelectualização, o carisma pode ser uma
transformação com ponto de partida íntimo, a qual, nascida de miséria
ou entusiasmo, significa uma modificação da direção da consciência e
das ações, com orientação totalmente nova de todas as atitudes diante de
todas as formas de vida e diante do “mundo” em geral. Nas épocas pré-
racionalistas, a tradição e o carisma dividem entre si a quase totalidade
das direções de orientação das ações (WEBER, 2012, p. 161).
Portanto, o processo educativo formal que, na ótica burocrática, atua na formação
profissional como treino técnico para inserção funcional, pode, como afirma o sociólogo,
operar como instrumento esclarecedor, capaz de reorganizar direções e ações, libertando
revolucionariamente o indivíduo de outras formas de domínio. Desta maneira, o sistema
educacional se legitimaria por um tipo de carisma ligado ao esclarecimento e à promoção
de crescimento crítico. Não estaria vinculado a um líder carismático místico religioso,
mas ao extraordinário poder do conhecimento e da reflexão.

Nesse ambiente, as instituições de ensino da Igreja Metodista, podem ser


consideradas, como promotoras de uma educação carismática, uma vez que trazem em
seu conceito primário compreensão abrangente de formação. Para a educação
confessional, de forma geral, o ensino demanda capacitar teórica, técnica e
filosoficamente o educando. Nesse sentido, a pesquisadora Roseli Moura afirma que:

A educação escolar cristã tem como proposta central a educação integral


do ser em três áreas interdependentes: o saber teórico, o saber crítico e os
saberes técnicos. Essa proposta tem como tripé axiológico a visão da
unicidade do ser humano, da centralidade do Ser divino e da integralidade
do processo educacional. Dessa base extrai-se, como abrangência da
educação, a formação do ser em três âmbitos, quais sejam: formação

119
cristã, transformação pessoal e crescimento intelectual. O âmago da
proposta é que Verdade, Sabedoria e Excelência instruam o ser e o saber
do educando em todos os âmbitos de sua vida. A estratégia analítica é
prover a ele recursos para que exerça seu direito de saber diferenciar, nas
diversas áreas de aprendizado, o dado teórico e científico, de um lado, e
o pressuposto filosófico, de outro (MOURA, 2008, p. 97).
Com isso é possível aceitar que a escola confessional elabora, em seu processo
educativo, uma pedagogia carismática, no sentido de sinalizar para além da formação
tradicional, estimulando uma reflexão humanística e espiritualista da realidade cotidiana,
portanto, utilizando-se do extraordinário, do não tangível, como ferramenta de formação
pessoal, como já visto no capítulo anterior. O sistema educacional metodista encontra
fundamentação para esse princípio nas primeiras iniciativas de John Wesley na
Inglaterra26, contudo, é necessário destacar que há vários metodismos, oriundos dos
desdobramentos do movimento ao migrar da Inglaterra para a América do Norte e,
posteriormente, para o Brasil, o que influenciou a forma de ser Igreja, bem como de
“fazer” educação. Peri Mesquida, em Hegemonia norte-americana e Educação
Protestante no Brasil (1994), cita, como exemplo dessa questão, a educação oferecida
pelos missionários americanos que trouxeram, para o Brasil, um metodismo que se
revestiu de componentes civilizatórios legitimados por elementos religiosos. Segundo o
autor, houve tentativa de implementar a cultura considerada “superior” que promovesse
crescimento religioso, cultural e social ao Brasil condicionada à educação escolar e à
adesão das pessoas ao cristianismo protestante (Mesquida, 1994, p. 105).

Como se observa, a análise de um modelo confessional de educação como o da


Igreja Metodista, a partir da teoria da legitimidade e da dominação, pode apresentar
nuances variadas, já que a política e a filosofia utilizadas podem flutuar de acordo com o
momento eclesiástico em que a Igreja se encontra. Mesmo com a estruturação burocrática
e racional característica da instituição educacional, a educação confessional não deixa de
ser uma extensão da Igreja na sociedade, portanto, sujeita aos pensamentos e variações
da eclesiologia confessional. Barros salienta que “No âmbito de uma visão sistêmica (da
interdependência), a “autonomia” de uma escola poderia ser entendida como a “liberdade
para obedecer” (2005, p. 86). Desta maneira, a educação confessional se alinha totalmente
ao direcionamento da Igreja e cumpre um papel não somente de educar, no sentido de
capacitar técnica e profissionalmente, mas também de formar o caráter e a espiritualidade.

26
As primeiras ações do movimento metodista inglês aconteceram através da alfabetização de pessoas
excluídas socialmente.

120
Portanto, podemos considerar que, mesmo vinculada legalmente às diretrizes
pedagógicas, burocráticas e institucionais, a escola confessional, por seu caráter e
dependência institucional, pode ser considerada sujeita à dominação carismática e, ainda
mais, legitimada por esse tipo de dominação. Mensurar, portanto, em que nível, ou com
qual intensidade, o sistema educacional metodista pode ser classificado como
carismático, é tarefa incerta, se considerarmos os movimentos naturais de interesse, de
caráter ideológico, que aproximam e distanciam a escola da Igreja conforme o momento
social e político em que ela se encontra. Ora as Instituições estarão mais sujeitas à
dominação carismática, ora mais arredias. Ora, a própria Igreja será, em maior grau,
carismática, ora, mais tradicional ou burocrática. Demonstrar essa oscilação será nosso
objetivo mais à frente.

3.2 - Dominações a partir das situações, circunstâncias e interesses

Como observamos no pensamento de Max Weber, a dinâmica de toda estrutura


está sujeita a um tipo de dominação, ou seja, acontece a partir de uma determinada
motivação que legitima a autoridade, proporcionando ao líder a possibilidade do domínio.
Desta maneira verificamos que cada composição organizacional dispõe de critério próprio
não havendo, por isso, possibilidade de estabelecer um mesmo tipo de domínio ou
legitimidade que contemple de forma geral qualquer atividade social, empresarial,
governamental ou eclesiástica. Com isso pudemos analisar, com base no pensamento
weberiano que, mesmo sendo parte de uma só instituição, o movimento funcional da
Igreja e de suas instituições de ensino, pode variar, em sua forma de legitimação e
domínio, segundo as premissas que cada atividade requer. Por exemplo, na Igreja, o poder
do carisma e da tradição, pode sobrepujar, em caráter geral, o poder da burocracia, sendo
a Igreja um recinto místico, onde a evidência do transcendente prevalece à regra da
organização e da lei. Já no sistema educacional, o poder da burocracia, em geral,
suplantará a representação extraordinária da mística. Isso, na perspectiva sociológica, não
deve sugerir mensurar valor ou importância, porém, localizar socialmente cada segmento,
segundo sua forma de domínio. Isso se refere a “um tema que se revelaria decisivo em
Weber: o da legalidade intrínseca às diferentes esferas da vida, que em Weber assumiria
a forma da legalidade intrínseca às diferentes linhas de ação” (Cohn, 2003, p. 54).

121
É necessário pontuar que, apesar de termos estabelecido características próprias
da Igreja e de suas instituições de ensino, devemos considerar que os domínios não podem
ser considerados estáticos, mas sujeitos a circunstâncias e interesses. Para tanto é
necessário lembrar que Weber entende as relações sociais através das ações sociais e que:

A ação social, como toda ação, poder ser determinada: 1) de modo


racional referente a fins: por expectativas quanto ao comportamento de
objetos do mundo exterior e de outras pessoas, utilizando essas
expectativas como “condições” ou “meios” para alcançar fins próprios,
ponderados e perseguidos racionalmente, como sucesso; 2) de modo
racional referente a valores: pela crença consciente no valor – ético,
estético, religioso ou qualquer que seja sua interpretação – absoluto e
inerente a determinado comportamento como tal, independentemente do
resultado; 3) de modo afetivo, especialmente emocional: por afetos ou
estados emocionais atuais; 4) de modo tradicional: por costume
arraigado (WEBER, 2012, p. 15).
Dessa maneira, o autor compreende que a relação social não se restringe somente
a um determinado fator ou motivação, já que ela também se move pela provocação de
uma variedade de pretextos. Cohn salienta que o pensamento weberiano remete não
somente à análise da ação ou do agente, mas, especialmente à situação em que a ação se
dá. Para Weber:

A noção de situação envolve a ideia de um complexo de ações


reciprocamente referidas (sem que isso implique presença concreta dos
agentes; basta que as ações sejam orientadas conforme outras ações
possíveis) que ganham seu caráter particular em todas essas ações. A
constituição e sobretudo a persistência de uma situação são, contudo,
problemáticas, porque ocorrem num contexto em princípio aberto – salvo
num caso limite, que é precisamente o que mais preocupou Weber, ou
seja, o da vigência plena da racionalidade da ação – e são, portanto,
possíveis mas não determinadas nem necessárias; sempre há alternativas.
Por outro lado, da mesma maneira como a constituição da situação limita
externamente o campo de opções dos agentes, ela limita externamente as
possibilidades alternativas (COHN, 2003, p. 130).
Para Cohn, essa compreensão é de extrema importância para que a análise não se
firme somente na percepção estática de um ou de outro fator, mas na multiplicidade dos
elementos considerados. Mais que isso, Weber amplia essa concepção associando ao
conceito questões como interesse, história ou política:

Um componente essencial da ‘racionalização’ da ação é a substituição da


submissão interna a costume habitual pela adaptação planejada a
determinadas situações de interesses (WEBER, 1991, p. 18).
(...)
Todo agir em sociedade é, naturalmente, a expressão de uma constelação
de interesses dos participantes que se dirige à orientação do agir, quer se
trate do agir alheio ou do agir próprio, de acordo com os seus próprios
regulamentos e de acordo com nenhum outro regulamento e, por causa

122
disso, percebe-se sempre a presença das mais diversas constelações de
interesses dos participantes (WEBER, 1995, p. 332).
(...)
Na maioria das vezes não se percebe que a oposição é outra, ou seja, a
oposição entre a ação humana que persegue um fim, por um lado, e as
condições para esta ação, isto é, os condicionamentos dados pela natureza
e pelas respectivas constelações históricas e políticas (WEBER, 1993, p.
33).

Com isso, a pesquisa de qualquer estrutura é enriquecida à medida que contempla,


por exemplo, situações influenciadas por interesses diversos que, no caso da Igreja,
podem se referir a ideologias, teologias ou luta pelo poder, e no sistema educacional, a
referenciais pedagógicos, metodológicos ou hierárquicos, entre outros. O que se pode
afirmar é que a análise desta ou daquela instituição deverá considerar os movimentos
causados pelos processos de cada organização. Ao mencionar as “constelações”, Weber
sugere a irregularidade temporal de fatores que se movimentam constantemente, podendo
se apresentar num instante de determinada maneira e, logo em seguida, se organizar de
outra forma. É importante a compreensão de que há em cada segmento uma conjuntura
de circunstâncias próprias que podem alterar seu movimento, segundo critérios
particulares decorrentes das políticas e princípios internos, portanto, em maior ou menor
grau, alheios à captação externa.

Estabelecida essa compreensão, podemos supor uma análise adequada do tipo de


dominação próprio de cada instituição estudada. Essa tarefa deve observar que o
movimento de cada uma delas pode inviabilizar qualquer forma de mensuração estática,
uma vez que no decorrer de sua história, tanto as tensões entre Igreja e instituições de
ensino, como as entre Igreja e Igreja, impossibilitam qualquer definição de maneira
conclusiva. A título de exemplo, citamos as tensões entre a Igreja Metodista e a UNIMEP
– criada em 1975 – verificadas por Alvim (1995) em Autonomia universitária e
confessionalidade:

A primeira administração da Universidade, dada a situação interna da


instituição com seus segmentos ainda inexperientes e desarticulados,
teve no autoritarismo, no conservadorismo e na visão empresarial
capitalista suas principais características. Contribuíram para o emprego
desse estilo administrativo a distância mantida pela Igreja em relação à
Universidade e o regime ditatorial vigente no País (...) A reitoria decidia
centralizadamente tudo o que dizia respeito à vida da UNIMEP, desde
horários e currículos até o veto na contratação de docentes. Os órgãos
colegiados superiores apenas homologavam essas decisões para cumprir
as exigências formais, enquanto outros órgãos em nível de
departamentos e cursos simplesmente não funcionavam (ALVIM, 1995,
p. 85 e 86).

123
Observemos a ocorrência de circunstâncias internas e externas, demonstradas por
crises da Universidade em relação à Igreja e, ao mesmo tempo, da Universidade em
relação a ela mesma, o que evidencia a teoria de particularidades distintas pelos matizes
de cada instituição.

Conforme salienta o autor, os desmandos do diretor geral que acumulava também


o cargo de reitor estremeciam o relacionamento entre direção e conselho diretor da
mantenedora e, ao mesmo tempo, surgiam crises internas, entre instituição e discentes:

(...) instalava-se, também, no interior da universidade, uma profunda


tensão: os alunos reclamando de anuidades exageradas e da má qualidade
do ensino, e os professores, por sua vez, clamando por melhores salários
e mínimas condições de trabalho, além do clima de generalizada rejeição
ao projeto pedagógico tecnicista. As cobranças e queixas desses dois
segmentos eram feitas com base em princípios constantes dos “Planos
quadrienais” da igreja Metodista, que, paradoxal e curiosamente, foram
também usados pelo Conselho diretor da Mantenedora, para exigir uma
postura diferente do Reitor, finalmente afastado em 1978, em meio à séria
crise (ALVIM, 1995, p. 86 e 87).
Nessa situação, Alvim destaca que os desmandos internos, além de provocarem
debates sobre os processos internos da instituição ligados ao andamento acadêmico e
administrativo, acenderam outras discussões, como a questão do “poder”:

Havia muita desconfiança. Para o corpo docente, o Conselho Diretor era


desconhecido. Os professores, reunidos em cinco e seis de maio de 1979,
escreveram um documento denominado “Carta de Águas de São Pedro”,
no qual declaram: “é preciso que se esclareçam as funções da
Mantenedora”. Afirmavam ainda: “a Universidade precisa ter ciência do
que ocorre na Mantenedora”. Oliveira (1983) diz que “houve tentativas
de aproximação maior entre as partes. Mas os que defendem a
mantenedora, com medo de perder as rédeas do poder, têm impedido
maiores avanços nesse campo” (ALVIM, 1995, p. 88).
Alvim aponta ainda que, de um lado, as sucessivas crises que envolvem Igreja e
suas instituições de ensino demonstram a existência de uma constelação de valores que,
apesar de importantes para uma e outra instituição, são constantemente reorganizadas, a
partir da compreensão, capacitação e sensibilidade de seus gestores, ao relatar que:

Se a autonomia não era, até a crise, algo que despertasse maior interesse,
muito menos o era a confessionalidade. Apesar de a confessionalidade
estar contemplada nos documentos da Igreja, a sua presença neles não
era visível aos olhos da maioria da comunidade universitária. A questão,
como dissemos, não era abordada nos debates internos, como seria
desejável. Mas foi exatamente o caráter confessional metodista presente
na instituição, pouco transparente à grande maioria, que permitiu e
fortaleceu a resistência à intervenção. A confessionalidade ajudou
também o grupo metodista da UNIMEP a se aglutinar e lutar contra o ato
da força. Ao mesmo tempo, forneceu os caminhos para uma

124
recomposição inteligente e eficaz, após o restabelecimento, por vias
judiciais, do status quo. Ao experimentar na prática, por força dos
acontecimentos, o espírito da autonomia universitária, numa instituição
particular, a comunidade compreendeu claramente que, em grande parte,
isto só fora possível porque a proposta metodista, conhecida dos diversos
segmentos, a incorporava. Era difícil aos representantes da Igreja,
essencialmente ao Colégio episcopal, como administradores de uma
instituição social, reconhecida como utilidade pública, sem fins
lucrativos, negar a “função social da propriedade” ou refutar modelos
mais democráticos de gestão e de autonomia universitária (ALVIM,
1995, p. 91 E 92).
De outro lado, estão os conflitos particulares da Igreja que decorrem, sobretudo,
do caráter ideológico – teológico – de suas lideranças que são substituídas, ou
substituíveis a cada cinco anos, conforme a lei atual. Essas alterações de mando, por sua
vez, refletem em alteração de filosofia que ora comunga com uns valores, ora com outros,
alternando pragmaticamente os rumos tanto da Igreja como de suas instituições de ensino.
Boaventura (2010) observa, do interior da Instituição Educacional – UNIMEP –, que a
existência de crises internas ocasionadas por crises externas, ou seja, crises das
Instituições de Ensino oriundas das crises da Igreja:

A crise, portanto, não é só financeira e nem se origina dentro da


UNIMEP. Vem de fora, brota no interior da “nova” Igreja Metodista,
mostra sua face no Concílio Geral com a rejeição ao ecumenismo27 e
abando do CONIC e prossegue com o desmonte de pastorais e a nova
postura autoritária e intervencionista do COGEIME com o mais irrestrito
apoio do Colégio Episcopal, contra toda rica tradição ecumênica e
democrática do metodismo brasileiro de que a construção do projeto
UNIMEP tem sido vigoroso testemunho.
Considero a UNIMEP a última trincheira na luta de resistência, não à
Igreja Metodista profética e compromissada a que pertenço e amo, com
a qual temos todos nós convivido ao longo destes muitos anos e que
Piracicaba conhece bem, mas a uma nova tendência avassaladora no
mercado da fé e que já não é tão estranha no protestantismo brasileiro,
dado o estrago que vem realizando. A crise, portanto, não é originalmente
da UNIMEP, veio de fora, com todos os seus estranhos métodos e
objetivos (BOAVENTURA, 2010, p. 51).
Vê-se nesse relato o fato claro de que a Igreja e suas instituições de ensino
navegam sobre ondas e ventos doutrinários que sopram segundo as incertezas dos acertos
e erros das políticas conciliares e das eclesiologias que deles podem resultar. As
incertezas aqui podem ser compreendidas tanto pela duração desses períodos quanto pelo
rumo que podem dar à Igreja e às suas instituições.

27
Boaventura se refere às decisões do 19º CONCÍLIO GERAL DA IGREJA METODISTA que ocorreu
em 2006.

125
Em A Igreja Metodista no Brasil, suas universidades, escolas e igrejas diante da
temporalidade pós moderna, Renders aponta para a existência de uma nova
temporalidade que impacta toda a estrutura eclesiástica e educacional. Para o autor, há
uma aceleração dos processos da vida que incidem sobre o modo de ser Igreja, assim
como o modo de fazer educação, por isso, a constatação de que os processos que
envolvem estas instituições são cada vez mais tensos e em algumas vezes conflitantes:

A Igreja Metodista no Brasil desenvolveu seu carisma institucional pelo


anúncio do evangelho (=evangelização), por pôr o evangelho em ação
(ação social) e pela educação (eclesiástica, teológica e secular). Essa
vocação está sob fortes pressões – tanto em nível eclesiástico como nas
instituições de ensino –, pressões parcialmente resultantes das dinâmicas
de uma aceleração de tudo que se desconectou dos ritmos da vida
(RENDERS, 2014, p. 63).
Essas citações evidenciam de forma concreta e histórica a existência de tensões e
situações que, constantemente, influenciam a relação Igreja-Educação28. A intenção aqui
não é a de fazer conjecturas sobre os fatos em si, mas de demonstrar que as relações
institucionais entre ambas as instâncias são perpassadas por motivações particulares a
cada contexto e situação.

3.3 - A Igreja Metodista e suas instituições de ensino a partir dos


três tipos puros de dominação legítima - um retrato

Em aula, a propósito do termo “realidade”, a professora Raquel Gandini fez


menção à alegoria do “retrato”. Segundo ela, ao registrar determinada cena, o fotógrafo
elege um ângulo restrito conforme sua livre escolha, que poderá estar vinculado a um
interesse específico ou à mera intuição artística. Ao enquadrar a cena, o profissional
captará parte do cenário, direcionando a visão de quem irá observá-lo, no entanto, a
paisagem, ainda assim, será maior que a observação do artista, já que a totalidade da
imagem não pode ser contemplada nas limitações do retrato. Em certa medida, esta
alegoria complementa o pensamento weberiano de situação, ao prever que uma análise
estará limitada a duas questões distintas: à formação sociológica de um momento
histórico que compõe a situação, e ao enquadramento dado ao retrato que a registrará.

28
Igreja e suas instituições de ensino.

126
Dessa maneira observamos que a análise dos tipos de dominação que regem a
Igreja e suas instituições de ensino será, em todos os casos, imprecisa, ou minimamente
parcial, uma vez que ela somente poderá acontecer através de retratos distintos que
considerem situações específicas da história e da relação das instituições. Cada pesquisa
poderá ter enfoque característico, localizado graças aos dados históricos, tensões ou
interesses. É o movimento desses fatores que distinguirá o tipo de dominação de cada
momento de uma e de outra instituição, bem como observará quais tensões foram
ocasionadas pelas influências das crises internas e externas nessas relações.

Pela existência dessa dinâmica, que envolve questões tão diversas, torna-se
complexa a constatação de uma dominação predominante. Se possível, em certos
momentos, retratar a Igreja como uma instituição de dominação predominantemente
tradicional, noutro instante, carismática, noutro, legal. Não obstante, ela poderá ser
tradicional e carismática, ou ainda, legal e carismática. Da mesma forma será com a
instituição educacional. Tudo dependerá da situação, da composição das constelações de
interesses que organizam determinado cenário, e que poderá ser “fotografado” também,
com o devido rigor metodológico, a partir de interesses e situações de quem observa.

Nosso intuito, no entanto, não é o de estabelecer um único perfil sociológico


dessas instituições, mas o de promover a compreensão destas possibilidades de análise,
em especial, por meio da teoria weberiana dos tipos de dominação legítima. Com isso,
torna-se plausível entender que tanto o tipo de dominação quanto a própria concessão de
legitimidade a determinada liderança ocorrerá usando os termos do próprio Weber,
através destas “situações de interesses”, ou “constelações históricas e políticas”, que
regem a realidade particular de cada instituição.

127
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Iniciamos este trabalho destacando nossa percepção de que a pesquisa acadêmica


sobre a relação de Igrejas e Escolas até então desenvolvida, quase que em sua totalidade,
foi realizada através da história, teologia ou pedagogia e que seria igualmente adequado
este estudo a partir da análise sociológica. A observação se deu pela compreensão de que
o estudo das instituições confessionais de educação secular ficou, ao longo do tempo,
restrito à pesquisa acadêmica ligada ao ambiente religioso, como se estas escolas
estivessem à parte da sociedade, não dependentes das nuances sociais e políticas do
mundo que as cerca. Mesmo sem objetivar declaradamente, pudemos demonstrar por
meio deste trabalho que tanto a Igreja Metodista quanto suas Instituições de Ensino
receberam influências políticas, econômicas ou de caráter religioso que de tempos em
tempos realinharam seus propósitos e direções. Consideramos que isto foi possível devido
a utilização de uma análise sociológica que, em nosso caso, foi fundamentada nos
pressupostos teóricos de Max Weber.

Faz-se necessário reiterar também que esta análise foi admissível através do
estudo dos documentos norteadores de ambas instituições, a saber: o Plano de Vida e
Missão, para a apreciação da Igreja Metodista e as Diretrizes para a Educação da Igreja
Metodista, para o exame de suas Instituições de Ensino. Estes foram a linha mestra de
análise considerando que constituem das referências oficiais da Igreja para o desempenho
de sua vida eclesiástica e educacional.

Desta maneira pudemos perceber a complexidade destas realidades que seria


ainda maior se considerássemos fatores outros como questões geográficas, culturais e
econômicas. Assim, foi possível observar que tanto a Igreja quanto a Escola são
organizações dinâmicas, construídas por ocorrências diversas demais para se mensurar,
em uma única análise, toda a heterogeneidade compreendida.

Com este propósito, elencamos no primeiro capítulo os pressupostos teóricos


weberianos destacando um a um temas que julgamos relevantes para nossa pesquisa.
Buscamos nas conceituações de Weber sobre burocracia, carisma, disciplina, religião e
os três tipos puros de legitimação de autoridade a fundamentação necessária para
caracterizar sociologicamente as instituições estudadas. É necessário destacar que não nos
aprofundamos em algumas destas referências como, por exemplo, burocracia, carisma,

128
religião, o que provavelmente abriria possibilidade para outras reflexões sobre a relação
estudada, no entanto, consideramos que esta tarefa ampliaria nosso foco em demasia o
que, talvez, trouxesse prejuízo à nossa pesquisa. Mesmo assim, entendemos que o
detalhamento desses temas subsidiou favoravelmente esta análise.

No segundo capítulo caracterizamos as instituições estudadas a partir dos


pressupostos weberianos, especialmente os Três Tipos Puros de Dominação Legítima,
onde, através do Plano de Vida e Missão e Diretrizes para a Educação da Igreja Metodista,
analisamos em que medida uma e outra instituição pode ser considerada “legitimada” pela
autoridade Legal (burocrática), Tradicional ou Carismática. Desta maneira observamos
que, segundo os documentos, as instituições podem se classificar pelas três conceituações.
Tanto o Plano de Vida e Missão quanto as Diretrizes para a Educação da Igreja Metodista
demonstram características burocráticas, ou seja, regulam e normatizam procedimentos,
estabelecendo ordens e critérios para o desempenho organizacional das instituições,
estipulando parâmetros processuais segundo decisões de órgãos superiores. Isto
evidenciou uma legitimidade legal – burocrática que regimenta e dirige a Igreja e as
Instituições de Ensino. Da mesma forma, pudemos constatar que os documentos
sinalizam o caráter tradicional das instituições através do reconhecimento de uma
legitimidade atribuída aos cargos, embora se perceba que no caso da Igreja esta tradição
seja influenciada pelo carisma mais do que na Instituição de Ensino, enquanto que na
Educação ela resulta mais de aspectos burocráticos que na Igreja. Isto demonstrou que a
legitimidade tradicional, mesmo que de maneiras distintas, ocorre nos dois segmentos.
Nesta mesma análise averiguamos que a legitimidade através do carisma incide com
maior ou menor grau, com formas adequadas a cada contexto. Na Igreja, como seria de
se esperar, o carisma é místico, sobrenatural e transcendente. Nela, o reconhecimento, a
legitimidade da autoridade, estão vinculados à manifestação do poder inexplicável,
proveniente da divindade. Na escola, diferentemente, o carisma depende da consideração
pública da capacidade transcendente do saber. De certa maneira, o carisma educacional é
burocrático, pois, ao mesmo tempo depende de um dom – uma dádiva superior – que
capacita para o saber e de um processo burocrático de reconhecimento acadêmico,
vinculado a titulação e preparo intelectual. Com isto pudemos caracterizar a Igreja e a
Educação Metodista a partir de uma leitura weberiana.

No terceiro capítulo, aprofundamos a compreensão sobre o significado dos


conceitos até então apresentados, exemplificando, através de alguns registros históricos

129
da relação entre a Igreja e suas Instituições de Ensino, a incidência destas características.
Elaboramos um exercício por meio dos tipos puros de legitimação de autoridade para
demonstrar a existência de variações que, no decorrer das interações entre estas
instituições, facilitaram ou dificultaram este processo. Estas alterações resultantes dos
movimentos sociológicos destas organizações nos levaram à conclusão que tanto a Igreja
quanto as Instituições de Ensino não podem ser consideradas como instituições inertes,
como se estivessem paralisadas diante das referências documentais que as balizam. Antes,
demonstraram que se desenvolvem a partir de movimentos que ora estão influenciados
pelas demandas da sociedade, ora estão influenciadas por si mesmas. Verificamos que a
legitimidade que as direciona vive em constante oscilação, ora mais carismática, ora mais
burocrática, ora mais tradicional. Esta intranquilidade pode ser explicada por vários
fatores que sobrevivem na religiosidade contemporânea e no próprio metodismo – que é
o nosso objeto de estudo – porém, da mesma forma, borbulham nas movimentações
sociais, como foi exemplificado no caso da UNIMEP diante de tensões políticas vividas
no decorrer da história de nosso país.

Portanto, seria imprudente identificarmos uma ou outra instituição a partir de um


só caráter de legitimidade, como se, por exemplo, a Igreja fosse regida somente pelo
carisma e a escola somente pela burocracia. Ocorre variações que as desconecta.
Enquanto a Igreja, num instante, pode estar mais sujeita a um caráter específico, devido
à motivação de determinada liderança, de um bispo ou algum grupo característico com
tendências conservadoras, fundamentalistas, tradicionais, progressistas ou carismáticas, a
Escola pode se encontrar num estado diferente, com influencias pedagógicas ou políticas
que a conduzam para uma direção oposta à da Igreja. É neste sentido que o trabalho nos
mostra a independência filosófica de procedimento de uma e de outra. Apesar de serem
“mãe e filha”, elas nem sempre orbitam em torno do mesmo referencial, por questões que
vão além do desejo e da referência documental de ambas. Como bem assinalou o Prof.
Elias Boaventura, elas possuem “naturezas” distintas e, portanto, objetivos que nem
sempre coincidem.

Desta maneira, faz-se necessária uma compreensão sociológica para as


considerações desta análise. Em diversos momentos deste trabalho enfatizamos que nosso
propósito não seria o de elaborar juízo de valor, ou seja, avaliar em que sentido uma ou
outra instituição é ou não coerente com os documentos balizadores ou mesmo com a
outra. Não foi nosso propósito avaliar acertos e desacertos da Igreja ou das Instituições

130
de Ensino sob qualquer referência que possa ter sido apresentada nesse trabalho. Nosso
objetivo maior foi demonstrar através de um exercício acadêmico a possibilidade e a
importância de se utilizar a sociologia como instrumento de análise também neste
ambiente específico que envolve educação e religião.

Reiteramos que a análise sociológica tem por finalidade o registro de fatos


históricos, como foi demonstrado anteriormente através da alegoria do retrato e da
situação. O retrato é o registro estanque de um determinado momento que, por sua vez, é
fruto de uma situação elaborada por um conjunto de fatores históricos, sociais,
geográficos e culturais que se cruzaram de maneira exata e momentânea e que,
dificilmente se formará do mesmo modo novamente. O retrato é limitado duplamente: ao
momento, que é praticamente único e à escolha do fotógrafo que elege, propositalmente
ou não, um ângulo, um foco que direciona a interpretação do observador. A situação é
ocasionada pela infinidade de fatores que rege a vida e pelo que o próprio Weber aponta
como uma “constelação de interesses”. É esta constelação que movimenta a vida, a
sociedade e a condução de qualquer instituição. Nela estão dispostos os anseios sociais,
institucionais e pessoais que se mobilizam e se alternam na dinâmica das necessidades.

É imprescindível salientar que os momentos históricos que movem a Igreja e suas


Instituições de Ensino alternam-se em tempos distintos segundo as influências que os
norteiam. Em uma dada situação, a Igreja pode se encontrar mais carismática do que
burocrática, ou mais tradicional do que carismática, por exemplo. Enquanto isto, as
Instituições de Ensino – e deveríamos considerar também a multiplicidade de fatores que
incide particularmente sobre cada uma delas, por diversos motivos – poderiam estar num
outro momento, sob outra influência ou interesse. Este movimento tem o poder de alternar
significativamente as imagens dos diversos “retratos” que a história consegue registrar.

Consideramos também adequados questionamentos sobre qual a validade dos


documentos apresentados como referenciais de nossa tese, uma vez que estão passíveis
de análise quanto a sua validade na realidade intrínseca do relacionamento cotidiano entre
a Igreja e suas Instituições de Ensino. Apesar de considerarmos cabíveis possíveis
indagações a este respeito, reiteramos que mesmo diante dessa probabilidade, tratam-se
de documentos oficiais, analisados, reconhecidos e aprovados pelo Concílio Geral da
Igreja, que é o seu órgão máximo, capaz e responsável por decidir todos os
encaminhamentos da mesma. Consideramos a este respeito admissível e necessária uma
outra pesquisa que possa dedicar-se na mensuração da validade e realidade dos mesmos,

131
na análise e na relação dos vários documentos da Igreja entre si e na coerência e aplicação
à Igreja e as Instituições contemporâneas, no entanto, não foi este o nosso propósito.
Provavelmente, este trabalho possa provocar estas ações e outras tantas que vislumbrem
a relação das Instituições através de outros pressupostos.

Outra indagação possível seria quanto a necessidade de um aprofundamento


histórico que contemplasse o contexto político interno e externo da Igreja na ocasião da
elaboração dos documentos utilizados. A este respeito, nossa compreensão é de que nesta
tese estes documentos são utilizados como parâmetros para um exercício acadêmico que
demonstra a possibilidade de uma análise sociológica do tema apresentado. Caso nos
debruçássemos na análise dos documentos em si, nosso trabalho seria redirecionado,
perdendo seu foco principal.

Da mesma maneira, podemos indicar outras questões que, embora pertinentes ao


tema, não fizeram parte de nosso propósito:

- em que medida a Igreja Metodista, como instituição, realmente está interessada


em servir a sociedade, promover a vida, dignificar as pessoas e anunciar os valores do
Reino de Deus através da tarefa educacional, como regem seus documentos oficiais?

- em que medida a Igreja Metodista vê nas Instituições somente um propósito


missionário, como afirmam os documentos, uma vez que sempre que as Instituições
enfrentam dilemas financeiros e deixam de repassar recursos para a Igreja, retornam, no
ideário eclesiástico, as propostas de dispor das mesmas, inclusive com a possibilidade de
ganhos monetários exorbitantes?

- em que medida a Igreja, realmente, entende a tarefa educacional como missão, e


não somente como fonte financeira para suprir seus projetos e demandas?

- em que medida as Instituições de Ensino, através de seus gestores e conselheiros,


estão comprometidas com os documentos da Igreja no sentido de serem agências de
promoção dos valores do Reino de Deus e não somente agências de lucro financeiro que
tratam a Educação como mero comércio?

Estes e outros questionamentos merecem a atenção do trabalho de pesquisa


acadêmica, uma vez que também possibilitam a análise da relação entre as instituições
apontadas. Portanto, nossa elaboração poderia voltar-se para questões como estas, ou
mesmo dedicar-se na construção de um registro sociológico, restrito a determinada
situação que envolveria a relação da Igreja com suas Instituições de Ensino. Contudo, não

132
foi este nosso propósito, e, ao nosso ver, o que este trabalho demonstrou, foi a viabilidade
desses registros que, embora destacados em situações distintas, ajudam quanto à
possibilidade de analisar sociologicamente a condução histórica desta relação.

133
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Cohn. Rio de Janeiro: VGuedes Multimídia, 2008.

WEBER, Max. Ensaios de Sociologia. 5ª Edição. LTC, 2008.

136
WEBER, Max. Economia e Sociedade. Fundamentos da Sociologia compreensiva.
Tradução Regis Barbosa e Karen Elsabe Barbosa. Revisão técnica de Gabriel Cohn. –
Brasilia, DF: Editora Universidade de Brasília, 1991.

WEBER, Max. Economia e Sociedade. Fundamentos da Sociologia compreensiva.


Tradução Regis Barbosa e Karen Elsabe Barbosa. Revisão técnica de Gabriel Cohn. –
Brasilia, DF: Editora Universidade de Brasília, 2012.

WEBER, Max. Conceitos Básicos de Sociologia/ Max Weber tradução de Rubens


Eduardo Ferreira Frias e Gerard Georges Delaunay. São Paulo, 2002.

WEBER, Max. A “objetividade” do conhecimento na ciência social e na ciência


política, In: Metodologia das ciências sociais - Parte 1. 4. ed. São Paulo: Editora da
Universidade Estadual de Campinas, 2001.

137
ANEXO 1
PLANO PARA A VIDA E A MISSÃO

Art. 24 - O XIII Concílio Geral aprovou o seguinte Plano para a Vida e a Missão da Igreja
Metodista: O “Plano Para a Vida e a Missão da Igreja” é continuação dos Planos
Quadrienais de 1974 e 1978 e conseqüência direta da consulta nacional de 1981 sobre a
Vida e a Missão da Igreja, principal evento da celebração de nosso 50º aniversário da
Autonomia.

A experiência do Colégio Episcopal e de vários segmentos da Igreja Metodista nestes


últimos anos indica que o metodismo brasileiro está saindo da profunda crise de
identidade que abalou nossa Igreja após a primeira metade da década dos sessenta.

Estas experiências nos têm mostrado que a Igreja necessita de um plano geral, que inspire
sua vida e programação, e que não será dentro do curto espaço de um quadriênio, que
corrigiremos os antigos vícios que nos impedem caminhar. Esse fato esteve claro na
semana da consulta Vida e Missão, e no documento que ela produziu. Ao adotarmos
aquele documento como a base do novo plano, estamos propondo ao Concílio não mais
um programa de ação para o quadriênio, mas linhas gerais que deverão orientar toda a
ação da Igreja nos próximos anos, enquanto necessário, devendo ser avaliado
periodicamente.

Deveremos continuar o processo que permitirá que tudo na Igreja se oriente para a
Missão. A Igreja deverá experimentar de modo cada vez mais claro que sua principal
tarefa é repartir fora dos limites do templo o que ela de graça recebe do seu Senhor. Por
isto estamos sendo convidados ao desafio tipicamente Wesleyano da santificação.
Certamente aqui estamos diante da necessidade de revisarmos profundamente nossa
prática de piedade pessoal e a necessidade de revermos nossos atos de misericórdia,
entendidos como ação concreta de amor a favor dos outros. Estes são os dois caminhos
que traduzem a visão de Wesley sobre a santificação na Bíblia.

Missão e santificação só podem gerar a unidade. Deveremos poder encontrar a unidade


naquilo que é básico e essencial para que possamos viver a diversidade dos dons que Deus
nos concede.

A adoção séria deste plano nos levará necessariamente ao crescimento em todas as


dimensões de nossa vida de serviço e culto. O novo surto de crescimento que

138
experimentamos será acelerado na medida em que fizermos convergir todos os nossos
esforços movidos por um plano comum. Movidos por esta esperança apresentamos à
Igreja o plano que Deus nos inspirou nestes últimos anos de estudos, tentativas concretas
de mudança, e rexame de nossa tradição.

A) HERANÇA WESLEYANA

ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA UNIDADE METODISTA

a) O Metodismo baseado nas Sagradas Escrituras, aceita completa e totalmente as


doutrinas fundamentais da Fé Cristã, enunciadas nos Credos promulgados pelos Concílios
da Igreja dos primeiros quatro séculos da Era Cristã. Esta aceitação se traduz na vida do
crente na prática cotidiana do amor a Deus e ao próximo ( Jo. 13.34-35; Dt 6.5), como
resposta à graça de Deus revelada em Jesus Cristo. Ela se nutre em autêntica vida de
adoração ao Senhor e de serviços ao próximo ( Jo 4.41-44). De forma alguma o
Metodismo confunde a aceitação das doutrinas históricas do cristianismo com as atitudes
doutrinárias intelectualistas e racionalistas, nem com a defesa intransigente, fanática e
desamorosa da ortodoxia doutrinária. “No essencial, unidade; no não essencial; liberdade;
em tudo, caridade” ( Jo 17.20-23, Ef; Ef. 2.14-16).

b) O Metodismo afirma que a vida cristã comunitária e pessoal deve ser a expressão
verdadeira da experiência pessoal do crente com Jesus Cristo, como Senhor e Salvador
(Ef. 3.14-19). Através do testemunho interno do Espírito sabemos que somos feitos filhos
de Deus, pela fé no Cristo que nos salva, nos liberta, nos reconcilia, e nos oferece vida
abundante e eterna ( Rm 8.1-2, 14-16; Jo 10.10; II Co 5.18-20).

c) O Metodismo proclama que o poder do Espírito Santo é fundamental para a vida da


comunidade da fé, tanto na piedade pessoal como no testemunho social ( Jo 14.16-17).
Somente sob a orientação do Espírito Santo pode a Igreja responder aos imperativos e
exigências do Evangelho, transformando-se em meio de graça significativo e relevante às
necessidades do mundo ( Jo 16.7-11; At 1.8, 4.18-20).

d) O Metodismo requer vida de disciplina pessoal e comunitária, expressão do amor a


Deus e ao próximo, a fim de que a resposta humana à graça divina se manifeste através
do compromisso contínuo e paciente do crente com o crescimento em santidade ( I Pe
1.22;Tt 2.11-15). A santificação do cristão e da Igreja em direção a perfeição cristã é
proclamada pelos metodistas em termos de amor a Deus e ao próximo ( Lc 11.25-28) e

139
se concretiza tanto em atos de piedade ( participação na Ceia do Senhor, leitura
devocional da Bíblia, prática da oração, do jejum, participação nos cultos, etc., At 2.42-
47) como em atos de misericórdia ( solidariedade ativa junto aos pobres, necessitados e
marginalizados sociais, At 2.42-47). Os metodistas como Wesley, crêem que tornar o
cristianismo uma religião solitária, é, na verdade, destruí-lo ( Lc 4.16-19, 6.20-21; Rm
14.7-8). e) O Metodismo caracteriza-se por sua paixão evangelística, procurando
proclamar as boas-novas de salvação a todas as pessoas, de tal sorte que o amor e a
misericórdia de Deus, revelados em Jesus Cristo, sejam proclamados e aceitos por todos
os homens e mulheres (I Cor. 1.22-24). No poder do Espírito Santo, através do
testemunho e do serviço prestados pela Igreja ao mundo em nome de Deus, da maneira
mais abrangente e persuasiva possíveis, os metodistas procuram anunciar a Cristo como
Senhor e Salvador ( I Co 9.16; Fp 1.12-14; At 7.55-58). a) O Metodismo demonstra
permanente compromisso com o bem estar da pessoa total, não só espiritual, mas também
seus aspectos sociais ( Lc 4.16-20). Este compromisso é parte integrante de sua
experiência de santificação e se constitui em expressão convicta do seu crescimento na
graça e no amor de Deus. De modo especial os metodistas se preocupam com a situação
de penúria e miséria dos pobres. Como Wesley, combatem tenazmente os problemas
sociais que oprimem os povos e as sociedades onde Deus os tem colocado, denunciando
as causas sociais, políticas, econômicas e morais que determinam a miséria e a exploração
e anunciando a libertação que o Evangelho de Jesus Cristo oferece às vítimas da opressão.
Esta compreensão abrangente da salvação faz com que os metodistas se comprometam
com as lutas que visam a eliminar a pobreza e a exploração e toda a forma de
discriminação ( Tg. 5.1-6; Gl.5.1). b) O Metodismo procura desenvolver de forma
adequada a doutrina do sacerdócio universal de todos os crentes ( I Pe 2.9). Reconhece
que todo o povo de Deus é chamado a desempenhar com eficácia na Igreja e no mundo,
ministérios através dos quais Deus realiza o seu propósito, ministérios essenciais para a
evangelização do mundo, para a assistência, nutrição e capacitação dos crentes, para o
serviço e o testemunho no momento histórico em que Deus os vocaciona ( I Co 12.7-11).
c) O Metodismo afirma que o sistema conexional é característica fundamental e básica
para a sua existência, tanto como movimento espiritual, quanto como instituição
eclesiástica. (EF. 1.22-23). Deus lhe deu esta forma de articulação unificadora para
cumprir a vocação histórica de : “reformar a nação particularmente a Igreja, e espalhar a
santidade bíblica sobre toda a terra” ( Wesley ) ( At 17.4-6; Jo 17.17-19). d) O Metodismo
é parte da Igreja Universal de Jesus Cristo. Procura preservar o espírito de renovação da

140
Igreja dentro da unidade conforme a intenção da reforma Protestante do século XVI e do
Movimento Wesleyano na Igreja Anglicana do século XVIII, que, por circunstâncias
históricas, resultaram em divisões. Por isto, dá sua mão a todos cujo coração é como o
seu e busca no Espírito os caminhos para o estabelecimento da unidade visível da Igreja
de Cristo ( Jo. 17.17-23). e) O Metodismo afirma que a vivência e a fé do cristão e da
Igreja se fundamentam na revelação e ação da Graça Divina. A Graça Divina é o
fundamento de toda a revelação e a ação históricas de Deus e se manifesta de forma
Preveniente, Justificadora e Santificadora, na vida do crente e da Igreja, através da fé
pessoal e comunitária ( Tt 2.11-15). A vivência cristã se fundamenta na fé ( Rm 1.16-17).
Fé obediente, amorosa e ativa, centralizada na ação histórica de Deus, na pessoa, vida e
obra de Cristo e na ação atualizadora do Espírito Santo ( Hb 1.1-3, 12.1-2). A palavra de
Deus, testemunha da ação e da revelação de Deus, é elemento básico para o
despertamento e a nutrição da fé ( II Tm 3.15; Lc 24.25-27; Gl 3.22). f) O Metodismo
afirma que a Igreja, antes de ser organização, instituição ou grupo social, é um Corpo, um
Organismo vivo, uma Comunidade de Cristo ( Ef 1.22-23; I Co 12.27). Sua vivência deve
ser expressa como uma comunidade de fé, adoração, crescimento, testemunho, amor,
apoio e serviço ( At 2.42-47; Rm 12.9-21). Nesta comunidade os metodistas são
despertados, alimentados, crescem, compartilham, vivem juntos, expressam sua vivência
e fé, edificam o Corpo de Cristo, são equipados para o serviço e o expressam junto das
pessoas e das comunidades ( I Co 12.16-26; II Co 9.12-14; Ef 4.11-16). g) O Metodismo
afirma o valor da prática e da experiência da fé cristã. Esta prática e experiência são
confirmadas pelo Palavra de Deus, pela tradição da Igreja, pela razão e pela comunidade
da Igreja ( At 16.10). A prática da fé é característica básica do metodismo, pois ele é um
“cristianismo prático”. Este cristianismo prático tem como fonte de conhecimento de
Deus a natureza, a razão, a tradição, a experiência cristã, a vivência na comunidade da fé,
sempre confrontadas pelo testemunho bíblico, que é

o elemento básico da revelação divina, interpretada a partir de Cristo ( II Tm 3.14-17; II


Ts 2.13-15; I Co 15.1-4).

B) ENTENDENDO A VONTADE DE DEUS

1- A Missão de Deus no mundo é estabelecer o seu reino. Participar da construção do


Reino de Deus em nosso mundo, pelo Espírito Santo, constitui-se na tarefa evangelizante
da Igreja. 2- O Reino de Deus é o alvo do Deus Trino e significa o surgimento do novo
mundo, da nova vida, do perfeito amor, da justiça plena, da autêntica liberdade e da

141
completa paz. Tudo isto esta introduzido em nós e no mundo como semente que o Espírito
Santo está fazendo brotar, como lemos em Rm 8.23:nós temos as primícias do Espírito,
aguardando a adoção de filhos, ou ainda em II Co 7.21-22: “mas aquele que nos confirma
convosco em Cristo, e nos ungiu, é Deus, que também nos selou e nos deu o penhor do
Espírito em nossos corações”. 3- Jesus iniciou a sua Missão no mundo com a pregação:
“O tempo está cumprido e o Reino de Deus está próximo, arrependei-vos e crede no
Evangelho ”Mc 1.15. 4- O propósito de Deus é, reconciliar consigo mesmo o ser humano,
libertando-o de todas as coisas que o escravizam, concedendo-lhe uma nova vida à
imagem de Jesus Cristo, através da ação e poder do Espírito Santo, a fim de que, como
Igreja, constitua neste mundo e neste momento histórico, sinais concretos do Reino de
Deus. 5- A missão é de Deus - Pai, Filho e Espírito Santo. O objetivo é construir o Reino
de Deus. O seu amor é a força motivadora de sua presença e ação. “Ele trabalha até agora”
( Mt 28.19; Jo 3.16): a) criando as pessoas e comunidades, dando-lhes condições para
viver, trabalhar e construir suas vidas como pessoas e como comunidades ( Gn 1.26-31;
Gn 2; II Co 5.17); b) Ajudando as pessoas e comunidades a superar seus conflitos e
pecados, trabalhando juntos e participando da vida abundante, concedida em Cristo por
meio da reconciliação ( Gn 3.8-21; Gn 12.1- 13; Jo 10.10; II Co 5.19); c) possibilitando
as pessoas e comunidades a se encontrarem como irmãos e irmãs, reconhecendo e
aceitando como Pai ( Mt 6.8-10) ; d) abrindo, pela ação do Espírito Santo, novas
possibilidades e fontes de vida ( At 2.17-21; I Co 12.4-11; Rm 12.6-8); e) sarando as
pessoas e as instituições, podando delas o que não convém, por meio de seu juízo e graça
( Ef 2.11-21; Fp 4.2-9; Jo 15); f) envolvendo todas as pessoas e comunidades e todas as
coisas neste seu trabalho. 6- Na História, e especialmente na do povo de Israel, Deus
revela a sua ação salvadora a favor das pessoas e do mundo. A concretização plena desta
ação deu-se na encarnação de Jesus Cristo. Ele assumiu as limitações humanas, trouxe as
boas-novas do Reino de Deus, confrontou os poderes do mal, do sofrimento e da morte,
vencendo-os em sua ressurreição ( Hb 1.1-14). 7- Na construção da vida e na realização
desta obra, as pessoas e comunidades sofrem com o domínio das forças satânicas e do
pecado. O pecado e o domínio destas forças manifestam-se de diferentes maneiras em
pessoas, grupos e instituições impedindo a vida abundante e contrariando a vontade de
Deus. 8- Através de Jesus Cristo, sua vida, trabalho e mensagem, sua morte, ressurreição
e ação redentora podemos compreender a ação de Deus no passado; as oportunidades à
esperança da vida plena no futuro que Ele nos oferece no presente, e a possibilidade de
se participar na construção deste futuro agora. É de Jesus Cristo que vem o poder para

142
esta participação. 9- A Igreja, fiel a Jesus Cristo, é sinal e testemunha do Reino de Deus.
É chamada a sair de si mesma e se envolver no trabalho de Deus, na construção do novo
ser humano e do Reino de Deus. Assim, ela realiza sua tarefa de evangelização ( Hb 2.18
). 10- A Igreja Metodista no Brasil é parte da Igreja Metodista na América Latina e no
mundo, ramo da Igreja Universal de Nosso Senhor Jesus Cristo. Sensível à ação do
Espírito Santo, reconhece-se chamada e enviada a trabalhar com Deus neste tempo e lugar
onde ela está. Neste tempo, fazemos uma escolha clara pela vida, manifesta em Jesus
Cristo, em oposição à morte e a todas as forças que a produzem. C) NECESSIDADES
E OPORTUNIDADES

Na realização do trabalho de Deus, a Igreja Metodista reconhece grandes necessidades


que são também desafios da missão: 1- Há necessidade de estar em comunhão com Deus,
ouvir e atender a sua voz e de se fortalecer no poder de Deus ( I Jo 1.1-4; Co 11.17-34);

2- Há necessidade de conhecer a Igreja, especialmente a igreja local, descobrir suas


possibilidades e seus dons e valorizar seus ministérios para alcançar a participação total
do povo na missão de Deus ( I Co 12.1-30; Ef 4.5); 3- Há necessidade de conhecer o
bairro, a cidade, o campo, o país, o continente, o mundo e os acontecimentos que os
envolvem, porque e como ocorrem e suas conseqüências. Isto inclui conhecer a maneira
como as pessoas vivem e se organizam, são governadas e participam politicamente, e
como isto pode ajudar ou atrapalhar a manifestação da vida abundante; 4- Há necessidade
de apoiar todas as iniciativas que preservem e valorizem a vida humana ( I Sm 2.1-10; Lc
1.46-55); 5- Há necessidade de denunciar por palavras e pela prática, todas a forças e
instrumentos que oprimem e destroem a vida humana ( Sl 82, 42.1-9, 49.1-6,50.13-53.12;
Is 1.17,58.6-7,61.1-3,65.20-23; Tg 5.1-6); 6- Há necessidade de entender e unir no
trabalho, de modo positivo, as igrejas locais, a Igreja e as demais Igrejas cristãs ( Jo 17);
7- Há necessidade de entender e superar as tensões existentes entre pastores e leigos,
liderança local e demais membros, liderança em todos os níveis. Isto deve dar-se por meio
de uma confrontação que expresse amor e justiça, unindo a todos num trabalho
participativo ( I Co 3.4-11, 3.21-23, 12.4-11). A missão acontece quando a Igreja sai de
si mesma, envolve-se com a comunidade e se torna instrumento da novidade do Reino de
Deus ( Mt 4.16-24, 2.18-20). A luz do conhecimento da Palavra de Deus, em confronto
com a realidade discernindo os sinais do tempo presente a Igreja trabalha, assumindo os
dramas e esperanças do nosso povo ( I Co 5.17-21; Ap 21.1-8; Is 43.14-21; II Tm 2.9-
10).

143
D ) O QUE É TRABALHAR NA MISSÃO DE DEUS?

• É trabalhar para o Senhor do Reino num mundo espremido pelas forças do pecado e da
morte, participando, como comunidade, com dons e serviços para o nascer da vida ( Jr
1.4-10; Fp 1.18-26, 3.10- 11; II Tm 1.10; I Jo 3.14); • É somar esforços com outras pessoas
e grupos que também trabalham na promoção da vida ( Mc 9.38-41 ; At 10.28, 15.8-11).

E ) COMO PARTICIPAR NA MISSÃO DE DEUS?

A Igreja participa na missão e cresce em santificação, o que acontece quando produz atos
de piedade e obras de misericórdia. Os atos de piedade são principalmente o culto e o
cultivo da piedade pessoal e comunitária e as obras de misericórdia são preferencialmente
o trabalho que valoriza e realiza a pessoa enquanto constrói em amor e justiça, a nova
comunidade e o Reino de Deus. Assim, a Igreja participa na Missão e cresce quando:

Cultua a Deus

• no oferecimento de nós mesmos, em comunidade, na adoração, no louvor, na confissão,


na afirmação da fé, na consagração e no compartilhar de nossas experiências e dons ( Rm
12.1-2; I Co 14.26); • no recebimento da palavra, de renovação, de alimento, de
fortalecimento mútuo e do poder de Deus ( Cl 3.16; Is 1.6, 2.13). Recebemos a vida de
Deus e a ofertamos novamente a Deus. A celebração da vida por meio de Jesus Cristo se
torna visível no seu início pelo batismo e sua continuidade através da Proclamação da
Palavra e da Ceia do Senhor, que são atos centrais do culto e nele celebramos a vitória do
Reino de Deus sobre as forças do mal e da morte ( I Co 11.26; Lc 22.18; Mt 26.29; Jo
14.16-18, 25-27; Ap 1).

O culto deve:

• Ser amplamente participativo, onde a comunidade tenha vez e voz; • ser inserido no dia-
a-dia da comunidade onde a Igreja está localizada; • expressar as angústias, lutas, alegrias
e esperanças do povo, ofertando-as a Deus ( I Co 14.26; Cl 3.16- 17; Sl 150; Cl 3.17; Ef.
5.19-21; Mt 6; Sl. 71; Rm 8.15-39; Ef 3.14-17, 20-21). O culto continua através da oração
e meditação pessoais, da família e de grupos. Ele se completa no oferecimento da vida
em atos de amor e justiça ( Ef 6.10-20; Dt 6.4-9 ; Sl 15).

Ser uma oportunidade para “apelos” a todos os homens e mulheres para aceitarem Jesus
Cristo como Salvador.

144
2- Aprende em comunidade

A Igreja participa na missão de Deus educando-se a partir:

• da vida prática aprendendo na experiência, uns com os outros, corrigindo-se e


descobrindo a ação de Deus na vida de cada dia; • do compartilhamento com outras
pessoas e grupos que preservam e valorizam a vida ( At. 2.42-47); • da Palavra de Deus,
buscando em conjunto, no confronto com os acontecimentos, alternativas que renovam a
vida ( Mt 7.24-27; Jo 5.39; 15.3, 14; 20; At 17.11-13); • da Doutrina da Igreja,
particularmente da herança metodista, descobrindo o valor histórico e atualizado de suas
expressões para a nossa situação.

3- Trabalha

O trabalho é algo próprio do ser humano porque é próprio do Criador. O trabalho pode
ser experiência de sofrimento ou de libertação. Nossa participação no Reino de Deus
renova a nossa compreensão acerca do trabalho . Seus resultados e seus benefícios torna-
se fontes de realização da vida pessoal e comunitária ( Jo 5.17;II Tm 2.6; I Co 15.58 ; II
Co 6.5ss, 11.22-27, Tg 5.4; I Tm 5.18; Gn 2.15).

Esta experiência nos leva a:

• concretizar nossos dons e ministérios como trabalho a serviço do Reino de Deus,


compartilhando com os outros a fé em Jesus Cristo como Senhor, Salvador e
Libertador ( Mt 25.14-30; I Co 12.6-7; Rm 12.3-8; Ef 4.7-16; Is 9.1-6; Mc 10.42-43); •
colocarmo-nos a favor de relações justas entre empregadores e empregados, estando ao
lado daqueles que são explorados em seu trabalho e daqueles que nem sequer conseguem
trabalhar ( Jr 22.13-19; Dt 24.14-15; Is 65.21-23; Am 2.6-7, Mt 25.40).

4- Usa ferramentas e métodos adequados.

Na experiência do trabalho no Reino de Deus vamos descobrindo a necessidade de


ferramentas apropriadas para a sua execução. Na Igreja e na comunidade hoje
encontramos novos desafios que exigem ferramentas adequadas. Uma destas, por
exemplo, é a participação de todos os membros da Igreja, homens e mulheres, nos
diferentes níveis de decisão ( At 16.9-10; At 13.1-3; Ef 4.1ss).

F) SITUAÇÕES NAS QUAIS ACONTECE A MISSÃO

A missão acontece na promoção da vida e do trabalho

145
• para que haja vida é necessário comunhão e reconciliação com Deus e o próximo, direito
à terra, habitação, alimentação, valorização da família e dos marginalizados da família,
saúde, educação, lazer, participação na vida comunitária, política e artística, e preservação
da natureza ( At 2.42; II Co 5.18-20; Jo 10.10, 15.5; I Jo 1.7); • para que haja trabalho, é
necessário haver, humanização do trabalho, melhor distribuição da riqueza, organização
e proteção do trabalhador, segurança, valorização, oportunidade para todos de salários e
empregos ( Êx 23.12-13, Jr 23.12; Lv 19.13-14, 25.35-38; Dt 24.14-15; Sl 72).

G ) OS FRUTOS DO TRABALHO NA MISSÃO DE DEUS

Colhemos a nova vida em Cristo como fruto do trabalho de Deus em nós, através de nós
e do mundo ( Mt 12.33, 13.8, 23, 7.16-17; Jo 15.12-16).

Esta nova vida se expressa: • na descoberta do novo relacionamento com Deus e com os
outros ( Mt 22.36-40); • na redescoberta contínua do sentido pleno da vida em nosso
compromisso com a vontade de Deus na História ( Mt 6.10; Mc 3.35; Jo 4.34, 6.40);

• no crescimento em nós, entre nós e no mundo da presença do Reino e de suas


manifestações de amor, justiça, paz, respeito, sustento mútuo, liberdade e alegria ( Gl
5.22-25; Mt 13.33; Rm 14.17; l Co 4.20).

H ) ESPERANÇA E VITÓRIA NA MISSÃO DE DEUS

Nosso trabalho tem sua raiz e força na confiança de que Deus está conosco, vai à frente e
é a garantia da concretização do Reino de Deus no presente e no porvir. Ainda que as
forças do mal e da morte lutem para dominar o nosso mundo, nossa esperança reside
naquele que as venceu, Jesus Cristo, que tornou real a ressurreição e a vida eterna. A
vitória da vida já pode ser percebida na luta que travamos contra as forças da morte, pois
já temos os primeiros frutos do Reino (primícias) que nos nutrem e nos levam a preservar
na caminhada orando “VENHA O TEU REINO” (Ex 3.7-15; Mt 28.20; Sl 2; Rm 8.37-
39; Gl 5.5; Ef 4.4; l Co 15.55-58).

PLANO PARA AS ÁREAS DE VIDA E TRABALHO

( Ver nota explicativa, pág. 60)

Apresentamos, a seguir, o plano específico para cada área de vida e trabalho da Igreja
Metodista.

O que é Missão? Missão é a construção do Reino de Deus, sob o poder do Espírito Santo,
através da ação da comunidade cristã e de pessoas, visando surgimento da nova vida

146
trazida por Jesus Cristo para renovação do ser humano e das estruturas sociais, marcados
pelos sinais da morte.

A) Área de Ação Social

1- Conceito: A ação social da Igreja, como parte da missão, é nossa expressão humana
do amor de Deus. É o esforço da Igreja para que na terra seja feita a vontade do pai. Isto
acontece quando sobre a ação do Espírito Santo, nos envolvemos em alternativas de amor
e justiça que renovam a vida e vencem o pecado e a morte, conforme a própria experiência
e vida de Jesus Cristo.

2 - Objetivos :

2.1 - Conscientizar o ser humano de que a sua responsabilidade é participar na construção


do Reino de Deus, promovendo a vida, num estilo que seja acessível a todas as pessoas.
2.2 - Cooperar com a pessoa e a comunidade a se libertar de tudo quanto as escraviza. 2.3
- Participar na solução de necessidades pessoais, sociais, econômicas, de trabalho, saúde,
escolares e outras fundamentais para a dignidade humana. Propugnar por mudanças
estruturais da sociedade que permitem a desmarginalização social dos indivíduos e das
populações pobres.

3 - Campo de Atuação : A Igreja Metodista cumpre a sua missão na área de ação social,
atuando nas seguintes ocasiões:

3.1 - em qualquer situação onde a opressão e a morte negou a realidade da vida com a
qual Deus comprometeu desde o começo do mundo; 3.2 - as estruturas sociais que se
tornaram obsoletas e desumanizantes, opressoras e injustas; 3.3 - na pessoa visando à
restauração da sua integralidade e do seu ambiente de vida; 3.4 - nos sofrimentos
humanos, participando de soluções para sua superação; 3.5 - nos conflitos humanos,
buscando promover a paz, combater a guerra e toda a violência; 3.6 - na educação integral
da pessoa.

4 - Meios de Atuação:

4.1 - exercer a justiça e o amor, como sinais da vinda do Reino de Deus; 4.2 - prática dos
princípios manifestados no Credo Social da Igreja Metodista; 4.3 - conhecer a Igreja,
especialmente a igreja local, descobrir suas possibilidades e seus dons e valorizar seus
ministérios para alcançar a participação total do povo na missão de Deus ( 1Co 12.1-30;
Ef 4.5); 4.4 - conhecer o bairro, a cidade, o campo, o país, o continente, o mundo e os

147
acontecimentos que os envolvem, porque e como ocorrem e suas conseqüências. Isso
inclui conhecer a maneira como as

pessoas vivem e se organizam, são governadas e participam politicamente, e como isso


pode ajudar ou atrapalhar a manifestação da vida abundante; 4.5 - apoiar todas as
iniciativas que preservem e valorizem a vida humana (1Sm 2.1-10; Lc 1.46-55); 4.6 -
denunciar todas as forças e instrumentos que oprimem e destróem a vida humana (Salmos
82, 42.1-9, 49.1-6, 50.4-11, 52.13-53.12; Is 1.17, 58.6-7, 61.1-3, 65.20-23; Tg 5.1-6); 4.7
- perseverar e zelo no exercício da ética cristã como princípio de toda ação social,
principalmente nas relações político-econômicas; 4.8 - estimular o desenvolvimento de
uma cidadania responsável e o preparo para maior participação nas estruturas e processos
de decisões; 4.9 - criar estruturas e instrumentos que visem ao desenvolvimento da
consciência nacional para promoção dos discriminados e marginalizados: o negro, o
índio, a mulher, o idoso, o menor, deficientes, aposentados e outros; 4.10 - promover e
praticar o uso racional e sadio do lazer; 4.11 - empenhar-se pela “liberdade de expressão
legítima de convicções, religiosas, éticas e políticas” conforme preceitua o Credo Social
( IV , 4c); 4.12 - apoiar, incentivar e participar das iniciativas em defesa da preservação
do meio ambiente; 4.13 - estimular o uso dos meios de comunicação e demais recursos
das igrejas locais, como instrumento de esclarecimento quanto aos males sociais, como a
exploração da mulher e do sexo, dos jogos de azar e loterias, bebidas alcoólicas e o fumo,
que contribuem para a destruição da saúde física, mental e espiritual do ser humano e da
família; 4.14 - identificar-se com o povo das periferias em seus problemas e lutas
empenhando-se em ajudá-los a se unirem em comunidades de reflexão sobre a Palavra de
Deus, de ajuda mútua, e de ação libertadora em seu próprio favor, através da descoberta
de suas próprias possibilidades e direitos.

B) Área de Comunicação Cristã

1 - Conceito: Comunicação Cristã como parte da missão é o processo de transmissão da


mensagem do Evangelho de Jesus Cristo, através dos veículos da comunicação social,
visando a transformação da pessoa e da sociedade segundo as exigências do Reino de
Deus.

2 - Objetivos :

2.1 - despertar a Igreja a estimulá-la, em todas as suas áreas, a usar os meios da


comunicação social, como veículo de divulgação, propagação e efetiva realização da

148
Missão; 2.2 - orientar a Igreja em todas as suas áreas, no uso das comunicações sociais;
2.3 - conscientizar a população quanto ao uso dos meios de comunicação em massa,
esclarecendo-lhe os aspectos positivos e negativos dos mesmos, e como afetam a própria
concepção da vida, podendo ser utilizados como instrumentos de sustentação da anti-vida;
2.4 - produzir ou fazer produzir o material de comunicação social, necessário aos
programas e atividades da Missão; 2.5 - atender as solicitações de prestação de serviço,
dentro das prioridades da Igreja, em todos os setores de sua atuação; 2.6 - criar ou
estimular a criação de programas de comunicação social, especialmente em áreas carentes
da presença evangelizante da Igreja.

3 - Campos de Atuação:

A Igreja Metodista cumpre a sua missão na área de Comunicação Cristã atuando nos
seguintes campos:

3.1- na totalidade da sociedade 3.2- nos veículos principais da comunicação social,


imprensa rádio, TV, editoras, cinema e outros; 3.3- na Imprensa Metodista; 3.4- nas áreas
de comunicação das instituições metodistas; 3.5- nas igrejas locais.

4 - Meios de Atuação:

A Igreja Metodista cumpre a sua missão na área de Comunicação Cristã, usando os


seguintes meios:

4.1- desenvolvimento da Imprensa Metodista como agência publicadora e divulgadora no


contexto da Missão;

4.2- dinamização do Expositor Cristão como instrumento da unidade, formação e


comunicação, visando o envolvimento da Igreja na Missão; 4.3- dinamização das revistas
da Escola Dominical e outros periódicos oficiais, como veículos de preparação para a
Missão; 4.4- pesquisas para uma contínua avaliação do material didático, usado na Igreja,
a fim de manter o equilíbrio entre as necessidades do povo metodista e as diretrizes e
ênfases bíblico-teológicas do Plano Para a Vida e a Missão; 4.5- pesquisa para conhecer
a realidade do povo brasileiro; 4.6- pesquisa entre o povo metodista, visando conhecer
sua realidade e potencialidade; 4.7- aproveitamento do Instituto Metodista de Ensino
Superior e outras instituições de ensino, para a produção de recursos audiovisuais, e
treinamento de obreiros na área de comunicação social, na medida de suas possibilidades;
4.8- organização de um cadastro de todas as pessoas da Igreja Metodista que trabalham
nos meios de comunicação social; 4.9- preparo de pessoas para a utilização dos meios de

149
comunicação social, como instrumento da Missão; 4.10- organização de um cadastro dos
meios de comunicação que estão sendo utilizados pela Igreja Metodista, relacionando-os;
4.11- utilização de uma assessoria de imprensa junto ao Colégio Episcopal e o Conselho
Geral, para divulgar pronunciamentos e informações oficiais da Igreja Metodista; 4.12-
utilização de espaços disponíveis em veículos de comunicação social para divulgação de
matérias e assuntos da Igreja; 4.13- municiamento da igreja local com sugestões e idéias
para atividade da comissão de comunicação local; 4.14- dinamizar a atividade musical,
inclusive instrumental, como veículo de comunicação na adoração, proclamação,
testemunho e serviço.

C ) Área de Educação

A educação como parte da Missão é o processo que visa oferecer à pessoa e comunidade,
uma compreensão da vida e da sociedade, comprometida com uma prática libertadora,
recriando a vida e a sociedade, segundo o modelo de Jesus Cristo, e questionando os
sistemas de dominação e morte, à luz do Reino de Deus.

C.1) Educação Cristã:

1- Conceito: A Educação Cristã é um processo dinâmico para a transformação, libertação


e capacitação da pessoa e da comunidade. Ela se dá na caminhada da fé, e se desenvolve
no confronto da realidade histórica com o Reino de Deus, num comprometimento com a
missão de Deus no mundo, sob a ação do Espírito Santo, que revela Jesus Cristo segundo
as Escrituras.

2- Objetivos:

2.1- Proporcionar a formação cristã da pessoa em comunidade levando-se em


consideração as diversas fases de seu desenvolvimento; 2.2- preparar o cristão a viver no
Espírito de Deus nas suas relações, anunciar o Evangelho e cumprir seu ministério no
mundo; 2.3- ajudar a comunidade a saber o que é, e o que significa sua situação humana,
a partir do indivíduo que integra o processo social; 2.4- levar os cristãos a se integrarem
na prática missionária à luz do Evangelho e da realidade social.

3- Campo de Atuação

A Igreja Metodista cumpre sua missão na área de Educação Cristã, atuando nos seguintes
campos:

150
3.1- no lar; 3.2- na igreja local; 3.3- nas instituições de Ensino da Igreja, Escolas Oficiais
do Estado e Universidades, grupos comunitários; 3.4- na sociedade.

4 - Meios de Atuação

A Igreja Metodista cumpre sua missão na área de Educação Cristã, usando os seguintes
meios:

4.1 - criação de instrumentos de análise da realidade social e da Bíblia, de modo a permitir


uma compreensão cristã da pessoa e da história para o cumprimento da Missão; 4.2 -
adequação dos instrumentos que favorecem a educação cristã na igreja local à luz do
Plano de Vida e Missão ( Escola Dominical, sociedades, pregação, liturgia, vida
comunitária); 4.3 - revisão do estilo de vida da família, adequando-o para o exercício da
Missão; 4.4 - organização de grupos comunitários para estudo ( conforme 4.1 ), e ação
comunitária; 4.5 - educação cristã abrangente nas escolas da Igreja e ensino religioso nas
escolas oficiais e da Igreja; 4.6 - classes permanentes de catecúmenos, preparando-os para
a Missão; 4.7 - cursos visando à orientação de pais e testemunhos para batismo de
crianças; 4.8 - cursos visando à orientação de noivos para o casamento; 4.9 - dinamização
da organização e atividades do setor de laicato, visando a Missão; 4.10 - criação de
serviços de apoio e sustentação cristã do jovem universitário; 4.11 - incentivo às
atividades criativas especiais e às expressões artísticas relacionadas com a Missão; 4.12-
desenvolvimento de uma nova hinologia engajada na vida e missão da Igreja; 4.13-
funcionamento de Seminários Regionais Teológicos como centros de formação e
enriquecimento bíblico, doutrinário e teológico dos professores e obreiros de Educação
Cristã da Escola Dominical, e formação do professor de ensino religioso nas escolas
públicas e instituições da Igreja; 4.14- estímulo da consciência da Igreja ao cumprimento
do compromisso de sustentação financeira da Missão; 4.15- desenvolvimento de novas
formas de educação cristã.

C.2) Educação Teológica

1- Conceito: A Educação Teológica é o processo que visa à compreensão da história em


confronto com a realidade do Reino de Deus, à luz da Bíblia e da tradição cristã
reconhecida e aceita pelo metodismo histórico como instrumento de reflexão e ação para
capacitar o povo de Deus, leigos e clérigos para a Vida e Missão numa dimensão
profética.

2- Objetivos:

151
2.1 - criar instrumentos para a reflexão teológica que propicie a ação pastoral de todo o
povo de Deus; 2.2 - preparar pastores e pastoras leigos e leigas para a Missão; 2.3 -
capacitar o pastor para o preparo dos membros com vistas à Missão; 2.4 - analisar os
fundamentos bíblico-teológicos das doutrinas cristãs enfatizadas pelo metodismo à luz da
sociedade brasileira; 2.5 - preparar obreiros para exercer ministérios em áreas especiais;
2.6 - manter o ministério pastoral e leigo atualizado para a Missão; 2.7 aprofundar a
pesquisa teológica no contexto brasileiro e latino-americano; 2.8 - integrar a educação
teológica em um programa nacional de educação teológica.

3- Campo de Atuação: A Igreja Metodista cumpre sua missão na área de educação


teológica atuando nos seguintes campos:

3.1 - Faculdade de Teologia e outras instituições de ensino teológico; 3.2 - Instituições de


ensino secular da Igreja através de departamento de teologia, pastorais escolares e
capelanias, cursos e outros; 3.3 - Igreja local.

4- Meios de Atuação: A Igreja Metodista cumpre sua missão na área de educação


teológica, usando os seguintes meios:

4.1 - criação de instrumentos que aprimorem a compreensão da ação de Deus ( Bíblia e


História ) na sociedade brasileira; 4.2 - programa de atualização de pastores e pastoras a
fim de alcançar a todos os pastores e pastoras; 4.3 - cursos de Bacharel em Teologia,
Educação Cristã, e outros segundo as necessidades da missão; 4.4 - cursos básicos de
teologia; 4.5 - cursos de formação de obreiros especiais em regime formal e não formal
visando as novas fronteiras na missão; 4.6 - cooperação com instituições de ensino
teológico de outras Igrejas visando a interesses e serviços comuns.

C.3) Educação Secular

1 - Conceito: É o processo que oferece formação melhor qualificada nas suas diversas
fases, possibilitando às pessoas desenvolvimento de uma consciência crítica e seu
comprometimento com a transformação da sociedade, segundo a Missão de Jesus Cristo.

2 - Objetivos :

2.1 - Capacitar a comunidade para cooperar no processo de transformação da sociedade,


na perspectiva do Reino de Deus; 2.2 - ser a instituição educacional agente para atuar na
sociedade na perspectiva do Reino de Deus; 2.3 - apoiar todas as decisões que promovam
a vida, denunciar e combater todas as ações que destruam a vida; 2.4 - responder às

152
necessidades do povo através da criação de escolas em áreas geográficas em
desenvolvimento e em áreas carentes; 2.5 - propiciar possibilidades de estudos a alunos
carentes; 2.6 - deixar claro o chamado de Jesus Cristo para o comprometimento da fé num
espírito não-sectarista.

3 - Campo de Atuação: A Igreja Metodista cumpre a sua missão na área de Educação


Secular, atuando nos seguintes campos: 3.1 - na comunidade, sobretudo nas áreas
carentes; 3.2 - nas instituições de ensino em todos os graus; 3.3 - no processo de
reformulação do sistema educacional do país; 3.4 - nos órgãos educacionais da Igreja.

4- Meios de Atuação: A Igreja Metodista cumpre a sua missão na área de Educação


Secular, usando os seguintes meios: 4.1 - estabelecimento de programas para as
atividades educacionais da Igreja, inclusive de suas instituições, com base em filosofia
educacional coerente com a missão por ela aprovada; 4.2 - adequação dos currículos de
curso à filosofia educacional da Igreja Metodista; 4.3 - estabelecimento de pastorais
escolares nas instituições; 4.4 - desenvolvimento de sistemas de bolsas que atenda alunos
carentes e projetos de interesse da Missão; 4.5 - capacitação e integração do pessoal da
Escola na Missão; 4.6 - preparo de pessoal qualificado para exercício das diversas funções
docentes e administrativas nas instituições da Igreja.

D) Área de Ministério Cristão

1 - Conceitos:

1.1 - Ministério Cristão como parte da Missão é serviço de todo o povo a partir do batismo
e da vocação divina. O cumprimento da Missão, todas a áreas da existência e da
sociedade, sob ação do Espírito Santo, requer preparo oferecido pela Igreja. 1.2 -
Ministério Cristão é também exercido de modo especial por pessoas que Deus chama
dentre os membros da Igreja como pastores e pastoras para a tarefa de edificar, equipar e
aperfeiçoar a comunidade da fé, capacitando-a para o cumprimento da Missão ( Ef 4.11-
12). 1.3 - A Igreja afirma a existência de dons para o exercício de outros ministérios - tais
como capelanias, serviços sociais, evangelistas, músicos etc. - cabendo-lhe perceber e
definir prioridades e facilitar o desenvolvimento e uso destes dons. ( Ef. 4.7-13; Rm
12.12-14; I Co 12,13 e 14; I Pe 4).

2 - Objetivos:

2.1 - proporcionar ao cristão a oportunidade de confrontar-se com o mundo como


fermento, sal e luz para a construção do Reino de Deus; 2.2 - proporcionar o encontro da

153
pessoa com Deus e o reencontro da Igreja com sua vocação e missão; 2.3 - desenvolver a
consciência de que, através do batismo, profissão de fé ou confirmação, o cristão se torna
membro do corpo de Cristo, por isto, participa da missão; 2.4 - o ministério pastoral visa
converter a capacitação e desenvolvimento da vida e ação dos membros da Igreja em
todas as áreas de existência.

3- Campo de Atuação: A Igreja Metodista cumpre a sua missão na área de Ministério


Cristão, atuando nos seguintes campos:

3.1 - na sociedade; 3.2 - na Igreja em geral; 3.3 - na igreja local; 3.4 - nas instituições da
Igreja; 3.5 - nas áreas de ministérios especiais, particularmente com jovens, juvenis e
crianças; 3.6 - no exercício profissional consciente de estar operando os sinais do Reino
de Deus. 4 - Meios de Atuação: A Igreja Metodista cumpre a sua missão na área de
Ministério Cristão, usando os seguintes meios:

4.1 - a comunidade cristã em geral e o cristão em particular encarnando o Reino de Deus,


nas mais diferentes situações humanas; 4.2 - currículo de Escola Dominical voltado para
o preparo missionário dos leigos; 4.3 - pastorais, proclamações, documentos e outros que
orientem ação dos membros da Igreja respondendo a situações concretas; 4.4 - cursos,
encontros apropriados e literatura específicos para o preparo do leigo, leiga, pastor e
pastora para o exercício dos diferentes ministérios; 4.5 - Comunicação Social: televisão,
rádio, jornal e telefone, etc. 4.6 - cursos e programas de educação continuada visando a
capacitação do laicato organizados pela Faculdade de Teologia e Seminários Regionais
tendo em vista melhor desempenho no cumprimento da missão; 4.7 - celebração do culto
como forma de adoração, testemunho e serviço.

E) Área de Evangelização

1 - Conceito: A evangelização, como parte da Missão, é encarnar o amor divino nas


formas mais diversas da realidade humana para que Jesus Cristo seja confessado como
Senhor, Salvador, Libertador e Reconciliador. A evangelização sinaliza e comunica o
amor de Deus na vida humana e na sociedade através da adoração, proclamação,
testemunho e serviço.

2 - Objetivos:

2.1 - confrontar o ser humano e as estruturas sociais com Jesus Cristo e o Reino por Ele
proclamado a fim de que as pessoas e a sociedade o confessem como Senhor, Salvador e
Libertador, e as estruturas sejam transformadas segundo o Evangelho; 2.2 - libertar a

154
pessoa e a comunidade de tudo que as escravizam e conduzi-las a plena comunhão com
Deus e o próximo.

3 - Campos de Atuação : A Igreja Metodista cumpre sua Missão na área de Evangelização,


atuando nos seguintes campos:

3.1 - pessoas, grupos e estruturas; 3.2 - lares e instituições; 3.3 - zona rural, suburbana e
urbana; 3.4 - grupos periféricos, marginalizados e minorias étnicas ( pobres, menores,
presos, prostitutas, idosos, toxicômanos, alcoólatras e outros).

4 - Meios de Atuação : A Igreja Metodista cumpre a sua Missão na área de Evangelização,


usando os seguintes meios:

4.1 - presença de Jesus Cristo, através do cristão e da comunidade cristã, nas mais
diferentes situações da vida humana; 4.2 - conscientização e preparo do cristão para o
exercício da Missão; 4.3 - estudos bíblicos através de pessoas capacitadas; 4.4 - literatura
adequada, visando ao preparo e a tarefa do evangelista; 4.5 - pontos missionários locais;
4.6 - campos missionários regionais e gerais, com envolvimento das igrejas locais;

4.7 - atividades e programas regulares da igreja local; 4.8 - culto comunitário e familiar;
4.9 - serviço de capelania em hospitais, prisões, escolas e outros; 4.10 - visitação nos
lares; 4.11 - realização de séries de pregações, que incluam o preparo, a realização e o
acompanhamento dos que se mostrarem interessados na nova vida em Cristo; 4.12 - igreja
local como comunidade solidária em situações de crise; 4.13 - veículos de comunicação
social; 4.14 - Escolas Dominicais.

f) Área de Patrimônio e Finanças

1 - Conceito: Patrimônio e finanças, como parte da Missão, são todos os recursos


materiais, como móveis, imóveis, veículos e financeiros a serviço da Missão, através da
ação da Igreja ( Ag 11.9;Ne 5 ).

2 - Objetivos:

2.1 - providenciar e organizar os recursos patrimoniais e financeiros para o cumprimento


da missão ( I Rs 5.15 -9.25); 2.2 - administrar o patrimônio e os recursos financeiros da
Igreja, mantendo-os a serviço da missão ( I Rs 4 ); 2.3 - desenvolver programas de
capacitação de recursos, visando às exigências da missão dentro da perspectiva bíblica da
mordomia cristã ( Lv 25; I Co 9.7-8 ); 2.4 - desenvolver uma política cristã de pessoal (
serventuários e outros ), à luz do Credo Social da Igreja ( Sl 82; II Sm 8.15; Lv 19.9-14

155
); 2.5 - observar os princípios da ética cristã no uso do patrimônio e finanças ( Ex 23.1-9;
Pv 2.6-9 ); 2.6 - manter todos os recursos patrimoniais e financeiros em nome da
Associação da Igreja Metodista e em regularidade legal.

3 - Campo de Atuação: A Igreja Metodista cumpre a sua missão na área de Patrimônio e


Finanças, atuando nos seguintes campos:

3.1 - Concílio e conselhos, Geral, Regional e Local; 3.2 - órgãos e instituições gerais,
regionais e locais; 3.3 - igrejas locais; 3.4 - programas e atividade da Igreja.

4 - Meios de Atuação: A Igreja Metodista cumpre a sua missão na área de Patrimônio e


Finanças, usando os seguintes meios:

4.1 - utilização do patrimônio da Igreja inclusive os das instituições a serviço da Missão,


extensiva à comunidade, onde a Igreja ou instituições estão localizadas; 4.2 -
desenvolvimento de programas de conservação e reparos das propriedades; 4.3 -
utilização das dependências dos templos, e outros prédios, para proveito da comunidade,
na formação de creches, jardins de infâncias, capacitação profissional e outros; 4.4 -
aquisição de novas propriedades e aceitação de doações e legados patrimoniais, sem ônus
e encargos, para a missão; 4.5 - participação generosa nas contribuições na perspectiva
bíblica da mordomia cristã, visando a manutenção e o avanço da missão, incluindo
ofertas, dízimos, legados e outras formas de contribuição ( At 5.4-34; Fp 4.15-19 ); 4.6 -
aplicação responsável dos recursos financeiros de acordo com os objetivos da Missão (
At. 4.35 ); 4.7 - busca e aplicação de recursos externos oriundos das igrejas cooperantes,
de outras agências e, da comunidade e dos poderes públicos, para o uso na Missão; 4.8 -
construções para uso polivalente de acordo com as exigências da Missão; 4.9 -
Valorização dos ministérios especializados, mediante o sustento dos respectivos obreiros,
inclusive de leigos pelas igrejas locais ( I Co 9.1-15; Mt 10.9-10; Dt 25.4 ).

G) Área de Promoção da Unidade Cristã

1 - Conceito : A busca e vivência da unidade da Igreja, como parte da Missão, não é


optativa mas uma das expressões históricas do Reino de Deus. Ela procede do Senhor
Jesus Cristo e é realizada por meio do

Espírito Santo através da rica diversidade de dons, ministérios, serviços e estruturas que
possibilitam aos cristãos trabalharem em amor na construção do Reino de Deus até a sua
concretização plena ( Jo 10.17; 17.17-23; I Co 1.10-13; 12.4-7, 12 e 13; Ef 4.3-6; Ef 2.10-
11 ).

156
2 - Objetivos :

2.1 - cumprir a ordem do Senhor Jesus Cristo, “que todos sejam um para que o mundo
creia”; 2.2 - fortalecer o sistema de conexão através de um processo dinâmico de inter-
relacionamento das Igrejas Metodistas a nível local, regional e geral; 2.3 - cultivar a
identidade histórica do metodismo como contribuição para a unidade do Corpo de Cristo;
2.4 - dentro da unidade cristã, cultivar a riqueza da diversidade de dons e serviços cristãos,
na unidade do Espírito ( I Co 12.4-11l Ef 4.3-6; Rm 12.1n); 2.5 - dar continuidade aos
esforços e a participação da Igreja Metodista em favor da Unidade Cristã, bem como
incentivo a participação e cooperação da Igreja em sinais visíveis; que enriqueçam a
unidade cristã; 2.6 - dar continuidade à tradição metodista reconhecendo que ela oferece
uma base própria e condizente para o diálogo entre posições.

3 - Campo de Atuação: A Igreja Metodista cumpre sua missão na Área de Unidade Cristã,
atuando nos seguintes campos:

3.1 - áreas de ação mencionadas neste Plano; 3.2 - metodismo brasileiro, latino-americano
e mundial; 3.3 - outras Igrejas e organizações e movimentos cristãos; 3.4 - movimentos e
organizações ecumênicas; 3.5 - comunidade local: em atividades de alcance social e
comunitária onde Igrejas ou grupos de diferentes confissões encontram uma missão
comum.

4 - Meios de Atuação: A Igreja Metodista cumpre sua missão na área de Unidade Cristã,
usando os seguintes meios:

4.1 - divulgação e análise através dos órgãos de comunicação, das decisões do Concílio
Geral; 4.2 - desenvolvimento de uma teologia que fortaleça nossa identidade wesleyana,
visando a uma prática pastoral comum e uma abertura para a unidade dos cristãos; 4.3 -
ação permanente do Colégio Episcopal, dos Bispos, dos pastores, dos leigos em geral, na
direção da unidade da Igreja; 4.4 - continuação e fortalecimento da integração da Igreja
Metodista brasileira com o metodismo latino- americano e mundial; 4.5 - participação em
organizações cristãs de nível nacional, continental e mundial, visando a uma ação
profética comum; 4.6 - formação de consciência de uma identidade metodista, a nível
comum na Missão com outros grupos cristãos, respeitadas as diversidades de dons e
estruturas; 4.7 - diálogo com as demais Igrejas de tradição metodista existentes no Brasil,
para conhecimento mútuo e busca de caminhos de aproximação; 4.8 - através de
declarações oficiais, definições doutrinárias e pastorais emanadas do Colégio Episcopal.

157
Parágrafo único - Os organismos integrantes de Administração Superior, Intermediária e
Básica, elaboram os Planejamentos e Programas Nacionais, Regionais e Locais,
respectivamente, com base no Plano para a Vida e a Missão, consubstanciado-o em seus
níveis correspondentes.

158
ANEXO 2
DIRETRIZES PARA A EDUCAÇÃO NA IGREJA METODISTA

Art. 25 - O XIII Concílio Geral aprovou as seguintes Diretrizes para a Educação na Igreja
Metodista:

Prefácio Histórico

Na continuidade de um processo iniciado há longo tempo e de projetos já elaborados


anteriormente, e tentando responder a anseios já existentes, a Igreja Metodista iniciou em
1979 processo formal para definir posições que servisse como diretrizes para a tarefa
educativa de suas escolas. Após pesquisas em igrejas e instituições metodistas no País,
realizou-se um seminário no Rio de Janeiro, em julho de 1980, convocado pelo Conselho
Geral, quando se elaborou um documento intitulado Fundamentos, Diretrizes e Objetivos
para o Sistema Educacional Metodista. Este documento, voltado para as instituições de
ensino secular e teológico foi publicado pelo Expositor Cristão e encaminhado a várias
igrejas, instituições e órgãos regionais e gerais, para que fosse avaliado.

Enquanto se desenrolava este processo, a Secretaria Executiva de Educação Cristã do


Conselho Geral promovia, a mando deste, a busca de um posicionamento acerca da
Educação Cristã. Certas afirmações básicas, intituladas A Educação Cristã: um
posicionamento metodista, foram também publicadas e propostas à Igreja em 1981. Por
outro lado, tendo em vista a necessidade de preparação do Plano Para a Vida e a Missão
da Igreja, o Conselho Geral procurou também definir a maneira metodista de se entender
a vida e a missão da Igreja. Isto foi levado a efeito através de pesquisa da Igreja e
especialmente através de uma Consulta Sobre Vida e Missão. Um documento sobre esta
compreensão foi também elaborado e publicado no órgão Oficial da Igreja. Tendo em
vista as colocações alcançadas, o Conselho Geral determinou que elas fossem
consideradas quando da revisão final dos Fundamentos, Diretrizes, Políticas e Objetivos
para o Sistema Educacional Metodista. Estes deveriam ser ampliados, de modo a incluir
também as responsabilidades da Igreja no campo de educação cristã. Com esta finalidade,
em janeiro de 1982 reuniu-se o Seminário Diretrizes para um Plano Nacional de
Educação, no Instituto Metodista de Ensino Superior. Foram convocados os bispo, os
membros do Conselho Geral, representantes dos Conselhos Regionais , das Federações
Regionais de Homens, Senhoras, Jovens e Juvenis, bem como das respectivas
Confederações. Cada instituição de ensino ( secular e teológico ) foi convidada a enviar

159
dos representantes. Os alunos de cada instituição de ensino teológico também foram
convidados a enviar um representante.

O Seminário pretendia elaborar um posicionamento que levasse em conta, além das


propostas dos documentos acima citados, a análise do opinamento recebido das igrejas,
órgãos e instituições. A complexidade da matéria mostrou que não se alcançaria a redação
apropriada. Uma comissão foi então eleita pelo Seminário e encarregada de reunir estas
conclusões, aproveitando também os estudos ali realizados.

O documento Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista é o resultado do trabalho,


aprovado pelo Conselho Geral e sancionado pelo XIII Concílio Geral da Igreja Metodista.

I - 0 QUE ESTAMOS VENDO

A educação tem sido um dos instrumentos sempre presentes na ação da Igreja Metodista
no Brasil. Como instrumento de transformação social, ela é parte essencial do
envolvimento da Igreja no processo da implantação do Reino de Deus.

A ação educativa da Igreja acontece de diversas maneiras: através da família, da igreja


local em todas as suas agências ( comissões, escola dominical, o púlpito, os grupos
societários, etc. ), através das suas instituições de ensino secular, teológico, de ação
comunitária e de comunicação.

Levando em conta o evangelho e sua influência sobre todos os aspectos da vida, a ação
educativa metodista trouxe muitas contribuições positivas. Por meio especialmente da
igreja local, muitas pessoas foram convertidas e transformadas, modificando suas vidas e
seu modo de agir. Por intermédio das instituições a Igreja buscou a democratização e a
liberalização da educação Brasileira. Suas propostas educacionais eram inovadoras e
humanizantes pois ofereciam um tipo de educação alternativa aos rígidos sistemas jesuíta
e governamental.

A ação educativa da Igreja, entretanto, deu muito mais valor às atitudes individualistas
em relação à sociedade. O mais importante era uma participação pessoal e isolada. No
caso específico das nossas escolas,

à medida em que a sociedade brasileira foi se desenvolvendo, elas perderam suas


características inovadoras e passaram a ser reprodutoras da educação oficial. Esvaziaram-
se perdendo sua percepção de que o evangelho tem também dimensões políticas e sociais,
esquecendo, assim, sua herança metodista. Em razão de suas limitações históricas e

160
culturais a ação educativa metodista tornou-se prejudicada em dois pontos importantes:
primeiro, porque não se identificou plenamente com a cultura brasileira; segundo, por ter
apresentado pouca preocupação em descobrir soluções em profundidade para os
problemas dos pobres e desvalidos, que são a maioria do nosso povo.

Hoje, no Brasil, vivemos situações que exigem de nós resposta concreta. Os problemas
que afligem nosso povo, desde a família até os aspectos mais amplos da vida nacional,
colocam um grande desafio e todos precisamos contribuir para encontrar as soluções que
atendam aos verdadeiros interesses da maioria da nossa população. Percebemos que
muitas são as forças contrárias a vida. Mas Também acreditamos que o evangelho nos
capacita para encontrar aquelas soluções que possibilitam a realização dos verdadeiros
interesses do povo Brasileiro. Por isso, nós, metodistas, à luz da Palavra de Deus,
examinamos nossa ação educativa presente, dispondo-nos a buscar novas linhas para esta
ação.

II - O QUE NOS DIZ A BÍBLIA

O Deus da Bíblia - que é Pai, Filho e Espírito Santo - se revela na história humana como
Criador, Senhor, Redentor, Reconciliador e Fortalecedor. Este Deus Trino, em seu
relacionamento com o Ser Humano, cria uma nova comunidade, sinalizada
historicamente através da vida do povo de Israel e da Igreja. A ação divina sempre nos
aponta para a realização plena do Reino de Deus.

A esperança deste Reino é vivida e experimentada parcialmente na vida do povo de Deus,


na promessa a Abraão ( Gn 12.1-4; 13.14-17; 17.8-9; 22.15-18), na experiência do êxodo
( Ex. 3.7-8; 6.1-9; 13.21-22; 14.15-16; 15.26; 16.4; Dt. 7.6-8 ), na conquista da terra ( Js
1.1-9;13-15; 24.14-25; Lv 25.8-55), na pregação dos profetas ( Is 49.8-26; 55.1-13; Ez
36.22-37; Jl 2.12-32, Mq 2.12-13; 4.1-13), e em outras formas. Esta esperança foi
manifestada de maneira completa na vida de Jesus de Nazaré ( Mc 1.15; Mt 6.9-13; Lc
4.16- 21: Mc 14.23-25; I Co 11.23-26). Através da vitória de Jesus Cristo sobre o pecado
e a morte temos a certeza de que se completará a realização total do Reino de Deus ( Mt
28.1-10; I Co 15.50-58; Ap. 21.1-8).

A ação de Deus se realiza por meio do Espírito Santo ( Jo 16.7-14 ). O dom do Espírito é
a força e o poder que faz brotarem entre nós os sinais do Reino de Deus e sua justiça, da
nova criação, do novo homem, da nova mulher, da nova sociedade ( II Co 5.5, 14-17). O

161
Espírito nos revela que o Reino de Deus é maior que qualquer instituição ou projeto
humano ( Mt 12.1-8).

Toda a nossa prática deve estar de acordo como o Reino de Deus ( Mt 6.33; Jo 14.26 ) e
o Espírito Santo é quem nos mostra se esta concordância existe ou não. O Espírito de
Deus age onde, como e quando quer ( Jo 3.5-8) a fim de criar as condições para o
estabelecimento do Reino. Só quando compreendemos isso é que nos comprometemos
com o projeto de Deus. Então percebemos claramente que Deus que dar ao ser humano
uma nova vida à imagem de Jesus Cristo, através da ação e do poder do Espírito Santo.
Por isso Ele condena o pecado individual e social gerador das forças que impedem as
pessoas e os grupos de viverem plenamente.

Sendo assim, a salvação é entendida como resultado da ação de Deus na História e na


vida das pessoas e dos povos. Biblicamente ela não se limita à idéia da salvação da alma,
mas inclui a ação de Deus na realidade de cada povo e de cada indivíduo. Isto atinge todos
os aspectos da vida: religião, trabalho, família, vizinhança, meios de comunicação, escola,
política, lazer, economia ( inclusive meios de produção ), cultura, segurança e outros. A
salvação é o processo pelo qual somos libertados por Jesus Cristo para servir a Deus e ao
próximo e para participar da vida plena no Reino de Deus.

A revelação do Reino de Deus em Jesus Cristo é motivo de esperança para todos nós (
Rm 8.20-25). O Reino se realiza parcialmente na história ( Mt 12.28) por meio de sinais,
que apontam para a plenitude futura. Ele é o modelo permanente para a ação do povo de
Deus ( Mt 20.24-28) criando em nós consciência crítica ( I Co 2.14-16), capaz de
desmascarar todos os sistemas de pensamento que se julgam donos exclusivos da verdade.
A esperança no Reino permite que participemos de projetos históricos que visam à
libertação da sociedade e do ser humano. Ao mesmo tempo nos liberta da idéia de que os
projetos humanos são auto-suficientes e nos leva a qualquer atitude de endeusamento de
instituições.

A ação de Deus atinge, transforma e promove as pessoas, na medida em que as desafia a


um relacionamento pleno e libertador com Deus e o próximo, para o serviço concreto na
comunidade. A natureza do Reino

exige compromisso do novo homem e da nova mulher e sua sociedade, na direção da vida
abundante da justiça e liberdade oferecidas por Cristo.

162
Deus se manifesta sempre em atos de amor, pois ele é amor ( I Jo 4.7-8 ) e quer alcançar
a toda a criação, pois nada foge à graça divina. Em Cristo, Deus nos ama de tal maneira
que dá sua vida por todos, alcançando especialmente os pobres, os oprimidos e
marginalizados dos quais assume a defesa com justiça e amor. Seu amor quebra as cadeias
da opressão, do pecado, em todas as suas formas. Por seu amor ele nos liberta do egoísmo
para uma vida de comunidade em amor e serviço ao próximo.

O Reino de Deus alcança qualquer tipo de pessoa, quaisquer que sejam suas idéias, suas
condições sociais, culturais, políticas, econômicas ou religiosas. Alcança igualmente a
pessoa como um todo.: corpo, mente e espírito, com todas as suas exigências.

Os atos de Deus, através dos quais ele revela e inauguras o seu Reino, nos ensinam
também como devemos agir, e são o critério para a ação missionária da Igreja.

III - ALGUMAS CONSIDERAÇÕES DE QUE DEVEMOS NOS LEMBRAR

Toda a ação educativa se baseia numa filosofia, isto é, numa visão a respeito do mundo e
das pessoas. Em nosso caso, a filosofia é iluminada pela fé, estando por isso sempre
relacionada com a reflexão teológica à luz da revelação bíblica em confronto com a
realidade.

Até o momento, nossa ação educativa tem sido influenciada por idéias da chamada
filosofia liberal, típicas de nossa sociedade, resultando num tipo de educação com
características acentuadamente individualistas.

Alguns dos elementos fundamentais dessa corrente são:

- preocupação individualista com a ascenção social; - acentuação do espírito de


competição; - aceitação do utilitarismo como norma de vida; - colocação do lucro como
base das relações econômicas.

Nenhum desses elementos está de acordo com as bases bíblico-teológicas sobre as quais
se deve fundamentar a prática educativa metodista.

A Educação na perspectiva cristã, “como parte da Missão é o processo que visa oferecer
à pessoa e comunidade, uma compreensão da vida e da sociedade, comprometida com
uma prática libertadora, recriando a vida e a sociedade, segundo o modelo de Jesus Cristo,
e questionando os sistemas de dominações e morte, à luz do Reino de Deus”( Plano Para
a Vida e a Missão da Igreja Metodista ). Por isso a Igreja precisou definir novas diretrizes
educacionais voltadas para a libertação das pessoas e da sociedade.

163
A partir dessas diretrizes a Igreja desenvolverá sua prática educativa, de tal modo que os
indivíduos e os grupos:

- Desenvolvam consciência crítica da realidade; - Compreendam que o interesse social é


mais importante que o individual; - Exercitem o senso e a prática da justiça e
solidariedade; - Alcancem a sua realização como fruto do esforço comum; - Tomem
consciência de que todos têm direito de participar de modo justo dos frutos do trabalho; -
reconheçam que, dentro de uma perspectiva cristã, útil é aquilo que tem valor social.

IV - O QUE DEVEMOS FAZER

A ação educativa da Igreja tem que estar mais firmemente ligada aos objetivos da Missão
de Deus, visando a implantação do seu reino. Além disso, nossos esforços educacionais
de todo tipo têm também que se identificar mais com a cultura brasileira, e atender às
principais necessidades do nosso povo. Por isso é preciso que busquemos novos
caminhos.

A busca destes novos caminhos deve procurar a superação do modelo educacional


vigente. Não se pode mais aceitar uma educação elitista, que discrimina e reproduz a
situação atual do povo brasileiro, impedindo transformações substanciais em nossa
sociedade. Também não podemos nos conformar com a tendência que favorece a
imposição da cultura dos poderosos, impedindo a maior participação das pessoas e
aumentando cada vez mais seu nível de dependência.

Uma tomada de decisão nesse sentido não deve ser entendida como simples reação às
falhas que encontramos na ação educativa, mas como uma atitude necessária de uma
Igreja que deseja ser serva fiel, participando ativamente na construção do Reino de Deus.

A partir destas constatações declaramos que a ação educativa da Igreja Metodista -


realizada através de todas as suas agências, isto é, a escola dominical, comissões, púlpito,
grupos societários, instituições de ensino secular, teológico, de ação comunitária, etc. -
terá por objetivos

1 - Dar continuidade, sob a ação do Espírito Santo, ao processo educativo realizado por
Deus em Cristo, que promove a transformação da pessoa em nova criatura e do mundo
em novo mundo, na perspectiva do Reino de Deus; 2 - Motivar educadores e educandos
a se tornarem agentes positivos de libertação, através de uma prática educativa de acordo
com o Evangelho; 3 - Confrontar permanentemente as filosofias vigentes com o
Evangelho; 4 - Denunciar todo e qualquer tipo de discriminação ou dominação que

164
marginalize a pessoa humana, e anunciar a libertação em Jesus Cristo; 5 - Respeitar e
valorizar a cultura dos participantes do processo educativo, na medida em que estejam de
acordo com os valores do Reino de Deus; 6 - Apoiar os movimentos que visem à
libertação dos oprimidos dentro do espírito do Evangelho libertador de Jesus Cristo; 7 -
Despertar consciência crítica e sensibilizada para o problema da justiça, num mundo
marcado pela opressão.

Com base nestes posicionamentos, ficam estabelecidas as seguintes diretrizes gerais:

1 - Toda e qualquer iniciativa educacional da Igreja, especialmente a organização de


novos cursos e projetos, levará sempre em consideração os objetivos da Missão, de acordo
com os documentos oficiais da Igreja e as necessidades locais; 2 - Quanto aos cursos,
currículos e programas já existentes, as agências da Igreja se empenharão para que, no
menor prazo possível, estejam de acordo com as orientações estabelecidas neste
documento; 3 - Será buscado um estreito relacionamento com as comunidades onde
nossos trabalhos estão localizados, compartilhando com elas os seus problemas; 4 - Em
todos os lugares em que a Igreja atua serão colocados à disposição da comunidade, das
organizações de classe e das entidades comunitárias, as instalações de que dispomos,
tanto para a realização de programas, quanto para a discussão de temas de interesses
comunitário, de acordo com os objetivos da Missão; 5 - As igrejas e instituições devem
atuar também através de programas de educação popular, para isto destinando recursos
financeiros específicos; 6 - Toda a ação educativa da Igreja deverá proporcionar aos
participantes condições para que se libertem das injustiças e males sociais que se
manifestam na organização da sociedade, tais como: a deterioração das relações na
família e entre as pessoas, a deturpação do sexo, o problema dos menores, dos idosos, dos
marginalizados a opressão da mulher, a prostituição, o racismo, a violência, o exôdo rural
resultante do mau uso da terra e da exploração dos trabalhadores do campo, a usurpação
dos direitos do índio, o problema da ocupação desumanizante do solo urbano e rural, o
problema dos toxicômanos, dos alcoólatras, e outros; 7 - A educação da criança deverá
merecer especial atenção, notadamente na faixa do pré-escolar ( de 0 a 6 anos ), e de
preferência voltada para os setores mais pobres da população; 8 - Visando à unidade
educacional da Igreja em sua missão, as igrejas locais e instituições se esforçarão no
sentido de uma ação conjunta em seus projetos educacionais; 9 - A Igreja e suas
instituições estabelecerão programas destinados à formação de pessoas capacitadas para
todas as tarefas ligadas à ação educacional e social; 10 -Todas as agências de educação

165
da Igreja Metodista, tanto ao nível local quanto a nível de instituição, procurarão orientar
os participantes de seu trabalho sobre as diretrizes ora adotadas, empenhando-se
igualmente para que elas sejam vividas na prática.

A - No caso específico da Educação Secular:

A Igreja entende a Educação Secular que promove como o “processo que oferece
formação melhor qualificada nas suas diversas fases, possibilitando às pessoas o
desenvolvimento de uma consciência crítica e seu comprometimento com a
transformação da sociedade , segundo a missão de Jesus Cristo”( Plano Para a Vida e a
Missão da Igreja).

Por isso:

1 - O ensino formal praticado em nossas instituições não se limitará a preparar para o


mercado de trabalho, mas , além disso, igualmente, deverá despertar uma percepção
crítica dos problemas da sociedade. 2 - As instituições superarão a simples transmissão
repetitiva de conhecimentos, buscando a criação de novas expressões do saber, a partir da
realidade e expectativa do povo. 3 - Terá prioridade a existência de pastorais escolares
que atuem como consciência crítica das instituições, em todos os seus aspectos, exercendo
suas funções profética e sacerdotal dentro e fora delas. 4 - Toda a prática das instituições
se caracterizará por um contínuo aperfeiçoamento no sentido de democratizar cada vez
mais as decisões. 5 - Os órgãos competentes farão com que estas diretrizes sejam
cumpridas em suas instituições. 6 - As instituições participarão em projetos da Igreja
compatíveis com suas finalidades estatutárias atendendo aos fins da Missão.

B - No caso específico da Educação Teológica

1 - “A Educação Teológica é o processo que visa à compreensão da história em confronto


com a realidade do Reino de Deus, à luz da Bíblia, e da tradição cristã reconhecida e
aceita pelo metodismo histórico como instrumentos de reflexão e ação para capacitar o
povo de Deus, leigos e clérigos, para a vida e missão, numa dimensão profética”. ( Plano
Para a Vida e a Missão da Igreja). 2 - Os currículos serão fundamentados nas bases
teológicas reconhecidas pela Igreja Metodista, como identificadas no presente
documento, com vistas a mudanças na metodologia do trabalho teológico, a partir das
necessidades do povo. 3 - No recrutamento e seleção dos professores de teologia se
observará não apenas a sua adequada qualificação aos cursos a serem ministrados mas,
também, a sua vivência pastoral e a consciência que tenham de que a tarefa teológica deve

166
ser feita a partir da revelação, no contexto do povo brasileiro e tendo em vista o
atendimento de suas necessidades. 4 - O processo de recrutamento dos que aspiram ao
pastorado, incluirá, sistematicamente, um programa pré- teológico de estudos, que os
iniciará no processo de reflexão sobre as preocupações da Igreja, como definidas nos seus
documentos. 5 - A educação teológica será desenvolvida observando-se os seguintes
relacionamentos:

• Relacionamento com o contexto social: a metodologia do trabalho teológico, em todos


os níveis, terá relação direta com a realidade da sociedade brasileira, na perspectiva do
oprimido, visando ao processo de sua libertação. • Relacionamento com outras áreas do
conhecimento humano: o trabalho teológico deverá ser desenvolvido de uma forma
integrada à outras áreas do conhecimento, incluindo tanto as ciências humanas, como
também as áreas de tecnologia, de ciências exatas, de saúde, ciências aplicadas, e outras.
• Relacionamento entre as instituições de ensino: o trabalho teológico deverá ser realizado
de maneira integrada, de tal modo que todo o ensino teológico na Igreja promova a sua
unidade de pensamento e ação naquilo que seja fundamental. • Relacionamento
ecumênico: a educação teológica será enriquecida pelo contato com outras Igrejas cristãs,
inclusive de outros países. 6 - As instituições de ensino teológico oferecerão cursos de
formação e atualização teológica para pastores e leigos, com a finalidade de os ajudar a
reexaminarem continuamente seu ministério e serviço, desde a perspectiva do Reino de
Deus. 7 - As instituições de ensino teológico desenvolverão esforços na pesquisa junto à
igreja local e outras fontes para a renovação litúrgica, levando em conta as características
culturais do povo brasileiro. 8 - Os órgãos competentes estudarão uma maneira de
uniformizar o tratamento dos seminaristas, pelas regiões eclesiásticas, em termos de ajuda
financeira ( bolsas ), apoio e requisitos dos estudantes para ingresso e continuação dos
estudos na Faculdade de Teologia e Seminários.

C - No caso específico de Educação Cristã:

1 - “A Educação Cristã é um processo dinâmico para transformação, libertação e


capacitação da pessoa e da comunidade. Ela se dá na caminhada da fé e se desenvolve no
confronto da realidade histórica com o Reino

de Deus, num comprometimento com a Missão de Deus no mundo, sob a ação do Espírito
Santo, que revela Jesus Cristo, segundo as Escrituras” ( Plano Para a Vida e a Missão da
Igreja ). 2 - O currículo de educação cristã na escola dominical será fundamentado na
Bíblia e tratará de relacionar os relatos bíblicos à realidade na qual a Igreja se encontra. 3
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- As secretarias executivas regionais de educação cristã estabelecerão cursos e programas,
com vistas à formação e aperfeiçoamento dos obreiros da Escola Dominical, para que
desenvolvam uma metodologia de ensino compatível com as diretrizes contidas neste
documento. 4 - A Igreja retomará especial cuidado para com a criança e o adolescente,
redefinindo a organização destes grupos e provendo material educativo adequado para
estas idades. 5 - Os grupos societários desenvolverão estudos e programas que auxiliem
os seus participantes a compreender e viver a ação libertadora do Evangelho e serão
municiados pela Igreja com literatura e sugestões apropriadas para alcançarem este
objetivo. 6 - Tendo em vista o fato de que a liturgia é um processo educativo, os pastores
e obreiros leigos serão incentivados a descobrirem novas formas litúrgicas que promovam
a educação do povo de Deus. 7 - O Conselho Geral estabelecerá programas mínimos de
educação religiosa para as instituições metodistas de ensino secular, em todos os níveis,
levando em conta as diretrizes aqui estabelecidas. 8 - O Conselho Geral providenciará
programas mínimos de educação religiosa a serem desenvolvidos, quando isto for
possível, em escolas públicas. 9 - O Conselho Geral providenciará material educativo a
ser utilizado na igreja local e capacitação do catecúmeno, neo-convertido, pais e
testemunhas quanto ao batismo e noivos, quanto ao casamento. 10- O Conselho Geral
providenciará material educativo a ser utilizado na igreja local visando à conscientizar a
família acerca de seu papel à luz da Missão.

Parágrafo único - As instituições educacionais da Igreja, de qualquer nível e grau, são


regidas pelas Diretrizes para a Educação da Igreja Metodista, devendo toda a sua vida
administrativa e acadêmica ser planejada e desenvolvida segundo seus ditames.

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