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Trigo No Brasil

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Trigo no Brasil I 283

Doenças de trigo
no Brasil
Douglas lau
Flávio Martins Santana
João leodato Nunes Maciel
José Maurício Cunha Fernandes
leila Maria Costamilan
Márcia Soares Chaves
Maria Imaculada Pontes Moreira Lima

Introdução umidade relativa, entre outros) forem favo-


ráveis. Este conjunto de fatores faz com que
trigo, como outras culturas de in- as doenças ocorram, predominantemente,

O teresse econômico, é acometido


por diversas doenças que afetam
o seu desenvolvimento, comprometendo
em uma determinada fase da cultura, em
determinados órgãos da planta e em certas
regiões do País.
a produtividade e a qualidade dos grãos. Assim, considerando o hospedeiro, en-
As doenças podem ser causadas por fato- tre as doenças fúngicas, por exemplo, há
res abióticos ou agentes bióticos. Os fatores aquelas que acometem o sistema radicular
abióticos (como frio ou calor excessivos, es- (mal-do-pé e podridões radículares), doen-
cassez ou excesso de água, desbalanço nu- ças da parte aérea (manchas foliares, oídios
tricional, granizo, fitotoxidez por produtos e ferrugens) e doenças de espiga (gibere-
químicos) podem ter efeito direto, como Ia e brusone}. Como exemplo do efeito do
por exemplo a queima causada pela geada, ambiente como determinante da distribui-
ou indireto, favorecendo a ação de agen- ção de doenças, observa-se o predomínio
tes bióticos. Os agentes bióticos (patóge- de mancha marrom em regiões tritícolas
nos) são diversos, variam em complexida- mais quentes (norte do Paraná e latitudes
de estrutural, ciclo infeccioso e condições inferiores). Em regiões mais frias, a princi-
requeri das para causar doença. Conside- pal mancha foliar é a amarela. Entre as do-
rando as exigências do hospedeiro (trigo) enças de etiologia viral, o mosaico comum
e de seus patógenos, a ocorrência de doen- do trigo é mais frequente nas regiões frias e
ça depende de um conjunto de fatores fa- úmidas, devido às exigências do organismo
voráveis do hospedeiro, do patógeno e do vetor, que possui esporos tlagelados, sen-
ambiente. A doença ocorre se, na presença do, portanto mais restrito ao Rio Grande do
de inóculo do patógeno, houver disponibi- Sul, Santa Catarina e sul do Paraná. Contra-
lidade do hospedeiro em estádio fenológí- riamente, o nanismo amarelo dos cereais,
co suscetível e quando as condições do am- transmitido por afídeos, está presente nas
biente (como temperatura, molhamento ou variadas regiões tritícolas brasileiras.
2841 Trigo no Brasil

o manejo de doenças depende de sua Viroses


correta identificação, do entendimento de
seu ciclo e do conhecimento das formas de o trigo e outras culturas de cereais de
manejo disponíveis. Neste sentido, são des- inverno são acometidos por diversas viro-
critas a seguir as principais doenças do tri- ses, sendo que, para as condições brasilei-
go no Brasil, com ilustrações de sintomas ras, duas são consideradas importantes:
típicos, informações sobre os agentes etío- o nanismo amarelo da cevada, causado
lógicos, epidemiologia e formas de controle. por mais de uma espécie dos vírus Barley
yellow dwarf vírus - (BYDV) e Cereal yellow
Viroses dwarf vírus - (CYDV), e o mosaico comum
• Nanismo amarelo - Barley/Cereal yellow do trigo, causado pelo Soil-bome wheat
dwarfvirus, (BjCYDV) mosaic vírus - (SBWMV).
• Mosaico comum - soil-bome wheat mosaic
virus, (SBWMV) Nanismo amarelo
Barley yellow dwarf vírus - (BYDV) e
Doenças bacterianas Cereal yellow dwarf vírus - (CYDV)
• Queima da folha - Pseudomonas syringae
pv. syringae Os nomes dados aos vírus costumam
• Estria bacteriana - Xanthomonas campestris fazer referência ao hospedeiro e aos sin-
pv. undulosa tomas típicos decorrentes da infecção. No
caso do Barley yellow dwarf vírus (BYDV), a
Doenças fúngicas descrição original ocorreu em cevada e os
• Giberela - Gibberella zeae sintomas marcantes nesse hospedeiro são
• Brusone - Magnaporthe oryzae a redução do crescimento da planta (na-
• Mal-do-pé - Gaeumannomyces graminis nisrno) e um forte amarelecimento das fo-
var. tritici lhas. O BYDVatualmente está separado em
• Oídio - Blumeria graminis f. sp. tritici várias espécies (BYDV-PAV,BYDV-MAV)e,
• Carvão-da-espiga - Ustilago nuda f. sp. a um grupo mais divergente, foi atribuído
tritici o nome Cereal yellow dwarf vírus (CYDV).Os
• Cárie - Tilletía tritici e T. Iaevis BjCYDVs não infectam apenas a cevada,
• Manchas foliares mas outras gramíneas cultivadas ou não,
• Mancha amarela - Pyrenophora sendo responsáveis por uma das princi-
tritici-reperuis pais doenças dos cereais de inverno. Am-
• Mancha marrom - Cochliobolus sativus plamente distribuídos, estes vírus limi-
• Manchadagluma-Phaeosphaería nodorum tam a produção de grãos no Brasil e no
• Podridão comum das raízes - Fusarium mundo (USTER; RANIERI, 1995; CASA et
spp. e Bípolaris sorokiníana aI., 2000). Para variedades de trigo planta-
• Ferrugens do trigo das no Brasil na década de 1960 e no início
• Ferrugem da folha - Puccinia triticina da década de 1970, perdas de 80% ou mais
• Ferrugem do colmo - Puccinia graminis f. foram registradas para quase 90% dos ge-
sp. tritici nótipos (CAETANO, 1972). Para variedades
• Ferrugem estriada - Puccinia striiiormis atuais, as perdas em parcelas inoculadas
f. sp. tritici estão entre 30% e 60% (BIANCHIN, 2008).
Trigo no Brasil I 285

Sintomas
São sintomas típicos desta doença a re-
dução do crescimento das plantas e a alte-
ração da cor do limbo foliar. A redução de
crescimento não se restringe à altura, tam-
bém são reduzidos o número de afilhos, a
massa foliar e a massa do sistema radicu-
lar (Figura 1). Entre os sintomas mais ca-
racterísticos desta virose, está a alteração
da coloração do limbo foliar, que ocorre no
sentido do ápice para a base da folha. No
trigo, geralmente ocorre o amarelecimen-
to do limbo foliar (Figura 2), mas, depen-
dendo da cultivar, outras tonalidades mais Figura 1. Nanismo amarelo, causado por Barley/
avermelhadas podem ser observadas. Além Cereal yellow dwarf virus (B/CYDV): nanismo,
redução da massa da parte aérea e atraso no de-
da alteração da cor, ocorrem alterações
senvolvimento de planta de trigo (à esquerda),
morfológicas, com o limbo foliar adqui- comparado com planta normal (à direita).
rindo aspecto lanceolado e tornando-se
mais rígido. O conjunto destas alterações
morfo-fisiológicas pode levar ao atraso no
desenvolvimento da planta (aumento do
tempo necessário para completar o ciclo)
e tornar a planta menos capaz de supor-
tar estresses ambientais, como o déficit hí-
drico. A diminuição da produtividade é de-
corrente da redução do número e do peso
dos grãos. A expressão dos sintomas é vari-
ável e depende do nível de suscetibilidade
e tolerância da cultivar e da época em que
as plantas foram infectadas. Quanto mais
cedo ocorrer a infecção, mais severos ten-
dem a ser os sintomas. Assim, os sintomas
nem sempre são evidentes, podendo ser
percebidos apenas de maneira comparati-
va entre plantas infectadas e não infecta-
das. Os sintomas geralmente são observa-
dos em grupos de plantas (reboleiras), que
correspondem às áreas de multiplicação e
dispersão do afídeo vetor.
Figura 2. Nanismo amarelo, causado por Barley/
Etiologia Cereal yellow dwarf virus (B/CYDV): amareleci-
mento e alterações morfológicas (aspecto lanceo-
Esta virose é causada por espécies de
lado e rigidez) do limbo foliar de trigo.
vírus da família Luteoviridae. Em comum,
2861 Trigo no Brasil

os membros desta família apresentam par- a estirpe RPV foi transferida para a espé-
tículas virais compostas por capsídeos iso- cie CYDV (Cerealyellow dwarf vírus - gênero
métricos de 25 nm a 30 nm não envelo- Polerovírus). Os demais tipos (BYDV-RMV,
pados. O genoma viral é não segmentado, BYDV-SGV e outros, como BYDV-GPV), fa-
composto por um RNA que apresenta en- zem parte da família Luteovírídae, mas ain-
tre 5.600 a 6.900 nucleotídeos, sendo fita da não foram classificados quanto ao gêne-
simples e sentido positivo (ssRNA+). Os ví- ro. No Brasil, as análises da variabilidade e
rus são transmitidos por insetos da ordem predominância dos tipos virais associados
Hemiptera, família Aphididae (MILLER; ao nanismo, efetuadas por meio de testes
RASOCHOVÁ,1997). sorológicos (ELISA), evidenciaram a pre-
Estirpes dos vírus que causam o nanis- dominância de BYDV-PAV e BYDV-MAV
mo amarelo foram identificadas em fun- (SCHONS;DALBOSCO,1999).
ção da especificidade de transmissão pela
espécie de afídeo vetor, por exemplo: RPV Epidemiologia
(transmitida por Rhopalosíphum padí); RMV Para que o vírus possa ser dissemina-
(por Rhopalosíphum maídís); MAV (por Si- do, são necessárias as presenças de plan-
tobíon avenae, antigo Macrosíphum avenae); tas hospedeiras e do afídeo vetor. Ao se ali-
SGV (por Schízaphís gramínum); e PAV (por mentar da seiva de uma planta infectada,
R. padi, s. avenae e outros) (ROCHOW,1969). o afídeo adquire partículas virais, as quais
Com base na organização genômica e migram pelo seu trato digestivo e hemo-
na similaridade da sequência dos genes, cele e acumulam-se na glândula salivar.
os vírus que causam nanismo amarelo es- O vírus é retido nas mudanças de fase do
tão separados em dois gêneros: Luieovirus afídeo, mas não é transmitido à sua pro-
e Polerovírus. Os membros de ambos os gê- gênie. A transmissão ocorre quando o afí-
neros apresentam similaridade em parte deo virulífero alimenta-se de uma planta
de seus genomas, especificamente no seg- sadia. O vírus não é transmitido por ne-
mento 3' que contém os genes que codifi- nhuma outra forma, como sementes, solo
cam para as proteínas da capa protéica, de ou mecanicamente. Assim, a capacidade de
movimento e uma proteína que auxilia na infectar várias espécies de gramíneas pe-
transmissão pelo afídeo vetor. Contraria- renes e anuais, que atuam como hospedei-
mente, na região 5', onde está codificada ras alternativas, e a capacidade de trans-
a RNA polimerase RNA dependente, exis- missão pelas diversas espécies de afídeo
te grande divergência entre os gêneros. são dois componentes importantes na epi-
Este tipo de organização genômica sugere demiologia do vírus e no êxito de uma de-
que houve um evento de recombinação du- terminada estirpe-espécie. Durante o ou-
rante a evolução da família, sendo o local tono e a primavera, os afídeos migram de
de recombinação localizado na extremi- gramíneas infectadas para gramíneas sa-
dade 5' dos RNAs subgenômicos 1 e 2. As- dias, transmitindo o vírus. Particularmen-
sim, as estirpes PAV, MAV e isolados que a te para as condições brasileiras, ocorre
eles se assemelham foram mantidos den- a migração dos afídeos de plantações de
tro da espécie BYDV (Barley yellow dwarf aveia para os cultivos recém implantados
vírus - gênero Luteovírus), enquanto que de trigo.
Trigo no Brasil 1287

Diagnose causam danos diretos à lavoura). O contro-


A presença de espécies de pulgões ve- le químico pode ser realizado no tratamen-
tores do vírus, dos sintomas marcadores to de sementes e em aplicações após a im-
(alteração da cor do limbo foliar, redução plementação da cultura, determinadas em
da altura e da massa foliar) e da distribui- função da população do afídeo. Para o con-
ção de plantas doentes no campo (em re- trole de afídeos em trigo, considerando o da-
boleiras) são indicativas da ocorrência no direto na planta, há indicação de início de
de BjCYDVs. A confirmação da diagnose, aplicação de inseticida quando houver, na
bem como a identificação da estirpe viral, média das amostras, 10% de plantas infes-
podem ser realizadas por teste sorológi- tadas com afídeos para 5. graminum (con-
co (ELISA), havendo antissoros comerciais tagem direta da emergência ao afilhamen-
disponíveis para os serotipos PAV, MAV e
to), 10 afídeos por afilho para R. padi e M.
RPV. O diagnóstico mais preciso pode ser
dirhodum (contagem direta da elongação ao
realizado por RT-PCR, utilizando oligonu-
emborrachamento) e 10 afídeos por espiga
cleotídeos específicos para as sequências
para 5. avenae (contagem direta do espiga-
virais (MALMSTROM; SHU, 2004).
mento ao grão em massa) (REUNIÃO..., 2008).
A introdução de resistência a afíde-
Controle
os em genótipos de trigo, no Brasil, foi re-
Entre as estratégias de controle desta
alizada para o pulgão verde (5. graminum)
virose, estão as práticas culturais, o contro-
(ROSA;TONET, 1986), resultando em culti-
le químico e biológico do vetor e a resistên-
vares como BR 36 - Ianomâmi e Embrapa 16,
cia genética da planta hospedeira ao vetor
resistentes a alguns biótipos desta espécie.
e ao vírus.
A resistência genética ao vírus é carac-
As práticas culturais visam a eliminar
terizada pela redução total ou parcial do
as "pontes verdes" que atuam como reser-
vatórios do vírus e de seu vetor, fornecen- título viral na planta, enquanto que a to-
do a fonte de inóculo para culturas sadias lerância é caracterizada pela manutenção
em implantação. Nas condições brasileiras, da produtividade (e ausência de sintomas),
reduzir as pontes verdes é difícil, porque mesmo a planta hospedeira suportando tí-
populações de afídeos, sobretudo R. padi e tulos virais similares a genótipos suscetí-
5. graminum, e do vírus multiplicam-se em veis. No Brasil, em uma avaliação de ge-
aveia, migrando no outono para o trigo. nótipos de trigo em que a ampla maioria
O controle do vetor apresenta duplo foi considerada suscetível e intolerante à
papel, pois, além de transmitir o vírus, o . virose, os genótipos IAS-28, Londrina (pel
afídeo também provoca danos diretos na 14410-64) e Norin, pelo nível de resistência
planta. Existem três estratégias que podem e tolerância que apresentaram, foram con-
ser utilizadas para este fim: o controle bio- siderados promissoras fontes de resistên-
lógico, o controle químico e a resistência cia a serem empregadas nos programas de
genética. O controle biológico, realizado melhoramento (CAETANO,1972). Mais re-
por espécies de microhimenópteros (vespi- centemente, cultivares como BR 34 e BR 35
nhas), tem grande êxito no Brasil, normal- foram consideradas fontes de resistência
mente mantendo as população de afídeos capazes de produzir descendentes toleran-
abaixo do nível de controle (nível em que tes à virose (BARBIERIet al., 2001).
2881 Trigo no Brasil

As poucas fontes de resistência dis- do de forma sequência-específica. Assim,


poníveis e a baixa herdabilidade, devido se houver grande variabilidade na popula-
ao caráter complexo de controle genéti- ção viral quanto à sequência utilizada no
co de características como a tolerância, desenvolvimento da planta transgênica, a
têm obrigado a busca por novas alterna- mesma poderá ser resistente para apenas
tivas para o desenvolvimento de plantas alguns isolados do vírus.
resistentes. Tais alternativas tornaram-se
possíveis com o advento da biologia mo- Mosaico comum
lecular. No campo da resistência natural, Soil-bome wheat mosaic vírus (SBWMV)
a biologia molecular tem auxiliado no es-
tudo dos mecanismos envolvidos na re- Mosaico em trigo ocorre em várias re-
sistência. Neste sentido, não apenas as giões produtoras do mundo, sendo cau-
informações geradas dentro da própria sado por diversas espécies de vírus. No
cultura, mas também de outros hospedei- Brasil, a virose conhecida como mosaico co-
ros e plantas-modelo, podem fornecer al- mum do trigo ocorre principalmente no Rio
vos para a manipulação genética. Em tri- Grande do Sul, Santa Catarina e no sul do
go, genes potencialmente envolvidos na Paraná, sendo atribuída ao Soil-bome wheat
resistência, detectados por meio da análi- mosaic vírus (SBWMV) (CAETANO, 1982).
se de expressão diferencial, poderão cons- Os danos na produção causados por mo-
tituir alvos importantes para a manipu- saico, em geral, são limitados a determi-
lação gênica visando à resistência OIANG nadas áreas da lavoura onde a doença se
et al., 2004). Outra alternativa de obten- concentra, mas, sob condições ambientais
ção de plantas resistentes, particularmen- favoráveis, grandes áreas cultivadas com
te empregada para viroses, é denominada cultivares suscetíveis podem ser compro-
de resistência derivada do patógeno. Esta metidas.
consiste na manipulação e inserção de ge-
nes do próprio vírus na planta hospedei- Sintomas
ra. Neste sentido, existem duas estraté- Mosaico é um típico sintoma causado
gias que podem ser utilizadas: resistência por vários vírus e que se caracteriza pela
mediada por RNA ou resistência mediada alternância entre tecidos sadios e afeta-
por proteínas. Ambas as estratégias de- dos. Nas folhas, o mosaico é estabelecido
pendem de trabalhos prévios de clonagem pela alternância entre áreas verdes e des-
e sequenciamento de genes do patógeno. coloridas (em geral amareladas) (Figura 3).
A resistência mediada ao nível de proteí- plantas de trigo com mosaico comum apre-
na baseia-se na interferência em etapas do sentam-se amareladas e com crescimento
ciclo viral, enquanto que a resistência de retardado. Dependendo da cultivar, po-
RNA baseia-se na ativação do silenciamen- de ocorrer o enrosetamento, com a forma-
to gênico pós-transcricional que, em plan- ção abundante de brotações curtas. Muitas
tas, é considerado um mecanismo de de- vezes não ocorre o espigamento. A distri-
fesa a vírus (VANCE; VAUCHERET, 2001). buição de plantas doentes no campo, nor-
Sobretudo para este último, é importan- malmente, ocorre em áreas definidas, pre-
te conhecer a variabilidade da população ferencialmente em locais onde a drenagem
viral, uma vez que o mecanismo é ativa- do solo não é boa.
Trigo no Brasil I 289

~================~~~
ee
..J
naturais o SBWMV é transmitido por um
organismo eucarioto, parasita obrigatório
de raízes de plantas denominado polymyxa
graminis (KANYUKAet al., Z003). A ocor-
rência e a epidemia desta virose estão dire-
tamente ligadas à dinâmica da população
do vetor. P. graminis é capaz de colonizar
raízes de várias gramíneas e de transmitir
várias espécies de vírus. Possui duas fases
de vida: primária ou esporangial (com pro-
dução de zoósporos) e secundária ou es-
porogênica (com produção de esporos de
resistência) (KANYUKAet al., Z003). Em pe-
ríodos frios (10°C a 15°C) e úmidos, os zo-
ósporos são liberados e infectam as raízes
de plantas hospedeiras. Em épocas desfa-
voráveis, P. graminis sobrevive na forma de
esporo de resistência. No Brasil, em áreas
Figura 3. Mosaico comum em planta de tri- deixadas em pousio no inverno por cinco
go, causado por Soil-borne wheat mosaic virus anos, verificou-se a ocorrência da doença
(SBWMV): altemância de áreas verdes e desco-
quando do plantio de cultivares suscetíveis
loridas (geralmente amareladas) no limbo foliar.
(CAETANO,198Z). Os esporos podem ser
transportados facilmente com solo conta-
minado.
Etiologia
O SBWMV pertence ao gênero Furovi- Diagnose
rus. Sua partícula possui formato de bastão O diagnóstico desta doença tem sido
rígido perfurado, com ZOnm de diâmetro. realizado com base na presença de estru-
As partículas possuem dois comprimentos turas de resistência de P. graminis nas ra-
predominantes, de 90 nm a 160 nm e 300 ízes, na detecção de sintomas típicos na
nm, não envelopadas, e possuem simetria parte aérea de plantas suscetíveis e em
helicoidal. As duas partículas são neces- testes sorológicos.
sárias à infecção. Possui genoma biparti-
do, linear, RNA de fita simples na orienta- Controle
ção senso positiva (ssRNA+), (SHIRAKO; O longo período de sobrevivência do
WILSON,1993). vetor e a diversidade de plantas hospe-
deiras dificultam o controle desta viro-
Epidemiologia se de outra forma que não seja a resistên-
Entre as espécies hospedeiras do vírus cia genética. No Brasil, a cultivar Embrapa
estão o trigo, o triticale, o centeio, a ceva- 16 é resistente, sendo esta característica
da e outras gramíneas. Embora possa ser transmitida com eficiência à sua progênie
transmitido mecanicamente, em condições (BARBOSAet al., ZOO1).
290 I Trigo no Brasil

Doenças Bacterianas dem coalescer, formando áreas com aspec-


to desidratado (Figura 4). Sob condições
Queima da folha ambientais extremamente úmidas, peque-
Pseudomonas syrinqae pv. syrinqae nas gotículas viscosas (exsudatos) podem
se desenvolver junto às lesões nas folhas.
Entre as doenças bacterianas que afe-
tam a cultura do trigo, encontra-se a quei- Epidemiologia
ma da folha causada por Pseudomonas A bactéria pode sobreviver sobre se-
syrinqae pv. syrinqae van Hall (KIETZEL; mentes, restos de cultura e em várias gra-
RUDOLPH, 1997). O grupo P. syrinqae tem si- míneas que são infectadas. Geralmente, a
do relatado na maioria das regiões de cli- doença inicia nas folhas inferiores. O im-
ma temperado e subtemperado do mundo, pacto dos respingos de chuva e o contato
onde o trigo é cultivado. As condições am- das plantas durante períodos úmidos dis-
bientais influenciam fortemente a severi- seminam o mícro-organismo. Insetos, in-
dade da doença, com consequente efeito no cluindo afídeos, podem disseminar a bacté-
rendimento do trigo. Um dos motivos pe- ria, transportando-a sob seus corpos. Neste
lo qual a doença não é muito estudada é o caso, o início dos sintomas pode aparecer
caráter esporádico que apresenta. As con- nas folhas superiores, dependendo onde o
dições ambientais que favorecem a doença inseto fez o contato. A bactéria penetra nas
são temperaturas amenas (15 "C a 25 °e) e plantas através de aberturas naturais, tais
alta umidade relativa. A bactéria pode es- como hídatódíos, estômatos e através de
tar presente em sementes, solo, restos cul- ferimentos. O desenvolvimento da doença
turais e na água. Outros cereais podem ser ocorre somente em condições úmidas.
afetados, incluindo aveia, centeio e triti-
cale. O patógeno é extremamente comum, Controle
sendo encontrado em numerosas plantas P. syríngae pv. syrinqae apresenta fa-
daninhas e em outras culturas. ses epifíticas importantes. Populações des-
No Brasil, a queima da folha ocorre te grupo de bactéria encontram-se sempre
mais comumente nos estados da Região Sul.
Nesta região, a ocorrência da doença, com
alguma severidade, é restrita a condições de
clima com temperaturas baixas e períodos
prolongados de alta umidade relativa.

Sintomas
Os primeiros sintomas da doença apa-
recem nas folhas superiores ao redor do
estádio de espigamento. A infecção de P.
syrinqae nas folhas inicia-se com a presen-
ça de manchas aquosas com diâmetro em Figura 4. Queima da folha de trigo, causada por
torno de 1 mm, que evoluem no período de Pseudomonas syringae pv. syringae: lesões de as-
2 a 3 dias para manchas de coloração bran- pecto desidratado, que correspondem ao estágio
final de desenvolvimento da doença.
co-amarelada com áreas cloróticas, que po-
Trigo no Brasil1291

presentes, colonizando a superfície foliar zidas sob regime de irrigação por asper-
de plantas de trigo ou de outras espécies. são propiciam um ambiente favorável para
Por conseguinte, as condições meteorológi- disseminação do agente causador da estria
cas são mais relevantes para que ocorram bacteriana. Os danos produzidos por esta
surtos da doença do que a mera presença enfermidade variam de um ano para o ou-
do inóculo. A resistência genética é o méto- tro e de uma lavoura para outra, dependen-
do mais eficiente e econômico de controle do, também, da quantidade de inóculo pre-
da queima da folha do trigo. Na ocorrência sente. Em ataques severos, em condições de
de uma epidemia, a identificação de culti- lavouras foram observadas reduções de até
vares resistentes é bastante fácil, o que per- 40% no peso dos grãos das plantas infecta-
mite que os melhoristas possam eliminar as das, quando comparadas com as sadias. O
cultivares que são suscetíveis. A cultivar de agente causal da mancha estriada tem ati-
trigo Embrapa 15, por exemplo, é altamen- vidade nucleadora de gelo, podendo pro-
te suscetível a esta doença. piciar a sua formação entre temperaturas
de -10 ·C a O ·C, causando dano à cultura
Estria bacteriana (MOREIRA, 1994).
Xanthomonas campestris pv. undu/osa
Sintomas
Entre as doenças bacterianas que afe- A estria bacteriana ocorre em todos os
tam a cultura do trigo, destaca-se a es- estádios e em toda a parte aérea da planta,
tria bacteriana ou mancha estriada, causa- mas os sintomas mais comumente obser-
da por Xanthomonas campestris pv. undu/osa vados são foliares. Os sintomas nas folhas,
(Smith, jones & Reddy) Dye. A doença pas- geralmente, iniciam com manchas peque-
sou a ter mais importância à medida que o nas ou com estrias claras ou com estrias
cultivo de trigo avançou para áreas mais encharcadas, que se tornam amarelo ouro,
tropicais, onde as condições são mais favo- iniciando, frequentemente, do vértice para
ráveis para o desenvolvimento da doença. as pontas das folhas. Estas manchas desen-
No Brasil, a estria bacteriana ocorre volvem-se e formam estrias longitudinais
em todos os estados onde o trigo é cultiva- entre as nervuras, translúcidas quando ob-
do, mas é, comumente, assinalada nos esta- servadas contra uma fonte de luz artificial
dos do Paraná, Mato Grosso do Sul, Minas ou brilho do sol. Nas partes infectadas, os
Gerais e no Distrito Federal. Na Região Sul, sintomas progridem para a necrose do te-
em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, cido, com cores que variam entre mar-
a ocorrência da doença, com alguma seve- rom-claro, marrom-avermelhado e preto,
ridade, é restrita às regiões mais quentes e causando a morte das folhas. Com o orva-
úmidas (LUZ, 1982; LUZZARDIet al., 1983). lho, gotas de aparência leitosa, represen-
A disseminação, a severidade e as perdas tando o exsudato bacteriano, podem surgir
em rendimento de grãos são, frequente- na superfície das lesões. Quando seco, o ex-
mente, maiores nos anos em que, durante sudato apresenta-se como grânulos duros,
o desenvolvimento do trigo, a temperatura como filme ou em pequenos flocos (LUZ;
diurna é maior ou igual a 25 ·C, associada FERNANDES,1982).
a períodos longos (3 a 5 dias) de água livre Nas espigas, os sintomas aparecem so-
na superfície das folhas. Lavouras condu- mente quando a severidade da doença nas
2921 Trigo no Brasil

folhas for bastante acentuada. Os sintomas Controle


nas glumas aparecem como estrias escuras, O cultivo de trigo em áreas livres de
que se fundem, tornando as glumas comple- restos culturais de trigo ou de outras gra-
tamente escuras, de onde originou-se o no- míneas suscetíveis, associado ao uso de se-
me espiga preta (black chamo Os sintomas mente livre de X. campestris pv. undulosa,
nas espigas são de diagnose mais complica- são medidas preventivas de controle pa-
da, porque efeitos similares são causados por ra a estria bacteriana. Para a obtenção de
vários agentes, tais como: a) fungos necro- sementes sadias, são necessárias rigoro-
tróficos em trigo, como Cochliobolus sativus sas inspeções em campos de produção de
e Phaeosphaeria nodorum, que provocam rea- sementes, associadas a teste de sanidade
ções no colmo (Figura 5) e nas espigas, pro- em laboratório (LUZ; FERNANDES, 1982).
duzindo pigmentação de melanina; b) al- No Brasil, desconhece-se a reação de todas
gumas cultivares apresentam melanismo as variedades recomendadas, porém ante-
como caráter hereditário, desenvolvendo-o cipa-se que a grande maioria é suscetível,
sob condições ambientais como umidade embora possa haver diferenças no grau de
e temperaturas altas; c) alguns patovares suscetibilidade (MORElRA,1994).
de P. syringae induzem estrias similares a
X. campestris pv. undulosa nas espigas de tri- Doenças Fúngicas
go; e d) raios solares parecem estar, tam-
bém, envolvidos na produção de reações si- Giberela - Gibberella zeae
milares nas plantas de trigo.
A giberela, também conhecida como
Epidemiologia fusariose, afeta espigas de trigo e de outros
As fontes de inóculo e as condições cereais de inverno como cevada, triticale,
ideais para o desenvolvimento da estria centeio e aveia. Mundialmente, causa preju-
bacteriana são as mesmas descritas para a ízos econômicos, sociais e de saúde humana
queima da folha. e animal, devido à redução de rendimento e
de qualidade dos grãos e derivados. Em vá-
rios países, como Estados Unidos da Améri-
ca, Canadá, China, Japão, México, Paraguai,
Argentina e Austrália, dentre outros, exis-
tem relatos de perdas causadas por gibere-
Ia em trigo (PARRYet al., 1995; MCMULLEN
et al., 1997). No Brasil, existem referências
de danos que variaram de 14% (REIS et al.,
1996a) a aproximadamente 60% (LIMA et
al.,2006).
Os danos diretos ocasionados por gí-
berela são devidos ao abortamento de flo-
Figura 5. Estria bacteriana, causada por res ou à formação de grãos chochos, enru-
Xanthomonas campestris pv. undu/osa: reações gados, de baixo peso e reduzida densidade,
em colmos e espigas de trigo, produzindo pig- e que são perdidos em grande parte na ope-
mentação de melanina.
ração de trilha (REIS, 1988; OSÓRIO, 1992;
Trigo no Bra5il1293

McMULLEN; STACK, 1994; PARRY et al., pedúnculo inclusive, que adquire colora-
1995), reduzindo o rendimento da lavoura. ção amarronzada (REIS, 1988; PARRYet al.,
Os danos indiretos são causados pela redu- 1995). Às vezes, espigas afetadas por gíbe-
ção de amido, proteínas, celulose e hernice- rela evidenciam sintomas semelhantes aos
lulose (DEXTER;NOWICKI, 2003), além dos induzidos por brusone, ou seja, ocorre des-
grãos infectados e de seus derivados pode- coloração de todas as espiguetas da porção
rem ser tóxicos para seres humanos e pa- superior da espiga. Nesse caso, o ráquis da
ra animais, em decorrência da presença de espiga afetada por giberela apresenta co-
micotoxinas (substâncias tóxicas produzi- loração escura na região de espiguetas sa-
das por fungos). Algumas toxinas podem in- dias e os grãos oriundos da parte afetada da
duzir a vômitos e espasmos musculares no espiga apresentam os sintomas típicos de
homem e animais não ruminantes, como é giberela, ou seja, são chochos, enrugados
o caso do deoxinivalenol (vomitoxina). Ou- de coloração branco-rosada a pardo-clara
tras podem causar disfunção sexual repro- (UMA, 2004) (Figura 7). O tamanho do grão
dutiva, como a zearalenona (REIS, 1988; afetado varia em função do estádio de de-
McMULLEN; STACK, 1994). A presença de senvolvimento em que a espigueta foi in-
grão giberelado não significa existência de fectada (REIS, 1988; PARRYet al., 1995).
micotoxinas (McMULLEN;STACK,1994). Es-
tas, quando produzidas, tornam os grãos
menos palatáveis aos animais. A ocorrência,
o tipo e a quantidade de micotoxina depen-
dem de vários fatores, como: meio ambien- ~
B
te, espécies do fungo presente, severidade c
o
c,
da infecção e da cultivar ou tipo de produto. '"
"
ee
:;
o
'"
É
Sintomas ee

Os sintomas característicos são espi- ~


Figura 6. Giberela, causada por Gibberella zeae: ~
guetas despigmentadas, de coloração es- espigas de trigo com descoloração de espiguetas, "-<
branquiçada ou cor de palha, que contras- e sinais do patógeno.
tam com o verde normal de espiguetas
sadias (Figura 6) (REIS, 1988; OSÓRIO, 1992;
McMULLEN; STACK, 1994; PARRY et al.,
1995). As aristas de espiguetas afetadas des-
~
viam-se do sentido normal das aristas de "
E
o
c,
espiguetas não afetadas (UMA, 2004) e as '"
"':;ª
espigas adquirem o aspecto de arrepiadas g
É
(REIS, 1988). Em genótipos de trigos múti- '"
cos (espigas sem aristas) ou com aristas apí-
~
cais, a giberela é caracterizada somente pe- ~"
o
la descoloração de espiguetas (UMA, 2004). :;

Em genótipos muito suscetíveis ou em anos Figura 7. Giberela, causada por Gibberella zeae: ~
grãos de trigo chochos, enrugados e de coloração ~
em que as condições de ambiente são muito
branco-rosada a pardo-clara.
favoráveis, toda a espiga pode ser afetada,
2941 Trigo no Brasil

Em condições favoráveis, estrutu- Fusaríum spp. em cereais de inverno, com


ras (sinais) do patógeno são facílmente vi- isolados brasileiros obtidos no período de
sualízadas a olho nu. Algumas espigue- 1997 a 2000 (RIVADENEIRA, 2001), indicou
tas afetadas apresentam coloração salmão que 88% dos isolados enquadravam-se co-
(vermelho-alaranjada), em decorrência mo F. gramínearum.
da produção de macroconídios de Fusa-
rium gramínearum. Outros sinais do pató- Epidemiologia
geno podem ser observados nas espigas se- A giberela é uma doença monocíelica
cas, pela formação de pontuações escuras, (não ocorrem cíelos repetitivos de produ-
que são os peritécíos de G. zeae (REIS, 1988; ção de esporos nas espigas), mas sua se-
PARRYet al., 1995). veridade poderá aumentar rapidamente
com a invasão do micélío do fungo para
Etiologia outras espiguetas (SHANER, 2003). O inó-
A giberela é causada, principalmen- culo princípal é constituído por ascosporos
te, pelo fungo ascomiceto Gíbberella zeae e os restos de culturas são a princípal re-
(Schwein.) Petch, forma assexuada Fusa- serva de F. gramínearum, embora solo, se-
rium gramínearum Schwabe (PARRY et al., mentes e vários hospedeiros (gramíneas)
1995). Os ascosporos de G.zeae são hialinos, também sejam fontes de inóculo (SUTTON,
apresentam de O a 4 septos, medem 3-5 pm 1982). O patógeno também sobrevive em
x 17-25 pm, e são produzidos em número colmos velhos e espigas de milho e, con-
de oito em ascos elavados, em peritécíos forme Fernandez & Fernandes (1990), F.
superfícíais, de cor escura. F. graminearum gramínearum foi recuperado de restos cul-
produz fíálides laterais curtas e conídios turais de soja. O plantio direto favorece
falciformes de 2,5-5 um x 35-62 pm, com o aumento da doença, pois, neste siste-
3 a 7 septos (REIS, 1988; REIS; CASA, 2005), ma, a manutenção de restos culturais na
cuja cultura em meio BDA apresenta, ge- superfícíe do solo proporcíona a sobrevi-
ralmente, a cor rosa intensa (NELSON et vência do patógeno G. zeae, garantindo, as-
al., 1983). Além de F. gramínearum, pelo me- sim, inóculo em abundâncía (FERNANDES,
nos 17 espécíes diferentes têm sido asso- 1997).
cíadas à enfermidade em cereais em todo O ambiente exerce papel importante
o mundo. Na Europa, F. culmorum, F. qrami- no desenvolvimento de giberela, que é fa-
nearum e F. nívale têm sido relatadas como vorecída por condições de elevada umida-
as espécíes mais patogênicas e, no Méxi- de e temperatura (PARRY et al., 1995). As
co, foram registradas variações na frequ- condições mais favoráveis para a infecção
ência da ocorrência de F. gramínearum, são os períodos de alta umidade do ar (pre-
F. equisetí, F. avenaceum e F. nívale (IRETA; cípitação pluvial) durante 48-72 horas e
GILCHRIST, 1994). Na América do Norte, F. temperatura de 24 ·C a 30 ·C (McMULLEN;
gramínearum e F. culmorum são as espécies STACK, 1994). Esses mesmos autores rela-
mais comuns que causam giberela. No Bra- taram que a infecção também ocorre em
sil, F. gramínearum predomina entre as es- temperatura mais baixa, quando alta umi-
pécies que podem causar giberela, todavia dade persiste por períodos acíma de 72
F. avenaceum também foi relatado (REIS, horas. A giberela ocorre no Brasil, em tri-
1988). Estudo sobre a variabilidade de go, em regiões onde as condições preva-
Trigo no Brasil I 295

lecentes, a partir da espiga recém emer- (Tipo I); resistência à colonização subse-
gida, sejam de temperatura alta (20 ·C a quente do tecido após a infecção (Tipo 11);
25 ·C) e de precipitação pluvial de, no mí- resistência expressa no próprio grão (Ti-
nimo, 48 horas consecutivas (REUNIÃO..., po I1I); resistência ao acúmulo de micoto-
2008). Em períodos mais secos, como anos xinas (Tipo IV) e resistência de tolerân-
de ocorrência do fenômeno La Nina na Re- cia (rendimento) (Tipo V) (SCHROEDER;
gião Sul do Brasil, a giberela não é con- CHRISTENSEN, 1963; MESTERHÁZY, 1995;
siderada problema em trigo. Em anos de PARRY et al., 1995; MIEDANER, 1997). A
ocorrência de El Nino, as condições climá- resistência genética à giberela é governa-
ticas de temperatura e precipitação plu- da por vários genes (quantitativa/polígê-
vial acima da média são extremamente nica), sendo fortemente influenciada pe-
favoráveis à ocorrência da doença. Como lo ambiente.
a giberela pode ocorrer a partir do espi-
gamento, e este, na Região Sul do Brasil, Brusone - Magnaporthe oryzae
ocorre na estação da primavera, pode-se
dizer que anos de primavera mais chuvo- O fungo Magnaporthe oryzae ataca di-
sa e com temperatura mais elevada são versas espécies de gramíneas, mas tem co-
anos de intensa ocorrência de giberela, mo hospedeiro principal o arroz (Oryza
e anos de primavera fria e mais seca são sativa L.), no qual causa a doença denomi-
anos em que a giberela não é problema nada de brusone. No Brasil, M. oryzae tam-
(LIMA,2004). bém causa a brusone do trigo, produzindo
elevados danos na cultura, principalmen-
Controle te nos Estados de Mato Grosso do Sul, Ma-
Medidas de controle como rotação de to Grosso, São Paulo e Goiás e no norte do
culturas e o uso de fungicidas têm sido pou- Paraná (IGARASHI et al., 1986; GOULART;
co eficazes (PARRYet al., 1995; FERNANDES, PAIVA, 1992, 2000; ANJOS et al., 1996).
1997). Escalonamento da época de semeadu-
ra de trigo e uso de cultivares de ciclos repro- Sintomas
dutivos diferentes podem minimizar os da- O sintoma mais conhecido da bruso-
nos causados por giberela (LIMAet al., 2002). ne do trigo ocorre nas espigas. Geralmente
O desenvolvimento de cultivares resisten- ocorre o branqueamento completo da espi-
tes tem se intensificado em alguns países ga a partir do ponto de penetração do pató-
como México, Canadá, Estados Unidos, geno no ráquis (Figura 8). Neste local, ocor-
Japão, China (PARRY et al., 1995) e Bra- re a interrupção da translocação de água e
sil (LIMA et al., 2000). A seleção de genó- de nutrientes na espiga, o que facilita a sua
tipos para resistência genética às doenças desidratação e impede o pleno enchimento
exige precisão nos testes fenotípicos. No dos grãos, deixando-os chochos. A principal
caso de giberela, inúmeras medições da característica dos grãos produzidos em es-
doença têm de ser feitas, pois existem vá- pigas de trigo que foram infectadas por M.
rios tipos de resistências e estas expres- oryzae é a sua mal-formação, apresentando
sam-se diferentemente. Mencionam-se graus variados de chochamento. Os sinto-
pelo menos cinco tipos em relação à gi- mas nas glumas são lesões ovaladas, de cen-
berela: resistência à infecção inicial tro claro e bordos castanhos. Nas bainhas
2961 Trigo no Brasil

(ou, 1985). Esses conídios são piriformes,


obclavados, de base circular e ápice fino,
podendo ser hialinos ou levemente escuros,
com pequeno hilo na base. Medem 17 J..Lm a
23 J..Lmde comprimento por 8 J..Lm a 11 J..Lm
de largura e, quando estão maduros, pos-
suem tipicamente três células (PRABHU;
FILIPPI, 2006). Até 1999, a recombinação
sexual do patógeno havia sido obtida so-
mente artificialmente, em condições de la-
boratório. Trabalhos realizados por Kumar
et al. (1999) sugeriram, entretanto, a exis-
tência de populações do fungo na Índia que
Figura 8. Brusone em trigo, causada por Magna-
teriam sido originadas de recombinações
porthe oryzae: A) sítio de penetração de M. oryzae
em ráquis de espiga de trigo (seta); B) branque- sexuais ocorridas naturalmente.
amento completo de espigas acima do ponto de
penetração do patógeno (seta). Epidemiologia
A maior intensidade de brusone na cul-
tura do trigo está diretamente relacionada à
e colmos, os sintomas são bastante simila- ocorrência de condições climáticas favorá-
res aos verificados nas glumas. Nas folhas, veis, especialmente a períodos prolongados
as lesões apresentam o formato elíptico, de chuvas durante o espigamento. Inocula-
com o centro variando de branco a mar- ções realizadas em espigas demonstraram
rom-claro e com as margens apresentando que são necessárias, pelo menos, 10 h de mo-
a coloração marrom-escura. Estas lesões ge- lhamento para que a infecção do patógeno
ralmente são esporulativas, ou seja, sob con- ocorra e que a temperatura mais adequada
dição ambiental adequada, pode ocorrer a para o desenvolvimento do fungo é de 25 ·C
formação de corpos de frutificação do fun- (CARDOSO,2006).
go. O que tem sido verificado, entretanto, é Urashima et al. (2007), utilizando iso-
que dificilmente esse tipo de sintoma ocorre lados de M. oryzae do triticale, determina-
nas folhas de plantas de trigo em condições ram que esporos do fungo podem ser dis-
de lavoura. seminados por até 1.000 m a partir de uma
fonte de inóculo primária da doença. Gou-
Etiologia lart et al. (1995) registraram baixa taxa de
O agente causal da brusone do trigo infecção do patógeno em sementes de tri-
é o fungo Magnaporthe oryzae Couch, cujo go. Ao se analisar 2.238 amostras de se-
estádio anamorfo é Pyricularia oryzae Ca- mentes produzidas entre os anos de 1987
vara que foi descrito em 2002 a partir de e 1992 no estado do Mato Grosso do Sul,
Magnaporthe oryzae (Hebert) Barr (Couch apenas 0,8% das mesmas estava infecta-
e Kohn, 2002). Trata-se de um fungo com da com o patógeno. Mesmo assim, deve-se
grande capacidade de esporulação, sendo considerar que as sementes também cons-
que M. oryzae do arroz é capaz de produ- tituem importante veículo para dissemi-
zir 2.000 a 6.000 conídios em duas semanas nação do fungo. A transmissão do pató-
Trigo no Brasil 1 297

geno para folhas primárias e coleóptilos cia, a utilização de sementes sadias, o tra-
de plântulas a partir de sementes infecta- tamento de sementes, a escolha da melhor
das foi demonstrada por Goulart e Paiva época de plantio (evitar a coincidência de
(1990), tendo sido observada uma taxa de condições favoráveis à doença por ocasião
transmissão de, aproximadamente, 3,5:1. do espigamento do trigo), a rotação de cul-
Sob condições de temperatura ambiente, turas, a eliminação de hospedeiros alterna-
a completa inviabilidade do patógeno em tivos do patógeno e a utilização de fungí-
sementes de trigo ocorre em um período cidas na parte aérea das plantas. Existem,
que pode variar de 12 meses a 22 meses entretanto, algumas dificuldades que im-
(GOULARTet al., 1990; LASCAet al., 1991; pedem que as medidas mencionadas acima
REIS et al., 1995). possam apresentar sucesso completo para
Muitas espécies de Pyricularia ocor- controlar a brusone do trigo. Uma delas é o
rem na natureza como agentes patogêni- fato do fungo M. oryzae apresentar uma am-
cos em mais de 80 gêneros de plantas, es- pla faixa de hospedeiros, dificultando o êxi-
pecialmente das famílias commelinaceae, to da rotação de culturas no controle da do-
Cyperaceae, Poaceae e Zingiberaceae (PUCHIO; ença (ANJOSet al., 1996; KATOet al., 2000).
MUCHOVEJ,1994). No caso de M. oryzae, sa- A inconsistência no desempenho dos
be-se que este patógeno apresenta ampla fungicidas aplicados na parte aérea das
faixa de hospedeiros (ataca mais de 50 es- plantas sempre foi apontada como um dos
pécies de gramíneas) (ANJOS et al., 1996). principais problemas associados a essa es-
Neste sentido, a real capacidade que os hos- tratégia para controlar a doença. O máxi-
pedeiros alternativos representam como mo de proteção relatada, em torno de 50%,
fontes de inóculo para M. oryzae constitui-se é reduzido drasticamente quando ocor-
em um tema bastante investigado no Brasil. rem condições climáticas muito favorá-
plantas das espécies Brachiaria plantaginea e veis à doença (GOULART; PAIVA, 1991,
Setaria geniculata possivelmente influenciam 1993; IGARASHI;OLIVEIRA, 1991). A dispo-
a ocorrência da brusone na cultura do trigo, nibilização de fungicidas contendo os prin-
hipótese esta fundamentada pelo sucesso da cípios ativos dos grupos químicos triazol e
inoculação cruzada feita entre isolados de M. estrobilurina tem gerado a expectativa de
oryzae obtidos de trigo e das duas espécies de que o sucesso no controle da doença seja
plantas daninhas acima citadas (URASHIMA; maior. Por exemplo, Dalla Nora et al. (2006)
KATO, 1998). Além disso, estudos sobre a com- demonstraram que, utilizando estas mistu-
patibilidade reprodutiva do fungo demons- ras, é possível obter níveis superiores a 90%
traram que isolados obtidos de B.plantaginea no controle da brusone em situações de al-
e S. geniculata podem produzir estruturas ta severidade da doença (45,8% de severi-
reprodutivas (peritécios) quando submeti- dade nas parcelas sem controle químico).
dos aos cruzamentos com isolados de trigo Embora o uso de cultivares resistentes à
(BRUNO;URASHIMA,2001). brusone seja a alternativa economicamente
mais viável para controlar a doença, o baixo
Controle nível de resistência apresentado pelas culti-
O controle da brusone do trigo requer vares atualmente indicadas para cultivo no
a integração de medidas, como o plantio Brasil tem tornado essa medida pouco eficaz
de variedades com maior nível de resistên- (URASHIMAet al., 2004). Assim, a obtenção
2981 Trigo no Brasil

de cultivares de trigo com níveis adequados Walker, ascomiceto membro da família


de resistência à brusone tem se constituído Magnaporthaceae. No tecido do hospedei-
em uma preocupação muito grande por par- ro, este fungo produz peritécios escuros,
te dos programas de melhoramento de trigo com ZOOum 400 um de diâmetro e erup-
existentes no país. Nesse sentido, Urashima tivos a partir da bainha das folhas inferio-
e Kato (1994) demonstraram que a espécie res. O comprimento do pescoço ostiolar
de gramínea Aegilopssquarrosa apresenta um varia de 150 }lm 300 }lm. Os ascosporos são
grande potencial para servir como fonte de hialinos, delgados, com três a sete septos
resistência à doença, caso venha a ser utili- e com dimensões de 3-4 }lm x 70-100 11m
zada no processo de geração de cultivares de (ALEXOPOULOSet al., 1996).
trigo em cruzamentos interespecíficos.
Epidemiologia
Mal-do-pé
Esta doença é mais conhecida pe-
Gaeumannomyces graminis varotritici
los danos que provoca na cultura do tri-
go, embora ocorra também em cevada,
É considerada a principal doença de
triticale, centeio e outras plantas da fa-
raízes da cultura do trigo em todo o mundo
mília Poaceae (NILSSON; SMITH, 1981). A
(FREEMAN;WARD, Z004). No Brasil, ocorre
ordem decrescente de suscetibilidade en-
basicamente na Região Sul, sendo muito as-
tre as gramíneas de importância agrí-
sociada com a prática de mono cultura.
cola é a seguinte: trigo, triticale, cevada
e centeio. Solo sob baixas temperaturas
Sintomas
(1z -c a ZO De),alcalinos (pH 6,5 a 8,5) e/ou
Inicia como uma podridão de raízes,
mal-drenados e excesso de chuvas são con-
e afeta a parte aérea das plantas, causan-
dições que favorecem a doença (REIS et al,
do redução do tamanho e morte prematu-
1983; eOOK et al., 1995). O fungo sobrevi-
ra das mesmas. As espigas tornam-se es-
ve de um ano para o outro em restos cul-
branquiçadas e não há o enchimento dos
turais do trigo ou em plantas vivas de ou-
grãos. Os primeiros sintomas do mal-do-pé
tros hospedeiros.
ocorrem nas plântulas. Se as plantas não
morrerem nos estádios de crescimento, o
perfilhamento será deficiente, com lesões Controle
pretas que se desenvolvem nas raízes e se Os programas para obtenção de culti-
estendem até a coroa da planta (Figura 9). vares resistentes ao mal-do-pé nunca obti-
Hifas fúngicas escuras são visíveis ao lon- veram sucesso, apesar do enorme esforço
go dos tecidos das raízes. As plantas com para se encontrar alguma fonte de resis-
sintomas da doença normalmente ocorrem tência a essa doença (eOOK et al., 1995).
em reboleiras (Figura 10) e, quando puxa- Rotação de culturas é a melhor forma de
das do solo, são arrancadas com facilida- controle, evitando-se espécies suscetí-
de, devido ao sistema radicular deficiente. veis por um ou dois anos (SeOTT, 1981).
As aveias são indicadas como culturas de
Etiologia rotação, além de espécies como ervilha-
O mal-do-pé é causado pelo fun- ca, serradela, canola, tremoço e nabo for-
go Gaeumannomyces graminis var. tritici J. rageiro. Trabalhos realizados na Euro-
Trigo no Brasil I 299

Figura 10. Mal-do-pé, causado por


Figura 9. Mal-do-pé, causado por Gaeumannomyces Gaeumannomyces graminis var. tritici: reboleira
graminis var. tritici: podridão de raízes, com escu- de plantas de trigo com morte prematura, exibindo
recimento do tecido. espigas esbranquiçadas.

pa e nos Estados Unidos relatam que, nos rigado nas regiões Centro-Oeste e Sudes-
chamados solos supressivos, pode ocor- te. A redução no rendimento de grãos varia
rer a redução da ocorrência do fungo, di- entre 10% e 62%, porém, na média de anos
minuindo os danos que o mal-do-pé pode normais de ocorrência da doença, perma-
causar na lavoura. Um dos principais com- nece entre 5% a 8% (CUNFER, 2002). Os ní-
ponentes associados aos solos supressivos veis de perdas dependem do local, do clima,
são os antagonistas naturais ao fungo G. da suscetibilidade da cultivar e do estádio
graminis var. tritici. em que a doença incide. Os principais com-
ponentes de rendimento afetados são o nú-
Oídio mero de espigas por área (quando a doença
Blumeria graminis f. sp. tritici ocorre em estádios iniciais de desenvolvi-
mento do trigo) e o número e tamanho de
o oídio, ou cinza, é uma das primeiras grãos por espiga (quando ocorre em fases
doenças foliares do trigo, ocorrendo desde mais tardias). Diminui em 7,5% o conteúdo
o início da estação de cultivo. Está presen- de amido e de proteína dos grãos. A respi-
te em todas as regiões tritícolas do mun- ração da planta afetada aumenta conside-
do, especialmente naquelas localizadas sob ravelmente, o que leva a desajustes fisio-
clima temperado. No Brasil, é encontrado lógicos e à diminuição do vigor e do porte
na Região Sul e em lavouras sob sistema ir- (MARTINELLI,2001).
300 I Trigo no Brasil

Sintomas co ao trigo. Os conídios são unicelulados,


A superfície da planta de trigo, princi- ovais e hialinos, de dimensões variando en-
palmente em folhas e em bainhas, fica reco- tre 8 um a 35 um. São produzidos basipe-
berta por micélio, conidíóforos e conídíos talmente em cadeias longas, sobre conidió-
de aparência pulverulenta, com coloração foros curtos e simples. Os cleistotécios são
branca, quando jovem (Figura 11), à cinza, escuros, com dimensões entre 135 um a Z80
quando envelhece. A doença ocorre prin- um de diâmetro, formados dentro da massa
cipalmente em folhas inferiores, mas pode de micélio envelhecido.
causar crestamento de folhas superiores,
espigas e aristas de cultivares suscetíveis Epidemiologia
(CUNFER, zooz). Tecidos foliares infectados O fungo é um parasita obrigatório (bio-
tornam-se amarelados, com o desenvol- trófico), que age de forma a não matar ra-
vimento da doença. Quando severamente pidamente seu hospedeiro. O inóculo pri-
atacadas, as folhas colapsam e caem. Pe- mário mantém-se, na entressafra, sobre
quenos pontos escuros, que são estruturas plantas voluntárias de trigo, sendo dis-
reprodutivas chamadas cleistotécios, po- seminado pelo vento ou, em regiões mais
dem ser observados no interior da massa quentes, pode hibernar como micélio dor-
de micélio. Na época de colheita de trigo, mente ou ativo. A germinação, a infecção e
os cleistotécios normalmente estão vazios, a produção de novos conídios são comple-
sem ascos poros, já que necessitam de vá- tadas entre 5 e Z5 dias, o que leva à ocor-
rios meses para desenvolver os ascósporos. rência de muitos ciclos consecutivos da
doença, em uma safra. A germinação dos es-
Etiologia poros é favorecida por temperaturas ame-
A doença é causada por Blumeria graminis nas e pela ausência de água livre. O maior
(DC)E.O. Speer f. sp. tritici Em. Marchal (sin. desenvolvimento da doença ocorre entre
Erysiphe graminis DC f. sp. tritici Marchal) 15°C e ZO"C, e o patógeno não tolera tem-
(CABI, Z008), patógeno altamente específi- peraturas próximas a 30°C. O oídio supor-
ta condições secas, embora a umidade re-
lativa para ocorrer a germinação esteja em
torno de 100%, mas a água livre é limitan-
te. Os primeiros sintomas da doença apare-
cem, aproximadamente, cinco dias após a
inoculação, caracterizando-se por amarele-
cimento, cloros e e/ou necrose dos tecidos.
Embora o aparecimento precoce da do-
ença, na estação de cultivo, seja, muitas ve-
zes, seguido por severa epidemia, há anos
em que não alcança seu máximo potencial
de danos. Em climas temperados, como na
Figura 11. Oídio, causado por Blumeria graminis Região Sul do Brasil, temperaturas muito
f. sp. tritici: folhas e colmas de trigo com esporu- baixas ou longos períodos de chuvas, no ou-
lação do patógeno.
tono, retardam a epidemia.
Trigo no 6ra5il1301

Controle Carvão-da-espiga
O uso de cultivares de trigo com resis- Ustilago nuda f. sp. tritici
tência genética é a forma preferencial de
controle de oídio. Como o fungo desenvol- O carvão da espiga ocorre mundial-
ve biótipos, pode tornar-se capaz de ínfec- mente, em áreas tritícolas de clima úmido e
tar cultivares consideradas resistentes em semiúmido, e é considerado uma doença de
anos anteriores. Em avaliações de efetiví- pouca importância econômica. Porém, da-
da de de genes de resistência de trigo, atra- nos na produção de 27% até 40%já foram re-
vés da análise de várias populações de oí- gistrados. Geralmente, sua ocorrência é es-
dío coletadas no Brasil, tem-se observado porádica e restrita a cultivares suscetíveis
que apenas o gene Pm4a mantém-se efeti- em lavouras formadas com sementes não
vo a todas as populações de B. graminis f. tratadas (REIS;CASA,2005; LIPPS, 2007).
sp. tritici (COSTAMILAN;LINHARES, 2002;
COSTAMILANet al., 2007). Sintomas
O controle químico de oídio de trigo Grãos e glumas de espigas das plantas
em cultivares suscetíveis é mais econômi- desenvolvidas a partir de semente infecta-
co via tratamento de sementes com fungí- da são transformados em massa de esporos
cidas sistêmicos do que por meio de apli- (teliosporos), de coloração marrom-escura
cação de fungicidas nos órgãos aéreos. a preta (Figura 12), que facilmente é remo-
Triadimenol aplicado em sementes confe- vida pelo vento, deixando apenas o ráquis
re proteção de 45 a 60 dias após a emergên- preso à planta.
cia (REIS; CASA, 2005). Para aplicação fo-
liar, o monitoramento do desenvolvimento Etiologia
da doença deve iniciar a partir do afilha- Ustilago nuda f. sp. tritici Schaffnit. Sino-
mento. A pulverização de fungicida deverá nímia: Ustilago nuda varo tritici G.W. Fisch. &
ser realizada quando a incidência foliar for c.G. Shaw, Ustilago tritici C. Bauhin, Ustilago
de 15% a 25%, a partir do estádio de alon- vaviloviJacz (CABI,2008).
gamento, ou através do cálculo do limite U. nuda f. sp. tritici é um basidiomiceto.
de dano econômico (LDE).Os fungicidas do Produz micélio hialino a amarronzado e teli-
grupo dos triazóis são eficientes no contro- ósporos de coloração pardo-oliváceo a mar-
le da doença (REUNIÃO..., 2008). rom, medindo 5 um a 10 um de diâmetro.
A rotação de culturas não é efetiva pa-
ra controle de oídio. Entre todos os nu- Epidemiologia
trientes, o nitrogênio parece ter efeito mais A doença é monocíclica, ou seja, em um
consistente e direto sobre o incremento da ano ocorre somente um único ciclo da do-
doença, pois sua adição, em qualquer está- ença. As espigas das plantas infectadas ge-
dio de desenvolvimento do trigo, aumen- ralmente emergem antes que as espigas
ta a suscetibilidade. Semeaduras mais pre- das plantas sadias. As plantas são infecta-
coces podem diminuir os danos da doença, das apenas durante o florescimento, pelos
pois as plântulas ficam expostas a menores esporos levados pelo vento, pela chuva ou
quantidades de inóculo justamente no es- por insetos. Chuvas leves ou orvalho e tem-
tádio de desenvolvimento mais suscetível à peratura entre 15 ·C e 22 ·c favorecem a in-
doença (MARTINELLI,2001; CUNFER,2002). fecção. O patógeno sobrevive e é transmiti-
3021 Trigo no Brasil

do em sementes, onde se mantém na forma Cárie comum


de micélio dormente, no embrião. Com a Tilletia caries e T. laevis
germinação destas sementes, as plantas de-
senvolvem-se normalmente e o fungo ini- A cárie, popularmente conhecida co-
cia o seu crescimento intra e intercelular- mo carvão fedorento ou grão de ponta pre-
mente no meristema apical da planta, até ta, é conhecida desde a antiguidade e sua
o início do emborrachamento e espigamen- etiologia foi descrita nos clássicos traba-
to, quando todos os tecidos da inflorescên- lhos de Tillet em 1755 e Prevost em 1807
cia são infectados e destruídos, com exce- (BAUMGART,1977). Já foi considerada uma
ção do ráquis. No lugar das inflorescências, das mais graves moléstias do trigo, como
são formadas massas pulverulentas de te li- atestam os relatos citados por Baumgart
ósporos, dispersadas pelo vento e gotas de (1977): em 1890, aproximadamente me-
chuva, infectando flores de plantas sadias. tade dos trigais do Kansas (Estados Uni-
Esta infecção pode ocorrer em até uma se-
dos da América) foi destruída por efeito da
mana após o início da floração, sob tem-
cárie; na Argentina, entre 1954 e 1955, de
peraturas de 14°C a 25°C e alta umidade
12% a 40% do trigo fiscalizado apresenta-
(REIS;CASA,2005; LIPPS, 2007).
va ataque por cárie. No Brasil, a cárie teve
uma importância secundária (BAUMGART,
Controle
1977), mas a preocupação com sua presen-
O uso de cultivares resistentes é o mé-
ça e prejuízos decorrentes foi assinalada
todo ideal de controle. O tratamento de se-
em trabalhos da década de 50. Em consequ-
mentes com fungicidas sistêmicos e empre-
ência da adoção do tratamento de semen-
go de sementes sadias também são práticas
tes, a cárie praticamente desapareceu dos
recomendadas (REIS; CASA,2005).
trigais no Brasil (BAUMGART,1977). Além
da cárie comum que ocorre no Brasil, ou-
tras duas formas de cáries, causadas por T.
indica (kamal bunt) e T. controversa (dwarf
bunt), causam prejuízos em outros países.

Sintomas
A cárie do trigo pode ser reconheci-
da pelo mau cheiro dos grãos e por trans-
formar o interior do grão em um pó pre-
to. O mau cheiro, que lembra o de peixe
podre e que deu origem ao nome popular
de carvão fedorento, resulta da liberação
de trimetilamina. Quando a incidência da
doença é alta, o cheiro denuncia a presen-
ça da cárie na lavoura, antes que a mes-
ma se torne visível (BAUMGART,1977). As
Figura 12. Espiga de trigo com carvão, causado plantas doentes tendem a ser ligeiramen-
por Ustilago nuda f. sp. tritici.
te mais baixas do que as saudáveis. As es-
Trigo no Brasil I 303

pigas, quando afetadas pela cane, per- e umidade no solo (PICININI; FERNANDES,
manecem verdes por mais tempo, sendo 1998). Nessas condições, quando as se-
menores e mais eretas do que as sadias. As mentes infestadas são plantadas, os espo-
espigas atacadas apresentam-se arrepia- ros germinam e, no caso da cárie comum,
das, pois as glumas afetadas formam um o fungo normalmente infecta a planta pe-
ângulo maior do que as glumas das espigas lo coleóptilo. O fungo desenvolve-se com a
normais. As espiguetas abrem-se, devido planta até que, durante a formação das se-
às sementes que ficam cheias de telióspo- mentes, há invasão das células e formação
ros, e tornam-se oleosas e verde-escuras. de teliosporos em seu lugar.
Os grãos de trigo tornam-se escuros (par-
do-acinzentados, em contraste com a co- Controle
loração amarela-dourada ou avermelhada A forma mais utilizada e eficiente de
dos grãos sadios) (Figura 13). Durante a co- controle da cárie do trigo é o tratamento
lheita do trigo, há a liberação de teliospo- de sementes com fungicidas.
ros, formando uma nuvem escura, devido
à coloração dos esporos. Ocasionalmente,
em uma espiga pode-se encontrar grãos
sadios junto aos grãos doentes (PICININI; ~================~ "§
"O

~
FERNANDES,1998). u..
o
~g
=s
ee
Etiologia ~
Duas espécies de basidiomicetos (or-
dem Ustilaginales) são responsáveis pela
cárie comum: Tílletia caries (D.e.) Tul e Til-
letia laevis Kühn. T. caries tem teliosporo de
14]..lma 24 um, de cor amarela pálida a cin-
za ou marrom-avermelhada, formato glo-
boso a subgloboso, com ornamentação re-
ticulada de 0,5 um a 1,5 um de altura. T.
laevis tem teliosporo de 14 ]..lma 22 um, de
cor marrom oliváceo e formato globoso ou
ovoide a elongado e ornamentação lisa.

Epidemiologia
A disseminação da doença ocorre du-
rante a colheita, quando os teliosporos são
liberados e dispersos pelo vento. Os grãos
cariados podem liberar os teliosporos du-
rante a trilha, permitindo a contaminação
das sementes sadias. São consideradas con- Figura 13. Cárie, causada por Tilletia caries e T
dições propícias à germinação dos telios- laevis: grãos sadios (acima); grãos escurecidos
(abaixo) devido à cárie.
poros temperaturas frias, entre 5 O( a 15 0(,
3041 Trigo no Brasil

Manchas foliares por fungicidas, mas a utilização desses quí-


micos é, em muitos casos, considerada an-
A cultura do trigo é afetada por um tieconômica e ambientalmente indesejável.
grupo de fungos que causa manchas fo- Devido ao plantio direto propiciar condi-
liares. A distinção dos agentes etiológicos ções adequadas à sobrevivência desses fun-
em alguns casos é difícil, pois os sintomas gos, o manejo cultural é medida indispen-
produzidos são semelhantes. Os patóge- sável no sistema.
nos responsáveis por manchas foliares de
importância econômica no Brasil são: Mancha amarela
a) Pyrenophora tritici-repentis (Died.)Drechs, Pyrenophora tritici-repentis
cujo anamorfo é Drechslera tritici-repentis
(Died.) Shoemaker; A mancha amarela, causada por P.
b) Cochliobolus saiivus (Ito & Kurib) Dreschler tritici-repentis, é a mancha predominante
ex Dastur, anamorfo Bipolaris sorokiniana no Rio Grande do Sul, sendo favorecida pe-
(Sacc.) Shoemaker [Anamorfo]: lo sistema de plantio direto, que propicia a
c) Phaeosphaeria nodorum (E. Müll.) Hedjar, sobrevivência e a multiplicação do patóge-
anamorfo Stagonospora nodorum (Berk.) E. no, e pelas condições climáticas da região,
Castell. e Germano. ideais para a multiplicação do mesmo.
Estes três fungos causam, respectiva-
mente, a mancha amarela, a mancha mar- Sintomas
rom e a mancha da gluma. Devido às con- O sintoma mais característico é o que
dições climáticas mais favoráveis a cada dá nome à doença, ou seja, a mancha ama-
patógeno, a mancha marrom é mais impor- rela. Nas folhas, aparece geralmente nos
tante no estado do Paraná e Região Cen- estádios iniciais da planta, formando le-
tro-Oeste, em relação às demais manchas, sões ovaladas ou oblongas, amareladas ou
que ocorrem com maior frequência no Rio de aspecto bronzeado, que coalescem, tor-
Grande do Sul. As perdas são variáveis, de- nando-se de coloração marrom-clara a
pendendo da suscetibilidade da cultivar, marrom-escura (Figura 14). No centro das
do manejo cultural e do ano de ocorrên- manchas, sob condições de alta umidade,
cia. Para o complexo envolvendo as man- são observados os conidióforos do fungo,
chas amarela e marrom, há relatos de da- de coloração marrom-escura. Dependendo
nos variando entre 20% a 30% e, em anos da cultivar, pode-se observar maior ou me-
chuvosos, especialmente na fase de enchi- nor clorose e necrose, devido à ação de toxi-
mento de grãos, perda total foi observada nas específicas do patógeno, como PtrToxA,
(DUVEILLERet al., 2005). No caso específi- que causa necrose, e PtrToxB ou PtrToxC,
co de mancha amarela, há relatos no Bra- que causam clorose (FERNANDES;PICININI,
sil de danos de até 48% (REIS; CASA, 2007). 1999; MANNING;CIUFFETTI,2005).
Os fungos listados acima são necrotró-
fícos e, diferentemente dos biotróficos, co- Etiologia
mo ferrugens e oídio, matam o tecido da A doença é causada por P. triiici-repen-
planta ao iniciar o processo de coloniza- tis (Died) Drechs (inóculo primário) e seu
ção. Além disso, não são tão bem controla- anamorfo Drechslera tritici-repentis (Died)
dos com cultivares resistentes quanto o são Shoemaker (inóculo secundário). Sobre fo-
Trigo no Brasil130S

lhas sintomáticas, pode-se verificar, sob período de molhamento foliar superior a 30


microscópio estereoscópico ou ao micros- horas. No entanto, 12 horas de molhamen-
cópio ótico, estruturas de D. tritici-repen- to são suficientes para que sintomas seve-
tis, que são caracterizadas por conidióforos ros sejam observados em cultivares susce-
escuros, eretos, solitários ou em pequenos tíveis. É um fungo necrotrófíco, portanto
grupos. As dimensões dos conídios variam com capacidade de sobreviver em restos
em torno de 80 11ma 250 11mde comprimen- culturais, formando estruturas de repro-
to por 14 11ma 20 11mde largura, com núme- dução sexuada, que são os pseudotécios. No
ro de septos variável entre 5 a 8, podendo sistema de plantio direto, os pseudotécios
germinar a partir de qualquer célula, sen- liberam ascos poros, que são responsáveis
do a célula basal reconhecida pelo forma- pela infecção primária. Durante o desen-
to semelhante ao de uma cabeça de cobra. volvimento da cultura, sob condições favo-
Em meio V8-ágar, o micélio tem aparên- ráveis e sem adoção de controle químico,
cia branca a cinza esverdeada, sem a for- conidióforos e conídios são formados sobre
mação de conídios. Para tal, é necessário o as lesões e iniciam o ciclo secundário da do-
cultivo do fungo em uma sequência de pe- ença (ORABI et aI., 2002; BACALTCHUKet
ríodos claros e escuros e temperatura con- al., 2006; McMULLEN,2008).
trolada. Embora no Brasil a mancha amare-
la tenha sido diretamente relacionada ao
Epidemiologia plantio direto, devido às características
As condições climáticas ideais para o de sobrevivência do patógeno na palha, há
desenvolvimento do patógeno no hospe- uma hipótese de que a importância de D.
deiro são temperatura entre 18°C e 28°C e tritici-repentis, além da questão de manejo,
seja devida à alteração genética do fungo.
O gene que codifica a toxina PtrToxA, im-
portante no processo de patogenicidade, foi
transferido horizontalmente de S. nodorum,
provavelmente em período imediatamente
anterior a 1941, quando a mancha amare-
la foi relatada nos Estados Unidos. A partir
de então, D. tritici-repentis tornou-se impor-
tante patógeno também em outros conti-
nentes, ocorrendo na Austrália e África,
sendo favorecido também pelo plantio dire-
to (FRIESENet aI., 2006). Esse gene de pato-
genicidade interage de forma gene-a-gene
com Tsnl que confere sensibilidade à plan-
ta. PtrToxA não é a única toxina envolvida
no processo de patogenicidade, mas sim a
Figura 14. Mancha amarela em trigo, causada por mais bem caracterizada e estudada. Existem
Pyrenophora tritici-repentis: manchas necróticas
ainda pelo menos mais duas toxinas envol-
em folhas de trigo, circundadas por halo amarelo.
vidas: PtrToxB e PtrToxC.
3061 Trigo no Brasil

Controle as últimas folhas no estádio de grão leito-


Devido à importância dos restos cul- so (REES et al., 1981).
turais na sobrevivência do fungo, uma das
mais importantes medidas de controle pa- Mancha marrom
ra esta doença está no manejo, com o ob- Cochliobolus sativus
jetivo de eliminar estruturas do patógeno.
Sendo assim, a primeira medida a ser toma- A mancha marrom, causada por C.
da é a rotação de culturas. Recomendam-se sativus, é mais importante em regiões mais
duas safras de inverno seguidas sem trigo, quentes e de alta umidade relativa dos tró-
a fim de obter redução satisfatória do pató- picos e subtrópicos. Dependendo do ataque
geno na palha do trigo (BACALTCHUKet al., da doença, perdas totais podem ocorrer.
2006). Entretanto, este fungo pode sobrevi- A mancha marrom pode ocorrer em qual-
ver em restos culturais de cevada, deven- quer parte ou estádio de desenvolvimento
do-se evitar este cereal como alternativa na da planta de trigo.
rotação com o trigo. Uma boa opção como
não-hospedeiro é aveia, que também não é Sintomas
hospedeira de outros patógenos importan- Os sintomas da mancha marrom ini-
tes do trigo. Em regiões onde não se pratica ciam-se com pequenas manchas ovais, de
o plantio direto, o enterrio de restos tam- coloração marrom-escura a negra, em folhas
bém funciona como medida de controle. (Figura 15), bainhas e colmos. Com o pro-
Em situações de grande potencial de inó- gresso da doença, as lesões tornam-se elíp-
culo, se empregada uma cultivar altamen- ticas e sobre estas há abundante esporula-
te suscetível, o uso de fungicidas é indis- ção do fungo, de coloração castanho-escura,
pensável. Nos Estados Unidos da América, o que dá uma aparência negra às lesões
o uso de fungicidas é recomendado, devido (PRATES; FERNANDES, 2001). Pontuações
à relação custo-benefício, apenas quando o pretas nas sementes e necrose em plântulas
potencial de produção da lavoura seja de, podem ocorrer (DUVEILLER;ALTAMIRANO,
ao menos, 3.300 kg/ha, quando os sintomas 2000). Sob condições favoráveis, a doença
não tenham atingido a folha bandeira e o ataca nós e entrenós, provocando estran-
clima seja favorável ao desenvolvimento da gulamento e matando a planta. O fungo
doença (YOUNG, 1998). No Brasil, indica-se pode atacar também a espiga, atingin-
a aplicação de fungicidas para o controle do as glumas, lemas, páleas e o ráquis. Os
do complexo de manchas foliares quando grãos atingidos ficam enrugados e, conse-
a incidência foliar atingir 70%. No caso de quentemente, com menor peso, apresen-
mancha amarela, por ser mais agressiva, tando sintoma de escurecimento conhe-
indica-se o uso do controle químico no apa- cido como "ponta-preta" (FERNANDES;
recimento dos sintomas (REUNIÃO..., 2008). PICININI, 1999).
Uma fórmula rápida para estimar
as perdas em decorrência dessa doen- Etiologia
ça é dada pela equação: P = 0,26X, sendo A mancha marrom é causada por B.
P = porcentagem de perda na produção sorokiniana (Sacc.) Shoemaker cujo tele-
de grãos e X = nível médio (porcentual de omorfo é Cochliobolus sativus (Ito e Kurib)
área foliar lesionada) de manchas nas du- Dreschler e Dastur. As características mor-
Trigo no Brasil 1 307

fológicas de B. sorokÍnÍana são: conidióforos Epidemiologia


escuros, eretos, solitários ou em pequenos O fungo é de ocorrência frequente
grupos, produzindo 1-6 conídios na metade em sementes, sendo estas um importan-
superior; micélio geralmente marrom-oli- te veículo de dispersão do patógeno a lon-
váceo; conídios escuros, brilhantes, retos a gas distâncias. Lotes de sementes de cul-
ligeiramente curvos, fusiformes a elipsoi- tivares suscetíveis podem apresentar
des, com 6 a 9 septos, medindo 60 ~m a 120 100% de incidência do patógeno. Seme-
um de comprimento por 12 um a 23 um de lhante aos demais patógenos do comple-
largura, com germinação bipolar. Em meio xo de manchas foliares, c. sativus tam-
BDA, o micélio tem coloração marrom oli- bém tem a capacidade de sobreviver em
vácea a negra. Com o passar do tempo em restos de cultura, sendo estes uma fon-
meio de cultura, a formação abundante de te de inóculo primário quando a doen-
conídios torna a cultura negra e brilhante.
ça já está instalada na área. Há relatos
Além de afetar sementes, folhas e espigas,
da ocorrência do teleomorfo em condi-
B. sorokiniana afeta também raízes, causan-
ções naturais apenas em Zâmbia, onde
do a doença conhecida como podridão co-
existem os dois grupos de compatibilida-
mum (DUVEILLER; ALTAMlRANO, 2000;
de de c. sarrvus. O anamorfo B. sorokiniana
DUVEILLER;DUBIN, 2002; PIEROBOM;DEL
sobrevive no solo e em restos culturais na
PONTE,2008).
forma de conídios, de micélio ou de ela-
midosporos, sendo que os conídios podem
sobreviver no solo por, aproximadamen-
te, um ano.
A faixa de temperatura ideal para iní-
cio de infecção está entre 20 ·C e 28 ·C, com,
pelo menos, 15 horas de molhamento foliar.
Estudos de patogenicidade em uma co-
leção global de B. sorokiniana, em plantas di-
ferenciadoras, demonstraram que existem
diferenças entre isolados, mas não a pon-
to de haver uma especialização por hospe-
deiro. Mesmo em análises moleculares, as
diferenças encontradas entre isolados não
mostraram relação com patogenicidade.
Tais estudos demonstraram que esse pató-
geno apresenta níveis contínuos de agressí-
vidade, mas sem especialização fisiológica.
As toxinas produzidas não são específi-
cas, como ocorre com D. tritici-repentis, e
Figura 15. Mancha marrom, causada por não estão diretamente associadas com a
Cochliobolus sativus: plantas jovens de trigo com agressividade do fungo (FORCELINI, 1995;
manchas de aspecto marrom a negro, sem a pre- DUVEILLER; DUBIN, 2002; BACALTCHUK
sença de halo amarelo.
et al., 2006).
3081 Trigo no Brasil

Controle órgãos da planta, como folhas (Figura 16),


A estratégia de controle mais ade- colmos e espiga, formando o sintoma típi-
quada é o manejo integrado, em que o co nas glumas. Os sintomas são manchas ir-
uso de cultivares resistentes é fundamen- regulares de coloração marrom-claro, com
tal. Entretanto, níveis satisfatórios de re- halo violáceo, as quais podem, inicialmen-
sistência normalmente não são encontra- te, ser confundidas com os sintomas cau-
dos por diversos motivos, sendo um deles sados por B. sorokiniana (mancha marrom).
a natureza quantitativa da resistência, Os sintomas evoluem para coloração casta-
que torna difícil a incorporação de ge- nha com centro claro e pontuações de cor
nes. Além disso, o número de fontes de marrom, que são os picnídios do patóge-
resistência é limitado. Na falta de contro- no. As glumas apresentam manchas irre-
le, a doença pode comprometer até 40% da gulares de cor marrom. Com o progresso
produção, tornando-se, em alguns casos, da doença, as lesões tornam-se castanhas
um fator limitante da cultura (DUVEILLER; com centro claro, com inúmeras pontua-
ALTAMIRANO,2000). ções (picnídios) de cor marrom claro ou
O tratamento de sementes é indicado, escuro. Os nós, quando infectados, são de
mas apenas em lotes que apresentam ní- coloração castanha, enrugados e quebradi-
vel de infecção abaixo de 40%, pois os fun- ços. Na espiga, as glumas e as aristas apre-
gicidas não têm capacidade de eliminar o sentam manchas irregulares de cor mar-
patógeno em casos de infecção acima des- rom, inicialmente na ponta das glumas,
te nível, e o lote de sementes deve ser des- alastrando-se posteriormente, provocan-
cartado (FERNANDES;PICININI, 1999). do maturação precoce da espiga. Sob ata-
Por se tratar de um patógeno necro- que severo, a espiga apresenta coloração
trófico, que sobrevive em restos culturais, marrom escura com as aristas arrepiadas, e
a rotação de culturas é também indicada, pode não produzir sementes (FERNANDES;
como forma de reduzir a infecção primá- PICININI,1999).
ria, desde que se utilizem sementes sadias
ou tratadas. Etiologia
A fase teleomórfica do agente causal da
Mancha da gluma Mancha da gluma é Phaeosphaería nodurum
Phaeosphaeria nodorum (E. Müll) Hedgar, anamorfo Stagonospora

A mancha da gluma é causada por P.


nodorum. Semelhante aos demais fungos do
complexo de manchas, este é também ne-
crotrófico. Os sintomas podem ser confun-
didos com as demais manchas, embora o
patógeno seja bem distinto, pois seus coní-
dios são formados em picnídios.
Figura 16. Mancha da gluma em folha de trigo,
Sintomas causada por Phaeosphaeria nodorum: diversas le-
Embora denominada mancha da gluma, sões coalescentes, circundadas por halo amarelo,
com presença de picnídios sobre as lesões.
a doença manifesta-se também em outros
Trigo no Brasil I 309

nodorum (Berk.) E. Castell e Germano. O tendo importante papel na epídemíolo-


fungo produz picnídios globosos, de 160 gia desta doença, pois propicia a infecção
Jlm a 210 Jlm de diâmetro, que se for- de plantas jovens. Apenas uma plântula in-
mam abaixo do micélio. Os picnidiospo- fectada entre 5.000 plantas pode ser sufi-
ros são hialinos, com até três septos, me- ciente para iniciar uma epidemia (EYAL et
dindo 15 um a 32 um de comprimento por 2 al., 1987; McMULLEN, 2003; BACALTCHUK
um a 4 um de largura, formando cirros ro- et al., 2006). /
sados (PIEROBOM;DELPONTE, 2008). Além
de S. nodorum, o trigo pode ser afetado por Controle
Septoria tritici (Berk.) E. Castell e Germano. O controle para essa doença é similar
A identificação deste é feita pela patoge- às demais manchas supracitadas, devido às
nicidade ao hospedeiro e pela morfologia características de sobrevivência do patóge-
dos esporos assexuados. Os picnídios de s. no em restos de cultura. Por esse motivo, é
tritici medem em torno de 60 Jlm a 200 um também indicada a rotação de culturas, sen-
e os picnidiosporos medem 35 Jlm a 98 Jlm do um dos principais ganhos com essa práti-
de comprimento por 1 um a 3 um de lar- ca o efeito erradicante sobre patógenos que
gura. Entretanto, a morfologia destas espé- sobrevivem nos restos culturais (necrotró-
cies varia consideravelmente sob diferen- fícos) e que não possuem estruturas de re-
tes condições ambientais, meios de cultura sistência, como escleródios, clamidosporos
e estádios de crescimento da planta hospe- e oosporos. Entre as opções, a aveia é uma
deira. Tais variações podem causar confu- das melhores, pois a rotação com cevada ou
são na identificação das espécies. s. tritici triticale, por exemplo, pode levar à prolife-
pode ser encontrada juntamente com s. ração de fungos de solo que atacam o trigo.
nodorum em folhas sintomáticas (EYAL et Embora um intervalo de dois anos sem trigo
al., 1987, CUNFER;UENG, 1999). seja o mais indicado para este tipo de pató-
geno, como ocorre para P. tritici-repentis, re-
Epidemiologia sultados de pesquisa tem demonstrado que
No Brasil, S. tritici tem menor impor- um intervalo mínimo de um inverno sem a
tância como patógeno de trigo. Conside- cultura do trigo pode ser suficiente para re-
rando-se as duas espécies, a faixa de tem- duzir significativamente a intensidade das
peratura ideal para o desenvolvimento do manchas foliares do trigo (SANTOS et al.,
patógeno é variável, podendo a doença se 1996, PRESTESet al., 2002).
desenvolver entre 5 °C a 35°C. A espécie s. O uso de fungicidas, normalmente, é
nodorum é mais destrutiva em temperatu- bastante eficiente para o controle de man-
ras em torno de 20°C a 25°C e em período chas foliares em geral, contribuindo para
de molhamento de 12 a 18 horas. Já as con- um ganho de produção em torno de 20% em
dições ideais para s. tritici são temperaturas cultivar suscetível, em comparação à mes-
em torno de 10°C a 20°C e período de mo- ma cultivar não tratada, desde que o fun-
lhamento superior a 24 horas. Entretanto, gicida seja aplicado no momento correto, a
molhamento foliar por um período maior fim de proteger ao menos a folha bandeira
que 12 horas já é suficiente para o início de e as aristas, que juntas respondem por 70%
infecção por estes patógenos. Sementes são a 80% dos fotoassimilados necessários ao
fonte de inóculo a~enas para s. nodorum, enchimento dos grãos (McMULLEN,2003).
310 I Trigo no Brasil

Podridão comum das raizes Etiologia


Fusarium spp. e Bipolaris sorokiniana A podridão comum pode ser causada
tanto por espécies de Fusarium, sendo a mais
Tanto Fusarium spp. como B. sorokiniana comum F. graminearum Schwabe, quanto por
podem causar podridão comum das raízes B. sorokiniana (Sacc.) Shoemaker, mesmo pa-
de trigo. Os sintomas podem ser confundi- tógeno causador de mancha marrom em fo-
dos com o mal-do-pé, o qual pode ser reco- lhas de trigo (McMULLEN, 2008). Fusarium
nhecido pela facilidade com que as plantas spp. infecta, além de espigas, o sistema ra-
são arrancadas do solo, devido à necrose do dicular e a região basal da planta, causan-
sistema radicular. As podridões causadas do a morte de plântulas. Sobrevive de uma
por Fusarium ou Bipolaris são de difícil dis- para outra estação como micélio, conídio ou
tinção, pois ambas apresentam aspecto mar- ascosporo, no solo, em restos culturais e em
rom na coroa e nas porções basais da planta sementes, além de infectar também a ceva-
(Figura 17). Neste caso, é necessário obser- da, o centeio, a aveia, o milho, o sorgo, o ar-
var as estruturas do patógeno, como esporos roz e diversas outras gramíneas (OSÓRIOet
de Bipolaris ou a coloração alaranjada típica al., 1998).
de Fusarium. É muito comum encontrar es-
tes patógenos associados em uma mesma la- Epidemiologia
voura. Há relato de redução no rendimento A podridão por Fusarium pode estar
de grãos, causada por podridão de Bipolaris, associada à baixa umidade do solo, sendo
da ordem de 19% (DIEHLet al., 1983). mais comum em regiões de baixa precipi-
tação pluvial. Em solos com boa umidade e
temperaturas baixas, as plantas geralmen-
te suportam melhor a infecção radicular,
não afetando a produção. Entretanto, em
infecções precoces nas raízes, o dano pode
ser grande se a planta for exposta a altas
temperaturas e solos secos, pois as raízes
doentes não absorvem bem água suficiente
nessas condições (McMULLEN, 2008).

Controle
Algumas estratégias são similares às
empregadas para o controle das manchas
foliares. Como B. sorokiniana e Fusarium
spp. sobrevivem nos restos culturais e são
transmitidos por sementes, recomenda-se
a rotação de culturas com espécies de plan-
tas de inverno não hospedeiras, sendo a
Figura 17. Podridão comum das raizes em plantas aveia preta uma boa alternativa, e o trata-
de trigo, causada por Fusarium spp. e Bipolaris mento de sementes, para evitar a introdu-
sorokiniana: (à esquerda), em comparação a raí- ção do patógeno em novas áreas de cultivo
zes sadias (à direita).
ou a reintrodução, após rotação de culturas
Trigo no Brasill311

(SANTOS et al., 1999; REIS; CASA, 2007). O A ferrugem linear ocasionou perdas
uso de cultivares resistentes é também uma significativas desde o Chile até o estado do
estratégia que reduz os danos causados por Rio Grande do Sul durante 1929-1930. Na
estes patógenos, quando estes já se encon- Argentina e no Uruguai, a presença de ra-
tram introduzidos de forma generalizada ças comumente encontradas no Chile indi-
na lavoura (McMULLEN, 2008). ca que o patógeno provavelmente migrou,
através da Cordilheira dos Andes, do Chile
Ferrugens do trigo para a região leste do continente (GERMAN
Puccinia triticina et al., 2007). No sul do Chile, uma epidemia
Puccinia graminis f. sp. tritici severa ocorreu em 1940 e, entre 1976-1988,
Puccinia striiformis f. sp. tritici a doença causou perdas econômicas pelo
menos uma vez a cada dois anos (ANDRADE
A cultura do trigo é atacada por três VILARO, 1990). Embora a ferrugem linear
ferrugens: a ferrugem da folha, a ferru- não tenha causado maiores preocupações
gem linear ou amarela e a ferrugem do nos últimos anos no Chile, em 2001 houve
colmo. Dessas, a ferrugem da folha é a uma ocorrência precoce que afetou várias
mais comum, ocorrendo em todas as re- cultivares de trigo de primavera (GERMAN
giões do mundo onde o cereal é cultiva- et al., 2007).
do, sendo também reconhecida mundial- A incidência de ferrugem do colmo no
mente como umas das doenças do trigo de Continente Sul-Americano é mais esporá-
maior importância histórica e econômica dica, embora já tenha causado altos níveis
(SAARI; PRESCOTT, 1985; SAMBORSKI, de danos no passado, tendo sido conside-
1985; ROELFS et al., 1992). Estima-se que rada a doença do trigo mais destrutiva no
a redução no rendimento devido às fer- Brasil, Paraguaí, Uruguai, no norte do Chi-
rugens do trigo possa alcançar 50% ou le e nas regiões norte e central da Argenti-
mais. Em anos de epidemias severas, as na (ANTONELLI,2000). Em 1950, uma epi-
perdas podem chegar a 100% em cultiva- demia muito severa ocorreu na Argentina e
res suscetíveis, se não for efetuado con- em outros países Sul-Americanos. Em 1975-
trole com fungicidas (ROELFS et al., 1992; 1976, vastas epidemias ocorreram no Bra-
REIS et al., 1996 b; ANNONE; NISI, 2003; sil, Argentina e Uruguai, mesmo sob condi-
CHAVES; BARCELLOS, 2003; GERMAN, ções de ambiente pouco favoráveis. Entre
2003; VIEDMA, 2003; CHEN, 2005). 1975-2003, duas ocorrências em nível epi-
Na América do Sul, a ferrugem da folha dêmico foram observadas no Brasil e sur-
é a mais importante e prevalecente doença tos localizados ocorreram durante o ano
do trigo, pois uma grande proporção da área de 1990 em algumas cultivares amplamen-
tritícola é semeada com cultivares suscetí- te cultivadas no Paraguai (GER~AN et al.,
veis ou moderadamente suscetíveis, o que 2007).
favorece a ocorrência precoce da doença e o As ferrugens do trigo são causadas por
incremento de inóculo dentro da estação de patógenos com grande poder de adaptação
cultivo. Estima-se que, nessa região, duran- e de disseminação, podendo ser considera-
te o período de 1996-2003, as perdas devidas das, em alguns casos, como ameaças à segu-
à ferrugem da folha tenham chegado a 170 rança alimentar mundial. No final dos anos
milhões de dólares (GERMANet al., 2007). 1980, uma nova raça do agente causal da fer-
3121 Trigo no Brasil

rugem linear surgiu no leste da África e mi- meçam a ser desfavoráveis, as uredopústu-
grou para o sul da ÁSia, através do Oriente Ias passam a produzir teliosporos, os quais
Médio e oeste da Ásia, em cerca de 10 anos, têm coloração negra devido à espessura das
causando perdas acima de 1 bilhão de dó- paredes de suas células (SAMBORSKI,1985).
lares ao longo de seu caminho de migração A ferrugem do colmo ocorre princi-
(SINGH et al., 2004). Em 2007, registrou-se palmente em colmos e bainhas mas, as-
o surgimento da raça Ug99 de ferrugem sim como a ferrugem da folha, pode ínfec-
do colmo no leste africano. Esta raça, ini- tar outras partes da planta, como folhas e
cialmente detectada em Uganda em 1999, glumas. A epiderme é drasticamente rom-
avançou para o Quênia em 2002-2003 e logo pida pelas uredopústulas, o que confere
após para a Etiópia, em 2003-2004, causan- um aspecto áspero à superfície dos teci-
do severas epidemias em virtude da susce- dos afetados (Figura 19). As uredopústulas
tibilidade da maioria dos genótipos culti- da ferrugem do colmo produzem uredos-
vados nessa região. A migração desta raça poros de coloração marrom-avermelhada,
para áreas vizinhas e outras regiões do glo- geralmente têm formato mais alongado e
bo tem sido motivo de grande preocupação, são maiores que as da ferrugem da folha,
pois projeta-se que as perdas poderão tota- podendo alcançar 10 mm de comprimento.
Na medida em que o trigo amadurece, os
lizar 2 bilhões de dólares,somente na Ásia
uredosporos são substituídos por telíospo-
(EXPERT..., 2005). As estratégias para re-
ros (LEONARD;SZABO,2005).
duzir as possibilidades de epidemias mais
A ferrugem linear ou amarela caracte-
severas incluem o monitoramento da dis-
riza-se por uredopústulas distribuídas em
seminação da raça Ug99, a realização de
linhas ou estrias, que se estendem ao lon-
testes massivos da reação de genótipos no
go da folha entre os feixes vasculares (Fi-
leste africano e programas de cruzamen-
gura 20). Além do padrão de distribuição
tos para alcançar níveis satisfatórios de
não aleatório, as uredopústulas da ferru-
resistência genética (SINGH et al., 2006;
gem linear também diferenciam-se das ou-
DUVEILLERet al., 2007).
tras ferrugens do trigo por serem menores
e por produzirem uredosporos de colora-
Sintomas ção amarela-clara. Semelhante às ferru-
A ferrugem da folha caracteriza-se gens da folha e do colmo, as uredopústulas
por uredopústulas contendo massas de da ferrugem linear também podem afetar
uredosporos de cor marrom-alaranjado, outras partes verdes da planta. Na medida
as quais surgem pela ruptura da epiderme em que a planta amadurece, os uredospo-
da folha e têm formato geralmente elípti- ros deixam de ser produzidos e são substi-
co (Figura 18). Em alguns casos, essas ure- tuídos pelos teliosporos (CHEN, 2005).
dopústulas são circundadas por um halo
clorótico. Os sintomas distribuem-se ale- Etiologia
atoriamente pela lâmina foliar e, em anos Os agentes causais das ferrugens do
de epidemias severas, podem atingir qual- trigo pertencem ao gênero Puccinia, famí-
quer parte verde da planta. No final do ci- lia Pucciniaceae, ordem Pucciniales classe
clo da cultura, quando a planta atinge a Pucciniomycetes. Estes fungos são patóge-
maturação e as condições de ambiente co- nos biotróficos altamente especializados e
Trigo no Brasil I 313

têm uma estreita gama de hospedeiros. O Atualmente, a nomenclatura do agen-


agente causal da ferrugem do colmo do tri- te causal da ferrugem do colmo do trigo
go foi nomeado como Puccinia graminis por é Puccinia graminis Pers.: Pers. f. sp. triiici
Persoon em 1797 e, nesta época, a ferrugem Eriks. & Henn; do agente causal da ferru-
da folha não era distinguida da ferrugem gem da folha é preferentemente Puccinia
do colmo. Em 1815, de Candolle mostrou triticina Eriks. e, do agente causal da ferru-
que a ferrugem da folha era causada por gem linear, é Puccinia striiformis West. f. sp.
um fungo diferente e o denominou de Uredo tritici Eriks. & E. Henn.
rubigovera (SINGHet al., 2002). A nomencla-
tura desse patógeno passou por uma série de Epidemiologia
modificações até que Cummings e Caldwell As epidemias de ferrugens do trigo,
(1956) sugeriram o nome Puccinia recondita, assim como de outras doenças, são afeta-
o qual foi usado desde então. Entretan- das pelos três componentes do "triângulo
to, novos estudos morfológicos e genéticos da epidemia": patógeno, hospedeiro e am-
mostraram que P. recondita não era o agen- biente. Em regiões onde o inóculo de ferru-
te causal da ferrugem da folha do trigo, mas gem está sempre presente e cultivares sus-
sim Puccinia triticina, sendo esta a nomen- cetíveis são semeadas, como no Continente
clatura preferencialmente adotada (SAVILE, Americano, o ambiente é o fator que mais
1984; ANIKSTERet al., 1997). A ferrugem li- influencia a ocorrência e a severidade das
near do trigo foi descrita por Gadd em 1777 epidemias (CHEN, 2005).
e o agente causal (Puccinia glumarum) em A principal fonte de inóculo inicial de
1896 por Eriksson e Henning, sendo o mes- P. triticina em cada estação de cultivo são
mo renomeado em 1953 por Hylander como plantas de trigo de áreas próximas ou plan-
Puccinia striiiormis (SINGH et al., 2002). tas voluntárias, que constituem as "pontes

Figura 18. Ferrugem da Figura 19. Ferrugem do colmo do tri- Figura 20. Ferrugem linear
folha do trigo, causada por go, causada por Puccinia graminis f. de trigo, causada por Puccinia
Puccinia triticina: uredopús- sp. tritici: uredopústulas da ferrugem striiformis f. sp. tritici.
tulas da ferrugem em folha. no colmo.
3141 Trigo no Brasil

verdes". O hospedeiro alternativo primário planta entra em senescência, formam-se


(Thalictrum speciosisimum) não tem papel teliosporos sob a epiderme, os quais per-
importante na produção de inóculo inicial, manecem nos tecidos da planta, podendo
mas sim na geração de variabilidade gené- ser disseminados a grandes distâncias pelo
tica na população de raças, pois é sobre ele vento, por animais ou pela ação do homem
que ocorre a fase sexual do patógeno. En- (ROELFSet al., 1992). Na América do Sul, os
tretanto, na América do Sul e do Norte e na teliosporos não têm função epídemiológí-
Austrália, não há relatos de que esse hospe- ca, pois não reinfectam o trigo.
deiro alternativo tenha função epidernioló- A epidemiologia de P. graminis f. sp.
gica relevante (SINGH et al., 2002). tritici é semelhante à de P. triticina, entre-
As condições de ambiente para a sobre- tanto, as temperaturas mínima, ótima e
vivência de P. triticina são as mesmas reque- máxima requeri das para a germinação dos
ridas para a sobrevivência do trigo. O fungo uredosporos (2 0(, 15 O( a 24 O( e 30 0(, res-
pode causar infecção dentro de um perío- pectivamente) e para esporulação (5 0(, 30 O(
do de três horas de molhamento foliar ou e 40 0(, respectivamente) são mais elevadas.
menos, em temperaturas de cerca de 20 0(, Essa característica faz com que a ferrugem
mas a maioria das infecções requer perío- do colmo seja mais importante no final do
dos mais longos de molhamento. A 10 0(, ciclo do trigo, em cultivares de maturação
são necessárias 12 h de molhamento fo- tardia ou quando a semeadura é tardia. A
liar para que a infecção ocorra. Em tem- ferrugem do colmo do trigo difere da fer-
peraturas superiores a 32 O( ou inferiores rugem da folha também por requerer um
a 2 0(, pouca ou nenhuma infecção ocorre maior período de molhamento foliar (seis a
(STUBBS et al., 1986). Os uredosporos ger- oito horas). Além disso, alta intensidade lu-
minam após 30 minutos de contato com minosa por um período de três horas é es-
água livre, em temperaturas entre 15 O( sencial para a penetração, sendo que a in-
e 25°C. Em temperatura ótima e constan- fecção máxima é obtida com 8 h a 12 h de
te (25 O(), a esporulação pode ocorrer den- molhamento a 18 0(, seguidos por lumí-
tro de sete a 10 dias após a germinação dos nos idade igualou superior a 10.000 lux e
uredosporos e penetração do fungo, a qual temperatura de 30 O( (ROWEL, 1984). Uma
se dá através dos estômatos. Em tempera- uredopústula de ferrugem do colmo pode
turas baixas (10 O( a 15 O(), ou se ocorre- produzir 10.000 esporos por dia (KATSUYA;
rem flutuações diurnas, períodos mais lon- GREEN, 1967). Embora a produtividade de
gos são necessários. A esporulação máxima esporos por pústulas seja maior que a da
ocorre cerca de quatro dias após a esporu- ferrugem da folha, a infectividade é menor,
lação inicial, em temperaturas de cerca de pois apenas 1 a cada 10 esporos germinados
20°C. Uma única uredopústula pode produ- consegue ter sucesso na infecção. As uredo-
zir até 3.000 esporos por dia, e pode con- pústulas da ferrugem do colmo geralmen-
tinuar a produzi-los por três semanas ou te sobrevivem por períodos mais longos do
mais, conforme a disponibilidade de teci- que as de ferrugem da folha, entretanto, a
do foliar (SINGH et al., 2002). Os uredospo- taxa de desenvolvimento das duas doenças
ros podem ser disseminados pelo vento por é semelhante. Os uredosporos de P. qraminis
longas distâncias (HlRST; HURST, 1967). f. sp. tritici são muito resistentes e podem
Sob condições desfavoráveis ou quando a ser disseminados pelo vento a distâncias de
Trigo no Brasil1315

até 8.000 ku. ~;;lNGHet al., 2002). O princi- Especialização fisiológica


pal hospedeiro alternativo de P. qraminis. f. Os agentes causais das ferrugens do
sp. tritici é o arbusto Berberis spp. Este hos- trigo são parasitas obrigatórios que coevo-
pedeiro é a maior fonte de inóculo primário luíram com seus hospedeiros como compo-
na América do Norte (ROELFS,1982), sendo nentes de um sistema muito influenciado
também responsável pela geração de varia- pelas condições ecológicas, ou seja, qual-
bilidade genética na população de raças do quer mudança na população predominan-
patógeno nessa região. Na América do Sul, te do hospedeiro resulta em mudanças sub-
não existem relatos de sua ocorrência. sequentes na população do patógeno, para
Das três ferrugens que atacam o tri- que o equilíbrio seja restabelecido (wAHL
go, P. striiformis é aquela que requer tem- et al., 1984; BARBIERI;CARVALHO, 2001).
peraturas mais baixas, e, por este motivo, Ao longo de sua coevolução, esses pató-
genos adquiriram uma grande habilidade
a ferrugem linear ocorre em regiões de cli-
em superar genes de resistência específi-
ma temperado e em áreas elevadas nas re-
cos, estejam eles isolados ou em combina-
giões de clima tropical. Também devido a
ções de dois ou poucos genes, havendo atu-
essa característica, a doença pode ter iní-
almente virulência para a maioria desses
cio muito cedo na estação de cultivo, e nes-
genes (SINGHet al., 2002). A habilidade dos
ses casos, causar danos mais severos que
isolados de ferrugem em infectar diferen-
a ferrugem da folha e do colmo, as quais
cialmente genótipos de trigo com genes de
requerem temperaturas ótimas mais ele-
resistência específicos caracteriza-os em
vadas para seu desenvolvimento (CHEN,
raças fisiológicas.
2005). As temperaturas mínima, ótima e
A identificação e caracterização de ra-
máxima para a infecção pelo patógeno são
ças das ferrugens do trigo ocorrentes nos
O ·C, 11 ·C e 23 ·C, respectivamente (ROELFS
locais em que causam epidemias fornecem
et al., 1992; SINGH et al., 2002). Semelhan- informações sobre prevalências, flutua-
te à ferrugem da folha, os uredosporos da ções, ocorrência de novas combinações gê-
ferrugem linear necessitam de um período nicas de virulência (novas raças) e efetivi-
de molhamento foliar de três horas para a dade de genes de resistência em uso e ainda
germinação e infecção (CHEN, 2005). Em- não incorporados amplamente em culti-
bora os uredosporos da ferrugem linear se- vares. Essas informações são especialmen-
jam três vezes mais sensíveis à radiação ul- te importantes para dar suporte à tomada
travioleta do que os da ferrugem do colmo de decisões em programas de melhoramen-
(SINGH et al., 2002), a disseminação através to e controle integrado, no que se refere
do vento a uma distância de 2.000 km, da à indicação de genótipos a serem cultiva-
Austrália para a Nova Zelândia, foi relatada dos, à escolha dos genes a serem combina-
(BERESFORD, 1982). Os uredosporos são a dos nos cruzamentos, à escolha da estraté-
única fonte de inóculo da doença, e na maio- gia de utilização da resistência incorporada
ria das regiões do mundo onde ela ocorre, e à indicação da necessidade ou não do uso
o inóculo inicial parece ser proveniente de de fungicidas.
plantas de trigo voluntárias no próprio local A identificação das raças é feita com
ou em locais vizinhos (UNE, 1976; STUBBS, base nas reações diferenciais que cada
1985; ZADOKS;BOWMAN, 1985). isolado produz sobre um conjunto pa-
3161 Trigo no Brasil

dronizado de genótipos de trigo, os quais sário. No Brasil, o uso de fungicidas tem si-
são específicos para P. triticina (LONG; do recomendado desde 1977; no Uruguai,
KOLMER, 1989), P. qraminis f. sp. trÍtÍCÍ tem sido mais comum desde 1990; e no Pa-
(ROELFS;MARTENS, 1988) e P. striiiormis f. raguai, desde 1996. Em condições normais
sp. trÍtÍCÍ (CHEN, 2005). de epidemias, ao menos duas aplicações
de fungicidas são necessárias para contro-
Controle lar as ferrugens do trigo em cultivares al-
O controle das ferrugens do trigo po- tamente suscetíveis. Na Argentina, uma
de ser efetivamente alcançado através da aplicação de fungicida para o controle da
combinação de métodos, como o uso de cul- ferrugem da folha é usada em aproxima-
tivares geneticamente resistentes, práticas damente 35% da área tritícola. No Chile, o
culturais e uso de fungicidas. O uso de cul- controle químico da ferrugem linear ini-
tivares resistentes é considerado o método ciou no final dos anos 1970 e foi amplamen-
de controle mais efetivo e econômico, pois, te adotado a partir da metade da década de
além de evitar as perdas causadas pelas mo- 1980, especialmente por agricultores que
léstias, não aumenta os custos de produção, empregavam tecnologias avançadas. O uso
garantindo maior retorno dos investimen- de fungicidas para o controle da ferrugem
tos feitos pelos produtores (NELSON, 1973; da folha no Chile não era comum, mas nos
PRIESTLEY;BAYLES,1988). A resistência às últimos cinco anos o uso de controle quími-
ferrugens do trigo pode ser obtida através co tem aumentado devido ao aumento da
da incorporação de um, de poucos ou de vá- importância dessa doença. Considerando
rios genes de resistência em um genótipo as grandes áreas semeadas com cultivares
(AGRIOS, 1988). Tradicionalmente, a resis- que requerem controle químico na região
tência que confere proteção total à planta do Cone Sul da América do Sul, estima-se
tem sido preferencialmente usada nos pro- que o custo anual das aplicações de fungici-
gramas de melhoramento, pela relativa fa- das para o controle das ferrugens do trigo
cilidade com que pode ser identificada e nessa região seja de cerca de 50 milhões de
incorporada. No entanto, a pouca durabili- dólares (GERMANet al., 2007).
dade deste tipo de resistência leva à neces- Algumas práticas culturais também
sidade de substituição constante de culti- podem auxiliar, ao menos parcialmente,
vares e de controle químico. Atualmente, a no controle das ferrugens do trigo. O uso
resistência quantitativa que se expressa na de cultivares com maturação precoce na
fase adulta é a alternativa mais promisso- Austrália e a semeadura antecipada no
ra, pois tem mostrado maior durabilidade México são exemplos de sucesso no con-
quando usada em grandes áreas, por lon- trole da ferrugem do colmo do trigo mes-
gos períodos de tempo, sob alta pressão de mo antes do uso de cultivares resisten-
inóculo e condições de ambiente favoráveis tes (BORLAUG, 1954; McINTOSH, 1976). A
ao desenvolvimento de epidemias de ferru- "ponte-verde", formada por plantas volun-
gens ÚOHNSON, 1984; ROELFSet al., 1992, tárias de trigo entre uma safra e outra ou
SINGH et al., 2002). por épocas de semeadura sobrepostas em
Quando a resistência de uma cultivar é uma região, é um fator de perpetuação de
superada ou quando cultivares suscetíveis inóculo e favorecimento de epidemias. A
são semeadas, o controle químico é neces- eliminação desta "ponte-verde" é uma me-
Trigo no Brasil I 317

dída eficiente de controle para epidemias 2002). Em regiões onde o hospedeiro alter-
que resultam de inóculo produzido local- nativo da ferrugem do colmo é importante
mente. A ampliação da base genética das na geração de variabilidade do patógeno,
cultivares usadas comercialmente também como no leste europeu e no noroeste dos
é uma estratégia para diminuir a vulnera- Estados Unidos, sua eliminação é uma prá-
bilidade da cultura frente às epidemias de tica recomendável e eficiente para o con-
ferrugens (ROELFSet al., 1992; SINGH et al, trole de epidemias (ROELFS,1982).

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