Fingerstyle Um Novo Capitulo Na Historia
Fingerstyle Um Novo Capitulo Na Historia
Fingerstyle Um Novo Capitulo Na Historia
MODALIDADE: COMUNICAÇÃO
Amanda Carpenedo
Resumo: O artigo visa apresentar e discutir aspectos do fingerstyle, conhecido como uma forma de tocar violão que reúne
diversas possibilidades técnicas. Apesar de não ser nova, ainda é pouco explorada pelos violonistas, mas vem ganhando
visibilidade e adeptos em diferentes lugares do mundo. Foi utilizado o método da revisão bibliográfica como forma de
obter evidências e informações sobre o estado da arte do fingerstyle. Os dados obtidos na revisão permitem concluir que
esta forma de tocar violão oferece possibilidades ilimitadas de sons e pode proporcionar liberdade criativa ao interprete,
oferecendo ferramentas para a composição, criação de arranjos e improvisação, enriquecendo e inovando as performances
violonísticas.
Abstract: The article aims to introduce and discuss aspects of fingerstyle, known as a way of playing guitar that brings
several technical possibilities. Although not new, it is still little explored by guitarists, but has gained visibility and fans in
different parts of the world. The method of bibliographical revision was used as a way to obtain evidence and information
about the state of the art of the fingerstyle. The data obtained in the review allow us to conclude that this form of playing
guitar offers unlimited possibilities of sounds and can provide creative freedom to the player, offering tools for
composition, arrangement creation and improvisation, enriching and innovating the guitar performances.
1.Introdução
O fingerstyle, em sua origem, não representa um estilo ou gênero musical e sim um modo de
tocar violão utilizando distintas técnicas. Oriundo de gêneros como o country, jazz e blues, este modo
se popularizou e hoje é encontrado na execução dos mais diversos gêneros musicais.
A técnica de dedilhar as cordas veio do alaúde e da vihuela (século XV e XVI), antecessores
do violão. A partir disto o “estilo dedilhado” ou fingerstyle teve seu desenvolvimento. É importante
destacar que quando nos referimos à prática do violão de concerto, o mais usual é utilizarmos o termo
“violão clássico/erudito” para defini-lo. O fingerstyle como conhecido hoje é proveniente do
fingerpicking vindo dos Estados Unidos, que em teoria representa a mesma técnica. Essa nomenclatura
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é utilizada apenas para esta forma de tocar e não engloba todas as formas com que o violão é tocado
utilizando apenas os dedos.
Como método para o desenvolvimento desta pesquisa optou-se pela revisão por permitir a
busca, a avaliação crítica e a síntese das evidências disponíveis sobre o tema pesquisado e o estado
atual do conhecimento sobre o mesmo. Foram utilizados como recursos revistas especializadas,
trabalhos acadêmicos, sites e artigos impressos ou publicados online.
Este artigo procurou trazer informações acerca do que é o fingerstyle, sua origem e suas
características. Apesar da crescente visibilidade e do aumento de adeptos a este modo de tocar e suas
técnicas, este ainda é pouco conhecido e explorado pelos violonistas. Com isto, a pesquisa visa também
introduzir este assunto ainda pouco estudado no meio acadêmico, como subsídios para fomentar
pesquisas sobre este tema.
2. Origem do Fingerstyle
Em contraste com a expansão de composições e crescente popularidade do violão clássico na
Europa do séc. XIX, nos Estados Unidos a música popular surgiu com força, tendo uma grande
influência dos negros africanos. Foi a partir da miscigenação das tradições musicais que nasceram
diversos gêneros que influenciaram o modo de tocar violão.
O fingerstyle, também chamado fingerpicking, nasceu a partir de tentativas de violonistas afro-
americanos de imitar os sons do piano ragtime, os quais eram muito populares por volta dos 1900 nos
Estados Unidos (MELLMER, 2014).
A técnica violonística, em analogia com a técnica do piano, tinha o uso do polegar da mão
direita como se fosse a mão direita do pianista, realizando os baixos alternados, enquanto o restante
dos dedos cumpriam a função da mão esquerda, realizando melodia e harmonia. Segundo o artigo
“History Of American Fingerstyle Guitar and Great Musicians Who Made It Happen” postado através
do site Ultimate guitar, os primeiros violonistas que tiveram registros tocando desta forma foram:
Blind Blake, Big Bill Broonzy, Menphins Minnie e Mississippi John Hurt.
No início do Século XX, novos gêneros musicais surgiram nos Estados Unidos como o Jazz e
o Country e neste contexto os violonistas necessitavam tocar o violão de modo a obter sons mais
distintos de modo a se destacar em meio ao outros instrumentos e para tanto lançaram mão do arpejo.
Em pouco tempo a técnica de arpejo ficou popularizada entre músicos como Sam Mcgee, Merle Travis
e “Thumbs” Carlile, e foi aperfeiçoada por Chet Atkins. (ULTIMATE GUITAR, 2017)
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Ao notar que ao colocar cordas de aço em violões tradicionais o braço não aguentava a tensão,
Martin recriou a construção do violão de modo a deixa-lo mais resistente. Isto reforçou a escala
e a tornou mais rígida. Apesar disto, a conquista mais importante, que superou a tensão das
cordas de aço, foi um parafuso ajustável colocado na parte de trás do braço do violão, com o
qual o braço estava ligado ao corpo. Christopher foi o primeiro que inventou esse tipo de violão
e fundou a mundialmente conhecida empresa Martin. A década de 1850 testemunhou uma das
principais inovações de design de Christopher Martin, o sistema de reforço "X" para o tampo
do violão. Ainda em uso hoje em todos os violões Martin de cordas de aço. Este sistema de
reforço é em grande parte responsável pelo tom distintivo, caracterizado por agudos brilhantes
e poderosa resposta de graves (MARTIN GUITAR, 2017).
Para obter um som limpo e com uma boa velocidade, Travis mantinha a mão esquerda fazendo
acordes ao invés de utilizar a independência dos dedos para a realização de escalas e melodias.
Este modo de tocar violão, “Travis Picking”, tornou-se um típico estilo americano
popularizado por Merle Travis nas décadas de 1940 e 50 (Hanson, 1992).
Em meados do Séc. XX, em 1941, Chet Atkins surgiu para consolidar e desenvolver a técnica
de Travis. Atkins começou cedo a tocar violão e cresceu a partir da escola “Travis Picking”. Ainda
novo aperfeiçoou o modo de tocar violão e a técnica de fingerstyle. Sua música não parou de se
desenvolver e logo exigiu novos sons. Atkins utilizava uma guitarra semiacústica que o possibilitava
adicionar novas sonoridades à técnica do fingerstyle, que eram complexas ou até mesmo inviáveis ao
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violão. Suas contribuições que mais se destacaram para o desenvolvimento do fingerstyle foram o uso
de harmônicos e o Tapping.
William Ackerman também contribuiu para difundir novos violonistas adeptos do fingerstyle
ao fundar em 1976 a “Windham Hill Records”, selo de música instrumental independente que
abrigava estilos musicais como o Eletrônico e o World Music. Naquela época os artistas não
utilizavam estes termos e o selo ficou conhecido como “New Age”. Ackerman tinha se
inspirado musicalmente pela Takoma Records de John Fahey, no sentido de que ele também
poderia começar sua própria gravadora. Na época ele não imaginava que o seu rótulo venderia
milhões de gravações, promoveria dezenas de artistas e começaria um novo gênero
(WINDHAM HILL RECORDS, s.d.).
Um dos aspectos mais importantes a se destacar sobre a técnica de fingerstyle foi o acréscimo
da percussão. Basicamente a técnica consiste em tocar no tampo, laterais, ponte e onde mais a
criatividade do intérprete permitir. O uso desta técnica possibilita complementar uma performance
solo da mesma forma que o padrão rítmico do baixo. Ambas as mãos podem não apenas tocar as cordas
do modo tradicional, como também, simultaneamente, percutirem no tampo extraindo uma grande
variação de timbres.
A batida percussiva no violão era utilizada pelos violonistas flamencos como uma técnica
auxiliar, e no fingerstyle esta técnica apareceu com o surgimento dos violões eletroacústicos no início
da década de 70. Um dos fundadores do estilo foi Michael Hedges, que começou a incluir este recurso
no início dos anos 80. Segundo De Grassi (2007), citado por Ferreira (2007), Hedges empregava
acordes cheios com marteladas (hammer on), utilizava harmônicos artificiais, técnicas de tocar com
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as duas mãos sobre o braço do violão além de outras afinações não ortodoxas, resultando numa
sonoridade lírica e percussiva.
Outro violonista que promoveu a técnica percussiva foi Preston Reed que, segundo Roos
(1997), apresentava uma performance impactante com “hammer ons” e outras técnicas como o uso de
ambas as mãos em slaps, taps e slides. Seus álbuns lançados no início dos anos 80 tiveram grande
influência de nomes como Jorma Kaukonen, John Fahey e Leo Kottke.
Segundo Reed, “...estes artistas forneceram a mim uma excelente base em termos de técnicas
de violão, assim como um conceito musical crucial: múltiplas vozes melódicas sincopadas.
Todos eles eram violonistas que utilizavam baixos alternados em suas músicas, provindo de
um estilo americano de blues, baseado nas músicas dos músicos negros de blues como Robert
Johnson, Leadbelly, Muddy Waters, Reverend Gary Davis entre outros. Mais tarde eu pude
adaptar o conceito de baixos alternados e as vozes melódicas sincopadas em uma técnica capaz
de usar as duas mãos (Two-Handed Technique), que integrava uma percussão feita no corpo
do violão mais o som das cordas”. (REED, jul. 2015, entrevista a FEDERSONI, 2015).
As notações dos sons percussivos ainda não foram sistematizadas e são muito variadas, sendo
assim cada compositor tem sua própria forma de escrita. A título de exemplo cita-se um catálogo de
sons percussivos utilizados por Preston Reed, conforme consta do trabalho de Federsoni (2015). A
maioria dos sons remete a partes da bateria ou instrumentos de percussão. Os símbolos apresentados
estão escritos no sistema de tablatura e não no sistema de partitura convencional. Segue alguns
exemplos de acordo com a Figura1:
Snare (caixa): Este som imita um som de caixa de bateria e é reproduzido utilizando-se a mão direita,
golpeando as cordas do violão que estão em frente à boca.
Whunk-Damp: Para reproduzir este efeito golpeia-se os bordões, abafando-os com a palma da mão
direita, mais especificamente, a parte da palma próxima ao punho, em conjunto com o tampo do violão,
entre a boca e o cavalete, enquanto, simultaneamente a parte de trás das unhas toca todas as cordas
restantes deixando-as soar.
Rim Shot (aro): Efeito que simula o som do aro de uma caixa de bateria. Para produzi-lo golpeia-se a
lateral destra inferior do violão utilizando-se os dedos médio e anular da mão direita.
Kick Drum (bumbo): Som que emula um bumbo de bateria. A palma da mão direita, na parte mais
próxima ao punho, golpeia o tampo inferior do violão, logo atrás do cavalete.
Harmonic Slap (harmônico com slap): Som que produz harmônicos a partir de um golpe realizado com
os dedos indicador, médio ou anular da mão direita, sobre um determinado traste do braço do
instrumento. No exemplo o algarismo indica a posição do traste a ser golpeado.
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Estas afinações facilitavam a execução com o slide, pedaço cilíndrico de vidro ou metal,
encaixado no dedo mínimo, que era deslizado sobre as cordas, gerando efeitos em glissando.
Notas simples, duplas ou em blocos eram produzidas em paralelismo pelo braço através do
uso de slide. Enquanto notas melódicas deslizavam pelo braço, eles tinham à disposição a
fundamental do tom em uma das cordas graves, que lhes servia de apoio harmônico
(VASCONCELOS, 2002, p.58).
Pat Kirtley (1992) abordou aspectos históricos recentes sobre o uso de afinações alternativas,
as quais provem de três fontes principais que foram uma tendência nas décadas de 1960 e 1970.
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3. Considerações finais
A partir da revisão realizada foi possível fazer um breve relato histórico acerca do fingerstyle e algumas
abordagens sobre elementos que o caracterizam, como técnicas de afinações e execuções, bem como
da própria constituição do violão fingerstyle. É possível concluir que este conjunto de técnicas se
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estabelece em uma forma de tocar violão muito rica, contendo um grande número de técnicas e com
possibilidades ilimitadas de sons. A mesma proporciona liberdade criativa ao intérprete e oferece
inúmeras ferramentas para a composição, criação de arranjos e improvisação, enriquecendo e inovando
as performances violonísticas. Esta revisão confirma as colocações de Mellmer (2014) no sentido de
que fingerstyle é uma técnica violonística sofisticada que abrange muitos gêneros e estilos musicais.
Atualmente, com a possibilidade de compartilhamento de mídias pela internet, essa forma de
tocar tem se espalhado pelo mundo e tem proporcionado o surgimento de um novo público apreciador
do violão instrumental. Entretanto, há muitas lacunas a serem preenchidas como, por exemplo, o
contraste entre a quantidade de materiais didáticos sobre fingerstyle (aulas virtuais) em relação às
poucas pesquisas sobre o tema. Constatou-se significativa ausência de artigos científicos e trabalhos
acadêmicos, evidenciando um possível campo de pesquisa a ser mais explorado. Já os métodos
didáticos escritos para fingerstyle ainda são muito pouco disponíveis no Brasil e nenhum método foi
encontrado em língua portuguesa, além disto, os métodos encontrados apresentam um conteúdo básico,
servindo apenas como material introdutório. Verificou-se ainda ausência de unanimidade entre os
autores quanto à descrição das técnicas expandidas.
Estas observações nos levam a crer que esta forma de tocar, que está em franca expansão,
necessita de novas investigações e sistematização de suas técnicas, pois é perceptível que o fingerstyle
se transformou em uma importante corrente do violão instrumental, necessitando, sim, ser incluso
como um novo capítulo na história do violão.
4. Referências
FERREIRA, J. T. Limites aéreos: o violão inovador de Michael Hedges. Passo Fundo. 42f. Trabalho
de conclusão de curso (Bacharel em Violão). Instituto de Artes e Comunicação, Universidade de Passo
Fundo, Passo Fundo, 2007.
HANSON, M. The art of Contemporary Travis picking. West Linn, EUA: 1992. E-book. ISBN 0-
936799-00-5. Disponível em: <http://markhansonguitar.com/product/the-art-of-contemporary-travis-
picking/>. Acesso em: 5 set 2017.
HUMPHREY, M. The Art of Fingerstyle Guitar. Cambridge: Ed. Vestapol, 2004. Disponível em: <
http://www.guitarvideos.com/LiteratureRetrieve.aspx?ID=146848>. Acesso em 19 set. 2017.
KIRTLEY, P. Alternate tunings for guitar: from a workshop presented at the Chet Atkins Appreciation
Society Convention, 1992. Disponível em: <www.win.net/mainstringltunings.html>. Acesso em 21
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