PEREIRA R. S. Proposições Da OCDE e Sua Materialização-0adac701c7a5498 Qyi5K0o
PEREIRA R. S. Proposições Da OCDE e Sua Materialização-0adac701c7a5498 Qyi5K0o
PEREIRA R. S. Proposições Da OCDE e Sua Materialização-0adac701c7a5498 Qyi5K0o
ISSN: 2177-6059
Universidade do Oeste de Santa Catarina
DOI: https://doi.org/10.18593/r.v44i3.20900
Resumo: Este artigo tem como objetivo apresentar as proposições da Organização para a Cooperação
e Desenvolvimento Econômico (OCDE), com base nos resultados Programa Internacional de Avaliação
de Alunos (Pisa), para a política educacional brasileira e como parte delas se materializam, sobretudo,
nas dimensões da gestão e avaliação do sistema educacional. Para tanto, analisou-se documentos
produzidos pela Organização que fazem recomendações à Educação Básica pública brasileira, tendo
como referência o período de 2000 a 2015. No contexto nacional, estudou-se documentos do Governo
Federal – Plano de Desenvolvimento da Educação (2007); Decreto n. 6.094/2007; Plano Nacional de
Educação (2014-2024) – evidenciando-se as articulações entre as duas esferas, Estado e OCDE.
Assinala-se o aprofundamento das relações políticas e educacionais entre Brasil e OCDE que resultam
na materialização das proposições daquele Organismo nas políticas nacionais para Educação Básica.
Conclui-se que esse processo vem redefinindo os pressupostos da gestão democrática e intensificando
as avaliações externas como mecanismo de controle e incentivo a um tipo de qualidade educacional
que atenda aos interesses do capital.
Palavras-chave: Política Educacional. Educação Básica. OCDE. Gestão Educacional. Avaliação Externa.
Resumen: Este artículo tiene como objetivo presentar las propuestas de la Organización para la
Cooperación y el Desarrollo Económico (OCDE), basadas en los resultados del Programa Internacional
de Evaluación de Estudiantes (Pisa), para la política educativa brasileña y como parte de ellas se
materializan principalmente en las dimensiones gestión y evaluación del sistema educativo. Con este fin,
Doutor em Educação pelo Programa de Pós-graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília;
1
Mestre em Educação pelo Programa de Pós-graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília.
Abstract: This article aims to present the propositions of the Organization for Economic Cooperation
and Development (OECD), based on the results Program International Student Assessment (Pisa), for
the Brazilian educational policy and as part of them materialize mainly in the dimensions management
and evaluation of the educational system. To this end, we analyzed documents produced by the
Organization that make recommendations to Brazilian public basic education, with reference to the
period from 2000 to 2015. In the national context, we studied federal government documents - Education
Development Plan (2007); Decree 6,094 / 2007; National Education Plan (2014-2024) - highlighting the
articulations between the two spheres, State and OECD. It is worth noting the deepening of the political
and educational relations between Brazil and OECD that result in the materialization of the propositions
of that Organization in the national policies for Basic Education. In conclusion, this process has redefined
the assumptions of democratic management and intensified external evaluations as a mechanism for
controlling and encouraging a type of educational quality that meets the interests of capital.
Keywords: Educational Policy. Basic education. OECD. Educational management. External Evaluation.
1 INTRODUÇÃO
O Brasil participa do Pisa desde sua primeira edição que aconteceu em 2000, contudo,
o processo de adesão ao Programa iniciou-se em 1998 como parte da política educacional do
governo de Fernando Henrique Cardoso. Nesse sentido, considero ser importante retomar o
debate sobre o papel do Estado a partir da década dos anos de 1990, entendendo esse contexto
histórico como elemento basilar da participação brasileira no Pisa. Não obstante, indico o recorte
deste trabalho entre os anos de 2000-2015, pois trata-se do período que abarca a participação
do País nas edições do programa que ocorreram em 2000, 2003, 2006, 2009, 2012 e 2015, das
quais analisamos documentos oriundos de seus resultados e orientações.
Desde a década de 1990 está em curso o processo de redefinição do papel
do Estado Brasileiro. Esse movimento tem acompanhando as demandas oriundas das
crises cíclicas do capital a fim de responder as estratégias do processo de reestruturação
2
Os Países observadores não são membros da OCDE, mas participam de seus programas e projetos.
3
Em 2000, foram 43 países e/ou economias; na edição de 2015 esse número saltou para 70, representando um acréscimo de
61% em relação à primeira edição.
reformas do Estado empreendidas a partir dos anos de 1990, mas aprofundar as redefinições
dos papéis e funções estatais. Ao mesmo tempo, a educação pública deve assumir a tarefa
de formar intelectuais de novo tipo (NEVES, 2010) que possam consentir com uma formação
instrumental e útil somente aos mercados e, simultaneamente, defender e difundir as ideologias
que sustentam tal instrução.
O documento de 2013 preconiza as bases elementares para uma política de
competências e habilidades eficaz. São elas:
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Em entrevista ao Jornal Folha de S. Paulo em 28 nov. 2015, o então Ministro da Educação, Aloizio Mercadante, declarou:
“[...] Não que a gente tenha que abdicar de uma reflexão teórica abrangente na educação, mas tem que ter a prática, como
aprender, como transmitir conhecimento, como liderar uma sala de aula, como observar os alunos, acompanhá-los”. (“SE
BRASIL..., 2015).
É notório considerar que no seu movimento há uma intencionalidade que faz parte
dos preceitos e processos de redefinição do papel do Estado no que tange à retração do
financiamento público da educação, induzindo a assunção dos setores empresariais na oferta
educacional. Na medida em que avançam as concepções da nova gestão pública, as parcerias
– e que pode ser maior e mais profundo do que aquele que resultou da
crise financeira no início do milénio, da qual muitos países ainda estão
lutando para subir. (ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
ECONÔMICO , 2015, p. 9).
objetivos com as demandas do mercado, formando cidadãos que estarão aptos a respondê-
las no processo produtivo. E, nesse caminho, não importam as diferenças estruturais dos
países, nem as consequências que delas decorrem, pois o centro é a melhoria dos níveis
de competências dos estudantes em idade escolar para apontar ao complexo do capital
possíveis nichos de investimentos.
O documento Competências básicas traz experiências de “políticas eficazes” a
serem assumidas por países e os pressiona com inúmeras expressões de alarde: “não há
tempo a perder”, “sem habilidades certas, as pessoas acabam nas margens da sociedade”,
“os países enfrentam uma grande batalha para permanecerem à frente neste mundo
interconectado” e, ainda, “o sucesso chegará aos indivíduos, instituições e países que se
apressarem para se adaptar, que reclamarem pouco e que forem abertos a mudanças”
Seção temática: Educação Brasileira e Organizações Multilaterais
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Segundo o documento, “com uma economia que tradicionalmente se baseou na extração de recursos naturais e sofreu
estagnação do crescimento e períodos de hiperinflação até o início dos anos 1990, o Brasil está hoje em rápida expansão
do seu setor industrial e de serviços [...] e reconhece o papel crítico que a educação tem no desenvolvimento econômico do
país. Como em apenas um punhado de outros países, o desempenho do Brasil em matemática, leitura e ciências melhorou
notavelmente durante a última década.” (ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, 2015, p. 31).
7
O estudo de cada um dos 76 países que participam do Pisa, incluídos na pesquisa, agrupou as nações de acordo com as
categorias de renda: os países de renda média-baixa, os países de renda média-alta, países não-membros da OCDE de
rendimento elevado e países membros da OCDE de alta renda. (As categorias seguem a classificação do Banco Mundial de
países por grupos de renda) (ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, 2015, p. 49).
No Nível 1, os alunos conseguem responder a questões envolvendo contextos familiares onde toda a informação relevante
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está presente e as perguntas estão claramente definidas. Eles são capazes de identificar as informações e realizar
procedimentos de rotina de acordo com instruções diretas em situações explícitas. Eles podem realizar ações que são quase
sempre óbvias e resultam imediatamente dos estímulos dados. No Nível 2, os alunos podem interpretar e reconhecer situações
em contextos que não requerem mais do que inferência direta. Eles podem extrair informações relevantes de uma única
fonte e fazer uso de um único modo de representação. Os estudantes nesse nível podem empregar algoritmos, fórmulas,
procedimentos ou convenções básicas para resolver problemas envolvendo números inteiros. Eles são capazes de fazer
interpretações literais dos resultados.
Assim, além de atuar no interior dos sistemas educacionais, a OCDE age no interior
das escolas, na perspectiva de materialização dos conceitos emanados da nova gestão pública,
preconizando a eficiência do gasto público em detrimento da ampliação de recursos. Ademais,
associa de forma linear gestão eficiente com desempenho dos estudantes e, ao mesmo tempo,
sustenta a responsabilização dos sujeitos da gestão pelo não atendimento dos objetivos
esperados, comprometendo o princípio democrático que permeia a Educação Nacional.
Adiciona-se a esse movimento a compreensão da autonomia da escola por um
viés burocrático, como liberdade para contratação e demissão de professores, associada
a uma noção de responsabilização também de tipo burocrática, emanada do conceito de
accountability.
Para isso, a OCDE oferece o Pisa como um tipo de avaliação externa em larga
escala dos sistemas que, na realidade concreta, opera a partir de uma lógica de aferição para
construção de rankings nos quais os países que não ocupam o topo da lista são induzidos
a adaptar seus sistemas – sem reclamar – para que possam ver o crescimento econômico
em médio e longo prazo e criar as condições para competir na economia cada vez mais
globalizada. Dessa forma, o tipo de educação almejada pelo Pisa é a instrução requerida pelos
mercados e determinada pelas demandas da globalização econômica.
avaliação dos sistemas. Para tanto, recorremos a alguns documentos que retratam esses
movimentos e relações.
Desde os anos de 1990, o Brasil realiza avaliações externas em larga escala,
porém, após sua participação no Pisa, vem remodelando os métodos desses exames. A partir
de 2005, o Governo Federal, sob a administração do Partido dos Trabalhadores, promoveu
profundas mudanças no Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) que, em um
movimento de mediação entre as demandas internacionais e locais, ampliou e aprofundou as
aferições como estratégia de gestão dos sistemas educacionais. Tais mediações não deixam
de levar em conta mecanismos oriundos das orientações e métodos da OCDE, como apontam
os objetivos da participação do Brasil no Pisa:
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Endereços para correspondência: Faculdade de Educação, Sala 18, Universidade Federal da Bahia,
Avenida Reitor Miguel Calmon, s/n, Campus Canela, 40110 100, Salvador, Bahia, Brasil; rodrigosilvaperei-
ra@ufba.br
Seção temática: Educação Brasileira e Organizações Multilaterais