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À DESCOBERTA DA

HIPNOSE
Escrito por:

Pedro Rodrigues Ribeiro

Fundador e Diretor de
INTRODUÇÃO
Recordo o primeiro momento em que tive contacto com a Hipnose, como se fosse
ontem. Estava no 4º Ano do Mestrado Integrado em Psicologia, vertente Clínica, numa
cadeira que se chamava Introdução às Psicoterapias. O objetivo dessa cadeira era
mostrar os principais modelos de Psicoterapia, desde a Psicanálise até às chamadas
Psicoterapias de 3ª Geração.

Num desses dias, fomos informados que iriamos ser hipnotizados. Não sei se alguém
sabia o que isso significaria. Apenas nos disseram que tínhamos de chegar a horas, já
que depois a porta seria fechada e não se poderia entrar e que, quem não quisesse
participar, não precisaria. Uma gravação foi passada com a voz da nossa professora a
falar. Hoje percebo perfeitamente cada uma partes mas, na altura, tudo isso era
desconhecido.

Passados minutos, vi a minha atenção e concentração a ser focada, uma alteração da


consciência a seguir as sugestões dadas e, ao longo da mais de uma hora de gravação,
comecei a executar ações, ouvir músicas e ver cores que realmente não estavam
presentes, com uma facilidade tremenda. Escusado será dizer que sai de lá a pensar:
“Que raio é que acabou de acontecer!? Quero saber mais sobre isto!!”. E assim começou
a minha jornada pelo mundo da Hipnose.

O primeiro passo foi um curso de Hipnose Clínica, numa perspetiva cognitivo-


comportamental, administrado pelo Prof. Dr. António Capafons, no ISPA. Foram das
melhores 40 horas do meu último ano de Mestrado. Entre conhecer a história, as teorias,
os testes de sugestionabilidade, as escalas, como dar as sugestões hipnóticas, o modelo
de Valência e auto-hipnose… Foram fins-de-semana completamente hipnotizantes, se
me permitem a redundância. Mas não foi o suficiente, não só para satisfazer a minha
sede de conhecimento mas, também, para poder utilizar profissionalmente. Mas seria
apenas o início.

A oportunidade surgiu após a conclusão do curso. Já com um mestrado em Psicologia,


recebo a novidade que a Prof. Dra. Cláudia Carvalho, minha antiga professora e diretora
do Instituto Milton H. Erickson de Lisboa iria administrar um curso de Hipnose, com o
mesmo molde da formação da Fundação Milton H. Erickson. A emoção foi mais que
muita!

Agarrei a oportunidade e fiz a formação completa, desde o mais básico, até ao mais
avançado. O meu mundo ficou aberto ao génio de Milton Erickson e às Abordagens
Ericksonianas à Psicoterapia. O pensamento de utilizar várias abordagens para que
tornasse a terapia em algo personalizado para o cliente fazia-me muito sentido, tanto em
Hipnose como Psicoterapia Cognitivo-Comportamental.

Desde essa altura, utilizo linguagem hipnótica e Hipnose sempre que a situação peça,
explorei outros estilos de Hipnose, uns mais tradicionais, outros mais integrativos, dou
formação no tema e aumentei os meus conhecimentos, com um Curso de Abordagem
Ericksoniana à Hipnose e Psicoterapia Breve, diretamente da Fundação Milton H.
Erickson, nos Estados Unidos.

Coloca-se a pergunta: Porquê escrever algo sobre Hipnose? A resposta é simples:


acredito que Hipnose pode ser uma técnica valiosa para profissionais de saúde e para os
seus clientes ou pacientes. Como eu, existem mais pessoas que partilham esta crença.
Mas o avanço e aceitação da Hipnose, por parte de profissionais de saúde, têm sido
lenta e com desconfiança, sem dúvida devido a algum desconhecimento e muitos mitos
que vêm associados à Hipnose.

Espero que esta pequena introdução ao mundo da Hipnose possa ser a abertura da porta
para uma curiosidade ainda maior de saber mais e mais.

Vamos então começar?


O QUE É HIPNOSE?
Para se começar a falar sobre Hipnose, nada melhor do começar pelo princípio. O que é
Hipnose?

Essa é uma pergunta que não tem uma resposta muito simples. Desde que Hipnose
surgiu e que se começou a investigar este método, vários foram os investigadores que
formularam definições, de acordo com aquilo que acreditavam e os resultados das suas
investigações. Como veremos mais à frente, o início da Hipnose foi caracterizado por
uma luta entre escolas e perspetivas diferentes. Mas se é difícil apresentar uma única e
abrangente definição de Hipnose, vamos analisar as áreas comuns das várias definições.

Em primeiro lugar, Hipnose é uma técnica e não uma forma de terapia. Hipnose é
uma forma de comunicação verbal e não-verbal, sendo que aquilo que dizemos terá
necessariamente que ter uma base terapêutica e isso é algo que Hipnose não ensina. O
termo “Hipnoterapia” entrou na linguagem científica como uma tentativa de se
aproximar de algo que se tornou numa cultura popular. E, se pensarmos bem,
“Hipnoterapia” apenas significa terapia com recurso à Hipnose.

Em segundo lugar, Hipnose implica um estado de atenção focado. De entre alguns


processos aos quais Hipnose utiliza, o processo de atenção é um dos, se não o mais
importante. De modo a hipnotizarmos alguém, temos de absorver a atenção da pessoa
em algo, podendo ser uma ideia, uma sensação, um objeto ou mesmo um som.

Em terceiro lugar, Hipnose implica uma relação. Uma das grandes preocupações das
pessoas, ao entrarem no mundo da Hipnose, é a questão do controlo mental, um poder
obscuro que o hipnotista exerce sobre a podre e indefesa pessoa. Nada poderia ser mais
longe da verdade. De facto, uma pessoa só pode ser hipnotiza se ela quiser, se permitir-
se estar numa relação com o hipnotista, que permita confiar, seguir a suas sugestões e
aproveitar as sensações que o estado de Hipnose traz.

Em quarto lugar, Hipnose possui uma linguagem própria. Hipnose é, por excelência,
uma técnica comunicacional. Nesse sentido, o terapeuta utiliza uma linguagem
especificamente estruturada para induzir a pessoa em Hipnose. Esse tipo de linguagem é
conhecido como sugestão. A sugestão não é algo exclusiva da Hipnose, psicoterapia
mais formal também pode utilizar. No caso da Hipnose, todas as estratégias terapêutica
que vamos utilizar são colocadas em forma de sugestão.

Finalmente, Hipnose pode ser induzida pelo próprio sujeito. Muitos são os teóricos
que afirmam que toda a Hipnose é Auto-Hipnose. Isto porque é o sujeito que se permite
aceitar e seguir as sugestões dadas. Nesse sentido, é possível ensinar e treinar a pessoa
em metodologias próprias de Hipnose, onde a pessoa possa passar pelo processo, sem o
auxílio de um terapeuta a conduzir o processo.
COMO SURGIU A HIPNOSE?
Hipnose é uma área relativamente jovem, com apenas umas centenas de anos. As
sementes do que viria a ser Hipnose foram plantadas há séculos atrás, antes de Cristo.

Os Egípcios, por exemplo, retinham uma prática de permitir que os seus altos
conselheiros e soldados entrassem em templos, devidamente preparados e
ornamentados. Dentro desses templos, deitavam-se em superfícies de pedra, muitas
delas, completamente imóveis. Sacerdotes vestidos em trajes elegantes passavam pelas
pessoas, entoando cantos e passes de mãos, como se orações se tratassem. De seguida,
as pessoas deitadas entravam em estados de sono curativos, que poderiam demorar
horas. O que é certo é, após saírem do templo, encontravam-se totalmente recuperados e
revigorados.

Mais tarde, os próprios Gregos e Romanos começaram a realizar essas práticas, onde os
primeiros chegavam a adorar Hypnos, o Deus do Sono.

A própria imagem do curandeiro, a pessoa mais velha e sábia da cultura que


representava, utilizava muitas vezes o poder da sugestão, parecendo realizar autênticos
milagres.

Franz Anton Mesmer, nascido em 1734, fora um médico alemão cujo interesse pela
astronomia viria a impulsionar a forma como Hipnose surgiria. O interesse de Mesmer
era tão grande que a sua própria dissertação de doutoramento incluía a teoria de que o
posicionamento da Lua afetava as marés, animais e até os seres vivos, via forças
magnéticas. No início, Mesmer pensou num aparelho em metal, de modo a poder ser um
condutor da força magnética. No entanto, com o passar do tempo, Mesmer começou a
perceber que essa mesma força poderia ser manipulada e lançada pelos seus próprios
dedos das mãos. Mais tarde, Mesmer iria considerar que todos os indivíduos mais
inteligentes o poderiam fazer.

Mesmer gerou muita controvérsia quando, um dia, atendeu uma pessoa bastante doente.
Contrariamente ao método utilizado na altura, abertura do crânio para libertar pressão e
sangue, Mesmer resolveu aplicar o seu método, realizando movimentos com as suas
mãos, ao longo do corpo da jovem. De repente, ela começou a ter convulsões, perdeu a
consciência por momentos e, quando retornou a si, parecia estar completamente curada.

Aproveitando este episódio, Mesmer começou a realizar o seu novo método de


tratamentos com várias pessoas. O suficiente para que a comunidade médica se
mostrasse desagradada com a metodologia de Mesmer. A pressão tornou-se tão grande
que Mesmer sentiu a necessidade de se mudar para Paris.

Já em Paris, Mesmer costuma organizar sessões de cura com grandes grupos de pessoas,
quase todas mulheres da alta sociedade. De modo a que o fluxo magnético pudesse ser
transferido, de maneira mais eficaz, foi construído um aparelho em forma de uma
banheira metálica, com vários condutores. Vestido de forma vistosa e ornamentada,
Mesmer montava um autêntico espetáculo onde transferia o magnetismo para todas as
pessoas, via condutores metálicos.

Tal como na sua terra natal, a comunidade médica parisiense começou a insurgir-se
contra Mesmer. Para satisfazer a comunidade médica, o Rei decidiu organizar uma
comissão cujo objetivo seria avaliar a veracidade do método de Mesmer. Essa comissão
seria popular por alguns dos seus constituintes, como Benjamin Franklin, Antoine
Lavoisier e Antoine Louis, o criador da guilhotina. A Comissão duplicou os métodos de
Mesmer, mas o resultado foi muito diferente. Era a conclusão de Franklin que os
métodos de Mesmer eram uma fraude e deveriam ser totalmente desacreditados.

Em desgraça, Mesmer acabou exilado fora de França, até ao final dos seus dias. Até aos
dias de hoje, os contributos de Mesmer, na evolução da Hipnose, não é esquecida e em
algumas escolas, a sua prática de Mesmerismo, como ficou conhecida, ainda é ensinada.

Um dos discípulos mais importantes do Mesmerismo foi o Marquês de Puységur.


Ensinado pelo seu irmão, nas práticas do Mesmerismo, o Marquês era um defensor e
praticante do Mesmerismo, dentro da alta sociedade. Achando que os benefícios do
Mesmerismo deveriam ser para todas as classes, o Marquês magnetizou uma árvore,
para que todos os membros do povo pudessem ter acesso.

Certo dia, um aldeão de nome Victor Race aproximou-se da árvore e, ao tocar-lhe, caiu
num profundo estado de sono. Ao verem o que aconteceu com Race, mais pessoas
tocaram e caíram num sono profundo. Este seria o estado conhecido como estado
sonambúlico.

Já que isto é um texto português, deixo aqui a referência histórica do hipnotismo


português, o Abade Faria. Nascido em 1756, José Custódio de Faria foi um monge
católico nascido em Goa, de pais portugueses. O seu impacto foi de tal ordem que existe
uma estátua do Abade em Goa, em sua honra, uma das ruas do Parque das Nações tem o
seu nome e a personagem Faria, do romance de Alexandre Dumas O Conde de Monte
Cristo, teve como base o Abade.

Ainda em Goa, pensa-se que Abade Faria já possuía alguns conhecimentos de


hipnotismo, com diferenças do trabalho de Mesmer. Foi em Paris que o trabalho de
hipnotismo do Abade se tornou popular, por convite do Marquês de Puységur.
Contrariamente ao que Mesmer pensava, o Abade acreditava que o estado de
hipnotismo seria atingido por via de sugestão. De tal forma que as suas ideias seriam
exploradas pelo campo da Psicoterapia e de grandes pensadores de Hipnose, referidos
mais à frente. Faria também foi a primeira pessoa a conseguir colocar alguém no estado
hipnótico, de modo rápido, via choque. Explicando ao sujeito o que se iria passar, o
Abade gritava a palavra “Durma!”, de forma violenta e inesperada. Devido à surpresa e
ao choque, o sujeito entrava no estado, quase sempre.

Uma das últimas grandes referências do Mesmerismo foi James Esdaile. Nascido em
1808, Esdaile foi um médico-cirurgião escocês que serviu como médico na Índia,
durante mais de 20 anos. Com a falta de condições para cirurgias, nomeadamente
agentes anestésicos, as práticas de Esdaile baseavam-se nos princípios do Mesmerismo.

Durante horas, Esdaile colocava os seus pacientes no estado de sonambulismo,


deixando que fossem preparados pelos assistentes. Assim que se encontravam
preparados, Edaile realizava as intervenções necessárias, desde pequenas cirurgias até
operações mais complexas, como amputações. Não só os pacientes não sentiam nada,
como a sua recuperação ainda parecia ser mais rápida.

Após mais de 300 intervenções bem-sucedidas, Esdaile escreveu vários artigos, com o
objetivo de apresentar a sua metodologia, à comunidade médica britânica. Contudo,
Esdaile mostrou-se incapaz de reproduzir os mesmos resultados que obteve na Índia, o
que desqualificou a sua abordagem, na comunidade médica. Pensa-se que parte do seu
sucesso teria a ver com a ritualização dos procedimentos que aconteciam nas suas
operações, na Índia.

O momento do surgimento de Hipnose ocorre este homem, James Braid. Nascido a


1795, Braid era um médico-cirurgião escocês com particular interesse no Mesmerismo.
Ao contrário da maioria, o objetivo de Braid era provar que o Mesmerismo não existia,
enquanto prática. A sua oportunidade surgiu quando Braid pediu o consentimento para
observar uma pessoa que tinha sido voluntária num espetáculo, por parte de um
mesmerista.

O que Braid descobriu mudaria o curso da história da Hipnose para sempre. Após uma
observação meticulosa do sujeito, Braid reparou num estranho movimentos dos olhos
do sujeito, estando virados para cima e humedecidos. Braid decidiu inverter o processo
e usá-lo nele próprio, o que fez com que atingisse o mesmo estado que o sujeito.

A grande conclusão de Braid é que o estado que era alcançado não se devia a
Mesmerismo ou o carisma do artista, mas sim à fixação ocular prolongada, num objeto,
onde o ponto estaria acima do campo de visão do sujeito, fazendo com que os seus
olhos revirassem. Braid denominou este fenómeno, inicialmente, como
Neurohipnotismo, atribuindo a processos fisiológicos. No entanto, a primeira parte
acabou por cair ficando apenas Hipnotismo e, mais tarde, Hipnose.

Neste sentido, Braid é considerado o pai da Hipnose, apesar deste termo algo infeliz. O
termo Hipnose deriva de Hypnos, o Deus grego do Sono, o que é incorreto visto
Hipnose não se tratar de um estado de sono, mas sim de um monoideísmo, a fixação em
algo ou numa ideia. Infelizmente, Hipnose tinha-se tornado um termo muito popular,
quando Braid tentou a sua alteração.

A história da Hipnose leva-nos a outro momento importante, em Paris. Mais


concretamente no Hospital de La Salpêtrière. Reconvertido num hospital universitário,
este local teve a sua importância graças a um dos seus médicos mais emblemáticos,
Charcot.
Nascido a 1825, Jean-Martin Charcot foi um médico neurologista e professor de
patologia anatómica. De entre as suas conquistas, Charcot trabalhou, ensinou e foi
responsável por um departamento do Hospital de La Salpêtrière, durante 33 anos.
Considerado o fundador da neurologia moderna, o trabalho de Charcot foi muito
marcado pelas suas descobertas no campo da Hipnose e Histeria.

Para Charcot, a Histeria era uma patologia neurológica, à qual os pacientes já possuíam
uma predisposição genética, no seu sistema nervoso. No final da sua vida, Charcot
recuou com esta afirmação e concluiu que a Histeria era uma doença psicológica.

O interesse pelo Hipnotismo levou Charcot a afirmar que existia uma relação direta
entre a capacidade de alguém ser hipnotiza e responder neste estado e ser-se histérica.
Coloca-se a questão no feminino pois, nessa altura, a Histeria era apenas considerada
uma condição feminina.

Charcot organizava, regularmente, reuniões com outros médicos e estudantes, de modo


a apresentar as suas descobertas e realizar demonstrações de Hipnose, com as suas
doentes histéricas. O trabalho de Charcot culminou na popular Escola de Paris, um
grupo de médicos e investigadores, sediados em Paris, que acreditavam na existência do
chamado “Transe” e fenómenos de dissociação, na sua teoria de Hipnose. Também teria
impacto na próxima personagem desta história: Freud.

Sigmund Freud é um dos nomes mais reconhecidos no mundo, especialmente no campo


da Psicoterapia. Nascido a 1856, Freud foi um médico neurologista, cuja ideia de existir
algo inconsciente por detrás de patologias físicas iria revolucionar o mundo, em geral e
Psicoterapia, em particular.

Após ter concluído o seu curso de Medicina, Freud começou a interessar-se pelo
trabalho de Charcot. O seu interesse era tão grande que quis arranjar uma bolsa de
estudo para estar junto de Charcot. E conseguiu.

Foi nesse trabalho conjunto que Freud foi introduzido à Hipnose e às demonstrações de
Charcot. Freud ficou tão impressionado que, não só utilizava na sua prática médica,
como ainda traduziu as obras de Charcot em várias línguas.

Freud continuaria com Hipnose, até ao início da sua relação profissional com Josef
Breuer onde, juntos, iriam criar os fundamentos da Psicanálise. No entanto, Freud iria
considerar que a Hipnose não lhe permitia alcançar a profundidade ao inconsciente
como desejara. Assim, desenvolveu a Associação Livre de Ideias e Interpretação dos
Sonhos, como substitutos. Esta ação levou a que Hipnose entra-se na obscuridade,
durante muitos anos.

Charcot não foi o único autor de interesse para Freud. Durante a sua viagem pelo mundo
da Hipnose, Freud seguiu o trabalho de um senhor chamado Bernheim, cujo impacto foi
profundo ao ponto de dar o nome de Bernheim a um dos seus filhos.
Nascido em 1840, Hippolyte Bernheim foi um médico neurologista francês, cujo
contributo marcou profundamente o campo da Hipnose.

Com o grosso do seu trabalho em Nancy, Bernheim iria trabalhar com Ambrose-
Auguste Liébeault no conceito de sugestionabilidade hipnótica, dando assim génese à
Escola de Nancy, uma oposição à Escola de Paris de Charcot.

Para esta escola, Hipnose teria diferentes comportamentos de diferentes pessoas, de


sugestionabilidades diferentes. Ou seja, cada pessoa teria a sua própria capacidade de
responder às sugestões, no estado hipnótico e que algumas responderiam melhor do que
outras. O conceito de sugestionabilidade hipnótica tornou-se essencial, existindo até aos
dias de hoje e iniciou toda a possibilidade de investigação científica.

Como já referido, Hipnose entrou na era das trevas, após Freud ter renegado o seu uso.
Mais, os avanços na farmacologia faria com que as práticas anestésicas dependessem
principalmente da utilização de clorofórmio, algo que fez com que a anestesia hipnótica
fosse praticamente extinta.

Por razões que mais tarde vou referir, a existência da Hipnose manteu-se graças à
Hipnose de Entretenimento ou Palco, já que eram artistas que montavam espetáculos,
utilizando rotinas de Hipnose. A próxima vez que esta técnica seria recorrida foi na
altura das Grandes Guerras, principalmente na 2ª Guerra Mundial, quando as reservas
de clorofórmio tornaram-se escassas e Hipnose era utilizada como anestésico e
analgésico, juntamente com o tratamento de Perturbações de Stress Pós-Traumático.

Com o avanço da indústria e a ciência, entramos no que foi chamado de Revolução


Cognitiva. De uma forma geral, a Revolução Cognitiva surge com o avanço da ciência
informática e a construção de máquinas computorizadas. O processamento da
informação era dada sobre uma linguagem numérica (0 e 1), pelo operador, guardada
em sistemas de armazenamento de memória, para depois serem utilizadas em operações
específicas. A Psicologia veio absorver e adaptar este conceito, dando origem à
Psicologia Cognitiva.

A partir deste ponto, a investigação científica floresceu e Hipnose foi uma área que
apanhou essa valorização. Nesse sentido, não podemos afastar-nos daquela que é
considerada a “gold standard” das escalas de investigação em Hipnose: Stanford
Hypnotic Susceptibility Scales. Desenvolvidas na Universidade de Stanford por André
Weitzenhoffer e Ernest Hilgard, estas escalas medem a capacidade de uma pessoa
responder a sugestão, no estado hipnótico. Existem três formas, sendo aplicadas a nível
individual. São compostas por uma indução, sugestões que passam por respostas
ideomotoras, sensoriais e cognitivas. Após a realização da escala, é preenchido um
questionário sobre quais as sugestões que o sujeito conseguiu responder, ou não. O
resultado final colocaria o sujeito em três categorias: não sugestionáveis (nesta
categoria, a pessoa pode ser hipnotizada, mas responde a muito poucas sugestões,
nomeadamente ideomotoras); mediamente sugestionáveis (nesta categoria, a pessoa é
hipnotizada e responde a muitas sugestões, incluindo ideomotoras e sensoriais, mas não
responde a fenómenos mais complexos); altamente sugestionáveis (Hilgard denominava
esta categoria como “virtuosos”. Nesta categoria, a pessoa é hipnotizada e responde a
todos as sugestões e fenómenos hipnóticos, com relativa facilidade). Existem mais
escalas e formas de medida de sugestão hipnótica mas, para âmbito de referência, deixo
apenas a Harvard Group Scale, uma adaptação validada das escalas de Stanford, para
aplicação em grupos.

O mundo da Hipnose iria sofrer uma enorme revolução, entrando no séc. XX, pelas
mãos do psiquiatra norte-americano Milton H. Erickson.

Nascido em 1901, Milton Erickson veio de uma família humilde, de trabalhadores de


campo. Erickson sofria de pólio, também conhecida como paralisia infantil, o que fez
com que quase morresse, enquanto criança. Embora tenha sobrevivido, ao contrário do
que os médicos acreditavam, Erickson sofreu várias sequelas físicas, muitas delas
vieram a deteriorar-se, perto da sua morte. Por mais dolorosas que fossem, Erickson
serviu-se delas como inspiração para a sua filosofia de terapia.

Enquanto concluía o seu curso em Medicina, com especialização em Psiquiatria,


Erickson teve aulas com Clark Hull, um dos mais conhecidos investigadores em
Hipnose. Hull possuía uma abordagem tradicional e direta, um tanto autoritária, com
enfâse na sugestionabilidade hipnótica, algo que Erickson não considerava adequado.
Propondo-se a fazer melhor, Erickson desenvolveu o seu próprio estilo, trabalhando
com sujeitos que Hull não conseguiu hipnotizar. Os resultados foram tão notáveis que
Erickson começou a construir a sua reputação, enquanto terapeuta que conseguiu
resolver os casos que ninguém conseguia solucionar.

No decurso da sua vida, Erickson foi diretor de vários hospitais psiquiátricos


americanos, até se mudar para Phoenix, no Arizona, por motivos de saúde. Aí, dedicou-
se à prática privada e ao ensino, num formato único. Estudantes iriam visitá-lo e
conviver com ele, enquanto ele partilhava as suas histórias clinicas, as suas perspetivas
sobre Hipnose e Psicoterapia e demonstrava os seus métodos.

O legado de Milton Erickson ainda continua vivo tanto em livros sobre a sua vida e os
seus métodos, como vídeos, demonstrações clínicas e dos seus alunos. Em especial,
Jeffrey Zeig reuniu esse legado na figura da Fundação Milton H. Erickson, cujo
objetivos passam por reunir, preservar e divulgar os métodos de Erickson e a sua vida.
A Fundação aprova e acredita centenas de Institutos, espalhados por vários países, que
continuam o trabalho de divulgação e ensino da Abordagem Ericksoniana à Hipnose e
Psicoterapia.

Embora Erickson tenha revolucionado Hipnose, com uma abordagem diferente, a


Hipnose clássica ou tradicional continuaria a evoluir, muito pelo trabalho de um homem
chamado Dave Elman.

Nascido a 1900, Dave Elman foi introduzido ao mundo da Hipnose desde criança, pelo
mundo do espetáculo. Elman percebeu do enorme potencial da Hipnose quando o seu
pai, diagnosticado com cancro em fase terminal, recorreu à Hipnose para gerir a sua dor
e desconforto. Como resultado, Elman conseguiu usufruir de muitos momentos de
qualidade com o seu pai, antes de este falecer.

Elman dedicou-se a realizar e elaborar espetáculos de palco com Hipnose, até conseguir
um programa de rádio, onde apresentaria várias pessoas de várias áreas de interesse.
Numa dessas ocasiões, Elman trouxe um hipnotista para o seu programa onde
rapidamente percebeu que não só percebia mais sobre Hipnose, mas também conseguia
hipnotizar pessoas, com mais sucesso.

Percebendo a importância e procura pela formação, Elman iria dedicar a sua vida à
formação, nomeadamente da comunidade médica. A sua perspetiva era que Hipnose
seria uma ferramenta inestimável para Medicina, tanto geral, cirúrgica ou dentária e que
um médico teria de ser capaz de induzir uma pessoa rapidamente e profundamente, visto
o tempo das consultas ser escasso.

Embora os métodos de Elman possam ser bastante diretos e autoritários, a sua


perspetiva e métodos são muito populares, nos dias de hoje, sendo ainda ensinados com
bastante sucesso.

AS TEORIAS DE HIPNOSE
Ao longo da história da Hipnose, por mais breve que tenha sido este resumo, o conceito
e o método foi sendo alterado, ao longo do tempo. Esta alteração deve-se às diferentes
especialidades envolvidas, a evolução dos métodos de investigação científica e a
perspetiva que muitos teóricos tinham, face à Hipnose.

Não sendo uma forma terapêutica, Hipnose tem um conjunto de teorias explicativas
sobre o seu funcionamento. Historicamente, estas teorias foram agrupadas em dois
grandes grupos: as Teorias do Estado e Teorias do Não Estado.

Vamos começar pelas primeiras. As Teorias do Estado são as principais teorias da


Escola de Paris, de Charcot. Segundo esta teoria, Hipnose existe enquanto um estado a
alcançar, por via do “transe”.

Apesar da popularidade do termo, o conceito de “transe” ainda não conseguiu ser


comprovado, cientificamente. Neste sentido, o estado de “transe” funciona como um
veículo que leva a pessoa, de um estado de consciência, até ao estado hipnótico.
Pressupõe, também, a noção de profundidade, ou seja, existem “transes” leves e
“transes” profundos. Estes últimos estão associados a estados de sono artificial e o
sonambulismo, como visto no Mesmerismo e retomado, mais à frente, por Elman.

Milton Erickson referia muito o “transe do dia-a-dia”. Para Erickson, todos as pessoas
passam por fenómenos hipnóticos todos os dias, ao longo da sua vida. Situações em que
distorcemos a tempo, regredimos a memórias de situações passadas, não vê-mos
determinados objetos que estão à nossa frente, ou mesmo pensamos estar a ver objetos
que não se encontram no nosso campo de visão. Na perspetiva ericksoniana, o terapeuta
deve reconhecer esses estados e utilizá-los, de forma a ajudar a pessoa terapeuticamente.

As Teorias do Não Estado adotam uma posição totalmente diferente. Defendidas pela
Escola de Nancy de Bernheim, estas teorias propõem que o “transe” não existe, assim
como o estado. Hipnose é atingida via sugestão e por determinadas variáveis, como a
expectativa de resposta que o cliente tem, o papel da autoridade do terapeuta,
condicionamentos clássicos, etc. Nesse sentido, Hipnose não é tida em termos de
profundidade, mas sim na capacidade de resposta do sujeito, a sugestão, durante o
processo de Hipnose. É esta perspetiva que é utilizada na investigação científica dos
fenómenos hipnóticos.

Quer aceitemos uma das teorias ou ambas, o que sabemos é que a definição de um
contexto como hipnótico aumenta a potência das intervenções, as variáveis
sociocognitivas devem ser tidas em atenção, a utilização da palavra Hipnose parece
aumentar a expectativa da pessoa e, finalmente, Hipnose pode trazer resultados,
independentemente do nível de profundidade em que a pessoa possa-se encontrar.

ESTILOS DE HIPNOSE
Quando se faz uma pesquisa pelos vários cursos de Hipnose que existem no mercado,
podemos encontrar uma panóplia de diferentes nomes. Desde Hipnose Terapêutica,
Hipnose Sistêmica, Hipnose Condicionativa, Hipnose Conversacional… Acho que já
fica a perceber a ideia!

O que é um facto é que todas estas designações não passam de estratégias de marketing,
construídas para atraírem o maior número de pessoas possível. Em termos técnicos, só
existem dois estilos de Hipnose: Hipnose Tradicional e Hipnose Ericksoniana. Vejamos
então cada um destes estilos.

Hipnose Clássica

Este estilo de Hipnose é a génese de toda esta técnica, inspirada pelos trabalhos de
James Braid. Podemos caracterizá-lo como um estilo direto e autoritário, onde as
sugestões são dadas de forma direta e o terapeuta assume uma postura mais superior.
Um exemplo seria “Feche os seus olhos agora!” ou então “Irei contar de 10 até 1.
Quando chegar ao número 1, entrará no estado de Hipnose”. Como se pode ver, é uma
forma de distribuir sugestões que não dá muita hipótese de escolha e que pode, para
determinados tipos de pessoas, originar uma guerra de vontades, onde o cliente se possa
sentir desafiado ou mesmo incomodado pela autoridade do terapeuta e, simplesmente,
não seguir a sugestão dada.

Para além da linguagem direta e autoritária, Hipnose Clássica é um estilo onde existe
uma clara estrutura do processo, por fases. Temos portanto:

 Pre-talk – Nesta fase, o terapeuta encontra-se já no final da entrevista de recolha


de dados. Destina-se à explicação do que é Hipnose e abordar possíveis mitos e
barreiras que possam comprometer o processo. Ao mesmo tempo, o terapeuta
pode lançar sugestões pré-hipnóticas, sugestões dadas antes do sujeito entrar no
estado de Hipnose, de modo a aumentar a expectativa de resposta e eficácia do
processo;
 Indução Hipnótica – Processo pelo qual guiamos o cliente do estado de vigília,
para o estado de Hipnose. Existem, virtualmente, centenas de induções
hipnóticas e, quando a pessoa percebe os princípios que fazem com que as
induções funcionam, pode criar as suas e adaptá-las ao cliente e contexto onde se
encontra. As induções servem alguns propósitos, permitem a entrada no estado
de Hipnose, aumentam a colaboração do cliente, aumentam a sua capacidade de
resposta a sugestões e fortalecem a relação terapêutica;
 Aprofundamento – Se a indução hipnótica já coloca o cliente no estado de
Hipnose, este procedimento vai aprofundar o estado. Não nos podemos esquecer
que o estilo clássico releva a noção de profundidade hipnótica e que a maior
parte do trabalho terapêutico é realizado a alta profundidade (Nota: esta ideia já
foi desmitificada pela investigação que aponta que, seja em que profundidade a
pessoa estiver, pode ser realizado todo o trabalho terapêutico necessário).
Alguns exemplos de aprofundamentos podem ser por contagem ou mecanismos
que indiquem uma descida, como escadas ou elevador. “Dentro de momentos,
irei fazer uma contagem de 10 a 1. A cada número que conte, quero que se sinta
a entrar cada vez mais no estado de Hipnose. E quando chegar ao número 1, irá
estar profundamente hipnotizado, sentindo-se totalmente confortável e em paz
consigo mesmo”;
 Fase Terapêutica – Como o nome indica, é nesta fase que o terapeuta começa a
elaborar as sugestões necessárias, para intervir na queixa do cliente. Os temas
variam, de pessoa para pessoa e devem ser apurados numa entrevista prévia. É
importante que o terapeuta tenha claro os objetivos que deve atingir, de modo a
melhor direcionar a sua comunicação. Esses objetivos devem ser conseguidos
em colaboração com o cliente, de modo a que a mudança faça sentido e que ele
possa seguir os passos necessários para consegui-la;
 Emergir o Cliente – Esta é a parte do processo em que o terapeuta guia o cliente,
de novo, ao estado de vigília. O terapeuta deve dar sugestões de bem-estar,
segurança e confiança. O terapeuta pode e deve usar um tipo específico de
sugestões, sugestões pós-hipnóticas. Como o nome indica, este é um tipo de
sugestão que pretende implementar comportamentos que queremos que sejam
executados, após o cliente sair do estado de Hipnose. Isso pode ser feito por
associação de um som específico, uma pista visual ou um toque particular.
Finalmente, o terapeuta deve emergir o cliente usando o mesmo racional que
usou na indução. Ou seja, se durante a indução o terapeuta usou uma contagem
regressiva, deverá usar uma contagem progressiva. O mesmo aplica-se para um
descer de um elevador ou escadas;
 Obter Feedback – O primeiro aspeto a reter é que o cliente, neste momento,
ainda se encontra altamente sugestionável. Apesar de já ter retomado o estado de
vigília, ainda existe uma parte da consciência do cliente que se encontra a
organizar tudo o que se passou, durante o processo hipnótico. Desta forma, o
terapeuta terá de ter em atenção no que diz ao cliente. Por outro lado, este é o
momento em que as sugestões dadas devem ser reforçadas, assim como a
instalação de qualquer sugestão pós-hipnótica. É, também, o momento para ser
realizado um resumo do que se passou, atribuir o significado indicado para a
experiência e planear aspetos da próxima sessão.

Hipnose Ericksoniana

Vulgarmente referida como Hipnose Ericksoniana, este estilo integra as Abordagens


Ericksonianas à Hipnose e Psicoterapia. Como o nome sugere, esta abordagem foi
concebida por Milton H. Erickson, um dos maiores nomes da Hipnose, como vimos
no resumo da História da Hipnose.

A intenção de Erickson foi retirar os aspetos positivos da Hipnose Clássica e


transformar em algo que pudesse ser personalizado, para cada pessoa que surgisse.
Não só a forma como Erickson pensava a Psicoterapia mas, também, as suas
próprias limitações viriam a ajudar o desenvolvimento de novas técnicas.

Em primeiro lugar, Erickson respeitava a individualidade de cada um. Apesar de


poder ser bastante direto, Erickson percebeu que comandos dados de forma a dar
uma possibilidade de escolha ao cliente seriam mais eficazes. Desta forma, o estilo
ericksoniano possui muita linguagem indireta e permissiva, em que a pessoa sente
ter uma possibilidade de como experienciar o processo. Muita desta comunicação é
feita através de histórias e metáforas que, parecendo não se dirigir à pessoa,
adequasse à queixa do cliente. Erickson acreditava que a pessoa tem todos os
recursos necessários para resolver qualquer barreira ou obstáculo. Assim, muitas
sugestões são vagas ou possuem várias hipóteses de escolha, confiando que a mente
do cliente possa preencher os detalhes daquela que será a melhor forma de visar
essas barreiras e atingir os objetivos propostos.

Em segundo lugar, Erickson olhava para a Psicoterapia de uma forma estratégica.


Ou seja, de que forma iria conduzir o cliente até ao objetivo pretendido, de uma
forma personalizada e mais breve possível. Daqui que um dos conceitos chave seja a
utilização. Erickson referia-se à utilização como integrar características únicas do
sujeito, ao longo de todo o processo. Isso inclui linguagem, a forma como o sujeito
vê o mundo, comportamentos observáveis, aspetos da sua história pessoal, etc.
Outro conceito importante é chamado de “seeding”, onde o terapeuta começa a
implementar uma ideia que pretende recuperar mais à frente, no processo
terapêutico. Por exemplo, se o terapeuta decide recorrer a uma regressão de idade,
então este começa a implementar pistas de regressão, já na indução, para serem
recuperadas mais á frente. Finalmente temos o “tailoring”, a noção da terapia ser
feita à medida de cada cliente. O terapeuta ericksoniano não possui nem utiliza
guiões estruturados, ele adequa cada intervenção às características e necessidades de
cada cliente que lhe surja. Daí que não existe dois processos idênticos, pois não
existem dois clientes idênticos.

Em terceiro lugar, Erickson não sistematizou a sua abordagem, a sua forma de


ensinar era realizar terapia e demonstrações, com os seus alunos. Desta forma,
Hipnose Ericksoniana não tem uma estruturação tão definida como a Hipnose
Clássica. Jeffrey Zeig, psicólogo e psicoterapeuta americano, um dos alunos de
Erickson e Diretor da Fundação Milton H. Erickson esquematizou uma forma de
induzir alguém em Hipnose, numa visão ericksonina. Conhecido como o Modelo
ARE, este é o atual modelo que a Fundação utiliza, na sua formação. ARE significa
Absorver, Ratificar, Elicitar. Neste modelo, o terapeuta ericksoniano começa por
Absorver o cliente na experiência de Hipnose. Numa segunda fase, o terapeuta
Ratifica o estado de Hipnose, através de comportamentos observáveis que são
referidos ao cliente, como estando em Hipnose. Finalmente, o terapeuta Elicita
recursos no cliente, fazendo uso de fenómenos hipnóticos específicos, indicados
para a queixa do cliente e para o percurso que o terapeuta ericksoniano deseja dirigir
a sessão.

Hoje em dia, a investigação demonstrou que tanto a sugestão direta, como indireta, é
igualmente eficaz, no processo terapêutico. Cabe ao terapeuta decidir qual a melhor
altura de utilizar um ou outra, partindo do pressuposto que tenha formação para usar
metodologias ericksonianas. Numa visão ericksoniana, quanto maior for a
resistência do cliente, maior a necessidade de se ser indireto. Por outro lado, existem
alturas em que ser-se demasiado indireto pode ser frustrante para o cliente, por isso,
como em tudo, há que haver conta, peso e medida nas intervenções.

Não sendo o objeto deste livro, acho que é importante referir no contributo da PNL.
Programação Neurolinguística, criada por Richard Bandler, John Grinder e Frank
Pucelik, é uma metodologia que pretende promover a excelência da comunicação e
desenvolvimento humano. Este método tem como base a modelagem das técnicas
eficazes de Virgínia Satir, Fritz Perls e Milton Erickson. Ao longo dos anos, Bandler
e Grinder escreveram muitos livros sobre Hipnose, nomeadamente na exploração
linguística de Erickson. São uma ótima fonte para todos os que desejem
compreender os padrões linguísticos ericksonianos.

ÁREAS ONDE HIPNOSE É APLICADA


Ora então, se só existem dois estilos de Hipnose, de que forma é que Hipnose pode
ser então aplicada? Existem várias áreas onde Hipnose pode ser usada.

A mais comum é a área clínica. Hipnose, como vimos, é uma ferramenta terapêutica
que aumenta a eficácia das intervenções terapêuticas mais formais. Assim, qualquer
Psicoterapeuta pode, tendo formação adequada, incorporar Hipnose na sua prática
clínica, para abordar temáticas como depressão, ansiedade, perturbações do sono,
mudança de comportamentos (deixar de fumar, por exemplo), algumas perturbações
alimentares, perturbações psicossomáticas, etc. Cada vez mais, a investigação tem
tentado validar a eficácia de Hipnose para o maior número de perturbações
possíveis.

A área médica também tem sido bastante explorada, especialmente na utilização de


Hipnose na anestesia e analgesia, fazendo com que ajude em intervenções
cirúrgicas. Existem mesmo operações que têm disso realizadas sem anestesia
química e até partos naturais. Em situações de emergência, enfermeiros têm usado
Hipnose para controlo de sintomas e regulação do estado emocional do paciente,
assim como ajuda na reabilitação física. Finalmente, a intervenção mais validada da
Hipnose tem sido na área da dor, tanto aguda como crónica. Hipnose é tão eficaz
que as diretrizes portuguesas da Direção Geral de Saúde sugerem a sua utilizam, na
intervenção da dor crónica, como estratégia não farmacológica.

A área educacional tem sido menos explorada mas, Hipnose pode auxiliar algumas
estratégias para o aumento de atenção, concentração, melhorar metodologias de
estudo e de memória e regular estados de ansiedade de desempenho escolares e
académicos.

Na área desportiva, Hipnose tem sido usada no auxílio de recuperação de lesões,


aumento da atenção, concentração, ajuda no estabelecimento de objetivos e aumento
do desempenho e resultados, também conhecido como “performance”.

Na área empresarial e comercial, Hipnose tem sido usada dentro da PNL, onde são
usados os padrões de comunicação hipnótica para aumentar as vendas, a capacidade
de liderança e persuasão. Para evitar confusões, persuadir alguém é fazer com que a
pessoa escolha o que propomos, de uma forma que não prejudique a outra pessoa e
que se mantenha dentro de uma forma ética. O contrário seria manipulação.

MITOS RELACIONADOS COM HIPNOSE


Nesta altura, você poderá estar a perguntar: “Mas Pedro, se Hipnose é tão boa como
diz, então porque demorou tanto tempo a ser conhecida? E porque é que nem todos a
utilizam?”. Boas perguntas!

A natureza da Hipnose exclama mistério, o que faz com que afaste muitos e esteja
associado a elementos místicos, sobrenaturais e do oculto.

Ao longo dos anos, Hipnose tem sido retratada e associada a situações de controlo
mental, magia, espetáculo, etc. Comunicação social, romances, cinema, séries, todos
esses canais têm ajudado para a criação de mitos que são desenvolvidos e
distribuídos pela sociedade. Embora a ciência tenha derrubado muitas dessas
afirmações, tem sido mais fácil distribuir os mitos do que a informação correta.
Aqui ficam alguns dos mais comuns mitos, sobre Hipnose.
É necessário estar em transe para poder ser hipnotizado

Como vimos na seção das teorias da Hipnose, nem todas as teorias aceitam a noção
do transe e a ciência não encontrou forma de validar a sua existência, ou não. O que
é um facto é que se a atenção for focada numa ideia, som, objeto ou sensação, se o
terapeuta dissociar a realidade da experiência da pessoa, então conseguimos
hipnotizar alguém.

Hipnose é estado provocado pelo hipnotizador e o sujeito assume uma posição


passiva

Romances literários e cinema têm passado a imagem de um hipnotizador todo-


poderoso que coloca uma pobre pessoa sobre a influência de Hipnose. Embora
possamos passar por fenómenos hipnóticos, ao longo da nossa vida, o processo
formal de Hipnose é um processo colaborativo. A pessoa tem de aceitar ser
hipnotizada e decidir seguir as sugestões do terapeuta, o que implica um processo
ativo. Isto é válido não só para o início como todo o processo de terapia, onde
Hipnose seja utilizada.

Durante o estado de Hipnose, o hipnotizador possui todo o controlo mental sobre o


sujeito

Este é um dos medos e mitos mais populares face à Hipnose, o mito do controlo
mental. Também este tem sido popularizado pela literatura e cinema, especialmente
com os casos de conspiração de assassinatos, como o de JFK, onde se suspeita que o
atirador tenha sido “programado”, com Hipnose. Este mito não é verdade, tendo
como base o ponto anterior. Hipnose é um processo colaborativo e não de
submissão de um cliente passivo, face a um hipnotizador. O que é um facto é que a
pessoa hipnotizada possui muito mais controlo e atividade mental, do que em muitas
situações. Portanto, Hipnose é uma técnica de autocontrolo. Por outro lado, uma das
bases da pessoa são as suas crenças e valores, os alicerces que constituem a tomada
de decisão sobre ações, o bem e o mal. Assim como a pessoa tem as suas crenças e
valores, num estado de vigília, também terá em Hipnose. Se existe algo que você
não queira fazer ou aceitar, antes de Hipnose, não o irá fazer durante o estado de
Hipnose. Este é um assunto muito estudado e validado pela investigação, apesar de
haver muitas disputas, alegando que será possível. Nesse caso, não estamos apenas a
falar de Hipnose, mas sim de técnicas manipulativas.

Sob Hipnose, o sujeito releva todos os seus segredos mais profundos

O mito da Hipnose, como a máquina da verdade. Isso simplesmente não é verdade.


Como vimos no ponto anterior, a pessoa retêm todo o controlo sobre si, no estado de
Hipnose. Isso implica a escolha de querer comunicar e o que quer comunicar. Se o
sujeito não desejar dar algo pessoal, como o seu código de cartão de multibanco por
exemplo, ao hipnotizador no seu estado de vigília, também não o irá dar no estado
de Hipnose. A pessoa tem todo o poder para responder apenas ao que quiser!
A pessoa pode ficar presa no estado de Hipnose

Se virmos Hipnose como um estado de atenção focada, podemos pensar que a


pessoa está bem ciente do que se passa ao seu redor, escolheu apenas estar focada
em algo que o hipnotizador sugere. Isso significa que se o hipnotizador deixar de
guiar a pessoa, der alguma sugestão que o cliente não aceite ou, simplesmente
deixar de falar com a pessoa, sem sugerir nada em contrário, a pessoa vai emergindo
até ao estado de vigília e abrir os olhos. Pode haver circunstâncias em que a pessoa
possa adormecer, mas isso deve-se ao intenso relaxamento físico e mental que pode
ser atingido.

Só as pessoas mais crédulas, mais frágeis ou mais ignorantes é que podem


experimentar Hipnose

Como vimos anteriormente, Hipnose implica o estabelecimento de uma relação


colaborativa. Seguindo este pressuposto, qualquer pessoa que queira estar nesta
relação pode ser hipnotizada. Inteligência ou QI não é um fator que causa
interferência no processo, tal como a investigação tem mostrado.

Sob Hipnose, é possível recuperar memórias escondidas

Este é mais um dos principais mitos, muito relacionados com o cinema e as recentes
ofertas de regressões a vidas passadas. Para podermos compreender este mito, temos
de falar um pouco sobre memória. Desde que as nossas estruturas neuronais se
encontram totalmente formadas, o ser humano tem a capacidade para processar e
armazenar acontecimentos. Esses acontecimentos podem ser guardados a longo
prazo, curto prazo ou apenas por uma questão de trabalho. De uma forma simples,
estes são os três tipos de memória que possuímos. Contudo, esta memória pode ser
alterada, ao longo de tempo e até mesmo vai desaparecendo, ao longo do tempo
(uma das principais características das demências é a progressiva deterioração da
memória). Da mesma forma que a estrutura da memória vai-se alterando, é possível
a implementação de cenários que nunca existiram, mas que a pessoa convence-se
que existiram. Este fenómeno é conhecido como as “falsas memórias”. Não só
existe ampla investigação sobre este fenómeno, como existem métodos para a
implementação, mesmo sem Hipnose. Técnicas de interrogatório, determinados
tipos de entrevista e a exaustão mental e física podem ser usadas para convencer a
pessoa que determinado acontecimento foi vivido pela própria, sem nunca ter-se
passado. Hipnose coloca a pessoa num estado mais sugestionável, o que faz com
que este processo ainda seja mais fácil do que outras técnicas, já que a pessoa se
encontra a experienciar todas as sugestões dadas, a nível cognitivo, emocional e
comportamental. Em suma, só podemos voltar a vivenciar acontecimentos pelos
quais passámos, até certo nível.
Hipnoterapia não exige qualquer esforço e só os sujeitos mais sugestionáveis
podem beneficiar desta terapia

Vamos examinar cada parte deste mito. Em primeiro lugar, Hipnoterapia é um termo
que foi tornado popular, desde os anos 60, indicando Hipnose como uma forma
terapêutica. Hipnose não é uma terapia, já que esta não explica a formação da
personalidade e a dinâmica de funcionamento psicológico. Hipnose é sim uma
técnica experiencial, tal como visualização guiada, focagem, técnica da cadeira
vazia ou técnica das duas cadeiras. O que isto significa é que Hipnose pode ser
usada, como coadjuvante de psicoterapias formais, como Psicanálise ou Terapia
Cognitivo-Comportamental. De forma a tentar chegar a um consenso, a Divisão 30
da APA define Hipnoterapia como terapia com utilização de Hipnose. Nesse
contexto, o psiquiatra e investigador americano Martin Orne sugeriu algo que se
tornou numa “regra de ouro” para a utilização de Hipnose: “Se um profissional não
é qualificado para tratar algo (uma determinada situação clínica) sem Hipnose,
então ele não é qualificado para a tratar (essa situação clínica) com Hipnose.
Primeiramente procura-se a certificação profissional (médico, dentista,
psicólogo clínico, etc.). Depois procura-se a certificação em Hipnose.”. A
passividade do sujeito já foi abordada noutros mitos. Como com qualquer outra
técnica terapêutica, se o sujeito não se envolver ativamente no processo, qualquer
sugestão ou fenómeno hipnótico usado, não irá garantir mudanças a longo prazo.
Finalmente, relativamente à sugestionabilidade, a investigação tem demonstrado que
todas as pessoas podem beneficiar de Hipnose, independentemente do seu nível de
sugestionabilidade hipnótica.

Esta lista não é exclusiva nem fechada, podem ser encontrados muitos mais, em
várias obras sobre Hipnose. Estes são apenas os mitos mais comuns de serem
encontrados. Porque é que estes mitos são formados?

Simples. Primeiro, a própria natureza da Hipnose exclama misticismo e esoterismo.

Segundo, a própria cultura assim tem retratado Hipnose.

Na literatura, temos o exemplo do romance de George du Maurier, de 1894,


“Trilby”, onde somos apresentados a uma das figuras mais populares de Hipnose,
Svengali. Este romance relata a experiência de uma bela jovem que sofria de
grandes dores e enxaquecas, chamada Trilby. Como último recurso, recorreu a um
maestro chamado Svengali, uma figura de ar ameaçador, que tinha conhecimentos
de Hipnose. Ao hipnotizar Trilby, Svengali percebeu que ela conseguia cantar de
forma magnífica o que, juntamente com a beleza de Trilby fez com que Svengali
começa-se a apaixonar-se por ela. Mas Trilby estava com outra pessoa e não gostava
de Svengali, o que fazia com que este tentasse dominar a sua mente, com Hipnose.
Esta é uma história que não teve um final feliz, mas não vou revelar para que possa
ler o romance. Escusado será dizer que Hipnose tornou-se associada à figura de
Svengali e de controlo mental.
No cinema, temos vários exemplos de Hipnose a ser usada como técnica de controlo
mental e recuperação de memórias escondidas. Filmes como o “Manchurian
Candidate”, “The Curse of the Jade Scorpion” ou “Get Out” retratam Hipnose como
uma técnica de controlo mental, onde as pessoas são programadas para executar
determinados comandos, contra a sua vontade e sem recordação de o fazerem. Por
outro lado, filmes como “Regression”, retratam Hipnose como algo que procura e
recupera memórias escondidas de situações traumáticas, desta e de outras vidas.

Na área de entretenimento, Hipnose tem sido usada em espetáculos de palco e


atuações de rua. Apesar do seu propósito de entreter e não fazer terapia, é passada a
imagem de que o hipnotizador possui todo o controlo sobre as pessoas, que pode
fazer com que elas façam tudo o que quiser, sem que elas possam recusar e pode
também passar a ideia do hipnotizador ter poderes mágicos ou sobrenaturais.

Terceiro, os próprios técnicos têm renegado o papel da Hipnose.

Esta é a parte em que tenho de me insurgir contra a minha própria profissão e outras,
no contexto da saúde. Historicamente, Hipnose sempre pertenceu ao campo da
ciência e de profissões de saúde, como a Medicina, Psiquiatria e Psicologia.
Contudo, o campo da ciência deixou-se influenciar pelas crenças e atitudes das
diversas épocas que se viviam, não conseguir acompanhar o desenvolvimento das
Revoluções Industriais e fármacos como clorofórmio e outros anestésicos, algumas
das suas personagens mais célebres renegaram Hipnose em função de outras
técnicas (Sigmund Freud, um dos pais da Psicanálise, foi um dos responsáveis por
renegar a Hipnose, na saúde mental) e, não menos importante, o desconhecimento
teórico e histórico de Hipnose, por parte dos vários técnicos de saúde. É certo que
países como os Estados Unidos, Inglaterra, Espanha, Austrália, etc., encontram-se
muito mais evoluídos e sensibilizados do que Portugal, embora deva dizer que já
existe um sólido corpo de investigação realizada em Portugal, por investigadores e
terapeutas portugueses.

A LINGUAGEM DA HIPNOSE
Todas as terapias e técnicas têm a sua própria linguagem. Hipnose não é exceção.

A linguagem, por excelência, da Hipnose é a linguagem da sugestão. Esta


linguagem não é exclusiva da Hipnose. De facto, a Psicoterapia usa uma variação da
linguagem da sugestão, adequada a determinada teoria psicológica. Contudo, a
forma como as sugestões são dadas, em Hipnose, diferem da forma tradicional em
dois aspetos principais:

 Contexto do estado hipnótico – investigação sugere que a pessoa, num estado de


vigília, pode responder a sugestões dadas. Contudo, a utilização de técnicas de
imagiologia mostra que, para cada sugestão, existe mais atividade cerebral no
estado hipnótico vs. no estado de vigília. Estas informações parecem sugerir que
o estado hipnótico amplifica, de alguma forma, a eficácia das sugestões;
 Estrutura linguística das sugestões – uma das principais diferenças entre uma
sugestão normal e uma sugestão hipnótica está na forma como esta última é
formulada, linguisticamente. Mesmo dentro das sugestões hipnóticas, existem
largas diferenças entre a forma clássica e a forma ericksoniana.

Não sendo o meu objetivo entrar em grandes pormenores técnicos, darei exemplos de
sugestões diretas e ericksonianas:

 Sugestão direta – “Dentro de momentos, irei fazer uma contagem de 10 a 1. A


cada número que contar, você irá entrar ainda mais no estado de Hipnose… A
cada número, duplicando o seu nível de conforto… de relaxamento… de
tranquilidade… sentindo-se cada vez mais… e mais… hipnotizado…”
 Sugestão ericksoniana – “À medida que se encontra sentando, poderá aproveitar
este tempo para se permitir a absorver todas as sensações… sentindo as suas
costas apoiadas na cadeira… os seus pés assentes no chão… as suas mãos
repousadas nas suas pernas… e essas sensações permitem que se senti cada
vez… mais confortável… mais tranquilo… abrindo-se à experiencia de
Hipnose…”

Para além destes dois exemplos de sugestões, temos ainda mais algumas categorias.
Estas são:

 Sugestões ideomotoras – Esta categoria de sugestões diz respeito àquelas que


pressupõem movimentos automáticos de partes corporais como, por exemplo, a
levitação do braço;
 Sugestões cognitivas – Esta categoria de sugestões diz respeito àquelas que
pressupõem a alteração da perceção ou de funções cognitivas como, por
exemplo, alucinações, amnésia, etc.;
 Sugestões de desafio – Esta categoria de sugestões diz respeito àquelas que
desafiam o individuo a realizar ou inibir determinados comportamentos como,
por exemplo, desafiar o individuo a dobrar o seu braço, estando este
completamente rijo e indobrável;
 Sugestões pré-hipnóticas – Esta categoria de sugestões diz respeito ao terapeuta
começar a lançar sugestões hipnóticas, antes do cliente encontrar-se no estado
hipnótico. Para além de serem sugestões que o terapeuta pode voltar a recuperar,
durante o processo, também podem usadas para aumentar a expectativa do
cliente. “Em qualquer altura, você poderá ajustar a sua postura. Isso não o vai
perturbar… De facto, até o pode ajudar a focar-se mais na experiência de
Hipnose”;
 Sugestões pós-hipnóticas – Esta categoria de sugestões diz respeito a todas as
ideias, emoções ou comportamentos que desejamos que o cliente experiencie e
executa, após o processo hipnótico estar concluído. Estas sugestões podem ser
ideomotoras, cognitivas ou de desafio, sendo aplicadas consoante o objetivo de
cada cliente e intervenção terapêutica.
OS FENÓMENOS HIPNÓTICOS
Vou voltar um pouco atrás, a Milton Erickson e na sua forma de conceber transe
hipnótico. Erickson referia-se ao “transe do dia-a-dia”, a experiências diárias que
tenham a possibilidade de desviar a pessoa, de um estado de vigília, para um estado de
atenção focada. É quase como se todos nós já tivemos sido hipnotizados, mas nunca
demos por isso. Acha difícil? Então tente rever-se nalguns dos próximos exemplos.

Você decide fazer uma viagem longa, uma que faça com que atravesse o país.
Naturalmente pode escolher a autoestrada como um caminho mais cómodo. A partir de
um determinado número de quilómetros, você começa a “entrar em modo automático”,
onde só vê a autoestrada e os carros que nela andam. O tempo parece dilatar-se de uma
forma invulgar e, quando dá por isso, fica confuso por perceber que já chegou a uma
determinada parte do percurso e nem se deu conta como. Se isto já lhe aconteceu, é um
fenómeno descrito como “highway hypnosis”.

Você vai ao cinema, após decidir que um filme que gostaria de assistir se encontra em
exibição. Ao entrar na sala e as luzes se apagarem, a sua atenção volta-se para o ecrã. Se
o filme for mesmo bom (às vezes apanhamos grandes banhadas!), a sua atenção
encontra-se completamente focada na história. E, apesar de saber que tudo aquilo que vê
não é real, é apenas uma história, você começa-se a envolver nela e nas emoções que
esta desperta em você. Pode rir, pode chorar, pode ter medo ou pode sentir-se zangado.
E o mundo exterior parece desaparecer, em seu redor.

Você decide ler um livro, aquele autor que você tanto aprecia. O enredo é tão bom que,
rapidamente, todo o foco da sua atenção se centra naquele livro. Envolve-se tanto na
história que é como se fosse difícil colocar o livro de lado. Nem os ruídos e sons do
local onde está o incomodam. E quando finalmente decide fechar o livro, repara que o
tempo passou e você nem notou na forma como isso aconteceu.

Se isto ou experiências semelhantes lhe aconteceram, então parabéns! Esteve


hipnotizado!

Estes fenómenos acontecem de forma natural, tanto como procurar os óculos e reparar
que os tem na cabeça, ou tentar encontrar as chaves elas estarem mesmo à sua frente.
São hipnóticos, pela sua natureza. O trabalho do terapeuta é criar condições para que
eles ocorram e utilizá-los com propósito terapêutico. Temos assim:

 Distorção temporal – Nesta categoria, o terapeuta utiliza o conceito de tempo e


orientação do cliente neste. Assim, o cliente pode regredir, acedendo a situações
pelas quais já passou ou progredir, acedendo a possibilidades de um futuro
possível, algo com que se possa ver a construir e ser bem-sucedido;
 Catalepsia – Este é um fenómeno onde o cliente pode tornar os seus músculos
rígidos ou extraordinariamente relaxados, de uma forma quase involuntária. Esse
fenómeno é caracterizado por se manter durante muito tempo e não causar
qualquer desconforto ao cliente;
 Amnésia – Como o nome indica, este é um fenómeno que coloca uma barreira
que impede o cliente de aceder a determinada informação. Isso implica a pessoa
“não se recordar” de que executou determinado comportamento ou ação, até que
uma determinada pista, implantada pelo terapeuta, seja acedida e a informação
voltar à consciência do cliente;
 Anestesia – Este fenómeno permite que o terapeuta induza a sugestão para que o
cliente não sinta nenhuma dor, em determinada parte do seu corpo. Caso seja
mais indicado, o terapeuta pode promover analgesia ou seja, reduzir ou deslocar
a dor;
 Dissociação – Este é o fenómeno por excelência da Hipnose. Dissociar alguém
significar separar a pessoa da experiência da realidade, para outra experiência
sugerida. Por exemplo, a pessoa pode ter a sua mão dentro de uma tina de gelo e,
na sua mente, a mesma mão estar dentro de areia quente da praia;
 Alucinações – Neste fenómeno, é sugerido ao cliente que crie imagens, ouça
sons ou sinta determinadas sensações. Ao sugerir a uma pessoa que um
determinado objeto deixa de se encontrar à sua frente, desaparecendo, estamos a
criar uma alucinação negativa. Pelo contrário, se quisermos sugerir algo ao
cliente, que realmente não existe, estamos a criar uma alucinação negativa.

Estes são os fenómenos hipnóticos mais comuns e mais utilizados. Em terapia, estes
fenómenos são usados com o propósito de otimizar os recursos do cliente, promovendo
flexibilidade e a mudança desejada.

OS SINAIS DE HIPNOSE
Começo esta parte por dizer que Hipnose é uma experiência vivencial subjetiva. Isto
significa que não existem duas experiências iguais, quer na mesma pessoa, quer entre
pessoas. A pessoa seguir as sugestões, a forma como as segue, o que sente, o que pensa
e o que vive, durante a experiência de Hipnose, só o próprio pode descrever.

No entanto, existem determinadas pistas que nos sugerem que a pessoa esteja em
Hipnose. Esses são os sinais que o terapeuta procura, de modo a perceber se o seu
método está a resultar. Aqui ficam alguns desses sinais:

 Movimento REM – Movimento REM ou “Rapid Eye Movement” é algo que


acontece durante etapas do sono natural. No entanto, quando recordamos
imagens ou visualizamos algo, os nossos olhos realizam esse movimento. Em
Hipnose, esse movimento acontece, desde o princípio até ao final do processo;
 Alteração da respiração – No estado de Hipnose, a respiração do sujeito fica
alterada. De modo a que o terapeuta perceba isso, terá de perceber o ritmo
respiratório normal para que, depois, possa perceber a diferença. A forma mais
simples é observar os movimentos da barriga ou da caixa torácica;
 Alteração do batimento cardíaco – Tal como a respiração, também o
batimento cardíaco do sujeito altera-se, durante o processo. Uma das formas de
controlar esse aspeto é reparar no pescoço do sujeito e observar o pulsar;
 Alteração do tónus muscular – Devido aos efeitos de ativação ou relaxamento,
o tónus muscular do sujeito vai-se alterando. Não só os músculos se tornam mais
relaxados, como o sangue vai sendo bombeado para áreas mais necessárias. Esse
fenómeno poder ser observado nas mudanças de coloração da pele;
 Simetria facial – Por norma, a nossa face é assimétrica no seu movimento
muscular normal. Em Hipnose, essa assimetria torna-se mais simétrica, devido
ao relaxamento muscular;
 Alterações no movimento de engolir – No estado natural de vigília, cada
sujeito tem vários movimentos de engolir a sua saliva, não só para a boca não
secar mas, também, para livrar-se do excesso. Em Hipnose, esses movimentos
são drasticamente mais reduzidos e a boca torna-se mais seca, mas não
desconfortável para o sujeito;
 Perceção automática de movimentos – Em Hipnose, o sujeito sente que os
seus movimentos são mais fáceis e sem esforço, como se fossem realizados de
forma automática. Para o exterior, esses movimentos não têm um aspeto fluído,
mas sim meio tremido. Por exemplo, na levitação do braço, o movimento
começa por um tremer dos dedos, uma subida progressiva da palma da mão, o
braço começa a levantar, etc.;
 Lentificação da fala – Ao contrário do que se possa pensar, a pessoa pode falar
quando se encontra hipnotizada. O não querer falar pode mostrar o seu desejo
em não o fazer ou pensar que não o pode fazer. Se o sujeito falar, será diferente
da maneira habitual. A fala será mais arrastada, o volume será muito mais baixo
e haverá uma pausa de reação, desde que o terapeuta faz uma pergunta, até à
altura em que o sujeito responde;
 Alteração na temperatura corporal – Nos casos em que Hipnose é induzida
por relaxamento e que o sujeito se encontra parado, a sua temperatura corporal
desce. Nesse contexto, é sempre útil cobrir a pessoa com uma manta leve.

Esta lista representa os comportamentos mais comuns que acontecem, ao longo do


processo de Hipnose. Existem mais, mas estes são os mais documentados. Gostaria só
de fazer uma breve referência ao lacrimejar. É normal que os olhos, mesmo fechados,
estejam em constante lubrificação e isso pode variar, consoante a pessoa usar lentes de
contacto ou ter problemas oculares. Mesmo que o sujeito começa a lacrimejar, ou
mesmo chorar, o terapeuta não deve assustar-se ou tentar fazer um esforço para limpá-
las. O sujeito não se vai preocupar com isso e, no final, o terapeuta pode simplesmente
dar um lenço.

ASSOCIAÇÕES E RECURSOS DE HIPNOSE


Existem alguns recursos e associações que os mais curiosos podem consultar. Até à
data, infelizmente, Portugal não tem nenhuma associação ou sociedade de Hipnose que
estejam acreditadas internacionalmente. O mais perto será a nossa vizinha Espanha ou
os institutos associados à Fundação Milton H. Erickson, em Lisboa e Norte.
Existe então:

 The International Society of Hypnosis;


 The European Society of Hypnosis;
 Society of Psychological Hypnosis (Divisão 30 da American Psychological
Association;
 Grupo de Hipnose Psicológica (Colégio Oficial de Psicólogos da Comunidade
Valenciana);
 American Society of Clinical Hypnosis;
 Society for Clinical and Experimental Hypnosis;
 The British Society of Clinical and Academic Hypnosis;
 Australian Society of Hypnosis;
 The Milton H. Erickson foundation (em Portugal temos o Instituto Milton H.
Erickson de Lisboa e o Instituto Milton H. Erickson do Norte)

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Hipnose é uma área que ainda tem muito por explorar. E muito por dizer.

Quando pensei em escrever algo, tomei a decisão de colocar algo breve mas
suficientemente informativo para que as pessoas possam procurar mais e, sobretudo,
tentar passar a imagem que Hipnose deve ter: a de uma ferramenta terapêutica que ajuda
a mudar a vida das pessoas. Sem dúvida que o fez comigo.

Não é o meu desejo converter, seja quem for, à “religião” da Hipnose. Nem todos temos
de fazer o mesmo ou ter os mesmos interesses. Se fosse assim, não haveria diversidade
nas intervenções e nas trocas de opiniões. Mas gostaria de passar a ideia que esta pode
ser uma alternativa possível, tanto para as pessoas que nos chegam, como também aos
profissionais de saúde.

Sou Psicólogo, como profissional. Sou membro da Ordem dos Psicólogos Portugueses,
o que me dá motivo de orgulho. A minha grande base de formação em Hipnose foi-me
passada por psicólogos, psicoterapeutas e investigadores reconhecidos como sendo dos
melhores, internacionalmente. É com estes valores que me identifico e que me
comporto, sempre que possível, no campo da formação e terapia.

Esta escolha faz-me afastar de assuntos como espetáculos de Hipnose e Terapia de


Regressão a Vidas Passadas. Não porque não os conheça, mas sim porque os conheço. E
muito bem. Hipnose é muito mais do que isto e não é comprimido mágico, estilo
Matrix, que se toma e que resolve todos os nossos problemas. Antes fosse!

Por outro lado, há mais do que espaço para todos. Se a pessoa que ler for um
profissional de saúde que queira aprender a usar Hipnose, um professor, educador ou até
mesmo um treinador, a minha porta estará sempre aberta. As restantes pessoas podem
afastar-se da minha porta, por não concordarem com a minha perspetiva. Aceito e
compreendo isso.
Também gostaria de dizer que hipnotizar alguém é das coisas mais fáceis que pode
fazer. A sério! Pode parecer que não ou que estou a gozar consigo, mas estou a ser o
mais sincero possível. Se você visualizar muitos materiais do Youtube, pode mesmo
conseguir hipnotizar alguém. Aliás, se este fosse um livro técnico, haveria grandes
possibilidades que você começasse a hipnotizar pessoas. Mas escolhi não o fazer e esta
é a razão: um dos grandes perigos da Hipnose é a própria pessoa que hipnotiza. Se você
não tiver uma base técnica sólida e uma excelente compreensão de como os
mecanismos da mente humana funcionam, você pode fazer mais mal do que bem. Se
quer fazer terapia, só tirar cursos de Hipnose e de PNL não serão suficientes. Precisa de
uma boa base de saúde mental. O que me leva ao último conselho: saiba reconhecer os
seus limites. Não se aventure por campos que acha que consegue resolver, só porque
consegue hipnotizar pessoas.

Despeço-me pelo início de qualquer conversa.

O meu nome é Pedro Rodrigues Ribeiro, sou Psicólogo, Fundador e Diretor da


Mindfull – Psicologia & Hipnose. Facilito consultas de Psicologia e Psicoterapia,
com e sem Hipnose, organizo palestras sobre temas ligados à Psicologia, Hipnose e
Áreas Comportamentais e dou formação em Hipnose Clínica e Ericksoniana.

Pode encontrar-me no Facebook (Em Mindfull ou Pedro Rodrigues Ribeiro), no


Linkedin (Mindfull – Psicologia & Hipnose), Youtube e https://www.mindfull.pt.

Para contacto direto, poderá fazê-lo através de pedro.ribeiro@mindfull.pt e


917438752.

Até breve!

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