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Metodologia Do Ensino de Historia III

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Coordenadoria de Educação

Aberta e a Distância

METODOLOGIA
DO ENSINO
DE HISTÓRIA III
Joana D’Arc Germano Hollerbach

Universidade
Federal
de Viçosa

Coordenadoria de Educação
Aberta e a Distância

Universidade Federal de Viçosa


Metodologia do Ensino de História III

Universidade Federal de Viçosa

Reitora
Nilda de Fátima Ferreira Soares

Vice-Reitor
Demetrius David da Silva

Diretor
Frederico Vieira Passos

Prédio CEE, Avenida PH Rolfs s/n


Campus Universitário, 36570-000, Viçosa/MG
Telefone: (31) 3899 2858 | Fax: (31) 3899 3352

Joana D’Arc Germano Hollerbach - Metodologia do Ensino de História III. Viçosa, 2012.

Layout: Diogo Rodrigues

Editoração Eletrônica: Diogo Rodrigues

Capa: Diogo Rodrigues

Revisão Final: João Batista Mota

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Metodologia do Ensino de História III

Sumário
4 Apresentação
5 Introdução
9 O ensino de história na legislação pós-LDB: construindo novos paradigmas
11 1.1 Novos sujeitos, novos objetos: o papel da memória na construção da história
11 1.2 Patrimônio e memória
13 1.3 Museus como espaço de construção do conhecimento histórico
16 1.4 A pesquisa documental como metodologia do ensino de história: a
construção da história local
18 1.5 O ensino de história e a história local: o caso do projeto Recriando Histórias
20 1.6 O ensino de história a partir do estudo do meio: a cidade conta a história
22 1.7 O ensino de história e as tecnologias da comunicação: a história virtual a
partir das possibilidades reais
26 1.8 Em busca de conclusões...
27 Referências Bibliográficas

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Metodologia do Ensino de História III

Apresentação
“A educação é o ponto em que decidimos se amamos o mundo o bastante
para assumirmos a responsabilidade por ele e, com tal gesto, salvá-lo da
ruína que seria inevitável não fosse a renovação e a vinda dos novos e dos
jovens. E educação é, também, onde decidimos se amamos nossas crianças
o bastante para não expulsá-las a seus próprios recursos, e tampouco ar-
rancar de suas mãos a oportunidade de empreender alguma coisa nova e
imprevista para nós, preparando-as em vez disso com antecedência para a
tarefa de renovar um mundo comum.”

Hannah Arendt

O objetivo deste material é orientar a leitura dos textos que serviram de base
para o desenvolvimento da disciplina HIS 263 - METODOLOGIA DO ENSINO
DE HISTÓRIA III. Para tanto, faremos aqui uma introdução sobre a temática, si-
tuando o ensino de história na história e na legislação nacional, sem prejuízo do
aprofundamento que será feito ao longo da leitura.
Entendemos que o ensino de história sofre, como todas as outras disciplinas,
problemas que assolam a educação básica. Daí a importância de uma educação
histórica sólida, que permita a crianças e jovens compreender a sociedade e a
sua organização no tempo e no espaço. Possibilita ainda um olhar questionador
sobre permanências e admitindo rupturas que possam alterar a ordem social na
qual nos encontramos, acreditando sempre na possibilidade de construção de
uma educação pública, de qualidade e para todos.
É para isso que pretendemos contribuir.

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Metodologia do Ensino de História III

Introdução
Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental apresen-
tam como um dos objetivos gerais da história valorizar o patrimônio sociocul-
tural, por meio do que o aluno irá, entre outras coisas, desenvolver a noção de
cidadania, ampliar sua percepção do outro, aprender a respeitar as diferenças
culturais e étnicas.
O documento oficial ainda recomenda a diversificação do trabalho em sala
de aula pelo uso de documentos, visita a museus e outros locais que favoreçam
a construção do conhecimento histórico e o debate, dentre outros.
Além de indicar uma abordagem conceitual mais relacionada à historiografia
contemporânea, pressupõe metodologias e critérios de avaliação que integrem
o aluno ao processo ensino-aprendizagem. Essa perspectiva metodológica pos-
sibilitaria a inserção do aluno nos processos históricos a partir da própria sala de
aula, colaborando, assim, para a elaboração de uma concepção de história na
qual o aluno se veja sujeito dos processos que o rodeiam.
O conceito de patrimônio, segundo Françoise Choay (2001), sofre alterações
ao longo do tempo. A autora fala do “culto ao patrimônio”, referindo-se ao desta-
que que é dado às questões que envolvem a herança histórica de uma socieda-
de. Segundo a autora, a importância do patrimônio está naquilo que ele repre-
senta, sua relação com a memória, como algo que traz de volta algo importante
que tenha sido vivido por aquele grupo, ou não.
A sociedade estabelece, portanto, relações com os espaços e com as coisas,
valorizando e esquecendo, destruindo ou construindo, segundo os interesses
dos seus membros, oficiais ou não. Para Janice Theodoro (1998), esquecer tam-
bém é uma forma de memória. Ao recontar a história, são descartadas algumas si-
tuações e assimiladas outras. E a cultura material também passa por essa seleção.
Ainda nesse sentido, admitimos que a memória seja fruto de uma constru-
ção, daí a necessidade de lugares de memória – como os museus, por exemplo
(NUNES, 2002). Em vista disto, a apropriação desses espaços na construção do
conhecimento histórico vem possibilitar uma ampliação das concepções tradi-
cionais de história.

! Ao aproximar o aluno da cultura material, temos a oportunidade


de trabalhar as permanências e rupturas temporais, ampliando a no-
ção de tempo, abrindo a possibilidade para a compreensão da história
como construção humana.

Em que medida, portanto, trabalhar os conceitos patrimônio, memória e mu-


seus seria útil à construção de outra concepção de história, mais coerente com as
discussões mais recentes da historiografia e com as propostas oficiais?
A ideia de educação patrimonial para o nível médio de ensino – sugerida
pelo governo de Minas Gerais, em documento que registra pesquisa sobre o as-
sunto – vem colaborar com essa discussão. Por meio de projetos que tenham por
objetivo “capacitar técnicos e docentes do sistema de ensino para a utilização
de conceitos e metodologias adequadas” (MINAS GERAIS, 2001), seria possível
desenvolver habilidades em alunos e professores e promover uma ampliação
na compreensão da história e na percepção do aluno/professor/comunidade do
seu papel como agente da história.

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Metodologia do Ensino de História III

A proposta de educação patrimonial parte do principio de que a educação


das relações sociais para a compreensão da história passa pela compreensão de
práticas culturais e da valorização da diversidade cultural. A pesquisa realizada
pela Fundação João Pinheiro identifica a necessidade de qualificação docente
para tratar do assunto e também de adequação do espaço escolar por meio de
materiais e infraestrutura.
É importante ressaltar que a ausência de referência a museus, patrimônio
e memória em nosso cotidiano escolar pode estar relacionada a práticas que
privilegiam a repetição, a cópia do livro didático, a inexistência de projetos que
levem a criança e o jovem a compartilhar de espaços coletivos da cidade para a
compreensão da história. O distanciamento de crianças e jovens desses espaços
pode fazer com que sua concepção de história seja reduzida a uma perspectiva
tradicional, na qual a reflexão e a crítica não tenham espaço. Não podemos es-
quecer que as condições de trabalho, de localização dos espaços de conserva-
ção da memória coletiva, muitas vezes distantes das pequenas cidades, também
contribuem para essa situação de distanciamento.
A ideia de educação patrimonial vem, portanto, abrir espaço para práticas
que possibilitem a aproximação do jovem (e das crianças) com outras formas de
representação da história, muitas vezes construídas e ressignificadas pelos sujei-
tos que delas se apropriam, dando outra interpretação para a história já constru-
ída. Perceber na prática que a história é reescrita a partir dos usos dos espaços e
das coisas abre ao aluno a possibilidade de compreendê-la como interpretação
e não como dado.

! O ensino de história no Brasil, no período em que vigorou o gover-


no militar, foi alvo de restrições e limitações que reconfiguraram a dis-
ciplina a partir de um caráter nacionalista, que privilegiava a dinâmica
oficial imposta pela ditadura.

Os instrumentos legais que passaram a regular o ensino de história, no bojo


das instruções dirigidas ao sistema educacional brasileiro, remetiam a uma pers-
pectiva pragmática, que pretendia atender aos interesses da ordem estabelecida
pelo regime militar. O culto aos heróis nacionais, o estabelecimento de diretrizes
específicas para a exaltação dos símbolos nacionais, bem como a reformulação
curricular foram alguns dos elementos norteadores desse período.
Após o golpe militar de 1964, em meio às mudanças no cenário social e po-
lítico brasileiro, tomaram corpo alterações no sistema educacional, compondo
o orquestramento da reordenação do país, no sentido de implementar as bases
do regime militar na esfera da educação. Entre as primeiras providências estava
a inclusão da Educação Moral e Cívica como disciplina obrigatória em todas as
escolas que compunham o sistema de ensino do país, inclusive no nível superior.
O Decreto-Lei 869, de 12 de setembro de 1969 dispunha sobre essa inclusão,
“em caráter obrigatório, como disciplina e, também como prática educativa, a
Educação Moral e Cívica, nas escolas de todos os graus e modalidades, dos siste-
mas de ensino do País”.

Saiba Mais:
Decreto-Lei 860/69, disponível em
http://www6.senado.gov.br/sicon/ExecutaPesquisaLegislacao.action

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Metodologia do Ensino de História III

A disposição de organização dos processos educativos de acordo com os


princípios do governo militar foi confirmada no texto do Decreto 68.065, de 14
de janeiro de 1971, que regulamentou o Decreto-Lei 869. A alínea d, do artigo
3º. desse documento dispunha que uma das finalidades da Educação Moral e Cí-
vica era “o culto à Pátria, aos seus símbolos, tradições, instituições e aos grandes
vultos de sua história”, apontando no sentido de uma perspectiva tradicional de
compreensão da história e dos seus sujeitos.
Ainda no contexto de reestruturação proposto pelo governo militar, o Decre-
to-Lei 547, de 18/04/1969, estabeleceu a possibilidade de formação de professo-
res em cursos de curta duração, cujo objetivo era atender à demanda para atuação
nos níveis de primeiro e segundo graus. Entre esses cursos, estava o de licenciatu-
ra em Estudos Sociais, disciplina introduzida nos currículos de primeiro grau pela
Resolução nº. 8, do Conselho Federal de Educação (FONSECA, 2001, p.27).
Nesse momento, a configuração da formação de professores de história (e
geografia) sofreu um golpe do qual vai se ressentir ao longo das décadas se-
guintes. A desconfiguração da área comprometeu as gerações futuras de pro-
fessores, quando consideramos a superficialidade e a fugacidade dos currículos
de formação docente. Para essa autora, o período marcou uma nova geração
de professores polivalentes, que descaracterizava as ciências humanas, no curso
que ficou conhecido como Estudos Sociais (Fonseca, 2001, p.27).
As lutas pela restauração da democracia e pelo estabelecimento de uma
nova ordem política e social no país se intensificam a partir da segunda metade
da década de 1970, apesar do recrudescimento do governo militar no início do
período.
No início da década de 1980, a resposta da sociedade às restrições impostas
pelo governo militar se fez por meio de movimentos sociais e de classe nas mais
diversas áreas. No que diz respeito ao ensino de História, cabe aqui registrar o
papel de organizações de classe, para alterar a ordem posta. Pressões de entida-
des como ANPUH e AGB, bem como de professores universitários de instituições
públicas e privadas e de alunos de cursos de graduação de História e Geografia,
fizeram chegar ao Ministério da Educação a reivindicação de extinção da disci-
plina de Estudos Sociais e o retorno da autonomia para as disciplinas História e
Geografia (FONSECA, 2001, p.31).
Esse movimento, conjugado ao apelo da sociedade por ampliação dos direi-
tos civis, pela volta dos exilados políticos e pela restauração da democracia favo-
rece a tomada de decisões que pouco a pouco restauraram os limites próprios às
disciplinas de História e Geografia.
Todavia, foi somente em 1993 que o então presidente Itamar Franco sancio-
nou a Lei 8663, de 14 de junho, revogando o Decreto-Lei 869/69, que determina-
va a inclusão da Educação Moral e Cívica nos currículos, restituindo esse espaço
ao ensino das disciplinas da área de Ciências Humanas e Sociais, em todos os
níveis de ensino.

!
A discussão não se restringiu a questões particulares relativas ao
ensino de História. Reformulações da legislação e da estrutura educa-
cional se estabeleceram tão logo o processo de transição democrática
se efetivou. Em 1986, iniciou-se um grande movimento de educadores
na busca da construção de uma política educacional que contemplasse
a parcela da população historicamente excluída dos processos educa-
tivos oficiais.

O momento, marcado pela instituição da Assembleia Constituinte que refor-


mularia a Carta Magna do país, ensejava a (re) construção da democracia com
implicação direta na ampliação do acesso à educação de forma plena. Para tanto,
era necessário que a discussão das propostas fosse efetivada a partir da base.

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Metodologia do Ensino de História III

A proposta de uma nova lei que orientaria a educação envolveu setores da so-
ciedade civil e o poder público nas suas três instâncias – municipal, estadual e
federal (BRITO, 1998).
Foram realizados fóruns para a discussão da educação pública em âmbito
nacional, a partir dos quais foram organizados documentos que formalizavam
a proposta da sociedade para a educação brasileira. Um desses documentos –
o texto de Demerval Saviani Contribuição à elaboração da nova LDB: um início de
conversa - foi a base para o primeiro projeto apresentado pelo deputado Octávio
Elísio (BRITO, 1998, p.54).
Desse primeiro projeto, apresentado ao Congresso Nacional em 1988, até o
texto final, em 1996, foi um longo caminho. Os trabalhos se estenderam ao lon-
go de oito anos, entre discussões e revisões, indo e vindo da Câmara dos Depu-
tados ao Senado Federal, terminando com a aprovação de um texto do senador
Darcy Ribeiro, que perdeu muito da proposta original. Entretanto, apesar das en-
xertias presentes no texto final e da articulação com o então governo Fernando
Henrique Cardoso1, à revelia das discussões construídas ao longo do processo, a
nova lei marcava um novo momento na educação brasileira.

!
Segundo Cury, a lei promulgada em 1996 marcou um avanço no
processo democrático brasileiro na medida em que estabeleceu a edu-
cação como direito público. O autor, contudo, adverte para a necessi-
dade da observação do que determina a LDBEN no que diz respeito à
obrigatoriedade e gratuidade da educação básica, sob pena de se com-
prometer os avanços alcançados.

A Lei 9394/96, que fixa as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em seu


artigo 26, §4º, faz referência ao ensino de história do Brasil, e no artigo 26, inse-
rido pela Lei 10.639, de 09/01/2003, determina o ensino de História da África e
Cultura Afro-Brasileira. A atual legislação também exige que a formação para o
exercício do magistério nos anos finais dos ensinos fundamental e médio se dê
em nível superior nos cursos de licenciatura plena (artigo 62), pondo fim à possi-
bilidade de formação nos cursos de curta duração.
Na esteira das novas proposições legais, em 1997, foram publicados os Parâ-
metros Curriculares Nacionais para as primeiras séries do ensino fundamental. A
proposta do documento era oferecer subsídios ao professor para a elaboração
de propostas de trabalho pedagógico para os diversos conteúdos. Os PCNs fo-
ram publicados em dez volumes para os conteúdos de 1ª. à 4ª. séries2 no ano
seguinte ao da promulgação da LDB e, posteriormente, em 1998, para os anos
finais do ensino fundamental e, em 2002, para o médio.
Os textos destinados a cada uma das etapas da educação básica, ao referir-
-se ao ensino de História, guardam relação com as discussões sobre o ensino e a
produção do conhecimento histórico baseadas nas orientações teóricas da Nova
História. As referências à história do cotidiano, à tematização da organização do
conteúdo, à diversificação dos métodos de ensino, aproximando-os das práticas
da pesquisa histórica e desvinculando-os de concepções tradicionais, estão pre-
sentes nas orientações presentes nos PCNs dos ensinos fundamental e médio.

1 Segundo Brito, a aprovação do texto proposto pelo Senador Darcy Ribeiro sem
vetos pelo então presidente da República indica “a negociação realizada com o governo
Fernando Henrique Cardoso e a articulação com as diretrizes educacionais do MEC”.
(BRITO, 1998, p.87).
2 Naquele momento o Ensino Fundamental era de 8 anos, indo da 1ª. à 8ª. séries.
Isso foi alterado em 06/02/2006 quando foi sancionada a Lei nº 11.274, que ampliou o
ensino fundamental para 9 anos.

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Metodologia do Ensino de História III

O ensino de história
na legislação pós-LDB:
construindo novos paradigmas
Para início dos nossos trabalhos, é importante identificarmos alguns marcos
legais que passaram a orientar o ensino de história a partir da promulgação da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), em 1996. Esse reconheci-
mento é importante para que possamos nos apropriar da legislação, enrique-
cendo o ensino da história, tão importante para a nossa formação e a formação
das crianças e dos jovens. É bom lembrar que todos os documentos citados aqui
se encontram disponíveis no sítio eletrônico do Ministério da Educação (www.
mec.gov.br).

!
Entre esses novos marcos legais, destacamos a própria Lei de Dire-
trizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96), que exige licencia-
tura plena para a atuação no ensino fundamental e médio, e extingue
a formação em cursos de curta duração, estabelecida no período da
ditadura militar e que restringiram em muito a formação dos professo-
res da educação básica.

Além da LDB, o estabelecimento dos Parâmetros Curriculares Nacionais


(PCN) também é um marco importante nesse processo. Primeiramente, foi edita-
do o documento referente aos anos iniciais do ensino fundamental, em 1997. Em
seguida, em 1998, os anos finais do ensino fundamental foram contemplados
com o material que viria a ser o referencial para aquelas séries. E finalmente, em
2002, foram publicados os parâmetros para o ensino médio.

Saiba Mais:
Os Parâmetros Curriculares Nacionais estão disponíveis
na versão eletrônica para download
em formato de arquivo pdf no site do MEC.

Além dos PCN, novas diretrizes foram estabelecidas para a formação dos pro-
fessores de história. O parecer 492, de 03 de abril de 2001, da Câmara Superior
de Educação, do Conselho Nacional de Educação (CNE), foi muito importante
naquele momento. Esse parecer veio definir as diretrizes para os formandos em
história. Logo em seguida, duas resoluções foram fundamentais para garantir
que a formação dos licenciados fosse resguardada no seu aspecto qualitativo.
Uma delas foi a Resolução nº. 2, de 19/02/2002, do Conselho Pleno, do
Conselho Nacional de Educação (CP/CNE). Essa resolução instituiu a duração e
a carga horária dos cursos de licenciatura, de graduação plena, de formação de
professores da educação básica em nível superior. Essa carga horária mínima é

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Metodologia do Ensino de História III

de 2.800 horas, das quais 400 (quatrocentas) são de prática, 400 de estágio curri-
cular supervisionado, 1.800 de aulas para os conteúdos curriculares de natureza
científico-cultural e 200 horas para atividades acadêmico-científico-culturais.
A Resolução nº. 13, do Conselho Pleno, do Conselho Nacional de Educação,
em 13 de março de 2002, estabeleceu as diretrizes curriculares para os cursos de
história. Mas o que falam as novas diretrizes? Essa é uma pergunta importante,
visto que seremos professores de história e precisamos nos apropriar dessas nor-
mas, para o bom desempenho das nossas atividades.

Dentre outros aspectos, as diretrizes estabelecem que o graduando em


história, ao longo da sua formação, deve:
Vivenciar a incorporação de novas metodologias
Vivenciar a diversificação dos currículos às peculiaridades regionais
Desenvolver a capacidade de investigação
Ter conhecimento e domínio de fontes diversificadas
Ao longo do curso de formação inicial, ter aproximação com as
concepções contemporâneas da história – novos problemas, novas
fontes, novas abordagens.

O movimento hoje conhecido como a Nova História tem sua origem ligada
à fundação da revista Annales, em Estrasburgo, na França, em 1929. A proposta
dos idealizadores do movimento – Marc Bloch e Lucien Febvre – era de rompi-
mento com a exclusividade da história econômica, além da proposta de proble-
matização dos fatos históricos. Para a escrita da Nova História, era proposta uma
redefinição de conceitos como tempo histórico, sujeito histórico e fato histórico
e a adoção de novos objetos e novas fontes para a pesquisa histórica.
Dentro da perspectiva da corrente historiográfica conhecida como Nova His-
tória, é proposta uma revisão da historiografia que passa a admitir novas aborda-
gens para a pesquisa histórica. Nessa nova perspectiva, são ouvidos outros ato-
res, antes silenciados pelo poder dos grandes vultos. O tempo não é o mesmo em
todos os lugares – o que se dá a partir do rompimento com a idéia de evolução e
progresso. E a idéia de neutralidade do pesquisador também é questionada.

! A concepção positivista de ciência considerava imprescindível a


postura neutra do pesquisador em relação ao objeto pesquisado, pre-
via a utilização de métodos quantitativos e a elaboração de leis gerais
que definissem o conhecimento produzido.

É importante observar que nos PCN encontramos referências à história do


cotidiano e encontramos também a recomendação de tematização da organiza-
ção do conteúdo e de diversificação dos métodos de ensino. Essas orientações
marcam a aproximação com a pesquisa histórica desvinculada de concepções
tradicionais, aquela que estamos chamando aqui de Nova História.
Nesse sentido, admite-se que a pesquisa e o ensino de história possam partir
de lugares especiais de preservação da memória coletiva, como museus e arqui-
vos públicos, mas também se admite a incorporação na prática do professor e

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Metodologia do Ensino de História III

nas atividades dos alunos dos espaços particulares de memória, como a família,
a comunidade e os arquivos pessoais.
Outra possibilidade de escrita da história é conhecida como o materialismo
histórico dialético, que também rompe com os ideais positivistas. A partir de es-
tudos de Karl Marx e Friedrich Engels, essa corrente teórica admite o trabalho
como categoria central de análise da sociedade, e a luta de classes como o mo-
tor das mudanças sociais. A compreensão dos fatos históricos se dá a partir da
análise das relações de trabalho, o que permite problematizar as desigualdades
sociais e a distribuição da riqueza.

1.1 Novos sujeitos, novos objetos: o papel da me-


mória na construção da história
Dentro da ideia de que novos sujeitos, novos objetos passam a compor o
cenário da historiografia e do ensino da história, é importante discutirmos qual
é o papel da memória na construção da história.
Ricardo Oriá (2001) nos aponta um incremento nas iniciativas que têm por
objetivo a preservação da memória e do patrimônio, os anos finais do século XX.
O autor registra, por exemplo, o resgate da memória como parte dos movimen-
tos sociais, a partir dos anos 1970. Essa iniciativa indica o rompimento, ainda que
incipiente, com o privilégio dado a grupos reduzidos da sociedade no registro da
história e no seu ensino.
Nesse sentido, nos perguntamos, então: quem preserva a memória? A quem
é atribuída a tarefa de resguardar a história coletiva?
Essa temática é relativamente nova na historiografia brasileira e, infelizmen-
te, praticamente ausente no processo ensino-aprendizagem, nos diversos níveis
escolares.

!
Assim, cabe a nós problematizar e discutir o papel da memória e da
escola na construção da história. Entendemos que a escola tem um pa-
pel muito importante no sentido de estimular o senso de preservação
da memória social coletiva. A escola é também um espaço privilegiado
de exercício da cidadania - disso não temos dúvida. É preciso, então,
assumir o conhecimento e a valorização do patrimônio como prática
cidadã.

Além disso, é muito importante, para além do patrimônio local, valorizar o


patrimônio cultural da humanidade. Esse cuidado impede que afastemos das
nossas crianças e dos nossos jovens a oportunidade de conhecer, ainda que vir-
tualmente, a cultura produzida por outros povos, em outras épocas.

1.2 Patrimônio e memória


Ao longo do século XX, a Nova História possibilitou outras formas de conce-
ber o patrimônio histórico. Entretanto, no inicio do século XX, em 1937, um de-
creto do então presidente Getúlio Vargas definia o patrimônio como sendo bem
móveis e imóveis, com valor histórico ou arqueológico. Dessa forma, estavam
priorizadas as igrejas, os casarões, os fortes, entre outras edificações de maior
expressão oficial. Com essa definição legal, foram excluídos aqueles bens rela-
cionados às camadas pobres da população, como as senzalas, as vilas operárias,
os cortiços, com grave prejuízo para a diversidade e para a pluralidade.

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Metodologia do Ensino de História III

Saiba Mais:
Veja o decreto-lei nº 25, de 30 de novembro de 1937, que organiza
a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional no portal do
Palácio do Planalto:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0025.htm.

Durante o século XX, a partir das reformulações teóricas que envolveram as


ciências humanas, patrimônio histórico e artístico e patrimônio cultural foram
conceitos reconfigurados. A mudança torna-se emblemática quando a Consti-
tuição brasileira assume outra concepção e substitui a expressão “patrimônio
histórico e artístico” por “patrimônio cultural”.

! Passa, então, a ser considerado bem cultural toda produção huma-


na, intelectual ou material. Com a ampliação do conceito, temos colo-
cada em pauta a possibilidade de ampliação dos sujeitos envolvidos
nos processos históricos.

Mas, afinal, o que é patrimônio 2cultural? Ricardo Oriá, em seu texto, nos traz
três categorias. A primeira delas envolve os elementos ligados à natureza – os
rios, as montanhas, os animais, enfim, o habitat natural. A segunda categoria, diz
respeito ao conhecimento produzido pelos homens, às técnicas empregadas
na produção de bens e aos saberes acumulados ao longo do tempo pela huma-
nidade. Por fim, mas não menos importantes, constituem a última categoria as
construções, os objetos e os artefatos construídos pelos homens – aqui con-
sideramos as edificações, as ferramentas, os adornos, o vestuário, por exemplo.
Considerando, então, que o texto constitucional já admite essa definição, uma
questão pode ser colocada aqui: qual é o patrimônio histórico do nosso municí-
pio? Vamos pensar sobre isso...
Diante de todas essas considerações, nos perguntamos então: por que pre-
servar?
A preservação é importante como lembrança do passado, mas não só isso...
Preservar os espaços de memória é relevante também como possibilidade de
compreensão da história e dos seus processos. Mas, além disso, também como
reconhecimento das semelhanças e diferenças entre nós e os outros.
Diante dessa constatação, fica a pergunta: quem (e o quê) nós elegemos para
preservar na lembrança? Durante muito tempo (e talvez ainda hoje...) foi privile-
giada a lembrança dos mais ricos e dos que dominavam as relações sociais, dos
políticos e das autoridades.

Vamos observar a organização do espaço urbano: quem dá nome às ruas


da sua cidade?
Todavia, em contraposição a uma prática persistente, a partir dos anos 1980,
percebemos nos documentos oficiais que orientam o ensino de história, a incor-
poração da nova historiografia que propõe o resgate dos atores antes excluídos.
Percebemos também a incorporação na legislação da valorização dos grupos
étnicos indígenas e afrodescendentes.

12
Metodologia do Ensino de História III

A memória como direito é outro destaque feito pelo autor que não pode-
mos deixar passar despercebido. Ao preservar a memória coletiva, preserva-se
também a história de uma comunidade, seus percursos e processos. Um povo se
reconhece como tal na história que compartilha e é daí que vem a possibilidade
de luta e de transformação.
Nesse sentido, a depredação que frequentemente observamos nos espaços
públicos nos leva a crer que esse sentimento de pertencimento ao lugar e à his-
tória ainda está por construir. Nesse sentido, o papel da escola e do ensino de
história é fundamental para colaborar com a criação de significado para a popu-
lação dos monumentos erigidos como representantes da memória coletiva. Para
o exercício da democracia e da cidadania, é importante o indivíduo se reconhe-
cer como parte daquela história.

1.3 Museus como espaço de construção do conheci-


mento histórico
Para início de conversa, é importante definir museu. Há quem relacione a
palavra museu à coisa velha, móveis antigos e até a mofo! Mas Adriana Mortara
Almeida e Camilo de Mello Vasconcelos nos trazem uma definição que auxilia
em muito a compreensão desse espaço.
Para eles, o museu é uma instituição permanente, sem fins lucrativos, que
está a serviço da sociedade e é aberta ao público para conservação e pesquisa
das evidências materiais do homem e do seu ambiente. Quando falamos em ins-
tituição permanente, é no sentido de que não se trata de um espaço que eventu-
almente disponibiliza determinada coleção ao público, mas sim de um local que
permanentemente está aberto à população.
Qual seria então, a finalidade educativa dos museus? Essa finalidade existe
de fato? Muito bem, não é difícil encontrarmos resposta para essa questão. Sem
muito esforço, entendemos que os museus são um espaço de conhecimento dos
processos sociais e da memória coletiva.
Sendo assim, identificamos como importante as oportunidades de visitação
e da compreensão dos significados das exposições, que sempre guardam rela-
ção com um tema ou um momento específico. Visitar museus nos aproxima da
história – nossa ou da história de outras sociedades - de forma concreta, trazen-
do para o nosso cotidiano o cotidiano de pessoas que sejam nossos contempo-
râneos ou que viveram antes de nós. Móveis, obras de arte, artefatos do cotidia-
no são trazidos até nós para que possamos nos inteirar de como essas pessoas
viveram (ou ainda vivem) num tempo e num espaço diverso do nosso.
Quais seriam, então, as características dos museus mais procurados pelos
professores de história? Em princípio, os autores nos esclarecem que os museus
de ciências humanas são os mais procurados para o ensino de história. Outras
possibilidades para as atividades formativas vinculadas à história seriam os mu-
seus de ciências naturais, os museus de arte e ainda os museus e as coleções
pessoais.

! A UFV mantém para a preservação da memória e do patrimônio o


Museu Histórico, a Casa Arthur Bernardes e a Pinacoteca. Estes espaços
estão abertos à visitação pública e podem ser contatados pelo endere-
ço eletrônico http://www.dac.ufv.br/.

13
Metodologia do Ensino de História III

Ao pensarmos nos museus como espaço de ensino e estudo da história, é


importante compreendermos como se organiza o acervo dos museus. Os auto-
res nos esclarecem que em geral, as coleções não têm um critério obrigatoria-
mente técnico. Elas podem ser resultado de aquisição ou doação, o que nem
sempre possibilita uma lógica histórica, científica.
É comum também que as exposições sejam organizadas por temáticas, que
irão definir quais objetos vão compor as mostras a serem expostas. Muitas ve-
zes essa temática se define pela disponibilidade de um determinado acervo ser
deslocado de um lugar para o outro. Esse deslocamento de coleções inteiras ou
de parte delas é importante para que a divulgação se dê para além do seu lugar
de origem. Um exemplo de acervo itinerante é a exposição de obras do artista
Auguste Rodin, que visitou inúmeras cidades do Brasil no ano de 2009.

Saiba Mais:
É possível conhecer as obras desse artista no site www.musee-rodin.fr/en.

Mas ainda nos perguntamos: por que visitar museus? As várias revisões na
teoria da história nos levaram a perceber que o estudo, a pesquisa e o ensino
podem acontecer em lugares diversos. Daí, percebermos o potencial educativo
desses espaços.
O museu permite tornar o conhecimento histórico concreto, palpável, pela
exposição de objetos dos mais variados tipos, nos remetendo à rotina daqueles
que nos antecederam no tempo e no espaço, ou que vivem numa outra socieda-
de, diferente da nossa.
Permite também a preservação do passado e da memória e a construção da
sua relação com o presente. Temos com a observação e análise das exposições
a possibilidade de encontrar semelhanças entre as nossas atividades e aquelas
desenvolvidas por outras pessoas. Mas é preciso ter um cuidado: as coleções de-
vem fazer sentido para os visitantes e para os estudantes. Por isso, é importante
que o professor tenha um contato prévio com o acervo a ser visitado.
Portanto, ao considerarmos a ação educativa dos museus, precisamos estar
atentos a alguns aspectos. Cabe aqui destacar a importância da atenção à ade-
quação da exposição ao perfil do público visitante: se são crianças ou adolescen-
tes, se já são alfabetizados ou não, se é necessário uma aula anterior à visita para
introdução do tema explorado pela exposição, etc. Outras possibilidades são as
visitas monitoradas; as oficinas promovidas por algumas instituições; o material
didático para empréstimo disponibilizado por alguns museus; as conferências
abertas ao público e os estágios de formação propostos por algumas instituições.
Os autores Adriana Mortara Almeida e Camilo de Mello Vasconcelos apre-
sentam a proposta de integração com professores e alunos de história do MAE –
Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (USP). O MAE
disponibiliza coleções arqueológicas da pré-história geral e americana, além de
outras referentes à etnografia brasileira e afro-brasileira. Desenvolve atividades
de ensino, pesquisa e extensão e promove a proteção e a valorização do patri-
mônio histórico.
A proposta do MAE contempla atividades para professores e para estudan-
tes. Para os professores, há treinamentos para visitas monitoradas e cursos de
aprofundamento. Para estudantes, são programadas visitas monitoradas e a ela-
boração de roteiros articulados com o conteúdo escolar.
Nesse museu, ainda há outras possibilidades de atividades a serem desen-
volvidas. Uma delas é a abordagem do trabalho arqueológico, que é uma das

14
Metodologia do Ensino de História III

especialidades dos pesquisadores que trabalham ali. Os roteiros desenvolvidos


pelos próprios professores, adequados às necessidades específicas da turma,
também são viáveis, o que ajuda em muito a atividade docente.
Outra possibilidade, não menos importante, é considerarmos o museu como
fonte de pesquisa. Pesquisadores e professores podem aprofundar seus conhe-
cimentos históricos desenvolvendo estudos a partir do acervo da instituição.
Outro espaço trazido pelos autores é o Museu Paulista. Também conhecido
como Museu do Ipiranga, este espaço foi inaugurado em 7 de setembro de 1895
como museu de história natural, se constituindo ao longo do tempo como um
marco representativo da independência, da história do Brasil e paulista.
Esse museu teve sua origem na coleção particular do coronel Joaquim Sertó-
rio, um rico comerciante de São Paulo, ainda no século XIX. Hoje, ocupa um pa-
pel importante no cenário nacional, sendo um espaço que abriga obras clássicas
da história brasileira.

! O famoso quadro O grito do Ipiranga, de autoria do pintor Pedro


Américo, compõe o acervo do Museu do Ipiranga. Esta obra é muito co-
mum nos livros didáticos de história dos ensinos fundamental e médio,
ilustrando o conteúdo que trata dos movimentos de independência do
Brasil.

Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Pedro_Am%C3%A9rico

O museu paulista apresenta duas possibilidades de estudo, segundo desta-


que feito pelos autores. Uma delas é dentro da temática da independência do
país, visto que abriga vasto acervo sobre esse assunto. Outra possibilidade é o
estudo da história da cidade de São Paulo.

Saiba Mais:
No site do Museu do Ipiranga estão disponíveis vídeos sobre algumas
exposições. Confira! www.mp.usp.br

Após estudarmos sobre esses dois museus – o MAE e o Museu Paulista –,


algumas indagações são pertinentes, de modo a nos aproximar dessa realidade.

15
Metodologia do Ensino de História III

Existe algum museu na sua cidade ou região? É possível o deslocamento dos


estudantes até esses espaços? Se não existe, é possível iniciar um trabalho de orga-
nização de objetos e documentos passíveis de serem estudados? Essas questões
são importantes para avaliarmos as possibilidades das nossas atividades práticas.
A visita a museus em outras cidades e em outros estados tem vários entraves.
Por isso, é tão importante a criação e a manutenção de espaços de preservação
da memória nas nossas cidades. Mas como organizar acervos, documentos e ou-
tras fontes? É o que discutiremos no próximo tópico.

1.4 A pesquisa documental como metodologia do


ensino de história: a construção da história local
Para melhor compreensão da pesquisa histórica a partir de pesquisa docu-
mental, vamos discutir o texto O estudo da história local e a construção de identi-
dades, da professora Selva Guimarães Fonseca, da Universidade Federal de Uber-
lândia. A temática da história local é muito importante para a compreensão da
história a partir da articulação do local com o global. Além disso, aponta para
uma concepção de história na qual o sujeito histórico se reconhece como tal, a
partir do seu reconhecimento no meio em que vive.
Neste texto, a autora discute o estudo da história local como metodologia
para o ensino da história. Para o ensino da história na educação básica, é mui-
to importante a articulação do nacional com o local, como estratégia para dar
sentido à história vivida e estudada por crianças e jovens. Não é por acaso o des-
taque feito pelos PCN para essa abordagem como forma de compreensão das
semelhanças, das diferenças, das permanências e das transformações sociais.
Entretanto, algumas dificuldades são verdadeiros empecilhos para o ensino
da histórica local, quando não tratados de forma adequada, tanto sob o ponto
de vista do conteúdo quanto da metodologia.
Podemos destacar a fragmentação dos vários espaços estudados: o bairro, a
cidade, o estado e o país não se comunicam. Esse distanciamento faz com que
os conteúdos percam a relação que se estabelece cotidianamente. Qualquer que
seja o município onde nos encontramos, mantemos relações com as outras es-
feras administrativas o tempo todo. Até o abandono é um tipo de relação e deve
ser considerado. A autora destaca também a divisão social, a luta de classes e
as relações de poder, que não aparecem nos manuais didáticos adotados nesse
segmento. Essas relações também são muito próximas do nosso cotidiano, mas
nem sempre são discutidas. Saber problematizar essas situações pode auxiliar
em muito o ensino da história.

!
Outras dificuldades são levantadas por Selva Guimarães Fonseca.
Segundo ela, o destaque para os aspectos políticos e a relevância dada
aos grandes vultos e às figuras políticas de destaque ofuscam o sujeito
comum, fazendo com que crianças e jovens não se reconhecem naque-
les papéis. Além disso, as fontes estudadas tendem a perpetuar a visão
construída pelos grupos que compõem a elite local.

Então, quais seriam então as alternativas à história oficial? É possível escre-


ver e contar outra história? O texto nos aponta que sim. Para isso, a utilização da
memória como fonte é um recurso importante. Além da memória, a observa-
ção do meio como método possibilita a compreensão dos processos locais, nem
sempre valorizados.
E, não menos importante, o contato com as instituições locais a partir de

16
Metodologia do Ensino de História III

questionamentos dos alunos leva a problematizações e indícios muito esclare-


cedores.
Ao optarmos pela história local como método no ensino de história, precisa-
mos estar atentos a alguns pontos fundamentais. O primeiro deles é estabelecer
contato com o tema. É preciso definir qual será o tema a ser pesquisado, com
clareza, para iniciarmos o processo. Em seguida, o estabelecimento de métodos
para a pesquisa é de igual maneira fundamental.
Qual a melhor metodologia para a temática escolhida? Essa questão deve
ser bem respondida, para que os problemas levantados no trabalho sejam res-
pondidos ao longo da pesquisa, de modo que o conteúdo proposto seja con-
templado de forma satisfatória.
A definição do conteúdo e dos seus limites também é de extrema importân-
cia. Precisamos estabelecer limites de tempo e de espaço, sob o risco de não dar
conta do trabalho. Essa é uma tarefa difícil para o pesquisador, seja ele professor
ou não. A história nos encanta e corremos o risco de não saber estabelecer os
marcos temporais e espaciais que limitarão nosso trabalho. Isso pode nos causar
grande desconforto para finalizar o trabalho.

!
O marco temporal é um período datado que delimita o tempo do
tema a ser pesquisado. O marco espacial indica em que região nos con-
centraremos para a pesquisa. Por exemplo: vamos pesquisar a chegada
de trabalhadores rurais, na região da Zona da Mata Mineira, a partir da
inserção da cultura do café na região, em 1850 (data fictícia), até a ex-
tinção da escravidão. Marco temporal: de 1850 a 1888. Marco espacial:
região da Zona da Mata Mineira.

Outro aspecto importante é o cuidado com a apropriação, por parte dos alu-
nos, dos conceitos que serão trabalhados em campo. É essa tarefa que vai dar
sentido ao trabalho e vinculá-lo ao conteúdo escolar. E, finalmente, a elaboração
da síntese final, em sala. O fechamento do projeto deve ser claro e objetivo, de
modo a dar sentido ao que foi pesquisado e contextualizar o trabalho em rela-
ção ao conjunto de temas a serem estudados pelos alunos.
Para que possamos compreender a dinâmica da história local, é importante
compreender como se organiza o trabalho de campo. Para nos auxiliar neste
trabalho, vamos lançar mão do texto indicado para leitura, buscado no livro A
construção do saber, de Christian Laville.
As pesquisas históricas envolvem, de maneira muito especial, a pesquisa do-
cumental. Mas, afinal, o que é um documento? Documentos são registros das
atividades dos homens nas suas atividades diárias de trabalho, de produção ar-
tística, de produção intelectual e na vida particular. Para a recuperação desses
processos por meio da pesquisa histórica podemos utilizar a pesquisa documen-
tal. Os documentos podem ser públicos, como leis, escrituras, projetos públicos,
publicações de órgãos de governo,
Mas também podemos contar com os documentos pessoais como os diários,
as cartas, as receitas culinárias (isso mesmo: as receitas culinárias são muito uti-
lizadas na pesquisa histórica!). Também podemos considerar como documentos
as publicações periódicas como jornais e revistas e ainda os documentos sono-
ros e visuais, como fotos, pinturas, vídeos, músicas e os filmes.
Ainda sobre a pesquisa documental é importante considerar a crítica dos
dados. E o que é isso? A crítica dos dados nos permite avaliar a qualidade dos
dados que temos em mãos e a informação contida nos documentos.
Para isso, algumas perguntas são importantes e auxiliam em muito o nosso
trabalho: quem produziu esses documentos? Quando eles foram elaborados?
Em que condições isso se deu? Qual é a qualidade dessa informação? É uma

17
Metodologia do Ensino de História III

fonte confiável? Já ouviram falar de documentos grilados? São documentos fal-


sificados ou forjados, com aparência antiga, mas que não são verdadeiros.
Outra pergunta importante nessa etapa do processo é: qual a relevância
desse documento para o problema de pesquisa proposto? O documento pode
ser fidedigno, legível, autêntico, mas não responder às questões propostas. Por-
tanto, não é útil para o trabalho proposto.

!
Também é possível coletar informações por meio da observação,
como em alguns projetos que discutiremos mais adiante. Para esse
procedimento, o autor nos recomenda alguns cuidados. A observação
não deve ser ocasional e deve relacionar-se com o objeto pesquisado.
Ela pode ser:
- Estruturada: tópicos previamente elencados.
- Não-estruturada: quando não há um roteiro predeterminado.

Outra possibilidade para a coleta de dados é o registro de testemunhos. Tam-


bém chamados depoimentos, os testemunhos permitem explorar as crenças e
os valores das pessoas sobre determinado objeto ou situação. Permitem ainda
que problemas que não são contemplados com os documentos escritos sejam
estudados. E são muito úteis em condições em que os documentos escritos não
existem por diversas razões. Os depoimentos podem ser obtidos por questioná-
rios ou entrevistas.

1.5 O ensino de história e a história local: o caso do


projeto Recriando Histórias
Nesse tópico, vamos analisar um projeto desenvolvido junto à rede munici-
pal de ensino da cidade de Pinhais, no estado do Paraná. O trabalho foi coorde-
nado pela professora Maria Auxiliadora Schmidt que, junto com Tânia Garcia, é
também autora o texto utilizado aqui.
O estudo da história local é concebido nesse curso como uma possibilidade
para a pesquisa e o ensino de história. Apesar de essa temática dizer respeito
diretamente aos anos iniciais do ensino fundamental, é importante que não se
perca a relação destes temas com os conteúdos dos segmentos seguintes.
Muitas vezes, os alunos alegam não se reconhecer na história estudada e
esse distanciamento pode estar relacionado à não identificação do espaço e do
tempo do aluno com as temáticas abordadas nos conteúdos dos anos finais do
ensino fundamental, bem como naqueles estudados ao longo do ensino médio.
Além disso, há que se considerar a recomendação dos PCN de se privilegiar o
estudo do meio como recurso pedagógico no ensino da história. Assim, a expe-
riência descrita no texto que discutiremos poderá contribuir para elaborarmos
novas estratégias de ensino.
Maria Auxiliadora Schmidt e Tânia Garcia apontam algumas dificuldades re-
correntes para o ensino de história nos anos iniciais do ensino fundamental. Se-
gundo elas, os professores que atuam nesse segmento não possuem formação
em história, o que dificulta o domínio dos métodos e das técnicas da pesquisa
histórica e, às vezes, do próprio conteúdo e da metodologia do ensino. Além
disso, a inexistência de materiais didáticos construídos a partir da história local
também é fator que dificulta a discussão dessa temática.
Diante das condições adversas, como já dissemos, recorrentes entre os profes-
sores, foi desenvolvido o projeto Recriando Histórias, tendo por base a rede muni-
cipal de dois municípios, que se localizam na região metropolitana de Curitiba, no

18
Metodologia do Ensino de História III

Paraná. O público alvo eram os alunos dos anos iniciais do ensino fundamental�.
Como todo projeto, o trabalho teve como referência uma base teórica deter-
minada. Nesse sentido, cabe destacar a organização do ensino de história levan-
do-se em consideração os conteúdos culturais; a identificação das diversidades
e das desigualdades presentes naquela região e a consideração da história como
estudo da experiência humana no tempo.
As autoras destacam a importância de termos cuidado com a teoria adota-
da. Uma realidade não contém em si mesma a explicação para suas próprias
questões – ela está relacionada com o global, com o todo. Por isso, é importante
estarmos atentos para evitar perspectivas reducionistas, localistas. Isso acontece
quando, ao estudarmos a história local, nos esquecemos das relações estabele-
cidas com os contextos mais amplos.

!
Com todos esses critérios, consideramos que são muitas as possi-
bilidades de ensino da história a partir da história local. Dentre essas
possibilidades, ressaltamos os destaques feitos pelas autoras sobre o
caráter positivo da inserção do aluno na comunidade da qual faz par-
te, além da produção de atividades e atitudes investigativas a partir
da realidade cotidiana. Esse recorte nos faculta ainda trabalho com di-
ferentes níveis de análise econômica, política, social, cultural, além de
facilitar a identificação das continuidades e permanências locais.

O desenvolvimento do projeto Recriando Histórias se deu em dois municí-


pios do estado do Paraná: Pinhais e Campina Grande do Sul e tinha por objetivo
recontar a história local a partir de documentos em estado de arquivo familiar,
coletados pelos alunos.
Para o desenvolvimento do projeto foi adotada como metodologia o pro-
cesso de captação de conteúdos a partir do envolvimento da comunidade local.
Além disso, foi necessária a identificação de fontes documentais em arquivos
públicos e em estado de arquivo familiar.
Os trabalhos foram orientados a partir de recortes específicos, organizados
a partir de dois grandes temas. Em Pinhais, população, trabalho e cultura, e em
Campina Grande do Sul famílias, trabalho e cultura.

A coleta dos dados aconteceu a partir dos seguintes instrumentos:


1. Documentos;
2. Entrevistas gravadas;
3. Depoimentos;
4. Registro de brincadeiras e músicas.

As atividades realizadas foram orientadas no sentido de buscar a análise do


material coletado pelos alunos, por meio de atividades realizadas em sala. Para
isso, foram desenvolvidas análise dos documentos; comparação dos depoimen-
tos coletados e a articulação das informações recolhidas com os conhecimentos
prévios estudados.
A socialização dos resultados aconteceu após seleção e classificação das in-
formações e a preparação de material didático. Foi organizada uma edição espe-
cial de um jornal local para divulgação dos dados, além da exposição de fotos e
documentos para a comunidade.
É importante ressaltarmos os destaques Maria Auxiliadora Schmidt e Tânia
Garcia para a necessidade de problematização dos conteúdos e do estabeleci-
mento de relações com o cotidiano de outras pessoas, em outros lugares. Além
disso, articular história local e nacional sem substituir o conteúdo básico pela
história local são cuidados fundamentais para não incorrermos no risco do em-
pobrecimento da história pelo recorte reduzido ao local.

19
Metodologia do Ensino de História III

1.6 O ensino de história a partir do estudo do meio: a


cidade conta a história
Vimos até aqui as possibilidades para o ensino de história a partir da me-
mória, da pesquisa documental, das visitas aos museus e da história local. Neste
tópico vamos discutir dois textos que trazem experiências de projetos realizados
com a metodologia conhecida como estudo do meio.
Essa metodologia, incentivada nos programas oficiais para o ensino de his-
tória é importante, pois permite que a paisagem urbana, assim como os equipa-
mentos sociais, seja objeto de estudo e de aprendizagem. Veremos como expe-
riências de lugares distantes guardam relação com o nosso cotidiano.

! Equipamentos sociais são equipamentos e serviços de apoio ao ci-


dadão, como creches, escolas, hospitais, telefones públicos, parques,
praças, entre vários outros.

Compartilhar experiências de aprendizagem é uma forma rica de compreen-


dermos como se dá o processo educativo. Os dois projetos que vamos discutir
aqui partiram do estudo do meio para o ensino de história. Aconteceram em
Uberlândia, interior de Minas Gerais, e em Jundiaí, no estado de São Paulo.
O estudo do meio como método é destacado nos PCN como possibilidade
para a produção do conhecimento histórico em sala de aula. Esse método en-
volve pesquisas preliminares que vão orientar as ações a serem desenvolvidas
ao longo do processo.
Algumas condições preliminares devem ser observadas para o desenvolvi-
mento de trabalhos a partir do estudo do meio. Nesse sentido, entendemos a
paisagem como documento e, como tal, deve ser lida interpretada, problema-
tizada. A paisagem não traz a história pronta. Precisamos dialogar com o meio,
a partir de problemas e questões preestabelecidos para que tenhamos sucesso
nos nossos projetos. É preciso considerar também que a paisagem (urbana ou
rural) é o lugar onde ora se depositam, ora se apagam os traços dos homens.
Esse movimento deve ser considerado pelo pesquisador.
Mas o que observar na paisagem? Basta olhar e já veremos a história estam-
pada nas fachadas e nos monumentos? É evidente que não. Precisamos estar
atentos às formas e aos padrões estéticos das edificações; aos materiais utiliza-
dos nas construções – é pedra? Taipa? Madeira? Por que um material e não outro?
A ocupação dos espaços também nos conta muita coisa. Como são utilizadas
as praças, as marquises e as ruas? São usadas como moradia por desabrigados?
São usadas pelos ambulantes, para o trabalho? São usadas por crianças e jovens,
para o lazer e as brincadeiras? É possível observar a prática de esportes nesses
espaços? Quais esportes? O que foi demolido? O que foi reconstruído? Quando
e porque se constrói ou se reconstrói? São muitas questões...
Vemos, então, que é preciso exercitar o olhar. Exercitar o olhar é olhar com
outros olhos. Não como o cidadão comum, que passa diariamente por uma pra-
ça ou vai à igreja. Aquela praça e aquela igreja guardam história. Aquela casa,
onde mora o morador mais antigo da cidade também guarda história. A escola
onde estudamos, a favela que nasceu na periferia, todos esses espaços trazem
lembranças, memórias, que podem ser resgatados.
Para isso, é importante, antes de tudo, definir o local a ser estudado previa-
mente. A cidade nos apresenta vários espaços a serem desvendados, todos eles

20
Metodologia do Ensino de História III

importantes sob algum aspecto. Mas o que nos interessa para tratar do nosso
conteúdo? Esse aspecto – o conteúdo a ser estudado – nos leva a levantar infor-
mações prévias. Precisamos saber onde iremos encontrar respostas para as nos-
sas questões: se quero saber sobre religião, devo procurar os espaços religiosos
e não os bares ou clubes da cidade.
Outro cuidado não menos importante é saber problematizar as informações.
Nem sempre as informações disponíveis aos olhos são as mais importantes: A
fachada que vemos é original? A cor das paredes nos diz alguma coisa?
Ainda exercitando o nosso olhar, devemos visitar o local em diferentes dias e
horários. A rotina da cidade e das pessoas muda ao longo do dia e essa informa-
ção é importante para nós. Um lembrete: é muito importante a elaboração de
um diário de campo nessas visitas, onde registraremos tudo o que for observado.

Além da observação, a pesquisa documental também complementa o traba-


lho de coleta de informações. Atas de fundação de escolas, projetos de constru-
ções, escrituras e jornais são alguns dos documentos que podem complementar
a coleta de dados. Por fim, a interpretação e sistematização das informações co-
letadas vai nos encaminhar para a conclusão da pesquisa.

1.6.1. O projeto de Jundiaí


O primeiro caso que vamos estudar é o projeto desenvolvido a partir da Pra-
ça Governador Pedro de Toledo, em Jundiaí (SP). O autor destaca a importância
de se considerar a existência de material para a pesquisa documental. Não basta
escolhermos um lugar para observar; precisamos nos munir de outros elemen-
tos para estudar a história do lugar.
Nesse projeto, as informações complementares foram reunidas a partir de
depoimentos, jornais, fotos, projetos de construções/reformas executadas pelo
poder público. O autor nos alerta para o fato de que a ausência de documentos
também pode dizer muita coisa.
É importante ainda direcionar o trabalho para a percepção das perma-
nências e mudanças. As cidades são vivas e mudam ao longo do tempo. Essas
mudanças nos indicam opções políticas, mudanças na economia, pessoas que
chegam e trazem novas culturas. Isso tudo nos interessa...
O segundo caso é o estudo feito Antoniete Camargo Oliveira da Praça João
Jorge Cury, em Uberlândia (MG). A observação se deu em dias e horários alterna-
dos, para que fosse possível observar situações próprias de cada período do dia.
Curioso notar que a praça tem um “apelido”: Praça do Chuá. Existe isso na
sua cidade? O nome oficial sobreposto por outro, mais popular? Essa situação é
comum, em muitas cidades e indica que a população às vezes se apropria de um
espaço de forma diferente daquela para a qual ele foi pensado originariamente.
Essa apropriação pode se dar pelo nome (ou apelido) que a população dá ao
lugar ou mesmo pelo uso do espaço, para além do que foi projeto inicialmente.
No caso de Uberlândia a autora faz um destaque para as características físi-
cas e naturais da praça: bancos, escadas, vegetação, topografia. Vemos ainda os
usos do espaço modificados pela população. A praça como espaço de trabalho
e produção e como espaço de lazer e transgressão das populações mais jovens.

! Aqui temos uma possibilidade de articulação com a Geografia.


Vincular o estudo do espaço historicamente e geograficamente é im-
portante para que os estudantes percebam que esses conhecimentos
estão relacionados às nossas ações mais simples, como andar pela rua.

21
Metodologia do Ensino de História III

Os exemplos discutidos aqui nos apontam as possibilidades de apresenta-


ção e discussão da história a partir do estudo do lugar: lugar de vida, lugar de
trabalho, lugar de luta. Lugar de mudança e de transformação. O lugar de cada
um de nós.

1.7 O ensino de história e as tecnologias da comuni-


cação: a história virtual a partir das possibilidades reais
As Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) podem ser definidas
como um conjunto de recursos tecnológicos (computadores, televisão, apare-
lhos celulares, etc.), conjugados com um objetivo comum (PACIEVITCH, 2009).
Esses recursos podem ser utilizados das mais diversas formas e em diferentes
lugares de trabalho. As TICs passam a compor o cenário educacional, na medida
em que são demandadas na formação dos trabalhadores, para atender às novas
exigências dos processos produtivos.
São diversas as técnicas utilizadas, dependendo dos modos de produção. Po-
dem ser manuais, mecânicas, microeletrônicas, nucleares, de acordo com o tipo
de atividade e de trabalho envolvido (TAVARES, 2004). Daí, as múltiplas bases
técnicas que vemos no nosso cotidiano.
A inserção da tecnologia na educação faz parte de um processo mais amplo
de reestruturação do sistema em que vivemos, que envolve todos os trabalha-
dores, inclusive aqueles ligados à escola - os que já estão atuando, no nosso caso
especialmente os professores, e os que ainda estão em processo de formação.
Assim, compreender a introdução e a apropriação desses conhecimentos
pelo professor se tornou fundamental, na medida em que a utilização da infor-
mática pode trazer alterações significativas para o trabalho docente.
Sabemos da importância da inserção e da utilização dos recursos de infor-
mática nas escolas, assim como em outros espaços educativos, como meio de
otimizar o trabalho docente e aprimorar o processo de ensino-aprendizagem.
Todavia, também sabemos das dificuldades que envolvem essa questão. O aces-
so à internet nem sempre é possível por questões técnicas (falta de conexão) ou
financeiras (o custo do acesso a um provedor).
A formação de professores e técnicos também nem sempre acontece a con-
tento, sendo que em muitos casos o desconhecimento dos programas e das
máquinas dificulta ou, em última instância, inviabiliza o uso de computadores e
similares nas escolas.
Entretanto, a despeito de todas as dificuldades, é fato que esse recurso já
chegou à escola e que podemos nos apropriar dele. A internet é uma porta aber-
ta para novos conhecimentos e contatos. As redes sociais permitem a troca de
informação, a articulação das pessoas, a informação em tempo real, além do
compartilhamento de conhecimentos e práticas, o que pode ajudar em muito o
professor no seu dia-a-dia.
Assim, propomos a discussão de dois projetos, ainda em fase de implantação,
que envolvem o uso de computadores e redes no ensino de história. Um deles
propõe a instalação de um museu virtual a partir da digitalização do acervo do
Museu de Artes e Ofícios, de Belo Horizonte. O segundo projeto propõe a criação
de um museu virtual que divulgue imagens da arte africana e afrodescendente,
com o objetivo de promover a inclusão.

1.7.1 O museu virtual como realidade escolar


Neste tópico, vamos discutir o projeto de criação de um museu virtual, como
proposta para o ensino de história. Trata-se de uma experiência ainda em fase de
implantação, desenvolvida pelo professor Eucídio Arruda, da Universidade Fede-

22
Metodologia do Ensino de História III

ral de Uberlândia. A ideia de discutir esse projeto, além de nos informar sobre as
ações desenvolvidas por pesquisadores, envolvendo os recursos da informática,
nos aponta possibilidades, ainda que em escala reduzida, para a nossa prática
diária.
O uso da internet como mediação para o ensino de história é fator importan-
te a ser discutido nos cursos de formação docente. Por essa razão, apresentamos
este projeto. O autor, que tem vasta experiência na pesquisa sobre o uso da in-
formática no ensino de história, considera importante admitirmos outras formas
de experiência escolar, baseadas na cultura digital. Além dessa ferramenta, o tra-
balho tem como vinculação teórica as noções de história-memória. É importante
destacarmos a aproximação desse referencial com os outros autores estudados
anteriormente.
O trabalho é apresentado pelo autor a partir de uma avaliação do museu,
do público e do acesso das pessoas a esse espaço. Para o autor, a ausência de
museus em grande parte das cidades dificulta a disponibilidade presencial. As-
sim, a internet amplia as possibilidades de acesso a pessoas distantes no espaço
dos museus tradicionais. Nesse sentido, já foi possível avaliarmos até aqui essa
dificuldade, não é mesmo? Basta verificarmos quantos museus temos nas nossas
cidades do interior.

Os objetivos do projeto explicitados pelo autor são:


● analisar as estratégias pedagógicas possíveis a partir do uso da internet
como plataforma de trabalho, e
● elaborar uma versão virtual do Museu de Artes e Ofícios, cuja sede física
fica em Belo Horizonte.

Saiba Mais:
A visita virtual ao Museu de Artes e Ofício (MAO) pode ser feita a partir
do site do Museu: http://www.mao.org.br/port/default.asp

O Museu de Artes e Ofícios, conforme o site da instituição, “é um espaço


cultural que abriga e difunde um acervo representativo do universo do trabalho,
das artes e dos ofícios do Brasil. Um lugar de encontro do trabalhador consigo
mesmo, com sua história e com o seu tempo”.
As ideias que fundamentam o projeto são a possibilidade de criação de no-
vas ações no âmbito da educação patrimonial, considerando, para isso, o uso
do computador e da internet. Assim, a utilização de novas mídias abre a pos-
sibilidade de novas aprendizagens. Além disso, as novas linguagens utilizadas
nessas ferramentas – computadores e redes – estão relacionadas a novas formas
de pensar e compreender a construção dos saberes.
Sabemos que a linguagem virtual admite tantas possibilidades quantas são
as formas de apresentação dos conteúdos: sons e imagens associados a movi-
mentos, em formatos diferentes daqueles rotineiramente utilizados por nós.
Essa diversidade de formatos é uma oportunidade para a ampliação da concep-
ção de mundo de crianças e jovens e uma forma de ampliar a compreensão da
sociedade e de seus processos históricos importantes.
O autor apresenta a possibilidade de buscarmos novas fontes para o estudo
e o ensino de história: as fontes virtuais. Nesse novo espaço, são possíveis as tro-
cas culturais a distância. Isso era algo impensado antes do MSN ou do Youtube.
Hoje, podemos nos comunicar com pessoas conhecidas ou não, em tempo real
ou por meio de mensagens, que podem ser escritas ou exibidas em formato de
pequenos filmes. Viu quanta diferença?

23
Metodologia do Ensino de História III

! O MSN é o nome mais comum do Windows Live Messenger, um pro-


grama de mensagens instantâneas, que possibilita a comunicação em
tempo real, o compartilhamento de informações. O Youtube é um site
de compartilhamento de vídeos.

O museu virtual pode ser apresentado como um arquivo em um CD-ROM


ou visitado via internet, on-line. Temos aqui o passeio virtual como possibilidade
educativa.
Esse projeto mostra o espaço virtual como espaços de formação e informa-
ção. O autor destaca uma crítica feita ao ambiente virtual e suas derivações: o
fato de o tempo ser mais rápido na internet. Tudo pode ser feito e desfeito ao
toque do mouse. Entretanto, desmistificando a valorização da efemeridade da
informação nos aponta a possibilidade de utilizar essa característica a favor da
aprendizagem. Isso é possível, segundo o autor, ao apresentarmos o conteúdo
explorando as possibilidades da ferramenta: problemas do cotidiano, novidades
e curiosidades como forma de aproximação da criança e do jovem com a his-
tória. O tempo acelerado da microinformática passa a ser aliado para o estudo
da história, na medida em que traz elementos do cotidiano em tempo real para
dentro da sala de aula.
A metodologia utilizada pelo autor foi a identificação dos sites, páginas de
internet, blogs, que disponibilizem acervos digitalizados e, a partir daí, a criação
de um banco de dados que ficará à disposição de professores e estudantes da
educação básica para consulta. Todavia, identifica um problema: entre os sites
já cadastrados, são poucos os que possibilitam a interação do internauta com o
ambiente virtual. Isso faz com que nos remetamos à famosa aula expositiva, em
que o estudante ouvia o professor sem poder se manifestar. A visita torna-se um
passeio sem diálogo, o que empobrece a ação educativa.
Outras limitações apresentadas: poucos professores fazem uso de sites virtu-
ais. Lembramos aqui as dificuldades já discutidas anteriormente: falta de familia-
ridade com computadores e, consequentemente, com a internet; falta de acesso
e o alto custo do acesso. E ainda são poucos os museus que disponibilizam acer-
vos digitalizados. Essa ação também é onerosa e os museus são reconhecida-
mente instituições de poucos recursos, o que torna fundamental o aumento no
investimento público nessa área.

1.7.2. Inclusão virtual: a história da África e dos afrodescendentes


ao alcance do mouse
Neste tópico, vamos analisar um projeto de inclusão virtual. O texto discuti-
do nos remete ao uso da internet como mediação para o ensino de história.
Trata-se de projeto desenvolvimento por pesquisadores da Universidade Fe-
deral da Paraíba, que prevê a criação de museu virtual de imagens da cultura
africana e afrodescendente. A iniciativa nos remete à Lei 10.639/2003, que de-
termina que nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e
particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre história e cultura afro-brasileira.
A iniciativa, portanto, vem ao encontro dessa determinação.
Os autores admitem a inclusão digital como pressuposto para a inserção na
sociedade da informação. A proposta se reveste de grande importância se con-
siderarmos o grande índice de exclusão histórica da população nordestina nos
processos educativos, especialmente aqueles relacionados à tecnologia.

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Alguns autores, mais críticos, reconhecem que essa denominação –
Sociedade da Informação - esconde a real exclusão em que vive a maior
parcela da população mundial, especialmente nos países mais pobres,
onde o analfabetismo, os altos custos do acesso às redes de computa-
dores e às máquinas, impedem o amplo acesso da população à infor-
mação difundida na rede mundial de computadores.

Os desafios do projeto são muitos. A necessidade de desenvolvimento cien-


tífico a partir da inclusão digital é importante para todo o país. Além disso, inser-
ção das populações afrodescendentes é premente, visto que a maior parte delas
encontra-se fora da escola formal, em decorrência da exclusão social e econômi-
ca experimentada desde a constituição do Brasil como nação por essa parcela
da população.
Nesse contexto, evidentemente, os entraves são muitos. A exclusão de gran-
de parte da população afrodescendente da escola formal dificulta o acesso e o
trabalho no ambiente digital. Sem saber ler e escrever é quase impossível o do-
mínio do ambiente virtual. Isso leva ao que ficou conhecido como analfabetismo
digital: pessoas que não conseguem lidar com essa tecnologia e, por isso, ficam
fora de ações comuns do cotidiano, como usar o caixa eletrônico de um banco
ou se inscrever no Enem, por exemplo.
Se pensarmos nos escassos processos de escolarização e em como o estudo
da história da África e dos afrodescendentes é realizado veremos quão difícil é
a tarefa. Daí, a necessidade de ações afirmativas para o resgate das tradições
africanas e afrodescendentes, especialmente aqueles que vinculam o uso de tec-
nologias da informação e comunicação.
A criação do museu virtual, uma das metas do projeto para a informação
e valorização da diversidade cultural, ainda está em andamento. A proposta é
a difusão permanente de imagens para alunos das camadas populares, histo-
ricamente privados de formação acadêmica e cultural. Essas crianças e jovens
terão aí a possibilidade de acesso a imagens antes restritas àqueles que tinham
a oportunidade de visitar um museu pessoalmente.
O museu virtual possibilitará a elaboração de um currículo que contemple
a diversidade étnico-racial, além de aproximar os conteúdos das realidades dos
estudantes da Paraíba. Cabe destacar a valorização do patrimônio material das
culturas africana e afrodescendente, privilegiado nesse espaço.
No museu virtual, a divulgação se dará de forma permanente para alunos
e professores do ensino formal, não-formal e para o público em geral, possibi-
litando a vulgarização do conhecimento histórico e cultural, até aqui restrita a
pequenas parcelas da população.
Será possível também a criação de uma rede de comunicação, por meio
da qual os visitantes poderão trocar informações e experiências, contribuindo,
inclusive, para o acervo do museu. Essas trocas serão possíveis a partir da in-
tegração dos visitantes por blogs, fóruns e chats via web. Se considerarmos a
participação de outros visitantes, em outros países, entenderemos a imensa ca-
pacidade de integração do projeto.
No espaço virtual proposto serão possíveis as seguintes atividades: blogs,
chats, fóruns, como forma de estimular a criatividade dos visitantes, aproximar
os jovens da informática, ampliando, assim, as possibilidades de aprendizagem
e relacionamento desses sujeitos. Tais ferramentas extrapolam os espaços geo-
gráficos e os diferentes tempos, tornando viável a aproximação de pessoas em
tempo real, apesar das distâncias físicas.

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Os autores indicam a existência de várias categorias de museus
virtuais. O museu brochura caracteriza-se por ser um site com infor-
mações básicas sobre determinada temática, sendo limitado nas inte-
rações e trocas entre os usuários. O museu conteúdo, de caráter mais
ampliando que o anterior, apresenta as coleções, com possibilidade de
visita on-line. Enfim, o museu aprendizagem guarda a possibilidade
maior de interação entre o visitante e o espaço virtual. Reconhecemos,
nesse espaço, maior qualificação da aprendizagem, com a participação
ativa dos sujeitos, com maior elaboração do conhecimento disponível.

Os desafios não são pequenos. Entre eles, a democratização do conhecimen-


to - tão perseguida também nos espaços presenciais. Além disso, é fundamental
a ampliação do conhecimento científico e tecnológico, sem o que fica inviável a
utilização desse recurso.
O acesso limitado ao conhecimento - que empobrece o desenvolvimento
acadêmico de crianças e jovens, levando a condições subalternas na sociedade
- também é limitado quando essas crianças e jovens não têm domínio da infor-
mática, fundamental no mundo hoje.

1.8 Em busca de conclusões...


O estudo da história nos remete a reflexões, problematizações e às vezes
mais dúvidas do que certezas. Essa busca incessante pela compreensão do mun-
do e da sociedade nos move e permite que tenhamos sempre uma motivação a
mais para buscar novas explicações para problemas já respondidos.
Assim, a proposta desse texto é fomentar a discussão e o debate, abrindo
possibilidades para o ensino e a pesquisa histórica, buscando uma maior inte-
gração dos sujeitos com os objetos, especialmente de crianças e jovens com os
diversos temas propostos nas escolas.

Para Le Goff
Sempre coube à história desempenhar um papel social, no mais amplo sen-
tido; e em nossa época, em que esse papel é mais do que nunca necessário, a
história nova, se lhes forem proporcionados os meios de pesquisa, de ensino (em
todos os níveis escolares) e de difusão de que necessita, está em condições de
desempenhá-lo. (2001, p.51)
Quando o autor francês fala da necessidade do conhecimento histórico na
época atual, é provável que não tivesse em mente, a princípio, os problemas pró-
prios dos países em desenvolvimento. Ainda que os rótulos oficiais e econômi-
cos nos distanciem do mundo subdesenvolvido, vivenciamos situações que nos
mostram que no nosso país, a educação está longe de ser a desejável. Acredita-
mos que o ensino de história vivenciado de forma satisfatória, com condições
adequadas de ensino e de desenvolvimento das ferramentas próprias do saber
histórico pode contribuir para alterar esse estado de coisas.
Infelizmente, sabemos que grande parte dos jovens brasileiros não têm aces-
so a escolas de qualidade, alguns a escola alguma. Por isso, nosso desejo é que
desse trabalho partam novos questionamentos e novos direcionamentos, que
auxiliem na definição de novos padrões sociais, nos quais crianças e jovens pos-
sam ter acesso à educação que lhes é direito e a uma história diferente daquela
escrita até aqui.
Recuperar a memória, reconstruir experiências, é buscar compreender o vi-
vido e o não vivido. Essa compreensão é fundamental para a construção de uma
sociedade mais justa e mais solidária. E para a escrita de uma outra história.

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