Bio Digest Ão
Bio Digest Ão
Bio Digest Ão
Diamantina
2019
Daniela Cristina Souza Oliveira
Diamantina
2019
DANIELA CRISTINA SOUZA OLIVEIRA
DIAMANTINA
Aos meus pais, Silvio e Maria do Socorro,
pelo exemplo de vida e incentivo nos momentos difíceis,
por tantas vezes que deixaram de realizar os vossos sonhos para realizar os meus,
pelo apoio e confiança depositada em mim.
Dedico.
AGRADECIMENTOS
A Deus, princípio de tudo, por ter me iluminado e guiado nos momentos difíceis e
pelo dom da vida.
Aos meus pais, Silvio e Maria do Socorro, por mostrarem sempre o caminho da
verdade, e pelo amor incondicional a mim dedicado com tamanho carinho. Ao meu irmão
Cristiano, pelo apoio e estímulo. Aos demais familiares, vô Ozorio, vó Mariinha, Tios, Tias e
primos pelo estímulo e companheirismo.
À Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri -UFVJM, à
Coordenação e equipe de professores do Programa de Pós-Graduação em Biocombustíveis –
Campus Diamantina, pela oportunidade, convívio e ensinamentos que me ajudaram a ser uma
profissional melhor.
Ao professor Dr. Marcus Henrique Canuto (Marquinhos), que dispensa
comentários, uma pessoa maravilhosa com quem tive o imenso prazer de trabalhar durante 8
anos da minha estadia na UFVJM, um dos maiores exemplos de profissionalismo, além de uma
capacidade incrível de passar adiante o conhecimento, o meu eterno agradecimento pela
excelente orientação, amizade, incentivo, paciência, por ter acreditado em mim e no meu
trabalho e, principalmente, pelo aprendizado que me proporcionou.
Ao Professor Dr. David Lee Nelson, pela orientação, paciência e disponibilidade.
À professora Dra. Arlete dos Reis Barbosa, pela orientação, confiança e pelas
inúmeras ajudas nos momentos difíceis. Agradeço também pela acolhida no Laboratório de
Processos Biológicos e Tecnologia Ambiental.
À professora Dra. Nísia Andrade Vilella Dessimoni Pinto pelos ensinamentos,
disponibilidade e acolhimento no Laboratório de Biomassa e Tecnologia do Cerrado.
Aos professores e técnicos do laboratório de pesquisa da UFVJM, por toda a ajuda
na realização deste trabalho. E aos amigos e alunos de Iniciação Cientifica: José Adão, Gustavo,
Ludimilla pela amizade e contribuição nessa pesquisa.
Ao meu companheiro Júnior, pela amizade, paciência e todo amor dedicado.
Aos meus amigos Luciana, Marclenio, Maria e Jack, que ouviram muitas vezes
minhas reclamações, obrigada pela amizade, paciência e as risadas proporcionadas nos
momentos difíceis.
A todos que contribuíram, direta ou indiretamente, para a realização deste trabalho,
a minha eterna gratidão.
Não pretendemos que as coisas mudem, se sempre fazemos o mesmo.
A crise é a melhor benção que pode ocorrer com as pessoas e países,
porque a crise traz progressos. A criatividade nasce da angústia, como
o dia nasce da noite escura. É na crise que nascem as invenções, os
descobrimentos e as grandes estratégias (EINSTEIN, Albert).
RESUMO
A fabricação artesanal da cachaça é uma importante fonte de renda para pequenos e médios
produtores agrícolas do estado de Minas Gerais. Na produção da bebida, um dos principais
subprodutos gerados é a vinhaça, rica em matéria orgânica e com significativo teor de enxofre.
Consequentemente, apresenta alto potencial poluidor. Para cada litro de cachaça produzido são
gerados, em média, 10 a 14 litros de vinhaça. A biodigestão anaeróbia apresenta grande
potencial de aplicação no tratamento da vinhaça, pois ocorre a redução de sua carga orgânica
poluente concomitantemente à recuperação de bioenergia a partir do biogás. O presente estudo
teve como objetivo avaliar as potencialidades da aplicação da biodigestão anaeróbia para o
tratamento da vinhaça provinda da fabricação de cachaça artesanal, bem como o
desenvolvimento de um biodigestor para implantação em propriedades rurais produtoras da
bebida. Para testar o desempenho do processo, realizou-se oito ensaios de biodigestão da
vinhaça em escala de bancada utilizando reatores de 250 mL, variando a quantidade de inóculo,
temperatura e diluição da vinhaça. Em seguida, o processo foi otimizado em um biorreator de
bancada anaeróbio com capacidade de 7,5 litros, e com um sistema de monitoramento e controle
do pH, dióxido de carbono, temperatura e pressão. A vinhaça in natura foi caracterizada quanto
a umidade, matéria seca, cinzas sólidos suspensos voláteis e totais, pH, DQO, proteínas,
lipídeos e nitrogênio total. O efluente da biodigestão foi caracterizado quanto a DQO e pH. A
composição do biogás gerado foi determinada através da quantificação de dióxido de carbônico,
metano, amônia e ácido sulfídrico. O processo de biodigestão da vinhaça para a produção de
biogás se mostrou eficiente no tratamento desse resíduo. O volume de biogás gerado e
acumulado, nos ensaios de bancada, durante o período de 25 dias variaram entre 2,08 mL e
347,90 mL. Quanto à remoção de carga orgânica, os ensaios mostraram-se uma boa alternativa
para o tratamento da vinhaça, visto que a eficiente redução de DQO na vinhaça biodigerida foi
em torno de 74%, fato que evidencia a transformação de matéria orgânica em biogás. A
principal contribuição desse experimento consistiu na disponibilização de novos métodos de
obtenção de energia a partir de uma matriz já disponível aos pequenos e médios produtores de
cachaça artesanal.
The artisanal production of cachaça is an important source of income for small and medium-
sized agricultural producers in the state of Minas Gerais. In the production of the beverage, one
of the main by-products generated is vinasse, rich in organic matter and with significant sulfur
content. Consequently, it presents high polluting potential. For each liter of cachaça produced,
an average of 10 to 14 liters of vinasse is generated. Anaerobic biodigestion presents great
potential for application in the treatment of vinasse, because the reduction of its organic
pollutant load occurs concomitantly with the recovery of bioenergy from the biogas. The
present study aimed to evaluate the potential of the application of anaerobic biodigestion for
the treatment of vinasse from the manufacture of artisanal cachaça, as well as the development
of a biodigester for implantation in rural properties that produce the beverage. To test the
performance of the process, eight batch-scale biodigestion tests were carried out using a 250
mL reactor, varying the amount of inoculum, temperature and dilution of the vinasse. The
process was optimized in a 7.5-liter anaerobic bench bioreactor with a monitoring and control
system for pH, carbon dioxide temperature and pressure. The crude vinasse was characterized
with respect to the moisture, dry matter, suspended volatile substances, total suspended ash,
pH, COD, proteins, lipids and total nitrogen contents. The biodigestion effluent was
characterized as COD and pH. The composition of the biogas generated was determined by the
quantification of carbon dioxide, methane, ammonia and hydrogen sulfide. The biodigestion
process of the vinasse for biogas production was efficient in the treatment of this residue. The
volume of biogas generated and accumulated in laboratory tests over a 25-day period ranging
from 2.08 mL to 347.90 mL. Regarding the removal of the organic load, the tests proved to be
a good alternative for the treatment of vinasse because the reduction of COD in biodigested
vinasse was around 74%, a fact that demonstrates the transformation of organic matter into
biogas. The main contribution of this experiment consisted in the availability of new methods
of obtaining energy from a matrix already available to small and medium producers of artisanal
cachaça.
LISTA DE GRÁFICOS
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 23
2 OBJETIVOS .............................................................................................................................. 25
2.1 Objetivos específicos ......................................................................................................... 25
3 JUSTIFICATIVA ...................................................................................................................... 27
4 REFERENCIAL TEÓRICO ...................................................................................................... 29
4.1 Definição de Cachaça ......................................................................................................... 29
4.2 Importância da Produção de Cachaça Artesanal ................................................................ 30
4.3 Vinhaça: composição, produção e uso no Brasil................................................................ 31
4.4 Biodigestão Anaeróbica ..................................................................................................... 33
4.4.1 Etapas do processo de digestão anaeróbica ................................................................... 33
4.4.2 Fatores que interferem na biodigestão anaeróbica ........................................................ 36
4.5 Uso da biodigestão anaeróbica para tratamento da vinhaça ............................................... 39
4.6 Digestores........................................................................................................................... 40
4.7 Uso de biodigestores em propriedades rurais..................................................................... 41
4.8 Biogás................................................................................................................................. 42
4.9 Análises físico-químicas .................................................................................................... 43
4.10 Análise Quimiométrica – Análise dos Componentes Principais ........................................ 43
5 METODOLOGIA...................................................................................................................... 45
5.1 Características gerais .......................................................................................................... 45
5.2 Local do experimento ......................................................................................................... 46
5.3 Substrato............................................................................................................................. 46
5.4 Caracterização da vinhaça bruta e do subproduto da biodigestão ...................................... 46
5.4.1 pH .................................................................................................................................. 47
5.4.2 Densidade ...................................................................................................................... 48
5.4.3 Sólidos Solúveis Totais – SST ...................................................................................... 48
5.4.4 Umidade e Matéria Seca ............................................................................................... 48
5.4.5 Sólidos Fixos Totais (Cinzas) - SFT ............................................................................. 49
5.4.6 Sólidos Voláteis Totais - SVT ...................................................................................... 49
5.4.7 Açúcares Redutores -AR ............................................................................................... 49
5.4.8 Acidez Total Titulável - ATT ....................................................................................... 50
5.4.9 Lipídeos ......................................................................................................................... 51
5.4.10 Nitrogênio total e Proteínas........................................................................................... 51
5.4.11 Demanda Química de Oxigênio – DQO ....................................................................... 52
5.5 Crescimento microbiano na vinhaça bruta ......................................................................... 53
5.6 Inóculo ............................................................................................................................... 54
5.7 Pré-testes da biodigestão de vinhaça .................................................................................. 54
5.8 Delineamento experimental ............................................................................................... 55
5.9 Ensaios da Biodigestão em escala laboratorial .................................................................. 56
5.10 Ensaios da biodigestão em um biorreator automatizado .................................................... 57
5.11 Desenvolvimento e construção de um biodigestor industrial ............................................ 59
5.12 Análises da composição do Biogás .................................................................................... 60
5.12.1 Determinação de Gás Carbônico e Gás Metano ........................................................... 61
5.12.2 Determinação de Amônia ............................................................................................. 61
5.12.3 Determinação de Ácido Sulfídrico................................................................................ 62
5.13 Análise estatística............................................................................................................... 62
5.13.1 Análise de componentes principais ............................................................................... 63
5.13.2 Otimização .................................................................................................................... 63
6 RESULTADOS E DISCUSSÃO .............................................................................................. 65
6.1 Caracterização da vinhaça .................................................................................................. 65
6.1.1 Umidade e matéria seca ................................................................................................ 66
6.1.2 Cinzas e Matéria Orgânica ............................................................................................ 66
6.1.3 pH.................................................................................................................................. 67
6.1.4 Densidade Relativa ....................................................................................................... 67
6.1.5 Sólidos totais, Fixos e Voláteis ..................................................................................... 67
6.1.6 Açúcares Redutores Totais e Sólidos Solúveis Totais .................................................. 68
6.1.7 Proteínas e Lipídios....................................................................................................... 68
6.1.8 DQO .............................................................................................................................. 69
6.2 Pré-testes da biodigestão de vinhaça .................................................................................. 69
6.3 I Estágio: Ensaios da Biodigestão em escala laboratorial .................................................. 71
6.4 Otimização da produção de biogás .................................................................................... 81
6.5 II Estágio: Ensaios da Biodigestão no biorreator anaeróbico ............................................ 83
6.6 Análises Quimiométricas ................................................................................................... 86
6.7 III Estágio: Construção do biodigestor .............................................................................. 88
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................... 89
8 PERSPECTIVAS FUTURAS ................................................................................................... 91
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................... 93
ANEXO I...................................................................................................................................... 105
23
1 INTRODUÇÃO
2 OBJETIVOS
.
27
3 JUSTIFICATIVA
4 REFERENCIAL TEÓRICO
“Aguardente de Cana é a bebida com graduação alcoólica de 38% vol. (trinta e oito
por cento em volume) a 54% vol. (cinquenta e quatro por cento em volume) a 20 ºC (vinte graus
Celsius), obtida do destilado alcoólico simples de cana-de-açúcar ou pela destilação do mosto
fermentado do caldo de cana-de-açúcar, podendo ser adicionada de açúcares até 6 g L-1 (seis
gramas por litro), expressos em sacarose” (BRASIL. MINISTERIO DA AGRICULTURA,
2005).
A cachaça, uma típica bebida brasileira, surgiu nos engenhos do Brasil Colônia em
meados do século XVI. Esse destilado tem apresentado crescimento no consumo tanto no
mercado internacional como no nacional. Segundo a ABRABE (2015), a bebida ocupa a
terceira posição no ranking mundial (mercado de destilados) e é o segundo maior mercado de
bebidas alcoólicas no Brasil, atrás apenas da cerveja.
A capacidade instalada de produção de cachaça no Brasil é de, aproximadamente,
1,4 bilhão de litros por ano; todavia apenas 1% da produção é exportada. São 40 mil produtores
(quatro mil marcas), sendo que 98% correspondem a pequenas e microempresas, mas 70% da
produção consiste de cachaça de coluna ou industrial e 30% de cachaça de alambique. O setor
movimenta anualmente em sua cadeia produtiva 7 bilhões de reais, sendo responsável pela
geração de 600 mil empregos diretos e indiretos (PAULO et al., 2016).
Mesmo sendo a padronização uma característica positiva da cachaça industrial em
relação à artesanal, requisito básico para uma bebida de exportação, a cachaça artesanal
conquista os consumidores do mercado internacional por seu aroma mais complexo e
rebuscado, alcançando maior valor agregado. Segundo a Federação Nacional das Associações
de Produtores de cachaça de Alambique FENACA, enquanto a cachaça industrial é vendida a
US$ 0,60/litro, a artesanal tem preço de US$ 3,50/litro, significando uma agregação de valor
próxima de 480% (TAVARES, 2010; VERDI, 2006).
Atualmente, no Brasil, o estado de São Paulo é o maior produtor de cachaça
industrial, enquanto em Minas Gerais prevalece como o maior de cachaça artesanal, com mais
de 8500 alambiques e 200 milhões de litros por ano. Existem diversos problemas relacionados
à produção da cachaça, sendo a vinhaça o principal resíduo deste processo. É gerada uma
quantidade de 2,6 milhões de litros de vinhaça por ano, sem contar os cerca de 300 bilhões de
litros gerados pela fabricação de álcool no país. Com isso, a vinhaça tida como rejeito ou
subproduto do processo de fabricação da cachaça tem gerado problemas quanto ao seu destino.
Nesse contexto, a aplicação de novas tecnologias de gestão no processo de fabricação de
31
cachaça pode proporcionar um sistema produtivo bastante sustentável e com alto rendimento
na geração de energia e administração dos resíduos (como o vinhaça) durante a produção
(NIGRI et al., 2011).
Em relação às exportações, no ano de 2018, a Cachaça foi exportada para 77 países,
com mais de 50 empresas exportadoras, gerando receita de US$ 15,61 milhões (8,41 milhões
de litros). Esses números representam um decréscimo de 1,24% em valor e de 3,80% em
volume, em comparação a 2017. Em 2018, os principais países de destino em valor foram:
Estados Unidos, Alemanha, Paraguai, Portugal e Itália (IBRAC, 2019).
O mercado mundial e também o brasileiro com melhor poder aquisitivo estão ávidos
por produtos denominados “naturais”. O produto artesanal tem maior apelo comercial,
permitindo ao micro, pequeno e médio produtor a chance de atingir um público consumidor de
aguardente mais refinado e exigente, que se distingue da parcela de consumidores tradicionais
de cachaças industrializadas, por consumirem o produto sem misturas, reverenciando a
importância de seu gosto, sendo imprescindível para isso que ele apresente qualidade
(AZEVEDO et al., 2003).
A vinhaça pode ser definida como o resíduo final obtido durante a produção de
etanol por fermentação de cana-de-açúcar (BARROS et al., 2015). Este resíduo das indústrias
sucroalcooleira é caracterizado por ser uma suspensão ácida, ter altos valores de DQO, odores
desagradáveis e coloração marrom escuro (CHRISTOFOLETTI et al., 2013; ESPANA-
GAMBOA et al., 2011). Além disso, a vinhaça possui uma alta carga poluidora, baixo pH e é
composta por 94-97% de água e nutrientes como potássio, nitrogênio, fósforo, cálcio, magnésio
(PINTO, M. P. M. et al., 2018).
A vinhaça, também denominada de vinhaça e restilo, compreende o principal
resíduo do processo produtivo do etanol, gerado especificamente na etapa de destilação a uma
taxa média de 13 L por litro de etanol produzido (NOGUEIRA et al., 2008). Segundo dados de
produção nacional de etanol (UNICA, 2013), pode calcular-se a produção de vinhaça no Brasil,
que resulta ser de aproximadamente 250 milhões de m3 por ano nas últimas safras (MORAES;
ZAIAT; BONOMI, 2015). Entre 1,0 e 1,7 milhões de m3 de vinhaça são reciclados anualmente
para campos de cana-de-açúcar por fertirrigação no Brasil (MORAES et al., 2017).
As características da vinhaça são amplamente dependentes da matéria-prima e das
condições de fermentação e destilação aplicadas (ESPAÑA-GAMBOA et al., 2012). De acordo
32
com Cortez et al. (1996), a composição química da vinhaça depende das características do solo,
variedade de cana, período de safra e processo industrial usado na produção de etanol. Segundo
Oliveira (2012), a composição química da vinhaça pode variar dentro de largos limites, sendo
influenciada por diversos fatores, em que pode ser destacada a natureza e composição da
matéria-prima.
No Brasil, a vinhaça de cana-de-açúcar é comumente devolvida aos canaviais via
fertirrigação para reciclar a água e nutrientes, predominantemente o potássio, para a cultura
(FUESS; GARCIA, 2014). Embora estudos tenham associado resultados benéficos à
fertirrigação (JIANG et al., 2012; SIVALOGANATHAN et al., 2013), incluindo redução de
gastos com fertilizantes inorgânicos, a disposição da vinhaça em terra pode gerar vários
impactos negativos para o sistema solo-água-planta ao longo prazo (DE OLIVEIRA et al.,
2013). O conceito de biorrefinaria indica que a aplicação direta da vinhaça na terra reflete a
subutilização de uma matéria-prima altamente energética, porque as abordagens
biotecnológicas são potencialmente adequadas para o processamento de tais efluentes,
particularmente por meio de processos anaeróbios (FUESS et al., 2018).
A utilização da vinhaça in natura como fertilizante causa preocupação devido ao
seu alto grau de impacto quando distribuída no meio ambiente, isso ocorre devido suas
características de baixo pH e elevada demanda química de oxigênio. A DQO pode reduzir os
níveis de oxigênio, afetando assim a sobrevivência dos organismos presentes no solo
(DAMIANO, 2005). Barros et al. (2009) relatam que a carga de DQO da vinhaça é cerca de
27000 mg/L e essa descarga de vinhaça nos cursos d’água, tem ameaçado a fauna e flora devido
a diminuição do oxigênio dissolvido na água.
A vinhaça oferece um grande potencial para a produção de biogás, embora este uso
alternativo seja atualmente subexplorado. No Brasil, bem como no Japão, na Europa e nos
Estados Unidos (EUA), a vinhaça foi tradicionalmente administrada como um aditivo para
alimentação animal, ou aplicado a campos como um nitrogênio-fósforo-potássio (NPK) adubo
para produção agrícola ou utilizado para melhorar a matéria orgânica do solo. As preocupações
com os potenciais impactos ambientais nas águas superficiais e nas águas subterrâneas
resultaram na proibição do uso de vinhaça como fertilizante nos EUA e no Uruguai. Em
contraste, a aplicação da vinhaça ainda é recomendada e legal no Brasil, na União Europeia e
no Canadá.
33
4.4.1.1 Hidrólise
4.4.1.2 Acidogênese
4.4.1.3 Acetogênese
4.4.1.4 Metanogênese
4.4.2.1 Temperatura
4.4.2.2 pH
O tempo de retenção hidráulica (TRH) pode ser definido como o tempo necessário
para a completa degradação da matéria orgânica ou o tempo que a matéria orgânica permanece
no digestor, sendo diretamente proporcional a sua taxa de degradação. Varia conforme a
temperatura e a composição do resíduo. Kothari et al. (2014) relatam um TRH de 10 a 40 dias
para biodigestão em condições mesofílicas e que resíduos compostos por celulose e
hemicelulose exigem maior TRH.
É o tempo necessário para a mistura ser totalmente digerida no digestor e ocorre
quando a produção de gás é máxima, definindo a melhor qualidade digestora. Seu valor depende
do substrato, tipo de digestor, além de outros fatores, e pode variar de 50 dias, em alguns tipos
de digestores rurais, em apenas algumas horas, em certos digestores industriais (SALOMON,
KARINA RIBERIO, 2007).
4.4.2.4 Inóculo
traços de O2, permaneceram em repouso por 24 horas, à temperatura de 20 °C. O autor concluiu
que o volume produzido de biogás foi maior para a diluição 1:2, evidenciando que a diluição
tem papel fundamental na produção de biogás.
Syaichurrozi (2018) utilizou fluído ruminal como inóculo na co-digestão do
Salvinia molesta e palha de arroz. Neste estudo, o líquido do rúmen em condições frescas foi
obtido do matadouro de vacas na Serang City, província de Banten, na Indonésia. O líquido
ruminal continha Clostridium sp., Clostridium sporogenes, Clostridium butyricum e bactérias
metanogênicas ricas. (SYAICHURROZI, 2018).
Barros e colaboradores (2016) utilizaram resíduos de suinocultura para arranque de
reator UASB (Upflow Anaerobic Sludge Blanket), em experimento com processo de digestão
anaeróbia com posterior alimentação dos reatores utilizando-se vinhaça natural, proveniente de
plantio de cana em Ribeirão Preto, São Paulo. O volume de lodo de resíduos da suinocultura
atingiu 30% do volume de cada reator, com o restante sendo preenchido pela vinhaça natural.
A média da eficiência de remoção de DQO foi de aproximadamente 70 a 80%, tendo atingido
até 82% de eficiência máxima pelos reatores UASB. Este estudo, que também analisou a
conversão anaeróbia da vinhaça em biometano com aumento gradual da carga orgânica em dois
reatores UASB, com volumes de 40,5 e 21,5 litros e com operação em temperatura mesófila,
verificou produções máximas de metano na ordem de 0,19 L (g DQO total removido)-,
alcançadas após 140 dias de operação dos reatores. (BARROS, V. G. D. et al., 2016)
aplicação deste subproduto "in natura" ao solo, pode ser comparável às demandas elétricas de
algumas cidades, ou a capacidade de geração de algumas usinas hidrelétricas e, em alguns
casos, excedeu a energia obtida da combustão do bagaço de cana-de-açúcar. Portanto, os
conceitos de sustentabilidade envolvidos na biodigestão anaeróbia da vinhaça ainda necessitam
ser melhor explorados em biorefinarias de cana-de-açúcar no Brasil (MORAES et al., 2015).
As vantagens da digestão anaeróbica da vinhaça incluem baixa produção de lodo
biológico, menor necessidade de nutrientes e produção de hidrogênio e / ou metano, que pode
ser usado como fonte de energia. Tal processo se encaixa no conceito de biorrefinaria,
integrando a produção etanol, a recuperação de energia e o uso de efluente tratado na
fertirrigação de plantações de cana-de-açúcar (VOLPINI et al., 2018).
Satyawali & Balakrishnan (2008) relataram que o sistema de reatores em batelada
tem futuro promissor no tratamento de vinhaça, principalmente nas pequenas fábricas, o qual
seria composto por um tanque receptor, um tanque de retenção intermediária, 2 tanques de
armazenamento e um tanque de tratamento aeróbio.
A tecnologia de digestão anaeróbia aplicada a vinhaça foi implementada em
algumas destilarias de grande porte, no qual demonstrou uma eficiência de conversão de mais
de 80% em taxas de carregamento orgânico de mais de 20 kg DQO/ m3/ d. Para a quantidade
de DQO em vinhaça, cerca de 100 kg de metano é produzido com uma eficiência de remoção
de 80% (TUNES, 2017; VAN HAANDEL, 2005).
4.6 Digestores
4.8 Biogás
5 METODOLOGIA
Esquema do experimento
2ª Etapa:
1ª Etapa: 4ª Etapa:
Obtenção e 3ª Etapa:
Desenho e montagem Análise e interpretação
caracterização da Digestão Anaeróbia
dos sistemas dos resultados
vinhaça
Caracterização 1° Estágio:
Físico-química Ensaios de bancada
2° Estágio: Ensaios
no Biorreator
1° Estágio: Ensaios
no Biodigestor
projetado
46
5.3 Substrato
A vinhaça in natura foi caracterizada quanto a umidade, matéria seca, cinzas sólidos
suspensos voláteis e totais, densidade, potencial hidrogeniônico, demanda química de oxigênio
47
(DQO), proteínas, lipídeos e nitrogênio total. O efluente da biodigestão foi caracterizado quanto
a DQO e pH. As análises descritas acima foram realizadas nos Laboratórios da UFVJM e as
técnicas utilizadas obedeceram os procedimentos estabelecidos pelo Standard Methods for the
Examination of Water and Wastewater (APHA, 2012). A Figura 3 apresenta um fluxograma
das análises realizadas.
Fonte: Autora.
5.4.1 pH
5.4.2 Densidade
Onde:
P0= Peso da capsula de porcelana (g)
P1 = Peso do resíduo seco + capsula de porcelana (g).
Uma vez calculado o teor de sólidos totais a umidade foi calculada pela diferença
entre 100 e o conteúdo de sólidos totais (U(%) = 100-ST(%)).
A quantificação dos sólidos fixos totais (SFT) foi feita em triplicata, utilizando-se
o método 2540E da metodologia proposta por Standard Methods for Examination of Water and
Wastewater (APHA, 2012). O conteúdo de sólidos totais fixos foi determinado a partir da
incineração em mufla a 550°C e o conteúdo de SFT foi obtido com a Equação (3).
𝑃2 − 𝑃0
𝑆𝐹𝑇(𝑔.𝑘𝑔−1) = × 1000
𝑘𝑔𝑎𝑚𝑜𝑠𝑡𝑟𝑎 (3)
Onde:
P0= Peso da capsula de porcelana (g)
P2 = Peso do resíduo após ignição + capsula de porcelana (g).
A análise foi feita pela adição de 800 μL do reagente DNS, 400 μL da amostra
(centrifugada, ou agitada) e 400 μL da H2O em um microtubo tipo Eppendorf de 2 mL, seguido
de incubação a 100 °C por 5 minutos e resfriamento em banho de água com gelo por mais 10
minutos. A seguir, transferiu-se a solução para um tubo de vidro e acrescentou 8000 μL de água
destilada, e posteriormente, realizou-se a leitura em espectrofotômetro a 540 nm.
1,6
y = 1,4792x
1,4 R² = 0,9994
Absorbância (540 nm)
1,2
0,8
0,6
0,4
0,2
0
0 0,2 0,4 0,6 0,8 1 1,2
Glicose (g.L-1)
(𝑉 × 𝑓 × 100)
𝐴𝑇𝑇(𝑚𝐿%) =
(𝑃 × 𝑐) (5)
51
Onde:
V = nº. de mL gasto na titulação; f = fator de correção;
P = g de amostra;
c = correção p/ NaOH 1M (c=10 p/ NaOH 0,1M e c=100 p/NaOH 0,01M)
5.4.9 Lipídeos
0,25
y = 0,0004x
R² = 0,9912
0,2
Absorbância (nm)
0,15
0,1
0,05
0
0 100 200 300 400 500 600
Concentração de DQO (mgO2/L)
53
5.6 Inóculo
que quantificava o volume de biogás produzido pela expansão do gás e deslocamento da coluna
de líquido dentro do kitassato. A água deslocada foi coletada em um recipiente graduado, neste
caso, utilizou-se uma proveta de vidro graduada.
Nos experimentos iniciais, o reator foi testado utilizando vinhaça de cachaça com
pH neutralizado como substrato e esterco bovino fresco como inóculo. A faixa de pH ideal para
a digestão anaeróbica é relatada, por Mao et al. (2015), como sendo entre 6,8-7,4. Como a
vinhaça in natura possui uma faixa de pH inferior, foi necessária a sua neutralização para
realização dos ensaios. O pH da vinhaça foi neutralizado utilizando solução de NaOH 5%.
Por meio de teste iniciais determinou-se um processo de referência, ou seja o
processo na qual foi obtido maior produção de biogás. Este foi utilizado como ponto central
para comparação de parâmetros. Assim, se determinou o delineamento experimental, a ser
utilizado no 2° estágio do processo de biodigestão.
D
A
(a) (b)
(A) Reator controlado por temperatura com um agitador; (B) Câmara de lavagem do biogás; (C) Depósito de Gases; (D)
Proveta para quantificar o biogás produzido por deslocamento de líquido.
Fonte: Autora.
Fonte: Autora.
A: biorreator anaeróbio com vinhaça; B: câmara de lavagem do biogás; C: reservatório de biogás; D: proveta
para coleta de agua.
Fonte: Autora.
6” de diâmetro. Esse depósito, possui um manômetro para leitura da pressão e uma saída de gás
com válvula de segurança.
Registro
Entrada do
efluente
Câmera de
fermentação
Descarga do
subproduto
Fonte: Autora.
Fonte: Autora.
61
Fonte: Autora.
com fenol e hipoclorito de sódio alcalino, produzindo indofenol, um corante azul. A reação é
acelerada pela adição de nitroprussiato de sódio, um catalisador (LODGE, 1989). A leitura
colorimétrica foi feita através do fotocolorímetro, da linha alfa kit com faixa de onda de 621 –
638 nm, e com as curvas de calibração, para amônia, já inseridas, conforme apresentado na
Figura 10.
Fonte: Autora.
Os valores médios dos dados obtidos foram comparados usando o teste de Tukey
em níveis de confiança de 95%. Todos os cálculos estatísticos foram feitos com os softwares
"Statistica", versão 10.0 e o “The Unscrambler X, versão 10.5.1”.
63
5.13.2 Otimização
6 RESULTADOS E DISCUSSÃO
de cana, assim como na produção de cachaça artesanal. Nas plantas anexas, que produzem
açúcar e etanol, a vinhaça deriva do melaço e do suco.
Pelos dados obtidos de matéria seca e cinzas é possível observar que maior parte da
vinhaça que está presente em matéria seca possui característica orgânica, sendo 23,94 %
inorgânica, restando 76,06 % de matéria orgânica que será utilizada para a produção de biogás.
Valores próximos ao encontrados por Pires e colaboradores (2018) na caracterização de vinhaça
de etanol: 97,49 % de umidade, 0,040 g 100 g-1 de matéria seca e 21,54% de cinzas. A
determinação das cinzas indica a quantidade de minerais presentes na matéria prima utilizada
nos processos biotecnológicos. Segundo Fick (1976), as cinzas contém, principalmente, os
seguintes cátions: cálcio, potássio, sódio, magnésio, ferro, cobre, cobalto e alumínio; e ânions:
sulfato, cloreto, silicato e fosfato.
67
6.1.3 pH
A densidade relativa obtida na vinhaça in natura foi de 1,003 ± 0,0001 g cm-3. Valor
próximo foi encontrado por Silva e Abud (2016) em vinhaça de etanol, de 1,015 ± 0,005 g cm-
3
.
para vinhaça um teor de 20,82 ± 0,44 g kg-1 de sólidos totais e 6,33 ± 0,065 g kg-1 de sólidos
fixos totais. Pires e colaboradores (2018) obtiveram 29,64 g.kg-1 de sólidos voláteis totais na
vinhaça de etanol.
A análise de sólidos totais (ST) interpreta quantitativamente a presença total de
matéria que não seja água (dissolvida, coloidal ou em suspensão). Segundo Goularte (2014),
quanto maior for o conteúdo de sólidos voláteis, os quais representam a quantidade de sólidos
orgânicos presentes na amostra, e a disponibilidade de nitratos e fosfatos, maior será a produção
de biogás. Logo, os valores de sólidos observados na vinhaça deste estudo, potencializa seu uso
na biodigestão anaeróbica.
6.1.8 DQO
300,00
35°C
250,00
Volume de Biogás (mL)
200,00
150,00
100,00
50,00
0,00
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
Tempo (dias)
71
400
350
Volume acumulado de Biogás (mL)
300
250
200
150
100
50
0
0 5 10 15 20 25
Tempo (dias)
Pelo Gráfico 4, é possível observar como ocorreu a formação do biogás nos ensaios,
ao longo do tempo de incubação. Os ensaios mantidos a 25 °C com as maiores concentrações
de inóculo, ensaios 02 e 04, tiveram um destaque maior na quantidade de biogás acumulado.
Dessa forma, pode se inferir que a concentração de inóculo tem grande interferência no volume
73
de biogás produzido, sendo um parâmetro que merece estudos mais aprofundados. Notou-se
ainda, que o ensaio 04 possui um processo mais estável em relação ao ensaio 02. Este
apresentou pequenas fases estacionárias durante o período de operação. Este fato pode ser
atribuído à formação de substâncias intermediárias que pode ser inibidoras para as bactérias
fermentativas e as acetogênicas que estão envolvidas nas etapas de acidogênese e acetogênese,
respectivamente.
Speece (1996) afirma que a instabilidade do processo anaeróbio ocorre quando a
velocidade de produção de ácidos for maior que seu consumo, acarretando queda do pH e
inibição das atividades das arqueias metanogênicas, altamente sensíveis a mudanças nas
condições ambientais. Segundo Rajagopal et al (2013) e Syaichurrozi (2018), o baixo pH pode
perturbar a estabilidade da biodigestão anaeróbica, que depende da manutenção de um
equilíbrio bioquímico delicado entre os microrganismos acidogênicos e metanogênicos. Os
microrganismos metanogênicos são mais sensíveis com baixo pH do que os microrganismos
acidogênicos.
No ensaio 04, com diluição de 50% da vinhaça, a formação de biogás teve início
no terceiro dia de biodigestão, e estabilizou a produção a partir do sétimo dia de incubação. Já
no ensaio 02, a formação do biogás teve início no quinto dia; entretanto, este produziu um
volume maior de biogás no período de 25 dias, ou seja, cerca de 25 % a mais que o ensaio 04.
Por outro lado, comparando-se estes dois ensaios em termos de gasto de energia e tempo de
biodigestão versus volume de biogás gerado, nota-se, que a reprodução do ensaio 02 numa
empresa seria mais viável. Pois, como neste processo a produção do biogás foi estabilizada no
oitavo dia com um volume de 253 ml, num período de 25 dias poderia realizar-se até três
bateladas, obtendo, no final, um volume total de aproximadamente 760 ml de biogás.
Em relação ao ponto central, verificou-se que houve início da formação de biogás
com 24 horas da biodigestão. O mesmo foi relatado por Budiyono e colaboradores (2014)
quando previram o rendimento de biogás a partir de resíduos de vinhaça contendo alto teor de
carboidratos. Em seus experimentos, o biogás foi gerado no primeiro momento da fermentação
da vinhaça (1 dia).
Os ensaios 01, 03, 05, 06 e 07, conforme apresentado no Gráfico 4, tiveram baixa
produção de biogás. No ensaio 01, o biogás começou a ser produzido no décimo nono dia de
biodigestão; a partir daí teve uma taxa de geração crescente até o 25º dia. Já no ensaio 03 teve
a formação de biogás em torno de 3 mL no terceiro dia e estabilizou a produção entre o quarto
e décimo terceiro dia com a formação de 8,7 ml. A partir desse dia, voltou a produzir com uma
velocidade de formação constante e lenta.
74
75
76
Segundo Kabdasli et al. (2000), para remover a amônia do substrato, dois métodos
físico-químicos podem ser utilizados: remoção de ar e precipitação química. Ambos provaram
ser tecnicamente viáveis em altas concentrações de amônia e em uma complexa matriz de
efluentes. Uma abordagem comum à inibição da amônia depende da diluição do esterco a um
nível total de sólidos de 0,5 a 3,0%. No entanto, o aumento resultante no volume de resíduos
que deve ser processado torna este método economicamente pouco atraente (CALLAGHAN et
al., 2002).
Na Tabela 7, os valores de demanda química de oxigênio ao final da biodigestão e
o percentual de remoção de DQO são apresentados nas colunas 12 e 13. A demanda química
de oxigênio nos 11 ensaios foram, respectivamente, 8.225, 5.833, 3.972, 3.877, 6.513, 4.632,
4.424, 4.228, 10.162, 18.893 e 17.925 mg O2 L-1.
A vinhaça de cachaça in natura apresentou uma DQO de 31.559 mg O2 L-1. Este
valor está de acordo com os estudos de Rossette (1987), na qual relata que a DQO da vinhaça
pode variar de 20.000 a 35.000 mg O2 L-1. Segundo Lyra et al. (2003), a Demanda Química de
Oxigênio do resíduo in natura da vinhaça para o uso em fertirrigação apresentou um valor de
21.000 mg O2 L-1 em seus estudos. Estes altos valores de DQO prejudica o crescimento das
plantas, especialmente em solos pobres.
O Gráfico 5 apresenta os valores da DQO na vinhaça bruta, ou seja, antes do
processo de biodigestão e após a biodigestão, vinhaça tratada.
35000 31.559,38
30000
DQO (mg O2.L-1)
25000
20000 15.660,42
15000
8.225,00
10000 5.833,75 6.513,75
3.972,50 3.877,50 4.632,50 4.424,38 4.228,75
5000
0
substituir o gás de cozinha ou para geração de calor e eletricidade nas propriedades rurais
produtoras de cachaça artesanal.
Com a realização dos ensaios, foi possível observar que os ensaios que obtiveram
uma maior produção de biogás foram os ensaios 02 e 04, respectivamente, com 347,90 e 261,08
mL de biogás formado num período de 25 dias. Ambos possuíam um inóculo com concentração
de 300 g.L-1 de esterco bovino. Entretanto, faz-se necessário otimizar o processo para encontrar
as melhores condições para a biodigestão de vinhaça de cachaça de acordo com um estudo
matemático, ou seja, qual os melhores valores das variáveis estudadas: concentração de inóculo.
Otimizar significa encontrar os valores das variáveis que irão produzir a melhor
resposta desejada, isto é, encontrar a região ótima na superfície definida pelos fatores. Isso
indicará com quais os valores de variáveis irá se obter o melhor desempenho na produção de
biogás. Para o otimização do experimento, fez-se o gráfico de superfície 3D e 2D, no software
Estática, Figuras 11 e 12.
Os gráficos de superfície foram construídos relacionando a correção da diluição da
vinhaça e concentração de inóculo na produção de biogás para uma temperatura de 25 °C (ponto
central). Nota-se que o área vermelha é onde teremos o maior volume de biogás, região dos
valores críticos. Dessa forma, de acordo o modelo proposto, na região vermelho escuro, estará
localizado o ponto ótimo para a biodigestão da vinhaça para se alcançar o maior volume de
biogás, que é na faixa de 22 a 33 % de concentração de inóculo e sem diluição da vinhaça.
A equação (8) representa o modelo matemático do modelo proposto, onde Z é o
volume de biogás, x a concentração de inoculo, e y a diluição da vinhaça. Os coeficientes
detalhado deste modelo está demonstrado no Anexo I.
𝒁(𝒙,𝒚) = 𝟏𝟓𝟏, 𝟓𝟐𝟑 + 𝟔𝟓, 𝟖𝟎𝒙 − 𝟎, 𝟕𝟑𝟐𝒙𝟐 − 𝟏𝟔, 𝟒𝟓𝟏𝒚 − 𝟏, 𝟎𝟐 × 𝟐𝟓𝒙 + 𝟎, 𝟎𝟓𝟐𝟕𝒙𝒚 + 𝟎, 𝟓𝟏𝟖 × 𝟐𝟓𝒚 − 𝟑𝟐𝟏, 𝟖𝟒 (8)
82
A Figura 13 apresenta o gráfico dos valores previstos e obtidos, dado uma resposta
se o modelo está bem calibrado. A linha vermelha representa a equação do modelo matemático
do experimento, e os pontos azuis são os resultados obtidos. Logo, quando mais próximo estes
pontos azuis estiverem da linha vermelha, mais eficiente é esse modelo. Pelo gráfico, nota-se
que o modelo obtido foi bem preditivo, o que demostra sua confiabilidade.
350
300
250
Predicted Values
200
150
100
50
-50
-100
-50 0 50 100 150 200 250 300 350 400
Obs erved Values
ensaio 02b. O não controle do pH no ensaio 01b, resultando numa diminuição de 30% deste
durante o período de incubação, pode ter ocasionado a baixa produção de biogás no
experimento. O processo de biodigestão é severamente inibido se o pH decresce para valores
inferiores a 6,0.
Conforme observado na Tabela 8, a vinhaça utilizada nessa fase do estudo e os
subprodutos dos ensaios 01b e 02b apresentaram um percentual de umidade, respectivamente,
de 95,75; 98,89 e 99,12%. E um percentual de matéria seca de 4,25; 1,1% e 0,87%,
respectivamente. Esse aumento da umidade nos subprodutos dos ensaios ocorreu devido a
diluição da vinhaça.
Após o processo de biodigestão anaeróbia da vinhaça, houve redução considerável
da DQO e elevação do pH final do subproduto. No ensaio 01b, a diminuição na DQO foi de
85,21% e no ensaio 02b foi 87,28%. Esse fato se deve a conversão da matéria orgânica em
biogás. Essa conversão da matéria orgânica pode ser observada, também, na redução do
conteúdo dos sólidos voláteis. A vinhaça bruta apresentou 21,43 g L-1 de SVT, já os subprodutos
dos ensaios 01b e 02b tiveram, respectivamente, 2,64 e 1,77 g L-1 de SVT. Os sólidos voláteis
representam a quantidade de sólidos orgânicos presentes na amostra. Logo, quanto maior for o
conteúdo de sólidos voláteis, maior será a produção de biogás. O ensaio 02b teve uma maior
redução dos sólidos orgânicos, cerca de 91%, e, consequentemente, este ensaio teve uma maior
produção de biogás, se comparado com o ensaio 01b.
O Gráfico 06 apresenta a produção do biogás ao longo do período de incubação nos
ensaios 01b e 02b.
10000
Volume de biogás (ml)
1000
100
10
ensaio 1
ensaio 2
1
0 5 10 15 20 25 30
Tempo (dias)
85
Fazendo uma análise comparativa dos ensaios 01b e 02b, pode-se verificar que, ao
ser realizar o controle do pH e aumentar a temperatura média em 6 °C, houve um aumento em
29 vezes no volume de biogás produzido entre um ensaio e outro. Isso comprova que o controle
de pH influencia positivamente no processo de biodigestão, sendo está variável relevante na
manutenção da produtividade de biogás. Dessa forma, o controle do pH foi importante para o
aumento da produtividade de biogás, bem como, a temperatura ambiente influenciou no
resultado, uma vez que os microrganismos apresentam parâmetros ótimos para o crescimento.
Em termos de aplicabilidade, devido ao baixo custo e facilidade de realização, o
controle do pH pode ser melhor estudado e adaptado ao sistema de biodigestão em larga escala,
bem como a temperatura, e assim viabilizar o tratamento da vinhaça pelos pequenos produtores
de cachaça, destinando de forma sustentável os resíduos da produção.
A Tabela 9 apresenta as configurações do processo e composição do biogás gerado
nos dois ensaios realizados no biorreator automatizado.
Figura 14 - Gráfico dos scores e loadings das duas primeiras componentes principais
87
Figura 15 - Gráfico dos scores e loadings das duas primeiras componentes principais
88
Com os resultados obtidos nesse trabalho, observa-se que os ensaios 02 e 04, que
tiveram a melhor produção de biogás, apresentaram aproximação na influência das variáveis
estudadas. No entanto, são necessários estudos mais aprofundados que levem em consideração
a variação de outros parâmetros para identificação daqueles paramentos que possuem influência
direta na produção de biogás.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
8 PERSPECTIVAS FUTURAS
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105
ANEXO I
Dados
Regr. Coefficients;
Var.: Volume de Gás (mL)
R-sqr = 0,87482;
Adj:,58274 (analise 1)
3 fatores, 1 Bloco, 11 amostras;
MS Residual=6034,446
Variável dependente: Volume de Gás (mL)
ANOVA
Fator SS df MS F p
(1) Concentração de Inóculo (%)(L) 20086,8 1 20086,83 3,328694 0,165580
Concentração de Inóculo (%)(Q) 3388,2 1 3388,21 0,561478 0,508070
(2) Temperatura (ºC)(L) 41653,5 1 41653,53 6,902627 0,078508
(3) Diluição da vinhaça (%)(L) 29,4 1 29,38 0,004869 0,948762
1L by 2L 21000,1 1 21000,08 3,480034 0,158963
1L by 3L 347,8 1 347,78 0,057632 0,825747
2L by 3L 8396,1 1 8396,07 1,391357 0,323199
Error 18103,3 3 6034,45
Total SS 144622,0 10