O Conceito de Emancipação
O Conceito de Emancipação
O Conceito de Emancipação
CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Santa Maria, RS
2016
Neyha Guedes Dariva
Santa Maria, RS
2016
© 2016
Todos os direitos autorais reservados a Neyha Guedes Dariva. A reprodução de partes ou do
todo deste trabalho só poderá ser feita mediante a citação da fonte. E-mail:
neyhadariva@gmail.com
Neyha Guedes Dariva
______________________________________
Elisete Medianeira Tomazetti, Dra. (UFSM)
(Presidente/orientadora)
______________________________________
Amarildo Luiz Trevisan, Dr. (UFSM)
_____________________________________
Pedro Angelo Pagni, Dr. (UNESP)
Santa Maria, RS
2016
DEDICATÓRIA
Dedico esta dissertação ao meu maior incentivador e apoiador, meu pai. Meus passos são seus
também. Dedico ainda para o meu amor maior, minha irmã Lyvia Sophia.
AGRADECIMENTOS
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
que aqui chamaremos de pedagogias críticas, têm sua marca registrada na ideia de uma
possibilidade de libertação humana. Logo, acreditam numa emancipação. Em oposição ao
modelo tradicional de ensino, as pedagogias críticas se posicionam em favor de uma
educação mais humana e menos rígida, capaz de promover a autonomia dos alunos e não
produção de meros sujeitos espectadores da ordem vigente. Assim, tais pedagogias retomam,
em certa medida, o projeto de emancipação para a construção de uma sociedade de justiça e
igualdade. A grande meta das pedagogias críticas era a de superar as contradições sociais e
promover a conscientização coletiva. Para Paulo Freire, por exemplo, a elevação do
pensamento das massas começa pela autorreflexão. ―Auto-reflexão que as levará ao
aprofundamento conseqüente de sua tomada de consciência e de que resultará sua inserção na
História, não mais como espectadoras, mas como figurantes e autoras‖ (FREIRE, 1983, p.36).
Já para Adorno, em sua teoria crítica, o caminho de uma síntese salvadora não parece
encontrar a mesma positividade. O filósofo alemão teceu duras críticas ao projeto moderno
apontando para uma falha estrutural em sua meta, capaz de encerrar o objetivo emancipatório
numa contradição paralisadora. A emancipação, nos moldes do Iluminismo, não se efetiva;
ruída em sua própria metodologização; ou seja, perece em sua prática. A premissa primeira do
movimento, a morte do mito, é o passo inicial nesta trajetória. Sua conclusão acerca desta
contradição revela o caráter cíclico das pretensões do esclarecimento. Como descreve no livro
Dialética do esclarecimento (ADORNO, 1985, p. 26),
e, de modo geral, de toda a forma de relação com o mundo que não entre nas prescrições do
saber científico.
Para a educação brasileira, desde os anos 1960, e mais fortemente nas décadas de 1980
e 1990, o conceito de emancipação se movimenta numa tendência marxista/gramsciana,
considerando a dicotomia das lutas de classes e da dominação social como alvos a serem
atingidos. Assim, o papel da educação tinha clara finalidade: emancipar o sujeito para que
este se rebelasse contra a realidade imposta, exercendo sua capacidade crítica para s
finalidade de uma nova sociedade. Aqui o conceito de emancipação se apresenta em inúmeras
formulações, tais como liberdade e conscientização, caracterizando o ideal pedagógico
presente nestas perspectivas educacionais.
Considero que nos apaixonamos por um autor não porque ele nos revela verdades
antes obscuras ou nos mostra aquilo que nem imaginávamos, mas sim porque encontramos
em suas afirmações nossas próprias posturas e visões de mundo. Afinal, parece que a
identificação com uma teoria tem sempre relação com aquilo que ela nos diz do mundo,
aquilo que já se sentia e que se pode concordar com força e verdade. Não faz muito tive um
desses insights. Estava lendo um desses autores, que me causam esse sentimento, e me dei
conta do porque escolhi na teoria crítica de Adorno minha morada conceitual. A resposta é
simples: porque sou intensa e apaixonada, assim como ele. E porque sinto, mesmo que
intuitivamente, o descompasso social que Adorno teoriza em sua filosofia. De fato, parece que
nos tornamos menos humanos em nosso relacionamento com o outro, na inversa proporção
em que avançamos e progredimos em nossa capacidade tecnológica e científica. Apresentarei,
rapidamente, a teoria que exponho para introduzir o leitor ao referencial teórico que move esta
investigação.
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Filósofo alemão e judeu nascido em 1903. Foi importante pensador da Escola de Frankfurt, se dedicando aos
temas sociais principalmente relacionados com a Indústria Cultural e com os rumos da educação pós-guerra.
Também foi crítico de arte, musicólogo e compositor.
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Tradução do autor: ―Instituto para a pesquisa social‖.
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Félix José Weil era filho de um rico produtor de trigo alemão. Financiou o instituto mesmo em tempos de
guerra, permitindo a autonomia deste centro.
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pensar questões ligadas a esta problemática. De fato, o estudo social de Adorno está, até certo
ponto, bastante conectado com a teoria marxista e suas categorias de análise.
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É importante destacar que a crítica à modernidade – tema da Aufklaerung – é comum aos autores do instituto.
Porém as ramificações e respostas a esta problemática se mostra bastante divergente em cada um.
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olha para a sociedade e se recusa a acreditar que a mesma sociedade capaz de produzir a
barbárie da segunda guerra mundial pode ser considerada emancipada. Assim, ele se
posiciona e se coloca a pensar as condições que nos levaram a esta falha e as possibilidades de
resistência a estes mecanismos.
Foi em 2010, ainda no segundo semestre da graduação, que tive contato com o autor
pela primeira vez. Passando por diferentes modalidades de bolsas de pesquisa, a teoria crítica
da Escola de Frankfurt – na figura de Adorno e Horkheimer – foi o tema que me acompanhou
por todo o curso de filosofia e culminou em minha monografia7. Pensar essa educação crítica
foi minha motivação. Ao ingressar no mestrado tive oportunidade de clarear algumas
concepções e ampliar meu referencial. Ao me inserir no grupo de pesquisa coordenado por
minha orientadora, profa. Elisete M. Tomazetti, grupo FILJEM (Filosofia, Cultura e Ensino
Médio) , passei a refinar meu objeto de análise e moldei minha pesquisa para a temática atual.
Em contato com a obra de Maria M. A. Garcia, Pedagogias críticas e subjetivação: uma
perspectiva foucaultiana (2002), passei a indagar se o conceito de emancipação presente nas
pedagogias críticas – termo empregado pela autora - teria alguma similitude ou aproximação
com aquele que vinha me constituindo como educadora desde o curso de graduação em
filosofia. Percebemos, então, que meu contato com a temática da teoria crítica poderia servir
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Trabalho de conclusão de curso de graduação em filosofia intitulado A dialética do esclarecimento de Adorno e
a educação como possibilidade emancipatória.
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de alavanca conceitual para uma pesquisa que abordasse o conceito desde o contexto
brasileiro, problematizando-o por meio de uma crítica externa. Somado a isto estava minha
própria angústia com o tratamento do conceito de emancipação dado no dia a dia da escola.
Minha impressão pessoal é a de que consideramos o conceito como autoexplicativo e
deixamos de questioná-lo, o que acarreta, como consequência, um conformismo da educação
em relação a si mesma. Logo, um diálogo entre essas duas perspectivas pareceu-me servir de
suporte para o não comodismo e para a constante crítica e melhoria de nossas práticas
educativas enquanto professores.
Por fim, apresento a pesquisa que teve como objetivo um estudo conceitual acerca de
nosso objetivo educacional de emancipação, assumindo a postura da teoria crítica de Adorno
como ferramenta analítica de uma atitude que se justifica por meio da própria postura da
autora desta pesquisa, de sua reivindicação teórica e de sua lente para diagnóstico do real. A
pesquisa realizada é de cunho bibliográfico e conceitual. Sendo assim, sua materialidade foi
composta por algumas obras selecionadas, que julgamos estabelecerem relevância ao tema.
Dos autores destacados utilizamos como norteador teórico o filósofo Theodor W. Adorno.
Sua teoria em relação ao conceito de emancipação motivou e deu rumo a esta pesquisa em sua
intencionalidade. Para a materialidade escolhemos três obras de importantes autores da
educação brasileira, a saber: Paulo Freire (1921-1997), José Carlos Libâneo (1945) e
Dermeval Saviani (1943). Suas respectivas obras são:
Apesar destes três autores não poderem ser ingenuamente encarados como iguais em
sua pedagogia, gostaríamos de fazer uma pequena ressalva sobre a opção desta pesquisa em
seus enquadramentos. Nosso objetivo se encontra nas finalidades que tais pedagogias
consideram em sua proposta educacional. Assim, consideramos que englobá-las em uma
categoria maior de análise nos seria mais fortuito. Logo, nos valeremos aqui da definição de
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Garcia que estabelece um núcleo norteador para aquilo que defini por pedagogias críticas.
Segundo a autora, as pedagogias críticas
são discursos que tanto propõem problematizações morais da ordem social, de como
a ordem social deve e deveria ser tendo por fundamento determinados princípios e
valores morais, como também posicionam os indivíduos como agentes morais, que
se relacionam consigo mesmos e uns com os outros de um modo moral e com uma
certa representação moral da sociedade. Os indivíduos serão mais ou menos
(auto)conscientes e (auto)críticos, mais ou menos ingênuos ou alienados, segundo
sua maior ou menor adesão a determinadas leituras do mundo social e a projetos
políticos específicos. São discursos que propõem certa forma de experiência de si
(as relações que o indivíduo deve ter consigo mesmo) e de experiência com os
outros. Além disso propõem formas de experiência do mundo, ou melhor, formas
dos indivíduos experimentarem o mundo e nele se experimentarem. (GARCIA,
2002, p. 21)
Assim, dado que o objetivo de tais pedagogias nasce como contraposição ao modelo
tradicional instituído e assumem a meta de conduzir para a autonomia e para a
conscientização, consideramos como válido utilizarmos a definição de Garcia, a saber:
pedagogias críticas. Tais autores foram escolhidos segundo sua relevância ao contexto
educacional brasileiro e o profundo legado de suas obras. É inquestionável a afirmativa
contribuição destes pensadores, no que diz respeito ao recorte desta pesquisa. Esta escolha foi
tomada em conjunto pelo grupo de pesquisa FILJEM, sendo fruto de inúmeras discussões até
chegar ao recorte presente. Os autores escolhidos fazem parte daqueles nomes lembrados
enquanto grandes pensadores que subjetivaram positivamente a educação brasileira nas
ultimas décadas e a prática pessoal de cada um. Assim, a relevância desta escolha está
assegurada na relevância dos próprios autores selecionados.
Logo, não nos pareceu necessário e nem prudente, dado o tempo máximo desta
pesquisa, selecionar um grande número de obras a serem analisadas. Encontrar o conceito de
emancipação considerado pelas pedagogias críticas implicava numa análise cautelosa de suas
formulações teóricas. Independente do número de obras, o importante era a capacidade de
extrair os pressupostos e as formulações conceituais que guiam tais pedagogias. Como
apontou Trevisan, trata-se, pois, de uma postura de escuta e implicação com o objeto de
análise, que resultará em uma ―fala‖ do mesmo. Assim, as obras analisadas foram tidas
enquanto ―palavras a serem escutadas‖.
Por fim, procuramos, de maneira não arbitrária, mostrar alguns aspectos conceituais
que podem servir de base para a reflexão e problematização do conceito de emancipação,
objetivo deste trabalho. O leitor perceberá que não foi construído um capítulo que faça algum
tipo de consideração, apontando uma delimitação rígida das diferenças e descontinuidades
encontradas entre o conceito de emancipação nas pedagogias críticas, no campo educacional
brasileiro, e na teoria crítica de Adorno. Esta ―falta‖, na verdade, é uma postura teórica, que
visa a conformidade com o método estabelecido. Não se intenciona, aqui, apontar verdades,
diferenças e divergências conceituais que estabeleçam um tipo de hierarquia entre as duas
perspectivas. Nem mesmo procuramos estabelecer um novo conceito de emancipação, que
harmonize um meio termo entre ambas as perspectivas. Construir a reflexão seria negar o
exercício pretendido ao próprio leitor, resultando em uma contradição entre nossa proposta e
sua efetivação. Além do mais, como já destacamos, seguimos imersos na perspectiva
adorniana, que não considera em sua teoria a síntese de uma postura dialética. Logo,
mantivemo-nos neste passo negativo de uma reflexão de potência assegurada em sua crítica e
tomada de consciência, sem ambições salvacionistas ou otimistas em demasia. Esperamos que
ao final cumpramos de fato com estas pretensões.
meta audaciosa da sociedade que emergia na Modernidade, como expressão de uma ruptura
com o instituído. As relações com o mundo e as formas de busca e validação do conhecimento
se alteram neste período de transição entre a Era Medieval e a Modernidade, servindo de
motivação ao conceito de emancipação. Logo, como melhor explicaremos no capítulo que
segue, a expressão de uma razão emancipatória culminaria numa meta de sujeito da
posteridade, aquele que seria capaz de um pleno aperfeiçoamento moral e de sua capacidade
racional. O projeto moderno pretendia iniciar os passos seguros desta trajetória, confiando em
suas prescrições para tal finalidade.
Desde o século XVIII, até o presente, vivemos conforme alguns destes preceitos,
seguindo a herança que nos foi deixada por este período. Considerando que alguns séculos já
se passaram, a conclusão que se esperava, desde a promessa moderna, é de que o objetivo
emancipatório já estivesse cumprido em sua totalidade. Todavia, a realidade que
experimentamos não nos deixa assumir esta afirmação. As condições que asseguram a efetiva
emancipação do sujeito passam, segundo Kant (2009), por uma postura moral absoluta, numa
plena capacidade de valer-se de seus próprios juízos, por uma razão altruísta e, por fim, por
uma maioridade intelectual. Tais preceitos não podem ser verificados por completo no
presente uma vez que ainda constatamos comportamentos de violência em nossa sociedade,
entre outros exemplos. Seguindo a afirmação adorniana, não pode existir progresso social em
uma civilização capaz de crueldades desumanas contra seus iguais. É a partir deste
diagnóstico que se configura a crítica de Theodor W. Adorno ao conceito de emancipação,
evidenciando suas problemáticas inerentes e suas (im)possibilidades.
discussão conceitual, o que a teoria crítica de Adorno nos revela com potencialidade
problematizadora?
Tais objetivos são contemplados nos capítulos que seguem, servindo ao interesse de
responder a questão que guiou esta pesquisa. Ao final, esperamos contribuir para a
reflexão conceitual a que nos propomos.
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Se por um lado não parece prudente concentrar nossa análise numa leitura linear e
restritiva da história, por outro não podemos desconsiderar nossa maquinaria social mais
importante: a cultura. Com isso defendemos que uma análise do presente não pode deixar de
considerar o fenômeno da cultura enquanto elo de repasse de conhecimento entre os homens
e, também, como mecanismo de ligação entre o antigo e o novo. Coincidindo com o próprio
estudo adorniano (1985), ao considerarmos o século XXI por meio desta perspectiva
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poderemos ressaltar inúmeros pontos, acontecimentos e condutas, que nos servem de base e
guiam nosso tempo presente. O ideal do projeto moderno nos importa nesse sentido e servirá
ao nosso interesse de apreensão do conceito de emancipação.
A modernidade nasce marcando o fim da era medieval. Isso significa que muitas
mudanças fundamentais ocorreram em tal período, propiciando o que comumente
conhecemos por mudança de paradigma. O que tratamos por mudança de paradigma aqui é
uma transformação maciça de caráter social; ou seja, uma mudança substancial na sociedade.
Consideramos que a transição entre a Idade Média e a Modernidade se efetiva nessa mudança
paradigmática enquanto transformação de cunho social bastante amplo, também motivado
pelas descobertas científicas. Neste caso, pelas novas ideias que muito se relacionam com as
revoluções do pensamento desde importantes descobertas científicas.
método de captura da verdade. Ricardo Costa, em publicação sobre o tema, nos elucida que ―a
Idade Média herdou dos antigos o conceito de ciência (scientia). Aristóteles (384-322 a.C.)
definiu-a como um ‗conhecimento demonstrativo‘, isto é, o conhecimento da causa de um
objeto e do por que o objeto não ser diferente do que ele é‖ (2009, p. 132). Nota-se que a
própria definição de ciência dada pelos filósofos da Grécia Antiga privilegia a abstração, não
diferenciando filosofia e ciência. Assim se efetivava a busca pelo conhecimento; a filosofia
era considerada ciência – entendida enquanto episteme. A episteme se expressa como aquele
conhecimento que conduz a uma purificação conceitual. Em outras palavras, conhecer um
determinado conceito ou objeto era o mesmo que dizer tudo aquilo que é e o que não é o tal
objeto, isto é, purificá-lo conceitualmente. Este refinamento garantiria um conhecimento do
todo do objeto de estudo. Assim se efetiva a busca pela verdade. Verdade que por sinal que
era tida no singular, enquanto ―A‖ verdade. O exercício de reflexão e refinamento de teorias
por meio das categorias lógicas era a forma do saber filosófico. Assim, nossa maneira de
interagir com o mundo estava intimamente relacionada a este modelo. Para entendermos
melhor basta nos lembrarmos dos diálogos platônicos e de seu método. Sócrates exercia sua
maiêutica como método para a verdade. Sua técnica consistia em indagar seu interlocutor para
conduzi-lo ao conhecimento, que é imanente. Se a verdade é parte constituinte do sujeito,
então apenas é preciso purificar as ideias e afastar-se das contradições. Logo, é possível
encontrar as respostas desde que o exercício reflexivo seja tomado como ferramenta. Mesmo
que não possamos defender uma unanimidade em relação ao método de socrático podemos
nos valer deste como exemplo de conduta da ciência pré-moderna. Ou seja, a análise do
objeto sem, necessariamente, a sua utilização prática. Assim se efetiva algumas importantes
discussões conceituais do período, como: o que é o belo, a justiça, a felicidade e etc. Talvez
ainda melhor exemplo seja o filósofo Aristóteles e sua coleção batizada de órganon. Neste
conjunto de obras Aristóteles apresenta sua lógica formal e traça caminhos para a organização
do conhecimento, em termos de um fazer científico. Como ponto central de sua teoria estava a
observação minuciosa da natureza e da sociedade, uma relação de análise e contemplação
tendo como ferramenta de interação a razão. A ciência da época, ou a filosofia natural, tinha
nessas características sua identidade. Como ressalta Chibeni (2016, p. 03),
(em latim scientia; em grego episteme), era usada para diferençar o tipo especial de
conhecimento a que Aristóteles cantou louvores: o conhecimento universal e certo
acerca dos fenômenos naturais, dos números, das figuras geométricas, etc., buscado
sem preocupações práticas.
A ciência que se efetiva na modernidade não nasce como ruptura polarizada ao modelo
anterior, é fruto de um processo gradual de mudanças. As necessidades sociais se modificam
e, assim, se modifica também a maneira pelo qual se constrói e constitui o conhecimento. As
relações estabelecidas já não são as mesmas, a percepção do homem em relação ao seu lugar
no mundo se altera. O tipo de explicação e de alcance das teorias formuladas da maneira
tradicional já não é suficiente. Durante a Idade Média a igreja concentrou toda a energia
filosófica ao entorno da figura da santidade, teorizando sobre sua veridição. Mas a curiosidade
humana avançava e as revelações da ciência se distanciavam rapidamente dos dogmas
religiosos.
Francis Bacon é conhecido por ser o pai da ciência experimental. Nascido em 1561
esse importante filósofo tinha como meta a reforma completa do fazer científico. Como base
de seu pensamento está a necessidade da experiência para a verificação de teorias. Ou seja,
não basta, para a teoria ser considerada válida, passar pelo refinamento lógico ou pelos
sentidos de nossa sensibilidade é preciso ser comprovada na realidade. Percebe-se claramente
que o foco de análise científico muda do universal para o singular, do abstrato para o
concreto. Teorizar sobre os conceitos universais deixa de fazer sentido, o que interessa é
somente aquilo que possa ser comprovado. Como esclarece Boaventura (1988, p. 49),
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Se pensarmos que o fim da Idade Média está intimamente ligado com a queda da
soberania da igreja católica e seus dogmas, então o pensamento baconiano não nos parecerá
estranho. Por vários séculos a igreja freou importantes descobertas e limitou a produção de
conhecimento. As explicações religiosas foram superadas por pensadores como Nicolau
Copérnico (1473-1543), Giordano Bruno (1548-1600), Galileu Galilei (1564-1642) entre
outros. Assim, o anseio social da época se voltava ao conhecimento para além do estabelecido
pela religião. Era necessidade humana se tornar senhor de si e da natureza para não se sujeitar
novamente ao falso e ilusório. É nesse contexto que Francis Bacon pode ser encarado como
influente pensador que captou em sua teoria o seu próprio tempo, as demandas de seu
presente. Em sua obra novum organum ele escreve:
Sua crítica ao modelo tradicional de ciência (ou não ciência em termos baconiano)
revela o profundo descontentamento vigente aos caminhos condicionados pela religião. Em
outro aforismo ele continua,
a verdadeira causa e raiz de todos os males que afetam as ciências é uma única:
enquanto admiramos e exaltamos de modo falso os poderes da mente humana, não
lhe buscamos auxílios adequados. A natureza supera em muito, em complexidade,
os sentidos e o intelecto. Todas aquelas belas meditações e especulações humanas,
todas as controvérsias são coisas malsãs. E ninguém disso se apercebe. (BACON,
2015, p. 07).
A ideia clara de que a razão humana é arma essencial na busca pelo conhecimento se
mantém, porém, com uma ressalva. Ela – a razão – já não é tida como único agente de busca
pelo conhecimento, é preciso estabelecer outras ferramentas que auxiliem na compreensão da
natureza em toda sua complexidade. Bacon acreditava que seu método científico de
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por isso, de vez que não ignoramos, nem nos esquecemos da magnitude da obra que
empreender (qual seja, a de colocar o intelecto humano ao nível da natureza e das
coisas), de nenhum modo nos podemos contentar com o que até agora preceituamos;
ao contrário, intentamos oferecer e subministrar ao intelecto os mais poderosos
auxílios, que é o que passaremos a indicar. E, certamente, na interpretação da
natureza deve-se formar e preparar o ânimo na interpretação da natureza, de modo
que, de um lado, detenha-se devidamente nos vários graus de certeza e, de outro,
pense também, especialmente no início, que o que lhe é permitido examinar depende
sobremaneira do que ainda está para ser examinado. (BACON, 2015, p. 123).
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Termo utilizado no sentido dado pelo filósofo Francis Bacon. Trata-se de uma expressão que visa capitar um
novo, tido como melhor, modelo de busca pelo conhecimento. Neste sentido o conhecimento seguro apenas
poderia ser atribuído ao método científico, enquanto que as outras formas de conhecimento eram tidas como
metafísicas e míticas – portanto, sem relevância prática.
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Em consonância ao seu próprio tempo este movimento tinha como bandeira a meta de
elevar a razão humana, tornando o sujeito centro dos questionamentos científicos. O homem
passa a ser a medida de todas as coisas enquanto criatura de razão e de insubordinação ao
meio. Bacon afirmava que o indivíduo deveria se valer da natureza, controlá-la. Os filósofos
do Iluminismo acompanhavam tal ideia e defendiam que por meio da razão científica e do
controle da natureza nos livraríamos dos mitos, chegando ao conhecimento seguro prometido
por Bacon. Dada esta pretensão tal movimento também é conhecido por outros termos como,
movimento das luzes, século das luzes, esclarecimento. Todos estes nomes fazem referência
ao ato de clarear, dar luz, dar razão, tirar das sombras. Esta era a meta, tirar o homem das
sombras da mitologia, das explicações religiosas e incertas; emancipar, tornar o homem
sujeito livre das amarras do medo e da falta de conhecimento. Conforme Pagni (2007, p. 166),
o século XVIII ficou conhecido como o Século das Luzes. Com essa metáfora que
denota claridade, os iluministas se opõem à Idade Média, considerada, por eles, o
período das trevas. Época em que a autoridade e a obediência tornaram-se regra
contra a liberdade humana e contra, sobretudo, o uso da razão e do entendimento.
Por isso, palavras como Lumières, Iluminismo, Enlighlenment, Ilustracion e
Aufklärung foram usadas pelo pensamento europeu do século XVIII para designar
sua auto-imagem.
Uma autoimagem que dava conta de expressar não somente as perspectivas e anseios
do movimento em si, como, ainda mais expressivamente, todo um contexto social de
dissociação entre ciência e religião. O início da modernidade é marcado por esta dicotomia.
Conhecimento passa a ter outro significado e atrela-se à ciência, distanciando-se de saberes
tido como menores ou até não considerados, como, por exemplo, os religiosos.
internalização das regras. Somente após essa formalização é que seria possível o
desprendimento e, assim, a autonomia do sujeito. Logo, as regras seriam absorvidas, num
primeiro momento, de maneira mecânica e pouco refletida, para, ―em seguida, representarem
um constrangimento moral, interior, definido autonomamente pelo próprio sujeito, graças a
sua capacidade de fazer livre uso da razão e do entendimento‖ (PAGNI, 2007, p. 180). Tal
internalização é de suma importância ao problema colocado pelo autor. Afinal, uma
emancipação pensada somente em critérios individuais, egoístas, não seria capaz de sustentar-
se, uma vez que, sucumbir-se-ia ao Estado e a ordem social. Este problema - da liberdade
individual e coletiva - está no centro da preocupação kantiana quanto a sua formulação do
objetivo emancipatório.
Eis que Kant resume em seu texto a meta de toda uma era, a meta da emancipação.
Quando tratamos de projeto da modernidade é a isso que nos referimos. A uma sociedade da
razão científica, do conhecimento seguro, da pacificação; e, logo, de uma sociedade
emancipada, capaz de fazer uso de seu entendimento. Vale ressaltar que, segundo Klein
(2009, p. 222), ―para Kant, o esclarecimento sempre se constitui muito mais como uma tarefa
do que propriamente um resultado. Isso também precisa estar presente quando se quer
compreender o real valor e o significado do Esclarecimento como uma época histórica‖. É
assim que o próprio Kant responde a pergunta (2009, p. 16) ―vivemos nós agora numa época
esclarecida? – a resposta é: não. Mas vivemos numa época do Iluminismo‖. A meta, neste
caso, é uma busca para além de seu próprio tempo; é um projeto.
Certa vez Foucault elogiou Kant por sua obra Resposta à pergunta: que é o
Iluminismo? e afirmou que apesar de ter sido uma obra considerada de pouca importância na
época, revelava muito sobre a preocupação filosófica que ocorreria dali para diante. Para o
filósofo, Kant se preocupou com entender seu tempo e o sujeito daquele período. Segundo
Foucault (1995, p. 239),
quando, em. 1784, Kant perguntou: Was heisst Aufklärung?, ele queria dizer: o que
está acontecendo neste momento? O que está acontecendo conosco? O que é este
mundo, esta época, este momento preciso em que vivemos? Em outras palavras: o
que somos, enquanto Aufklärer, enquanto parte do Iluminismo? Façamos uma
comparação com a questão cartesiana: quem sou eu? Eu, enquanto sujeito único,
mas universal e a-histórico - eu para Descartes é todo mundo, em todo lugar e a todo
momento? Kant, porém, pergunta algo mais: o que somos nós? num momento muito
preciso da história. A questão de Kant aparece como uma análise de quem somos
nós e do nosso presente. Creio que este aspecto da filosofia adquiriu cada vez maior
importância.
No texto kantiano citado por Foucault, Was heisst Aufklärung? (2009), o filósofo, de
maneira bastante didática, procurou descrever o que era afinal ser um sujeito esclarecido,
emancipado. Para Kant, o Iluminismo seria a expressão máxima da razão humana. Segundo
essa afirmação, esclarecer-se seria o mesmo que tornar-se dono e único responsável por suas
escolhas. Devemos lembrar que Kant apostou na razão como instrumento moral; logo, não
devemos entender apressadamente que o filósofo defenda um tipo de sociedade desordenada
onde cada um pode fazer o que lhe vem à mente. Para Kant, a razão humana é capaz de
chegar, quando bem utilizada pelo sujeito, a um axioma moral. Esse axioma é universal;
assim, a organização e a paz estariam asseguradas, segundo sua teoria. A educação, para o
filósofo, deveria debruçar-se neste projeto. Segundo Kant (1996, p. 80),
a cultura moral deve-se fundar sobre máximas, não sobre disciplina. Esta impede os
defeitos; aquelas formam a maneira de pensar. É preciso proceder de tal modo que a
criança se acostume a agir segundo máximas e não segundo certos motivos. A
disciplina não gera senão um hábito, que desaparece com os anos. É necessário que
a criança aprenda a agir segundo certas máximas, cuja eqüidade ela própria distinga.
Alcançar a maioridade, nos termos kantiano, seria o mesmo que tornar-se emancipado.
Kant defendeu que essa era a meta de seu tempo e a meta da própria educação. A tradução do
próprio termo empregado por Kant nos garante essa afirmação; Aufklärung é emancipação.
Como dito anteriormente, a teoria do filósofo embasa tal pretensão como possibilidade da
nossa racionalidade. Assim, todos nós seríamos capazes de nos tornarmos emancipados,
9
Tradução do autor: tenha coragem de saber.
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Até aqui resgatamos as bases teóricas de nossa estrutura social e, assim, também
educacional. Compreendemos que a modernidade nasce juntamente com uma nova sociedade
e uma nova forma de compreendermo-nos em relação ao meio. Obviamente, como
defendemos desde o início desta pesquisa, este processo não se tratou de uma ruptura drástica
e nem mesmo rápida. Podemos concordar que as mudanças que motivaram o início de uma
nova era foram significativas para a constituição da contemporaneidade. Se justamente somos
o que somos em virtude de todas as questões elencadas – e infinitas outras que deixamos de
lado dado o ponto de interesse deste trabalho -, então uma análise do presente não pode
esquivar-se desta contextualização. Seguindo a perspectiva teórica que dá suporte a esta
pesquisa, destacamos que o conceito de emancipação pretendido pelo Iluminismo não pode
ser concretizado, uma vez que guarda em sua constituição uma contradição capaz de podar
sua efetivação. Segundo a teoria crítica de Theodor W. Adorno e Max Horkheimer, a
principal desconfiança que gera tal suspeita se deve ao fato de não ser possível, na atualidade,
encontrar traços dessa paz pretendida por Kant, ou mesmo de uma emancipação em sentido
menos abrangente. O que se nota, em total contraposição ao projeto moderno, é uma
sociedade cada vez mais envolta na mentalidade da reprodução cega e, assim, acrítica.
o homem não pode tornar-se um verdadeiro homem senão pela educação. Ele é
aquilo que a educação dele faz. Note-se que ele só pode receber esta educação de
outros homens, os quais a receberam igualmente de outros. Portanto, a falta de
disciplina e de instrução em certos homens os torna mestres muito ruins de seus
educandos.
Francis Bacon, como já vimos, tinha como proposta audaciosa a meta de utilizar da
natureza o máximo em benefício do homem. Não se tratava de uma tomada gananciosa ou
sem limites dos recursos naturais, essa discussão não estava em jogo na época. Seu vislumbre
estava entrelaçado na lógica do empoderamento humano. Quanto mais o homem pudesse
controlar a natureza, mais livre ele estaria dos medos que o aprisionavam. Em suma, Bacon
defendia uma concepção de método científico que valoriza a experiência e a experimentação.
Sua grande preocupação foi definir um método em que o erro fosse ao máximo evitado, para,
segundo ele, levar o homem ao caminho do conhecimento seguro. Conforme Oliveira (2002,
p. 29),
assim como o próprio discurso científico reforça as premissas do movimento. A essa faceta de
nossa racionalidade Adorno e, também, Horkheimer chamaram de razão subjetiva10.
É assim que o Iluminismo acaba por colaborar para que se alcance justamente o
contrário do que se pretendia. Se a promessa era que por meio da razão e da ciência como
detentora da verdade o homem se tornaria emancipado, o que se conseguiu foi o oposto. Cada
vez mais o homem delega a outros o seu direito de refletir e de tomada de decisões. Para
10
Segundo a compreensão de Adorno e Horkheimer (1985) a razão subjetiva é aquela capacidade racional que
torna possível nossas ações de classificação, dedução e inferência. Ou seja, trata-se da capacidade abstrata de
nosso mecanismo de pensamento. Por outro lado, a razão objetiva se configura como sendo o próprio logos
filosófico ligado à filosofia da Grécia Antiga se manifestando naquela capacidade contemplativa de especulação
do mundo e de uma ética universal.
44
Tal legado motiva a reflexão dos filósofos da Escola de Frankfurt, aqui, em especial,
Adorno e Horkheimer, justamente por entenderem que jamais se alcançou a meta pretendida.
O Iluminismo ao privilegiar o conhecimento científico e desconsiderar outras formas de busca
pelo conhecimento acabou por valorizar especialmente nossa capacidade técnica, mecânica e
de cálculo. O tipo de racionalidade empregado pelo fazer científico acabou por transpassar as
fronteiras de sua própria atividade, influenciando nossas práticas de interação social. Pensar
uma educação para a emancipação desde estes critérios acaba se efetivando como o mesmo
que reproduzir as decadentes relações sociais experimentadas na atualidade.
Adorno caracteriza como barbárie todo o comportamento violento que é fruto de uma
incapacidade reflexiva. Em outras palavras, as erupções de violência primitiva. O holocausto,
por exemplo, é, para o autor, o exemplo máximo de barbárie humana e reflexo incontestável
da falha do objetivo emancipatório. Uma nação inteira entregou-se aos delírios de uma
finalidade deturpada para a qual se estava disposto qualquer meio. A razão subjetiva não se
relaciona com as ―finalidades‖ naquele sentido metafísico de uma filosofia natural. No tipo de
racionalidade subjetiva o cálculo de justificação é prático e pode ser modificado, sem riscos
de tornar-se contraditório, de acordo com cada situação. Segundo Tomazetti (1991, p. 127),
11
O conceito de alienação dá conta de expressar a não concretização da relação de formação implicada entre
sujeito/trabalho. Quando tratou de trabalho alienado, por exemplo, Marx descreveu a não identificação do sujeito
com o fruto de seu trabalho (enquanto transformação da natureza). Numa relação alienada a formação não se
concretiza e a relação sujeito e trabalho é sempre assimétrica.
46
Segundo Adorno e Horkheimer, o Iluminismo nada mais fez do que eleger um novo
modelo mítico. Se antes a preocupação humana se voltava ao modelo metafísico ou teológico,
agora a ciência se ergue como um novo Deus na contemporaneidade, servindo de justificativa
para, inclusive, diversas atrocidades. A crítica dos filósofos frankfurtianos é radicalizada na
medida em que pretende servir de lupa aos problemas sociais de uma época supostamente
esclarecida, deturpada conceitualmente. É válido esclarecer, que não se tratava de considerar a
―morte‖ plena de nossa capacidade objetiva de reflexão, nem mesmo dividir nossa
racionalidade como duas partes distintas e opostas. O entender humano possui estas duas
facetas e ambas as competências permanecem, obviamente. São características de nossa
razão. Todavia, a crítica ao Iluminismo evidencia um privilégio dado, uma maior importância,
a apenas uma dessas características. Nossa capacidade subjetiva foi elevada ao nível de única
capaz de alcançar verdades e certezas, enquanto que nossa faceta objetiva foi desmerecida
enquanto mítica e errônea, incapaz de produzir verdades. É assim que a relação com a
natureza passa a ser tratada, descaracterizando nossa própria formação de identidade. Nesse
sentido, a instrumentalização compreende uma expressão desta tomada de posição. Conforme
Tomazetti (1991, p. 140),
47
12
Conceito marxista que expressa o fato do homem ―tornar-se objeto‖ no sistema capitalista de produção.
48
A nova classe oriunda do capitalismo foi capaz de enriquecer com o fruto desta relação e
transformou para sempre a velha cadeia das relações laborais. Se outrora o senhor feudal era
50
sempre aquele que por nobreza herdava sua condição, sendo o servo o fruto desta
desigualdade, agora o homem de comércio é capaz de inventar seu próprio meio de
subsistência e abandonar a condição de dependente. É assim que, para Marx, a burguesia
nasce representando uma classe subversiva que fora capaz de superar o velho regime feudal e
estipular o novo. Na engrenagem das revoluções históricas a burguesia representou um
importante papel que transformou para sempre as relações econômicas de nossa sociedade.
Todavia, novas mazelas sociais se constituíram gerando um novo ciclo de desigualdades. A
apropriação burguesa dos meios de produção estimulou uma nova dualidade. A relação
econômica deste novo regime constituiu-se marcada por duas polaridades: de um lado, os
donos dos meios de produção, os burgueses; de outro, aqueles que sem os meios materiais
necessários restavam-lhes sua força de trabalhado como moeda de troca comercial, a classe
proletária.
A crítica marxista destaca esta dualidade extrema experimentada na fase mais radical
do capitalismo. Enquanto o trabalhador labutava para transformar a matéria prima em
mercadoria, recebendo sempre a menor parte do lucro total do produto, o empregador
enriquecia à custa desta dominação formal. Conforme elucida o autor em sua obra
denominada O capital,
que sua tarefa é sempre fracionada e destituída de significado simbólico. Marx aponta no
próprio ciclo histórico a possibilidade real da superação aos excessos da burguesia e, assim,
do próprio capitalismo. Para o filósofo, assim como outrora a revolução burguesa representou
o início de uma nova relação econômica e social, agora seria preciso outra revolução, da nova
classe dominada, a saber, o proletariado. É assim que o comunismo se apresenta na teoria
marxista como uma solução possível ao problema da discrepância social oriunda da má
distribuição de renda. Seria, assim, possível dentro da engrenagem dos acontecimentos
históricos a construção de um novo modelo econômico, que se pretende mais justo e ético em
relação às questões sociais.
Se Marx estipulou uma análise econômica que repercutiu fortemente nas questões
sociais, Gramsci (1891 – 1937) pode ser exaltado como a figura intelectual que colocou os
apontamentos marxistas no centro da questão educacional. Suas indicações acerca de uma
educação revolucionária, que fosse capaz de produzir uma contra hegemonia, ganhou força
entre uma parcela da elite intelectual de esquerda. No Brasil, suas ideias deram sustentação ao
projeto de uma pedagogia que visava em seu ideal a transformação social e a superação da
relação de dominação do sistema capitalista. De maneira mais ou menos incisiva, podemos
estabelecer que de modo geral os autores das pedagogias críticas estão envoltos nesta
proposta de uma educação pautada na missão de superar a condição de marginalidade da
parcela menos favorecida da população.
13
Conforme apresentaremos, Gramsci considera que somos todos intelectuais, sendo a divisão entre
trabalhadores intelectuais e braçais um equívoco. Porém, esclarece uma divisão entre a classe de intelectuais,
apresentando o que seria este novo intelectual do capitalismo. Para elucidar este conceito utilizaremos uma
passagem da autora Ramos que esclarece muito bem a diferença entre intelectuais e intelectuais orgânicos.
Segundo a autora, ―Gramsci faz uma distinção importante entre todos os homens (intelectuais) e aqueles que
desempenham na sociedade a função de intelectual. Dentre estes últimos destacam-se dois tipos de intelectuais:
os tradicionais - eclesiáticos, aristocratas togados, administradores, cientistas, teóricos, filósofos etc-, os quais
fazem parte de um continuam histórico e cujo meio de ser consiste na eloquência, e o novo tipo de intelectual, o
orgânico; cuja formação será baseada na ‗educação técnica estreitamente ligada ao trabalho intelectual, mesmo
ao mais primitivo e desqualificado‘. Este novo intelectual não mais se caracterizará pela eloquência e pelo
distanciamento do mundo do trabalho físico, devendo ‗imiscuir-se ativamente na vida prática como construtor,
organizador, pensador permanente (...), especialista mais político". (1996, p. 18)
52
voltada para as camadas sociais e seu suposto papel no mercado de trabalho revela a direção
apontada por estes intelectuais orgânicos de nossa sociedade. Segundo Monasta,
todos os homens são intelectuais, poder-se-ia dizer então: mas nem todos os homens
desempenham na sociedade a função de intelectuais. Quando se distingue entre
intelectuais e não-intelectuais, faz-se referência, na realidade, tão-somente á
imediata função social da categoria profissional dos intelectuais, isto é, leva-se em
conta a direção sobre a qual incide o peso maior da atividade profissional específica,
se na elaboração intelectual ou se no esforço muscular-nervoso. (...) Em suma, todo
homem, fora de sua profissão, desenvolve uma atividade intelectual qualquer, ou
seja, é um "filósofo", um artista, um homem de gosto, participa de uma concepção
do mundo, possui uma linha consciente de conduta moral, contribui assim para
manter ou para modificar uma concepção do mundo, isto é, para promover novas
maneiras de pensar. (GRAMSCI, 1982, p. 07).
Gramsci defendeu uma postura de ideal marxista visando a educação como arma a
serviço do proletariado. Uma educação nos moldes de uma verdadeira democracia teria como
consequência uma harmonia social, se cumprida a meta de dissolução das classes e das
desigualdades oriundas desta divisão. A formação proposta pelo filósofo estava pautada na
ideia de uma educação para além do espontaneísmo. A criança da classe trabalhadora,
segundo Gramsci, não poderia ficar entregue a própria sorte de experiências e apropriações de
mundo. Era preciso educá-la para desenvolver certas habilidades que tanto permitiriam sua
formação técnica quando intelectual. Assim,
progressista‘, ‗renovada não diretiva‘, ‗tecnicista‘ – esta última tendência batizada pelo
próprio Saviani, para dar nome à pedagogia oficial da ditadura militar) e as ‗progressistas‘
(‗libertadora‘, ‗libertária‘ e ‗crítico-social dos conteúdos‘)‖. Libâneo encontra-se situado,
conforme sua própria descrição, dentro daquilo que denominou por ―pedagogia crítico-social
dos conteúdos‖, que por sua vez expressaria, segundo o autor, ―uma práxis político-
pedagógica articulada com outros movimentos sociais, na sociedade capitalista, no sentido de
construção de uma outra forma de vida: a sociedade socialista‖ (GHIRALDELLI, 2003, p.
181).
a visão da liberdade tem nesta pedagogia uma posição de relêvo. É a matriz que
atribui sentido a uma prática educativa que só pode alcançar efetividade e eficácia
na medida da participação livre e crítica dos educandos. É um dos princípios
essenciais para a estruturação do círculo de cultura, unidade de ensino que substitui
a escola , autoritária por estrutura e tradição. (1983, p.05) (...) Aqui a idéia da
liberdade não aparece apenas como conceito ou como aspiração humana, mas
também interessa, e fundamentalmente, em seu modo de instauração histórica. Paulo
Freire diz com clareza: educação como prática de liberdade. Trata-se, como
57
Aqui Weffort revela uma clara inclinação dialética para a análise da realidade. Para
uma educação voltada para a superação das condições de exploração, de opressão e de
marginalização social. A noção de emancipação encontrada nesta afirmação está conectada e
estruturada em torno da ideia de liberdade enquanto mudança, escolha. Em outras palavras,
uma liberdade que se opõe à decisão irrefletida e ao comando arbitrário. Emancipação parece
respeitar a máxima de um sujeito de escolha, livre e esclarecido.
consumo e não mais o todo deste bem. Não há relação com a natureza já que ela já não mais
permeia nossa relação com o mundo. O mundo dos homens é a segunda natureza (ARENDT,
2007) - aquela que construímos -, para além desses processos primários de trabalho. O
homem moderno não se identifica com aquilo que produz, não o faz com o objetivo de
permanecer neste mundo ou deixar um legado. Não se relaciona de maneira a identificar-se e,
posteriormente, separar-se – naquele processo de constituir-se humano. A relação é outra, é
quebrada, foi rompida. Conforme Marx, está alienada. Nessa dialética se encontra a chave
para a compreensão do mundo e para sua efetiva transformação. Segundo Mandel,
a educação das massas se faz, assim, algo de absolutamente fundamental entre nós.
Educação que, desvestida da roupagem alienada e alienante seja uma força de
mudança e de libertação. A opção, por isso, teria de ser também, entre uma educação
para a domesticação, para a alienação, e uma educação para a liberdade. Educação
para o homem-objeto ou educação para o homem-sujeito. (1983, p.36)
O que quer Freire de uma ―educação para o homem-sujeito‖? Está clara sua intensão
de uma educação comprometida com o objetivo de formar cidadãos capazes de refletir e de
mudar sua realidade. O homem emancipado jamais poderia escolher a passividade, se assim o
59
fosse este não haveria de estar de fato emancipado. Decidir! Esta é a palavra fundamental.
Autonomia é decisão, liberdade é poder de escolha. O sujeito, objeto desta nova educação,
precisa ser capaz de decidir e, mais do que isso, garantir seu direito à. Para Freire,
umas das grandes, se não a maior, tragédia do homem moderno, está em que
é hoje dominado pela fôrça dos mitos e comandado pela publicidade organizada,
ideológica ou não, e por isso vem renunciando cada vez, sem o saber,
à sua capacidade de decidir. Vem sendo expulso da órbita das decisões.
As tarefas de seu tempo não são captadas pelo homem simples, mas a êle
apresentadas por uma elite que as interpreta e lhas entrega em forma de
receita, de prescrições, afoga-se no anonimato nivelador da massificação, sem
esperança e sem fé, domestificado e acomodado: já não é sujeito. Rebaixa-se a
puro objeto. Coisifica-se. (1983, p.43)
Saviani (1999), apesar de sua crítica à Escola Nova14, não parece duvidar desta
máxima. A educação cumpre tal objetivo e tem em seu horizonte a igualdade. Igualdade que
só pode ser alcançada com sujeitos devidamente esclarecidos. Para o autor, conforme
esclarece em sua obra Escola e Democracia, a educação tem papel claro:
Percebe-se, pois, que autonomia tem sempre esta relação direta com uma tomada de
consciência deste sujeito, antes alienado e conformado, agora crítico e reflexivo. Tem também
relação com a superação da marginalidade, fenômeno que é sintoma desta sociedade de
14
A Escola Nova foi um movimento renovador do ensino que surgiu no século XIX, ganhando força no Brasil
na primeira metade do século XX.
60
dominação. Trata-se, então, de uma emancipação sempre positiva, enquanto agente de efetiva
transformação. A educação não é tida por acaso como importante ferramenta para esta tomada
de consciência. É com a educação, formal e informal, que nos comprometemos com o antigo
e afirmamos o novo. Ou seja, a educação é nossa mais potente e legítima ferramenta de
repasse cultural. Por meio deste sistema somos capazes de apreender o conhecimento das
gerações passadas e de criar as novidades de nosso próprio tempo. A educação é uma
importante mantenedora do social. A escola, enquanto instituição formal de ensino se
relaciona com este fim. Precisa ser capaz de estabelecer a medida entre o velho e o novo.
Saviani (1999) e Libâneo (1990), em especial, dão em sua teoria forte respaldo aos
conhecimentos construídos ao longo dos séculos pela humanidade. O novo não pode ser
instituído sem a apreensão do antigo, seu entendimento e, até, se for o caso, desaprovação.
Autonomia, neste sentido, não pode estar desvinculada do rigor e autoridade. Segundo
Saviani,
trata-se de uma pedagogia que leva em conta os determinantes sociais e que propicia
a crítica dos mecanismos e imposições resultantes da organização da sociedade em
classes sociais antagônicas; ao mesmo tempo, é uma pedagogia que vai buscar, no
interior da escola, respostas pedagógico-didáticas que permitam o exercício dessa
61
Autonomia, neste sentido, se efetiva desde uma educação preocupada com a crítica
construída em bases sólidas. Base que parte, primeiro, da apreensão social e da interação com
o meio. É preciso, pois, uma pedagogia possível e não meramente representativa. As bases
pedagógicas precisam dar conta deste objetivo, precisam promover a capacidade deste sujeito
para uma práxis. Para Marx (2004), teoria e prática se articulam e não podem ser tidas em
separado. O movimento teórico já é prática e, ao mesmo tempo, toda prática se apresenta
como teoria. Aceitar que ambas ocorrem em separado é negar a capacidade do conhecimento
humano, que opera sempre com ambas as categorias. O conceito de práxis “refere-se, em
geral, a ação, a atividade, e, no sentido que lhe atribui Marx, à atividade livre, universal,
criativa e auto criativa, por meio da qual o homem cria (faz, produz), e transforma (conforma)
seu mundo humano e histórico e a si mesmo‖ (BOTTOMORE, 2001, p. 292). Para as
pedagogias críticas, a práxis é fator determinante nesta caminhada para uma emancipação.
Tal objetivo é cumprido quando o sujeito é capaz de refletir sobre sua realidade e operá-la,
transformá-la. Ou seja, é capaz de unir teoria e prática, de efetivar uma práxis social. Como
destaca Libâneo (1990, p.12), ―para tanto, é imperioso buscar uma pedagogia e uma didática
que, partindo da compreensão da educação na prática social histórica e concreta, ajudem os
professores no trabalho docente com as camadas populares‖. A didática, a prática pedagógica,
está a serviço deste objetivo e deve servir ao uso do professor para a finalidade da autonomia.
Assim, uma boa pedagogia é aquela capaz de desenvolver métodos, maneiras adequadas, para
este fim determinado.
Paulo Freire (1983) elaborou seu método para alfabetização de jovens e adultos a
serviço deste duplo objetivo: alfabetizar e promover a consciência crítica. Para o autor, a
tomada de consciência era parte fundamental da educação. Alfabetizar era uma forma de
apreender o mundo e se colocar nele, ao mesmo tempo em que se efetivava com um ato de
resistência e de luta política. Conforme Weffort,
Dada a realidade de nosso país, a alfabetização se mostrou, para Freire, como o campo
mais urgente de sua pedagogia. Prática esta que revela a aspiração por emancipar como
imprescindível para a parcela explorada da sociedade. Sua dimensão dialética da história do
trabalho humano considera a exploração entre as classes sociais uma condição de possível
superação, na medida em que pode ser transformada. Talvez esta seja a principal característica
das pedagogias críticas, a profunda crença na transformação social. Uma sociedade justa
pode ser alcançada, temos a garantia desta trajetória dada por nossa capacidade. É possível!
Esta vontade que move nossa capacidade para a justiça e equidade não se efetivará
antes que sejamos capazes de refletir criticamente e chegarmos a uma mesma conclusão: uma
sociedade justa é possível. É claro que, em termos marxistas, a conscientização de ―todos‖
não é possível, dado que a parcela privilegiada da sociedade – detentora dos meios de
produção – não se mostraria favorável a uma possível perda de privilégios. Assim, a tomada
de consciência é para todos, mas a luta é para a parte interessada. Proletários do mundo, uni-
vos (MARX, 2010), eis a bandeira marxista. Poderíamos ainda complementar: uni-vos e
tomem as rédeas de suas vidas, sejam maiores e pensem por si. Emancipem-se e mudem esta
sociedade e sua própria condição.
contrário, educaria para a obediência cega e para irreflexão. A educação que se pretende
crítica inaugura uma postura de crença na capacidade humana. Como esclarece Freire,
Esta crença marca uma relação menos autoritária em sala de aula, porque, justamente,
coloca o aluno – educando, em termos freireano – como agente de conhecimento e não mero
receptáculo. Em outras palavras, uma relação em que o aluno é reconhecido enquanto sujeito
de interesses e conhecimento. Nesse sentido não se pode, de fato, ensinar autonomia, já que é
no movimento do próprio aluno que este objetivo se concretiza. O que é possível, e necessário
para a transformação social, é fornecer as ferramentas para que o sujeito seja capaz de
conduzir-se para esta finalidade. A emancipação não pode ser, em sua essência – com risco de
tornar-se contraditória –, uma imposição. Emancipar-se, nesta perspectiva, é justamente ser
capaz de reflexão e de ação: concretizar uma práxis. Garcia sintetiza o papel do
esclarecimento, da emancipação, nas pedagogias críticas. Para a autora,
ao sujeito tomar consciência de seu papel no mundo e ocupar seu espaço. A educação pensada
nesses critérios tem como finalidade um sujeito capaz de uma verdadeira liberdade. Logo, tem
como esperança uma sociedade melhor, mais justa e não opressora. Para Gadotti,
uma verdadeira caminhada, necessária, para a educação brasileira está sendo feita:
refiro-me ao trabalho de sindicalização e de associação dos professores e
estudantes. Contra a ideologia da educação, de uma educação feita de cima para
baixo, é preciso criar uma contra-ideologia: reinventarmos a educação de baixo para
cima. A partir dos próprios educadores, unindo-se uns aos outros, caminhar de
forma coesa e organizada. A análise crítica da educação brasileira contemporânea
nos deve despertar para isso. Caso contrário, toda a crítica, será inútil. É preciso
preparar propostas alternativas. Não propostas criadas por um ou dois educadores,
mas por todos os educadores, a partir das bases. É essa a tarefa que nos cabe hoje. É
uma tarefa gigantesca e estimulante: construir uma nova educação, passo a passo
com a construção de uma nova sociedade. (1983, p.130)
É possível notar o entusiasmo por esta educação, pensada como alternativa para a
sociedade capitalista. De uma educação que promove a injustiça e a relação de dominação
entre os homens para uma educação de participação e construção coletiva que visa um futuro
diferente. Poderíamos pensar, assim, que educação e política são, neste caso, idênticas.
Educar é sempre promover e atuar politicamente. Todavia, Saviani nos ressalta,
A ressalva do autor visa a preocupação com a própria essência, por assim dizer, de
uma educação crítica. Para ele,
uma análise, ainda que superficial, do fenômeno educativo nos revela que,
diferentemente da prática Política, a educação configura uma relação que se trava
entre não-antagônicos. É pressuposto de toda e qualquer relação educativa que o
educador está a serviço dos interesses do educando. Nenhuma prática educativa
pode se instaurar sem este suposto. Em se tratando da política ocorre o inverso. A
mais superficial das análises põe em evidência que a relação política se trava,
fundamentalmente, entre antagônicos. No jogo político se defrontam interesses e
perspectivas mutuamente excludentes. Por isso em política o objetivo é vencer e não
convencer. Inversamente, em educação o objetivo é convencer e não vencer. (1999,
p. 92)
65
Uma educação que tenha como objetivo o puro ato de convencimento é ideológica e se
torna contraditória. Para as pedagogias críticas o convencimento não pode ser o objetivo
último da educação, se assim o fosse estaria, o professor, privilegiando a passividade
intelectual daqueles alunos que apenas recebem, sem crítica ou reflexão, a informação e o
conteúdo dado. Autonomia pressupõe liberdade, já o convencimento arbitrário elimina
qualquer escolha. Se educação e política não são idênticas também não podem ser tidas como
totalmente isoladas e sem relação. Uma se relaciona com a outra na medida em que tratam da
realidade social e das questões práticas da comunidade. Todavia, o que Saviani nos aponta é a
necessidade de considerar na educação uma postura para além do construído e efetivado.
Assim, parece ser papel da educação este ―pensar para o futuro‖, para ―o novo‖. Pensar ―além
do dado e consolidado‖ é papel desta formação para a emancipação, pois assim é que se
garante o fluxo das transformações históricas. Não seria possível manter tal fluxo se apenas
fosse privilegiado a reprodução cega do instaurado.
O ato de resistência das pedagogias críticas está pautado nessa necessidade da escola
em se contrapor à mera reprodução do consolidado. Para Saviani, a postura burguesa tem
como objetivo justamente frear a transformação, o novo, como forma de manter-se enquanto
classe dominante. Na revolução burguesa a educação teve papel de destaque, enquanto
formadora para uma nova postura social. Saviani nos narra essa passagem histórica,
É claro que muitas diferenças podem ser marcadas entre os autores que estamos
utilizando. Para Libâneo, as pedagogias, que neste trabalho tratamos por pedagogias críticas,
desdobram-se em três tendências pedagógicas distintas dentro da categoria maior chamada de
―pedagogia progressista‖. Segundo o autor classifica em sua obra,
Nota-se que o objetivo maior de tais pedagogias se efetiva como a própria tomada de
consciência. A preocupação com as disparidades sociais provenientes do capitalismo se
consolida como uma meta humana nestas pedagogias. Trata-se, pois, de uma pedagogia
focada na mudança social por meio da conscientização. A ação política seria, neste caso, uma
consequência da conscientização, não sendo, porém, meta da educação propriamente dita.
Paulo Freire destaca essa diferença entre política e educação na seguinte passagem:
A educação para autonomia, no contexto das pedagogias críticas, se efetiva como uma
atividade de cunho social e transformador. A noção de liberdade empregada tem ligação
política na medida em que se apresenta enquanto prática do sujeito esclarecido, dentro de sua
própria sociedade, com fins de mudança em sua realidade. A ação política, aqui entendida,
69
tem seus limites, respeitando certo distanciamento entre ambas, justamente para não cair em
contradição. A prática social é a ferramenta desta pedagogia, para sua meta de autonomia.
Libâneo escreve:
É preciso, pois, estar atento ao fato de que conteúdo não é garantia de conhecimento.
Para as pedagogias críticas o conhecimento enciclopédico não é sinônimo de autonomia.
Uma educação que tenha em seu objetivo a emancipação, a conscientização do educando,
precisa estar atenta a este fato. É preciso encontrar uma sintonia entre o social e o individual,
como sugere Libâneo (1990), e articular conteúdo e realidade individual de forma a
privilegiar o saber crítico como finalidade.
A difícil tarefa da educação, nas pedagogias críticas, é dar conta deste objetivo
máximo de fomentar a consciência crítica, que também chamamos de autonomia ou
emancipação, e de promover essa capacidade individual de reflexão. É preciso observar que o
caráter desta educação é ativo dentro da sociedade, pois busca melhoria e mudança. Assim, a
proposta educacional é otimista em sua meta. Conforme nos afirma Garcia, trata-se da meta
educativa destas pedagogias:
Conforme nos afirma a autora, a tomada positiva destas pedagogias se apresenta como
meta otimista em relação ao sujeito, tanto individual quanto se tratando de sociedade. Para os
autores das pedagogias críticas, conduzir para a autonomia é a máxima expressão de uma
educação comprometida com a sociedade e com aqueles ideais de erradicação da
marginalidade e, assim, de produção de equidade social. É preciso destacar que Paulo Freire
70
se encontra em posição diferenciada em relação aos outros dois autores analisados, Saviani e
Libâneo. Sua preocupação estava descentralizada da demanda acadêmica. Assim, respeitando
as diferenças de contexto e enfoque não nos preocupamos em fazer nenhum tipo de crítica ou
demarcar tais diferenças de maneira incisiva. Todavia, para fins didáticos, suas distinções
serão brevemente apresentadas no subcapítulo que segue, ao destacarmos o fazer pedagógico
presente em cada autor.
contra a opressão. Para ele, o ajuste social promovido pela pedagogia tradicional é o principal
fator de fortalecimento das relações assimétricas na sociedade. Segundo o autor,
a integração ao seu contexto, resultante de estar não apenas nêle, mas com êle, e não
a simples adaptação, acomodação ou ajustamento, comportamento próprio da esfera
dos contatos, ou sintoma de sua desumanização, implica em que, tanto a visão de si
mesmo, como a do mundo, não podem absolutizar-se, fazendo-o sentir-se um ser
desgarrado e suspenso ou levando-o a julgar o seu mundo algo sôbre que apenas se
acha. A sua integração o enraíza. Faz dêle, na feliz expressão de Marcel, um ser
‗situado e datado‘. Daí que a massificação implique no desenraizamento do homem.
No seu ajustamento. (1983, p.42)
Esta tomada de posição, para a análise social, faz crer, para Freire, que a educação
deva perseguir seu ideal, livrando-se, primeiramente, da reprodução desta condição desigual.
É preciso, assim, descentralizar o papel do professor em prol de um aluno que seja respeitado
como ser pensante e participativo. Assim, sua conclusão nos sugere que as relações de
autoridade devam ser minimizadas na relação professor/aluno. Somente assim uma educação
crítica poderia se concretizar. Interessava-lhe ―uma pedagogia que elimina pela raiz as
15
Segundo a concepção marxista, o fenômeno da mais valia está associado à exploração da mão de obra
assalariada. Para Marx, trata-se por mais valia o lucro obtido pelo capitalista ao recolher o excedente da
produção do trabalhador.
72
relações autoritárias, onde não há ‗escola‘ nem ‗professor‘, mas círculos de cultura e um
coordenador cuja tarefa essencial é o diálogo‖ (1983, p.26). Os círculos de cultura16, citados
por Freire, dão conta de sua metodologia de efetivação do aprendizado, neste caso, na
educação de jovens e adultos. Se a relação de autoridade, nos termos de um modelo de
autoritarismo efetivado na pedagogia tradicional, entre professor e aluno é suprimida já não
faz sentido falar em uma aula centrada na exposição de conteúdos. Assim, o círculo de cultura
se mostra como alternativa para uma troca de conhecimentos. Segundo Weffort, no método de
ensino freireano seria possível encontrar certa maiêutica socrática,
pois como em Sócrates a conquista do saber se realiza através do exercício livre das
consciências. Contudo será preciso reconhecer que a maiêutica tem aqui uma
significação particular. Os participantes do diálogo no círculo de cultura não são
uma minoria de aristocratas dedicada à especulação, mas homens do povo. Homens
para os quais as palavras têm vida porque dizem respeito ao seu trabalho, à sua dor,
à sua fome. Daí que esta maiêutica para as massas comprometa desde o início o
educando, e também o educador, como homens concretos, e que não possa limitar-se
jamais ao estrito aprendizado de técnicas ou de noções abstratas. (1983, p. 07)
Podemos perceber que o educador se apresenta como aquele que deve educar. Ou seja,
aquele que repassa ao educando certos conhecimentos. Poderíamos aí questionar a validade da
afirmação freireana acerca da ruptura do modelo de autoridade entre professor e aluno, afinal
o educador também se efetiva como autoridade, na medida em que educa. Todavia, a proposta
de Freire quebra esta relação justamente por descaracterizar a função de autoridade, no
sentido rígido e negativo do termo, deste novo professor, a quem ele chama de educador. Já
não é mais seu dever dar luz aquele, outrora considerado, sem luz. Despejar conhecimento ao
ignorante e conduzir ao conhecimento seguro. Esta relação de reprodução do modelo
capitalista conduz à desigualdade e fortalece a relação de dominação. Para Freire, a relação
educador/educando deve ser de respeito mútuo, considerando a carga cultural de cada
individuo enquanto conhecimento legítimo e valorável. Assim o professor adquire papel de
mediador de conhecimento, valendo-se do diálogo como instrumento de sua função. Segundo
Freire, o diálogo
16
Segundo Dickmann e Dickmann os círculos de cultura citados por Freire podem ser caracterizados como
sendo uma nova nomenclatura para o que seria o novo espaço de ensino-aprendizagem. Para os autores, o termo
escola já não daria conta de nomear a proposta educacional freireana. Assim, esta troca se fez necessária, uma
vez que existia uma ―carga de ‗passividade‘ que o termo escola trazia dentro do modelo ‗bancário‘ ao qual
estava subordinado e do qual havia se tornado instrumento de opressão‖ (2008, p 88).
73
isso, só o diálogo comunica. E quando os dois polos do diálogo se ligam assim, com
amor, com esperança, com fé um no outro, se fazem críticos na busca de algo.
Instala-se, então, uma relação de simpatia entre ambos Só aí há comunicação. (1983,
107)
É preciso, de acordo com esta noção, fugir da lógica dominante; assim a educação se
efetiva como saída possível. O diálogo é a ferramenta de troca de conhecimento que garante
uma relação mais simétrica, logo, mais justa. A sala de aula cumpre a função social, neste
sentido, de espaço para a conscientização, uma vez que possibilita o aprendizado, que por sua
vez, é agente de transformação social. Esta tomada de posição é uma potencialidade humana
que precisa ser fomentada pela educação. Assim, ―conscientização não é privilégio de alguns,
mas é um fenômeno humano. O que se opõe, portanto, não é o caso da possibilidade ou não
dos seres humanos conscientizarem-se, mas da viabilidade disso na educação atual e/ou na
que queremos construir‖ (DICKMANN e DICKMANN, 2008, p.31).
êste educador sabe que sua tarefa contém implicações políticas, e sabe ademais que
essas implicações interessam ao povo e não às elites. Mas sabe também que seu
campo é a pedagogia e não a política, e que não pode, como educador, substituir o
político revolucionário interessado no conhecimento e na transformação das
estruturas. Se recusa a idéia tradicional da educação como ‗alavanca do progresso‘,
teria sentido contrapor-lhe a tese, igualmente ingênua, da educação como a
‗alavanca da revolução‘? Uma pedagogia da liberdade pode ajudar uma política
popular, pois a conscientização significa uma abertura à compreensão das estruturas
sociais como modos da dominação e da violência. Mas cabe aos políticos, não ao
educador, a tarefa de orientar esta tomada de consciência numa direção
especificamente política. (1983, p.15)
É desde esta perspectiva que Paulo Freire (1983) sustenta que as práticas educacionais
sejam desenvolvidas desde a escola e não ―de cima para baixo‖. A política não pode se valer
da escola como mecanismo de massificação com intuito de alienação, pelo contrário, teria
como objetivo a libertação nos termos de uma emancipação, de uma conscientização. Esta é a
principal batalha de uma pedagogia crítica, frear o processo de massificação alienante
promovendo a capacidade de reflexão.
objetos de alvenaria e narram de uma experiência de vida, da própria trajetória humana deste
sujeito embebecido pelo novo conhecimento. ―Porque unindo pedaços de palavras, aos poucos
vai unindo argila e orvalho, tristeza e pão, cambão e beija-flor, e acaba de unir a própria vida‖
(Ibid). A potência deste poema nos revela a potência da própria alfabetização, para Paulo
Freire. Seu ideal emancipatório sinalizava esta concretização da mudança de vida e de
condições deste sujeito real, corpóreo, cheio de anseios, necessidades, sonhos e vida. A
educação deixa de ser pensada em seu plano ideal, para o aluno dos sonhos, dotado de
competências culturais. Agora, a nova educação tem o compromisso com as massas e com
esse sujeito outrora excluído deste processo de humanização. É preciso dar voz a quem
sempre foi silenciado e escutar o que ele tem a dizer. O diálogo entre educador e educando é a
afirmação deste compromisso de escuta, de troca, de respeito e de conversa. Assim se constrói
o conhecimento.
A teoria da Escola nova foi o primeiro passo nesta nova concepção, que pretendia
mudar a noção de marginalidade que outrora havia sido atribuída àqueles que sem
competência e conhecimento não podiam participar da educação. Em suma, o que pretendia
esta nova pedagogia era a inclusão daqueles marginalizados e desmerecidos pelo sistema
educacional. Daquela parcela da sociedade que, na sua condição de pobreza, não tinha acesso
à escola, perpetuando as condições que favorecem a miséria e a dominação de classe. A
pedagogia tradicional operava segundo critérios que atribuíam à falta de habilidade e
predisposição (numa conduta essencialista) ao fenômeno da marginalidade17. Logo, estava
fora da escola toda aquela classe que, por essência, não seria capaz de acompanhar os
conteúdos escolares e, assim, aprofundar-se na cultura culta. O que advogava a Escola nova
era uma mudança deste ponto de vista inicial. O conhecimento é uma oferta que deve ser feita
com igualdade. Como elucida Saviani,
toma corpo, então, um amplo movimento de reforma cuja expressão mais típica
ficou conhecida sob o nome de ‗escolanovismo‘. Tal movimento tem como ponto de
partida a escola tradicional já implantada segundo as diretrizes consubstanciadas na
teoria da educação que ficou conhecida como pedagogia tradicional. A pedagogia
nova começa, pois, por efetuar a crítica da pedagogia tradicional, esboçando uma
nova maneira de interpretar a educação e ensaiando implantá-la, primeiro, através de
experiências restritas; depois, advogando sua generalização no âmbito dos sistemas
17
Segundo Saviani (1999) o fenômeno da marginalidade se apresenta como aquela segregação social que
distribui os indivíduos em duas polaridades: dominadores x dominados. Assim, a marginalidade seria a categoria
que engloba aqueles que não são detentores dos meios de produção; logo, dominados. No que tange as questões
referentes à educação, a marginalidade se apresenta naquelas pedagogias que não estão a serviço dos interesses
desta classe em específico, operando apenas de acordo com as necessidades da classe dominante.
77
escolares. (...) Segundo essa nova teoria, a marginalidade deixa de ser vista
predominantemente sob o ângulo da ignorância, isto é, o não domínio de
conhecimentos. O marginalizado já não é, propriamente, o ignorante mas o
rejeitado. Alguém está integrado não quando é ilustrado, mas quando se sente aceito
pelo grupo e, através dele, pela sociedade em seu conjunto. (1999, p.19)
se na polêmica avulta a questão da Escola Nova, isto não deve induzir a equívocos.
Este não é um livro contra a Escola Nova enquanto tal. É, antes, um livro contra a
pedagogia liberal burguesa. Por isso, enganam-se aqueles que imaginam que, por
efetuar a critica à Escola Nova, o autor desta obra estaria de algum modo
reabilitando a pedagogia burguesa. Ora, não se nega à Escola Nova o seu caráter
progressista em relação à Escola Tradicional. Aliás, isso está formalmente explícito
no terceiro texto. Entretanto, enquanto proposta burguesa, a Escola Nova articula em
torno dos interesses da burguesia os elementos progressistas que, obviamente, não
são intrinsecamente burgueses. É dessa forma que a burguesia trava a luta pela
hegemonia procurando subordinar aos seus interesses os interesses das demais
classes. (1999, p.08)
Uma concepção educacional nestes critérios precisa sofrer uma alteração em sua
estrutura organizacional. É correto afirmarmos que se colocando enquanto oposição ao
―velho‖ modelo de ensino a Escola nova teria interesse em promover outras relações em sala
de aula, para além do velho regime hierárquico. Ao invés de alunos confinados a professores
conhecedores das grandes áreas do conhecimento, internalizando a reprodução mimética por
meio do conhecimento embrutecido e engessado, o que se almejava era uma aprendizagem
espontânea e interessante (SAVIANI, 1999). Assim, tanto a postura do professor quanto o
ambiente da aprendizagem se fazem aspectos importantes para que se efetive o estímulo e,
posteriormente, o conhecimento de forma espontânea, fugindo ao velho autoritarismo que
outrora privilegiava o conhecimento enciclopédico. Conforme análise de Saviani foi
justamente este aspecto que impossibilitou uma expansão do modelo pedagógico proposto
pela Escola Nova. A reformulação do espaço escolar, para se mostrar atrativo e estimulador,
para abarcar as necessidades de uma educação para a experiência e experimentação, não se
efetiva, uma vez que se torna um grande gasto para os cofres públicos. Logo, essas
experiências pedagógicas acabaram por se conformar à pequenos grupos . Assim, ―a ‗Escola
Nova‘ organizou-se basicamente na forma de escolas experimentais ou como núcleos raros,
muito bem equipados e circunscritos a pequenos grupos de elite‖ (SAVIANI, 1999, p.21).
Ao fim o trabalho para as massas se restringiu, mais uma vez, a pequenos grupos, se
tornando elitizado. O professor que adota esta perspectiva encontra dificuldade em sua
prática. Conforme Libâneo,
A prática do professor em sala de aula, orientada por sua doutrina, deixa de ser
correspondente a sua filiação conceitual, porque este se encontra perdido e desorientado. A
79
uma pedagogia articulada com os interesses populares valorizará, pois, a escola; não
será indiferente ao que ocorre em seu interior; estará empenhada em que a escola
funcione bem; portanto, estará interessada em métodos de ensino eficazes. Tais
métodos se situarão para além dos métodos tradicionais e novos, superando por
incorporação as contribuições de uns e de outros. Portanto, serão métodos que
estimularão a atividade e iniciativa dos alunos sem abrir mão, porém, da iniciativa
do professor; favorecerão o diálogo dos alunos entre si e com o professor mas sem
deixar de valorizar o diálogo com a cultura acumulada historicamente; levarão em
conta os interesses dos alunos, os ritmos de aprendizagem e o desenvolvimento
psicológico mas sem perder de vista a sistematização lógica dos conhecimentos, sua
ordenação e gradação para efeitos do processo de transmissão-assimilação dos
conteúdos cognitivos. (SAVIANI, 1999, p.79)
É nítida aqui sua preocupação com os conteúdos e com aqueles saberes consolidados
pela sociedade. É neste ponto que se resguarda algo da pedagogia tradicional. Por outro lado,
entende a necessidade de incentivar a iniciativa dos alunos, o diálogo, os interesses, ritmos de
aprendizagem e etc. Aquele problema da marginalização, citado anteriormente, ganha
novamente o foco. A pedagogia da Escola Nova tinha um nobre ideal, mas foi incapaz de
colocá-lo em prática em sua totalidade. A educação crítica se mostra como alternativa viável,
tentando de fato sanar a questão da marginalidade. Um fator decisivo nesta questão se
concentra no fato da Escola Nova dar pouca importância aos conteúdos escolares. Segundo
Libâneo e Saviani, essa prática levou ao efeito referido anteriormente, uma educação incapaz
de cumprir seu objetivo de inclusão das massas.
leitura; estes deverão ser redigidos pelos próprios educandos com a orientação do
educador. (1990, p.33)
Para que não se crie equívocos gostaríamos de salientar que Paulo Freire não tinha
como preocupação inicial a educação escolar regular. Sua atividade concentrou-se na
alfabetização de jovens e adultos. A postura adotada por professores engajados em sua teoria
esteve, sempre, livre; uma vez que não se encontrava fixada mais do que em recomendações
de uma visão educacional. O próprio Libâneo nos alerta para este caráter ―não-formal‖ da
pedagogia freireana. Segundo o autor,
não é próprio da pedagogia libertadora falar em ensino escolar, já que sua marca é a
atuação "não-formal". Entretanto, professores e educadores engajados no ensino
escolar vêm adotando pressupostos dessa pedagogia. Assim, quando se fala na
educação em geral, diz-se que ela é uma atividade onde professores e alunos,
mediatizados pela realidade que apreendem e da qual extraem o conteúdo de
aprendizagem, atingem um nível de consciência dessa mesma realidade, a fim de
nela atuarem, num sentido de transformação social. Tanto a educação tradicional,
denominada "bancária" - que visa apenas depositar informações sobre o aluno -,
quanto a educação renovada – que pretenderia uma libertação psicológica individual
- são domesticadoras, pois em nada contribuem para desvelar a realidade social de
opressão. A educação libertadora, ao contrário, questiona concretamente a realidade
das relações do homem com a natureza e com os outros homens, visando a uma
transformação – daí ser uma educação crítica. (1990, p.33)
Libâneo apostam nesta educação preocupada com as massas, com a conscientização e com a
criatividade; porém, resguardam na figura do professor e nos conteúdos escolares as parcelas
importantes para este fim. O professor mediador de Freire exigia uma estrutura, quando
pretendida em nível escolar, para além das reais possibilidades da escola.
estimuladas. Logo, entende-se que liberdade é o ponto de partida e o objetivo. Parece estranho
pensar esta relação, mas é perfeitamente cabível dentro do pressuposto pedagógico que
analisamos. A liberdade do aluno precisa ser reconhecida pelo professor para que não se
regresse àquela educação bancária denunciada por Freire. Ao mesmo tempo é preciso
reconhecer que esta autonomia não é plena, tendo a educação papel fundamental neste
processo.
em Eclipse da razão, Horkheimer diferencia dois sentidos do termo razão (Vernunft): um que designa ―a
faculdade de classificação, inferência e dedução, não importando qual o conteúdo específico dessas ações: ou
seja, o funcionamento abstrato do mecanismo de pensamento‖ (ER, p. 13), a qual ele nomeia como razão
subjetiva. Essa forma racional coordena os meios em relação aos fins, os quais correspondem ao interesse de
autopreservação do indivíduo ou da comunidade na qual ele se insere. Não se trata, portanto, de determinar os
fins das ações, nem de questionar sua racionalidade, mas de direcioná-las para a realização de objetivos em
benefício do sujeito. (...) A razão objetiva, por outro lado, é entendida por Horkheimer como a dimensão capaz
de definir os fins das ações. Historicamente, essa idéia esteve no centro de uma concepção segundo a qual à
razão objetiva caberia a determinação de fins intimamente relacionados com uma totalidade. Tal concepção, diz
Horkheimer, ―afirmava a existência da razão não só como força da mente individual, mas também do mundo
objetivo: nas relações entre os seres humanos e entre classes sociais, nas instituições sociais, e na natureza e suas
manifestações‖ (ER, p. 14). Foi a partir desse conceito que a própria filosofia foi possível enquanto um sistema
que procurou organizar e hierarquizar seres, coisas e ações de acordo com a noção de uma totalidade‖ (2011a, p.
86
79) Se por um lado a razão subjetiva se apresenta como aquela nossa faculdade de
classificação e cálculo, a razão objetiva é aquela dimensão moral, capaz de estabelecer as
finalidades por meio de uma relação não utilitária com o meio. A supervalorização de apenas
uma destas facetas racionais é o problema apontado por Adorno e Horkheimer no que diz
respeito à impossibilidade emancipatória. A subjetivação da razão, efeito do ideal Iluminista e
de suas premissas condutoras, produziu efeitos sociais que acabaram por distanciar a
humanidade de sua pretensão de alcançar a autonomia e a melhora de sua própria condição no
mundo. Como vimos, a meta máxima do Iluminismo em dissolver os mitos e conduzir o
homem ao conhecimento seguro de uma razão que não permite falhas, acabou por se efetivar
como substrato mitológico, na medida em que elencou, também, uma nova entidade de
adoração cega. O saber científico se eleva como único detentor da verdade e passa a fomentar
a postura social de passividade e acomodação intelectual. Além do mais, a postura inaugurada
por esta nova maneira de relacionar-se com mundo, a ciência experimental, acaba por
ultrapassar os limites de sua atividade técnica, transformando-se em parâmetro das próprias
relações humanas. O modelo de interação Homem-Natureza da ciência moderna se consolida
como padrão comportamental em todos os âmbitos sociais. A dominação velada, na forma de
coisificação, é exemplo desta afirmação. Assim, a racionalidade instrumental se conecta
intimamente com o fenômeno da barbárie e da violência das massas, enquanto causa concreta
de nossa acomodação reflexiva e, portanto, potencializadora da violência primitiva. Conforme
Petry,
a barbárie é um tema central nos escritos de Adorno sobre a educação, pois ela foi o
auge de uma racionalidade incapaz de prestar atenção em si mesma. Tal afirmativa
decorre de uma crítica que ele e Horkheimer fazem ao conceito de racionalidade, do
modo como se desenvolveu ao longo do processo que constituiu a civilização. A
crítica de Adorno e Horkheimer à racionalidade se coloca em contraposição ao ideal
iluminista de Kant, pois questiona a potencialidade da razão em possibilitar a
autonomia dos sujeitos. É no caráter duplo do conceito de razão que os
frankfurtianos irão detectar uma dialética que se apresenta na tensão entre oposições
como: esclarecimento e mito, progresso e regressão, cultura e natureza ou
civilização e barbárie. (2011b, p. 36)
Tais oposições são encaradas como aquelas tensões que movimentam ambos os
conceitos entre seus limites de encontro e de repulsão. O erro do movimento das luzes teria
sido, segundo Adorno e Horkheimer (1985), o de desconsiderar a importância destes
antagonismos na própria potencialidade conceitual. O esclarecimento que previa para sua
concretização a morte do saber mitológico, por exemplo, não considerou que com esta perda
87
mataria também uma parcela muito importante de sua própria identidade. A razão objetiva
deixada de lado em prol deste conhecimento seguro assegurava, outrora, as relações morais e
as reflexões filosóficas acerca do mundo. A nova forma de relacionar-se não está pautada em
uma ética universal, como acreditava ser possível Kant, mas antes, pauta-se em critérios de
utilidade regionalizados. Conforme sugere Tomazetti (2006, p. 06),
A autora alerta para que não se tome erroneamente a ideia de que - com a crítica à
modernidade e à razão subjetiva - os autores da Dialética do Esclarecimento propunham a
volta para um momento anterior àquele propulsor do modelo científico, de busca pelo
conhecimento. Ambos os autores compreendem os benefícios oriundos do saber científico e
não pretendem um ―retrocesso‖. Sua crítica é direcionada para o lado negativo desta
racionalidade, que se revela em sua diluição em outros aspectos da vida cotidiana. Já sabemos
que o ideal do movimento da Ilustração se mostrou inviável dentro da lógica em que fora
operado, dado que a razão técnica18 se mostra incapaz de servir ao ideal de autonomia. No
âmbito educacional, as premissas conceituais da modernidade acabam por servir apenas para a
manutenção do próprio jogo racional. Assim, a educação, não somente é incapaz de resistir ao
enfraquecimento reflexivo, como serve, justamente, de reforço a esta incapacidade.
18
Segundo Horkheimer (2002), a razão técnica esta ligada com aquela faceta subjetiva de nossa racionalidade.
Em outras palavras, a razão técnica se apresenta como sendo uma expressão da racionalidade humana que
privilegia a operação e o cálculo em detrimento de outras competências, morais, por exemplo, que devem
auxiliar em nossa tomada de decisão.
88
suporte a sua análise do presente. Assim, sua preocupação se volta ao fenômeno da barbárie,
enquanto faceta da falha do objetivo moderno. A brutalidade das relações humanas, para
Adorno, deveria ser uma preocupação urgente da educação contemporânea, para evitar que
Auschwitz se repita. Sua teoria educativa se volta a este problema, destacando os fatores
psicológicos que, de certa forma, motivam o comportamento bárbaro; ao mesmo tempo o
autor problematiza o modelo cultural no qual a formação dos sujeitos do século XX está
pautada. Veremos agora sua teorização acerca deste fenômeno, para, em seguida, nos
debruçarmos sobre o conceito de emancipação presente em sua teoria.
Como já indicado, a percepção inicial que sustenta a teoria dos filósofos frankfurtianos
está pauta na contradição latente entre o projeto da modernidade e a realidade contemporânea
do século XX. Essa afirmação é embasada pela própria experiência vivenciada. Segundo os
filósofos, vivemos em uma sociedade onde ainda se pratica a violência bárbara, a crueldade, e
89
que por isso não faz jus a seus avanços no que se refere ao campo científico e as novas
tecnologias. O próprio conceito de barbárie estabelecido por Adorno nos revela, no excerto
abaixo, sua preocupação com tal contradição. Segundo o filósofo,
entendo por barbárie algo muito simples, ou seja, que, estando na civilização do
mais alto desenvolvimento tecnológico, as pessoas se encontrem atrasadas de um
modo particularmente disforme em relação a sua própria civilização – e não apenas
por não terem em sua arrasadora maioria experimentado a formação nos termos
correspondentes ao conceito de civilização, mas também por se encontrarem
tomadas por agressividade primitiva, um ódio primitivo ou, na terminologia culta,
um impulso de destruição, que contribui para aumentar ainda mais o perigo de que
toda essa civilização venha a explodir, aliás uma tendência imanente que a
caracteriza. (ADORNO, 1995, p.155)
A explicação dada pelo autor sobre o que chama por barbárie aponta diretamente para
a contradição observada na sua sociedade atual. A ideia de que somos uma comunidade
humana e que estamos em constante evolução não parece viável quando facilmente podemos
perceber que a violência irrefletida ainda faz parte do nosso cotidiano. Nesse sentido, não
somente seria possível afirmar que o ideal de emancipação do Iluminismo não se concretizou,
mas, também, que a pretensão de progresso não se realiza em todos os setores. Somos seres
sociais, nos unimos em grupos na busca pela sobrevivência e pela manutenção da vida; somos
capazes de aprimorar novas técnicas para que cada vez mais possamos usufruir de tempo livre
ou dedicá-lo para outras atividades. Cunhamos o conceito de progresso e nos convencemos de
que estamos andando em sua esteira, sempre avante. Afastamo-nos de nossa natureza mais
primitiva por acreditarmos que assim seguimos rumo ao desenvolvimento. Porém, não nos
demos conta das inúmeras consequências atreladas a estes ideais. A problematização da teoria
crítica ia além da perspectiva marxista, em especial, na medida em que elencou uma nova
base ao problema da dominação. A questão de Adorno e de Horkheimer ultrapassava a tese
que culpabiliza o sistema econômico pelas mazelas sociais e calcava aquela esperança
marxista numa sociedade socialista. Pucci nos elucida acerca da problemática que motivou a
pesquisa frankfurtiana. Segundo o autor (1999, p. 45),
A razão emancipatória foi a base encontrada para sustentar a tese de uma sociedade
estruturalmente doente, cada vez mais voltada para a instrumentalização em suas próprias
relações pessoais. ―Se a formação cultural eleva o espírito humano para transcender as suas
limitações, a coisificação seria o movimento que o diminui, absorvendo-lhe a moeda de troca
da mercadoria, que acaba degradando as suas qualidades‖ (TREVISAN, 2011, p. 1190). É
assim, que o fenômeno da coisificação ―se impõe de fora para dentro e molda o indivíduo,
inclusive as suas faculdades psíquicas e sensoriais, limitando a sua compreensão do existente‖
(Ibid.). A dimensão psicológica da racionalidade instrumental interessa às análises de Adorno
e Horkheimer, influenciando as futuras contribuições de Adorno ao tema da educação. A
repressão social, a razão subjetiva alienadora e a massificação cultural são alguns dos
principais elementos que configuram a teoria adorniana e encaminham para sua análise do
conceito de emancipação. Aprofundando-se nestas questões, os filósofos se valem dos estudos
freudianos em sua busca pelos motivadores psicológicos da violência social que nos afasta do
projeto moderno para a humanidade. Mais especificamente, o que se apresenta na teoria
adorniana é a análise de Freud acerca da cultura. Esta visa destacar o sentimento comum
presente nos indivíduos em sociedade e como o fenômeno da cultura se relaciona a este.
Segundo Freud (1856-1939), uma espécie de mal estar parece acometer a humanidade. Tal
sentimento, para o autor, se relaciona com nossa base civilizatória e encontra sua expressão na
própria cultura. Para Freud (2010, p. 87),
condição como diferentes da natureza em geral. O projeto do Iluminismo era, antes de tudo,
um grande projeto civilizatório. A ideia de que estamos numa engrenagem natural de
progresso parece ser a grande certeza desde o século XVIII. A educação formal é uma
ferramenta cultural interligada a esta narrativa, que cumpre o duplo objetivo de formar para o
social e de conduzir ao progresso pessoal.
19
Thomas Hobbes (1588-1679) formulou sua teoria sobre o contrato social como forma de legitimar o Estado e
o poder do soberano. Ao tratar de um estado de natureza – momento anterior da criação do Estado – Hobbes não
pretende uma explicação sobre a vida natural do homem em termos históricos, mas sim afirmar a necessidade
humana de organizar-se em grupos para a preservação da vida.
92
Assim, o sentimento destacado por Freud faz parte de nosso cotidiano. Esse mal estar
está interligado com nossa cultura, ao próprio processo civilizatório e, de modo geral, a toda a
violência interna que este processo pressupõe. Segundo a leitura de Adorno dos textos
freudianos essa angústia coletiva se intensifica em nossa estrutura social atual - uma
sociedade de instrumentalização racional. Lembremos que nossa racionalidade é calcada –
fundante e reprodutora – na própria forma como interagimos com o mundo e como nele nos
estabelecemos. Quando tratamos de racionalidade não apenas expressamos uma forma de
organização mental de cada indivíduo em separado, mas, também, da própria constituição
humana. Assim, quando relacionamos racionalidade com formação do sujeito, estamos, antes,
estabelecendo relação entre operação racional e formação de identidade. Para entendermos
melhor esta relação nos valeremos da explicação que Hannah Arendt (1906-1975) propôs em
sua obra A condição humana (2007). Segundo a filósofa, por meio do trabalho o homem se
relaciona com a natureza e garante, assim, sua constituição individual. Nossa condição de
imortalidade seria a chave para o tipo de interação que estabelecemos com o meio. Segundo a
autora (2007, p. 27-28),
inserida num cosmo onde tudo era imortal, a mortalidade tornou-se o emblema da
existência humana. Os homens são <<os mortais>>, as únicas coisas mortais que
existem porque, ao contrário dos animais, não existem apenas como membros de
uma espécie cuja vida imortal é garantida pela procriação. A mortalidade dos
homens reside no fato de que a vida individual, com uma história vital identificável
desde o nascimento até a morte, advém da vida biológica. Essa vida individual
difere de todas as outras coisas pelo curso retilíneo do seu movimento que, por
assim dizer, intercepta o movimento circular da vida biológica. É isto a mortalidade:
mover-se ao longo de uma linha reta num universo em que tudo que se move o faz
num sentido cíclico. A tarefa e a grandeza potencial dos mortais têm a ver com sua
capacidade de produzir coisas – obras e feitos e palavras – que mereceriam pertencer
e, pelo menos até certo ponto, pertencem à eternidade, de sorte que, através delas, os
mortais possam encontrar o seu lugar num cosmo onde tudo é imortal exceto eles
próprios.
A condição de ser individual garante ao homem sua posição no cosmo, como ser
mortal. Logo, não nos relacionamos com o mundo natural de maneira coletiva, visando
apenas a posteridade enquanto grupo. Nossa interação com o meio se dá no âmbito da
singularidade, nos compreendemos como indivíduos e nossa finitude em critérios de vida e
morte. Neste ponto o que nos interessa é destacar de que forma esta condição humana – de ser
mortal – nos imprime identidade e nos movimenta no mundo. A leitura de Arendt (2007)
acerca da teoria marxista sobre o trabalho elucida a própria constituição do homem como ser
voltado, essencialmente, para o trabalho/labor. Estes dois termos não são sinônimos em sua
teoria, mas expressam nossa ligação mais elementar com o meio. O trabalho enquanto labor
93
representa o esforço que fazemos pela manutenção e garantia de nossa existência. Quando
colhemos um fruto ou pescamos um peixe, por exemplo, labutamos. Já o trabalho representa
a transformação que operamos na natureza, justamente movidos pelo sentimento de
mortalidade que tanto nos aflige. A transformação de recursos naturais em utensílios é o
melhor exemplo deste processo. Se é verdade que somos seres que nos constituímos e
formamos nossa identidade por meio de nossa relação com o mundo, então fica mais fácil
entender a crítica de Adorno e seu estudo das relações humanas.
Adorno mostra que no lugar de uma verdadeira formação cultural, ideal vivido pelos
iluministas, está a semiformação, estendida a várias camadas sociais com o intuito
de promover a ―cultura‖. Tal tendência é a negação de uma verdadeira formação
cultural, que se realmente vivenciada pelos indivíduos, poderia torná-los livres e
capazes de se autodeterminar. Isso porque a formação cultural, nas palavras de
Adorno, ―nada mais é que a cultura tomada pelo lado de sua apropriação subjetiva‖,
ela consiste no modo como a consciência apreende os bens culturais. A
semiformação se apresenta, à primeira vista, como uma quase-formação, ou seja,
como precedente daquela que seria uma formação cultural integral ou completa.
Entretanto, ela constitui justamente sua antítese, e não a ausência de cultura. Adorno
diz: ―no clima da semiformação, os conteúdos objetivos, coisificados e com caráter
de mercadoria da formação cultural perduram à custa de seu conteúdo de verdade e
de suas relações vivas com o sujeito vivo, o qual, de certo modo, corresponde à sua
definição‖. Ou seja, a semiformação, embora se relacione com os conteúdos que
fazem parte da formação cultural, trata-os de modo inadequado, impedindo sua
apropriação por parte dos indivíduos. (2011b, p. 43)
20
A experiência estética se configura para Adorno como sendo aquela formação por meio da cultura genuína,
não massificada, capaz de transportar o indivíduo para uma reflexão e experiência de mundo para além da
racionalidade instrumental. Trata-se de uma interação objetiva, não conceitual, com o mundo que permite uma
formação mais completa do indivíduo.
96
para o consumidor não há nada mais a classificar que não tenha sido antecipado no
esquematismo da produção. A arte sem sonho destinada ao povo realiza aquele
idealismo sonhador que ia longe demais para o idealismo crítico. Tudo vem da
consciência, em Malebranche e Berkeley da consciência de Deus; na arte para as
massas, da consciência terrena das equipes de produção. Não somente dos tipos das
canções de sucesso, os astros, as novelas ressurgem ciclicamente como invariantes
fixos, mas o conteúdo específico do espetáculo é ele próprio derivado deles e só
varia na aparência. Os detalhes tornam-se fungíveis. A breve sequência de
intervalos, fácil de memorizar, como mostrou a canção de sucesso; o fracasso
temporário do herói, que ele sabe suportar como good sport que é; a boa palmada
que a namorada recebe da mão forte do astro; sua rude reserva em face da herdeira
mimada são, como todos os detalhes, clichês prontos para serem empregados
arbitrariamente aqui e ali e completamente definidos pela finalidade que os cabe no
esquema. Confirmá-lo, compondo-o, eis aí sua razão de ser. Desde o começo do
filme já se sabe como ele termina, quem é recompensado, e, ao escutar a música
ligeira, o ouvido treinado é perfeitamente capaz, desde os primeiros compassos, de
adivinhar o desenvolvimento do tema e sentir-se feliz quando ele tem lugar como
previsto. O número médio de palavras da short story é algo que não se pode mexer.
Até mesmo as gags, efeitos e piadas são calculados, assim como o quadro em que se
inserem. Sua produção é administrada por especialistas, e sua pequena diversidade
permite reparti-las facilmente no escritório. A indústria cultural desenvolveu-se com
o predomínio que o efeito, a performance tangível e o detalhe técnico alcançaram
sobre a obra, que era outrora o veículo da Idéia e com essa foi liquidada.
Pensemos que todos os dias precisamos nos descolocar de casa para o trabalho. Para
este deslocamento entregamos quatro horas diárias, duas de ida e duas de volta. São ao final
do dia duas conduções que precisamos tomar para chegar ao trabalho e retornar ao conforto
de nosso lar. A história bem poderia ser real, pois neste meu exemplo o ônibus é sempre
lotado. Nossa protagonista, que aqui chamaremos de Joana, precisa ficar de pé, igual a
várias outras pessoas que também necessitam deste transporte. A passagem é cara e dona
Joana não sente que o valor faz jus ao serviço oferecido. Joana se sente desrespeitada
sempre que precisa se submeter a esta degradante forma de chegar a seu trabalho. Todos os
dias o motorista corre muito, pois precisa cumprir seu horário que, por sinal, está sempre
atrasado. A cada freada brusca, frequente já que o trânsito de um grande centro é bastante
intenso, dona Joana é esmagada por pessoas desavisadas. Joana mesmo já caiu algumas
vezes. O ônibus é velho, o motorista estressado, a passagem é cara. Mas Joana precisa
chegar ao trabalho e por isso se cala e se reprime. Até que um dia o ônibus quebra, deixando
todos no meio de uma via movimentada. O ônibus para, todos irão se atrasar para o
trabalho. O sentimento que aflora em dona Joana é de uma raiva quase descontrolada. Ela
sabia que isso um dia iria acontecer, pois a manutenção do veículo claramente deixava a
desejar. Mas ela se cala. Eis que uma voz ao fundo começa a reclamar com o motorista.
Outras vozes se somam a esta e aos poucos todos os passageiros estão gritando e expondo
seu descontentamento. Dona Joana vai se enchendo desse sentimento e resolve colocar para
fora sua indignação. Mas o motorista não está preocupado com nenhum daqueles
passageiros. Ele desce sem dar explicações a ninguém e mantém as portas fechadas. A
revolta gerada entre os passageiros é tão grande que um deles, em certo momento, tomado
pela raiva, quebra um vidro, com o intuito de sair do ônibus. Imediatamente, um a um, os
passageiros sentem a necessitada de externar sua revolta. Dona Joana não é diferente. Ela se
sente desrespeitada todos os dias naquele espaço, por aquele motorista. Assim, ela também
passa a depredar o ônibus, como forma de concentrar sua raiva, a tanto reprimida.
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O outro, nesta relação, não é um outro de mim mesmo. Passa a ser um outro
dissociado e, portanto, encarado como menos humano. Aquele a ser dominado, mesmo numa
relação formalizada do neoliberalismo, já que é sempre mais natureza e deve ser medido
conforme se faz útil nesta relação. Os fundamentos deste comportamento não são racionais,
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como se poderia esperar. Justamente recaem sobre nossa própria animalidade desde nossa
segunda natureza, revelando, mais uma vez, aquele ciclo vicioso do qual o Iluminismo não
conseguiu escapar. A contínua reprodução e cópia do igual, do mesmo, repete este processo
falho. Na indústria cultural o espaço para o novo é suprimido em prol da boa e velha
manutenção do status quo. Para os filósofos da Dialética do Esclarecimento (1985, p. 126),
essa mesmice regula também as relações com o que passou. O que é novo na fase da
cultura de massas em comparação com a fase do liberalismo avançado é a exclusão
do novo. A máquina gira sem sair do lugar. Ao mesmo tempo que já determina o
consumo, ela descarta o que ainda não foi experimentado porque é um risco. É com
desconfiança que os cineastas consideram todo manuscrito que não se baseie, para
tranquilidade sua, em um best-seller.
está em jogo é sempre a satisfação pessoal. A regulação da vida humana perdeu seu valor
moral, retornando ao estágio violento que deveria ter sido freado pelo processo civilizatório.
Essa percepção nos é propícia para pensarmos no conceito que guia esta pesquisa. A
problematização do conceito de emancipação destacou, até aqui, sua impossibilidade nos
termos em que fora cunhado pelo Iluminismo. Vimos também que as pedagogias críticas se
voltam a um objetivo educacional pautado na esperança de uma efetiva transformação social.
Nesse sentido, o conceito de emancipação se constituiu, nas pedagogias críticas, como uma
dupla potencialidade. É, primeiro, uma necessária suposição no processo educacional e,
segundo, uma meta a ser atingida. Emancipar é o mesmo que conscientizar para a práxis
transformadora. Todavia, essa práxis social está viciada, segundo Adorno, perdida em sua
própria contradição. A mudança não tem espaço nesta sociedade marcada pela mentalidade
industrial e pela cultura massificada. Logo, poderíamos nos indagar sobre os rumos que a
educação deve seguir neste cenário onde as condições objetivas da sociedade estão
engessadas pela semiformação promovida pela indústria cultural e sua mentalidade
instrumental. Afinal, para que se volta o objetivo educacional na contemporaneidade?
119). Sua crítica à massificação instrumental resulta em uma saída estética como caminho de
uma educação voltada para valores éticos. Afinal, ―o princípio fundante da racionalidade
instrumental, a saber, da autoconservação (sese conservare) é abandonado pela arte, pois ela
não se insere de forma direta no plano das necessidades humanas‖ (PETRY, 2014, p. 400).
Enquanto resguarda sua relação mitológica com o mundo a arte preserva aquela relação de
contemplação que não entra na lógica rígida da cientificidade. Conforme Petry (2014, p. 399),
na Teoria Estética, Adorno procura mostrar como a arte, ao mesmo tempo em que se
origina do mundo empírico, dele se separa no momento mesmo em que se constitui,
negando sua própria origem. Assim, a arte se mostra superior à realidade quanto
maior for a negatividade com que a apresenta. Como afirma Adorno, ―as obras de
arte destacam-se do mundo empírico e suscitam um outro com uma essência própria,
oposto ao primeiro como se ele fosse igualmente uma realidade‖ (ADORNO, 2008b,
p. 12). As obras de arte, portanto, são capazes de negar a realidade objetiva, mas não
de forma integral, pois tal recusa em participar do mundo empírico se manifestará
em sua forma. Quanto mais separada da sociedade, mais esta se fará presente na
obra por meio de sua estrutura.
Essa possibilidade, sempre parcial, estética de uma dialética negativa visa resguardar e
aflorar aqueles traços da razão objetiva que foram escrachados pela modernidade. Se é
impossível sair da lógica da razão subjetiva para apontar caminhos seguros de uma melhoria
real e totalizante da sociedade, pelo menos é possível trazer à tona algumas reflexões dessa
nossa tendência comportamental. Assim, segundo Adorno, estaríamos resistindo, mesmo que
em pequena medida, ao modelo vigente. O primeiro passo para uma educação preocupada
com o objetivo de que jamais Auschwitz volte a se repetir, precisa tornar, para si, consciente,
em termos freudianos, os motivadores internos que permitiram tal violência. Segundo Adorno
(1995, p. 121),
É preciso, pois, que a educação se comprometa com esta atividade. A única saída
possível para evitar a contínua degradação humana, em nível de sua sociabilidade, é a tomada
de consciência desta própria degradação. Primeiramente, antes de tudo, é necessário que se
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reconheça a contradição nos mesmos moldes que para a psicanálise o paciente precisa
reconhecer sua condição; é preciso que a sociedade seja capaz de elaborar seu próprio
diagnóstico. Somente a partir daí é que, talvez, possamos frear as drásticas consequências da
super valorização da razão instrumental. A educação que resgata sua dimensão estética está a
serviço desta finalidade. Ela visa fugir da lógica operante como forma de dar subsídios a uma
formação cultural diferente, com outros elementos, daquela ofertada pela indústria cultural.
Conforme Pagni e Silva (2007, p. 263-264),
Observa-se que existe um papel social e formativo atribuído à arte, desde a análise de
Adorno. Uma educação estética não deve ser confundida com uma educação artística,
necessariamente. A educação estética defendida por Adorno é aquela que resgata a experiência
livre e subjetiva fornecida pela obra de arte como modelo de formação. Trata-se de uma
educação que não se permite engolir pela lógica da cientificidade, onde tudo precisa ser
catalogado e enquadrado em categorias muito bem definidas. A estética, neste caso, se efetiva
como o espaço do novo e da experimentação, justamente podados na indústria cultural. Assim
o conceito de emancipação em Adorno ganha uma nova roupagem, na medida em que se
reconcilia com dimensões objetivas abandonadas pelo movimento do esclarecimento. Se
configura como uma emancipação em seu devir, enquanto potencialidade. Não importa,
necessariamente, se está ou não passível de uma concretude plena. O que importa é o processo
de sua busca, enquanto resulta em pequenas fugas da mentalidade mecanicista. O que Adorno
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entende enquanto pretensão educativa não é outra coisa se não a humanização de nossas
relações pessoais.
com a educação contra a barbárie no fundo não pretendo nada além de que o último
adolescente do campo se envergonhe quando, por exemplo, agride um colega com
rudeza ou se comporta de um modo brutal com uma moça; quero que por meio do
sistema educacional as pessoas comecem a ser inteiramente tomadas pela aversão à
violência física. (ADORNO, 1995, p.165)
Assim se configura a postura realista, por assim dizer, de uma teoria educacional nos
moldes de Adorno. Emancipar é o mesmo que ser capaz de refletir e de tensionar as verdades
prontas. Todavia, é válido lembrar que o simples ato de reflexão não garante a educação
humana perseguida pelo filósofo.
a reflexão pode servir tanto para à dominação cega como ao seu oposto. As reflexões
precisam portanto, ser transparentes em sua finalidade humana. [...] De resto,
acredito também que um ensino que se realiza em formas humanas de maneira
alguma ultima o fortalecimento do instinto de competição. Quando muito é possível
educar desta maneira esportistas, mas não pessoas desbarbarizadas. (idem, p.161)
Percebe-se, então, que existe, para Adorno, uma clara valorização da vida e da
dignidade humana como fim último. É por isso que não basta exercer qualquer reflexão de
maneira descuidada. A educação, em seu papel de formação, deve voltar-se para a reflexão
desde esta finalidade, a saber: a de considerar o outro em sua humanidade. A rígida educação
competitiva foge a esta meta. Assim, a dimensão estética da educação assegura que ―a
experiência com a obra de arte autêntica é capaz de modificar a percepção que o indivíduo
tem da realidade. Essa seria, incontestavelmente, uma qualidade essencial do processo
formativo voltado para a emancipação dos sujeitos em uma sociedade marcada pela
reificação‖ (PETRY, 2014, p. 398).
Não obstante é preciso destacar que a educação precisa resguardar seu papel
civilizatório, de ser um mecanismo social que modela os sujeitos para que se encaixem na
sociedade. Se parece uma brutalidade considerar tal finalidade à educação, devemos lembrar
que sem a internalização das regras sociais a vivência em grupo se faria insustentável. Logo, a
educação precisa encontrar a medida entre sua dupla missão. De um lado, precisa adaptar os
indivíduos. De outro, precisa ser capaz de permitir a constituição de suas individualidades.
Para Adorno (1995, p. 143),
106
A via escapatória apresentada por Adorno, portanto, não é mais do que uma tomada de
posição de resistência e de crítica ao instituído, com a diferença, em relação às pedagogias
críticas, de não pautar o objetivo máximo da educação naquela síntese de uma nova
sociedade. A proposta de Adorno tem sua limitação marcada em sua postura negativa. Sua
convicção de que nossa estrutura racional propiciou o comportamento nazista motivou sua
teoria educacional. Trata-se de uma postura teórica que visa uma prática concreta na
realidade, uma resistência pontual para um problema específico. Era preciso frear os
mecanismos que permitiram tal comportamento bárbaro contra outros seres humanos. Assim,
a emancipação se apresenta como a própria caminhada humana nesta finalidade, para uma
autonomia possível frente ao jogo da contradição a que estamos submersos. A diferença entre
Adorno e os autores das pedagogias críticas não se encerra na dicotomia positivo e negativo,
otimista e pessimista. A função da educação guarda uma sútil diferenciação que não deve
escapar à nossa análise. O conceito de emancipação, a meta da conscientização, passa antes
por uma crítica e renasce revisitada e autoconsciente. Como intentamos demonstrar, a
proposta educacional adorniana leva em consideração o conceito de emancipação, formulando
uma crítica de sua estrutura e denunciando sua própria contradição latente. Assim, não é
menor e nem deve ser despercebida uma importante questão apresentada. A frieza humana, e
todos aqueles nossos traços negativos, não pode negada pela educação e nem mesmo ser tida
em critérios de superação e erradicação. Pelo contrário, ela precisa ser evidenciada e
humanizada. Precisa ser compreendida e elaborada para que não se encerre em violência e
repressão. É assim que na volta para si, em uma autorreflexão crítica, o sujeito da educação
será capaz de uma postura emancipada e esclarecida. Adorno não teorizou acerca de
metodologias específicas do fazer pedagógico. Sua postura negativa não pretende tais
diretrizes. A crítica de Adorno visava atacar algo mais enraizado que a própria educação,
buscou atingir nossa estrutura social mais elementar: nossa racionalidade.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como mostramos no início deste trabalho nossa pesquisa intentou oferecer elementos
para uma problematização que tomou como protagonistas duas correntes teóricas que muito
contribuem ao tema, a saber: as pedagogias críticas e a teoria crítica. De um lado, o conceito
de emancipação tido desde as pedagogias que exerceram sua crítica ao modelo tradicional de
ensino no contexto da educação brasileira, fornecendo ferramentas para uma nova
interpretação do fazer pedagógico, da relação professor/aluno e dos próprios rumos de uma
educação comprometida com as massas. De outro, uma perspectiva sustentada em uma dura
crítica ao conceito educacional em voga desde a modernidade, a saber, de um projeto de uma
razão emancipatória. Perspectiva esta apresentada na teoria crítica de Adorno e de
Horkheimer. Portanto, neste diálogo problematizador esteve presente, primeiro, um
reconhecimento teórico das premissas e conclusões em relação ao conceito desde as
pedagogias críticas. Segundo, uma postura de problematização conceitual desde uma crítica
já estabelecida.
capacidade humana de exercer novas e melhores relações sociais e, assim, criar uma
sociedade mais justa. Nestes termos, a educação comprometida com este ideal é aquela capaz
de colocar-se aos passos de tal compromisso, auxiliando na tarefa de uma práxis social e de
um efetivo compromisso com a classe revolucionária.
erradicação da barbárie e da cegueira coletiva. Este passo não será capaz de construir um
novo mundo, com uma nova sociedade. Para o autor não é possível a elevação a este terceiro
passo. Todavia, uma postura de resistência ao movimento uniformizador das massas e da
razão já se encontra no seio daquela postura emancipatória. O caminho da educação é
audacioso, mas realista, já que não acredita numa revolução das massas.
Diferente das conclusões das pedagogias críticas Adorno nos dá elementos para uma
tomada negativa do conceito analisado. Logo, a superação das contradições sociais não
somente não parece possível, como, ainda, não deve ser a pauta máxima de um conceito
revisitado em suas limitações. Uma postura de superação apenas privilegia a mesma violência
empregada por aquela razão subjetiva, que restringiu a conceitos rígidos toda a nossa
experiência com o mundo. Nestes termos, a sociedade de justiça e igualdade pretendida por
aquelas pedagogias críticas estaria pautada numa negação e pretensa erradicação daquelas
características humanas que tomamos por defeitos. A frieza humana, por exemplo, é um alvo
a ser abatido nesta missão de uma sociedade melhor. Se tomarmos a problematização do
conceito de emancipação desde a proposta teórica desta pesquisa, concluiremos que a
principal diferença entre as duas teorias analisadas se efetiva nesta característica apontada.
Assim, o objetivo desta pesquisa se concretiza, uma vez que foi possível estabelecer uma
linha de argumentação que nos deu suporte para um tensionamento entre nosso entendimento
local acerca do objetivo de emancipar e uma crítica potencializadora deste conceito e sua
efetivação.
REFERÊNCIAS
ADORNO, T. Educação e emancipação. Trad. Wolfgang Leo Maar. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1995.
_______. Minima Moralia. Trad. Luiz Eduardo Bicca. São Paulo: Atica, 1992.
ARENDT. H. A condição humana. Trad. Roberto Raposo. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2007.
FREUD. S. O mal-estar na cultura. Trad. Renato Zwick. Porto Alegre: L&PM, 2010.
KANT. I. Sobre a pedagogia. Trad. Francisco Cock Fontanella. Piracicaba: Editora Unimep,
1996.
_______. Resposta à pergunta: Que é o Iluminismo? In: A Paz Perpétua e Outros
Opúsculos. Lisboa: Edições 70, 2009.
PETRY, F. B. A relação dialética entre arte e sociedade em Theodor W. Adorno. In: Veritas.
Porto Alegre: PUC, v.59, n. 02, p. 388-406, mai./ago. 2014.
_______. Além de uma crítica à razão instrumental. 2011. Tese (Doutorado no Programa
de Pós-Graduação em Filosofia) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis,
2011a.
PUCCI. B. Teoria crítica e educação. In. Teoria crítica e educação: a questão da formação
cultural na Escola de Frankfurt. Org. Bruno Pucci. Petrópolis: Vozes, 1994. p. 11-58.