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Educação Integral: Princípios e Concepções

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Princípios e concepções de educação integral no Brasil

PRINCÍPIOS E CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO INTEGRAL NO BRASIL

PRINCIPLES AND CONCEPTIONS OF INTEGRAL EDUCATION IN BRAZIL

PRINCIPIOS Y CONCEPCIONES DE EDUCACIÓN INTEGRAL EN BRASIL

Claudinei FRUTUOSO/FAAR1

RESUMO: O presente trabalho apresenta um estudo sobre os princípios e as


concepções de educação integral no Brasil, baseando-se nas premissas que deram início
à educação integral institucionalizada e por intermédio de políticas implantadas entre
1950 e 2005. Esta abordagem se inicia com a construção da primeira escola-parque, a
qual, embora não seja denominada por seu criador como educação integral, possuía
características que permitem assim a classificar. A outra experiência é a dos Cieps, que
foi pensada por Darcy Ribeiro num modelo distinto do primeiro. Os CEUS são
apresentados aqui como experiência que merece destaque, pois não sendo esta uma
escola de educação integral traz, em sua estrutura, um espaço propício para o
desenvolvimento de um tipo de educação voltado para as camadas mais paupérrimas da
população. Neste modelo, o que chama a atenção, além da estrutura, é a proposta
pedagógica e a organização escolar. Por fim, apresenta-se uma experiência desenvolvida
no Norte do país, denominada Projeto Burareiro de Educação Integral, experimento que
funcionou nos anos de 2005-2006, sendo uma proposta pedagógica que teve como base
teórico-metodológica a Pedagogia Histórico-Crítica. Assim, este texto tem como
objetivo caracterizar o percurso das políticas de educação integral no Brasil como
registro histórico de um momento. Percebe-se, porém, que embora se tenha progredido,
pedagógica e organizacionalmente, a escola de educação integral ainda está aquém das
reais necessidades das demandas a que se destina.
Palavras-chave: Concepções de Educação. Políticas Educacionais. Princípios
Pedagógicos. Educação Integral.

ABSTRACT: The present paper shows a study about the principles and conceptions of
integral education in Brazil, based on the premises that initiated the institutionalized
integral education and through policies implemented between 1950 and 2005. This
approach begins with the construction of the first School-park, which, although it is not
denominated by its creator like integral education, had characteristics that allow thus to
classify. The other experience is the Cieps, which was thought by Darcy Ribeiro in a
model different from the first. The “CEUS” are presented here as an experience that
deserves to be highlighted, since this is not a comprehensive school of education, which
in its structure provides a space conducive to the development of a type of education
aimed at the poorest sections of the population. In this model, what draws attention,
besides the structure, is the pedagogical proposal and the school organization. Finally,
an experiment developed in the North of the country, called the Burareiro Project of
Integral Education, is an experiment that worked in the years 2005-2006, being a
pedagogical proposal that had as a theoretical-methodological basis the Historical-
Critical Pedagogy. Thus, this text aims to characterize the course of integral education

1
Mestre em Educação-UNIR, Graduado em Pedagogia-UNIR, membro do Grupo de Pesquisa CIEPES-
UNIR. Professor da rede estadual de ensino e Professor das Faculdades Associadas de Ariquemes -
FAAR. Email frutuoso12@gmail.com .

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policies in Brazil as a historical record of a moment. It is noticed, however, that


although the pedagogical and organizational progress has been made, the school of
integral education still falls short of the real needs of the demands for which it is
intended.
Keywords: Conceptions of Education. Educational Policies. Pedagogical Principles.
Integral Education.

RESUMEN: Este trabajo presenta un estudio sobre los principios y las concepciones de
educación integral en Brasil, basándose en las premisas que dieron inicio a la educación
integral institucionalizada a través de políticas implantadas entre 1950 y 2005. Este
enfoque se inicia con la construcción de la primera Escuela-parque, la cual, aunque no
sea denominada por su creador como educación integral, poseía características que
permiten clasificarla así. La otra experiencia es la de los Cieps, que fue pensada por
Darcy Ribeiro en un modelo distinto del primero. Los CEUS son presentados aquí como
una experiencia que merece destaque, pues no siendo esta una escuela de educación
integral trae en su estructura un espacio propicio para el desarrollo de un tipo de
educación orientado hacia las esferas más pobres de la población. En este modelo, lo
que llama la atención, además de la estructura, es la propuesta pedagógica y la
organización escolar. Por último, se presenta una experiencia desarrollada en el Norte
del país, denominada Proyecto Burareiro de Educación Integral, experimento que
funcionó en los años 2005-2006, siendo una propuesta pedagógica que tuvo como base
teórico-metodológica la Pedagogía Histórico-Crítica. Así, este texto tiene como objetivo
caracterizar el recorrido de las políticas de educación integral en Brasil como registro
histórico de un momento. Sin embargo, aunque se ha progresado, pedagógica y
organizacionalmente, la escuela de educación integral todavía está en desacuerdo con
las reales necesidades de las demandas a que se destina.
Palavras clave: Concepciones de Educación. Políticas Educativas. Principios
pedagógicos. Educación Integral.

Introdução

O movimento educacional no Brasil, em especial o da educação integral, pode


ser compreendido a partir das lutas dos movimentos sociais no final do século XIX e
início do século XX. Este período é marcado por lutas travadas entre as classes
compostas pela burguesia urbana e rural de um lado e, de outro, por uma classe operária
desarticulada e analfabeta. É preciso destacar, nesse período, que a mão de obra da
pequena indústria e da agricultura era composta, em sua maioria, por estrangeiros. Para
Gomes (2007, p. 27-28), alguns fatores se apresentam importantes na compreensão das
origens da indústria no Brasil, bem como a formação do movimento operário; para ele,

dentro de todo esse processo, a concentração regional de renda foi


uma marca do desenvolvimento capitalista no Brasil. O processo
acelerado de urbanização, de diversificação da economia e a formação
de uma classe operária, ainda que reduzida numericamente, foram
características marcantes principalmente da região Sudeste. Outro

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aspecto a ser salientado do desenvolvimento dependente e desigual


relaciona-se umbilicalmente com a subordinação econômica [...]. Os
abismos sociais e econômicos constituíram-se em uma outra
característica marcante do desenvolvimento da economia brasileira,
fato que o surgimento das fábricas não alterou. A burguesia rural e
urbana consolidava-se, política e economicamente, enquanto o
proletariado sobrevivia em condições miseráveis.

As causas apresentadas descrevem como a concentração regional de renda e o


processo acelerado de urbanização, bem a propósito de diversificação econômica e
formação de uma classe operária, acentuaram as desigualdades. Embora no Brasil o
movimento da educação integral tenha iniciado por volta do ano 10 do século XX com a
proposta do movimento anarquista, na Europa já havia se materializado. Para Ligia
Maria Coelho, o século XVIII marca na Europa, mais precisamente com a Revolução
Francesa, a luta por uma escola igualitária, uma vez que a burguesia já se beneficiava de
uma instrução integral, havendo a defesa que esses direitos fossem expandidos a todos
(COELHO, 2009).
Nesse período, a educação integral no contexto das demandas da classe operária
surgiu como possibilidade de formação completa para as camadas desprovidas de
acesso à educação primária, valorizando, além do saber formal, a ação prática, ou seja, a
junção entre trabalho intelectual e trabalho manual. Para os anarquistas, essa educação é
efetivada pelas mais variadas formas e expressões da arte, bem como uma espécie de
deleite estético, além dos aspectos relacionados à saúde física e instrução profissional,
ocasionando a base da educação integral nos moldes anarquistas (COELHO, 2009).
Esse debate teve como função promover uma escola para atendimento das camadas da
população que, naquele momento, não tinham acesso à escola primária.
Uma vez que as políticas para a educação no Brasil não priorizavam o ensino
para todos e, segundo dados censitários, em torno de 85% da população era analfabeta,
isto constituía, assim, em fator determinante no processo de exclusão. Essa população
ficava a mercê das vontades da burguesia, pois não existiam, nessa época, leis que
regulamentassem o trabalho, sendo estas criadas pelos próprios patrões que acabavam
fazendo suas próprias leis. A saber, o trabalho de crianças e mulheres se dava nas
mesmas condições do trabalho do homem adulto, contudo o valor pago representava
metade do valor pago ao homem (GOMES, 2007).
Embora esse momento tenha marcado, de forma singular, a implantação da
educação integral, esta só se consolidou de forma institucional em 1950, com a Escola

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Carneiro Ribeiro, a primeira escola-parque construída por Anísio Teixeira2 que, durante
o período em que esteve à frente do INEP (1951-1964), expandiu sua experiência de
educação integral com as escolas-parque do Distrito Federal. No mesmo período
trabalhando com Anísio, na década de 1960, Darcy Ribeiro tornou-se um dos
responsáveis pela criação da Universidade de Brasília-UnB. Passados quase 20 anos do
período em que assumiu como vice-governador do Estado do Rio de Janeiro (1983-
1987), Darcy Ribeiro criou sua experiência de educação integral com a construção dos
CIEPS. Para Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro, a educação escolar precisava investir de
forma organizada fazendo chegar os benefícios deste investimento ao povo.
Propostas de educação diferenciadas, em aspectos como tempo de permanência
na escola, surgiram no Estado de São Paulo com a construção dos CEUs (Centros
Educacionais Unificados) no ano de 2003. Esse modelo se destacou pela estrutura física,
pois essas escolas foram construídas na intenção de levar um ambiente típico de escola
do centro para a periferia. Outro fator de destaque está relacionado à proposta
pedagógica que leva em consideração aquilo que se apresenta no centro e não na
periferia (GADOTTI, 2000).
Em oposição a esses modelos, Maciel (2007) propõe uma educação integral de
base politécnica, em que a formação do aluno ocorre pela associação entre trabalho
intelectual, as atividades corporais trabalhadas a partir da educação física e a atividade
tecnológica, acrescentando a esses a própria politecnia como concepção pedagógica
através da relação direta entre teoria e prática. Fundamentada numa concepção marxiana

2
No final da década de 1940, o então governador da Bahia, Otávio Mangabeira, solicitou ao seu
Secretário de Educação e Cultura, Anísio Teixeira, que elaborasse um sistema para resolver a crescente
demanda por vagas nas escolas públicas. Paralelamente àquela época, precisavam-se, urgentemente, de
novos currículos, novos programas e novos professores. Anísio Teixeira providenciou tudo num trabalho
hercúleo de quase 16 horas por dia. Conseguiu criar a primeira célula – o modelo de Salvador – e a
denominou de Centro de Educação Popular. Para ele, este centro deveria ser a primeira demonstração da
passagem da escola de poucos para a escola de todos. A intenção de Anísio Teixeira era que fossem
instalados, inicialmente, sete sistemas semelhantes que seriam localizados nos bairros mais carentes de
Salvador. O primeiro esquema para a distribuição destes núcleos previa, para Salvador, sete escolas. O
primeiro núcleo foi construído no bairro da Caixa D´Água, bairro popular de Salvador que tinha grande
concentração de menores sem escola e até mesmo menores abandonados – e sta ainda é a realidade deste
bairro. O espaço para a construção do centro foi definido através de um convênio entre o Governo Federal
e o Governo do Estado da Bahia, através da Secretaria da Educação. Nesta negociação coube ao Governo
do Estado a cessão do terreno, cabendo ao Governo Federal a manutenção da escola e o pagamento dos
professores, todos em regime de dedicação integral. Após alguns anos, o centro passou a ser mantido
exclusivamente pelo Governo do Estado da Bahia. O Centro Educacional Carneiro Ribeiro foi idealizado
e planejado por Anísio Teixeira quando Secretário de Educação do Estado da Bahia (1947-1950) e diretor
do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais – 1951-1964), com a finalidade de
proporcionar uma educação em tempo integral às crianças e adolescentes da região do bairro da
Liberdade e adjacências. Acesso em 30 de jun. de 2014. Disponível em:
http://www.escolaparquesalvador.com.br/?post_type=external-videos&p=381.

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de educação, o Projeto Burareiro de Educação Integral propõe estimular as habilidades e


as potencialidades humanas, num movimento educacional que trabalhe o ser humano
completo.
O movimento da educação integral no Brasil, numa objetivação de expansão, vai
se difundir com a implantação do Programa Mais Educação no ano de 2007, cuja
proposta surge a partir das demais experiências existentes no Brasil. Porém, seu caráter
expansivo toma dimensões que outros projetos não tomaram, estendendo o tempo de
permanência do aluno na escola; no entanto, não garantindo esse tempo com trabalho
educativo e sim com desenvolvimento de atividades. Assim, buscar-se-á aqui
caracterizar o percurso das políticas de educação integral no Brasil como registro
histórico de um momento, caracterizado com base nos estudos realizados em três
concepções pedagógicas em especial, sendo: concepção escolanovista, concepção
progressista e concepção histórico-crítica.
Na apresentação dos modelos estruturados na concepção escolanovistas
destacam-se as experiências da escola-parque de Anísio Teixeira, os Cieps de Darcy
Ribeiro e o projeto do governo petista à frente da prefeitura de São Paulo, entre 2001-
2004, com os CEUs. Na concepção histórico-crítica, destaca-se a experiência do Projeto
Burareiro de Educação Integral, primeira experiência no Estado de Rondônia,
caracterizada por um viés teórico oposto as demais.

Concepção escolanovista de educação: as escolas-parque de Anísio Teixeira

A educação integral no Brasil começa e ser pensada, a partir das décadas de


1920 e 1930, como o acesso à escola primária que era privilégio de uns poucos,
passando-se a pensar num modelo de educação que atendesse não só as minorias, mas
atendessem, também, parte da população que não tinha o acesso a essa educação
escolar.
Nesse período, o país passa por algumas transformações, dentre as quais se
podem destacar a econômica afetada pela primeira guerra e a educacional com a
expansão da educação primária (até então um desafio que deveria ser enfrentado com
muita sobriedade e dedicação), já que a escola era para uns poucos e sua expansão
indicaria uma alteração na estrutura social da época. A escola era um espaço que
deveria oferecer uma série de oportunidades de aprendizagem, conforme Nunes (2009,
p. 123):

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a escola primária deveria oferecer aos estudantes oportunidades


amplas de vida, compreendendo atividades de estudos, de trabalho, de
sociabilidade, de arte, recreação e jogos. Era preciso um novo
currículo, um novo programa, um novo docente. Tratava-se, portanto,
de expandir, do ponto de vista da cultura geral, a instrução primária –
até então caracterizada praticamente como escola alfabetizadora –
para que a população, sobretudo das áreas mais pobres, se integrasse
no contexto de uma sociedade moderna.

Desta maneira, seria preciso não só uma estruturação da instrução pública, como
também uma mudança na forma de condução do ensino. Deste modo, o pensamento de
Dewey vai influenciar a reestruturação do ensino no país, já que o debate no âmbito da
escola pública da época é de como esta deveria ensinar, estava no auge. Segundo
Cavaliere (2002, p. 261), “seu projeto de escola é fundamentalmente um projeto de
comunidade intersubjetiva, democraticamente estruturada, na qual se possibilitará, por
meio da comunicação da experiência, a construção de alguma identidade coletiva”.
Assim, a escola torna-se um espaço onde a experiência deve ser utilizada como meio
para o alcance de determinado fim, ou seja, o aprendizado.
Neste contexto, num Brasil de expectativas, mudanças, lutas e incertezas, surge
o educador Anísio Teixeira que, ao se formar na mesma profissão do pai, escolheu uma
carreira diferente, enveredando pela da educação. Assumiu a instrução pública de seu
Estado, no ano de 1922, a convite do então governador do Estado da Bahia, sendo sua
indicação feita pelo amigo Hermes de Lima.
Vivendo em um tempo de grandes eventos internacionais, como a primeira
guerra mundial e o movimento da escola nova, Anísio Teixeira tomou como base o
pensamento educacional escolanovista fundamentado nas ideias de Dewey. Conforme
expresso por Cavaliere (2002, p. 256),

um dos grandes impulsos do pensamento escolanovista foi a


ocorrência das guerras mundiais, particularmente a primeira grande
guerra, que surpreendeu o espírito iluminista com o fato de que foram
exatamente as nações mais desenvolvidas na ciência, na tecnologia e
na filosofia que protagonizaram o episódio bárbaro.

Assim, a escola passa, para Anísio, a ter um novo papel dentro deste contexto,
pois a princípio não foi possível continuar com o mesmo modelo de escola, uma vez
que esta não atendia as necessidades da população mais necessitada. A educação na
concepção escolanovista é centrada na visão de educação como vida, e não como
preparação para a vida, podendo-se destacar a importância que essa dá à atividade

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criadora em suas mais variadas expressões, tanto na vida social como na comunitária,
proporcionando uma formação global da criança (CAVALIERE, 2002).
Influenciado por este modelo de educação, Anísio se propõe a remodelar a
educação brasileira, visando sua expansão e autonomia, uma vez que os governos
responsáveis diretos por ofertar o ensino às crianças se abstêm de investir como devem
na estrutura e formação. O que para Nunes (2009, p. 129) é visto como um diferencial
da concepção da Escola Nova está no fato de sua intervenção funcionar como fator de
qualidade, quando afirma que:

de fato, a questão do caráter demonstrativo de uma obra pública esteve


e está sempre presente nos governos que se sucedem. No caso dos
educadores da chamada Escola Nova, esse caráter tem, entre outras, a
finalidade de dar o testemunho de que é possível intervir na escola e
mudar a qualidade. Essa intervenção funciona como matriz para a
criação de outras representações sobre finalidades e funções da escola,
seu papel na sociedade moderna, formação da cidadania.

Desta forma, o objetivo dos educadores da escola nova era a transformação desta
e a intervenção direta em sua estrutura, pois não era possível remodelar o ensino numa
escola com as características tradicionais, ou seja, ensino, estrutura, formação e função
da escola. Para isso, era preciso amenizar as desigualdades a partir do efetivo
reconhecimento, por parte de classes e grupos da sociedade, promovendo a “autoridade
pedagógica”, pois deste modo quanto menos esta necessite produzir as condições de sua
instauração e perpetuação, mais efetivo será o trabalho da escola, diminuindo o processo
de reprodução da desigualdade social (CAVALIERE, 2002).
Assim, o pensamento escolanovista vai permear o novo modelo de educação,
proporcionando uma reflexão sobre as bases da escola primária, tanto em sua concepção
pedagógica como em sua infraestrutura, pensando um modelo de escola que atenda com
propriedade às necessidades de se fazer conhecer a escola para as massas.
A educação integral pensada por Anísio Teixeira tinha como base uma escola
onde a sua estrutura favorecesse o aprendizado, bem como economizasse nos custos,
partindo de um espaço em que as atividades pudessem ser realizadas com o mínimo de
intervenção externa possível. Seguindo estes critérios, ele cria a escola-parque, uma
escola onde as atividades aconteceriam em dois ambientes: a escola-classe e, depois, a
escola-parque.
Seu funcionamento se daria da seguinte forma: os alunos seriam matriculados
nas quatro (4) escolas-classes onde se organizariam, passando um tempo na escola-

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classe e outro na escola-parque; o tempo escolar seria de 9 horas diárias divididas em


um turno de quatro horas pela manhã (com um intervalo de uma hora) e quatro horas à
tarde. Na escola-parque, os alunos seriam agrupados por idade e em atividades onde os
mesmos demonstrassem aptidão, sendo que as atividades de educação física, sociais,
artísticas e de organização e biblioteca faziam parte das atividades que os alunos
deveriam participar (TEIXEIRA, 1967). Sendo assim, esse modelo de escola, embora
tenha a vaga ideia de diminuir as desigualdades por meio da participação ativa nas
diversas atividades – transformando a escola num ambiente criador –, não produz o
resultado esperado.
Seu funcionamento foi apoiado na experiência anteriormente feita na Escola de
Aplicação do Centro Regional de pesquisas educacionais da Bahia. Este, por sua vez,
era vinculado ao Inep e funcionou entre os anos de 1956 e 1962, sendo que as classes
reuniam alunos por faixa etária e não por outros testes, como os de inteligência
(NUNES, 2009). Deste modo, as crianças deveriam ser agrupadas em classes não por
suas habilidades e potencialidades, o que faria com que, em determinadas turmas por
exemplo, existissem alunos totalmente alfabetizados e outros não alfabetizados.
Neste contexto, a escola-parque se diferenciaria da escola primária normal por
oferecer o dia completo de atividades onde os alunos permaneciam em ambiente
educativo, além de tentar resolver outro problema social: o dos meninos sem lar.
Conforme expresso por Nunes (2009, p. 125), “havia um plano para manter, numa
residência apropriada, 5% dos meninos considerados sem lar, mas essa residência nunca
foi construída. A construção dessas instalações foi dada como encerrada em 1964”. Um
projeto audacioso para a educação, não só pelo desafio de montar uma estrutura que
atendesse de maneira adequada a todos, mas principalmente por ter como meta o
alcance das camadas mais pobres, uma vez que seu objetivo era o de dar uma escola de
qualidade para os filhos dos trabalhadores.
Há, porém, nesse projeto, um ponto que deve ser observado: dar educação de
qualidade aos filhos dos trabalhadores, sem ensinar-lhes como deve. Num momento tão
importante para o país, a educação integral ganha forma e força ao se destacar na
importância do projeto inovador de Anísio Teixeira, uma vez que a abrangência da
escola primária era uma meta do educador brasileiro, haja vista haver uma restrição do
acesso à escola primária à classe trabalhadora. Nunes (2009, p. 122) expõe na fala de
Anísio Teixeira esse processo, detalhando o momento de difusão da escola primária ao
dizer que:

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o processo que difundiu a educação primária no Brasil, afirma ele, foi


marcado, num primeiro momento, pela restrição da escola primária a
uma classe média, o que significava que as classes trabalhadoras dela
estavam ausentes. [...] Ao lado da redução da escola primária,
inventaram-se também os turnos escolares que repercutiam na redução
do dia escolar e na formação dos professores.

Outro aspecto a ser destacado diz respeito ao funcionamento da escola-parque,


ambiente que, ao contrário da escola primária, era criador. Na concepção de Anísio
Teixeira, em uma das críticas que fez à escola primária, estava caracterizado o fato desta
não oportunizar a comunicação entre os alunos a partir das vivências em diversas
atividades, pois não se tratava, segundo ele, de suprir carências culturais, mas de
antecipar experiências que pudessem levar a uma relação com o conhecimento
necessário ao cotidiano que se encontra em constante mudança, o que em si já seria um
desafio paradoxal (NUNES, 2009).
Esse desafio se torna maior se pensarmos em como a escola e seu ambiente
podem contribuir na construção da identidade. Cavaliere (2002, p. 267), ao destacar este
modelo de escola, seu ambiente e vivência, acrescenta: “é preciso que a escola seja um
ambiente onde crianças e adultos vivenciem experiências democráticas. Só a partir delas
será possível construir essa nova identidade”. Essa construção, para Anísio, estaria
relacionada não a privilégios dados pelo Estado, mas a uma concepção de educação
como um direito estando na base e na autonomia do povo.
A autonomia, como se vê, fazia parte da proposta de educação integral pensada
por Anísio Teixeira, pois em sua primeira experiência aborda a importância das
atividades extraclasses (aquelas feitas na escola-parque) e das atividades feitas nas
classes. Essa identificação e autonomicidade se davam com a organização de inúmeras
tarefas que deveriam ser realizadas pelos alunos. Segundo Nunes (2009, p. 125), o êxito
dado a estas atividades se dava por que:

os alunos eram encarregados de organizar inúmeras atividades:


correios, clubes, biblioteca, banco, lojas, rádio-escola, etc... Pesquisas
e excursões incentivavam a investigação dos aspectos estudados.
Além dessas, outras atividades extra-classe chegaram a ser
desenvolvidas, como o escotismo, as campanhas para melhoria do
aprendizado, a associação de pais e mestres, etc... Nas escolas-classe
registrou-se grande êxito da matemática moderna.

Apesar de todos os empecilhos, a escola-parque projetada por Anísio Teixeira


tinha como objetivo elevar e expandir o ensino num país de território gigantesco e de

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tantas desigualdades. Sua contribuição no campo educacional é inegável; contudo,


mesmo todo seu conhecimento e influência ainda assim não foram suficientes para
alavancar o ensino no país. Embora tenha lutado para ver florescer um novo modelo de
educação, sofreu com a falta de investimentos de governos, o descaso com a educação
e, acima de tudo, a valorização de uma concepção de educação fundamentada na
chamada teoria do capital humano, isto é, uma educação como planejamento e
investimento econômico, educação como mercadoria e como produto específico e
delimitado a ser consumido (CAVALIERE, 2002).
Neste sentido, a obra de Anísio deve ser analisada como um marco histórico na
construção da escola integral. Uma escola que atendesse as necessidades daqueles que
não tinham acesso e, tampouco, o conhecimento da própria importância da educação
escolar na formação do homem.

Uma outra concepção escolanovista de educação: os CIEPES de Darcy Ribeiro

As políticas educacionais no Brasil nunca estiveram entre as prioridades de


governos e demais setores da sociedade industrial. Prova disto é a forma como se
arrasta, até hoje, a educação pública num país onde as desigualdades são visíveis e a
escola continua ocupando lugar secundário nas ações governamentais. Preocupado com
a pobreza e com os excluídos socialmente, Darcy Ribeiro vai a seu tempo, além de
promover um debate sólido no campo educacional, elaborar uma série de metas para a
educação, bem como construir ações que desafiem o ensino de sua época.
Dentre as várias ações e programas, pode-se destacar aqui o programa
Educação-Rio que serviu de base para a implantação dos Cieps. Darcy criticava aqueles
que não faziam e não deixavam fazer, inclusive quando o tema era a educação integral.
Educador focado e preocupado com as causas sociais, buscava uma escola para o
povo e não contra o povo. Para ele era necessário dar dignidade aos frequentadores da
escola, propriamente para os filhos da classe trabalhadora. Ao defender o novo modelo
de escola, Ribeiro (1984, p. 25) diz que aqueles que hoje oferecem a escola:

negaram escolas foi para o povo. Em lugar do sistema expandir-se,


multiplicando verdadeiros edifícios escolares como os que Anísio
Teixeira levantou no Rio na década de 30, multiplicaram-se
principalmente barracões [...]. Junto com as escolas, o próprio
professorado – recrutado em camadas menos abonadas – mal
preparado, para suas funções e desestimulado – também decai em

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níveis de formação pedagógica e se desprestigia social e


profissionalmente.

A crítica aqui levantada à escola vem das péssimas condições que este a vê: essa
condição é vista tanto de seu olhar enquanto político, quanto do seu olhar como
educador, visto que Darcy tem a realidade como laboratório, fato ligado a sua formação
antropológica. Neste contexto de debates se propõe um novo modelo de escola que,
segundo Ribeiro (1984, p. 81), tem as seguintes características: “essas escolas de novo
tipo assumirão dois padrões: um para educação pré-escolar e quatro primeiras séries do
primeiro grau; outro para alunos de quinta a oitava séries e maiores de 14 anos atrasados
nos estudos”. Assim, pensasse uma escola, a princípio, que tem como objetivo atender
um número x de alunos que são vistos como excluídos do atual sistema, porém qual
forma teria essa escola? Essa era uma resposta que apenas Darcy Ribeiro poderia dar.
Os debates que definiram a série de metas a serem materializadas visando à
melhoria do sistema educacional do Rio de Janeiro foram realizados num minicongresso
em que Darcy, então vice-governador do Estado, esteve à frente dos trabalhos, inclusive
como palestrante e mediador. O objetivo deste minicongresso era ouvir os professores e
os demais profissionais envolvidos com a educação escolar.
Dentre os muitos desafios que se propuseram neste congresso um chama a
atenção, que era o relacionado à formação do professor, que deveria receber essa
formação em serviço (RIBEIRO, 1984). Assim, após extenso debate surge uma
proposta de escola que atendesse verdadeiramente a classe trabalhadora; Ana Maria
Monteiro destaca esta escola como sendo uma escola revolucionária. Segundo Monteiro
(2009, p. 41), “os Cieps surgiram, nesse contexto, como uma escola revolucionária em
todos os sentidos, que atuaria como espaço privilegiado para a crítica das desigualdades
e luta para a construção de uma sociedade mais justa”. Essa visão de escola
revolucionária, porém não era a dos políticos que viam nos Cieps só mais uma escola
que traria gastos à máquina pública.
Embora tivesse trabalhado com Anísio e pudesse ter se utilizado do modelo das
escolas-parque, Darcy preferiu criar uma escola diferente para sua época. Neste
contexto, Bomeny (2009, p. 117) distingue Darcy de Anísio ao dizer que, “neste ponto,
me parece, reside a maior distinção entre ele e Anísio Teixeira: um conferindo ao seu
projeto um cunho político-sociológico e o outro, Anísio, defendendo gradualmente o
modelo pedagógico”. Estava aí o ponto central para a criação dos Cieps, pois o objetivo
era dar uma escola que pudesse não só ensinar em tempo integral, mas que auxiliasse a

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família precarizada pelo modo de vida capitalista, uma vez que essa criança, estando na
escola, a família estaria despreocupada podendo proporcionar o sustento.
O caráter revolucionário dos Cieps não estava relacionado apenas à maneira
como o ensino seria dado dentro dos Cieps, mas também pela estrutura que seria dada
para que ocorresse. Mas, afinal, o que eram os Cieps? Para Gomes (2010, p. 52),
“constituíam mais um fruto do trabalho de Darcy associado a Oscar Niemeyer. A
arquitetura conferia identidade, inclusive político-partidária, às unidades e ao mesmo
tempo, condicionava e refletia a proposta pedagógica”. A construção de uma escola de
pompa para os trabalhadores provocou (e muito) os adversários, tanto políticos como os
que nunca quiseram ver florescer a escola para todos.
A este contexto somasse o fato de a escola primária, desde meados da década de
1920 no Brasil, haver perdido espaço e significado, restando reconstruir ou mesmo criar
um novo padrão. A opção de Darcy em não implantar o modelo das escolas-parque de
Anísio Teixeira estava no fato de, para ele, este modelo de escola preterir certa classe já
em muito favorecida pelo sistema.
Os Cieps se valiam de uma proposta pedagógica diferenciada, embasada nos
princípios da Escola Nova onde sua ação pedagógica primava pela visão
interdisciplinar, tendo como base um trabalho integrado, em que cada professor pudesse
complementar e reforçar o trabalho dos demais (RIBEIRO, 1986). Desta forma, as
ações eram voltadas, primeiramente, para o universo cultural dos alunos, respeitando,
acima de tudo, seus saberes. Daí a escola nova ser criticada por ser uma escola que
valorizava mais a experiência em detrimento dos conteúdos, ou seja, o saber livresco.
Ao lado de uma escola elitista e que pouco acrescentava às classes
empobrecidas, os Cieps constituíram uma saída para uma sociedade há muito
marginalizada. Essa preocupação com a escola que excluía e cobrava da criança pobre o
mesmo rendimento da criança abastada já encontrava, em Darcy, sua crítica. Era,
porém, preciso a superação desta escola elitista e seletiva (BOMENY, 2009); então,
além de uma nova proposta pedagógica, seria preciso ressignificar a escola em sua
estrutura.
Para a tarefa de criar uma escola com estrutura ideal que proporcionasse um
ambiente de aprendizagem, procurou-se não se espelhar totalmente nas escolas-parque,
mas em construções que pudessem atender as demandas e as características locais.
Portanto, os Cieps se caracterizavam por serem escolões com capacidade para 1.000

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Princípios e concepções de educação integral no Brasil

alunos cada e, como se pode perceber, o objetivo era o de integrar a formação cultural e
pedagógica num único espaço. Conforme Monteiro (2009, p. 38),

o Ciep é integrado em vários sentidos: seu projeto desenvolve uma


proposta de currículo que assume a cultura como eixo articulador das
atividades pedagógicas voltadas para aspectos pertinentes ao
desenvolvimento de uma vida saudável. A dimensão integradora
propõe o desenvolvimento de um diálogo constante e transformador
com a comunidade a que atende. Assim, o projeto pedagógico implica
pensar esta escola como pólo de dinamização cultural, possibilitando a
elaboração e apropriação dos saberes escolares pelos alunos, com
abertura para receber e incorporar saberes próprios à comunidade,
inclusive para o resgate de práticas e saberes em risco de
desaparecimento ente a pressão dos meios de comunicação.

As características ora apontadas representam o tamanho da responsabilidade


exercida pelos Cieps, pois não se tratava, única e exclusivamente, de levar à escola, mas
de levar a uma escola com todos os requisitos necessários para a elevação do
conhecimento desta comunidade.
Bomeny (2009, p. 114) aponta que a receita para a resolução deste problema
estava na escola de tempo integral: “a escola pública, aberta a todos, em tempo integral,
era a receita para iniciar as crianças nos códigos de sociabilidade, tratamento,
relacionamento e preparo para a vida em sociedade”. Havia, porém, outro contexto que
desfavorecia o tempo integral que estava relacionado com o trabalho, ou seja, com a
renda das famílias, pois, para boa parte das famílias, a escola em tempo integral subtraia
parte da renda, uma vez que a criança tinha que permanecer na escola e deixava de
executar determinadas tarefas em casa (BOMENY, 2009), o que ocasionava um
prejuízo para a família.
Outra característica dos Cieps que se deve destacar está relacionada a seu
funcionamento. Conforme Ribeiro (1986, p. 42), “o CIEP é uma escola que funciona
das 8 horas da manhã às 5 horas da tarde, com capacidade para abrigar 1000 alunos.
Projetado por Oscar Niemeyer, cada CIEP possui três blocos”. Assim sendo, o aluno
deveria permanecer no Ciep com um turno de atividades nas salas e outro nas oficinas
que eram disponibilizadas dentro da própria escola, o que favorecia o desenvolvimento
dos alunos.

Concepção progressista de educação: os Centros Educacionais Unificados – CEUS


A busca por modelos de educação que pudessem valorizar a formação cidadã
baseada na autonomia sempre esteve ligada a alguns projetos partidários. Neste sentido,

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governos (na esfera municipal, estadual ou federal) buscavam desenvolver ações (que
pelo menos no discurso, se diz) voltadas à melhoria educacional. O Brasil se destaca
neste contexto com políticas que são impostas por governos e exemplos não faltam,
especialmente no campo da educação integral.
Vale ressaltar que a diversidade de projetos, além de priorizar padrões que não
vão ao encontro das características locais, se dizem capazes de resolver o problema da
falta de qualidade; porém, nem sempre a lógica do sistema criado pelo próprio Estado
permite obter essa qualidade. Contrariando a lógica, o governo do PT frente à Prefeitura
de São Paulo, durante a gestão da prefeita Marta Suplicy (2001-2004), criou um modelo
de escola que, embora não seja caracterizada como escola integral, traz em seu eixo
pedagógico e administrativo traços de uma escola de educação integral.
Surgem, assim, os Centros Educacionais Unificados (CEUs) caracterizando-se
como escola normal, atendendo alunos em turnos de quatro horas com um diferencial: a
oferta de atividades em outros horários à comunidade. Ao destacar o surgimento dos
CEUs, Gadotti (2000, p. 2) os caracteriza como projeto de educação popular:

nascia um projeto de educação popular, de educação cidadã,


buscando tratar o povo com dignidade e respeito. O projeto dos CEUs
foi concebido, desde sua origem, como uma proposta intersetorial,
somando a atuação de diversas áreas, como: meio ambiente, educação,
emprego e renda, participação popular, desenvolvimento local, saúde,
cultura, esporte e lazer. Os CEUs inspiram-se na concepção de
equipamento urbano agregador da comunidade, com uma visão de
educação que transcende a sala de aula e o espaço escolar.

Neste sentido, o CEU traz em sua essência uma proposta a partir da


intersetoriedade3, em que há a soma de diversas áreas atuando, como exemplo: meio
ambiente, educação, emprego e renda, participação popular (tão importante na
construção de uma sociedade), saúde, cultura, esporte e lazer. Essa proposta inspira-se

3
Para Freire (1979), não é possível um compromisso verdadeiro com a realidade e com os homens
concretos que nela e com ela estão, se desta realidade e destes homens se tem uma consciência ingênua.
Não é possível um compromisso autêntico se, àquele que se julga comprometido, a realidade se apresenta
como algo dado, estático e imutável. Se este olha e percebe a realidade enclausurada em departamentos
estanques. Se não a vê e não a capta como uma totalidade, cujas partes se encontram em permanente
interação. Daí sua ação não poder incidir sobre as partes isoladas, pensadas que assim transforma a
realidade, mas sobre a totalidade. É transformando a totalidade que se transformam as partes e não o
contrário. No primeiro caso, sua ação, que estaria baseada numa visão ingênua, meramente “focalista” da
realidade, não poderia constituir um compromisso. Desta forma, o sentido dado à intersetorialidade é o de
compromisso de todas as partes envolvidas, onde a atuação constante com o objetivo de transformar e
incidir sobre esta realidade é claro. Aqui, é importante observar que não haveria êxito sem a participação
de todos os setores envolvidos e comprometidos com o objetivo final.

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Princípios e concepções de educação integral no Brasil

na concepção de escola como equipamento urbano agregador da comunidade,


transcendendo o espaço da sala de aula e o próprio espaço escolar.
Essa proposta, segundo Grosbaum e Carvalho (2009), não surge ao acaso, pois
as ideias, as concepções e as experiências que se desenvolveram em diferentes
momentos históricos, contribuíram para a proposta final. Ideias como as de Educação
para a Cidadania e de Escola Aberta, constantes do pensamento de Paulo Freire, e da
Escola Parque do educador Anísio Teixeira foram essenciais na construção deste
modelo.
Enquanto modelo escolar, o CEU se destaca pela grandiosidade e pela imagem
persuasiva de um novo equipamento público que impressiona, contrastando com a
periferia, de ruas de terra e esburacadas. O CEU pode denominar-se, aqui, como obra
que expressa a espetacularização arquitetônica de uma política educacional
(PACHECO, 2011).
Tendo como meta levar cidadania à periferia, essa escola recebe várias críticas
por propor como política educacional um modelo de cidadania regulada. Para Pacheco
(2011, p. 336-337),

deve-se destacar que no caso de São Paulo, sequer foi discutida a


municipalização da rede de ensino fundamental, questão que deveria
entrar na agenda do debate sobre política educacional. Com os
recursos empregados em obras como os CEUs e com um pacto
federativo que garanta a transferência de recursos para o município,
talvez fosse possível a municipalização de todo o ensino público
fundamental na cidade de São Paulo, muito embora isso não fosse
garantia da conquista da qualidade. [...] No entanto, o fortalecimento
das estruturas de poder local é fundamental na construção de uma
cidadania ativa, com a participação cada vez mais intensa da
sociedade civil nos processos decisórios sobre a adoção desta ou
daquela estratégia governamental de aplicação de recursos.

Entenda-se que apenas a participação não garante a valorização, uma vez que o
Estado dita as regras. Grosbaum e Carvalho (2009, p. 12) destacam que esses
parâmetros estavam estipulados no Regimento dos CEUs, onde deveria existir um
Colegiado de Integração. Por sua vez, o objetivo principal era “assegurar a integração
operacional entre as diretrizes e prioridades das diversas Secretarias, Coordenadorias e
Comunidade”, promovendo uma organicidade e unicidade em torno do projeto
educacional e seus objetivos.
Em sua composição, os CEUs têm como principal objetivo aproximar a
comunidade do poder público, bem como a valorização da estrutura e o cuidado com o

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equipamento. Assim, Gadotti (2000, p. 3) vê nessa relação uma saída na aproximação


da escola com a comunidade, acrescentando que

o envolvimento e a organização da comunidade foram essenciais para


garantir os objetivos educacionais, culturais e esportivos desse
equipamento público. O novo não está no prédio bonito, mas no seu
projeto educacional e na sua proposta de gestão comunitária e
democrática. A população, desde o início, está entendendo que o CEU
é dela e o defenderá enquanto tal.

O CEU passa a ser visto por seus criadores como uma escola da comunidade que
tem voz e decide, no conjunto, o que é melhor para o coletivo. Porém, é importante
destacar que o projeto não se desenvolve de forma homogênea, uma vez que cada
localidade tinha as suas particularidades e que os problemas foram acumulando à
medida que esse envolvimento foi perdendo força. Fato observado nos estudos de
Grosbaum e Carvalho (2009, p.42) ao destacarem a pouca participação comunitária no
interior dos CEUs, pois, segundo as mesmas, o interior chama mais a atenção à presença
predominante de crianças e pessoas idosas e a quase ausência de jovens. Outro número
que chama atenção está relacionado à equipe de limpeza que é numerosa, tendo um
cuidado com a manutenção e a higiene local.
O funcionamento dos CEUs tem características bem diferenciadas, chamando a
atenção até pelo horário, já que funciona com uma série de atividades extras, iniciando-
se às 6h30min com a chegada das pessoas para fazer caminhada e cursos indo até às
23h, com a saída do último aluno ou telespectador do teatro. Nos finais de semana
funciona com programações diversas, podendo fechar mais tarde no sábado, por
exemplo, dependendo do tipo de evento, como o caso de bailes ou festivais. No
domingo as atividades encerravam-se às 19h, sendo as segundas-feiras dedicadas à
avaliação, ao planejamento e aos debates (CANGUSSÚ, 2010).
Caracterizada por ser uma escola de arquitetura diferenciada, sua gestão se
destaca por ser composta por um conselho gestor formado por representantes das
escolas do entorno, representantes dos núcleos de ação educacional e da ação cultural e
de esportes e lazer, representantes do telecentro, da guarda civil metropolitana e da
subprefeitura, além, é claro, dos representantes de CEI, EMEI e EMEF4.

4
No estudo de caso realizado por Grosbaum e Carvalho (2009, p. 18-21), alguns problemas puderam ser
observados nos CEUs, principalmente os relacionados à divisão existente no próprio ambiente
relacionada às classes, ou seja, unidades escolares ali estruturadas quando diz que: “um Colegiado
composto por gestor, coordenadores dos núcleos e diretores das escolas fica responsável pela integração
dos projetos e das ações a serem desenvolvidas. Reúne-se mensalmente e, para essas reuniões, são

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Princípios e concepções de educação integral no Brasil

Para se compreender a importância desse conselho, Cangussú (2010, p. 23)


destaca:

a gestão participativa e democrática extrapolava os Conselhos Gestor


ou Escolar existente em cada unidade escolar, na medida em que se
procurava ampliar o envolvimento da sociedade nos diversos projetos
e atividades desenvolvidas nas unidades escolares, construindo-se uma
rede de troca de experiências e informações e propiciando-se a
organização de movimentos sociais para além da escola. Esse
processo também é educativo e deve ser compreendido como parte da
educação na formação dos sujeitos sociais.

Nesse contexto, a gestão dos CEUs tem como principal desafio a participação
comunitária – tão necessária para o desenvolvimento da escola do ponto de vista da
gestão democrática – e como possibilidade de deliberar sobre o que realmente a
comunidade quer da escola. Para Gadotti (2000, p. 10), esse desafio visa “instituir
mecanismos que permitam a comunidade deliberar sobre o que querem dar as
instalações construídas, como querem que seja executado o orçamento, que normas de
funcionamento [...] e que tipo de educação querem”. Tudo isso para que a participação
se efetive no caminhar de uma gestão compartilhada.
A importância de um envolvimento da comunidade do entorno da escola segue
como desafio nos CEUs, pois para garantir que o trabalho pedagógico tenha êxito, os
objetivos educacionais, socioculturais e esportivos devem ser trabalhados em todas as
suas dimensões. Esse trabalho não tem tornado o CEU um espaço diferenciado na
relação aprendizado, pois segundo as pesquisas atuais este espaço tem contrariado a
lógica se destacando pelo baixo desempenho nas avaliações educacionais em relação a
outras escolas que não possuem espaço diferenciado (GROSBAUM; CARVALHO,
2009).
Compreendendo que na relação ensino-aprendizado os espaços também
influenciam o aprender, a estrutura pensada para o CEU privilegiava as relações
horizontais. Conforme Gadotti (2000, p.7), “em especial aquelas entendidas como
projetos estratégicos de integração do CEU, respeitando-se a autonomia de seus

convidados também o coordenador do telecentro, o responsável pela biblioteca e lideranças das equipes
de segurança e limpeza. Vários entrevistados revelaram que essa integração é difícil, principalmente pelas
dificuldades de relacionamento com as Unidades Escolares (CEI, EMEI, EMEF), sobretudo com a
EMEF, que se coloca como uma Unidade à parte. Segundo uma das gestoras entrevistadas, “a relação
com os três diretores das Unidades não é fácil, mas a gente tem que batalhar para conseguir. Um exemplo
foi o Recreio nas férias: as Unidades não se inscreveram e a gestão teve que assumir e fazer a inscrição de
mais de 800 crianças. Isso ocorreu em mais de um CEU”, o que explica as dificuldades em realizar um
trabalho articulado.

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núcleos, unidades e espaços”. Esses espaços eram distribuídos a partir dos núcleos que
faziam parte da composição do CEU, são eles: o núcleo educacional, o de ação cultural,
o de esportes e lazer, o Centro de Educação Infantil (CEI), a Escola Municipal de
Educação Infantil (EMEI) e a Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF), além
do Telecentro e da padaria-escola que também compõe esta estrutura.
Desse modo, embora os CEUs não sejam escolas integrais, sua estrutura e
organicidade o eleva como projeto educacional que se assemelha as escolas projetadas
tanto por Anísio Teixeira quanto por Darcy Ribeiro, diferenciando-se destas em seu
projeto pedagógico, pois o discurso da valorização e da participação comunitária
encobre o objetivo principal, que é a manutenção de um clientelismo típico das políticas
do Estado neoliberal.

Concepção histórico-crítica de educação: o projeto burareiro de educação integral

O esforço constante para compreender o movimento da educação integral no


Brasil faz surgir uma nova experiência neste campo, embasada numa concepção
marxista e partindo do conceito de educação politécnica. Surge, então, o Projeto
Burareiro de Educação Integral no município de Ariquemes-RO, criado no ano de 2005
pelo professor Dr. Antônio Carlos Maciel, após uma leitura dos modelos de educação
integral implantados no país, principalmente o dos Cieps de Darcy.
Define-se, neste sentido, por criar um projeto com um viés totalmente voltado à
concepção marxista de educação. Assim, é necessário, em um primeiro momento,
entender o conceito de politecnia que pode ser definida, segundo Maciel e Braga (2007,
p. 61), da seguinte forma: “concebe-se politecnia como um processo de
desenvolvimento integral das faculdades humanas, tratando equilibradamente
racionalidade, habilidade, sensibilidade e sociabilidade”. Desta maneira, não se pode
confundir politecnia ou formação politécnica como uma formação para a técnica, mas
sim uma formação integral na qual o homem possa exercer um alto grau de
potencialidades, ou seja, uma formação completa.
O destaque dado aqui à formação integral está relacionado com as dimensões
apresentadas na politecnia, as quais são categorizadas num conjunto onde não há a ação
única, mas uma habilidade ligada à outra. Essas são a lógico-cognitiva e psíquica, as
psicomotoras e físicas, a sensibilidade como potencialização dos sentidos em seu
aspecto amplo e a sociabilidade como efetivo exercício político (MACIEL; BRAGA,

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Princípios e concepções de educação integral no Brasil

2007). Em cada uma dessas existe um conjunto de atividades que visam desenvolver a
formação politécnica.
O funcionamento do Projeto Burareiro ocorre nas ações de tempo integral para a
promoção de uma educação integral. O que quer dizer que em sua concepção
pedagógica há uma característica metodológica intrínseca à teoria que leva a essa
prática de educação integral. Devido às particularidades da região amazônica, o turno de
estudos começava às 7 horas, com um café da manhã para todos os alunos, o qual era
servido nos refeitórios da escola e do Country5. Depois, cada grupo seguia para o
desenvolvimento de suas atividades de estudos diários e, das 11:30 às 13:30 horas, era
servido o almoço, realizando-se no intervalo atividades de relaxamento com músicas
clássicas, entre outras (MACIEL, 2007). Todo esse trabalho era acompanhado por uma
equipe de profissionais, tais como os da recreação, artes e reforço escolar.
Esse modelo de escola vai de encontro a uma perspectiva educacional de
superação do modelo de educação integral, portanto uma educação integral para além da
exclusão promovida pela escola pública aos filhos dos trabalhadores, pois estes sofrem
com a falta de investimento e com a exclusão promovida pelo Estado às massas.

Considerações finais

Em face do exposto sobre os princípios pedagógicos da educação integral no


Brasil e seu funcionamento, é fato que os vários modelos trazem contribuições para a
construção de uma educação verdadeiramente para o povo. Porém, é necessário destacar
que não há aqui a intenção de eleger um modelo como o melhor, mas apontar como
cada modelo funciona e deixar a critério do leitor optar por um deles.
A questão a ser respondida é porque os modelos de Anísio Teixeira e de Darcy
Ribeiro não foram capazes de resolver os problemas da educação pública de tempo
integral? Ou seja, uma educação fundada nos preceitos escolanovista como a que eles
criaram não conseguiu superar o modelo da época. Qual seria, então, a causa? Falta de
profissionais, má formação, baixa remuneração, esses são os pontos que devem ser
5
O Country Clube é um ambiente afastado, aproximadamente, da escola uns 2,5 km. Esse local tem
piscina para atividades de natação, campo de futebol e quadra para atividades da educação física e espaço
coberto para as atividades de artes. Segundo Maciel (2007), o ambiente da escola não era agradável,
portanto ela passou por uma reforma visando adequar o prédio às necessidades do projeto. “O que
proporcionou um ambiente mais agradável e mais higiênico, tamanha eram as condições de degradação
ambiental da escola. Além disso, para comportar todas as atividades do Projeto, foi anexado à Escola um
prédio do Centro da Juventude, com três salas, salão e banheiros, e foram alugadas as dependências do
Country Club para as atividades esportivas e culturais” (MACIEL, 2007, p. 4-5).

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analisados. Assim, não seria esse o propósito deste trabalho, mas o de caracterizar no
tempo como funcionou cada modelo de escola integral, deixando para um próximo
momento a continuação deste debate.

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Enviado em: Dezembro de 2016.


Aceito em: Maio de 2017.

Como referenciar este artigo:

FRUTUOSO, Claudinei. Princípios e concepções de educação integral no Brasil.


EDUCA - Revista Multidisciplinar em Educação, Porto Velho, v. 4, n. 8, p. 175-195,
mai/ago, 2017. Disponível em: <http://www.periodicos.unir.br/index.php/EDUCA>. e-
ISSN: 2359-2087.

EDUCA – Revista Multidisciplinar em Educação, v. 4, n° 8, p. 175-195, mai/ago, 2017. e-ISSN: 2359-2087


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