173-Texto Do Artigo-531-1-10-20101107
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Liliana Pinto
ENQUADRAMENTO TEÓRICO
O Complexo de Culpa
Na perspectiva da teoria psicanalítica, a culpa é alvo de uma atenção particular, o
campo crítico nde a seu estudo é feito de uma forma mais aprofundada, sendo denomi-
nado como complexo de culpa. O problema foi abordado por variados autores, dos quais
se salientam Sigmund Freud, Melanie Klein, León Grinberg e, em Portugal, António
Coimbra de Matos, entre outros.
Freud relaciona a culpa com a 2a tópica, ou seja, para este autor a culpa é o resultado
da tensão existente entre o Ego e o Superego. O Id é a instância que condensa as
pulsões mais primitivas e a necessidade de satisfação imediata do prazer associado a
essas mesmas pulsões, enquanto que o Superego está encarregue da sua repressão,
através de juízos de censura e crítica. Cabe ao Ego a função de mediação destas duas
instâncias, em benefício do indivíduo na sua totalidade. No entanto, quando a severida-
de e rigidez do superego dominam, esta mediação torna-se difícil de alcançar, originan-
do, assim, uma submissão do Ego ao Superego. É desta submissão, segundo Freud, que
emerge o sentimento de culpa.
Numa outra perspectiva, a teoria Kleiniana salienta o sentimento de culpa como
sendo o resultado da integração dos objectos parciais num objecto total. Inicialmente,
o bebé relaciona-se com a mãe sob forma de objectos parciais, sendo esta alvo de
impulsos agressivos (quando percepcionada como um objecto ameaçador). Quando é
feita a integração dos objectos parciais, surge o sentimento de culpa, que advém do
facto de o bebé perceber que o objecto que ama e que odeia é um só. Assim, receia ter
destruído esse objecto com os seus impulsos mais destrutivos e de perder o seu amor.
Nesta mesma linha de orientação, Grinberg faz a distinção entre dois tipos de
culpa. A culpa persecutória é caracterizada por um funcionamento onde predominam
as ansiedades persecutórias e o duplo sentimento de perda relativo ao objecto e às
partes do self. Por outro lado, a culpa depressiva subentende a existência de um Eu mais
maduro e integrativo, de modo a proporcionar os movimentos de reparação. Este tipo
de culpa emerge do sentimento de se ter agredido o objecto e da necessidade de repará-
lo destes ‘danos’ que o indivíduo sente ter provocado com os seus impulsos agressivos.
Na obra intitulada de O Desespero’, A. Coimbra de Matos fala da culpabilidade
inconsciente, considerando-a uma espécie de resíduo que, mantendo-se inconsciente,
determina e condiciona os comportamentos do indivíduo, sem que a sua origem seja
identificável.
158 Interacções
A Psicoterapia Psicanalítica
A psicoterapia foi sofrendo diversas alterações e valorizando diferentes aspectos. Actu-
almente, podemos considerar que a psicoterapia é o conjunto de técnicas utilizadas
com vista à alteração dos estados psicológicos inadequados (que perturbam o funciona-
mento normal do indivíduo), através de meios psicológicos.
No entanto, a psicoterapia psicanalítica é um método peculiar, na medida em que
visa o tratamento das perturbações físicas e psíquicas, remetendo-as para a existência
de conflitos internos (conscientes e inconscientes) que não foram resolvidos. Estes
conflitos estão relacionados com experiências infantis e determinam o funcionamento
psíquico do indivíduo. A psicoterapia psicanalítica utiliza como técnicas principais a
associação livre de ideias e a interpretação, sendo que a linguagem é o modo preferen-
cial de comunicação, na medida que funciona como um meio de análise do mundo
interno do paciente.
Neste tipo de psicoterapia, é valorizada a relação entre o paciente e o psicotera-
peuta e os movimentos que ocorrem nesta relação, assim como as características do
espaço onde a psicoterapia decorre.
Escola Superior de Altos Estudos 159
ESTUDO CLÍNICO
Objecto do Estudo
A escolha deste tema encontra-se relacionada com o facto de, na prática clínica, defron-
tar-me com a influência de determinados sentimentos que se revelam determinantes
na evolução do processo psicoterapêutico e que, consequentemente, interferem no
funcionamento mental do paciente. Na verdade, a prática psicoterapêutica permite
observar a importância do sentimento de culpa quer pela frequência da sua emergência
no material trazido pelos pacientes à sessão, quer pela relevância da sua adequada
interpretação para o avanço do processo psicoterapêutico. Deste modo, o estudo clíni-
co que fundamenta este trabalho de investigação é dirigido para a observação das
implicações práticas que este sentimento adquire, numa perspectiva de análise quali-
tativa, a partir do material trazido pelos pacientes à sessão psicoterapêutica.
Questões de Investigação
O objectivo desta investigação é a compreensão das implicações do sentimento de
culpa no processo psicoterapêutico. Perante a constatação de que nem sempre o
sentimento de culpa é manifesto de uma forma explícita, mas também latente, tornou-
se fundamental perceber como é possível a sua identificação, em que momentos surge
e a que está associado. No entanto, a questão principal relaciona-se com os efeitos que
este sentimento tem na evolução do processo psicoterapêutico, porque é, neste domí-
nio, que percebemos o seu grau de relevância.
Tipo de Estudo
O tipo de estudo utilizado foi o estudo de caso múltiplo, através da análise qualitativa de
um conjunto de sessões de dois pacientes, um adulto e uma criança, realizadas ao
longo de um período de seis meses. A escolha destes pacientes é destinada a analisar,
comparativamente, as implicações do sentimento de culpa em pacientes que se en-
contram em fases distintas Trata-se de uma metodologia relacionada com o ‘como’ e o
‘porquê’ e que obedece a determinados parâmetros éticos, como a confidencialidade.
Neste estudo clínico, são apresentadas as sessões dos pacientes, seguidas da análise
das mesmas. Estes conteúdos são, de seguida, integrados e sintetizados, de modo a
obter uma perspectiva global e comparativa das sessões apresentadas e dos itens
analisados.
Desta forma, foram analisadas sessões de psicoterapia psicanalítica, tendo sido
definidas as seguintes categorias de avaliação acontecimentos precipitantes da culpa;
formas de expressão; repercussões na interacção com o psicoterapeuta; impacto trans-
ferencial e contra-transferencial; resultado obtido pela actividade interpretativa do psi-
coterapeuta.
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CONCLUSÕES