Uma Esposa para o Lorde Fantasma
Uma Esposa para o Lorde Fantasma
Uma Esposa para o Lorde Fantasma
Capa: LA Capas
Revisão: DehRatton
Diagramação: Patrícia Rossi
Nota da autora
Sinopse
Capítulo Um
Capítulo Dois
Capítulo Três
Capítulo Quatro
Capítulo Cinco
Capítulo Seis
Capítulo Sete
Capítulo Oito
Capítulo Nove
Capítulo Dez
Capítulo Onze
Capítulo Doze
Capítulo Treze
Capítulo Quatorze.
Capítulo Quinze
Cena extra
Cena extra II
Sinopse
Lorde Willian se isolou em casa desde o acidente que lhe retirou parte
da visão e deformou seu rosto, o que lhe atribuiu o apelido de Lorde
Fantasma. Ele precisou refletir sobre o passado e acabou em um casamento
de conveniência acordado com o pai da noiva, celebrado através de
procuração. Seus planos para a vida incluíam a tranquilidade de ser esquecido
por todos e usufruir os prazeres da casa de jogos que frequentava, mas a
situação mudou quando, um ano após o casamento, uma bela jovem apareceu
para reclamar o lugar de esposa, levando a vida pacata de Willian a
ocompleto caos. Uma esposa bonita e tentadora era tudo que ele não queria
no momento, mas agora teria que aprender a conviver com uma jovem
intempestiva e cheia de amor. Nessa batalha quem vencerá?
Capítulo Um
A jovem de cabelos negros, ondulados, desceu de uma belíssima
carruagem, em frente a uma casa de tijolos vermelhos, e sorriu ao contemplar
o tamanho da construção. Era uma bela casa, maior do que qualquer outra
que ela vira em muito tempo.
Ao lado da jovem, Mia,sua criada, cochichou-lhe algo sobre como a
viagem havia sido cansativa, e a outra concordou.
Viajara da fronteira com a Escócia até Londres levando mais tempo do
que poderia contar, ainda que tivesse parado, em hospedarias, apenas o
suficiente para descansare poder enfrentar as estradas trepidantes novamente.
O medo dos ladrões a acompanhava a todo momento e,valendo-se da
única forma de manter a salvo o que era seu, elahavia costurado as joias no
forro da capa que usava. Ainda que fizesse calor demais para usar tal peça,
esperava enganar qualquer bandido que porventura aparecesse em seu
caminho.
Uma mulher alta e esguia apareceu na entrada da casa, com uma
expressão desconfiada, e olhou a visitante dos pés à cabeça.
— Sou a Senhora Norwood — anunciou a jovem, inflando o peito,
com um sorriso nos lábios.
A mulher, que parecia ser uma criada, encarou-a por alguns segundos
antes de corar, as bochechas tomando um tom avermelhado.
— Desculpe, senhora. Nós não a esperávamos — a criada disse
envergonhada, enquanto abria caminho para que a mulher passasse. — Pode
me acompanhar?
A jovem sorriu para a criada que a acompanhava e seguiu a mulher,
enquanto olhava com interesse para o interior da casa, constatando que tudo
era melhor do que ela tinha esperado.
Na decoração do salão principal, prevalecia a cor branca, que se via
desde as cortinas até os sofás antigos e as cadeiras. Havia um grande espaço
livre no salão, o que a levou a pensar em jogos e até mesmo, quem sabe, em
passos de dança — algo que ela adorava — que poderiam ser realizados ali.
Parou por um momento e respirou fundo, ainda com um grande sorriso
no rosto. Estava se sentindo feliz por finalmente ter tomado aquela decisão.
Levara um ano para criar coragem suficiente para tal coisa e nem mesmo
agora acreditava que tinha viajado todas aquelas milhas para enfim encontrá-
lo.
Engoliu em seco pensando em como seria o primeiro encontro com ele.
Ouvira histórias sobre como a aparência de Lorde Willian era aterrorizante e
sabia que as pessoas o chamavam de Lorde Fantasma devido ao rosto
deformado. Gostaria de saber como ele era de verdade, de vê-lo realmente,
pela primeira vez desde o casamento.
A criada indicou um sofá para que ela se sentasse, enquanto a sua
acompanhante ficava ao lado, também admirada com a decoração do lugar.
—Vou comunicar aLorde Norwood — informou a criada, dando as
costas a ela e subindo as grandes escadas que levavam ao andar superior.
Ele estaria dormindo? Já passava do meio-dia. Seria um desses lordes
caprichosos que costumavam acordar apenas depois do almoço?
A jovem estava curiosa sobre muitas coisas a respeito daquele homem
e suspeitava de que levaria um bom tempo para conhecê-lo mais
intimamente. Isso, claro,se ele tornasse as coisas mais fáceis.
Um homem não espera que uma jovem desconhecida apareça em sua
casa de repente, um ano depois, cobrando-lhe os direitos de esposa. Não em
um casamento acordado com o pai da noiva, quando tudo não passara de um
trato financeiro, de um acordo planejado em benefício dos dois.
Não havia motivo para uma mulher quebrar um acordo como este,
quando estava vivendo tranquilamente longe de um marido deformado. Era
um alívio, uma benção.
Mas aquela jovem de olhos astutos e aparência angelical sentada no
sofá tinha motivos suficientes para cometer tamanha loucura.
Sobressaltou-seao ouvir barulhos de passos vindos da escada. Levou a
mão ao coração, nervosa, pois estavaprestes a conhecer o marido, algo por
que tanto ansiava.
O homem desceu as escadas lentamente, com passos tranquilos,
enquanto a expressão no rosto de todos os presentes no salão mudava.
Ninguém mais sorria, todos pareciam apreensivos.
E, quando finalmente parou em frente à jovem encolhida no sofá,
Lorde Norwood lhe lançou um olhar amargo.
— Quem é você? — ele quis saber, fitando-a com curiosidade.
A jovem ficou de pé, curvando-se rapidamente para cumprimentá-lo.
— Eu me chamo Sarah, senhor — apresentou-se um tanto sem jeito.
Ele arqueou uma sobrancelha, deixando o rosto com um ar engraçado.
— E a que devo o prazer de sua visita, senhorita? Sabe, eu sou um
homem muito ocupado e não tenho tempo para desperdiçar com conversas
fúteis — Willian explicou olhando para a criada parada ao lado dela. —Você
faz parte de algum grupo de acolhimento a crianças e precisa de dinheiro?
Devo lhe avisar que não sou esse tipo de gente que faz caridades.
Sarah lambeu os lábios, nervosa. Mal conseguia olhar para o rosto
daquele homem sem sentir o coração em pedaços e só podia imaginar toda a
dor que ele sofrera. Mas, mesmo assim, não podia negar o encantamento em
que caíra ao ver como ele era bonito, apesar das feridas que se estendiam do
lado esquerdo de seu rosto, sobre um olho. Como tinham coragem de chamá-
lo de Lorde Fantasma?
Ela ainda estava em silêncio, e ele esperava pela resposta. O homem
tinha os braços cruzados sobre o peito, encarando-a com uma expressão
estranha.
A jovem, então, criou coragem para fazer aquilo que a levaraaté ali.
—Sou sua esposa, senhor — falou.
A voz saiu baixa demais, mas mesmo assim Sarah notou quando ele a
ouviu e deu um passo para trás.
— Perdoe-me, mas creio que tenha ouvido mal— Willian disse, em
dúvida.
Sarah respirou fundo.
— Casamo-nos há um ano, senhor. Sou filha de Reux, que tratou dos
detalhes do casamento com milorde.
Willian esperava muitas coisas para aquele dia, quando decidira deixar
o conforto de sua cama para atender uma jovem que batera a sua porta, mas
em nenhuma delas havia a possibilidade de que ela fosse sua esposa.
— E o que faz aqui, se me permite perguntar? Não esperava vê-la de
nenhum modo— era notável a irritação na voz dele, o que deixou Sarah em
alerta.
A jovem o encarou tentando entendê-lo. Ela tinha imaginado aquela
conversa diversas vezes e cogitara muitas possibilidades para o que o marido
diria; jurava que estava preparada para isso. Mas a realidade agora era outra.
Suas pernas estavam tremendo por baixo das saias do vestido, e ela só
conseguia pensar em correr porta afora.
— Estou aqui para vê-lo, senhor. Viajei até aqui para conhecer o
homem com que me casei — falou sentindo o coração acelerado contra o
peito, ansiosa para ouvir a resposta do lorde.
Ele a fitou por longos segundos e, enquanto isso, Sarah também o
olhava com atenção, escrutinandoos traços do rosto do homem alto e loiro.
— Isso é um engano — anunciou caminhando de um lado para o outro
em frente à jovem. Ele parou apenas para apontar para o rosto delae declarar:
— Eu não a quero nesta casa. Seu pai tinha um compromisso comigo. Como
ele pôde permitir que viesse até aqui?
Ela baixou a cabeça.
— Ele morreu há alguns meses — contou com a voz embargada.
Willian suspirou, passando as mãos pelo cabelo dourado.
— Não é problema meu. — Deu as costas à esposa, pronto para subir
as escadas novamente. — Volte para sua casa, senhorita. Não há espaço para
você aqui.
— Mas, senhor... — ela tentou dizer, porém ele já a tinha deixado
sozinha no salão e estava subindo as escadas novamente.
Sentindo-se derrotada, sentou-se novamente no sofá e olhou ao redor,
incapaz de acreditar que tinha ido até ali para algo tão rápido e inútil. Ele nem
lhe dera tempo suficiente para falar! Ela mal pudera explicar os motivos pelos
quais estava ali, suas intenções.
Como o convenceria de que era uma boa ideia recebê-la na casa dele?
— Senhorita, por favor, precisa sair. — Uma criada apareceu ao lado
dela, pronta para levá-la até a porta.
Então era daquela forma que tudo terminava? Com apenas uma troca
de olhares rápida, poucas palavras e nenhum tipo de intimidade ousaudação?
Não era o que ela esperava ao deixar a própria casa dias atrás, sonhando com
a possibilidade de finalmente viver um casamento de verdade.
Em silêncio, completamente arrasada, a jovem dirigiu-seà porta junto
da criada e estava pronta para sair, quando ouviu uma voz feminina atrás de
si.
— Esperem aí.
Sarah se voltou e se assustou ao ver uma mulher loura, com um vestido
verde bem ajustado e o cabelo penteado em cachos, como ditava a moda,
parada em um degrau da escada, sorrindo-lhe abertamente.
— Deixe-as, Kit — a mulher ordenou à criada, que se retirou no
mesmo instante. — Por favor, volte a se sentar, menina. — Indicou o sofá,
enquanto se dirigia para ele.
— Obrigada, senhora. — Sarah, mesmo sem compreender o que estava
acontecendo, acatou a ordem e se acomodou novamente no sofá branco.
— Meu nome é Cecil — apresentou-se a mulher, sentando-se ao lado
da jovem. — Perdoe-me, mas acabei ouvindo sua conversa com meu filho.
— Lorde Willian é seu filho?
A mulher sorriu e em seguida assentiu.
— Somos parecidos, não acha?
— Sim, são, senhora — concordou Sarah, sorrindo de volta.
— Isso é um elogio para mim, pode notar. —Abaixou o tom de voz
para cochichar algo. — Mesmo com a aparência dele, ainda é um homem
bonito.
— A senhora está certa.
A mãe de Willian a fitou com mais cuidado, admirando-a e sorrindo
com delicadeza em seguida.
— Ouvi que é a esposa de Willian. Compreenda, eu não esperava sua
visita —Cecil disse de um jeito delicado, tentando não a ofender.
—Sou, senhora. Eu me casei com Lorde Willian há um ano, um
casamento acordado com meu pai.
— Epor que apareceu apenas agora para tomar seu lugar de direito? —
a senhora perguntou com curiosidade.
Sarah se retesou, ansiosa, com medo do que aquela mulher estava
pensando dela.Respirou fundo antes de responder, com cuidado:
— Meu pai faleceu há alguns meses e fiquei apenas com minha mãe.
Ocorreu-me então que eu tinha um marido e que poderia viver muito bem
com ele. Sei que é um sonho distante, mas decidi tentar.
— Você é corajosa, menina — a mulher falou em tom divertido.
Sarah piscou encarando-a sem entender. Esperava que a mulher fosse
grosseira ou até mesmo indelicada com ela, mas em vez disso Cecil a tratava
com respeito.
— Eu só quero viver esse casamento, senhora. Acredito que pode dar
certo —disse convicta.
— E você tem um plano para conseguir isso? Acho que notou que seu
marido não é uma pessoa muito agradável, não é fácil conviver com ele —
explicou Cecil, com um meio sorriso.
Sarah também tinha pensado naquilo, sobre o que faria se seu marido
fosse um homem amargo e mal-humorado, e a resposta era simples:tentaria
convencê-lo com toda a sua doçura e coragem, faria de tudo para que ele
tivesse o coração amolecido.
— Sou uma pessoa persistente, senhora. E tenho muita paciência. Acho
que é o suficiente para fazê-lo prestar atenção em mim.
— Eu lhe desejo sorte. — A senhora ficou de pé, e Sarah a imitou. —
Vou pedir que a acompanhem ao seu quarto nesta casa.
— Eu lhe agradeço muito. Prometo me esforçar em meu plano e honrar
meu casamento — falou sentindo os olhos arderem, porque era o que mais
desejava.
— Eu acredito em você, menina — Cecil disse com um sorriso nos
lábios.
A criada apareceu novamente e seguiu as ordens da senhora,
convidando Sarah a acompanhá-la.
A jovem a seguiu pela escadaria e depois pelo largo corredor.
Enquanto isso se perguntava em qual daqueles quartos o marido estava. Será
que já está dormindo? Tinha tanta curiosidade em saber mais sobre ele,
desejava poder lhe falar mais.
— Aqui é seu quarto, senhora.
A criada abriu a porta e indicou que entrasse, enquanto Cecil ficava do
lado de fora.
— Ela ficará na ala dos criados.
Sarah assentiu, não queria ficar só, mas sabia que não tinha opção.
Sozinha em seu quarto, admirou o belo lugar. Havia uma grande cama
e móveis de madeira antiga. Também havia uma tina de madeira no canto, e
ela suspirou pensando emum bom banho.
Sentou-se na cama e levou a mão ao peito, sentindo o coração aos
pulos, nervosa, porque sabia que agora não haveria mais volta. Estava na casa
de Willian e tinha o apoio da mãe dele, bastava fazer as coisas da maneira
certa e conseguir, por fim, conquistar o coração do marido.
Sarah não tinha exatamente um plano formado e não havia pensado em
como conquistaria o coração do marido, ainda mais conhecendo o
temperamento dele. Mas acreditava que, de algum modo, conseguiria tornar
aquele casamento real. Ela só precisava encontrar o caminho para o coração
de Willian e fazê-lo notá-la como mulher. Não tinha ideia de como faria isso,
mas suspeitava que precisaria tirá-lo do quarto primeiro.
Ouviu batidas à porta e, quando abriu, encontrou Cecil parada,
sorrindo.
— Há algumas coisas que precisam ser ditas, menina — começou ela,
ao entrar no quarto. — Quero que saiba que tem todo o meu apoio para
conquistar meu filho.
— Obrigada, senhora.
— E acho que será uma tarefa difícil, que demandará muito esforço
seu. Willian não me ouve desde que aconteceu esse acidente terrível. Imagino
que você terá dificuldades em conversar com ele.
— Eu tentarei de todas as formas — Sarah disse animada.
— Espero que sim, menina. Hoje à noite pode tentar conversar com ele
durante o jantar. É uma boa oportunidade — sugeriu Cecil.
— Eu farei —concordou ansiosa.
— Vou deixá-la descansar até a hora do jantar, querida.
A senhora seguiu em direção à porta de novo e acenou para Sarah antes
de sair. A jovem respirou fundo quando se viu sozinha, pensando em como
iria fazer para que Willian conversasse com ela.
Precisaria usar toda a sua artimanha e esperteza para conseguir essa
façanha.
Ela era boa nisso.
***
Horas depois, quando a noite já tinha caído sobre Londres, Sarah se
olhava em frente ao espelho, ainda nervosa pela iminência do próximo
encontro com o marido. Tinha descansado um pouco, relaxado na confortável
cama, mas seus pensamentos se dirigiam a Willian, ao rosto dele. Não
conseguia esquecer aqueles olhos cheios de raiva e a pele avermelhada pelas
feridas que tinham ficado no rosto do lorde. Eram marcas profundas, e Sarah
se perguntava se ele sentia dores. Pobre homem, como podia viver daquele
jeito?
Uma criada apareceu para avisá-la de que deveria descer para o jantar,
e a jovem conferiu o vestido verde-escuro mais uma vez, esperando que sua
aparência estivesse apresentável.
Desceu a escada devagar, ainda admirando o salão agora envolto em
sombras e à luz da lamparina. A criada a levou até a mesa, que estava vazia, e
indicou-lhe um lugar.
A primeira a aparecer foi Cecil. Sentou-se em frente à Sarah, sorrindo
de um jeito cúmplice, como se as duas tivessem um grande plano ali.
A refeição começou a ser servida, e Sarah se perguntou se o marido
não apareceria para comer naquela noite, quando ele entrou no salão usando
roupas pretas e o cabelo bempenteado. Estava bonito, pensou ela.
— O que essa mulher faz aqui, mãe? Desobedeceu-me ao mantê-la
nesta casa — a voz de Willian era um poço de amargura.
Sarah tremeu sobre a cadeira, ele não a queria ali. Lorde Norwood a
mandaria embora no meio da noite?
— Ela é minha convidada, filho. Sarah ficará alguns dias conosco —
explicou Cecil tranquilamente.
A jovem ainda estava em silêncio, apavorada diante de Willian,
quenem sequer a olhava, concentrado na comida e ignorando-a
completamente.
— Os dias estão cada vez mais quentes — a mãe de Willian comentou
corriqueiramente.
— Sim, estão. Nesta época o calor nas Terras Altas é intenso — Sarah
contou esperando que isso despertasse o interesse do marido.
— Ouvi muito falar sobre as Terras Altas, sobre os guerreiros
impiedosos que habitam essa região — Cecil disse entre mordidas em um
pedaço de pão.
— Histórias, como sabe. Nunca conheci um realmente — explicou
Sarah.
Willian continuava concentrado em sua comida, sem desviar a atenção
do prato, como se as duas mulheres ao lado não existissem.
— Precisa conhecer Londres, minha querida. Eu mesma me
encarregarei de apresentá-la à cidade. Tenho certeza de que todos vão adorar
conhecê-la — falou animada.
— Agradeço a disposição em me apresentar tudo, senhora. Vou adorar
conhecer a cidade — e iria mesmo, estava curiosa parasaber como as pessoas
viviam naquele caos que ela tinha visto ao entrar na cidade.
Algo despertou a atenção de Willian, que ergueu os olhos para a mãe.
— Não pode apresentá-la a Londres.
— E por que não?
Ele desviou o olhar para a esposa, olhando-a com a mesma raiva de
antes.
— Porque todos saberão quem é ela — disse com a voz rouca, baixa.
As duas mulheres se olharam.
— Não tente esconder quem ela é, filho. Logo todos a conhecerão —
explicou Cecil, olhando para o filho.
Willian deixou os talheres sobre a mesa e fitou a esposa com irritação.
— Podemos evitar todo o constrangimento se apenas for embora,
senhorita.
Ela engoliu em seco. Ergueu os ombros.
— Pretendo permanecer por um tempo nesta casa, senhor — disse de
um jeito sério.
Ele bufou.
— A senhorita se arrependerá de tudo isso quando perceber o tamanho
do erro que cometeu.
Sarah o encarou diretamente nos olhos, corajosa.
— Pretendo cumprir com meu objetivo, senhor. Não sou uma pessoa
que desiste facilmente — explicou a ele.
Willian se levantou, pronto para sair do salão.
— Para todos os efeitos, eu me divertirei vendo-a fracassar como uma
tola em seu débil plano — ele disse antes de virar-se e sair, deixando-a
irritada com aquelas palavras.
— Ele é difícil mesmo, Sarah. Perdoe-o por isso.
— Eu o dobrarei — insistiu ela, convicta. — Em pouco tempo ele
estará agindo de um jeito diferente.
— Estou ansiosa por isso, querida. Não aguento mais ver meu filho
vagando por esta casa como um verdadeiro fantasma.
A jovem se compadeceu do sofrimentodaquela mãe. Cecil não queria
mais ver o filho agindo daquela maneira, e isso era apenas mais um incentivo
para que Sarah seguisse lutando peloamor de Willian.
Tinha muitos motivos para isso, para fazer o lorde aceitar seu coração,
e não desistiria tão facilmente.
Sarah tinha um longo caminho pela frente.
Capítulo Dois
Ela acordou no meio da noite, completamente assustada, com o rosto
coberto de suor. Sentou-se na cama e respirou fundo, tentando se localizar em
meio à escuridão do quarto. Então recordou onde estava e levou a mão ao
coração tentando se acalmar, mentalizando que estava tudo bem.
Sarah tinha sonhado que viajava pelas trepidantes estradas que levavam
a Londres e que no caminho era assaltada por bandidos impiedosos.Haviam
levado tudo o que ela tinha e a deixado amarrada na floresta. O sonho tinha
sido muito real e a assustara.
Sentia-se angustiada, como se alguma coisa fosse acontecer, eisso
piorava a situação.
Nervosa, levantou-se da cama e decidiu que iria até a cozinha em busca
de um copo d’água, sozinha, sem a ajuda de uma criada.
Abriu a porta do quarto e saiu para o corredor, caminhando com
cuidado pelo chão frio, em meio às sombras da noite. Toda a casa estava em
um enorme silêncio e ela tentava não fazer barulho, buscando não acordar
ninguém.
Desceu a escadaria agarrada ao corrimão e contava apenas com a luz da
lua que adentrava a enorme janela no salão principal. Somente assim
conseguia enxergar os degraus na escuridão.
Caminhava na direção da cozinha quando ouviu um barulho, uma voz
conversando com alguém. Aguçou os ouvidos e percebeu que o som vinha de
uma porta à esquerda.
Havia alguém ali? Ou algum fantasma?
Ela engoliu em seco e considerou um pouco a situação. Nunca fora
uma pessoa extremamente corajosa, mas naquele momento sua curiosidade
falava mais alto que o medo.
Encostou o ouvido na porta esperando pela voz novamente e, quando
os sussurros voltaram, confirmou que havia alguém ali dentro. Mas o que
fazia no escuro àquelas horas da noite?
Sarah tomou um ar de coragem e colocou a mão no trinco da porta,
pronta para abri-la, enquanto pensava ainda se era uma boa ideia. Mas logo,
quando deu por si, já tinha aberto a porta e entrado no cômodo.
—Alguém aí? — Ia dizer algo mais, mas calou-se ao ver um grande
cão sentado em frente a uma mesa, rosnando para ela.
Tentou dar um passo para trás, mas o animal a seguiu, ainda rosnando
bravamente.
Estava perdida! Como sairia dali?
Em pânico, Sarah pensou em gritar por ajuda, mas foi imediatamente
impedida, quando uma mão tapou sua boca, uma pessoa surgindo de repente
em sua frente.
— Não grite. Vai acordar todos — era Willian sussurrando para ela.
Sarah obedeceu meneando a cabeça, ficando em silêncio enquanto o
marido acalmava o cão falando com ele em voz baixa. O animal o reconheceu
e ficou calmo, deitando-se no chão aos pés do lorde.
Mais tranquila, Sarah fitou Willian em meio às sombras da única vela
no cômodo e suspirou ao vê-lo fitando-a com irritação.
— O que faz aqui no meu escritório? — ele perguntou sem paciência.
A jovem moveu os ombros.
— Estava indo até a cozinha atrás de um copo d’água e acho que me
perdi — disse simplesmente, esperando que fosse o bastante.
— Volte para seu quarto, senhorita. Não é seguro ficar andando por aí
no meio da noite.
Não era seguro? Sarah não entendia qual era o problema no fato deuma
dama procurar por um copo d’água no meio da noite. Que tipo de perigo
poderia haver ali?
— Não tenho medo de nada, senhor — ela falou com a voz límpida,
para que ele ouvisse perfeitamente.
Willian se aproximou dela. Sua figura no escuro provocava arrepios; a
forma como se movia, sorrateiro, e o tom de sua voz, tão rouca.
— Pois deveria ter, senhorita. Nunca se sabe que tipo de coisa pode
estar esperando-a mais à frente — e de novo a voz dele soou daquele jeito tão
misterioso.
— Ainda assim, posso me defender sozinha. Desde que não seja de um
cão raivoso — falou olhando para o animal agora adormecido sobre um
tapete.
Ela não tinha a mínima certeza daquelas palavras, e até achava que
tinha exagerado um tanto. Não passava de uma jovem indefesa, que tinha
medo de ser assaltada durante uma viagem e que se tornava vulnerável diante
daquele homem.
Mas não tinha a intenção de se mostrar fraca diante de Willian, que
naquele momento ria dela, fazendo pouco-caso de suas palavras.
— Volte para seu quarto, senhorita. Chega de aventuras no meio da
noite.
— Eu irei — concordou dando as costas a ele, indo para a escuridão.
Subiu as escadas novamente e se esgueirou até o quarto outra vez, em
silêncio, esperando não ter acordado ninguém durante sua aventura secreta.
Deitou-se na cama e respirou profundamente, sorrindo, lembrando-se
da reação de Willian ao cobrir-lhea boca para evitar que ela gritasse e
acordasse a casa toda. E o modo como tentara amedrontá-la, de um jeito tão
débil e inocente da parte dele.
Sarah estava começando a simpatizar com o marido, aos poucos,
conforme o conhecia. Trocara apenas algumas palavras com ele e já ansiava
por conversar mais. Tinha muito a dizer e gostaria de ser ouvida, gostaria de
manter uma conversa tranquila com ele, sem que Willian entrasse em surto e
a “excomungasse”.
Ela sorriu em meio à escuridão, pensando em como faria para se
aproximar ainda mais, para despertar o interesse dele e conseguir, enfim, que
o marido se apaixonasse por ela. Era a primeira vez que Sarah pensava
naquele enlace como uma relação verdadeira, que pensava em amor. Poderia
ela despertar o amor no coração de Willian?
Esperava que sim, estava determinada a conseguir isso, e os próximos
passos seriam importantes para alcançar o objetivo. Pretendia se aproximar e
fazê-lo notá-la como mulher.
Ela esperava apenas que tudo fosse fácil, simples, e que o coração dele
estivesse próximo de suas mãos.
Voltou a adormecer, um sono tranquilo e cheio de bons sonhos, como
deveria ser.
***
Pelo visto ninguém tinha o costume de acordar cedo naquela casa.A
mãe de Willian continuava dormindo, assim como o filho, mesmo com o sol
já alto no céu, mas Sarah fora acostumada desde pequena a se levantar com o
clarear do dia. Segundo seus pais, assim ela poderia aproveitar mais o dia e
ter mais tempo para todas as tarefas que tinha para fazer.
Ela crescera numa propriedade no interior da Inglaterra, fronteira com
a Escócia, e tivera uma infância cheia de aventuras nas Terras Altas. Crescera
entre os campos esverdeados, banhara-se em rios cristalinos e temia as
histórias sobre as florestas mal-assombradas. E ainda, quando jovem, sonhara
com os guerreiros de fama conhecida, perguntando-se se algum dia casaria
com algum deles.
Mas os planos do destino foram completamente diferentes, desde a
noite em que o pai de Sarah entrara emcasa com um papel nas mãos, o nome
dela escrito ao lado do nome de um homem. Como ela poderia ter se casado
se não comparecera ao casamento? Mas, sim, era possível, um casamento por
procuração, um acordo entre dois cavalheiros; um pai que vendia a filha
daquela forma horrível.
Sarah tinha perdoado o pai pelo modo como tinha planejado tudo, sem
contar-lhe nada, e também operdoara pelo casamento inesperado, que a
condenara a uma vida de amargura e infelicidade.
Mas naquela noite ele garantira que ela não precisaria nem sequer
conhecer o marido, que poderia continuar vivendo como antes, que tudo se
tratava apenas de um acordo comercial que não lhe dizia respeito. Porém,
como não lhe diria respeito se era sua vida sendo usada daquela forma?
Sarah não estava totalmente convencida e, por isso, dois meses depois
da morte do pai, despediu-se da mãe dizendo-lhe que precisava encontrar o
marido e resolver as coisas. Não aceitaria aquele tipo de enlace, uma jovem
que acreditava no poder do amor e que esperara pelo momento em que
encontraria um bom marido. Nada poderia ser desperdiçado daquela forma.
Foi assim que Sarah chegou à mansão de Willian econheceu o belo
lorde, dono dos olhos verdes mais lindos que ela já vira. Seu marido. Seu
coração disparava toda vez que pensava naquilo, que estava casada com
aquele homem tão bonito, mesmo com as marcas do acidente.
— A senhorita gostaria do desjejum? — a criada perguntou a Sarah,
assustando-a.
— Eu aceito. E Lorde Willian, ainda dorme? — perguntou enquanto se
sentava à mesa.
A criada mudou de expressão, olhando parabaixo.
— Bem, ele já saiu, senhorita.
Sarah interessou-se. Aonde ele tinha ido tão cedo?
— E para onde foi meu marido?
Nervosa, a criada hesitou em falar-lhe a verdade.
— Pode dizer a verdade, Kit — insistiu Sarah.
A jovem assentiu, assustada.
— Lorde Willian vai à casa de jogos todos os dias, senhora.É lá que ele
passa o dia todo — contou a criada, por fim.
Sarah se assustou com aquela informação. Então seu marido era
viciado em jogos? Era uma surpresa saber daquilo tão de repente.
— Onde fica essa casa de jogos, Kit?
— Eu não sei, senhora. A dona se chama Anna, e é uma viúva muito
conhecida na sociedade, comanda sozinha a casa.
A história ficava cada vez pior.
— Algo mais que eu precise saber?
A criada negou.
— Não, senhora. Isso é tudo — respondeu antes de sair depressa.
Sarah ficou sozinha e pensativa, tentando entender que tipo de costume
era aquele que o marido tinha. Era um viciado em jogos e provavelmente
gastava altas quantias em apostas. Isso era ruim.
Assim que pudesse, falaria com Cecil e lhe perguntaria sobre aquele
fato.
***
Naquele mesmo dia, pela tarde, Sarahpediu a Cecilque se reunisse a ela
no pequeno jardim, na lateral da casa, convite também para um chá em um
dia frio.
A mãe de Willian apareceu sorrindo, bem-arrumada, usando um vestido
azul-escuro e joias combinando, o penteado impecavelmente arrumado.
Sentou-se ao lado de Sarah, que lhe serviu chá e perguntou como estava.
— Realmente bem. Estou tendo um ótimo dia —respondeu animada.
Sarah bebeu do chá quente e sorriu para a mulher. Ela sempre estava
feliz e a jovem não entendia o motivo.
— Há algo que eu gostaria de lhe perguntar, senhora.
—Esteja à vontade, minha querida.
Isso era bom. Ela teria liberdade para perguntar livremente sobre o
assunto. Esperava ao menos que Cecil não ficasse brava com a pergunta, nem
a repreendesse.
— Willian, por acaso,é viciado em jogos? — perguntou em voz baixa,
nervosa.
Cecil ficou pálida de repente e deixou a xícara sobre a pequena mesa à
sua frente.
Sarah achou que ela não fosse responder, que fosse contornar o assunto,
ou até mesmo perder a paciência e discutir com ela. Mas a mulher era uma
dama e sabia como se portar em situações de desagrado.
— Bem, acho que você deve ter percebido algo, não é? — Quando
Sarah assentiu, ela continuou. — A verdade é que Willian passa os dias
trancado na casa de jogos, gastando mais dinheiro do que deveria.
— A senhora já tentou falar com ele? — a jovem perguntou,
empenhada.
Cecil fungou, as lágrimas caindo por seu rosto, a sensação de
impotência a dominando, porque não podia fazer nada a respeito.
— Ele não me ouve, querida. Já tentei dizer que está colocando toda a
nossa fortuna fora, mas é inútil, Willian continua indo todos os dias à casa de
jogos. — Limpou as lágrimas com o dorso da mão e respirou fundo. —
Aquela desavergonhada, dona da casa, deve tê-lo seduzido para que ele não
saia mais de lá.
— Ouvi falar de Anna. Ela parece ser bem ousada, verdade? — Sarah
disse com o coração doendo, imaginando o marido com aquela mulher.
Se aquilo era verdade, seria também mais um capítulo de dor e
sofrimento em sua vida, e dificultaria ainda mais seu plano de conquista. Ela
não tinha contado com o fato de que Willian pudesseter uma amante na
ausência da esposa.
— O que pretende fazer, querida? Sei que Willian não a ouve e nem
sequer a olha, então como poderá fazer algo?
— Vou falar com ele de qualquer jeito— disse determinada.
Não ficaria parada vendo o marido gastar inutilmente todo o dinheiro
que possuía, e nem se afundandoem algum tipo de vida errada. Ela se
empenharia em fazê-lo ver o caminho certo.
Falaria com ele assim que tivesse oportunidade e resolveria a questão
de uma maneira simples. Bom, assim esperava ela.
***
Quando a noite caiu e Willian entrou em casa, Sarah já estava
preparada para lhe falar. Esperou que ele trocasse de roupa e descesse para o
escritório em silêncio, ignorando os chamados para o jantar.
Ansiosa, ela repensou tudo o que tinha planejado lhe dizer e a forma
como falaria,a fim de evitar que ele tivesse um ataque de raiva ou algo do
tipo. Então, bateu à porta devagar, esperando que Willian a mandasse entrar.
Mas, em vez disso, a porta foi aberta por ele, que a olhava com raiva, as
feridas no rosto dando-lhe um ar fantasmagórico. Ela engoliu em seco, as
palavras sumiram de sua mente, e já não sabia mais o que dizer.
— O que foi? — ele perguntou examinando-a com o olhar diretamente
em seu rosto.
Ela encarou aqueles olhos verdes que relampejavam à luz da
lamparinae por um momento esqueceu o que tinha ido fazer ali. Eram tão
verdes como os campos da Escócia, tão belos como ela nunca antes tinha
visto.
Precisou esforçar-se para recobrar o plano inicial e sorriu-lhe
esperando que funcionasse.
— Queria lhe falar alguns minutos, senhor — respondeu em atraso,
pouco depois.
— Estou ocupado. — Ele estava fechando a porta, mas ela se interpôs,
bloqueando-o. — O que está fazendo?
— Ouça-me apenas um momento, por favor — pediu desesperada.
Ele entrecerrou os olhos para Sarah e abriu a porta um pouco.
— Tem poucos minutos para dizer o que quer, senhorita — aquiesceu
deixando-a passar.
Sarah entrou no escritório e deu de encontro com o cão da noite
anterior, que a olhava com atenção. Ela se afastou do animal e ficou do outro
lado do cômodo.
— Irei ouvi-la agora — Willian disse sentando-se na cadeira atrás da
mesa.
Ela também se acomodou, noassento em frente a ele, antes mesmo que
Willian a autorizasse a fazê-lo,e embolou as mãos sobre o colo, nervosa,
ansiosa enquanto pensava em um modo de abordar o assunto.
Como começar? Dizendo-lhe que sabia que ele saía todos os dias para
jogar? Perguntando-lhe se tinha uma amante?
— Sua mãe comentou comigo que está preocupada com o senhor —
tentou ela, indo por um caminho mais seguro.
Willian arqueou uma sobrancelha, curioso sobre aquilo.
— Preocupada com o que, senhorita?
Sarah abriu a boca e fechou sem nada dizer, em verdadeiro pânico.
O marido a fitava com diversão, tentando entender o que acontecia
com ela, por que as palavras lhe faltavam.
Mas a coragem venceu o medo e Sarah conseguiu falar.
— Preocupada,temendo que o senhor esteja viciado em jogos de azar
— sua voz soou baixinho, mas o marido conseguiu ouvi-la.
O rastro de diversão sumiu do rosto de Willian, uma sombra de puro
descontentamento tomando conta da sua expressão. Ele se recostou na
cadeira e respirou fundo.
— Está se metendo em um assunto que não lhe diz respeito, senhorita.
Pode sair se já acabou.
— Entendo que seja desagradável para o senhor...
— Talvez seja necessário que eu explique melhor as coisas, senhorita
— interrompeu-a no mesmo instante. — Este terrível arranjo em que estamos
envolvidos é apenas um acordo comercial entre dois homens e não denota
nenhum tipo de sentimentos.
— Eu sei — Sarah disse abaixando a cabeça.
— Sei que sonha em tornar esse casamento real, mas me permita dizer
que está cometendo um grande erro, senhorita. Não tenho nenhum tipo de
interesse em você, e não terei no futuro.
A jovem permanecia calada, ouvindo tudo aquilo sem saber o que
dizer, sem qualquer reação, porque no fundo ele estava certo e ela sabia
disso. Mas Sarah tinha esperanças, era por isso que estava ali, porque ainda
acreditava com toda a sua fé na possibilidade de tornar aquele casamento
real. E não importava se ele não acreditava nisso, ela tinha fé pelos dois, e
não pretendia parar de lutar.
— Suas palavras são amargas, meu senhor. Mas tenho certeza de que
se arrependerá delas no futuro — falou, corajosa.
Willian se aproximou, sem acreditar no que ouvira.
— Está me desafiando?
— Eu não me atreveria, senhor —disse tranquilamente.
Ele se levantou e caminhou pelo escritório em silêncio. Sarah ficou em
expectativa, esperando pelo que ele iria fazer.
— Por que ainda está aqui, senhorita? Retire-se imediatamente —
trovejou, a voz alta e ríspida.
Ela ficou de pé no mesmo instante. Passou pelo marido e estava saindo
quando ele voltou a falar.
— Volte para casa,mulher. Você não conseguirá nada aqui.
— Vamos ver então, senhor — ela sussurrou antes de abrir a porta e
sair.
Sarah não sabia se ele tinha ouvido a última frase e já não se importava
com isso, porque, depois de ouvir tantas palavras amargas, tinha ainda mais
certeza de que precisava ficar naquela casa e conquistar o coração do Lorde
Fantasma.
Willian era um homem amargurado, e Sarah sabia disso. O pai dela lhe
contara sobre o acidente, a relação com o primo e como tudo acontecera. Ela
tinha pena dele, doía-lhe o coração pensar que o marido tivera que passar por
tudo aquilo, ter o rosto deformado por um motivo tão fútil. Ele merecia um
destino melhor.
Resignada, Sarah voltou ao quarto, ainda pensando em como as coisas
poderiam melhorar e no que poderia fazer. Mas estava muito cansada para
pensar em qualquer coisa, então apenas deitou-se para dormir, suspirando na
cama macia.
Dessa vez sonhou com coisas boas, com a antiga vida no campo, com
as lembranças de quando passeava pelos campos verdes e nadava nos rios
cristalinos.
Quando acordou na manhã seguinte, desceu parao primeiro andar e não
se admirou ao notar que era a única acordada àquela hora. Sem pressa, tomou
o desjejum sozinha, na grande sala vazia, e pensou em Willian. Ele já saíra
para os jogos, ouaindaestava dormindo? —perguntou-se.
— Onde está Willian, Kit? — perguntou à criada.
A jovem sorriu antes de responder.
— Dormindo, senhora.
Sarah assentiu; o marido não tinha acordado ainda, mesmo que fosse
tarde. Ele precisava mudar esse costume vergonhoso de acordar ao meio-dia.
A criada voltou dizendo que havia um homem procurando por Willian,
e que ele tinha urgência. Curiosa com o que estava acontecendo, Sarah foi até
o recém-chegado, um rapaz na casa dos vinte anos, usando roupas boas e um
chapéu engraçado.
— Posso ajudá-lo?
— Somente com o Lorde Fantasma, senhorita— respondeu ele.
— Ele não pode recebê-lo agora. Eu posso transmitir sua mensagem a
ele assim que o vir, entende?
O menino considerou por alguns instantes e, depois de um tempo,
acenou com a cabeça concordando.
— É que as contas do Lorde Fantasma estão atrasadas e precisam ser
pagas.
— Contas de jogos?
— Sim, senhorita. Da casa de jogos da Senhora Anna. Precisa pagar as
dívidas.
— E quanto ele deve?
— Oito mil, senhorita — o rapaz respondeu, assustando Sarah.
Tudo aquilo? Era uma pequena fortuna.
— Eu avisarei a ele, rapaz.
O jovem concordou e deixou o salão. Sarah ficou sozinha, pensativa
sobre aquilo. Então o marido tinha contraído dívidas e precisava pagá-las.
Já tinha passado da hora de fazer alguma coisa, pensou determinada.
Willian que se preparasse, pois Sarah não deixaria as coisas daquela
forma.
Capítulo Três
Infortunadamente o dia passou devagar para Sarah, que ficou a maior
parte do tempo no quarto, lendo, esperando pelo momento oportuno, em que
seu marido sairia para a casa de jogos. Pelo visto ele tinha escolhido ir à noite
naquele dia, o que tornava as coisas mais difíceis para ela.
No meio da tarde a mãe de Willian a convidou para um chá na área
externa da casa, onde havia um pequeno e agradável jardim cheio de flores
amarelas e brancas.
Ansiosa, Sarah tinha decidido manter em segredo seu plano, com medo
de que a mãe de Willian discordasse dela e tudo fosse por água abaixo. Era
difícil guardar segredo perante Cecil, já que a senhora era boa em fazer
perguntas e em desconfiar das pessoas.
— Está um pouco pálida hoje, querida — atentou a mãe de Willian,
enquanto levava a xícara de chá aos lábios.
A mulher a olhava com perspicácia, era como se pudesse ver acima da
verdade de Sarah.
— Estou sentindo falta dos passeios pelo campo. Eu costumava tomar
bastante sol, senhora — explicou a jovem sorrindo.
Sentia falta dos campos ensolarados da fronteira, quando os recorria
livremente,sem se preocupar com qualquer questão. Junto de sua amiga
Célia, passava as tardes sob a sombra das árvores,conjecturando sobre a vida
em Londres, e agora,quando experimentava essa sensação, podia dizer que
era angustiante.
Londres a sufocava, com seu ar carregado, o movimento intenso de
pessoas pelas ruas, os animais trotando entre os mercadores
e,principalmente,com a falta de espaço. Ainda que fosse grande,a casa de
Willian era sufocante. Mas ela tinha escolhido ir até ali e não seria a saudade
de casa que a faria desistir de seu plano.
— Vi que falou com Willian na noite passada. Espero que tenha
conseguido algum avanço.
Sarah suspirou. Nada. O marido era difícil, comunicava-se pouco e,
quando o fazia, era para rejeitá-la.
— Seu filho é muito teimoso, senhora. Pensarei em uma forma melhor
de convencê-lo — disse Sarah, bebendo do chá.
Cecil sorriu, porque sabia exatamente como era o filhoe como ele se
comportava.
— Aos poucos conquistará o coração de Willian, menina. Seja paciente
e dedicada, que em pouco tempo ele se apaixonará por você— ela falou
tranquilamente, como que esperando que aquilo acontecesse em breve.
Sarah engoliu em seco. Queria que as coisas fossem tão fáceis assim.
Na verdade, gostaria apenas que o marido a ouvisse, assim as coisas
poderiam decorrer de maneira melhor.
Ela tinha tanto para lhe falar. Gostaria de poder lhe dizer que, desde o
momento em que o vira, havia sentido uma grande conexão com ele, algo que
mal podia explicar; dizer também que sua aparência era apenas um detalhe
diante do homem que era.
— Eu me esforçarei para isso, senhora. Prometo — disse ela
solenemente.
Depois disso Cecilinformou que precisava se retirar e voltou para o
quarto. EntãoSarah viu um homem alto, de cabelos escuros, entrar no
escritório do marido e se perguntou quem poderia ser. Algum amigo?Ela nem
sabia se ele tinha amigos ou se mantinha uma vida completamente isolada.
Deixou o assunto de lado e subiu os degraus da escada, rumo ao quarto.
***
—A que devo a visita, Anthony? — Willian perguntou enquanto servia
ao amigo um pouco de bebida.
O lorde de olhos azuis e cabelos negros sorriu, já sabendo como era o
humor do amigo normalmente.
— Cheguei de Bath ontem e decidi que precisava ver a pessoa mais
bem-informada de Londres — provocou ele, arrancando uma risada do outro
lorde.
Willian entregou a taça a ele e serviu a si mesmo, enquanto recostava-
se na cadeira e suspirava profundamente.
— Está escolhendo mal as pessoas, Anthony. Mal saio de casa, como
bem sabe.
O amigo estalou a língua, revoltado.
— Sabe o que acho dessa sua reclusão, Willian. Deveria estar
convivendo normalmente em sociedade. Todos esperam por sua grande volta.
— Isso não vai acontecer. — Deu um gole na bebida e o fitou. —
Nunca mais me verão.
Anthony deu de ombros, exausto de em vão tentar convencer o amigo.
Sempre tinham aquela conversa, e a resposta de Willian era invariável.
Negação. Era como se estivesse lhe ofendendo por dizer tal coisa, então o
lorde estava decidido a deixar o assunto de lado e a desistir de tentar fazer o
amigo mudar de ideia.
— Preciso ser sincero e dizer-lhe a verdade, que ouvi por aí que uma
certa jovem de aparência agradável chegou a sua residência há alguns dias e
que ela diz ser sua esposa — confessou Anthony, animado.
Willian bufou, irritado.
— Ela é minha esposa — sua expressão era de descontentamento. —
Apareceu em minha casa depois de um ano,com a ideia de que devemos viver
um casamento de verdade.
Anthony riu, mas disfarçou depois de um olhar amargo do amigo.
— E,se bem o conheço, o bom amigo não tem interesse em tornar esse
casamento real. Estou certo? — apostou ele, atrevido.
— Está — concordou Willian. — Ainda não decidi o que fazer com
ela.
— Mande-a de volta — sugeriu Anthony.
Willian o fitou.
— O pai morreu, ela não tem mais ninguém além da mãe — explicou
servindo-se de mais bebida; precisava de uma dose maior para suportar tudo
que estava acontecendo.
— Mande-a para outra casa longe daqui — o lorde deu mais uma
brilhante ideia.
O amigo o encarou com pouca crença em sua fala.
— Ela faria um escândalo, com toda a certeza — explicou Willian,
desanimado.
Anthony deixou a taça vazia sobre a mesa do amigo e respirou fundo,
enquanto em sua mente passavam várias coisas. Havia a solução mais fácil de
todas, então.
— E por que não assumir um verdadeiro casamento com essa jovem?
Pelo que ouvi, ela é bonita e agradável.Pode ser o momento de aceitar que
deve se render a uma mulher, bom amigo — falou o lorde sinceramente.
Os olhos de Lorde Willian relampejaram de pura raiva. Como ele
ousava sugerir tal coisa? Tinha se casado com a jovem apenas por um
negócio com o pai dela. Não tinha intenção nenhuma de assumir um
casamento.
— Eu jamais farei isso. Não vou viver com aquela jovem simplória
como se fôssemos um casal feliz — disse determinado. — Você sabe que eu
não posso me dar ao luxo de ter uma vida assim.
—Acho que está equivocado, Willian. Talvez devesse tentar.
— Falemos de outro assunto, por favor. Como vão seus negócios no
porto?
Anthony sorriu sabendo que o amigo mudaria de assunto daquela
forma. Mas, mesmo assim, acreditava que as coisas pudessem mudar, que
Willian poderia reconsiderar o casamento com a jovem. Bastava tempo para
isso.
Mas por enquanto tratariam de outro assunto de seu interesse também.
Os navios fretados por Anthony chegavam abarrotados de mercadorias
ao porto e seguiam seus destinos por terra. Ele fazia negócios com
vendedores da América e da China, trazia a melhor seda e o melhor vinho.
Bastava o pedido do comprador.
E agora interessava a Willian investir em uma frota de navios também,
começar um negócio com o amigo, porque, como ele mesmo dizia, o dinheiro
precisava ser investido, e não de ficar guardado em gavetas.
— Recebo uma carga vinda da China amanhã. Os melhores tecidos, é
evidente.
— Podemos ir até o porto no próximo mês? Decidirei se invisto na
frota ou não. Preciso saber se é um bom negócio — sugeriu Willian.
— Como quiser. — Olhou para o relógio de bolso e se levantou
imediatamente. —Desculpe-me, mas estou atrasado para outro compromisso.
— Compromisso que usa saias, suspeito — o amigo disse brincando.
Anthony sorriu.
— Não com o dia claro como agora, Willian. Sei ser discreto com
minhas mulheres — provocou o lorde.
Houve uma batida à porta e quem abriu foi a criada, dizendo que o
administrador havia chegado, que esperava para conversar com o lorde.
— Eu vou indo, amigo — despediu-se Anthony, caminhando para a
porta. — Vejo você em breve.
Ele se encontrou com um homem baixinho e calvo quando saiu, mas
notou também, no topo das escadas, uma jovem de vestido azul e cabelos
longos, que ele jurou ser a esposa do amigo. Sorriu, ela era bonita e podia,
sim, ser a verdadeira esposa de Willian. Esperava que a jovem tivesse um
plano dos bons para conquistar o difícil lorde.
Anthony deixou a casa esperançoso de ver o amigo feliz novamente,
depois de todo aquele tempo recluso.
***
À noite, quando todos já tinham se recolhido nos quartos, a jovem se
esgueirou pelos corredores e se escondeu no topo da escada, enquanto ouvia
os passos do marido no andar de baixo. Ele estava saindo e agora cabia a ela
segui-lo, como havia planejado.
Willian saiu pela porta da frente, e ela apressou-se em descer as escadas
em silêncio, porque não queria acordar nenhum criado ou mesmo Cecil. Fez
o mesmo caminho que o marido, seguindo o vulto que saía para a rua. Sarah
usava uma capa grossa, que escondia toda a sua cabeça e o corpo, o que a
protegeria dos olhares de quem se deparasse com ela.
A lua clareava o caminho, e a jovem rezava para não ser pega enquanto
seguia o marido pelas ruas largas. Havia muitas pessoas na rua, e carruagens
chegando para algum evento londrino, o que a deixava infiltrada entre os
outros.
O caminho não era longo, Willian apenas virou à direita e depois à
esquerda; logo estava em frente a um grande salão, que estava de portas
abertas, lotado de pessoas.
Por um momento Sarah sepreocupou perguntando-se se conseguiria
entrar, enquanto via o marido passar pela porta. Mas deu-se conta de que
bastava agir naturalmente e ninguém desconfiaria dela. Ao que parecia, havia
muitas mulheres ali.
E assim, retirando a capa de sobre a cabeça, mostrando o rosto, ela
passou por umhomem alto e corpulento na porta, adentrando o frenesi que era
o grande salão.
O ambiente estava cheio de gente, a maioria sentada em volta de mesas
redondas, cobertas por toalhas vermelhas, e a fumaça dos charutos pairava no
ar, deixando o local sufocante. Sarah notou que o marido havia se sentado ao
fundo, a uma mesa com mais quatro homens, que o cumprimentaram ao vê-
lo. Uma jovem de vestido decotado apareceu, serviu-lhe bebida e saiu
depressa. Logo Willian estava com cartas nas mãos, preparando-se para a
partida.
Escorada contra a parede, Sarah assistia com clareza a todos os
movimentos do marido; estava escondida entre as pessoas que circulavam
pelo salão. A jovem que servia bebidas se aproximou e ofereceu uísque a ela,
que rejeitou no mesmo instante.
Era visível a alegria de Willian enquanto jogava com os amigos, e ela
se perguntava seele não se importava com as dívidas que havia contraído com
a dona do salão. Era cruel o que o lorde fazia, sem pensar na mãe, que vivia
sob o mesmo teto que ele.
Sarah a notou no mesmo instante, era impossível não perceber a entrada
daquelafigura no salão.A mulher usava um vestido vermelho colado ao
corpo, com um enorme decote, os cabelos negros caindo em cachos pelos
ombros e os lábios pintados de carmim. Todos a olharam, e Sarah logo
entendeu que aquela era a dona do salão de que tanto falavam. Era uma
mulher bonita, na casa dos quarenta anos, mas bem apresentável.
Foi na direção de Willian, e Sarah prendeu a respiração quando a viu
cumprimentá-lo e, com grande ousadia, sentar-se no colo dele, sorrindo
largamente.
O coração da jovem disparou, e ela começou a suar frio. Aquela mulher
estava sentada no colo de Willian, marido de Sarah, que também parecia
muito íntimo da “dama”. Foi naquele momento que a esposa do lorde
começou a se dar conta de tudo o que estava acontecendo. Ele tinha um caso
com a dona do salão e estava endividado por conta dela. Era um ciclo sem
fim.
Sentiu raiva, pressionou os dedos contra a palma da mão, desejando
poder ir até lá e dizer algumas verdades aos dois, principalmente a Willian.
Mas precisava se manter escondida, porque do contrário todo o seu plano
acabaria ali;deveria manter a ira controlada, e não fazer um grande escândalo.
— Está sozinha, meu bem? — um homem se aproximou dela, enquanto
fumava um charuto.
Sarah deu um passo para trás, com medo.
— Estou com meu marido — respondeu de pronto, caminhando
emoutra direção.
Ela se aproximou do bar, que tinha cadeiras livres, e se sentou ali por
um momento, esperando estar escondida o suficiente. Ficou sentada naquele
lugar por um tempo; podia ver o marido dali e estava longe o bastante para
não ser notada.
Horas tinham se passado quando Sarah viu o marido se levantar e se
despedir dos amigos, dando um adeus especial à dona do salão, que
desavergonhadamente beijou-o nos lábios rapidamente, chamando a atenção
de muitos.
Depois disso ele se dirigiu à saída, e Sarah aproveitou para segui-lo,
quase perdendo-o na noite. Mantinha uma distância segura evitando que
elepudesse identificá-la na escuridão.A alguma distância de casa, uma chuva
fria começou a cair, molhando completamente Sarah, que deu graças por
estar usando a capa. Willian começou a correr, e sua esposa continuou a
segui-lo, até que ele finalmente entrasse em casa.
Ela aguardou por um momento antes de entrar, tempo suficiente para
que ele se dirigisse ao quarto. Depois, julgando estar mais segura, abriu a
porta devagar e entrou. O salão principal estava vazio, por sorte.
Subiu as escadas devagar, sentindo-se cansada. Chegou ao quarto e
trocou de roupa; em seguida deitou-se na cama, suspirando. As coisas tinham
se mostrado piores do que ela tinha imaginado.
Descobrira sobre o vício em jogos de Willian e, para piorar, havia
descoberto que o marido tinha uma amante, ou o que quer que aquela mulher
fosse dele.
Via-se em uma situação difícil. Ela já não tinha certeza sobre o plano
que havia traçado e tampouco se conseguiria realmente conquistar o marido.
Como poderia concorrer contra outra mulher? Como fazê-lo prestar atenção
nela quando ele tinha outra disponível a qualquer hora?
Sarah deixou de relutar e fez o quevinha evitando havia muito tempo.
Chorou. De pura tristeza, de infelicidade, e de medo. Não voltaria para casa
sem ter o amor de Willian. Era uma promessa, disse ao coração.
E promessas não podiam ser quebradas.
Mas por agora ela precisava apenas dormir um pouco e esquecer tudo
que vira.
Capítulo Quatro
Mia acordou Sarah mais tarde naquela manhã. A noite da jovem havia
sido turbulenta; tremera de febre e sentia dores no corpo, resultado da chuva
que pegara enquanto voltava para casa. Foi difícil levantar-se sem reclamar
do mal-estar que sentia.
Mas, com esforço, conseguiu sair da cama e descer para o desjejum,
teve a sorte de encontrar a mãe de Willian sentada à mesa. Cecil sorriu para
ela assim que a viu e a convidou a sentar-se ao seu lado.
Sarah aceitou e tentou manter uma boa aparência para que a sogra não
notasse seu mal-estar. Não teria como explicar a causadaquilo se fosse
descoberta.
— Acordei mais cedo hoje, querida. Quero ir à modista e à livraria.
Gostaria de me acompanhar? — sugeriu a senhora.
Sarah se animou. Não conhecia nada de Londres, e essa era sua
oportunidade.
— Eu adoraria — respondeu com um sorriso genuíno. — Estou
interessada em alguns livros. Quando morava em minha antiga casa, os
exemplares que eu recebia eram muito antigos.
— Podemos ver os lançamentos — Cecil disse enquanto bebia chá,
olhando para a jovem por sobre a xícara.
— Vou usar parte das minhas economias — contou Sarah pensando no
quanto poderia gastar.
Cecil bateu a xícara na mesa, assustando a jovem.
— De jeito nenhum. Isso é um disparate — exclamou a mulher,
levando a mão ao peito dramaticamente. — É a esposa de Willian, e não é
necessário que gaste suas pequenas economias, minha querida. Ele com
certeza lhe cederá um alto valor para suas despesas.
Oh, não. Isso não. Sarah não queria depender do marido naquele
momento, quando mal conversavam e mal tinham uma relação. Ele a julgaria
interesseira.
— Veja bem, senhora, eu acho que...
— Não discutiremos mais isso. — Cecil ergueu a mão, fazendo-a ficar
em silêncio. — Falarei com Willian sobre o assunto mais tarde. Mas por
agora lhe emprestarei uma boa quantia.
— Não é necessário...
— Sim, é — interrompeu-a novamente.
Sarah ficou quieta. Não havia como discutir com a mulher e, se fizesse
isso, a conversa se estenderia por mais tempo.
Cecil se retirou primeiro, dizendo que sairiam em uma hora, depois que
se encontrassem no salão principal, e que iriam apenas as duas, sem criadas.
Então Sarah subiu para o quarto e encontrou Mia arrumando as roupas no
armário.
— Vou sair, Mia. Escolha uma roupa bonita para mim, sim? — pediu à
criada, enquanto deitava-se na cama novamente, gemendo pelas dores no
corpo.
— Tem certeza de que estábem para sair, senhora? Está resfriada e
deveria descansar — sugeriu a criada.
— Eu estou bem — garantiu Sarah, sentando-se na cama. Sorriu. —
Pegue aquele vestido amarelo de que tanto gosto.
Mia foi até o armário, procurou pela peça e, quando a achou, mostrou a
jovem.
— Esse mesmo. — Levantou-se da cama e começou a despir-se sem
cerimônia alguma, ao mesmo tempo que contava sobre o passeio. — Irei à
livraria com a mãe de Willian. Você sabe o quanto sonhei com isso, Mia.
A criada assentiu entregando o vestido amarelo a ela e a ajudou a vesti-
lo.
— Eu sei, senhora. Fico feliz que esteja realizando seus sonhos —
comentou a moça de cabelos claros.
Sarah correu para a frente do espelho a fim de se olhar, ter certeza de
que a roupa lhe caíra bem. Ajustou as fitas nos ombros e encarou-se no
espelho, considerando se estava tudo bem.
— Eu ainda preciso conquistar o coração de Willian, Mia. Só então
meus sonhos estarão completos — explicou calçando agora os sapatos.
— Está tão bonita, senhora. Permita-me que ajeite seus cabelos?
Sarah sentou-se no banquinho em frente à penteadeira e deixou que a
criada cuidasse de seus cabelos, passando devagar a escova, alisando-os para
trás. Em seguida Mia usou uma fita azul para prendê-los em mechas,
deixando-os com aspecto natural, mas bem-cuidados.
— Usarei meu chapéu. Está muito quente hoje. — Mia entregou a ela a
peça, que foi encaixada delicadamente em sua cabeça. — Como estou?
A criada a olhou dos pés à cabeça, examinando-a com cuidado. Em
seguida sorriu balançando a cabeça.
— Está muito bonita, senhora. Vai encantar todos que encontrar.
Sarah pensou que não era essa sua intenção. A única pessoa que ela
gostaria de encantar era o marido, mas acreditava que,nem mesmo vê-la
daquele jeito surtiria algum efeito nele. Era como se ela fosse invisível para
Willian. Precisa encontrar um modo de fazê-lo enxergá-la como uma mulher.
Mas não sabia como fazer isso exatamente. Estava jogando contra um
homem esperto, que sabia as regras do jogo e que entendia que evitá-la era a
melhor forma de impedi-la de se aproximar. O que Sarah deveria fazer, então,
era, talvez, aproximar-se aos poucos, sem temê-lo, afinal, o que um homem
como ele poderia fazer a uma inocente jovem?
Com tantos pensamentos, Sarah terminou de se arrumar e desceu para o
salão principal, a fim de esperar por Cecil, que logo desceria. Mas, para seu
infortúnio, o cão daquela noite estava ali, sentado em frente ao escritório de
Willian, o que significava que o lorde estava ali dentro.
Ela queria falar com ele, tinha tanto a lhe dizer, mas quando se
aproximava as palavras lhe faltavam, e o medo tomava conta. Não medo dele
precisamente, mas de suas palavras, que eram sempre duras contra ela.
— Está pronta, querida? — era Cecil descendo as escadas, vestida com
um belo vestido rosa e um chapéu combinando.
Estava tão bonita.
— Estou. Estava apenas especulando se Willian está no escritório —
contou espremendo os olhos na direção do cão.
— Ele não sairá tão cedo daí — disse a mulher suspirando. — Soube
que está resfriado devido à chuva de ontem à noite. Não se sente bem, pobre
coitado.
Sarah prestou atenção às palavras de Cecil e sentiu-se mal ao saber que
o marido estava doente. Sabia que não deveria se importar com ele depois de
vê-lo nos braços de outra mulher, na noite anterior, mas sobre isso tinha
pensado muito e tinha decidido: teria Willian para si de uma forma ou de
outra. Assim que começasse a encantar-se com ela, à medida que fosse se
apaixonando, ele deixaria de ver a outra. Talvez isso fosse completamente
humilhante para Sarah, mas a jovem acreditava que assim as coisas
funcionariam. Ele era seu marido e logo lhe devia fidelidade. Em breve
Willian deixaria aquela vida libertina e passaria a amá-la de verdade.
— Vamos? — convidou Cecil, apontando para a porta.
Com um último olhar para o escritório, Sarah se colocou ao lado da
sogra, enquanto as duas saíam para a rua.
Fazia calor, o sol estava alto no céu, e o típico aroma, pouco agradável,
flutuava pelas ruas abarrotadas de gente. Pessoas gritavam vendendo laranjas
e porcos, enquanto outras perambulavam alegremente; senhoritas passeando
em seus vestidos coloridos, recebendo cumprimentos de homens na rua. Cecil
e Sarah andavam pela lateral da via e desviavam-se dos vendedores, quando
encontraram um grupo de militares fardados. Eleschamaram atenção ao
redor, arrancando suspiros de jovens que se escondiam atrás de leques e
tentavam ocultar os sorrisos matreiros.
Andaram algumas ruas, até chegarem à modista que Cecil tanto queria
visitar, uma loja grande, cheia de tecidos coloridos, na esquina de uma rua.
Uma mulher na casa dos cinquenta anos, de cabelos curtos, vestido azul e um
sorriso amigável, apareceu. Sarah se sentou e esperou pela mãe de Willian,
que provou os vestidos que havia encomendado.A jovem pegou-se sorrindo
ao ver como a mulher estava feliz com as peças que tinha escolhido.
Enquanto esperava, Sarah notou um uma mulher de vestido vermelho
entrando na loja e logo a reconheceu. A dona da casa de jogos. A jovem
engoliu em seco, enquanto espreitava a mulher, que estava escolhendo fitas.
A modista conversou com ela por um momento e em seguida a mulher saiu
da loja, dizendo que voltaria outro dia.
O rosto de Sarah queimava, e ela não tinha como exprimir toda a raiva
que sentia sem que alguém notasse. Mal conhecia a mulher, mas não a
tolerava o mínimo. Que tipo de mulher anda com um homem casado?
— Estamos prontas, Sarah — Cecil disse, mostrando as caixas com os
vestidos.
A jovem se levantou e a acompanhou para fora da loja, as duas
caminhando até a livraria. Mas naquele momento toda a empolgação de Sarah
tinha ido embora,graças ao encontro coma amante de Willian.
— Vamos ver alguns livros. — Sarah seguiu a sogra para dentro da
livraria.
Os olhos da jovem brilharam quando avistou todos aqueles exemplares.
Havia livros do chão ao teto, e ela mal conseguia ler os títulos. Passou as
mãos pelas capas, sentindo a textura grossa do papel, e suspirou encantada.
O dono da livraria, um senhor de idade, apresentou às duas os últimos
lançamentos de romances e contou-lhes sobre um autor novo que estava
fazendo sucesso em Londres.
— Vamos levar. — Cecil apontou para três títulos.
O senhor correu para embrulhar os livros e, ainda assim, Sarah não
parava de olhar para as prateleiras.
Enquanto as duas saíam da livraria, uma mulher de cabelos louros
apareceu em frente a elas e sorriu para Cecil, que correspondeu ao gesto.
— Holly, que bom vê-la — a mãe de Willian disse.
A outra mulher olhou para Sarah com curiosidade.
— Cecil, há tempos não a vejo. Quem é a jovem?
Sarah fitou Cecil, que tomou uma longa respiração antes de responder.
— É a esposa de Willian. Chegou há poucos dias — explicou.
Holly assentiu, olhando para a jovem de cima a baixo.
— Prazer em conhecê-la, menina. Está convidada a minha casa, peça
aCecil que a leve.
— Eu agradeço, senhora — Sarah disse solenemente.
A mulher se despediu com um aceno, ainda deixando olhares sobre a
jovem. Cecil estava com uma expressão irritada e se calou completamente.
As duas decidiram voltar para casa, e Sarah caminhouao lado de Cecil
com preocupação, sem entender o que tinha acontecido com a sogra.
Chegaram pouco depois e, quando entraram no salão principal, a mãe
de Willian sorriu, suspirando.
— Foi um passeio muito agradável, querida. Agora descanse, sim? — e
se retirou deixando Sarah sozinha.
Segurando os livros que comprara, a jovem pensou no marido
perguntando-se se ele estava bem e se precisava de algo. Enquanto subia para
o quarto, decidiu que iria preparar um chá para ele. Usaria folhas da laranjeira
que havia no jardim e adoçaria com mel.
Deixou os livros sobre a cama, junto com o chapéu, e saiu do quarto,
dando de cara com Willian no corredor. Ele a olhou dos pés à cabeça e depois
deu as costas a ela, que mantinha um sorriso no rosto.
Entrou no quarto, batendo a porta com força, e Sarah se perguntou se
ele estava irritado. Dando de ombros, desceu para a cozinha, pouco depois de
passar pelo jardim, onde colheu as folhas de laranjeira. Depois as colocou
em uma xícara, enquanto despejava água fervente em cima. Em seguida
adoçou com duas colheres de mel silvestre.
Satisfeita, ela pegou a xícara e subiu para o segundo andar, em direção
ao quarto de Willian. Parou em frente à porta, a coragem para bater faltando-
lhe.
Mas tinha ido até ali e não deveria desistir agora. Precisava resistir à
negação de Willian e fazê-lo ao menos aceitar o chá.
Tomou uma longa respiração e enfim bateu à porta, esperando que ele
abrisse. Podia ouvir os passos dele se aproximando.
A porta se abriu e Willian a fitou com desinteresse.
— O que deseja? — perguntou ele.
Ela lambeu os lábios, nervosa.
— Soube que está se sentindo mal e então preparei este chá para que
melhore — explicou mostrando a xícara quente.
— Eu não quero. Vá embora. — Willian tentou fechar a porta, mas ela
colocou o pé na frente.
— Espere! —pediu a jovem fitando-o nos olhos. — Ao menos
experimente o chá. Usei folhas da laranjeira do jardim.
Os olhos de Willian se estreitaram na direção dela e, por um instante, a
jovem achou que ele estivesse lendo sua alma.
De repente ele abriu a porta, indicando a ela que entrasse.
— Entre, senhorita —pediu e, quando ela passou, trancou a porta
novamente.
Sarah se viu dentro do quarto do marido, um lugar escuro, de cortinas
fechadas, e que cheirava a tabaco. Ele fumava? A cama estava desarrumada
indicando que ele havia se deitado recentemente, e em sua escrivaninha havia
vários papéis, além de cera para selos. Mas o que mais chamou a atenção de
Sarah foi um objeto grande e inusitado, que não deveria estar ali escondido
dentro de um quarto. Um piano encostado próximo à janela, como se fosse
um casaco esquecido.
Ele tocava? Ela queria saber, saber de tudo sobre ele.
— O chá, senhorita — Willian disse chamando a atenção dela.
Sarah entregou a ele a xícara, e o marido tomou um gole do chá quente,
enquanto seus olhos estavam sobre ela.
A jovem estava constrangida por receber tamanha atenção e não sabia
o que fazer com as próprias mãos, inquieta. Olhava para os pés e respirava
aos poucos, nervosa.
— Usou mel para adoçar? — ele perguntou.
Ela assentiu, sem conseguir responder.
Willian caminhou pelo quarto, seus olhos verdes dançando sobre o
corpo dela, examinando-a com cuidado, como se a avaliasse. Isso apenas a
deixava mais tímida ainda e servia para fazer o marido parecer impiedoso.
Por que ele agia daquele modo?
— Tem medo de mim? — Willian perguntou, uma sobrancelha
subindo em seu rosto.
— N-não — respondeu ela, erguendo os ombros.
Ele riu baixinho. Deixou a xícara sobre a escrivaninha e caminhou até
o piano, sentando-se no banquinho. Os olhos de Sarah cresceram na direção
do marido, ansiosa para vê-lo tocando.
— Gostaria de ouvir algo? — ela assentiu,e ele continuou. — É uma
canção de ninar antiga.
Willian começou a tocar uma música suave, com notas doces,
delicadas, que faziam Sarah sorrir. Ela imaginou um bebê ouvindo aquela
música e adormecendo tranquilamente. Era lindo.
Os dedos do lorde eram ágeis sobre as teclas, e ajovem notou cicatrizes
sobre o dorso das mãos dele, provavelmente decorrentes do acidente. E, bem,
a imagem dele vestido de negro...As feridas no rosto davam-lhe o ar de um
verdadeiro fantasma. Ela podia entender o apelido, mas Willian era lindo
daquele jeito. Sarah sentiu o coração apertado e um frio no estômago, então
logo deu-se conta do que acontecia: queria poder beijá-lo ao menos uma vez.
Mas como o faria, se ele mal deixava que se aproximasse?
— É lindo. Com quem aprendeu a tocar piano?
Willian considerou por um momento.
— Com meu pai. Ele era bom nisso — respondeu sorrindo com as
recordações.
Estavam em sua memória as aulas em que o pai lhe ensinava piano e
em que, depois, oferecia-lhe biscoitos e leite. Era apenas uma criança, sem
qualquer maldade.
— Agora você deve ir, senhorita. — Ele se levantou. — Não é certo
que fiquemos no mesmo ambiente desta forma.
— Mas somos casados, milorde — reclamou ela, tirando um olhar duro
dele.
— Não me lembre desse arranjo estranho. — Segurou-a pelos ombros
e a empurrou até a porta. — E não volte a me procurar, senhorita.
— É certo que eu irei — garantiu ela.
Ele a achou petulante. Como podia desafiá-lo assim?
— Pois seu empenho não terá nenhum efeito. Obrigado pelo chá, e
adeus!
Willian a empurrou para fora e em seguida bateu a porta na cara dela,
que àquela altura estava rindo. Rindo do jeito do marido. Esperava que ele
ficasse mais irritado, mas ao menos conversara com ela.
Foi para o próprio quarto, ainda com um grande sorriso, porque agora
sabia que podia conversar com o marido sem que ele sofresse algum tipo de
surto. Ela era tolerável para ele.
— Em breve me amará, milorde —disse baixinho enquanto se deitava
na cama.
Ela tinha certeza disso, como do sol preso no firmamento.
Bastava tempo para isso.
Capítulo Cinco
Numa tarde ensolarada e quente, Cecil recebeu a visita de uma velha
amiga. Com as saias esvoaçantes e o cabelo em desalinho, Beatrice chegou,
com as bochechas rosadas pelo calor, e deixou a sombrinha na mão da criada.
As duas se sentaram no salão principal, onde Cecil pediu à criada que
preparasse um refresco para a amiga, enquanto Beatrice desatava a falar.
— Senti sua falta no último sarau — disse ao bebericar a bebida.
Cecil sorriu calmamente.
— Como sabe, minha nora está conosco, e eu não quis deixá-la
sozinha.
Os olhos de Beatrice cresceram.
— Sim, eu soube que seu filho tem uma esposa. Uma grande surpresa,
verdade?
— Realmente, é uma novidade e tanto — concordou Cecil com um
leve sorriso.
— Será possível que ela desça para que eu a veja? — a mulher
perguntou curiosa.
— Sinto muito, mas ela está com dor de cabeça. Não poderá descer —
Cecil respondeu e bebericou do refresco, enquanto sentia os nervos atacados.
Ela sabia que a amiga era uma faladeira, e que queria ver Sarah para
que pudesse falar depois que saísse dali. Cecil faria o possível para preservar
a nora dos lábios maliciosos que rondavam a cidade.
— É uma pena, realmente. — Beatrice suspirou desanimada. Mas logo
levantou a cabeça, e seus olhos brilharam com algo que, Cecil diria, beirava o
maligno. — Suponho que não saiba do que estão falando sobre seu filho, não
é?
— É evidente que não — Cecil disse começando a sentir-se nervosa.
O que falavam de Willian?
O sorriso de Beatrice foi quase como a face do Diabo. A mulher
eramaldosa em suas fofocas e não tinha pena de ninguém. Cecil sabia que
algo ruim sairia dos lábios daquela mulher.
— Dizem que seu filho está traindo a esposa com a dona da casa de
jogos. Um romance, se me entende.
Cecil entendia tudo. Sentiu o corpo se arrepiar e pensou em mandar
Beatrice imediatamente embora. Mas não podia fazer isso antes de contarsua
versão dos fatos.
Respirou fundo e encarou a visita.
— Uma grande mentira, é claro. Meu filho é fiel à esposa. Boatos
infundados estão sendo criados contra Willian, mas não passam de mentiras.
Compreende, não é?
— É claro — disse Beatrice, mudando de opinião rapidamente. —
Boatos infundados, com certeza.
— Eu me sinto cansada com toda essa fofoca que existe em nossa
sociedade. — Cecil levou a mão ao peito, ofendida.
— É lamentável mesmo. — Beatrice suspirou. — Como sua amiga,
achei melhor avisá-la do que está acontecendo.
— Eu entendo. —Um sorriso amarelo surgiu nos lábios de Cecil.
Ela tinha muitas coisas para dizer àquela mulher, mas pronunciá-las
não era de bom-tom para uma dama. Estava controlando a raiva.
Não demorou para que Beatrice se fosse deixando Cecil aliviada.
Sozinha, esta soltou o ar preso nos pulmões e tentou se acalmar.
A fofoca era grave e colocava em risco a reputação de toda a família.
Ser alvo de comentários nos salões de Londres era tudo que uma família não
queria, e agora Cecil começava a pensar rapidamente no que fazer, em como
agir. Acreditava que a primeira coisa a fazer era falar com Willian, já que ele
era o motivo da fofoca; depois os dois juntos decidiriam o que fazer.
Resignada, foi até o escritório do filho, bateu à porta e esperou. Estava
nervosa, mal sabia como iniciar a conversa sem entrar em desalinho.
Ele abriu a porta e encarou a mãe com uma expressão neutra,
despreocupada.
— Tenho algo a dizer —disse decidida.
— Entre — ele a convidou a passar.
Cecil sentou-se na cadeira em frente à mesa do filho, que se sentou na
outra extremidade e ficou fitando-a curiosamente. Ele não dizia nada,
esperava pelas palavras da mãe.
— Uma amiga esteve aqui hoje à tarde. Trouxe algumas notícias.
— Algo grave, suspeito, para que esteja aqui — sugeriu Willian.
Ela olhou para asmãos sobre as pernas e suspirou de leve.
— Há comentários de que você é amante da dona da casa de jogos, e
isso é muito ruim, porque todos já sabem que é casado e que sua esposa mora
nesta casa. Pode imaginar o escândalo.
— Apenas comentários, mãe. Não vamos nos preocupar — Willian
disse com ar displicente.
Cecil se ajeitou na cadeira.
— Tudo culpa sua, Willian, que fica junto daquela mulher. Como
abafaremos o escândalo agora?
— Deixemos que as coisas se acalmem sozinhas. Ademais, como as
pessoas souberam que minha esposa está em nossa casa? — ele perguntou
encarando a mãe.
As bochechas de Cecil se tornaram vermelhas de vergonha.
— Bem, eu levei Sarah para passear e talvez as pessoas a tenham visto.
Mas isso não é importante. Não tente livrar-se da culpa por andar com aquela
mulher, Willian.
Ele deu de ombros.
— Eu era livre antes de ela chegar e atrapalhar tudo.
— Mas as coisas mudaram agora que ela chegou, filho. Agora você é
um homem casado e precisa respeitar sua esposa — Cecil explicou a ele.
Willian revirou os olhos. Não considerava válido aquele casamento de
qualquer forma. Nada do que fizesse poderia ser prejudicial.
—Acho que sei o que fazer quanto ao escândalo, mãe. Eu já tinha
planos e agora acho que seja um bom momento.
— E qual é? — quis saber ela.
Ele se inclinou para a frente e colocou os cotovelos sobre a mesa,
fitando a mãe.
— Vamos para o campo por um tempo, mãe. Podemos ficar até as
temperaturas diminuírem e assim voltamos. Até lá ninguém se lembrará de
mais nada.
E havia mais, coisas que ele não queria contar à mãe, mas que haviam
se tornado urgentes. Contraíra dívidas na casa de jogos e não tinha como
pagá-las naquele momento. O dinheiro que restara ele tinha decidido investir
em negócios de navegação, junto do amigo. Não era um engano, Willian
ainda tinha reservas de dinheiro, mas nestas esperava não ter que mexer. A
viagem seria um bom jeito de acalmar as coisas.
—Parece-me umaboa ideia. O ar do campo me fará bem — Cecil disse
animada com a ideia. — E Sarah vai se sentir bem também.
— Ela já sabe de tudo?
— Não, eu decidi dizer a você primeiro. Penso que tem que dizer a ela,
Willian.
Ele fechou a cara. Não era uma boa ideia conversar com aquela mulher.
— Vou deixar essa tarefa para você, mãe.
Cecil bufou, irritada.
Levantou-se e estava prestes a sair, quando perguntou:
— Quando partiremos?
— Amanhã mesmo. Em silêncio, sem que ninguém saiba.
Ela concordou.
— Desse jeito, parece que estamos fugindo, Willian.
O filho fitou a mãe.
— No final é isso mesmo, mãe. A senhora sabe disso.
Cecil aproveitou o momento para sair do escritório sem olhar para trás,
caminhando a passos largos para fora dali.
Willian levantou-se e caminhou pelo estreito cômodo, pensando sobre
a viagema Devonshire e no quanto seria bom para ele ficar longe de toda a
Londres. A calmaria do campo e o ar fresco lhe fariam bem, e ele não teria
nada mais com que se preocupar.
Ponderou, tinha sim. A esposa indesejada, que não fora embora e que
insistia em um casamento real com ele.
Talvez, no campo, ela prendesse a atenção em outras atividades e o
deixasse em paz. Era tudo que ele queria. Não queria mais se envolver com
aquela mulher, que lhe causava arrepios.
***
Sarah estava empolgada com a leitura do livro que havia comprado
junto de Cecil. Era uma história de amor, e ela ansiava por saber se o casal
superaria as adversidades do relacionamento dos dois. Torcia para que sim,
estava o dia todo lendo e esperava pelo final feliz.
Ouviu alguém bater à porta e não se surpreendeu ao encontrar Cecil
parada no corredor. Sorriu-lheao vê-la.
Sarah convidou-a para entrar, e a senhora o fez, entrando no quarto da
jovem.
— Como passou o dia, minha querida?
— Muito bem, estava lendo. — Sarah apontou para o livro em cima da
cama. — Aconteceu alguma coisa, senhora?
A mulher olhou para os pés, nervosa.
— É melhor que se sente primeiro. — Fez Sarah acomodar-se na cama
antes de continuar. — Você sabe como as pessoas são fofoqueiras, não é?
Falam de todo mundo. E em Londres não é diferente. Pois bem, meu filho,
Willian, virou motivo de fofoca recentemente.
— E por qual motivo ele seria alvo de fofocas?
Cecil engoliu em seco, sabendo que estava sem saída. Teria de falar.
— As más línguas dizem que ele é amante da dona da casa de jogos.
Uma grande mentira, é claro, mas é incontrolável a língua dos outros.
Sarah agarrou as saias do vestido.
Ela tinha visto com os próprios olhos o marido com a mulher e por isso
não estranharia que as pessoas começassem a comentar sobre isso, ainda mais
com a chegada dela. Willian era um homem casado se encontrando com uma
mulher luxuriosa.
— Temo que muitos saibam que você está aqui, Sarah. E isso
aumentou os comentários de que Willian trai a esposa — continuou Cecil.
Sarah ainda se mantinha impassível, de queixo e ombros erguidos. Não
se abalaria com aquilo. Sabia que podia acontecer a qualquer momento. E, de
toda forma, estava preparada para isso.
— E o que seu filho decidiu fazer? — perguntou Sarah, calmamente.
Cecil começou a andar de um lado para o outro, procurando as palavras
certas.
— Willian decidiu que passaremos algum tempo no campo, até que o
escândalo passe. Apenas algumas semanas, tempo suficiente para que a
sociedade esqueça e encontre um novo escândalo com que entreter-se.
— Então partiremos em breve?
— Acredito que amanhã mesmo, minha querida. Peça a sua criada que
a ajude com seus baús. No final, essa viagem será boa para nós. Willian
ficará longe daquela mulher e você terá chance de conquistá-lo.
Sarah sorriu, mas sem alegria.
A mulher saiu do quarto e a jovem respirou fundo, sentindo-se uma
tola. Mas ela sabia antes de todos, tinha visto com os próprios olhos a mulher
no colo do marido, e mantinha-se em silêncio. Então Willian escolhera fugir,
partir para o campo e permanecer lá até que a sociedade esquecesse esse
pequeno deslize da parte dele. Talvez funcionasse e, quando voltassem,
ninguém mais lembrasse do acontecido, mas ela ainda lembraria, porque
sabia que, depois, ele voltaria para a dona da casa de jogos. Era questão de
tempo.
Sarah julgava a viagem inútil, mas não diria nada, porque omarido não
a ouviria. Para ela era mais fácil ficar e enfrentar a situação de peito aberto.
Mas uma mulher não tinha voz no casamento, e ela muito menos, uma vez
que nem reconhecida como esposa era.
Então bastava concordar e se preparar para a viagem do dia seguinte.
***
Logo pela manhã via-se uma confusão de baús descendo as escadas.
Criados carregavam objetos seguindo as ordens dos patrões e organizavam
tudo nas duas carruagens estacionadas à frente da casa, de prontidão para a
viagem.
Quem passava questionava-se para onde a família estava indo, se seria
uma viagem curta e se iriam para longe.
Cecil foi a primeira a descer as escadas de entrada da casa e ir até a
carruagem, sendo ajudada por um lacaio. Ela notou que havia pessoas em
frente à casa, curiosas com o que estava acontecendo. Empinou, então, o
nariz e endireitou os ombros, numa atitude austera. Não se humilharia perante
ninguém e nem responderia a perguntas sobre onde estava indo. Ficou dentro
da carruagem, esperando por Sarah.
A jovem desceu em seguida e estranhou o acúmulo de pessoas em
frente à casa, mas decidiu não se importar com isso. Viajaria com
Cecil,enquanto Willian iria em outra carruagem, o que não foi uma surpresa
para Sarah; duvidava que o marido dividisse a carruagem com ela.
O último a aparecer foi Willian. Usando roupas pretas e um chapéu de
topo alto, passou rapidamente, dando pouca visão aos curiosos. Entrou na
outra carruagem e confirmou com o lacaio que podiam partir, dando assim
início à viagem.
Sarah sabia que viajar com Cecil seria agradável,que a sogra era
animada e que não a deixaria quieta. Mas a jovem não estava muito
empolgadapara conversar durante o trajeto. Mal respondeu às perguntas da
mulher e em algum momento fingiu adormecer, somente para ficar em paz.
A viagem não era tão longa, demandava um dia inteiro e, no final da
tarde, já era possível avistar pela janela os campos verdes de Devonshire, um
lugar com grandes propriedades, as quais se viam pelo caminho. Sarah mal
tinha chegado e já sentia o frescor do ar do campo nos pulmões. De repente
uma alegria alcançou-lhe o coração,porque aquele lugar lembrava sua antiga
casa, lugarem que era feliz.
—Serei feliz aqui também — sussurrou, enquanto olhava pela janela.
As carruagens pararam em frente à grande casa de madeira branca, e as
portas foram abertas, permitindo que Sarah descesse primeiro. Ela olhou
encantada para a construção. Era enorme, com dois andares, janelas que
Sarah mal podia contar.
— Minha adorável casa — disse Cecil ao lado dela.
Willian desceu, parou um pouco para observar a casa e em seguida
subiu as escadas, abrindo a porta com ímpeto. Nenhum criado fora avisado de
que chegariam ali naquele dia. As criadas, quando o viram, ficaram em
pânico, e um jovem de cabelos negros apareceu, vindo dos estábulos.
Ele cumprimentou Cecil e Sarah, então esperou por Willian, que voltou
de dentro da casa rapidamente, irritado.
— Todos são inúteis! — rugiu com as mãos na cintura.
— Sou Eddy, administrador da propriedade. É bom recebê-lo de volta,
senhor. E uma surpresa também — o jovem disse com um sorriso genuíno.
Willian ainda parecia mal-humorado.
— Diga às criadas que levem os baús para dentro — orientou ele.
— Sim, senhor. — Rapidamente o rapaz saiu em busca das criadas
assustadas.
— Vamos entrar — Cecil disse a Sarah, que a acompanhou.
Enquanto subiam as escadas, a jovem se distraiu olhando para o outro
lado e não viu um defeito na escada, onde tropeçou, caindo ao chão.
Ela tentou se levantar, mas sentiu o tornozelo latejar e não conseguiu se
mover. Mas, quando Sarah menos esperava, braços a seguraram pela cintura
e a ergueram com facilidade, como se ela pesasse como uma pluma.
Era Willian quem a recolhera do chão e a colocara de pé. Ela se virou
para ele e, com o coração aos pulos, tentou agradecer.
— Obrigada, senhor. Eu...
— Não é preciso se incomodar buscando palavras para isso, senhorita.
Eu apenas a ajudei — ele disse interrompendo-a.
Passou por ela e subiu os degraus restantes.
Sarah ainda sentia o coração palpitando rapidamente, e nem mesmo o
chamado de Cecil foi suficiente para libertá-la do transe em que se
encontrava.
— Vamos, menina — a mãe de Willian a pegou pelo braço, fazendo-a
acordar.
As duas caminharam para dentro da casa e novamente Sarah viu-se
encantada com um salão tão bonito e amplo. Havia até uma grande lareira ali.
As criadas corriam de um lado para o outro, ajeitando tudo para os recém-
chegados, e era visível o desespero das jovens, surpreendidas pela chegada
dos patrões.
Enquanto todos se organizavam, Sarah decidiu dar um pequeno passeio
pensando que seria bom para seu tornozelo. Deixou Cecil sozinha e saiu da
casa, admirando tudo ao redor, até que notou o estábulo mais à frente e
decidiu ir até lá.
Caminhou devagar até as baias onde ficavam os cavalos e ficou na
ponta dos pés para admirá-los. Havia um potro negro, de pelo brilhante, o
qual chamou sua atenção. Ela esticou o corpo para tocá-lo, mas ele acabou se
assustando.
— Luz da noite é arisco, senhora — uma voz surgiu de trás de Sarah.
Ela virou-se rapidamente.
Era Eddy, o administrador. Mas ele parecia tão jovem, de cabelos
negros desgrenhados e olhos esverdeados.
— Ele é muito bonito — Sarah disse sem jeito por ter sido pega.
— Ele tem a cor do pai. Era um dos melhores cavalos da região,
senhora.
— Eu acredito que sim. — Juntou as saias do vestido e passou pelo
rapaz.
— Se algum dia quiser montar, é só dizer, senhora — Eddy falou assim
que ela deu as costas a ele.
Sarah parou.
— Eu adoraria — disse simplesmente, antes de continuar por seu
caminho.
O jovem sorriu, encantado pela beleza da senhora,era graciosa. Quanto
ele não daria para ao menos tocar a delicada pele de seu rosto com a ponta
dos dedos...
Era loucura, ele sabia, mas se encantara com ela à primeira vista, como
um pobre tolo.
***
Sarah sentia-se cansada quando a noite caiu e agradeceu aos céus
quando a criada, a pedido de Cecil,serviu-lhe o jantar no quarto. Havia sido
um dia cansativo e tudo que ela desejava era poder deitar-se na confortável
cama e descansar até o outro dia.
Mas isso não aconteceu, porque logo depois Cecil veio visitá-la, com a
desculpa de que tinha um assunto sério a tratar.
— Desculpe vir vê-la a esta hora, mas eu precisava falar com você,
querida.
— Estou sem sono — mentiu e sorriu. — Do que se trata?
Cecil sentou-se na cama e suspirou. Sarah já conhecia aquele sinal,
significava que algo sério estava por vir.
— Criei um plano para que meu filho se apaixone por você —
começou ela, animada. — Para que isso aconteça, é preciso que passem um
bom tempo juntos. E eu pensei que ele poderia ensiná-la a cavalgar.
Sarah mordeu lábio.
— Eu já sei cavalgar, senhora. Há muitos anos meu pai me ensinou.
Cecil ficou vermelha no mesmo instante.
— Ora, ele não precisa saber desse detalhe. Pode achar que é sua
primeira vez cavalgando. Confie em mim, menina, funcionará.
— E como irei convencê-lo a me ensinar? Ele nem sequer tolera minha
presença — ela disse desanimada.
Ficando de pé, Cecil sorriu erguendo o indicador para cima.
— Eu mesma o convencerei. Deixe isso comigo. Amanhã mesmo
falarei com ele sobre o assunto — falou convencida de que iria dar certo.
— Eu agradeço, senhora. Farei de tudo para que Willian se apaixone
por mim — prometeu, esperançosa.
— Agora durma, menina. Está com olheiras enormes — Cecil disse
indo para a porta.
Quando se viu sozinha, Sarah jogou-se sobre a cama e sorriu feito uma
menina. Se o plano de Cecil funcionasse, ela finalmente teria tempo para
conhecer melhor Willian e se aproximar dele. Poderia entendê-lo melhor e
compreender por que era tão arredio. E, quem sabe, pudesse chegar até seu
coração, por fim fazê-lo amá-la.
Ela tinha esperanças e agora, mais do que nunca, acreditava que aquela
viagem ao campo era o momento perfeito para agir. Longe das tentações de
Londres, seria mais fácil fazer Willian notá-la como mulher.
Sarah dormiu tranquilamente naquela noite, sonhou com Willian
sorrindo para ela, feliz com alguma coisa que fora dita e com cavalos
correndo pelo campo. E,quando acordou na manhã seguinte, estava pronta
para começar com o plano de conquista. Estava esperando apenas por Cecil.
Desceu para o andar de baixo e encontrou a mesa do desjejum posta,
mas, como era muito cedo, deduziu ser a única por ali. Enquanto Sarah se
servia de ovos e pão, Cecil apareceu sorrindo de orelha a orelha, o que era um
bom sinal.
— Bom dia, minha querida. Espero que tenha dormido bem.
Sarah deu um sorriso gentil à sogra.
— Tive uma boa noite de sono — respondeu lembrando-se dos sonhos.
Cecil se sentou ao lado dela e não parou de falar um minuto sobre tudo
que tinha de fazer na propriedade, das amigas que pretendia visitar,
ressaltando a pretensão de levar Sarah junto. Também dizia que gostaria de
voltar a bordar, atividade que tinha deixado de lado desde que se mudara em
definitivo para Londres, o que tinha lhe roubado todo o tempo disponível.
Sarah a ouvia com atenção e se perguntava como uma mulher como
Cecil podia ter tanta energia e disposição para falar. Lembrava sua mãe, que
também falava daquele jeito e que muitas vezes recebia reprimendas do
marido, para que falasse menos e cuidasse das palavras. Ao contrário da mãe,
Sarah era mais contida, falava somente o necessário e se limitava a poucas
palavras, padecia de uma timidez que a fazia sofrer muito.
— Eu tenho novidades, menina. Falei com meu filho esta manhã
quando ele saiu para cavalgar. Consegui convencê-lo a lhe dar aulas de
montaria — disse batendo palminhas de alegria.
— Não tenho como agradecer, senhora. Não posso imaginar como
conseguiu isso — Sarah disse.
E a jovem não sabia que Cecil necessitara de todo o poder de atuação
que possuía para convencê-lo do que queria. A mulher precisara chorar
dizendo que era um pedido especial de uma mãe desiludida com a vida, e que
jamais o perdoaria se ele dissesse não. Apelara, ainda, dizendo que a pobre
esposa de Willian era como uma criança, inocente, e que tinha prometido a
ela que o marido lhe ensinaria. Por fim, quando já não suportavamais os
pedidos incessantes da mãe, o homem disse que ensinaria Sarah a montar
desde que a mãe parasse de chorar.
E dessa forma Cecil conseguira convencer o filho, que esperaria por
Sarah nos estábulos antes do almoço.
A jovem correu para se arrumar, calçar as botas certas e colocarum
vestido mais apropriado. Sentou-se em frente ao espelho e trançou os cabelos,
lamentando a falta da criada, que tinha ficado em Londres;Mia saberia como
fazer melhor. Mas, ainda assim, encontrava-se animada com a primeira aula.
Desceu logo em seguida, passando por Cecil no salão e sorrindo-lhe.
Deixou a casa e seguiu na direção dos estábulos, encontrando o marido a sua
espera.
Ela não evitou sorrir ao vê-lo. Willian usava uma calça preta e uma
camisa perfeitamente branca, com dois botões abertos, os cabelos loiros
desgrenhados, e os olhos verdes cintilando na direção dela.
— Vou ensiná-la a montar, senhorita. Espero que possa aprender
rápido para tornar esse tormento menos difícil.
Aquilo era um tormento para ele? — perguntou-se Sarah.
Willian abriu a baia onde estava um cavalo cor de caramelo e o puxou
para fora, levando-o para a frente. Olhou para trás e fez um sinal para que
Sarah o acompanhasse. Ela o seguiu enquanto ele levava o cavalo pelo
campo, passando em frente à casa, despertando a curiosidade dos criados.
Andaram bastante, o suficiente para ficarem longe da casa e dos estábulos.
Willian então parou e olhou para Sarah.
— Primeiro toque no cavalo, e fique tranquila, não sinta medo —
ensinou como fazer, passando a mão pelo flanco do animal.
Ela se aproximou e devagar passou a mão no pelo do cavalo, já que não
sentia medo algum.
— Estou fazendo certo? —perguntou olhando para Willian de canto de
olho.
— Está. Agora vamos montar. — Ele rapidamente montou no cavalo, e
Sarah ficou olhando-o sem entender. —Dê-me sua mão.
Ela o fez, esticando a palma da mão para ele.
— O que está fazendo? — gritou quando foi içada e posta de pernas
abertas no lombo do cavalo, em frente ao corpo de Willian.
— Ora, estamos cavalgando. Sei que é a primeira vez que faz isso, mas
tente não ficar assustada. Eu a estou segurando — e o braço de Willian
envolveu a cintura de Sarah, assustando-a.
O problema da pobre jovem, contudo, não era medo de cavalgar, mas
sim o contato com o marido, as costas contra o peito firme e musculoso, o
braço a envolvendo tão intimamente. Porém ela não diria nada, prendeu a
respiração e, conforme o cavalo começava a trotar, ia relaxando. Ou não,
porque então Willian colocou a cabeça por sobre o ombro dela e, de um jeito
tentador, sussurrou em seu ouvido:
— Está gostando, senhorita?
Ela apenas meneou a cabeça, sem palavras.
— Segure as rédeas. — Entregou nas mãos dela.
Sarah guiou o cavalo, coisa que já sabia fazer, mas em algum momento
mostrou dificuldade, para que o marido acreditasse que ela não sabia mesmo
montar.
— Siga reto mais um pouco — e assim Sarah continuou, até avistar
uma grande árvore solitária, carregada de frutas. — Venha, eu a ajudo a
descer.
Sarah foi colocada no chão e deu-se conta de que a árvore tinha peras
maduras. Não resistiu e fez menção de pegar uma,mas olhou para o marido
primeiro e, depois de vê-lo assentir, colheu e comeu um pedaço, deliciando-
se com a doçura da fruta.
— Esta árvore está aqui desde que eu era criança — contou Willian,
pegando uma fruta também.
— Nunca tinha visto uma tão grande como esta — comentou Sarah,
encantada.
— Aproveite para descansar um pouco. Logo voltaremos.
Sarah concordou. Sentou-se na grama e relaxou, esperando pelo
momento de voltar. O marido estava ao seu lado, e a jovem aproveitou para
dar uma boa olhada nele.
As feridas no rosto pareciam maiores. Avermelhadas, cruzavamsobre
um olho pelo qual ele quase não enxergava. Willian tinha apenas um olho
bom. Sarah tinha curiosidade, desejava perguntar-lhe como tinha se
acostumado a ver menos. Mas nunca teria oportunidade de saber, porque ele
era um marido arredio.
— Vamos voltar — Willian disse e ela se levantou.
Ele montou no cavalo com facilidade e novamente a fez subir, como se
ela fosse uma pluma de tão leve.
— Logo você se acostuma com isso, senhorita —falou ao fazer o
cavalo andar.
É claro que ela podia se acostumar com aquilo, muito facilmente.
Como não poderia quando tinha o corpo contra o dele? Podia sentir o coração
de Willian batendo contra as costas dela, e isso lhe era muito significativo.
— Quando aprendeu a cavalgar, senhor? —perguntou tímida.
— Quando criança, meu pai me ensinou. Demorei a aprender, porque
tinha medo do cavalo. Eu andava com ele da mesma forma que estou
andando com você, até perder o medo. Depois disso foi fácil aprender a
cavalgar.
— Espero que eu aprenda logo — Sarah falou, triste por enganá-lo.
Mas era por uma boa causa, pensava ela.
— Não demorará para que cavalgue pelos campos, senhorita — disse
de um jeito gentil.
Sarah estava assustada, surpresa ao notar como o marido podia ser um
homem gentil quando queria. Estava devotando toda atenção e cuidado a ela,
ea jovem precisava admitir que era uma boa coisa. Ela poderia se acostumar a
isso facilmente, a ser bem tratada pelo marido.
Faria de tudo para que ele continuasse tratando-a tão bem quanto
agora, e para que os dois vivessem em harmonia.
Voltaram para os estábulos, e Sarah desceu, ainda sorridente. Eddy
estava ao lado e pegou o cavalo das mãos de Willian, devolvendo-oà baia.
O lorde não esperou por Sarah, foi direto para casa, e ela o seguiu
calmamente.
Estava feliz, porque havia conseguido uma vitória naquele dia e porque
aos poucos estava conhecendo mais do marido.
Sorriu, em breve estaria nos braços dele. Era uma promessa.
Capítulo Seis
No dia seguinte, à tarde, uma carruagem parou em frente ao solar da
propriedade, e de dentro saiu um homem, sua esposa e um bebê. Eram
amigos de Willian que vieram para uma visita.
— Há quanto tempo não nos vemos! — exclamou Richard ao ver o
amigo.
A última vez que haviam se encontrado fora logo após o trágico
acidenteque resultara nas feridas no rosto de Willian. Eram tempos difíceis e
o amigo não pôde dar toda atenção a Richard, que havia entendido a situação.
Mas agora o tempo havia passado. E Nina, sua esposa, carregava o
pequeno Charlie, um bebê de seis meses, de bochechas grandes e rosadas, o
cabelo claro como o da mãe.
As visitas foram acomodadas no salão, e Sarah foi chamada em seu
quarto. Ela cumprimentou o casal com um sorriso, apresentando-se como
esposa de Willian, que tinha uma expressão amarga ao lado.
— Como pode ter se casado sem nos avisar, Willian? — Richard
perguntou, sorrindo.
Willian, sentado forçadamente ao lado da esposa, tomou um pouco de
ar antes de responder.
— As coisas aconteceram de repente. Não tive tempo de contar —
respondeu ele.
Ao lado, Sarah sorria tentando ser gentil. Olhou para o bebê, depois
para Nina, e pensou em como era bonito ver a mãe com o filho nos braços.
— Seu bebê é muito bonito — elogiou Sarah.
Nina colocou Charlie de pé sobre os joelhos e sorriu para a jovem.
— Obrigada. Ele é muito esperto, não é, Charlie?
Willian se levantou e convidou o amigo para um passeio nos estábulos,
um modo de ficarem a sós e conversarem amenidades.
Sozinhas, Nina e Sarah conversaram sobre o bebê, e a jovem esposa de
Willian confidenciou-lhe o sonho de ser mãe. Ainda era um sonho distante, já
que seu marido sequer a tocava ou lhe dirigia a palavra. Porém podia
claramente imaginar um bebê de bochechas rosadas, cabelos loiros e olhos
esverdeados como os do pai.
— Tenho sorte de que Richard seja um bom marido e um ótimo pai.
Sempre me ajuda com o bebê — Nina contou alegremente.
Sarah suspirou. Não tinha nada para falar do marido, nem sequer sabia
se ele podia ser um bom esposo, se era gentil ou se poderia ser um bom pai.
— Meu pai foi um ótimo pai e um bom marido. Ainda sinto saudades
dele até hoje — disse Sarah usando a única referência de bom pai e marido
que possuía.
— E quanto a seu casamento, como foi? — quis saber a mulher.
Nervosa com a pergunta, Sarah bebericou um pouco de refresco,
enquanto pensava em uma boa resposta.
— Foi simples e rápido, sem uma grande festa. Preferimos a
simplicidade — explicou com um meio sorriso.
Nina assentiu, enquanto balançava o filho nos braços.
— Acho que preciso trocá-lo. Pode me dizer onde faço isso?
— Vamos ao meu quarto. — Sarah se levantou e caminhou na direção
das escadas.
Amulher a acompanhou subindo os degraus devagar. E, enquanto
subia, Sarah ponderava sobre a sorte de Nina,que além de ter um bom marido
tinha um filho adorável. Perguntava-se se estava destinada a uma vida
miserável e sem amor como a que estava vivendo, e se algum dia as coisas
melhorariam. Porque, ao que parecia, nada do que tentava surtia efeito algum,
servia apenas para afastar o marido mais ainda. Ela se perguntava sobre o que
havia de errado.
Chegaram ao quarto, e Sarah indicou à outra que entrasse. Nina
colocou o bebê deitado sobre a cama e então tirou uma fralda de pano da
bolsa.
Não demorou para que trocasse o bebê, que logo estava brincando na
cama de Sarah, enquanto a jovem o admirava.
— Parece pensativa, Sarah — atentou-se Nina.
— Crianças me deixam feliz — respondeu Sarah, sorrindo.
— Você será uma boa mãe — a mulher disse com um sorriso.
Sarah devolveu o gesto, achando a atitude de Nina gentil.
As duas continuaram a conversar sobre Charlie e sobre como era ser
mãe, enquanto Sarah sentia o coração apertado.
***
— Casado? É difícil de acreditar, Willian — Richard disse com uma
risada.
Os dois estavam nos estábulos, e Willian parecia incomodado com o
amigo.
— Eu também custo a acreditar. Mas foi um acordo de negócios, eu
não esperava que Sarah aparecesse de repente em minha vida — explicou ele.
Richard assentiu.
— Mas ela apareceu. E como você está com isso? — perguntou ao
amigo.
Desesperado, diria ele. Mas Willian deu de ombros, desanimado.
— Eu não a quero. Espero que mude de ideia e decida voltar para casa
— contou decidido.
Com urgência, na verdade. Não podia mais suportar a presença dela.
— E por que não a aceita como sua esposa? Ela é bonita e parece
gostar de você, bom amigo — Richard falou, batendo no ombro do outro para
animá-lo.
Mas não havia nada que conseguisse aumentar o ânimo de Willian.
Muitos motivos o levavam a não aceitar Sarah, e a aparência dele era uma
delas. Não queria condenar uma mulher a viver com um homem como ele.
Era cruel demais.
— Porque as coisas serão mais fáceis se ela retornar para casa. Não
estou procurando uma esposa, apesar de ter me casado — disse Willian,
perdendo a paciência.
Richard riu do amigo, mas logo voltou a ficar sério, diante do olhar
dele.
— Então eu lhe desejo muita sorte, meu amigo, porque sua esposa não
parece disposta a voltar para casa — brincou esperando arrancar uma risada
do amigo e falhando. — Bem, você pode tentar convencê-la.
— Ela não resistirá por muito tempo. Eu não sou um cavalheiro, você
sabe. — Willian agora sorria ironicamente.
— E por que voltou para Devonshire nesta época do ano? E tão de
repente?
O olhar de Willian mudou, tornou-se obscuro.
— Um escândalo envolvendo meu nome. Você sabe como são as
coisas em Londres e como pode ter o nome jogado na lama por tão pouco.
Corria pelos salões de Londres o boato de que eu era amante da dona da casa
de jogos — contou, ansioso com tudo aquilo.
Richard o observou por um tempo.
— Devo presumir que as fofocas sejam verdadeiras, Willian. Eu o
conheço o suficiente para saber que andou envolvido por essa mulher.
Willian não negou. Continuou calado, encarando o amigo.
— Você me conhece bem o suficiente, camarada — disse apenas.
O amigo se apoiou na cerca de madeira e suspirou, desanimado.
— Espero que esse tempo morando em Devonshire o mude, Willian. O
ar do campo lhe fará bem.
— Vamos, eu estava sozinho e desimpedido quando a encontrei. Não
havia sinal de esposa e de casamento. Qualquer homem em minha situação
aceitaria um convite para os lençóis da formosa dama — protestou Willian,
convencido de que estava certo.
Apenas meneando a cabeça, Richard lamentou as palavras do amigo.
Era uma pena que ele não compreendesse a importância do casamento e
como suas palavras eram amargas. Como se sentiria Sarah se as ouvisse?
Muito provavelmente ficaria arrasada. Mas Richard ainda acreditava no poder
de convencimento da jovem e na possibilidadede que ela conquistasse o
coração de Willian. Ela só precisava conseguir se aproximar, então as coisas
fluiriam naturalmente.
— Continua sendo o mesmo que conheci anos atrás, Willian. Teimoso
e intempestivo. Mas não discutirei com você, estou aqui hoje não só para
visitá-lo, mas também para convidá-lo para uma festa na propriedade de Lady
Tess. Acontecerá em quatro dias; sua mãe e sua esposa devem comparecer
também.
— Sinto desapontá-lo, Richard, mas não irei — disse Willian em
negação.
— Posso saber o motivo para que negue tal convite?
Willian sorriu ao amigo e olhou para si mesmo de modo significativo.
— Minha aparência é resposta suficiente para você?
— Não. — Richard revirou os olhos. — Sua aparência não é desculpa
para que decline do meu convite. Ninguém realmente liga para sua aparência.
— Não sei se sabe, mas sou chamado de Lorde Fantasma por causa do
meu rosto. Não me entenda mal, mas é difícil enxergar apenas de um olho e
ter cicatrizes tão terríveis — explicou Willian, esperando que o amigo
entendesse seu lado.
Richard respirou fundo.
— Não pode ficar o resto da vida se escondendo das pessoas como um
verdadeiro fantasma, Willian. Tem direito de viver normalmente como
qualquer outra pessoa — ponderou devagar, para que ele entendesse.
Willian sentia-se desanimado. Queria que as coisas fossem mais fáceis.
Por vezes pegava-se pensando na impossibilidade de voltar ao passado e
evitar os eventos que antecederam seu acidente. Suas atitudes não tinham
sido honrosas, ele sabia disso e se envergonhava terrivelmente. E se
perguntava também se seu destino agora era viver daquele jeito, nas sombras,
longe dos olhares das pessoas, sem conviver com ninguém além da mãe e,
agora, da esposa. Sentia falta de ir aos bailes de Londres, de dançar com belas
damas, de receber olhares de interesse e ser considerado bonito pelas
mulheres. Tinha uma boa vida antes de tudo acontecer, e agora vivia
miseravelmente.
— Sinto muito, Richard, mas não irei. Espero que compreenda — disse
por fim.
— Eu entendo, Willian — falou o amigo, desanimado.
Depois disso, os dois voltaram para a casa e encontraram as mulheres
conversando, ao que parecia tinham se entendido muito bem e já eram
amigas.
Richard convidou a esposa para partir, porque já estava tarde, e os dois
deixaram a casa, indo até a carruagem.
— Espero vê-la em breve — Nina disse despedindo-se da outra.
Sarah sorriu acenando para ela, enquanto Willianpermanecia ao seu
lado, em silêncio.
A carruagem partiu, e os dois ficaram sozinhos na entrada da casa,
quietos.
Sarah olhou para o marido, mas ele nem a fitou.
— Está tudo bem, senhor?
Ele passou os olhos por ela.
— Perfeitamente bem. O que faz aqui fora ainda?
Ela piscou sem entender.
— Já estou indo para dentro, senhor —disse obediente.
Segurou as saias do vestido e começou a subir as escadas, mas parou
de repente e virou-se.
Encontrou o marido a olhando e sentiu-se arrepiar com a visão do rosto
de Willian, tão sério, as feridas avermelhadas dando-lhe um ar sobrenatural e
o olho machucado enchendo-a de angústia. Os dois encaravam-se sem se
moverem, e era como se o tempo tivessecongelado, e os minutos, parado de
correr. Um via a alma do outro, enxergavam-se com a alma desnuda.
Mas o encanto se acabou quando Willian virou-se dando as costas a ela
e desceu as escadas.
Ainda em choque pelo que tinha acontecido, Sarah voltou a subir os
degraus devagar, pensando no que tinha acabado de acontecer ali.
Chegou ao salão principal e encontrou Cecil, que veio a seu encontro.
— Estive com dor de cabeça e fiquei no meu quarto toda a tarde. Mas
soube que recebeu a visita de Nina — falou a senhora, sorrindo.
Sarah balançou a cabeça concordando.
— Conheci Nina hoje e já a considero como uma amiga. E Charlie é
uma graça! — contou ela, animada.
— Fico feliz que esteja fazendo amizades, querida. Isso é muito bom
—Cecil disse. Segurou a mão de Sarah e a levou até o sofá. — E Willian
onde está?
— Eu o vi ir em direção aos estábulos.
— E quando será sua próxima aula de montaria? — perguntou Cecil.
Sarah também queria saber. Willian não dissera mais nada sobre isso, e
ela estava começando a duvidar que houvesse próxima aula. Ele parecia ter
desistido.
— Ainda não sei. Estou esperando por Willian — disse Sarah.
— Falarei com ele, querida. Não se preocupe — Cecil tentou
tranquilizá-la.
Elas se viraram quando Willian entrou no salão e parou em frente às
duas. Ele olhou para Sarah com algo que beirava o desprezo, mas ela não se
ressentiu, já estava acostumada aos olhares do marido. Não se importava
minimamente.
— Richard nos convidou para a festa na casa de Lady Tess, sua amiga,
mãe.
— Mas isso é ótimo — comemorou Cecil, batendo palmas.
— Eu disse que não iríamos — cortou Willian, fazendo a mãe murchar.
— E por que não, meu filho? — perguntou ela, triste.
Ele desviou o olhar para a esposa, ligeiramente.
— Não quero ser visto por outras pessoas. Devia saber disso, mãe —
explicou ele.
Cecil se levantou e foi até o filho, segurando-o pelo braço.
— Pense melhor sobre isso, filho. Nós merecemos um pouco de
diversão, sim? Tenho certeza de que pode reconsiderar.
Willian encarou a mãe.
— Isso é importante para a senhora? — perguntou ele, preocupado
com a mãe.
Cecil o olhava cheia de esperança.
— Sim, é. Eu realmente quero ir.
Ele suspirou, abaixando os ombros.
— Então nós iremos, mãe. Porque é importante para a senhora, eu
cederei — anuiu ele por fim.
Ao lado, observando tudo com atenção, Sarah também comemorou
secretamente. Seria bom se Willian se mostrasse para outras pessoas
novamente, e isso por fim iria acontecer, mesmo que fosse algo mais íntimo,
sem tantos convidados, como ela acreditava que seria.
— Agradeço sua disposição, meu filho — Cecil murmurou.
Willian olhou para a esposa de um modo frio e apontou para ela.
— Quanto a você, trate de ser discreta e silenciosa.
Sarah o fitou sem entender.
Era assim que ele queria que ela agisse durante a festa?
— Não se preocupe, senhor, ninguém me notará — prometeu ela,
amargamente.
Ele assentiu e saiu, deixando-a sozinha com Cecil, que parecia
compadecida de seus sentimentos.
— Eu sinto muito por isso, querida. Não esperava que ele dissesse tal
coisa.
— Está tudo bem — disse ela empinando o nariz, altiva. — Não desejo
que as pessoas prestem muita atenção em mim, de qualquer maneira.
— Mesmo assim, temos que nos preparar para a festa, Sarah. Se
precisar de ajuda para escolher seu vestido, basta que me avise. Lady Tess é
realmente adorável, tenho certeza de que se encantará por ela.
— Estou certa de que sim, senhora — concordou sorrindo.
***
Três dias depois, tempo que recorreu devagar na propriedade, havia
chegado o dia da festa de Lady Tess, e todos estavam ansiosos, menos
Willian, que se mantinha inquieto, nervoso.
Cecil experimentou todos os vestidos que havia levado e, por fim,
buscou auxílio em Sarah. Estatentou ajudar opinando, mas isso demandou
muito tempo e quase os atrasou.
Deixaram a propriedade pela manhã, Sarah usando um vestido azul-
claro com laços nas mangas, que lhe caía perfeitamente bem e a deixava com
boa aparência. Estavam em silêncio na carruagem, percorrendo a curta
distância que separava as duas propriedades. Willian olhava pela janela, em
nenhum momento prestou atenção na esposa, sequer lhe dirigiu um olhar.
Chegaram em pouco tempo, e a carruagem parou em frente à grande
construção de tijolos vermelhos, mais de oito janelas em cada extremidade e
uma grande porta em madeira antiga, que foi aberta na sequência. De dentro
saiu uma mulher de idade, usando um vestido de cor marfim, que abriu os
braços cumprimentando todos.
— Vocês enfim chegaram. — Lady Tess se aproximou do trio, que
tinha acabado de descer da carruagem.
Abraçou Cecil, a velha amiga, e direcionou um olhar curioso a Sarah,
que estava quieta ao lado das duas.
— É muito bom vê-la novamente, Lady Tess — Cecil a cumprimentou.
— E você, tão jovem, deve ser a esposa de Willian — a senhora disse
sorrindo. Segurou Sarah pelos ombros e a encarou. — Muito bonita, menina.
— Obrigada — Sarah respondeu de maneira automática; estava
admirada com a personalidade da senhora.
Ao lado das três, estava Willian, que mal olhava na direção da esposa,
como se ali estivesse algo terrível. Ele sempre mudava o olhar de direção
quando ela estava em seu raio de visão.
— Entrem, já temos convidados no salão — convidou a senhora
indicando que subissem os degraus.
Sarah olhou rapidamente para trás, preocupada com o marido, que ela
acreditava estar quase entrando em pânico. Ele seria visto por outras pessoas
e deixaria exposta sua aparência. Ela sabia que Willian estava se sentindo mal
por isso e daria tudo para poder lhe dizer que estava ali por ele, para apoiá-lo
independentemente do que acontecesse. Se pudesse, o aconselharia a não
sentir medo e a não ficar nervoso, porque todos logo perderiam interesse
quanto a sua aparência e então se encantariam por seu jeito de conversar.
Mas ela não podia apoiá-lo, não podia dizer nenhuma palavra, e o veria
sofrer em silêncio.
Entraram na casa e caminharam até o salão principal, onde
conversavam algumas pessoas, que logo viraram-se para prestar atenção a
quem tinha acabado de chegar.
Sarah notou como os olhares de todos foram primeiramente na direção
do marido dela. Algumas pessoas mostraram-se assustadas,e outras, curiosas
quanto a aparência dele.
— Sintam-se à vontade. Vou pedir que lhe sirvam refrescos — Lady
Tess disse a eles, antes de sair para a cozinha.
Um homem de cabelos loiros veio até Willian e o cumprimentou
alegremente, deixando-o mais confortável. Era um amigo dele, e isso era
bom, pensava Sarah.
Duas mulheres, sorrindo abertamente, aproximaram-se de Sarah e
Cecil, e a jovem descobriu que eram amigas da sogra, que há muito tempo
não se viam.
— Esta é minha nora, Sarah — apresentou Cecil.
— É um prazer conhecê-la, Sarah — a mais jovem disse.
Sarah meneou a cabeça assentindo, ainda sem saber se poderia falar,
uma vez que tinha prometido a Willian manter-se quieta.
Nora, uma das amigas de Cecil, puxou Sarah pelo braço e a levou até
onde estavam as outras mulheres, apresentando-as uma por uma. Havia um
grupo de homens em um canto, e eles direcionaram olhares à jovem, que se
sentiuenvergonhada.
— Ela é esposa de Willian — comentou Nora dirigindo-se às outras.
— Você é a grande novidade desta festa, Sarah — uma das outras disse
rindo.
— Eu gostaria de aparecer o mínimo — ela falou, com um sorriso sem
jeito.
Lady Tess voltou ao salão e anunciou que os homens estavam partindo
para uma caçada na floresta próximoà propriedade, dando espaço para que as
mulheres ficassem sozinhas e tivessem mais privacidade.
Os homens se retiraram, e Willian os seguiu, enquanto conversava com
o amigo de cabelos loiros. Sarah se perguntava se o marido era bom em caça,
já que ele aparentava ser um homem da cidade e não parecia ter esse tipo de
habilidades.
— Agora que estamos sozinhas, você pode contar como conheceu
Willian, Sarah. Conte-nos sobre seu casamento.
Ela olhou para Cecil, que ergueu uma sobrancelha, animada.
— A doce Sarah conheceu Willian quando ele viajou para a Escócia a
negócios. Ela vivia no campo, na fronteira, e eles se encontraram quando ela
caminhava pelos campos floridos.
— Isso é tão romântico! — disse uma das mulheres, suspirando.
Sarah estava entrando em pânico, enquanto olhava para a sogra, que
não parecia satisfeita.
— Apaixonaram-senomesmo instante. E ali mesmo Willian prometeu-
lhe voltar para casar-se com ela. Demorou para que isso acontecesse, mas ele
tomou coragem e voltou para encontrá-la, para por fim desposá-la.
— Um amor à primeira vista — falou uma mulher mais jovem.
— Um casamento simples, sem grandes festas, a pedido dela, muito
humilde, e por fim estavam unidos em matrimônio — terminou Cecil,
sorrindo satisfeita.
As mulheres estavam encantadas com a grande história de amor,
enquanto Sarah parecia não acreditar que a sogra havia criado uma história
como aquela. Perguntava-se o que aconteceria se alguma daquelas mulheres
soubesse a verdade sobre como havia se casado com Willian, por procuração,
sem que ao menos pudesse vê-lo antes do enlace.
— Vamos beber um pouco, sim?Estamos sozinhas, e isso é de bom-
tom — sugeriu Lady Tess, quando os criados apareceram carregando taças
em bandejas de prata.
Sarah segurou uma taça com a bebida âmbar e olhou para a sogra, que
anuiu com um gesto de cabeça. Ela poderia beber.
Quando o líquido escorreu por sua garganta, ela sentiu o calor tomando
conta da boca, e logo depois, uma sensação boa, algo que ela nunca tinha
sentido. Seu pai nunca lhe permitira experimentar álcool, aquela era uma
nova experiência, algo que tinha acabado de acontecer.
— Conte-nos, por que decidiram voltar ao campo, Cecil? —perguntou
Lady Tess.
Cecil bebericou mais um pouco da bebida e suspirou, enquanto
pensava na resposta.
Ao seu lado, Sarah questionava-se como a sogra podia manter-se tão
tranquila ao responder às perguntas das mulheres, como não entrava em
pânico.
— Enjoamos da agitação de Londres, estávamos cansados da
temporada a pleno vapor, então decidimos que seria ótimo se recorrêssemos
ao campo para descansar — explicou calmamente.
Asmulheres se empenharam em conversar entre elas, deixando Cecil e
Sarah de lado um pouco, o que serviu para que a jovem se aproximasse da
sogra e lhe perguntasse baixinho:
— Por que mentiu?
— Porque elas não precisam saber da verdade, minha querida — Cecil
explicou piscando para ela.
Enquanto conversavam, duas crianças irromperam pela porta, um
menino e uma menina; o primeiro segurando uma galinha debaixo dos braços
e a segunda com os cabelos desarrumados.
— Mamãe! — gritou o menino assustando a galinha, que se debateu
em seus braços. — Eu a peguei nos estábulos!
— Michael, devolva a galinha ao lugar onde a achou — a mãe do
menino se levantou e disse, irritada.
— Estamos brincando com ela — a menina argumentou, cruzando os
braços.
A mãe dela se colocou de pé também, sem paciência com a pequena.
— Elizabeth, leve a galinha aos estábulos imediatamente.
As duas crianças olharam-se, e o menino tentou segurar a galinha nas
mãos, mas o animal foi mais rápido e escapou, fugindo pelo salão, correndo
entre os pés das mulheres, que se puseram a gritar freneticamente.
As crianças corriam atrás da galinha, que era mais rápida que qualquer
um, dando voltas no salão, passando sobre o colo das mulheres, deixando-as
em pânico. Vendo a situação desastrosa que se desenrolava, Sarah se
preparou e pulou sobre a galinha quando ela passava em sua frente,
agarrando-a com firmeza e se colocando de pé com o animal nas mãos.
As mulheres comemoraram a captura do animal e aplaudiram Sarah
pelo feito, enquanto ela o devolvia ao menino, que agora segurava-a com
mais empenho. Ele e a menina saíram do salão, de volta ao estábulo para
devolver o animal, enquanto as mulheres cumprimentavam Sarah por ser tão
corajosa e pegar a galinha.
Lady Tess, que tinha se assustado com o animal, parabenizou-a e
dispensou-lhe mais atenção daquele momento em diante, sempre pedindo sua
opinião em qualquer assunto de que falava.
Quanto a Sarah, sentia-se feliz por estar sendo bem tratada, mas
também culpada, porque prometera a Willian manter-se discreta, o contrário
do que tinha acontecido quando ela se tornara o centro das atenções.
— Precisa me visitar, Sarah — dizia Nora, animada com a nova
amizade.
— Eu farei o possível — respondeu a jovem, encolhida contra a
parede.
As pessoas nunca tinham desejado sua visita, Sarah não tivera amigas
que se preocupavam com ela. Vivera uma vida feliz anteriormente, mas,
mesmo assim, solitária; tudo que tinha era a companhia dos pais e dos poucos
empregados da propriedade da família. Tudo para ela era novo, estava
aprendendo a ter pessoas preocupadas com seu bem-estar ao redor, a ter
pessoas a chamando de amiga, querendo sua opinião.
Lady Tess chamou as mulheres para compartilharem a comida que
havia sido servida à mesa, e todas se encaminharam para lá, conversando sem
parar.
A refeição foi demorada, as mulheres não paravam de falar, e Lady
Tess tinha boas histórias para contar. Sarah ouviu todas, algumas tinham um
tom de humor que ela adorava e outras lhe arrepiavam a pele dos braços de
medo. Cecil conversava a todo momento, tinha muitas amigas, e todas
estavam dispostas a ouvi-la, o que tornava tudo mais animado.
Sarah respondia às perguntas que lhe eram feitas, mas tentava ficar a
maior parte do tempo em silêncio, apenas ouvindo.
Ainda estavam à mesa quando um criado veio avisar que os homens
tinham voltado da caçada e que por isso elas deveriam lhes ceder os lugares.
As mulheres deixaram a sala de jantar e se dirigiram ao salão
novamente, enquanto os homens se colocavam à mesa, inclusive Willian, que
conversava com outro homem animadamente. Isso despertou a curiosidade de
Sara, quando o viu de relance.
Willian falava de negócios com Ned, umafigura importante, que
possuía vários barcos no porto e que tratava de importações. O homem lhe
deu dicas sobre como investir e o orientou acerca dos melhores produtos para
importar, os mais lucrativos e os quesignificavam mais riscos.
Ademais, durante a caçada, Willian conversara com os outros homens
sobre amenidades e usara de toda a sua pouca habilidade para caça a fim de
receber conselhos sobre como conseguir um bom coelho e como empunhar a
arma corretamente. Ele esperara pelo momento em que lhe perguntariam
sobre seu rosto, mas isso não aconteceu, o que acabara deixando-o mais
confortável.
Era a primeira vez, desde o acidente, que conversava com outros
homens que não fossem seu amigo Anthonyouaquelescom quem se
encontrava na casa de jogos. Conversavam com ele de igual para igual, sem
fazer acepções, e sem que as feridas em seu rosto constituíssem uma barreira.
Willian chegou a se perguntar se seria assim sempre, mas bastaram alguns
minutos de reflexão para que entendesse que não, nem sempre seria assim.
Em Londres ele não poderia aparecer livremente, como era, porque as
pessoas ali agiam diferentemente, e um homem ferido como ele chocaria
demais uma sociedade tão rígida.
Isso deixou Willian triste, saber que apenas no campo poderia ser ele
mesmo, longe da grande sociedade; saber que as pessoas simples podiam ser
mais compreensivas e boas com ele do que pessoas que carregavam títulos e
nomes da pura nobreza.
Ele notou também, de longe, vendo-a no salão principal, como Sarah
estava encolhida em um canto, como parecia triste. Se fosse um bom homem,
talvez lhe pesasse a consciência por exigir que ela se mantivesse quieta, mas
naquelas circunstâncias preferia que a jovem agisse discretamente, porque
assim chamaria menos atenção e não a associariam a ele.
De algum modo, no seu íntimo, tinha curiosidade sobre a personalidade
daquela jovem, sobre como ela de fato era. Desde que o encontrara, Sarah
vivia reclusa em um mundo solitário e pouco manifestava as emoções. Isso
despertava a curiosidade dele, Williandesejava vê-la de verdade, em sua
personalidade inata.
Mas tinha escolhido reprimi-la daquela forma, e não cabiam
arrependimentos; ele tinha decidido não a aceitar, não voltaria atrás. Sua
resposta definitiva para ela era não. Nunca a aceitaria. Sarah precisava
compreender isso.
Capítulo Sete
Dois dias mais tarde, Sarah caminhava pelo campo sozinha, andando
pela grama verde, contemplando as pequeninas flores roxas rasteiras que
brotavam nos campos, enquanto o vento fresco fazia as saias leves de seu
vestido revoarem, assim como seus cabelos, que pareciam rebeldes.
Decidira passear sozinha ainda pela manhã e saíra sem avisar ninguém,
disposta a ter um bom momento longe da agitação de Cecil, ou da braveza de
Willian.
Naquele dia em especial, acordara com saudades do pai e sentira o
coração apertado ao se lembrar dele. Ainda tinha as memórias guardadas no
coração e não se esqueceria tão facilmente dos bons momentos que
haviampassado juntos. Recordava-se especialmente de quando o pai a
ensinara a montar, de como fora paciente e atencioso, e de como comemorara
ao vê-la cavalgar sozinha.
Foram bons tempos, os quais não voltariam, mas ela sentia saudades, e
seria assim até que deixasse esse mundo.
Ao longe Sarah notou que alguém se aproximava a cavalo e perguntou-
se se era Willian procurando por ela. Bem, ele não se daria a esse trabalho.
Mais perto, notou que era Eddy. O administrador parou na frente dela e
apeou.
— Senhora, eu a procurava — ele disse sorrindo.
Ela sorriu de volta.
— Eu estava passeando pelo campo. Por que veio me procurar?
— Minha senhora a procura— informou o rapaz.
Cecil procurava por ela. Alguma coisa devia ter acontecido para que
ela a procurasse daquele jeito.
Eddy abaixou-se e colheu uma pequena flor, oferecendo a Sarah, que o
olhou sem entender.
— Ela me faz lembrar a senhora. Uma beleza fascinante — falou,
entregando a flor a ela.
Sarah a encarou e depois voltou o olhar para o rapaz, sem saber o que
fazer e dizer. Era uma demonstração estranha da parte dele e a deixava sem
ação.
— Obrigada — disse simplesmente, com um meio sorriso.
Nesse meio-tempo, a jovem já estava marchando para casa, sem olhar
para trás, onde vinha Eddy montado no cavalo, acompanhando-a.
Caminhou rapidamente, ignorando o fato de que o rapaz a
acompanhava de perto e o gesto dele com a flor. Estava preocupada com
Cecil.
Chegou à frente da casa e subiu os degraus com pressa, abrindo a porta
e entrando no salão principal com ímpeto. Encontrou Cecil sentada no sofá,
esperando por ela.
— Finalmente a encontrei — disse a senhora, levantando-se.
— Eu estava passeando pelo campo, desculpe-me por não avisar—
tratou de desculpar-se Sarah.
Cecil sorriu e isso aliviou a jovem, que acreditava que a sogra estivesse
brava.
— Hoje o dia está agradável, por isso decidi fazer um piquenique mais
tarde. Convidei Willian, e estranhamente ele aceitou. Vamos nós três.
— Eu conheço um lugar. Há uma grande árvore, umapereira,mais ao
longe — sugeriu Sarah, animada. — A sombra é grande e fresca.
— É perfeito, querida — concordou Cecil batendo palmas. — Iremos
no meio da tarde, não se esqueça.
Sarah assentiu e deixou o salão quase pulando de alegria, porque isso
significava que passaria um tempo com Willian e que poderia tentar falar
com ele.
Ela subiu para o quarto, onde encontrou um livro para distrair-se até o
horário combinado.
***
— Onde está Sarah? — Cecil perguntou no meio do salão.
— Estou aqui — a jovem respondeu descendo as escadas.
— Acho que podemos ir. Willian está esperando lá fora — informou a
senhora, puxando Sarah pelo braço.
A jovem sorria, porque teria um tempo com o marido, o que era raro.
Carregando uma cesta de palha com a comida, Cecil e Sarah saíram de
casa e encontraram Willian esperando por elas. Ele estava com uma
expressão zangada, não pareciamuito feliz.
— As duas demoraram —reclamou pegando a cesta das mãos da mãe.
— Vamos logo, sim? — Cecil disse passando pelo filho, deixando
Sarah ao lado dele.
Um fitou o outro, e Willian desviou o olhar da esposa, caminhando
mais rapidamente, deixando-a para trás sem cerimônia alguma.
Sarah não se importou com a atitude do marido. Ela era paciente e —
mais dia, menos dia — ele mudaria o comportamento.
Os três chegaram àpereira que Sarah e Willian tinham visto outro dia, o
lugar perfeito para um piquenique. Cecil estendeu uma toalha debaixo da
árvore e se sentou, convidando os outros dois a fazerem o mesmo.
— Eu trouxe alguns doces, querida. Quer provar? — ofereceu Cecil a
Sarah.
A jovem se sentou ao lado dela e foi surpreendida pelo pedaço de bolo
que Cecil havia retirado de dentro da cesta e entregava a ela. Havia cobertura
de amoras, e, quando Sarah comeu, gemeu de prazer ao saborear algo tão
bom.
De pé, assistindo a tudo, estava Willian. Não parecia contente, o que
levava sua esposa a se perguntar por que motivo ele havia ido. Mas isso era
algo que nem mesmo o lorde sabia. Tinha aceitado o convite da mãe, mesmo
sabendo que teria que suportar a esposa.
Talvez estivesse começando a se arrepender naquele momento. Não
queria encarar aquele olhar especulador da esposa.
Sarah terminou de comer o bolo, pegou outra fatia e ofereceu ao
marido, que a fitou sem entender.
— Aceite um pedaço, senhor.
Ele deu um sorriso de escárnio.
— Como pode acreditar que aceitarei qualquer coisa sua?
A jovem respirou fundo, tentando ter calma.
— É apenas um pedaço de bolo, Willian — Cecil interveio ao lado.
— Não quero nada das mãos dela — o lorde respondeu, dando as
costas às duas.
Sarah deixou o pedaço de bolo na cesta novamente e se levantou,
ficando próximo do marido. Ele a olhou com raiva quando anotou perto.
— Não se atreva a se aproximar. Não quero que encoste em mim —
esbravejou ele, dando um passo para o lado.
— Não irei tocá-lo, senhor. Só quero que me ouça. Como pode me
tratar desta maneira?
Willian se virou para vê-la melhor, estavam frente a frente.
— Trato-a como merece, senhorita. Lembre-se de que não passa de
ninguém em minha casa, e de que não é bem-vinda — disse rudemente.
Sarah engoliu em seco. As palavras dele eram duras e a faziam quase
desistir.
— Sou sua esposa, senhor. Deveria ter mais consideração por mim e
tratar-me melhor.
Ele riu ironicamente, deixando-a mais nervosa ainda.
— Já lhe disse, senhorita, este arranjo é um terrível engano, e de fato
não somos casados. Pode simplesmente voltar para sua casa para
continuarmos vivendo normalmente. É um bom plano.
Ela cruzou os braços, decidida. Não deixaria que ele lhe dissesse o que
fazer tão facilmente assim.
— Não importa o que diga, senhor, ainda acredito neste casamento. Eu
o farei acreditar também, e em algum momento viveremos como um casal
comum — ela disse tranquilamente.
Willian continuava a sorrir, como se tudo que estivesse ouvindo fosse
uma grande brincadeira. Ele não perderia a compostura tão facilmente.
— Engana-se terrivelmente, senhorita, há algo que não poderá
conseguir de mim de qualquer maneira.
— O que é? — ela perguntou.
— Meu coração, ele nunca será seu — Willian respondeu por fim,
virando as costas para ela e saindo em direção a casa.
—Sinto muito, querida. Ele um dia vai mudar — Cecil falou ao lado
dela.
Sarah suspirou enquanto o via ir calmamente para a casa, depois das
palavras amargas que ele lhe falara.
Será mesmo que nunca conseguirei conquistar o coração desse
homem? Agora temia por isso. Ele a desestabilizara deixando-a sem rumo e
com medo do futuro.
— Ele se arrependerá de tais palavras, senhora. Willian ainda me
amará — Sarah disse determinada, ao encontrar um pouco de coragem.
— Vamos voltar, certo? — a senhora sugeriu,levantou-se e começou a
arrumar as coisas. — Infelizmente nosso piquenique foi arruinado.
— Perdoe-me por isso, senhora. Não era minha intenção.
— Não se preocupe, Sarah, a culpa é de Willian.
As duas começaram a caminhar de volta, a jovem sentindo o coração
partido em milhões de pedacinhos, as duras palavras de Willian fazendo-a
questionar se estava certa ao continuar ali. Não seria hora de voltar para casa
e assumir que seu plano fora um fracasso? Mas o que faria, então, com aquele
sentimento que tinha aos poucos tomado conta de seu coração e que a
dominara sem chance de reação? O que faria, agora que tinha descoberto o
que era o amor verdadeiro? E como faria quando tudo o que desejava era
ficar perto daquele homem?
Ela não tinha escolha além de continuar com o plano e morando com
Willian, mesmo que fosse um infortúnio para ele.
Voltaria às aulas de montaria e tentaria se aproximar dele novamente,
era tudo em que conseguia pensar naquele momento.
Chegaram a casa logo depois de Willian e, enquanto subiam as
escadas, encontraram olorde descendo. Ele parou em frente às duas.
— Diga que arrumará suas coisas hoje mesmo, senhorita.
Ela fechou a cara.
— Sinto decepcioná-lo, senhor, mas eu não vou partir — respondeu de
pronto.
Willian apertou a mão em punho, irritado.
Deixou de olhá-la e continuou a descer a escada, deixando-a irritada.
Ele se dirigiu para os estábulos, e Sarah continuou seguindo o próprio
caminho, entrando na casa. Deixou Cecil no salão principal e foi para o
quarto.
Ela jogou-se na cama e suspirou profundamente.
Estava cansada de tudo aquilo, sentia a falta de casa e da mãe. Não
esperava que as coisas fossem ficartão difíceis quanto estavam sendo.
Esperava um marido mais compreensivo e sociável, enão um tão arredio
como ele era. Teria um longo trabalho pela frente se quisesse que ele
começasse a tolerá-la. Se ao menos Sarah conseguisse se comunicar com o
marido de uma forma melhor, sem que ele começasse a gritar.
Talvez devesse mudar o jeito de agir também.
Ela pensaria nisso.
***
No dia seguinte Cecil conversou com o filho e pediu a ele que
continuasse com as aulas de montaria de Sarah. O lorde reclamou e tentou
negar, mas a mãe foi insistente, até que ele se convencesse de que era uma
boa ideia continuar com as aulas.
Naquela tarde, Sarah calçou as botas apropriadas e colocou um vestido
mais fresco, então desceu para o salão principal, onde encontrou Cecil a
esperando.
A jovem se aproximou da sogra, que a tomou pelo braço e cochichou
em seu ouvido.
— Use a aula para se aproximar dele, querida. Seja doce e atenciosa
com Willian.
Sarah assentiu.
— Eu farei, senhora — garantiu animada.
Ela caminhou para fora da casa e se dirigiu aos estábulos, onde
encontrou Eddy preparando o cavalo que seria usado por Willian.
— Está muito bonita hoje, senhora — o jovem disse sorrindo.
Sarah corou, envergonhada pelo elogio.
Willian apareceu caminhando com pressa até o estábulo. Ele se
aproximou do animal e o segurou pela rédea, enquanto o levava para o
campo. Sarah o seguia em silêncio, esperando pelo que ele diria.
— Hoje irá montar sozinha — falou ele, apontando para o cavalo.
— Mas não sei como fazê-lo — protestou Sarah.
Willian a fitou.
— Eu estarei ao seu lado — explicou. — Venha até aqui.
Ela obedeceu e se aproximou. Ele a orientou sobre como montar, e,
quando ela precisou fazê-lo, conseguiu com facilidade, porque já o sabia
fazer. Mesmo que ele não soubesse disso.
— Eu consegui — ela comemorou.
— Agora segure as rédeas e tente fazê-lo andar — ensinou Willian.
Sarah fez como ele dissera, e logo o animal estava andando pelo
campo. Willian andava ao lado, cuidando para o caso de um imprevisto.
— Bom Deus, eu estou fazendo isso — ela falou, completamente feliz.
Distanciaram-se da casa e já estavam perto da pereira quando Willian
deu um grito, ajoelhando-se no chão. Ele tinha a mão sobre o tornozelo, e
Sarah se perguntava se o havia torcido.
— Uma víbora — anunciou ele, revelando a picada do animal.
— Vamos voltar, senhor — disse Sarah, nervosa.
Willian tentou ficar em pé, mas cambaleou e caiu, o veneno da cobra
agindo em seu corpo.
— Eu preciso de ajuda — ele falou, encarando a esposa.
Ela pensou rápido no que faria e não viu escolha senão voltar em busca
de ajuda.
— Eu volto logo — avisou antes de virar o cavalo epartir galopando.
Quanto a Willian, ficou sentado vendo-a cavalgar tão rápido, os
cabelos dela esvoaçando com o vento. E então ele constatou algo: sua
adorável esposa já sabia cavalgar. Ela o enganara. Uma mulher que não sabe
o mínimo não cavalga daquela maneira.
Ele estava furioso por ter sido enganado e a cobraria pela mentira, mas
agora tinha um problema maior. Puxou a calça para cima e expôs a picada, o
local ao redor já estava arroxeado. Willian sentia tonturas e ânsias de vômito,
não conseguia se levantar.
Só restava esperar por Sarah.
A jovem chegou aos estábulos rapidamente e, de cima do cavalo, pediu
ajuda.
— Venha, Eddy, Willian foi picado por uma víbora — exclamou
assustada.
O rapaz pediu a outro jovem que trabalhava no estábulo que chamasse
o médico na vila. Enquanto isso subiu no cavalo e então, junto de Sarah,
partiu em busca de Willian.
Os dois chegaram rapidamente e encontraram o lorde sentado no
mesmo lugar.
— Senhor, precisamos voltar para casa. Venha, eu o ajudo. — Eddy
desceu do cavalo e segurou Willian pelos braços, fazendo-o ficar de pé.
O jovem segurou o lorde, que com muito esforço conseguiu subir no
cavalo de Sarah, sentando-se atrás dela, e a agarrou pela cintura sem
cerimônia alguma.
— Não caia, por favor — a jovem pediu a ele, que tinha a cabeça
encostada nos ombros dela.
— Vamos logo, mulher — ele rosnou, irritado.
Sarah atiçou o cavalo e o animal começou a trotar em direção a casa. A
jovem tinha o coração aos pulos pelo jeito como o marido a segurava, tão
próximo. Era a primeira vez que se tocavam de verdade, e ela não sabia
explicar a sensação que a atormentava. Seu estômago parecia abrigar milhões
de pequenas borboletas brincalhonas, e a respiração estava acelerada.
Quando chegaram a casa, Eddy desceu do cavalo e ajudou Willian a
apear segurando-o para que não caísse. O lorde cambaleou e foi salvo por
Sarah, que estava atrás dele.
Ela o ajudou a subir a escada, um passo de cada vez, tudo devagar.
Quando estavam em frente à porta, esta foi aberta e Cecil apareceu
desesperada, procurando pelo filho.
— Willian, o médico está vindo, meu filho — anunciou nervosa.
Ele não disse nada, continuou caminhando para dentro da casa, Sarah
ainda o ajudando. Mas mal a olhava, concentrado agora em subir as escadas,
que levavam ao segundo andar. Sarah estava ao seu lado, enquanto ele
proferia impropérios que a jovem nunca antes tinha escutado, e arrastava a
perna que havia sido picada, uma vez que o veneno tinhase espalhado.
Ele chegou ao quarto e ela abriu a porta, quando de repente Willian a
empurrou para o lado.O lorde cambaleou até a cama e deitou-se em seguida,
respirando com dificuldade.
— Não preciso mais de você, senhorita — ele disse dispensando-a,
fazendo um gesto com a mão.
Sarah o olhou com raiva. Como podia ser tão desprezível? Ela o
ajudara para que ele a dispensasse daquela forma.
Mas não disse nada, apenas se retirou após dar uma última olhada em
Willian, enquanto no andar inferior Cecil falava com um homem,
provavelmente o médico, que havia chegado.
Sarah encontrou o doutor subindo as escadas, um senhor de idade,
carregando uma maleta de couro. Ele se dirigiu ao quarto de Willian e fechou
a porta, impedindo a jovem de ver qualquer coisa.
Cecil encontrou Sarah e a puxou para um lado, como se fosse lhe
contar um segredo.
— Willian ficará bem, não é?
— É claro, senhora — tranquilizou Sarah.
Cecil respirou profundamente, mais tranquila, sem todo o medo que
estava sentindo.
— Estou orgulhosa de você, querida. Ajudou Willian com muita
determinação — disse segurando a jovem pelas mãos.
Sarah sorriu, feliz por ter sido útil.
— Fiz o que pude, senhora. Eu não poderia deixá-lo sozinho, sou sua
esposa, e minha obrigação é cuidar dele.
Cecil levou a mão ao coração, emocionada.
— Você é uma jovem de valor, minha querida. Fico feliz que seja
esposa de Willian.
Sarah ficou em silêncio, tocada pelas palavras da sogra. Não faria de
modo diferente. Ficara desesperada ao ver que Willian tinha sido picado pela
víbora e a primeira coisa que pensara fora em ajudá-lo. E, mesmo que o
marido não reconhecesse seus esforços, ela não se importava, estava feliz,
porque agora ele ficaria bem, aos cuidados do médico, e o mais importante
era que nada de ruim lhe tinha acontecido.
A jovem se sentou em um sofá no salão principal, para esperar o
médico descer. Queria falar com ele e saber se estava tudo bem com Willian.
Ela se mantivera tranquila durante a situação porque sabia que poucas víboras
tinham o veneno mortal e que a maioria tinha efeito temporário, que apenas
causava mal-estar. Aprendera isso com o pai, enquanto crescia, e vira criados
da propriedade em que morava serem picados por víboras; o pai dela
administrava o remédio e ele mesmo os curava.
Sarah esperou por um tempo sozinha e, quando viu o médico descendo
as escadas, correu para interceptá-lo, perguntando-lhe sobre Willian.
— Ele está bem. Administrei o remédio. Não era uma cobra venenosa
no fim — explicou o médico.
— Obrigada, doutor, por ter vindo tão depressa — agradeceu Sarah.
O homem sorriu, balançando a cabeça.
— Agora faça com que o lorde descanse, jovem. Ele deve ficar de
cama por alguns dias até que melhore —orientou ele, caminhando para fora.
Sarah ficou sozinha, pensando que o marido não iria gostar da notícia
de que deveria ficar no quarto por alguns dias. Mas ele teria que obedecer, ela
mesma se certificaria de que o marido cumprisse as determinações médicas.
Cecil voltou até a nora andando depressa, com um olhar assustado.
—Willian quer vê-la.
Sarah estranhou.
— O que ele quer comigo?
A sogra deu de ombros, sem saber.
Reunindo toda a coragem, Sarah subiu as escadas novamente, enquanto
pensava no que poderia ter acontecido para que o marido quisesse vê-la. Mas
algo lhe dizia que não era nada bom.
Ela bateu à porta e do outro lado ele respondeu dizendo que entrasse.
Sarah se via tímida perante o marido, as mãos juntas em frente ao
corpo, o olhar baixo, o rosto queimando.
Willian estava sentado na cama fitando-a com atenção, tinha a
expressão de quem está bravo, as feridas deixando-o com uma aparência
assustadora.
—Soube que me chamou, senhor —ela disse num fio de voz.
—Há algo que gostaria de perguntar à senhorita.
Ela ergueu o rosto para ele.
—Sim?
Willian se aproximou dela firmando-se na cama, para vê-la melhor.
—Por acaso a senhorita já sabia montar e mentiu todo esse tempo?
Ela fraquejou, abriu a boca e fechou sem saber o que dizer.
Mentir? Ele provavelmente sabia de toda a verdade, e isso apenas
pioraria a situação. Falaria a verdade, então.
—Sim —respondeu baixinho.
Notou como a mandíbula de Willian endurecia demonstrando raiva.
Era um mau sinal.
— Deve achar que sou um idiota, senhorita.
Ela se agitou.
—Não, de jeito nenhum, senhor. Eu apenas queria...
—Enganar-me, era isso que queria — cortou ele.
Sarah se via em desespero, tentando explicar seus reais motivos para
mentir. Mas era difícil fazer isso quando ele não queria ouvir.
— Vejo que não posso confiar na senhorita. É uma mentirosa e não me
atenho a pessoas assim. Peço que, por favor, saia do meu quarto — ele disse
amargamente.
— Mas eu...
— Saia agora —retumbou.
Ela assentiu, desolada. Olhou-o pela última vez antes de fechar a porta
e, do lado de fora, já sentia as lágrimas quentes descendo pelo rosto.Por que
ele não a ouvira? Bem, mesmo que ouvisse, talvez as palavras não fossem
suficientes para que entendesse os motivos dela.
Caminhou até o próprio quarto e se sentou na poltrona em frente à
janela que dava para o jardim. Havia duas mulheres cuidando das flores, e
por um instante Sarah permitiu-se admirar o trabalho delas, observando como
depositavam adubo nas raízes e como regavam a flor, enquanto conversavam
alegremente.
Sentia-se vazia, triste e decepcionada. Seu plano só dava errado, e ela
não sabia mais ao que recorrer para agradar Willian. O que estava fazendo de
errado? Eram suas atitudes? Deveria ser mais altiva? Mais doce? Agora
precisaria recomeçar o plano e tentar de outra maneira se aproximar de
Willian, já que as aulas de montaria haviam dado errado.
Por enquanto esperaria, até que o marido melhorasse, e talvez usasse a
reclusão dele como desculpa para vê-lo, mesmo que ele se opusesse.
Capítulo Oito
Lorde Willian precisou ficar mais de dois dias trancado no quarto,
isolado das outras pessoas, enquanto ainda sentia alguns efeitos do veneno da
víbora no corpo. O homem reclamava a todo instante por ter que ficar
trancado e até tentou sair do quarto em algum momento, mas foi impedido
por sua mãe, que lhe garantiu que tudo passaria logo.
Enquanto isso, Sarah aguardava, também no quarto, ao mesmo tempo
que considerava visitar o marido, ainda que ele fizesse um escândalo, pois ela
estava preocupada por vê-lo isolado daquela forma, sem ninguém para
conversar.
Foi assim que naquela tarde quente Sarah esgueirou-se até o quarto de
Willian e,imaginando que ele estivesse dormindo, entrou sem bater. Ele
realmente estava dormindo, e ela fez silêncio para não o acordar.
Sarah assistiu por um momento ao homem adormecido, até que decidiu
sentar-se ao lado dele na cama. Sentou-se devagar, até mesmo respirava com
calma para não o acordar.
Ele parecia tão sereno dormindo daquele jeito, sem preocupações, e a
jovem se atentou ao fato de que o marido era bonito,do quanto ela queria
poder tocá-lo apenas por um momento.
Sentia desejo de tocá-lo ao menos um pouco, recorrer o rosto do
marido com os dedos, acariciá-lo com a mão. Aproximou-se um pouco mais
e sentiu algo noíntimo, uma vontade absurda de beijá-lo. Os lábios dele
estavam tão próximos. Ele acordaria? Apenas um roçar de lábios e nada mais.
Aproximou-se mais e fechou os olhos. Seria rápido e imperceptível.
Tocou os lábios nos de Willian e nesse momento seu coração pareceu sair
pela boca. Era mais do que ela esperava.
Estava pronta para se afastar, quando foi surpreendida por braços fortes
que a envolveram pela cintura e a deitaram na cama, Willian sobre ela, ainda
a beijando. Ele deslizou os lábios de um modo sensual sobre os dela,
assustando-a. Sarah estava imóvel debaixo do marido, que continuava a
beijá-la.
De repente o lorde parou e saiu de cima da esposa, deixando-a
mortificada de vergonha. Ele se levantou da cama e caminhou até o outro
lado do quarto, de costas para ela.
— Isso foi um erro. Peço que me desculpe, senhorita — ele disse sem
jeito.
Sarah conseguiu se levantar e, arrumando o vestido amassado,
caminhou até a porta.
— Não se preocupe, senhor. Eu não me lembrarei disso — mentiu ela,
abrindo a porta.
Conseguiu escapar para fora do quarto e correu para os próprios
aposentos, entrando e trancando a porta em seguida. Sarah sentou-se na cama
e começou a abanar-se sentindo-se quente. Tinha as bochechas em chamas e
precisou respirar pausadamente para que o coração se acalmasse.
O que tinha acontecido naquele quarto?
Ele a beijara de uma forma intensa, fizera-a sentir-se estranha, o
coração disparado.
Sarah se sentia imensamente feliz não apenas pelo beijo, mas pelo que
ele significava no coração dela. Aquilo servira apenas para confirmar o que já
sabia: amava o marido, amou-o no instante que o viu pela primeira vez, e não
se importava com as feridas, nem com a visão debilitada de Willian.
Não entendia porque ele a tinha beijado, mas, mesmo que o
lordetivesseagido apenas por um impulso, o acontecido não deixava de ser
fantástico e de grande importância para Sarah.
Um beijo podia mudar tudo, podia amolecero coração de Willian e
fazê-lo mais tranquilo em relação à esposa. Podia ser o começo do
funcionamento do plano dela, as coisas poderiam ficar mais fáceis agora.
Ainda feliz, a jovem desceu para o salão principal, e, não encontrando
ninguém ali, decidiu sair para passear um pouco. Deixou a casa e desceu a
escada, saindo no jardim. Caminhou entre as flores admirando cada uma e
parou para contemplar uma rosa vermelha maior que sua mão. Era linda, e
deixava Sarah feliz.
Ela andou mais um pouco e chegou até a horta, mas desanimou ao ver
a quantidade de ervas daninhas junto das verduras. Sarah não pensou duas
vezes quando começou a arrancar as pragas, pouco importando-se com seu
vestido de cor clara.
Estava tão entretida no trabalho que não viu quando ele se aproximou
caminhando devagar, parando ao lado de uma árvore.
— Santo Deus! — Sarah disse levando a mão ao peito, assustando-se
ao encontrar Willian a olhando.
— O que está fazendo? — ele perguntou apontando para a horta.
Ela continuou com o trabalho, dando as costas a ele.
— Removendo as ervas daninhas. Elas impedem as outras plantas de se
desenvolverem — explicou ela.
Willian assentiu.
— Esse trabalho não é para a senhorita.
Sarah se virou para ele, com o intuito de fitá-lo.
— Eu não me importo. É bom mexer com a terra um pouco — ela
rebateu.
Ele olhou paraa roupade Sarah e um pequeno sorriso escapou de seus
lábios.
A jovem olhou para si mesma e levou um susto ao ver o vestido todo
sujo de terra. Era disso que ele estava rindo.
— Temo que tenha arruinado seu vestido — ele atentou.
— Eu tenho muitos — respondeu Sarah, envergonhada.
O vestido não era o real problema ali, pensou ela. Por que Willian tinha
saído do quarto quando o doutor havia dito que ele deveria ficar trancado?
— Se me permite perguntar, o que faz aqui fora, senhor?
Willian deu de ombros.
— Estava cansado de ficar trancado, decidi sair um pouco e tomar ar
fresco. Então encontrei a senhorita aqui.
Ela o encarou.
— Eu o estou divertindo — falou ela sem graça.
— Está. — O sutil sorriso estava lá novamente. — É uma distração vê-
la ajoelhada sobre a terra enquanto tira ervas daninhas. Eu poderia assistir por
horas.
— Que bom que alguém está se divertindo — comentou Sarah.
— Parece boa no que está fazendo. Já fez isso antes, senhorita? —
perguntou Willian, sério.
Sarah ficou de joelhos e o fitou, enquanto esfregava as mãos para
remover a terra.
— Eu ajudava a cuidar da horta na minha antiga casa — contou ela.
Willian assentiu novamente.
— Estava pensando que poderíamos plantar alguns nabos e cenouras.
O que acha, senhorita? Temos algumas sementes.
— Eu acho uma boa ideia. Posso fazer isso agora mesmo — ofereceu-
se Sarah.
Willian saiu em busca das sementes, e ela continuou com seu trabalho,
feliz porque o marido estava conversando com ela, estava sendo gentil.
Presumira que ele fosse se isolar mais depois do beijo, mas isso não tinha
acontecido.
Ele voltou carregando dois pequenos sacos de semente e parou ao lado
dela, que se levantou e se aproximou.
— Eu posso semeá-las.
— Eu ajudarei — disse Willian, dobrando as mangas da camisa.
Sarah fez os buracos na terra, e o marido colocou as sementes, tudo
com muito cuidado.
E assim os dois trabalharam juntos, em harmonia, um ajudando o
outro, e Willian nem parecia o lorde mal-humorado que sempre se afastava
da esposa. Algo tinha acontecido para que ele tivesse mudado, e Sarah se
perguntava se fora o beijo. Era a única coisa diferente que tinha acontecido.
— Terminamos — anunciou Willian.
Sarah parou ao lado dele enquanto contemplava o trabalho feito;
sentia-se orgulhosa por ter terminado com a ajuda do marido.
— Vamos entrar. Pedirei que nos sirvam um refresco — ele falou
animado, caminhando de volta para casa, com Sarah ao seu lado.
Os dois entraram e encontraram Cecil no salão principal. Ela se
espantou ao vê-los sujos de terra.
— O que fizeram?
— Ajudei Sarah na horta, mãe. Pode pedir um refresco enquanto nos
lavamos? — pediu Willian.
A mãe concordou, ainda admirada com os dois.
Sarah e Willian subiram cada um para seu quarto, onde criadas levaram
bacias de água para que pudessem se lavar. Ela aproveitou para trocar de
vestido, escolhendo um de cor mais escura, e terminou de se lavar com um
sorriso doce nos lábios.
Desceu novamente e encontrou Willian sentado no sofá, enquanto a
criada servia um refresco de laranja.
— Sente-se — ele disse ao vê-la.
Ela o fez, sentou-se em sua frente, com timidez.
Bebericou do refresco e passou a admirar o marido, que parecia mais
bonito do que antes, talvez devido ao bom humor.
— Sente-se cansada, senhorita?
Sarah se assustou com a pergunta.
Balançou a cabeça negativamente.
— Estou acostumada ao trabalho, senhor.
Ele deixou o copo na mesinha ao lado e a encarou.
— Que tipo de vida levava em sua antiga casa?
Ela foi pega de surpresa pela pergunta. Pensou um pouco. Seria sincera
com ele.
— Uma vida simples, senhor. Sem grandes luxos e riquezas. Meu pai
tinha posses, mas acreditava na simplicidade da vida. Por isso desde pequena
aprendi como cuidar da terra, ordenhar uma vaca ou cozinhar qualquer coisa
— contou lembrando-se do pai por um momento.
Willian apoiou o queixo na mão enquanto a olhava, estava interessado
em saber mais sobre ela.
— Quando conheci seu pai, ele me pareceu um homem de família.
Então eu estava certo sobre isso.
— Totalmente — concordou ela. — Meu pai vivia por minha mãe e
por mim.
Ele suspirou.
— Acredito que sinta a falta dele.
— É evidente — respondeu Sarah.
Sentia muito a sua falta, mais do que poderia dizer. A morte dele ainda
era como um sonho ruim do qual ela não conseguia acordar.
Mas Sarah continuara a viver e, embora sempre sentisse a falta do pai,
sabia que ele estava em um bom lugar.
Notou Willian se levantando, sentiu sua aproximação e entrou em
estado de alerta, quando ele se inclinou e passou o polegar por sua bochecha,
assustando-a.
— Havia uma mancha de terra — ele disse com a voz suave, nem
parecia o mesmo.
— Obrigada, senhor — ela agradeceu sem jeito.
Willian se afastou, voltou a se sentar, enquanto Sarah seguia
constrangida. Ele notou que ela tinha as bochechas vermelhas e sorriu,
achando graça da situação.
Passaram um tempo em silêncio, a jovem evitando olhá-lo, fitando as
próprias mãos juntas no colo. Willian a fitava intensamente, como se a
estivesse conhecendo finalmente.
Então houve o momento em que o lorde se levantou e abotoou o botão
do casaco, pronto para se retirar. Ele se despediu de Sarah com um gesto de
cabeça e saiu, subindo para o quarto.
Assim,por fim, a jovem pôde respirar tranquilamente outra vez, sem
precisar se preocupar com o olhar insistente do marido, o que lhe causava
arrepios.
Sarah ainda se sentia feliz pelo gesto de Williande conversar com ela e
se perguntava o que tinha acontecido para que ele agisse daquela maneira. Se
fora o beijo ou não pouco importava realmente.
A jovem levantou-se e caminhou para as escadas, rumo ao quarto, onde
esperava descansar até o jantar.
Tinha muito o que refletir, pensou alegremente.
***
No dia seguinte Sarah acordou mais tarde e desceu para o desjejum
pensando se encontraria o marido ali. Mas estava enganada, ele já tinha saído
mais cedo, com a desculpa de que iria cavalgar ainda pela manhã.
Cecil estava acordada e foi correndo até a nora, a fim de saber das
novidades sobre Willian. Quando Sarah contou que ele estava finalmente
conversando com ela, a senhora juntou as mãos e ofereceu aos céus, grata
pelo pequeno milagre.
Willian adentrou o salão caminhando com pressa na direção das duas.
Ele parou em frente a Sarah e a cumprimentou.
— Eu estava a sua procura, senhorita.
— Em que posso ser útil ao senhor? — ela perguntou dedicada.
Ele olhou para a mãe e depois desviou o olhar rapidamente.
— Queria saber se deseja cavalgar comigo esta manhã.
Sarah demorou a responder, surpresa pelo convite.
— Eu adoraria — respondeu por fim, sorrindo.
— É uma ótima ideia, meu filho — elogiou Cecil ao lado.
Willian ignorou a mãe e prestou atenção em Sarah, que parecia
envergonhada.
— Vou esperá-la se arrumar, senhorita — ele disse apontando para a
saída e caminhou para lá.
Sarah apressou-se em subir para o quarto, ansiosa com o passeio.
Entrou no cômodo e saiu à procura de um vestido mais adequado para
cavalgar. Não demorou a encontrar a peça perfeita. Calçou as botas e prendeu
o cabelo em uma trança, logo estava pronta.
Retornou ao salão sorrindo, Cecil também parecia feliz por ela.
— Willian a está esperando lá fora, querida — anunciou a senhora.
A jovem assentiu enquanto caminhava para fora da casa e encontrou o
marido parado nas escadas, esperando-a.
— Os cavalos estão prontos — informou Willian, enquanto descia a
escada com a esposa ao lado.
Eddy segurava os dois cavalos e sorriu para Sarah quando ela passou
por ele.
Willian se aproximou dela, preocupado.
— Consegue montar sozinha?
— Consigo, sim — respondeu orgulhosa.
Sarah segurou na sela do cavalo e montou, ajeitando-se em cima do
animal. Notou um pequeno sorriso de orgulho do marido e sentiu o coração
disparar.
Willian também montou com facilidade. Ele indicou a Sarah o caminho
e logo começaram o passeio, cavalgando devagar. O lorde, mesmo sabendo
que Sarah sabia cavalgar, tinha medo de que algo acontecesse a ela, por isso
preferia ir devagar.
Passaram pelo campo, por entre algumas árvores e depois costearam o
rio que cruzava a propriedade. Estavam em silêncio, até que a jovem se sentiu
à vontade para conversar.
— Com quem aprendeu a cavalgar, senhor?
Willian a olhou por sobre o ombro.
— Meu pai. Quando eu era pequeno via todos cavalgando e chorava
porque queria aprender. Mas sempre me diziam que eu era jovem demais.
Houve um dia em que fugi para os estábulos e tentei montar um cavalo, mas
obviamente ele era alto demais. Meu pai viu meus esforços e resolveu me
ensinar. Havia uma égua pequena e nela comecei a aprender; em poucos dias
já estava cavalgando sozinho por toda a propriedade — contou ele,
relembrando os fatos.
— Aprendi com meu pai também. Mas eu já era adulta — disse Sarah.
— Você cavalga bem, senhorita. Tem uma boa postura — elogiou
Willian.
Sarah sorriu.
— Obrigada, senhor.
— Veja, a pereira tem algumas frutas. Vamos pegá-las? — sugeriu ele.
Ela assentiu.
Pararam debaixo da árvore e, mesmo montado no cavalo, Willian
esticou-se para tirar uma fruta madura e a ofereceu a Sarah, que aceitou de
bom grado.
Enquanto ela comia, ele colheu outra e logo começou a comer também.
Os dois saborearam a fruta em silêncio, mas Willian o rompeu quando
terminaram.
— Podemos voltar, senhorita.
— Como quiser, senhor — ela concordou desanimada com o fim do
passeio.
Viraram os cavalos e começaram a voltar para casa, quando Sara
empertigou-se desejando cavalgar de verdade, sentindo o cabelo voando, o
vento no rosto.
Ela atiçou o cavalo fazendo-o disparar pelo campo, e, logo atrás,
Willian assustou-se.
— Sarah! —gritou, partindo em disparada também.
Ela cavalgava com velocidade, e Willian seguia atrás, gritando seu
nome.
Tudo correria bem, não fosse por Sarah perder o equilíbrio e ir ao chão,
caindo com a cabeça na terra, desmaiando em seguida. Willian parou o
cavalo, desceu e correu até ela, que não respondia aos seus chamados. Elea
ergueu no colo,voltou a montar levando-a juntoe partiu na direção da casa,
que não estava longe dali.
Eddy viu o patrão chegando com Sarah nos braços e correu para
conferir o que tinha acontecido.
— Ela caiu, bateu a cabeça e desmaiou —explicou Willian.
O lorde entrou correndo em casa e encontrou a mãe no salão. Ao ver
Sarah nos braços de Willian, Cecil entrou em desespero.
— Ela está viva?
— Foi apenas um desmaio, mãe.
Ele subiu as escadas até o próprio quarto e a colocou deitada na cama.
Perguntou-se se seria necessário chamar um médico, mas decidiu que
podia cuidar de Sarah sozinho. Não era nada grave, esperava ele.
— Senhorita — chamou uma vez, tocando-a nas bochechas. —
Senhorita — repetiu.
Os olhos dela começaram aabrir e, quanto mais ele chamava, mais
Sarah parecia consciente. A jovem vagava entre a consciência e o sono, mas
ouvia uma voz a chamando lá no fundo. Esforçou-se para ficar acordada,para
abrir os olhos e, quando conseguiu, encontrou o marido em sua frente, muito
próximo dela.
— O que foi, senhor? — ela sussurrou ainda grogue.
— Você desmaiou, senhorita — respondeu ele, afastando-se.
Sarah sentou-se na cama e olhou ao redor, notando que não estava no
quarto dela. Estava nos aposentos de Willian.
— Não deveria ter acelerado daquele jeito, senhorita — repreendeu.
— Foi um impulso, senhor. Peço que me desculpe — disse ela,
envergonhada.
Willian estava parado no meio do quarto, braços cruzados, de olho em
Sarah. E ela se via em apuros ali no quarto dele, sem ter o que fazer.
— Voltarei para o meu quarto agora, senhor — ela disse levantando-se.
— De jeito nenhum — impediu Willian, empurrando-a novamente para
a cama. — Ficará aqui até que eu tenha certeza de que está bem.
— Mas me sinto bem, senhor — argumentou Sarah.
— Peço, por favor, que não discuta comigo, senhorita. Sei o que estou
fazendo.
— Está bem — concordou ela por fim.
— Deixarei que descanse um pouco — Willian disse despedindo-se e
saiu pela porta.
Ela ficou sozinha e não deixou de notar os detalhes do quarto do
marido, assim como o perfume que as cobertas possuíam, um cheiro
almiscarado, que combinava com ele. Na escrivaninha, perto da janela, havia
vários pedaços de papel rabiscado e papéis de carta, o que queria dizer que
ele recebera correspondência recentemente.
Sarah sentiu-se estranha no quarto do marido. A intimidade que isso
pressupunha era alheia à atitude de Willian,ele sempretão distante, evitando
ao máximo qualquer aproximação.
Mas tinha notado que o lorde começara a preocupar-se com seu bem-
estar, e isso talvez fosse bom. Talvez ele estivesse começando a se importar
com a esposa e o plano de Sarah estivesse realmente funcionando. Era uma
conquista, a jovem sabia, e isso significava que Willian estava a um passo de
se apaixonar por ela.
O sono começou a se abater sobre Sarah, e ela aninhou-se na cama do
marido. Sentiu-amuito macia e então suspirou, enquanto aos poucos
adormecia com o pensamento em Willian.
Capítulo Nove
No dia seguinte, Sarah acordou lentamente, os raios de sol
ultrapassando a cortina e batendo em seu rosto. Sentou-se e notou a figura do
marido, ele sentadoaos pés da cama, admirando-a.
Assustada, cobriu-se e o fitou com estranheza.
— Desculpe se a assustei. Queria garantir que estaria bem ao acordar
— explicou ele.
Ela assentiu.
— Está tudo bem. Obrigada pela preocupação —respondeu em voz
baixa.
— Como nada aconteceu, você já pode sair daqui.
— Posso deixar seu quarto?
Ele balançou a cabeça concordando.
Sarah sentiu-se um pouco triste de repente. Teria que deixar os
aposentos do marido, quando havia gostado de estar ali.
— Eu queria perguntar algo ao senhor, por que tamanha preocupação
comigo?
Willian estava sério, mas então um pequeno sorriso surgiu em seu
rosto. Ele se aproximou para que ela pudesse ouvi-lo melhor.
— Porque, no final de tudo, ainda é minha esposa.
O coração de Sarah ficou aos pulos ao ouvir aquilo, ela desejava jogar-
se nos braços dele e dizer que o amava. Mas precisou se manter impassível,
sem demonstrar nenhum sentimento.
— Sim, eu sou sua esposa, senhor — concordou ela.
Willian ficou de pé, com as mãos nos bolsos da calça.
— Vou deixá-la levantar-se e a esperarei para o desjejum.
— Eu já desço, senhor — ela disse enquanto ele saía.
Sozinha, Sarah levantou-se da cama e ficou de pé no meio do quarto,
fitando os detalhes com interesse. Foi até a janela e espiou para baixo; viu os
criados trabalhando, carregando lenha. Certamente já era tarde, havia
dormido muito. Mas tivera bons sonhos, e no principal Willian a beijara; ele a
abraçara e a tratara com carinho. Isso se tornaria realidade? Ele admitira
havia pouco que ela era sua esposa, e isso era um grande avanço. Talvez as
coisas começassem a dar certo a partir de agora. Ele estava cedendo aos
poucos.
Animada, Sarah deixou o quarto de Willian e foi até o seu para trocar
de roupa e lavar-se.
Enquanto isso, no andar de baixo, o marido a esperava sentado à mesa.
Willian estava imóvel, fitando os talheres sobre a mesa enquanto sua
mente estava em um lugar distante, os pensamentos rodeando a jovem no
andar de cima como se ela fosse alguma joia preciosa a ser cuidada. Precisava
admitir que a relação com Sarah havia mudado e que, por tanta insistência
dela, começara a vê-la como esposa; admitiu que talvez devesse dar uma
chance a isso.Podia ter uma esposa, no final nada o impedia, e as amarras do
passado ele podia simplesmente deixar para trás.
Conquistaria a confiança de Sarah aos poucos e quem sabe a fizesse
apaixonar-se por ele, mesmo com as feridas que lhe cobriam o lado esquerdo
do rosto e que o deixavam com aquela aparência horrível.
Talvez houvesse uma chance de recomeço com Sarah, talvez juntos
pudessem recomeçar a vida, sem réstias do passado, olhando para o futuro.
Poderiam, quem sabe, viver bem e, em nome de Deus, quiçá pudessem até
mesmo ter filhos.
Willian tinha começado a sonhar e agora nada mais tirava aquele
sentimento dele. Havia decidido que seria assim, e ninguém o faria voltar
atrás.
Sarah desceu as escadas, e Willian se levantou para esperá-la. Ela
parecia nervosa com tudo aquilo, e ele a entendia.
— Sente-se — o lorde disse indicando o lugar dela.
A jovem sentou-se com as mãos no colo, o olhar baixo.
Willian pediu às criadas que servissem a comida, e a todo momento
Sarah continuava muda, as mãos sobre as pernas e o olhar para o colo.
— Está com uma boa aparência hoje. Suas bochechas estão coradas —
elogiou Willian.
Sarah olhou para ele.
— Eu me sinto bem, senhor.
Willian concordou. Era bom vê-la bem finalmente. O desmaio do dia
anterior o assustara, mas precisara manter a calma. No fundo ele sabia que ela
ficaria bem, e foi um alívio vê-la acordar. Vê-la tão bem o deixava feliz,
porque tudo não passara de um acidente.
— Pensei que poderíamos olhar a horta esta manhã, pretendo plantar
mais algumas coisas e queria sua opinião — falou ele, tomando um gole de
chá.
Sarah terminou de comer e o fitou. Tinha um sorriso bonito nos lábios.
— Eu adoraria, senhor. Podemos ir quando quiser — disse de pronto,
colocando o guardanapo sobre a mesa.
— Espere-me na horta em meia hora, eu vou pegar mais algumas
sementes que encomendei a Eddy, no estábulo — ele pediu se levantando.
Sarah continuou sentada, vendo-o sair, e ficou feliz ao ver Cecil
descendo as escadas.
A senhora bocejou e espreguiçou-se antes de sentar-seà mesa.
— Bom dia, minha querida. Acordou mais tarde hoje, sim?
— Um pouco mais tarde que de costume, é verdade — confirmou ela.
— E Willian, onde está? — Cecil perguntou enquanto uma criada a
servia.
— Atrás de algumas sementes. Vamos plantar na horta.
— Quer dizer que seu plano está dando certo, menina?
Sarah deu de ombros.
— Eu acho que sim. — Sorriu confidente.
Ficou conversando com Cecil por um tempo, até que se lembrou de que
deveria estar na horta esperando por Willian e levantou-se correndo. Desceu
as escadas da frente da casa rapidamente e se dirigiu ao canteiro, que ficava
aos fundos. Quando ela chegou lá, Willian a esperava com um saco de
sementes na mão.
— Desculpe, eu me atrasei, senhor.
— Tenho algumas sementes de legumes e pensei que poderíamos
plantar. Ou melhor, eu planto e a senhorita observa, não quero que se suje —
ele explicou.
Sarah concordou, ficou ao lado vendo Willian preparar a terra, arando-
a. Em seguida ele começou a semear adicionando duas sementes por cova,
com distância de um passo entre uma e outra.
— E assim veremos nascer pés de pepinos e tomates. Bem, não sei se
ainda estaremos aqui para ver isso, mas eles com certeza nascerão.
— Acredita que voltaremos logo para Londres, senhor?
Willian olhou para ela.
— Em breve as coisas estarão melhores e poderemos voltar — ele
disse enquanto ainda plantava.
O coração de Sarah se apertou. Voltar para Londres significava que
Willian estaria perto da dona da casa de jogos novamente. E isso ela não
queria. Não agora que as coisas estavam indo bem.
Enquanto Willian terminava de plantar e Sarah o esperava, uma chuva
forte começou a cair sobre a terra.Ele, então, foi obrigado a interromper o
plantio, segurou a esposa pelo braço e a puxou.
— Venha comigo —gritou para ela.
Correram até o local em que guardavam a lenha, onde puderam se
abrigar, encolhidos em um canto.
Sarah estava espremida contra a parede, sob o corpo de Willian, o
cheiro do marido entrando no nariz dela e a fazendo quase suspirar. Tinha a
cabeça no ombro dele e, quando olhou para cima, encontrou-a fitando.
— Senhorita, como pode ser tão pequena? — ele falou segurando-a
pelos braços.
Ela arrepiou-se com o contato, as mãos molhadas dele contra sua pele.
— E-eu não sei —gaguejou.
Saraho fitou e encontrou-lheos olhos, esverdeados e tão bonitos, cheios
de uma emoção desconhecida. Mas então o olhar de Willian se desviou para
os lábiosda esposa, e ela estava certa, em nome de tudo que fosse sagrado,de
que ele a beijaria.
— Pequena e doce. — Segurou-a pelo queixo e se abaixou um pouco
mais. — Inferno, como quero beijá-la.
Beije, então — queria dizer ela.
Os lábios de Willian cobriram os de Sarah de um jeito explosivo, a
língua serpenteando para dentro da boca dela, arrancando-lhe um gemido
rouco quando as línguas se tocaram, num sinal claro de paixão. A mão do
lorde desceu pelo corpo da esposa, e ele a segurou pela cintura, enquanto com
a outra mão acolhia seu rosto. Beijavam-se com desespero, a jovem agarrada
ao casaco do marido.
Willian se afastou, inebriado, desejoso de mais. Contudo alguém
precisava ter controle da situação, e tinha que ser ele.
Soltou-a fazendo-a cambalear sobre os pés e notou-a agarrada a seu
casaco. Sorriu sabendo que ela tinha gostado do beijo.
— A chuva parou — ele anunciou.
Sarah soltou-o e aproveitou para sair do pequeno esconderijo.
Não olhava para o marido, tamanha a vergonha que sentia depois do
beijo.
Mas ele não queria vê-la envergonhada, pelo contrário, queria que
Sarah falasse sobre o que sentia e o que desejava. Willian queria alguém com
quem pudesse conversar livremente, sem amarras.
— Devo voltar — ela disse ainda de cabeça baixa.
—Eu a acompanho —falou indicando o caminho ao lado dela.
Caminharam juntos, em silêncio, Sarah ainda envergonhada pelo beijo,
Willian sentindo-se tão feliz como um tolo. Um não era consciente do
sentimento do outro.
Entraram em casa e Sarah seguiu para o quarto, enquanto Willian
sentava-se no salão principal, com os pensamentos atormentando-o. Estava
todo molhado, mas completamente feliz, porque a havia beijado e ela havia
correspondido. Por Deus, a esperança estava ali dentro dele agora, e nada
mais podia impedi-lo de desejar aquilo mais que tudo. Pela primeira vez na
vida, estava sentindo-se vivo de alguma maneira, e o motivo era uma jovem
da pele rosada e de olhos astutos.
Willian continuou sentado refletindo, enquanto no andar de cima uma
jovem tinha um ataque de risos, de pura felicidade.
Deitada na cama, Sarah ria com as mãos na boca, para ninguém ouvir
sua felicidade. A jovem parou de rir e abriu os braços na cama, um sorriso
magnífico enfeitando seus lábios. Era uma pena que não estivesse disposta a
demonstrar tamanha felicidade a outra pessoa.
Beijar o homem amado era uma das melhores coisas da vida, pensou
Sarah. E, mais que isso, ela sentia que finalmente o passo maior fora dado;em
pouco tempo poderia declarar-se oficialmente como esposa de Willian. Ele
mesmo dissera isso, não havia mais como voltar atrás.
Sentou-se na cama, a mão sobre o coração acelerado. Queria que sua
mãe soubesse disso. A pobre, sozinha, morando tão longe, nada poderia
imaginar sobre a felicidade da filha. Sarah queria poder contar a ela que as
coisas estavam melhorando e que, se tudo desse certo, em breve estaria
vivendo verdadeiramente com Willian.
A jovem ficou no quarto o resto da tarde, queria continuar sozinha,
ainda emocionada com o beijo e com vergonha de encontrar Willian
novamente.
***
Era final de tarde quando Sarah saiu do quarto. Estava decidida a falar
com Willian, a passar por cima da vergonha e dizer-lhe que era sua
verdadeira esposa, que ele deveria aceitá-la. Tornaria as coisas mais fáceis e
deixaria tudo mais claro.
Saiu da casa e, suspeitando que ele estivesse no estábulo, foi na direção
das baias chamando-o, mas não recebeu resposta.
Encontrou Eddy, que estava selando um cavalo, e ele parou ao vê-la,
aproximando-se com um sorriso.
— Olá, senhora — ele disse tirando o chapéu para cumprimentá-la.
— Estou procurando Willian.
— Ele não está por aqui — falou dando um passo para mais perto.
— Então irei procurá-lo em outro lugar — ela disse com pressa,
querendo sair logo dali.
Contudo foi impedida, puxada por Eddy, que a segurou pelo braço.
Sarah se encolheu diante da mão do homem, mas ainda assim ele se
aproximou e a segurou pelo queixo.
— Quero que me olhe, mulher — falou ele, a voz grave.
Ela tremeu de medo, não se moveu.
A boca de Eddy se aproximou da de Sarah, e ela fechou os olhos
apavorada. Os lábios se tocaram rapidamente, antes de Eddy ser arrancado de
cima de Sarah por Willian.
— Willian! — Sarah gritou, mas foi calada quando ele a segurou pelo
braço e a arrastou para longe.
— Como teve coragem de beijar aquele homem? — perguntou ele,
empurrando-a em frente às escadas da entrada.
— Eu não o beijei. Foi ele — ela disse em pânico.
— Eu a vi aceitando o beijo dele. Não minta. Eu devia ter imaginado
que aconteceria algo assim. Por que confiei em você?
— Não, senhor. Por favor, acredite em mim — implorou chorando.
Willian deu as costas a ela, o peito subindo e descendo de tanta raiva,
as mãos fechadas em punho, a respiração acelerada. Ele subiu as escadas sem
olhar para trás.
Entrou na casa e encontrou a mãe no salão principal. Ao vê-lo daquele
jeito, Cecil se aproximou e quis saber o que acontecia.
— Arrume as coisas, mãe. Vamos embora amanhã cedo —disse ao
passar por ela.
Cecil correu atrás dele, segurando-o pelo braço.
— O que aconteceu, filho? Diga o que houve — pediu ela.
Willian a olhou com os olhos em fúria, o que a fez dar um passo para
trás.
— Não aconteceu nada, mãe. Eu me cansei deste lugar. Partiremos
amanhã, sim?
Ela concordou em silêncio.
O lorde subiu as escadas e foi para o quarto, trancando-se em seguida.
Ele finalmente respirou fundo, tentando liberar um pouco da raiva
acumulada. Como ela tivera coragem de beijar aquele rapaz? Willian a vira
beijando-o, por Deus, Sarah fizera mesmo aquilo. Depois de tudo, depois
daquele beijo na chuva, como pudera?
Tudo que queria agora era ir embora, voltar para sua antiga vida e
esquecer que Sarah um dia existira. Quanto a ela, se tivesse o mínimo de
vergonha iria embora definitivamente. Não era mais bem-vinda na casa dele.
Ainda no andar de baixo, havia alguém aos prantos, desesperada por
uma enorme confusão que acontecera havia pouco. Sarah encontrou Cecil e
lhe contou o acontecido, relatando como Willian ficara furioso. A senhora a
acolheu e tentou acalmá-la.
— Ele entenderá, querida. Não se preocupe — tranquilizou-a.
Sarah limpou as lágrimas no rosto.
— Ele não me ouve, senhora. Está muito bravo.
Cecil deu-lhe batidinhas no ombro, acalentando-a.
— As coisas se resolverão, menina. Acredite em mim. Mas, por agora,
uma criada arrumará suas coisas, porque partiremos amanhã — garantiu a
senhora.
— Willian decidiu isso?
Com um aceno de cabeça, Cecil confirmou.
Nervosa, Sarah se levantou e a deixou sozinha. Precisava do conforto
do quarto naquele momento. Subiu ao andar de cima e entrou em seus
aposentos, jogando-se na cama em seguida, caindo em lágrimas. Tudo estava
perfeito com Willian. Como as coisas foram acontecer daquele jeito? Ela
simplesmente congelara ao ver Eddy se aproximando para beijá-la. Sarah não
esperava pelo beijo e não soubera reagir. Mas Willian entendera que sua falta
de resistência fora uma aprovação ao beijo.
O que faria agora? Como provaria a ele que o beijo não fora
correspondido por ela? Como ele acreditaria nela?
Exatamente naquele momento em que as coisas estavam indo bem, que
tinham se beijado, e que Willian confiava nela. Um péssimo momento para
acontecer isso.
E agora o lorde tinha decidido ir embora de volta para Londres, o que
podia significar muitas coisas para Sarah. Primeiro Willian voltaria a
frequentar aquela casa de jogos e, segundo, retomaria a relação com Anna, a
dona do estabelecimento. Isso ela não podia aceitar. Não perderia o marido
para a outra mulher agora que tinha balançado o coração dele.
Sarah rolou na cama e suspirou profundamente, pensando no que faria.
No dia seguinte, antes de partir, tentaria falar novamente com Williane quem
sabe ele compreendesse tudo. E, se isso não funcionasse, ela pensaria em um
novo plano.
Por agora tudo que desejava era descansar e,possivelmente, aliviar um
pouco a terrível dor de cabeça que sentia.
***
O dia amanheceu na propriedade, e, quando os primeiros raios de sol
tocavam o chão, o lorde já estava de pé, pronto para partir. Esperou até que a
mãe e Sarah acordassem e, quandose juntaram a ele no salão principal, disse-
lhes algumas palavras.
— Está tudo pronto. Partiremos rumo a Londres agora mesmo.
Ninguém disse nada, de acordo com ele. Os criados desciam os baús
escada abaixo e carregavam para a carruagem preparada para a viagem. Cecil
e Sarah subiram no veículo e esperaram por Willian, que as contrariou
subindo em um cavalo. Ao que parecia o lorde faria a viagem do lado de fora,
cavalgando, deixando a carruagem para as duas.
Antes da partida, uma criada apareceu com uma cesta, dizendo que
tinha preparado um pouco de comida para a viagem, e despediu-se em
seguida.
O condutor da carruagem estalou o chicote, e os cavalos começaram a
andar, assim como a montaria de Willian, ao lado. Sarah sentia-se
decepcionada, pois não conseguira falar com o marido como desejava; ele
não tivera tempo para ouvi-la, tamanha a pressa. Ela se perguntava agora
quando teria tempo para falar-lhe novamente sem interrupções. A viagem não
durava mais que um dia, e até o anoitecer estariam em Londres, o que
deixava pouco tempo para que ela pudesse conversar com ele.
Cruzaram os campos esverdeados, e Sarah contemplou o rio que
passava na margem, pensando em como seria bom refrescar-se ali por alguns
minutos. O vento estava abafado devido às altas temperaturas típicas da
estação, e o calor dentro da carruagem fazia a jovem suar. Havia uma garrafa
com água, que ela usava para refrescar-se, e Sarah aproveitou para comer um
pedaço do bolo que a criada tinha enviado, tudo isso enquanto Cecil dormia
encostada no banco da carruagem.
Era meio-dia quando o veículo parou em frente a uma hospedaria, e o
condutor levou os cavalos para beber água, enquanto Sarah e Cecil
esperavam ainda dentro. Voltaram à estrada em seguida, ladeando vilas
pequenas no decorrer do caminho, e Sarah viu crianças correndo atrás da
carruagem enquanto passavam em frente às pequenas casas. Ela queria
acenar-lhes, mas achou melhor não, pois talvez Willian não gostasse.
Aproximou-se da janela para vê-lo cavalgando ao lado da carruagem e
perguntou-se se ele não estava cansado de ficar tantas horas montado num
animal.
Cecil acordou sentindo-se dolorida devido à viagem e aos buracos na
estrada.
— Ainda estamos longe?
— Creio que já passamos da metade — informou Sarah.
Ofereceu-lhe comida enquanto conversavam sobre a viagem e sobre
como fariam quando chegassem a Londres.
Houve um momento em que a carruagem parou e Willian apareceu na
janela, preocupado.
— Como estão? Precisam de algo? — ele perguntou.
— Estamos bem, filho. Não se preocupe.
— Eu queria falar-lhe um minuto, senhor — a jovem criou coragem.
Ele encarou Sarah.
— Não temos nada para conversar, senhorita —disse duramente.
— Sim, temos. Apenas um momento. Por favor — ela pediu
desesperada.
Willian bufou.
— Desça da carruagem, então. — Ele deu a volta e abriu a porta,
ajudando-a a sair.
Sarah caminhou até próximo a uma árvore e esperou por Willian, que a
seguiu. Ela olhou para ele e notou-o irritado. Seria difícil fazer aquilo.
— Eu queria dizer que não beijei Eddy, senhor. Eu nunca...
— Pare, se era isso que queria me dizer, por favor, pare — cortou-a.
— Mas...
— Não tenho interesse neste assunto, por favor, limite-se a poucas
palavras comigo — ele disse de forma amarga.
— Sim, senhor — ela assentiu, desanimada.
Ele a fez voltar para a carruagem, que logo em seguida já estava em
movimento de novo pelas estradas trepidantes.
Sarah viajava em silêncio, vendo as belas paisagens por onde
passavam, campos floridos pelos quais adoraria correr e árvores onde
pendiam frutas maduras que ela adoraria comer.
Já era fim de tarde quando a carruagem se aproximou da entrada de
Londres, e a essa altura Sarah já sentia o coração disparado; era sempre assim
quando estava naquela cidade.
Ela assistiu aos cavalos passando pelas construções e pequenas lojas,
até se aproximarem da casa de Willian, parando na frente.
A porta foi aberta e Sarah desceu da carruagem, erguendo os olhos para
a casa do marido. Nem acreditava que estava de volta àquela casa.
Cecil desceu em seguida, espreguiçando-se, e as duas começaram a
caminhar para a entrada da casa, enquanto Willian vinha atrás. Entraram e
encontraram os criados andando de um lado para o outro, esperando a
chegada deles.
Sarah decidiu que iria para o quarto e deixou os dois no salão principal,
enquanto subia as escadas.
Sozinhos, Cecil e Willian sentaram-se, enquanto o filho parecia
ansioso.
— O que fará agora, filho?
— Vou fazê-la voltar para casa, mãe. Ela não pertence a este lugar.
Cecil bufou, irritada.
— Deveria ouvi-la, meu filho. Acho que ela diz a verdade.
Willian revirou os olhos.
— Eu não acredito em nada do que ela diz. A verdade é o que meus
olhos viram, mãe — explicou ele.
Cecil assentiu, relutante.
— Como quiser, Willian. Mas depois não se arrependa do que fizer —
disse de forma dura.
O lorde deu de ombros, pouco importando-se com as palavras da mãe.
Palavras não eram necessárias quando seus próprios olhos tinham visto a
cena. Não havia explicação.
E ele não estava disposto a ouvir ninguém.
No dia seguinte viajaria até o porto com Anthony e trataria de
negócios.
Capítulo Dez
O dia mal tinha raiado e o lorde já estava de pé, esperando pelo amigo,
que apareceu pouco depois. Então juntos, de carruagempuseram-se em
marcha na direção do porto, onde Willian tinha negócios a tratar.
Ele finalmente saberia se investir em barcos de mercadorias era uma
boa ideia, se poderia render um bom dinheiro. O lorde não estava em uma
boa situação financeira, mas, se investisse no negócio certo, talvez pudesse
recuperar o que perdera nos últimos meses. Anthony garantira que o negócio
dos barcos era rentável e que bastaria um certo investimento para que rios de
dinheiro entrassem para Willian. Este estava disposto a tentar.
Sarah acordou mais tarde, assim como Cecil. A mãe de Willian desceu
para o desjejum bocejando de sono e sentou-se à mesa ao lado da nora,
cumprimentando-a com um gesto de cabeça.
— Willian partiu muito cedo. Foi ao porto ver algo sobre barcos —
contou Cecil.
— Ele pensa em investir em barcos?
A outra suspirou.
— Eu não sei. Ele não quis me dizer.
Sarah concordou em silêncio.
Uma criada apareceu correndo, as bochechas vermelhas, e pediu para
falar com Cecil. A senhora ordenou que a jovem falasse.
— Há uma senhora esperando para vê-la — a criada disse rapidamente,
sem ar.
— Quem é a esta hora?
A criada tinha os olhos arregalados e pediu para falar novamente.
— Ela diz que se chama Érica, senhora — explicou a jovem.
Cecil dispensou a criada, pensando no nome que ela tinha dito.
— Sarah, querida, temos visita. Acompanhe-me até o salão, sim?
A jovem a acompanhou e surpreendeu-se ao ver uma mulher de
cabelos cor de fogo, sentada as esperando. Ao vê-las, a mulher se levantou,
revelando uma protuberante barriga de provavelmente mais de oito meses de
gravidez.
— Oh, tia Cecil. Que bom vê-la. — A mulher abriu os braços,
envolvendo a senhoracom carinho.
Quando se afastaram, Cecil sorriu olhando com admiração para a
mulher, que não era muito mais velha que Sarah.
— Está tão linda, Érica — elogiou Cecil.
— E você deve ser Sarah — Érica disse para a jovem ao lado, que
sorriu envergonhada.
— Vejo que me conhece — falou Sarah.
Érica sorriu.
— E como eu não conheceria a esposa do meu primo Willian? Ouvi
falar de você, querida.
— Ora, e você como está? Vejo que está perto de parir — falou Cecil,
apontando para a barriga da sobrinha.
Érica passou a mão pelo ventre e riu.
— Ainda tenho dois meses de espera, tia.
— Venha, sente-se um pouco, deve cansar de ficar em pé — ofereceu
Cecil, indicando o sofá para ela.
— Eu fico feliz por tê-la encontrado, tia. A criada me disse que haviam
chegado da propriedade ontem.
Cecil assentiu.
— Passamos alguns dias no campo, menina. O ar era bom e me fazia
bem.
— Eu entendo, tia — garantiu Érica.
Sarah estava sentada ao lado das duas em silêncio, apenas ouvindo a
conversa, sentindo-se um pouco excluída.
— E você, Sarah, como tem estado o casamento com Willian?
A jovem engoliu em seco. Contaria a verdade a ela assim tão de
repente? Ela parecia desconfiada.
— Willian não me aceita como esposa — falou a verdade.
A expressão de Érica foi de pura pena.
— E você tem feito algo para mudar isso?
— Eu tenho tentado convencê-lo a todo custo, mas tem sido falho o
meu plano. Quando achei que tinha dado certo, houve um imprevisto, e então
tudo desandou — explicou ela.
Érica respirou fundo tomando ar e pôs-se a pensar.
— Acho que posso ajudá-la, Sarah.
— Pode?
Ela balançou a cabeça concordando.
— Criaremos um bom plano juntas, e tenho certeza de que seu marido
se renderá a você.
— Não sei se é possível — reclamou Sarah.
— Não tenha dúvida do que estou falando, querida. Seu marido vai se
apaixonar por você em pouco tempo — garantiu Érica.
A jovem questionou-se sobre a conveniência de confiar na prima de
Willian para criar um plano, mas decidiu,por fim, arriscar, mesmo não
sabendo nada sobre a mulher. Era um tiro no escuro.
As três passaram o resto do dia conversando, Érica explicando como a
morte do marido tinha acontecido, havia cinco meses, quando ele levara um
tiro de um credor irritado, que o levara à morte. Desde então a jovem ficara
sozinha, grávida, com o destino jogado nas mãos da sorte. Mas Érica era forte
e tinha conseguido se manter com as quantias que o marido deixara, e
acreditava que podia viver muitos anos com essa reserva.
Estava visitando a tia sob o pretexto de estar com saudades, apenas
para aliviar a solidão que sentia e que se abatia sobre ela. Não queria mais
ficar sozinha e era por isso que tinha decidido visitá-los.
Willian retornou na noite do dia seguinte, depois de uma viagem de
mais de cinquenta milhas, o que foi extremamente exaustivo. Ele entrou e
passou direto para o escritório, ignorando a presença da prima também.
Estava cansado e precisava ficar um pouco sozinho, para reorganizar os
pensamentos.
Ficou trançando sozinho enquanto tomava um pouco de brandy, o cão
brincando a seus pés. Refletia perguntando-se se havia feito um bom negócio
ao alugar aquele navio para compra de cargas. Era um ajuste arriscado e
demandara uma grande quantia de dinheiro, o qual ele tinha contado com
muito custo.
Respirou fundo ciente de que nos próximos dias saberia se o negócio
havia dado certo ou não.
Demorou para decidir deitar-se e subiu para o andar de cima devagar,
esperando não acordar ninguém. Ao menos merecia uma boa noite de sono.
***
Sarah estava furiosa. Willian tinha ido à casa de jogos novamente,
tinha voltado à antiga vida, e ela estava com os nervos à flor da pele.
Podia imaginar que aquilo aconteceria quando voltassem, mas não
esperava que fosse tão de repente.
A jovem estava decidida a dizer a ele algumas palavras, fazê-lo
entender que estava errado, e quem sabe conseguir fazê-lo mudar de ideia.
Já era noite, e ela esperava por ele sentada no sofá no salão principal,
sozinha, no escuro, iluminada por apenas uma vela.
A porta se abriu e ele entrou cambaleando, dizendo coisas inaudíveis,
tropeçando nos próprios pés. Estava completamente bêbado.
Sarah levantou-se e foi até ele, aproximando-se devagar para não o
assustar.
— Senhor, por favor, cuidado — ela disse segurando-o pelo braço.
Willian se afastou dando um passo para trás.
— O que faz aqui, senhorita? —perguntou com a língua enrolada.
— Estou ajudando-o a subir para o quarto. Vamos. — Sarah pegou-o
pelo braço e o arrastou para os degraus, mas ele continuava a cambalear. —
Ande, suba mais um.
Com dificuldade, Willian subiu os degraus, parando de vez em quando
para rir, soando sem sentido algum. Sarah estava agarrada a seu braço e o
puxava para o quarto.
Ele parou no meio do corredor e apontou para ela.
—A senhorita foi muito má comigo — disse tropeçando nas palavras.
Sarah abriu a porta do quarto e o empurrou para dentro, fechando a
porta em seguida. Ele tropeçou e caiu sobre a cama, gemendo como se
sentisse dor.
— Agora durma, senhor — ela falou, pronta para ir, mas foi impedida;
Willian a segurou pela mão e a puxou para mais perto. — O que foi?
— Quero sentir seu perfume, lembrar como cheira bem. — Ele a fez
sentar-se na cama e fez o mesmo, ficando muito próximo dela.
— Não sei o que está dizendo, senhor. Por favor...
Ela se calou quando ele aproximou o rosto de seu pescoço e pôs-se a
inalar seu perfume.
— Tão doce — ele murmurou removendo o cabelo dela para o lado e
beijou a pele pálida, fazendo-a arrepiar-se.
Sarah se controlou para não soltar um gemido; ficou imóvel enquanto
Willian continuava a atormentá-la.
— Há tantas coisas que eu quero fazer com a senhorita. Muitas
impronunciáveis. — Arrastou os lábios pelo pescoço dela e subiu até o
queixo, onde beijou-a com paixão.
— Senhor, por favor... —implorou respirando com dificuldade.
Willian puxou para baixo o vestido dela, revelando os ombros e os
seios cobertos apenas por uma fina camisa branca. Antes que Sarah pudesse
reclamar, ele estava com as mãos cobrindo-lhe os seios, estimulando-os com
o polegar, instigando-os sobre o fino tecido.
Ela engoliu em seco, mas não reagiu.
Nem mesmo quando Willian começou a beijar as comissuras de sua
boca, devagar, estimulando-a a responder. E, por Deus, como ela tentou ser
forte e continuar imóvel, mas era mortal como qualquer outro, por isso
correspondeu-lhe o beijo.
Ele tomou-lhe a boca investindo com a língua e deslizou os lábios com
desejo sobre os dela, convidando-a fazer o mesmo. E Sarah se entregou sem
reservas, oferecendo-se a ele.
Beijava-a com paixão, e iria mais longe se não fosse por alguma parte
de seu cérebro acordar e dizer-lhe que o que estava fazendo era errado. Foi
assim que Willian afastou-se de repente.
— Vá para seu quarto, senhorita. E esqueça que isso aconteceu — ele
disse olhando para o outro lado.
Ela se levantou rapidamente e ergueu o vestido, sentindo as bochechas
quentes de vergonha. Saiu do quarto com um último olhar para Willian, que
estava sentado na cama olhando para as próprias mãos, um pouco confuso.
Sarah correu para o quarto dela, onde respirou com tranquilidade, ainda
sentindo o corpo quente pelo contato que tivera com Willian.
Sorriu olhando-se no espelho, vendo-se daquele jeito, despenteada e
desarrumada, mas completamente feliz.
A jovem sabia que o marido não havia se esquecido dela, que ainda
havia uma chama de paixão entre os dois. Era uma chance em suas mãos,
pensou Sarah, determinada a ter Willian para si finalmente.
Aceitaria a ajuda de Érica e conquistaria o coração do marido
definitivamente; ele entenderia o engano sobre o beijo e por fim a aceitaria.
Willian a desejava, ela sabia. E sentia o mesmo. Era quente, abrasador,
e a jovem não via a hora de entregar-se completamente a ele. Sua mãe havia
lhe contado em detalhes o que acontecia entreos cônjuges depois do
casamento, e ela estava ansiosa para que isso acontecesse.
Sarah deitou-se esperando que no dia seguinte Willian ainda se
lembrasse do que tinha acontecido e fosse consciente dos efeitos que causara
no coração dela.
Adormeceu completamente em paz.
***
No outro dia, Sarah encontrou Érica no salão principal, junto de Cecil,
que a convidou a sentar-se. Ao lado da sogra, a jovem fitou a prima, que
tinha algo a lhe dizer.
— Estou esperando Willian. Avisei que quero falar com ele —
explicou Érica sorrindo.
— Ele está vindo, veja — anunciou Cecil, apontando para as escadas.
Willian apareceu, todo bonito,vestido com um belo conjunto preto e
branco, botas bem lustradas e o cabelo penteado com esmero. Estava lindo,
pensou Sarah.
Ele se aproximou com receio, ao ver todas aquelas mulheres reunidas,
algo lhe dizia que não era uma boa coisa.
— É bom vê-la de novo, prima — ele disse ao passar por Érica e se
sentar num lugar vazio, no sofá ao lado da esposa.
— Eu digo o mesmo, Willian — falou Érica cumprimentando-o.
Willian olhou para a esposa, que corou imediatamente. Ele se recordou
do que havia acontecido na noite anterior, o que serviu para deixá-lo ainda
mais desconfortável.
— O que é tão importante para que deseje me ver, prima? — perguntou
ele, querendo saber logo do que se tratava tudo aquilo.
Érica passou a mão pela barriga e suspirou.
— Eu soube do seu casamento e também do escândalo que aconteceu
em seguida. Achei conveniente informá-lo de que o escândalo não irá passar
até que faça algo — contou a jovem, olhando de lado para o primo,
esperando a reação dele.
Willian pareceu prender a respiração, irritado. Mas de repente inclinou-
se para a frente e começou a falar.
— E o que eu poderia fazer? — quis saber ele, ansioso.
Um sorriso recorreu o rosto de Érica, que logo se controlou.
— Voltar a frequentar a sociedade e a mostrar que está vivendo um
casamento de verdade com sua esposa. Essa é minha aposta — concluiu ela,
determinada.
Willian a fitou por alguns instantes, antes de começar a rir.
— Só pode estar brincando — acusou ele.
— Estou falando muito sério, primo. Essa é única maneira de abafar
esse escândalo — explicou Érica.
Ao lado do marido, Sarah ouvia tudo atentamente e assustou-se com a
sugestão de Érica, pois não esperava ouvir aquilo. Mas no fundo fazia sentido
e, por Deus, podia jurar que funcionaria.
Quanto a Willian, estava quieto, pensativo com o que acabara de ouvir.
Voltar à sociedade com aquela aparência? Não, ele não poderia. Não queria
ser motivo de fofocas mais uma vez. Ele estava muito bem assim, escondido
em casa, sem ter contato com ninguém. O único problema era o escândalo,
que não diminuíra, apenas crescera mais, agora com a desculpa de que o
lorde tinha fugido para o campo a fim de evitar comentários. Ele não tinha
saída.
— Eu não poderia voltar, não como estou agora — ele comentou, a voz
cheia de tristeza.
— É claro que poderia, senhor — interveio Sarah, olhando para ele.
O lorde a fitou com interesse, esperando que ela continuasse.
— Eu estarei ao seu lado, senhor. Posso ajudá-lo — ofereceu ela.
— Mesmo assim, eu sofreria com os comentários — insistiu ele.
— Basta ignorar o que os outros dizem sobre você, primo — garantiu
Érica.
Willian ficou em silêncio, pensando sobre aquilo.
Poderia ele fingir um casamento real com Sarah apenas para abafar um
escândalo? Suportaria os falatórios sobre sua aparência? Colocaria a própria
vida de cabeça para baixo apenas para que parassem de falar dele?
Decidiu que não, era um custo muito alto, não iria fazer essa aposta.
— Sinto muito, mas teremos que pensar em outro jeito — respondeu
decidido.
Sarah lamentou a escolha dele, mas evitou confrontá-lo, para deixá-lo
ainda mais irritado. Ele poderia mudar de ideia mais tarde, talvez.
— Pense bem em sua decisão, primo — disse Érica.
— Eu farei — rebateu Willian.
Ele se levantou e, com um último olhar para a esposa, saiu, indo para a
porta da frente da casa.
Decepcionada, Sarah sabia onde ele estava indo, à casa de jogos, ver
Anna, tê-la em seus braços. Isso a frustrava. Não havia nada que pudesse
fazer para que ele parasse de ir àquele lugar, ele não a ouviria sequer um
minuto sobre isso.
— Ele mudará de ideia — comentou Érica, pouco depois.
— Eu o farei mudar de ideia — garantiu Sarah, determinada.
— Gosto desse espírito, Sarah — elogiou a jovem, sorrindo-lhe.
— Meu filho é muito teimoso — desabafou Cecil, ao lado.
— Mas ele será dobrado por Sarah, tia, eu tenho certeza disso —
animou Érica.
Sarah sentia que podia convencer Willian sobre voltar à sociedade, ele
poderia escutá-la ao menos um pouco e, por fim, ela poderia convencê-lo.
Esperaria a noite e falaria com ele.
As três continuaram conversando, Érica explicando melhor o plano a
Sarah. Esta assentia a tudo, admirada pela capacidade da prima, que tinha
conseguido pensar em tudo aquilo.
Sarah tinha passado a confiar no plano de Érica, que consistia em
forçar Willian a voltar à sociedade e fingir que o casamento era real. Durante
esse caminho, haveria espaço para que a jovem fizesse o marido se apaixonar
por ela, enxergar a verdadeira face de Sarah. Era um plano audacioso e podia
dar errado, fazendo-o odiá-la, mas ela estava disposta a tentar.
Já era noite quando Sarah se retirou ao seu quarto e esperou por
Willian, que demorava a chegar. Enquanto o aguardava, sentou-se em frente
ao espelho e penteou os cabelos de um jeito novo.Prendeu as mechas com
grampos decorados, dando-lhe um ar de jovialidade, e aplicou um pouco de
pó facial, deixando a pele ainda mais branca. Olhou-se no reflexo e sorriu,
pensando no quanto tinha amadurecido nos últimos tempos e como seus
pensamentos estavam cheios ultimamente.
Ela ouviu um barulho de porta fechando e logo desconfiou que Willian
havia chegado.
Sarah arrumou o vestido e endireitou a postura, enquanto saía de seu
quarto para ir até o do marido.
Parada em frente à porta, ela precisou tomar um pouco de coragem
antes de dar duas batidinhas e esperaro marido abrir.
Ele o fez e a espiou de dentro.
— O que quer, senhorita?
— Falar-lhe, apenas um minuto — disse.
Ele espremeu os olhos na direção dela e ponderou por um momento,
antes de abrir a porta.
— Entre — indicou.
Ela entrou no quarto mal-iluminado, e as lembranças da noite anterior
voltaram com força, fazendo-a corar. Mas ele não podia ver com a pouca luz.
— O que deseja me falar?
Ela colocou as mãos em frente ao corpo, unidas.
— Vim pedir que aceite o plano de Érica, senhor. Por favor, considere-
o — pediu ela.
Willian suspirou, cansado daquele assunto.
— Eu só tenho a perder com esse plano, senhorita. Não posso aceitá-lo
— argumentou.
Sarah deu dois passos à frente, para perto dele.
— Sim, pode. Serão apenas alguns dias, senhor. Nada mais do que isso.
Depois poderá voltar a viver normalmente — explicou a jovem.
— Ainda assim, quem garante que o escândalo acabará?
Sarah o olhou profundamente, e ele sentiu que havia algo diferente
nela.
— Só saberemos se tentarmos, senhor. Por favor, eu lhe peço que
aceite — ela disse abaixando a cabeça em um gesto de humildade.
Willian passou a mão pelos cabelos, exasperado.
Deveria aceitar, por fim? Seria essa mesmo a única forma de controlar
o escândalo e impedir que tome grandes proporções? Ele suportaria as
consequências? Aguentaria ser visto novamente?
— Eu concordo — aquiesceu ele finalmente.
Um sorriso bonito tomou conta dos lábios de Sarah, que mal sabia onde
colocar as mãos, tamanha a felicidade.
— Fez uma ótima escolha, senhor. Vamos consertar isso — ela falou
animada.
— Vamos? — ele perguntou achando graça.
O sorriso dela sumiu.
— Bem, eu prometi ajudá-lo, senhor — respondeu sem jeito.
Willian adiantou um passo, ficando mais próximo dela, que prendeu a
respiração, ansiosa.
— Respire, senhorita — ele disse rindo.
Ela soltou o ar preso nos pulmões e passou por Willian, rumo à porta.
— Preciso voltar ao meu quarto.
— É melhor — Willian falou com a voz rouca.
Sarah não perdeu tempo, abriu a porta e saiu do quarto do marido,
correndo pelo corredor, direto para os próprios aposentos. Entrou soltando o
ar dos pulmões novamente e decidiu que estava segura.
Tinha conseguido, convencera Willian a aceitar o plano. E fora mais
fácil do que ela tinha imaginado. Sendo assim, em breve, passaria a se
comportar realmente como a esposa de Willian e agiria assim na frente de
todos. A única coisa que a deixava nervosa eram os comentários que se
sucederiam sobre a aparência do marido dela e como ele lidaria com isso.
Ademais, a jovem estava feliz, porque realizaria um dos seus sonhos:
participar de algum evento na sociedade londrina.
Estava ansiosa por isso.
Capítulo Onze
Sarah estava no quarto bordando uma toalha, enquanto recordava
alguns momentos vividos ao lado dos pais na época em quemoravana antiga
casa. Lembrou-se de um dia em que saíra com uma amiga até a vila, sem
avisar, o que provocara uma grande confusão, já que os paisde Sarah não
sabiam onde a filha estava. A jovem justificara o sumiço dizendo que tinha
ido até a vila para comprar doces com a intenção de logo retornar. Fora um
dos dias em que seus pais mais ficaram bravos com ela.
Mas Sarah nunca fora uma filha que desse trabalho realmente, era
muito tímida e gostava de ficar em casa, o que facilitava muito as coisas.
Tanto que, se não tivesse se casado com Willian, dificilmente teria achado
outro bom casamento. Ou talvez se casasse, sim, pois um jovem na região
demonstrara interesse na menina, que o rechaçara diversas vezes.
Era seu destino casar-se com Willian, pensou ela alegremente.
Alguém bateu à porta, era Mia, que parecia ansiosa por alguma coisa.
— O que houve?
A jovem criada mal conseguia falar, de tão nervosa.
— É Anna, a dona da casa de jogos. Está no escritório com o lorde.
Sarah queria ter ouvido mal, contudo era real, aquela mulher estava ali,
na casa de Willian.
Ela se levantou jogando o bordado para o lado e passou pela criada,
que a olhava com os olhos arregalados.
— A senhora vai até lá?
— É claro que vou — disse Sarah arrumando os cabelos, com uma
olhadinha no espelho.
Abriu a porta e saiu para o corredor, andando calmamente, enquanto
por dentro tremia de raiva. Desceu os degraus da escada e chegou ao salão
principal, onde se sentou no sofá, à espera da visita inoportuna.
Precisava admitir que a mulher era corajosa ao aparecer ali, sabendo
que a esposa de Willian estaria naquela casa. Mas Sarah era mais corajosa
ainda, por isso a estava esperando tranquilamente.
Não demorou para que a porta do escritório fosse aberta e uma figura
vestida de vermelho saísse, rindo. A mulher se despediu de Willian e
caminhou para o salão principal, onde encontrou uma jovem sentada,
esperando-a.
Ousada, a mulher a cumprimentou.
— Deve ser Sarah, a mulher de Willian.
A jovem se levantou, fitando-a com raiva.
— Sim, eu sou a esposa. E você,quem é? — perguntou como se não
soubesse.
Anna sorriu descaradamente.
— Sou uma amiga de Willian. Nós nos vemos frequentemente, você
deve saber — respondeu de um jeito debochado.
Sarah suspirou, desconfortável. Mas se manteve impassível,
mostrando-se superior.
— Eu devo ter ouvido falar da senhorita por aí. Nada realmente
importante, é verdade — falou, alfinetando-a.
A mulher passou a mão pelos cabelos, ajeitando-os, e olhou Sarah de
cima a baixo.
— A verdade dói, não é mesmo?
Sarah deu de ombros.
— Não sei de que verdade está falando, senhorita. Acho melhor ir
embora.
— Eu preciso ir mesmo. Espero que nos vejamos novamente, querida.
— Eu espero que esta seja a última vez, senhorita — retrucou Sarah
quando a mulher passou por ela em direção à saída.
Anna ignorou-a caminhando para a porta, enquanto atrás Sarah fervia
de raiva.
A mulher se foi, e a jovem levou a mão ao peito, respirando fundo,
porque tinha passado por uma situação complicada, ver a amante do marido
frente a frente e ter que enfrentá-la sozinha.
Mas ela se saíra bem, tinha conseguido enfrentá-la à altura.
Agora havia outro problema na vida de Sarah: o marido. Teria que falar
com ele, e sabia que essa era a pior parte.
Encaminhou-se para o escritório, bateu e esperou. Ele apareceu no vão
da porta e espiou, então abriu, por fim deixando-a entrar.
A jovem entrou no escritório e esperou que o marido falasse.
— Aconteceu algo? —perguntou desconfiado.
Ela o encarou.
— Encontrei-me com sua amante no salão principal. Veio fazer uma
visita, não é?
Willian ficou pálido, perdeu a cor, de tão nervoso.
— O que isso tem a ver com a senhorita? Posso receber qualquer visita
— respondeu na defensiva.
Sarah cruzou os braços, ainda o fitando com raiva.
— Pois sou sua esposa, senhor, e exijo respeito neste casamento — ela
falou, decidida.
O lorde ergueu uma sobrancelha achando aquilo divertido de repente.
— Este casamento não é real, senhorita.
Ela bufou, irritada.
— Por certo que é, senhor. Nós estamos casados de verdade, e eu exijo
que respeite minha posição de esposa. Não aceito que traga amantes para
dentro de casa — disse ela, exaltada.
Willian ficou em silêncio um momento, pensando nas palavras dela.
— Assim seja então. Não acontecerá novamente, senhorita. Tem minha
palavra — ele prometeu solenemente.
Ela assentiu concordando.
— Se me dá licença, agora preciso sair — ele disse pegando o chapéu
de topo alto em cima da mesa.
Sarah voltou a ficar nervosa, porque sabia onde ele estava indo.
— Não vá, por favor, fique —pediu desesperada.
Ele parou e virou-se para ela.
— Por que está fazendo isso, senhorita?
Ela deu de ombros olhando para ele.
Estava indo por um caminho perigoso, sabia Sarah, mas era sua última
opção para impedi-lo de ir à casa de jogos, pelo menos daquela vez. Ela
poderia aguentar as consequências.
Sarah se aproximou do marido sorrindo-lhe e segurou na gola da
camisa dele, puxando-o para mais perto.
— Fique aqui comigo — pediu olhando-o de baixo.
Notou como o rosto do marido endurecera, e ele parecia contrariado.
— Não me peça isso, senhorita — Willian disse com a voz rouca.
A jovem ficou na ponta dos pés, somente para aproximar-se do rosto
do marido e depositar-lhe um beijo no queixo.E, por tudo que fosse sagrado,
ela o ouviu gemer.
— Eu o quero, senhor — ela murmurou contra a boca dele, que engoliu
em seco.
E não havia nada nem ninguém que pudesse impedir o que aconteceu
em seguida, quando o lorde a envolveu pela cintura e colou os lábios sobre os
dela, a boca quente dominando a jovem, que entregou-se rapidamente.
Beijavam-se com desejo, as línguas unidas, os lábios deslizando docemente.
Willian a empurrou até a mesa, onde a colocou sentada e abriu-lhe as
pernas, deixando-a exposta para ele. Deslizou os lábios pelo pescoço dela,
enquanto suas mãos puxavam o vestido pelos ombros, revelando a camisa
fina e os seios endurecidos. Ele expôs os picos rosados, prontos para serem
adorados. Seus lábios desceram até os mamilos, fazendo Sarah agarrar-se às
laterais da mesa, tamanho prazer sentia.
O lorde mordiscou os mamilos levemente, arrancando gemidos de
prazer da esposa, que ofegava de boca aberta. A mão de Willian serpenteou
pela cintura de Sarah e desceu até o meio de suas pernas, erguendo as saias
do vestido. Sem cerimônia, o lorde procurou pelo centro do prazer da esposa
que gemeu alto quando ele se pôs a estimulá-la com os dedos, com círculos
rápidos.
— Diga meu nome, por favor — ele pediu.
— Willian — clamou ela, em meio aos gemidos.
Os movimentos da mão de Willian aceleraram, e a esposa jogou a
cabeça para trás, em êxtase. Ela tremeu quando o prazer em fim chegou,
jorrando ondas por seus membros. Em seguida amoleceu escorando-se em
Willian, que apenas assistia.
Ele soltou-a e passou a mão pelos cabelos, ansioso. Respirou fundo e
pensou no que tinha acabado de fazer. Tinha ultrapassado os limites do que
era certo.
Sarah se ajeitou e desceu da mesa, enquanto olhava para o marido com
um sorriso no rosto. Quando a viu, ele desviou o olhar. E então ela soube que
havia algo errado.
— Willian —chamou, mas ele lhe deu as costas.
— Pode se retirar, senhorita. Isso foi um erro meu, peço desculpas —
ele disse secamente.
Sarah pensou em dizer algo, mas sabia que seria inútil. Então decidiu
sair.
— Vou me retirar, senhor — e tinha voltado a chamá-lo de senhor,
toda a intimidade havia acabado.
Ela se foi, fechou a porta ao sair, e Willian, sozinho, praguejou. Porque
era um fraco que não conseguia resistir ao convite de uma mulher e porque
estava envolvendo-se cada vez mais com Sarah. Se continuasse assim, não
haveria volta.
Ele precisava admitir que havia algo naquela mulher que o deixava
louco, que o atormentava de desejo, mas não podia esquecer o que ela tinha
feito, o beijo em Eddy. Tudo que precisava era evitar ficar a sós com a jovem,
com o resto conseguiria lidar.
***
Alguém bateu à porta do quarto de Sarah, e ela foi atender. Era Érica
esperando-a do lado de fora com um sorriso.
Mandou-a entrar, ainda sem entender o motivo da visita.
— Já temos o primeiro evento para vocês irem, querida — anunciou
Érica, batendo palmas.
Sarah indicou a ela que se sentasse na cama e acomodou-se ao lado.
— O baile de Lady Jane, em três dias — contou a mulher, animada.
— Oh, já estou nervosa apenas em imaginar — disse Sarah, com a mão
no peito.
Ela sabia o que fazer e como se comportar, mas ficava nervosa ao
imaginar-se no baile, com todo mundo olhando. Bem, em parte o nervosismo
se devia a Willian, pois Sarah temia a maneira como as pessoas reagiriam a
ele.
— Não é necessário que fique nervosa, Sarah. Tudo dará certo. Estou
aqui para orientá-la sobre o que fazer.
— Por favor, ajude-me — pediu a jovem, um pouco insegura.
Érica arrumou as mechas de cabelo que caíam sobre os ombros e
pensou por um momento.
— Para que todos os vejam e saibam quem são, é importante que
circulem pelo salão e cumprimentem as pessoas que encontrarem. Deixe que
vejam como vocês conversam, mostre que se dão bem e quando possível
troquem olhares — orientou Érica.
— Devemos dançar? — perguntou Sarah, curiosa.
A jovem sorriu.
— É evidente. Dancem juntos a contradança, você sempre sorrindo,
mostrando estar feliz. Rodopie como uma borboleta, leve e delicada — disse
Érica.
— Temo que eu não possa fazer isso — negou Sarah, receosa.
— É claro que pode, querida. Encantará todos com seu jeito — afirmou
a mulher.
Sarah não tinha mais tanta certeza. O nervosismo estava começando a
deixá-la preocupada, e ela já não sabia mais se faria o certo. Tinha medo de
cometer algum erro e prejudicar o marido.
— Irá conosco?
Érica a encarou.
— Eu não posso, Sarah. Não com esta barriga enorme — negou, triste
porque desejava ir.
— Então eu estarei sozinha lá — reclamou Sarah.
A prima sorriu, segurando sua mão.
— Não é verdade, querida. Estará com seu marido, a melhor
companhia possível.
Sarah assentiu mais aliviada.
Érica levantou-se, disse que precisava voltar ao seu quarto e despediu-
se de Sarah, que a acompanhou até a porta. Sozinha, a jovem ensaiou alguns
passos de dança e tentou sorrir como a prima havia aconselhado. Acenou para
pessoas imaginárias e fez uma mesura a um cavalheiro que só existia em sua
mente. Tudo para tentar repetir o que Érica falara, e talvez assim não errar
nada.
No fim, ela deitou-se na cama e relaxou. O dia tinha sido ótimo e tinha
terminado melhor ainda depois que ela estivera nos braços de Willian e ele
fizera todas aquelas coisas fantásticas. Sarah não conhecia tanto prazer
quanto o marido lhe proporcionara e nem sabia de todos os lugares em que o
próprio corpo era capaz de reagir.
Perguntava-se se o coração de Willian também estava como o seu, aos
pulos, desesperadamente. Desejava saber se ele sentia o mesmo que ela,
aquela paixão avassaladora, que fazia suas pernas tremerem, que lhe tirava o
ar e que a fazia ter sonhos quentes. Ou tudo aquilo era insignificante para ele?
Sarah temia por isso, que fosse uma relação unilateral, e que apenas ela
estivesse tão envolvida daquele jeito.
Com tantos pensamentos a atormentando, tentou dormir, rolando pela
cama sob a luz da lamparina, procurando pelo sono. Demorou para que
finalmente se acalmasse e dormisse, enfim.
***
O dia do baile havia chegado, e Sarah olhava pela terceira vez sua
figura no espelho, com medo de que não estivesse bom o suficiente. Usava
um vestido azul-claro, adornado de fitas escuras, e tinha o cabelo preso em
mechas no alto da cabeça, preso com pequenos grampos decorados que ela
comprara no dia em que fora com Cecil a Oxford Street fazer compras. Mia, a
criada, garantia que sua senhora estava bem, mas a esposa de Willian ainda
temia não estar vestida corretamente.
Érica apareceu no quarto junto de Cecil, e as duas, quando viram
Sarah, abriram um enorme sorriso, elogiando-a com entusiasmo.
— Está linda— disse Érica, fazendo-a dar uma volta para vê-la melhor.
— Realmente, está belíssima —elogiou Cecil ao lado.
— Estou um pouco nervosa, mas vai passar — comentou Sarah.
— Vamos descer, Willian a está esperando — Érica falou puxando-a
pela mão, levando-a para a porta.
No andar de baixo, Willian suspirou pela terceira vez, olhando para o
alto das escadas para ver se Sarah estava descendo. Esperava por ela, estava
pronto e tinha pressa. Queria acabar com aquilo rapidamente.
Mas, então, ela apareceu como se estivesse flutuando pelo ar, descendo
as escadas, e um mar azul invadiu os olhos dele. Sarah estava linda,com a
pele rosada e os olhos castanhos luminosos. Willian se perguntou se aquela
figura era real, tamanha a beleza.
E algo dentro dele gritou dizendo: É sua esposa. Mas Willian sufocou
essas palavras e se recompôs, desviando o olhar, deixando de encarar Sarah.
Ela parou em sua frente com um sorriso bonito, e ele obrigou-se a fitá-
la, sua felicidade o incomodando.
— Senhor, está muito bonito — elogiou ela, os olhos brilhando.
— Também está muito bonita, senhorita — obrigou-se a dizer, e seu
coração falhou uma batida ao ver a reação de Sarah, que levou a mão ao
peito, emocionada.
— Ambos estão apresentáveis — concordou Érica ao lado dos dois. —
Lembrem-se de mostrarem-se aos outros e serem simpáticos.
— Sei como agir — respondeu Willian, amargo. — Vamos depressa,
antes que fique tarde.
— Como quiser, senhor — falou Sarah ao lado dele.
Com um último olhar a Érica, Sarah despediu-se enquanto
caminhavam, e passaram pela porta. Lá fora, a carruagem de Willian estava
posicionada em frente ao portão, e ele a ajudou a subir oferecendo-lhe a mão.
Ela sentou-se no banco do veículo e esperou pelo marido, que logo se
acomodou ao seu lado.
Willian bateu no teto da carruagem, indicando ao condutor que se
pusesse em marcha.
O caminho para Covent Garden não era longo, mas demandava alguns
minutos, passando pelas ruas pavimentadas e pela grande quantidade de
pessoas.
Não demoraram para chegar em frente ao grande salão, a carruagem
parou ao lado de outras, e Willian desceu primeiro, ajudando Sarah em
seguida.
Na entrada do salão, do lado de fora, duas crianças maltrapilhas, uma
maior que a outra, pediam comida, as pequenas mãos estendidas para os
convidados do baile. Sarah sentiu-se mal pela cena e queria ajudar, mas
simplesmente não podia. Willian não parecia ter notado a situação, ou tinha
apenas ignorado, ela não sabia. Mas doía-lhe o coração ver tal coisa.
Quando chegaram à porta do salão, Willian pegou o braço da esposa e
cruzou com o dele sem dizer nada. Estavam de braços dados quando entraram
no suntuoso salão de baile.
O local era bonito,bemiluminado pelas lamparinas espalhadas pelo
salão, decorado com flores amarelas, e havia uma mesa de bebidas no fundo,
lotada de taças.
Havia cadeiras dispostas nas laterais, e muitas damas estavam sentadas,
conversando. Cavalheiros espalhavam-se pelo local, muitos reunidos para
conversar antes que as danças começassem.
Sarah não conhecia ninguém, mas, quando Willian a deixou sozinha,
ela caminhou timidamente até um grupo de mulheres e sentou-se ao lado,
chamando-lhes a atenção.
— É a esposa do Lorde Fantasma, verdade? —uma jovem perguntou.
Sarah assentiu com um gesto de cabeça.
— Sim, eu sou.
As mulheres cochicharam entre si, rindo, o que deixou Sarah
desconfortável.
— É uma surpresa ver o Lorde Fantasma novamente. Achamos que ele
nunca mais se revelaria — comentou uma das mulheres.
— Ele estava ansioso para voltar — respondeu Sarah.
— É a novidade da temporada, com toda a certeza — disse a mulher
loura, sorrindo.
— Precisamos admitir que ele continua bonito — falou outra mulher,
dando uma risadinha.
Sarah sorriu. Era isso que ela queria ouvir falar sobre o marido. Que o
achassem bonito e que gostassem da presença dele. Isso o deixaria feliz.
— As danças já vão começar, vou procurar meu marido. Com licença
— disse Sarah levantando-se, indo atrás de Willian.
Ele a viu se aproximar e deixou os amigos. Encontraram-se no meio do
salão, todos os olhando com atenção.
Willian a surpreendeu com um sorriso e depois lhe ofereceu a mão,
para que caminhassem até a lateral do espaço, para longe dos olhares
curiosos.
— Como estou me saindo? — ela perguntou.
Ele a encarou por alguns segundos.
— Está fazendo tudo certo, senhorita. Agora precisaremos dançar. Irá
conseguir?
— Por certo que sim — garantiu ela.
O mestre de cerimônias começou a falar, e Willian e Sarah viraram-se
para prestar atenção. O homem explicou qual era a dança e que deveriam
dançar em pares. Os casais começaram a entrar em formação, e Willian levou
Sarah até seu lugar.
A música começou e o primeiro casal iniciou a dança, seguido dos
outros, as mulheres dando um rodopio e mudando de parceiro. Sarah fazia
tudo à risca, como aprendera, e depois de um tempo começou a relaxar,
aproveitar a dança.
Quando por fim a música parou, Sarah e Willian saíram do centro do
salão e se dirigiram à lateral onde os amigos do marido dela estavam.
Anthony se aproximou e a cumprimentou; a jovem sorriu para ele.
— É bom finalmente conhecê-la, senhora.
— Eu digo o mesmo, senhor — retribuiu alegremente.
— Está acontecendo alguma coisa ali. — Apontou Willian para o outro
lado do salão, onde havia um movimento de pessoas.
Aproximaram-se um pouco e conseguiram avistar um senhor caído no
chão, com pessoas tentando socorrê-lo. Havia uma senhora de joelhos ao seu
lado, ao que parecia, sua esposa.
— Afastem-se! — gritou um homem que tentava acordar o senhor.
A mulher ao lado começou a chorar quando viu que o marido não
acordava, passando a mão pelo rosto dele, inconsciente.
Dois homens se propuseram a carregá-lo, enquanto o mestre de
cerimônia anunciava que o baile chegava ao fim devido ao contratempo.
As pessoas começaram a sair, então Willian segurou Sarah pela mão e
a conduziu para fora, junto da multidão. Ela seguia em silêncio ao lado dele,
desviando-se de algumas pessoas em sua frente.
— Vamos para casa — ele disse do lado de fora, procurando pela
carruagem.
— Por aqui. — Sarah o puxou para o lado, de onde conseguia ver o
veículo a distância.
Conseguiram sair do meio das pessoas e chegaram onde a carruagem
estava. Willian a ajudou a subir e em seguida fez o mesmo, enquanto
começavam a andar rumo a casa.
— Que confusão — comentou Sarah, respirando fundo.
— A senhorita machucou-se na multidão? — perguntou ele,
preocupado.
— Estou bem. Apenas com pena do senhor que passou mal.
— Acho que ele morreu, senhorita — disse Willian.
Sarah arregalou os olhos diante da notícia.
— A mulher dele parecia desesperada. Não posso imaginar quão
terrível é perder o marido dessa forma.
Encontrou os olhos de Willian e notou também que ele ria.
— Do que está rindo, senhor? — ela perguntou sem entender.
— Por sorte seu marido está bem vivo —comentou ele, achando graça
da situação.
Sarah sorriu, envergonhada.
— Uma grande sorte, é verdade — disse brincando.
A carruagem parou em frente à casa de Willian, que desceu e a ajudou
a descer também. Ele aproveitou para olhar para o céu e contemplar a
imensidão de estrelas que brilhavam lá em cima.
— Bela noite, não acha?
Ela olhou para cima e assentiu.
— Maravilhosa, com toda a certeza — falou ao contemplar o céu
escurecido.
— Gosto de olhar as estrelas da janela do meu quarto. Posso vê-las
quando o céu não está nublado. Sabe, senhorita, se fizer o mesmo, estaremos
os dois vendo o mesmo céu ao mesmo tempo — ele disse olhando-a.
— Contemplar estrelas é uma boa distração, senhor. Farei isso todas as
noites se me pede —concordou ela.
Os dois ficaram em silêncio, olhando-se sob a luz da lua, de frente para
casa, e poderiam passar muito tempo assim, se não fosse por Willian voltar à
realidade e desviar o olhar.
— Vamos entrar. Está tarde — ele falou, acompanhando-a.
Caminharam até a porta, que Willian abriu, e entraram na casa
totalmente escura em silêncio.
—Não posso ver nada — reclamou Sarah.
— Vamos subir. Venha — ele a pegou pela mão e a levou até as
escadas, os dois tropeçando enquanto subiam os degraus.
Conseguiram chegar ao corredor, e Willian levou Sarah até a porta do
quarto dela, onde a deixou, seguindo para os próprios aposentos.
— Boa noite, senhorita — ele disse antes de entrar no quarto.
— Boa noite, senhor.
Sarah entrou e ficou agradecida por Mia ter deixado uma lamparina
acesa sobre a penteadeira, o que iluminava todo o quarto.
Ela finalmente poderia descansar, depois de uma noite agitada.
Capítulo Doze
Naquela manhã, Sarah acordou muito mais cedo, arrumou-se,
penteando os cabelos e escolhendo um belo vestido, e desceu as escadas em
silêncio, indo diretamente para a cozinha.
Faria algo que não fazia havia tempo, e que a encantava. As criadas
assustaram-se ao vê-la ali, todas parando seus trabalhos para atendê-la.
— Eu só quero ajudar a cozinhar, preparar o desjejum — pediu ela.
As criadas entenderam e logo ofereceram a ela um avental, além de
uma colher para mexer os ovos que estavam sendo fritos.
Sarah ajudou a cortar o pão e o serviu nos pratos, decorando-os com
pedaços de toucinho. Em seguida ajudou a decorar o bolo recém-assado com
uma fina camada de açúcar por cima e, por fim, dourou as torradas,
deixando-as prontas em uma tigela.
Enquanto Sarah cuidava da comida, no salão principal chegava
Willian, que acordara um pouco mais cedo naquele dia.
Ele se sentou à mesa e mandou servir a comida, que chegou
rapidamente. Willian comeu um pouco de ovos e serviu-se da torrada,
achando estranho o modo como estava disposta no prato. Chamou a criada,
que apareceu timidamente na frente dele.
— O que há de diferente nessa comida? —perguntou curioso.
— A Senhora Sarah a cozinhou, senhor — explicou a criada.
Willian jogou o guardanapo em cima da mesa e se levantou, indo para
a cozinha, para o desespero das criadas, que não o esperavam ali.
Encontrou Sarah decorando um bolo com frutas e canela, e ela
assustou-se ao vê-lo ali.
— Não o esperava aqui, senhor — ela disse sem jeito.
— Vim convidá-la para tomar o desjejum comigo — falou ele, fitando-
a.
Sarah ficou constrangida, olhou para as criadas e para Willian, mas por
fim decidiu aceitar. Retirou o avental e arrumou os cabelos, enquanto seguia
atrás do marido, em direção ao salão principal.
— Sente-se aqui. — Willian indicou puxando a cadeira para ela.
Ela obedeceu em silêncio, e ele voltou ao lugar que ocupava, sentando-
se também.
— Está tudo muito agradável. Deveria provar — ele sugeriu mostrando
os pratos.
Logo as criadas apareceram para servir Sarah, que recebeu um monte
de comida em seu prato, um pouco de tudo que havia preparado. Ela provou
o bolo e se deliciou com o sabor das especiarias. Em seguida comeu um
pouco de ovos preparados por ela, e achou que estavam bons. Enquanto a
jovem comia, Willian assistia encantado, gostando de vê-la comer.
— Agora percebe como está bom, não é? — ele perguntou rindo,
debochando dela.
A esposa de Willian parou de comer e o fitou sem jeito.
Ele estava rindo dela. E Sarah não sabia como reagir diante disso.
— Desculpe-me, senhorita. Por favor, continue a comer — Willian
disse pouco depois.
Ela já não tinha fome, por isso deixou o prato de lado e se dedicou a
fitar o marido, que estava realmente bonito. Com o cabelo úmido penteado
para o lado, vestido de preto e branco, os olhos verdes ainda mais bonitos.
— Vocês estão aqui! — Cecil apareceu no salão, com um enorme
sorriso por ver os dois juntos.
A senhora estava feliz em encontrá-los ali sozinhos. Para ela era uma
grande evolução na relação dos dois.
Cecil sentou-se ao lado do filho, que sorriu para a mãe, acalentando o
coração da mulher. Ele não sabia como gestos como aqueles faziam bem à
mãe. A senhora estava carente da atenção do filho, e qualquer pequeno gesto
vindo dele era algo enorme.
A mãe de Willian começou a comer enquanto contava a Sarah seus
planos para a tarde, que incluíam bordar uma toalha, e convidou a jovem para
juntar-se a ela. Sarah prontamente lhe respondeu dizendo que aceitava o
convite.
— Estou feliz por sua companhia, menina — disse Cecil alegremente.
— Eu vou cuidar de negócios e volto só à noite, mãe — comunicou
Willian.
— Soube de seus investimentos junto de Anthony. Espero que sejam
produtivos.
Willian relanceou o olhar para Sarah e depois para a mãe.
— Serão, mãe. Agora preciso ir — disse se levantando, acenando com
a cabeça para a esposa antes de sair.
Ela acenou de volta, em um cumprimento mudo.
— Parece que temos uma evolução na relação dos dois — comentou
Cecil depois que ele tinha saído.
— Ele está mais gentil comigo — explicou Sarah.
— Logo estará caindo de amores por você, querida — disse a senhora,
sonhadora.
Sarah riu do jeito da sogra, a pessoa que mais acreditava na relação do
jovem casal e a que mais torcia para que se acertassem. Precisava agradecer a
Cecil tanto empenho e a fé, que se mantinha inabalável mesmo em meioa
todas as adversidades.
As duas terminaram de comer e se retiraram, cada uma indo para seu
quarto, Sarah disposta a ler um pouco do novo romance que conseguira e que
a estava deixando ansiosa para saber o final.
***
Pela tarde, Cecil foi atrás de Sarah, em busca de companhia enquanto
bordasse, como pela manhã a jovem concordara em fazer.Sentaram-se nos
sofás do salão principal, com duas xícaras de chá fumegantes à frente. Cecil
bordava uma toalha e fazia os pontos rapidamente, devido aos anos de
prática.
Já Sarah fazia devagar, ponto por ponto, com cuidado para não furar o
dedo com a agulha, coisa que quase sempre fazia. Aprendera a bordar com a
mãe, mas não tinha a mesma prática que ela ou Cecil. Não era um de seus
passatempos favoritos, preferia muito mais cavalgar pelo campo ou nadar no
rio a passar as tardes bordando. Mas não tinha muita escolha naquela tarde,
depois do insistente convite da mãe de Willian.
— Está fazendo muito bem, menina — elogiou Cecil.
Sarah alternou o olhar entre o bordado da sogra e o seu, comparando-
os. Havia uma diferença muito grande entre os dois. Um era bonito e grande,
com cores vivas, e no outro via-se uma flor de cinco pétalas, de cor vermelha,
que pareciam disformes.
— Estou feliz em ver que meu filho e você estão se entendendo,
querida. Sabe, estou me sentindo muito afastada de Willian e sinto que nossa
relação agora é complicada — reclamou Cecil, chorosa.
— A senhora tem que tentar falar com ele. Willian irá ouvi-la, eu sei
que ele se preocupa com a mãe — sugeriu Sarah.
— E quanto a você, menina, deixe-me dizer que já sinto que é como
uma filha que não tive — revelou a senhora, emocionada.
Sarah sentiu-se tocada pelas palavras da sogra. Não esperava ouvi-las.
E, na verdade, também sentia o mesmo por Cecil, tinha-lhe muita
consideração.
— Fico feliz em ouvir isso, senhora. Eu também a vejo como a uma
mãe — falou Sarah.
Cecil tinha um enorme sorriso no rosto. Tudo que lhe faltava era ser
notada e receber um pouco de atenção. Ter um pouco de carinho das pessoas
com quem ela mais se importava na vida, Sarah e Willian.
A jovem tinha decidido falar com o marido sobre isso, pedir-lhe que
desse mais atenção a Cecil, que sentia a falta dele. Sarah tinha certeza de que
Willian a ouviria e conversaria com a mãe.
Distraídas com o bordado, as duas passaram quase a tarde toda
entretidas, conversando. Não viram o tempo passar, notaram apenas que era
tarde, pois Willian tinha chegado e ido diretamente ao escritório.
Sarah deixou Cecil e foi até o marido, batendo à porta. Ele abriu e a
mandou entrar.
Ela foi se sentar na cadeira em frente à mesa dele, que deu a volta e se
acomodou na confortável cadeira de tecido.
— Eu queria falar com o senhor sobre um assunto importante — disse
ela, assim que o viu sentado.
— Pois estou aqui para ouvi-la.
Ela se aproximou da mesa dele e falou baixinho.
— É sua mãe, senhor, está sentindo sua falta. Não está destinando
muita atenção a ela — explicou Sarah.
— Realmente? Ela disse isso à senhorita? — perguntou ele,
aproximando-se da esposa também.
— Disse, é verdade. Está se sentindo só e desamparada — contou a
jovem.
Willian pensou por um instante.
— Eu cuidarei disso, senhorita. Agradeço a informação. Mas por que
estamos sussurrando? — ele quis saber, sorrindo.
— Eu não sei — disse Sarah normalmente, arrumando a postura. —
Meu trabalho era apenas informá-lo, senhor. Agora que o fiz, vou me retirar.
Ela se levantou, mas ele a segurou pela mão, impedindo-a de ir.
— Espere, senhorita. Deixe-me avisá-la que fomos convidados para a
festa na casa de Lady Susan amanhã.
Sarah se surpreendeu com a informação. Não sabia de nada.
— E suponho que nós iremos, verdade?
— É evidente. Pessoas importantes estarão lá, além de alguns
conhecidos que não vejo há anos. É o momento certo para nos mostrarmos—
explicou Willian calmamente.
Ela soltou-se do aperto dele e deu um passo para trás.
— Farei como desejar, senhor.
O rosto de Willian mudou, tornou-se sério. O lorde se levantou e foi até
ela, que já não sabia mais o que ele faria.
— Eu preciso lhe agradecer, senhorita, por tornar minha vida mais fácil
aceitando tudo isso — ele disse bem próximo dela, que o olhava encantada.
— Sabe que farei o que for preciso pelo senhor — ela respondeu
simplesmente.
Ele acolheu o rosto dela em uma mão, acariciando-a.
— Eu sei, senhorita. Mas ainda me admiro com sua lealdade a mim,
depois de tudo. Como posso recompensá-la? — Willian perguntou com a voz
rouca.
Basta que me beije, diria ela.
— Dando-me seu amor, senhor — ela pediu baixinho.
— Não posso, senhorita —respondeu de pronto, afastando-se.
— Por que não? — Sarah perguntou triste.
Willian levou a mão ao rosto ferido e suspirou.
— Porque não a mereço. E não posso esquecer o que vi.
— Mas eu não o beijei — protestou a jovem.
O lorde deu as costas a ela.
— É melhor que se vá, senhorita — ele disse decidido.
Ela não tinha mais nada que dizer a ele, então se foi, batendo a porta ao
sair. E o deixou com o coração partido, porque o lorde já não podia mais
controlar os sentimentos que agiam desgovernadamente em seu coração.
E enquanto isso, em uma área específica da casa, longe dos olhos dos
patrões, uma mulher se esgueirava, ao lado de uma criada que a tinha ajudado
a entrar ali. A mulher tinha más intenções, almejava prejudicar Willian.
Anna não tivera muito trabalho para entrar ali, precisara apenas
convencer uma criada a ajudá-la, oferecendo dinheiro.
— Quero que me informe sobre tudo que acontece aqui dentro.
— Sim, senhora — respondeu a criada.
— Eu lhe pagarei uma alta quantia para que me informe tudo que
Willian faz. Ninguém saberá, e seus patrões não descobrirão. Você não estará
prejudicando ninguém — explicou a mulher.
A criada assentiu, maravilhada com a quantia de dinheiro prometido a
ela. Era mais do que ganhava na casa e poderia mudar sua vida.
Assim, a mulher se foi, rebolando os quadris de volta a sua casa de
jogos, esperando pelos apostadores que chegariam naquela noite e que lhe
encheriam os cofres. Esperava principalmente pela visita de Willian, que
continuava gastando o que não tinha, aumentando sua dívida, o que já era
uma pequena fortuna.
Ela não o avisava sobre as dívidas, esperava o momento certo para
cobrar, quando arrancaria tudo dele e o faria arrepender-se por ter se casado
com aquela jovenzinha sem graça. Willian era só dela, seu amante preferido,
e nenhuma outra ousava tocá-lo. Mas ela tinha ouvido falar que ele tinha
comparecido ao baile de Lady Jane ao lado da esposa e que tinham sido a
sensação do evento. Tinham atraído os olhares de todos, e muitos já diziam
que eram o casal da temporada; Willian com sua beleza exótica, e a esposa,
de uma beleza angelical.
Ela não deixaria aquilo acontecer.
Capítulo Treze
A noite da festa de Lady Susan havia chegado, Sarah e Willian estavam
reunidos no salão principal antes de partir. A jovem usava um vestido de cor
pérola, o cabelo preso em um coque adornado por pequenos cristais. Estava
linda, Willian mesmo achara, encantara-se com a aparência da esposa.
Ele e Érica conversavam sobre o que fazer na festa. A prima o
orientavasobre como o casal deveria se comportar, sempre próximos um do
outro, deixando que os vissem. Era importante que as pessoas comentassem
sobre como o marido era atencioso com a esposa, e o quanto ela parecia
apaixonada por ele.
— Sorria sempre, Sarah — aconselhou Érica.
— Eu farei — garantiu.
— Podemos ir?— perguntou Willian, conduzindo Sarah para a saída.
Saíram da casa e foram para a carruagem. A viagem até o Mayfair não
era tão curta e levava um tempo. Os dois estavam dentro da carruagem, que
começou a se movimentar, e Sarah olhava para o marido no escuro, tentando
vê-lo.
Ele notou e sorriu para ela.
— Temo que não possamos nos ver aqui dentro, senhorita —falou em
tom de brincadeira.
— Mas posso ouvir sua voz. Isso já basta — disse Sarah, também
sorrindo.
Os dois ficaram em silêncio em seguida, enquanto acarruagem
percorria as largas ruas de Londres, mas era possível ouvir pessoas gritando
do lado de fora e sentir um cheiro forte de fumaça. Sarah ainda não se
acostumara à agitação da cidade e achava estranho como as pessoas pareciam
estar sempre com pressa, diferentementede como agiam regidos pela vida
pacata a que ela estava acostumada. Preferia o clima bucólico em que fora
criadaà cidade e, assim que se acertasse com Willian, pediria a ele que
voltassem ao campo ao menos depois da temporada.
A carruagem parou em frente a uma enorme casa, e os dois desceram,
Sarah ficando encantada com o tamanho da construção. Havia pessoas na
porta, entrando, então eles foram para o final da fila e juntos entraram na
casa.
O local estava lotado de pessoas, enquanto um piano soava ao fundo, e
os criados serviam bebida aos convidados. Willian logo reconheceu Anthony
e levou Sarah junto, até o outro lado do salão, passando entre as pessoas.
— É bom vê-lo, velho amigo — Willian falou rindo.
Anthony sorriu e cumprimentou Sarah ao notá-la.
— Digo o mesmo, Willian. Não sabia que viriam hoje.
Sarah estava sorrindo. Gostava de Anthony, achava-o um bom homem,
e era amigo de Willian, o que era uma boa coisa.
Os dois começaram a falar sobre outros assuntos, e Sarah ficou de lado,
sozinha. Notou ao lado as mulheres que conhecera no baile e decidiu que iria
até elas. Deixou Willian para trás e se aproximou das damas, que a
reconheceram de pronto.
— A mulher do Lorde Fantasma — comentou uma delas.
— Sou eu mesma — respondeu Sarah, sorrindo.
— Achamos que não iríamos mais vê-la — disse uma mulhermais
jovem.
— Meu marido e eu decidimos frequentar mais eventos este ano —
explicou Sarah.
Asmulheres olharam-se e sorriram, cúmplices. Como se soubessem de
algo que Sarah não sabia.
— Há uma convidada especial esta noite. Acho que a conhece.
— Quem é? — Sarah quis saber.
A mulher mais velha tinha um sorriso maligno nos lábios quando fez
um gesto apontando para o lado, sugerindo que Sarah olhasse.
E, quando a jovem o fez,seu coração quase parou. Era ela. Era Anna.
Ela estava ali.
— A dona da casa de jogos — contou uma mulher.
Sarah se levantou ao ver que Anna também a havia notado e que agora
caminhava na direção de Willian. A jovem não perdeu tempo e também se
dirigiu para onde ele estava, esperando alcançá-lo primeiro.
Por sorte logo estava ao lado do marido, que se assustou com a
expressão dela.
— O que foi? — ele cochichou para a esposa.
— É Anna. Ela está aqui —respondeu baixinho.
Os olhos de Willian percorreram o salão e pararam na mulher de
vestido verde, que lhe sorria. Ele deu as costas a elae olhou para a esposa.
— Fique sempre ao meu lado, vamos passar por isso juntos — ele disse
determinado.
Sarah assentiu.
Lady Susan apareceu no centro do salão, falando que haveria uma
quadrilha e que quem quisesse participar ficasse no centro do espaço. Ela mal
terminou de falar e Willian pegou a mão de Sarah, levando-a até onde
estavam os outros casais.
— Apenas dance e esqueça o resto, senhorita — Willian disse no
ouvido dela.
Sarah concordou.
Os casais foram para seus lugares, alinhados frente a frente, enquanto a
pequena orquestra que havia ali começava a tocar. Todos tinham se colocado
nas laterais do salão para ter mais espaço.
Sarah notou que Anna também dançaria, o que a deixou nervosa.
A dança começou, as mulheres encontraram os homens e bateram as
mãos, enquanto giravam e voltavam aos seus lugares. Havia chegado a hora
de trocar de par e, quando Willian fez isso, ficou de frente para Anna, que
sorriu sedutoramente para ele.
Os casais trocaram de novo e, por sorte, Sarah voltou ao seu lugar. A
dança seguiu e a jovem não deixava de prestar atenção na mulher ao seu lado,
no quão bonita ela era.
A dança terminou, e os casais deixaram o centro do salão, Willian
levando Sarah consigo, sempre a protegendo.
Ficaram na lateral do salão, enquanto ele conversava com um
conhecido e ela permanecia em silêncio, ao lado. Mas Sarah notou
rapidamente quando a mulher se aproximou caminhando com lentidão na
direção deles, carregando uma taça de bebida nas mãos.
Em outra ocasião, as pernas de Sarah teriam tremido, e ela teria ficado
com medo da mulher. Mas era uma pessoa mais forte agora e estava
determinada a não temer nada. Por isso ficou ao lado do marido, até que
Anna se aproximou e parou em frente aos dois.
— Será que posso conversar com você um minuto? — ela perguntou
sorrindo, olhando com luxúria para Willian.
O lorde olhou para a esposa e sorriu.
— Estou ocupado esta noite, senhora. Há de me desculpar — ele disse
amargamente.
O sorriso no rosto dela sumiu, e Anna deu as costas aos dois.
— Eu disse que daria tudo certo — Willian falou para a esposa.
— E eu confiei no senhor —rebateu.
Ele sorriu para ela.
Depois disso, Anna sumiu da festa, certamente fora embora emburrada,
por ter sido ignorada. Sarah e Willian continuaram conversando com os
amigos do lorde, que agora incluíam a jovem em seus assuntos. Ela estava se
sentindo muito feliz pela atitude do marido e também por ser incluída na
conversa. Estava sendo uma noite perfeita.
Mas a festa acabou e, antes que eles se fossem, Lady Susan apareceu
para cumprimentá-los.
— Que graciosa é a esposa de Willian — elogiou a mulher.
A jovem corou, envergonhada.
— Sou um homem de sorte — disse ele, orgulhoso.
Deixaram o salão pouco depois e se dirigiram à carruagem em silêncio,
rumando para casa em seguida.
— Eu me diverti essa noite — comentou o lorde.
Sarah olhou-o no escuro.
— Eu também me diverti, senhor — afirmou ela.
— Acho que não precisaremos ir a bailes e festas por um tempo,
senhorita. Todos já sabem que somos casados — informou ele.
Ela assentiu.
— Como quiser, senhor.
Mas no fundo a jovem sentiria falta dos bailes e eventos londrinos.
Tinha gostado de estar no meio das pessoas e de conversar, assim como de
dançar.
A carruagem parou em frente à casa de Willian e os dois desceram, ele
segurando-a pela mão. O lorde a conduziu até a entrada, ajudando-a com o
degrau, e os dois entraram, sendo surpreendidos ao encontrar as lamparinas
acesas.
Sem dizer nada, Sarah subiu as escadas e o marido a seguiu em
silêncio. Quando estavam perto da porta do quarto, ele a segurou pelo braço,
impedindo-a de continuar.
— O que houve, senhor?
— Quero apenas desejar uma boa noite. — Aproximou-se e depositou
um beijo na testa de Sarah, que não reagiu. — Boa noite, senhorita.
— Boa noite — ela murmurou antes de abrir a porta do quarto e entrar.
Ele ficou sozinho, sorrindo, sabendo que não tinha mais controle sobre
o próprio coração e que talvez aquela fosse uma batalha perdida.
Willian não tinha mais forças para lutar contra aquele sentimento.
***
Na noite seguinte, todos reuniram-se no salão principal por um motivo
especial. Era aniversário de Sarah, que se surpreendeu ao ver o bolo de mel,
que as criadas haviam preparado especialmente para ela. A jovem ficou
emocionada com o gesto, pois quase nunca comemorava os aniversários,
sendo que eram sempre dias comuns quando morava com os pais.
— Vamos, corte o bolo — disse Érica, batendo palmas.
Sarah pegou a faca e cortou uma fatia do bolo coberto de creme,
colocando-o num pratinho.
— O primeiro pedaço é seu, senhor — ofereceu Sarah ao lorde, que
estava quieto em um canto.
Ele pegou o pedaço, surpreso.
— Obrigado, senhorita —agradeceu antes de comer.
Sarah pegou-se sorrindo. Ele tinha ficado feliz com o bolo. E isso era
bom.
— O que deseja no dia do seu aniversário, Sarah? — perguntou Érica
ao lado.
A jovem pensou por um momento. De canto de olho fitou o marido e
logo soube o que pedir.
Eu quero o amor de Willian.
Pediu em silêncio, esperando com toda a fé que se realizasse o pedido.
Ela não deixaria de acreditar naquilo mesmo que demorasse a acontecer; não
tinha pressa, podia ser muito paciente.
Todos comeram do bolo, enquanto Sarah contava como passava os
aniversários na casa dos pais, dias comuns, sem festa enem sequer bolo,
dizendo como ficara feliz com aquela surpresa.
— Quantos anos está fazendo, senhorita? — Willian perguntou.
Ela o fitou por trás dos cílios longos.
— Vinte e quatro, senhor.
— Não sou muito mais velho que a senhorita. Tenho vinte e sete —
contou ele.
Sarah ficou surpresa com a revelação, esperava que o marido fosse
mais velho que isso.
Depois de comerem o bolo, Cecil disse que iria deitar-se e logo, com
um olhar cúmplice, Érica também anunciou o mesmo. As duas subiram
conversando baixinho, em segredo.
Sobraram Willian e Sarah, que se olhavam constrangidos, e a jovem
poderia jurar que o lorde tinha algo a lhe dizer. Mas ele estava quieto,
concentrado nos próprios pés.
— Vou me deitar também — ela disse esperando que assim ele falasse
algo.
— Eu também vou. — Levantou ele, bocejando.
Encaminharam-se juntos para as escadas e, até o momento em que
alcançaram a porta, Sarah acreditava que o marido fosse dizer-lhe algo. Mas
Willian estava mudo. Ora, elenão falaria nada?
— Boa noite, senhorita — o lorde se despediu.
— Boa noite, senhor — ela correspondeu desanimada.
Cada um entrou em seu quarto, e Sarah logo deitou-se na cama,
exasperada porque o marido ficara quieto quando estava claro que tinha algo
a dizer. Agora ela desejava saber o que era. E se fosse importante?
Bufou, irritada.
Estava tentando dormir, de olhos fechados e debaixo das cobertas,
quando ouviu uma leve batida à porta. De novo.
Ela se levantou e foi correndo abrir, surpreendendo-se ao encontrar
Willian parado do lado de fora.
— Entre. — Abriu espaço para ele passar.
— Lembrei-me de algo importante, senhorita —falou correndo os
olhos por todo o corpo dela.
— O que é?
Ele se aproximou e tirou do bolso uma caixinha pequena,de cor preta.
— É um presente para que se lembre sempre de mim, senhorita — ele
ergueu a caixinha e a abriu, revelando um anel com um grande cristal
transparente.
— Meu senhor... — ela disse assustada. — É um anel.
— Muito perspicaz. — Willian riu.
Ele retirou o anel da caixinha e o deslizou pelo dedo dela, que ainda
estava sem palavras.
— Quero que, ao olhar para este anel, recorde-se de toda a admiração
que tenho pela senhorita — Willian disse, a voz rouca.
— Eu me lembrarei — garantiu admirando o anel.
— Mas preciso ser sincero e dizer que há mais um motivo para minha
presença aqui no meio da noite, senhorita. — Deu dois passos para perto
dela.
Sarah começou a sentir que o clima tinha mudado. Willian estava sério,
respirando calmamente, mas não parava de apertar as mãos em punho,
ansioso.
— Pergunto-me qual seria o motivo, senhor — provocou ela, ciente do
que estava acontecendo.
Um sorriso quase diabólico correu o rosto de Willian, que se
aproximou mais, ficando a centímetros da jovem.
— Vim porque estou morto de vontade de beijá-la — ele disse de um
modo sensual.
— Pois então me beije, senhor.
Ele então a segurou pela cintura e a aproximou, beijando-a com paixão.
Sarah deslizou os lábios sobre os dele, lábios macios e carnudos, em um beijo
cheio de desejo. A língua dele serpenteou para dentro da boca dela, que a
recebeu com ardor. Era um beijo quente, sensual e doce. E, por Deus, como
ele podia sentir aquilo!
Os lábios de Willian desceram para o pescoço de Sarah, que se inclinou
para que ele tivesse total acesso. E, enquanto a beijava, ele começou a puxar
o vestido para baixo, junto da camisa fina, revelando os seios rosados,
prontos para ser adorados.
— Faça amor comigo, Sarah — ele pediu em um sussurro.
— Sim — ela respondeu com a respiração entrecortada.
Era uma aprovação, pensou Willian, feliz porque ela tinha concordado
em se entregar a ele finalmente. E ele a queria, em nome de Deus, como a
desejava.
Willian abocanhou um mamilo túrgido e o adorou como se saboreasse
a fruta proibida mais doce de todas. Rodopiou a língua em volta do pico
rosadoe fez Sarah arquear o corpo de tanto prazer.
Levou-a até a cama, onde a fez deitar-se, enquanto continuava a despi-
la. Abriu os fechos do vestido e puxou-o para longe do corpo dela. A peça foi
ao chão, e Sarah se viu completamente nua na frente dele. O olhar do marido
era faminto, e a jovem começou a ficar com vergonha, usando as mãos para
tapar-se.
— Não tenha vergonha de mim, meu amor — ele falou, tirando as
mãos dela de sobre o corpo.
Sarah entendeu aquilo.
Willian se colocou de joelhos sobre a cama e abriu as pernas da esposa,
deixando-a exposta aos olhos dele. Começou a beijá-las arrastando os lábios
para cima, rumo a um caminho sensual. Quando ele alcançou a altura das
coxas, bem próximo do ponto certo, Sarah se retesou.
— Abra-se para mim, Sarah. Confie em mim.
E ela confiou, fechou os olhos e esperou pelo que viria.
Quando a boca do marido lhe tocoua intimidade, Sarah agarrou-se ao
lençol da cama, assustada com o prazer arrebatador que lhe atravessava o
corpo. Willian a estimulou com a língua, bem sobre aquele ponto de prazer, e
a fez gemer o nome dele.
Willian a torturou, levou-a quase ao topo e parou, apenas para vê-la
implorar pelo alívio.
Ele aumentou o ritmo com lambidas mais rápidas, e ela se contorceu,
atingindo o ápice.
Sarah ainda tremia quando ele começou a se despir. Willian removeu
as roupas com rapidez, até ficar completamente nu, fazendo-afitá-lo com
interesse.
Ela não podia deixar de notar o membro grosso e rijo, e como o marido
tinha um corpo bonito, bemdefinido, ombros largos e pernas esbeltas. Ele
sorriu para ela ao notar o olhar atrevido.
— Vamos fazer isso ser bom — Williandisse quando se colocou entre
as pernas dela.
Estimulou-a novamente naquele ponto sensível e a fez estremecer. Ele
deitou-se sobre a esposa e posicionou o membro na entrada dela, que o fitava
com intensidade. Havia muita coisa no olhar dele.
Willian a penetrou com cuidado, aos poucos, fazendo-a acostumar-se
com seu tamanho, então foi mais fundo, arrancando um gemido de dor de
Sarah.
— Vai passar, meu amor — ele a acalmou, enquanto começava a se
mover devagar.
Sarah sentia um ardor forte e algo que ainda não conseguia identificar,
mas era como um prazer novo e desconhecido. Ela começou a se acostumar
às sensações e em certo momento já estava mais relaxada.
Willian acelerou o ritmo, fazendo-a agarrar-se nele, então juntos
encontraram o pico mais alto do prazer, ele se derramando dentro dela, ela
caindo sobre os lençóis.
— Isso foi muito bom — ela comentou pouco depois, quando estavam
deitados, juntos, na cama.
— Esperei muito por isso — confessou ele.
— Valeu a pena esperar, senhor.
Ele franziu o cenho.
— Pode me chamar de Willian a partir de agora. Nós somos íntimos
demais para que me chame de senhor.
Ela sorriu.
— Tudo bem, Willian.
Ele pegou a mão de Sarah e beijou sobre o anel que lhe dera. Era um
sinal de amor verdadeiro da parte dele. Pois era assim que se sentia,
totalmente apaixonado por aquela mulher.
— Preciso dizer algo, por favor, ouça. Eu não beijei Eddy, foi ele que o
fez, eu apenas fiquei sem reação.
— Eu sei — Willian falou calmamente.
— Sabe?
Ele assentiu com um gesto de cabeça.
— Eu acredito em você, Sarah — confidenciou.
O sorriso dela era bonito, de pura felicidade.
— Então estamos bem?
— Estamos.
Sarah queria pular de alegria. Tinha finalmente se acertado com
Willian, tinha conquistado o coração do marido, algo pelo que tinha se
esforçado tanto. Havia passado por tanta coisa para chegar ali, que tudo
parecia um grande e terrível sonho. Era seu momento de vitória. Finalmente.
— Vamos dormir um pouco. Talvez eu a acorde no meio da noite —
Willian avisou, arrumando-se na cama.
— Para quê? — perguntou ela, confusa.
Ele riu.
— Para que repitamos o que acabamos de fazer, meu amor. Eu tenho
muita energia, sabe.
Ela abriu a boca, incrédula. Não sabia que as pessoas podiam fazer isso
mais de uma vez em uma mesma noite. Podia gostar disso facilmente.
Os dois se arrumaram para dormir, ainda nus sob as cobertas, Willian a
abraçando de um jeito doce, massageando-lhe o lóbulo da orelha até que ela
dormisse.
O sono veio rápido para os dois, que se entregaram aos sonhos.
Capítulo Quatorze.
Era noite, e Sarah passara o dia entretida entre bordar com Cecil e ler o
novo romance que comprara. Seu marido passara o dia no escritório, junto de
Anthony, falavam sobre negócios. E, quando a noite caiu, saiu sem dizer
aonde ia, o que a levou a acreditar que ele tivesse ido à casa de jogos.
Era uma grande decepção para ela, depois da noite que passaram
juntos. Pela manhã, ao acordar, Willian a tinha levado ao céu novamente,
mostrando-lhe todas as faces do prazer. Ela não podia acreditar que tudo
aquilo não significara nada para ele. Como podia procurar a outra quando
havia estado nos braços dela?
Sarah estava triste e chateada, com vergonha por ter acreditado nas
palavras doces de Willian, por ter acreditado que ele a amava. Era uma
grande ilusão.
Alguém bateu à porta do quarto, e ela foi atender.
Era Mia, com uma expressão preocupada.
— O que houve, Mia?
— É Érica, senhora. O bebê vai nascer.
Sarah assustou-se. Saiu do quarto e seguiu a criada, até os aposentos de
Érica.
A mulher estava deitada na cama, com as mãos na barriga, enquanto
gemia alto. Ao ver a prima, Éricapediu-lhe que se aproximasse.
— Meu bebê vai nascer, Sarah. Preciso de você — rogou a mulher,
respirando com dificuldade.
Sarah não estava certado que fazer. Sabia como nasciam os bebês, mas
não tinha ideia de como fazer um parto. Estava quase em pânico também.
— Eu a ajudarei — garantiu ela, mesmo sem saber o que fazer.
Cecil entrou no quarto carregando alguns pedaços de pano e logo
ordenou à criada que fervesse água.
— Vou precisar da sua ajuda, menina. Vamos ter de fazer o parto dela
sozinhas. O médico não está na cidade.
Sarah assentiu, ajudaria no que fosse necessário. Ao que parecia, Cecil
sabia o que fazer, o que era um alívio para ela.
As horas passaram, e as dores de Érica só aumentaram, seus gritos
ecoando pela casa. Sarah estava ao lado da prima, que lhe apertava a mão a
cada contração.
— Eu acho que chegou a hora, Sarah! — gritou Érica, com a mão na
barriga.
Cecil se aproximou e colocou a sobrinha numa posição melhor, as
pernas abertas, enquanto dizia a ela que começasse a empurrar.
Érica fazia o que era pedido, empurrava com todas as forças, mas a dor
era dilacerante sobre os seus quadris, fazendo-a quase arquear o corpo.
— Mais forte, Érica — dizia Cecil ajoelhada entre as pernas da mulher.
Ela empurrou novamente, mas precisou respirar fundo para recuperar
as forças, e o fez de novo, e de novo.
— Estou vendo a cabeça. Vamos, continue.
Ao lado, Sarah assistia a tudo angustiada, temendo que a prima não
conseguisse.
Érica fez força mais uma vez, agora com mais empenho, e assim o
bebê saiu, deslizando nos braços de Cecil. Ela segurou o bebê nos braços e
ele chorou, fazendo todas no quarto respirarem aliviados.
— É uma menina — revelou Cecil, enrolando o bebê em um tecido
limpo e o entregando nos braços de Érica.
— Minha filha. —A mulher chorava admirando o pequeno ser.
Cecil se levantou, cansada, e olhou para a nora, que assistia a tudo com
os olhos cheios de água. Era um milagre lindo, uma benção de Deus.
Sarah deixou o quarto pensando em como seria se tivesse um filho de
Willian, porque no fim tanta dor valeria a pena. Nunca havia pensado sobre
ter bebês, mas as atuais circunstâncias a faziam refletirsobre essa
possibilidade. Um lindo bebê, de olhos verdes como os do pai, pensou.
Havia apenas um problema. Willian não tinha voltado ainda da casa de
jogos e já era madrugada. Ele nunca tinha ficado tanto tempo assim, o que
levava Sarah a pensar sobre o que o marido estava fazendo.
A verdade era que não sabia mais se poderia perdoá-lo por isso. Ele
estragara a única possibilidade de ficarem juntos. E ela estava cansada de
tanto o esperar, dia após dia, com a crença de que no final ficariam juntos.
Cansara-se de acreditar que o destino de ambos era o amor verdadeiro. Fora
tempo perdido, tempo gasto em vão.
Mas ela tomaria uma atitude assim que amanhecesse.
***
O dia mal havia raiado, e Sarah já tinha arrumado todos os seus
baús,estava pronta para partir. Decidira ir embora definitivamente e esquecer
Willian. Estava cansada de acreditar nele e em um amor fadado ao fracasso.
Seu marido não mudaria, não deixaria de ver a amante,e ela não podia lidar
com isso.
— Vim me despedir, senhora — disse a Cecil, que a olhou assustada.
— O que está fazendo, menina?
— Voltando para casa. Eu desisto de Willian.
Cecil a segurou pelas mãos.
— Ele pode mudar, querida. Acredite, eu falarei com ele.
— Não. — Sarah sorriu de um jeito triste. — Não quero mais isso.
Estou cansada, senhora.
— Eu entendo, querida. Se é isso o que quer, pelo menos use nossa
carruagem. Assim não precisa alugar uma — disse Cecil, chorosa.
— Eu aceito, senhora. Vou pedir que levem meus baús agora mesmo
— Sarah falou, passando por ela. — Ah, senhora, por favor, despeça-se de
Érica por mim, não quero atrapalhá-la com o bebê.
Sarah deu as costas à sogra e desceu as escadas, olhando pela última
vez aquela casa. Vivera bons momentos ali, muitos dos quais jamais
esqueceria. Passou pelo salão principal e foi para a saída, deixando para trás o
que ela sonhara ser seu futuro. Willian não voltara da casa de jogos, então
não a veria partir, o que era melhor.
Abriu a porta e saiu, os raios do sol batendo contra seu rosto. A
carruagem estava preparada, e o condutor a ajudou a subir. Em seguida ele
começou a conduzir o veículo rumo à casa de Sarah.
Ela admirou pela última vez a cidade.Parecera-lhe tão estranha no
começo, mas depois Sarah acabara gostando de morar ali. Fitou pela última
vez os prédios cinza, as casas bem-construídas e o parque que ela não pudera
conhecer. Disse adeus para Londres com um gosto amargo na boca e jurou
pelos céus que era a última vez que botava os pés ali. Voltaria a acostumar-se
com a vida no campo, com a tranquilidade e a calmaria inerentes a um lugar
tão afastado.
A carruagem deixou Londres e passou pelos campos esverdeados,
beirando um pequeno rio, mas, quando tinha acabado de passar por uma vila,
ela parou bruscamente.
Sarah estranhou. O que tinha acontecido?
Logo ouviu gritos e uma voz grossa; pensou que poderia ser um
assalto. Tentou se manter calma, ficou encolhida dentro da carruagem. Até
que abriram a porta e um homem, com uma máscara preta que deixava ver
apenas os olhos dele, interpelou-a:
— Desça, senhora.
A jovem engoliu em seco. O que aquele homem faria com ela?
Sarah desceu da carruagem, e ele a segurou pelo braço com força.
Havia mais três sujeitos, também usando máscaras e portando armas.
Ela entrou em pânico.
— Por favor, não façam nada comigo —pediu desesperada.
— Não é você que queremos, senhora — o homem disse ainda a
segurando.
Não? Então do que falavam?
Um grito ecoou ao longe, todos avistaram um homem cavalgando na
direção deles, e logo Sarah reconheceu Willian. Ele parou ao lado da
carruagem e desceu, caminhando de mãos erguidas na direção dos bandidos.
— Soltem-na — pediu respirando com dificuldade.
Um dos homens riu, empurrando Sarah para o lado.
— Estamos com sorte, achamos quem queríamos. — Ele caminhou até
Willian, que deu um passo para trás.
— Você vem conosco. É o senhor que queremos.
— Não vou a lugar nenhum — Willian se opôs erguendo os punhos,
pronto para lutar.
— Homens, prendam-no — um dos assaltantesordenou e os outros três
se aproximaram de Willian, que estava pronto para enfrentá-los.
Ele desferiu um soco em um delese outro no seguinte, mas eles eram
rápidos,de modo queWillian errou os dois. Um homem acertou um soco no
queixo do lorde, que tropeçou e caiu no chão. Os outros se aproximaram e
pegaram uma corda para amarrá-lo nas mãos, então colocaram um pedaço de
tecido dentro da boca dele, para que não gritasse.
Sarah assistia a tudo assustada, não podia fazer nada. Os homens
ergueram Willian e o colocaram sobre um cavalo, amarrado, enquanto os
demais subiam nosoutros animais e iam na direção de Londres.
A jovem ficou olhando enquanto levavam Willian e pouco depois o
condutor da carruagem apareceu para perguntar-lhe aonde ir.
— Para a casa de Willian — ela respondeu de pronto.
Subiu novamente na carruagem e voltou na direção de Londres,
esperando encontrar o marido.
Chegou a casa um tempo depois e, ao vê-la, Cecil sorriu.
— Willian a encontrou, querida?
— Encontrou — afirmou ela, agitada. — Mas foi raptado em seguida.
— Como é? — Cecil não compreendeu.
— Alguns homens o levaram, senhora. Eu suspeito de alguém, mas não
tenho provas — explicou ela.
Uma das criadas apareceu no salão principal e timidamente se
aproximou de Sarah.
— Senhora, tenho algo alhe contar.
Sarah parou para ouvi-la, mesmo em um momento conturbado como
aquele.
— Uma senhora ofereceu dinheiro para que eu contasse o que
acontecia aqui na casa a ela. A quantia era alta. Sinto muito por ter aceitado,
senhora. Perdoe-me.
A jovem fitou com tristeza a criada. Mas não lhe faria mal e nem a
mandaria embora por isso. Sabia como a falta de dinheiro poderia ser um
problema.
— Então minhas suspeitas estão certas. Anna sequestrou Willian.Irei
atrás dela — disse determinada.
— Espere, menina. Pode ser perigoso — alertou Cecil.
— Eu não tenho medo, senhora —respondeu Sarah, caminhando para a
saída.
Deixou a casa e olhou ao redor. Notou o céu nublado,choveria, e
agradeceu a si mesma por usar a capa. Caminhou pelas ruas de Londres rumo
à casa de jogos e notou sobre si os olhares das pessoas.Elas a reconheciam?
Sabiam quem era?
Não demorou e Sarah estava em frente à casa de jogos, que tinha
apenas uma fresta da porta aberta, o suficiente para ela entrar. Adentrouo
lugar, que estava completamente vazio.
— Você veio — uma voz surgiu no alto das escadas. Era Anna.
A mulher desceu os degraus e parou em frente a Sarah.
— Você está com Willian. Solte-o — ordenou a jovem.
Amulher riu com as mãos na cintura.
— Eu irei soltá-lo quando ele quitar a dívida que tem comigo.
— Solte-o e ele pagará depois — tentou Sarah.
Anna balançou a cabeça em negativa. Ela não deixaria Willian sair dali
tão facilmente assim. Precisaria pagar a dívida primeiro.
— Homens, tragam-no aqui — ordenou Anna.
Dois homens apareceram vindos de uma porta ao fundo, arrastando
Willian, que estava amarrado e amordaçado. Um deles tinha uma faca na mão
e arma foi diretamente para a garganta do lorde, que gemeu alto.
— O que está fazendo? — perguntou Sarah alarmada.
— Brincando com ele, é claro. — Anna foi até Willian e tomou a faca
da mão do homem, deslizando-a pelo pescoço do lorde, fazendo-o agitar-se.
— Batam nele, homens.
Eles encheram Willian de socos no rosto e chutes pelo corpo, jogando-
o no chão. Espancaram-no obedecendo às ordens de Anna.
Sarah analisou a situação pensando no que deveria fazer e chegou à
conclusão de que não tinha escolha senão aquilo em que tinha pensado. Era
sua decisão final.
— Nós vamos pagar a dívida — anunciou.
— Como fará isso se seu marido gastou o dinheiro em um navio no
porto? — perguntou Anna.
Sarah abriu a capa e passou o dedo pela costura abrindo-a, fazendo as
joias caírem no chão aos seus pés.
Willian arregalou os olhos diante da cena, e Anna sorriu.
— Elas valem mais do que a dívida. São todas suas — anunciou a
jovem.
Anna se colocou de joelhos, a juntar as joias, anéis, colares e pérolas.
— Agora solte Willian — pediu Sarah.
— Soltem-no — falou Anna, enquanto ainda pegava as joias.
Os homens tiraram a mordaça da boca do lorde e em seguida cortaram
as cordas, soltando-o.
— Sarah — ele disse se aproximando da esposa, com o rosto
machucado.
Ela desviou o olhar dele, ainda estava magoada.
— Vamos embora. — Willian a puxou pelo braço na direção da saída.
Eles saíram caminhando pela rua cheia de gente, um do lado do outro, e
Sarah permaneceu quieta, sem nada para dizer-lhe.
Mas o lorde tinha coisas a dizer.
— Passei a noite negociando com Anna, tentando convencê-la a esperar
mais tempo antes de cobrar a dívida. Mas ela não quis saber de me ouvir.
— Você não voltou para casa e eu pensei que estivesse apostando, ou
com Anna.
— Eu fui até lá pela última vez na noite passada, para dizer adeus e
negociar a dívida — explicou ele.
Sarah parou.
— Então não foi vê-la?
Willian sorriu, e seu rosto parecia disforme depois de tanto apanhar.
— Eu não me atreveria, minha senhora. Não depois da nossa noite
juntos.
— O senhor foi atrás de mim depois que soube que eu tinha ido
embora?
— É evidente. Não poderia deixá-la ir. Só não esperava que aqueles
homens seguissem a carruagem, achando que era eu quem viajava nela. Então
tudo aconteceu — explicou Willian.
Voltaram a caminhar, as pessoas ainda os olhando de modo estranho.
Talvez a reconhecessem do baile, era possível.
Mas tudo tinha acabado bem, e isso era o importante.
Capítulo Quinze
Willian tinha acabado de se banhar e estava deitado na cama usando
apenas as calças, o peito desnudo. Sua esposa estava sentada ao lado, tinha
acabado de limpar as feridas causadas pelo espancamento.
— Eu estou bem — afirmou Willian tentando rir com o lábio inchado.
— Como pode rir disso? Poderiam tê-lo matado se eu não entregasse as
joias — ralhou Sarah, brava.
Willian segurou-a pelos braços e a puxou para o colo, fazendo-a sentar
de pernas abertas.
— Não fique brava comigo, meu amor. Tenho uma boa notícia. Em
breve poderei comprar joias tão bonitas quanto aquelas.
— Do que está falando? — ela perguntou desconfiada.
O lorde sorriu.
— O negócio dos navios deu certo, meu amor. Voltarei a ganhar
dinheiro e sairei desta crise — explicou Willian.
— Estou feliz por você, marido.
Willian arqueou uma sobrancelha, curioso.
— Marido? É assim que me chama agora?
Ela deu de ombros, sorrindo timidamente.
— É o que você é. Meu marido.
— Então devo chamá-la de minha esposa, certo?
Ela concordou.
Ele se arrumou na cama e a puxou para mais perto, a intimidade dela
sobre sua ereção.
— O que está fazendo? — Sarah perguntou enquanto Willian
massageava sua coxa.
— Estou tentando fazer amor com você — ele disse ao subir mais a
mão, parando sobre a intimidade dela.
Sarah prendeu a respiração.
Havia a barreira das saias do vestido, mas era mínima em relação aos
toques do marido, que lhe abrasavam a pele. Ela queria despir-se de tudo
rapidamente e estar pronta para ele.
— Por Deus, como eu gostaria de enxergar totalmente para vê-la neste
instante — falou Willian, a voz engasgada.
Ela pegou a mão dele e levou ao rosto, depois foi descendo pelo
corpo,fazendo-o reconhecer cada traço seu.
— Assim me conhecerá como sou.
Ela parou sobre o coração, e ele espalmou a mão ali, enquanto sentia as
batidas contra a pele.
— Eu preciso dizer, não aguento mais esconder, Willian — Sarah disse
emocionada.
— O que é?
Ela colocou a mão sobre a do marido e respirou fundo, esperando não o
assustar.
— Eu o amo. Amo-o desde a primeira vez que o vi.
Willian ficou em silêncio, apenas absorvendo as palavras que a esposa
tinha dito.
Sarah achou que aquele era o momento em que ele a rejeitaria,
repudiaria seu amor, mas Willian tomou a mão dela e aproximou do coração,
enquanto a fitava com intensidade.
— Eu também a amo, meu amor. Amo-a com todo o meu coração —
disse com a voz rouca.
Ela abriu um enorme sorriso e pulou nos braços dele, que a acolheu
com carinho, abraçando-a.
— Sinto como se estivesse sonhando — ela disse feliz, agarrada a ele.
— Mas é real, Sarah, e, a partir de hoje, prometo que teremos uma boa
vida — prometeu ele.
Ela ergueu os olhos para Willian, aproximando-se para um beijo, e ele
a recebeu com paixão.
Um beijo quente, apaixonado e cheio de fervor.
Ele começou a despi-la, removeu o vestido, jogou-o para o lado e tirou
a calça, perdendo-a no processo. Os dois ficaram nus, ela sentada em cima do
marido com as pernas abertas.
— Estou louco para entrar em você, meu amor — ele murmurou
beijando o pescoço dela.
— Gosto de fazer amor com você, Willian.
Ele gostou de ouvir aquilo. Sua esposa estava se soltando e isso era
bom. Gostaria de vê-la mais ousada.
Willian desceu o beijo em um rastro de puro calor até os seios e
estimulou um mamilo. Depois sua mão encontrou o centro do prazer de
Sarah, deslizou os dedos sobre o clitóris e deu prazer a ela com paixão.
Queria que a esposa se entregasse a ele, que oferecesse tudo que tinha e, no
fim, se derramasse em prazer. Ela veio na mãodo marido, gemendo seu
nome, agarrando-o pelos braços.
Willian a ergueu e a fez sentar-se sobre seu membro, deslizando para
dentro do corpo da jovem, sentindo-o pulsar ao seu redor. Ela era quente,
apertada. Então, quando começou a se mover, ele jogou a cabeça para trás
edeixou um gemido alto escaparda garganta.
Segurou os quadris dela e a orientou a subir e descer, aumentando o
ritmo, fazendo-a cravar as unhas no braço dele. O prazer chegou para os dois,
que caíram cansados, abraçados.
Ela estava nos braços do marido, ele ainda dentro dela, quando Willian
a acolheu contra o peito.
— Eu nunca disse, mas acho que você deveria saber. Nunca amei
Emeline, a esposa do meu primo.. Tudo que fiz foi por meu ego, que não
queria perdê-la para Aaron. E como conseqüência, acabei ferido.— contou
ele.
Sarah sorriu fracamente.
— Eu imaginava isso.
— Precisei pagar pelo que fiz. O destino foi cruel comigo — comentou
pesaroso.
— Mas lhe deu uma nova chance quando você decidiu fazer negócio
com meu pai — disse Sarah, rindo.
Willian riu também. Passou a mão pelas costas dela, em círculos
preguiçosos.
— Sou grato a Deus por ter feito aquele negócio com seu pai. Mas
dinheiro nenhum compra o que temos.
— Ele ficaria feliz em saber que nos acertamos — falou Sarah,
pensando no pai.
— Então, em memória dele, prometo ser feliz com você, meu amor.
— É uma promessa e tanto — provocou ela.
— Uma promessa verdadeira — afirmou.
— Vou acreditar, então. O senhor é bom em fazer promessas —
brincou Sarah.
Ele era e, se ela pedisse, juraria por todas as estrelas do céu, ou até
mesmo pediria confirmação a todos os anjos do céu. Ele a amava e,diante de
tudo que fosse mais sagrado, daria a vida por ela.
***
No dia seguinte, pela manhã, Sarah e Willian foram visitar Érica, que
ainda estava no quarto, cuidando do bebê. Os dois chegaram juntos,o que fez
a prima abrir um grande sorriso, porque compreendera que os dois tinham se
acertado.
— Vejo que estão juntos — disse a prima, com a filha nos braços.
— Muita coisa aconteceu, mas resolvemos ficar juntos — explicou
Willian.
— Fico feliz com isso. Vocês merecem ser felizes.
— E você, como está? Já tem um nome para ela?
Érica olhou para a filha, que dormia nos braços dela, e sorriu.
— Phillipa.
— É um belo nome — elogiou Sarah.
— Edward ficaria feliz se soubesse — a jovem disse tristemente.
— E o que fará agora? — perguntou Willian.
A prima pensou por um momento. Tinha poucas opções agora que
tinha acabado de parir, e enfrentar a vida sozinha era difícil.
— Vou abusar da hospitalidade de vocês e ficar aqui por mais um
tempo, mas depois voltarei para minha casa.
— Fique o tempo que quiser — disse o lorde.
— Eu agradeço, primo.
— Vamos procurar por Cecil? — disse Sarah, com pressa de falar com
a sogra.
Ele concordou. Deixaram Érica sozinha novamente e desceram as
escadas, à procura de Cecil. Encontraram-na sentada, solitária no salão
principal, bordando.
Ela se sobressaltou ao vê-los juntos.
— Não me digam que se acertaram finalmente —disse animada.
Os dois se olharam e sorriram.
— Está certo, nós estamos juntos, mãe — contou Willian.
Cecil levou a mão ao peito, emocionada.
— Esperei tanto por este momento.
— Eu também — disse Sarah, rindo.
— E quanto a você, mãe, sinto muito por ter estado longe todo esse
tempo — Willian falou se aproximando de Cecil, tomando a mão dela na sua.
— Senti sua falta, filho — ela disse chorosa.
Puxou o filho para um abraço, e ele a apertou entre os braços.
Sentia saudade desde que se afastara e agora estava finalmente se
acertando com ela.
Willian a soltou e se colocou ao lado da esposa; olhou-a e sorriu, feliz
porque a tinha ao seu lado. Amava Sarah mais do que tudo que possuía e só
conseguia pensar em como era triste sua vida sem ela.
Sarah sentia o coração pulando desenfreado, de pura felicidade. No
final tinha razão em perseverar na conquistado amor do marido. Toda a
espera, todos os momentos de incerteza serviram para que, no final,
descobrisse que Willian também a amava.
No final, o amor tinha vencido, e o Lorde Fantasma tinha aceitado sua
esposa.
Cena extra
Willian subiu aquelas escadas sabendo que não seria bem recebido e
que, talvez, até lhe mandassem embora na hora. Mas precisava fazer aquilo,
para continuar com sua vida carregando um pouco menos de peso na
consciência.
A porta estava aberta, a criada o viu chegar e correu para dentro, a fim
de avisar ao patrão. Willian parou e o esperou, até que ele apareceu andando
rápido em sua direção.
— O que faz aqui? — o homem perguntou com raiva.
— Tenho algumas coisas para dizer — respondeu Willian.
— Diga logo e vá embora.
O lorde assentiu.
— Eu queria que soubesse que nunca amei Emeline. Tudo que fiz foi
para desafiá-lo — disse Willian de braços abertos.
Aaron o fitava com raiva, as mãos fechadas em punho.
— Estou pagando pelo que fiz, como pode ver. — O lorde mostrou as
feridas do lado do rosto.
— Seu tempo está acabando, diga logo a que veio — falou Aaron.
Willian deu dois passos para a frente e continuou de braços abertos.
— Quero que me perdoe por tudo que fiz — disse, a voz trêmula.
Aaron demorou a responder, porque achou que tinha ouvido mal, mas,
quando entendeu as palavras do primo, respondeu da pior maneira. Deu-lhe
um soco no rosto e o derrubou no chão.
—Você é um grande merda —Aaron disse segurando Willian pela
camisa, dando outro soco no rosto dele.
— Eu mereço cada golpe, eu sei — falou Willian, ainda no chão.
Aaron saiu de cima do primo, que se levantou, a mão sobre a boca
cortada pelo soco.
Willian achou que seu plano tinha sido falho, que o primo não iria
perdoá-lo, então assustou-se quando viu Aaron esticar a mão para ele, em um
gesto de amizade.
— Estamos de bem, então — disse Aaron, ao segurar a mão do primo.
— Estamos — confirmou o outro, sorrindo.
Era um grande alívio para Willian, que buscava redenção e um pouco
de paz. Saber que havia sido perdoado significava um pouco de
contentamento, e isso o faria viver melhor.
Cena extra II