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Filosofia 11 Ano

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David Hume

Impressões e ideias
A teoria do conhecimento de Descartes baseia-se inteiramente na razão. Descartes
pensa que as crenças básicas, nas quais se funda todo o conhecimento, em nada dependem
dos sentidos. Na verdade, sem as crenças básicas racionais, Descartes pensa que não pode
haver justificação para aceitar as impressões dos sentidos. Hume, contudo, tem uma
perspetiva inteiramente oposta.

Hume defende que tudo o que ocorre na nossa mente mais não é do que perceções.
No entanto, todos compreendemos a diferença entre sentir e pensar. Essa diferença é
explicada porque, segundo Hume, há duas classes de perceções: as impressões e as ideias.

Hume caracteriza as perceções humanas segundo um critério da vivacidade e da força com


que são suscetíveis de impressionar o espírito.

Impressões: apresentam maior grau de força e vivacidade, são obtidas através de um


contacto direto. Nelas se incluem não só as sensações (auditivas, visuais, táteis, etc.) como
também as emoções e as paixões (o amor, odio, desejo, ira, etc)

Ideias/ pensamentos: são as representações das impressões, ou seja, imagens


enfraquecidas das impressões, copias das impressões. Sendo assim, são mais fracas, menos
vivas e recorremos à imaginação.

No que toca às ideias, Hume considera que as da memória são mais fortes do que as da
imaginação.

Não é possível termos uma ideia de algo sem antes termos impressão da mesma.

Ex.: uma impressão é a cor da flor que os olhos veem; uma ideia é a memória dessa cor.

Uma impressão é a dor de dentes enquanto vivida; uma ideia é a lembrança dessa dor.

Aas impressões e as ideias podem ser classificadas como simples ou complexas. As simples
são aquelas que não admitem qualquer tipo de divisão, as complexas são aquelas que
podem ser divididas em várias ideias ou impressões simples.

A maçã é verde. A maçã é verde

1º ideia simples 2º ideia simples ideia complexa

Deus é uma ideia complexa que tem origem nas ideias simples de bondade, sabedoria,
perfeição, inteligência,...

As ideias simples derivam de impressões simples, mas muitas ideias complexas não resultam
de impressões complexas. o critério usado para distinguir uma ideia verdadeira de uma ficção
passa a ser a existência ou não de uma impressão que lhes corresponda, embora também as
ficções tenham por base, em última instância, as impressões uma vez que são ideias
construídas a partir delas.

Não há conhecimento fora dos limites impostos pelas impressões.

Daqui se conclui a posição de David Hume sobre o problema da origem do conhecimento: é na


experiência que se encontra a origem ou fundamento do conhecimento, em resultado das
ideias derivarem das impressões. David Hume (à semelhança de John Locke) é empirista. À
nascença a nossa mente é uma tábua rasa ou uma folha em branco, que vai ser preenchida a
partir dos dados da experiência.

Todo o conteúdo da nossa mente é constituído por ideias e impressões, derivando todo ele,
num primeiro momento, da experiência. É uma perspetiva contrária à de Descartes,
relembremos a propósito que o filósofo francês defendia a existência de ideias inatas
(racionalismo inatista).

Para Hume todo o nosso conhecimento está limitado à experiência. Desta forma, quando
ousamos ir além dos dados empíricos, estamos sempre sujeitos a cair no erro; David Hume
revela assim a sua faceta cética, nomeadamente um ceticismo metafísico.

Ideias simples e complexas


Todas as nossas ideias têm origem empírica por duas razões: porque são cópias diretas
das impressões, que são ideias simples; e porque o nosso pensamento recorre à imaginação
para combinar ideias simples, formando ideias complexas.

As ideias simples constituem a memória, enquanto as ideias complexas constituem a


imaginação. Por exemplo, nunca observámos qualquer cavalo alado, mas formamos essa ideia
complexa a partir das ideias simples de cavalo – que consiste na memória de ver cavalos – e de
coisa com asas – que consiste na memória de ver coisas com asas. Mais uma vez, as primeiras
são mais intensas e vivazes do que as segundas: a memória, ou ideia simples de cavalo é mais
intensa e vivaz do que a imaginação, ou ideia complexa, de cavalo alado.

Assim, Hume conclui que todas as nossas ideias são uma espécie de imagens
mentais, cuja origem está nas nossas impressões e que mesmo as ideias mais complexas têm
origem na experiência

Conteúdo mental: Perceções

Ideias: São cópias das impressões,


Impressões: Caracterizam-se pela
Com menos força e vivacidade.
sua força e vivacidade.

Sensações externas Sentimentos Simples (memória: Complexas


(auditivas, visuais, internos (emoções e ideia de cavalo, de (imaginação: ideia
tácteis, olfativas e desejos). coisa com asas, de cavalo alado,
gustativas). etc.) etc.)
Tipos ou modos de conhecimento
Questões de facto e relações de ideias:
Todas as nossas ideias têm uma origem empírica, o que significa que, para Hume, não
há conhecimento a priori sobre o mundo. Todo o conhecimento acerca do mundo é a
posteriori. Isto não significa que este negue a existência do conhecimento a priori, apenas
defende que este não é suficiente para conhecermos o mundo.

Hume diz, por exemplo, que nenhuma pessoa conseguiria descobrir as propriedades explosivas
da pólvora apenas através do pensamento. Mas o que dizer de afirmações como «o dobro de
dois é igual à metade de oito»? Não podemos saber isso apenas através do pensamento? Sim,
concede Hume, só que isso nada nos diz sobre o mundo. Vejamos porquê.

Hume defende que todo o nosso conhecimento, tudo o que podemos afirmar, se
refere a questões de facto ou a relações de ideias. O que distingue o conhecimento ou as
afirmações sobre questões de facto do conhecimento ou das afirmações sobre relações de
ideias? A resposta é a seguinte:

- Negar uma afirmação sobre questões de facto não implica uma contradição.

- Negar uma afirmação sobre relações de ideias implica uma contradição.

Por exemplo, apesar de ser muitíssimo provável que o sol irá nascer amanhã ou que a
escola estará no mesmo sítio, é logicamente possível que isso não aconteça. Portanto, afirmar
que o sol não irá nascer amanhã ou que a escola não estará no mesmo sítio em que a
deixámos na véspera, não implica qualquer contradição da nossa parte.

O mesmo não acontece se afirmarmos que cinco vezes três não é igual à metade de trinta.
Isto sim, é algo logicamente impossível. Podemos conceber sem contradição que as paredes
exteriores do bloco A da escola não são brancas, mas não podemos conceber sem contradição
que num triângulo retângulo o quadrado da hipotenusa não é igual à soma do quadrado dos
catetos.

As questões de facto também se distinguem das relações de ideias pelo seguinte:

- As afirmações sobre questões de facto exprimem verdades contingentes (v ou F)

- as afirmações sobre relações de ideias exprimem verdades necessárias (só V)

Uma verdade é contingente se sendo assim, poderia não o ser. Ou seja, se sendo verdadeira
poderia ser falsa. Uma verdade é necessária se não poderia ser diferente do que é. Se sendo
verdadeira não poderia ser falsa.

É uma verdade contingente que Aristóteles foi o fundador da Lógica, pois poderia ter sido
outro em vez dele. Mas é uma verdade necessária que um triângulo tem três lados, pois a ideia
de um triângulo com outro número de lados é inconcebível.
Relações de ideias e questões de facto distinguem-se ainda pelo seguinte:

- As verdades sobre relações de ideias são conhecidas de um modo a priori, basta-nos usar o
pensamento para conhecê-las ou usar o raciocínio dedutivo para demonstrá-las. Disso são
exemplo as verdades matemáticas.

- As verdades sobre questões de facto são conhecidas a posteriori, são dependentes da


experiência, das impressões. Um facto só pode ser conhecido se ele resultar de uma
impressão.

Isto leva-nos a outra conclusão:

- O conhecimento a priori das relações de ideias, apesar de absolutamente certo, não é


acerca do mundo, não nos informa sobre este, pois a sua verdade é independente de
qualquer observação do mundo.

- O conhecimento a posteriori das relações de facto, sendo apenas contingentemente certo,


informa-nos no entanto sobre o mundo, sobre o que existe fora do pensamento, dizendo-
nos como são as coisas do mundo.

Relações de ideias Questões de facto


Ciências matemáticas Há contradição (depende do sujeito que
experiencia o Mundo)
Intuição São contingentes (F ou V)
Demonstrações certas A verdade depende da experiência, isto
é, depende de um confronto com os
factos
Dedução
Pensamento Ex.: O sol vai nascer amanhã
O calor dilata os corpos
Sócrates foi um filosofo grego
Não há contradição
Não nos dá conhecimento acerca do
mundo
São necessárias (só V) e nega-las
implicaria entrar em contradição.
Carácter evidente
A verdade não depende da experiência,
a verdade pode ser conhecida pela
simples inspeção logica do conteúdo da
proposição.

Ex: 3x5= 15
Uma casa amarela é colorida
Nenhum casado é solteiro
Em conclusão e sintetizando

Tipos ou modos de conhecimento

Sobre relações de ideias. Ex. 50x2 =


Sobre questões de facto. Ex. Os
1000 / 10.
corvos são negros.

Negar uma afirmação sobre Negar uma informação sobre


questões de facto não relações de ideias implica uma
implica uma contradição. contradição.

Verdades contingentes Verdades necessárias (não


(poderiam ter sido falsas) poderiam ter sido falsas)

Conhecidas a posteriori, a Conhecidas a priori, só pelo


partir da experiência pensamento.
(impressões externas ou
internas).

Dá-nos informações sobre o O conhecimento das relações de


que existe no mundo, sobre ideias é independente dos factos,
os seus factos e objetos. é analítico, não nos dá nenhuma
informação substancial do
mundo.

Causalidade e conexão necessária


A ordem e a regularidade das nossas ideias assentam em princípios que permitem uni-
las e associá-las. Os princípios de associação de ideias são os seguintes:

 Semelhança: ex.: um rosto desenhado remete-nos para o rosto original


 Contiguidade no tempo e no espaço: ex.: a lembrança de um comboio leva a
pensar na estação, nos passageiros, etc.
 Causalidade (causa e efeito): a água fria posta ao lume (causa) faz pensar na
fervura (efeito) que lhe seguirá.
Em que consiste a ideia de relação de causa-efeito ou de causalidade?

Consiste na ideia de conexão necessária entre acontecimentos, isto é, que sempre


que, em certas condições, acontece A, acontece inevitavelmente B de tal maneira que A
produz necessariamente B.

Qual a posição de David Hume sobre a ideia de causalidade?


Segundo Hume, todo o conhecimento e raciocínios (indutivos) das questões de facto
baseiam-se na relação de causa e efeito. O nosso conhecimento dos factos restringe-se às
impressões atuais e às recordações de impressões passadas. No entanto, muitas vezes
fazemos afirmações sobre o mundo que nos levam além da experiência imediata (ou passada).

Eis alguns exemplos: O sol vai nascer amanhã; Todos os corvos são negros; Esta barra de metal
dilatou por causa do calor.

Todas estas afirmações referem-se a questões de facto, pelo que Hume considera que são
verdades contingentes, conhecidas a posteriori e que têm por base uma inferência causal.

Ora, dizer que o sol vai nascer amanhã é afirmar algo que não foi observado. E também não
podemos observar os corvos todos. Finalmente, com base apenas nos sentidos, só podemos
ver que a barra de metal dilatou e que está quente – mas não que dilatou por causa do calor.
Em qualquer destes casos, estamos a ir além da experiência. Isso só é possível através do
raciocínio indutivo (que nos permite generalizar e prever a partir de casos semelhantes no
passado e presente) e da utilização da ideia de causalidade (que julgamos refletir uma relação
de conexão necessária entre acontecimentos, como por exemplo entre o calor – causa – e a
dilatação da barra de metal – efeito).

Tenho conhecimento certo do presente e do passado mas tenho apenas conhecimento


provável do futuro (quando se trata de hábitos).

O problema do conhecimento do Mundo


Ex. Toda a água entra em ebulição a 100ºC: Trata-se de um conhecimento de facto porque
relaciona dois factos ou acontecimentos- o aquecimento da água a determinada temperatura
e a sua ebulição.

Relação causal: relação estabelecida entre dois factos.

O aquecimento da água a determinada temperatura (A) é a causa da sua ebulição (B)

O que significa isto? Não só que B acontece depois de A. A relação causal aqui exemplificada
quer dizer que sempre que aconteça A acontecerá B.

Entre A e B estabelece-se uma conexão necessária entre acontecimentos que se obtém


através de um raciocínio indutivo. Isto ajudar-nos-á a prever o futuro.
Para Hume, a Natureza funciona de forma regular, ou seja, o seu comportamento é uniforme-
PRINCÍPIO DA UNIFORMIDADE DA NATUREZA

Se a natureza não fosse regular e não tivesse o mesmo comportamento seria


imprevisível e não a poderíamos conhecer.

Porque é que conhecer o mundo é um problema?


Problema da causalidade (relação causa efeito)
A: caneta B: caneta a cair

Isto é aquilo que chamamos de causalidade, não conseguimos ver utilizando os nosso
sentidos.

O barulho feito pela caneta é nos dado recorrendo aos sentidos mas a relação entre os 2
acontecimentos não.

1. A observação repetida da ocorrência conjunta de 2 acontecimentos gera a crença de


que um é causa do outro

ex.: sentimos a mão aquecer quando a colocamos perto do fogo

A ideia de causalidade não é a priori já que o efeito não pode ser encontrado na causa por
examinarmos apenas o conceito de causa, uma causa produz vários efeitos.

Os factos apresentados como efeito e causa são diferentes, logo não podemos deduzir um do
outro (Do conceito de água não se traduz apenas molhar).

Hume conclui que a ideia de relação causal é formada com base na experiência.

2. A ideia de conjunção constante é importante para a relação causal mas insuficiente


para a concretizar

Ex. Os materiais dilatam (efeito) com o calor (causa).

Entre a causa e o efeito estabelece -se uma conexão necessária que não tem origem nem
a priori nem a posteriori já que o seu fundamento é o hábito, devido ao facto de a
natureza ser uniforme.

Hábito:
 Não há conhecimento certo aqui
 Dá-nos uma crença apenas de que algo que aconteceu no passado acontece no
futuro. Estamos habituados que depois de A vem B (conhecimento provável)
 É um fundamento psicológico (forma-se na mente através do fundamento
indutível)
 Não é justificado a priori nem a posteriori, apenas está na nossa mente.
Assim, em jeito de conclusão, a posição de Hume sobre a ideia de causalidade é a
seguinte:

 Ao observarmos repetidamente uma conjunção constante entre certos


acontecimentos ou objetos, gera-se em nós a expectativa de que o mesmo ocorra
inevitavelmente no futuro. Isso leva-nos a pensar que há uma conexão necessária
(causalidade). Assim, a nossa crença de que há uma conexão necessária decorre
simplesmente do hábito, que é uma espécie de sentimento ou disposição interna.
É o hábito que leva a nossa mente a projetar no mundo a conexão necessária
entre causa e efeito. Esta é uma conexão que não existe na realidade, mas apenas
na nossa mente (como tendência psicológica). «expectativa», «hábito» e
«projetar» são todos termos psicológicos. Portanto, a causalidade, que
supostamente nos permite compreender muito do que acontece no mundo não
passa de uma ilusão ou ficção.

Princípio da Uniformidade da Natureza


Não pode ser justificado a priori através do simples recurso a razão. Já que uma justificação a
priori implicaria que o princípio da uniformidade da natureza fosse uma verdade necessária,
logo não poderia entrar em contradição. É logicamente real pensar que apesar da natureza ter
este comportamento no futuro ela deixa de se comportar assim

O princípio da uniformidade da natureza não pode ser justificado à posteriori por intermédio
da experiência. Afirmar que a natureza é uniforme significa dizer que se até aqui a natureza se
comportou assim então no futuro irá ter o mesmo comportamento, contudo podemos
observar a natureza no passado e presente mas não no futuro.

Assim, a crença da uniformidade surge através do raciocínio indutivo.

O princípio da uniformidade da natureza é a base dos nossos raciocínios indutivos. Contudo


para os justificar recorremos a raciocínios indutivos: Falácia circular ou falácia de petição de
princípio

Queremos justificar a indução mas a única resposta que encontramos é que a indução justifica
a indução. Se não conseguimos justificar esta crença, não conseguiremos justificar que o
conhecimento do mundo é possível.

Estatuto do conhecimento científico

Senso Comum/ conhecimento vulgar Conhecimento científico


Conhecimento prático: orienta a vida Conhecimento mais aprofundado da
quotidiana realidade
Apreensão sensorial espontânea Baseia-se em pesquisas e investigações
apoiadas em procedimentos (métodos)
Não disciplinar e imetódico(não é Implica a construção de conceitos e
aprofundado nem apoiado por testes teorias
experimentais)
Conhecimento superficial (pouco ou nada Linguagem rigorosa e especifica
aprofundado)
Conjunto de crenças e opiniões Metódico e sistemático
subjetivas, suposições, pressentimentos
preconceitos ideias feitas
Linguagem natural e simples Não confia nos sentidos
Primeiro nível do conhecimento- serve de É critico, explicativo, aprofundado e
alavanca à construção de tipos de problematizador
conhecimentos mais elaborados, como é
o cientifico

Mas será que podemos justificar esta relação de causalidade?

Há duas possibilidades: a relação de causa-efeito pode ser conhecida a priori ou baseia-se


inteiramente na experiência (a posteriori). Ora, segundo Hume, esta relação não pode ser
conhecida a priori. Se fosse possível saber a priori que certos factos têm o poder de causar
outros, poderíamos antecipar, sem nunca ter visto algo semelhante, que o impacto de uma
bola de bilhar noutra bola de bilhar produz o movimento da segunda. No entanto, sem
experiência não é possível saber nenhuma destas coisas.

Estará então a experiência em condições de justificar a relação de causa-efeito? A experiência


apenas pode revelar entre dois acontecimentos uma sucessão temporal e conjunção constante
e nada permite afirmar que o primeiro tenha realmente poder ou energia para produzir o
segundo. Portanto, o conhecimento da relação de causa-efeito não pode ser obtido a priori
nem a posteriori.

Segundo Hume, esta ideia forma-se na mente do sujeito em consequência de um


hábito, que é fruto da associação que se verifica na sua mente entre as ideias correspondentes
aos acontecimentos observados e não algo que descubramos nas próprias coisas. Assim, David
Hume diria que, em bom rigor, quando pomos a água ao lume, «não sabemos que a água vai
aquecer, ainda que esse facto seja possível ou muito provável até». Em tal caso, não temos um
saber, mas apenas uma crença ou suposição, e isto porque não existe qualquer justificação,
estritamente racional (a priori) ou empírica (a posteriori), para a nossa crença na existência de
relações causais. É o hábito baseado em repetições passadas, em que sempre que um
fenómeno ocorria, um outro se lhe seguia, que nos leva a crer, isto é, a ter a tendência
psicológica para formar a expetativa de que um é causa e o outro efeito. Com base no hábito
(psicológico) e não na razão ou nos próprios objetos, acreditamos na igualdade futura dos
acontecimentos. No entanto, não temos nenhum conhecimento direto do que seja a conexão
necessária dos fenómenos, pelo que as inferências feitas desse modo são apenas
provavelmente verdadeiras. A ideia de causalidade não é senão uma ficção, uma ilusão, uma
criação subjetiva ou psicológica da mente humana.

Ao contrário de David Hume, os filósofos racionalistas consideravam que existe uma


relação causal entre acontecimentos, isto é, uma conexão necessária entre acontecimentos
que faz com que à ocorrência de um deles se siga sempre necessariamente a ocorrência do
outro. Mas, segundo Hume, é impossível pela mera análise de um acontecimento, tido como
causa, descobrir os supostos efeitos a que dá origem (Adão nunca poderia a priori, isto é,
anteriormente à experiência, saber que a água afoga) e, portanto, a ideia de relação causal não
tem um fundamento racional e não pode ser necessária. Mas também não tem fundamento na
experiência. Para que a ideia de relação causal tivesse fundamento na experiência, teria de
haver uma impressão correspondente, uma vez que todas as ideias derivam e correspondem
às impressões. No entanto, a experiência não nos dá qualquer impressão correspondente à
ideia de uma conexão necessária, mostra-nos apenas a existência de uma conjunção constante
ou sucessão temporal de acontecimentos. Temos a impressão do acontecimento A e,
seguidamente, do acontecimento B. Portanto, a ideia de conexão necessária não tem um
fundamento na razão nem na experiência. Ela é o resultado do mecanismo psicológico do
hábito ou costume. O hábito de vermos um dado acontecimento ser seguido por outro leva-
nos a crer que existe uma conexão necessária entre esses acontecimentos. Por conseguinte, a
ideia de relação de causa e efeito é o produto de uma tendência psicológica (da subjetividade
humana) e não temos razões para afirmar que tem correspondência na realidade objetiva.

Esclareça o que distingue o empirismo de Hume do


racionalismo de Descartes.
1 —A origem do conhecimento.

Descartes considera que a experiência, dados os erros dos sentidos, não pode ser
fonte credível de conhecimentos, melhor dizendo, as suas informações não podem constituir
(dado que muitas vezes são enganadoras) crenças básicas que possam conduzir a outros
conhecimentos. O saber constrói-se com base em ideias inatas e, desde que siga um método
correto e Deus garanta o normal funcionamento da nossa razão, podemos alcançar verdades
objetivas (claras e distintas) sobre o mundo. Esta rejeição dos sentidos é uma convicção
fundamental de Descartes e marca a sua orientação claramente racionalista inspirada no
modelo dedutivo das matemáticas.

Para Hume, todas as ideias têm uma origem empírica. Todos os nossos conteúdos
mentais são perceções. Estas são de dois tipos: impressões e ideias. As nossas ideias são cópias
das nossas impressões e por isso não há ideias inatas.

2 —A possibilidade do conhecimento.

Partindo de um ceticismo metódico, Descartes liberta a razão da dependência em


relação à experiência e, tornando o seu funcionamento dependente da garantia de Deus,
conclui que podemos alcançar conhecimentos verdadeiros (claros e distintos) acerca do
mundo. Para Hume, o critério de verdade do nosso conhecimento é este: um conhecimento,
uma ideia, só é válido se pudermos indicar a impressão ou impressões de que deriva. A toda e
qualquer ideia tem de corresponder uma impressão sensível. Se não há correspondência, há
falsidade. Criticando a fé cega no poder da razão quanto ao conhecimento do mundo e do que
transcende a natureza, Hume argumenta contra os racionalistas que o conhecimento científico
não é como o conhecimento matemático, não o podendo ter como modelo: não é um
conhecimento puramente demonstrativo, mas procede da experiência.

Quanto à objetividade das leis naturais defendida por pensadores não racionalistas como
Locke e Newton, o filósofo escocês argumenta que qualquer generalização, baseando-se em
factos passados e pretendendo valer para o que ainda não foi objeto de experiência, é incerta.
Nada podemos saber acerca do futuro porque nada nos garante que o futuro seja semelhante
ao passado. Não há conhecimento, propriamente falando, do que ultrapassa a nossa
experiência atual ou passada: o que aconteceu não serve como fundamento seguro da
previsão do que ainda não aconteceu.

Ceticismo? Sim, no sentido em que o nosso conhecimento não é certo e seguro. Mas uma
coisa é o valor científico dos nossos conhecimentos e outra a sua utilidade prática e vital:
sabemos que os nossos «conhecimentos científicos» são mais pretensão e desejo de segurança
do que saber, mas não podemos viver sem essas sábias ilusões.

3 — Os limites do conhecimento.

Descartes afirma que a razão apoiada na veracidade divina e nas ideias inatas pode
conhecer a realidade na sua totalidade ou, melhor dizendo, os princípios gerais de toda a
realidade: Deus, alma (cogito) e mundo são realidades que podem ser conhecidas.

Para Hume, as impressões sensíveis são, não só o critério de verdade do conhecimento


humano, mas também o seu limite. Não tendo outra base que não as impressões ou
sensações, o nosso conhecimento está limitado por elas: não posso afirmar nenhuma coisa ou
realidade da qual não tenho qualquer impressão sensível (como, por exemplo, Deus).

4— Ciência e metafísica
Em Descartes, temos uma fundamentação metafísica da ciência, isto é, uma fundação
baseada em realidades metafísicas tais como Deus e cogito (mas sobretudo Deus, que é o
verdadeiro pilar do sistema científico que Descartes se propôs construir).

Segundo Hume, não podemos afirmar a existência de qualquer fundamento metafísico


do saber.

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