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HOMOSSEXUALIDADE
Os ensinamentos do Magistério eclesiástico e os
dizeres dos seminaristas*
Pelo Pe. Dr. Elismar Alves dos Santos**
Goiânia, GO
Pelo Pe. Dr. Pedrinho Arcides Guareschi***
Porto Alegre, RS
* Este artigo foi produzido a partir da tese de doutorado em Psicologia Social, intitulada Repre-
sentações Sociais da Sexualidade: a Construção da Sexualidade em Seminaristas e Padres, desenvolvida
pelo autor Elismar Alves dos Santos, sob a orientação do Prof. Dr. Pedrinho Arcides Guareschi, no
Instituto de Psicologia Social e Institucional da Universidade Federal do Rio Grande do Sul-RS, com
financiamento da CAPES.
** Doutor em Psicologia Social e Institucional na UFRGS. Doutor em Teologia, na área de Teo-
logia Moral, na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia de Belo Horizonte-MG, com estágio na Uni-
versidad Pontificia Comillas, Madrid, Espanha. Professor de Psicologia e Teologia na Faculdade de
Filosofia e Teologia de Goiás (IFITEG), em Goiânia-GO. Pe. C.Ss.R., graduado em Filosofia, Teologia
e Psicologia. Mestre em Psicologia Clínica pela PUC-GO.
*** Doutor em Psicologia Social pela Universidade de Wiscosin at Medison, EUA. Pós-Doutorado
na University of Wisconsin, EUA, e na Universidade de Cambridge, Inglaterra. Professor e Pesqui-
sador no Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social e Institucional da UFRGS. Pesquisador
do CNPQ. Pe. C.Ss.R., graduado em Filosofia, Teologia e Letras. Pós-Graduado em Sociologia pela
PUC-RS. Mestre em Psicologia Social na Marquete University, EUA.
REB, Petrópolis, volume 77, número 306, p. 368-387, Abr./Jun. 2017 369
Introdução
A ideia central deste artigo consiste em discutir o que ensina a Igreja
católica sobre a homossexualidade nos seminários e o que dizem os se-
minaristas acerca desse fenômeno. Os dados mais recentes apresentados
pelo Anuário Pontifício do Vaticano (2011) informam que há no mun-
do uma média de 117.978 seminaristas. No Brasil, segundo o Anuário
Católico (2012), existem 9.285 seminaristas. É preciso ressaltar que os
participantes da pesquisa não representam, de modo algum, a totalida-
de daqueles que correspondem às condições de seminaristas, nem todas
as variações que podem se expressar no tema específico. Entretanto,
entre eles há o suficiente para que se pare, pense, questione e reflita em
relação à temática da sexualidade no processo de formação nos seminá-
rios e, especificamente, acerca dos dilemas da homossexualidade.
Para mostrar o que ensina a Igreja católica a respeito da homosse-
xualidade nos seminários, recorremos ao documento da Congregação
para a Educação Católica: Instrução sobre os critérios de discernimento vo-
cacional acerca das pessoas com tendências homossexuais e da sua admissão
ao seminário e às ordens sacras (2005). Essa instrução, em seus três breves
capítulos, que serão explicados separadamente, apresenta normas a res-
peito de uma temática particular: a admissão ou não ao seminário e às
ordens sacras dos candidatos que apresentam tendências homossexuais
profundamente radicadas. Antes de explicar os capítulos que compõem
370 E.A. dos Santos; P.A. Guareschi. Representações sociais da homossexualidade
3. Percurso metodológico
Tipo de estudo
Trata-se de um estudo de campo, com uma abordagem de princípio
qualitativo Minayo (2012), fundamentado na Teoria das Representa-
ções Sociais (TRS). A coleta de dados foi realizada de forma coletiva,
em dois seminários católicos, após um contato prévio com os responsá-
veis pelos seminários. Os participantes foram informados a respeito dos
objetivos e procedimentos da pesquisa, bem como da confiabilidade
dos dados e do anonimato da sua colaboração. A pesquisa foi realizada
de acordo com as normas éticas da Resolução 196/96, sobre Pesquisa
Envolvendo Seres Humanos, tendo os formadores assinado um Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido.
Participantes
Devido ao fato do anonimato dos participantes e da sede da pesqui-
sa, omitimos os detalhes que geralmente são informados sobre o lugar
onde se realizou o estudo. Como dito, obtivemos a autorização para
realizar a pesquisa em dois seminários. Explicamos detalhadamente a fi-
nalidade da investigação e o compromisso em manter o anonimato dos
participantes como também dos seminários. Escolhemos dois seminá-
rios com perfis eclesiais distintos, com a intenção de obter informações
não apenas de um único cenário de Igreja (Libanio, 1999), quanto à
forma de se compreender a sexualidade e, especificamente, a homos-
sexualidade. A amostra foi composta por 50 seminaristas. Procuramos
contemplar os seminaristas que já haviam concluído a formação em
filosofia ou que estivessem em fase de conclusão e outros que se encon-
travam em fase de conclusão da formação em teologia.
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Instrumentos
Desenvolvemos um Questionário de Identificação, que levou em con-
ta o anonimato dos participantes e das instituições das quais eles fazem
parte. Utilizamos a Técnica de Substituição que consiste em responder
no lugar dos outros como sugere Abric (2005). A Técnica de Substitui-
ção tem como finalidade diminuir o grau de envolvimento e reduzir
os mecanismos de defesa dos participantes da pesquisa. Essa técnica é
constituída de duas etapas: na primeira, os participantes respondem em
seu próprio nome. Na segunda, respondem no lugar dos outros. Como
fazer emergir a zona muda, como tornar explícita a face escondida da
representação nos estudos psicossociais? Segundo o autor supracitado,
as técnicas de substituição permitem ao menos levantar hipóteses so-
bre a existência e a natureza das Representações Sociais. Geralmente, as
pessoas que pertencem a um mesmo grupo, quando solicitadas, tendem
a posicionar-se sem muitas dificuldades a respeito do que pensam as
demais pessoas de seu próprio grupo (Abric, 2005, p. 28). Priorizamos,
no artigo, somente uma das categorias representacionais da sexualidade
no público estudado: a temática da homossexualidade nos seminários.
Procedimentos
A abordagem dos seminaristas ocorreu nos seminários. Foi realizado
o levantamento do número de seminaristas em cada um dos seminários
selecionados, foram escolhidos os horários mais apropriados, de forma
a não atrapalhar o desenvolvimento das atividades internas do seminá-
rio. Após as devidas informações quanto aos procedimentos éticos e ao
sigilo referente à não identificação dos participantes, como também dos
seminários, foram dados os esclarecimentos sobre os objetivos do estudo
e das questões relativas ao caráter voluntário da participação. Antes da
aplicação do instrumento, foi explicado que não existiam respostas cer-
tas ou erradas, salientando-se a importância de se conhecer o que cada
participante pensava a respeito das questões a serem respondidas.
Porém, os que são precisam ser mais bem acompanhados pelos forma-
dores. “Que existe, contudo, não é uma generalização, e que necessita
melhor acompanhamento pelos formadores”.
Encerrando essa seção, gostaríamos de lembrar, mais uma vez, que a
dimensão da necessidade da reflexão sobre a homossexualidade nos semi-
nários precisa fazer parte do programa pedagógico dos seminaristas. Em
outras palavras, “uma realidade que ainda precisa ser mais bem trabalha-
da na formação. Trata-se de uma orientação sexual que está presente na
maioria absoluta dos religiosos”.
Conclusão
Como ficou subtendido no documento da Congregação para a
Educação Católica, o magistério eclesiástico vê como necessário que os
candidatos ao sacerdócio sejam capazes de atingir a maturidade afetiva.
Especificamente em relação à questão da homossexualidade nos seminá-
rios, o documento faz a distinção entre atos e tendências homossexuais.
Os atos são “pecados graves”, porque vão contra a lei natural. As ten-
dências homossexuais fundamentalmente arraigadas são “também elas
objetivamente desordenadas”. O estudo realizado mostrou que há duas
Representações Sociais da homossexualidade e que traduzem o modo
como os seminaristas compreendem este fenômeno nos seminários: di-
mensão da realidade presente e dimensão da necessidade da reflexão.
Primeiramente, admitem que a homossexualidade é uma realida-
de nos seminários. Reconhecem que a homossexualidade faz parte da
vida de um número significativo de seminaristas. É preciso observar
com atenção o fato de que, se há um número significativo de semina-
ristas homossexuais, se corre o risco de predominar nos seminários o
que tem sido chamado ultimamente de “cultura gay”. As consequências
para o processo de formação quando chega a esse estado de haver um
número expressivo de seminaristas homossexuais podem ser inúmeras,
especialmente se não há um processo de acompanhamento por parte
do programa de formação nos seminários: visão da vida religiosa ou do
sacerdócio somente a partir da exclusividade homossexual; exclusão dos
que são heterossexuais; formação de guetos homossexuais etc. Entretan-
to, sabemos que há também um número significativo de seminaristas
homossexuais que fizeram um caminho espiritual e psicológico com a
intenção de lidar com as próprias demanda sexuais.
386 E.A. dos Santos; P.A. Guareschi. Representações sociais da homossexualidade
Referências bibliográficas
ABRIC, J.CL. A zona muda das representações sociais. In: OLIVEIRA,
D.C.; CAMPOS, P.H.F. (Org.). Representações sociais – uma teoria sem
fronteiras. Rio de Janeiro: Museu da República, 2005. p. 23-34.
ANUARIO PONTECIFICIO DEL VATICANO. Città del Vaticano:
Libreria Editrice Vaticana, 2011.
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