História Medieval
História Medieval
História Medieval
2013
Copyright © UNIASSELVI 2013
Elaboração:
Prof. Fabiano Dauwe
Prof. Thiago Juliano Sayão
Prof. Itamar Siebert
930
D244h Dauwe, Fabiano
História medieval / Fabiano Dauwe; Thiago Juliano Sayão;
Itamar Siebert. Indaial : Uniasselvi, 2013.
284 p. : il
A intenção deste caderno não é esgotar o tema, mas dar a você uma
visão muito resumida do que um professor de História precisa saber para
ensinar Idade Média aos seus alunos em sala de aula.
Bons estudos!
Fabiano Dauwe
Thiago Juliano Sayão
Itamar Siebert
IV
UNI
Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano,
há novidades em nosso material.
O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação
no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir
a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.
Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.
UNI
V
VI
Sumário
UNIDADE 1 - AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA ............................................................................ 1
VII
2 O AUGE E A DECADÊNCIA DO IMPÉRIO ROMANO .............................................................. 37
2.1 POR QUE A DECADÊNCIA? ........................................................................................................ 39
2.1.1 O fim das conquistas militares . ............................................................................................... 39
2.1.2 A crise do século III ................................................................................................................... 40
2.2 OS REFORMADORES: DIOCLECIANO E CONSTANTINO . ................................................. 43
2.3 AS ORIGENS REMOTAS DO FEUDALISMO . ........................................................................... 45
3 OS BÁRBAROS NO IMPÉRIO DO OCIDENTE ........................................................................... 47
3.1 OS HUNOS ....................................................................................................................................... 48
3.2 A QUEDA DE ROMA ..................................................................................................................... 50
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 51
RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 54
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 55
VIII
2.2 A PERIODIZAÇÃO DA HISTÓRIA BIZANTINA ..................................................................... 99
2.3 O REINADO DE JUSTINIANO ..................................................................................................... 100
2.3.1 A revolta de Nika . ..................................................................................................................... 101
2.3.2 As reformas de Justiniano ........................................................................................................ 102
2.4 A TRANSFORMAÇÃO DO IMPÉRIO ......................................................................................... 103
2.5 AS PERDAS BIZANTINAS NA ÁFRICA .................................................................................... 104
3 CONSTANTINOPLA ........................................................................................................................... 105
3.1 A CIDADE ........................................................................................................................................ 107
3.2 MÉSIA, A PRINCIPAL AVENIDA DE CONSTANTINOPLA .................................................. 108
3.3 O HIPÓDROMO .............................................................................................................................. 111
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 113
RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 115
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 116
IX
4.2.2 A Filosofia ................................................................................................................................... 152
4.2.3 As ciências . ................................................................................................................................ 153
4.3 AS MULHERES E O ISLAMISMO ................................................................................................ 154
4.4 O ISLÃ E OS “INFIÉIS” .................................................................................................................. 156
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 157
RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 159
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 160
X
3.1 MOTIVAÇÕES ECONÔMICAS .................................................................................................... 191
3.2 MOTIVAÇÕES RELIGIOSAS . ....................................................................................................... 192
3.3 MOTIVAÇÕES POLÍTICAS ........................................................................................................... 192
4 AS CRUZADAS ..................................................................................................................................... 193
4.1 OUTRAS CRUZADAS .................................................................................................................... 195
4.2 O FIM DAS CRUZADAS . .............................................................................................................. 195
4.3 AS CRUZADAS VISTAS PELOS ÁRABES .................................................................................. 196
4.4 AS PERSEGUIÇÕES AOS JUDEUS NAS CRUZADAS ............................................................. 200
RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 201
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 203
XI
3.1 AS FEIRAS MEDIEVAIS ................................................................................................................. 245
3.2 A FORMAÇÃO DOS BURGOS ..................................................................................................... 246
4 A VIDA URBANA NA BAIXA IDADE MÉDIA ............................................................................. 247
4.1 DEMOGRAFIA E URBANISMO ................................................................................................... 247
4.2 O SISTEMA CORPORATIVO ........................................................................................................ 249
4.3 A FORMAÇÃO DA BURGUESIA . ............................................................................................... 251
5 O MOVIMENTO COMUNAL E AS CIDADES LIVRES ............................................................. 253
LEITURA COMPLEMENTAR 1 ............................................................................................................ 256
LEITURA COMPLEMENTAR 2 ............................................................................................................ 257
RESUMO DO TÓPICO 4 ....................................................................................................................... 259
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 261
XII
UNIDADE 1
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Esta unidade tem por objetivos:
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em cinco tópicos. Ao final de cada um deles você
encontrará atividades que o(a) ajudarão a refletir e fixar os conhecimentos
abordados.
Assista ao vídeo
desta unidade.
1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1
1 INTRODUÇÃO
Ao mesmo tempo, existe outra questão fundamental que precisa ser levada
em consideração. A história da Idade Média, como a estudamos, padece de um vício
muito grave de eurocentrismo. Ou seja, está completamente focada na história da
Europa,- mais especificamente da Europa Ocidental: França, Alemanha, Inglaterra
-, e ignora completamente outras regiões, como o mundo muçulmano, onde uma
cultura, muito distinta, estava em seu auge.
3
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
Vamos, por enquanto, apenas supor que você tem uma noção do que
signifique Idade Média, que você aprendeu no Ensino Médio e talvez tenha
complementado com algumas leituras próprias. É exatamente essa visão que nos
interessa por enquanto, porque essa é, provavelmente, a visão que seus futuros
alunos terão quando começarem a ter aulas sobre o assunto.
AUTOATIVIDADE
4
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE A IDADE MÉDIA
No entanto, a Idade Média real geralmente está mais próxima disso do que
dos clichês do senso comum, que, às vezes, são pura ficção, como no caso do Rei
Arthur e seus cavaleiros, dos dragões e, também, das donzelas nas torres.
UNI
Mas, provavelmente, o clichê (ou, antes, o chavão) mais comum será o apelido
de Idade das Trevas, que esse período histórico ganhou há muito tempo e do qual
ainda não foi possível livrá-lo.
DICAS
SUGESTÃO DE LEITURAS
Caro(a) acadêmico(a), veja aqui uma lista de livros dedicados a desmistificar a Idade Média:
DUBY, Georges. A Europa e a Idade Média. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
LE GOFF, Jacques. Para um novo conceito de Idade Média: tempo, trabalho e cultura no
Ocidente. Lisboa: Estampa, 1980.
5
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
2.2.1 Imaginando
UNI
IMAGINE!
Prezado(a) acadêmco(a)! Antes de começar, vamos fazer um exercício de ficção!
para trás. E que, por isso, ele resolvesse chamar a nossa época de Idade das Trevas,
um longo período de ignorância, superstição, estupidez generalizada e decadência.
Ei, não é justo você nos julgar por coisas que nós não podemos saber como serão
um dia! Nós vivemos agora, não no futuro, e nossas preocupações são as que fazem sentido
para nós hoje. Se você se preocupasse em entender como vivemos, compreenderia por que
pensamos dessa forma e por que fazemos essas coisas. Você não está nos estudando, está só
nos chamando de ignorantes por não sermos como você!
AUTOATIVIDADE
ANÁLISE
Tente pensar em outras argumentações que poderíamos fazer para discordar
de uma visão tão parcial e tão inadequada sobre nós e nosso tempo. Em sua
opinião, esse tipo de perspectiva revela mais sobre o período que está sendo
discutido ou sobre quem está criticando? O que levaria alguém a tratar dessa
forma uma cultura passada?
Pode ser até que você discorde de muita coisa que existe hoje, mas
provavelmente não chamaria o século XXI de Idade das Trevas. Muito menos diria
que esse período é simplesmente uma preparação para um tempo no futuro em
que as pessoas serão realmente felizes, por pensarem de uma maneira que nós nem
sabemos ainda qual é, ou por terem tecnologias que ainda nem foram inventadas.
Como você poderia saber o que vai acontecer no futuro?
7
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
NOTA
Acredita-se que o termo Idade das Trevas tenha sido criado por Francesco
Petrarca (1304-1374) por volta da década de 1330, ou seja, nos primeiros instantes
da renovação cultural renascentista. Por ser da região da Toscana, na atual Itália, e
um representante do período florentino do Renascimento, Petrarca entendia que a
queda de Roma teria trazido a decadência da cultura clássica, com o surgimento de
uma nova raça de homens violentos, analfabetos e incultos: os bárbaros.
UNI
Perceba que Petrarca viveu no século XIV – durante, portanto, o período histórico
tradicionalmente considerado como Idade Média, que só se encerraria em 1453. De acordo
com as periodizações históricas mais comuns, portanto, Petrarca era um ‘homem medieval’.
Ora, se um “homem medieval” critica os “tempos medievais” anteriores e louva a sua própria
época como diferente disso, não lhe parece que a divisão tradicional é, pelo menos, uma
simplificação exagerada?
8
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE A IDADE MÉDIA
NOTA
Prezado(a) acadêmico(a), ficou claro por que não devemos julgar o passado?
Mesmo quando dispomos de muitas fontes, sabemos tão pouco sobre o passado que não
somos capazes de compreendê-lo razoavelmente. E mesmo se pudéssemos, que direito
teríamos de supor que somos melhores do que os que vieram antes de nós?
Lembre-se sempre disso, pois é tentador criticar os hábitos e as decisões das pessoas do
passado. Os historiadores não têm o direito de fazer isso e têm o dever de chamar a atenção
de quem faz.
E
IMPORTANT
Não lhe parece que a visão de Idade Média que os reformadores protestantes e
católicos criaram dizia muito mais sobre o que eles próprios pensavam a respeito da Igreja
Católica da época em que viviam do que sobre a Idade Média em si?
3.2 NO ILUMINISMO
Durante o Iluminismo (século XVIII), a Razão passou a ser entendida como
a única forma de se alcançar um conhecimento verdadeiro. A Fé, nesse momento,
passou a ser entendida como um sinal de tudo o que era atrasado e que deveria
ser destruído, o que incluía o poder político da Igreja. Entendendo a Idade Média
como a Idade da Fé, os iluministas tinham uma visão bastante negativa do período,
reforçando as visões anteriores de decadência.
E
IMPORTANT
DICAS
LEITURA!
Caro(a) acadêmico(a), para saber mais sobre a evolução do conceito de Idade Média, leia o
texto “A Idade Média de Jacques Le Goff”, publicado em: LE GOFF, Jacques. Uma longa Idade
Média. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008.
10
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE A IDADE MÉDIA
É unívoca: considera que o caminho que foi percorrido pela civilização ocidental
é o único possível e que todas as “civilizações” um dia trilharão esse mesmo
caminho. Portanto, despreza tudo o que não tiver perdurado até hoje como
sendo uma “relíquia” sem utilidade.
11
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
NOTA
4 CONCEITOS MODERNOS
Você se lembra do nosso historiador do futuro, aquele que falou tão mal
da época em que vivemos? Já reclamamos de sua parcialidade. Outra objeção a
ele poderia ser: Além do mais, nós e você não somos assim tão diferentes. Somos todos
seres humanos e temos as mesmas necessidades. O que muda é a forma de satisfazer essas
necessidades e as complicações que nós inventamos para satisfazê-las ou impedir que isso
aconteça. Sem falar que você é nosso descendente, o seu mundo surgiu a partir do nosso, e
tudo o que você considera importante apareceu, um dia, a partir do que nós tínhamos em
nossa época.
12
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE A IDADE MÉDIA
NOTA
DICAS
A Idade Média foi uma época de inúmeras inovações tecnológicas. Para saber
mais a respeito, sugerimos a leitura de:
BARK, William Carroll. Origens da Idade Média. Riao de Janeiro: Zahar, 1979, p. 125-140, ou o
artigo de Ênio José Toniolo, “O progresso técnico na Idade Média”, disponível em:<http://www.
lepanto.com.br/EstPrgIdM.html>.
13
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
UNI
Como você pôde perceber, o conceito de Idade Média foi criado por estudiosos
europeus para explicar a história de suas regiões de origem – sem levar em consideração se
as características de outras regiões, como o mundo islâmico ou o Império Bizantino, eram
ou não semelhantes a essas. Ou seja, o conceito de Idade Média é eurocêntrico! Precisamos
questionar esse eurocentrismo e buscar interpretações sobre o mundo mais globais. Por que
é que nós, no Brasil do século XXI, contamos a história da forma como os europeus a viam no
século XIX e esquecemos que existia muita coisa no mundo fora de lá?
Em resumo, temos que ter cuidado ao estudar a Idade Média, para não
cairmos numa simplificação exagerada, que termina por prejudicar a nossa
compreensão sobre o período. Pior ainda, se generalizarmos as características
da Idade Média, transformando-a em uma “idade do feudalismo”, estaremos
falseando a verdade, ignorando aspectos essenciais dessa própria história ou,
mesmo, apresentando os elementos “externos” a ela (como os muçulmanos) sob um
ponto de vista maniqueísta, como as grandes ameaças (felizmente malsucedidas)
à “nossa” cultura. Ou seja, estaremos recaindo nos mesmos preconceitos e
supersimplificações que desejamos e precisamos combater.
NOTA
14
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE A IDADE MÉDIA
Média”), no qual ela se dedica a atacar os preconceitos comuns sobre o tema. Neste
trecho, Pernoud fala sobre as origens do feudalismo e sobre o choque de culturas
na época.
LEITURA COMPLEMENTAR
Com efeito, as trocas tornam-se difíceis, pois o exército já lá não está para
conservar nem fiscalizar as estradas; por isso, mais do que nunca, a terra é a única
fonte de riqueza. Essa terra é preciso protegê-la. Não se vê nascer hoje em alguns
países, onde os pacíficos habitantes se consideram ameaçados pelo aumento da
delinquência, polícias semelhantes? Isso pode fazer compreender o que se produziu
então; um pequeno cultivador, impotente para assegurar sozinho a sua segurança
e a da sua família, dirige-se a um vizinho poderoso que tem a possibilidade de
manter homens armados, este consente em defendê-lo, em troca do que este lhe
dará uma parte das suas colheitas.
Tal é, em geral, o esquema das relações que se criam nos séculos V e VI;
certamente que as modalidades são muito diversas, segundo as circunstâncias
de tempo e de lugar; elas conduzem, em definitivo, a esse estado que se chama,
muito justamente, feudal. Baseia-se, com efeito, no fief, feodum. O termo, de
origem germânica ou celta, designa o direito que se desfruta sobre qualquer bem,
geralmente uma terra: não se trata duma propriedade, mas dum usufruto, dum
direito de uso.
15
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
FONTE: PERNOUD, Régine. O mito da Idade Média. Lisboa: Europa-América, 1979, p. 58-60.
16
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você viu que:
Para estudar a Idade Média ou qualquer outro período histórico, devemos evitar
os perigos do julgamento do passado, do anacronismo e do eurocentrismo.
17
AUTOATIVIDADE
c) Pelo que você pôde perceber, o tema da Idade Média foi tratado de forma
adequada? Que complementações você sente que precisaria fazer em sala de
aula para melhorá-lo?
18
UNIDADE 1
TÓPICO 2
1 INTRODUÇÃO
Se desejarmos estudar e ensinar Idade Média de forma adequada,
precisaremos ir além do que o senso comum fala a respeito desse período e estudar
as interpretações feitas pelos historiadores do assunto. Mas isso não significa,
apenas, conhecer os “fatos” que contribuíram para a transição da Antiguidade
para o mundo medieval. Estudar História é interpretar, é questionar a validade
das teorias, dos conceitos e das interpretações, tentando sempre compreender
como surgiram, ou seja, situá-las em um contexto histórico.
19
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
NOTA
HISTORIOGRAFIA
Prezado(a) acadêmico(a), discutiremos a seguir algumas das teorias ou interpretações que
foram feitas ao longo do tempo sobre o declínio do Império Romano e o surgimento da Idade
Média.
Preste atenção não apenas ao conteúdo das teorias, mas tente observar a época em que a
teoria foi criada, o local em que o seu formulador viveu e sua origem social ou cultural, pois
isso é fundamental para compreender o seu sentido.
Vegécio viveu por volta do ano 450 e escreveu sobre a tecnologia militar do
Império Romano tardio e início da Idade Média. Salviano vinha de uma família
abastada, possivelmente nobre, e foi sacerdote cristão no início do século V. Eram,
portanto, contemporâneos (ou seja, viveram na mesma época) do processo de
queda do Império. Eram também romanos, cristãos e letrados, o que demarca uma
posição sociocultural muito específica e privilegiada.
20
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
AUTOATIVIDADE
21
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
AUTOATIVIDADE
DICAS
SUGESTÃO DE LEITURA
O livro “Declínio e queda do Império Romano”, de Edward Gibbon, é uma leitura obrigatória
para quem desejar entender a fundo o processo de surgimento da Idade Média. Além de
detalhado e muitíssimo bem redigido, o livro, escrito no século XVIII, é hoje um documento
histórico importantíssimo, pois mostra como um estudioso viu esse processo há mais de
200 anos e por ser um dos grandes exemplos de como se escrevia História antes da grande
transformação do século XIX.
22
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
John B. Bury, nos anos 1920, atribuiu a queda do Império a uma série
de fatores e dedicou-se a derrubar a teoria da “queda moral” de Gibbon,
considerando-a “simplista”. Para ele, o que ocorreu foi uma série de ocorrências
infelizes em sequência, de crise econômica e uma crescente dependência dos povos
germânicos para o exército a uma perda de vigor moral que gerou uma falta de
lideranças firmes.
23
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
que o gênio criador dos primeiros homens medievais não estava, ou não se
exercia, no conhecimento literário do velho modelo clássico.
O êxodo rural decorrente dessa degradação teria agravado, por sua vez, as
condições de saúde nas cidades, predispondo as populações a epidemias de varíola,
cólera e outras doenças.
24
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
NOTA
Uma teoria que segue essa linha foi criada por Henri Pirenne, no início do
século XX. Pirenne discordava do marco tradicional da queda do Império Romano,
estabelecido por Gibbon como a queda de Roma em 476 sob os exércitos de Odoacro.
Para ele, os reinos germânicos não representaram o fim do Império Romano, mas
uma continuidade deste, apenas em um formato ligeiramente diferente.
NOTA
HISTORIOGRAFIA
As teses de Henri Pirenne tiveram influência muito grande sobre alguns de seus conterrâneos,
que viriam a elaborar os pressupostos da escola historiográfica dos Annales – especialmente
Marc Bloch, Lucien Febvre e Fernand Braudel. Bloch rejeitava a história dos eventos e advogava
estudos baseados na interpretação de fenômenos sociais. Febvre trabalhou com a noção de
rupturas e permanências na história. Braudel desenvolveu a teoria do mundo mediterrâneo,
ao redor do qual as trocas culturais permitiriam uma homogeneização da civilização. Busque
mais informações sobre esses autores e tente relacionar a teoria de Pirenne com essas ideias.
25
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
DICAS
SUGESTÃO DE LEITURA!
Prezado(a) acadêmico(a), se você tiver interesse nas teorias de Henri Pirenne, procure seu
clássico sobre o assunto:
PIRENNE, Henri. Maomé e Carlos Magno. O impacto do Islã sobre a civilização europeia. Rio
de Janeiro: PUC-RIO/Contraponto, 2010.
Obs.: O livro foi publicado na França logo após a morte de Pirenne, em 1835.
Muitos foram os críticos da tese de Pirenne. Citamos alguns:
BARK, William Carroll. Origens da Idade Média. Rio de Janeiro: Zahar, 1979, p. 16-48.
HODGETT, Gerald A.J. História social e econômica da Idade Média. Rio de Janeiro: Zahar,
1975, p. 55-60.
LOPEZ, Robert S. Mohammad and Charlemagne: a Revision. Speculum, XVIII (1943), p. 14-38.
26
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
AUTOATIVIDADE
REFLETINDO...
Quando Pirenne estabelece como marco inicial da Idade Média o avanço do
Islamismo, que sentidos para a história ele está, implícita ou explicitamente,
atribuindo? Quais os significados que ele dá para os marcos tradicionais e
para o marco que ele próprio estabelece? Perceba que um dos “marcos” dessa
controvérsia é o papel que os povos germânicos teriam entre a tomada do
Império (século V) e o confronto com o Islã (século VII). Perceba também que
a coroação de Carlos Magno se torna, na análise de Pirenne, um símbolo que
demarca uma transformação significativa. O que você pensa a respeito disso?
Não nos estenderemos, agora, nesse ponto. Veremos apenas algumas das
perspectivas mais comuns sobre o tema.
27
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
envolvidas nesse processo e elas não podem ser explicadas simplesmente pelo
retorno do comércio.
28
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
AUTOATIVIDADE
29
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
30
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
LEITURA COMPLEMENTAR
Gerald Hodgett
[...] A tese de Pirenne foi que após 570, aproximadamente, o comércio através
do Mediterrâneo começou mesmo a expandir-se até o princípio do século VIII.
31
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
Certos aspectos das opiniões de Pirenne não são mais aceitáveis pelos
estudiosos. Baynes julgou que suas alusões aos mercadores sírios mencionados por
Gregório de Tours não provavam a continuidade do comércio1. Lopez, apesar de
concordar que, culturalmente, o avanço islamítico foi mais disruptivo do mundo
romano do que haviam sido as ocupações germânicas, discorda em muitos detalhes
econômicos2. Argumenta particularmente que muitos dos “desaparecimentos” na
Europa ocidental, que, para Pirenne, coincidiram com o controle da Europa ocidental
pelos muçulmanos, não foram contemporâneos, quer em relação ao avanço árabe,
quer um em relação ao outro. [...] Como Lopez demonstrou, a oferta de papiro
não cessou com a conquista do Egito; pelo contrário, as fábricas, que contavam em
grande parte com o trabalho de cristãos, continuaram a produzi-lo e os muçulmanos
a exportá-lo para Constantinopla, onde o Código de Justiniano, ainda em vigor,
exigia que certos documentos fossem redigidos em papiro. [...]
Dessa forma, os argumentos de Pirenne sobre o papiro são fracos e sua tese
de que houve um súbito abandono por parte dos carolíngios da cunhagem em ouro
merovíngia não pode ser mantida, pois, tanto Carlos Magno como Luís, o Piedoso,
cunharam moedas de ouro. Como disse Renouard, ele não conseguiu substanciar
sua tese de que a vida econômica na Europa ocidental se manteve com a mesma
intensidade até o século VIII3.
32
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
1
N.H. Baynes, “Pirenne and the unity of the Mediterranean world”, J. Rom. Studies,
XIX (1929), 230-5.
2
R. S. Lopez, “Mohammed and Charlemagne: a Revision”.
3
Y. Renouard, Hommes d’Affaires Italiens (Paris, Colin, 1949), p. 8.
4
F. Vercauteren, “Monnaie et circulation monétaire en Belgique e dans le Nord de
la France du Ve au XIe siècle”, Settimane di studio... di studi sull’alto medioevo,
Spoleto, VIII (1961), 279-311.
5
No que concerne às razões monetárias que levaram à substituição do ouro pela
prata no Ocidente, ver P. Grierson: “The monetary reforms of ’Abd al-Malik”, J. of
the Economic and Social History of the Orient, III, 3 (1960), 241 e ss.
FONTE: HODGETT, Gerald A.J. História social e econômica da Idade Média. Rio de Janeiro:
Zahar, 1975, p. 56-60.
33
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico você viu que:
34
AUTOATIVIDADE
2 Baseado nas teorias apresentadas nesta seção, tente elaborar uma explicação
abrangente para a decadência do Império Romano do Ocidente e o surgimento
do mundo medieval.
Assista ao vídeo de
resolução da questão 2
35
36
UNIDADE 1
TÓPICO 3
1 INTRODUÇÃO
No tópico anterior tratamos da forma como os estudiosos interpretaram a
transformação do mundo antigo na sociedade medieval. Agora, conheceremos os
eventos que levaram a essa transformação, para podermos, nós mesmos, avaliar
o processo. Isso ocorreu no período que se costuma chamar, atualmente, de
Antiguidade Tardia: um período situado, de forma imprecisa, entre os primórdios
da era Cristã e a quebra do poder político romano, seja com as invasões germânicas,
seja com o avanço muçulmano.
UNI
Prezado(a) acadêmico(a)!
Vamos falar sobre o processo de transformação do Império Romano na cultura
medieval. Repare, ao longo do texto, que várias das características medievais estão surgindo
nesse momento.
37
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
pôde manter o modo de vida luxuoso dos patrícios romanos. No entanto, como a
escravidão era baseada essencialmente nos prisioneiros de guerra, era necessário
conquistar terras sem parar, sob risco de o sistema econômico entrar em colapso.
FIGURA 1 – IMPÉRIO ROMANO EM SUA MÁXIMA EXTENSÃO, SOB TRAJANO (177 D.C.)
38
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
NOTA
Ocorre que o Império Romano era mais frágil do que parecia. Mesmo
hoje, as modernas estratégias de administração e as tecnologias avançadas de
comunicações e transportes nem sempre são suficientes para garantir a eficiência
do governo de um território tão extenso como era o do Império Romano, que dirá
há mais de 1.500 anos!
39
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
Por outro lado, não havia na Roma imperial uma situação econômica que
favorecesse o trabalho livre, muito menos o assalariado, em grande escala, de
modo que os escravos pudessem simplesmente ser absorvidos em uma economia
urbana de mercado. Muito ao contrário, a crise e a concentração de legiões nas
fronteiras enfraqueceram as rotas comerciais entre as províncias.
40
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
alimento, mas deviam oferecer alguma compensação para o chefe local, único
capaz de garantir efetivamente sua segurança.
Mas, e o Estado? Como vimos, o Estado romano não era forte o bastante
para garantir a segurança da população, e os imperadores viviam assolados por
conspirações.
Em parte, a crise do período entre 235 e 285 foi gerada pela fórmula da
sucessão imperial. Como não havia um sucessor direto, a disputa era intensa, e
quase todos os imperadores desse meio século (dos 25 imperadores, houve apenas
duas exceções) foram mortos em combate ou assassinados.
41
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
NOTA
OS SASSÂNIDAS
Os Sassânidas foram uma dinastia persa que reinou no chamado Segundo Império Persa, entre
226 e 651 d.C. Seu primeiro período de apogeu, entre 309-379, coincidiu em grande parte
com o período de queda do Império Romano. Seus territórios iam, em sua máxima extensão,
da Líbia à Índia, do Iêmen ao lago Baikal (Rússia), chegando a incluir toda a Ásia Menor (atual
Turquia). Sua religião era o Zoroastrismo. O Império Persa durou até o momento da grande
expansão árabe do século VII, quando, enfraquecido pelos conflitos com o Império Bizantino,
não resistiu ao avanço fulminante do Islã.
42
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
ATENCAO
UNI
43
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
TUROS
ESTUDOS FU
TUROS
ESTUDOS FU
44
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
Uma das principais diferenças era econômica. A parte oriental era muito mais
rica do que a ocidental, por ter ocupação muito mais antiga e intensa, um comércio
mais vigoroso e cidades mais populosas. Por mais que tentassem preservar o seu
ouro, os imperadores do Ocidente, ao contrário de seus equivalentes orientais, não
conseguiam conter a fuga ou a estocagem de recursos, e o resultado foi uma séria
crise inflacionária. Com o dinheiro perdendo praticamente todo o seu valor, cada
vez mais a economia monetária, baseada no ouro e em outros metais, foi sendo
substituída por uma economia natural no Império ocidental.
NOTA
Economia natural: é o nome que se dá a uma forma de produção que não envolve
o uso do dinheiro. Nesse tipo de produção, as pessoas em geral se dedicam à subsistência, e os
poucos produtos restantes são trocados por mercadorias de valor equivalente.
AUTOATIVIDADE
45
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
UNI
E
IMPORTANT
Servo é um termo que vem do latim servus, ‘escravo’. Apesar disso, os servos
não eram escravos: estavam presos não a um senhor, mas à terra em que viviam. Mesmo
assim, ao contrário do que se costuma pensar, a escravidão continuou existindo na Europa
durante a Idade Média; apenas era mais rara. Geralmente, os escravos eram capturados de
povos estrangeiros, especialmente muçulmanos, e havia muitos cristãos escravizados em
terras islâmicas.
UNI
46
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
ATENCAO
Perceba que não estamos falando de pequenos bandos, mas de tribos inteiras, às
vezes, milhares de pessoas, assentadas em terras romanas e mantendo sua autonomia e sua
cultura no interior do Império!
AUTOATIVIDADE
ATENCAO
Uma tentativa de invasão da Itália foi rechaçada pelo general Estilicão (que
era de origem vândalo-romana). Após a morte de Estilicão, o chefe godo Alarico
comandou um cerco a Roma e, em 410, tomou a cidade e saqueou-a durante três
dias.
3.1 OS HUNOS
Há muitas controvérsias sobre a unidade étnica e linguística desse povo
– como, de resto, também entre os povos germânicos. Os hunos eram uma
confederação de povos nômades, provavelmente originários das estepes da
Ásia Central (região entre o Mar de Aral e a Mongólia), que falavam uma língua
provavelmente aparentada ao turco.
O historiador de origem grega Amiano faz uma descrição dos hunos que
dá uma demonstração clara do terror que esses homens infundiam nos romanos:
48
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
49
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
UNI
Os domínios dos hunos, em sua máxima extensão, estendiam-se do rio Reno (na
fronteira da Alemanha) até as proximidades do mar Cáspio, e da atual Estônia até o rio Danúbio.
50
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
LEITURA COMPLEMENTAR
Muito mais surpreendente teria sido a descoberta, se lhes fosse possível fazê-
la, de que por maiores que parecessem as modificações externas, eram pequenas se
comparadas a certas alterações mais sutis da perspectiva, dos valores, dos modos de
pensar e das aspirações. A evolução política, econômica e social [...] foi um movimento
de repulsão às velhas práticas romanas, mas no qual ainda se identificavam as antigas
instituições que haviam provocado. As demais modificações representavam um
movimento no sentido de alguma coisa nova e inteiramente estranha à experiência
de um César ou um Adriano, e dentro em breve se expressariam no comportamento
externo, bem como no pensamento e no sentimento.
51
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
vinho sírio era transportado para a França no século II, e também no século VI. O
produto era o mesmo, o meio de transporte o mesmo, a fonte e o destino os mesmos:
nada mais provável, portanto, que as condições continuassem as mesmas, que as
circunstâncias predominantes no Mediterrâneo perdurassem.
A história não pode ser escrita sem analogias semelhantes, baseadas nesse
tipo de fatos. Não obstante, nessa interpretação o historiador pode deixar de
identificar novas evoluções de aspecto não familiar, pode passar sobre o trigo para
ir ocupar-se do joio. Pode estar descrevendo o lado de fora de uma casca, deixando
a impressão de que se trata mais do que de uma simples casca.
A tese primordial [...] deste trabalho como um todo é a de que algo novo,
distinto e essencialmente original começou na parte europeia ocidental do Império
Romano, que seus elementos são identificáveis a partir do século IV, e alguns até
mesmo antes. Esse “algo de novo” talvez se compreenda melhor como uma nova
atitude para com a vida. Nos séculos de sua formação, ela é parcialmente obscurecida
pelas aparências externas dos remanescentes romanos, mais familiares e mais
evidentes, pela turbulência da época e pela escassez de nossas fontes.
Grande parte das informações que mais gostaríamos de ter não pareceu aos
contemporâneos como merecedora de ser preservada, sob qualquer forma; outra
parte perdeu-se para nós em incêndios, guerras, mau trato. Talvez a pior ameaça
de todas tenham sido certas ideias fixas poderosas: a preocupação com a imensa
epopeia do declínio e queda, a opinião “autorizada” de que o princípio da Idade
Média foi uma época de ignorância supersticiosa e letargia geral, animada apenas
por instantes de violência e crueldade bárbaras. [...]
Sabemos agora que a Idade das Trevas não foi de trevas. Ignorância, letargia,
desordem, existiram então como hoje, e longe estiveram de predominar numa
época ansiosa de conhecimento, vigorosa em seu modo de viver e de se expressar,
e idealista nas suas construções.
Talvez não seja demais dizer que a sociedade medieval tinha formas
funcionais com que a idade antiga nem sonhara, formas essas que levaram a fins
jamais imaginados em épocas anteriores. Por “funcional” entendo que era uma
sociedade ativa, trabalhadora, experimentadora, cometendo erros frequentemente,
mas também utilizando a energia de seu povo muito mais integralmente que suas
52
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
FONTE: BARK, William C. Origens da Idade Média. Rio de Janeiro: Zahar, 1979, p. 97-101.
53
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico você viu que:
54
AUTOATIVIDADE
3 Como foi dito no tópico anterior, William C. Bark acredita que o Império
Romano caiu por causa das tentativas de mantê-lo. Encontre neste tópico
elementos que permitam confirmar essa teoria.
55
56
UNIDADE 1
TÓPICO 4
1 INTRODUÇÃO
O período compreendido entre os séculos V e X, aproximadamente, costuma
ser denominado pelos historiadores de Alta Idade Média. Foi um período marcado
pela criação de reinos que, em um lento processo, promoveriam a integração entre
as culturas tão diferentes dos romanos e dos germânicos, por meio da religião
cristã. Esses reinos, no entanto, não tinham a unidade e a estabilidade que havia
tido o Império Romano, de modo que, por volta do ano 1000, a ordem política da
Europa era claramente fragmentada.
UNI
SUGESTÃO DE LEITURA
Prezado(a) acadêmico(a), uma boa obra de referência para aprofundar seus conhecimentos
acerca dos temas abordados neste tópico é: LE GOFF, Jacques. A Civilização do Ocidente
Medieval. Bauru: Edusc, 2005.
2 OS REINOS BÁRBAROS
Como vimos no tópico anterior, a presença dos bárbaros completou o
processo de desagregação do Império Romano do Ocidente. Até o século V, diversos
povos haviam invadido o Império, e começaram a criar domínios relativamente
independentes (inicialmente na condição de foederati), que se tornariam os
chamados reinos germânicos.
57
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
UNI
Outro problema enfrentado pela maioria dos reinos bárbaros era religioso:
no processo de migração, os bárbaros haviam sido, em sua maioria, cristianizados
pela corrente ariana do Cristianismo. Para os católicos romanos, o arianismo era
uma heresia, e os povos germânicos que a adotavam eram vistos, muitas vezes,
como inimigos.
TUROS
ESTUDOS FU
58
TÓPICO 4 | O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
Vândalos: após invadirem a Península Ibérica entre 407 e 409, foram expulsos
de lá pelos romanos e visigodos. Invadiram a África do Norte em 429, onde
fundaram um reino poderoso. (Santo Agostinho morreu durante essa invasão
59
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
ATENCAO
A imagem que se tem dos povos bárbaros como incapazes de criar um reino
organizado, por não conhecerem as tradições e as leis romanas, não é correta. Observe-se,
por exemplo, o caso de Teodorico, rei ostrogodo. Essa imagem é preconceituosa porque parte
da ideia de que os germânicos eram ignorantes e incapazes de elaborar governos sofisticados,
coisa que só os civilizados romanos teriam condições de fazer.
3 O REINO FRANCO
No entanto, de todos os povos bárbaros, o que teve mais sucesso em criar e
consolidar um reino foram os francos. As razões para isso têm a ver, entre outros
fatores, com a conversão dos francos ao cristianismo católico, que facilitou a sua
aceitação pelas populações galo-romanas.
60
TÓPICO 4 | O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
Com a morte de Pepino, o Breve, seu filho Carlos assumiu o trono. Seu
reinado foi caracterizado por uma grande ampliação nos domínios francos (ver
mapa a seguir) e por uma valorização da cultura. Carlos Magno, como ficou
conhecido, consolidou a aliança entre os francos e a Igreja e, como um prêmio à
sua lealdade e às suas conquistas e forma de garantir a predominância do papado
sobre o governante mais poderoso do Ocidente na época, o Papa Leão III coroou-o
“imperador romano” no Natal de 800.
62
TÓPICO 4 | O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
Carlos Magno, ele próprio analfabeto até a idade adulta, entendeu bem
a importância da educação. Seus estudiosos, comandados por Alcuíno de York,
instituíram os currículos do trivium (gramática, lógica e retórica) e do quadrivium
(aritmética, geometria, música e astronomia) e criaram obras literárias originais em
latim medieval.
63
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
NOTA
64
TÓPICO 4 | O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
65
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
NOTA
4.2 O ARIANISMO
A Igreja, criada como uma analogia do Império, tinha uma estrutura
rígida, que se fundou cada vez mais na primazia do bispo de Roma, considerado
o sucessor de São Pedro (desde Leão I, em meados do século V), sobre os demais.
Isso significava a necessidade de se manter uma única autoridade suprema na
Terra, assim como havia uma única divindade no Céu.
ATENCAO
Não estamos querendo dizer, com isso, que a motivação para combater as
heresias fosse simplesmente política, ou seja, que os papas estivessem preocupados apenas
em manter o seu poder diante das ameaças. Entender o combate às heresias apenas do ponto
de vista político é tão incorreto quanto entendê-lo apenas do ponto de vista teológico. Como
dissemos, não havia uma separação clara entre as duas categorias.
66
TÓPICO 4 | O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
a 318 bispos que se estima que compareceram (de acordo com as várias contagens),
apenas dois apoiaram Ário. O Concílio estabeleceu o chamado Credo Nicênico,
que reafirmava toda a doutrina católica e que, com modificações, é recitado até
hoje, em praticamente todas as denominações religiosas do Cristianismo.
FONTE: Extraído de ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura: A Doutrina Reformada das Escrituras. São
Paulo: Os Puritanos, 1998, p. 179-80.
67
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
Hilário Franco Júnior (2004, p. 70) faz a seguinte reflexão sobre a Regra:
68
TÓPICO 4 | O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
NOTA
VOCÊ SABIA?
Quando o Papa Bento XVI explicou, dias após a sua eleição, em 2006, a razão para escolher
seu nome, mencionou o trabalho importantíssimo de São Bento na evangelização da Europa.
UNI
Perceba que esses monges serviram como o elo de ligação entre essas duas
culturas tão diferentes, o que explica, em parte, o caráter central que a religião teve durante a
Idade Média.
69
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
LEITURA COMPLEMENTAR
70
TÓPICO 4 | O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
71
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
O essencial é que pelo século IV uma nova atitude intelectual para com o
mundo já se firmara, e que essa atitude não era necessariamente superior ou inferior
à da antiguidade clássica, mas simplesmente diferente, e que as circunstâncias
e natureza de seu desenvolvimento eram da maior importância. É de duvidar
que qualquer atitude mental e espiritual menos consistente, agressiva e menos
convencida de sua missão pudesse ter preparado as tempestades que iam envolver
a Europa ocidental nos séculos futuros.
72
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico você viu que:
O reino bárbaro mais poderoso foi o dos francos, que conseguiu o apoio da
Igreja e consolidou o seu domínio sobre grande parte do Ocidente.
73
AUTOATIVIDADE
Assista ao vídeo de
resolução da questão 1
74
UNIDADE 1
TÓPICO 5
AS ORIGENS DO ISLAMISMO
1 INTRODUÇÃO
Desde o início do século XXI, o Islamismo parece estar o tempo todo em
evidência. Os atentados de 11 de setembro de 2001, a crise no Oriente Médio, as
polêmicas sobre símbolos religiosos na Europa, tudo parece apontar para uma
tensão entre Ocidente e Oriente, entre cristãos e muçulmanos. A ideia de um
“choque de civilizações” é controversa e exagerada, mas não temos como negar
que existe pelo menos um estranhamento entre o mundo ocidental e os valores do
Islamismo.
NOTA
75
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
UNI
SUGESTÕES DE LEITURA
Prezado(a) acadêmico(a), existem diversos livros que podem nos dar uma visão mais precisa
sobre o mundo muçulmano, dos pontos de vista político e cultural. Quatro obras, facilmente
acessíveis no mercado editorial brasileiro, podem servir de referência mais imediata:
Para uma visão mais factual do mundo islâmico, ver o livro de:
● GIORDANI, Mário Curtis. História do mundo árabe medieval. Petrópolis: Vozes, 1997.
O livro é parte de uma série de títulos que o autor escreveu sobre História Geral, em um estilo
bastante descritivo e detalhado, mas como costuma ocorrer em obras dessa magnitude, sem
o compromisso com uma reflexão teórico-metodológica mais aprofundada. É um bom ponto
de partida, mas vale a pena complementá-lo com obras posteriores.
Para discussões mais recentes e mais críticas sobre o mundo islâmico, ver:
● HOURANI, Albert. Uma história dos povos árabes. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
● MAALOUF, Amin. As Cruzadas vistas pelos Árabes. São Paulo: Brasiliense, 1988.
● SAID, Edward. Orientalismo. O Oriente como invenção do Ocidente. São Paulo: Companhia
das Letras, 2008.
76
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
É claro que existem, nas duas religiões, pessoas dispostas a isso, mas é
claro, também, que essas pessoas são uma ínfima minoria em populações que são,
em sua quase totalidade, pacíficas.
Como estudiosos de História, não nos cabe julgar o Islã e, muito menos,
aceitar sem questionamento as visões preconceituosas criadas sobre ele. Por isso,
precisamos conhecer o que é o Islã, como surgiu e por que tem obtido esse sucesso
extraordinário.
77
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
UNI
“ca.” (em itálico) é uma abreviatura consagrada do latim circa, que quer dizer
“cerca de”; na dúvida, substituir o “ca.” por “cerca de”,
Aos 25 anos, casou-se com Khadija, uma rica viúva comerciante. Aos
40 anos, Maomé começou a ter visões em que um anjo o incitava a proclamar a
existência de um deus único. Embora logo tenha arregimentado seguidores, a
pregação de Maomé trouxe-lhe a ira dos comerciantes da cidade, que temiam
perder os negócios voltados aos cultos politeístas.
78
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
E
IMPORTANT
NOTA
O CALENDÁRIO ISLÂMICO
O calendário islâmico é contado a partir da migração de Maomé a Medina. Portanto, o ano 1
AH (Ano da Hégira) inicia-se em 622 d.C. O calendário islâmico não segue uma contagem solar
(ou seja, o ano não tem 365,25 dias), mas puramente lunar. O ano é composto de 12 meses de
28 ou 29 dias, que se iniciam sempre quando a Lua crescente é avistada ao pôr do Sol. Dessa
forma, o ano tem cerca de 11 dias a menos do que o do nosso calendário. Portanto, embora
tenham decorrido 1390 anos entre a Hégira e o ano de 2012, o ano islâmico que se iniciou em
15 de novembro de 2012 foi 1434 AH.
Após a morte do Profeta, em 632 d.C. (ano 10 d.H.), o poder político passou
a ser disputado entre o genro de Maomé, Ali, e seu grande amigo Abu Bakr, que
foi escolhido pela comunidade como novo líder. A disputa gerou uma cisão
religiosa entre os muçulmanos, que passaram a se dividir entre xiitas e sunitas,
respectivamente, conforme o reconhecimento da autoridade de Ali e de Abu Bakr.
79
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
E
IMPORTANT
80
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
ATENCAO
ÁRABE OU MUÇULMANO?
Costuma haver grande confusão entre os termos “árabe” e “muçulmano”. Árabe é a designação
de uma etnia, formada por pessoas que nasceram, ou cujos ancestrais vieram da Península
Arábica e que falam a língua árabe, de origem semita. Nesse sentido, é árabe a maioria dos
habitantes da atual Arábia Saudita, mas também dos Emirados Árabes Unidos, Egito, Iraque e
outros países, mas não a maioria dos iranianos, turcos, afegãos ou nigerianos.
Em um sentido mais restrito, árabe pode designar uma nacionalidade, aplicada aos moradores
dos Emirados Árabes Unidos.
Muçulmano é a designação dos fiéis de uma religião, de pessoas que reconhecem em Maomé
o profeta, e que seguem seus preceitos.Pessoas de qualquer etnia podem ser muçulmanas
e, curiosamente, os árabes são, há muitos séculos, minoria no Islã: dos dez países islâmicos
mais populosos hoje, apenas o Egito é etnicamente árabe. Há, também, árabes que não são
muçulmanos, como é o caso da maioria dos libaneses (cristãos).
ATENCAO
Prezado(a) acadêmico(a), o que estamos falando aqui sobre o Islamismo não tem,
de nenhuma forma, a intenção de “confundir suas crenças”, nem de “doutrinar” ou “converter”
você. Os próprios autores, aliás, nem muçulmanos são... Mas o Islamismo é uma das maiores
religiões do mundo e o seu surgimento influenciou enormemente a história mundial, e é
por esse motivo que precisamos, como historiadores, conhecê-lo de forma relativamente
detalhada, independente de convicções religiosas. Se isso faz ou não sentido para você, é
questão inteiramente pessoal. O mesmo valerá, no futuro, para qualquer outra religião ou
perspectiva filosófica que você estudar.
Lembre-se: para ser um bom estudioso ou professor de História, é preciso manter a cabeça
aberta a várias perspectivas, buscar conhecer os diversos lados possíveis de uma questão e não
julgar as atitudes ou as crenças de ninguém. Por isso, não leia sobre o Islamismo (ou qualquer
outra religião) pensando “isso não é verdade, porque eu sei/o padre disse/ não tem lógica/ na
Bíblia fala que...”; essa atitude é inadequada para quem deseja estudar História.
No fim das contas, para os historiadores, pouco importa se uma coisa é ou não “verdadeira”,
ou se existe ou não uma “Verdade”. O que importa é como as pessoas entenderam e lidaram
com isso.
E quando você mesmo(a) for professor(a), incite seus alunos a fazerem a mesma coisa.
81
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
2. As preces: o fiel tem a obrigação de rezar cinco vezes ao dia. A prece é feita
recitando-se versos do Alcorão em língua árabe, com o corpo voltado na direção
de Meca (se o fiel não conseguir descobrir qual o lado correto, basta supor).
Pode ser feita em uma mesquita ou em qualquer outro lugar onde o fiel esteja
3. Os tributos: o fiel tem a obrigação de dar parte dos seus rendimentos para
auxiliar aos pobres ou necessitados. Essa contribuição, chamada zakat, é
diferente da esmola, que é opcional: o zakat é uma obrigação religiosa.
82
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
5. A peregrinação: o fiel deve viajar a Meca, em peregrinação, pelo menos uma vez
na vida, se suas condições econômicas assim lhe permitirem. Uma vez em Meca,
deverá cumprir uma série de rituais ao redor da Caaba e em outros pontos na
cidade.
3.2 O ALCORÃO
O Alcorão é o livro sagrado dos muçulmanos. De acordo com a tradição
islâmica, o Alcorão representa com perfeição a palavra de Deus e existe desde
sempre. Por esse motivo, é chamado de “O Livro Incriado”. Ele teria sido
simplesmente revelado a Maomé em 114 capítulos, ou suras, das quais 92 ditadas
em Meca e as outras 22 suras em Medina.
83
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
E
IMPORTANT
Prezado(a) acadêmico(a), você já viu algumas vezes, neste tópico, falar em “tradição
islâmica”. Com esse termo estamos nos referindo a pontos centrais da crença muçulmana,
que não constam diretamente do Alcorão (ou mesmo das Sunas ou dos Hadiths), mas que
foram interpretados dessa forma pelos estudiosos da religião. Algumas dessas tradições podem
parecer absurdas ou totalmente contrárias à razão. Mas lembre-se: o compromisso da tradição
islâmica não é com a razão e sim com a interpretação do Livro Sagrado. Toda religião parte de
pressupostos que parecem absurdos aos não crentes, mas não cabe ao historiador julgar se
esses preceitos têm alguma validade racional, teológica ou metafísica.
De acordo com a tradição sunita, o Alcorão não foi escrito por Maomé. Ele
teria recebido a revelação das suras diretamente de Allah, e estas eram anotadas
por pessoas próximas a ele. Temendo que o conteúdo do livro se perdesse, o
primeiro califa, Abu Bakr, ordenou a transcrição do livro pouco tempo após a
morte de Maomé.
Foi apenas no reinado do terceiro califa, Uthman Ibn Affan (às vezes,
traduzido em português como Osman ou Omã), que o texto final, como é conhecido
hoje, foi consolidado a partir das diferentes versões que já existiam. O texto final
foi copiado e difundido para toda a ummah (mundo islâmico) que, àquela altura,
como veremos, já era bastante extensa.
84
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
NOTA
“CORÃO” OU “ALCORÃO”?
O termo “Alcorão”, utilizado, frequentemente, para descrever o nome do livro sagrado dos
muçulmanos, popularizou-se em Portugal durante a ocupação islâmica, na Idade Média. O
prefixo “al” representa, na língua árabe, o artigo definido “o”; em português, passou a ser utilizado
em centenas de palavras de origem árabe que foram incorporadas ao idioma: algodão, alface,
alcaide, aldrava, algibeira, almoxarifado, almanaque, e muitas outras. O termo “Alcorão” segue a
mesma regra. “Alcorão” significa “a recitação”.
Recentemente, temos visto na imprensa o termo “Corão”. É a tradução direta do termo utilizado
em francês (Coran) e inglês (Koran ou, como tem sido comum hoje, Qur’an), entre outras
línguas, para designar o livro. Lembre-se de que a França e a Inglaterra não foram ocupadas pelos
árabes, então não fizeram essa incorporação do “al”. Termos de origem árabe que em português
incorporam o artigo (arroz, açúcar, algodão), não o fazem em francês (riz, sucre, coton) nem em
inglês (rice, sugar, cotton). Em português, os dois termos são corretos, mas é preferível o termo
clássico “Alcorão”.
85
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
a Sharia, o código moral e religioso do Islã, que trata dos mais variados aspectos da
legislação e da vida quotidiana dos muçulmanos: alimentação, higiene, conduta,
vestimenta, comércio etc.
86
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
FIGURA 17 - Mapa: A distribuição das escolas de interpretação da lei (Fiqh) pelo mundo
islâmico. Nos tons mais escuros, os locais de predominância xiita
Por tudo isso, foi um dos elementos fundamentais de difusão do Islã entre
os povos conquistados, do estabelecimento de uma certa homogeneidade cultural
no mundo muçulmano, e do notável florescimento cultural ocorrido entre os
séculos VIII – XIII, aproximadamente, que ficou conhecido como “A Era de Ouro
do Islã”.
TUROS
ESTUDOS FU
88
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
LEITURA COMPLEMENTAR
INTRODUÇÃO AO ISLAM
Muhammad Hamidullah
524. Quando a criança chega à idade adequada para iniciar os seus estudos, logo
após os primeiros quatro anos, organiza-se uma festa em família, ocasião em que
a criança recebe a sua primeira lição. Para promover um augúrio, lê-se, diante da
criança, os primeiros cinco versículos da 96ª Surata do Alcorão, que consistem
da primeira revelação que sobreveio ao iletrado Profeta do Islã, e que se refere à
leitura e à escrita. Faz-se a criança repetir palavra por palavra esse texto. Eis uma
tradução [...]: “Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso. 1. Lê, em nome
do teu Senhor, que criou; 2. Criou o homem de um coágulo. 3. Lê, que teu Senhor é
Generosíssimo, 4. Que ensinou através do cálamo, 5. Ensinou ao homem o que este
não sabia. (96ª Surata, versículos 1-5). [...]
89
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
Morte
537. É proibido gastar com fausto em sepulcros, que devem ser os mais simples
possíveis; devemos, ao invés disso, gastar tais valores com os pobres e com aqueles
que merecem e rogar a Deus para que a recompensa dessa caridade seja dada ao
falecido.
Hábitos Gerais
538. Além das horas dedicadas diariamente às orações e o jejum anual, certos
hábitos são recomendados aos muçulmanos. O mais importante é o de estudar
continuamente o texto e a tradução do Alcorão, meditar sobre o seu conteúdo, para
assimilar as suas diretrizes na vida quotidiana. O que pode causar mais felicidade
do que a invocação da Palavra de Deus?
539. Devemos dizer Bismil-lah (i.é, em nome de Deus) quando estivermos para
começar qualquer ato, e alhamdulil-lah (i.é, louvado seja Deus) ao terminar o mesmo.
Quando se pretende ou se promete algo para o futuro, deve-se dizer imediatamente
inchaal-lah (i.é., se Deus quiser).
542. O Profeta preferia o lado direito. Quando calçava as sandálias, calçava primeiro
o pé direito, e depois o esquerdo, e exatamente o contrário quando as tirava; quando
vestia uma camisa, vestia primeiro o braço direito, depois o esquerdo; quando
penteava o cabelo, penteava-o primeiro do lado direito, e depois do esquerdo; ao
entrar numa casa, ou na mesquita, fazia-o primeiro com o pé direito, depois com o
90
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
91
RESUMO DO TÓPICO 5
Neste tópico você viu que:
Além do Alcorão, a sharia retira seus preceitos dos hadiths e das sunas, que
reúnem declarações e práticas de Maomé.
92
AUTOATIVIDADE
1 Elabore uma síntese explicativa sobre o Islamismo.
Assista ao vídeo de
resolução da questão 1
93
94
UNIDADE 2
• observar a era feudal a partir de uma perspectiva mais ampla e mais com-
plexa do que a tradicional redução simplista da Europa medieval ao feu-
dalismo e à “Idade das Trevas”.
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer e no final de cada
um deles você encontrará atividades que contribuirão para sua reflexão e
análise dos conteúdos adquiridos.
TÓPICO 4 – O FEUDALISMO
Assista ao vídeo
desta unidade.
95
96
UNIDADE 2
TÓPICO 1
1 INTRODUÇÃO
Houve um tempo em que arte, religião, cultura e política se fundiram a
tal ponto que era impossível distinguir uma da outra. Nessa época, a fé movia
os exércitos e era por eles transportada para novas regiões. As concepções sobre
Deus moldavam não apenas a conduta das pessoas, mas a sua lealdade para com
o Estado. Debates acalorados aconteciam a respeito de minúcias religiosas, e de
seus desfechos dependiam reis, exércitos, estados e a vida dos camponeses. A
arte refletia tudo isso, ora retratando imperadores, com a autoridade divina,
ora escapando completamente à representação humana de Deus ou do Profeta,
considerada blasfêmia.
Foi uma época contraditória. De um lado, como se pode ver, quase todos
os aspectos da vida cotidiana ficavam sujeitos à religião; de outro, diversas regiões
do mundo, em contato, sobretudo pela guerra e, novamente, pela diferença de
crenças, prosperaram, cada uma a seu modo. Nesse longo período, as sociedades
dividiam-se localmente por querelas religiosas ou por dificuldades de controle de
vastos territórios por governantes fracos, mas permaneceram coesas por séculos.
97
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
perceberá que, em todas essas sociedades, o período entre os séculos VIII e XIII foi
de intensas transformações culturais, que moldaram o mundo de hoje de forma
irreversível.
NOTA
Caros acadêmicos!
A partir de agora iniciaremos uma leitura sobre o Império Romano do Oriente, na qual
procuraremos destacar suas características marcantes. Você encontrará, ao longo do texto,
referências bibliográficas, caso queira se aprofundar no assunto. Recomendamos a consulta
em mapas, se houver dúvida acerca de alguma localização geográfica. Boa leitura!
98
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
NOTA
E
IMPORTANT
O Médio Império, por sua vez, representou o mais longo dos períodos.
Nos primeiros momentos, os bizantinos sofreram com as invasões persas em
99
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
Jerusalém e árabes na Síria e no Egito. Porém, nesta mesma fase o império viveu,
sob a dinastia dos Macedônicos, a segunda época de ouro.
NOTA
TUROS
ESTUDOS FU
100
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
101
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
102
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
NOTA
NOTA
104
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
3 CONSTANTINOPLA
Quando um estrangeiro em embaixada, ou mais simplesmente um humilde
súdito do império, que a sorte não favoreceu, contempla Constantinopla do alto
das colinas que a cercam, sua fama, levada de cidade em cidade e de aldeia em
aldeia, torna-se uma esplendorosa realidade. No cruzamento das vias terrestres da
Europa e da Ásia, Constantinopla está construída sobre o estreito canal marítimo,
o Bósforo, que abre caminho ao Mar Negro e às terras da Ásia Central para o
Mediterrâneo. A cidade prospera em uma situação natural privilegiada. No fim do
século V de nossa era, Constantinopla conta com cerca de um milhão de habitantes;
é a maior metrópole do império. (FÈVRE, 1991).
105
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
NOTA
Mentalidade: é definida por Hilário Franco Júnior como “o plano mais profundo da
psicologia coletiva, no qual estão os anseios, esperanças, medos, angústias e desejos assimilados
e transmitidos inconscientemente, e exteriorizados de forma automática e espontânea pela
linguagem cultural de cada momento histórico em que se dá essa manifestação”. (FRANCO
Júnior, 2004, p. 184).
106
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
3.1 A CIDADE
A cidade de Constantinopla, abençoada por Deus, conseguiu sobreviver
aos ataques dos povos bárbaros no século V. A razão para isso, é claro, tem menos
a ver com a proteção divina do que com as reforçadas defesas da cidade e a grande
disponibilidade de recursos (ouro) que podiam ser usados para subornar os
invasores. Ambas as características deviam-se, em parte, à posição estratégica da
cidade e à necessidade de garantir sua segurança.
107
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
108
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
O povo, ávido de luxo e esplendor, une seus farrapos aos mantos reais
debruados de ouro dos aristocratas para ver o cortejo. Nessas ocasiões, a praça
do Augusteon, ponto terminal da Mésia, abriga uma multidão efervescente,
recolhida ou hostil segundo a cerimônia e o humor da cidade.
109
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
NOTA
110
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
3.3 O HIPÓDROMO
As corridas de cavalos eram muito populares entre os romanos da
Antiguidade, e mantiveram-se como o “esporte nacional” dos bizantinos. Em
Constantinopla, o Hipódromo (do grego hippos = cavalo; drómos = corrida) era
mais do que uma simples pista de corrida. Era o local onde as discussões políticas
aconteciam, onde os negócios eram fechados. As altas apostas feitas nos vencedores
eram capazes de criar e destruir fortunas do dia para a noite.
111
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
112
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
LEITURA COMPLEMENTAR
Steven Runciman
«Nunca, daí por diante, a Rússia dos czares esqueceu as ambições que lhe
impunha essa herança, nem deixou modificar-se o espírito que lhe havia instilado
sua educação bizantina. Ainda recentemente, se se quisesse fazer ideia do que foi o
mundo bizantino, seria para a corte de São Petersburgo e para o Kremlin de Moscou
que valeria a pena dirigir os olhos. Em nenhuma parte, mais que na Rússia czarista,
se havia conservado a imagem fiel de Bizâncio desaparecida».
Essa imagem era bem visível na concepção russa do poder imperial (o czar
era o lugar-tenente de Deus na Terra), na etiqueta, no luxo da corte, na íntima ligação
existente entre a Igreja e o Estado, no esplendor das cerimônias litúrgicas, no grande
113
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
FONTE: RUNCIMAN, Steven. A civilização bizantina. Tradução de Waltensir Dutra. Rio de Janeiro:
Zahar, 1977, p. 286-287.
114
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico você viu que:
115
AUTOATIVIDADE
2 Que relação simbólica é possível traçar entre o fim das conquistas militares
e essa “helenização” do Império Romano do Oriente?
116
UNIDADE 2 TÓPICO 2
1 INTRODUÇÃO
O Império Romano do Oriente, conhecido pelos historiadores desde o
século XIX como Império Bizantino, como o continuador do Império Romano da
Antiguidade, foi uma entidade política muito particular. Durou mais de mil anos –
a rigor, os marcos temporais tradicionais da Idade Média delimitam a sua duração
e abarcou uma grande quantidade de populações de diferentes origens e religiões.
Como é de se imaginar, em um império tão duradouro, houve períodos de grande
prosperidade econômica e outros de crise.
2.1 O NESTORIANISMO
Em 428, Nestório, patriarca de Constantinopla, propôs a ideia de que Jesus
Cristo, ao contrário do que dizia a doutrina oficial da Igreja, tinha duas naturezas
distintas: divina e humana. Isso era entendido por seus opositores como rebaixando
a condição de Cristo e da Virgem Maria, e foi condenado pelos Concílios de Éfeso
(431) e de Calcedônia (451).
117
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
2.2 A ICONOCLASTIA
As desavenças quanto ao uso de certos elementos no culto católico eram
antigas. A “Querela das Imagens” (728-842) foi um dos significativos conflitos
envolvendo imagens (de Cristo, de Maria, dos santos etc.) nos cultos religiosos.
118
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
No texto que segue podemos ver a sanção (documento com força de lei)
da Igreja Bizantina, condenando o uso das imagens em cerimônias religiosas.
Este documento foi publicado no ano de 754, no Palácio de Hiereia, que ficava às
margens do Estreito de Bósforo. O documento foi retirado do livro de Fernando
Espinosa intitulado “Antologia de textos históricos medievais”.
119
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
120
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
121
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
122
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
NOTA
123
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
NOTA
Vocabulário
Pão ázimo: pão sem fermento, utilizado nos rituais da Páscoa judaica e para a fabricação da
hóstia.
Pernicioso: nocivo.
Conjecturas: suposições, afirmações baseadas em dados não comprovados.
NOTA
UNI
REMISSÃO À LEITURA
No site: <http://www.fosja.com.br/curiosidades.htm#003>, você encontrará informações
sobre as diferenças entre os rituais das Igrejas: Ocidental e Oriental.
124
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
NOTA
FIGURA 27 - IMPÉRIO ROMANO DO ORIENTE (MAIS CLARO) EM SEU AUGE, SOB A DINASTIA
MACEDÔNICA (1025 D.C.).
125
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
NOTA
126
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
NOTA
127
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
4 A DECADÊNCIA
A Cruzada de 1204 foi financiada pela cidade comercial de Veneza, que
disputava com Gênova o monopólio comercial na Europa. Portanto, a guerra posta
em prática pelos cruzados ultrapassou a dimensão religiosa, vindo a funcionar
fundamentalmente como uma luta pelo domínio das principais rotas comerciais
controladas por Constantinopla. As cruzadas favoreceram o enriquecimento dos
comerciantes que, aproveitando-se das viagens, foram criando novas oportunidades
de comércio. Governar Constantinopla significou, acima de tudo, ter o controle
sobre o comércio entre Ocidente e Oriente, entre Europa e Ásia.
128
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
AUTOATIVIDADE
Foi durante o século VII que aquele imperador criou o regime denominado
themas, que consistiu na divisão do território controlado pelos bizantinos. Os themas
eram províncias controladas por um estratego, um chefe que reunia os poderes
militar e civil e devia obediência ao imperador. As tropas por ele comandadas
eram formadas por soldados-camponeses, soldados que se tornaram pequenos
proprietários rurais. Este sistema teve um grande sucesso militar, pois cada soldado
lutava pela proteção de sua família e pela manutenção de suas próprias terras.
Até o século IX, havia sete de themas, número que passou a 25 e, no século
X, saltou para 31. Este sistema político foi criado a fim de proteger as terras do
império dos ataques estrangeiros e, ao mesmo tempo, criar obstáculos para o
129
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
UNI
A partir do que foi exposto, podemos deduzir o que aconteceu no século XII
para resultar no colapso do Império do Oriente. Se você pensou que o imperador
começou a perder o poder e o prestígio a partir do momento em que a aristocracia,
grupo formado por militares de alta patente, passou a dominar grandes extensões
de terra, acertou. A combinação de latifúndio e privilégios políticos aos militares
130
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
fez ruir por dentro a estrutura do grande Império Bizantino, que tinha se reerguido,
nos séculos X e XI, sob a dinastia dos Macedônicos.
NOTA
AUTOATIVIDADE
131
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
LEITURA COMPLEMENTAR
Se Bizâncio devia sua força e segurança à eficiência dos seus serviços públicos,
era o comércio que lhe permitia pagá-los. Sua história é fundamentalmente a história
de sua política financeira e a do comércio da Idade Média.
Até Colombo e Vasco da Gama abrirem uma nova era, o principal comércio do
mundo realizava-se do Extremo Oriente para o Mediterrâneo. A esfera mediterrânea
podia abastecer-se de alimentos e suprir as próprias necessidades. Mas, sempre que
se tornava próspera, punha-se a desejar os artigos de luxo que só o Oriente podia
fornecer.
Nos primeiros séculos da era cristã, o comércio oriental era muito florescente.
Roma importava largamente especiarias, ervas e madeira de sândalo das Índias e,
acima de tudo, seda bruta da China. Tudo isso custava bom preço e as exportações
de vidro, esmalte e artigos manufaturados do Mediterrâneo não eram suficientes
para pagá-lo. Uma soma enorme de ouro ia anualmente para o Leste e essa drenagem
conduziu à depressão que gradualmente envolveu o mundo romano. Mas a procura
da seda continuava e a busca de uma rota menos dispendiosa para importá-la passou
a constituir a preocupação das autoridades.
Várias rotas eram utilizadas pelo comércio oriental. Podiam seguir através
do Turquestão até o Cáspio e daí, quer pelo norte até o Volga e o Mar Negro, no
Quersoneso, quer pelo sul, através da Pérsia Setentrional até Nisibin, na fronteira
imperial, ou através da Armênia, para Trebizonda. Podiam atravessar a Índia e o
Afeganistão e o centro da Pérsia, até Nisbin ou a Síria; ou podiam seguir por mar
até o Golfo Pérsico e então atravessar para a Síria; ou ainda, fazer todo o trajeto
marítimo, Mar Vermelho acima até o Egito.
132
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
O século VI foi uma grande era do comércio oriental. O império, sob Anastásio
e nos primeiros anos da casa de Justino, encontrava-se num estado de renovada
prosperidade e o caminho para o Leste atravessava povos ordeiros. A seda ainda
viajava principalmente por terra, através da Pérsia, para os postos alfandegários
de Nisbin e Dara. Daí partia para as fábricas de Constantinopla ou de Tiro e Bérito.
Mas alguns viajavam com todas as especiarias das Índias pela rota marítima. Um
marítimo aposentado, Cosme, apelidado Indicopleustes, o Marinheiro das Índias,
escreveu um livro para provar, com base na sua larga experiência, que a Terra era
plana; e nele descreve o comércio com a Índia.
Os navios imperiais não iam com frequência ao Ceilão, embora ali houvesse
colônias cristãs nestorianas, e em Caliana, Malabar e Socotra muitos habitantes
falassem o grego. Mas a moeda preferida pelos mercadores orientais de todas as
raças era a imperial, o que constituía grande vantagem para o comércio imperial.
FONTE: GIORDANI, Mário Curtis. História do Império Bizantino. Petrópolis: Vozes, 1968, p. 128-
130.
134
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico você viu que:
135
AUTOATIVIDADE
Assista ao vídeo de
resolução da questão 1
136
UNIDADE 2
TÓPICO 3
1 INTRODUÇÃO
O surgimento do Islã foi uma poderosa força social, política e religiosa, que
transformou radicalmente a região atualmente conhecida como Oriente Médio
e, a longo prazo, o mundo todo. Logo após a morte de Maomé, em 632 d.C. (10
AH pela contagem islâmica), seus seguidores expandiram as fronteiras do mundo
muçulmano com uma rapidez espantosa. Cem anos após a morte do profeta,
territórios sob o domínio do Islã iam do Oceano Atlântico (Marrocos e Portugal)
até a Índia, e nos séculos seguintes esses limites se expandiriam ainda mais.
2 O AVANÇO MUÇULMANO
Impulsionados pela palavra de Deus revelada pelo profeta, e pela jihad,
que pregava a propagação da fé, os muçulmanos deram início imediatamente a
uma estratégia de conquista dos territórios vizinhos à Península Arábica.
E não parou por aí: da morte de Maomé, em 632, até cerca de 750, os
domínios do Islã passaram do deserto da Arábia a todo o território entre o Oceano
Atlântico, no Marrocos, ao vale do rio Indo, no atual Paquistão.
Nos séculos seguintes, a expansão seria ainda maior, mas o rápido avanço
sobre um território tão extenso (muito superior ao território do Império Bizantino,
e consideravelmente superior aos impérios anteriores já surgidos naquela parte
137
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
● o primeiro era constituído por seus seguidores iniciais (unidos por endogamia),
que haviam participado da Hégira;
● o terceiro, por membros das principais famílias de Meca. Nesta disputa, como
já vimos, venceu Abu Bakr, integrante do primeiro grupo e um dos genros de
Maomé.
Basta analisarmos o mapa que segue para termos uma ideia da expansão
dos árabes sob o Islamismo.
138
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
UNI
NOTA
A tradição árabe previa que o líder fosse escolhido por consenso entre os
comandados e todos os primeiros califas (sucessores) foram escolhidos dessa forma.
Mesmo após a escolha de Abu Bakr, seu genro, que tinha justificações militares e
também familiares, o título de califa continuou a ser eletivo não hereditário.
139
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
140
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
Podemos dizer que foi sob o governo omíada que a sociedade muçulmana
ganhou contornos verdadeiramente multiculturais, alastrando-se pela Espanha,
Ásia Central e norte da África e vindo a mesclar-se com outras civilizações.
141
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
NOTA
142
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
NOTA
143
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
UNI
Segundo Giordani:
144
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
UNI
Você se lembra de que os abássidas tomaram o poder no século VIII? Pois é, este
fato fez com que a antiga dinastia, omíada, se retirasse de cena. E foi na longínqua província de
Andalus que a família omíada encontrou refúgio e proteção.
caía a última cidade sob jurisdição do Islã, Granada. Porém, a cultura islâmica
permaneceria por mais tempo naquelas paragens europeias. O fim do domínio
político muçulmano na Espanha representa, para nós, “fazedores de história”, um
dos principais marcos do início da Idade Moderna.
146
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
TUROS
ESTUDOS FU
O impacto dos turcos e dos mongóis ficará mais claro na Unidade 3, quando
estudarmos as Cruzadas e as Invasões Mongólicas.
147
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
4 A CULTURA MUÇULMANA
Toda essa diversidade étnica, aliada às características próprias da religião,
permitiu que as regiões muçulmanas produzissem uma riqueza cultural de valor
inestimável.
4.1 AS ARTES
A percepção artística dos povos islâmicos está fortemente condicionada
aos preceitos religiosos. Um dos mais importantes, nesse contexto, é a proibição
da reprodução da figura humana, decretada no Alcorão. Com isso, algumas artes
que se desenvolveram fortemente na Europa, como a pintura e a escultura, são
muito menos expressivas entre os países muçulmanos. Por outro lado, algumas
artes encontraram uma expressividade que não tem paralelo no Ocidente.
UNI
SUGESTÃO DE LEITURA!
Prezado(a) acadêmico(a), se você tiver interesse em saber mais sobre a arte islâmica, ou se
desejar encontrar imagens para ilustrar as aulas que ministrará sobre o assunto, sugerimos
buscar com cuidado pela internet. É um repositório de informações riquíssimo. No entanto,
é sempre bom verificar as informações antes de selecionar as imagens, especialmente para
saber se elas são acuradas e não violam direitos autorais.
Uma boa fonte de informação sobre a arte islâmica é a recente obra de:
● MANDEL, Gabriele. Como reconhecer a arte islâmica. Lisboa: Edições 70, 2010.
4.1.1 Os arabescos
Em parte para compensar a proibição de representar a figura humana, os
povos muçulmanos desenvolveram uma técnica de entrelaçar símbolos, imagens e
letras do flexível alfabeto árabe em figuras denominadas arabescos. Os arabescos
podem ser pintados, gravados ou esculpidos, e são um elemento central da estética
islâmica desde o início da religião.
148
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
4.1.2 A caligrafia
Tirando proveito da beleza e flexibilidade do alfabeto árabe, os calígrafos
refinaram a sua arte ao extremo. A caligrafia está presente em praticamente todos
os lugares e situações. Os textos, muitas vezes, são dispostos de formas elegantes e
engenhosas, formando figuras, arabescos ou belas imagens abstratas.
149
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
UNI
Sugestão de site. Para ver centenas de versões como essas, acesse: <bit.
ly/11sg2TZ>.
4.1.3 A arquitetura
A arquitetura islâmica é bastante diversificada, refletindo as inúmeras
culturas que fazem parte do mundo muçulmano. Embora grande parte dos
monumentos arquitetônicos tenha finalidade religiosa (mesquitas e minaretes),
as construções civis (palácios e edifícios em geral) também produziram obras de
inestimável valor cultural.
150
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
4.1.4 Literatura
Uma das mais conhecidas (no Ocidente) obras literárias da cultura islâmica
é a famosa “As mil e uma noites”. A obra, escrita em árabe, é uma compilação
de histórias populares de várias regiões do mundo islâmico, especialmente do
Irã, Arábia e Índia. A obra, embora tenha fornecido uma grande quantidade de
elementos para o imaginário ocidental sobre o Islã, não é uma das mais populares
na região; curiosamente, é mais popular em outras regiões do mundo.
151
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
4.2.1 A Educação
O Alcorão e os Hadiths estão repletos de referências positivas à educação:
“busque a educação do berço até o túmulo”; “a tinta do estudioso é mais sagrada
do que o sangue do guerreiro”- estes são apenas dois exemplos da atitude islâmica
em relação à educação. Os califas, seguindo o que ditava o profeta, foram grandes
incentivadores da cultura e da instrução pública.
4.2.2 A Filosofia
A Filosofia e as ciências foram áreas de conhecimento que atingiram um
alto grau de desenvolvimento e sofisticação no mundo islâmico medieval. A
expansão muçulmana atingiu, em poucas décadas, algumas regiões do mundo
em que essas áreas de conhecimento eram muito refinadas: o mundo helênico, a
Pérsia, a Palestina, o Egito (já sob influência greco-romana) e a Índia.
152
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
4.2.3 As ciências
Dentre os campos da ciência mais estudados no mundo islâmico medieval,
destacam-se: a Matemática, a Astronomia, a Medicina, a Física, a Alquimia, a
Geografia, a História e a Psicologia.
153
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
E
IMPORTANT
154
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
155
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
UNI
GLOSSÁRIO!
cádi: s. m. Magistrado muçulmano, com funções civis e religiosas.
FONTE: Disponível em: <www.priberam.pt/dlpo/Default.aspx?pal=cádi>. Acesso em:
23 mar. 2013 haria, chariá, xaria ou xariá (em árabe ;ةعيرش transl.: sharīʿah, "legis-
lação"), também grafada sharia, shariah, shari'a ou syariah: é o nome que se dá ao
código de leis do Islamismo. Em várias sociedades islâmicas, ao contrário da maioria
das sociedades ocidentais dos nossos tempos, não há separação entre a religião e
o direito, todas as leis sendo religiosas e baseadas ou nas escrituras sagradas ou nas
opiniões de líderes religiosos.
FONTE: Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Dicion%C3%A1rio_Aur%C3%A-
9lio>. Acesso em: 23 mar. 2013.
156
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
E
IMPORTANT
LEITURA COMPLEMENTAR
5
Busca a felicidade agora, não sabes de amanhã.
Apanha um grande copo cheio de vinho,
senta-te ao luar, e pensa:
Talvez amanhã a lua me procure em vão.
10
Hoje os meus anos reflorescem.
Quero o vinho que me dá calor.
Dizes que é amargo? Vinho!
Que seja amargo, como a vida.
11
É inútil a tua aflição;
nada podes sobre o teu destino.
Se és prudente, toma o que tens à mão.
Amanhã... que sabes do amanhã?
157
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
12
Além da Terra, pelo Infinito,
procurei, em vão, o Céu e o Inferno.
Depois uma voz me disse:
Céu e Inferno estão em ti.
13
Não vamos falar agora, dá-me vinho. Nesta noite
a tua boca é a mais linda rosa, e me basta.
Dá-me vinho, e que seja vermelho como os teus lábios;
o meu remorso será leve como os teus cabelos.
FONTE: KHAYYAM, Omar. Os Rubayat. Versão em português de Alfredo Braga. 2003. Versão para
eBook: eBooksBrasil. Disponível em: <http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/rubayat.html>.
Acesso em: 15 fev. 2013.
158
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você viu que:
159
AUTOATIVIDADE
1 Qual a relação que se pode estabelecer entre religião e Estado para entender
a expansão do Islã?
Assista ao vídeo de
resolução da questão 1
160
UNIDADE 2
TÓPICO 4
O FEUDALISMO
1 INTRODUÇÃO
Prezado(a) acadêmico(a), estudaremos agora o que costuma ser entendido
como o “carro-chefe” dos estudos sobre Idade Média: o feudalismo. Mas vamos
fazer isso de uma forma como você provavelmente nunca viu antes.
Foi apenas com Karl Marx que uma perspectiva totalmente nova sobre o
feudalismo foi elaborada, embora Marx tenha sido influenciado pela obra de outros
economistas clássicos de sua época e não questionasse a validade do conceito.
162
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
UNI
163
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
E
IMPORTANT
164
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
3 OS MODELOS DE FEUDALISMO
O que é feudalismo? É a característica central da Idade Média? O crítico social
estadunidense H.L. Mencken dizia, com ironia, que: “há sempre uma solução bem
conhecida para cada problema – elegante, plausível, e errada”. Como veremos, a frase
aplica-se como uma luva ao conceito de feudalismo. Ou, mais ainda, à tentativa de
explicar a Idade Média ocidental a partir desse conceito.
3.1.1 A homenagem
A definição clássica de feudalismo, em linhas gerais, implica uma relação de
obrigações militares e legais mútuas entre duas pessoas. Em termos simples, existia
um senhor (chamado suserano) que delegava a outra pessoa (o vassalo) uma porção
de terra de seus domínios em troca de algum tipo de benefício: obrigações militares,
trabalho, serviços etc. Portanto, era uma relação que beneficiava mutuamente os
dois contratantes, e obrigava-os a respeitar determinadas obrigações. O suserano
era de origem nobre, o vassalo não necessariamente.
165
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
UNI
3.1.2 O feudo
O feudo, como é tradicionalmente entendido, seria uma estrutura agrária
autossuficiente, sob posse de um nobre (senhor). O terreno costumava ser dividido
entre manso senhorial (terras de usufruto do senhor), manso servil (terras de
usufruto do servo) e terras comunais (o terreno do castelo, da vila, mais os bosques,
lagos, pântanos etc., que eram improdutivos ou de uso comum).
166
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
● Banalidades: taxas devidas pelo servo pelo uso de algum tipo de facilidade do
feudo – o moinho, o lagar, o forno etc., geralmente pagas com o produto final.
● Talha: valor pago pelo servo para o custeio das defesas do feudo. A talha era
paga com uma porcentagem da produção do manso servil.
● Mão morta: taxa paga pela família de um servo falecido, para reafirmar a
proteção.
Teria vivido melhor, não fora o fato de que, dois ou três dias por semana,
tinha que trabalhar a terra do senhor, sem pagamento. Tampouco era esse o
único trabalho a que estava obrigado. Quando havia pressa, como em época de
colheita, tinha primeiro que segar o grão nas terras do senhor.
Esses "dias de dádiva" não faziam parte do trabalho normal. Mas isso
ainda não era tudo. Jamais houve dúvida quanto à terra mais importante. A
propriedade do senhor tinha que ser arada primeiro, semeada primeiro e
ceifada primeiro. Uma tempestade ameaçava fazer perder a colheita? Então, era
a plantação do senhor a primeira que deveria ser salva.
167
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
TUROS
ESTUDOS FU
168
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
4 AS ORIGENS DO FEUDALISMO
Existe uma grande polêmica entre os historiadores sobre quais fatores
seriam responsáveis pelo aparecimento do feudalismo na Europa. Quase todos
concordam, porém, que um dos principais destes fatores seria o fato de que entre
os germanos invasores o Estado era entendido como propriedade privada do
governante e não uma República, como entre os romanos.
169
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
170
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
4.3 EM RESUMO
Em resumo, as explicações mais tradicionais atribuem sua origem a, pelo
menos, três causas:
5 FUGINDO AO ESQUEMA
O modelo clássico de feudalismo usado para se pensar a Idade Média,
juntamente com os complementos trazidos pela perspectiva marxista, ainda é o
mais comum nos manuais escolares, especialmente no Brasil. Isso é lamentável,
porque essa perspectiva tem sido contestada há muitas décadas na Europa, pelo
menos desde Marc Bloch.
171
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
UNI
SUGESTÃO DE LEITURA
A literatura sobre a Idade Média é vastíssima. Citamos aqui algumas das obras mais clássicas
sobre o tema:
● DUBY, Georges. A Europa na Idade Média. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
● LE GOFF, Jacques. Para um novo conceito de Idade Média: tempo, trabalho e cultura no
Ocidente. São Paulo: Estampa, 1993.
● WOLFF, Philippe. Outono da Idade Média ou Primavera dos Tempos Modernos? São Paulo:
Martins Fontes, 1988.
Todos os autores relacionados são medievalistas, ou seja, fizeram suas carreiras acadêmicas
estudando a Idade Média. Portanto, praticamente todas as suas obras são relacionadas ao tema,
e são excepcionais fontes de consulta.
5.2 AS COMUNICAÇÕES
“As comunicações também eram precárias: as estradas romanas – que
não eram tão bem construídas como se costuma imaginar” (BLOCH, 1982, p.
61) careciam de manutenção há séculos e estavam interrompidas por trechos
destruídos, pontes que se desfizeram e bandos de salteadores em todos os lugares.
172
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
AUTOATIVIDADE
Prezado(a) acadêmico(a), você não acha que fica bem mais fácil perceber,
a partir dessa “visualização de dentro” da sociedade do início da Idade Média,
as razões pelas quais o Estado era descentralizado e o comércio era fraco na
Europa? A que você pode atribuir a diferença entre essa situação e os períodos
posteriores (Idade Moderna) e, principalmente, anteriores (Idade Antiga)?
5.3 A ECONOMIA
É equivocado dizer que “não existia dinheiro na Europa feudal”; havia uma
relativa quantidade, que era importante para manter o comércio irregular que existia
por toda a parte. A ideia da autossuficiência dos feudos é ilusória; não era possível
produzir, em todos os lugares, os cereais, vinho, laticínios e outros produtos em
quantidade e qualidade suficiente para alimentar a todos.
Sal e ferro precisavam ser trazidos de fora na maior parte das regiões. Tudo
isso requeria dinheiro ou trocas em espécie quando possível – o que não era tão
frequente quanto se acredita.
Por esse motivo, mesmo os mais ricos não tinham recursos suficientes para
conseguir planejar seus negócios e garantir sua segurança por longo tempo, e
viviam pouco melhor do que os camponeses. Boa parte do ouro que existia escoava
lentamente para os domínios bizantinos e muçulmanos, levados por comerciantes
que traziam aos senhores alguns poucos luxos ou produtos necessários.
173
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
UNI
REFLETINDO...
- Quer dizer, então, que tudo o que estudamos sobre Idade Média está errado? Que essa não
era uma época em que o comércio desapareceu, em que senhores ricos e poderosos só se
preocupavam em fazer guerra e explorar seus servos, em que as pessoas nunca na vida saíam de
seu pequeno feudo autossuficiente?
- Sim e não. Digamos que essa visão é exagerada e esquemática. Havia comércio, transportes,
comunicações, desenvolvimento técnico, poder real etc.; mas em escala dramaticamente menor
do que temos hoje. Essa diferença de escala é fundamental: ao contrário do dinamismo econômico
da Idade Moderna, a economia medieval era estagnada e irregular – o que é diferente de dizer que
não existia nada.
6 O AUGE DO FEUDALISMO
Apesar dos esforços de reis e papas para constituir domínios políticos,
como o Império Carolíngio e o Sacro Império Romano-Germânico, a tendência era
muito mais à desagregação política do que à unidade territorial. Os chefes locais,
sustentados pela lealdade de seus vassalos, sentiam-se fortes o suficiente para recusar
a autoridade real, e mantinham seus próprios domínios da forma como podiam.
174
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
Tudo isso começou a mudar por volta do ano 1000, ainda que lentamente
e de forma desigual. A Europa ocidental do início do II Milênio era, certamente,
uma sociedade em transformação. Após séculos de desordem política e econômica
– causada, como já vimos, pela crise do escravismo e da produção agrícola no
período pós-romano e pela interminável sucessão de invasões de povos nômades
(“bárbaros”) –, a sociedade recuperava agora sua estabilidade e retomava o
crescimento demográfico e econômico. Por volta do ano 1000, a Europa lentamente
despertava suas forças vitais, após séculos de insegurança social, precariedade
técnica e dogmatismo intelectual.
175
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
6.2 A PRIMOGENITURA
A pressão exercida por este aumento de população sobre a estrutura
fundiária, já excessivamente fragmentada, levou alguns clãs senhoriais a adotar
uma medida extrema para evitar uma descendênciamiserável: a escolha de
apenas um dos filhos varões para herdar a propriedade. Adotada por todos os
clãs em situação de análoga perda de prestígio, esta prática paulatinamente se
generalizou, transformando-se por força do costume, na Lei Consuetudinária da
primogenitura. A partir de então, os filhos não herdeiros dos diversos clãs que
adotaram a primogenitura vieram a constituir-se num excesso social de população
não absorvida por aquela estrutura fundiária.
176
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
NOTA
Com isso, surgiu uma enorme quantidade de nobres sem terra (ou seja,
sem vassalos e, logo, sem poder nem meios de sustento), que tentavam encontrar
alguma forma de se inserirem na sociedade, como: religiosos, vassalos de algum
senhor mais poderoso ou pretendentes a ocupar algum feudo sem senhor. Isso
gerou uma transformação radical na sociedade, pois colocou os nobres em posições
sociais muito distintas. É por causa disso que surgiram os códigos de cavalaria, de
comportamento (etiqueta), de amor cortês etc.
Estes nobres sem terra – filhos “segundogênitos” dos clãs mais empobrecidos
– deviam permanecer celibatários, uma vez que, sem terras e sem vassalos, não
podiam legar aos filhos uma descendência digna. Esta situação devia lhes parecer
desonrosa, pois, como nobres herdeiros de uma longa genealogia, não podiam
legar o nome da família aos filhos. A condição que lhes faltava era a terra.
TUROS
ESTUDOS FU
Caro(a) acadêmico(a), mais adiante você verá como estes nobres sem terra serão
importantes para o processo conhecido como CRUZADAS. Você também verá como eles,
constituindo-se em cavaleiros, serão imprescindíveis para a formação das CORTES MEDIEVAIS,
após o término do período cruzadista.
177
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
Foi neste momento que surgiram a ferradura, a carroça, o arado com rodas,
as estradas de cascalho e, finalmente, os moinhos (d’água e de vento) assumem a
importância que não tinham na Antiguidade. Além disso, ao Ocidente medieval
deve-se ainda a difusão e o aperfeiçoamento de uma série de mecanismos, tais
como o parafuso, a roda, a catraca, a engrenagem e a polia. Por outro lado, a
construção de igrejas e castelos levou ao desenvolvimento de roldanas e guindastes
rudimentares.
178
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
DICAS
Recomendações de filmes
Caro(a) acadêmico(a)! Sobre os assuntos tratados neste tópico, existem alguns bons filmes
onde você poderá encontrar, além de diversão, conhecimento.
● EL CID, de 1961, dirigido por Anthonny Mann, com Charlton Heston e Sophia Loren.
● O Incrível Exército de Brancaleone, de 1966, dirigido por Mário Monicelli, com Vittorio
Gassman.
● Cruzada, de 2004, dirigido por Ridley Scott com Orlando Bloom, Jeremy Irons e Liam Neeson.
179
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
LEITURA COMPLEMENTAR
Jacques Le Goff
Entre as “redes que se vão constituindo”, o senhor citou a das senhorias. Raramente
o senhor emprega a palavra feudal, entretanto tão comum.
Como você já viu, muitas palavras de que nos utilizamos para qualificar
a Idade Média são de criação recente. Religião, no sentido em que a entendemos,
aparece no século XIV, Feudalidade aparece no século XVII e Cruzada no século XVIII...
Isso não me impede de usar essas palavras e de introduzir outras nesse contexto,
também elas “anacrônicas”, como intelectuais, Senhoria, mais perto das concepções
e da linguagem da época.
180
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
FONTE: LE GOFF, Jacques. Em busca da Idade Média. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011,
p. 156-159.
181
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico você viu que:
Depois do longo processo de invasões bárbaras (do século III ao século IX), as
tensões do sistema feudal se estabilizaram.
182
Este processo de expansão criou novas necessidades que revolucionaram os
métodos de trabalho e aumentaram a produtividade da economia medieval,
sustentando, assim, o crescimento demográfico.
183
AUTOATIVIDADE
Assista ao vídeo de
resolução da questão 3
184
UNIDADE 3
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em cinco tópicos. No decorrer e no final de cada
um deles você encontrará atividades que contribuirão para sua reflexão e
análise dos conteúdos adquiridos.
Assista ao vídeo
desta unidade.
185
186
UNIDADE 3
TÓPICO 1
AS TRANSFORMAÇÕES DO SÉCULO XI E AS
CRUZADAS
1 INTRODUÇÃO
188
TÓPICO 1 | AS TRANSFORMAÇÕES DO SÉCULO XI E AS CRUZADAS
189
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
NOTA
Repare você, caro(a) acadêmico(a), que todos estes eventos são anteriores à data
oficial que tradicionalmente marca o início das Cruzadas no Concílio de Clermont-Ferrand em
1095. Na Europa, apenas o avanço a Leste dos cavaleiros teutônicos sobre os eslavos ortodoxos
das planícies polonesas e das margens do Báltico pode ser considerado posterior, uma vez que
apenas em 1193, a cruzada do Báltico foi legitimada pelo Papa Celestino III.
TUROS
ESTUDOS FU
190
TÓPICO 1 | AS TRANSFORMAÇÕES DO SÉCULO XI E AS CRUZADAS
191
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
que nada tem). Eis porque, humilhados com esses problemas, estes nobres sem
terra da Europa estavam dispostos a responder o apelo do Papa Urbano II.
Porém, a situação no Oriente Médio não era nada favorável aos cristãos no
século XI. Em 1071, os turcos seljúcidas derrotaram o exército bizantino na batalha
de Manzikert e conquistaram parte considerável do império. Dois anos depois,
conquistaram a Palestina e, de acordo com as queixas dos cristãos, passaram a
atacar os peregrinos e a dificultar a vida dos cristãos na região.
Já que a terra que vós habitais, fechada de todos os lados pelo mar e
circundada pelos picos das montanhas, é demasiadamente pequena para a vossa
grande população e como a sua riqueza também não é abundante, uma vez que
ela fornece apenas o alimento suficiente para seus cultivadores [...]. Entrai no
caminho do Santo Sepulcro; arrebatai a terra da raça maldita e submetei-a a vós.
192
TÓPICO 1 | AS TRANSFORMAÇÕES DO SÉCULO XI E AS CRUZADAS
Essa terra em que, como diz a escritura, ‘jorra leite e mel’, foi dada por Deus aos
filhos de Israel. Jerusalém é o coração do Mundo; a terra é, mais do que todas,
frutífera como um novo paraíso de prazeres (apud ESPINOSA, 1981, p. 17).
E
IMPORTANT
Quando olhamos um mapa, pode nos parecer ridículo ou até mesmo cínico o
papa convocar os guerreiros europeus, que não tinham terras em seu continente de origem,
para lutarem pela Palestina, que é semiárida e minúscula na comparação com a Europa. As
terras lá seriam escassas e não resolveriam a pressão feudal. Isso pode nos fazer desconfiar
de oportunismo e de manipulação, mas será que não podemos também considerar outra
possibilidade? Não havia mapas precisos no século XI, e era bem possível que houvesse a ideia
de que a “Terra Santa”, justamente por ser santa, fosse vastíssima e muito fértil.
4 AS CRUZADAS
As Cruzadas são tradicionalmente classificadas da seguinte forma:
193
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
194
TÓPICO 1 | AS TRANSFORMAÇÕES DO SÉCULO XI E AS CRUZADAS
● Sétima Cruzada (1248-1254). Liderada por São Luís (rei Luís XI da França), tinha
por objetivo o Egito. Mas o rei e seus soldados foram feitos prisioneiros, tendo
de pagar enorme resgate, a fim de obterem a liberdade.
● Oitava Cruzada (1270). Também liderada por São Luís. Durante o cerco a Túnis,
Luís morreu vitimado pela peste. Esta foi a última cruzada.
195
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
controle de Constantinopla e seu rico, mas frágil, Império. Nas últimas, ardorosas
e desesperadas expedições, mais resistência encontraram não só dos muçulmanos,
mas também de cristãos ortodoxos desiludidos com a truculência dos latinos.
TUROS
ESTUDOS FU
Caro(a) acadêmico(a)! Você deve ter notado que as cruzadas tiveram múltiplas
motivações e implicações e que elas, sendo algo inteiramente inédito, marcam uma ruptura
com o passado feudal. Nos próximos tópicos, você estudará o mundo novo que começou a se
instaurar na Europa a partir deste movimento.
O escritor libanês Amin Maalouf nos traz um retrato vivo desses ataques a
partir de uma biografia fictícia, mas baseada em histórias reais, em: “As Cruzadas
vistas pelos árabes”. A seguir, um trecho do Prólogo da obra:
196
TÓPICO 1 | AS TRANSFORMAÇÕES DO SÉCULO XI E AS CRUZADAS
UNI
SUGESTÃO DE LEITURA!
Para visões diferentes sobre as Cruzadas, do ponto de vista das maiores vítimas, recomendamos
dois livros:
● FALBEL, Nachman. Kidush Hashem: Crônicas hebraicas sobre as Cruzadas. São Paulo:
Edusp/Imprensa Oficial de São Paulo, 2001.
● MAALOUF, Amin. As Cruzadas vistas pelos árabes. São Paulo: Brasiliense, 1988.
Para que não reste nenhuma dúvida de que o termo Cruzada deve ser
abolido do seu vocabulário quando se referir a uma ofensiva militar e/ou religiosa,
transcrevemos aqui outro trecho da obra de Maalouf, que descreve atitudes ainda
mais cruéis e truculentas dos cruzados sobre as populações locais.
197
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
ATENCAO
OS CANIBAIS DE MAARA
Esse poeta cego, livre pensador, ousara atacar os costumes de sua época,
sem se preocupar com as proibições estabelecidas. Era preciso audácia para
escrever:
198
TÓPICO 1 | AS TRANSFORMAÇÕES DO SÉCULO XI E AS CRUZADAS
199
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
NOTA
Por causa de episódios como esse, as Cruzadas aparecem, aos olhos dos
muçulmanos, como um movimento de selvageria injustificada contra sua religião e seus
povos. Mas é importante que se diga que, durante muito tempo, as Cruzadas não eram parte
do imaginário muçulmano; essa visão tem sido incentivada atualmente por grupos políticos
específicos, que desejam incitar os muçulmanos ao confronto direto com o Ocidente; mas,
declarações como a de Bush (2001) e do Papa Bento XVI (2006) não ajudam em nada a
melhorar a imagem ocidental.
Salomão Bar Sansão foi um dos cronistas que narrou o ocorrido, desse
ponto de vista:
200
RESUMO DO TÓPICO 1
● Depois do longo processo de invasões bárbaras (do século III ao século IX), as
tensões do sistema feudal se estabilizaram.
● Resultou da carência de terras por parte da nobreza feudal que, num amplo
movimento militar, expandiu-se em todas as direções.
201
● Apesar dos êxitos passageiros, enquanto expedições de conquista de terras na
Palestina, as cruzadas fracassaram; no entanto, foram importantíssimas para
abrir, ao ocidente latino, as rotas do comércio oriental.
202
AUTOATIVIDADE
3 Após ler o texto “Os canibais de Maara”, responda: Quem eram os franj? De
que forma eles foram representados pelos habitantes de Maara?
Assista ao vídeo de
resolução da questão 2
203
204
UNIDADE 3
TÓPICO 2
AS CONQUISTAS MONGÓLICAS
1 INTRODUÇÃO
UNI
SUGESTÃO DE LEITURA
Prezado(a) acadêmico(a), este é o tópico em que discutiremos com mais intensidade uma
história global, fugindo ao esquematismo da história medieval europeia fechada em si mesma.
Há um livro muito interessante que observa a história dessa forma:
● WOLFF, Eric. Europa e os povos sem história. São Paulo: EDUSP, 2009.
Se você souber inglês, há uma ótima coleção ainda não traduzida, que foge da tradicional
visão da História “a partir de cá”, e percebe que nada do que existe hoje era uma “necessidade
histórica”:
● TIGNOR, Robert (ed.) Worlds together, worlds apart: A History of the Modern World (1300 to
the Present). New York: Norton, 2002.
205
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
NOTA
206
TÓPICO 2 | AS CONQUISTAS MONGÓLICAS
UNI
Como você pode imaginar, uma rota comercial de tamanha extensão tinha
valor inestimável. Era muito difícil e perigoso viajar por longas distâncias, e por
isso a grande maioria das pessoas não conhecia nada que não tivesse surgido
no local onde viviam. Os comerciantes, por isso, desempenhavam um papel
fundamental de difusão cultural, ao trazer novos produtos, novas línguas, novas
doenças e novas ideias.
208
TÓPICO 2 | AS CONQUISTAS MONGÓLICAS
Além da seda, eram transportados pela rota: tapetes persas, armas, tecidos,
pedras preciosas, prata, especiarias do Oriente (canela, cravo, noz moscada,
pimenta), produtos trazidos do sul do Saara pelas caravanas cameleiras etc. Em
suma, tudo o que tivesse valor comercial era levado de uma ponta à outra do
mundo conhecido. Como você pode perceber, falamos aqui de um verdadeiro
comércio global, em pleno século XIII!
NOTA
NOTA
UNI
SUGESTÃO DE SITE
Prezado(a) acadêmico(a), uma das melhores fontes de pesquisa de mapas históricos disponíveis
hoje na internet é a extensa coleção de mapas produzidos e divulgados por Thomas Lessmann,
em seu website:
<http://www.worldhistorymaps.info/>.
210
TÓPICO 2 | AS CONQUISTAS MONGÓLICAS
211
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
212
TÓPICO 2 | AS CONQUISTAS MONGÓLICAS
Após sua morte (1227), seus filhos e netos deram continuidade à expansão
e conquistaram vastos territórios em terras chinesas, islâmicas e russas (ver mapa).
Mas as disputas entre eles levaram à fragmentação do império, que ficou dividido
em canatos independentes.
Outro motivo apontado para o fim do período de paz foi a Grande Peste. A
peste surgiu em algum lugar do Império Mongol e foi rapidamente transportada
para regiões que antes tinham pouca comunicação. A peste foi noticiada na China
em 1331 e na Crimeia (no Mar Negro) em 1346, de onde se espalhou rapidamente
pela Europa. A peste causou uma reviravolta demográfica e política em toda a
Eurásia: enfraqueceu os mongóis e, na Europa, o sistema feudal.
213
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
4.1 NA CHINA
Os mongóis unificaram toda a China e regiões adjacentes (mapa a seguir)
sob a dinastia Yuan. Seu fundador foi Kublai Khan, neto de Gengis Khan. Após
conquistar o poder (1260), conteve as revoltas dos antigos grupos dominantes
e iniciou um período de paz e tolerância religiosa. Kublai era um entusiasta
da cultura chinesa e um grande incentivador das artes e da cultura. Durante
seu reinado, a China abriu-se para o mundo, favorecida pela rota da seda, e
mercadores europeus, como Marco Polo, visitaram o reino, possibilitando o
intercâmbio cultural.
214
TÓPICO 2 | AS CONQUISTAS MONGÓLICAS
215
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
4.3 NA EUROPA
A expansão pelas estepes da Rússia não era a prioridade dos mongóis;
muito mais importante era a conquista da China e do Oriente Médio, regiões muito
mais ricas. Mesmo assim, os mongóis invadiram as estepes russas e destruíram as
grandes cidades da região: Kiev, Moscou, Rostov e outras.
216
TÓPICO 2 | AS CONQUISTAS MONGÓLICAS
217
RESUMO DO TÓPICO 2
● A Dinastia Tang, que governou a China entre os séculos VIII e IX, foi uma
das mais poderosas da história do país. Nessa época foram desenvolvidas
tecnologias como: a pólvora, a xilogravura e a porcelana.
● A rota da seda foi um longo caminho que ia da China até o Mar Mediterrâneo e
pelo qual eram transportados todos os tipos de produtos de uma região a outra
da Ásia.
● A expansão mongólica favoreceu o comércio pela rota da seda e trouxe paz para
vastas regiões da Ásia. O período ficou conhecido com Pax Mongolica.
● Uma das consequências mais drásticas das conquistas mongólicas foi a invasão
do mundo muçulmano, encerrando a Era de Ouro Islâmica.
218
AUTOATIVIDADE
Assista ao vídeo de
resolução da questão 2
219
220
UNIDADE 3
TÓPICO 3
1 INTRODUÇÃO
As transformações econômicas, sociais e políticas analisadas nos tópicos
anteriores nos ajudarão a entender, agora, a grande revolução intelectual que
alterou a mentalidade e o espírito do Ocidente e preparou o caminho para o
Renascimento.
Neste tópico procuramos fazer uma análise de como surgiram e quais foram
as características mais marcantes deste novo mundo da religião, da cultura, das artes
e do pensamento.
Boa leitura!
221
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
espiritualidade mais pura levou muitas pessoas a adotarem uma vida monástica,
ou a auxiliarem, com seu sacerdócio, os mais pobres. A religiosidade estava
trilhando novos caminhos, e eles seriam decisivos para o futuro da Igreja.
Vejamos em detalhes:
222
TÓPICO 3 | A IGREJA E A CULTURA NA BAIXA IDADE MÉDIA
AUTOATIVIDADE
223
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
2.3.2 O Monasticismo
Os movimentos que desejavam um retorno à pureza original da Igreja
eram comuns na Europa desde o século IX. O objetivo dos reformadores era
retornar a uma vida de simplicidade, cultivando as artes, o silêncio e a devoção
aos mais pobres. Os movimentos reformistas tornaram-se muito prestigiados a
partir de 950, e durante todo o século XI. Inicialmente, a reforma monástica estava
concentrada na Abadia de Cluny (atual França) e baseava-se no retorno a uma
obediência estrita da Regra de São Bento.
Inocêncio III autorizou a criação de sua ordem religiosa, que ficaria conhecida
como Franciscana. Os franciscanos têm por objetivo viver da forma mais simples
possível e seguir os passos de Jesus Cristo.
NOTA
225
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
O mundo que conhecemos teria sido criação não de Deus, mas do Demônio,
pois é instável, corrupto e decadente. Jesus Cristo teria sido enviado por Deus para
a salvação, mas não como homem: seria apenas um anjo que assumiu a aparência
humana.
O massacre dos cátaros (e dos não cátaros) não foi suficiente para destruir
o movimento. No século seguinte, a Igreja Católica procurou nova abordagem
para o problema e instituiu uma forma de investigação baseada na observação,
inquérito e determinação de responsabilidades. Estava instituída a Inquisição,
que tinha poderes para confiscar bens e condenar os hereges, assim que fossem
identificados.
226
TÓPICO 3 | A IGREJA E A CULTURA NA BAIXA IDADE MÉDIA
NOTA
A Inquisição, como você pode perceber, é a forma de investigação que deu origem
aos nossos tribunais.
3 AS UNIVERSIDADES
As universidades se desenvolveram a partir das escolas das catedrais
que ensinavam os candidatos ao clero regular. Nascidas no meio urbano, seus
integrantes - professores e alunos - formavam uma corporação destinada ao ensino
e à aprendizagem e cuja mercadoria era o conhecimento.
227
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
E
IMPORTANT
DEBATE EM SALA
— Professor, como assim? As universidades nasciam nas cidades, no século XI? Esse não era o
período do auge do feudalismo e as cidades não surgiram alguns séculos mais tarde?
— As coisas não são tão esquemáticas e estanques como estamos acostumados a pensar.
Primeiro que o “feudalismo” é um conceito problemático, como já discutimos. Depois, não
é porque havia feudalismo que não podia haver cidades. Muito ao contrário: as cidades e os
comerciantes eram fundamentais para garantir aos feudos alguns tipos de produtos. Ainda,
as universidades iniciaram seu funcionamento no século XI, o que não quer dizer que elas
já fossem muito fortes. Algumas das maiores universidades europeias foram criadas lá pelos
séculos XIII ou XIV. Mas as condições para seu surgimento apareceram com a reforma religiosa
do século XI.
228
TÓPICO 3 | A IGREJA E A CULTURA NA BAIXA IDADE MÉDIA
229
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
230
TÓPICO 3 | A IGREJA E A CULTURA NA BAIXA IDADE MÉDIA
E
IMPORTANT
O que fazer com tal patrimônio? Foi aí, em meio à cruel guerra religiosa que
foram as Cruzadas, que os cristãos decidiram não destruir aqueles livros mantidos
pelos “infiéis”, mas decifrá-los. Em parte para melhor compreenderem o inimigo,
a fim de derrotá-lo mais facilmente, em parte por reverência àqueles acervos, em
parte por curiosidade, os estudiosos cristãos puseram-se a ler aquelas obras. Ao
fazerem isso, a grande surpresa: perceberam que nelas estavam preservadas a
antiga ciência e a filosofia de gregos e romanos, inclusive obras há séculos perdidas
no Ocidente e que se julgavam perdidas para sempre, enriquecidas por séculos de
reflexões muçulmanas e judaicas.
232
TÓPICO 3 | A IGREJA E A CULTURA NA BAIXA IDADE MÉDIA
233
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
nada parece ter sido tão significativo para o pensamento do Ocidente do que as
traduções da obra de Aristóteles feitas e enriquecidas com comentários próprios
pelo filósofo Averróis (Ibn Rushd, 1126-1198).
4.3 A ESCOLÁSTICA
Quando estes novos conhecimentos, advindos das traduções que se faziam
nas fronteiras da cristandade, começaram a ser absorvidos pelos intelectuais da
época, provocaram uma verdadeira revolução na Teologia (conhecimento de Deus
e da religião) e na Filosofia (conhecimento do mundo e dos homens) ocidentais.
UNI
Para São Tomás, as duas fontes tinham necessariamente que concordar, pois
ambas provinham da mesma fonte: Deus. Sendo assim, os objetivos primordiais
de sua filosofia eram demonstrar que a razão teria sempre preferência e que o
Universo era racionalmente constituído.
ATENCAO
Não confunda o franciscano Roger Bacon com o filósofo Francis Bacon, que
nasceu no século XVI e também trouxe contribuições fundamentais para a filosofia e a ciência.
235
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
LEITURA COMPLEMENTAR 1
Jacques Le Goff
FONTE: Adaptado de: LE GOFF, Jacques. Os Intelectuais na Idade Média. Lisboa: Estúdios Cor,
1973, p. 92.
236
TÓPICO 3 | A IGREJA E A CULTURA NA BAIXA IDADE MÉDIA
LEITURA COMPLEMENTAR 2
FONTE: Adaptado de: AQUINO, São Tomás de. Summa Theologiae, q. VIII, art. I.
LEITURA COMPLEMENTAR 3
Rogério Bacon
pelo caminho da experiência; como tal, muitos têm argumentos dizendo respeito
ao que pode ser conhecido, mas porque têm falta de experiência, desprezam os
argumentos e nunca evitam o que é prejudicial, nem seguem o que é bom. Porque, se
um homem que nunca tivesse visto fogo quisesse provar por raciocínios adequados
que o fogo queima, injuria e destrói as coisas, o seu espírito não se daria por satisfeito
desta maneira, nem ele evitaria o fogo até que nele colocasse a mão ou qualquer
substância combustível, de forma a provar pela experiência o que o raciocínio
tinha ensinado. Mas quando tivesse feito a presente experiência da combustão, o
seu espírito adquiriria uma certeza e descansaria na plena luz da verdade. Por esta
razão, o raciocínio não é suficiente, mas o é a experiência.
FONTE: BACON, Rogério. Opus Majus. In: ROSS, J. Bruce; MCLAUGHLIN, M. Martins. The
Portable Medieval Reader. 8. ed. New York, 1958, p. 626.
238
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico você viu que:
● A partir de então, o mundo terreno deixou de ser desprezado, pois com a ciência
antiga e árabe, os pensadores ocidentais puderam ver que o universo possuía
leis naturais, regularidades dadas por Deus no momento da criação. O mesmo
Deus dotará o homem de capacidade racional para compreender estas leis e
intervir no mundo terreno.
239
AUTOATIVIDADE
1 São Francisco de Assis foi recebido pelo Papa Inocêncio III em Roma e dele
recebeu autorização para a criação de suas ordens religiosas. O mesmo
Inocêncio III ordenou a “cruzada” contra os cátaros albigenses do sul da
França. É possível traçar uma relação entre os dois eventos? De que forma
eles se vinculam ao movimento reformista da Igreja que estava em curso
desde o século XI?
3 A partir do que você pôde apreender da leitura deste tópico, qual lhe parece
ter sido o alcance das transformações na Igreja e na sociedade europeias
a partir do século XI? Foram profundas, consideráveis, superficiais ou
ilusórias? Justifique seu ponto de vista.
Assista ao vídeo de
resolução da questão 1
240
UNIDADE 3
TÓPICO 4
1 INTRODUÇÃO
241
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
E
IMPORTANT
Caro(a) acadêmico(a), você já deve ter percebido que a língua portuguesa tem
dezenas de palavras de origem árabe. Certamente, esta contribuição foi fruto da dominação
muçulmana na Península Ibérica. Mas um dado interessante é que muitas destas palavras
designam mercadorias ou prazeres relacionados à vida econômica. Vejamos alguns exemplos:
açúcar, açougue, aduana, alambique, álcool, alfândega, almoxarifado, cheque, cifra, café, elixir,
garrafa, laranja, limão, safra etc.
Composta de indianos e
negros, a tripulação deste
barco no Golfo Pérsico
enfrenta alguma agitação
no convés, enquanto os
passageiros assistem
pelas portinholas. Pelo
Mediterrâneo, pelo Mar
Vermelho e pelo Golfo
Pérsico, os itinerários
marítimos uniam África,
Índia e China à Europa.
242
TÓPICO 4 | O RENASCIMENTO COMERCIAL E URBANO
E
IMPORTANT
É importante, porém, observar que essa escravidão tinha muito pouca semelhança
com a escravidão que os europeus estabeleceriam, na Idade Moderna, no Continente
Americano. Não apenas o tipo de trabalho executado era muito diferente, mas a dependência
econômica que a sociedade tinha dele era muito menor. Além do mais, o escravo era tratado
de forma muito distinta e tinha acesso muito mais facilitado à libertação.
243
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
3 O COMÉRCIO NA EUROPA
No momento em que as cidades italianas começaram a fazer concorrência
aos comerciantes muçulmanos no Mediterrâneo, os produtos adquiridos passaram
a ser negociados no continente europeu. Mercadores italianos e de outras origens
transportavam esses produtos continente adentro, por rotas fluviais ou terrestres,
e favoreciam a troca comercial com produtos das próprias regiões atravessadas.
244
TÓPICO 4 | O RENASCIMENTO COMERCIAL E URBANO
Todas essas moedas passavam pelas mãos ágeis dos cambistas, que as
pesavam, tocavam e lhes determinavam o valor. Da bancada onde eles realizavam
esse ritual proveio o banco moderno e até mesmo as práticas bancárias como
a carta de crédito, a letra de câmbio, o penhor mercantil e o seguro marítimo.
Enfim, caro(a) acadêmico(a), apesar das restrições do Direito Canônico, com
o maior encontro entre os povos, com as crescentes necessidades econômicas,
desenvolveu-se um importante setor monetarizado no interior feudal da Europa.
245
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
246
TÓPICO 4 | O RENASCIMENTO COMERCIAL E URBANO
TUROS
ESTUDOS FU
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UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
248
TÓPICO 4 | O RENASCIMENTO COMERCIAL E URBANO
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UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
250
TÓPICO 4 | O RENASCIMENTO COMERCIAL E URBANO
251
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
Aos poucos, a força desta nova classe burguesa foi se tornando cada vez
mais considerável, a ponto de rivalizar com os dois outros estados privilegiados do
mundo feudal: a nobreza e o clero. O burguês desprezava o ócio do cavaleiro e do
monge e fazia do trabalho e do acúmulo de riquezas seu próprio ideal de vida. Não
por acaso, desde a literatura cavalheiresca da nobreza – os romances de cavalaria
–, a palavra “vilão” (habitante da cidade) passou a carregar todos os estigmas da
mesquinharia e da avareza, da “falta de nobreza” de sentimentos. Independente
de detalhes pitorescos, a força econômica destes burgueses transformou-se em
força política. Dependentes de financiamento, os senhores de território davam
aos burgueses voz em seus conselhos. Por sua vez, os comerciantes apoiavam os
senhores de território na sua luta pela monopolização do poder contra os senhores
feudais, estimulando assim o nascimento dos estados nacionais absolutistas.
252
TÓPICO 4 | O RENASCIMENTO COMERCIAL E URBANO
TUROS
ESTUDOS FU
Caro(a) acadêmico(a), como você já sabe, no próximo tópico veremos o papel das
Cortes medievais no surgimento dos Estados Absolutistas.
253
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
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TÓPICO 4 | O RENASCIMENTO COMERCIAL E URBANO
UNI
SUGESTÃO DE LEITURA
Se você quiser obter uma boa análise desta obra, leia o artigo:
COSTA, Ricardo da. “Um espelho de príncipes artístico e profano: a representação das virtudes
do Bom Governo e os vícios do Mau Governo nos afrescos de Ambrogio Lorenzetti (c.1290-
1348) - análise iconográfica”. Utopía y Praxis Latinoamericana. Revista Internacional de
Filosofìa Iberoamericana y Teoría Social. Maracaibo (Venezuela): Universidad del Zulia, v. 8,
n. 23, octubre de 2003, p. 55-71. O artigo pode ser encontrado nesta página: <http://www.
ricardocosta.com/pub/lorenzetti.htm>.
255
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
LEITURA COMPLEMENTAR 1
A FORMAÇÃO DE UM MERCADOR
Godric de Finchale, que veio a ser santificado, começou a sua vida como
mercador. Nasceu de pais lavradores, no Lincolnshire, em fins do século XI. A
narrativa de sua primeira atividade ajuda-nos a entender como se deu o aparecimento
de um novo tipo de mentalidade e profissão.
FONTE: Adaptado de: Reginald of Durham, Libellus de Vita et Miraculis S. Godrici, Heremitae de
Finchale, Ed. Stewenson, Londres, 1847. In: ESPINOSA, Fernanda. Antologia de textos
medievais. Lisboa: Sá da Costa, 1981, p. 198.
256
TÓPICO 4 | O RENASCIMENTO COMERCIAL E URBANO
LEITURA COMPLEMENTAR 2
AS FEIRAS DA CHAMPAGNE
Andrea envia-vos saudações. E deveis saber que os sieneses que aqui estão
despacharam [as suas cartas] por um mensageiro comum depois da última feira
de Saint-Ayoul, como habitualmente. Envio-vos um rolo de cartas por Balza, um
correio de Siena. Se as não receberdes, tentai alcançá-las [...].
257
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
FONTE: Adaptado de: Paolo e Piecolomini, carta comum cit. Em Louis Gothier et Albert Trous,
Recueills. De textes d’ histoire pour l’ ensseignement secondaire. In: ESPINOSA,
Fernanda. Antologia de textos medievais. Lisboa: Sá da Costa, 1981. p. 206.
258
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico você viu que:
259
● A partir do século XI, o aumento da riqueza e do prestígio das cidades fez nascer
o chamado movimento comunal, que buscava, por todos os meios, conquistar a
autonomia política e administrativa, em relação ao senhor de território.
260
AUTOATIVIDADE
2 Quais os fatores que levaram a Europa Cristã a ter um incremento dos centros
urbanos a partir do século XII?
261
262
UNIDADE 3
TÓPICO 5
AS CORTES MEDIEVAIS
1 INTRODUÇÃO
Quando lançamos uma visão panorâmica nos mil anos de Idade Média,
podemos perceber um duplo movimento, a saber: 1) Na Alta Idade Média, um
processo de desintegração total da autoridade, dos direitos, das oportunidades
de governar, culminou num sistema de posições fechadas, conhecido como
Feudalismo. 2) Na Baixa Idade Média, com a reintrodução da economia monetária,
verificam-se as primeiras formas de reintegração política, econômica, social e
cultural, culminando num processo de monopolização do poder, conhecido como
Estado Nacional Absolutista.
263
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
Enquanto aos clãs menores faltavam terras para permitir que todos os filhos
fossem herdeiros, aqueles grandes senhores podiam agora absorver esse excesso
de população de nobres sem terra, que encontravam abrigo, vestuário e alimento
nos castelos dos grandes senhores pela prestação de algum serviço. Já estes grandes
senhores – servidos agora por este novo exército de vassalos – puderam impor
sua autoridade a todos os outros senhores menores. Como contavam agora com
uma fonte de renda quase inesgotável – o comércio e as cidades situadas em seu
território –, estes senhores conseguiam escapar do círculo perpétuo de distribuição
de terra em troca de serviços e da subsequente apropriação da terra pelos vassalos,
constituindo-se, assim, numa nova força detentora de poder territorial e político.
264
TÓPICO 5 | AS CORTES MEDIEVAIS
UNI
Na França, por exemplo, o clã dos Capetos (987-1328) tinha seu núcleo
original na região de Île-de-France. Mas soube bem utilizar os recursos advindos
do controle do rio Sena – importantíssimo para as redes de rotas comerciais que
cruzavam a Europa –, assim como seu controle sobre as cidades de Paris e Orléans.
Por confisco, casamento, doação e, principalmente, pela força de sua cavalaria,
265
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
Hilário Franco Jr. (2004, p. 65) faz a seguinte afirmação sobre o fracasso do
nacionalismo alemão e italiano:
267
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
A nobreza destes territórios era formada por vassalos dos Capetos e devia-
lhes lealdade; por sua vez, a burguesia desta importante região manufatureira
estava ligada economicamente à Inglaterra.
268
TÓPICO 5 | AS CORTES MEDIEVAIS
FIGURA 71- JOANA D’ARC, UMA JOVEM DA LORENA, GUIADA POR UMA
VISÃO DIVINA, COMANDOU OS EXÉRCITOS FRANCESES NA
DERROTA DOS BRITÂNICOS. CAPTURADA, FOI ACUSADA DE
HERESIA PELOS INGLESES E QUEIMADA NA FOGUEIRA
269
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
5 AS MULHERES E A SOCIEDADE
Foram as mulheres que viviam nas cortes as primeiras a serem liberadas
para o desenvolvimento intelectual, para a leitura. As riquezas das grandes cortesãs
davam às mulheres a possibilidade de preencher seu tempo de ócio e dedicar-se a
interesses de luxo e lúdicos passatempos.
270
TÓPICO 5 | AS CORTES MEDIEVAIS
NOTA
No texto que segue temos um exemplo da disputa entre as casas dos Plantagenetas
e dos Capetos pela centralização política. João, rei plantageneta da Inglaterra, era também
conde de Anjou e duque da Aquitânia. Estes últimos territórios também eram cobiçados por
Felipe Augusto, rei Capeto da França, que, aproveitando o descontentamento dos nobres
destas regiões, confiscou estes territórios. Apenas mais um incidente que levaria à Guerra dos
Cem Anos entre as duas casas reais.
LEITURA COMPLEMENTAR
O rei Filipe tinha ordenado muitas vezes ao rei da Inglaterra que terminasse
o ataque aos condes franceses e fizesse a paz com os seus homens. Mas quando o
rei de Inglaterra se recusou a dar ouvidos às alegações e ordens do rei de França,
foi intimado pelos barões do reino da França, na qualidade de Conde de Anjou e
Duque da Aquitânia, a vir à corte do seu senhor, o rei de França, em Paris, e aceitar
o julgamento da corte. [...].
FONTE: Adaptado de: Ralph of Coggeshall. Chronicon Anglicanun. In: ESPINOSA, Fernanda.
Antologia de textos medievais. Lisboa: Sá da Costa, 1981, p. 319-320.
271
RESUMO DO TÓPICO 5
Neste tópico você viu que:
● Foi devido à profunda fragmentação feudal que a Europa cristã pôde resistir às
invasões dos séculos IX e X.
● A Guerra dos Cem Anos foi o duelo final entre os dois últimos competidores deste
processo de centralização: os Capetos e os Plantagenetas; a definição desta guerra
consolidou as duas monarquias absolutas mais importantes da era moderna:
Inglaterra e França.
272
AUTOATIVIDADE
273
274
REFERÊNCIAS
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São Paulo: Madras, 2011.
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280
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Modernos? São Paulo:
Martins Fontes, 1988.
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ANOTAÇÕES
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