Revista Raça Ed. 217 Compressed
Revista Raça Ed. 217 Compressed
Revista Raça Ed. 217 Compressed
br
A N O S
2 4
E S P E C I A L
S A Ú D E
RAÇA BRASIL:
M O V I M E N T O
24 anos da maior
revista negra da
América Latina
E M
PÁGINAS
N E G R O S
PRETAS:
Eder Ramos, exemplo
de comprometimento
com a diversidade racial
R A Ç A
N A
R$ 15,99
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u
NÚMERO 217 - PREÇO
aj
M O D A
M
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UM TESTE
DE RAÇA
O
s últimos meses têm sido um teste para muita gente no Brasil e
no mundo. Teste de paciência, teste de saúde, teste de vacina,
teste de conseguir ou não se organizar em uma nova forma
de trabalho, teste de viver um novo normal. Cada um de seu
modo e jeito. Para nós, da RAÇA Brasil, foi desafiador. Mais
uma vez tivemos que nos superar e colocar nosso bloco na rua,
ou melhor, nossa RAÇA na rua, de máscara e tudo.
Do ponto de vista pessoal, aceitei o desafio e o teste de ser analista na maior
rede de televisão jornalística do mundo, a CNN Brasil. Mas nossa luta não
é só individual. Os últimos meses foram também de torcida para que nossa
Maju Coutinho passasse no teste, não só de ancorar um dos principais jornais
do país, o “Jornal Hoje”, mas também superasse a pressão e os comentários
racistas das redes sociais.
Teste coletivo, também, de assistir policiais racistas de lá e de cá assassinando
jovens como o menino João Pedro, Ágatha e George Floyd e não engolir a
impunidade. Mas nosso teste maior foi o de, mesmo com a crise econômica,
social, política e sanitária que estamos vivendo, chegar até setembro e
comemorar os 24 anos da nossa RAÇA Brasil, a primeira, a número um, a
maior revista negra da América Latina.
Das centenas de revistas que nasceram e morreram na história do Brasil, apenas
uma dezena delas conseguiu chegar a essa marca de 24 anos de vida, somente
dez títulos alcançaram esta façanha e, com esta edição, entramos para o clube.
Difícil seria enumerar as diversas pessoas que passaram por aqui segurando o
Mauricio Pestana bastão. Editores, fotógrafos, repórteres, jornalistas, homens, mulheres, negros,
Jornalista, publicitário, cartunista, escritor e roteirista brancos e até a coreana Joana Woo, dona da Editora Símbolo, que lançou a RAÇA
mpestana@revistaraca.com.br Brasil e publicou por dez anos. Depois a revista migrou para editora Escala, do Sr.
Hercílio de Lorenzi, também por dez anos. Agora, pela primeira vez, é pilotada
por uma família negra, há quase meia década, na Pestana Arte & publicações.
Mudanças de tempo.
Um novo ciclo se inicia para a RAÇA Brasil. Nunca fomos tão orgulhosos das
nossas raízes como agora, com patrocinadores como Carrefour, Amil, Symrise,
Via Mundi e tantas outros apoiadores, como Hotel Holiday Inn, Max Fama,
Grupo YBrasil, Grupo Cultural Olodum e Hotel The Premium. Eles sabem
que este apoio vai muito além do comercial, muito além de estar falando com
a representatividade de 56% da população brasileira. Sabem que, na realidade,
estão também apoiando um projeto de justiça social, de diversidade e igualdade
e, assim, somando-se aos nossos profissionais, colaboradores e amigos, estão
FOTO: RAFAEL CUSATO
Diversidade
racial
como
prioridade por maurício pestana
E
xecutivo com mais de 40 anos de experiência no
mercado de Cosméticos e Fragrâncias e há 35 anos
trabalhando nos quadros da empresa Symrise,
Eder Ramos atuou em diferentes posições e países
como diretor e vice-presidente. Presidente
global da Divisão de Ingredientes Cosméticos, ele assumiu
como missão pessoal encarar a questão da diversidade
racial no mercado. Ele criou e assumiu a implementação da
política de diversidade da Symrise no Brasil, dando ênfase
para a questão étnico-racial.
Precisamos promover
oportunidades iguais para todos e
todas e, consequentemente, criar
uma sociedade mais justa
homem. E universalizamos a questão da mulher branca, cientistas dedicaram-se à bioquímica dos ingredientes,
deixando uma lacuna no olhar e ações de inclusão com na busca de uma melhor composição, que atendesse ao
foco nas mulheres negras. desejo de mais hidratação, mais brilho, melhor controle
do frizz e volume e maleabilidade dos fios. Após meses
O que você diria para um CEO que quisesse iniciar hoje de testes e avaliações de especialistas, podemos dizer que
um processo de mudança profunda, mudança na sua temos um produto pensado e aprovado para suprir a
empresa, querendo colocar mais negros e negras em necessidade de afrodescendentes.
cargos de decisão e representatividade?
Tenha coragem! Esteja à frente do projeto e processo de Vocês buscaram nos produtos oriundos da África, um
mudanças. produto que traz o cuidado e benefícios aos cabelos de
afrodescendentes. Mas, qual é a relação de vocês com
Você é líder de umas das maiores empresas os fornecedores destes elementos?
produtoras de matérias-primas cosméticas do Como comentei, o SymOleo® Nutri Intense é composto
mundo. De fato, em termos de produtos, como vocês por sete óleos africanos: baobá, moringa, nigella, tamanu,
avaliam a questão étnico-racial? opuntia, karité e coco. Estes óleos são parte da coleção
Neste período trabalhando como fornecedor de de óleos africanos da Symrise, provenientes de diversos
matérias-primas para a indústria países, cada um tem a sua história,
de cosméticos, pude observar suas comunidades produtoras,
que o cosmético é um bem com as quais temos uma relação
de consumo com o poder de de respeito e transparência. Posso
transformar pessoas. Muitos citar um exemplo, o tamanu que
compram para melhorar a vem das operações da Symrise
autoestima, sentirem-se melhor, em Madagascar. Esta planta
em busca de beleza e bem- sempre foi utilizada para construir
estar. Em épocas tão difíceis paredões verdes, na costa da
como as que estamos vivendo, ilha, para abrigar e proteger a
o cosmético torna-se um população de tufões costeiros,
grande aliado do bem-estar. que muitas vezes arrasaram a
Acreditando nisso, a Symrise vegetação e moradias do local.
tem desenvolvido produtos com Temos uma operação grande em
este propósito, a fim de auxiliar Madagascar que supre o mundo
as empresas de cosméticos a cumprirem esse papel. com a famosa baunilha e nos permite vivenciar o dia-a-
Um exemplo disso é o mais novo produto de nosso dia das comunidades. Em uma expedição para a busca
portfólio de cuidado com os cabelos, o SymOleo® Nutri de novos ingredientes, um de nossos cientistas observou
Intense, um blend de sete óleos africanos que, em que as paredes verdes de proteção davam uma frutinha
uma composição perfeita, destaca hidratação, brilho, oleaginosa e assim a pesquisa deste ingrediente nasceu.
maleabilidade para os fios e o controle de volume e Hoje, mais de 300 famílias são beneficiadas nesta cadeia
frizz. Tudo que um cabelo texturizado pede. produtiva, onde as mulheres têm um papel importante
coletando os frutos que caem na época de seca. O tamanu
O que indica que esta matéria-prima foi pensada tornou-se uma renda alternativa complementar para estas
para cabelos étnicos? famílias. O papel socioambiental dessa frutinha já se
Há uma gama ampla de pessoas com cabelos estende ao Quênia e a Tanzânia.
texturizados, como os ondulados, cacheados,
encaracolados, afro, com necessidades específicas. Quando os consumidores encontrarão este produto no
E, já que o cabelo tem uma grande importância na mercado?
individualidade e auto- expressão, pensamos em algo Setembro. Estamos realizando uma forte campanha
para valorizar este tipo de cabelo, ajudando estas junto às empresas de cosméticos para que elas possam
pessoas a assumirem as ondas, os caracóis, o afro, em incorporar o ingrediente na fórmula de seus produtos.
vez de submetê-los a tratamentos químicos como Em breve, os consumidores terão a oportunidade
alisamento. Fizemos uma grande avaliação do mercado de experimentá-lo em shampoos, condicionadores,
global e de suas necessidades. Com base nisso, nossos finalizadores de grandes marcas de cosméticos.
28
MARIANA NUNES
PROTAGONISTA NA TV FECHADA
EFEITOS DA COVID-19
NEGROS SÃO OS MAIS ATINGIDOS
20
FESTEJE
CONOSCO!
44 LEMBRA DELES?
PESSOAS QUE JÁ ESTIVERAM
NAS PÁGINAS DA RAÇA
40
E SE A RAÇA
FOSSE UMA
MULHER
DE 24 ANOS?
SEÇÕES
03 Opinião de Raça
04 Páginas Pretas
12 Interativa
15 Professor Oscar Henrique
18 Livros
26 Serviços
30 Zulu
48
42 Francisco José
46 Beleza
52 Eu na Raça
54 Rachel Quintiliano
56 Tadeu Kaçula MODA ARTIVISTA
Negros em Movimento O CONCEITO DE CAROL
58
BARRETO
62 Sandro Aloísio
N
ão é lugar comum citar o que, quase certeiro, todos que leem essas
páginas, desde 06 de setembro de 1996, pensaram alguma vez: um dia
estarei na Revista RAÇA! Sim, esse pensamento foi latente em mim,
exatamente naquele ano e que me graduava na universidade, como
acadêmica de Comunicação Social, optando pelo Jornalismo.
Jovem à época, tive os mesmos sentimentos da maioria: existíamos! E ali era um
lugar onde não estávamos em primeiro plano para falar de mazelas! O belo, o
positivo, o inusitado, o não pensado, o “yes, we can”, bem ai, ao nosso alcance.
O tempo passou, a vida me levou para outros caminhos, igualmente desejados
e felizmente conquistados, até que o acaso me colocou “na bola da vez”.
Despretenciosamente, num café da manhã em um hotel em São Paulo, meu amigo
Flávio Andrade, que era gerente geral do local, apresentou-me a Maurício Pestana.
Não trocamos mais que dois ou três minutos de prosa. Foi exatamente estar no lugar
certo, na hora certa. Ele buscava alguém cujo perfil era exatamente o meu. E, sem
mais delongas, cá estou, desde a edição 198.
Olhar para trás e ver que a trajetória tão bonita e fiel às suas origens não se perdeu,
é engrandecedor. Entender que somos um produto – hoje – feito 100% por uma
família preta (sem demérito, ao longo da caminhada houve muita mão branca),
traz ainda mais responsabilidade e vontade de prosseguir. Adversidades? Temos! Até
mesmo torcida contra, vinda dos nossos... mas faz parte. Árvore que não dá fruto,
não é apedrejada. Ficamos com a enorme gama de positividade e aquilombamento
que nos abraça.
Em tempo recorde, transformamos a RAÇA, até então apenas a publicação impressa,
em um grupo multimídia, com programa de TV (RAÇA na TV, exibido na TV
Guarulhos, canal no YouTube, perfil no Instagram, Facebook e Twitter, além de
projetos especiais, como feira literária, noites de jazz, cruzeiros, saraus etc.
Nesses tempos de pandemia, superamos ainda mais. Na contramão de empresas
de comunicação que encerraram suas publicações impressas, desdobramos-nos
para seguir. Driblando percalços de distribuição, fechamento remoto, atrasos, mas
com a mesma garra de dias melhores. Até porque nos tornamos melhores! E assim
chegamos até aqui. A Revista RAÇA resiste. Persiste e mantém acesa a chama da
elevação da autoestima do nosso povo. Que nossa juventude possa, como há 24 anos
fiz, perceber e entender, que “essa é pra mim!”
Vida longa à revista dos negros brasileiros! E começa a contagem regressiva para os
25 anos!
Flavia Cirino
Editora chefe
flavia.editora@revistaraca.com.br
Estou sem estrutura com esta capa. Exalte sempre a sua família preta.
120 ANOS DAA
O amor preto é tudo!
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Dos 40 maiore
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Caroline Tavares – via Instagram @rolltavares
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Coringão Jogador de futebol preto, casado com uma mulher preta... merece uma
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do futebol
capa linda dessa mesmo! Representatividade é tudo!
Jamila Isau – via Instagram @jamilaisau
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A Até que enfim um jogador de futebol que não é palmiteiro! E que família
Jô volta
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NA NDA ALC
REI RA FER JO
TO ELÓ I FER ZULU AR AÚ
CAR OL BA RRE ÍSIO TAD EU KAÇU LA
E OS CO LU NIS
TAS : CAR
RA
LOS
CH EL
MACH AD O
QU INT ILIA NO
SAN DR O ALO 14/07/20
21:35
O menorzinho de chupeta foi a coisa mais fofa desta capa! Mas vamos respeitar esta família!
Que lindos! Que respeito à ancestralidade!
Vânia Carvalho – Madureira – RJ
BOAS LEMBRANÇAS
Lembro quando comprei esta revista pela
primeira vez. Meu chefe, branco, ficou
perplexo - mas ficou feliz - em saber
que existia uma revista voltada a nossa
raça. E eu, com 17 anos à época, jamais
pensei que existisse uma revista em que
eu pudesse estar na capa. Hoje, com
40, continuo orgulhosa em saber que a
revista RAÇA segue aí, encantando nosso
povo preto.
Camila Russel – via Instagram @camilarussel
MAURO SILVA
Eu sempre admirei o Mauro como jogador, porque ele fugia
Tive a honra de assinar o style de uma
revista que sempre tive como referência. daquele estereotipo do bronco, sem cultura. Adorei saber que
Gratidão! ele cresceu ainda mais!
Junior Rocha – via Instagram @juniorrochassa André Luis Corrêa – Vila Nova Conceição – SP
Eu tenho muita admiração pelo trabalho Sensacional ver a ascensão do Mauro Silva! Bela entrevista!
de vocês na luta pea representatividade. Carlos Trindade – Jabaquara - SP
Caroline Fraga – via Instagram @caarolmare
T
rês filmes internacionais no currículo,
séries na TV aberta e fechada, novelas,
cinema nacional. Muito talento.
Mariana Nunes não para. Após ter
participado de alguns capítulos da
novela “Amor de Mãe”, na Globo, interpretando
marcante personagem Rita, mãe biológica de Camila,
papel de Jéssica Ellen, ela acaba de fazer seu primeiro
papel como protagonista na TV, algo que já fazia
com maestria no cinema.
Em “Um Dia Qualquer”, exibido no canal SPACE,
a atriz mostra mais um pouco de seu talento, na pele
de Penha. Mariana se destaca na série de drama-
ficção, com cinco episódios, de 25 minutos cada.
Com uma carreira estabelecida em todas as frentes,
ela fez sucesso ainda na série Carcereiros, como a
Janaína; em “Segunda Chamada”, como a Gislaine,
entre muitos outros trabalhos. Natural de Brasília, a
atriz destaca o amadurecimento no mercado ainda
hostil a mulheres e a profissionais negros.
“Eu preciso sempre fazer a primeira cena (e mandar
bem!), para que as pessoas da equipe que não me
conhecem criem alguma empatia comigo. O que me
anima é ver que tem uma geração nova de negras
atrizes chegando com muita força. Tenho muita
esperança na nova geração”, comentou.
foto: rogério von kruger
o sul está
na raça brasil
C
omemorar 24 anos de existência de aqui em Porto Alegre, é o fato de ela poder se ver.
um projeto independente e arrojado Lembrou de uma ocasião em que foi comparada com
como a Revista Raça Brasil é falar uma atriz norte-americana por conta do penteado que
da força e do sucesso de um grupo usava. Ela fez questão de salientar que a Raça Brasil
de negros e negras empreendedores também informa sobre o que acontece no universo
e empreendedoras que tiveram a coragem de lançar cultural negro brasileiro. E para ela, é importante se
uma publicação impressa que apresente na pauta a ver representada como negra, gaúcha e brasileira. Vale
diversidade da presença negra na sociedade brasileira. dizer que, além da publicação de notícias e matérias
relacionadas a casos de racismo, o que infelizmente
Falar de diversidade é falar também do Rio Grande
ainda é muito presente em nossa comunidade, Raça
do Sul, estado de onde eu sou natural e onde vivo,
Brasil também é apoiadora de projetos de relevância.
há dez anos desde que retornei de Brasília, com
uma breve passagem por Florianópolis. O Rio Vale citar o apoio institucional e a presença que o
Grande do Sul, que até a chegada da Raça Brasil então editor-chefe, jornalista e cartunista Maurício
era apresentado apenas sob um olhar europeu, Pestana, concedeu ao estar presente, em dezembro de
onde a presença e a existência do negro não tinham 2013, no lançamento do Projeto “Coletânea Negras
um destaque para o resto do Brasil, passou a ser Palavras Gaúchas”, que reuniu 23 autores negros. O
também contemplado. E a resposta vem pela lançamento reuniu mais de 500 convidados em Porto
aceitação do gaúcho. Hoje, o Sul, em especial Alegre e Maurício Pestana falou do apoio que recebe
Porto Alegre responde por um alto volume de dos gaúchos e da importância de publicações que dão
vendas da publicação, em bancas. Tal fato pode ser visibilidade à produção editorial afro-brasileira.
analisado por alguns pontos. Entre eles, destaco
Para concluir, o momento é de desejar votos de muitas
o pensamento político do gaúcho, em especial
e muitas edições. Que a Revista Raça Brasil nos traga
do negro gaúcho que se organiza em coletivos e
cidadania e representatividade. Nós, aqui no Sul,
promove atuações que vêm a impactar a sociedade.
estamos e somos também um pouco da Raça Brasil.
Em uma sociedade politizada, os cidadãos Sucesso e vida longa sempre.
querem se ver e a Raça Brasil veio nos ofertar esta
oportunidade. Nós estamos incluídos e nós, negros,
somos pauta de uma revista de circulação nacional.
Outro ponto que também vale ser apresentado é a
representatividade que a Raça Brasil trouxe a todos
nós. Ao conversar com alguns amigos, pude saber
que eles compram mensalmente a revista nas bancas. Oscar Henrique Marques Cardoso é jornalista,
O que nos leva a comprar, e isso perguntei a uma radialista, escritor e poeta. Mora em Porto Alegre, RS,
amiga que atua como atriz e produtora cultural onde é editor da Editora Agbara.
Black
is
king:
por Fernanda Alcântara | fotos Reprodução/ Instagram
a Universidade de
Beyoncé
16 | REVISTA RAÇA brasil
:
críticas, positivas e negativas,
sobre representação, cultura
negra e representatividade. Aqui
no Brasil, a mais polêmica esteve relacionada
a um texto de Lilia Schwarcz, cujas críticas
lembram muito um famoso vídeo humorístico
do Saturday Night Live (SNL), “The Day
Beyoncé Turned Black” (em tradução livre,
“O dia em que Beyoncé virou preta” – que
recomendo veementemente que assistam.
No vídeo, fãs da cantora “descobrem”, a partir
do álbum Lemonade, que Beyoncé é negra
e surtam. A polêmica sobre Black is King
no Brasil tem várias faces, mas gostaria de
explorar uma que vi pouco manifestada desde
a publicação do artigo, que diz respeito a esta
discussão entre Academia e cultura negra.
Como defensora da ideia de que representatividade
importa e fã confessa de Beyoncé, começo
lembrando que esta é uma discussão antiga sobre
paixão e rigor acadêmico. E não é de hoje que a nesse patamar de admiração por trazer alguns elementos, é porque
soberba acadêmica faz com que alguém se coloque sabemos como é importante o trabalho da artista em representar de
no direito de deslegitimar a cultura negra, e com forma orgulhosa coisas que por séculos foram consideradas ruins,
certeza, não será a última vez que discutimos isso. como ter filhos, ser negro ou ter orgulho da ascendência africana. Sua
participação na luta antirracista e do feminismo negro não precisa
Como mestre em comunicação, diversas passar pelo crivo de ninguém, porque, repito: ela não é obrigada.
vezes me vi nesta posição de ter que defender
nosso olhar, uma sabedoria baseada mais na Existe, é claro, a crítica da própria cultura pop como algo superficial,
experiência daqueles que ocupam uma posição porque envolve a paixão, e esta é difícil de ser analisada com o tal
privilegiada e que, muitas vezes, parecem rigor acadêmico. Mas essa mesma paixão tem o poder de influenciar
acreditar que precisam sair julgando todos nós. e empoderar, e isso é legítimo e acontece em
A crítica de Schwarcz parte deste sentimento, Black is King. Como Beyoncé faz isso, é outra
desta dificuldade da Academia em conseguir conversa, para outro texto, mas a Academia
dialogar com o popular e enxergar suas versões erra ao criticar este lugar.
da realidade, desconsiderando, assim, o poder da Mas vamos ocupar a Academia também
representatividade e de se enxergar no outro. e, em breve, ensinar que a nossa cultura
Mais do que a análise técnica, semiótica ou até sai da sala de jantar.
mesmo política que se possa levantar sobre Black
Is King, existe uma inquietação que persiste
sobre o caso: por que tantas pessoas acreditam
que Beyoncé precisa ser uma representante dos
negros norte-americanos ou mesmo da cultura FERNANDA ALCÂNTARA
africana em sua arte? É jornalista, pesquisadora de quadrinhos e mestre em Comunicação pela
USP. Desde 2014 realiza palestras sobre comunicação, diversidade e
Pode parecer tolo, mas vale lembrar: Beyoncé não igualdade racial e de gênero. Especialista em cultura pop, e universo nerd
é obrigada a nada por ser negra. E se a colocamos
Nei Lopes
O livro de estreia da escritora afro-americana Angie Thomas
O que seria de uma pessoa sem memória, sem a se tornou um fenômeno. A personagem principal de seu livro,
capacidade de lembrar de seu passado? Da mesma forma Starr Carter, é uma garota de dezesseis anos que vai, sem
que uma pessoa sem memória perderia suas referências, que seus pais saibam, a uma festa em seu bairro. Os pais de
um povo sem memória perderia sua identidade. De Starr não a deixam ir às festas em seu próprio bairro, pois
certo modo, a imprensa negra tem sido, desde o século têm medo da violência. Esse também é o motivo pelo qual
XIX, com Luís Gama e outros abolicionistas, até os dias ela estuda em um colégio longe dali. Os piores medos dos
atuais, com revistas como a Raça, um dos pilares da pais se concretizam quando há um tiroteio na festa em que
memória dos afrodescendentes. A literatura e os livros ela está. Starr consegue escapar com a ajuda de um amigo
são outros pilares. Um livro como este, de Nei Lopes, de infância, que a leva para casa em seu carro. No meio do
coloca-nos diante de tradições culturais que sobrevivem caminho, entretanto, eles são parados por um policial. O
no inconsciente coletivo e que emergem para alimentar que acontece daí em diante é o desenrolar de um drama
os saberes que nos possibilitam seguir adiante. Além de muito visto nos dias atuais. Fica explícita a dicotomia entre
sambista, cantor e compositor, Nei também é estudioso a vida de Starr em seu próprio mundo, em que a violência,
de temas relacionados à cultura afro-brasileira e um especialmente a policial, faz parte da paisagem, mas onde
importante escritor com uma vasta obra. Neste livro ele fala estão sua família e suas raízes, e a aparente paz do “mundo
de uma forma de religiosidade que une espiritualidade e branco”, onde estão suas amigas e seu namorado. Starr se
racionalidade, filosofia e tecnicidade. Ele nos mostra o culto vê diante da necessidade de ter que tomar várias decisões,
de Ifá e faz ver que esse culto vem criando raízes no Brasil, e essas decisões a farão crescer. O livro de Angie Thomas foi
possibilitando um retorno espiritual até uma África que escrito para jovens e ficou durante um ano em primeiro lugar
permanece muito viva no inconsciente, mas com alguns na lista de mais vendidos do New York Times. O título deriva
aspectos que nem sempre têm oportunidade de vir à tona. de um código escrito pelo rapper Tupac e seu padrasto. E
Da sabedoria tradicional dessa África, Nei nos traz inclusive embora a história tenha dado origem a um belo filme, nada
alguns provérbios, como este: “Quando a memória me substitui a leitura do livro, que nos conduz pelo duro, mas
falha, eu recorro aos meus segredos”. Que esses segredos necessário, processo de crescimento e afirmação de Starr e
possam sempre nos iluminar. de sua comunidade.
É HORA DE C
CELEBRAR:
VISTA SUA ROUPA E
COMEMORE O ANIVERSÁRIO
DA RAÇA COM A GENTE
por FERNANDO COSTA
O mês de setembro é
marcado por uma data
mais do que especial
para a Revista Raça.
Estamos completando
24 anos, isso mesmo. Parece que
foi ontem que começamos, né? De
lá para cá, o nosso país mudou,
E claro que moda faz parte desse
processo, ela está no nosso DNA.
“A Revista Raça é uma das pioneiras
quando falamos em moda, e em
moda com representatividade. Todo
mundo já viu pelo menos uma
edição para se inspirar, aprender
e se atualizar”, relata a stylist Ana
Que venham mais 24 anos de
inspiração”, finaliza.
Óbvio que nesta edição especial a
moda se faria presente e ela chega
para brindarmos a nossa história.
Para celebrar esse grande momento,
nós fizemos esse editorial em parceria
com a agência de modelos Max
o mundo mudou, nós mudamos, Paula Fernandes. “Nos seus 24 anos Fama que ficou um arraso. Vista a
mas os desafios não. Crescemos, encontramos diversidade, editoriais sua roupa e comemore o aniversário
amadurecemos e aprendemos muito. com temas relevantes e o principal, da revista Raça com a gente. Esse
Todos os dias. Com todos vocês. da maneira que precisa ser mostrada. momento é nosso! Vamos celebrar!
FICHA TÉCNICA
MODELOS: AGÊNCIA DE MODELOS MAX FAMA
FOTÓGRAFO: JORGE LUIZ GARCIA
STYLIST: ANA PAULA FERNANDES
MAQUIAGEM: ISABELLE FREITAS
CABELO: SILVA’S HAIR THERAPY ( @VEMPROSILVIAS ) - (11) 95397-7227
PRODUÇÃO EXECUTIVA: PAULO HENRIQUE ALBUQUERQUE
DIREÇÃO DE ARTE: WESLEY ALISSON
COORDENAÇÃO GERAL: FELIPE MONTEIRO
na vida
acadêmica
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MAIS DE
100 MIL
A
o longo dos 24 anos de existência da O impacto da incapacidade de prefeitos, governadores e presidente para
revista RAÇA, não houve registro de frear o avanço do novo vírus não foi sentido de maneira uniforme por
maior letalidade da população negra, toda a sociedade. Os microdados mais recentes do sistema nacional de
por problema de saúde, que não fosse monitoramento de doenças respiratórias, atualizados até 3 de agosto,
a atual pandemia da Covid-19. Ao demonstram que pessoas do sexo masculino, idosos e pretos ou pardos
cruzar o limite de 100 mil mortos, segundo dados do foram os mais castigados pela pandemia no país.
Ministério da Saúde divulgados em agosto, o Brasil se
O sexo masculino, a exemplo do que também foi verificado em outros
tornou o segundo país no mundo a superar essa cifra.
países, representa quase 60% dos mortos, enquanto os idosos somam
Em primeiro lugar, os Estados Unidos. Infelizmente,
mais de 70%. Fatores biológicos ainda em estudo ajudam a explicar
a triste e melancólica marca foi atingida,
esses percentuais, mas os registros do Sivep-Gripe também sugerem
principalmente, à custa da vida de homens, idosos
que características sociais alteram o risco a que os brasileiros estão
e negros — vítimas mais frequentes da pandemia
submetidos diante da pandemia.
conforme os registros detalhados das notificações.
Pretos e pardos representam cerca de 56% da população brasileira, mas
O tamanho da população brasileira, superior a 210
somam 58% dos mortos que tiveram a etnia especificada na ficha de
milhões de pessoas, ajuda a explicar a vice-liderança
atendimento. O efeito da desigualdade social é visível ainda por outro
planetária em número absoluto de óbitos, mas não é
critério. Pretos e pardos somam 36,7% de todos os infectados quando
suficiente pra esconder o fracasso nacional em reduzir
se incluem na conta os sobreviventes e aqueles que não tiveram raça
o impacto do coronavírus de Norte a Sul.
determinada nos registros, mas 40% das notificações de óbito por esse
Quando se analisa a taxa de mortes por habitantes, viés ampliado. Isso significa que essa parcela da população, associada a
o país também ocupa uma posição negativa de uma renda média mais baixa e mais dificuldade de acesso aos serviços de
destaque: nos últimos dias, superou a França e passou saúde do que os brancos, morre em proporção maior do que o seu nível
a ocupar o nono lugar no ranking internacional de de infecção. Com os brancos, é o contrário: representam 29,7% de
óbitos por habitante, com cerca de 47 vítimas por todos os contaminados (incluindo quem não teve indicação de etnia),
100 mil pessoas. mas 27,9% dos mortos.
A RAÇA Brasil
sempre reforça nossa
história, com orgulho
FOTO: THIAGO DURAN/ AGNEWS
foto: divulgação
zulu
Zulu Araújo
S
im, foi preciso muita raça, coragem e E o curioso no ineditismo da Revista Raça é que ela
determinação, nesses últimos vinte e não produz nada de excepcional para um país ou
quatro anos, para que a Revista Raça uma sociedade que fosse democrática e respeitasse os
continuasse de pé e se consolidasse valores da igualdade, da diversidade e da civilidade.
no país como o grande veículo de Mas, como estes são bens ainda raros por aqui, é
comunicação da comunidade negra brasileira. Hoje, estranho, para muita gente, tratar com dignidade
sob o comando do jornalista Maurício Pestana, a Raça saberes e fazeres da parcela da população que construiu
situa-se no seleto grupo dos poucos empreendimentos esse país. População esta que, mesmo escravizada e
jornalísticos brasileiros que possuem mais de vinte vilipendiada por séculos, tem dado uma contribuição
anos de vida, além de ser reconhecida por todos/as grandiosa para o processo civilizatório e cultural do
como uma publicação séria e de qualidade. país. E isso, a Raça faz muito bem.
Desde setembro de 1996, quando foi às ruas pela Na quadra que estamos vivendo, onde o retrocesso
primeira vez e alcançando o recorde de 270 mil político, o desprezo pela vida, a intolerância de todas as
exemplares vendidos, a Raça tem sido a única ordens, a violência contra os pretos e pobres e o racismo
referência da comunidade negra brasileira na chamada e fascismo têm sido cantados em prosa e verso, celebrar
grande imprensa. Claro que muita gente tem os vinte e quatro anos da Revista Raça é como dar um
contribuído para que a Raça cumpra com seu objetivo grito de alerta em defesa da liberdade de expressão e dos
maior, que é o de ser espaço aberto e sem preconceitos direitos civis pra toda a sociedade brasileira. Até porque
para que a criatividade, o pensamento e as ideias da a Raça é um exemplo real e factível de que é possível
comunidade negra brasileira possam fluir livremente. sim, fazer da democracia, da diversidade e da defesa da
Mas ainda assim, não tem sido fácil. igualdade um caminho de sucesso.
Apesar de todas as dificuldades, a Raça tem sido um Embora não possa negar que, ao tempo que celebramos
exemplo de engajamento entre veículo e público-alvo. com toda força e alegria esse feito histórico da Revista
Os leitores da Revista, são muito mais do que leitores, Raça, também nos incomoda e nos dá certa tristeza
são companheiros/as de viagem. Acompanham, perceber que continuamos a ser a única publicação
criticam, divulgam e ajudam a revista a estar presente, do gênero no país. Isto é sinal de que, apesar da nossa
com grande força, em estados como São Paulo, Rio luta e da nossa resiliência, o racismo continua forte e
de Janeiro e Bahia. Ter um artigo publicado ou estar presente o suficiente para não reconhecer o legado e a
na capa da Raça é, hoje, muito mais que um desejo presença da comunidade negra como algo importante
de inúmeros articulistas, artistas e anônimos da nossa para o desenvolvimento da democracia no país.
comunidade, é a chancela da credibilidade. Portanto, brindemos, mas com atenção, pois a luta
continua...
Isso porque, apesar de sermos mais de 56% da
população brasileira, tratar da temática afro-brasileira,
por mais incrível que pareça, é algo difícil e delicado
Toca a zabumba que a terra é nossa!
em nosso país. O racismo e o preconceito são
tão arraigados que, 132 anos de pós-abolição da
escravatura, ainda soa estranho para a maioria dos
leitores do país, que os pretos/as também gostem de zulu araújo, Presidente da Fundação Pedro Calmon
ler sobre suas histórias, seus desafios, suas modas, sua (FPC), vinculada da Secretaria de Cultura do Estado da
música, sua cultura, sua arte e, sobretudo, sobre sua Bahia, graduado em Arquitetura e Urbanismo e Mestrando
luta pela igualdade de direitos. em Cultura e Desenvolvimento pela UFBA
era meu caminho” não chegou a seguir na área e decidiu seguir carreira
diplomática. Éramos pouquíssimos na Cásper. Já na
representar algo para essas crianças, e espero que seja algo bom, mas
sempre também ter cautela para não pirar.
Pret a Br a s il e ir a ?
por LÉIA ABADIA | fotos SUELEN LIMA
Francisco Alves
C
ontemplo por alguns minutos a capa da uma territorialidade poética em que cada frase incita a
primeira edição da Revista Raça. Uma valorização e o conhecimento da cultura preta. Observo
trama revolve meu interior. Misto de a capa como um espelho que demarca dobraduras de
alegria em fios de miçangas da memória. liberdade e reinscrição de novas formas de pensar minha
Exu caminha pelos meus dedos ansiosos. negritude no passado, como adolescente e no meu
Ogum, meu orixá de cabeça, aponta a direção. Então sigo presente, sendo homem adulto.
em Escrevivência, deslumbrado pelos sorrisos vigorosos
A edição trouxe como pautas a maquiagem, a música do
da imagem. Busco erguer uma arqueologia íntima sobre
Pelourinho, a moda e os cortes de cabelo. Nada é por acaso
a importância da revista para a compreensão do meu
na composição de um quadro. Tudo na capa está disponível
mundo de homem preto. Eu tinha 11 anos em 1996, ano
para signos que se retroalimentam num ritual de conexões
de surgimento da Raça. E hoje, aos 34, depois de uma
ideológicas e políticas.
longa caminhada rumo a um processo de pertencimento e
amor próprio, uma potente reflexão irradia meu ser: graças A primeira edição da Raça é um movimento de intensa
a esta publicação pioneira no país, consegui apreender celebração e que decerto foi responsável pelo florescer de
visualidades estéticas que operacionalizaram a criação de muitas identidades pretas no país. O aniversário de 24 de anos
uma mística afrocentrada em minha vida. de existência da revista evoca um movimento de afirmação,
libertação e consciência das pluralidades culturais que nos
A frase em vermelho: “Essa é pra mim!” denota um
formam, enquanto homens e mulheres pretos, dotados de
ornamento contemplativo. Um chamamento para todos os
riquezas simbólicas e inteligências múltiplas. Para muitos a
pretos brasileiros excluídos dos processos de representação
revista foi e é parte fulcral na aprendizagem de ser gente e
simbólica a construir a ideia de nação. A capa é um quadro
amar a ancestralidade.
com moldura ancestral. A capa é a pintura de um sonho
tecido na realidade. A Revista Raça é um aquilombamento, “Somos bonitos, fortes e poderosos”, frase de Carlinhos
e em seus 24 anos de existência tem contribuído fortemente Brown, arremata minhas lembranças diante da observação
na luta por igualdade racial em suas dimensões várias. da primeira publicação impressa devotada a mostrar
pretos e pretas em suas potencialidades artísticas,
O sorriso iluminado da atriz Isabel Fillardis problematiza
comerciais, empreendedoras, afetivas, donos de suas
minhas memórias sobre a representação imagética das
plenitudes. Que os quilombos do coração do mundo
mulheres negras. Na escola, temos contato com nossa
comemorem a longevidade da Revista Raça, e que todos
história através de narrativas visuais que em sua maioria
nós dancemos ao som do Afoxé em plena celebração pela
endossam a violência e o controle dos corpos. Isso é
existência deste veículo impresso, que desde sua primeira
evidente nos livros de história do Brasil, recheados com
edição é pura Resistência.
imagens do pintor francês Jean Baptiste Debret, que na
função de artista oficial do império, retratou o cotidiano
dos escravizados. Não existe o traço do sorriso, uma vez
que a construção de mundo para os negros se dava pela
servidão e açoite. Nossa aprendizagem do estético e do
imagético afro-brasileiro é construído, principalmente
nos anos escolares, através de uma sucessão pictórica
assentada, em sua maioria, no espectro da escravidão.
FRANCISCO ALVES
Deleito-me em fazer uma leitura poética da capa da é Doutor em Literatura
primeira edição da Revista Raça. Esse conjunto de Professor de História
signos, juntos no mesmo rizoma racial, funciona com da Arte (UFRR)
Sah Oliveira, uma das influencers que esteve na capa da edição 209
FICHA TÉCNICA
MODELOS: AGÊNCIA
DE MODELOS MAX FAMA
FOTÓGRAFO:
VINÍCIUS HAWK
HAIR: SALÃO PRETA
BRASILEIRA – HAIR STYLE:
LÉIA ABADIA, BRUNA
VANESSA BEAUTY E
EDUARDO SOARES.
MAQUIAGEM:
s
ISABELLE FREITAS
o
PRODUÇÃO EXECUTIVA:
PAULO HENRIQUE
d
ALBUQUERQUE
a
DIREÇÃO DE ARTE:
te
WESLEY ALISSON
n
COORDENAÇÃO GERAL :
Pe
FELIPE MONTEIRO
PARA ARRASAR
NO SEU DIA A DIA
O que é
ModAtivismo
por CAROL BARRETO | assistente DAVID SANTOS
FOTO: DIVULGAÇÃO
EDNEI
WILLIAM
MORAIS
MELO DOS
SANTOS
Ator, modelo e poeta.
É assim que esse
baiano de 17 anos se
destaca por onde passa,
inclusive pelos projetos
FOTO: RODRIGO CASTRO
LINDIWE
MAKINI
Não bastasse esse
nome forte e potente,
Lindiwe carrega
consigo o orgulho da
ancestralidade. Natural
de Aracaju, ela tem
20 anos e faz questão
de enfatizar que é “
mulher, jovem, preta
e candomblecista”.
Estudante de Serviço
Social, ela faz parte
do grupo Abaô de
Capoeira Angola. Axé!
MAIARA VICENTE
Ela acaba de se formar em Direito! Natural
de Criciúma, em Santa Catarina, a advogada
de 28 anos pretende alçar voos altos e já
está focada na Pós-Graduação em Direito
e Processos Previdenciários na Faculdade
Damásio. Seu apaixonado namorado,
Ricardo Anacleto, é só orgulho!
“É importante ressaltar que em um país
onde os pretos são maioria, deveríamos
ocupar os melhores cargos, as melhores
posições na sociedade e nos governos.”
Celebrar os 24 anos
da revista Raça é
possíveis
celebrar a imprensa
negra brasileira e
todas as pessoas
que criaram e a
mantêm viva.
Tadeu Kaçula
a revista
dos negros brasileiros
A
lguns fatos históricos que estruturaram parte A edição do mês de novembro trouxe uma narrativa potente
da população brasileira através da criação de na manchete “A nova onda é ser black”, causando um
uma imprensa negra que impactou, de forma impacto extraordinário na autoestima da população negra às
positiva e organizada, nas relações sociais e vésperas dos 110 anos da abolição.
políticas e, sobretudo, culturais da população
Ao longo dos anos a Revista Raça Brasil ganhou destaque
negra em alguns estados do Brasil, formam um importante
nacional e internacional, firmando-se como uma das
marco histórico e civilizatório para discutir a identidade
principais revistas do país, além de cumprir um papel
étnica da população negra brasileira.
estratégico dirigido a um público que não consumia revistas
Compreender essas complexidades históricas nas relações no mercado editorial.
raciais deste tempo e espaço nos impulsiona a visitar
Durante duas décadas, estampou em suas capas
dos períodos em que a produção científica teve papel
personalidades conhecidas ou não, que não tinham espaço
fundamental na desconstrução da figura da pessoa negra
em outras revistas. O público criou uma identificação com os
como sujeito passivo de inclusão na estrutura social.
temas e conteúdos e a revista cresceu cumprindo importante
No início do século XIX, o Rio de Janeiro respondia pela papel na formação e na ressignificação da identidade social e
maior população negra livre das Américas. O primeiro cultural da população negra, com destaque especial para as
periódico negro, “O Mulato”, de 1833, nasceu focado no meninas que se enxergam nas modelos e atrizes negras que
reconhecimento da cidadania da população afro-brasileira embelezam as páginas da revista.
em tempos de escravização. As experiências de liberdade
Em 2018, o jornalista e publicitário Maurício Pestana, depois
foram impactantes para outros países que passavam pelo
de ter passado pela direção executiva em 2007, retorna à
mesmo processo.
direção como CEO da Revista Raça, que passa a ser editada
Em São Paulo, o “A Pátria” era publicado por um grupo pela Editora Pestana Arte & Publicações, onde a jornalista
de pensadores que acreditavam na abolição e apostaram Flavia Cirino é a editora-chefe.
na República como resolução do que era proposto pelos
Com uma respeitada trajetória de sucesso, a Revista Raça
abolicionistas. Eles davam visibilidade aos processos
está comemorando seu 24º aniversário em alto nível e
que a história apagou, como o Clube Republicando dos
ocupando todas as plataformas de comunicação, mantendo
Homens de Cor.
a sua tradição de evidenciar a nossa negritude e valorizar a
Entre 1924 e 1945, os jornais passaram a ser mais críticos sua essência, desde a primeira edição publicada em setembro
e defendiam a raça negra. Na década de 1930, foi criada de 1996 até sua última edição publicada em julho de 2020
uma das mais importantes entidades negras do país com onde, certamente, fazendo um paralelo com a fundação da
uma proposta que visava à união, organização, formação e imprensa negra, podemos afirmar que foi criado mais um
inserção da população negra na sociedade: a Frente Negra importante marco histórico e civilizatório que contribui
Brasileira. Através do seu jornal, “A voz da Raça”, apresentou positivamente para elevar a autoestima da população negra
propostas político-sociais. É fundamental compreendermos o em todo o país.
papel político e simbólico que essa mídia cumpriu para elevar
a autoestima da população negra daquele período.
Dando um salto histórico no tempo, revisitamos outra Tadeu Augusto Matheus (Tadeu Kaçula). Sociólogo;
experiência que marcou e marca até hoje importantes Mestrando em Mudança Social e Participação Política pela
referenciais étnicos para a população negra no Brasil. Em USP; membro do grupo de estudos sobre América Latina
setembro 1996 foi lançada a Revista Raça Brasil – a revista (CELACC-USP), coordenador nacional da Nova Frente Negra
dos negros brasileiros. A primeira edição da destacava a Brasileira; fundador do Instituto Cultural Samba Autêntico e
chamada “Essa é pra mim”. autor do livro Casa Verde, uma pequena África paulistana.
MULTIMÍDIA
Jornalista, escritor, roteirista e mestrando em comunicação e cultura pela eco/
PÓs/UFrJ. carioca de 44 anos, evandro Luiz da conceição tem participado de
diversas oficinas de formação com importantes nomes da Literatura Periférica.
Participou de duas edições do Laboratório de Narrativas Negras para o audiovisual,
iniciativa da FLUP em parceria com a Fundação Ford e tv Globo, e integrou a
primeira turma de formação de roteiristas negros ministrada pela emissora.
Um de seus principais contos, “Ninguém regula a américa”, resultado do processo
formativo Flup Pensa de 2019, está presente na coletânea “contos para depois
do ódio”, inspirado nas músicas de marcelo Yuka. atualmente., é consultor de
coneúdo da tv Globo.
menina
preta
Enquanto o álbum
“Terra” não é lançado,
o cantor e compositor
Gabriel Peri coloca mais
um single e videoclipe
no mercado. “Menina
Preta” , de sua autoria,
está disponível nas
plataformas digitais.
Trata-se de uma
canção de amor curta
e direta, com arranjos
propositalmente
dissonantes e obscuros.
“É uma letra de poucas
palavras sobre pensar
em alguém, sobre a
sorte que a gente tem
ao se abrir para outro” ,
comenta Gabriel.
“A sorte que invade
o apartamento/ é
você comendo meu
pensamento”, é um
dos versos da música,
que traz a participação
especial da cantora
Nina Oliveira.
“Gosto muito da
maneira inventiva e
potente dela cantar.
Fiquei muito feliz em
fazer esse dueto”,
completa. Gabriel
e Nina gravaram o
clipe cada um na
sua casa, por conta
das orientações de
distanciamento social.
C
omentarista de questões raciais da
CNN Brasil, jornalista Maurício
Pestana, CEO da RAÇA Brasil, já
havia sentenciado: Kamala Harris
seria a candidata de Joe Binden em
sua chapa, como vice-presidente dos
#ElaDecide
Vem com a gente:
Sandro Aloisio
Se importando com
as vidas pretas desde 1996
R
evista Raça 24 anos. Uma revista que brasileira, que ainda é oprimida por uma estrutura
fez e continua fazendo história num de estado racista que não enxerga, não ouve e não se
país que insiste em negar suas origens. importa com essas vidas. E menospreza sua força.
Muito possivelmente, se voltássemos
Esses 24 anos são de reflexão. De tentar compreender
ao ano de 1996 e entrevistássemos
o que aconteceu em quase duas décadas e meia desde
Aroldo Macedo, seu primeiro editor, e pedíssemos
a edição número 1. Quais os motivos para que os
um exercício de futurologia no qual ele descrevesse
avanços em políticas de estado e de ações afirmativas,
o panorama da vida dos pretos do Brasil em 2020, é
objetivando a valorização de uma identidade e de uma
pouco provável que, por mais pessimista que fosse seu
cultura que é nossa, brasileira, tenham se mostrado
relato, chegaria próximo ao que vemos e vivemos.
tão frágeis ao não suportar os primeiros anos de
Esses 24 anos são de celebração, afinal, são poucos governos declaradamente contrários a manter ou
os títulos que se mantêm em circulação por tanto estimular esses avanços, chegando mesmo a desmontar
tempo numa sociedade desestimulada ao hábito da ou fragilizar todas as conquistas? Resposta a ser
leitura. Ainda mais um título que ousa abordar temas buscada a cada edição.
até pouco tempo muito distantes da grande mídia.
O que é certo é que, entre erros e acertos, a Revista
É preciso um “caso Floyd” para que a questão do
Raça se mantém na trincheira. Resiste e se renova
racismo entre na pauta do dia... todos os dias. Até
sem jamais se omitir. Com a maturidade dos 24 anos,
virar rodapé.
outras ambições se apresentam. Não se assuste se a
Na Revista Raça, não. Desde suas primeiras edições capacidade de realização do Pestana, nos brindar, em
na Símbolo, passando pela Escala e chegando às mãos breve, com um canal de TV e outros meios que façam
de Maurício Pestana, a vida preta sempre importou. a conexão e promovam a união entre os leitores de
Nem sempre, nesses 24 anos, o tema foi tratado Raça. Sem, no entanto, que isso signifique abrir mão
como deveria, é preciso admitir. Houve um período de seu formato tradicional e necessário. Sim, porque
de glamourização, do black is beautiful. Os ‘modelos mesmo com o avanço das mídias digitais, a Raça
de sucesso’ entre os pretos ganharam destaque. Em ainda faz questão de se manter com a versão impressa,
outros, o ativismo político e cultural protagonizou. pois tem a consciência de seu valor de documento
O olhar para o que acontecia na periferia foi afinado. histórico. ‘Indeletável’.
Chegamos mais próximos da realidade? Sim, de parte
Salve a Raça. Salve o povo preto do Brasil.
dela apenas, pois as vidas pretas acontecem de forma
mais abrangente, mais ampla e diversa, em todos os
cantos das cidades brasileiras, em todas as camadas da
sociedade.
Portanto, o desafio da Revista Raça está posto: buscar
o equilíbrio no olhar para essas realidades todas Sandro Aloisio é jornalista e membro do Conselho
e retratar essa diversa e rica maioria da sociedade Editorial da Revista Raça
http://www.lacan.com.br/ www.revistaraca.com.br
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@lacancosmeticos Ano XXII – Edição 217
Café da Etiópia - Importador por: DemiLion Importadora e Exportadora Ltda. | EDITORA-CHEFE: Flavia Cirino
DIRETOR DE ARTE: Paulo Alexandre
empresa da DaMinhaCor – contato@daminhacor.com.br MÍDIAS SOCIAIS: Hamalli Alcântara
REVISÃO: Afonso Leite
COLABORADORES: Augusto Baptista, Dione
Rio, Emanuele Sanuto, Fernanda Alcântara,
Fernando Ferraz e Márcio Telles
PARA ANUNCIAR
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SUGESTÃO DE PAUTA
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IMPRESSÃO
Grafilar - Tiragem 20.000
Nota da redação: Algumas imagens desta edição,
foram pesquisadas na internet. Não encontramos as
fontes, que poderão ser creditadas na próxima edição.
* NA EDIÇÃO 216, EDITORIAL MAX FAMA, FOTO 10: PAI VESTE: BLUSA: FILA; TÊNIS: ASICS;
LOJA RAÇA
BERMUDA: JAB, MÃE VESTE: CALÇA: ASICS; CAMISETA: LEVIS; TÊNIS: CONVERSE; BRINCO: ACERVO
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E CRIANÇA VESTE: VESTIDO: DIMY CANDY; SANDÁLIA: MOLEQUINHA. no site: www.revistaraca.com.br
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