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Artigo Sayd Miranda A Teoria Da Cegueira Deliberada

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A TEORIA DA CEGUEIRA DELIBERADA APLICADA AOS CRIMES DE1

LAVAGEM DE CAPITAIS: Uma análise sobre a compatibilidade da jurisprudência


norte americana nos crimes de lavagem de dinheiro no direito brasileiro.

DELIBERATED BLINDNESS THEORY APPLIED TO CAPITAL LAUNDERING


CRIMES: An analysis of the compatibility of North American jurisprudence in money
laundering atual crimes under Brazilian law.

Sayd Miranda Alexandre2


Henry Guilherme Ferreira Andrade3

Resumo: O presente trabalho visa analisar a possibilidade da aplicação da Willfull


Blindness Doctrine, (Teoria da Cegueira Deliberada), proveniente da jurisprudência
da Suprema Corte dos Estados Unidos da América, no ordenamento brasileiro, em
especial aos crimes financeiros, como lavagem de dinheiro, corrupção ativa e
passiva. Após analisar os conceitos desses crimes e suas variantes históricas
proceder-se-á uma análise crítica à Teoria da Cegueira Deliberada, a partir de um
apanhado teórico, demonstrando a compatibilidade da sua aplicação no direito
brasileiro, visto que já foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no
histórico julgamento dos crimes do mensalão.

Palavras-Chave: Teoria da Cegueira Deliberada. Crimes Financeiros. Supremo


Tribunal Federal- STF.

Abstract: The present work aims to analyze the possibility of applying the Willfull
blindness doctrine, (Theory of deliberate blindness), derived from the jurisprudence
of the Supreme Court of the United States of America, in the current Brazilian order,
in particular to financial crimes, such as money laundering, corruption active and
passive. After analyzing the concepts of these crimes and their variants, a critical
analysis will be made of the Theory of Deliberate Blindness. Seeking a theoretical
overview, demonstrated the compatibility of the application in Brazilian law, as well
as already recognized by the Supreme Federal Court - STF in the judgment of the
crimes of the monthly allowance.

Key-words: Theory of deliberate blindness. financial crimes. Supreme Federal Court


- STF..

1
Artigo apresentado ao Curso de Bacharelado em Direito
2
Graduando em Direito pela Universidade do Sul do Maranhão – UNISULMA. E-mail:
3
Professor orientador. Especialista em Direito Civil e Empresarial, FDDJ. E-mail: henryguilherme.f@gmail.com.
1. INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como objetivo a análise da Teoria da Cegueira


Deliberada, jurisprudência norte americana que procura estender o dolo eventual na
busca da penalização dos agentes que financiam e viabilizam de forma não habitual
os crimes de “lavagem” de dinheiro.
Tal estudo foi realizado sob o aspecto jurídico penal, observando a Lei nº
9.613 de 1998, mais especificamente no que concerne sua aplicação ao Processo nº
2005.81.00.145860-0 que versa sobre o assalto ao Banco Central de Fortaleza/CE,
bem como à Ação Penal nº 470, o “Mensalão”, onde se verificou a aplicação da
Teoria da Cegueira Deliberada.
O tema foi escolhido em decorrência da reincidência da utilização da teoria
em comento por parte dos tribunais brasileiros, que a utilizaram a fim de preencher
lacunas existentes na legislação pátria no que se refere ao dolo eventual.
Realizamos, primeiramente, a análise da historicidade da Teoria da Cegueira
Deliberada, explicando sua gênese, proveniente do direito anglo-saxão, e sua
aplicação aos crimes de “lavagem de dinheiro” cometidos na Inglaterra, vez que sua
incidência ocorria em virtude da quantidade de ilícitos desta natureza cometidos por
comerciantes, empresários, políticos e mafiosos que facilitavam entrada de
mercadorias ilegais.
Verificamos, de outro modo, que, após adormecer como teoria, e tendo os
Estados Unidos da América herdado o Comow Lawn, e percebendo a crescente
influencia da máfia, a Suprema Corte dos EUA decidiu aplicar a Willful Blindness
Doctrine em busca de inibir o financiamento da criminalidade e julgar casos que
envolviam “lavagem” de dinheiro referente a jogos e apostas.
Após a compreensão conceitual e histórica da Teoria da Cegueira Deliberada,
e suas ramificações no direito Inglês e nos EUA, foi verificada a sua aplicação dentro
do direito brasileiro, mais especificamente relacionado à Lei 9.613/98.
Ainda dentro do ordenamento Brasileiro, observou-se, por meio de estudo
doutrinário e jurisprudencial, as suas ramificações e fases, que são realizadas pelo
crime para dar legalidade aos bens e valores de origem ilícita, a saber: ocultação,
dissimulação e integração.
Após toda explicação sobre origem, historicidade, aplicação dentro do
ordenamento jurídico brasileiro, foi realizada explanação sobre: dolo e suas
espécies; o elemento “culpa”, suas definições e espécies; o conceito de culpa
consciente e culpa inconsciente; a diferença entre dolo eventual e culpa consciente;
e as teorias intelectivas e volitivas sobre dolo eventual e culpa consciente.
Por fim, foi realizada a análise do caso do furto ao Banco Central na cidade
de Fortaleza/CE, sendo verificados os fundamentos da sentença de 1º grau para a
utilização da Teoria da Cegueira Deliberada, o conflito entre a sentença da 11ª Vara
da Justiça Federal da 5ª Região e o 5º Acórdão da 2ª Turma do Tribunal Regional
Federal da 5ª Região, bem como a Teoria da Cegueira Deliberada e o liame com o
Código Penal Brasileiro.
Para tanto foi utilizado metodologia baseada em pesquisa bibliográfica a fim
de analisar a posição doutrinária dentro do direito brasileiro, bem como o presente
análise das jurisprudências dos casos do “Mensalão”, AP nº 470, e as sentenças
proferidas no processo nº 2005. 81.00.145860-0 que tratam sobre o furto ao Banco
central de Fortaleza/CE.

2. WILLFUL BLINDNESS DOCTRINE (TEORIA DA CEGUEIRA


DELIBERADA): CONCEITO E HISTÓRICO

2.1 As origens inglesas da Teoria da Cegueira

A Willful Blindness Doctrine (Teoria da Cegueira Deliberada) tem ganhado


notoriedade no direto brasileiro após os julgamentos pelo Supremo Tribunal Federal
– STF da Ação Penal nº 470 conhecida como „‟mensalão‟‟, que foi aplicada a fim de
penalizar os envolvidos indiretamente com os crimes de lavagem de dinheiro, uma
vez que pune aquele que se coloca em posição de ignorância, mas permanece
recebendo, auxiliando ou financiando a suspeita do crime.
A análise feita no julgado da AP nº 470, envolvia diversos crimes, tais como,
caixa dois, financiamento ilícito de campanhas e, ainda, a compra de votos realizada
pelo Poder Executivo. Na época, o Brasil era presidido por Luís Inácio Lula da Silva,
que chegou a ter seu Ministro de Casa Civil, José Dirceu, investigado e preso pelos
atos ilícitos cometidos, em votação que ocorreu no STF, onde foi aplicada a Teoria
da Cegueira Deliberada a fim de punir os financiadores do ilícito.
A teoria da cegueira deliberada que trata de uma forma de imputação
subjetiva criada pelo direito anglo saxão para preencher lacuna jurídica da
interpretação restritiva da teoria do dolo nas situações em que o sujeito de
um delito alega desconhecimento de fatos por desídia em investigá-los ou
por criação de estratégia de nunca adquirir consciência deles (SYDOW,
2017).

A Teoria da Cegueira Deliberada busca a ampliação do dolo indireto na busca


de punir aquele que se coloca em situação de ignorância a fim de auferir lucros
provenientes de crimes ou objetos que entende como ilícito, buscando uma maneira
de penalizar os financiadores ou facilitadores do crime, em que o agente
desconfiava ou deveria saber da finalidade ilícita.
Cabe destacar que, a discussão doutrinaria sobre a Willful Blindness Doctrine
(Teoria da Cegueira Deliberada) remonta do século XIX, nas cortes Inglesas, tendo
sido citada pela primeira vez no julgamento Regina vs Sleep;

Sleep era um proprietário de uma ferragem que embarcou num navio com
um barril que continha parafusos de cobre, estando alguns deles marcados
com um sinal em forma “flecha” para indicar que eram propriedade do
Estado. Por este motivo, Sleep foi acusado, em primeira instância, da
prática do crime de peculato6, cujo “conhecimento” de que os bens eram
propriedade do Estado era elemento do tipo normativo. Após Sleep ter
alegado, em sede de recurso, que não sabia da circunstância de que tais
sinais serviam para indicar que os parafusos eram pertences do Estado, a
condenação foi revogada com o fundamento de que: o júri não considerou
que o agente soubesse que os bens estavam marcados como propriedade
do Estado, nem que se abstivera intencionalmente de adquirir tal
conhecimento (EDWARDS,1889).

Percebemos então, que, na Inglaterra, pela primeira vez se teve a conclusão


de que, ainda que de forma indireta, aqueles que se colocavam em posição inerte
deliberadamente, teriam o mesmo tratamento punitivo que aquele que cometia o ato
com dolo direto. Tal visão tinha por objetivo punir os contribuintes do crime, que,
mesmo indiretamente, facilitavam a perpetuação da lavagem de dinheiro.
Todavia, ciente, de que no direito Inglês se praticava o common lawn, que
analisava os casos através de julgados e não de atos legislativos ou executivos, no
caso em comento, no entanto, quem julgou foi a sociedade, vez que o júri não
reconheceu os crimes de Sleep, tendo o inocentado, até por ausência de tipificação
do crime e por não possuir outros julgados do tipo. Essa foi reconhecida como uma
das primeiras tentativas da aplicação da teoria, que, mesmo sem sucesso, abriu
precedentes para discussões futuras.
Portanto se houvesse outros julgados no direito inglês, ou crimes
equiparados, poderia Sleep ter sido condenado baseado no Willful Blindness Doctrin
(Teoria da Cegueira Deliberada), uma vez que incidiu nas premissas iniciais da
teoria, como o desconhecimento voluntário sobre o ilícito e a anuência com o
resultado.
A rediscussão acerca da doutrina só voltou a ser debatida com afinco
quatorze anos depois, no caso Bosley vs Davies. Em relatos, conta-se que Basley,
uma hoteleira, foi acusada de permitir a realização de jogos ilegais nas instalações
do hotel. A acusada argumentou durante todo o processo que ela não tinha
conhecimento sobre a atividade ilegal que ocorria no hotel, e que não lhe poderia ser
imputado o delito do qual era acusada.
Basley alegou, ainda, que não havia provas suficientes para sua condenação,
no entanto, o tribunal se pronunciou no sentido de que a acusada possuía o pleno
conhecimento sobre o que lá ocorria, pois via e ouvia tudo o que se passava no
hotel, e acabou por imputar a conivência da proprietária e dos funcionários com o
ocorrido.
Verifica-se nos exemplos apresentados, que o foco dos tribunais foi na
responsabilização e identificação dos crimes abordados, sobretudo na tentativa de
se imputar a responsabilidade (dolo indireto) aos acusados, Desse modo, como
alegado em juízo, a proprietária perambulava pelos corredores do hotel e era
presente em sua administração, além de ter conhecimento acerca dos jogos ilegais
que aconteciam dentro do estabelecimento, não podendo, dessa forma, se escusar
dos fatos.
Percebe-se, então, que a Willful Blindness Doctrine (Teoria da Cegueira
Deliberada), gerou debates e precedentes sobre a responsabilização daquele que
participava do ato indiretamente, financiando ou cooperando com o crime de algum
modo, muito embora no final do século XIX o debate ainda não se encontrava
consolidado, dependendo de uma evolução conceitual que viria ocorrer
posteriormente, em outro país, conforme veremos a seguir.

2.2 . A teoria da cegueira deliberada nos Estados Unidos da América


Em que pese a Willful Blindness Doctrine tenha nascido na Inglaterra, foi
somente nos Estados Unidos da América que o debate se consolidou de fato, em
1887, no julgamento do caso People vs. Brown.
No caso em comento, os denunciados foram acusados de terem obtido
depoimento escrito autenticado por autoridade incompetente, onde deveria ser
protocolado em tribunal distrital, e não de condado, segue in verbis da decisão

“Parece haver uma noção predominante de que a ninguém é exigível mais


conhecimento do que aquele que escolhe obter; que lhes é permitido fechar
os olhos sobre todas as fontes de informação, e então desculparem a sua
ignorância ao dizer que nada viram… se a pessoa tem os meios de verificar
o verdadeiro estado dos factos pelo exercício de uma normal diligência,
então é obrigada a fazê-lo Cfr. (BOND VS EVANS, 1888).

Dessa forma, a Suprema Corte dos Estados Unidos elaborou o conceito da


Teoria da Cegueira Deliberada como conhecemos hoje, uma vez que reconheceu o
ato da negligência na sentença referente ao caso People vs. Brown.
A condenação, entretanto, foi afastada por revogação da corte, pois
reconheceu a falta de legislação que definia o dolo indireto, bem como não
encontrou nenhum julgado que punia investigados pelo ato de omissão, algo
semelhante ao que havia ocorrido na Inglaterra.
Após outros diversos casos, a teoria passou a ser mencionada ainda mais na
doutrina, mesmo assim nunca foi explorada de maneira significativa. Até o final da
década de 1960, a teoria foi discutida de maneira superficial, aparecendo de forma
mais dedicada apenas depois de aplicações em julgamentos de crimes financeiros,
lavagem de dinheiro e atos de corrupção envolvendo agentes públicos.
Ante a breve análise conceitual e histórica acerca da Teoria da Cegueira
Deliberada, faz-se necessário a compreensão quanto à forma que o direito brasileiro
trata aqueles que cometem crimes financeiros ou “lavagem” de dinheiro.

3. LEI Nº 9.613 DE 1998: PREVENÇÃO À LAVAGEM DE DINHEIRO

A lei 9.613 de 1998 dispõe sobre os crimes de „‟lavagem‟‟ de dinheiro


conceituando como sendo os crimes antecedentes, que são todo e qualquer ilícito
que gere bens e valores antes do crime tipificado na lei em comento.
Os crimes descritos da lei 9.613 de 98 abrangem todas as fases do delito,
demonstrando as práticas de mascaramento e integração, uma vez que o agente
que comete o ilícito faz o branqueamento do lucro a fim de torná-lo lícito, e, em
muito dos casos, mascarando os crimes anteriores sob o véu de lojas,
departamentos, igrejas, etc. que servem para escamotear a atividade ilícita, seja ela
tráfico de drogas, crimes financeiros ou de agentes públicos.
Os órgãos públicos de investigação, como a Polícia Federal e o Conselho de
Controle de Atividades Financeiras – COAF devem possuir os meios e prerrogativas
de investigação, tendo em vista que o ilícito se trata de crime de alta complexidade.
Tais práticas devem ter contribuição máxima destes órgãos, usando
prerrogativas como a delação premiada, a quebra de sigilo telefônico e bancário,
bem como garantindo a investigação de forma livre e sem interferência de outros
poderes.
A lavagem de dinheiro é método pelo qual um indivíduo ou uma
organização criminosa processa os ganhos financeiros obtidos com
atividades ilegais, buscando trazer a sua aparência para obtidos
licitamente”. Em comento com a citação do autor é válido destacar que, as
diversas organizações criminosas usam deste crime para poder ocultar
outros anteriores, utilizando prerrogativas de empresas de pequeno, médio
e grande porte para ocultar a atividade ilícita. Segundo (MENDRONI 2015,
p. 20).

Em consonância à citação do autor, é válido destacar que, as diversas


organizações criminosas usam deste crime para poder ocultar outros anteriores,
utilizando prerrogativas de empresas de pequeno, médio e grande porte para ocultar
a atividade ilícita. Tal método tem como objetivo dificultar as investigações por parte
das Policias Civil, Federal e também da COAF, dando transparência a um dinheiro
obtido de forma ilegal.
Nos casos de desvios de verbas investigados pela Polícia Federal na
Operação “Lava Jato”, por exemplo, políticos fechavam acordos com empreiteiras
para obterem vantagens depois passavam o dinheiro para os doleiros efetuarem a
chamada “lavagem”, dando retorno com aparência de licita.
A título de exemplo, podemos destacar o caso de Jordan Belfort, que ficou
famoso ao ser representado no filme o Lobo de Wall Street, onde Belfort usa de
seus conhecimentos financeiros para vender ações de empresas de médio porte ou
de empresas que não existiam, e lavava seu dinheiro em sua empresa de ações
conhecida pelo nome de Stratton Oakmont, sendo investigado e preso pela Policia
Federal dos Estados Unidos.
3.1 Fases da “lavagem” de dinheiro

É valido ressaltar que nos crimes descritos pela Lei 9.613 de 1998,
encontraremos três fases, a saber mascaramento, ocultação e integração, como
veremos a seguir.

3.1.1 Dissimulação

Dissimulação, também conhecida como mascaramento, é a primeira fase do


crime de lavagem de dinheiro, que é quando o agente realiza transações financeiras
a fim de ocultar os rastros do crime anterior, inviabiliza a localização pelas
autoridades do dinheiro ilícito, procura desassociar o dinheiro da origem, passando
por uma serie de transações e procedimentos a fim de realizar o branqueamento.
Afirma Mendroni (2015, p. 182) que

Uma vez que o dinheiro foi colocado, faz-se necessário efetuar diversas
operações complexas, tanto nacionais como internacionalmente, visando
dificultar o seu rastreamento contábil. objetivo do criminoso nessa etapa
cortar a cadeia de evidências, ante a possibilidade de eventuais
investigações sobre a origem do dinheiro. (MENDRONI, 2015, p. 182)

Logo, o dinheiro é transferido para várias contas em outros países em


transações realizadas e/ou em nome de terceiros, falsas identidades e até mesmo
de forma anônima. Escolhe-se de forma proposital os países conhecidos como
paraísos fiscais, pois possuem leis de sigilo bancário, e são pouco rígidos com
transações.
Em muitos dos casos o dinheiro também poderá ser lavado usando empresas
fantasmas, empreiteiras, ONGs por meio de doações, com o objetivo de confundir as
autoridades quanto à origem do dinheiro.
As operações da Polícia Federal, conhecidas no grande agrupamento como
„‟Lava-Jato‟‟, aplicaram bem o reconhecimento dessa primeira fase durante as
investigações, uma vez que, durante a investigação, constatou que ex-agentes
públicos, como deputados e senadores, usavam desse atributo, enviando dinheiro
ao Panamá, Suíça e outros países, cujo as leis de sigilo bancário são mais rígidas e
dificultam o reconhecimento de seus clientes.
3.1.2 Ocultação

É nesta fase que os criminosos procuram se desfazer do dinheiro ilícito, uma


vez que transferem os lucros a diferentes lugares, podendo ser por inteiro ou de
forma fracionada, a ideia é misturar o dinheiro ilícito com o lícito. Essa fase é
conhecida como a mais frágil devido à facilidade de identificação das transações
geralmente realizada pelo COAF.
A ocultação possui uma fragilidade maior, pois são necessárias diversas
contas de terceiros, pessoas físicas ou jurídicas para realizar a divisão do dinheiro
ilícito, visto que ocorrem diversas transações no mesmo dia para poder dar certa
ocultação.
Tal fato pode ser verificado no recente “Caso Queiróz”, por exemplo, que
envolve o inquérito que investiga o Senador Flávio Bolsonaro, uma vez que,
Queiróz, seu chefe de gabinete, realizava diversos depósitos de pouco valor e
transferia para diversas contas, a fim de burlar o sistema de investigação. Frise-se
que o caso ainda está sob investigação.

3.1.3 Integração

A integração é a ultima fase e a mais complexa, e pode ser identificada nas


fases posteriores das investigações, que é quando o dinheiro adquirido de forma
ilícita já possui características integrais de dinheiro lícito, podendo ser usado
livremente para compra de bens móveis ou imóveis, nesta etapa são usadas
empresas, terceiros.
Podemos verificar esta aplicação no caso que envolve o ex-presidente Luís
Inácio Lula da Silva, visto que, durante as investigações, a Polícia Federal e o
Ministério Público abriram denúncia sobre o tríplex do Guarujá, demonstrando que
Lula usou do nome de terceiros para a compra do imóvel, bem como para reforma
de seu apartamento.

3.1.4 O elemento subjetivo na lei de lavagem de dinheiro

Comete crime de lavagem de dinheiro o agente que oculta ou dissimula a


natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens,
direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente de infração penal (art. 1º,
caput, da Lei 9.613/98).

O princípio da legalidade veio insculpido no inc. XXXIX do art. 5° da


Constituição Federal [...] É o princípio da legalidade, sem dúvida alguma,
um dos mais importantes do Direito Lucas Nacur Almeida Ricardo De Jure |
ISSN 1809-8487 | v. 17 | n. 30 | jan.-jun. 2018 | p. 233-259 255 Penal.
Conforme se extrai do art. 1° do Código Penal, bem como do inc. XXXIX do
art. 5° da Constituição Federal, não se fala na existência de crime se não
houver uma lei definindo-o como tal. A lei é a única fonte de Direito Penal
quando se quer proibir ou impor condutas sob a ameaça de sanção. Tudo o
que não for expressamente proibido é lícito em Direito Penal. Por essa
razão, von Liszt diz que o „Código Penal a Carta Magna do delinquente‟.
(GRECO, 2016, p. 1).

Tipificado no art. 18 do Código Penal, classifica-se como doloso quando o


agente quis produzir o resultado. Nesta figura apresenta-se também o dolo eventual,
que é quando o agente assumiu o risco de produzir o resultado. Aduz, ainda, que é
culposo quando o agente dá causa ao resultado agindo com negligência,
imprudência ou imperícia, sendo passível de punição somente quando tipificado em
lei.
O crime de lavagem de dinheiro só é punível na modalidade dolosa ou de
dolo eventual, não assumindo modalidade culposa, ou seja, segundo o art. 1º, só se
pune aquele que quis praticar o ato. Nesse sentido, são as lições de Bottini e Badaró

Ao contrário de outros países – como a Espanha, a Bélgica, a Irlanda, a


Suécia e o Chile – o tipo penal não existe aqui na forma culposa –
consciente ou inconsciente. Apenas o comportamento doloso é objeto de
repressão, caracterizado como aquele qual o agente tem ciência da
existência dos elementos típicos e vontade de agir naquele sentido. Logo,
não basta a constatação objetiva da ocultação ou dissimulação. É
necessário demonstrar que o agente conhecia a procedência criminosa dos
bens e agiu com consciência e vontade de encobri-los
(BARDARO,1995,196).

Desta feita, em crimes dessa natureza, quando o agente é o financiador do


ilícito, fica difícil a punição, pois faz parecer que não queria ou desconhecia o
resultado, prejudicando as investigações, ou quando o agente se coloca em situação
de „‟in rcia‟‟, desconfiando que o ato de destino seja ilícito, mas, visando o lucro,
procura não conhecer o resultado.
Já no que diz a respeito aos crimes de lavagem de dinheiro com a
modalidade de dolo eventual, a doutrina se divide, tendo os que concordam com a
tese, de que aquele que assume o risco pela ação praticada deve ser punido, e
aqueles que não aceitam a tese.
Sergio Fernando Moro defende em seu livro “Crime de Lavagem de Dinheiro”
a imputação do dolo eventual em crimes desta tipificação, pois serve para ampliar o
rol de punições e aplicar a Teoria da Cegueira Deliberada, impondo penas às
condutas praticadas de maneira inerte, sem se preocupar com o resultado final ou
com a comunicação do dinheiro com o crime.
Segundo o ex-ministro, a partir do momento em que o agente se coloca em
posição de praticar o crime de lavagem de dinheiro, seria possível a aplicação do
dolo eventual para a conduta, pois o poder judiciário precisa encontrar meios de
combater os chamados crimes de colarinho branco.

[…] a conduta daquele que diz a si mesmo „que aguente‟, „que se


incomode‟, „se acontecer, azar‟, „não me importo‟. [...] aqui não há uma
aceitação do resultado como tal, e sim sua aceitação como possibilidade,
como probabilidade. (ZAFFARONI; PIERANGELI, 2001, p. 498).

Vamos ao exemplo do empresário que negocia de forma indireta, e aceita em


sua sociedade político já acusado em esquema de corrupção e lavagem de dinheiro,
e procura desconhecer os valores que seu sócio aplicou na empresa. Neste caso, o
autor, sem ter participação direta com o esquema, não poderia ser punido pela lei de
lavagem de dinheiro.
Agora imaginemos que seja aplicada a Teoria do Avestruz (outro nome dado
à Teoria da Cegueira Deliberada). Neste caso, o empresário por ter aceitado
financiamento e sociedade com o político de histórico corrupto, que desconfia que
seu sócio utilizará a empresa para lavagem de dinheiro e, mesmo assim, permanece
em sociedade, ignorando a origem do dinheiro, incorre em crime, pois contribui para
o branqueamento.
Após a compreensão dos aspectos gerais acerca da Lei 9.613/98, que dispõe
acerca da prevenção à lavagem de dinheiro, passaremos agora ao estudo sobre a
correlação entre a referida lei e a Teoria da Cegueira Deliberada.

4. O LIÂME ENTRE A TEORIA DA CEGUEIRA DELIBERADA E A LEI Nº


9.613.98.
A Teoria da Cegueira Deliberada atualmente se encontra em seu momento
mais delicado e em evidência desde que o Supremo Tribunal Federal, realizou sua
aplicação nos casos da Ação Penal nº 470, o “Mensalão”, bem como às sentenças
referentes ao Assalto ao Banco Central de Fortaleza, fomentando o debate
doutrinário acerca do liame entre a teoria e a legislação que tipifica o crime de
“lavagem” de dinheiro.

Portanto, quando o sujeito atua, desconhecendo ou ignorando que os bens


sobre os quais recai sua conduta têm sua origem numa infração penal
antecedente ou, ao menos, admite por erro que não procedem da comissão
de uma infração, estaria atuando em erro de tipo [...] o erro sobre elementos
constitutivos do tipo legal de crime exclui o dolo, já que este requer o
conhecimento dos elementos do tipo objetivo. Se o erro sobre os elementos
do tipo for vencível, a infração penal será castigada na modalidade culposa,
desde que haja uma figura delitiva tipificando a correspondente conduta
culposa, o que não acontece no crime de lavagem de capitais no
ordenamento pátrio, que admite sua punição exclusivamente a título de
dolo. (LIMA, 2017, p. 503).

O crime de lavagem de dinheiro já é recorrente, e se trata de ação ilícita que


se leva em consideração crimes anteriores, vez que poderá ser de qualquer tipo,
como descrita na legislação, sendo que o objetivo do agente é unicamente a
obtenção de lucro através da transformação dos bens provenientes dos crimes, a fim
de dar destinação, seja para venda ou para uso.
A lei 9.613 de 1998 não prevê um rol taxativo, deixando que os magistrados e
Suprema Corte tenham que fazer um adendo sobre o que levou ao crime de
branqueamento do dinheiro.
É exatamente após ocorrerem tais crimes, e os meios de investigação
identificarem uma das três fases que comentamos, que se pode aplicar a Teoria da
Cegueira Deliberada, bastante discutida hoje em virtude do Mensalão e da
“ peração Lava-Jato”. Ambas as investigações identificaram diversos deputados,
partidos e empresas realizando crimes financeiros, lavagem de dinheiro e outros
ilícitos.
É daí que surge a Doutrina da Cegueira Deliberada, para punir os
financiadores destes tipos de crime. O Código Penal Brasileiro adota duas teorias
acerca do dolo, sendo elas a teoria da vontade e a do assentimento. Define, desse
modo, como já mencionado, em seu artigo 18 que crime doloso é quando o agente
tem a intenção de obter o resultado (dolo direto), ou quando assume o risco e acaba
em produzir a ação (dolo indireto).
Para a Teoria da Cegueira Deliberada, a aplicação ocorrerá no dolo indireto,
conhecido também como dolo eventual, pois os agentes procuram evitar a origem
ilícita do financiamento ou financiam agentes obtendo contrapartidas e não se
preocupam em conhecer a origem do lucro, o que denota uma conduta lesiva,
mesmo que omissiva, por parte deste.
No que diz a respeito aos crimes culposos, a teoria não poderá ser aplicada,
uma vez que tem na sua origem o escopo de punir aqueles que assumiram o risco
de cometer as infrações, pois o agente finge não enxergar a origem abrupta dos
lucros e bens, com a intenção de obter vantagem, tanto que para a teoria ser
aplicada deverá ser reconhecida a probabilidade de conhecimento de que os valores
eram resultantes de crimes.
Após análise do dolo indireto e direto e aplicabilidade da teoria aos crimes
culposos, é necessário verificar a aplicação em território brasileiro, além de verificar
o caso do assalto ao Banco Central na cidade de Fortaleza/CE em 2005, onde o
Tribunal Regional da 5ª Região utilizou da Willful Blindness Doctrine para condenar
terceiros.

4.1 Aplicações da Teoria da Cegueira Deliberada ao direito brasileiro.

A Teoria da Cegueira Deliberada ficou em evidência em dois casos no direito


brasileiro, que trouxeram e configuraram o estudo da Willful Blindness Doctrine, a
saber: o escândalo de corrupção conhecido como “Mensalão” e o “Assalto ao Banco
Central de Fortaleza/CE”.

4.1.1 O assalto ao banco central em fortaleza/CE

O assalto ao Banco Central ocorreu no ano de 2005, na cidade de Fortaleza,


no Estado do Ceará. Segundo a Polícia Federal foram roubados por volta de R$
164.755.150,00 (cento e sessenta e quatro milhões setecentos e cinquenta e cinco
mil cento e cinquenta reais) em cerca de 3.295.103 notas de cinquenta reais, o que
correspondia a cerca de U$ 71.000.000 (setenta e um milhões de dólares), através
de um túnel, que ligava uma casa ao cofre.
A Teoria da Cegueira Deliberada, então, foi aplicada na sentença de 1º grau
que condenou alguns membros da quadrilha que participaram do assalto. No caso
em comento, far-se-á uma análise da referida sentença, bem como do recurso de
apelação realizado junto ao Tribunal Regional Federal da 5º região – TRF5.
Em denúncia realizada pelo Ministério Público Federal, o crime ocorreu entre
os dias cinco e seis de Agosto de 2005, que resultou na subtração de milhões de
reais que deveriam ser descartados por se tratar de notas velhas, fato este que só
foi descoberto no dia 08 de agosto de 2005, com a abertura dos cofres.
Alguns membros da quadrilha se dirigiram a uma revendedora de carros,
conhecida como Brilhe Car, comprando 11 veículos em dinheiro proveniente do
furto. Na sentença de primeiro grau o juiz colaciona as características do crime
organizado, e comenta sobre o combate mundial frente a essas quadrilhas,
caracterizou, também, na sentença, o crime de lavagem de dinheiro.
Entendeu o juízo que a concessionária de veículos cometeu crime previsto na
lei de lavagem de dinheiro, mais precisamente o que está disposto no art.1º,
Parágrafo 2º, inciso I. Neste sentido, restou caracterizado o crime através do
elemento subjetivo, conforme cita Sergio Fernando Moro;

O art. 1.º, caput, da Lei 9.613/1998 exige o dolo genérico, ou seja,


consciência e vontade de realização dos elementos objetivos do tipo penal,
não exigindo nenhum elemento subjetivo adicional ou intencionalidade
específica, bastando o querer do resultado típico. Para a lei brasileira, o
crime é doloso "quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de
produzi-lo" (art. 18, I, do CP). No dolo eventual, o sujeito ativo não conhece
com certeza a existência dos elementos requeridos pelo tipo objetivo,
duvidando da sua existência e, apesar disto, age, aceitando a possibilidade
de sua existência. Em exposição ainda mais clara: "O dolo eventual,
conceituado em termos correntes, é a conduta daquele que diz a si mesmo
'que agüente', 'que se incomode', 'se acontecer, azar', 'não me importo'.
Observe-se que aqui não há uma aceitação do resultado como tal, e sim
sua aceitação como possibilidade, como probabilidade (MORO,2007,PG14).

Segundo o autor, para configuração do crime dentro da Lei 9.613 de 1998,


deverá ser levada em consideração a consciência de vontade para o cometimento
do crime, não se podendo extinguir nenhum elemento subjetivo ao tipo penal.
Logo, verifica-se, dentro do caso em comento, que a loja de veículos possuía
conhecimento dentro da área territorial do crime ocorrido no Banco Central, e, ao
vender os veículos em dinheiro vivo a membros da quadrilha, deveria ter avisado
aos órgãos Policiais para realização da averiguação da compra.
Levando em consideração este fato, o juízo, ao proferir sentença, e levando
em consideração, também, a lacuna dentro da lei de lavagem de dinheiro, achou
possibilidade que justificaria a aplicação do dolo eventual nos delitos relacionados
ao artigo 1º, paragrafo 2º, inciso I da referida legislação.
Assim, o argumento já apresentado estatui que, dentro da localidade territorial
e da repercussão do crime, os agentes envolvidos tinham desconfiança sobre o ato
que poderia estar ocorrendo na concessionária de veículos e deveriam ter acionado
os órgãos policiais.
A sentença proferida no caso em comento ainda argumentou sobre a
discussão doutrinária sobre a admissão ou não do dolo eventual dentro do crime de
lavagem de dinheiro, fez ainda referência ao direito comparado onde, diante da
ausência de restrições, a penalidade ficaria a cargo da jurisprudência e das
discussões doutrinárias, aplicou-se, assim, a Teoria da Cegueira Deliberada aos
proprietários da revenda de veículos.
Para o juízo competente, a cegueira deliberada, teoria oriunda da
jurisprudência dos Estados Unidos da América, corroborou a aplicação da sentença
aos donos da concessionária, uma vez que entendeu que os donos sabiam que os
valores eram de origem ilícita, e, mesmo possuindo essas informações, realizaram a
venda dos veículos.
Concluiu o juízo de 1º grau, neste aspecto:

Portanto, muito embora não haja previsão legal expressa para o dolo
eventual no crime do art. 1.º, caput, da Lei 9.613/1998 (como não há em
geral para qualquer outro crime no modelo brasileiro), há a possibilidade de
admiti-lo diante da previsão geral do art. 18, I, do CP e de sua pertinência e
relevância para a eficácia da lei de lavagem (TRF5,2009, on-line).

4.1.2 Análise do acórdão proferido pelo tribunal regional da 5ª região (AP nº


2005.81.00.014586-0).

A análise do acórdão se figurará procurando apontamentos na sentença de 1º


instância que condenou a Brilha Car, usando como instrumento a Teoria da
Cegueira Deliberada aplicada ao art. 1º, paragrafo 2º, inciso I da Lei 9.613 de 1998.
Na sentença proferida em 1º instância, os donos da revendedora foram
condenados a 03 anos de reclusão em regime aberto pelo crime previsto no artigo
1º, paragrafo 2º, inciso I da lei 9.613 de 1998, onde o juízo aplicou a Teoria da
Cegueira Deliberada por entender que os donos da revendedora realizaram a venda
mesmo sabendo que os valores poderiam ser provenientes do furto ao banco
central.
O referido juízo entendeu ainda que, por motivo de restrição da legislação o
uso do dolo eventual aplicado à lavagem de dinheiro, lei essa que só admite o dolo
direto, e como contraria a aplicação, e por haver vácuo legislativo, a decisão ficaria a
cargo de decisões e jurisprudência.
No recurso apresentado ao Tribunal Regional Federal da quinta região, os
proprietários da concessionária de seminovos alegaram que eram incapazes de
saber que o dinheiro envolvido na compra dos veículos era proveniente do roubo ao
Banco Central, e, portanto, não cometeram o ato com dolo, agindo totalmente de
boa-fé, alegando, ainda, que o Ministério Público não apresentou provas
contundentes sobre sua participação.
Ao interpor a apelação os empresários proprietários da Brilhar Car
questionaram a responsabilização criminal imputada a eles pelo Ministério Público,
alegaram ausência de provas que comprovassem o envolvimento no ilícito, bem
como questionaram a aplicação da Teoria da Cegueira Deliberada com a extensão
do dolo aplicado a Lei 9.613 de 1998, ao que segue:

Os delitos previstos na Lei 9.613/98 só podem ser punidos se praticados


com dolo, ainda que gen rico. Somente possível o enquadramento “nos
crimes previstos nessa lei quando houver a consciência da ilicitude da
conduta. Dessa forma, é necessário que o agente saiba da procedência
ilícita do dinheiro em movimentação, não precisando que esse agente tenha
absoluta certeza sobre o fato, mas apenas a consciência do ilícito. Será de
suma importância que se verifique no caso concreto quais os processos que
o agente utilizou para lavar o dinheiro oriundo de fontes ilícitas para que se
verifique assim se o dolo (elemento subjetivo) está presente( TRF5,2007,fls.
52).

Reconhecendo os fatos imputados na apelação, o Tribunal Regional Federal


da 5º Região, baseado no artigo 386 inciso VII do Código de Processo Penal,
decidiu pela absolvição dos empresários donos da Brilhar Car por ausência de
provas que lhes imputasse contribuição com o crime de lavagem de dinheiro.
Em voto proferido pelo relator do processo no TRF5, o desembargador
entendeu que, conforme parágrafo primeiro da lei 9.613 de 1998, para reconhecer o
crime e aplicar penas aos empresários, seria necessário a sabedoria dolosa da
origem do dinheiro ilícito, fato este que não se tornou coaduno às alegações
apresentadas pelo Ministério Publico Federal.

4.1.3 A Teoria da Cegueira Deliberada e o Código Penal brasileiro.

A Teoria da Cegueira Deliberada, retirada da jurisprudência norte americana,


teve poucas aplicações no Brasil, uma vez que o Código Penal define em seu artigo
18 os crimes dolosos, que são aqueles cujo agente busca o resultado do crime, ou
assume o risco de produzir. O referido artigo define também os crimes culposos, que
são aqueles em que o agente age com imperícia ou negligencia e desta forma
produz um resultado.
A Willful Blindness Doctrine possui como elemento subjetivo o dolo eventual,
o problema, no entanto, para configuração de crimes baseados na Teoria da
Cegueira Deliberada é o fato de saber se o agente atua com dolo direto ou indireto,
pois este pratica o tipo penal sem se importar em conhecer mais a fundo a
circunstância do fato.
Logo, a referida teoria considera, para tipificação penal, o dolo eventual, que é
caracterizado quando o agente assume o risco de produzir o resultado ou sendo
indiferente ao mesmo. Como cita Laufe

Não se exige para o dolo eventual, o completo conhecimento dos elementos


do tipo objetivo. Há dolo eventual mesmo quando o autor duvida de alguns
desses elementos e, mesmo assim, age de modo a assumir o risco de
produzir o resultado normal do tipo, conformando-se com ele (LAUFE,1976).

Desta forma, para uma aplicação da Teoria da Cegueira Deliberada, é


importante realizar uma análise detalhada, com conhecimento objetivo, que detecte
que o agente assumiu os riscos de produzir o resultado, e, sabendo do ilícito, não
fez nada para impedir a continuação da conduta.
Não existindo, assim, os pressupostos supracitados, ficaria o crime impossível
de se verificar no ordenamento pátrio brasileiro, mas, havendo elementos suficientes
para a aplicação da teoria, poderia ser considerado pela jurisprudência

5. CONCLUSÃO
No que versa sobre a Teoria da Cegueira deliberada aplicada à legislação de
lavagem de dinheiro, lei 9.613 de 1998, percebemos que se trata de instituto recém-
chegado ao Brasil, mas já com muita história nas jurisprudências de tribunais
europeus e dos Estados Unidos da América.
A aplicação no Brasil encontra dificuldade, uma vez que se esbarra na
extensão quanto ao dolo, haja vista que só pode ser aplicado na modalidade de dolo
direto assim como descrito no art.18, inciso I do Código Penal Brasileiro.
Nas análises dos componentes sobre culpa e dolo, foi verificada a teoria do
dolo para aplicação correta na tipificação do delito previsto no art. 1º, paragrafo 2º da
lei de lavagem de dinheiro, sendo aplicado pela lei o dolo direto, e não eventual
como interpretação do juízo de 1º grau da 11º Vara de Justiça do TRF5º, que
discutiu matéria sobre aplicação das penas nos empresários que venderam veículos
para os envolvidos no assalto ao Banco Central.
Por se tratar de instituto novo a ser discutido pelos Tribunais brasileiros, a
Teoria da Cegueira Deliberada ainda não é bem desenvolvida e seus defensores
apresentam falha na interpretação e aplicação da jurisprudência advinda dos EUA,
conforme examinado na sentença condenatória do furto ao Banco Central de
Fortaleza, onde os proprietários da revendedora de veículos Brilhar Car, foram
condenados por participação na lavagem de dinheiro, fato este onde a Teoria da
Cegueira Deliberada se demonstrou inaplicável.
Sob este aspecto, a Teoria da Cegueira Deliberada prevê que para que o
agente seja punido de fato é necessário observar se este comete o ilícito, tenha
conhecimento da procedência do ato cometido, e, ainda, tenha como instituto final a
aferição de vantagens, podendo ter como resultado o lucro, facilitando a
concretização do crime.
Assim, percebe-se que o instituto estudado na Teoria da Cegueira Deliberada
encaixa-se com o dolo eventual, o que se procura é estendê-lo para crimes de
corrupção e lavagem de dinheiro a fim de punir os facilitadores do ilícito, que em
muitas vezes sabem do ilícito, e compactuam, vendendo, abrindo lojas de fachadas,
caracterizando-se, muitas vezes, como “laranjas”.
Portanto, para aplicação correta da teoria, devemos ter um desenvolvimento
a mais, e utilizar de um sistema jurídico que desenvolva através de jurisprudências e
doutrinas, o dolo eventual especificado para estes casos, uma vez que tal teoria
contribuiria para punir aqueles que realizam a lavagem, utilizando da ignorância
como subterfúgio para cometer o ilícito, bem como se valem deste artifício para
financiar o crime organizado, seja ele de colarinho branco, tráfico de drogas e a
gama de crimes financeiros que assolam o Brasil.
6. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS

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Danilo Fontenelle Sampaio. Fortaleza, CE.

BRASIL. TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO. 2ª Turma. ACR nº 5520-CE


Ementa [...] Relator Rogério Fialho Moreira. Recife, PE, 09.set.08. DJU de 22.10.08, p.
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