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Afonso Neves Morais (2005)

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Processos de formação e sua relação com o desenvolvimento profissional

dos professores: Um estudo sociológico no 1º ciclo do ensino básico

Margarida Afonso
Isabel Pestana Neves
Ana Maria Morais
Centro de Investigação em Educação
Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa

Versão pessoal revista do artigo publicado em:


Revista de Educação, XIII (1), 5-37 (2005).
Homepage da Revista de Educação: http://revista.educ.fc.ul.pt/
Processos de formação e sua relação com o desenvolvimento profissional dos professores:
Um estudo sociológico no 1º ciclo do ensino básico

1. INTRODUÇÃO

A investigação em que este estudo se integra envolveu a formação e a análise do


desenvolvimento profissional de professoras do 1º ciclo do ensino básico (Afonso, 2002) e a
análise da influência das suas práticas pedagógicas no desenvolvimento científico e sócio -
afectivo das crianças (Pires, 2001). A relação entre programas de formação, desenvolvimento
profissional dos professores e aprendizagem dos alunos é, aliás, defendida por vários autores tais
como Liston e Zeichner (1993), Wilson e Berne (1999), Monk e Dillon (1995) e Tuomi (1997).

Os quadros conceptuais que fundamentam a formação dos professores têm-se baseado,


predominantemente, em correntes sedeadas na psicologia e na epistemologia. Revisões da
literatura sobre formação de professores feitas, por exemplo, por Zeichner (1992) e Lemke (2001)
revelam que existem poucos programas de formação de professores de cariz sociológico e
multicultural e que poucos programas fazem uma investigação e avaliação sistemáticas que
permitam determinar em que medida os professores estão preparados para ensinar todas as
crianças. Anderson e Mitchener (1994) referem também que muitos dos estudos, no âmbito da
formação inicial e desenvolvimento profissional de professores, não têm um quadro conceptual
de referência consistente e profundo e apelam ao desenvolvimento de estudos que contemplem
múltiplas perspectivas como, por exemplo, considerar a análise da competência dos professores,
em termos psicológicos, sociológicos e epistemológicos.

É essencial ensinar e aprender ciências pois o conhecimento e as competêncas científicas são uma
força cultural no mundo moderno e são nece ssários na tomada de decisões e na educação para a
cidadania (ver, por exemplo, De Boer, 2000; Wellington, 1998 a, b; Hodson, 1998, 2000; Saez &
Riquatz, 1996). Por outro lado, o ensino das ciências não deve ignorar a sua vertente
experimental, dado que esta é um dos pilares da ciência e uma educação científica sem trabalho
experimental falha em reflectir a sua verdadeira natureza. O ensino e a aprendizagem das ciências
devem envolver a aquisição de níveis elevados de conhecimentos científicos e competências
investigativas uma vez que, como afirma Wenham (1995), a ciência não é apenas um tipo de

1
conhecimento mas também um modo de fazer, e cada uma das partes modela e determina a outra.

Contudo, várias investigações, relacionadas particularmente com os primeiros anos de


escolaridade, revelam que muitos professores não valorizam adequadamente a aprendizagem das
ciências nem o seu ensino experimental, estão mal preparados científica e pedagogicamente e dão
relativamente pouca ênfase ao desenvolvimento de competências de nível elevado, como a
resolução de problemas e a aplicação do conhecimento científico em situações do dia-a-dia (Sá &
Carvalho, 1997; Harlen & Jelly, 1993; Harlen & Holroyd, 1997; Tilgner, 1990; Radford, 1998;
Hodson, 1998; Briscoe, Peters & O’ Brien, 1993; Lewis & Barufaldi, 1993). De acordo com
Briscoe, Peters e O’ Brien (1993), e muitos outros, o ensino das ciências deve começar nos
primeiros anos de escolaridade. A questão que se coloca é, então, como preparar melhor os
professores primários a ensinar ciências.

O desenvolvimento profissional dos professores de ciências requer a aprendizagem de conteúdos


científicos fundamentais, a integração de diferentes conhecimentos sobre a ciência, o ensino e os
alunos e requer também a aplicação destes conhecimentos no ensino das ciências (Radford, 1998;
Briscoe, Peters & O’ Brien, 1993; National Academy of Sciences, 1996). O desenvolvimento
profissional deve ocorrer através de perspectivas e métodos de inquérito, isto é, os professores
devem primeiro experimentar os métodos e as actividades que se espera que usem nas suas salas
de aula, num ambiente de suporte e de reflexão sobre as suas experiências.

Em Portugal, a formação de professores, segundo Nóvoa (1992) e Alarcão, Tavares e Maia


(1992), tem sido marcada nos últimos anos pelo signo da qualificação e formação contínua de
professores e um documento do Ministério da Educação (1998), sobre o sistema educativo
português, defende que a sobrevivência das sociedades contemporâneas, cada vez mais
permeáveis à mobilidade, à mundialização e, consequentemente, à competitividade, exige uma
melhor formação dos professores. Porém, como referem Canário e Santana (1996) e Nóvoa
(1992), a oferta de formação contínua nem sempre é a mais adequada e tem uma concepção
forma tiva de racionalidade técnica traduzida numa aquisição de conhecimentos prévios à acção
profissional, isolando a componente científica da componente pedagógica, as disciplinas teóricas
das disciplinas metodológicas.

Procurando, com este estudo, contribuir para o esclarecimento desta problemática, partimos do

2
seguinte problema: Analisar em que medida modalidades específicas de formação influenciam o
desempenho dos professores, em contextos de aprendizagem científica.

Este problema conduziu a duas questões de investigação:

• Investigar quais as características sociológicas da modalidade de formação favoráveis ao


desenvolvimento profissional de professores em termos da sua competência científica e
pedagógica.

• Analisar o desenvolvimento profissional dos professores em termos de aquisição da


orientação específica de codificação (regras de reconhecimento e de realização)
relativamente a cada uma das características da prática pedagógica a ser implementada
no contexto de aprendizagem científica.

No sentido de responder ao problema e às questões com ele relacionadas, desenvolveu-se um


estudo particularmente focado no ensino das ciências. O estudo envolveu a formação de
professoras do 1º ciclo do ensino básico e a implementação, por parte das professoras envolvidas,
de uma prática pedagógica com determinadas características. A formação foi implementada
segundo uma perspectiva de investigação-acção em que se pretendia que o desenvolvimento
profissional fosse adquirido através do envolvimento e da participação de todos os intervenientes
no processo, isto é, professores e investigadores. Estamos conscientes de que “podem distinguir-
se graus de participação de acordo com as características do processo […] que se relacionam
com as perspectivas da equipa exterior, o papel de maior ou menor orientação e as formas de
relação que estabelece com outros actores.” (Silva, 1996, p. 194), e que diferentes formas de
colaboração conduzem a diferentes modalidades de investigação-acção. Como consequência, a
forma como os actores sociais colaboram, deve ser cuidadosamente analisada, caracterizada e
conceptualizada.

2. QUADRO CONCEPTUAL

Consideramos que a formação de professores deve ter uma clara fundamentação teórica e que a
sua conceptualização e caracterização devem ser coerentes e profundas e que deve também
contemplar uma vertente sociológica. Tendo por base estes princípios usámos, como principal

3
quadro teórico do estudo, o modelo do discurso pedagógico de Bernstein (Bernstein, 1990, 2000;
Bernstein & Solomon, 1999; Domingos et al, 1986). Pelo facto de possuir uma forte estrutura
conceptual e conceitos operativos de grande poder analítico, esta teoria permite conceptualizar e
caracterizar, com rigor e pormenor, a formação de professores, enquanto parte do meso-nível
daquele modelo.

As modalidades de formação podem ser consideradas como práticas pedagógicas e, neste sentido,
caracterizadas quanto ao contexto instrucional e ao contexto regulador. No contexto instrucional,
pode considerar-se a relação entre sujeitos (regras discursivas - selecção, sequência, ritmagem e
critérios de avaliação – que estão relacionadas com a transmissão-aquisição do discurso) e a
relação entre discursos (intra-disciplinaridade, inter-disciplinaridade e relação entre os
conhecimentos da investigadora e das professoras). No contexto regulador, pode considerar-se a
relação entre sujeitos (regras hierárquicas) e a relação entre espaços.

Na caracterização de qualquer modalidade de prática pedagógica recorre-se a dois conceitos


operativos importantes, a classificação e o enquadramento. A classificação (C) permite definir o
grau de isolamento entre categorias (agências, agentes, discursos) e o enquadramento (E) diz
respeito ao controlo que as diversas categorias possuem nas práticas comunicativas. As categorias
podem estar nitidamente isoladas umas das outras, com fronteiras definidas entre elas,
significando que existe uma classificação forte. Quando o isolamento entre as categorias não é
explícito e as fronteiras entre elas estão esbatidas a classificação é fraca. À semelhança do que foi
referido em relação à classificação, também o enquadramento pode tomar valores fortes se, na
relação de comunicação, o controlo for exercido pelo transmissor (investigadores/formadores), ou
fracos se, na relação de comunicação, o controlo for também exercido pelo aquisidor
(professores). Os valores que a classificação e o enquadramento adquirem, em relação às diversas
características dos contextos instrucional e regulador, podem apresentar diferentes graus de
intensidade e variar de modo relativamente independente resultando, desta possibilidade, diversas
formas de realização do código pedagógico.

Em termos de formação de professores, diferentes modalidades de formação conduzem a


diferentes orientações específicas de codificação, ou seja, diferentes práticas interaccionais
implicam, ao nível do sujeito, diferenças nas regras de reconhecimento e nas regras de realização
(Domingos et al, 1986).

4
De acordo com a teoria de Bernstein, os sujeitos adquirem o código pedagógico durante as
interacções sociais, isto é, os sujeitos adquirem as regras de reconhecimento que lhe permitem
distinguir entre contextos adequados e contextos inadequados e entre significados e realizações
relevantes e significados e realizações irrelevantes, e as regras de realização que lhe permitem
seleccionar e produzir o texto adequado ao contexto. Quanto à posse das regras de realização é
possível que o sujeito manifeste uma realização passiva (se apenas for capaz de seleccionar os
significados necessários à produção do texto) ou uma realização activa (se o sujeito além de
seleccionar os significados necessários, produz o texto adequado ao contexto). Se o sujeito
possuir as regras de reconhecimento e as regras de realização para um determinado contexto,
dizemos que possui a orientação específica de codificação para esse contexto.

No contexto de formação de professores, o sucesso dos professores requer a aquisição das regras
de reconhecimento para distinguir a especificidade dos múltiplos micro-contextos de
aprendizagem e ainda a aquisição das regras de realização para seleccionar e produzir os
significados apropriados a cada micro-contexto. Estes micro-contextos da sala de aula podem
envolver, ao nível da aprendizagem científica, trabalho experimental, actividades de discussão,
etc. Para um professor, ter as regras de reconhecimento e de realização significa, neste caso, ter
as competências científicas e pedagógicas para implementar uma determinada prática
pedagógica. A aquisição das regras de reconhecimento e de realização podem ser, contudo,
limitadas pelas disposições sócio -afectivas, isto é, motivações, interesses e valores favoráveis à
implementação de tal prática.

3. METODOLOGIA

O estudo envolveu quatro professoras de três escolas do 1º ciclo do ensino básico localizadas em
duas cidades do interior do país. As turmas, do quarto ano de escolaridade (9-10 anos), eram
socialmente heterogéneas em termos de género e classe social. A formação das professoras
seguiu uma metodologia de investigação-acção (Afonso, Morais & Neves 2002) e envolveu duas
investigadoras, cada uma trabalhando com duas professoras. Pretendíamos desenvolver uma
formação conjunta, de modo a controlar as variáveis “investigador” e “conhecimentos científicos
e competências a serem desenvolvidas”, mas tal não foi possível. Porém, a variável

5
“investigador” foi, em grande medida, controlada porque as duas investigadoras tinham percursos
académicos semelhantes na sua formação inicial e contínua e funções académicas semelhantes 1 e
desenvolveram em conjunto o plano de formação (o que e o como), analisando-o e discutindo-o
sistematicamente.

Em termos de temas/conteúdos a serem explorados com os professores (o que da formação), a


formação incluiu a aprendizagem de conhecimentos e processos científicos e a aprendizagem de
conteúdos pedagógicos dos campos da epistemologia, psicologia e sociologia, em particular a
teoria de Bernstein. Pretendíamos promover uma sólida formação científica que valorizasse a
aquisição de conhecimentos científicos e o desenvolvimento de competências relacionadas com
os processos investigativos. Pretendíamos também promover uma sólida formação pedagógica
que valorizasse as dimensões sociológica e psico-sociológica. Todas estas dimensões foram
discutidas com as professoras. Em termos da modalidade de código pedagógico subjacente ao
plano de formação (o como da formação), definimos um perfil teórico com características
semelhantes, em termos gerais, às características da prática pedagógica a ser implementada pelas
professoras. Este perfil tinha características sociológicas de uma prática pedagógica mista, isto é,
uma prática pedagógica com classificações e enquadramentos fortes ou fracos consoante os
aspectos específicos da prática (Pires, 2001; Pires, Morais & Neves 2003). Dado que um dos
objectivos do estudo era levar as professoras a implementar práticas pedagógicas que estudos
anteriores tinham revelado ser favoráveis à aprendizagem científica e sócio -afectiva de crianças
de diferentes grupos sociais (Morais et al, 1993, 2000), seria importante desenvolver uma
modalidade de formação com características sociológicas paralelas às da prática pedagógica a ser
implementada. Por um lado, a semelhança entre a modalidade de formação e a modalidade de
prática pedagógica a implementar na sala de aula facilitaria a transferência de conhecimentos,
competências e atitudes, do contexto de formação para o contexto de aplicação em sala de aula.
Por outro lado, o facto de usarmos a mesmo quadro conceptual e metodológico na concepção e
análise da modalidade de formação e da modalidade de prática pedagógica, permitiria dar maior
abrangência e significado à acção e reflexão que estariam presentes ao longo de todo o processo
de investigação-acção.

O plano de formação durou dois anos e envolveu duas fases, uma mais estruturada e intensiva, no
primeiro ano, e outra mais flexível e expandida, no segundo ano em que decorreu o estudo.

6
Durante a primeira fase, foi feita a pilotagem da prática pedagógica a ser implementada pelas
professoras, através da aplicação em sala de aula, de uma unidade de ensino de ciências. Na
segunda fase, as professoras implementaram a prática pedagógica, previamente pilotada, em duas
unidades de ensino: uma unidade sobre as mudanças de estado das substâncias no início do
primeiro período e uma unidade sobre experiências com o ar no início do terceiro período.

Os perfis teóricos da modalidade de código pedagógico que caracterizaram a primeira e segunda


fases da formação das professoras apenas se distinguiam no contexto instrucional, ao nível do
controlo sobre a selecção e sobre a sequência. Pretendíamos que, na segunda fase, as professoras
tivessem maior controlo em aspectos relacionados com estas duas regras discursivas. Esta opção
baseou-se na crença de que, no início, não seria de esperar que as professoras tivessem
conhecimento suficiente para intervir ao nível da macro-selecção e da macro-sequência, para
seleccionar e sequenciar temas/conhecimentos científicos e pedagógicos necessários a uma
formação baseada em resultados recentes do campo da investigação educacional. Na segunda
fase, após um período de implementação das práticas pedagógicas, e de discussão e reflexão
dessas práticas com base em quadros teóricos a que tiveram acesso durante a primeira fase, seria
importante ir ao encontro das suas motivações, interesses e necessidades particulares. Deste
modo, pretendíamos que a macro-selecção e a macro-sequência fossem também controladas pelas
professoras2 .

As figuras 1 e 2 mostram, respectivamente, para os contextos instrucional e regulador, as


características do modelo teórico da formação. As figuras mostram também, para cada um dos
pares de professoras (Rita-Inácia e Dulce-Céu) 3, e para ambos os contextos, as modalidades de
formação que realmente tiveram lugar durante o processo de investigação-acção. As relações de
poder referem-se a uma escala de classificação com dois graus (C+ e C -)4 e as relações de
controlo a uma escala de enquadramento com quatro graus (E++, E+, E -, E- -). De forma a
caracterizar as modalidades de formação implementadas, desenvolvemos um instrumento tendo
por base uma metodologia de investigação construtiva. Partindo dos dados de observação
empírica, fornecidos pelas situações reais do contexto de formação, e mantendo uma relação
dialéctica entre esses dados e as proposições teóricas derivadas do quadro conceptual no qual o
estudo se baseou, construímos indicadores para cada uma das relações a serem analisadas e os
respectivos descritivos correspondentes a situações distintas para cada indicador5 . O instrumento

7
de caracterização da modalidade de formação foi utilizado em dois momentos, o primeiro no final
do primeiro ano de formação e o segundo no final do segundo ano de formação. Esta
caracterização foi baseada em registos de observações feitos pelas investigadoras durante todo o
processo de formação e foi validado por duas outras investigadoras. Os dados obtidos a partir das
opiniões das professoras e da caracterização feita por elas, com base no mesmo instrumento de
análise, foram também usados para validar a caracterização feita pelas investigadoras.

(inserir figuras 1 e 2)

O desenvolvimento profissional das professoras foi analisado em relação a duas dimensões, o


como do ensino, em termos de regras de reconhecimento e de realização (orientação específica de
codificação), e o que do ensino, isto é, os conhecimentos científicos e as competências
investigativas envolvidos no processo de ensino-aprendizagem.

3.1. A orientação específica de codificação - Competência pedagógica das professoras

A posse das regras de reconhecimento e de realização passiva foi analisada através das respostas
das professoras a questionários/entrevistas elaborados para o efeito (Afonso, 2002). Os
questionários/entrevistas continham questões gerais, relacionadas com aspectos de natureza
pessoal, social e profissional, e um conjunto de questões específicas relacionadas com a
modalidade de prática pedagógica a ser implementada na sala de aula. Estas questões foram
construídas de modo a fornecer informação sobre as características sociológicas que as
professoras valorizavam, ao nível dos contextos instrucional e regulador da prática pedagógica,
como sendo mais favoráveis à aprendizagem científica de todas as crianças (regras de
reconhecimento). As questões permitiam também obter informação sobre as razões que as
professoras apresentavam para justificar as práticas que valorizavam (regras de realização
passiva). As questões incidiam sobre as várias relações sociológicas consideradas na definição do
perfil teórico das práticas pedagógicas a serem implementadas e na caracterização das práticas
pedagógicas valorizadas e implementadas pelas professoras6 . Este aspecto está relacionado com o

8
facto de pretendermos, no decurso do processo de investigação-acção, que as professoras
adquirissem conhecimentos e competênc ias para implementar uma modalidade de prática
pedagógica com determinadas características sociológicas (ver ponto anterior).

Os questionários/entrevistas foram aplicados em dois momentos, o primeiro antes de se iniciar a


formação e o segundo cerca de um mês depois de terminada a investigação. A comparação das
respostas dadas nos dois momentos permitiu analisar a evolução das professoras no que respeita à
aquisição de regras de reconhecimento e de realização passiva e estes dados foram usados para
apreciar a influência das modalidades de formação implementadas no desenvolvimento
profissional das professoras.

Foram criadas categorias para avaliar a posse/ausência das regras de reconhecimento e de


realização passiva 7. Estas categorias foram utilizadas na análise de cada uma das relações que
caracterizam a prática pedagógica (ver, em detalhe, Afonso, 2002). De modo a minimizar o grau
de subjectividade inerente a qualquer interpretação, fizemos um exame minucioso das respostas
das professoras às entrevistas/ques tionários e cruzámos esta informação com os dados obtidos a
partir dos registos das investigadoras, das respostas das professoras a outras entrevistas e da
análise das práticas pedagógicas implementadas pelas professoras. Desta forma, a análise
relacionada com a presença/ausência de regras de reconhecimento e de realização passiva
resultou de um compromisso entre vários tipos de informação. A posse da realização activa foi
avaliada através da análise das práticas pedagógicas implementadas por cada professora na
primeira e na segunda unidades de ensino, o que significa que os dados referentes à realização
activa foram obtidos após a primeira fase da formação, depois das professoras terem
implementado uma unidade de ensino piloto (e não antes do processo se te r iniciado, como
ocorreu na análise da posse das regras de reconhecimento e realização passiva), e no final do
processo de formação. A comparação entre o modelo teórico proposto e as práticas pedagógicas
implementadas nesses dois momentos permitiu apreciar em que medida as professoras tinham
adquirido as regras de realização activa e avaliar a influência da formação desenvolvida no
desempenho das professoras.

As aulas foram observadas, video-gravadas e posteriormente transcritas. Terminado o período das


transcrições, passou-se à análise dos descritivos e à comparação entre cada situação descrita e os
“comportamentos-tipo” previamente delineados no instrumento que orientou a conceptualização

9
e caracterização da prática pedagógica (Afonso, 2002). Cada “comportamento-tipo” correspondia
a um indicador específico e a uma determinada posição numa escala de quatro graus de
enquadramento (E++/E--) e/ou de classificação (C ++/C --). As situações categorizadas foram
anotadas e contabilizadas em quadros-resumo sobre a prática pedagógica de cada professora. O
conjunto dos pontos determinou “manchas” que ajudaram a visualizar o(s) quadrante(s) para o(s)
qual(ais) tendia(m) os comportamentos da professora e a caracterizar mais facilmente as práticas
pedagógicas em análise. No caso de um comportamento poder ser analisado em mais do que um
aspecto da prática pedagógica, ele foi considerado para cada um desses aspectos. Estes dados
“mais quantitativos”, conjugados com a apreciação global das investigadoras que assistiram a
todas as aulas das duas unidades de ensino e com a apreciação feita pelas professoras das suas
aulas, conduziram à caracterização da prática pedagógica de cada professora.

O conjunto dos procedimentos usados para determinar a prática pedagógica de cada professor a é
descrito em Afonso (2002) e em Pires, Morais e Neves (2003), onde as características das quatro
práticas pedagógicas são apresentadas e comparadas com o modelo teórico proposto8 . De acordo
com esta comparação, a realização activa foi medida numa escala de quatro graus, onde o grau 1
indica uma situação em que a prática pedagógica da professora é muito distante do modelo
teórico e o grau 4 uma situação em que a prática pedagógica da professora é muito próxima do
modelo teórico. Por exemplo, se o modelo teórico indica E++ para os critérios de avaliação, eram
atribuídos os seguintes graus às professoras: E+ +- 4; E+ - 3; E- - 2; E- - - 1. Se o modelo teórico
--
indica E para as regras hierárquicas, os graus seguintes eram atribuídos às professoras: E- - - 4;
E- - 3; E+ - 2; E+ + - 1. Se o modelo teórico indica E- para as relações inter-disciplinares, eram
atribuídos, às professoras, os graus seguintes: E- - 4; E- - - 3; E+ - 2; E++ - 1.

Em síntese, tendo em consideração os dados das entrevistas/questionário s, aplicados antes e após


a formação das professoras, e os dados da caracterização das práticas das professoras nas duas
unidades de ensino, pretendíamos analisar se, depois da formação, as professoras:

(a) Reconheciam a especificidade do contexto de uma determinada prática pedagógica, nos


seus múltiplos aspectos, demarcando-o de outros possíveis contextos de prática
pedagógica (têm regras de reconhecimento);

(b)Seleccionavam os significados/justificações apropriados áquele contexto, isto é, mostravam

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conhecer os princípios de como actuar/agir naquela prática pedagógica (têm regras de
realização passiva);

(c) Produziam o texto pretendido, isto é, usavam na sala de aula uma prática pedagógica
segundo os princípios subjacentes ao perfil teórico delineado (têm regras de realização
activa).

No texto que se segue, apresentamos os instrumentos de análise para as regras de reconhecimento


e de realização passiva e exemplos de excertos das entrevistas para dois aspectos da prática
pedagógica - critérios de avaliação e regras hierárquicas (professora-aluno). De modo a tornar
claro como determinámos a realização activa, apresentamos um exemplo para um dos indicadores
do instrumento que foi construído para caracterizar a prática pedagógica das professoras.
Apresentamos, posteriormente, dois exemplos de interacções na sala de aula, um dos quais
corresponde ao que o modelo teórico propõe. Também, neste caso, os exemplos dizem respeito a
dois aspectos da prática pedagógica - critérios de avaliação e regras hierárquicas (professora-
aluno).

Caracterização da orientação específica de codificação

Instrumento de análise- Regras de reconhecimento (RC)


INDICADOR Não tem RC Pode ter RC Tem RC

CARACTERÍSTICAS As características indicadas são As características indicadas As características indicadas


DA PRÁTICA diferentes/opostas das preconi- são ambíguas/pouco claras são semelhantes às preco-
PEDAGÓGICA
zadas pelo modelo teórico nizadas pelo modelo teórico

Exemplos de excertos das entrevistas

Regra discursiva – Critérios de avaliação


Não tem Rc – Esta situação não ocorreu

Pode ter RC - No 1º Ciclo acho que o professor deve explicitar aos alunos o que têm de fazer, mas não o como o
devem fazer, para que a criatividade e a imaginação sejam desenvolvidas.

Tem RC - Além das indicações dadas no início, eles [as crianças] vão pedindo sempre mais…sempre um bocado de
ajuda, e depois…mesmo quando eles não conseguem chegar aos objectivos que, em princípio, eu tinha
proposto…quando vamos fazer a avaliação do trabalho…eles próprios conseguem…se não é o próprio grupo é

11
alguém de outro grupo…um dos outros grupos…as crianças dos outros grupos, conseguem dizer “ah! Pois aqui
faltou isto, faltou aquilo”, “aquilo não era preciso, está a mais”, “este assunto foi pouco desenvolvido”, “ah! Mas
também podia falar disto ou daquilo”.

Regras hierárquicas – Professora –aluno

Não tem RC - Às vezes oiço as razões deles [das crianças], mas neste momento os meus gostam muito de conversar e
às vezes só lhes digo que não podemos estar a conversar muito e às vezes tenho que me zangar com eles, para os
mandar calar, e digo-lhes que estamos a perder tempo […] eu não consigo fazê-los entender que se têm trabalho não
pode haver conversa […].

Pode ter RC – Esta situação não ocorreu

Tem RC - Portanto, dava-lhes qualquer trabalho e por exemplo passava o tempo e eu tentava fazer-lhes ver que o
tempo tinha passado e que para a próxima vez tinham que estar mais caladinhos […] estarem com mais atenção
sobre o que estavam a fazer […] porque depois passava o tempo e o trabalho ficava por fazer.

Instrumento de análise - Realização passiva (RLp)


INDICADOR Não tem RLp Pode ter RLp Tem RLp

RAZÕES As razões apresentadas são As razões apresentadas são As razões apresen-


APRESENTADAS
diferentes/opostas das preconi- ambíguas/pouco claras ou não são tadas são semelhan-
PARA A PRÁTICA
PEDAGÓGICA zadas pelo modelo teórico dadas razões tes às preconizadas
SELECCIONADA pelo modelo teórico

Exemplos de excertos das entrevistas

Regra discursiva – Critérios de avaliação


Não tem RLp - […] o professor poderá dar aos alunos determinadas pistas, mas o trabalho ficará ao critério de cada
aluno. Torna-se necessário educar para a autonomia e responsabilidade, desenvolver a capacidade de descobrir.

Pode ter RLp - Porque me parece que ao fazer assim, os conduzo [às crianças] a uma investigação mais deles. Não
tanto uma investigação minha, mas uma investigação deles. […] Se for eu a dar a forma ao trabalho, a enformar o
trabalho, limitam-se a fazer o que se lhes pede […] normalmente digo-lhes os pontos principais. Além desses, podem
depois tocar os que quiserem.

Tem RLp - Eu acho que é essencial [para a aprendizagem, os critérios ficarem clarificados] até para outros
trabalhos…sim normalmente [clarifico quando os alunos não o fazem], sim. E eles perguntam “ah! Então e o que é
que pensa?” “olha, eu penso que faltou isto ou aquilo, ou isto esteve a mais, isto esteve muito bem, mas se estivesse
mais abordado, mais explanado o assunto, tinha ficado melhor…ficou incompleto ou está completo.

12
Regras hierárquicas – Professora-aluno

Não tem RLp – A professora não dá qualquer justificação [a professora começa por não ter regras de reconhecimento
– ver exemplo anteriormente referido]

Pode ter RLp – A professora não apresenta qualquer justificação para a característica que seleccionou e que
correspondia ao modelo teórico

Tem RLp - Porque eu acho que é muito importante chamá-los [às crianças] à atenção […] que não fizeram o trabalho
como devia ser, eles apanham um balde de água fria quando chegam ao ciclo [2º Ciclo]. […] estão habituados a estar
ali, e se ao fim de uma hora não acabaram a ficha ou o trabalho que estão a fazer, não há problema nenhum,
continua-se, não é?! E no ciclo [2º Ciclo] isso não vai acontecer, por isso temos que os chamar à atenção para os
preparar... é uma maneira de se habituarem a fazer as coisas bem feitas.

Realização activa (Rla)


Regra discursiva - Critérios de avaliação

Instrumento de análise- Excerto


INDICADOR E++ E+ E– E--

QUANDO O O que o aluno diz é por- O que o aluno diz é É dito ao aluno o que O que o aluno diz
ALUNO
INTERVÉM COM
menorizadamente refor- reformulado/ corrigido/ está incorrecto mas não é não é sujeito a qual-
INCORRECÇÕES mulado/ corrigido/ com- completado de forma feita qualquer reformula- quer correcção ou
pletado genérica ção reformulação

Exemplos de transcrições

E+ Professora - Para o álcool evaporar o que é que tem que acontecer?...Grupo três

Criança (pelo grupo) - Eu acho que é porque dentro do frasquinho que tinha álcool estava quente e cá fora
estava mais frio e evaporou-se.

Professora - Então, não estás a dizer ao contrário? […] Como é que tu disseste? …. [disseste que] a
temperatura do frasquinho estava mais alta, que passou para uma temperatura mais baixa e que se evaporou

Criança (pelo grupo) - Tem que ser ao contrário…

Professora - O álcool ao passar à temperatura ambiente aqueceu – termina a professora

E- - Os alunos estão a analisar o que aconteceu aos cubos de gelo que foram retirados do congelador.

Professora - Então, o que é que observaste durante esses dez minutos?

Aluno - Observei que o gelo derreteu e transformou-se em água.

A professora ouve a resposta incorrecta mas não a rectifica em nenhum momento das aulas dedicadas à

13
exploração do tema “mudanças de estado das substâncias”.

Regras hierárquicas – Professora –aluno

Instrumento de análise- Excerto


INDICADOR E++ E+ E– E--

QUANDO SE A professora não recor- A professora utiliza con- A professora utiliza um A professora usa um
DIRIGE AOS
ALUNOS
re a qualquer tipo de trolo posicional, dando controlo pessoal ape- controlo pessoal apelan-
justificações, utilizando justificações com base lando para razões rela- do para atributos pes-
um controlo imperativo em regras estabelecidas cionadas consigo soais das crianças
na escola/sala de aula

Exemplos de transcrições

E++ Criança - Oh professora posso ir beber água?

Professora - Fala menos que já não precisas de beber tanta água.

E- - Professora - […] Vamos lá pôr a nossa capacidade de atenção, de respeito pelos outros que estão ao nosso
lado, para que ninguém fique prejudicado [...] e agora vão, sim, pegar na ficha de trabalho, proceder como se
diz lá […] entendendo-se bem uns com os outros, esperando pela sua vez, está bem? E, sobretudo, falando
mais baixinho, só para o grupo está bem?. – Tem RLa

3.2. Competências científicas das professoras

O conhecimento científico e as competências investigativas revelados pelas professoras nas aulas,


durante as duas unidades de ensino (o que da prática pedagógica), foram apreciados através de
uma análise detalhada dos registos das investigadoras e das transcrições de vídeo dessas aulas. A
comparação dos dados obtidos nos dois momentos permitiu avaliar a influência da formação no
desenvolvimento profissional das professoras, no que respeita às suas competências científicas.

De modo a analisar os conhecimentos científicos e as competências investigativas desenvolvidas


pelas professoras, criámos, para cada uma destas duas dimensões, cinco categorias, desde o nível
muito baixo (em que a professora apresentava muitas dificuldades no domínio dos conhecimentos
científicos/competências investigativas requeridos nas unidades de ensino realizadas) até ao nível
muito bom (em que a professora revelava um elevado domínio dos conhecimentos
científicos/competências investigativas requeridos nas unidades de ensino realizadas).

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Os exemplos que se seguem ilustram, para cada uma das duas dimensões do que da prática
pedagógica, situações correspondentes ao nível muito baixo e ao nível muito bom. O nível muito
baixo de conhecimento científico pode ser exemplificado quando uma professora considerou o
“desaparecimento” e a “dissolução” como sinónimos de evaporação de uma substância. O nível
muito bom pode ser exemplificado por uma professora que nunca considerou o “calor”, o “frio”,
o “sol” como causas das mudanças de estado da matéria e que corrigiu os alunos sempre que eles
utilizavam estes termos.

O nível muito baixo das competências investigativas pode ser exemplificado por uma professora
que nunca teve em consideração, durante o trabalho experimental, que é importante identificar e
controlar as variáveis presentes no trabalho. O nível muito bom pode ser exemplificado quando
uma professora revelou ter a capacidade de prever, controlar variáveis e explorar,
adequadamente, os resultados de uma experiência.

4. RESULTADOS – APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E REFLEXÃO

Apresentamos agora os resultados relativos às quatro professoras que fizeram parte da


investigação e a análise e reflexão sobre a importância da formação implementada no
desenvolvimento profissional das professoras.

Começamos por apresentar e analisar os resultados relativos às suas competências pedagógicas


(orientação específica de codificação para a prática pedagógica) e, posteriormente, os resultados
relativos às suas competências científicas (conhecimentos científicos e competências
investigativas).

4.1. A competência pedagógica das professoras

A figura 3 mostra a evolução das professoras em termos de orientação específica de codificação,


para os aspectos específicos do contexto instrucional da prática pedagógica estudada.

Tal como já referimos anteriormente, a evolução das professoras foi apreciada através da
comparação, em dois momentos, da posse das regras de reconhecimento e de realização passiva e

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activa, para implementar uma prática pedagógica com determinadas características sociológicas.
Na análise da realização activa é necessário considerar os dados referidos na nota 8 acerca da
caracterização da prática pedagógica. É necessário também ter presente que os dados sobre o
primeiro momento, referentes à realização activa, foram obtidos após a primeira fase da formação
e não antes do processo se ter iniciado, como ocorreu na análise da posse das regras de
reconhecimento e de realização passiva.

(inserir figura 3)

Fazendo uma síntese da evolução das professoras no que diz respeito à aquisição da orientação
específica de codificação, podemos dizer que houve evolução ao nível do contexto instrucional.
Ao considerarmos o conjunto das professoras, o estudo permite afirmar que todas evoluíram
positivamente, pois foram adquirindo as regras de reconhecimento e/ou de realização, passiva e
activa para vários indicadores da prática pedagógica, isto é, foram sendo capazes de implementar
uma prática pedagógica mais próxima do perfil pretendido.

Fazendo uma análise e reflexão mais detalhada e comparativa do trabalho desenvolvido pelas
professoras no que diz respeito ao como desenvolveram a sua prática pedagógica, isto é, à sua
competência pedagógica, e no que se refere ao contexto instrucional, pode afirmar-se que
relativamente às regras discursivas selecção e sequência, as professoras desempenharam
facilmente a prática pedagógica pretendida. Mesmo a professora Inácia que, no início da
investigação, não revelava possuir as regras de reconhecimento e de realização passiva
relativamente à sequência, mostrou ter adquirido essas regras durante a primeira fase de
formação. Esta evolução positiva de todas as professoras, ao nível da selecção e da sequência,
está relacionada, provavelmente, com as semelhanças entre o perfil proposto e a prática
pedagógica que é valorizada pelas professoras.

Em relação à regra discursiva ritmagem a professora Dulce revelou uma evolução evidente pois,
antes de se iniciar a formação, começou por nem sequer reconhecer o contexto e, durante a
implementação da primeira unidade de ensino, já apresentava as regras de realização activa para

16
esta característica da prática pedagógica. Este facto mostra que esta professora tinha adquirido as
regras de reconhecimento e de realização passiva durante a primeira fase de formação. A
professora Céu parece revelar, no fim do estudo, uma evolução positiva, no que respeita à
aquisição das regras de reconhecimento e de realização passiva e, em certa medida, das regras de
realização activa. A professora Rita não apresentou qualquer evolução para esta regra discursiva,
dado que já possuía, desde o início, as regras de reconhecimento e de realização passiva e, em
parte, as regras de realização activa. A professora Inácia parece ter “perdido”, em parte, as regras
de realização activa que havia revelado no início. Contudo, esta situação pode não corresponder a
uma evolução negativa, pois constrangimentos de tempo, independentes da investigadora e da
professora, e relacionados com actividades escolares acrescidas, teriam influenciado a ritmagem
da prática pedagógica, durante a implementação da segunda unidade de ensino, no sentido
inverso do pretendido. O facto de nem todas as professoras terem revelado a orientação específica
de codificação para esta característica da prática pedagógica pode, de certo modo, surpreender
porque parece haver a ideia generalizada de que ao nível do primeiro ciclo do ensino básico são
os alunos que controlam o ritmo da sua aprendizagem. O presente estudo revelou não ser este o
caso.

Ao nível dos critérios de avaliação, a evolução foi também positiva. Todas as professoras
evoluíram no seu desempenho ao nível desta regra discursiva. A professora Rita mostrou
claramente ter adquirido as regras de realização passiva e revelou alguma evolução ao nível da
realização activa. A professora Inácia também mostrou possuir a realização passiva. Contudo,
esta professora implementou, na segunda unidade de ensino, uma prática pedagógica em que os
critérios de avaliação não foram tão clarificados e explicitados como na primeira unidade de
ensino; mas este aspecto deve-se particularmente ao facto de a ritmagem ter sido mais forte,
como anteriormente se referiu. A professora Dulce mostrou ter adquirido as regras de
reconhecimento e de realização passiva e activa. A professora Céu revelou evolução e a posse
quase total das regras de realização activa.

A evolução das professoras, no que diz respeito às regras discursivas, esteve relacionada com
dois aspectos comuns a todas. O primeiro aspecto refere-se ao facto de todas as professoras
(mesmo a professora Céu que tinha um curso superior em ciências e matemática), passarem a dar
mais valor à aquisição de conhecimentos científicos e ao desenvolvimento de competências

17
investigativas por parte dos alunos do 1º ciclo do ensino básico. O outro aspecto diz respeito ao
facto de todas as professoras terem alterado a sua teoria de instrução, nomeadamente ao nível dos
critérios de avaliação. Inicialmente, e de uma forma mais ou menos explíc ita, elas consideravam
que a aprendizagem devia ficar ao critério dos alunos para não limitar a sua criatividade e o seu
desenvolvimento. À medida que a formação foi decorrendo, desenvolveram a ideia de que a
explicitação dos critérios de avaliação não impedia a criatividade e o desenvolvimento cognitivo
das crianças e que essa explicitação era muito importante para a aprendizagem científica dos
alunos.

No que diz respeito às relações entre discursos, verifica-se que houve também alguma evolução
em todas as professoras mas que foram estes os aspectos em que houve maior dificuldade de
mudança. Nenhuma das professoras conseguiu adquirir totalmente a orientação específica de
codificação, particularmente ao nível da realização activa, para qualquer das relações entre
discursos (intra-disciplinares, inter-disciplinares e académicos-não académicos). A profe ssora
Inácia, que foi aquela que no início estava mais próxima do modelo teórico, no que respeita às
relações intra-disciplinares e inter-disciplinares, chegou mesmo, no segundo momento, a afastar-
se do perfil teórico relativo às relações intra-disciplinares. Porém, este afastamento poderá estar
relacionado com a falta de tempo, atrás referida, para estabelecer as interligações desejadas entre
os conteúdos científicos.

Uma dificuldade comum sentida pelas professoras, ao nível das relações entre discursos, pode
estar relacionada com o princípio geral da sociedade de que “as coisas se devem manter
separadas”. Uma outra razão que se pode apontar para esta dificuldade pode residir no baixo
nível de conhecimentos científicos que as professoras revelaram ter e/ou na forma como
estabelecer relações entre diferentes conteúdos científicos e entre o conhecimento científico e
outros tipos de conhecimentos (de outras áreas disciplinares e do senso comum). Todas as
professoras teceram críticas à sua formação inicial e contínua, referindo que essa formação não
lhes havia proporcionado a aquisição de um nível suficiente de conhecimentos científicos e/ou o
desenvolvimento de competências que lhes permitissem exp lorar esses conhecimentos na sala de
aula. E quando esses conhecimentos foram considerados apropriados, como foi o caso da
professora Céu, a formação que recebeu reforçou ainda mais a ideia de que não se devem
estabelecer tais inter-relações. Uma terceira razão explicativa da dificuldade das professoras em

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estabelecer relações entre discursos pode estar relacionada com a própria concepção de inter-
relação. Pareceu que, por vezes, as professoras consideravam que bastava “falar sobre certos
assuntos” para serem estabelecidas relações entre discursos. Colocamos também a hipótese de a
modalidade de formação, embora caracterizada em termos globais por critérios de avaliação
explícitos, não ter sido suficientemente efectiva ao nível da explicitação do texto, a ser produzido
pelas professoras, referente às relações entre discursos.

A figura 4 apresenta a evolução da orientação específica de codificação de cada professora para


os aspectos específicos do contexto regulador da prática pedagógica estudada.

(inserir figura 4)

Ao nível do contexto regulador, em particular no que diz respeito às regras hierárquicas que
regulam a relação entre as professoras e os respectivos alunos, a evolução foi muito evidente. A
professora Rita adquiriu as regras de reconhecimento e de realização passiva. A professora Inácia
mostrou claramente ter adquirido as regras de realização passiva e embora pareça ter retrocedido
ao nível da realização activa, tal foi, uma vez mais, um resultado do enquadramento mais forte na
ritmagem. A professora Dulce adquiriu as regras de realização passiva e mostrou ter realização
activa já na implementação da primeira unidade de ensino. A professora Céu mostrou claramente
ter adquirido as regras de realização passiva e, parcialmente, as de realização activa. As
professoras foram gradualmente consciencializando-se do significado e da verdadeira
importância de as regras hierárquicas serem caracterizadas, na relação professora-alunos, por
enquadrame ntos muito fracos e de que algumas atitudes que inicialmente haviam tomado,
poderiam influenciar negativamente o desenvolvimento cognitivo e sócio-afectivo dos alunos.

Em relação às regras hierárquicas que regulam as relações aluno-aluno, a evolução foi também
evidente. A professora Rita adquiriu as regras de reconhecimento, as regras de realização passiva
e, em parte, as regras de realização activa. A professora Inácia já tinha revelado, na primeira
unidade de ensino, a posse da orientação específica de codificação para este aspecto da prática
pedagógica. As professoras Dulce e Céu mostraram uma clara aquisição das regras de

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reconhecimento e de realização passiva e ainda a aquisição parcial (no caso da professora Céu)
ou total (no caso da professora Dulce) das regras de realização activa. A evolução das
professoras, em particular das professoras Rita e Céu, deveu-se essencialmente à
consciencialização progressiva de que algumas das atitudes e decisões que tomavam na sala de
aula, como por exemplo a formação de grupos homogéneos em termos de aproveitamento
escolar, embora tendo como objectivo criar melhores condições para o desenvolvimento e a
aprendizagem das crianças, acabavam por conduzir à criação de hierarquias entre os alunos com a
consequente diminuição do posicionamento dos alunos com aproveitamento escolar mais baixo.
Quanto às professoras Dulce e Inácia, que já tinham por hábito formar grupos de trabalho
heterogéneos, a formação ajudou-as a perceber melhor as suas vantagens e forneceu-lhes
argumentos mais sólidos a favor da metodologia que já implementavam.

Ainda no que diz respeito ao contexto regulador, mas quanto à relação entre os espaços dos
diversos intervenientes no processo educativo, verificámos que as professoras evoluíram no
sentido de se aproximarem do perfil de prática pedagógica desejado. Em relação aos espaços da
professora e dos alunos, a professora Rita adquiriu as regras de reconhecimento e de realização
passiva e as outras três professoras possuíam já na primeira unidade de ensino, realizada depois
da primeira fase de formação, as regras de realização activa. No que concerne à relação entre
espaços professora-alunos, a formação conseguiu levar a professora Rita, que parecia não
apresentar a orientação específica de codificação para esta relação, a tomar consciência de que a
organização e a utilização dos espaços é uma variável importante para a criação de um ambiente
de trabalho agradável e favorável à aprendizagem. Contudo, esta professora revelou alguma
resistência à implementação de uma prática pedagógica caracterizada por uma classificação fraca
na relação entre os espaços professora-alunos, justificando que lhe causava alguma confusão ver
os alunos levantados e a movimentarem-se pelos diversos espaços da sala de aula.

Na relação entre os espaços dos vários alunos, as professoras Inácia e Dulce revelaram, desde o
início, possuir a orientação específica de codificação para esta característica da prática
pedagógica. A professora Rita parece ter adquirido claramente as regras de realização passiva e a
professora Céu adquiriu as regras de reconhecimento e de realização passiva. Ambas as
professoras mostraram, já na primeira unidade de ensino, ter parcialmente as regras de realização
activa. As professoras Céu e Rita foram tomando uma consciência crescente sobre a importância

20
da relação entre os espaços dos vários alunos na criação de um bom ambiente de trabalho. As
professoras Inácia e Dulce reforçaram a sua ideia de que uma sala de aula caracterizada por uma
utilização equitativa dos diversos espaços pelos alunos tinha o potencial para criar um bom
ambiente de trabalho e de aprendizagem.

Sintetizando, podemos afirmar que a evolução das professoras, no que diz respeito à aquisição da
orientação específica de codificação necessária para a implementação de uma prática pedagógica
com determinadas características sociológicas, se revelou mais ou menos evidente consoante os
contextos – instrucional e regulador – e as várias características da prática pedagógica. Olhando
para a evolução das professoras como um todo, o estudo revelou uma evolução positiva no
sentido de as professoras terem adquirido progressivamente as regras de reconhecimento e de
realização, passiva e activa, para vários aspectos da prática pedagógica, isto é, as professoras
tornaram-se mais eficientes em implementar uma prática pedagógica mais próxima da delineada
no perfil teórico.

4.2. As competências científicas das professoras

A figura 5 mostra a evolução das professoras em termos das suas competências científicas.

(inserir figura 5)

As professoras Inácia, Dulce e Céu evoluíram alcançando, na segunda unidade de ensino, um


nível bom, tanto no que respeita aos conhecimentos científicos como às competências
investigativas. A professora Rita foi a que apresentou maiores dificuldades, embora tendo
evoluído, ao passar do nível muito baixo para o nível baixo nas duas vertentes da competência
científica. As dificuldades apresentadas pelas professoras deveram-se a alguma falta de
sensibilização para determinados aspectos, alguns mais relacionados com a forma de explorar os
conteúdos científicos, outros mais relacionados com a forma de explorar os processos
investigativos, particularmente os mais complexos, como por exemplo, a planificação de
experiências e o controlo de variáveis (Afonso, 2002). As dificuldades que as professoras foram

21
sentindo, quanto aos conhecimentos científicos e competências investigativas, deveram-se
particularmente à sua formação, inicial e contínua, que apresentara lacunas relacionadas, por um
lado, com a pouca importância atribuída às ciências e, por outro lado, à ausência (para as
professoras Dulce, Inácia e Rita) de sensibilização para a importância e exploração das
competências investigativas. Mesmo quando a formação anterior foi considerada suficiente,
como foi o caso da professora Céu, ela não a preparou para saber explo rar e desenvolver tais
conhecimentos e competências investigativas no contexto da sala de aula.

Sintetizando, os resultados relativos à evolução das competências científicas das professoras


permitem afirmar que todas as professoras evoluíram, em maior ou menor grau, ao nível dos
conhecimentos científicos e/ou ao nível das competências investigativas.

5. CONCLUSÕES

A modalidade de formação implementada durante dois anos, seguindo uma metodologia de


investigação-acção, apresentou como principais características: (a) uma clara explicitação dos
textos legítimos no contexto interaccional (enquadramento forte nos critérios de avaliação); (b)
relação entre os conhecimentos das professoras e os conhecimentos a serem adquiridos
(classificação pouco forte entre discursos); (c) relações de comunicação pessoais entre as
investigadoras e as professoras e entre as professoras (enquadramento fraco nas regras
hierárquicas); (d) clara distinção entre os intervenientes com diferentes estatutos (forte
classificação investigadora-professora). Esta modalidade de formação foi capaz de desenvolver
profissionalmente as professoras. As quatro professoras evoluíram ao nível da exploração, em
sala de aula, dos conteúdos científicos e das competências investigativas e evoluíram quanto à
forma usada para explorar tais conteúdos e competências. Em termos de orie ntação específica de
codificação, o estudo sugere que o desenvolvimento profissional das professoras é o resultado da
aquisição de regras de reconhecimento e de realização, passiva e activa, para uma série de
componentes da prática pedagógica. Mesmo quando a formação não levou à aquisição plena das
regras de realização activa, ela conduziu à aquisição das regras de reconhecimento e de realização
passiva e à aquisição, pelo menos em certa medida, das regras de realização activa para várias
características da prática pedagógica.

22
Um aspecto que, na modalidade de formação realizada, parece ter ajudado as professoras a
adquirir as regras de reconhecimento e de realização para uma dada prática pedagógica, foi a
explicitação dos critérios de avaliação. Esta explicitação foi, fundamentalmente, concretizada
tornando claro às professoras a especificidade dos contextos de aprendizagem científica e os
fundamentos que estão subjacentes às suas características e também tornando claro os aspectos
do seu desempenho em sala de aula que se aproximavam das características do modelo de prática
pedagógica a ser implementada.

Por outro lado, a relação aberta entre as formadoras e as professoras, em que se explicaram e
discutiram razões relacionadas com os conteúdos e os proced imentos, terá sido favorável à
aceitação e valorização, pelas professoras, dos vários aspectos da prática pedagógica que
pretendíamos que desenvolvessem nas suas aulas. Essa relação com as professoras terá tido, por
sua vez, influência na própria aquisição das regras de reconhecimento e de realização. Na
aquisição destas regras teve também, certamente, influência o enfraquecimento da classificação
entre os conhecimentos das investigadoras e das professoras que ocorreu durante as intensas
discussões nas muitas sessões de trabalho que constituíram a formação. As relações abertas entre
as professoras mostraram ser igualmente importantes. No caso das professoras Inácia e Rita, se a
formação tivesse sido caracterizada por uma classificação mais fraca nas relações de poder
professora-professora e por um enquadramento mais fraco nas relações de controlo ao nível das
regras hierárquicas profe ssora-professora, o progresso da professora Rita poderia ter sido mais
evidente. As duas professoras participaram e intervieram activamente mas a professora Inácia,
pelo tipo de intervenções que fazia e pelos conhecimentos que revelava, acabou por intervir mais
frequentemente e adquirir um estatuto um pouco superior ao da professora Rita. Estes aspectos
parecem ter levado a professora Rita a diminuir o seu posicionamento e a enfraquecer as suas
disposições sócio-afectivas positivas e, como consequência, a ter uma menor evolução.

Consideramos também que a formação foi muito positiva na evolução do próprio discurso das
professoras. As professoras tomaram maior consciência das características da sua prática
pedagógica e foram capazes de a caracterizar, justificando e fundamentando melhor as suas
opiniões. A formação forneceu às professoras instrumentos de análise e reflexão úteis para a sua
actividade docente. Quando questionadas sobre a importância da formação recebida, as
professoras salientaram a necessidade de considerar, na formação de professores, não só aspectos

23
psicológicos mas também aspectos sociológicos da aprendizagem, se se pretender que todos os
professores adquiram competência profissional.

Podemos colocar como hipótese que a evolução das professoras poderia ter sido maior e, talvez,
mais rápida, se a formação desenvolvida se tivesse prolongado por mais tempo. De facto, as
professoras adquiriram, para a maioria das características da prática pedagógica, as regras de
reconhecimento e de realização passiva e, para várias características, as regras de realização
activa. A realização activa parece ser mais difícil de adquirir do que a realização passiva e o
reconhecimento. Isto foi particularmente evidente no caso das relações entre conhecimentos
(intra-disciplinares, inter-disciplinares e académicos-não académicos), onde as professoras
mostraram grandes dificuldades em estabelecer tais relações. Se a formação tivesse continuado,
poderia então focar-se (quase) exclusivamente na aquisição da dimensão activa das regras de
realização nos aspectos ainda não adquiridos pelas professoras. As professoras mostraram
também dificuldades ao nível do que ensinar, quer em termos de conhecimentos científicos, quer
em termos de competências investigativas (particularmente, competências de maior nível de
complexidade). Este aspecto poderia também ter actuado como um factor limitante da
competência das professoras, ao nível do como da prática pedagógica.

Julgamos que um aspecto importante da modalidade de formação que teria contribuído para a
aquisição da orientação específica de codificação para a prática pedagógica a ser implementada é
o isomorfismo existente entre a modalidade de formação e a modalidade de prática. Este facto
pode ter facilitado a transferência dos conhecimentos e competências do contexto de formação
para o contexto de intervenção na sala de aula. Aliás, um dos grandes problemas relacionados
com a formação, inicial e contínua, dos professores, e que é apontado por diversos autores
(Tilgner, 1990; Perrenoud, 1993; Monk & Dillon, 1995; Lea, 1997) e que foi referido pelas
professoras envolvidas neste estudo, é que os modelos de ensino -aprendizagem usados em
contextos de formação, contradizem, na prática, o que é defendido teoricamente pelos
formadores. Os formadores apelam a um ensino construtivista mas impleme ntam um ensino
expositivo, incentivam um processo de ensino-aprendizagem activo mas implementam um
processo de ensino-aprendizagem passivo, apelam a uma “pedagogia aberta” mas desenvolvem
uma “pedagogia fechada”.

Um outro aspecto a salientar deste estudo, é que os resultados da formação desenvolvida, através

24
de uma metodologia de investigação-acção, contrariam de certo modo a ideia globalmente
defendida por várias correntes da investigação-acção de que as relações no contexto de formação
devem ser caracterizadas por valores de classificação e de enquadramento fracos. Os resultados
do estudo sugerem que, embora os valores globais da classificação e do enquadramento devam
ser tendencialmente fracos, não o devem ser no que respeita às relações de poder investigador-
professores e no que respeita a alguns aspectos da selecção e sequência e também aos critérios de
avaliação. É de toda a conveniência que esses valores sejam fortes de modo a garantirem a
viabilização e sucesso do processo em curso. Mais concretamente, a classificação forte na relação
de poder investigador-professores permite mais facilmente distinguir os diversos intervenientes
no processo e permite que o investigador (formador) determine como devem ser definidas as
outras relações presentes no contexto de formação. Contudo, deve ser salientado que a forte
classificação entre investigador e professores deverá ser sempre acompanhada por um
enquadramento fraco nas regras hierárquicas que regulam esta interacção. O enquadramento forte
ao nível da selecção e da sequência é necessário, se pretendermos que os professores aprendam.
Com efeito, os professores não podem seleccionar um assunto que ainda não conhecem e não
podem explorá- lo segundo uma sequência apropriada. Assim, uma macro-selecção e uma macro-
sequência de enquadramentos fortes parecem ser mais adequadas no início da formação, pois
nesta fase não será de esperar que os professores tenham conhecimento científico suficiente para
intervir ao nível da escolha e ordenação dos temas/conhecimentos científicos e pedagógicos
necessários à sua formação. Numa segunda fase, depois de um período de discussão, análise e
reflexão com base em quadros teóricos, será mais fácil os professores seleccionarem e
sequenciarem a sua formação.

Simultaneamente, os resultados sugerem que os valores do enquadramento na regra discursiva


ritmagem e nas regras hierárquicas, devem ser fracos de forma a permitir e legitimar a
partic ipação de todos os intervenientes, quer ao nível do controlo do tempo de aprendizagem
requerido, quer ao nível de oportunidade de abordar todos os temas seleccionados. O
enfraquecimento dos valores do enquadramento quanto às regras hierárquicas estimula uma
participação mais equitativa de todos os elementos em situação de comunicação.

O facto de a modalidade de formação implementada estabelecer uma relação constante entre a


teoria e a prática, como preconizada por várias correntes da investigação-acção, também

25
influenciou positivamente o desenvo lvimento das professoras. A valorização da prática evitou
que a formação fosse “demasiado teórica”, “distante dos problemas reais” sentidos pelas
professoras. Por outro lado, a valorização da teoria evitou que a formação fosse “demasiado
prática”, “demasiado contextualizada” e “sem fundamentos e razões”, permitindo uma maior
profundidade, relação e coerência.

Outro aspecto fundamental, e que vai ao encontro da opinião de alguns autores (Silva, 1996;
Calderhead & Gates, 1995), é o importante papel que as investigadoras desempenharam no
desenvolvimento profissional das professoras, ao actuarem como facilitadoras no
desenvolvimento da reflexão, na (re)aquisição de conhecimentos, na alteração da prática
pedagógica, na resolução de conflitos ao nível de concepções e crenças, no domínio da
linguagem e dos conceitos necessários para descrever e compreender as práticas dos professores e
a aprendizagem dos alunos, no envolvimento das professoras num diálogo construtivo, entre si e
com as formadoras, acerca do seu trabalho. Consideramos que o professor deve ter algum grau de
responsabilidade no seu desenvolvimento profissional, mas também consideramos que um
professor individual tem um poder limitado para mudar conhecimentos e desempenhos social e
culturalmente construídos. Mesmo um adulto competente pode beneficiar da participação de
outros para melhorar e manter o seu desempenho (Manning & Payne, 1993; Jones, Rua & Carter,
1998).

O papel do formador pode alterar-se ao longo das diferentes fases do ciclo de investigação-acção,
contribuindo, deste modo, para o desenvolvimento profissional futuro dos professores
(Calderhead & Gates, 1995). Contudo, parece-nos, que ele terá sempre um papel importante na
colaboração que pode dar ao desenvolvimento profissional dos professores, embora a sua
importância possa diminuir ao longo do processo, pois os professores, em princípio, já terão
adquirido os conhecimentos e as competências necessários para a prossecução do seu
desenvolvimento de uma forma mais autónoma e independente.

Estamos conscientes de que o desenvolvimento profissional dos professores não depende apenas
das características da formação mas que é influenciado por inúmeros factores pessoais, sociais e
profissionais. As características pessoais, o ambiente de trabalho na escola, as relações entre
colegas, a relação com os pais dos alunos e com a comunidade em geral, também influenciam o
desempenho profissional. Uma outra variável que influenciou a evolução das professoras na

26
aquisição da orientação específica de codificação, que conduziria ao desempenho da prática
pedagógica com o perfil pretendido, foi a formação inicial e contínua recebida. As quatro
professoras tiraram o seu curso em escolas diferentes, em anos diferentes, em locais diferentes,
mas tiveram uma formação semelhante e bastante diferente da modalidade de prática pedagógica
proposta, no que diz respeito ao que e, particularme nte, ao como foram ensinadas. Quanto ao que,
quer científico quer pedagógico, as professoras referiram-se à formação como apresentando
várias lacunas, essencialmente relacionadas com a forma teórica como o conhecimento foi
ensinado, e que não incluía o desenvolvimento de competências investigativas e a ligação com a
prática e os problemas do dia-a-dia dos professores. Quanto ao como da sua formação contínua,
mas particularmente da formação inicial, a prática esteve predominantemente centrada no
professor tanto no contexto instrucional como no contexto regulador. O estágio, que constitui
uma fase muito importante para o desenvolvimento de futuros professores, de modo a
desempenharem uma prática pedagógica eficiente, foi também desenvolvido no sentido de as
professoras centrarem todo o processo de ensino-aprendizagem em si, limitando o controlo do
aluno naquele processo. Levar os professores a impleme ntar uma prática pedagógica mista,
centrada no aluno, em certos aspectos (como por exemplo, a ritmagem) e centrada, no professor,
noutros aspectos (como, por exemplo, os critérios de avaliação), pode, de facto, constituir uma
tarefa difícil/árdua quer para professores, quer para formadores.

Embora os resultados apresentados neste trabalho tenham sido obtidos com uma amostra de
professores e de alunos relativamente pequena, pensamos que o estudo pode dar algum contributo
no campo da investigação educacional, no âmbito da formação de professores, e no campo da
intervenção pedagógica. Do ponto de vista da investigação educacional o estudo ajuda a
compreender parte da incapacidade de alguns professores em implementar, em sala de aula,
práticas pedagógicas distintas das práticas que costumam desenvolver e compreender que tal
incapacidade não depende apenas das características pessoais, sociais e profissionais, mas
também dos contextos da formação inicial e contínua em que os professores estiveram
envolvidos.

Do ponto de vista da intervenção pedagógica, o estudo mostra que a criação de condições


favoráveis ao desenvolvimento profissional dos professores passa pela implementação de
modalidades de formação que tenham não apenas em consideração as vivências/experiências de

27
todos os professores mas que dêem também algum co ntrolo aos professores no seu processo de
desenvolvimento profissional e na aquisição da orientação específica de codificação necessária à
implementação de modalidades de prática pedagógica inovadoras e facilitadoras do
desenvolvimento científico e sócio -afectivo de crianças de diferentes grupos sociais. É também
importante para o desenvolvimento profissional dos professores que a relação entre
investigador/formador e professores seja caracterizada por uma forte classificação, de forma a
permitir que o investigador/formador possa decidir quais os aspectos que deve controlar e quais
os aspectos que os professores devem controlar.

Gostaríamos de salientar ainda a importância de dois aspectos. O primeiro tem a ver com a
importância de consciencializar os formadores de professores de que, além de razões de natureza
psicológica, existem razões de natureza sociológica que interferem no desenvolvimento
profissional dos professores e de que determinadas características sociológicas das modalidades
de formação constituem aspectos importantes que devem ser contemplados se, de facto, se
pretende alcançar uma melhoria do desempenho profissional de todos os professores. O segundo
aspecto tem a ver com a importância de se recorrer a modelos de análise em investigação
educacional que possibilitem a análise a vários níveis do discurso pedagógico, usando os mesmos
princípios e conceitos. No caso do presente estudo, foram usados os mesmos conceitos ao meso-
nível (na formação de professores) e ao micro- nível (na sala de aula). Ta l foi possível devido à
forte estrutura conceptual e grande poder explicativo da teoria em que a investigação se
fundamentou.

Finalmente, gostaríamos de salientar o modo como analisámos o desenvolvimento profissional


dos professores, que consideramos inovador no âmbito da investigação realizada neste domínio.
Analisámos o desenvolvimento em termos de aquisição, por parte das professoras, de regras de
reconhecimento e de realização e, neste sentido, o estudo sugere uma abordagem metodológica
que fornece a possibilidade de discriminar componentes específicas do desempenho dos
professores. Esta abordagem partiu dos mesmos pressupostos teóricos que tinham orientado
estudos anteriores sobre a aprendizagem dos alunos e a sua aquisição de regras de
reconhecimento e de realização (Morais & Neves, 2001). Contrariamente à aprendizagem dos
alunos, onde já foram realizados vários estudos que conduziram a um maior rigor dos
instrumentos de análise, no caso do desempenho dos professores, este estudo representa apenas

28
um primeiro passo. Há ainda muito a ser feito, nomeadamente no modo de analisar as regras de
reconhecimento e de realização passiva e a sua relação com a realização activa. Também a
avaliação da posse/ausência das regras de reconhecimento e de realização deverá ser feita no
mesmo momento da investigação. A entrevista aplicada, neste estudo, às professoras, como
instrumento de obtenção de dados acerca das regras de reconhecimento e de realização passiva,
precisa também ser melhorada. Por exemplo, será importante dar aos professores uma maior
diversidade de situações de aprendizagem do que as que foram incluídas nas entrevistas deste
estudo e criar situações que permitam discriminar melhor a posse/ausência de tais regras.

NOTAS

1. As duas investigadoras fizeram a sua formação inicial na mesma universidade, terminaram o mesmo grau
académico, tiraram o curso de mestrado na mesma universidade e a sua dissertação usou como referência teórica
a teoria de Bernstein para analisar questões relacionadas com a aprendizagem das ciências. As duas
investigadoras são professoras em Escolas Superiores de Educação.

2. Uma descrição mais completa das relações sociológicas que caracterizam os perfis teóricos das modalidades de
código pedagógico das duas fases que constituíram a formação das professoras pode ser encontrada em Afonso
(2002) e em Afonso, Morais e Neves (2002).

3. Os nomes com que designamos as professoras são fictícios pois, pretende-se manter o seu anonimato.

4. No caso da modalidade de formação, os dados empíricos permitiram o estabelecimento de uma escala de


classificação, apenas com dois graus. O valor de C- atribuído, no modelo teórico, à relação entre conhecimentos
da investigadora e das professoras não significa que o novo conhecimento a ser adquirido pelas professoras seja
desvalorizado, isto é, que tenha baixo estatuto, mas que os conhecimentos das professoras devem ser tomados em
consideração. Numa escala de dois pontos, C - era a única opção.

5. Uma descrição detalhada do instrumento pode ser encontrada em Afonso, Morais e Neves (2002) e em Afonso
(2002).

6. De forma a mostrar o tipo de questões que foram colocadas na entrevista, apresentamos, como exemplos, uma
questão relacionada com a regra discursiva critérios de avaliação e uma questão relacionada com as regras
hierárquicas.

Critérios de avaliação
Acha que, quando os alunos têm que fazer e apresentar trabalhos, o professor deve explicitar-lhes o que têm de
fazer e como devem fazê -lo ou acha que fica ao critério dos alunos? Justifique.

Regras hierárquicas
Quando os alunos não fazem o que o professor manda, como acha que deve chamar a atenção dos alunos
(zangando-se, dando as suas razões, ouvindo as razões dos alunos)? Justifique.

7. O sistema de categorias usado para analisar a posse/ausência das regras de reconhecimento e de realização passiva
foi o seguinte:

29
Regras de reconhecimento
Não possui regras de reconhecimento
• Indica características da prática pedagógica diferentes/opostas das características preconizadas pelo modelo
teórico
• Indica características da prática pedagógica descontextualizadas/não consideradas no modelo teórico
Pode possuir regras de reconhecimento
• Não indica as características da prática pedagógica - Sem elementos
• As características apontadas para a prática pedagógica são ambíguas/pouco claras
• As características apontadas para a prática pedagógica são contraditórias
Possui regras de reconhecimento
• As características apontadas para a prática pedagógica são semelhantes às características preconizadas pelo
modelo teórico

Regras de realização passiva


Não possui regras de realização passiva
• Não possui as regras de reconhecimento
• Embora indicando características da prática pedagógica semelhantes às características preconizadas pelo
modelo teórico, apresenta justificações/explicações/argumentos que se opõem aos princípios que orientaram a
definição do modelo teórico
Pode possuir regras de realização passiva
• Não apresenta justificações/explicações/argumentos para a prática pedagógica - Sem elementos
• As justificações/explicações/argumentos que apresenta para a prática pedagógica são ambíguos/pouco claros
• As justificações/explicações/argumentos que apresenta para a prática pedagógica são contraditórios

Possui regras de realização passiva


• As justificações/explicações/argumentos que apresenta para a prática pedagógica são consonantes com os
princípios que fundamentam o modelo teórico

8. As figuras que se seguem mostram a caracterização da prática pedagógica de cada professora, nos contextos
instrucional e regulador e o modelo teórico proposto (Afonso, 2002).

Caracterização da prática pedagógica das professoras – Contexto instrucional

RELAÇÃO ENTRE SUJEITOS


RELAÇÃO ENTRE DISCURSOS
PROFESSORA-ALUNO
(Cie Eie )
(Ci Ei )

RELAÇÕES DE CONTROLO
(Ei) CONHECIMENTO CONHECIMENTO CONHECIMENTO
INTRA- INTER - ACADÉMICO/ NÃO
PROFESSORAS/ FASES RELAÇÕES DE DISCIPLINAR DISCIPLINAR ACADÉMICO
Regras discursivas
DA INVESTIGAÇÃO PODER (Ci) (Ci Fi) (Ce Fe)
(C i)
Selecção Sequência Ritmagem Critérios de
avaliação

Modelo
C +
E+ E+ E -- E ++ C --
C +
E- C +E - -
teórico

1ª fase C + E+ E+ E- E -- C + C ++E + C ++ E +
Rita + C ++ E +
2ª fase C E+ E+ E- E -
C +
C +
E + / E-

1ª fase C + E+ E+ E- E ++ C - C +E -- C ++ E +
Inácia
2ª fase C +
E+ E+ E+ E+ C +
C +
E -- C ++ E +

1ª fase C +
E +
E +
E --
E +
C +
C ++
E + C ++ E +
Dulce C +E -
2ª fase C + E+ E+ E -- E ++ C+ C ++E +

1ª fase C + E+ E+ E+ E -/ E + C + C ++E + C ++ E ++
Céu
2ª fase C +
E+ E+ E- E + / E ++ C +
C ++
E+ C ++ E +

30
Caracterização da prática pedagógica das professoras – Contexto regulador

RELAÇÃO ENTRE SUJEITOS


(CiEi) RELAÇÃO ENTRE
ESPAÇOS
PROFESSORA-ALUNO ALUNO -ALUNO (Ci)

RELAÇÕES DE RELAÇÕES DE CONTROLO RELAÇÕES DE RELAÇÕES DE CONTROLO


PROFESSORAS/ FASES PODER (Ei) PODER (Ei) ESPAÇO ESPAÇO
(Ci) (Ci) PROFESSORA/ ALUNO/
DA INVESTIGAÇÃO Regras Regras ALUNO ALUNO
hierárquicas hierárquicas

Modelo +
C E -- C- -
E- -
C- C --
teórico

1ª fase C +
E+ C ++ E+ C+ C-
Rita +
2ª fase C E+ C+ E- C +
C-

+
1ª fase C E- C- - E- - C- C --
Inácia +
2ª fase C E - /E + C- -
E- -
C- C --

1ª fase C +
E --
C - - E- C- C- -
Dulce
2ª fase C + E -- C - - E -- C- C- -

1ª fase C+ E+ C ++ E+ C- C-
Céu +
2ª fase C E- C+ E- C- C-

AGRADECIMENTOS

As autoras agradecem à Fundação Calouste Gulbenkian e ao Instituto de Inovação Educacional o apoio financeiro
que tornou possível a investigação.

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33
Relação entre sujeitos Relação entre discursos
(Investigadora-Professoras)
(Ci Ei) (Cie)
Relações Relações de controlo Relações Intra- Relações inter- Conhecimento da
de poder (Ei) disciplinares disciplinares investigadora-conhecimento
Regras discursivas das professoras
(Ci) Selecção Sequência Ritmagem Critérios (Ci) (Ci) (Ce)
Modelo Teórico + + + -- ++ - - -
C E E E E C C C
(1ª fase)
+ + + -- ++ - - -
Rita - Inácia C E E E E C C C

+ + + -- ++ - - -
Dulce - Céu C E E E E C C C

Modelo Teórico + - - -- ++ - - -
(2º fase) C E E E E C C C
+ - + - + -- ++ - - -
Rita - Inácia C E /E E /E E E C C C
+ - + - + -- ++ - - -
Dulce - Céu C E /E E /E E E C C C

Figura 1 - Modalidades de formação- Contexto instrucional (1ª e 2ª fases)

Relação entre sujeitos Relação entre espaços


(Ci)
Investigadora-Professora Professora-Professora
(Ci Ei) (Ci Ei)
Relações Relações de Relações Relações de controlo Espaço investigadora- Espaço professora-
de poder controlo (Ei) de poder (Ei) professora professora
(Ci) Regras Hierárquicas (Ci) Regras Hierárquicas
Modelo Teórico
+ -- - -- - -
(1ª fase) C E C E C C
Rita -Inácia C
+
E
--
C
+
E
-
C
-
C
-

+ -- - -- - -
Dulce -Céu C E C E C C

Modelo Teórico
+ -- - -- - -
(2ª fase) C E C E C C
Rita -Inácia + -- + - - -
C E C E C C
Dulce -Céu C
+
E
--
C
-
E
--
C
-
C
-

Figura 2 - Modalidades de formação - Contexto regulador (1ª e 2ª fases)

34
REGRAS DE
REGRAS DE REALIZAÇÃO
RECONHECIMENTO
PROFESSORAS/
CONTEXTOS Passiva Activa
Antes da Depois da
formação formação Antes da Depois da Unidades de ensino
formação formação 1ª 2ª
Selecção + + ? + 4 4
discursivas
Regras

Sequência + + ? + 4 4
Ritmagem + + + + 3 3
RITA

Critérios + + ? + 1 2
Intra-disciplinares + + + + 2 2
discursos
Relação
entre

Inter-disciplinares + + ? ? 2 2,5
Académicos-não
+ + ? + 2 2
académicos
Selecção + + + + 4 4
discursivas

− −
Regras

Sequência + + 4 4
Ritmagem + + + + 3 2
INÁCIA

Critérios + + ? + 4 3
Intra-disciplinares + + ? + 3 2
discursos
Relação
entre

Inter-disciplinares + + + + 3 3
Académicos-não
+ + + + 2 2
académicos
Selecção + + ? + 4 4
discursivas
Regras

Sequência + + + + 4 4
Ritmagem − + − + 4 4
DULCE

Critérios ? + ? + 3 4
Intra-disciplinares + + + + 2 2
discursos
Relação
entre

Inter-disciplinares + + ? ? 2 2
Académicos-não
+ + + + 2 3
académicos
Selecção + + ? + 4 4
discursivas
Regras

Sequência + + + + 4 4
Ritmagem ? + ? + 2 3
CÉU

Critérios ? + − + 2,5 3,5


Intra-disciplinares + + ? ? 2 2
discursos
Relação
entre

Inter-disciplinares + + + + 2 2
Académicos-não
+ + + + 1 2
académicos

− Ausência
+ Presença
? Pode ou não ter
Mudança
1-4 níveis de desempenho

Figura 3 – Evolução da orientação específica de codificação das professoras – Contexto instrucional


REGRAS DE REGRAS DE REALIZAÇÃO
RECONHECIMENTO
PROFESSORAS/
CONTEXTOS Passiva Activa
Antes da Depois da
formação formação Antes da Depois da Unidades de ensino
formação formação 1ª 2ª
hierárquicas
Professora-Aluno − + − + 2 2
Regras

Aluno-Aluno − + − + 2 3
RITA

Professora-Aluno − + − + 2 2
Relação

espaços
entre

Aluno-Aluno + + ? + 3 3
hierárquicas

Professora-Aluno + + ? + 3 2,5
Regras

Aluno-Aluno + + ? + 4 4
INÁCIA

Professora-Aluno + + ? + 4 4
Relação

espaços
entre

Aluno-Aluno + + + + 4 4
hierárquicas

Professora-Aluno + + ? + 4 4
Regras

Aluno-Aluno ? + ? + 3 4
DULCE

Professora-Aluno ? + ? + 4 4
Relação

espaços
entre

Aluno-Aluno + + + + 4 4
hierárquicas

Professora-Aluno + + ? + 2 3
Regras

Aluno-Aluno ? + ? + 2 3
CÉU

Professora-Aluno + + + + 4 4
Relação

espaços
entre

Aluno-Aluno − + − + 3 3

− Ausência
+ Presença
? Pode ou não ter
Mudança
1-4 níveis de desempenho

Figura 4 – Evolução da orientação específica de codificação das professoras – Contexto regulador


Competências Conhecimentos científicos Competências investigativas
científicas
Muito Muito Muito Muito
Professoras Baixo Médio Bom Baixo Médio Bom
baixo bom baixo bom
Rita
Inácia
Dulce
Céu O

Figura 5 – Evolução dos conhecimentos científicos e competências investigativas das professoras

37
Processos de formação e sua relação com o desenvolvimento profissional dos professores:
Um estudo sociológico no 1º ciclo do ensino básico

Resumo

O artigo descreve parte de um estudo cujo objectivo era investigar a relação entre modalidades de
formação de professores e modalidades de prática pedagógica implementadas em contextos de
aprendizagem científica. O estudo foca-se no primeiro ciclo do ensino básico e analisa a evolução
do desempenho dos professores, em termos de aquisição de regras de reconhecimento e de
realização, isto é, de orientação de codificação, para contextos específicos de aprendizagem das
ciências.

Teoricamente, o estudo baseia -se na teoria do discurso pedagógico de Bernstein (1999, 2000) que
forneceu os conceitos usados para caracterizar as modalidades de formação de professores e as
práticas pedagógicas implementadas na sala de aula e para analisar a evolução dos professores
em termos de regras de reconhecimento e de realização. A amostra era constituída por quatro
professoras e respectivas turmas, socialmente heterogéneas. Foi implementada uma metodologia
de investigação-acção.

Os resultados sugerem que a modalidade de formação implementada foi favorável ao


desenvolvimento profissional das professoras e à sua competência para conduzir todas as crianças
a um elevado nível de desenvolvimento científico. A eficácia da modalidade de formação é
principalmente atribuída à forte classificação na relação investigadora-professoras e ao forte
enquadramento nos critérios de avaliação, selecção e sequência, conjuntamente com um fraco
enquadramento nas regras hierárquicas e na ritmagem.

Palavras-chave: Competência pedagógica; Competência científica; Prática pedagógica; Regras


de reconhecimento; Regras de realização; Desenvolvimento profissional de professores.

Teacher training processes and teachers’competence: A sociological study in the primary


school

Abstract

The paper describes part of a study whose aim was to investigate the relation between modalities

38
of teacher training and modalities of pedagogic practice implemented in the science classroom.
The study is focused on primary school and analyses the evolution of teachers performance in
terms of their acquisition of recognition and realisation rules, i.e. coding orientation, to specific
scientific learning contexts.

Theoretically, the study is based on Bernstein’s theory of pedagogic discourse (1999, 2000)
which provided the concepts to characterise the modalities of teacher training and of classroom
pedagogic practices and to analyse teachers’ evolution in terms of recognition and realisation
rules. The sample was made up of four teachers and their four socially heterogeneous school
classes. An action-research methodology was followed.

The results suggest that the teacher training implemented was favourable to the teachers’
professional development and their competence to lead all children to a high level of scientific
development. The efficienc y of the training process has to be mostly attributed to the strong
classification of the researcher-teachers relation and to the strong framing of evaluation criteria,
selection and sequence, together with weak framing of hierarchical rules and pacing.

Key-words: Pedagogic competence; Scientific competence; Pedagogic practice; Recognition


rules; Realization rules; Teachers professional development.

39

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