Peritonite Infecciosa Felina - Relato de Caso
Peritonite Infecciosa Felina - Relato de Caso
Peritonite Infecciosa Felina - Relato de Caso
181-191
Recebido: 20/05/15
Aceito: 19/10/15
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Mestranda, Programa de Pós-Graduação em Veterinária, UFPEL; Bolsista de Pós-Doutorado Júnior, UFSM;
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Médico Veterinário, Doutor, Axys Análises; Professora Doutora, Faculdade de Veterinária, UFPEL.
RESUMO
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ISSN: 2318-356X V.3 N.2 JUL/DEZ 2015 P. 181-191
INTRODUÇÃO
A peritonite infecciosa felina (PIF) é uma doença que atinge gatos, de ocorrência esporádica,
imunomediada, de caráter progressivo, geralmente fatal (ADDIE; JARRET, 1998). É
considerada, atualmente, a doença mais letal em gatos jovens (PEDERSEN, 2014). A PIF tem
como agente etiológico um coronavírus felino (FCoV) (ADDIE et al., 2009), vírus envelopado
com RNA fita simples, do gênero Coronavirus, família Coronaviridae (LAI; HOLMES, 2001). No
entanto, nem todas as infecções por FCoV causam PIF (MACLACHLAN; DUBOVI, 2011). Sabe-
se que há dois biótipos do vírus: um coronavírus entérico felino (FECV), responsável por
infecção gastrointestinal branda, e uma mutação desse vírus, responsável pela peritonite
infecciosa felina (FIPV) (SHARIF et al., 2010). Porém restam dúvidas se a cepa virulenta
mutada (FIPV), que causa a doença patogênica, e a cepa avirulenta (FECV), que causa uma
infecção benigna de caráter intestinal coexistem, ou se a cepa avirulenta se transforma in
vivo, causando a PIF (BROWN et al., 2009). Não há comprovação de que os gatos com PIF
possam transmitir diretamente a outros gatos o vírus mutado, embora essa possibilidade
tenha sido sugerida como explicação para pequenos surtos raros (PEDERSEN et al., 2009b).
A via de transmissão do FCoV é fecal-oral (ADDIE et al., 2009). Após a infecção, no entanto,
há diversos fatores predisponentes para o desenvolvimento da doença, como idade,
suscetibilidade genética, estado físico geral, presença de outra enfermidade concomitante,
imunodepressão, entre outros (AUGUST, 1992). Além disso, o sistema imune, ao tentar
desempenhar papel protetor, acaba colaborando com a disseminação viral que, aliada a
intensa formação e deposição de imuno-complexos, causam lesões aos órgãos
(MONTELEONE et al., 2005).
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RELATO DE CASO
Um gato, macho, sem raça definida, com oito meses de idade, e com histórico de acesso à
rua, foi encaminhado a uma clínica veterinária devido a emagrecimento progressivo e
apatia. O proprietário relatou que o gato havia tido contato com um animal diagnosticado
com PIF. Alguns dias após a consulta, o animal começou a apresentar dispneia, vindo a óbito
em seguida.
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cloreto de Mg (2 mM), 2 µM de cada primer necessário para a reação, 1 unidade de Taq DNA
polimerase, 100 a 200 ng/µL da amostra de DNA e q.s.p. de água ultrapura. A enzima
utilizada para amplificação do gene foi a Taq DNA Polimerase Recombinante (Invitrogen®).
Tabela 1 - Primers utilizados na PCR para amplificação de fragmento da proteína de membrana do FCoV.
Primer Sequência
Forward 5'-3' (F) TCTTGCTAACTGGAACTTCAGCTGG
As amostras teste, controle positivo (gato PIF positivo) e controle negativo (gato PIF
negativo) foram submetidas à amplificação em um termociclador obedecendo ao seguinte
programa: uma incubação inicial por dois minutos a 94 °C, seguida de uma desnaturação por
20 segundos a 94 °C, então, a fase de anelamento foi realizada com temperaturas variáveis
conforme o ciclo, sendo 30 segundos a 60 °C nos três primeiros ciclos, então 58 °C (5 ciclos),
56 °C (5 ciclos), 54 °C (5 ciclos), 52 °C nos últimos 22 ciclos, e, por fim de cada ciclo, uma
extensão de um minuto a 72 °C e uma extensão final a 72 °C por sete minutos. Para análise
do fragmento obtido, um volume de 10 µL do produto final misturado com gelRed® foi
submetido à eletroforese. A eletroforese foi realizada em cuba horizontal a 60 V durante 60
minutos em gel de agarose a 1,5%. O gel foi submetido à luz UV e a análise da reação foi
feita baseada na altura de banda obtida (677 pb) em comparação com o controle e o
marcador de peso molecular de 100 pb.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O gato examinado tinha oito meses, estando entre a faixa etária mais acometida pela PIF,
visto que aproximadamente 50% dos gatos diagnosticados têm menos de dois anos (NORRIS
et al., 2005). Os sinais clínicos apresentados eram condizentes com a doença, que segundo
Tekelioglu et al. (2015) cursa com sinais de depressão, febre, perda de peso, e em alguns
casos dispneia.
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Figura 1 - Pulmão do felino de oito meses diagnosticado com PIF, apresentando coloração vermelho-clara e
superfície úmida e brilhante devido à grande quantidade de infiltrado inflamatório.
Figura 2 - Cavidade pericárdica do felino de oito meses diagnosticado com PIF, apresentando líquido viscoso,
amarelo e com fibrina.
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Figura 3 - Resultados da PCR para o gene de membrana do vírus causador da PIF em gel de agarose a 1,5%
corado com gelRed®. M: marcador de peso molecular 100 bp DNA Ladder RTU KASVI; 1: produto de PCR do
controle positivo; 2, 3, e 4: produto de PCR de amostras aleatórias; 5: produto de PCR da amostra do felino; 6:
produto de PCR do controle negativo.
De acordo com Hartmann (2003), o diagnóstico por RT-PCR em efusões de gatos buscando
diretamente o agente tem um bom valor preditivo para o diagnóstico, porém é preciso ter
cuidado pois não se diferencia o vírus mutado do não-mutado através da técnica. Dessa
forma, o resultado da RT-PCR sempre deve ser avaliado em conjunto com outros dados e
não como diagnóstico definitivo (SHARIF et al., 2010).
CONCLUSÃO
A PIF é considerada a doença mais letal em gatos jovens e é de difícil diagnóstico, por ser
complexa e de curso variável. O gato que veio a óbito apresentava sinais clínicos e histórico
que induziram a um diagnóstico presuntivo de PIF. O diagnóstico foi confirmado com os
achados de necropsia e histopatológicos, compatíveis com o já descrito pela literatura, e
também pela detecção do agente através da técnica de RT-PCR.
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ABSTRACT
RESUMEN
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AGRADECIMENTOS
REFERÊNCIAS
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