Unesp: Acolhimento No Estágio: Entre Modelos E Possibilidades de Formaçao Docente
Unesp: Acolhimento No Estágio: Entre Modelos E Possibilidades de Formaçao Docente
Unesp: Acolhimento No Estágio: Entre Modelos E Possibilidades de Formaçao Docente
Dissertação apresentada ao
Instituto de Biociências do Câmpus
de Rio Claro, Universidade
Estadual Paulista, como parte dos
requisitos para obtenção do título
de Mestre em Educação.
Agosto - 2014
Simone Reis Palermo Machado de Araújo
Dissertação apresentada ao
Instituto de Biociências do
Campus de Rio Claro,
Universidade Estadual
Paulista, como parte dos
requisitos para obtenção do
título de Mestre em
Educação.
Rio Claro/SP
Agosto -2014
370.71 Araújo, Simone Reis Palermo Machado de
A663a Acolhimento no estágio : entre modelos e possibilidades
de formação docente / Simone Reis Palermo Machado de
Araújo. - Rio Claro, 2014
202 f. : il.
Agradeço em especial a Deus “Porque por Ele nós vivemos, nos movemos e
existimos” Atos. 17.28. Agradeço pela vida e por me capacitar a cada dia a desenvolver esse
trabalho e ainda cumprir com os meus outros papéis.
Agradeço a minha orientadora profª Dra. Flávia Medeiros Sarti pela preciosa
caminhada ao seu lado de muito aprendizado e pela amizade.
Aos professores da banca profª Dra Denise Trento Rebello Souza e profº dr. Samuel
Souza Neto pelas excelentes contribuições durante o processo.
Aos meus preciosos filhos Pedro e Rafael por tentarem compreender os momentos de
ausência.
As minhas amigas Keila, Eliana e Auxiliadora por cuidarem dos meus filhos para que
eu pudesse realizar a pesquisa.
Aos meus amigos pelo apoio e companhia durante a trajetória: Lilian Souza, Clayton
Budin, Fabiana Villela, Jaqueline Oliveira, Érika Rodrigues, Marina Cyrino, Andréia
Vasques, Michelle Bueno, Karin Casarin.
RESUMO
Esta pesquisa focaliza o modo como professores em exercício percebem sua atuação
ao receberem estagiários da licenciatura em suas classes. Busca identificar, também, o valor
auto-formativo por eles conferido a essa sua experiência na formação docente. O trabalho
orienta-se por uma abordagem qualitativa e pauta-se em princípios da pesquisa etnográfica.
Durante o período de atividades em campo, foram acompanhadas sistematicamente as
intervenções de duas professoras ao longo do estágio de prática de ensino no ensino
fundamental de duas estudantes do curso de Pedagogia de uma universidade pública paulista.
Tal estágio vem sendo desenvolvido no âmbito de um projeto que aposta no valor das
“parcerias intergeracionais” para a formação docente. A coleta de dados da pesquisa foi
realizada por meio da observação das duplas formadas pelas professoras titulares e suas
estagiárias. Os dados reunidos foram complementados por duas entrevistas semi-estruturadas,
a primeira realizada antes de iniciar o processo de estágio e a outra ao final do período de
observação. Informações acerca de uma terceira dupla foram coletadas por meio de uma
entrevista e da observação de uma reunião entre professora e estagiária. O conjunto de dados
foi analisado a partir de princípios da análise de conteúdo e explorados com o apoio de
diferentes categorias. Os resultados da investigação revelam que as professoras focalizadas
optaram por acolher suas estagiárias (e não apenas recebê-las), considerando suas
necessidades formativas e incluindo–as entre suas atividades cotidianas. Tal acolhimento foi
desenvolvido de diferentes maneiras pelas professoras: um acolhimento que denominamos
como modelar, realizado em uma relação de mestrança e um acolhimento formativo, que
revelou-se potencialmente auto-formativo para as professoras. As professoras focalizadas
consideram que desempenham um papel formativo na dinâmica do estágio, identificando com
isso um lugar para os professores na formação de seus pares e apontando, assim, para uma
concepção da docência próxima ao modelo profissional.
This research focuses on how teachers understand their role when they have pre-service
teachers in their classrooms. This research also aims to understand how they assess such such
experience, which is part of their formation as teachers. The study is qualitative-based and has
elements of ethnographic research. The field research was developed in elementary school by
systematical observation of two pre-service teachers of the Pedagogy course of a public
university of the State of São Paulo and the teachers with whom they paired up with and
received mediations from over the practical training period. This practical training is
developed under a project which valorize the "intergenerational partnerships" for teacher
education. The collected data shows the observation of the pairs formed by teachers/pre-
service teachers. The data collection was complemented by two semi-structured interviews;
the first of which done before the starting of the practical training process and the other done
at the end of the observation period. During the development of the research a third pair
emerged. Information regarding this third pair was collected by interview and by the
observation of a meeting between the teacher and the pre-service teacher. The data was
analyzed with principles of content analysis and explored by different categories. The results
show that teachers chose to welcome the pre-service teachers (not just have them in their
classrooms), taking their formative needs into consideration and including them in their daily
routine activities. The teachers welcomed the pre-service teachers in different ways: the first
one we call modeling, in wich the teacher acts as master; and the second is a formative
welcome, which proved itself to be potentially self-formative for the teachers. The teachers
considered that they performed a formative role on the pre-service teachers' practical training,
identifying that there is a place for teachers in the education of their pairs and indicating to a
conception of teaching close to the professional model.
Key-words: practical training – welcome on practical training – Teacher Education - teacher
educators – field trainers
Sumário Página
INTRODUÇÃO ..............................................................................................................................11
2. ITINERÁRIO METODOLÓGICO: CONCEPÇÕES E PROCEDIMENTOS ........................ 20
2.1- Instrumentos utilizados no trabalho de campo ........................................................................21
2.2-Contexto da pesquisa ..............................................................................................................27
2.3 Terrenos Explorados ...............................................................................................................28
2.4- Sujeitos ..................................................................................................................................30
2.5.Análise dos dados ....................................................................................................................38
3. O ESTÁGIO SUPERVISIONADO EM DISCUSSÃO ......................................................... 41
3.1- Um breve olhar para as políticas sobre o estágio supervisionado ...........................................41
3.2-Visita às discussões realizadas nos Endipes 2010 e 2012........................................................46
3.3- O que dizem as pesquisas apresentadas..................................................................................58
3.4- Sujeitos formadores dos futuros docentes ...............................................................................63
3.5.Breve discussão sobre os trabalhos apresentados ....................................................................67
4. AS RELAÇÕES FOCALIZADAS.............................................................................................. 70
4.1.Caso da professora Isabel .......................................................................................................70
4.2.Proposta de nova categoria a partir dos dados analisados ......................................................93
4.2.1.O acolhimento modelar em relação de mestrança .................................................................93
4.1.2-Discussão dos dados do caso da professora Isabel ...............................................................97
4.3-Caso da professora Agnes ..................................................................................................... 105
4.3.4-Discussão dos dados do caso da professora Agnes ............................................................. 120
4.5-Caso da professora Fábia ..................................................................................................... 130
4.5.2-Discussão do caso da professora Fábia .............................................................................. 140
5. O ACOLHIMENTO- PASSOS À FRENTE DA RECEPÇÃO ............................................... 147
5.1-O acolhimento nos estágios supervisionados de prática de ensino... ...................................... 148
5.2-Modelos de formação presentes no campo educacional ......................................................... 149
5.3-Estratégias elaboradas e modos assumidos pelas professoras durante a recepção de estagiários
................................................................................................................................................... 150
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................................ 169
REFERÊNCIAS............................................................................................................................ 175
APÊNDICES ................................................................................................................................. 180
8
APRESENTAÇÃO
Realizar a pesquisa de campo foi uma experiência paradoxal, pois ao mesmo tempo
em que o prazer e a sede, impulsionavam a busca por dados sobre os modos como os
professores em exercício consideram sua atuação durante os estágios, a angústia por focar o
olhar apenas para este ponto em muitas ocasiões me desgastava. Esta luta interior; luta do
trajeto, se dava devido a minha identidade enquanto professora da educação básica, que estava
afastada de meu local de trabalho justamente para realizar tal tarefa com maior singularidade.
Contudo, adentrar a uma escola, não me causava tanto estranhamento devido a familiaridade
desse espaço; de pessoas conhecidas. Conhecido, no entanto, como espaço de prática docente,
como espaço de recepção de estagiários, mas, desconhecido como espaço de pesquisa.
Reflito, então, sobre o professor em exercício que não é apenas um agente a ser
observado, onde suas práticas são simplesmente analisadas, estudadas por um sujeito,
estagiário, que se insere em seu espaço de atuação, numa dinâmica já iniciada. Ou ainda, em
uma relação distanciada, sem trocas, sem discussão ou estudo dos casos, reflexões sobre sua
prática, sua postura, trajetória de formação.
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa versa sobre o modo como professores em exercício consideram sua
atuação durante os estágios supervisionados de prática de ensino quando recebem
estagiários da licenciatura em sua classe e busca identificar, também, o valor
(auto)formativo por eles conferido a essa experiência, de ‘parceria intergeracional’.
Esta investigação insere-se em duas pesquisas mais amplas financiadas pelo CNPq
e que integraram o projeto Temático FAPESP "Programas Especiais de Formação de
Professores, Educação a Distância e Escolarização: pesquisas sobre novos modelos de
formação em serviço". A primeira pesquisa intitula-se “Os professores no campo da
formação docente e a profissionalização do magistério” – coordenado por minha
orientadora; e a segunda, pesquisa é coordenada pela professora Denise Trento, da FEUSP
e tem por titulo “Mercado de formação docente: constituição, funcionamento,
possibilidades e limites”.
A formação dos professores tem recebido tal atenção nas últimas duas décadas por
ser considerada como medida redentora para os problemas da educação e para as questões
complexas que se colocam na sociedade. Nesse sentido, “tal centralidade deve-se
especialmente a discursos que responsabilizam o professor pelos maus resultados
escolares” (VASQUES e SARTI,2011,p.4). Este "argumento da incompetência docente"
(SOUZA, 2007) fundamenta o investimento que vem sendo feito na formação dos
professores, vista como meio para atender as novas e variadas demandas que se colocam
para a escola. A qualidade da educação, então, passa a ser o objetivo, mas norteada por
uma visão do mercado que tem interesse em produzir grande quantidade de mão de obra
12
eficiente e produtiva para o desenvolvimento do país. Esta ênfase é que sustenta este
mercado de formação de professores (SOUZA e SARTI, 2012).
Azanha (2000) afirma que o fato dos professores serem bem formados não garante
um ensino de qualidade. Portanto, nem a escola e nem os professores podem ser colocados
no papel de redentores e muito menos colocados como principais culpados pelos
problemas do sistema educacional. A pesquisadora Galindo (2012) argumenta ainda que
não se trata de desresponsabilizar os envolvidos no processo educativo, mas de ressaltar
que cada instância da sociedade tem suas responsabilidades, o que envolve a família, a
escola, órgãos públicos, ou seja, toda sociedade. Tal visão é partilhada por Imbernón
(2011) que expõe que a “instituição educativa precisa que outras instâncias sociais se
envolvam e a ajudem no processo de educar” (p.8).Também para Gatti (2010) “deve ser
claro para todos que a preocupação com a qualidade do ensino não quer dizer reputar
apenas ao professor e à sua formação responsabilidade sobre o desempenho atual das
redes de ensino” (p.1359).
E ainda,
[...]compara os professores
com as características, a conclusão mais habitual à que se chega é que
a única denominação possível a ser atribuída é a de semiprofissionais,
já que se considera que lhes falta autonomia com relação ao Estado
que fixa sua prática, carentes de um conhecimento próprio
especializado e sem uma organização exclusiva que regule o acesso e
o código profissional ( p.57).
Formosinho (2009) faz uma análise crítica das práticas de formação inicial,
ressaltando que o processo de universitarização se baseia em uma lógica acadêmica,
afastada dos componentes profissionais. Esse é um ponto que tem sido salientado por
outros pesquisadores, como Imbernón (2011), que defende uma formação centrada na
escola, que possibilite o desenvolvimento de um modelo colaborativo, baseado na reflexão
e na pesquisa-ação. Para Sarti (2012), “a própria idéia de universitarização traz subjacente
essa desigualdade de posições entre os agentes do campo educacional, sugerindo que a
formação dos professores deva ser absorvida e, então, transformada pela cultura
universitária“ (p.333).
Por isso a necessidade, segundo afirma Nóvoa (2009), “de uma formação de
professores construída dentro da profissão” (p.45), com uma “ideia de formação para o
magistério, levando em conta os saberes dos professores e as realidades específicas de seu
trabalho cotidiano” (TARDIF,2012,p.22,23). Uma formação docente pensada nesse
sentido tende a colocar “os professores no centro das preocupações e das políticas públicas
de Educação” (NÓVOA,2009,p.12). Tratar dessa relevante questão é abranger múltiplos
aspectos, sejam eles da formação inicial ou continuada, de formação ou (auto) formação.
16
Nesse sentido, compreende-se que “a iniciação de uma nova geração docente pode
ser possibilitada por professores mais experientes, tendo o estágio como campo de
conhecimento fundamental para o processo de formação”(PIMENTA e LIMA,
2010,p.101). O estágio passa então a ser considerado como um “momento de exploração e
aproximação da realidade, oportunidade de aprendizagem da profissão e de construção da
identidade profissional”(PIMENTA e LIMA,2010, p.99,100). Tal etapa da formação torna
possível o envolvimento do futuro docente com a profissão para a qual está se formando,
bem como, “a reafirmação da escolha por essa profissão e de crescimento”(PIMENTA e
LIMA,2010, p.100).
Nessa mesma direção, Pimenta e Lima (2010) consideram o estágio como uma
experiência singular e fundamental na formação de professores que, nos termos de Sarti
(2009) “possibilita vivenciar gradualmente a transição entre o ofício de aluno e ofício
docente por se caracterizar como período de aprendizagem” (p.135).
17
A recepção pode ser considerada como o nível mais inicial e elementar de atuação
dos professores colaboradores nos estágios. Trata-se da autorização para entrada e
permanência do estagiário em sala de aula para que ele observe de maneira passiva as
aulas e práticas dos professores ou que, conforme indicação da instituição de formação
inicial realize regências preparadas sem a participação do professor da classe. Tal modo
reduz-se a permitir o cumprimento da carga horária e atividades exigidas pela
universidade. Desse modo, o estagiário tende a ocupar um lugar passivo em sala de aula.
Já o professor da escola permanece no lugar de professor exemplar, no sentido de que
deve ser apenas observado sem o objetivo de se construir relações de envolvimento ou
algum tipo de compromisso com a formação do futuro docente.
O acolhimento é considerado neste trabalho como uma ação específica que pode
ser assumida pelo professor da classe no período do estágio, pressupondo um nível de
envolvimento mais elevado do que o da mera recepção do estagiário. Trata-se então de
uma situação em que o professor da escola permite a entrada do estagiário em sala de aula
para a realização do estágio, porém, oportunizando uma situação diferenciada para a
observação e regência. Nessa modalidade de colaboração, o professor da classe envolve-
se com o estágio, interage com o estagiário e interfere de forma deliberada nos rumos do
trabalho.
1
VIAL,Michel; CAPARROS-MENCACCI, Nicole. L´accompagnement professionnnel? Méthode à l´usage des
praticiens exerçant une fonction educative. Bruxelas: De Boeck, 2007.
19
Este tipo de relação é uma oportunidade de formação não apenas para o estagiário,
mas inclusive para o professor que o acompanha, considerando que cada um está em sua
fase e em seu trajeto de formação, portanto, possui seus próprios objetivos.
Nessa etapa foram explorados os resumos dos trabalhos apresentados nos XV e XVI
Endipes (Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino), realizados em 2010 e 2012. A
escolha apenas por essa fonte se deu por ser um evento de âmbito nacional, que discute as
políticas educacionais e reflete sobre questões pedagógicas, visto que, segundo Pimenta e
Lima (2010), “[...] os Endipes constituem espaços de consolidação das teorias e práticas de
ensino e de formação contínua para formadores” (p. 71).
artigos, optamos pelo subtema “formação de professores”, de modo que encontramos 150
(cento e cinquenta) trabalhos no total.
Este evento possui sua trajetória e reconhecimento nacional, de modo que possibilita
momentos para compartilhar pesquisas que estão sendo realizadas em todo o país.
2.1.1 Entrevistas
Realizamos entrevistas, por termos a compreensão, como ressalta Zago (2003, p. 298),
de que a observação e a entrevista podem estabelecer uma rica “relação de
complementaridade”. Optamos por realizar uma primeira no início do processo de observação
e outra complementar, ao final do período.
A entrevista inicial, realizada com quatro professoras, teve como objetivo conhecer as
primeiras motivações delas em acompanhar estagiárias, suas expectativas, suas reflexões
sobre sua trajetória de formação, suas visões sobre o estágio, já que não possuem formação
específica para desenvolver esse trabalho.
Realizou-se também uma entrevista única com uma quinta professora inserida na
pesquisa ao final do processo do trabalho de campo, a fim de conhecer a relação de parceria
que foi construída durante o processo de estágio. É relevante ressaltar que essa foi a primeira
experiência da professora em receber estagiários.
23
As duas professoras com mais tempo em exercício (professoras Isabel e Emília) não
permitiram a gravação da entrevista. Nesses casos, as informações foram anotadas durante a
entrevista, com todas as dificuldades que se apresentam, como a velocidade dos depoimentos,
o registro simultâneo e a tentativa de literalidade nesse registro. Diante desta situação,
produzimos um texto narrativo com algumas falas literais a partir dos registros e não uma
transcrição precisa das falas dos sujeitos. Esta etapa era efetuada logo após as entrevistas.
A quinta professora que participou como sujeito da pesquisa foi a professora Fábia.
Aquela era a primeira vez que recebia uma estagiária do projeto de “pareceria intergeracional”
e seus depoimentos nas aulas realizadas no curso de extensão evidenciaram indícios da
construção de uma parceria interessante com a estagiária. Mas, como o trabalho já estava em
andamento (faltando pouco tempo para a finalização do estágio), optamos por realizar apenas
uma entrevista com essa professora e acompanhar uma reunião entre ela e sua estagiária.
2.1.2 Observação
Tura (2003) sublinha que “a observação possibilita não só o acúmulo de dados como o
descortinar de novos direcionamentos, novas focalizações e acertos de rota” (p. 191). Por isso,
decidimos observar algumas interações e situações entre estagiário e professor em exercício
para descortinar e compreender as relações construídas.
2
Consideramos por “observação sistemática” o presenciar do processo de estágio do início ao fim, desde a
entrada do estagiário na escola até o término do período.
25
Decidimos usar, como critério de escolha para os sujeitos, a fase profissional em que a
professora se encontrava. Duas professoras foram então selecionadas: uma com mais de vinte
anos de experiência e outra com apenas cinco anos. No caso da professora com cinco anos de
experiência, optamos pela professora Agnes, pois a identificamos já na primeira entrevista em
que deu indícios de que percebe a responsabilidade do professor em exercício no processo de
estágio, além de sugerir que o trabalho de formação docente seja feito em parceria entre os
profissionais da escola e da universidade.
26
Para que o trabalho de campo fosse realizado com o consentimento de todos que
seriam observados, consultei ainda as estagiárias dessas docentes (Isabel e Agnes)
pessoalmente, pois, apesar de não terem sido o foco, compunham diretamente o processo de
estágio. Fui então até a universidade no período de aula dos alunos da licenciatura em
Pedagogia no mês de março e, antes de iniciar a primeira aula, conversei com as estagiárias
sobre os objetivos da pesquisa com um pouco mais de detalhes. A princípio a estagiária da
professora Isabel demonstrou certa timidez, mas, assim como a outra, aceitou que seu
processo de estágio fizesse parte de nosso estudo, por compreender que nosso olhar estaria
voltado para a professora.
Como já exposto anteriormente, além das duas professoras que permitiram ser
acompanhadas, incluímos mais um sujeito em nossa pesquisa, a professora Fábia, que
acompanhou uma estagiária pela primeira vez. Ela foi convidada a conceder uma entrevista e
acompanhada em uma última reunião com a estagiária, fora de seu horário de trabalho, pois
suas falas, nos dois encontros que ocorreram com os professores na universidade,
expressavam pistas de uma relação construída em parceria. Sua entrevista foi gravada em
áudio, transcrita e utilizada como dados da pesquisa. Já a reunião entre a professora e a
27
estagiária foi apenas observada e registrada, gerando em seguida um relato ampliado. Além
desses meios, a dupla disponibilizou os emails trocados entre elas como material de pesquisa.
Diante desta proposta, os estagiários precisam cumprir uma carga horária de 105
horas, sendo 70 horas em sala de aula e 35 horas de pesquisa, preparação de material,
planejamento, participação em reuniões na escola e outros, conforme a legislação vigente.
Uma lista composta por 6 ou 7 escolas parceiras é apresentada aos estudantes no semestre
anterior ao estágio, para que possam escolher a de sua preferência, bem como o período e o
nível (ano) em que desejam estagiar. É nesse semestre, então, que cada um desses estudantes
tem a oportunidade de estabelecer os primeiros contatos, por meio de uma entrevista
semiestruturada, com a/o professor/a que o receberá para o estágio.
exercício. Tais professores não passam por nenhuma espécie de seleção. Apresentam,
portanto, variados perfis em suas práticas pedagógicas e crenças quanto ao ensino e
aprendizagem (SARTI, 2009). Eles são informados pela Secretaria da Educação sobre a
possibilidade de participarem do projeto e sobre o período em que os estudantes realizarão o
estágio. Em acordo com o projeto de estágio em curso, professores e estagiários desenvolvem
atividades conjuntas de ensino, atuando em parceria docente.
2.3.2 As escolas
As escolas nas quais se efetuou o trabalho de campo desta pesquisa atendem alunos do
Ensino Fundamental I. São unidades que estavam vinculadas à rede estadual de ensino e que
foram municipalizadas.
A participação anual dessas escolas nos estágios foi um dos critérios colocados, pois a
chegada ao local, a aceitação dos gestores e professores sempre causam certo estranhamento e
desconfiança até compreenderem os reais motivos que nos levam ali. Entretanto, as
coordenadoras das duas escolas, bem como a direção, foram muito solícitas.
No que se refere ao modo como cada uma das duas escolas recebeu as estagiárias,
algumas informações foram reunidas durante o período inicial das atividades de campo. Na
escola X, a coordenação conversou com a estagiária sobre os dias em que estaria na escola e
confeccionou um crachá com seu nome, dias de estágio e o nome da ‘professora responsável’
(esta era a forma como estava escrito), para que fosse usado por ela todos os dias –
identificação que deve ser utilizada por todos os que trabalham na escola. Inclusive eu recebi
esta identificação. Além disso, no decorrer do período de estágio, a coordenadora conversou
30
em algumas ocasiões sobre o plano de aula registrado pela estagiária em um quadro (quadro
impresso, também preenchido pelas professoras durante a semana com a rotina da sala), de
modo que, em alguns momentos, interferia em seus planos, propondo algumas mudanças de
atividades e pesquisas sobre determinados assuntos.
Quanto à escolha das escolas, em um primeiro momento ficou decidido que seriam
escolhidas apenas duas escolas, para facilitar o trânsito da pesquisadora, devido ao
acompanhamento sistemático pretendido. Quanto à escolha das docentes, relatamos em
seguida.
2.4- Sujeitos
O estudo teve como sujeitos professoras em exercício de duas escolas que participam
do projeto de estágio ligado à universidade. As professoras selecionadas como informantes da
pesquisa são efetivas na rede e já participam do projeto de estágio no mínimo há 5 anos.
No caso da escola Y, ao telefonar para o primeiro contato, após expor meus objetivos,
a coordenação me declarou que poderia realizar a pesquisa e que estaria comunicando as
professoras sobre minhas intenções, mas me orientou a contactá-las pessoalmente no final de
um período de aula. Informou então os dias de HTPC (Horário de Trabalho Pedagógico
Coletivo) da escola. Dirigi-me à escola e explicitei a pesquisa às docentes, de modo que ficou
combinado um momento para a entrevista, pois as mesmas aceitaram colaborar com o
trabalho. As duas foram realizadas em horário de HTPC, em dias diferentes com as
professoras com menos tempo na carreira – apenas 5 anos de experiência.
A seguir, uma descrição sucinta do perfil das professoras focalizadas em nosso estudo
que, assim como as estagiárias, tiveram seus nomes modificados para preservar suas
identidades.
Professora Isabel
32
Ela contou, durante a entrevista, que atualmente vivencia uma etapa profissional em
ritmo de aposentadoria e já se sente cansada após trabalhar por 25 anos enfrentando tantas
mudanças educativas. Afirma que, a cada ano, as crianças estão diferentes; ao mesmo tempo,
depara-se com novas orientações e exigências para seu trabalho, o que a faz relativizar a
importância de sua experiência docente. Tem a sensação de que deve “guardar tudo e começar
de novo” (expressão utilizada pela professora). “É sempre um começar” – o que parece
incomodá-la.
Seu discurso com relação às mudanças das atitudes e postura das crianças, mais “as
novidades”, têm vestígios de uma geração formada por um contexto de educação que era
permeada por uma concepção de ensino com a ideia de que os alunos eram sempre os
mesmos, não mudavam: “[...] essas crianças que estão entrando são muito diferentes. Parece
que a gente nunca deu aula na vida” (depoimento da docente na 1ª entrevista). Isso nos remete
a uma época em que era possível acreditar que as experiências em classe, o domínio das
técnicas, os modelos serviam, eram suficientes para garantir a aprendizagem dos alunos.
Aparentemente havia a possibilidade de aplicação das mesmas atividades: “[...] acho que a
experiência de 25 anos não serve de muita coisa. A cada ano você tem que guardar tudo e
começar de novo” (depoimento da docente na 1ª entrevista). Algo que ficou evidente em suas
práticas, ao colocar atividades de matemática na lousa, por exemplo, sempre com o primeiro
item realizado como modelo. Conforme Pimenta, Lima (2010, p. 36), “o pressuposto dessa
concepção é que a realidade do ensino é imutável e os alunos que frequentam a escola
também o são”. Pesquisadores caracterizam esse modo tradicional de atuação docente como
artesanal.
Tendo em vista os dados reunidos por meio da entrevista, parece ser possível enunciar
que a professora está vivenciando a fase denominada por Huberman (1992, p. 46) como de
“desinvestimento”; uma fase marcada pelo desprendimento da carreira, dirigindo o olhar para
outros aspectos da vida social. E ao mesmo tempo marcada por “conservantismo e
33
lamentações”, cuja tendência é de uma maior rigidez devido à idade, além de certa saudade do
passado. Ela parece estar vivenciando um período em que as experiências, que eram sua
sustentação, o que alicerçava seu fazer profissional, começam a se desestabilizar.
Professora Agnes
A professora Agnes teve sua formação inicial na Unesp finalizada em 2007. Mesmo
com apenas cinco anos de experiência como docente, aceita acompanhar estagiários desde o
início de sua carreira, pois justifica que teve dificuldades em encontrar alguém que a
recebesse no período em que foi estagiária. Esta experiência não foi compreendida pela
professora naquele momento, porém, impeliu-a a decidir que sempre receberia estagiário
apesar do transtorno, pois declarou que receber estagiários é um transtorno por modificar o
comportamento da classe e por ser constrangedor ser observada por muito tempo. Contudo,
como declarou, nunca teve problemas com eles, por isso continua recebendo-os quando
solicitada.
A própria docente caracteriza sua fase profissional atual como sendo “mais leve” do
que antes, por estar mais convicta da teoria, de suas ações. Reconhece, porém, que ainda tem
muito a aprender, principalmente no que diz respeito ao “controle interno”. Afirma ter
segurança quanto à parte pedagógica, possuindo muitos materiais que lhe permitem trabalhar
com o 1º ano, de modo que pode ver o que funcionou com determinada turma e o que não
funcionou, podendo assim rever seu trabalho e alterar algumas práticas. Este trecho do
depoimento da professora nos remete às proposições de Huberman (1992) quando trata sobre
o ciclo de vida profissional, citando “a fase da estabilização, tempo de domínio da situação,
no plano pedagógico, e traz uma sensação de libertação” (p. 41). Ao discorrer sobre a fase de
estabilização no ensino, o autor ressalta que se trata de uma escolha subjetiva, por pressupor a
renúncia a outras profissões, sendo carregada de um significado de pertença a um corpo
profissional e de independência. Diz ele: “[...] a estabilização precede ligeiramente ou
acompanha um sentimento de ‘competência’ pedagógica crescente” (HUBERMAN, 1992, p.
40).
Ao refletir sobre sua própria formação inicial, período em que ocupava o lugar de
estagiária, descreve-o como momento de afirmação pela escolha profissional. Experiência que
lhe permitiu refletir sobre sua opção profissional, proporcionando-lhe convicção, pois, ao
relatar sua experiência enquanto estagiária, declara: “Era o que eu queria fazer na minha vida
inteira e era exatamente aquilo”. Interessante ressaltar que, ao relatar essa sua vivência, afirma
que não consegue se recordar das atividades desenvolvidas durante o estágio. Segundo seu
depoimento, o que marcou o período foram as relações estabelecidas com as professoras que a
acolheram, bem como o perfil das mesmas, descritas como “boas professoras”, “experientes”,
que lhe davam incentivos, que se relacionavam bem entre si. Sua opção por trabalhar na
mesma escola em que realizou o estágio deve-se a essas impressões reunidas naquele período.
A professora faz alusão ainda aos momentos de crise que vivenciou no estágio, ao
verificar que a realidade entrava em conflito com a teoria vista na universidade. Entretanto,
afirma que, apesar de as práticas observadas se afastarem em vários aspectos das teorias que
estava estudando na universidade, percebia resultados positivos e que os modos de fazer das
professoras da escola “fazia sentido”, apesar de em alguns momentos considerar que as
práticas da professora conflitavam com as teorias da universidade: “[...] apesar de estar sendo
conflitante do que eu tinha visto de teoria, o que ela fazia tinha sentido também” (depoimento
da professora na 1ª entrevista).
A professora concebe o estágio como “meio que possibilita o contato com a sala de
aula de verdade”. Afirma que esse contato ocorre em função de o estagiário poder ver como
funciona a realidade.
Apesar desta sua percepção sobre o estágio, a professora abriu mão do curso de
extensão oferecido aos professores no ano em que a pesquisa de campo foi realizada,
justificando suas muitas responsabilidades. No período da manhã, estava envolvida com o
projeto de reforço da Secretaria da Educação, realizado na própria escola em que leciona. No
período da tarde, trabalhava com um 1º ano, além de ter se comprometido a participar do
curso de alfabetização obrigatório do governo federal, o PACTO.
Professora Fábia
Fábia possui 15 anos de experiência docente e, no ano em que a pesquisa de campo foi
realizada, recebia uma estagiária em sua sala pela primeira vez. É formada no curso de
magistério, realizado em nível médio, e no curso de Pedagogia. Teve experiências com
classes de alunos com necessidades especiais na APAE e atualmente trabalha com uma classe
do Ensino Fundamental I na rede municipal de Rio Claro. Participa de um grupo de estudos
de alfabetização por projetos na universidade, cujo trabalho é fundamentado na proposta da
francesa Josett Jolibert.
Esta foi sua primeira experiência em acompanhar uma estagiária. Segundo relatos da
própria professora nos dois encontros de professores na universidade, e ao acompanhar
professora e estagiária em uma reunião de análise do trabalho que desenvolveram com os
alunos em sala de aula, foi descrita como uma relação que deu certo, que pode ser
caracterizada como uma parceria.
a estagiária ficava responsável por pesquisar e elaborar alguns materiais. Esta prática se
tornou uma oportunidade de aprendizagem sobre o trabalho docente para a estagiária e de
orientação para a docente, que intervinha com seus saberes sobre o trabalho docente.
O diálogo, portanto, se apresentou como base para a construção dessa relação, que
pode ser caracterizada como parceira.
Para a professora Fábia, o estágio deve ser um momento em que o estagiário tenha
subsídios para decidir pela profissão docente. Da parte do professor, deve ser uma experiência
que lhe permita redimensionar sua carreira, de maneira que passe a trabalhar em equipe e se
disponha a receber estagiários. Pois, segundo a professora, este período implica em colocar
para o estagiário que os professores estão inseridos em um sistema e que não estão isolados na
situação de trabalho. Para ela, é importante que o estagiário perceba, durante o estágio, que o
trabalho docente sofre, então, múltiplas influências vindas do contexto em que atuam.
Professora Nicole
Nicole foi uma das professoras selecionadas como sujeito para esta pesquisa no início
dos trabalhos. Ela tem apenas 5 anos de experiência no magistério e recebe estagiários desde
o início de sua carreira. Ademais, participou do curso de extensão oferecido em 2011 pela
universidade parceira no estágio.
Segundo ela, a recepção possibilita, ainda, visualizar a prática; “entrar na prática antes
de ir para sua própria sala de aula”; “é uma prévia”; é ter esse “contato de ver que ela
37
(professora acompanhada) também está sujeita ao erro”. Para ela, é verificar, ainda, que
muitas vezes a prática contradiz a teoria, pois declara que “nem tudo o que é visto na teoria é
o que acontece em sala de aula”. Afirma também que a universidade é responsável por
oferecer a base teórica, porém, é preciso que se oportunize a discussão sobre a prática.
Destaca ainda que “as coisas observadas” pelos estagiários, consideradas “absurdas”,
devem ser utilizadas como questões para discussão, para ver o que precisa ser melhorado; pois
coloca: “a observação dá um norte [...] porque, afinal de contas, a gente dá a base”.
Nicole realizou sua formação inicial na Unesp/RC e neste momento descreveu sua fase
profissional como um período de transição, ao declarar: “estou saindo daquela fase do
desespero... estou entrando na fase de uma segurança um pouquinho maior [...]”. Considera
que está vivenciando uma fase de saída do “desespero” e entrada na fase de uma maior
segurança devido ao ganho da experiência, o que, segundo suas declarações, a encaminha
para a busca de soluções “mais centradas e conscientes”.
Professora Emília
A professora Emília teve sua formação inicial no curso de magistério, em nível médio,
e também no curso de Pedagogia. Tem 20 anos de experiência e atualmente é efetiva em duas
classes da rede municipal. É a professora com o maior tempo de trabalho na unidade escolar
em que atua.
38
Conforme os dados iam sendo reunidos, procedeu-se sua análise, focada em seu
conteúdo. Consideramos que todo o processo de coleta e análise de dados é interpretativo,
voltado para a compreensão dos fenômenos em seu contexto, em um movimento dialético
entre teoria e a técnica, hipóteses e interpretações, que vão ramificando, produzindo
( BARDIN, 1977,p.80).
brutos, de modo que fomos elencando as categorias que se sobressaíram. Já com os relatos
ampliados produzidos a partir das observações, o material foi explorado de maneira
semelhante à segunda entrevista. A partir deles, foram produzidos os primeiros registros de
análise, após leitura flutuante. Essas práticas se inspiram no trabalho etnográfico, conforme
proposto por Rockwell (2009), “[...] entre o início e fim, as análises requerem uma série de
passos intermediários consistentes na elaboração de escritos sucessivos (notas, registros
ampliados, quadros ou fichas, descrições analíticas) (p.65, nossa tradução ).
Em um trabalho já exploratório das informações expostas pelos sujeitos por meio das
entrevistas, arquivos foram criados para armazenar os depoimentos das professoras e cenas
observadas relacionadas às categorias ressaltadas. Essas foram submetidas à análise e reflexão
dos dados, selecionando o que é significativo, interpretando e reinterpretando, construindo
categorias de análise, tendo a partir dessa etapa como produto um texto descritivo dos dados
com alguns apontamentos. A análise se deu como um “processo interativo com a coleta de
dados”, conforme afirma Mazzotti (2001,p.171). Conforme as orientações de Rockwell
(2009), “Na etnografia não deve haver divisão entre a tarefa de coleta de dados e o trabalho de
análises”; essas são partes indissociáveis do processo investigativo[...](p. 22, nossa tradução ).
A triangulação dos dados coletados por meio da observação, dos depoimentos dos
sujeitos, tanto na sala de aula, como nos encontros, nas entrevistas e a busca pelos
conhecimentos teóricos, permitiu uma análise mais profunda por serem instrumentos que
possibilitam variados ângulos de visão, a partir do cruzamento das informações
(SARMENTO, 2003). Esse procedimento metodológico se torna apropriado por abarcar um
conjunto de instrumentos investigativos adequados à análise do objeto a ser estudado e por
fazer “o investigador abdicar do efeito de totalização, pois tem de fazer prova, pelo
cruzamento triangulado das fontes, tipo de dados e métodos, de que as suas interpretações têm
uma base empírica de sustentação” (SARMENTO,2003,p.158).
Por meio desses registros, fizemos uma descrição de cada caso- de cada uma das três
professoras focalizadas. A partir das três categorias elencadas- recepção, acolhimento e
acompanhamento- realizamos a exploração dos dados que nos encaminharam à novas
propostas de categorias relacionadas ao acolhimento, pois esse foi o modo elegido pelas
professoras para recepcionarem os estagiários. Os dados foram trabalhados com os conceitos
de análise: o modelo pedagógico da modernidade (CARVALHO,2000) e o modelo
pedagógico da contemporaneidade (BUENO e SOUZA, 2012).
Por fim, buscamos alcançar uma "descrição densa" que resultou do "esforço de
articulação entre fatos, o envolvimento na lógica de sua organização, o decifrar dos aspectos
obscuros, o buscar pistas para desvendar certos mistérios” (TURA,2003,p.190)
Tal perspectiva sobre o estágio encontra lugar hoje nas discussões da área e em
experiências formativas desenvolvidas nas disciplinas de Prática de Ensino e de Estágio
Supervisionado em diferentes cursos de licenciatura e pode se revelar como uma introdução à
docência, um período de preparação à profissão (SARTI, 2009). Momento advogado por
Nóvoa (2009) como sendo “fundamental para consolidar as bases da formação, que deve ter
como referência lógica de acompanhamento, de formação–em–situação, de análise da prática
e de integração na cultura profissional docente” (p.38).
Este documento coloca o estágio como parte que compõe o processo formativo de um
profissional. Em seu parágrafo primeiro do artigo 3º tanto determina que o educando nesse
processo seja “acompanhado”, como estabelece que tal ação seja efetuada/encaminhada pelo
“professor orientador”, que é o professor da universidade, responsável pela disciplina do
estágio supervisionado. E também por um “supervisor” da “parte concedente”, que no caso da
formação de professores é o professor da escola, que recebe o estagiário. Interessante notar o
artigo 9º, que indica este outro sujeito que também deve se responsabilizar pela formação do
futuro profissional:
43
Essa legislação descreve ainda que, dentre as obrigações da parte concedente (no caso
da formação docente, a unidade escolar), refere-se à escolha de um profissional experiente da
mesma área de estudo do estagiário, que desempenhe o papel de “orientar e supervisionar” o
mesmo (p.4). Tais denominações apontam para mudanças significativas para o campo da
formação docente, mais especificamente para o período do estágio. Depreendemos que tal
legislação sugere que este período da formação seja acompanhado, mais do que apenas
recepcionado, pois entendemos que “orientar” requer movimento por parte de quem assume
essa posição; desenvolver uma ação. Tal proposição segue a “tendência internacional”,
segundo Sarti (2013), “de integração entre o local de trabalho docente e a formação de
professores”(p.84). A universidade não é mais considerada como o único espaço de formação
profissional e a escola passa a ser chamada a se envolver mais sistematicamente neste
processo, o que evidentemente implica em envolver outros sujeitos - professores da educação
básica. Segundo esse documento, trata-se de um envolvimento que ultrapassa a mera
recepção. Portanto, espera-se que o docente integre novos papéis a sua identidade
profissional. Entretanto, como já exposto por Souza Neto e Benites (2013,p.6) “deixou em
aberto a formação do professor que recebe os estagiários”.
No que se refere à legislação específica sobre a formação de professores, em 2001, o
Parecer CNE/CP 28/2001 (BRASIL, 2001c), que dá nova redação ao CNE/CP 21/2001 (que
estabelece a duração e a carga horária dos cursos de Formação de Professores da Educação
Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena), denomina a escola
como “instituição acolhedora” nos estágios, enquanto a universidade é considerada como
“instituição formadora”.
44
Este parecer abre espaço para pensarmos que a formação docente requer a atuação de
“equipes pluricategoriais”, ou seja, a formação de professores não pode ser de
responsabilidade exclusiva de uma instituição ou de um formador. O documento sugere que
haja um envolvimento de vários profissionais em uma ação colaborativa, de maneira que
todos contribuam e se comprometam com a formação do futuro docente. Tardif (2000) propõe
45
O parecer identifica ainda o lugar que deve ser ocupado pelo estagiário “o estágio
curricular supervisionado é, pois um modo especial de atividade de capacitação em serviço e
que só pode ocorrer em unidades escolares onde o estagiário assuma efetivamente o papel de
professor”(p.10). Essa indicação aponta para a transição vivenciada pelo futuro docente e que,
apesar da familiaridade com o espaço escolar, o mesmo é agora encaminhado a se posicionar
em outro ângulo, de modo que seu olhar para os fazeres docentes e o ambiente escolar seja
com o propósito de integrar-se a esta nova cultura para vivenciá-la e não mais como aluno.
O tema dos estágios na formação de professores vem recebendo crescente atenção por
parte das pesquisas acadêmicas. Tal afirmação constata-se, por exemplo, por meio da leitura
de alguns trabalhos apresentados na categoria de comunicação oral no Endipe (Encontro
Nacional de Didática e Prática de Ensino) 2010 e na participação do evento e na leitura dos
resumos dos trabalhos apresentados na forma de comunicação oral relacionados ao tema do
estágio no XVI ENDIPE 2012 (Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino), realizado
em Campinas, que teve como tema “Didática e Práticas de Ensino: compromisso com a
escola pública, laica, gratuita e de qualidade”.
Não poderíamos deixar de levantar os dados explorados neste evento, pois, como bem
colocado por Pimenta e Lima (2010), o ENDIPE é espaço de consolidação das teorias e
práticas de ensino.
Matemática- 7 trabalhos
Letras- 6 trabalhos
Ciências Biológicas- 5 trabalhos
Biologia- 5 trabalhos
Educação Física 4 trabalhos
Química- 2 trabalhos
Artes Visuais- 2 trabalhos
Inglês- 2 trabalhos
Física- 2 trabalhos
História 1 trabalho
Geografia- 1 trabalho
Quantidade de trabalhos apresentados na categoria Comunicação oral com o tema estágio- XVI Endipe 2012
Alguns trabalhos não foram contabilizados por terem sido investigados em mais de
uma licenciatura.
Nosso objetivo não era mostrar a quantidade exata dos trabalhos sobre estágio em suas
respectivas licenciaturas, mas pontuar as informações que eles nos oferecem sobre as questões
que são discutidas, de modo que revelam a direção do foco dos trabalhos que exploram o
estágio supervisionado. Diante dos que foram apresentados no referido evento, podemos
pontuar que a Pedagogia tem sido o lugar mais visitado no que diz repeito ao estágio, com
uma diferença discrepante em relação às demais licenciaturas. Em seguida, vem a licenciatura
em Matemática. Ao mesmo tempo, apesar da preocupação tímida sobre o estágio, as
informações revelam que há uma tendência em se discutir a questão nas demais licenciaturas.
temática nas produções apresentadas nos X e XI Congresso Estadual Paulista sobre Formação
de Educadores, ocorridos em 2009 e 2011. A pesquisadora ressalta que a maioria dos
trabalhos reunidos por ela, focaliza a dicotomia entre teoria e prática e coloca “o estágio como
momento oportuno em que os alunos estagiários têm condições de se familiarizarem com as
possibilidades e dificuldades vivenciadas pelos professores” (FERENC, 2012,p.3427)
Quadro com as questões elencadas nas discussões dos trabalhos que serão expostos
com maiores detalhes logo em seguida.
docente.
9 Espaço de descoberta do ser professor na vivência
contexto escolar.
9 Elemento central no processo formativo do professor.
9 Eixo articulador.
docente. Em relação a este ponto, Melo (2012); Pereira e Pereira (2012) buscaram conhecer a
perspectiva dos estagiários da Educação Infantil em relação ao papel do estágio na formação.
E como resultados colocaram o estágio como oportunidade para os estagiários se
familiarizarem com o cotidiano das salas de aula, e as possibilidades e dificuldades
vivenciadas pelos professores. Explicitaram ainda a relevância de se articular teoria e prática,
além de colocar a escola como local de estudo e pesquisa.
Leite (2012) sinaliza que a contribuição dos cursos têm sido precárias, devido às
problemáticas vivenciadas pelos professores no momento da inserção na profissão.Diante
deste quadro, a pesquisadora afirma que o estágio e a prática de ensino têm se mostrado
insuficientes no que se refere à construção de saberes necessários para atuação docente, por
isso, propõe que se “repense as formas de organização, o desenvolvimento e avaliação dos
estágios e das práticas de ensino para que seja assegurado aos estagiários um contato próximo
e real da realidade escolar” (p.169).
Melo (2012,p.5055) concebe que a direção para se obter uma melhor formação na
prática dos estágios está relacionado à existência de uma maior integração na relação entre
teoria e prática, o que para ela requer uma aproximação entre as disciplinas com caráter mais
teórico com a que possuem uma natureza mais prática.
Em seu estudo Costa (2012) partiu das concepções dos professores orientadores de
estágios da universidade sobre prática e pesquisa, e observou que “as precárias condições de
fazer estágio continuam presentes. E é a ação do professor como pesquisador de sua própria
prática que amplia e consolida o campo da prática como lugar da produção de
conhecimento”(p.6037). O que resulta então em diversos projetos de estágio e de iniciação à
docência, que segundo a autora é “fruto da postura investigativa vivenciada no cotidiano dos
estágios” (p.6037).
3.2.2.4- Legislação
Alguns autores analisam questões das políticas públicas relacionadas ao estágio, como
Romanelli e Maia (2012) que verificaram se o estágio cumpre o papel colocado pela
legislação.Seus resultados mostraram que o estágio supervisionado é visto como relevante
55
3.2.2.5- Reflexão
Brito (2012) também analisa a narrativa escrita como ferramenta que potencializa a
reflexão crítica, de modo que conclui que “a narrativa, o estágio supervisionado e a reflexão
56
Cruz e Bittar (2012), mostram em seus estudos que a reflexão na ação é um meio para
se “aprender na prática”(p.3394), além de estar amparado de um repertório de conhecimentos
do instrutor, o que mostra a relevância do professor formador em todo o processo; atividades
dentro de uma perspectiva investigativa de reflexão e ação sobre a prática (BARBOSA e
JARDILINO, 2012); RODRIGUES e KICHOW, 2012); REBOUÇAS, 2012;; SOUSA e
CABRAL, 2012; ZANON, 2012).
autoras destacam que “os professores atuam e assumem papéis que têm potencial de
contribuir para a formação inicial docente do estagiário”(p.6953).
Notamos que na maioria dos trabalhos, a atenção está voltada para os graduandos,
também denominados nas pesquisas como acadêmicos, estagiários, futuros docentes ou
licenciandos. Focalizados em suas percepções sobre o estágio como instância formativa,
esclarecendo suas possibilidades e desafios.
3.3.1-Ouçam as vozes...
Rodrigues e Kichow (2012) afirmam que tal relação vem sendo desenvolvida em
alguns espaços, mas esta aproximação ainda lhes parece frágil, requerendo o estabelecimento
de diálogos mais frequentes entre as duas instâncias , o que para esses pesquisadores exigiria
ações que ultrapassassem as formalidades institucionais.
Araújo (2012), em seu trabalho, sublinha que pensar o estágio e a prática como objeto
de estudo requer uma abordagem pluridisciplinar, que exige uma interlocução com a produção
de várias áreas, tais como políticas educacionais e curriculares, Didática, Prática de Ensino,
entre outros. Tal abordagem pluridisciplinar poderia, segundo a pesquisadora, complementar e
enriquecer a compreensão sobre o tema, por meio do fornecimento de ferramentas teórico-
metodológicas pertinentes.
estagiários passaram a compreender que a ação educativa envolve muito mais que técnicas de
aprendizagem, mas é parte de um contexto político, social, econômico e cultural e segundo a
autora abandona o caráter instrumental e burocrático.
Outro tema que circulou em diversos trabalhos apresentados naquele evento diz
respeito à reflexão. Proença e Valençuela (2012) destacam o estágio supervisionado como
um processo que possibilita momentos de estudos e reflexão em sala de aula, observação da
realidade e regência. Muitos pesquisadores ressaltaram a importância da reflexão na ação;
sobre a ação de ensinar e sobre o ser professor (MACIEL,2012); da reflexão sobre a prática,
como princípio formativo (SOUSA; TEIXEIRA,TRINDADE; PEREIRA, SAKAI; LIMA;
BETTIOL; ZANON; SOUSA, CABRAL,2012). De acordo com tais estudos, o trabalho de
Bittar e Cruz (2012) destaca que esses processos reflexivos estão amparados sobre o
repertório de conhecimento do instrutor, o que mostra a importância do professor formador
(professor experiente, neste caso, licenciado em Matemática) em todo processo.
Outra ideia identificada em alguns dos estudos focalizados diz respeito ao trabalho
colaborativo. Pereira e Sakai (2012) consideram o estágio como possibilidade de troca de
experiência entre as instituições universidade e escola. Azevedo e Abib (2012) também
consideram a possibilidade colaboração no estilo de orientação que os professores
supervisores de estágio podem vir a desenvolver
Ferenc (2012) retrata a escola como lócus de estudo e pesquisa. Além de concordar
com esta visão, Silva (2012) apresenta a escola como campo de estágio. Já Bezerra, Sátiro e
Passos (2012) a considera como lugar privilegiado de formação inicial e continuada. Engajado
nesta mesma perspectiva, Rivas (2012) ao evidenciar, após análise de relatos de estagiários,
que a escola tem este potencial; tanto para o licenciando como para o professor, relaciona esta
formação continuada às reuniões pedagógicas e de HTPC (Hora de trabalho pedagógico
coletivo), principalmente por meio do estágio, contudo, não propõe meios de formação para o
professor que acolhe o estagiário. Firmino (2012) defende que a escola seja um lócus de
desenvolvimento profissional; “lugar significativo, onde constrói-se a identidade docente e se
dá num processo evolutivo de experiências que vão sendo adquiridas com a convivência e
pelos rituais consagrados e instituídos”(p.3569).
Quem participa afinal da formação dos futuros docentes? Quem são os formadores
colocados nas discussões? Dentre as vozes mais audíveis, sobressai a dos professores
supervisores de estágio. Que papel eles desempenham neste processo?
Pires (2012), ao realizar uma pesquisa com foco no estágio sob a ótica do professor
supervisor, denominado pela autora de orientador, que possui a oportunidade de articular as
dimensões teórica e prática, ambas indispensáveis à formação docente, constatou que
“professores orientadores ainda estão muito arraigados a uma prática tradicional, apesar do
discurso inovador”. Segundo ela, “os relatos das práticas estão rodeados de novas teorias, mas
não têm chegado às escolas”(p.930).
do magistério. Pires (2012) sublinha ainda que a interação entre professor orientador e
estagiário é tão necessária quanto entre professor orientador e seus pares. Ressalta que os
estagiários que participaram da pesquisa não salientam professor regente (professor em
exercício da educação básica) como atores do processo de estágio; além disso, evidencia que
os discursos de propostas inovadoras de estágio, não condizem com a prática por não chegar
até os professores da escola. Ponto que justifica o lugar em que estes são vistos e situados
neste processo.
O professor tutor regente (TR), responsável por uma classe dos anos iniciais
que recebe o estagiário, tem a função de planejar e orientar os momentos de estágio na
escola. Além disso, media a interação do estagiário com a turma e avalia seu processo
de participação e desempenho (p.464- grifo do autor).
66
Já Galindo e Abib (2012) dão voz aos professores da licenciatura de Física que
receberam estagiários em suas salas de aula para se aproximarem dos sentidos atribuídos
pelos mesmos ao estágio supervisionado. As pesquisadoras os colocam como um dos sujeitos
principais que participam do estágio supervisionado, junto ao professor supervisor e ao
estagiário.
O tema dos estágios na formação de professores vem recebendo crescente atenção por
parte das pesquisas acadêmicas como podemos evidenciar nos dados aqui apresentados.
Vários estudos sobre o assunto têm sido produzidos sob diferentes enfoques e ao mesmo
tempo, todos os aspectos explorados são considerados relevantes para a efetivação de um
estágio supervisionado produtivo. Pimenta e Lima (2010) afirmam que “professores
orientadores de estágio e pesquisadores, situados em universidades de diferentes regiões do
país, se colocam a frente do que prescrevem as resoluções do CNE” (p.88 ).
Tais estudos parecem revelar alguns pontos importantes. Como visto, poucos dos
trabalhos aqui evidenciados tiveram como foco o professor da educação básica que recebe o
estagiário e participa da constituição desse profissional. Embora atentemos para a importância
dos estudos que focalizam o estudante em formação profissional no processo de constituição
do estágio, consideramos que é preciso ampliar a perspectiva que incide sobre o mesmo,
incluindo os demais sujeitos envolvidos nesse processo. Com essa ampliação, pretende-se
permitir que todos os envolvidos tenham voz na formação dos futuros docentes. É preciso
ampliar o olhar para todo o processo de formação, bem como, para os diversos ângulos e
sujeitos que a compõe, professores supervisores (universidade), estagiários, professores da
escola básica, que evidentemente, estão interligados.
professor da Educação Básica ainda não tem tido voz ativa nesse processo. Ao mesmo tempo
identificamos uma tendência que emerge no campo da formação de professores sobre um
modelo de formação profissional que evoca o envolvimento e participação deste professor,
apontando-o como “formador de campo”.
Tal participação impulsiona outros fatores relacionados que também estão sendo
discutidos. Como por exemplo, a articulação entre teoria e prática, universidade e escola, que
ressaltam a importância das práticas colaborativas entre as instituições e ainda esta articulação
“como fundamento do princípio da alternância” (BORGES,2008,p.169). A pesquisadora
explica que é um modelo de formação profissional que “ocorre em alternância entre o meio
escolar e o meio de formação na universidade”(p.161), além disso, esse movimento “promove
a reflexão”, ponto também muito discutido nos trabalhos apresentados.
Entretanto, esse papel ativo na formação docente representa um papel adicional a ser
desempenhado pelo professor em exercício. Além de desenvolver-se enquanto profissional
que domina saberes do ensino, o saber-fazer, paralelamente, se faz necessário desenvolver-se
69
enquanto formador de adultos, uma área que requer outros saberes e competências que
possibilitam a concretização dessa parceria. Portanto, ao participarem da formação de outros
professores, os professores experientes realizam um alto investimento de energia, que deve
ser considerado.
70
4. AS RELAÇÕES FOCALIZADAS
No período em que a pesquisa foi realizada a professora Isabel possuía vinte e cinco
anos de magistério. Teve sua formação inicial antes da LDBEN (1996) (Lei de Diretrizes e
Bases Educação Básica Nacional), época em que o ingresso na carreira exigia apenas a
habilitação específica para o magistério em nível médio.
Após 25 anos com tantas mudanças, ela declarou que se sentia cansada. Explicou que
a cada ano que vem tem uma “novidade diferente”, o que a faz pensar que sua “experiência
não serve de muita coisa”. Pois é como se tivesse que “guardar tudo e começar de novo”. “É
sempre um começar”. Ressaltou: "parece que a gente nunca deu aula na vida” (1ª entrevista).
Ela recebe estagiários da Unesp há cerca de sete anos, por valorizar a proposta de
parceria colocada, que segundo ela, “é uma oportunidade de aprendizagem ímpar, que
oportuniza conhecer a sala de aula, além de possibilitar reafirmar a escolha pela profissão”.
De acordo com seus depoimentos, já recebeu estagiários de outras faculdades, mas foi por
“imposição”, “obrigação”- “ Era ficar no fundo olhando o que a professora estava fazendo de
errado.Tive experiência assim antes das estagiárias da Unesp” (1ª entrevista). A professora
revelou que com o tempo foi “aprendendo” a receber estagiários. “Recebo porque quero,
porque gosto. É um sangue novo. Traz coisa que a gente nunca viu. Não tenho tempo com
uma classe”.
Quando a professora da sala em que estagiavam considerava que estava na hora, escolhia uma
das estagiárias para fazer a regência de uma aula pronta, que não podia ser modificada, esta
era proposta pela própria docente. Tal aula já havia sido trabalhada com os alunos. E estes
eram preparados para aquele momento, inclusive com perguntas determinadas e não iam nem
ao banheiro. Esse tipo de estágio, de acordo com os depoimentos, “não acrescentava nada
para o estagiário, porque via aulas soltas, não tinha contato com as crianças. Só se a
professora deixasse olhar os cadernos, corrigir”. A professora citou ainda que os materiais
dos alunos das salas onde faziam estágio estavam sempre arrumados em cima da mesa. “Você
tinha uma classe perfeita”. “Quem dava aula é porque queria ingressar na carreira. Você
não tinha liberdade de criar”. A professora adjetivou essa experiência como “ruim”, pois esta
proposta de estágio não possibilitava que os estagiários fossem “preparados para enfrentar a
realidade” quando assumiam suas próprias classes por “não encontrar os alunos quietinhos.”
Por isso a professora Isabel enfatizou diversas vezes o valor que atribui ao estágio
proposto atualmente pela universidade. A professora parece compreender que estágio é um
período de formação que acrescenta por possibilitar o contato com o “real”, pois é uma
oportunidade do “estagiário ver o que acontece no dia a dia. É muito bom! Só não sai do
estágio com tudo bem definido na cabeça quem não quer”. Para ela, se o estagiário “ficar
apenas com a teoria, vai se assustar quando vier para a sala de aula. Esse estágio é muito
bom!”. “A teoria é muito bonita. O papel aceita tudo. Muitas vezes a gente não pode aplicar
a teoria na prática não”. “Na regência elas já têm clareza do que pode e do que não pode”.
Atualmente, o estagiário
sugar tudo o que a professora pode oferecer”. Ela ainda salienta que a interação entre uma
“estagiária com vontade” e uma “professora com vontade” é um ganho para as duas partes.
“Não adianta estar pronta para acolher e ela não ter vontade”. Sua expectativa inicial é
sempre receber uma estagiária “comprometida com o trabalho”, “com aquilo que realmente
quer” e com “vontade de aprender”, pois para ela se “aprende na prática”.
Diante da exposição de sua visão, entende-se que, para Isabel, o lugar do estagiário na
sala de aula foi modificado, bem como o lugar do professor em exercício nesse processo, pois
é ele quem tem maior contato com a prática e quem acolhe o estagiário, por ser o responsável
em orientar. “O papel do estágio, se bem feito, bem orientado, supervisionado, é uma peça
importante na formação por ver na prática o que é”. Aqui a professora pontuou o papel do
professor da educação básica, que acolhe o estagiário que, por estar inserido na prática tem o
papel de orientador do mesmo. Segundo os depoimentos, cabe a esse professor orientar o
estagiário sobre o que fazer em classe, sobre a importância dos registros nos cadernos dos
alunos, sobre a organização dos materiais com antecedência a serem utilizados nas aulas,
entre outros aspectos ligados à gestão da classe. O professor da universidade, conforme
Isabel, é o responsável pela supervisão do estágio.
Ela atribuiu este movimento de mudança, quanto ao papel do professor que recebe o
estagiário, como consequência da mudança de concepção de estágio e sua proposta.
73
“O pouco que eu sei vou tentar passar para elas. Elas também, dentro
do que vão aprendendo. É uma troca de experiência. Eu com a prática, elas
com a teoria, juventude, com o frescor da profissão”(Depoimentos da 1ª
entrevista). “A estagiária pega a teoria vai e encaixa com a minha prática. Não
ensino a estagiária. Fico mais como uma interventora do que ela vai fazer. Dá
para fazer.”(2ª entrevista).
Nessa declaração expõe as estratégias que utiliza inicialmente, que parece incluir a
escuta dos interesses da estagiária “[...]é deixá-la falar o que quer, falar, ver o grau de
interesse, empolgação. Quando não tem, você vai murchando”.
No entanto, para a professora Isabel, no ano em que a pesquisa foi realizada, não foi
possível construir nenhum tipo de relação com sua estagiária, pois “a estagiária não deu
abertura” para tanto. Segundo seu depoimento, a estagiária “cumpriu com a obrigação dela,
que era cumprir com as horas de regência e foi embora”. Esta “não abertura” por parte da
estagiária, seria caracterizada, segundo a professora, pelo fato da estagiária mostrar-se sem
‘disposição de aprender’, ‘desinteressada’, ‘sem iniciativa’ para desenvolver um trabalho que
era proposto e nem para além do que era proposto. Diante da postura que atribuía à estagiária,
Isabel passou a assumir um papel de observadora- “Nesse estágio só de observadora
mesmo”. “[...]As dicas que passei. Acho que era um papel que não vi retorno nas aulas”.
Conta que continuou a oferecer-lhe “dicas” com a expectativa de que fossem colocadas em
prática. Pois, como já exposto anteriormente, para ela, o estágio da maneira como é proposto
atualmente possibilita aos estagiários “aprender de tudo”. Para ela, o estagiário só não
aprende "se não quiser". Conforme suas declarações, a disposição do estagiário para aprender
é central para o sucesso do estágio: “quem vai à escola apenas fazer estágio não percebe, por
estar preocupada em cumprir apenas com a obrigação”. Isabel espera receber estagiários
interessados no estágio e no trabalho docente.
A professora afirmou ainda que nem com as crianças a estagiária daquele ano tinha
construído uma relação mais significativa. Segundo seus depoimentos, não houve “laço” entre
a estagiária e seus alunos. Mas observamos que no momento em que a estagiária contou-lhes
que aquele seria seu último dia na sala, os alunos falaram em coro: “Ahhh!!!”
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Contou ainda sobre uma estagiária tímida que recebeu em outra ocasião, que a
princípio parou na porta e "ficou olhando". Após algumas conversas, ficava apenas sentada
como Mariana fazia mas, com o passar do tempo, quando chegava, passou a conversar na
porta com Isabel e com outras professoras e realizou um “trabalho maravilhoso” de produção
de um jornal. Agora, com relação a Mariana declarou: “Com essa daí, não sei se fui eu que
errei. Se não consegui chegar nela. Ela não queria melhorar”. Diante das experiências
anteriores, reconheceu que assumiu um papel de “parceira mesmo”. De sua parte, a professora
parecia esperar que a estagiária desenvolvesse as atividades da maneira como ela imaginava e
propunha; que seguisse o modelo proposto e suas estratégias de ensino. Essa sua expectativa
foi alcançada na relação estabelecida com outras estagiárias ao longo dos anos. Referindo-se a
uma estagiária que recebeu em um ano anterior, ressaltou: “Ela fazia, dava sempre aquele
olhar pra mim, ela começava; eu interferia, ia trabalhando em conjunto. Às vezes, quando ela
não fazia o que eu havia comentado, eu completava”.
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Por isso, em seus depoimentos utilizou o termo “dicas”: “ Todas as coisas que falei;
todas as dicas”. “[...]Acho forte dizer ensinar. As dicas que passei”. O período reservado
para o diálogo se resumiu ao que ela denominou de “dicas”, transmitir informações que
considerava relevante com a expectativa de que a estagiária seguisse suas “dicas”.
Todas as coisas que falei; todas as dicas, todas as atividades,
nada ela fez. Todas as vezes que eu tentei interferir, ela não aceitou.
Tanto que nas últimas vezes não falei mais nada.”. “Eu tinha um
monte de ideias. Tinha atividade que ela não precisava nem pensar,
era só levar e fazer.
Diante destas observações realizadas pela docente, ao ser indagada sobre sua
influência no processo de aprendizagem da estagiária, considerou:
Os alunos tinham como rotina entrar na sala, guardar o material e sair logo após o
sinal para tomarem o leite fornecido pela prefeitura. Isso levava cerca de 10 minutos. Em
seguida, transcorria a aula planejada pela professora. Momento em que a estagiária
permanecia em seu lugar apenas observando o transcorrer da aula.
3
A escola tem como norma que as professoras devem estar cinco minutos antes do horário para aguardarem as crianças já na sala
de aula.
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A partir do mês de maio no período das 7h10 às 8h40, parte dos alunos passou a ter
aulas de reforço fora da sala de aula com a professora Isabel enquanto os demais,
participavam de um grupo, denominado grupo de estudo, com foco em produção de texto. Em
seguida, então, passavam a ter aula de xadrez (desde o início do ano) com um professor
indicado pela secretaria de esportes. Só após o intervalo é que tinham aula com a professora
Isabel.
Neste período das aulas de reforço, a estagiária não saía com a professora Isabel e os
alunos determinados por ela, mas permanecia na sala de aula com a outra professora
responsável pelo grupo de estudo. Continuava em seu lugar apenas observando e em algumas
ocasiões escrevendo.
Logo que retornavam, já era o período da aula de xadrez 4, (a partir das 8h40 às 9h30)
momento em que quase todas as quartas-feiras a professora e a estagiária conversavam sobre
o plano de aula dentro da sala de aula mesmo, enquanto o professor de xadrez desenvolvia o
trabalho com os alunos. Nesse período, portanto, a estagiária se dirigia até a mesa da
professora e quando encerrava a conversa, a estagiária retornava ao seu lugar. Sempre
sobravam apenas alguns minutos para o intervalo, cerca de dez minutos, momento em que os
alunos organizavam as mesas ou já adiantavam o cabeçalho da próxima disciplina a ser
trabalhada.
Este tema era frequente nas conversas entre a professora e a estagiária, a necessidade
da organização antecipada dos materiais/ recursos que seriam utilizados em sala. Sempre
ressaltava a importância de ter os recursos em mãos.
4 É relevante ressaltar que no período da aula de xadrez oferecida aos alunos, a professora da classe deveria permanecer na sala
de aula e utilizar deste tempo para preparar ou corrigir atividades relacionadas a classe ou qualquer outra atividade relacionada a
classe.
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Mariana aceitou a proposta e foi elaborando os seus planos de aula à medida que as
semanas transcorriam e baseava-se nas conversas que tinha com a professora. A regência
ocorria geralmente no início do período, pois após o intervalo (9h30 às 9h50) a aula era
direcionada pela professora Isabel, porém, por volta das 10h40 os alunos saíam para o pátio
para o culto às bandeiras. Após concluir as aulas regidas por ela, a estagiária sempre retornava
ao seu lugar, fazia anotações e ficava o restante do tempo observando a aula sem interagir
com os alunos ou com a professora.
Contudo, a partir do segundo dia em que Mariana estava na sala, o processo de estágio
pôde ser acompanhado. Era uma sexta-feira, a estagiária chegou antes do horário de entrada
dos alunos -7 horas-e estava sentada. Nesse período, que normalmente durava cerca de dez
minutos, a estagiária Mariana aproveitou o momento e se dirigiu até a mesa da professora
Isabel para falar sobre o que havia pensado sobre o projeto de brincadeiras. Mariana expôs
que havia pensado em apresentar o projeto para as crianças, e que estabeleceria uma conversa
e em seguida pediria que realizassem um desenho sobre as brincadeiras antigas. Como a
estagiária levou suas ideias por escrito, a professora lhe deu atenção, leu suas anotações, mas
questionou-a sobre a simplicidade da atividade. Disse que o que ela propunha era pouco,
sendo que ela teria mais tempo para realizar esse trabalho, e que era preciso "prender a
atenção" dos alunos, propor atividades que tivessem uma sequência lógica e que tivessem um
objetivo. Nesse momento a professora lançou alguns questionamentos- “Qual seria o objetivo
de pedir que eles desenhassem”? “Que recurso você vai utilizar para apresentar as
brincadeiras”? Mariana argumentou que iria falar sobre o assunto com as crianças. “Mas o
que você vai usar, Power point? O que” ? A professora explicou que é preciso preparar uma
aula que chamasse a atenção dos alunos, de modo que ficassem estimulados para a próxima
etapa do projeto. Ela esclareceu ainda que as crianças desconheciam esse assunto, portanto ela
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propunha que a estagiária contasse a história sobre as brincadeiras para depois poder solicitar
alguma pesquisa. Quando os alunos retornaram para a sala de aula, ( após o intervalo para
tomar leite) a estagiária Mariana voltou ao seu lugar e a professora a apresentou
novamente, dizendo que eles tinham uma visita que já era conhecida por eles, que era a
Mariana. Complementou dizendo que ela iria começar um trabalho com eles na semana
seguinte e eles deveriam colaborar.
professora decidiu então produzir um texto curto que deveria ser colocado na lousa pela
estagiária para os alunos copiarem no caderno. Nas outras aulas, a própria estagiária trazia o
texto pronto para ser copiado, tal como recomendado pela professora.
Naquele dia então, o inspetor entrou na sala para montar o data show solicitado pela
estagiária. Mariana foi até a frente da sala para ligar seu computador. Enquanto a estagiária
iniciava a aula, a professora permaneceu em sua mesa organizando algumas atividades.
Durante as aulas que eram desenvolvidas pela estagiária, a docente ficava em sua mesa,
ocupada com seus materiais. Sobre essa sua postura, contou em um dos depoimentos que não
sabia o que fazer naquele momento, pois não queria constranger a estagiária. Em alguns
momentos observava, auxiliava algum aluno ou grupo; chamava atenção da sala ou de algum
aluno específico. Pedia para finalizar a atividade quando achava que o barulho ou a
desorganização era excessivo.
A estagiária então utilizou apenas dez minutos para abrir os slides que preparou e
iniciar a explicação sobre o tema. Nesse período, passou diversos slides sobre exemplos de
brincadeiras e brinquedos antigos e em cada um, perguntava aos alunos se conheciam aquela
determinada brincadeira. A maioria levantava a mão todas as vezes que ela questionava. A
professora fez uma feição de espanto e questionou em um tom não muito alto de voz: “Ela já
explicou tudo”? Como a tela onde as imagens eram projetadas ficava bem no centro, entre a
mesa da professora e a estagiária, parece que Mariana não percebeu a professora, pois não
teve nenhuma reação e deu continuidade à aula com as brincadeiras planejadas.
Seguiu então, com as brincadeiras de forca e passa anel que foram realizadas na
própria sala- essa etapa levou cerca de 40 minutos. Durante a realização das brincadeiras a
professora Isabel permaneceu em sua mesa mexendo em seus materiais, porém, interrompia
em algumas ocasiões, chamando a atenção dos alunos por diversas vezes devido o barulho.
Mariana também tentou chamar a atenção dos alunos, mas se colocava de braços
cruzados na frente da classe. Mesmo a estagiária querendo dar continuidade, pensando em ir
para outra brincadeira, Isabel pediu para encerrar devido a dispersão da sala, pois as crianças
davam opiniões sobre as regras e várias falavam ao mesmo tempo. Em seguida, a professora
Isabel entregou o papel com o registro que deveria ser colocado na lousa para as crianças
copiarem, que elaborou em sua mesa enquanto a estagiária trabalhava com os alunos.
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Nesse primeiro dia em que a estagiária iniciou o trabalho com o projeto, minutos antes
do intervalo, a professora a chamou para uma conversa: “O que você achou do primeiro dia
de aula”? Infelizmente, não foi possível ouvir a resposta da estagiária. Mas a professora
continuou, oferecendo indicações sobre os limites percebidos por ela na atuação da estagiária:
“Você não perguntou. Você não explorou o material que preparou com tanto trabalho”.
Naquela ocasião, a professora elogiou os slides que a estagiária preparou e reconheceu o
tempo gasto para prepará-los. Mas pontuou: “Você não pode dispersar. Deve dar as
coordenadas iniciais. Você deve integrar o Julio” (nome fictício do aluno que apresenta
problemas de aprendizagem e comportamento). “Ele é uma criança difícil, mas você deve
integrá-lo. É preciso sempre dar as coordenadas, mas se você não fizer isso, já, já vai virar
uma bagunça por ser o projeto que é. “[...]é preciso explorar o material ao máximo.
A professora então sugeriu outro dia para as duas se encontrarem para que ela pudesse
ver o plano de aula com antecedência e assim, a Mariana pudesse solicitar o material
necessário para os inspetores da escola. Elas agendaram a 4ª feira, e já combinaram de pedir
que os alunos trouxessem a garrafa pet para a confecção do brinquedo “vai e vem”. Mariana
perguntou sobre as garrafas, como deveria cortá-las, pensaram em como realizar essa
solicitação, e decidiram que os alunos trariam a garrafa inteira e Mariana iria cortá-las. A
professora retomou: “Pareceu que você queria terminar logo!” Mariana fez uma feição de
espanto com esta colocação e disse que não. Isabel seguiu com as orientações de como ela
deveria proceder, explicou que era preciso explorar o material ao máximo. “São pequenas
coisas que no decorrer do trabalho você vai compreender”. A professora retomou a
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importância dos registros, ressaltando que os pais reclamam a quantidade mínima de lições no
caderno.
Na sexta-feira seguinte, após a estagiária faltar na quarta- feira anterior, por motivo de
saúde, dia combinado para planejarem as aulas, Mariana aproveitou para ir até a mesa da
professora para conversar sobre a aula. A professora iniciou perguntando: “O que você
planejou para hoje?”. Mariana respondeu: “Confeccionar o brinquedo”. Isabel fez outro
questionamento: “Mas pretende falar alguma coisa antes?” Como a estagiária respondeu que
era apenas a confecção do brinquedo, Isabel limitou-se a indicar o local no fundo da sala com
um saco de aproximadamente 100 litros cheio de garrafas e a orientou a pegá-lo, ir até fora da
sala para cortar todas as garrafas. Mariana saiu para preparar as garrafas. Ela ficou um pouco
mais de uma hora fora. Nesse período, enquanto as crianças realizavam as atividades
propostas pela professora, a mesma desabafa dizendo que estava cansada, que além da
responsabilidade com a classe, tinha o aluno Julio, que necessitava de uma atenção redobrada
e ainda a estagiária.
Este mesmo dia a estagiária deu o depoimento de que estava gostando do curso de
Pedagogia, mas não sabia se era bem essa carreira que queria seguir.
Logo após o intervalo, Mariana aproveitou para conversar com a professora. Isabel
colocou que o dia agora seria insuficiente para a confecção do brinquedo e que iria deixar
para a outra semana. Mariana afirmou que estaria na quarta- feira, mas Isabel expôs que ainda
iriam planejar. A aula, portanto, seria apenas na outra sexta- feira.
Após uma semana, a professora sentada em sua mesa e Mariana no mesmo lugar de
sempre: “Vai fazer alguma coisa hoje ?” A estagiária respondeu que faria o brinquedo. Em
seguida, perguntou se ela iria colocar alguma coisa na lousa e Mariana afirmou que sim.
Mariana olhou para seu caderno, foi até a mesa de Isabel e mostrou o que havia preparado.
Ela colocou os óculos, leu com atenção enquanto Mariana ficou em pé ao lado da mesa
esperando. A professora orientou para que acrescentasse - Parceria- Unesp e escola – projeto:
Brinquedos e brincadeiras- estagiária Mariana”- no início do texto.
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A estagiária concordou, foi para a lousa iniciar a cópia do texto para as crianças
transcreverem, mas não cumprimentou as crianças. Ao terminar, a estagiária foi até a mesa de
Isabel e perguntou sobre o material que seria utilizado além das garrafas que já estavam
cortadas para confecção do brinquedo. A professora orientou que era preciso ver se o inspetor
estava desocupado para pegar o que ela precisava, pois salientou que ela não havia ido na
quarta- feira para organizar o material.
Mariana então saiu da sala e foi atrás do inspetor; logo retornou, sentou-se sem fazer
nenhum comentário. Isabel perguntou quem já havia terminado de copiar o texto. A maioria
das crianças levantou a mão e Mariana portanto, levantou-se, pegou o saco de lixo grande
onde estavam as garrafas, que estava no fundo da sala, próximo a sua cadeira e dali mesmo
diz: “ Pessoal, quem trouxe garrafa? Está com nome?”.A professora deu um sinal para que
ela fosse para a frente e comentou que eles colocaram os nomes. Mariana foi à frente da sala e
começou a chamar um a um e a entregar as partes das garrafas. Enquanto citava o nome de
uma das alunas, esta disse que a garrafa não lhe pertencia. A estagiária repetiu o nome; a
professora pediu para ver e confirmou o nome e entregou a garrafa para a criança. O inspetor
apareceu novamente e chamou a estagiária. Os dois saíram e em poucos minutos ela retornou
e continuou com a distribuição. Ao final, a professora perguntou se todos haviam recebido.
Como alguns não levaram as garrafas, foram chamados a atenção.
Neste dia, a rotina prosseguiu normalmente até o horário da saída em que Isabel
aproveitou para reforçar a importância de vir às quartas- feiras para planejar as aulas, pois
afirmou: “hoje não deu muito certo porque é preciso organizar o material antecipadamente”.
Ao retornar para sua mesa: “Um projeto é isso daqui”. “Lógico que você não vai fazer
isso aqui, pois este foi programado para meio ano.” “Mas é preciso explorar, o que é
brincadeira? É um resgate das brincadeiras antigas”.
A professora esclareceu que Mariana devia ter um objetivo. Que ela não esperava nada
escrito, por isso pensou em um trabalho mais voltado para a arte, pela facilidade que ele
possibilitava, segundo a visão da professora. Explicou ainda que, em cima da confecção de
um brinquedo ela tinha que trabalhar a linguagem. Explorar, por exemplo, o texto
instrucional, sua função social. A professora afirmou ainda que na confecção do brinquedo
“vai e vem” a estagiária “deixou no ar”. “A aula ficou solta”. Faltou explicar porque havia
montado o brinquedo. Ela ressaltou que é preciso contar a história do brinquedo. Isabel
comentou ainda que: “Perguntei para as crianças na 2ª feira sobre o brinquedo. Ninguém
brincou. Não tiveram interesse. Você deve explorar tudo o que puder ser explorado. Se
precisar ir lá fora. As regras.” Isabel retomou a importância de se organizar com
antecedência o material necessário. De discutir com as crianças quais são as regras antes de
saírem, perguntar pra elas quais são. Neste momento a professora parou e pediu silêncio para
a classe. E continuou falando [...]“é preciso falar sobre as regras; uma conversa básica; ter
domínio da sala para quando sair...” A professora Isabel seguiu a conversa utilizando o
exemplo da confecção do bimboquê. Disse que era preciso solicitar os materiais com
antecedência e “ter tudo esquematizado” do que iria precisar. Sugeriu elaborar uma lista junto
com os alunos sobre os materiais que seriam necessários. Propôs ainda que a cada semana
planejasse uma atividade diferente. Um dia a confecção de um brinquedo. Na outra semana
sair da sala para brincar. Indicou algumas brincadeiras, como o “passa anel” e a “amarelinha”.
“Aqui na escola temos duas pintadas no chão”.“São coisas assim que eu quero, não sempre
a mesma coisa”.Mariana pareceu concordar com a professora, pois olhava a todo momento e
mexia e concordava com a cabeça. Isabel recomendava também o que a estagiária deveria
escrever na lousa. Exemplo: “Vocês vão conhecer os brinquedos...Como eram as
brincadeiras antigas? Como os meninos brincavam ? As meninas? Quais eram os tipos de
brinquedos? É tudo pesquisa”. Ela ressaltou ainda o contar sobre o modo como os brinquedos
eram confeccionados antigamente, que eles eram confeccionados em casa, pelas famílias, com
sabugo de milho, bonecas de pano... A estagiária interveio com uma questão: “Posso trazer
brinquedos? Por exemplo, bonecas de pano[...]”, a professora: “ Claro, o que tiver, mas não
pode ser sempre a mesma coisa.É preciso ter expectativa...” E reforçou
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Tudo tem que ser planejado. Construir o brinquedo; sair para brincar.
Tem que conciliar o tempo de tudo, a explicação, o registro, montar, sair para
brincar. É preciso organizar tudo isso no tempo.Lembrando que na 6ª feira,
separei justamente porque não tem nenhuma aula extra, mas que às 10h30 tem
o hino. Por isso que eu falo, vem na 4ª feira para conversarmos sobre a aula a
organização do material.
Neste mesmo dia, no final da conversa, a professora entregou uma folha com um
quadro impresso, que era organizado em colunas, relativas aos dias da semana. Este era um
recurso criado pela escola, que era utilizado pelas professoras como material a ser entregue à
coordenação com a rotina das atividades que seriam trabalhadas durante a semana. “Olha,
esse papel facilita o trabalho porque já vem com os espaços para organizar as aulas e pensar
no material necessário”. A professora solicitou então, que a estagiária passasse também a
preenchê-lo semanalmente, para isso, pegou um quadro já preenchido como modelo. Neste
dia, portanto, foram oferecidos dois modelos à estagiária, do projeto e do quadro de rotina.
Após entregar o modelo, a professora Isabel acrescentou: “Se você soubesse como detesto
fazer essa rotina! A estagiária pareceu ter considerado um bom recurso para auxiliá-la a
organizar as aulas: “É até melhor isso mesmo!” ( Comentário da estagiária).
Apenas neste dia foi identificada uma conversa rápida entre elas sobre a postura de um
aluno. A estagiária comentou sobre a observação que fez de um dos alunos: “Eu estava
observando o aluno Léo (nome fictício), ele ‘viaja’ bastante. Ele está fazendo a lição daqui a
pouco para, se dispersa...” A professora fez um rápido comentário: “Ele é o caçula de irmãos
adultos”, mas estava focada no impresso que procurava para entregar para a estagiária, pois
era sobre isso que estavam falando e ao mesmo tempo, estava atenta a composição das duplas
que o professor de xadrez estava fazendo. Este foi o único momento observado de conversa
sobre um aluno específico.
A professora Isabel entregou à Mariana o projeto impresso realizado em 2012 para que
ela lesse a parte sobre etapas do mesmo. Após a leitura da estagiária, Isabel a questionou:
“Ficou mais claro, agora? O que eu gostaria que você fizesse é sempre trabalhar coisas
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diferentes, dominó, quebra –cabeça”. Sugeriu que solicitasse pesquisa com os familiares
sobre os brinquedos e brincadeiras da época. A estagiária interveio: “Estou aqui pensando na
amarelinha”. Isabel disse que poderia escolher. Que apenas não daria para ser futebol nem
bolinha de gude devido a falta de espaço. E seguiu com outra sugestão, da confecção de um
dominó gigante feito com papel cartão, experiência vivenciada com a turma anterior. Mariana
se admirou e Isabel deu o passo-a-passo do modo a se elaborar e mais uma vez justificou a
importância de se trabalhar com estes brinquedos, dando como exemplos, experiência de
alunos que não sabiam brincar com este tipo de jogos.
Ao final desse dia, Isabel declarou que esperava “melhora” na postura da estagiária, na
expectativa de que “surtisse efeito”. “ Eu falei com ela, agora vamos ver”.
tinha que ter mandado a aula. Aproveita para que eles façam o registro”. Mariana então, foi
até sua mesa e pegou seu caderno com o texto já preparado, o que deixou a professora
surpresa. Os alunos copiaram o texto da lousa e Mariana ficou atenta para ver se os alunos
estavam conseguindo copiar. Voltou então a falar com Isabel sobre retirar as crianças da sala
para realizarem a brincadeira, Isabel pediu para que uma das alunas verificasse com
professora que estava ensaiando lá fora se era possível sair e retornou com uma resposta
positiva. Antes de saírem, a professora Isabel deu algumas orientações para os alunos: “Olha,
nós vamos sair para brincar. A professora Emília tem ensaio. Se começar muita gritaria,
muito barulho, a gente volta e conversa aqui”!
Antes, porém, Isabel pediu para que Mariana lesse para ela o texto que produziu para
as crianças registrarem. Isso foi feito em voz baixa apenas para a professora, que não
conseguia ler de sua mesa. Logo depois, Isabel disse: “Explica pra eles o que você quer deles
lá fora. Você não aproveitou o data show. Nós vamos ter que conversar mais sobre a aula.
Não sei qual a sua intenção em trabalhar lá fora!”
A estagiária saiu para o pátio na frente dos alunos para brincarem de amarelinha. A
professora sentou-se em uma mureta do pátio para observar a atividade. Após fazer diversos
comentários sobre a estagiária com a vice-diretora, que parou para conversar, expôs sua
insatisfação quanto à postura da estagiária. Comentou por fim:
Acho que vou ter que conversar novamente. Vou ter que conversar
com a coordenadora pedagógica”. “[...]Dá dó. Os professores que estão se
formando hoje não querem aprender. É preciso ter humildade de chegar e
perguntar para os que estão há mais tempo: “ E a APM? Como anota? E o
diário? ( a professora cita exemplos). -“O que estou fazendo de errado ? Não
sei o que eu faço! Ela me mandou um email escrito: Jogo da amarelinha! Mas
eu expliquei que precisa vir antes para planejarmos juntas. Vou ter que
conversar com a coordenação”. E acrescentou: "é preciso querer aprender ,
estar disposta... isso eu não tenho percebido. Ela não tem vontade.
Metade do mês de maio e Mariana propõe a confecção de uma peteca com jornal após
explicações sobre sua origem e significado. Durante a aula os alunos permaneceram sentados
em suas mesas enfileiradas, de maneira que eram orientados e auxiliados pela estagiária. Este
foi um dia de muitas intervenções da professora para que os alunos permanecessem em
silêncio e concluíssem logo a atividade proposta. A última etapa era a saída dos alunos para
brincarem com as petecas. Isabel só pediu à Mariana que saíssem após o intervalo, pois o
momento em os alunos terminaram, era o horário de intervalo de algumas classes ( A escola
se organiza com dois intervalos- 1ºs aos 3ºs anos e depois 4ºs e 5ºs anos). Enquanto isso, os
alunos realizaram atividades de Matemática.
Quando saíram para brincar no espaço aberto, ao lado do pátio, a professora parou em
uma mureta para observar e declarou que notou certa mudança na aula- “a aula de hoje foi
pouca coisa diferente” . E citou o ponto que considerou diferente: “Acho que ela estava mais
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organizada. Mas a oralidade dela, essa voz, esse jeito, não dá”.Isabel disse perceber que
Mariana queria finalizar logo a aula, pois ela voltava a sentar muito rápido. Julgou que esta
pequena mudança foi devido as conversas que teve com ela sobre o planejamento e a
organização do material. Contudo, avalia que ainda é preciso outros momentos para
“conversar novamente”. De acordo com os depoimentos da professora Isabel, as crianças não
aguardavam a sexta-feira com ansiedade a aula da estagiária, pois alegou que não houve
“interação” e nem “envolvimento” com os alunos, porque ela “não brinca”. Esta postura era
caracterizada por ela como “falta de vontade mesmo" por parte da estagiária. Prosseguiu ainda
dizendo que as crianças olhavam para a professora por não compreenderem o objetivo das
aulas propostas por Mariana. Mais uma vez a professora reiterou: “ Não vejo nela entusiasmo,
vontade de ser professora. Não sei como vai ser. Fico imaginando ela numa sala de aula”. A
professora acreditava que o estágio estava sendo “um fardo”.
No decorrer da conversa, Isabel disse que esta postura de Mariana não estava
relacionada com a timidez. O fato também de ter sido considerada como boa aluna pela
professora da universidade responsável pelo estágio, foi considerado por Isabel como visões
diferentes, pois na faculdade ela era vista como aluna,“boa aluna”. Na escola era vista como
“futura professora”, cuja postura “não condiz” com essa posição. Isabel considerava que
Mariana iria “precisar de muito chão”, muita experiência com a prática, até desenvolver uma
"postura" mais adequada.
Final de maio, Mariana já chegou no dia de planejar a aula com a ideia de explorar as
cantigas. Isabel concordou com o tema, porém, interveio nas estratégias pensadas, com a
preocupação de que Mariana não desse conta de orientar todos os grupos e de que as crianças
se “agitariam”. Mais uma vez, durante a conversa, retomou alguns pontos já colocados: “O
que já falei outro dia, você está correndo demais. Não está aproveitando o tempo. Está muito
ansiosa. Eles sentem essa ansiedade, eles se agitam. Tire deles, explique mais vezes... fique
mais tranquila”. Mariana ficou atenta aos comentários de Isabel, fez anotações e a professora
pediu para que ela falasse o que diria na aula para os alunos. Mariana iniciou: “Vou entregar a
cartolina aí...”. Isabel interrompe e diz: “ Não . O importante é orientar antes de dar o
material” . E justificou “Quando a gente tem mais tempo, a gente fala e entrega ao mesmo
tempo”. A questão do tempo de experiência e o domínio das técnicas e dos modos de fazer
foram são salientados pela professora em outro momento da conversa
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Ao mesmo tempo declarou que também estava trabalhando este projeto em paralelo
nos outros dias da semana com os alunos. Dias em que a estagiária não estava na escola:
A professora seguiu dando exemplos do que poderia ser falado pela estagiária no dia
da aula, o modo como ela poderia desenvolver a atividade, as estratégias e recursos a serem
utilizados. Como deveria organizar o tempo da aula. Mas, solicitou que fizesse perguntas aos
alunos, da mesma maneira como havia feito em outra aula; que “envolvesse” os alunos para
que sentissem que fazem parte do projeto. A professora afirmou que o trabalho desenvolvido
por Mariana estava muito “unilateral”, pois não havia “troca” entre elas e os alunos e
reafirmou a importância do controle da ansiedade. Outro ponto retomado é sobre o propósito
das atividades. Resgatou a aula anterior e comentou que um aluno perguntou sobre o objetivo
de ter confeccionado a peteca e o que ele deveria fazer com ela. Mariana estava sempre atenta
e fazendo anotações. No encerramento da conversa Isabel perguntou: “Agora, diz pra mim,
que material você vai precisar?” Mariana citou uma lista simples de materiais e Isabel já a
orientou a separar tudo com o funcionário da escola , responsável pelos materiais. E por fim
Você sempre tem que ter na mão antes de qualquer coisa. A primeira coisa,
munida do seu material. Tudo na cabeça. Mas tem que ter o plano B. No caminho as
coisas podem mudar. Ao mesmo tempo que eles demoram, eles podem ser rápidos.
Tem sempre que ter duas atividades. Isso não é só pra agora, na regência. Se for seguir
no magistério; ter sua classe. Por isso na nossa rotina a gente sempre prepara mais do
que vai dar. E também não gera conversas. Se parar para pensar: E agora, o que eu
vou fazer? A classe já se agitou. Você não pode deixar perder o fogo. Por
exemplo:Olha como ele desenhou!... Olha, esse! Agora vamos para outra. Sempre
dando continuidade à aula.
Mariana aproveitou para dizer que o período de estágio estava encerrando e que
precisava da ajuda da professora. Isabel disse que era difícil ajudá-la, pois em sua visão, o
trabalho “não teve uma sequência”, por isso, “faltou muita coisa” e elas teriam que “pensar
com calma”, contudo, naquele momento era preciso ter o foco na próxima aula planejada ,
mas que “o ideal, pensa assim, quando você tiver sua sala, você precisa ter o material na
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mão.” Isabel encerrou dizendo que “isso que é planejamento, colocar tudo no papel o que vai
fazer para sua organização” e pediu para que Mariana preenchesse o quadro de rotina e
entregasse para a coordenadora.
Chegou, então, o dia da aula sobre as cantigas, que foi tão explorada na conversa com
a professora. Mariana iniciou a aula, as crianças trabalharam em grupos, de modo que
Mariana andou o tempo todo pela classe orientando as turmas. Isabel também conversou com
alguns grupos apesar de ficar em sua mesa. Em alguns momentos chamava a atenção dos
alunos devido ao barulho e dispersão de alguns. Mariana preparou atividades como orientadas
por Isabel na última conversa; estipulou tempo para os alunos realizarem o trabalho e diversas
vezes também pedia que os alunos controlassem o tom de voz.
Em outro dia reservado para a realização do estágio, a professora Isabel faltou por
motivos de saúde e Mariana acabou cumprindo o horário na sala de aula com a presença de
uma professora substituta.
Faltavam duas semanas para encerrar o estágio e Mariana se planejou para trabalhar
com o jogo da memória. Orientou os alunos novamente, estipulou tempo para a confecção do
jogo, , levou o texto pronto para ser colocado na lousa, possibilitou o jogo em grupo que é
também orientado pela professora Isabel em algumas duplas.
A última quarta-feira em que as duas teriam o tempo para conversar chegou e Isabel
pergunta para a estagiária: “Quer falar comigo?” Mariana respondeu positivamente e expôs a
ideia de avaliação oferecida pela coordenadora e mostrou as questões elaboradas. Isabel leu as
perguntas e explicou que não compreendeu. Mariana não conseguiu contra argumentar e disse
que não sabia o que fazer, porém, ainda arriscou dizer que pensou em um vídeo, mas Isabel
também se opôs. Mariana então, perguntou como ela deveria terminar. A professora Isabel
93
aproveitou para sugerir que a classe criasse seu próprio brinquedo a partir de sucatas e elas
combinaram a forma como solicitariam os materiais. Mariana, como de costume, faz suas
anotações, Isabel chamou atenção da classe enquanto conversava com a estagiária e
aproveitava para perguntar se a supervisora de estágio da universidade não havia falado nada
sobre algum relatório que deveria ser feito pelos professores. Mariana respondeu que não.
Como combinado, a estagiária entregou a folha de frequência para ser assinada apenas
no último dia e agradeceu a professora. Os alunos pareciam decepcionados. Alguns deles
produziram bilhetes, desenhos direcionados à estagiária. E antes de ir embora, muitos a
abraçaram e a beijaram. Mas, tais manifestações não foram percebidas ou consideradas por
Isabel como indícios do estabelecimento de "laços" entre a estagiária e os alunos. Mariana se
despediu de Isabel e agradeceu por “tudo”, Isabel diz que não era preciso agradecer.
Pouco antes do século XI, as oficinas dos mosteiros eram o lugar em que se
formavam os artesãos de vários gêneros, com o objetivo de treinar os jovens, de maneira a
“instituir laboratórios artesanais para instruir a mão-de-obra necessária” (RUGIU,1998,p.26).
Segundo o autor, esses mosteiros eram “verdadeiras e próprias cidades auto-
suficientes”(p.26), onde ocorriam dois tipos de formação. A primeira, para os clérigos, “uma
instrução essencialmente profissional e técnica”, com noções essenciais para um frade
desenvolver as habilidades da memória para aprendizagem do ofício, de modo que os
exercícios se voltavam para repetições dos ensinos recitados pelo professor. O ensino
envolvia também gramática, retórica e lógica – denominada de Trívio- e ainda matemática,
geometria, astronomia e música- denominada de Quadrívio. Interessante ressaltar que a leitura
aqui apenas subsidiava a memória. E a escrita não era acessível a este grupo (RUGIU,1998).
O outro tipo de formação era para “os fratres laborantes ou aos leigos encarregados
do serviço ou da produção material”, baseado em um modelo “adestrador prático para os
artesãos” (RUGIU, 1998, p.27). Essa divisão, para o autor “antecipa a futura bifurcação entre
formação nas Artes liberais ou nas Artes mecânicas”. O que aponta para a herança da divisão
da instrução intelectual e instrução profissional. Rugiu (1998) expõe que as Artes liberais
eram consideradas como “atividades dignas de um homem livre da necessidade de ter que
trabalhar para viver”(p.32).
É relevante o apontamento de Rugiu (1998) sobre o termo artesão, que tem em suas
origens o “sentido de certas necessidades e normas”(p.32), ao mesmo tempo o pesquisador
95
revê o termo mister, também ligado à arte, que é “uma atividade que tinha o segredo dos seus
procedimentos e dos seus ritos como primeiro caráter distintivo, geridos e guardados pelos
iniciados”(p.32). No interior das oficinas, portanto, desenvolvia-se atividades, cujos
aprendizados eram “inseparáveis do exercício do trabalho para ser envolvido no seu
segredo”(p.34).
A idade para a entrada na oficina era dos 9 aos 18 anos, dependendo do tipo de
ofício e o período de permanência era previsto para que o aprendiz passasse o dia todo na
oficina e só retornasse para casa à noite ou ainda, com a possibilidade de passar a viver com a
família do mestre, que assumia o suprimento das necessidades essenciais. O título de mestre
era conquistado apenas pelos melhores e pelos que possuíam dinheiro. Depois de um longo
período de aprendizado e experiência e diversos exames detalhados, o título era concedido por
uma “comissão nomeada pelos Cônsules de Arte a qual o próprio candidato pertencia”(p.43).
Para a entrada nas corporações, caso o pai de família não fosse membro de uma determinada
corporação, mas tivesse condições financeiras, poderia encaminhar seu filho a aprendiz de
ofício a partir de um contrato. Caso o jovem fosse filho de um mestre ou de algum dono de
uma corporação, não necessitava de contrato.
96
A professora Isabel teve sua formação inicial e seu ingresso na carreira docente em
uma época caracterizada pelo pressuposto de uma “realidade de que o ensino era imutável e
os alunos que frequentavam a escola também o eram” (PIMENTA, LIMA, 2010, p.35,36).
Pesquisadores caracterizam esse modo tradicional de atuação docente como sendo de natureza
“artesanal”. A imagem do professor nessa perspectiva é a de um “técnico que aplica o
conhecimento às situações práticas” (FREIRE,2001,p. 7).
98
Tendo em vista os dados reunidos por meio da entrevista, parece ser possível enunciar
que a professora está vivenciando a fase denominada por Huberman (1992) como de
“desinvestimento”(p.46); uma fase marcada pelo desprendimento da carreira, dirigindo o
olhar para outros aspectos da vida social. E ao mesmo tempo marcada por certo grau de
“conservantismo e lamentações”, caracterizado por alguma rigidez e saudosismo. Ela parece
estar vivenciando um período em que as experiências, que eram sua sustentação, o que
alicerçava seu fazer profissional, começam a se desestabilizar.
4.1.2.1-Estratégias elaboradas
repetiram durante o estágio. Pareceu-nos que a professora pressupõe que é preciso 'ver como
se faz' e 'realizar conforme o observado'; conforme o exemplo oferecido. A professora Isabel
parecia esperar que a estagiária desenvolvesse as atividades da maneira como ela imaginava e
propunha; que seguisse o modelo proposto e suas estratégias de ensino.
A orientação, para Isabel, parece ter em vista ensinar a estagiária a aplicar as dicas
que lhe oferece a cada momento. Esse modo de assumir a orientação da estagiária parece
aproximar-se de uma relação baseada na mestrança, que implica um "pacto" em torno do
interesse e da adesão ao ofício que está sendo ensinado. Por esse motivo, a ênfase na
seriedade deste momento da escolha pela profissão, de maneira que o professor da escola
atuará como orientador desde que o estagiário esteja seguro em relação a sua escolha
profissional. O objetivo da relação é a aprendizagem de ações e atividades que constituem o
ofício docente. Como a estagiária não correspondia ao que era esperado pela professora,
Isabel insistia retomando as mesmas indicações, como se tivesse a intenção de fixar algumas
ideias. “Vamos ter que conversar novamente”, ou ainda, “ela não queria melhorar”. “Ou ela
101
melhora ou vai encerrar o estágio já, já”. Todas as coisas que falei; todas as dicas, todas as
atividades, nada ela fez. Todas as vezes que eu tentei interferir, ela não aceitou”. Esses
depoimentos informais apontam para uma concepção de formação voltada para os
resultados da ação do aprendiz e parece enfatizar a dimensão operacional do ensino . O olhar
estava voltado para a aula realizada pela estagiária (o resultado do trabalho) e não para seu
processo formativo, pois declarou: “ não vi retorno nas aulas”; “ a mudança nela foi
imperceptível”. Isabel parecia acolher Mariana para ensinar-lhe a ensinar e parecia decidida
em cumprir esse papel, desde que a estudante realmente desejasse aprender o ofício. Em
retribuição ao seu interesse, Isabel lhe ensinaria "a norma" do trabalho docente.
Isabel parece assumir a percepção sobre o ensino como aplicação de modelos, algo
que se aprende por meio do contato e convivência com um mestre, que é o princípio da
relação de mestrança. Identificamos que a professora Isabel percebe a formação docente sob o
modelo da visibilidade, que de acordo com Marta Carvalho (2000) baseia-se na observação e
imitação de práticas pedagógicas, pois o modelo pedagógico é externo ao sujeito em
formação.
102
Mas essa perspectiva assumida por Isabel não lhe possibilita avançar diante de um
estagiário ‘incompleto’, ainda em fase de descoberta da docência, de exploração, de transição
do papel de aluno para o papel de professor.
No entanto, os dados levantados por meio das observações nos revelam que a
estagiária Mariana ficou a maior parte do estágio sentada no fundo da sala, observando.
103
Apenas no dia programado para a realização do projeto ela se posicionava na frente da sala e
interagia com os alunos. Nas demais atividades desenvolvidas pelos alunos e pela docente,
Mariana não participava. Segundo a professora, o fato de o estagiário atualmente ter a
oportunidade da regência de uma aula para a qual os alunos não foram previamente
preparados pela professora da classe, já constitui um movimento de mudança, pois não se
posiciona apenas observando, mas de certa maneira interage com os alunos “aplica” uma aula.
Identificamos, portanto, que o lugar, tanto geográfico, quanto simbólico ocupado pela
estagiária não sofreu muitas mudanças naquele ambiente. Também não houve grande
modificação no que se refere ao papel da professora em exercício que, embora tenha
disponibilizado sua classe para que a estagiária desenvolvesse um projeto e deixado que ela
vivenciasse a classe sem preparação prévia dos alunos para aquele momento, manteve certo
distanciamento com relação à estagiária e seu processo de aprendizagem profissional. “Não
ensino a estagiária. Fico mais como uma interventora do que ela vai fazer. Dá para fazer”.
O fato de Isabel permitir que a estagiária se colocasse na frente da sala por alguns
momentos e apenas aplicasse algumas atividades não era garantia de que ela estava tendo a
oportunidade de se colocar em uma perspectiva docente. Mariana reproduzia ou em algumas
situações colocava em prática o lhe era dito. Havia conversa com propósito de guiar as ações
e não de refletir sobre aquele contexto e sobre sua própria prática.
Há duas possibilidades quanto ao lugar que o estagiário pode ocupar. Ele pode ocupar
o lugar de estagiário como aluno- de maneira que se restringe a aplicar atividades e cumprir
com o que lhe foi ensinado, de modo que seu olhar está voltado para a professora como seu
modelo. Ou ocupar o lugar de estagiário como futuro professor- olhar para a sala de aula a
partir da lente docente e experimentar o cotidiano da sala de aula em seu dinamismo e
complexidade em uma perspectiva de processo formativo. Seu olhar então, se voltará para si
mesmo, para sua prática com os alunos, o que pressupõe então, tempo de ação e reflexão. No
entanto, para ocupar esse lugar é preciso anteriormente que as pessoas que ocupam o espaço
da escola atribuam-lhe significado e a legitimem como espaço de formação e assim passe a se
constituir como um lugar de ações formativas (CUNHA, 2008).
104
No caso observado por esta pesquisa, Mariana é descrita por Isabel como uma
estagiária “descomprometida”, “desinteressada”, “sem disposição para aprender”, “sem
entusiasmo”, “sem iniciativa para desenvolver um trabalho além do que era proposto”. Isabel
não identificou em Mariana sinais claros de interesse e de adesão ao magistério. A moça
parecia de fato insegura quanto à escolha profissional, acomodada ao papel discente que
exercia na universidade. Isabel, diante desse quadro, parecia sentir-se paralisada, passando a
assumir um papel de “observadora” do trabalho a ser realizado pela estagiária.
No período em que esta pesquisa foi realizada a professora Agnes possuía 5 anos de
experiência como docente. Fase profissional caracterizada por ela como sendo “mais leve do
que antes”, por estar “mais convicta da teoria”, do que faz, apesar de reconhecer que há muito
que aprender principalmente no que diz respeito ao "controle interno". Controle, segundo ela,
da ansiedade quanto à aprendizagem das crianças e do modo de gerir a classe. A questão do
controle é um ponto que retoma várias vezes durante seus depoimentos. Contudo, ela afirma
sentir-se segura quanto à parte pedagógica, citando ter material suficiente para trabalhar com
o 1º ano, podendo ver o que funcionou e o que não funcionou e também porque consegue
gerenciar melhor a disciplina.
Desde o início de sua carreira, se propôs a receber estagiários, pois justifica que teve
dificuldades em encontrar alguém que quisesse recebê-la no período em que foi estagiária. Na
época, não compreendeu este desafio, contudo, aquela situação levou-a a decidir que quando
assumisse o lugar docente sempre receberia estagiários.
Quanto à própria experiência de estágio, a professora adjetiva como tendo sido uma
boa experiência e que influenciou em sua escolha pela profissão. Interessante ressaltar que as
atividades desenvolvidas naquele período se perderam em suas lembranças, mas o que marcou
foram as relações estabelecidas com as professoras que a receberam, bem como, o perfil das
mesmas, descritas como boas professoras, experientes, que davam incentivos; se
relacionavam bem entre si; tanto que optou em trabalhar na mesma escola por esses motivos.
Pudemos identificar ações semelhantes no momento em que Agnes recebia a estagiária Luana.
Em vários momentos, observamos a professora elogiando o trabalho da estagiária e sua
criatividade ao utilizar os jogos.
“ Ela tem jeito com eles!”;“Ela pensa um monte de coisa!”; “Ela faz
direitinho!”; “Os jogos da dona Luana foram muito legais. E vi que vocês
fizeram tudo direitinho, bonito;” “Sua aula foi ótima!”; “Excelente ideia”;“Foi
ótimo!Vou aproveitar a ideia do bingo para adição”; Foi bom! Acho que eles
aprenderam; “ Vocês foram muito bem! Os desenhos ficaram ótimos! Bem
feito. Todo mundo trabalhou direitinho! Gostei!” “ Ela é paciente!”
106
Quando passou a ocupar o lugar docente e receber estagiários, pôde então perceber
que ter um estagiário em sua sala de aula é algo “que dá trabalho”; “é um transtorno”, mas,
“que faz parte” e “acrescenta” (1º depoimento).
A professora ainda fez referência ao projeto da universidade, que tem como proposta a
construção de um trabalho em conjunto entre professor e estagiário, uma parceria.
[...]é importante até, não só observar. Observa uns dias, mas participar
mesmo, um trabalho que é a proposta[...] ( 1º depoimento quando fala sobre o
papel do estágio na formação docente).
funciona” a gestão da sala. Interessante ressaltar este ponto colocado pela docente, pois ela
valoriza não a qualidade da atividade realizada pelo estagiário junto a seus alunos, mas a
possibilidade que ele tem de, durante o estágio, vivenciar fazeres próprios à docência. Essa
perspectiva parece apontar para a valorização da escola como espaço de formação profissional
docente. A professora enfatizou que o estagiário não pode apenas observar durante o estágio,
mas sim se envolver no trabalho docente. Ela considerou a importância e a especificidade dos
dois espaços- universidade e escola- como lugares de formação.
[...]E a hora que você chega na sala de aula é outro universo, mas
uma coisa precisa da outra realmente (1º depoimento sobre o papel do estágio na
formação).
Apesar de perceber que tem uma parte ou uma responsabilidade na formação do futuro
docente, a professora expõe suas dúvidas quanto ao papel que assume no processo.
108
[...]“No começo eu não sabia bem o que fazer. Eu não sabia qual era
minha parte. Na verdade ainda nem sei muito bem qual é minha parte ( 1ª
entrevista).
Ninguém falou que era pra eu fazer ou não. Então não fiquei sabendo
qual era meu papel ( 2º entrevista).
“via que não tava fluindo muito bem, olha, sua metodologia não foi
muito bem...”
“O que eu faço é trocar mesmo, com ideia, sem ideia, vamos trabalhar
junto”.( 1ª entrevista)
Mesmo sem assumir um papel mais claro e sistemático na formação dos estagiários, a
professora declarou “que alguém tem que receber estagiário” e que recebê-lo “faz parte” do
trabalho dos professores.
“[...]eu tenho que agregar alguma coisa na vida dele, além do que ele vai
observar. Tem que formalizar alguma coisa na cabeça dele. Pelo menos pra ele ter
alguma coisa pra pensar sobre estágio[...]”(P.- 2ª entrevista).
Por isso, a partir dos depoimentos, Agnes afirmou que procura identificar as
expectativas do estagiário para intervir mais adequadamente e busca estabelecer uma
estratégia de ação. Ela expôs que, para isso, é preciso disponibilizar parte do seu tempo para
estar e trabalhar com o estagiário.
expectativa de aprender sobre a profissão para a qual estão se formando e ter experiências
enquanto docentes e não como alunos, pois estão em outra posição. É uma relação de um
profissional com um futuro profissional. Por isso, a relação construída, segundo o
depoimento, se torna distinta, o que requer um diálogo diferente.
“mas o estágio que vem, que eu já me propus a receber é tudo novo, está por
vir. Então, o que vier a gente vai adaptando, vai trabalhando, devagar, ou não, não sei.
De repente ela chega aqui no último dia querendo, fazendo. Vai depender de como ela
vai vir (P. 1ª entrevista).
A princípio, a docente parece não criar muitas expectativas, porém, explicou que
precisa identificar as habilidades pessoais da estagiária para pensar no projeto que pode ser
desenvolvido.
Como não tem nenhum projeto pronto, que vai se discutir ainda o que
fazer. Eu vou ver o que a pessoa tem mais habilidade. A gente trabalha em
cima de uma coisa maior, que isso é legal, ter um projeto maior da escola, no
ano. Não sei o que esperar de... vamos ver o que dá ( 1 ª entrevista).
De troca mesmo. Bem de troca. Que eu consiga passar o que eu gostaria que
tivessem falado pra mim no estágio. Nossa, não custava nada terem falado pra mim”
olha na escola existe um plano assim. Sabe aquele projeto, o PPP que você estudou
lá na Unesp, vai ser assim, vai tá ali,você vai pegar aquilo , você não vai fazer um
projeto sozinha. Juntar essa parte prática com a teórica de forma leve. Mostrar, é isso
aqui. Você vai tirar sua ideia disso aqui.Você acrescenta seus projetos aqui , mexe
aqui essa parte, que eu cheguei fiquei muito ansiosa porque não sabia fazer .Então,
quando o estagiário chega, a primeira coisa que eu mostro você sabe como que
funciona isso? Dá uma olhadinha no meu plano de aula , no plano de ensino, como é
que funciona, que é o que eu gostaria de ter visto (Depoimentos da 1ª entrevista- sobre
a relação que pretendia estabelecer com a estagiária).
Agnes conduzia a fila de alunos para a sala de aula e Luana seguia com a turma. Os
alunos entravam na sala de aula e, orientados pela professora, sentavam-se em frente à lousa,
para que professora e estagiária organizassem suas mesas em duplas. Observamos inclusive
que durante todo período de estágio, uma mesa grande era colocada ao lado da mesa da
professora para a estagiária. Ao ser questionada sobre esta prática, Agnes explica: “não vou
111
colocar o estagiário lá atrás. Ele não está na condição de meu aluno. Ele está de parceiro
comigo. Então, o lugar dele é ali na frente junto comigo, pra ver, participar, trocar ideia”( 2ª
entrevista).
Observamos que no período de estágio, além de colocá-la ao seu lado, Agnes permitia
que a estagiária “fizesse a parte dela”, de modo que desenvolvesse o projeto planejado pelas
duas e não se limitasse a ficar sentada apenas observando.
Além disso, diante dos alunos, sempre denominava a estagiária de “dona Luana”
Justificou-se:
Além disso, Agnes mostrou para a estagiária, materiais que têm arquivado em seu
computador, organizado em pastas, com diversas temáticas, além de uma pasta com
atividades que utiliza como tarefa de casa. Salientou que não seguia o material "à risca", mas
que valorizava o fato de ter um vasto material de trabalho para o 1º ano. Todo o material foi
112
disponibilizado para a estagiária (que o copiou em seu pen drive), que pareceu vibrar com o
oferecimento da professora.
O HTPI era um horário, segundo a professora, em que Agnes se dirigia a outra sala
reservada aos professores para este período, porém, decidiu que ficaria na sala de aula para
poder conversar com Luana.
Agnes ainda possibilitou o trabalho de Luana com os alunos, de modo que pôde
vivenciar o cotidiano da sala de aula. Contudo, em algumas ocasiões em que a estagiária
desenvolveu o trabalho com os jogos, a professora intervinha na aula quando considerava
necessário. Sobre essa intervenção da professora na atuação da estagiária, foi possível
perceber que sua atenção estava voltada para o processo de aprendizagem dos alunos. Sempre
que percebia que alguma explicação oferecida por Luana não havia ficado clara, ou que um
aluno estava com dúvida em certo traçado de letra, levantava-se e ao pedir licença, explicava
para o aluno ou para a classe. Agnes contou em entrevista que esse tipo de intervenção que
fazia não lhe deixava muito confortável.
Sua identidade docente impunha-se, portanto, oferecendo limites para sua atuação como
formadora de uma futura professora.
No primeiro dia em que Luana iniciou a regência, já era seu terceiro dia de estágio.
Agnes cumpriu com a rotina da classe, leitura diária de um texto e conversa com os alunos,
que ficavam sentados em roda. Ao retornarem para seus lugares, Agnes chamou Luana para
dar sequência, mas antes ressaltou para a classe: “o jogo que será trabalhado pela “dona
Luana” será muito legal! Vocês irão gostar”. Luana se dirigiu à professora, antes de iniciar, e
tirou algumas dúvidas sobre a sequência da atividade ( confecção de um jogo da memória): se
deveria pedir para pintar ou recortar primeiro. A professora disse que ela deveria ficar “à
vontade” para fazer do jeito que achasse melhor.
A estagiária iniciou o trabalho e cumpriu com os combinados das regras da classe com
os alunos. Quando as crianças pediam ao mesmo tempo para serem escolhidas para irem à
lousa, Luana relembrava-os a regra: “quem pede não é escolhido”. E se utilizou em alguns
momentos de certas estratégias de Agnes, por exemplo, a escolha do próximo aluno para ir à
lousa e completar as palavras com as vogais. A escolha era feita pela criança que já estava na
lousa, assim como Agnes fazia.
Com relação as regras, destacou-se também neste mesmo dia, um momento em que
um dos alunos pediu para ir beber água e a estagiária permitiu, por ter anteriormente
consultado a professora sobre a questão de deixar os alunos saírem. Contudo, o combinado
era levar água de casa em uma garrafinha e só sair para ir ao banheiro. Agnes chamou a
atenção do aluno e relembrou a regra da classe que era exposta inclusive para os pais em
reunião. No entanto, o que se sobressai nessa situação é que Agnes acabou autorizando a saída
do aluno devido a liberação de Luana.
No instante em que finalizaram a parte escrita, se voltaram para a leitura das palavras.
Luana direcionou a leitura e fez as marcações na lousa em cada sílaba, enquanto os alunos
também marcavam nas folhas impressas que receberam. Neste momento, Agnes, que estava
sentada na cadeira onde ficava a estagiária, observando o trabalho, interveio, pois percebeu
que um dos alunos estava realizando as marcações das sílabas de modo aleatório. Pediu
licença à estagiária, se dirigiu à lousa, escreveu um nome qualquer e explicou para toda a
classe como deveria ser feita a marcação das sílabas e voltou a sentar.
Antes ainda do horário de Educação Física, Agnes solicitou os cadernos de casa para
olhar as atividades realizadas pelos alunos e Luana se prontificou a ajudá-la. Agnes
comentou: “É bom quando tem alguém”!
Esta foi a única vez em que a estagiária trabalhou diretamente com a classe e Agnes
questionou sobre a impressão que teve de sua aula quando ficaram sozinhas no HTPI. A
estagiária se colocou de maneira muito objetiva, dizendo que achava que havia dado certo,
devido a participação dos alunos e por terem conseguido realizar a atividade proposta. A
professora complementou dizendo que gostaram do jogo e que a atividade proposta estava de
acordo com o trabalho que desenvolvia durante toda a semana. O assunto não teve maiores
explorações. Ela aproveitou para perguntar se a estagiária estava realizando os registros, pois
Agnes fazia apenas anotações sucintas do que ocorria. Como havia guardado seu material
encadernado, onde tem seus registros gerais da turma, voltou ao seu armário para pegá-lo e
mostrá-lo à estagiária a forma como os realizava. A estagiária explicou que vinha fazendo
anotações dia a dia e que já eram suficientes. Nesse dia, a professora aproveitou para explicar
o que costumava fazer nos horários em que as crianças estavam na Educação Física e também
falar sobre alguns projetos já realizados com outras turmas. A conversa perpassou inclusive
pelo contexto da educação, mais especificamente daquela unidade escolar, relacionadas
quanto a questão de verbas disponíveis para xerox e outros materiais, mas também os recursos
disponíveis na escola. Comentaram ainda sobre o curso de alfabetização oferecido pelo
governo federal (O PACTO)5 e sua preocupação com o brincar. A estagiária fazia pequenos
comentários e expunha também os discursos da academia sobre o assunto.
5
O Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa é um compromisso formal assumido pelos governos federal, do Distrito Feder al, dos estados e
municípios de assegurar que todas as crianças estejam alfabetizadas até os oito anos de idade, ao final do 3º ano do ensino fundamental.
116
Em outro dia de estágio, Luana preparou uma atividade em que os alunos tiveram de
completar os espaços em branco já determinados com a quantidade de letras. Ela iniciou
realizando oralmente com alguns alunos indo à lousa. Neste dia, ocorreu outra intervenção da
professora no momento em que um dos alunos apresentou dúvida na escrita da letra “G” na
palavra “gato”. Ele utilizou a letra “H” e Luana insistiu em sonorizar a letra “G”. Agnes
levantou: “Já sei o que houve! O “G” e o “H” tem o som próximo! Explicou para o menino e
mudaram para a letra G.”Mais uma vez, Agnes interveio na aula que era direcionada pela
estagiária.
Agnes permitia que Luana trabalhasse com a classe propondo as atividades, atendendo
os alunos individualmente, o que em muitas ocasiões Agnes fazia junto.
Em uma das aulas, Luana apresentou certas dúvidas quanto ao que planejar para a
próxima aula, Agnes retomou questionando-a sobre o que tinha em mente. Luana propôs
ampliar para um trabalho além das vogais; explorar as consoantes também. Nisso mostrou
uma atividade. Agnes observou, sugeriu algumas modificações, justificando com experiências
117
de atividades semelhantes com alunos do ano anterior. Agnes elogiou o trabalho de Luana e
aproveitaram para pensar em ampliar o trabalho utilizando a Matemática. Neste mesmo dia,
conversaram sobre o acréscimo de mais um dia de estágio para completar a carga horária
exigida.
Após a atividade, a professora Agnes organizou a classe com os alunos e pediu para
que se acalmassem e conversou com eles sobre o trabalho realizado. Elogiou a turma com
relação a primeira parte da atividade, mas ressaltou a dificuldade de trabalharem em grupo e
aproveitou o momento para orientá-los sobre a questão, dando oportunidade para que a
estagiária também falasse sobre sua impressão. A mesma aproveitou apenas para reiterar o
que foi dito pela professora. Em seguida, a professora pediu para os alunos ficarem de cabeça
baixa, pois faltavam poucos minutos para o intervalo. Ela aproveitou e fez o seguinte
comentário com a estagiária: “Você viu onde a gente falhou? Não foram só eles. A gente devia
ter explicado antes de entregar as letrinhas. Podia ter escrito todas as letrinhas, explicado,
apagado e que fosse colocando de 3 em 3”. A professora se referia a estratégia utilizada que,
segundo ela, gerou muitas dúvidas e agitação.
118
Conforme os dias transcorriam, notava-se que o diálogo era constante neste processo.
Segundo relatos da professora e da estagiária e pelas conversas presenciadas, as duas também
utilizaram o email como via de comunicação sobre o trabalho desenvolvido.
Isso também ocorria nos HTPIs (Horário de Trabalho Pedagógico Individual); porém,
em sua maioria, este momento foi utilizado para a estagiária mostrar a atividade planejada que
seria desenvolvida na próxima aula. Aproveitavam para repensar algumas estratégias que
seriam utilizadas, os níveis de dificuldades que seriam trabalhados, além de conversas de
assuntos pessoais também, do cotidiano da vida, o que é considerado natural em uma relação
entre adultos. Ou até dias em que a professora precisava conversar com alguma colega de
trabalho sobre questões relacionadas ao trabalho docente ou atender mãe de aluno. Momentos
presenciados também pela estagiária.
Agnes organizou-se para reservar um tempo para dialogar com a estagiária e preparou
o espaço geográfico da sala de aula para acolhê-la.
No último dia, Agnes elogiou o trabalho de Luana na frente dos alunos, aproveitando
para comunicar que a estagiária não iria mais e que sentiria falta dela. Os alunos a abraçaram
e declararam que também sentiriam falta dela.
Acolher um estagiário pode ser considerado como uma ação que vai além da mera
recepção, mas encontra-se ainda distante de uma intervenção de acompanhamento, pois essa
modalidade de formação-acompanhamento- pressupõe um trabalho com especifidades
formativas com intervenções sistemáticas
A professora Agnes denomina sua fase profissional como sendo "mais leve" do que
antes, por sentir-se mais convicta sobre algumas teorias relativas ao ensino e também sobre
suas próprias ações junto aos alunos. Ressalta o valor dos muitos materiais que vem reunindo
ao longo dos anos, que lhe permitem trabalhar mais tranquilamente com o 1º ano. Reavalia
esses materiais , analisando a cada ano "o que funcionou" com determinada turma e o que não
funcionou, podendo assim rever seu trabalho e alterar algumas práticas. Esses dados reunidos
sobre Agnes nos remetem às proposições de Huberman (1992), quando trata sobre o ciclo de
vida profissional docente e descreve a “fase da estabilização” profissional como "tempo de
domínio da situação, no plano pedagógico, e traz uma sensação de libertação” (p. 41). Ao
discorrer sobre a fase de estabilização no ensino, o autor ressalta que se trata de uma “escolha
subjetiva, por pressupor a renúncia a outras profissões, sendo carregada de um significado de
pertença a um corpo profissional e à independência”. Diz ele “[...] a estabilização precede
ligeiramente ou acompanha um sentimento de “competência” pedagógica crescente”
(HUBERMAN, 1992,p.40)
121
Mas nem sempre agiu assim. Seus depoimentos parecem revelar que no decorrer de
sua trajetória, sua concepção de formação de docentes foi se modificando. A princípio, a visão
da professora se baseava em uma concepção de formação mais próxima a uma formação
modelar. Quanto ao estágio, compreendia que bastava apenas restringir-se a receber o
estagiário para que ele observasse sua aula. No entanto, por vivenciar outras experiências e
participar da proposta de parceria da universidade, fez a opção por acolher o estagiário; dar
um passo a frente da recepção.
Frente a essa visão ela considera o “estágio como meio que possibilita o contato com a
sala de aula de verdade”. Essa fala dá indícios de que “ver” tem o sentido de poder visualizar
a realidade da escola de outro ângulo; uma oportunidade de conhecer o campo que será
vivenciado e explorado pelos futuros professores. Um espaço considerado pela docente como
distinto da universidade. Esse, que é descrito como o papel de apoio que, segundo os
depoimentos, tem a função de “desenvolver o lado pra pensar”. [...]Saber por onde ir, é
comparar com teorias que já existem. Ver o que funciona, parte mais intelectual mesmo[...]é
importante”. Ao ressaltar a relevância do estágio e o contato com a sala de aula, que
considera como “outro universo”, a professora expõe, ao mesmo tempo, a importância do
papel dos dois espaços na formação e a articulação entre os mesmos. Apesar de distinguir os
espaços identificou a interdependência entre eles.
[...]E a hora que você chega na sala de aula é outro universo, mas uma
coisa precisa da outra realmente ( 1º depoimento sobre o papel do estágio na
formação).
Apesar de perceber que tem uma parte ou uma responsabilidade com a formação do
futuro docente, a professora coloca dúvidas quanto ao seu papel.
[...]“No começo eu não sabia bem o que fazer. Eu não sabia qual era
minha parte. Na verdade ainda nem sei muito bem qual é minha parte ( 1ª
entrevista).
123
Ninguém falou que era pra eu fazer ou não. Então não fiquei sabendo
qual era meu papel ( 2º entrevista).
A professora ainda citou que orienta o estagiário: “dando umas dicazinhas, mas não
oficialmente”. Seu modo de se referir a essa orientação que realiza sugere certa insegurança
com relação ao lugar que ocupa. Agnes não parece ter clareza quanto às tarefas ou ações que
compõem o acolhimento. Cita na entrevista que já auxiliou em outra ocasião na escrita do
projeto, dizendo o que devia colocar em determinado tópico, por exemplo.
“[...]via que não tava fluindo muito bem, olha, sua metodologia não
foi muito bem [...]”
“O que eu faço é trocar mesmo, com ideia, sem ideia, vamos trabalhar
junto” (1ª entrevista
Após exposição dos dados e análise dos mesmos, identificamos algumas estratégias
elaboradas pela professora ao recepcionar a estagiária, que as descreveremos a seguir.
Pontuamos que suas práticas sugerem ter assumido o papel de acolhimento formativo.
4.3.4.1-Estratégias de ação
Foi possível notar ao longo do processo de interação com a estagiária, que Agnes foi
elaborando sua atuação e se utilizou de experiências anteriores para compor este modo de
agir. Suas referências pareciam estar baseadas em sua própria experiência de formação inicial
e nas lacunas que teve enquanto estagiária e ainda na fase de iniciante da docência também,
elaborando assim, seus modos de agir e acolher os estagiários, desenvolvendo, dessa maneira,
um modo específico de acolher os estagiários. Ao expor que, a princípio, ficava receosa em
ofender os estagiários, teve a percepção de que para que o relacionamento entre eles
funcionasse e fosse potencializada a construção de uma parceria, não se paralisou e mudou a
estratégia, organizando desde o início o trabalho, os dias e horários de estágio. Diante desta
opção por acolher, Agnes elaborou algumas estratégias de ação que parecem compor o perfil
de um professor que acolhe o estagiário.
“[...]eu tenho que agregar alguma coisa na vida dele, além do que ele vai
observar. Tem que formalizar alguma coisa na cabeça dele. Pelo menos pra ele ter
alguma coisa pra pensar sobre estágio[...]”(2ª entrevista).
Sua motivação passa também pela expectativa de trocas com a estagiária. Questão
também salientada na pesquisa de Cyrino (2012), em que há uma expectativa dos professores
em trocar com os estagiários, passando seus saberes práticos e recebendo ideias novas.
Essa ação sugere o interesse de que a estagiária não olhasse apenas um momento, uma
parte do trabalho, um flash, mas que tivesse a oportunidade de visualizar e compreender o
contexto e o processo de ensino e aprendizagem que estava se construindo naquela sala de
aula.
Frente a estas visões expostas em depoimentos, pôde ser identificado nos períodos de
observação, que Agnes permitia que a estagiária "fizesse a parte dela", assumindo um papel
ativo na relação, desenvolvendo o projeto planejado pelas duas e não se limitando a apenas
observar. Além disso, diversas atividades do cotidiano da turma puderam ser vivenciadas pela
estagiária, que intervinha na realização das atividades, auxiliando os alunos ou até a própria
docente; participando de momentos de correções de cadernos e de sondagens dos níveis de
escrita, a partir de diálogos com a professora. Agnes possibilitava, portanto, que Luana
ocupasse, de certo modo e de maneira provisória, o lugar docente.
E esta ocupação se deu inclusive no que se refere ao espaço da sala de aula. A ação da
professora de colocar uma mesa grande ao lado da sua para a estagiária, revela um grau de
intencionalidade em suas ações, no sentido de contribuir para a formação profissional da
estagiária, colocando-a no lugar docente. Contribuía, assim, para que estagiária passasse do
lugar de aluno para o lugar docente; que a estagiária assumisse um outra perspectiva na
percepção sobre a sala de aula, os alunos e as tarefas docentes. E ao ser questionada sobre
esta prática, explica: “não vou colocar o estagiário lá atrás. Ele não está na condição de meu
aluno. Ele está de parceiro comigo. Então, o lugar dele é ali na frente junto comigo, pra ver,
participar, trocar ideia”. Este é o lugar próximo ao lugar docente e não ao lugar de aluno.
Esta estratégia de acolhimento está fundamentada em uma ideia que possibilita o estagiário a
olhar para o ensino de outra perspectiva; da perspectiva da ação, que está relacionada a ideia
de socialização profissional, que pressupõe o envolvimento do outro, no caso, da estagiária,
na cultura docente.
Além disso, havia ainda no foco da intervenção da professora, a relação de Luana com
os alunos, o que também integra suas estratégias de acolhimento; Agnes sempre se referia à
Luana na frente dos alunos de “dona Luana”.
conflito de Agnes entre os papéis de professora e formadora, nos diversos momentos em que
ela interveio nas aulas que estavam sendo direcionadas por Luana. Em várias ocasiões Agnes
interveio, acrescentando algumas explicações, com o foco voltado para os alunos. Contudo,
considerou em seus depoimentos o impacto dessa sua opção para o processo de formação da
estagiária, o que aponta para uma percepção que integra seu modo de acolher “Isso até me
dava é...me dava é um certo receio que eu tinha que interromper a aula dela, de atrapalhar o
raciocínio dela, ou é...desencadear alguma coisa que não fosse positiva[...] tentava não ser
invasiva”.
Mas mesmo diante das dúvidas, no final do período de estágio, Agnes, ao descrever a
estagiária, assume uma posição que avança na direção do papel de formadora. Seu
depoimento revela seu esforço para compreender o processo de aprendizagem profissional
pelo qual passam os estagiários. Parece compreender que a formação docente implica em
processo de desenvolvimento e revela esperar que o estágio possibilite que o estagiário avance
do papel de aluno para o papel docente. Em suas palavras:
Agnes entende que colaborar no estágio não se limita a receber o estagiário. Ela
compreende que deve acolher o estagiário, a partir de várias ações, mas em uma dimensão
que assume características específicas que caminham na direção de uma intervenção
formativa. Trata-se, como dito antes, de um acolhimento formativo. Ela percebe que ocupa
um lugar com potenciais formativos, identifica um possível lugar para os professores na
130
formação de seus pares, o que revela uma percepção da docência que a aproxima de uma
profissão, na qual os professores como ela, podem e devem assumir um lugar de poder na
formação dos pares.
Fábia, ao refletir sobre sua trajetória de formação, disse estar vivenciando um bom
momento de sua carreira profissional.
Hoje está muito bom. Está muito bom. Porque eu penso que a
faculdade, a formação acadêmica não me ajudou muito. Ela me ajudou
assim, ela deu a teoria, só. Ela deu a teoria.[...]hoje eu estou muito
feliz com aquilo que eu consigo fazer em sala de aula. Estou feliz
mesmo. Eu falo assim, eu sei dar aula. Eu sei. Eu sei de uns cinco anos
pra cá. Eu sei buscar ajuda e sei como buscar essa ajuda.
Fábia ressaltou em seu depoimento que não é apenas o domínio da teoria que lhe dava
condições de trabalhar com uma criança- “Não é só a teoria que vai dar conta, mas o que está
por trás da minha relação, do meu modo de ver o outro”. E ela questionava se esse modo
perpassava por suas “experiências”, por suas relações “interpessoais” ou pelas “teorias”; ou
ainda por questões “éticas”.
131
Esta foi sua primeira experiência em acompanhar uma estagiária e, segundo relatos da
própria professora (em dois encontros de professores na universidade e durante uma reunião
com a estagiária), foi uma relação que "deu certo".
Apesar de sua relação com a estagiária não ter sido acompanhada durante o processo
de estágio, conseguimos acompanhá-las no dia 12 de junho, quando marcaram um encontro
na biblioteca da universidade para analisarem alguns materiais produzidos pelos alunos
durante o percurso do projeto desenvolvido sobre “Substâncias químicas”. Apenas este
momento foi acompanhado devido a escolha prévia no início do trabalho que delimitava o
número de duas professoras. No entanto, o contato com a professora durante os encontros do
curso de extensão e a observação de seu envolvimento na proposta da universidade em
acompanhar estagiários chamou atenção. Identificou-se algo diferente na interação entre a
professora Fábia e sua estagiária. Instigou-nos, portanto, conhecer, ainda que parcialmente, o
desenvolvimento daquele trabalho, as reflexões que vinham sendo feitas pela professora e sua
visão sobre a proposta de estágio e sobre seu próprio papel nessa fase de formação inicial do
futuro docente. Decidimos acompanhar esse momento singular e realizar uma entrevista com
a professora para conhecer suas reflexões durante este processo e ainda o significado que
atribuía a sua participação na construção da identidade desta futura docente.
Retomou ainda a importância do trabalho intenso com o foco na leitura :“Como essa
classe, por ter chegado sem a escrita convencional, coloquei como objetivo a leitura”.
Larissa também fez uma declaração durante a reunião quando se voltou para justificar
um dos trabalhos que realizaram: “A Fábia me ensinou[...]”. A estagiária se referia ao
trabalho desenvolvido com gênero textual ‘carta’ e a importância de se trabalhar a função
social deste gênero. A intenção da professora em ensinar algo à estagiária foi salientada pela
própria docente:
No decorrer da conversa, alinharam pontos que iriam retomar com os alunos para o
fechamento do projeto. Enquanto uma mencionava alguma atividade realizada, a outra
complementava e, juntas, refletiram sobre as práticas trabalhadas. Segue um trecho da
conversa:
Inicialmente a professora foi instigada a pensar sobre o papel que assumiu ao receber
estagiária. Ao ser levada a pensar sobre as questões que lançaria a uma professora que iria
recepcionar estagiário pela primeira vez, pareceu ter declarado as reflexões que fez durante
esse processo “[...]perguntaria pra ela se ela sabe qual é a função dela nessa relação. E o
porquê se tem que fazer estágio?” “Eu daria até meu exemplo, porque eu já disse isso para
algumas professoras. Eu disse assim, que no momento que eu recebi estagiária, foi um
momento que eu tive que me rever enquanto professora”. Recepcionar estagiário, conforme o
depoimento de Fábia é um momento de se rever enquanto professora “[...]o sentido assim,
eu...eu estou dizendo pra ela o que deve ser feito , baseado numa teoria tal, mas eu faço
realmente isso”.
Identificamos, portanto, sua visão quanto ao papel e lugar em que deve estar o
estagiário, pois ela declarou: “Não pra professora achar que o estagiário está ali pra
observar o trabalho dela simples, sem achar que ela faz parte de um sistema, sem achar que
ela está isolada no mundo”. O papel do estagiário neste processo de estágio, conforme as
134
declarações é de "avaliar" o contexto escolar. Porém, não parece um olhar automático, vem à
tona a importância de um orientador
[...]Pensei em solicitar aos alunos o registro de tudo o que foi dito por
meio de uma ilustração, e em seguida o registro escrito desta mesma
ilustração...O que acha? Porque esta turma, como comentei com você, é muito
imatura, então gostaria de “fechar” cada aula. Preocupo-me com a ‘disciplina’
nas atividades para melhor orientá-los[...] ( Trecho de um dos emails escrito
pela professora).
135
A comunicação entre elas era para além da escola. Além dos HTPIs, o email também
foi um meio de comunicação muito explorado pelas duas.
[...] Com essas atividades que vamos extrair do texto não será preciso
o mapa nem o questionário? Ahhh...você disse que vamos usar o quadrinho do
REx no final, então, não seria melhor tirarmos a pequena explicação que tem
logo ao fim do desenho e fazê-los pensar um pouco? Depois podemos explicar
que a química é essencial para a nossa vida, dentro do nosso corpo, na nossa
alimentação[...] (Trechos de email escrito pela estagiária)
[...] Com essas atividades que vamos extrair do texto não será preciso
o mapa nem o questionário? Ahhh...você disse que vamos usar o quadrinho do
REx no final, então, não seria melhor tirarmos a pequena explicação que tem
logo ao fim do desenho e fazê-los pensar um pouco? Depois podemos explicar
que a química é essencial para a nossa vida, dentro do nosso corpo, na nossa
alimentação [...]
Além do email, os HTPIs, nos dias em que a estagiária estava na escola, segundo a
professora, eram destinados também para diálogos sobre o trabalho pedagógico com a
estagiária, pois declarou ter se comprometido com um trabalho de formação profissional; de
alguém que tinha expectativas de aprendizagem: “[...]não é nem dificuldade, mas o
comprometimento com o trabalho que eu assumi. Eu tive que assim, eu não tinha que falar só
pra mim, eu tinha que falar pra ela também. Era uma energia que eu tinha que pôr, por
136
exemplo: eu perdi todos os meus HTPIs” ( Depoimento da professora- quando questionada sobre as
dificuldades enfrentadas no processo de acolhimento). Quando citou que “perdeu os HTPIs” expôs
que houve uma troca, enquanto ela disponibilizou seu tempo, a estagiária colaborou com o
trabalho docente, não ficou em uma posição passiva.“[...]Ao mesmo tempo que ela estava lá,
colaborando, fazendo muita coisa que eu deixei de fazer em casa, mas teve essa troca.”
Embora a professora não tenha sido formada para trabalhar com a estagiária parece ter
criado suas próprias estratégias assumindo um papel para além da recepção “[...]Porque
durante os meus HTPIs eu tinha que orientá-la.”
Suas falas apontam que o professor da educação básica deve assumir uma postura de
diálogo, de modo a expor ao futuro docente sua perspectiva teórica e ao mesmo tempo
mostrar o contexto do sistema educacional o qual o professor está inserido e que muitas
práticas fazem parte de uma cultura escolar. “[...]primeiro você conversa, você mostra seu
trabalho, como que é feito seu trabalho. Se você fundamenta em alguém. Se você tem essa
clareza você diz. Se você não tem, você diz, eu acho, eu penso que deve ser feito
assim[...]”.Outra proposta da professora é que o docente que irá acolher estagiário deve
mostrar o próprio trabalho, as teorias que o embasam ou ao menos expor explicar o porquê
tem determinada prática.
O diálogo foi apontado pela docente como base para a construção da relação entre os
dois sujeitos, que requer disponibilidade de tempo para o diálogo que resulte em orientação.
A professora orientava quanto ao trabalho que iriam desenvolver na próxima aula com
os alunos. Planejavam a aula, mas com os objetivos estabelecidos pela professora- “[...] a
preocupação era orientá-la para que ela pudesse fazer uma intervenção necessária , baseado
no que eu acho adequado”.
[...] ela apresentava o texto, mandava por email . Então, querendo ou não,
então ela fazia, mandava por email e eu dizia, tá bom, não tá; o que falta o que não
falta , né? E uma coisa assim, que ela achou, a primeira coisa que deixou escapar na
137
hora de fazer o texto não colocou a bibliografia, né? Aí eu disse pra ela, nós desde
pequenininhos, as crianças têm que saber que os textos vêm de algum lugar.
[...] que nós somos formadores de opinião, que a gente tem que ser um pouco
neutra. Eu não posso vir dar aula com um decote, por mais que a gente queira, a gente
é exemplo, falava muito nessa linha com a Letícia. Falava pra ela, dava uns toques.
Além disso, a professora fazia questão de justificar e esclarecer para a estagiária seu
modo de trabalhar com os alunos e como deveria ser encaminhado.
[...]Vai ter dia que nós vamos dialogar uma hora... ai vai definir se nós vamos
dar continuidade no diálogo ou não. Porque a criança tem o tempo dela. Então eu dava
esses toques Porque vai ter aula que em meia hora, tudo bem, vai ter aula que em 20
minutos a gente vai parar tudo, ou fazer um desenho, ou registrar da maneira deles,
porque tem dia que eles não estão a fim e não adianta você forçar. Não que você vai
matar o teu tempo. Então foi direcionado nisso daí (Depoimento da professora sobre
um dos diálogos com a estagiária).
[...]Então, aí, principalmente baseada nessa prova, ela teve a certeza de que eu
estava... eu não sei como ela interpretou isso. Mas eu mostrei pra ela o porquê eu
estava trabalhando só com diálogo. Lógico que o diálogo com intervenção. Não a
conversa pela conversa. Não jogar a conversa fora...
[...]Aí eu sempre dizia pra ela. Não sei se foi no começo ou depois... observa
certas coisas; não deixa passar certas coisas . Olha aquela criança. Olha como ela
interage. Olha como ela não interage. E olha como a gente tem que olhar pra ela ou
não (Fala da professora-Entrevista ).
[...]eu sempre dizia pra ela, a gente não pode negligenciar o contato com a
criança.
[...] Então, isso tudo, eu dei um toque pra Letícia. Porque isso também não foi
me ensinado.
138
A professora revelou então estratégias que escolheu para trabalhar com a estagiária. E
segundo os depoimentos, as questões que foram direcionadas a olhar foram específicas por
pertencer aquele contexto –“ Outra turma de 2º ano que eu dei no ano passado, era outra
turma, ela ia ver outra realidade”.
[...] Nós vamos sim, é escrever muito, porque eu quero o diálogo delas
(das crianças). Diálogo, diálogo, diálogo. Eu fiz esse escrito do diálogo não
porque a Larissa estava lá, porque é uma prática minha [...] ( Depoimento da
professora em entrevista).
Então, na rotina da sala de aula, enquanto uma interagia diretamente com o grupo
todo, a outra fazia anotações das colocações dos alunos e das intervenções. Quando as
crianças passavam a realizar atividades individuais, em duplas ou grupos, as duas realizavam
intervenções no atendimento às crianças.
Eu acho que foi válido pra mim, porque, toda vez que eu falava alguma
coisa com a Larissa, eu tentava ver se eu fazia mesmo. Eu fiz esse exercício todo
tempo: será que eu faço de verdade? ( Depoimento da professora ao final da
entrevista).
A maneira como esta relação foi construída, foi atribuída pela professora, às
características e posturas identificadas na estagiária: “[...]a Larissa tem uma característica
muito interessante, ela é muito curiosa[...]”
[...]Ela quer aprender. Por conta da leitura que eu fiz dela eu agi desta
forma[...] Então, acho que é isso, tem coisas que quando você vai orientar uma pessoa,
se ela está aberta a, acho que você tem que aproveitar e dizer.
[...]eu percebi que ela é uma pessoa que quer buscar.Por isso que eu, a gente
dialogava, do jeito que estou aqui dialogando com você eu dialogava com ela
[...]curiosidade que eu acho que o educador tem que ter. Porque é lidar com
criança que a todo tempo questiona[...].
139
“Então não sei se é...se em outro momento, em outra turma, como seria o meu
trabalho com estagiário”- mais uma vez a professora percebeu que desempenha um trabalho
específico com a estagiária, que seu modo de agir talvez seja influenciado pela característica
da turma que estava trabalhando naquele período e também da postura e características da
estagiária.
A professora pontuou sua contribuição para a formação docente. Falou sobre o papel
que deve ser assumido pelo professor da educação básica que recebe um estagiário, alguém
que ensina. Contudo, declarou que os professores precisam reconhecer que esse período da
formação é fundamental. Para a professora, o estágio é um período de formação necessária em
que o estagiário tem a oportunidade de visualizar diversos docentes, com a possibilidade de
conhecer diversas práticas e posturas docentes.
Era notório que as duas pareciam 'sintonizadas' quanto ao trabalho que foi
desenvolvido, pois conversavam sobre os objetivos relacionados à leitura que haviam
proposto para o projeto, bem como sobre os materiais produzidos pelos alunos, com os quais
a estagiária parecia já familiarizada, por ter participado de maneira ativa de vários momentos
de diálogos com a classe, além de ter direcionado muitos deles. Identificamos aqui que a
professora possibilitou que estagiária tivesse a oportunidade de ocupar o lugar docente,
experimentar os fazeres docentes e o cotidiano dinâmico da sala de aula. De sua parte, a
professora Fábia aproveitou esse período de estágio para mostrar as complexidades que
percebe presentes na profissão docente, alertando a estagiária para a necessidade de "se
preparar".
A postura assumida por Fábia durante a reunião observada oferecia indícios de que
vinha realizando um acolhimento formativo no estágio de Larissa. Ela claramente permitia o
envolvimento da estagiária em todo o processo desenvolvido, tanto no que se refere aos
momentos de ação como nos de reflexão sobre a prática. Ao mesmo tempo em que a
estagiária tinha oportunidade de experimentar o lugar docente, Fábia pontuava questões que
considerava importantes sobre e para a docência. Como por exemplo, nos momentos em que
retomava os princípios que embasam a pedagogia por projetos, fundamento de suas práticas,
lançava questões que levavam as duas a pensarem sobre o próprio trabalho.
Apesar de Larissa ter vivenciado todas as fases do projeto realizado em parceria com a
professora, Fábia parecia compreender que a estagiária vivia uma fase específica de seu
processo de formação, diferente daquele vivenciado por ela mesma. Reconhecia o processo
de aprendizagem vivenciado por Larissa e reconhecia seu lugar na relação. Assim, no decorrer
da reunião observada, a estagiária expôs: “Depois os alunos queriam trabalhar profissões. Eu
queria esse. Estava tudo na cabeça”. Imediatamente Fábia chamou sua atenção sobre a
proposta de seu trabalho (Pedagogia por projetos): “Larissa, Larissa!” E Larissa diz logo em
seguida: “ É esse projeto é muito dinâmico, não tem nada pronto! E Fábia apenas confirma:
“Não!”
Larissa parecia reconhecer o papel de formadora assumido por Fábia, pois algumas
vezes durante a reunião justificava o trabalho se utilizando da frase: “Fábia me ensinou”,
além de no final do encontro ter agradecido a oportunidade de aprender e experimentar a sala
de aula.
Por meio dos depoimentos, foi possível identificar ainda as reflexões feitas pela
professora quando relatou as questões que lançaria a alguém que iria recepcionar estagiário
pela primeira vez. Fábia parece perceber que tem uma função a assumir diante do acolhimento
de estagiários e ressalta a importância deste período para a formação inicial. Porém, sugere
que não seja um mero acolhimento, mas um “acolhimento formativo”, que pressupõe a
percepção de que o professor deve assumir um compromisso com o estagiário, de maneira a
contribuir com sua formação, possibilitando-lhe ocupar o lugar docente e assim refletir sobre
as questões relacionadas à docência.
4.5.2.2-Estratégias de ação
O estágio, na formação de professores, é valorizado por Fábia, de modo que ela expõe
que o estágio deve ser um momento em que o estagiário tenha subsídios para decidir pela
profissão docente. Segundo a professora, este período implica em colocar para o estagiário
que os professores estão inseridos em um sistema e que não estão isolados na situação de
trabalho. Para ela, é importante que o estagiário perceba durante o estágio que o trabalho
docente sofre então, múltiplas influências vindas do contexto em que atuam. Para isso,
segundo Fábia, é preciso que o olhar do estagiário seja direcionado e aos poucos ela pode se
integrar à cultura docente. A professora parece perceber que a formação docente é um
processo de socialização profissional, ideia que se afina ao conceito expresso por Tardif
(2000) “é um processo de identificação e incorporação dos indivíduos às práticas e rotinas
institucionalizadas dos grupos de trabalho (p.14).”
O diálogo entre professora e estagiária apresenta-se como base para a construção dessa
relação que pode ser caracterizada como uma parceria. O estabelecimento dessa parceria
pressupõe que a professora reserve tempo específico e disposição para ouvir e falar, para
trocar ideias com a estagiária.
Esse modo de agir aponta, como dito, para um acolhimento formativo, de modo que é
possível identificar que receber estagiário em sala de aula não se resume a permitir que o
estudante entre e observe, porém, o professor em exercício, como afirma Fábia, dispõe de
uma “energia”, que caracteriza o desenvolvimento de outro trabalho. O professor, portanto,
tem o papel de contribuir para a formação do estagiário. Contudo, ao se referir ao estágio de
observação, coloca-o como um período apenas do estagiário avaliar o professor.
Outra estratégia utilizada e salientada por Fábia é dar visibilidade do seu trabalho ao
estagiário, porém, não no sentido de se limitar às boas práticas, mas com o objetivo de
mostrar o que embasa suas práticas e com a intenção de justificá-las. E ao mesmo tempo
direcionar alguns olhares do estagiário para as questões docentes e o cotidiano, dinamismo e
complexidade da sala de aula.
Aí eu sempre dizia pra ela. Não sei se foi no começo ou depois... observa
certas coisas; não deixa passar certas coisas . Olha aquela criança. Olha como ela
interage. Olha como ela não interage. E olha como a gente tem que olhar pra ela ou
não (Fala da professora-Entrevista ).
Tal prática revela uma compreensão sobre o papel do formador de campo. Fábia
enfatiza que as aprendizagens no estágio não são "automáticas", fazendo-se necessária a
intervenção sistemática do professor experiente. Essa maneira de trabalhar com a estagiária
propiciava a formação da estagiária enquanto docente, socializando-a na cultura profissional,
de modo a desenvolver o seu olhar para os alunos, suas interações, seus aprendizados.
Outras questões também trabalhadas eram sobre a postura do docente frente aos
alunos, que segundo ela, o professor é um “formador de opinião”. Por isso, ela orientou
inclusive sobre a influência da mídia na maneira de se vestir. E sobre a questão da
organização das etapas do trabalho.
A escolha por essa opção de acolher e o uso de certas estratégias tem a influência da
proposta de parceria da universidade, porém também como referência sua própria experiência
145
de formação inicial e das brechas identificadas por ela : “[...]isso tudo, eu dei um toque pra
Larissa. Porque isso também não foi me ensinado”.
4.5.2.3-Acolhimento formativo
Em meio a esse processo, a professora expôs que a reflexão sobre sua própria prática e
suas convicções era um exercício constante impulsionado por esta experiência de acolher uma
pessoa que está vivenciando a fase da formação inicial docente. Como já exposto, este
movimento de olhar para si e para suas práticas, (re) modelando-se, configura um modo de
formação do modelo pedagógico da contemporaneidade (BUENO, SOUZA, 2012). Tal
modelo possibilita um movimento de auto-formação, pois encaminha a um exercício de
146
reflexão sobre seu papel enquanto docente e consequentemente sobre seu papel enquanto
‘formadora’.
A discussão dos dados reunidos por esta pesquisa requer considerarmos a composição
da identidade profissional das professoras que passam a desempenhar tarefas, relativas ao
acolhimento de estagiários, para as quais não foram formadas. Sua identidade é marcada por
suas socializações familiares, escolares, pelo período de formação inicial e segue com suas
experiências da prática e outras. Esses modos de agir na relação com os estagiários não estão
isolados de um contexto vivenciado por elas ao longo de suas vidas e carreiras
(NÓVOA,2011), sendo vinculados ao processo de construção da identidade docente, que tem
início muito antes da formação inicial. Entendemos, portanto que a identidade de cada um é
permeada pela história de vida, situada geográfica e historicamente. O que pressupõe
movimento, dinamismo; processo inacabado, e que ao mesmo tempo se compõe a partir de
diversas influências e socializações (DUBAR,1997). A identidade “não é algo que se possua,
mas sim algo que se desenvolve durante a vida” (MARCELO, 2009,p.109).
Diante desta questão considera-se, pois, que os professores em exercício que recebem
estagiários em suas classes estão em fases distintas de sua carreira profissional. Embora todos
exerçam a profissão de ensino, cada um se encontra em uma etapa, devido ao período
histórico percorrido e as suas experiências (HUBERMAN, 1992). O docente experiente está
inserido em um momento específico de sua carreira. A respeito das tendências do ciclo de
vida profissional dos professores, Huberman (1992) explica que cada época apresenta traços
que lhe são característicos, por ser construída em seus contextos históricos, culturais, que
influenciam de alguma maneira a formação dos professores. Por sua vez, os professores
148
escolar e da sala de aula, integrando-o em suas atividades docentes etc. Mas tais expectativas
eram transmitidas de modo um tanto assistemático em reuniões com a supervisora do estágio
ou mesmo em algumas das aulas do curso de extensão que fora oferecido algumas vezes para
os professores parceiros, como contrapartida da atuação nos estágios. Nenhuma formação
mais sistemática e especifica lhes fora oferecida para o trabalho junto aos estagiários.
Como atestam os estudos de França (2009), Daniel (2009), Benites (2012), Galindo
(2012), mesmo não tendo um papel de formador de campo institucionalizado, muitos
professores da educação básica recebem estagiários em suas classes e desempenham algum
tipo de função quando realizam esta atividade. Os papéis que os professores assumem ao
receber estagiários parecem guardar relações bastante estreitas com suas concepções sobre a
formação docente que, por sua vez, referem-se a certos modelos de formação presentes no
campo educacional.
Contudo, compreendemos que as posturas aqui descritas podem coexistir nas práticas
desenvolvidas por cada professora e em cada modelo pedagógico. Por isso, não pretendemos
150
Mais do que permitir que a estagiária utilize a classe para “dar aulas”, as professoras
focalizadas procuravam planejar junto com elas e, posteriormente a essa etapa de
planejamento em conjunto, dialogavam sobre o trabalho realizado, ou seja, pensavam juntas
sobre a ação e a prática; o que caracteriza um trabalho que se constituiu em parceria, proposta
colocada pela universidade, que o estágio se constitua espaço de interação de diferentes
gerações docentes (SARTI, 2009).
Os temas das conversas ultrapassavam o próprio projeto delineado para a dupla. Entre
os assuntos dialogados destacaram-se: o desenvolvimento dos alunos, as questões sociais,
emocionais e de aprendizagem que os envolviam. Relevante ainda pontuar que o diálogo
também perpassava a discussão sobre o contexto da sala de aula, sobre o processo de ensino e
aprendizagem do período em que as estagiárias não estavam em sala. O que sugere a
intencionalidade da professora em integrar a estagiária a todo processo da turma
acompanhada, pois parece perceber que o estágio é um momento para além da observação de
uma prática exemplar.
Outras práticas do cotidiano da classe, que não estavam diretamente ligadas ao projeto
elaborado em conjunto pela dupla, faziam parte da pauta das conversas entre professora e
estagiária. Em algumas ocasiões também, as professoras buscavam justificar o modo como
desenvolvia determinados trabalhos com os alunos, como já citado, por exemplo, a realização
da sondagem do nível de escrita dos alunos ou porque trabalhava com o desenvolvimento da
oralidade com os alunos.
152
Esta estratégia do diálogo se afina com Nóvoa (2009) quando diz que “[...] é na escola
e no diálogo com os outros professores que se aprende a profissão” (p.30). Ele afirma que é
preciso “aprender com os colegas mais experientes”(p.30) para incorporar-se à cultura
docente.
aspecto considerado por professores pesquisados nos trabalhos de Tardif (2012), “que
afirmam ter que duplicar esforços, multiplicar as demonstrações, destacar os comportamentos
de alunos que foram ignorados[...]”(p.70), que parecem estar em sintonia com o modo como
as professoras focalizadas nesse estudo decidiram acolher estagiários, pois relataram igual
necessidade de direcionar o olhar da estagiária para algumas questões específicas do cotidiano
da sala de aula. Isso pressupõe que a docência se constitui de saberes complexos, que impõe a
necessidade de uma formação complexa (NÓVOA, 2007).
Diante dessa ação, é relevante ressaltar que simplesmente dialogar com o estagiário
não se caracteriza como um modo de acolhimento. Nos casos analisados, duas modalidades de
acolhimento se apresentaram como sendo possíveis: um modo de acolhimento modelar,
realizado em uma relação de mestrança, e o acolhimento formativo.
Reconheceu certa mudança na postura da estagiária, mas não foi possível percebê-la por não
o ‘ver retorno nas aulas’. Ela não parecia prever que a estagiária vivia um momento de
desenvolvimento, de descobertas e aprendizagens iniciais de uma cultura profissional. A
concepção de aprendizagem neste caso liga-se a concepção de estágio como imitação de
modelos.
Este acolhimento sob o modelo da “mestrança”, embora encontre suas raízes nas
Escolas de Oficio da Idade Media, parece relacionado ao modelo pedagógico da modernidade,
cujo primado é a visibilidade (CARVALHO, 2000), pois situa o professor em uma posição de
modelo exemplar, ou seja, a referência é externa ao sujeito em formação. Como na
‘mestrança’ que se pautava na tradição ‘olhe como eu faço e faça igual’.
experiência”(p.21). Mizukami (2006) se utiliza de ideias de Shulman (1996) para ressaltar que
a aprendizagem pela experiência implica em um processo de reflexão, prática que foi
identificada em algumas professoras observadas.
A reflexão nos parece um elemento que pode se constituir a partir do diálogo entre
professor e estagiários. Evidentemente que não de maneira espontânea. Podemos pontuar a
necessidade não apenas de tempo, mas a disponibilidade e a intenção do professor em
exercício que acolhe o estagiário em voltar os olhares para a prática e repensar sobre ela.
Nesse caso, o professor reflete não somente sobre a prática, mas sobre outras questões
relevantes do cotidiano da escola, como salientados pelas docentes nesta pesquisa. O
professor se esforça por levar o estagiário a pensar no contexto educacional em que ele
mesmo está inserido. E com isso, pode, o próprio professor, vivenciar processos reflexivos.
Este elemento tem feito parte dos discursos sobre a formação de professores, contudo,
concordamos com Contreras (1997) quando diz que a reflexão
“não se refere só àquele tipo de meditação que podem fazer os docentes sobre
suas práticas e as incertezas que estas lhe ocasionam, senão que supõe ademais uma
forma de crítica que lhes permita analisar e questionar as estruturas institucionais em
que trabalham.
Monteiro (2012), ao se valer de ideias destacadas por Zeichner, expõe que “a reflexão
não pode ser reduzida a qualquer operação mental; requer esforço consciente e voluntário’, ou
seja, tem método e intenção”. Para ele ‘a reflexão é um tipo de labor mental’(p.138).
Cunha (2008) expõe que “o lugar se constitui quando atribuímos sentido aos espaços,
ou seja, reconhecemos sua legitimidade para localizar ações, expectativas, esperanças e
possibilidades” (p.184). Compreendemos que é preciso que o reconhecimento desse espaço
venha das políticas públicas, mas também dos sujeitos que constituem a escola. Sobre a escola
se colocar apenas em um “compromisso indireto”, Cyrino (2012) justifica esta posição
explicando que “[...]ainda não há uma política, diretrizes ou convênios formais voltados para
estes aspectos, ou seja, ela não tem esta função, porém de alguma maneira encontra
significado em suas ações”. Embora, como já explicitado no Parecer CNE/CP 28/2001
(BRASIL, 2001c) a escola é denominada de “instituição acolhedora”.
Buscamos identificar o lugar das estagiárias ao lado das professoras durante o estágio;
as oportunidades que lhes foram oferecidas de se envolver e participar no trabalho
desenvolvido na sala de aula, além do projeto realizado em dupla; o modo como as estagiárias
160
eram denominada pelas professoras diante dos alunos, bem como, o modo como os diálogos
entre elas transcorriam. Todos esses pontos observados, junto aos depoimentos que sugeriram
que a “estagiária não está na condição de aluna, mas de parceira” (Professora Agnes), revelam
que há mudanças nas concepções de estágio, pois o estagiário está sendo colocado em um
lugar que lhe possibilita uma perspectiva docente e não de aluno. Embora, essa experiência
como aluno tenha sido bastante longa, de maneira que foram desenvolvidas muitas crenças
(MARCELO, 2009), compreendemos que no período de estágio supervisionado o futuro
docente volta à escola com outros objetivos- de formação profissional- o que requer a
ocupação não apenas espacial, mas a possibilidade de ocupar o lugar docente.
Um ponto importante a ser ressaltado sobre a reflexão das professoras focalizadas por
esta pesquisa é a percepção que algumas delas tiveram sobre o fato de que receber um
estagiário pode impulsionar o professor a pensar sobre sua própria prática. A pensar, por
exemplo, se os saberes que ele compartilha com o estagiário são coerentes com o trabalho que
ele mesmo realiza e comunica. Ou ainda, a repensar suas práticas diante das propostas do
estagiário a ponto de mudar suas ações. Este movimento de olhar para sua própria prática e se
rever ao mesmo tempo enquanto docente e ‘formador’, afina-se com o já citado modelo
pedagógico da invisibilidade (BUENO e SOUZA, 2012), de modo a interferir em seu próprio
processo de formação a ponto de modificar sua identidade. Essa percepção por parte das
professoras focalizadas se afinam com a proposta de estágio que lhes foi feita pela
universidade
[...] a identidade humana não é dada, de uma vez por todas, no ato do
nascimento: constrói-se na infância e deve reconstruir-se sempre ao longo da vida. O
indivíduo nunca constrói [ sua identidade] sozinho: depende tanto dos julgamentos dos
outros, como das suas próprias orientações e auto definições. [Assim] a identidade é
produto de sucessivas socializações (DUBAR, 1997, p.13)
162
A reflexão mostra-se assim como um exercício a ser realizado pelo professor que
acolhe estagiários em meio a possibilidades de auto- formação. E nos estágios focalizados foi
possível identificar algumas das questões que permearam as reflexões das professoras
focalizadas.
[...]No começo eu não sabia bem o que fazer. Eu não sabia qual era
minha parte. Na verdade ainda nem sei muito bem qual é minha parte ( P.
Agnes-1ª entrevista).
Ninguém falou que era pra eu fazer ou não. Então não fiquei sabendo
qual era meu papel (P. Agnes 2º entrevista).
Isso é desencadeado pelo fato de não existir políticas públicas nacionais que normatize
a função do professor-colaborador como professor formador e como consequência, por não ter
uma formação específica para esta função. Este é um ponto que vem sendo discutido por
algumas pesquisadoras (GALINDO, 2012; BENITES, 2012; CYRINO, 2012), de modo que,
tal situação acaba gerando um trabalho de recepção de estagiário na “camaradagem” ou
“amador” (BENITES, 2012, p.52).
No caso da professora Isabel, por exemplo, a percepção de que a estagiária não estava
realmente interessada em aprender trouxe-lhe grande frustração e sofrimento. Ela não sabia
como agir diante da situação. O que se esperava de sua atuação em um caso como esse?
Para Agnes, os conflitos surgiram também nos momentos em que a professora não
sabia se deveria assumir o papel de docente, e intervir no processo de aprendizagem dos
163
No entanto, percebemos por estas práticas e reflexões aqui expostas que, mesmo ainda
não tendo um papel definido, as professoras assumem um papel de compromisso e
responsabilidade diante das estagiárias. As professoras parecem perceber o estágio como
período relevante para a formação docente, pois atribuem um valor significativo para essa
etapa, considerando-o como momento de iniciação à profissão.
Para isso, a professora Agnes declarou se planejar no inicio do estágio, pois já tem
previsto conversar com o estagiário sobre suas expectativas para essa experiência; organizar
os horários de estágio e a elaboração do projeto; inclusive se propõe a orientar sobre a escrita
do mesmo; prevê a apresentação de alguns instrumentos de trabalho; além de também ter
alguns saberes em pauta para serem apresentados, como oportunizar o contato com a escrita
das crianças em fase de alfabetização, para compreender melhor o que os estagiários estão
estudando na teoria sobre as fases da escrita, por exemplo.
Esta concepção está ligada à ideia de socialização profissional que implica em trazer
os futuros professores para a cultura docente. O que impõe ao professor da educação básica,
assumir um novo papel na relação com o futuro docente. Freire (2001) afirma que atualmente
o estágio é visto como esse espaço de socialização, pois, integrar-se a uma nova cultura não é
um movimento automático, mas um processo que requer acompanhamento e orientação que
possibilita uma vivência profissional, de modo que oportuniza a construção da identidade
docente que vai pouco a pouco sendo construída e experimentada (TARDIF, 2012). Trata-se
de um processo de interiorização.
Essas declarações que surgem do campo insinuam mudanças nas concepções das
professoras quanto ao estágio supervisionado, pois mostram, ainda que sutilmente, posturas
mais ativas no processo de formação inicial dos futuros docentes. As professoras deram um
passo a mais, pois decidiram acolher os estagiários e não apenas recebê-los. Mesmo optando
por esta postura participativa, surgiu um questionamento importante, já que os professores das
escolas ainda não têm formação específica para acompanhar os estagiários. Ressaltou-se a
necessidade de uma modificação na cultura docente para poder atender a proposta de estágio
de construção de uma parceria. Segundo os dados, é preciso que o saber trabalhar em equipe
integre o perfil do professor que decide acolher estagiários. O trabalho em equipe é inclusive
uma questão que tem sido discutida no campo de formação de professores. Nóvoa (2007)
afirma que “a formação de professores deve valorizar o trabalho em equipa e o exercício
colectivo da profissão[...]” (p.40).
Apesar de termos analisado as práticas elaboradas pelas professoras, não nos compete
enquadrá-las em um modelo específico. Esse trabalho de acolhimento ainda está em processo
de estruturação, o professor ainda não tem um papel definido na formação dos futuros
docentes, com políticas públicas estabelecidas, tanto sobre o perfil e papel desse ‘professor
167
formador’, quanto a formação específica e a carga horária e espaços para desenvolver este
trabalho e refletir sobre ele, além de outras questões que compõem uma profissão. Portanto,
objetivamos compreender esses modos de acolhimento e o valor auto formativo conferido
pelas professoras.
Esse movimento nos remete a análise realizada por Sarti (2012) sobre a formação de
professores da educação básica dos anos iniciais, que a partir de um esquema de triangulação,
a pesquisadora analisa as relações entre os agentes que ocupam lugares nos vértices do campo
da formação docente, considerados ocupações desiguais.
Ela cita como agentes: “os professores e as instâncias que os representam, de um lado;
as universidades, fundações e institutos de pesquisa, com seus especialistas, no outro; e o
poder público, representado por secretarias de educação e outros órgãos administrativos, no
terceiro”. A atual configuração aponta uma relação estreita entre poder público e
168
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No entanto, consideramos que esse papel mais ativo, como potencial formador, do
professor da educação básica já emerge, ainda que de forma sutil, no campo de formação de
professores. Mas concordamos com Benites (2012) e Cyrino (2012) quando expõem a
necessidade de formação para que os professores possam assumir esse outro papel, que não é
a docência.
As ações elaboradas por elas encaminharam para passos mais largos do que a mera
recepção, pois não se limitaram a abrir suas salas para que simplesmente as estagiárias se
colocassem em um papel de observadoras passivas do ambiente escolar, porém, elegeram o
acolhimento como o modo de receber os futuros professores.
Para isso perceberam que era preciso disponibilizar tempo e trabalhar especificamente
com as estagiárias. E o fizeram, mesmo sem ter uma carga horária prevista para ‘acolher’ esse
estagiário. Colocaram o diálogo como estratégia de construção de uma via de comunicação,
que se deu não apenas nos momentos reservados especificamente para a conversa entre as
duas; ou ficou restrito à sala de aula, mas incluiu também conversas durante a dinâmica das
aulas. Utilizaram o email e o telefone com o intuito de ampliar a comunicação entre as
parceiras e orientar as estagiárias, segundo as declarações expostas anteriormente. Como
estratégia, também entenderam que é preciso direcionar o foco de atenção dos estagiários, já
que estão em fase de transição de lugar de aluno à lugar docente. E se esforçavam em
mostrar-lhes alguns de seus instrumentos de trabalho. Algumas duplas se utilizaram mais do
que outras desses meios, como já exposto nas descrições dos casos e análises e a partir de suas
concepções de formação.
A ocupação dos lugares em meio a essas interações foi também um ponto explorado
em nossa pesquisa, já que a escola tem sido considerada com potencial de “espaço de
formação” (NÓVOA, 2009). Entretanto, seguindo Cunha (2008), entende-se que para que os
lugares sejam ocupados e legitimados nesse outro espaço de formação de professores é
preciso avançar da condição de possibilidade de espaço formativo. Frente a essas questões,
podemos entender que o estagiário chega à escola em outra condição, como futuro docente.
Portanto, a familiaridade de algumas práticas se justifica apenas pela outra posição ocupada-
de aluno. No período de estágio supervisionado de prática de ensino concordamos com a
concepção de que é um período de aprendizagem e de transição de papel de aluno ao papel
docente, “com forte potencial formativo” (SARTI, 2009). Sendo assim, pressupõe-se que o
172
estagiário seja oportunizado pelo professor que o recepciona a ocupar o lugar docente para
que experimente a docência e visualize o contexto escolar com suas complexidades de uma
perspectiva docente. Ao mesmo tempo, o professor é encaminhado a modificar o seu lugar e
assumir seu papel na formação dos novos professores.
socializador, com uma proposta que aponta para ideia de alternância, a relevância de ‘equipes
pluricategorias’ e um trabalho permeado pela reflexão.
Podemos pressupor ainda que, possivelmente, caso tivéssemos um período maior para
a exploração e dados mais específicos das práticas elencadas, o acolhimento formativo teria
outros desdobramentos também e assim poderíamos investigar quais seriam as outras
possibilidades de desenvolvê-lo. Esta talvez faça parte de questões de outra investigação.
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APÊNDICES
181
APÊNDICE 1
Início 12h55
DATA 09 de maio de 2013
Fim 17h30
Local ESCOLA Y
(A) Alunos
(P) Professora
Descrição de memória, sem apoio de registro de
Negrito
campo
Fala exata do sujeito –com apoio de registro de
“”
campo
... Falas não registradas
Chego à escola e sigo direto para o corredor, que fica próximo ao lugar, onde os
alunos de Agnes formam a fila. Alguns alunos dela correm e me abraçam, junto com
outros que não me conhecem.O sinal bate e Agnes vem junto com outra professora. Nos
cumprimentamos, Agnes com um beijo e sorrindo e a outra professora sorri.
Na fila...
Agnes segue com a fila para a sala, as crianças sentam-se no chão em frente a
lousa e auxilio a organizar as mesas, como tem feito todas as vezes que estou.
(P) Oi!
182
(E) Oi!!
Agnes se posiciona de frente para os alunos e com as mãos conta até três...
Não dá um minuto ela retorna, pois a sala em que fica alguns materiais de
uso coletivo é ao lado da sala da Agnes.
(P-Ed. Fís.) Você pode me emprestar seu diário para ver as presenças de
fevereiro?
(P) Posso!!!
E a entrega...
“Ontem a gente leu a primeira história dessa, agora vamos ler a segunda.
Olha!!!” “Aproveita a própria companhia” ( título do livro).
“Vamos sentar direitinho? Por favor, esse brinquedo vai enfeitar minha mesa de
novo” ( e pega o brinquedo de um aluno).
Agnes inicia a leitura, mas está como uma tosse constante, precisa ler e parar
muitas vezes.
(P) “Não!! Pode falar!! Já parou tudo mesmo! Estou tossindo muito”.
(E) “Ai, eu devia ter pedido pra ela para eu realizar a leitura!!!”
13h20- (P) “Vou ler só o finalzinho. Muita gente percebeu o que eu quis dizer com
que estava lendo?”
“Tem criança que pensa que ser feliz é quando tem um monte de gente ou quando
está comprando um monte de coisas!!!..”.
(P) “O V.está pedindo a moral da história” ( sorri e dirige o olhar para a estagiária
e pra mim).
Faz a leitura...
(P) “Vamos relacionar com a história? Você ficou feliz em trazer a bolacha?”
(A) É.
...
(E) “Então, hoje vou fazer um jogo e vou precisar de dois grupos”.
(E) “É”.
A fileira do meio junta as mesas para o lado da janela e Agnes estende a folha
no meio, formando um corredor. Vai até o armário, pega uma fita crepe e prende a
folha ao chão.
(E) “ Pode”.
(P) “Prestem atenção!! Aquele dia nós dividimos em 5 partes. Hoje nós vamos
dividir em duas”.
(P) “No momento que você achar que está na hora, a gente pega as letrinhas”.
A estagiária se agacha...
(P) “Vamos combinar? Quem não souber brincar, vai sair da brincadeira!”
(A) “Levei”.
A estagiária vai para a outra ponta da folha explicar e senta-se no chão com
um grupo em roda.
(E) “Pode”.
“O que é isso”?
...
13h40- Agnes senta sobre a mesa e fotografa com seu celular e observa o
grupo jogar sozinho um pouco. Volta para o chão...
...
(P) “relógio”
(A) “RU”
(P) “Relógio”
(A) “RE”
Continua...
(A) “FA”
(P) “Conta quantos pares têm.. Vocês vão contar quantas peças?”
As crianças contam...
186
O aluno D. só acertou 2 pares, mas insistia com a professora que eram 10.
Ele insistia...
(A) “GA”
O aluno que cantava, saiu para o banheiro, olhava para o lado...e a estagiária
chamava-o várias vezes para o grupo.
(E) “Isso!”
As crianças se organizam...
(E)” A gente não viu os pedacinhos? Agora vou falar e vocês vão montar com as
letras.”
Agnes vai até o armário e pega uma caixa cheia de letras de plástico.
(P) “Beatriz, podemos fazer uma alteração? Grupos menores. Acho que dá mais
certo pra eles escreverem!”
(P) “Vai ter que melhorar aqui! Algum alfabético, silábico- alfabético”.
(P) “Se não colocar um para puxar, não roda. Pode escrever. Eu vou espalhando as
letrinhas nos grupos”.
As crianças conversam...
(P) “Olha, observa aqui uma coisa. A dona Beatriz está colocando as palavras que
estavam no cartão e vocês vão tentar montar as palavras com as letrinhas”.
(A) “Vaca”
(P) “Vamos fazer uma coisa? Não está funcionando. O que é trabalhar em grupo?
Tem que fazer junto. É para um ajudar o outro”.
(A) “G”
(E) “D. (nome de um aluno), não é para abraçar as letras é para montar.”
As duas observam...
(P)” Mudança!!!! Vou marcar com canetinha vermelha. Todos vão montar nesse
espaço!”
(P) “Tira VACA, vai começar outro”. ..Aponta onde devem montar.
(P) “Isso!”
Beatriz ajuda a tirar o papel do chão, pede para alguns alunos sentarem...
O jogo da memória. Eu nem sabia que tinha criança que sabia tanta coisa!
Foi bom trabalhar em grupo para ver que não funcionou. A dona Beatriz também viu
isso”.
“Se tem que escrever PATO, todo mundo vai procurar “P”. Não importa quem achou.
Todo mundo vai ficar feliz porque achou a letra “P”.”
“Tem que ajudar o outro. No começo estava todo mundo fazendo separado, depois
fizeram dentro do espaço.”
Se dirige à Beatriz:
(P) “Vamos fazer 5 minutos de roda de silêncio? Não dá tempo de começar nenhuma
atividade. Começa Igor”.
O garoto vai pra lousa , faz um círculo e marca a primeira letra do nome de um
colega que considera que está em silêncio e quieto.
Não foram só eles. A gente devia ter explicado antes de entregar as letrinhas. Podia
ter escrito todas as letrinhas, explicado, apagado e que fosse colocando de 3 em 3.”
(E)” É.”
(P) “Ontem mandei um bilhete pra mãe do Daniel dizendo que ele está melhorando,
inclusive no comportamento.”
(P) “Deixa eu ver se todo mundo chegou!! Preciso falar com a coordenadora sobre
uma aluna que foi transferida. Enquanto isso vocês vão desenhando nesta folhinha.”
(E) “Dou”
Beatriz acalma o aluno D. que chora por ter se desentendido com seu amigo L.
(E) “Fica calmo, faz seu desenho que daqui a pouco ele conversa com você”.
...
192
15h37- A professora entra, vai até o armário, pega uma pilha de cadernos pequenos...
(P) “vamos combinar! Eu sei que vocês estão fazendo desenho, mas a gente precisa
fazer uma atividade ainda hoje antes da educação física. Cinco minutos.”
(P) “4 minutos!!!”
(E)” É, mas se não der um tempo!! No projeto também faço isso, coloco até o celular
para despertar!”
1.
2.
3.
4.
5.
(P) “Então vamos lá! Hoje nós vamos escrever no ditado o que estava no jogo da
memória.”
Agnes, enquanto olha, faz comenta´rios com a estagiária e anota em seu caderno de
registros.
Coloca o caderno no meio para ver junto com a Beatriz , enquanto a criança
também está junto.
...
“Tem que forçar mais porque ela está muito tempo silábica –alfabética.”
J”., corre!!
(E) “E o G. ?”
(P) “A gente tem que fazer isso na primeira parte que é mais tranquilo. Na 3ª feira...”
(P) Tive um aluno que eu ficava com ele nas aulas de Ed. Física para dar uma
arrancada e ele estava se desenvolvendo . Um dia ele chegou pra mim e disse que a irmã
estava ensinando ele a ler... risos.. ah, sua irmã!!!
HTPI.
(E) Não.
Elas começam a conversar diversos assuntos pessoais que não estão relacionados
coma classe.
196
APÊNDICE 2
Legenda
(E) Entrevistadora
Beatriz ou Bia Pseudônimo-estagiária
Eu até cheguei a falar que eu ia sentir saudade dela. Ela é uma graça, não se mete
na aula de forma agressiva. Ela só conversa. É uma pessoa fina, uma postura fina. Então,
fácil de lidar. Tranquila.
Postura profissional. Tinha aquela parte mais... é...chegou não ia para sala dos
professores. A princípio, né. Tinha aquela posição de aluno. Uma postura mesmo de
197
aluno. Daqui a pouco foi trocando, já foi pra sala dos professores. Ficou legal. Começou a
ter uma postura profissional.
(E)E você não coloca nenhuma dificuldade. Você acha que não teve nenhuma
dificuldade nesse processo todo? Pra você
Pra qualquer coisa que tenha, ah, vamos repensar? Tudo foi fácil. Nada assim de
dificuldade, coisa que tivesse que ficar repensando, não. Ah, vamos fazer assim. Ela já
trocava sozinha. Mandava um email. A gente se relacionava mais por email, não era
encontro. Ela já fala: “ Ah, tudo bem, isso? Posso mudar pra isso?” Então vamos fazer
diferente. Ela mesma, qualquer comentário que eu fazia, ela analisava, tocava meio
sozinha. Só assim, ela queria meu aval pra ver se estava tudo certo. E fazia sozinha uma
parte, né?
Um pouco sim. Nunca tive problema com estagiário. Tanto que eu recebi sempre
estagiário. Desde que comecei a trabalhar, desde o primeiro ano. E vejo todo mundo falando
que teve problema com estagiário. Eu nunca tive, eu nunca tive nada demais com estagiário.
Por isso eu recebo numa boa.É...só que no começo eu não me colocava muito. Ah, nós vamos
desenvolver esse trabalho. A pessoa chegava muito imatura, assim. Não tinha muita noção e
eu ficava com aquele cuidado mesmo de não interferir, de falar coisa e ela se ofender. Isso eu
acho que eu tive que mudar. Já chegou estagiário, ah, vamos montar o cronograma,
desenvolver alguma coisa de trabalho, se não der certo você vai me ligar nesse telefone. Se
precisar conversar você já vai, já fala por email. A gente agilizou o processo no início pra não
ficar aquela coisa massante até resolver tudo. Então, isso eu tive que mudar. Acho que...
(E) Por causa do seu trabalho?
198
Com a Beatriz?
(E) Nela o que você ressalta mais, que trouxe assim, pra você?
Com a Bia? O que eu gostei muito na Bia foi mais a postura dela, assim, porque o
trabalho, como foi jogo. Jogos de alfabetização, é um trabalho que se você fizer, você tem
uma teoria, faz acaba fazendo certo e acabou, né? Mas a postura dela foi muito boa. As
crianças a receberam muito bem. O comportamento dela como professora. Ficou legal. Esse
é o ponto principal dela.
Se ela chegava na sala é... até você chegou a ver. Eu comentei até com você lá na
hora: “ Olha só, ela faz assim, mais baixo, ela não grita. Ela se coloca. A criança respeita.
Não precisou. Quando começa a gritar a criança perde o respeito, né? Não. Ela foi fazendo
do jeitinho dela, foi contornando, contornando e chegava onde ela queria. Então eu vi isso
nela de bom. Fora o trabalho , é claro, de alfabetizar, todos os jogos são ótimos.
(E) Se uma professora que vai receber estagiário pela primeira vez
viesse perguntar para você o que ela deve fazer, que postura deve ter, o que diria
a ela?
199
Eu diria o que queria que tivessem feito comigo. Eu era , que é essa parte que eu to
tentando fazer. Mostrar a parte mais burocrática: “ Olha, você tem que fazer um planejamento
de aula. Divida seu conteúdo, monte do jeito que você quiser, pra você visualizar do que você
tem que dar no ano, no trimestre, no mês, na semana, no dia. Vai montando. Eu queria que me
desse essa orientada. Então eu falaria pra ela orientar nesse aspecto.
Não. A princípio eu achei que seria só o estagiário chegar e observar a minha aula. Ai
ele ia ficar na dele. Ai a partir disso seria uma postura minha. Só que hoje eu acho que não, o
estagiário vem e eu tenho que agregar alguma coisa na vida dele, além do que ele vai
observar. Tem que formalizar alguma coisa na cabeça dele. Pelo menos pra ele ter alguma
coisa pra pensar sobre estágio. Então é um trabalho sim, é...é...diferente. Não sei se eu
respondi o que você perguntou. É isso?
Eu preciso sentar com esse estagiário, independente de estar em sala de aula ou não.
Tem que sentar uma hora com ele. HTPI é um horário bom que tem que conversar. Tem que
trocar ideia com ele. Vê o que ele tá precisando saber. Que, que ele tá, pra onde ele quer ir.
È que aí é um relacionamento entre dois adultos que estão, ela numa condição de
estudante adulta. Ela quer algumas coisas que ela busca. O que que ela tá buscando no
estágio. Vamos conversar sobre isso. Vamos trocar ideia. O que que eu faço. Eu acho que é
diferente.
(E)Você coloca na 1ª entrevista que não sabia muito bem qual era o seu
papel, o que te cabia nesse processo. Ficou mais claro após esta experiência?
Justifique. O que contribuiu ou o que falta?
200
Não. Risos...não...Na verdade eu não participei daquele curso. Até não teve,
né? Cheguei a ir lá, depois cancelaram o curso. É... eu não sabia muito o que fazer.
Ano passado eu participei mais da montagem do trabalho, introdução, metodologia,
tarãrãrã... Com a Bia não, ela fez tudo sozinha. Então, eu não sabia se essa era minha
função, ou se isso é função da professora dela, regular dela. Afinal é uma montagem
de trabalho acadêmico, deve ser da professora dela. Então, pensando nisso eu me
afastei. Ninguém falou que era pra eu fazer ou não. Então não fiquei sabendo qual era
meu papel. Eu acho que meu papel como professora e ela como estagiária fica mais
fácil de lidar, que é que ela vai chegar, eu vou mostrar meu trabalho. Fiz questão de
mostrar planejamento. Tudo no início. Ela chegou eu já mostrei como é que funciona.
Ah, você vai ter um plano de ensino pra se basear; você vai fazer isso, vai fazer aquilo.
É importante o registro. Vai registrando no caderno de tudo o que você fizer. Passei os
modelos pra ela. Então, assim, orientando nessa parte com ela. Ah, você não vai fazer
assim porque senão a criança, você não vai dar conta daqui a pouco. Essas dicazinhas
assim, mas não oficialmente.
(E) Ainda não está uma coisa clara...
Não tá claro.
(E) Você acha que é por conta do que?
Não sei. Alguém chegar pra mim e dizer assim: “ Você vai até aí e a estagiária
a partir daí”. Ou eu acho que o estágio é pra haver uma troca ali. Houve. Eu não sei se
a parte de trabalho eu teria que ter feito como eu fiz no ano passado. É... estar mais
presente. Ano retrasado que o estagiário vinha, mostrava. Eu falava assim: “Opa, nós
vamos fazer uma introdução, mas só que você tem que falar disso”. Não sei se essa é
minha parte.
Bom, é, eu não vou colocar o estagiário lá atrás. Ele não está na condição de
meu aluno. Ele tá de parceiro comigo. Então, o lugar dele é ali na frente junto comigo,
pra ver, participar, trocar ideia.Então, ai é o primeiro.
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Trocar de mesa era só pra ela ter mais espaço físico mesmo. Acho que era mais
nesse sentido. Até as crianças vão vê-la, “oh, agora quem está no comando é ela”.
Facilitar a vida pra ela no momento. É isso.
Olha, quando eu entrei, eu não tinha nem noção de níveis de aprendizagem. O que
eu estudei na faculdade não foi o suficiente para saber que que era pegar um caderno e
olhar: “oh, progresso, olha que legal, olha o progresso”, que progresso? Então, quando eu
mostrava um por um pra ela era pra ela já sair com essa noção que eu não consegui ter na
faculdade. Noção mais prática, de pegar um caderno , bater o olho e analisar. Mais por
isso.
(E)Por que você se referia a estagiária como ”dona Beatriz” na presença dos
alunos?
(E)No último dia, comentou que sentiria falta da estagiária. Especifique sua
falta.
(E)Algumas vezes você interviu quando a Beatriz estava dando aula .Para
explicar o traçado de um algarismo; outro momento, interviu na escrita... Por quê?
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Isso até me dava é...me dava é um certo receio que eu tinha que interromper a aula
dela, de atrapalhar o raciocínio dela, ou é...desencadear alguma coisa que não fosse
positiva. Mas, se as crianças, por exemplo o traçado, se as crianças estão lá fazendo o
traçado e começa de qualquer jeito... e traça errado, já pegar no começo. O primeiro erro
da criança é aquela hora; assim, o momento de intervir é aquela hora. Não pode deixar pra
daqui a pouco. Então , eu passava por cima um pouco disso,tentava não ser invasiva
demais. Não sei se e conseguia, mas , é... vamos corrigir na hora que surgiu a
possibilidade, né? A oportunidade.
Mas, é tentei não ser muito invasiva.Porque ela pescava. Ela entendia. Até brinquei
outro dia brinquei com você que ela tinha muito reflexo meu. Ai nesses reflexos que eu
via que ela tava fazendo é porque ela tinha incorporado. Às vezes incorporava até
demais...risos... mas todo estagiário acaba pegando uns vícios da gente, né? Eu via através
das próximas atividades que ela tinha pegado. Você deve ter analisado que, às vezes, ela
falava como eu ali, né? Mostrava: “ Ah, são...eu via que ela pegava.