Soberania: A Legitimidade Do Poder Estatal e Os Novos Rumos Democráticos
Soberania: A Legitimidade Do Poder Estatal e Os Novos Rumos Democráticos
Soberania: A Legitimidade Do Poder Estatal e Os Novos Rumos Democráticos
Daniella S. Dias
Sumário
1. Introdução. 2. A soberania e a legitimidade
do poder do Estado. 3. A soberania estatal e os
novos rumos democráticos. 4. Considerações
finais.
1. Introdução
O presente trabalho tem por objetivo
refletir sobre o poder político e a legitimi-
dade do poder do Estado e está dividido
em dois momentos.
Ao tratar da soberania e da análise so-
bre a legitimidade do exercício do poder
político pelo poder estatal, na atualidade,
objetivou-se considerar que o cumprimento
das normas e dos valores expostos no siste-
ma jurídico não são suficientes para satisfa-
zer as necessidades e interesses sociais. A
legitimidade do exercício do poder político
depende da análise de um componente da
realidade política muito mais complexo:
o exercício da soberania tendo em vista o
cumprimento das funções estatais deve ser
visualizado perante outros atores políticos
não estatais.
A questão democrática é eixo temático
do segundo item do artigo e tem direta
relação com os desafios para o exercício
da soberania estatal, em âmbitos interno
Daniella S. Dias é Doutora em Direito Pú- e externo, justamente porque o regime
blico – UFPE. Professora da Graduação e Pós- democrático demanda novas formas de
-graduação UFPA. Professora da Pós-graduação atuação estatal, novos parâmetros para que
UNAMA. Promotora de Justiça as instituições democráticas consolidem o
Brasília a. 48 n. 192 out./dez. 2011 55
processo democrático nas fronteiras e além dade, seu poder político, se este não estiver
das fronteiras nacionais. relacionado com a existência de leis, com
a existência de instituições que reflitam as
2. A soberania e a legitimidade convicções, as crenças, as deliberações e os
consensos produzidos entre a sociedade e
do poder do Estado
a autoridade.
Águila (2005, p. 23), ao tratar do poder, Dallari (2006, p. 110-111), com base nos
afirma que este não é um objeto, que se pos- estudos da teoria de Burdeau, afirma que o
sui ou que não se possui. O poder é produto Estado é um poder, e o poder é a expressão
de uma relação em que alguns obedecem do próprio Estado. E salienta: “Para a maior
e outros mandam. Está relacionado com a parte dos autores o poder é um elemento
força, com a violência, mas não se restringe essencial ou uma nota característica do
a esta. O poder também está relacionado Estado. Sendo o Estado uma sociedade,
com a existência de valores que propiciam não pode existir sem um poder, tendo este
à autoridade a legitimidade para mandar e na sociedade estatal certas peculiaridades
o assentimento para ser obedecida. que o qualificam, das quais a mais impor-
Segundo Águila, apesar do medo ao tante é a soberania”. Para Miranda (2005,
castigo ser componente fundamental do p. 218), “o poder é a qualidade ou atributo
poder, a existência de um poder estável do Estado. Condição de existência do Es-
deve contar não somente com a violência, tado, ele aparece simultaneamente como
mas com a existência de conjunto de crenças a mais marcante das suas manifestações
e valores que possam justificar a existência e encontra-se-lhe ligado por um nexo de
do poder e também o seu funcionamento. pertença”.
O poder político, para ser estável, necessita É no Estado Moderno, caracterizado
de que as autoridades estejam legitimadas como o Estado que governa por meio de
para exigir a obediência. Por isso, afirma leis, em seu território, que a justificação e
Águila (2005, p. 26), “el poder está intima- a legitimação do poder surge como tema
mente ligado a los valores y las creencias. preponderante para a Teoria do Estado. O
Este vínculo es el que permite establecer poder do Estado é um poder jurídico, um
relaciones de poder duraderas y estables poder originário, embasado na expressão
en las que el recurso constante a la fuerza do contrato social em que os governados
se hace innecesario”. cedem aos governantes o poder para con-
Para Águila (2005, p. 26), quando o po- duzir os interesses comuns da nação. Trata-
der é exercido de maneira rotineira, tendo -se de poder originário que o Estado possui.
em vista que a obediência está relacionada Miranda (2005, p. 214) considera que o
com crenças e valores que apoiam o sistema poder político é “um poder constituinte” na
político, o poder passa a ser um poder insti- medida em que molda o Estado consoante
tucionalizado, um poder permanente entre uma ideia, um projeto, uma finalidade. Esse
governantes e governados. Aí se caracteriza poder, segundo o autor, não se extingue
a existência da autoridade. A autoridade com a criação da constituição. Trata-se
nada mais é do que a expressão do poder de um poder que perdura, que se renova,
político legitimado no momento em que que se transforma durante a vigência da
as relações sociais entre governantes e constituição, podendo inclusive substituí-la
governados se estabilizam, e a obediência em razão da realidade política, econômica
se obtém sem necessariamente recorrer-se e social.
à força, à violência. O poder do Estado nada mais expressa
Argumenta Águila (2005, p. 32) que do que a necessidade da consecução de
nenhum homem pode manter a sua autori- interesses como segurança, justiça, paz,