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Dissertação de Mestrado Mario Cabral de Almeida - unifESP

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO

ESCOLA DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

MARIO CABRAL DE ALMEIDA

VIOLAS URBANAS:
A expressão de uma arte popular e a configuração desse fenômeno
na cidade deGuarulhos

Orientador: Prof. Dr. José Carlos Gomes da Silva

Guarulhos
2021

1
MARIO CABRAL DE ALMEIDA

VIOLAS URBANAS:

A expressão de uma arte popular e a configuração desse fenômeno


na cidade deGuarulhos

Dissertação apresentada à Universidade Federal de


São Paulo – Escola de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas, como requisito parcial para obtenção
do título de Mestre em Ciências Sociais.
Orientador: Prof. Dr. José Carlos Gomes da Silva

Guarulhos
2021
Na qualidade de titular dos direitos autorais, em consonância com a Lei de direitos autorais nº
9610/98, autorizo a publicação livre e gratuita desse trabalho no Repositório Institucional da
UNIFESP ou em outro meio eletrônico da instituição, sem qualquer ressarcimento dos direitos
autorais para leitura, impressão e/ou download em meio eletrônico para fins de divulgação
intelectual, desde que citada a fonte.

Almeida, Mario Cabral.

Violas Urbanas: A expressão de uma arte popular e a configuração desse fenômeno na cidade de Guarulhos /
MarioCabral de Almeida. – 2021. – 100 f.

Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Guarulhos: Universidade.

Federal de São Paulo. Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas.

Orientador: Prof. Dr. José Carlos Gomes da Silva.

Urban Violas: The expression of a popular art and the configuration of this phenomenon in the city of Guarulhos.

1. Violas. 2. migração. 3. violeiros. 4. arte. I. Silva, José Carlos Gomes. II. Violas Urbanas: A expressão de
uma arte popular e a configuração desse fenômeno na cidade de Guarulhos.

3
MARIO CABRAL DE ALMEIDA

VIOLAS URBANAS:

A expressão de uma arte popular e a configuração desse fenômeno na cidade de


Guarulhos

Dissertação apresentada à Universidade Federal de

São Paulo – Escola de Filosofia, Letras e Ciências

Humanas, como requisito parcial para obtenção do

título de Mestre em Ciências Sociais.

Aprovada em: 22/ 09 / 2021

Banca examinadora:

Prof. Dr. José Carlos Gomes da Silva (Presidente da Banca)

Instituição: Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)

Julgamento Assinatura

Prof. Dr. Alberto Tsuyoshi Ikeda ( Examinador Externo)

Instituição: Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP)

Julgamento Assinatura

Prof. Dra. Andrea Cláudia Miguel Marques Barbosa (Examinador Interno )

Instituição: Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)

Julgamento Assinatura
AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, “seu” Joventino e Dona Erotildes, migrantes paraibanos,
pela vida e por tudo! Agradeço às professoras Alessandra El Far e Andréa Barbosa, que
me ajudaram muito na feitura do projeto de mestrado que culminou nessa dissertação, e
do querido mestre Lindolfo Campos Sancho que também contribuiu.

Agradeço também ao professor Dr. José Carlos Gomes da Silva que acolheu essa
pesquisa e me ajudou muito na orientação do recorte sobre cultura popular e do que se
trata o fazer antropológico.

Agradeço também ao professore Ivan Vilela, excelente violeiro e professor


universitário, que me ensinou muito sobre o que é ser Caipira e a configuração e
enraizamento da Cultura Caipira, e ao professor Alberto Ikeda, grande mestre de cultura
popular, exímio pesquisador e professor, que colaborou e contribuiu muito para o meu
aprimoramento intelectual. À CAPES, por me ajudar com o financiamento da pesquisa e
incentivar a produção de conhecimento no Brasil. E, por fim, uma menção especial ao
meu colega, professor Gustavo Santos Barboza, cujo apoio, incentivo e ajuda foram
inestimáveis para a realização da pesquisa e de todos os artigos relacionados a ela. E
agradeço imensamente, também, aos violeiros e agentes culturais que colaboraram com
esse trabalho.

Lamentando por não poder entrevistar mais pessoas que certamente enriqueceriam
essa pesquisa, ficam descritos aqui os nomes dos artistas que nos concederam seus ricos
depoimentos: “seu” Oliveira, Anthony Ventura, ZéHelder e Orlando Alvorada, esses da
linguagem Caipira da viola e Antônio Dantas, Dedé Laurentino e Gilberto Alves, esses
representantes da linguagem Repentista.

E um agradecimento, mais que especial, à promotora cultural e cantora Áurea


Fontes, grande dama da música Caipira no município de Guarulhos, um monumento da
viola para a cidade, que manteve por anos o “Viola Viva”, evento de música raiz, há 25
anos, sustentando essa bandeira na cidade, apesar de percalços e dificuldades!
DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a todos os agentes culturais que difundem e fomentam a viola, em
suas diversas linguagens, em todo o país, mas, fazendo um recorte, dedico aos violeiros e
apoiadores de Guarulhos, repentistas e caipiras que estão fomentando sua arte e divulgando
cultura popular para nós, com zelo e apreço e com ínfimo apoio do poder público, isto quando
há. Abaixo, seguem duas estrofes dos dois estilos que este trabalho se propôs a investigar, um
exemplo da Viola Nordestina Repentista e o outro de uma toada da Viola Caipira:

A viola um marco cultural


Conservada em diversas gerações
Transmitindo alegria e emoções
Com a sua riqueza natural
Conduzindo um padrão original

Pra também ser irmã e companheira


Do Baião, Xaxado, Xote e
Rancheira berimbau, realejo e
concertina
Venha ver a Viola Nordestina
Defendendo a cultura brasileira.

(Mote Decassílabo, de Moacir Laurentino e Sebastião da Silva, dupla de repentistas


paraibanos, no LP: Sua Majestade a Viola, de 1985, pela Gravadora Chantecler).

Viola Cabocla é bem brasileira


Sua melodia atravessou fronteira
Levando a beleza para terra estrangeira
Do nosso sertão é a mensageira
É o verde-amarelo da nossa bandeira.

(Viola Cabocla, toada caipira de Tonico e Tinoco, gravada por vários artistas. Dentre
tantos, pela dupla: Tião Carreiro e Pardinho, no LP Viola Cabocla, pela Gravadora
Continental, 1973).
Uma homenagem também a:

Totonho do Sertão (cantador


repentista pernambucano), que viveu
em Guarulhos nas décadas de 80 e
90, um desbravador do Repente.

Fonte: Capa de LP (Arquivo Pessoal).

In memorian: Índio Cachoeira (Mestre da Viola


Caipira, que residiu em Guarulhos muitos anos, um
virtuose das 10 cordas!) Fonte: Internet.
RESUMO

Essa pesquisa buscou compreender como se construiu e se mantêm os fenômenos


musicais da Viola Caipira e da Viola Repentista na cidade de Guarulhos. Investigou como
a viola, esse instrumento musical de origem de zonas rurais, mantém-se vivo na cidade.
Buscamos, através de entrevistas e pesquisas bibliográficas, entender a história dessa
manifestação artística e a trajetória dos agentes culturais que praticam e difundem essa
arte e, neste pleito, conhecemos alguns violeiros e promotores culturais que expressam
essa cultura e a sua relação com o município e descrevemos um pouco de suas
experiências e perspectivas sobre o que é a viola hoje, mostrando um foco vivo, atual e
atuante dos violeiros que residem na cidade de Guarulhos, que são frutos do grande fluxo
migratório que aconteceu nas décadas de 70, 80 e 90. Exploramos a arte musical da viola,
em sua riqueza de “causos”, significados para os que migraram para a cidade, as
afinações que são usadas em Guarulhos, fazendo uma fundamentação histórica e também
atentando-nos aos saberes e depoimentos de algumas pessoas ligadas a esse meio
artístico. Neste município, detectamos as afinações Mi Cebolão, para os violeiros que
propagam a arte Caipira e a Afinação de Cantoria, para cantadores do Repente Nordestino
como sendo as mais difundidas, além de ressaltar a relevância da cidade como acolhedora
de migrantes de várias regiões do país, aglomerando, em sua maior parte, migrantes
nordestinos, mineiros, goianos, do interior paulista, mais precisamente, na periferia do
município, onde vivem a maior parcela de artistas migrantes que preservam e difundem
sua arte, dando à viola um tom urbano.

PALAVRAS-CHAVE: violas, migração, violeiros, cidade, arte.


ABSTRACT

This research seeks to understand how the musical phenomena of Viola Caipira
and Viola Repentista were built and sustain in Guarulhos city. This research investigated
how viola, a musical instrument from rural areas, is kept alive in the city. We tried,
through interviews and bibliographic research, to understand the history of this artistic
expression and the trajectory of cultural agents who practice and spread this art, which in
this case, we met some guitar players and cultural promoters who express this Culture and
its relationship with the municipality and we describe a little of their experiences and
perspectives on what Viola is today, showing a live, current and active focus of the guitar
players who live in Guarulhos city, being the result of the great migratory flow that
happened in the 70s, 80s and 90s. On this research, we’d explored the musical art of
Viola, in its wealth of stories, meanings for those who have migrated to the city, the
tunings that are used in Guarulhos, making a historical foundation and also paying
attention to the knowledge and testimonies of some people connected to this artistic
environment. Around the city, we detect that the most widespread are the ‘Cebolão’ E
tunings, for guitar players who propagate the ‘Caipira’ art, and the ‘Cantoria’ Tuning,
which singers of the northeastern sudden use, in addition to highlighting the relevance of
the city as a welcoming place for migrants from several regions of the country, which
agglomerated, in its most, migrants from the Northeast, Minas Gerais, Goiás, the São
Paulo countryside, more precisely, from the outskirts of the city, where the largest quota
of migrant artists who preserve and disseminate their art live, giving to the viola an urban
tone.

KEYWORDS: violas, migration, violeiros, city, art.


Tabela de abreviaturas:

S. O. “seu” Oliveira

A.F. Áurea Fontes

Z.H. ZéHelder

A.V. Antony Ventura

A.D. Antônio Dantas

D. L. Dedé Laurentino

G.A. Gilberto Alves


SUMÁRIO

CAPÍTULO I – GUARULHOS; CONTEXTOS E RAZÕES HISTÓRICAS ..........18

1.1. Um Histórico Anterior ..........................................................................................20

1.2. A Festa da Carpição ..............................................................................................22

1.3. Uma Trajetória Cultural ......................................................................................24

1.4. Áurea Fontes e o Viola Viva .................................................................................30

CAPÍTULO II – A VIOLA EM GUARULHOS, TRADIÇÃO E MÚSICA


POPULAR ....................................................................................................................34

2.1. A Viola Caipira .....................................................................................................35

2.1.1 Os Mensageiros dos Santos Reis .........................................................................37

2.1.2 Os Favoritos do Catira ........................................................................................39

2.1.3 Orquestra de Violeiros “Coração da Viola” ......................................................39

2.1.4 Duplas e Artistas Solo ........................................................................................41

2.2. A Viola Repentista.................................................................................................42

2.2.1 O Improviso .........................................................................................................44

2.2.2 As Métricas Poéticas ...........................................................................................47

2.2.3 A Divulgação das Cantorias ................................................................................49

CAPÍTULO III-A VIOLA NO CONTEXTO GUARULHENSE


CONTEMPORÂNEO: ................................................................................................52

3.1. Violeiros no Presente .............................................................................................52

3.2. As Entrevistas ........................................................................................................55

3.2.1 Os Representantes da Viola Caipira ...................................................................55

3.2.2 - Os Representantes da Viola Repentista............................................................64

CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................70

ANEXOS ......................................................................................................................72

REFERÊNCIAS ...........................................................................................................94
INTRODUÇÃO
As questões que mobilizaram essa pesquisa são: como sobrevive na metrópole
uma cultura que tem origem nas zonas rurais do país 1? E como ela se expressa na
cidade de Guarulhos? Tais indagações vêm à baila pois, como morador da cidade e
filho de migrantes paraibanos, o universo da viola, tanto Repentista dos violeiros do
Nordeste como a Caipira dos violeiros do Sudeste, sempre estiveram presentes em meu
cotidiano, tanto ouvindo as músicas pelos discos ou pelo rádio, quanto em apresentações
desses artistas em toda cidade, sendo esse cenário um reflexo do grande fluxo
migratório que ocorreu no município entre as décadas de 70 e 90 do século XX.

Como a viola e as manifestações artísticas a ela relacionadas fazem parte da


trajetória sócio-histórico-cultural do município? Como, através de gerações, ela
permanece como a “voz” de muitos migrantes e de seus descendentes? Essa é a espinha
dorsal em que essa pesquisa foiconcebida e buscou descrever alguns aspectos.

Nessa pesquisa foram abordadas duas linhas de análise do objeto, uma de viés
histórico e a outra de cunho antropológico, devido à oferta de publicações, documentos e
divulgação. Por se tratarem de artistas de expressão da Viola Caipira na cidade de
Guarulhos, fez-se necessário não só as entrevistas e etnografias que fizemos com os
violeiros mas, também, uma pesquisa bibliográfica e documental para embasar nosso
texto e reconhecer as perspectivas e trabalhos já produzidos acerca do tema (HANSSEN;
HELFSTEIN, 2016).

O etnomusicólogo Rafael J. Menezes Bastos, tem a seguinte citação para compor a


argumentação de nossa pesquisa: “Se os musicólogos ignoram o povo, os antropólogos
ignoram o som” (MENEZES BASTOS, 2014, p.9). Nessa afirmação, o autor faz uma
crítica aos estudos referentes à música que só focam o som como objeto, desconsiderando
os aspectos social e cultural da música produzida por um determinado povo e/ou

1 A viola e as manifestações artísticas onde ela se insere, são uma das nossas heranças culturais mais
latentes e difundidas pelo Brasil. Trazida pelos colonizadores portugueses, aqui sofreu influência dos
indígenas e suas tradições, passando pela contribuição africana através dos escravizados, com seus ritmos e
musicalidade, tornando-se, então, um instrumento popular. Aqui no Brasil, ela floresceu nos interiores e
zonas rurais. Rica em vários estilos e afinações, está atrelada a várias festas populares e estilos musicais em
várias regiões, como podemos destacar: a Folia de Reis, a Catira, a Dança de São Gonçalo, o Cururu Paulista
(no Sudeste) e também, entre os repentistas nordestinos, o Samba Chula, do Recôncavo Baiano, para citar
algumas manifestações onde ela se insere. Para mais estudos acerca do assunto, ver: CORRÊA, 2000 e
VILELA, 2013.

12
comunidade, mas também aos antropólogos que desconsideram as sonoridades. O autor
levanta a questão de que, muitos trabalhos sobre música popular respaldam
equivocadamente suas análises em referenciais teóricos da música erudita. Em
contrapartida, também aponta, na mesma frase, que a grande maioria dos estudos
antropológicos é insensível à sonoridade, não se atentando aos aspectos da produção
sonora de um determinado grupo social como uma de suas marcantes características
culturais2. É nessa entrelinha que fica calcada esta dissertação, que busca descrever e
apresentar essa expressão musical, não pelos moldes teóricos do campo musical, muito
menos restringindo nossos entrevistados a meros informantes para endossar nossas ideias,
mas privilegiando o fato de que suas “vozes”, nesse trabalho, sejam ouvidas e que eles
falem de sua música, de sua arte, pois nesse processo percebemos o quanto ainda temos
que aprender com eles.

Já, no tocante à expressão da Viola Repentista, respaldamo-nos na metodologia


de análise do antropólogo norte-americano Clifford Geertz (1926-2006), cuja concepção
de estudos é etnografar, descrever densamente e construir uma leitura acerca da ação
pesquisada, buscando entender e codificar o que esses violeiros nos informaram, foi a
estratégia privilegiada, pois, para o autor, o antropólogo é aquele que “escreve” e a
principal característica da etnografia é “inscrever o discurso social para futuras
inspeções” (GEERTZ,1989). Assim, fomos em busca de trabalhos, livros, tratados e
outros materiais que falassem dessa outra linguagem da viola na cidade em questão,
porém, não encontramos registros sobre este importante fenômeno, por isso, foi de
muita valia o recurso às entrevistas com os cantadores repentistas para compor nosso
objeto de investigação que, nesse sentido, torna-se algo “novo ante ao silenciamento
histórico” sobre o tema em Guarulhos 3.

2 É nesse sentido que o antropólogo Thiago Oliveira Pinto apresenta a proposta da especificidade da
Antropologia Sonora: “A antropologia sonora entende a música para além de seus aspectos estéticos,
observando-a como forma de linguagem e comunicação, com códigos próprios que desvelam
comportamentos e identidades, e que é, portanto, universal, na medida em que sua existência está presente
em qualquer sociedade e, de outro lado, é singular e de difícil tradução quando fora de seu contexto social”
(OLIVEIRA PINTO, 2001, p. 233).

3 Para efeito de clareza, reforçamos aqui: Já existe uma gama de trabalhos acadêmicos ou não, dentre
periódicos, teses, dissertações, livros e monografias sobre o Repente e a Viola Nordestina e/ou Repentista,
porém, em nossas buscas, não encontramos nenhum trabalho relacionado a esse estilo e modalidade com o
uso da viola no município de Guarulhos. Por isso nossa preocupação em descrever, da melhor maneira
possível essa expressão, que também usa a viola na sua execução, bem como a importância dos registros
orais dos cantadores que contatamos, moradores da cidade, sem os quais não teríamos respaldo para

13
Advém disso uma grande responsabilidade na produção dessa pesquisa. O estudo
também foi marcado por momentos de grande satisfação, pois nos permitiu também o
encontro com outros artistas que tocam suas violas, porém, com estilo musical diferente
do estilo Caipira na cidade. E, nessa descrição, marcada pela subjetividade, que
empreendemos a nossa investigação. A propósito e em acordo com Geertz, exercitamos
uma das características da “descrição densa”. Nessa perspectiva o autor admite a
incorporação da percepção subjetiva como algo inescapável à abordagem antropológica.
A nossa análise, embora marcada pela pertença ao universo pesquisado, apresenta-se
como uma “interpretação de interpretações”, não reivindicando, nesse sentido, um
privilégio ou superioridade objetiva conferida pela condição de “nativo”. Apresentamos,
portanto, nessa dissertação, um pouco dessa arte dos violeiros que vivem em Guarulhos e
como se inserem no universo cultural da cidade. Nossos sinceros votos são os de que
ambas expressões sejam mais conhecidas e divulgadas em todos os meios e locais
possíveis, que mais pesquisas sobre essas temáticas motivem novos pesquisadores e que
estes tenham mais espaço na Academia.

Fizemos também uma consulta relativa a fontes que abordavam estatísticas de


migração, história da cidade, principalmente a história cultural (negligenciada nos
autores consultados, salvo raros apontamentos superficiais), para um ponto de partida
sobre o lócus do estudo, porém, foi necessário o recurso aos “agentes vivos” que
difundem a viola em Guarulhos, para mostrar que, mesmo tendo uma larga trajetória, as
expressões culturais com o uso das violas se mantêm ativas. Assim, descartamos a ideia
muitas vezes associada à cultura popular, de abordá-la como parte do folclore ou fóssil
representativo do passado. A Viola Caipira é por nós apreendida como um fenômeno
articulado à cultura popular que, na perspectiva de Arantes (1981) deve ser vista como
algo contemporâneo e dinâmico.

Nossa abordagem foi, portanto, elaborada a partir da aproximação entre os


estudos sobre a viola enquanto fenômeno situado no amplo espectro da cultura popular
da cidade e, do ponto de vista mais metodológico, orientamo-nos pelos princípios da
Antropologia Interpretativa (GEERTZ, 1988) que, embora enfatize a subjetividade na
análise, lembra que entre a literatura e a etnografia existe uma distinção: uma foi

apresentarmos esta outra parte de nossa pesquisa.

14
efetivamente criação do autor, outra, os fatos antropológicos, embora recriados por meio
da escrita etnográfica – também por um autor – de fato aconteceram.

Se a interpretação antropológica está construindo uma leitura do que acontece,


então divorciá-la do que acontece – do que, nessa ocasião ou naquele lugar,
pessoas específicas dizem, o que elas fazem, o que é feito a elas, a partir de todo
o vasto negócio do mundo – é divorciá-la das suas aplicações e torná-la vazia
(GEERTZ, 1989, p. 13).

Essa dissertação é um recorte entre as manutenções e configurações dessa


expressão artística em Guarulhos, com enfoque nos conceitos de Identidade Urbana
(SANTOS, 2006), Sociabilidade (SIMMEL, 2006) e Cultura Popular (ARANTES, 1981)
que foram percebidos nas interações e entrevistas com os violeiros que contatamos.
Também concorrem para as nossas análises as contribuições de Eunice Durham (2004),
referência clássica nos estudos antropológicos sobre migrações e espaço urbano. Ademais,
ficou claro no decorrer da pesquisa que a Viola Caipira é um fenômeno que está imbricado
na questão da migração de pessoas das camadas populares em busca de melhores
condições de vida e atrelado à dinâmica econômica-histórica-social por qual a cidade
passou, cuja cultura, necessariamente, se reelabora e se reproduz num jogo dialético.
A migração não se apresenta como um deslocamento de indivíduos isolados,
mas se orienta de acordo com uma rede de relações sociais personalistas.
Mantendo e reformulando as relações sociais estabelecidas na terra de
origem, o migrante manipula o seu equipamento cultural tradicional para
conseguir um ajustamento satisfatório às novas condições de vida
(DURHAM, 2004, p. 200).

No Capítulo I: Guarulhos: Contextos e Razões Históricas, são tratados alguns


dos motivos que culminaram na migração e os desdobramentos desse fenômeno social
(na primeira parte), na segunda, é apresentado um breve histórico cultural da atuação
dos artistas violeiros aqui, já nos idos das décadas de 70, 80 e 90, para entendermos
como ainda se reproduz essa arte e a recorrência da mesma. No Capítulo II: A Viola em
Guarulhos: tradição e música popular, também dividido em tópicos, primeiramente
falamos da Viola Caipira e de suas características culturais e musicais, na perspectiva
dos entrevistados, depois abordamos a Viola Repentista, nos mesmos enfoques,
mostrando as especificidades de cada uma e os aspectos musicais peculiares que
ambas possuem em nosso contexto. E, por fim, no Capítulo III: A Viola no Contexto
Guarulhense Contemporâneo, buscamos sintetizar a análise histórica e cultural por
nós proposta, bem como o referencial teórico-etnográfico baseado em Geertz.

15
Tencionamos mostrar como essas manifestações artísticas ainda são reelaboradas na
cidade, e o que dizem os interlocutores que as fomentam, divulgam e “tocam” em
Guarulhos, cujos depoimentos coletados, mostram a vitalidade e a atualidade da viola,
mais especificamente no tópico “Linguagens Violeiras"4.

O intuito desta empreitada é, também, criar mais um referencial de estudos


culturais e expressar a diversidade artística existente em Guarulhos, dando ênfase à
memória e saberes locais dos munícipes, que mereceram maior atenção na
historiografia local tradicional, mas que não considerou com profundidade, as
manifestações populares dos migrantes, salvo raros trechos inseridos como curiosidades
ou tópicos sucintos em narrativas generalistas.

A capacidade dos antropólogos de nos fazer levar a sério o que dizem tem
menos a ver com uma aparência factual ou com um ar de elegância conceitual,
do que com sua capacidade de nos convencer de que o que eles dizem resulta de
haverem realmente penetrado numa outra forma de vida (ou, se preferir, de
terem sido penetrados por ela) - de realmente haverem, de um modo ou de outro,
"estado lá". E é aí, ao nos convencer de que esse milagre dos bastidores ocorreu,
que entra a escrita (GEERTZ, 2002, p. 15).

A pesquisa e o aparato metodológico


Em Geertz, temos uma pergunta que nos parece decisiva quando o tema é a
etnografia: “Como é possível para o antropólogo chegar a conhecer a maneira como o
nativo, e/ou povo pensa, sente e percebe o mundo?” (GEERTZ, 2002, p. 86). A resposta,
para ele, está relacionada à constante busca antropológica para se entender o mundo do
ponto de vista do nativo, do povo a ser pesquisado, capturando “experiências próximas”
para maior entendimento da vida social (aqui, cultural, se reportarmos tal perspectiva
para esta pesquisa). Pois, ao analisar a “cultura” como um “texto”, o autor deixa claro
que um interpretativo de um povo, fenômeno, ou cultura, implica em um esforço de

4 Em Guarulhos há vários nomes que divulgam essa arte, onde destacamos: “seu” Oliveira, a dupla Dalan e
Bueno, o músico e professor de Viola Caipira, pelo Conservatório Municipal de Guarulhos, ZéHelder, de
Minas Gerais, Cristal e João do Prado, Paulimar e Presidente, Zenon e Eli Silva, Joseval e Josiene, Edson
Fontes, Douglas Cruz, o Duo Quando o Inhambu Cantou no Meu Quintal, formado pelos músicos Antony
Ventura e Ricardo Santiago, o violeiro Amauri Falabella, Ricardo Dutra, a promotora do evento Viola Viva,
Áurea Fontes, dentre dezenas de artistas que fazem parte da cena cultural da cidade, fazendo de Guarulhos
um celeiro de violeiros (FONTES, 2014). Em Guarulhos também há vários repentistas tocando e cantando
repentes em bares, Casas do Norte (MAGNANI, 1998), em eventos culturais e festas de família, dentre eles
destacamos: Dedé Laurentino, do Ceará, Gilberto Alves, de Alagoas, Antônio Dantas, da Paraíba, Gerson
Bandeira, de Pernambuco, Severino Souza, paraibano, Chico de Oliveira, Luiz Ferreira, dentre muitos
outros.

16
“leitura”, fazendo com que “esta leitura aqui proposta” seja uma de muitas que possam
surgir em estudos referentes aos violeiros da cidade, sendo de valia, também, as
etnografias e sistemáticas observações em eventos e diálogos com os agentes culturais
que investigamos. Geertz defende que o antropólogo deve interpretar os significados
atribuídos pelos nativos. Tarefa que, para resultar em êxito, deve partir dos saberes e
conhecimentos do povo que se deseja pesquisar, em articulação com os conceitos criados
cientificamente. Assim, categorias acadêmicas não são desprezadas. O próprio autor se
refere a categorias como Ideologia, Identidade, Senso Comum, Nação e Poder como
estratégicos e os emprega em diferentes análises, porém, também enfatiza que não é a
teoria o primado da análise interpretativa, mas o lugar especial ocupado pela etnografia
da cultura.

Segundo o autor: “a cultura é como uma teia de significados construída pelos


próprios homens, de modo que a antropologia apresenta-se como uma ciência
interpretativa que está à busca desses significados” (GEERTZ, 1989). Salientando a
grande contribuição do fazer antropológico na análise de manifestações populares,
Arantes endossa esse argumento quando diz:

Ela propõe o máximo de aproximação possível entre o “observador” e a vida


cotidiana daqueles cuja cultura se quer estudar, para através de longa e profunda
convivência, definir e delimitar diálogos com ela, os problemas a serem
investigados (…) não basta explicitar o objeto de estudo, pois coloca-se
também a pergunta: quem é o povo de quem se fala? (ARANTES, 1981, pp. 59-
60).

A teoria e o método inspirados na “descrição densa” consistem em buscar o


máximo de detalhes e fatos para termos ciência, ao menos, de algumas características
do objeto, do evento, do fenômeno estudado, onde são notórias a expressão e difusão da
viola pela cidade, como produto das migrações de pessoas de diversas regiões que para
cá vieram e trouxeram “na mala” suas raízes e valores, como nos reforça a antropóloga
Alba Zaluar, no tocante ao ato de fluxos migratórios também serem “fluxos de cultura e
costumes”:

O antropólogo é sempre uma espécie de intermediário entre o grupo que


estuda e o resto do mundo, mas deve pensar continuamente sobre essa
particular intermediação que inclui o seu texto sobre as outras culturas ou
sociedades no circuito assim ampliado de comunicação entre os homens
(ZALUAR, 1997, p.114).

17
Durante a pesquisa foram captadas estruturas características comuns entre os
artistas e os ouvintes, como se expressam em suas interações nas atividades que
frequentam (shows, encontros de viola, etc.), onde os sujeitos trazem à baila valores
históricos, culturais e sociais similares, onde detectamos uma certa “unidade”, porém,
com cada indivíduo se manifestando de forma autônoma e reagindo das mais diversas
formas, mas sem quebrar a “unidade do grupo”5, uma convergência concernente
estritamente ao apreço musical, uma “unidade de valores” que são expostos pelo
“mundo exterior”.
Boa leitura e que ambos “toques de viola” e suas características socioculturais
os permitam conhecer mais sobre a arte que migrou para Guarulhos, e que mais
pesquisas e procuras por essa temática encontrem novos pesquisadores e tenham mais
visibilidade nas universidades.

5 Esta “unidade” que detectamos é em relação ao cultivo da arte que promovem, ou seja, nas manifestações
musicais com as violas. Vemos essa unidade em práticas de divulgação, promoção, participação, e também
em um ponto em comum que este trabalho se propôs a detalhar, não considerando posições políticas, crenças
religiosas e valores morais, focando a análise no campo artístico e musical. Segundo Geertz, é inconcebível
a divisão de Etnografia (descrição e coleta de dados) e Etnologia (análise dos mesmos), para ele, são
indissociáveis e ocorrem de maneira simultânea em campo e na sistematização do estudo.

18
CAPÍTULO I – GUARULHOS: CONTEXTOS E RAZÕES HISTÓRICAS.

Recorrendo a fontes impressas e, também, atentando ao que nos foi dito pelos
artistas violeiros, ficaram latentes os temas “migração, trabalho e emprego” como os
motivos principais de suas “arribações”, cabendo pois, tais temas, na chave das
“estratégias de sobrevivência” - proposta na perspectiva antropológica de Eunice Ribeiro
Durham, onde ela frisa que os indivíduos que migram para grandes centros e/ou cidades
com grande oferta de indústrias, geralmente há um adensamento da população desses
locais e que, apesar da diversidade cultural que cada um traz, há uma “uniformidade” e
“familiaridade”6 nos motivos que levam à mudança de seu “chão para outro lugar”
(DURHAM, 2004). Os motivos para migrar são muito semelhantes e no intuito de vir
para trabalhar e se manter, acabam trazendo “na mala” sua cultura, seus hábitos e valores
que vão se agregando aos dos locais para onde migram, fazendo com isso uma
reconfiguração de culturas, costumes, mostrando o quão a cultura é moldável e dinâmica
(DURHAM, 2004).
Hoje, a cidade de Guarulhos possui um importante setor industrial ao qual se
somam o comércio e os serviços e, ainda que concentre um grande pátio industrial nas
adjacências das principais rodovias (a Presidente Dutra – BR 116 e a Fernão Dias – BR
381), onde se nota uma grande ocupação humana, mantém características de uma cidade-
dormitório e com resquícios muito peculiares da população migrante (SANTOS, 2006 e
NORONHA; ROMÃO, 1980). De forma geral, as áreas de loteamentos e os novos
bairros que começaram a se desenvolver entre as décadas de 1970, 1980 e início dos
anos 90, ainda careciam de infraestrutura, equipamentos e serviços públicos de
qualidade, assemelhando-se a quase todas as periferias de cidades que compõem a Zona
Metropolitana de São Paulo 7, onde se formam pequenos núcleos de populações afastadas

6 Eunice Ribeiro Durham, junto com Teresa Pires do Rio Caldeira, Elisabete Bilac e José Guilherme Cantor
Magnani, constataram essas similaridades nas razões do por que muitos indivíduos migram, em estudos
realizados nas cidades paulistas de São José dos Campos, Rio Claro e Marília (região interiorana, mas com
forte industrialização e urbanização), para compreender melhor os diversos tipos de urbanização,
crescimento de cidades e fluxos migratórios. Para mais informações acerca desse assunto, ver: DURHAM,
2004.

7 A Região Metropolitana de São Paulo concentra 39 municípios e é o maior polo de riqueza nacional.
Criada em 1973, foi reorganizada em 2011 pela LC 1.139 que instituiu o Conselho de Desenvolvimento e
agrupou seus municípios em sub-regiões: A Norte: em Caieiras, Cajamar, Francisco Morato, Franco da
Rocha e Mairiporã; Leste: em Arujá, Biritiba-Mirim, Ferraz de Vasconcelos, Guararema, Guarulhos,
Itaquaquecetuba, Mogi das Cruzes, Poá, Salesópolis, Santa Isabel e Suzano; Sudeste: em Diadema, Mauá,

19
da região central, nas quais moram, em sua maioria, os pobres e uma parcela grande dos
migrantes que vieram para Guarulhos em busca de trabalho. A periferia de Guarulhos se
tornou a principal alternativa de residência, uma vez que, além da cidade abrigar um
importante parque industrial, também foi edificado em seus arredores o maior aeroporto
da América Latina – o Aeroporto Internacional de São Paulo/Guarulhos – Governador
André Franco Montoro, localizado no bairro de Cumbica, que se tornou um grande polo
de empregos e serviços (SANTOS, 2006 e NORONHA; ROMÃO, 1980).
Essa tendência de polo de grande oferta de empregos e o grande número de
fábricas (e também comércio), possibilitou esse grande afluxo de migrantes advindos de
diversas áreas do país, mais destacadamente dos “Sertões”, tanto nordestinos quanto
caipiras, principalmente dos Estados com a morfologia do semiárido e dos interiores de
São Paulo e Minas Gerais. Outro fator, que corrobora esse afluxo é a rodovia Presidente
Dutra, que liga Guarulhos ao Rio de Janeiro e às cidades vizinhas como Arujá,
Itaquaquecetuba, Ferraz de Vasconcelos, bem como, a rodovia Fernão Dias, que liga à
Mairiporã e Minas Gerais, onde se concentram boa parcela das empresas e entrepostos da
cidade. Tratam-se, portanto, de fatores decisivos para se compreender a grande “massa
migrante” que aqui se instalou e se mantém fazendo parte do processo econômico, social
e cultural guarulhense, espaço no qual pulula a expressão da “cultura das violas”.

Tal concepção fica nítida nos depoimentos que recolhemos, onde os motivos
mais destacados para a vinda dos migrantes seriam “arranjar um emprego”, “melhorar
de vida”, “ajudar a família” (isso quando esses não migram também) e muitos outros
tópicos, onde vemos quase uma unanimidade das razões que motivaram o
deslocamento dos violeiros para cidade. É o que nos revela “seu” Oliveira, natural de
São José do Rio Preto, 76 anos, e residente em Guarulhos desde 1968:

O povo falava qui na cidade era milhor, eu vim pra cá pra trabaiá aqui. Comecei
a trabaiá de zelador de prédio, depois passei ser motorista de ônibus, trabaiei em
metalúrgica, mas sempre tocando uma violinha assim "mei de leve" né?! (
OLIVEIRA, em entrevista, 2019).

Portanto, aqui percebemos que, mesmo na vinda de um local para outro,

Ribeirão Pires, Rio Grande da Serra, Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul; Sudoeste:
em Cotia, Embu das Artes, Embu-Guaçu, Itapecerica da Serra, Juquitiba, São Lourenço da Serra, Taboão da
Serra e Vargem Grande Paulista; Oeste: em Barueri, Carapicuíba, Itapevi, Jandira, Osasco, Pirapora do Bom
Jesus e Santana de Parnaíba. Guarulhos tem uma área de 318,68 km²; População por volta dos 1.365.899
habitantes; Densidade Demográfica: 4.286,18hab./km². Dados de 2018. Fonte:
<https://emplasa.sp.gov.br/RMSP>

20
totalmente diferente de seu habitat e costumes e se inserindo numa estrutura de produção
e economia muito díspares das localidades de onde provêm, os indivíduos, por vezes, se
“agarram” à sua cultura e manifestações populares, no caso específico, à viola, ou seja,
quando se veem afastados de suas origens, essa distância incute neles o instinto de
manter e promover suas artes no novo meio urbano (VILELA, 2013). As palavras de
“seu” Oliveira são reforçadas no depoimento do músico, compositor e professor do
Conservatório Municipal de Guarulhos (CMG), o violeiro mineiro ZéHelder:

E o que acontece quando essa pessoa sai do campo e vem pra cidade, é
justamente ela se "blindar” ao encontrar um ambiente hostil e agressivo,
diferente do que ela tinha lá! E se agarrar a essa sua origem né? como sendo a
coisa mais importante para ela e talvez aqui esse fato de você chegar numa
cidade, que é meio hostil, que é meio agressiva, esse fato de você se agarrar a
sua cultura é mais forte aqui, às vezes, do que no ambiente rural hoje em dia
sabe?! (ZÉHELDER, em entrevista, 2019).

Isso posto, fica notório que os principais motivos da vinda dos violeiros e demais
migrantes, foram a busca por melhores condições de vida, ajuda aos seus familiares que
porventura ficaram nos seus rincões (quando não migravam de imediato, algo que
normalmente ocorria após a instalação de um familiar ou parente que viera primeiro), e
garantia de sustento para si e os seus. Em meio ao deslocamento em busca de melhores
condições de vida a “arte das violas” criou raízes em Guarulhos. O fenômeno é fruto
desse processo social e cultural onde o indivíduo seleciona algo da bagagem cultural de
sua terra natal e a enfatiza como um símbolo de identidade. O fenômeno é amplamente
estudado na antropologia. Conforme Cunha (1986), os migrantes não podem levar
consigo toda a cultura tradicional, mas, procedendo de maneira seletiva, escolhem
símbolos que consideram importantes na reconstituição de suas identidades no
“estrangeiro”. A viola, no caso em tela, tornou-se inicialmente um símbolo de identidade
representativa do resgate de suas raízes migrantes e, posteriormente, um elemento que
tem sido reivindicado como expressão cultural de Guarulhos. O fenômeno revela o
dinamismo e fluidez que existe no âmbito da cultura onde, o que é tradicional pode,
certamente, reconfigurar-se em um novo local, adquirindo novos sentidos, no caso
específico em análise, a viola na cidade de Guarulhos é um bom exemplo.

1.1 Um histórico anterior

21
O uso de violas em festas populares e ritos religiosos já ocorria por aqui,
muito antes até do grande fluxo migratório que estamos abordando em nosso escopo
de pesquisa8. Identificamos escritos sobre esse período na obra Repaginando a
História (2002), do historiador guarulhense João Ranali (1913-2007), o primeiro
historiador do município, onde ele descreve um quadro da Festa do Divino:

Mas, esta é uma história repaginada de Guarulhos e o que interessa saber é


como se processava a Festa do Divino entre nós. Por falta de recursos alentados
para erguer o Império e promover cultos suntuosos, os guarulhenses,
principalmente da zona rural, mais apegados às tradições religiosas, reuniam-se
na casa de um dos festeiros e, com estandarte do Divino enfeitado de fitas
multicoloridas, e tendo à frente alguns “tocadores de violas” e tambores,
percorriam as principais ruas da cidade, que pouquíssimas eram, e, entoando
hinos de louvor ao Divino, visitavam os lares mais receptivos, pedindo dádivas
(RANALI, 2002, p.180).

O guarulhense desse período citado é oriundo de diversas matrizes étnicas entre


as quais, indígenas, afrodescendentes e até descendentes de europeus. A população,
etnicamente diversa, participava ativamente da Festa. Os indivíduos se misturavam e
promoviam essa arte popular (RANALI, 2002). Já, outra manifestação cultural e
tradicional que ainda se promove pela cidade é a Folia de Reis, organizada entre
meados de dezembro a início de janeiro (RANALI, 2002). O evento ocorre em várias
partes do município, em bairros como a Vila Fátima (com Os Mensageiros dos Santos
Reis9), o bairro Bom Clima (Companhia Estrela D'Alva), que ainda mantêm as
tradições de louvação aos Três Reis Magos que, segundo a narrativa cristã,
presentearam o menino Jesus (RANALI, 2002 e HANSSEN; HELFSTEIN, 2016).

Vestidos com roupas coloridas e carregando estandartes e violas adornadas com


fitas e rosários, os foliões percorrem as ruas dos bairros onde residem e saem cantando
louvores e tocando viola, características gerais de todas as Folias de Reis pelo país
(VILELA, 2013 e CORRÊA, 2019). Nestes eventos, homens e mulheres com “cantos,
cores e flores”, locomovem-se versando ao som de violas, violões, tambores e até

8 Segundo os violeiros e algumas pessoas mais ligadas às tradições católicas, hoje, não são mais encontradas
as manifestações da Festa do Divino em Guarulhos, ao menos os interlocutores que acessamos não nos
confirmaram essa informação, de que ainda ocorre essa expressão popular pela cidade e se ainda há, é de
nosso desconhecimento.

9 Os Mensageiros dos Santo Reis, companhia de Folia de Reis da cidade, é comandada por “seu” Oliveira,
um de nossos interlocutores, e Edson “Catira” seu filho e será descrita com mais detalhes à frente.

22
sanfonas em direção às casas de anfitriões já combinados, com os locais certos de
parada (OLIVEIRA, em entrevista, 2019).

Ó de casa, Nobre gente, Escutai e ouvireis, Que das bandas do Oriente, São
chegados os três reis (RANALI, 2002, p. 182). Versos cantados no momento de
“chegada” à casa do anfitrião).

Já na residência, os cantadores e violeiros, após várias toadas e cantos10, recebem


como agradecimento uma mesa farta de comidas, típicas ou não, como bolo de fubá,
tapiocas, doces caseiros; pratos salgados como, feijão tropeiro e cuscuz paulista, para o
repasto da Companhia que cantou a Folia na residência. A visita muitas vezes acontece
como parte de alguma promessa de graça alcançada, louvação por parte do dono da casa,
onde também não faltam umas boas doses de cachaça para animar os foliões (RANALI,
2002 e OLIVEIRA, em entrevista, 2019).

Um ponto a destacar é que a viola está atrelada a várias manifestações culturais, e no


decorrer da pesquisa, constatamos que ela se apresenta como um grande momento de
sociabilidades11 onde, não só a música ocorre mas, também, há por vezes um fator
religioso (no caso da Folia) entrelaçado. Em meio à religiosidade se manifesta um
encontro de violeiros, amigos ouvintes e promotores culturais e um estilo artístico-
identitário se firma. De fato, em associação ao desempenho do instrumento musical,
fundem-se “causos”, anedotas e estórias que transcendem a tradição e são incorporados na
contemporaneidade, exprimindo dessa maneira o dinamismo da cultura e enfatizando uma
característica peculiar na cidade, identificada como um símbolo das camadas populares 12.

1.2 . A Festa da Carpição

10 Neste tipo de canto, existem várias vozes que ora cantam em uníssono, em alturas diferentes (mesma
melodia, mas com vozes diferentes, como um soprano, um contralto e um baixo), ora em vozes alternadas
com melodias diferentes geralmente, cantado em “terças” (IKEDA, em entrevista, 2019).

11 O conceito de Sociabilidade foi desenvolvido pelo sociólogo alemão Georg Simmel (1858-1918), que
abordou os temas da relação entre indivíduos e grupos sociais. Sua perspectiva contribuiu para o surgimento
da Microssociologia, um estudo de fenômenos sobre as interações diretas entre as pessoas. Ver: SIMMEL,
2006.

12 Para Menezes Bastos existem três grandes matrizes musicais que convivem no mundo contemporâneo: a
música tradicional (fundada na oralidade), a música popular (música gravada) e a música sinfônica (música
de conservatório) que valoriza a escrita. A música caipira transita nesse universo, entre a música tradicional
e a música popular (música gravada). A música tradicional é música de tradição oral, música indígena,
africana, afro-brasileira, dentre outras, música “folclórica”. A música popular tem origem, ainda segundo
Menezes Bastos, nos espaços de exclusão social, nos guetos, é música das camadas populares. Para um
estudo apurado sobre o assunto, ver: MENEZES BASTOS, 2014.

23
Outra festa que ainda ocorre na cidade e conta com grande participação de violeiros
e grupos de artes populares é a Festa da Carpição, realizada há 278 anos no bairro de
Bonsucesso13, próximo à rodovia Presidente Dutra. O evento simboliza a devoção a
Nossa Senhora de Bonsucesso. O fenômeno atrai milhares de pessoas de todos os cantos
da cidade e das cidades vizinhas a Guarulhos que, na simbologia cristã, buscam fé e
proteção para lidar com suas mazelas e fardos e encontram na “terra carpida do Adro da
Igreja”14 um “elixir” para seus males (SANTOS, 2006). Atualmente, trata-se da festa
religiosa mais caracteristicamente popular do município. O afluxo de pessoas de várias
regiões resulta em um encontro expressivo do conceito de cultura popular, isto é,
dinâmico e plural (ARANTES, 1981). Durante os quatro dias de festa, onde se atualizam
e renovam hábitos e símbolos referidos às tradições ancestrais, são comuns a ocorrência
de Danças de Catira, Folia de Reis, duplas caipiras (e sertanejas, “mais modernas”) e
rodas de viola, sendo alguns dos artistas que executam essas expressões culturais, os
interlocutores que aqui entrevistamos, denotando a vivacidade e contemporaneidade da
prática da viola entre os guarulhenses.

Os costumes populares, durante este evento, são experimentados em uma


concepção segundo a qual evocam o passado, ou seja, que não se transformaram durante
os anos. Contudo, concernente aos rituais feitos pelos romeiros da festa, identificamos a
presença de barracas de comidas típicas e fast-food, um comércio bem similar a feiras
livres e a atmosfera interiorana que advém das características rurais do bairro, e também
da participação assídua de violeiros, onde notamos a viola como um dos símbolos mais
destacados dessa festa (SANTOS, 2006 e VENTURA, em entrevista, 2019). Segundo
Ranali, “Enquanto houver um pedacinho de chão para cavar, e a fé no coração dos
guarulhenses, a Festa da Carpição jamais desaparecerá” (RANALI, 2002, p.192).

13 Estive presente nas edições 276ª (em 2017), 277ª (em 2018) e 278ª (em 2019), onde a presença de
violeiros e grupos populares foi visivelmente viva.

14 O ato de mexer na terra do adro da igreja e passá-la no corpo, ou levar um punhado dela para casa, é tido
como milagroso pelos fiéis, e se configura como uma das características mais marcantes da festa, cujo ato é
denominado “Carpição”, um ritual que dá nome a festa e reúne um número considerável de pessoas
anualmente. Devido a Pandemia da Covid-19, em 2020, a Festa da Carpição não ocorreu no mês costumeiro
de agosto, mas, por iniciativa da Secretaria de Cultura de Guarulhos, em parceria com o Governo do Estado
de São Paulo, foram transmitidas as atrações artísticas que faziam alusão à festa, em live, pelo YouTube, em
29 de janeiro de2021. Link: <https://www.youtube.com/watch?v=h2fAPNNnTTc&t=282s>.

24
Conforme dissemos, a Festa da Carpição ocorre em todo mês de agosto e faz
parte da devoção a Nossa Senhora de Bonsucesso (SANTOS, 2006), que consiste em
duas festas tradicionais nas quais vemos, notadamente, a presença de violeiros15, sendo a
Festa da Carpição a que acontece primeiro, realizada na primeira segunda-feira do mês
de agosto. Logo após, ocorre a Festa de Nossa Senhora do Bonsucesso, situada no último
domingo do mesmo mês, no encerramento das festividades, onde ritos católicos como
novenas, terços e missas, contrastam com manifestações de cunho mais popular, “um
profano com toque de fé”, com as Folias, as Cantorias, Rodas de Violeiros e shows de
duplas sertanejas, num misto de sagrado e profano que interagem durante o mês inteiro,
fazendo parte da história cultural da cidade, bem como, contemporaneamente, do seu
calendário de eventos culturais 16 .
Lembramos que, outrora, havia divulgação impressa e distribuída nos pontos
culturais públicos da cidade pela Secretaria Municipal de Cultura de Guarulhos, que era
responsável também pela logística do local. Porém, com ínfimos investimentos para a
realização da festa, e na gestão atual (do Prefeito Gustavo Henrique Costa, o Guti), estes
têm se mostrado mais parcos e, certamente, na prática, a festa é mantida pela iniciativa
popular e pela Igreja Católica, sendo que, a mesma, não ocorreria se dependesse
exclusivamente da administração pública. Para reforço da nossa argumentação expomos
o que nos disse Antony Ventura em entrevista:

Quero dizer que a cidade de Guarulhos é uma cidade muito plural, muito
grande, muito diversa. Nós temos artistas maravilhosos aqui nessa cidade e
pessoas com potenciais incríveis né?! E que acho que são muito mal
aproveitados assim né?... acho que tem até aquela frase que responde muito isso
que eu tô dizendo que: Santo de casa não faz milagre!... Então, como já havia
dito, em um bairro periférico né?, em Guarulhos, que não tem muito incentivo à
cultura, temos pouquíssimos espaços públicos aqui, de incentivo à cultura né?!
Não temos uma biblioteca, não temos um auditório (em seu bairro), acho que
isso dificulta muito as pessoas, os moradores e as crianças aqui, a descobrirem
suas potencialidades artísticas culturais e até o seu contato com a história do

15 Para um estudo mais profundo sobre a Festa da Carpição, ver: (RANALI, 2002, pp.192-195) e
(SANTOS, 2006, pp. 58-87).

16 A festa é divulgada na agenda cultural do município, feita digitalmente no site oficial


<https://www.guarulhos.sp.gov.br/agendacultural> (outrora, era impressa e distribuída nos pontos culturais
públicos da cidade), pela Secretaria Municipal de Cultura de Guarulhos, a qual é responsável pela divulgação
e logística do local da festa. Por conta da Pandemia da Covid-19, as atividades em relação ao evento estão
suspensas.

25
lugar onde vive! (VENTURA, em entrevista, 2019).

O artista guarulhense Antony Ventura alega a negligência do poder público em


incentivos e investimentos em aparatos culturais, ele é natural de Bonsucesso, o bairro
que promove a já citada Festa da Carpição. Sublinhamos que a insatisfação com as
políticas públicas municipais orientadas para a cultura popular é, também, uma questão
constante para todos os artistas e interlocutores que contatamos na pesquisa.

1.3 Uma trajetória cultural

Sabendo que a viola e as tradições ligadas a ela são fenômenos culturais e artísticos
que ocorrem em grande parte do Brasil, a cidade de Guarulhos também se insere como
promotora e “acolhedora” desse estilo musical, talvez, pelos artistas do gênero que a
habitam e que aqui passaram a residir nas décadas de 1970, 80 e 90, advindos de cidades
do interior paulista, Minas Gerais, Paraná e regiões Norte e Nordeste do país 17 (PIETÁ,
1992 e SANTOS, 2006). Identificamos a organização sólida desses músicos em 1977,
quando foi fundada a Associação Guarulhense dos Artistas Sertanejos (AGAS). A
interação desses artistas migrantes, facilitou o avanço de várias carreiras musicais, como
das duplas Pena Branca e Xavantinho, Camões e Camargo, oriundos da Orquestra de
Violeiros Coração da Viola (da qual falaremos mais adiante), e do grupo Os Favoritos da
Catira, que ainda existe e é liderado por “seu” Oliveira e pelo filho, Edson Fontes (Edson
Catira), e muitos outros, sem esquecer o nome de Aleixinho (1927-2007), um grande
compositor e violeiro que residiu na cidade desde 1949 até seu falecimento (HANSSEN;
HELFSTEIN, 2016).
Outro fator que contribuiu para o sucesso de alguns artistas guarulhenses nesses
anos 1970/1980, foi o apoio e o estímulo da dupla “coração do Brasil”, já consagrada no
cenário caipira, Tonico e Tinoco, que havia participado de vários filmes e diversas
gravações de 78 rpm e LP's, uma referência expressiva na indústria fonográfica que,
alcançado o sucesso, passou a receber convites para shows em diversas cidades e estados

17 É claro que houve outros fluxos migratórios anteriores à década de 70 para Guarulhos (RANALI,
2002). Porém, onde realmente percebemos se efetivar um movimento maior de artistas Caipiras e Sertanejos
na cidade, é em meados da década de 70, no período do chamado “Milagre Econômico”, onde centros
urbanos eram povoados em massa por pessoas em busca de emprego e renda, e Guarulhos, que contava com
muitas indústrias, comportou muitos migrantes dentre os quais, os já citados, artistas violeiros que vieram
residir na cidade.

26
brasileiros (NEPOMUCENO, 1999).

O convite peculiar dessa dupla sertaneja (feito em 1979) aos violeiros


guarulhenses para se apresentarem no Teatro Municipal de São Paulo, foi um divisor
importante para a carreira dos artistas. O inusitado convite produziu inquietações, pois,
não era comum para artistas deste gênero atuarem em locais como o sugerido, já que
suas matrizes rítmicas eram vinculadas à cultura popular. Tonico e Tinoco18 fizeram a
proposta para que os violeiros de Guarulhos, os associados da AGAS, ousassem,
criassem uma “coisa nova” e fugissem dos estilos padronizados de apresentações em
duplas, organizando-se para uma apresentação de viola orquestrada (ALVES, em
entrevista, 2019), mais clássica, em vista de ocorrer no Teatro Municipal. Cerca de
quarenta violeiros ligados à AGAS, iniciaram ensaios sistêmicos e harmoniosos.

Vale frisar que a cidade de Guarulhos já contava com diversos espaços


alternativos desse estilo musical, onde os músicos se apresentavam em duplas e para um
público consideravelmente grande, a exemplo da dupla: Aleixinho e Hélio Bueno, que já
havia despontado para o Brasil através de convites para aparições em programas de rádio
e televisão. Entre estes, o Festival de Violeiros do MOBRAL (Movimento Brasileiro de
Alfabetização), organizado com ajuda do produtor cultural Orlando Ramos, este,
inclusive, já havia organizado outros eventos de grande repercussão, como o Festival de
Música Sertaneja em Bonsucesso, bairro guarulhense, com grande tradição religiosa e
artística (MARTINS; OLIVEIRA; RAMOS, 2013).
A apresentação no Teatro Municipal de São Paulo foi aclamada e teve uma
grande repercussão em todas as linguagens midiáticas (jornais, revistas, e afins; até na
própria televisão) e, em pouco tempo, a recém-nascida Orquestra despontou para o
universo artístico e da música caipira para o Brasil inteiro. Além disso, o “espetáculo
sertanejo” motivou a dupla Tonico e Tinoco a produzir uma de suas obras mais
emblemáticas, o LP A Viola No Teatro (1980), que apresenta em sua contracapa uma
foto da pioneira Orquestra de Violeiros Coração da Viola (MARTINS; OLIVEIRA;

18 Dupla caipira considerada a mais importante da história da Música Popular Brasileira e de maior
referência. Em 60 anos de carreira juntos (e mesmo após, com Tinoco em carreira solo), Tonico e Tinoco
realizaram quase mil gravações e também atuaram em diversos filmes do gênero, como Lá no Meu Sertão
(1962), com direção de Eduardo Norente e Luar do Sertão (1971), dirigido por Osvaldo de Oliveira.
Também foram autores e intérpretes de muitos clássicos da Música Caipira, como Chico Mineiro, Brasil
Caboclo, Cana Verde, Moreninha Linda e tantos outros.

27
RAMOS, 2013).

A experiência de tocar viola de forma orquestrada deu certo e os ensaios


passaram a ser constantes. Inúmeros convites para participações em festivais, como o
Festival de Verão da Cidade do Guarujá, no litoral Paulista, atraindo um público
estimado de cem mil pessoas e o MPB-Shell-80, surgiram em decorrência do sucesso.
Durante estes anos inaugurais a Orquestra também se dedicou à produção de material
fonográfico, gravando seu primeiro LP, o Violas de Natal e o Orquestra de Violeiros
Coração da Viola, ambos de 1980 (MARTINS; OLIVEIRA; RAMOS, 2013). Os
integrantes da Orquestra, normalmente associados da AGAS, mantinham projetos
paralelos com suas duplas e ainda participavam de outros grupos que estavam em
destaque na cidade, com isso, o número de integrantes das apresentações da Orquestra
não era fixo e a rotatividade de violeiros era grande. Por isso, os organizadores sempre
faziam uma espécie de “lista de presença” para programar como seriam feitas as contas
orçamentárias. Diante dessa “explosão” da música Sertaneja (NEPOMUCENO, 1999),
na década de 80, no rádio e na televisão, a AGAS, sob a presidência do seu fundador
Manoel Rezende, começou a ganhar destaque nesse âmbito e era através dela que os
violeiros da Coração da Viola se organizavam, tanto para as agendas de shows e espaço
para os ensaios, como na parte financeira, por meio do repasse de arrecadação de shows
que auxiliavam nas despesas.

Manoel Rezende da Silva foi a referência principal da AGAS. Foi durante sua
gestão que os violeiros de Guarulhos tiveram maior destaque no cenário da música
sertaneja do país. Manoel Rezende sempre esteve envolvido no ambiente político da
cidade e, durante a segunda gestão do prefeito Néfi Tales, atuou como Secretário de
Finanças do município de Guarulhos, cargo que ocupou até ser assassinado, em junho de
1997. Em determinado momento dessa relação, houve uma fusão. Não havia mais como
se distinguir a AGAS da Orquestra Coração da Viola, elas eram uma só, com os mesmos
compromissos, atividades e integrantes. Assim, a AGAS, em 1981, foi reconhecida pelo
poder público municipal, tendo suas ações declaradas como de utilidade pública19
(MARTINS; OLIVEIRA; RAMOS, 2013).

19 Lei N°2.519, de 02 de Dezembro de 1981, que reconhece como de Utilidade Pública a AGAS,
AssociaçãoGuarulhense dos Artistas Sertanejos, com sede em Guarulhos.

28
Os movimentos que permeavam a música Caipira na cidade de Guarulhos
estavam distribuídos em suas diferentes regiões e eventos. Na década de 70, o MOBRAL
realizava nesta cidade a Roda de Violeiros, que proporcionava aos artistas a
possibilidade de sair dos bastidores para serem reconhecidos por um público mais amplo,
com excursões dos violeiros por vários bairros. Houve também o Campeonato de
Violeiros de Novo Bonsucesso, evento organizado na região do bairro Bonsucesso, que
perdurou até abril de 1979. Além desses movimentos de música sertaneja, os violeiros
guarulhenses tinham o apoio da Associação Brasileira de Artistas Sertanejos (ABAS),
fundada em 1975, em Osasco, que era representada em Guarulhos na pessoa de Irineu de
Almeida e com sede localizada na Rua São Jorge, no bairro de mesmo nome
(MARTINS; OLIVEIRA; RAMOS, 2013). Ao sair desse cargo, o senhor Irineu indicou
Orlando Ramos para assumir essa responsabilidade, pois este era considerado um dos
pioneiros na organização dos violeiros na cidade de Guarulhos. Era ele o organizador do
Festival de Novo Bonsucesso. Possuía também uma coluna no jornal Folha
Metropolitana – No Mundo da Música Sertaneja – escrita pelo poeta guarulhense
Castelo Hanssen (1942-2020) e estava sempre inteirado dos assuntos e participando dos
eventos do gênero. A ABAS, ao lançar seu primeiro LP Valores da ABAS (1979),
apresentou 14 duplas sertanejas, entre elas, uma de Guarulhos, que já fazia sucesso nos
campeonatos promovidos pelo MOBRAL, o Duo Rouxinol.

Embora a música Caipira continuasse na paisagem da cidade de Guarulhos, sendo


a Associação Guarulhense dos Artistas Sertanejos reconhecida pela legislação local, a
Orquestra Coração da Viola não resistiu às crises financeiras. Para atender aos diversos
convites que vinham de todas as partes, os músicos precisavam arcar com despesas de
transporte, diárias, alimentação, e os cachês não correspondiam a estas necessidades. A
Orquestra, nesse ínterim, contava com um grupo composto, em média, por trinta e cinco
violeiros. Assim, aos poucos, os violeiros foram priorizando as apresentações
tradicionais com suas duplas e, em 1982, a Orquestra já estava desfeita e a maioria dos
violeiros continuava fazendo apresentações de trabalhos em duplas, inclusive, foi nesse
momento que despontaram nomes famosos da música caipira oriundos da cidade de
Guarulhos como, Pena Branca e Xavantinho (cuja madrinha artística foi, ninguém menos

29
que, Inezita Barroso)20, e muitos outros.

Mesmo com a saída dos violeiros da Orquestra Coração da Viola na década de


80, a cidade continuava repleta de eventos e organizações de violeiros, como o
Movimento SOMUVIC – Sociedade Musical – Uma Viola Na Cidade, de 1984,
sociedade de artistas e fãs de viola na cidade que, posteriormente, torna-se a CAUVIC –
Casa e União dos Violeiros – Uma Viola Na Cidade, sob gestão de Orlando Ramos, o
qual já havia atuado em várias ações culturais do gênero como no Festival Novo
Bonsucesso e como representante da ABAS em Guarulhos21.

No final da década de 70 e até o final da década de 80, com os incentivos legais


proporcionados pelo Poder Público Municipal de Guarulhos, através da elaboração de
normatizações, o apoio aos artistas violeiros foi expressivo, mais especificamente no
campo do amparo legal, mas não na parte de recursos financeiros (OLIVEIRA,
FONTES, em entrevistas, 2018-2019). Ao se observar a cidade de Guarulhos, constata-se
que os processos migratórios, advindos das cidades do interior dos estados de São Paulo
e Minas Gerais, envolveram mecanismos peculiares amplamente identificados em
diferentes contextos, ou seja, envolveu a seletividade de símbolos diacríticos ou
contrastivos (CUNHA, 1986), assim, o modo de vida caipira foi recriado, não como uma
reprodução exata da tradição, mas de maneira a enfatizar não a totalidade, algo de fato
impossível, mas destacando-se elementos marcadores da diferença e, no caso, a viola
mereceu destaque como expressão simbólica do passado. Algumas regiões da cidade,
como Bonsucesso, Cabuçu, Tanque Grande, Bom Clima, Carmela 22, mantêm suas
relações socioculturais ainda com fortes referenciais ligados ao universo e às raízes
caipiras.

Duplas sertanejas, trios nordestinos, conjuntos de serestas. Estas e outras

20 Inezita Barroso (1925-2015), também teve uma relação bem estreita com a cidade de Guarulhos, no
concernente à cultura Caipira, e alguns fatos e detalhes dessa relação serão vistos mais à frente.

21 Tanto a SOMUVIC como a CAUVIC, tem respaldo legal até hoje pelos respectivos Decretos Municipais:
N°10700 de 24 de Outubro de 1984 e, N° 10.810 de 20 de Dezembro de 1984, que consideram essa
associação cultural como bem de utilidade pública do município.

22 Bairros da cidade de Guarulhos que tinham, e ainda mantêm, manifestações culturais de origens rurais.
Porém, o fenômeno de violeiros ocorre em toda a cidade, por isso na pesquisa não delimitamos bairros e/ou
regiões que difundam a viola, focamos mais nas trajetórias culturais dos interlocutores, visto que os
entrevistados são de vários bairros da cidade.

30
atrações farão parte do programa "Música na Praça" organizado por Wagner
Roucourt e patrocinado pela Prefeitura de Guarulhos, com a finalidade de dar
uma distração popular aos munícipes. [...] a praça Juscelino Kubitschek, no
Jardim Bela Vista foi escolhida para a estreia. [...] o apresentador fez um convite
a toda população do bairro para que comparecesse, principalmente as crianças,
uma vez que foi distribuída farta quantidade de guloseimas. Para o primeiro
programa foram convidadas as duplas sertanejas Manda Brasa e Pinga Fogo, o
Duo Rouxinol, muitas vezes premiado. Moisés e Mateus e os Nordestinos.
Batistinha e seu acordeon, Cícero do Baião, os repentistas do Norte, Os Brasas
Nordestinos, além de Aleixo e Aleixinho e outras atrações (Guarulhos em revista
– Abril-Maio-Junho de 1978, p. 24).

Observando-se as transformações socioculturais, econômicas e políticas públicas


após a década de 1960, nas cidades da Região Metropolitana de São Paulo, naturalmente
as ações do poder urbano apontavam para atender os anseios das expressões culturais e
populares dessa massa migrante que chegava em demasia às periferias e em Guarulhos
não foi diferente23. Das festividades, surgimento de artistas e a indústria cultural em
vários locais, abriam espaços pelo notório lucro advindo dos públicos que se
identificavam com essas manifestações culturais recriadas pelos artistas do gênero
musical caipira.

Notamos que a vida urbana, na maior parte das vezes, criou um descompasso
que causou ao migrante dos bolsões rurais um sentimento de inferioridade e por
vezes de incapacidade em função dos valores requeridos nos postos de trabalho
serem muito diferentes das habilidades específicas que possuíam. Isto, aliado ao
ideário da modernização, acabou por acentuar um preconceito em relação a
estes migrantes que foram se amontoando nas periferias (por não conseguirem
empregos melhores devido à sua desqualificação para os serviços requisitados).
Sua cultura foi tornando-se periférica, bem como todo o universo de valores que
os cercava. Até a viola, acreditávamos nos anos 1980, começava a entrar em
extinção de seu uso por ser tratada como um instrumento menor. Em algumas
das vezes este preconceito gerou um efeito colateral, ou seja, uma reação de
orgulho e exacerbação da própria identidade caipira (VILELA, 2013, pp.171-
172).

Durante a década de 1980 (até um pouco antes, na década de 70, para sermos mais
abrangentes), quando ocorre a mudança do ritmo musical do Caipira para o Sertanejo 24,
verificamos uma adesão mais acentuada nos lugares onde houve fluxo migratório mais
expressivo, por parte desse público que passou a se identificar com esse “estilo sertanejo”,

23 Ver: SANTOS, 2006.

24 Para um estudo mais aprofundado sobre as diferenças entre Caipira e Sertanejo (na questão musical), ver:
NEPOMUCENO,1999; MARTINS,1975 e FERRETE, 1985.

31
porém, a música mais tradicional, a Caipira, manteve-se viva e nunca perdeu espaço na
cidade. Acerca desse tópico, que consideramos importante, apoiamo-nos na perspectiva
de análise do pesquisador José de Souza Martins, que em seu livro Capitalismo e
Tradicionalismo, defendeu a tese segundo qual essa metamorfose musical de Caipira para
Sertanejo, deu-se pela propagação da música caipira na cidade e que, ao longo dos anos,
as letras e temáticas musicais abordadas nesse estilo musical foram se transformando e
dando forma a uma “música nova”, não tão caipira como outrora, nem citadina demais, a
ponto de esquecer temas como o boi, o campo, e outros temas próprios e inerentes ao
estilo, mas agora com uma roupagem mais “modernizada” (uso de contrabaixo, guitarra e
outros recursos sonoros), e com temas mais românticos e urbanizados em detrimento das
velhas modas melancólicas só à voz, viola e violão.

Apesar dessa diferença pontuada sobre esses estilos musicais, observamos que a
tese permanece válida, pois no tocante a nossa pesquisa, verificamos em Guarulhos, onde
ambas modalidades são difundidas e onde os violeiros tocam músicas dos dois estilos, a
análise de Martins nos auxilia a compreender os aspectos identitários de cada proposta
musical, contudo, na prática, essa diferença se manifesta muito mais no campo musical
enquanto consciência sobre a existência dos estilos, mas não no campo da sociabilidade e
das relações entre artista e público e sua relação com a cidade, onde o que ganha destaque
são os eventos culturais. Na cidade de Guarulhos, além das organizações como a AGAS e
a SOMUVIC, aconteciam diversos eventos organizados e descentralizados pelos violeiros,
como a Semana de Arte Nordestina.25

1.4. Áurea Fontes e o Viola Viva

25 Na Semana de Arte Nordestina, instituída pela Lei: N°2241 de 1978, e pelo Decreto: N°16.784 de 1991,
havia diversas atrações musicais e de outras expressões artísticas e não, necessariamente, só músicas ligadas
à temática nordestina. Muitos violeiros caipiras se apresentavam, e também aconteciam apresentações de
violeiros repentistas, mas como convidados, vindos de outras cidades e não tendo uma constância em
apresentações como os caipiras de Guarulhos. Não encontramos documentos, informantes e informações
suficientes para afirmar que havia violeiros repentistas residentes aqui nesse período, e registros de
atividades com a Viola Repentista com tanta ocorrência como a Viola Caipira, reforçando mais uma vez
nossa justificativa de discorrer sobre a Viola Repentista aqui em Guarulhos como uma descoberta de nossa
investigação, no concernente a repentistas “residentes” e com uma relação mais íntima com a cidade. E
nossos votos são que futuras pesquisas surjam sobre e possam preencher essa lacuna, e aqui é apresentada
(sobre os repentistas) uma análise contemporânea.

32
Após o fim da Orquestra de Violeiros Coração da Viola é criada, em 1984, a
Orquestra Municipal de Viola, a qual abriu oportunidade para vários músicos se
apresentarem, inclusive aqueles que já haviam participado da Orquestra Coração da
Viola26. Uma das vantagens para os violeiros agora era que, embora não recebessem
cachê, o fato da Prefeitura arcar com as despesas de transporte e alimentação se
apresentava como um grande incentivo. Alguns violeiros remanescentes da Orquestra
Coração da Viola, agora integrantes da Orquestra Municipal de Violeiros, e outros artistas
do gênero Caipira, juntamente a Áurea Fontes, uma personalidade atuante nos eventos
culturais da música Caipira, formaram no início da década de 1990 uma nova orquestra:
Áurea Fontes e Orquestra Violeiros de Ouro. Mais do que um grupo de apresentações
musicais nos moldes da indústria fonográfica da época, o projeto surge como um
movimento em resposta à larga banalização da música de raiz, que se caracterizava pela
valorização dos aspectos inerentes e peculiares à música caipira, como as narrativas
simples do cotidiano rural. Inicialmente a orquestra conseguiu reunir cerca de 22 músicos,
e entre ensaios e construção de repertório levou três anos para realizarem sua primeira
apresentação ao público (MARTINS; OLIVEIRA; RAMOS, 2013).

A estreia foi marcada pelo show, apoiado pela Secretaria Municipal de Cultura de
Guarulhos, em homenagem à dupla Tonico e Tinoco. Com um repertório totalmente
selecionado, com o intento de combater a banalização da música tradicional que se
firmava à época, o grupo firmou sua posição. A apresentação foi muito bem-sucedida e
demonstrou uma parte do que seria o trabalho de Áurea Fontes e Orquestra Violeiros de
Ouro (MARTINS; OLIVEIRA; RAMOS, 2013). O empenho em preservar a música de
raiz, tão defendida pelo grupo, onde os valores da cultura caipira e música sertaneja
atrelada à terra eram enfatizados, abriu oportunidades para realizarem trabalhos apoiados
por secretarias e organizações culturais fora da escala da indústria musical estabelecida
desde o final da década de 80 e toda a década de 90 no Brasil 27. Em 1997, Áurea Fontes
e Orquestra Violeiros de Ouro, contava com 12 integrantes fixos e gravaram o primeiro
LP, intitulado Caipira Sim Senhô, que, além de releituras de clássicos da música caipira,
contemplou algumas composições inéditas, como Mão Negra, dos guarulhenses Ezequiel

26 Lei Municipal N °2859 de 1984, dispõe sobre a criação da Orquestra Municipal de Violeiros e Decreto
Municipal N°10. 856 de 1985.
27 Para um estudo mais aprofundado sobre a criação e difusão de orquestras de violeiros, ver: DIAS, 2012.

33
de Moraes e Paulinho Aguiar e, Morrendo de Saudade, de Áurea Fontes e César do
Acordeon, sendo acrescentada a participação de nomes consagrados, como o da cantora e
compositora Inezita Barroso (FONTES, em entrevista, 2019). O Projeto Quatro Estados
se propunha a levar a música caipira, resgatando ritmos tradicionais como o Valseado,
Rasqueado, Batidão e Cururu28, além de outras influências da tradição caipira brasileira
para os estados de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e Paraná.
Além desse projeto, Áurea Fontes e Orquestra de Violeiros de Ouro participavam,
paralelamente, de outras atividades culturais e promoviam apresentações locais. Em
1996, garantiram vaga no projeto Arte nas Ruas, promovido pela Secretaria Municipal de
Cultura de São Paulo (MARTINS; OLIVEIRA; RAMOS, 2013), outro momento
importante foi o programa radiofônico de auditório transmitido pela TV Tupi, o Viola
Viva.
O projeto Viola Viva ainda acontece na cidade de Guarulhos com apresentações
periódicas no Teatro Nelson Rodrigues (no bairro de Vila Galvão)29. Para os
promotores do evento era a maneira de captar o quanto as pessoas, dos mais variados
estilos, classes sociais e faixas etárias, recebiam a música caipira. Impulsionado pelas
agitações que ocorriam em torno da retomada de eventos ligados à música caipira na
década de 90, o poder público de Guarulhos instituiu medidas para a organização de
festejos por meio de comissões responsáveis. Essas comissões, em grande parte,
contavam, em sua composição, com artistas ou pessoas de alguma maneira
comprometidas com a música de raiz e, a exemplo disso, em 1997, membros influentes
desenvolveram trabalhos de destaque no ambiente deste estilo, como a própria Áurea,
Manoel Rezende, Aleixinho e o professor Néfi Tales, ex-prefeito da cidade, dentre
outros artistas em evidência na época (MARTINS;OLIVEIRA;RAMOS, 2013).

É notória a relevância social e cultural de Guarulhos no contexto da Região


Metropolitana de São Paulo. A cidade é considerada um celeiro de violeiros e agentes

28 O projeto Quatro Estados fora aprovado pela CNIC (Comissão Nacional de Incentivo à Cultura) do
extinto Minc (Ministério da Cultura) e autorizado a adquirir recursos da Lei Rouanet em 1997 (MARTINS;
OLIVEIRA; RAMOS, 2013). Áurea Fontes e Orquestra Violeiros de Ouro se apresentaram em diversos
programas na televisão de várias localidades, onde houve uma aproximação da apresentadora com Inezita
Barroso, através de excursões e turnês, que culminaram em diversas apresentações de Inezita em Guarulhos
por intermédio de Áurea, e apresentações de Áurea no palco com Inezita em vários locais e mais ainda aqui
na cidade.

29 O evento Viola Viva ocorre todo último domingo do mês, às 16h, há exatos 25 anos ininterruptos e agora
está em recesso devido à Pandemia.

34
culturais (ZÉHELDER, em entrevista, 2019). São inegáveis as manifestações do campo
artístico, sobretudo para músicos ligados ao gênero caipira com todas as suas variações,
na construção desta imagem.

Talvez, o histórico do desenvolvimento da região de Guarulhos desde o período


colonial, considerando-se suas diversas transformações urbanas e socioculturais, tenha
contribuído para a emergência da Música Caipira (NORONHA; ROMÃO, 1980 e
SANTOS, 2006). Não é sem motivo que Guarulhos, especialmente durante a década de
70, ficou conhecida como “Capital da Música Sertaneja” (FONTES, em entrevista,
2019), pois seus artistas, anônimos ou famosos, sempre estiveram atuantes em
diferentes ações, não apenas compondo, recriando composições, fazendo apresentações,
mas, sobretudo, organizando-se e galgando espaços, aparecendo em programas de rádio
e televisão e tocando viola em palcos na periferia e no centro da cidade.

Assim, foram sendo criados espaços, revelando-se talentos e tornando-se


consistentes certas políticas públicas, algo que contrasta com o momento atual marcado,
segundo os violeiros, pelo irrisório e ínfimo fomento, tema recorrente nas falas dos
violeiros e de todos os interlocutores contatados. Atualmente (desde 2013, mais
precisamente), alguns violeiros que participaram da antiga Orquestra Coração da Viola,
voltaram a ensaiar, a se reunir e retomar os trabalhos com diversas apresentações pela
cidade. Uma destas ocorreu para homenagear Inezita Barroso, a qual dividiu o palco e
as atenções com Áurea Fontes, que mantém suas atividades 30 até hoje. Com o
acompanhamento da banda Viola Viva, tradicionalmente são feitas apresentações
constantes, propiciando espaços para vários artistas participarem como convidados.

Remanescentes da antiga CAUVIC, do Movimento Brasil Caboclo, do Viola


Viva, Os Favoritos do Catira, O Encontro de Música Raiz, organizado pelo agente
cultural Claiton Carvalho, o Café com Viola, que acontece todo primeiro domingo do
mês no Teatro Ponte Alta, no bairro de mesmo nome, organizado pelo casal Vera
Bianca e Guaru, entre outros atores, sinalizam que o estilo musical ainda se mantém

30 Atualmente, devido a sua saúde frágil, quem está à frente do Viola Viva, é o esposo de Áurea Fontes, o
contrabaixista e promotor cultural Potiguar Bloch, ao lado de Maria José Tarumã, apresentadora de rádio e
de auditório, mas, sempre que pode, Áurea comparece ao evento, do qual é a idealizadora e que agora, em
2020, completou 25 anos de atividade e promoção da cultura caipira na cidade de Guarulhos, sendo também
a iniciativa mais longeva nesse segmento de arte. No presente momento, o projeto está com suas atividades
suspensas por conta da Pandemia da Covid-19.

35
como referência importante para a cidade de Guarulhos.

36
CAPÍTULO II – A VIOLA EM GUARULHOS, TRADIÇÃO E MÚSICA
POPULAR

Neste capítulo abordaremos a questão da viola em sua riqueza cultural e


especificidades, precisamente falando, em primeiro lugar, sobre a Viola Caipira e, mais
adiante, sobre a Viola Repentista, com suas peculiaridades e suas formas musicais, com
base no que foi dito pelos entrevistados para a pesquisa e em algumas afirmações dos
pesquisadores do assunto.
Mesmo com estilos de execução distintos, tanto os violeiros Caipiras quanto os
Repentistas comungam de temáticas similares em suas “modas” e/ou “repentes” e um
ponto de convergência que notamos nas letras, nas músicas tocadas e cantadas pelos
violeiros de ambas as linguagens é a memória de sua terra natal, recordações da infância e
da vida na roça, antes de chegarem em Guarulhos, as atividades que faziam outrora,
enfim, todas as memórias e trajetórias de suas vidas, que se assemelham as dos ouvintes
migrantes e seus descentes, e também dos apreciadores. Estes percebem que os violeiros
são, muitas vezes, as “vozes” dos migrantes que se reconhecem e se identificam nas
manifestações e nas músicas que difundem, e a viola é o fio condutor dessas relações
sociais e dessa memória. Nesse ponto, o violeiro, músico, professor e pesquisador Ivan
Vilela apresenta algo que exprime bem esse foco de nossa análise:

A saída de seu lugar de origem acarretou, na vida dos migrantes, uma


considerável quantidade de perdas. Indo além das perdas materiais, houve
perdas afetivas, culturais e por vezes até de valores. Por outro lado, a busca de
horizontes diferentes trouxe não só perdas, mas também conquistas e aquisição
de valores, famílias e amizades. Destarte, pretendemos que essas narrativas nos
mostrem um pouco da história pessoal vivida por cada um dos entrevistados, o
que, de certa maneira, exprime um sentimento geral, humano, dos migrantes de
todos os lugares (VILELA, 2013, p. 171).

Portanto, a viola em ambos os estilos que são difundidos em Guarulhos, conta um


pouco da saga desses migrantes de todos os lugares, suas histórias, seus costumes, sua
vida laboral antes da arribação em busca de melhores condições de vida. E a manutenção e
difusão da “cultura da viola” entre esses migrantes dos sertões e interiores, mostra o quão
é importante a memória para eles e como lhes é cara a música embalada ao som de violas,
como instrumento que se mostra a expressão mais fidedigna para narrar essas histórias de

37
gente simples. Tal fenômeno acabará se constituindo em uma marca cultural distintiva na
história de Guarulhos.
O professor, músico e cantor ZéHelder, nos fez a seguinte afirmação, corroborando
o exposto acima:

Toda pessoa que pega esse instrumento, sei lá, se você, e todo mundo que tem a
sua alma de brasileiro escutou, uma escalinha duetada, isso, sei lá, te transporta
pra um passado que muitas vezes, as pessoas não conheceram, e isso aqui é o
meio para fazer elas voltarem para lá sabe?!(ZÉHELDER, em entrevista, 2019).

Essa fala reforça a ideia de que a viola é um instrumento que serve de “passaporte”
para quem deseja conhecer o mundo do caipira e do sertanejo no âmbito cultural, social e
quiçá espiritual, e vemos nesse instrumento um importante meio para entendermos um
pouco do fenômeno da migração e seus desdobramentos nas grandes cidades e que a
cultura dos que migram se torna parte da cultura do lugar que os acolhe, num jogo
dinâmico e dialético.

2.1. A Viola Caipira

A viola é um instrumento com cinco pares de cordas duplas, muito usada em


festas, ritos e musicalidades de origens rurais pelo país. Como já dito anteriormente, a
cultura Caipira31 é algo plural e repleto de influências no tocante à sua musicalidade, com
ritmos de origem africana, indígena e de onde se originou a viola, isto é, da cultura
portuguesa (VILELA, 2013). Na questão da sociabilidade, onde, por intermédio da viola,
são expressos valores religiosos, músicas, danças, causos e uma amálgama de cultura
popular, temos nesse instrumento o principal ingresso e acesso ao mundo caipira.
Percebemos nos depoimentos de nossos interlocutores, que falar de cultura caipira e não
se reportar à viola, fica meio sem sentido, como se uma fosse o complemento da outra,
quase um sinônimo.
Mesmo que o espectro cultural da vivência caipira seja muito mais amplo, a viola é
um instrumento indispensável dentro deste universo de possibilidades. Ela está calcada em

31Para designar a região de ocorrência da cultura Caipira, o historiador, sociólogo e professor universitário
Alfredo Ellis Júnior (1896-1974), cunhou o termo “Paulistânia” ,termo este que ficou conhecido na obra, de
1964, Os Parceiros do Rio Bonito do sociólogo e crítico literário Antonio Candido (1918-2017), onde faz
um estudo profundo da gênese do caipira paulista, como fruto da miscigenação de bandeirantes e indígenas e
uma minuciosa análise de hábitos e costumes destes, que moldaram a verve do Caipira. Ver: CANDIDO,
2010.

38
valores religiosos, como, por exemplo, na Folia de Reis e na dança, como podemos notar
na Dança de São Gonçalo e na Catira e, mais ainda, no teor das letras e canções que são as
narrativas desse modo de vida, onde a viola faz a função de cronista, de repórter da cultura
e das vivências dos caipiras. Portanto, a viola se apresenta como um meio de interação
social, um instrumento com o qual se identificam os indivíduos com valores sociais
próximos, conferindo ao coletivo uma identidade cultural. Outro ponto de suma
importância, para delimitarmos as duas modalidades de manifestações culturais com
violas que Guarulhos promove, é que, há vários nomes dados por todo o país ao
instrumento, dentre eles: Viola Sertaneja, Viola Cabocla, Viola de Arame, Viola
Repentista, Viola de Cantoria, Viola de Samba (a Viola Machete, do Recôncavo Baiano) e
Viola Brasileira (CORRÊA, 2019). Mostrando o quão difundido é o instrumento por todo
o país e o quanto ele é inserido em várias culturas populares e manifestações artísticas,
mas, salientando que no recorte da pesquisa, situado no âmbito do município de
Guarulhos, as duas linguagens que ocorrem na cidade, como já dito anteriormente, são a
Viola Caipira e a Viola Repentista. A afinação usada na Viola Caipira em Guarulhos é
conhecida por Mi Cebolão, cuja disposição das notas de baixo para cima é: Mi-Si-Sol#-Si-
Mi.

A música sertaneja e sua radiodifusão operaram como fatores aglutinantes e


reenraizantes dos valores de vida do camponês caipira, agora urbano. A música
sertaneja agiu como mantenedora dos valores referenciais deste povo no
momento e após o êxodo rural (VILELA, 2013, p.145).

Com essa afirmação e o que nos disseram os interlocutores contatados, percebemos


que a música caipira, através da viola e dos violeiros, teve e tem uma importância singular
para os migrantes. Tal fenômeno se evidencia no que concerne a cultivarem na cidade seus
costumes e em meio ao apreço em preservar a referência musical. Identificamos nesse
processo o esforço em investir na reconfiguração dessa tradição na “cidade grande”, na
qual uma nova geração de violeiros descendentes (ou não) de migrantes, começa a se
interessar pela viola, pela cultura caipira, tocando, compondo, em suma, colocando a viola
na atualidade e no cenário da música de forma geral, fenômeno este, visto não apenas em
Guarulhos, mas, em várias cidades do estado de São Paulo e, principalmente, onde

39
ocorreram fluxos migratórios32. Com esses fluxos reconstituem-se novas perspectivas de
arte e manutenção de tradições, e também uma nova roupagem destas, onde o antigo
caipira se torna um citadino e nessa mudança de habitat, por mais que ele se agarre ao seu
modo de vida rural, acaba por sofrer influências da sua relação com a cidade grande e com
isso surge uma nova relação desse migrante com a arte à qual tanto tem apreço.
O fenômeno da migração se revelou, nas Ciências Socais, um campo fértil para se
estudar novas sociabilidades e transformações culturais e descrever, como nos diz Eunice
Durham, um universo importante para a elaboração de novas etnografias sobre as
periferias urbanas na cidade de São Paulo (DURHAM, 2004).
Como a Viola Caipira está atrelada a várias expressões culturais em Guarulhos,
vamos expor de forma sintética cada uma dessas manifestações onde ela está presente,
desde a Folia de Reis à Dança da Catira, passando pela Orquestra de Violeiros até as
duplas caipiras e artistas solo, para mostrar que o leque de atuação do instrumento na
modalidade Caipira é muito amplo e cada uma dessas manifestações artísticas tem
particularidades dignas de nota.

2.1.1 Os Mensageiros dos Santos Reis

A Folia de Reis, conforme comentamos no capítulo anterior, faz parte da tradição


cultural e histórica de Guarulhos. Mas, agora, descreveremos um grupo que difunde essa
arte de maneira mais focalizada e descritiva no contexto urbano. Iremos nos ater à
manifestação popular intitulada Os Mensageiros dos Santos Reis, grupo que desde a
década de 70 atua com regularidade na cidade.

Assim, tem sido comum nos núcleos urbanos brasileiros que vivenciam o
crescimento e a chamada “modernidade”, a não manutenção das práticas
religiosas do tipo das folias de reis, que têm se preservado mais em ambientes
rurais ou pequenas cidades, “espírito” predominantemente rural. Naturalmente,
até em grandes cidades como São Paulo e Rio de janeiro registram-se Folias de
Reis, em alguns bairros, porém de forma isolada e sem maiores repercussões no
contexto geral destas (IKEDA, 2011, p.72).

Com base nessa afirmação do pesquisador, músico e professor Alberto Ikeda,


vemos que as Folias de Reis em cidades grandes são fenômenos bem raros e, atualmente,
os agentes que mantêm essa tradição são, em grande parte, oriundos de regiões rurais. Os

32 Ver: MAGNANI, 1998, pp. 24-27.

40
descendentes vêm mantendo o evento por gerações, sendo esse o caso de “seu” Oliveira
Fontes, natural de São José do Rio Preto, interior de São Paulo, 76 anos, que reside em
Guarulhos desde o fim da década de 60 e que veio em busca de trabalho, mas trouxe na
sua bagagem, também, sua cultura, conforme ele mesmo nos diz:

O povo falava qui na cidade era milhor, eu vim pra cá pra trabaiá aqui. Comecei
a trabaiá de zelador de prédio, depois passei ser motorista de ônibus, trabaiei em
metalúrgica, mas sempre tocando uma violinha, assim “mei de leve” né?!
(OLIVEIRA, em entrevista, 2019).

No caso de “seu” Oliveira, destacamos que ele atua como violeiro caipira, mestre
de folia, cantando em duplas e como catireiro. Atua em vários espectros da música caipira,
ato que engloba o sagrado e o profano e mostra que, mesmo vivendo há mais de 50 anos
em Guarulhos, não abandonou suas raízes culturais. O filho, Edson Fontes, conhecido por
“Edson Catira”, 43 anos, vem seguindo os passos do pai e é considerado um dos agentes
culturais da nova geração, fomentando a arte das violas e a cultura popular caipira na
cidade. Sendo guarulhense nato, já fruto da migração, incumbe-se da manutenção dessa
tradição de um lugar para o outro. Ele também atua nas mesmas modalidades que o pai,
onde a Viola Caipira é um fator chave.
Os Mensageiros dos Santos Reis surgiu no final da década de 70, após a produção
pelo cantor e compositor Dino Franco, da dupla Dino Franco e Mouraí, do LP: A Viola
Vai ao Teatro (1979), com Tonico e Tinoco e a Orquestra de Violeiros Coração da Viola,
onde se sugeriu a introdução de faixas com músicas de Folias de Reis. Após essa
iniciativa, eles tiveram sucesso e gravaram no ano seguinte, em 1980, o disco Missa
Cabocla, que era totalmente composto de canções de Folias de Reis. Em São Paulo, na
capital, conheceram o mestre Antônio Gonçalves, com o qual formaram o grupo intitulado
Os Mensageiros dos Santos Reis, que se mantém atuante até hoje.
Na época, a cidade de Guarulhos possuía vários grupos de foliões, tais como a
Folia de Reis do Cocaia, a Folia de Reis de Vila Galvão, Folia de Reis do Cirilo, Folia de
Reis do Bom Clima e a Folia da Cidade Soberana 33, sendo que destes, só Os Mensageiros,
que são do bairro da Vila Fátima, ainda existe. A estrutura musical de uma Folia de Reis é
composta geralmente por um mestre, que comumente entoa a primeira voz, sucedido por
um contramestre que faz a segunda voz, e há um coro com outras vozes diversas, do tom
grave para o agudo. Nos Mensageiros havia dois mestres: “seu” Oliveira e Geraldo Garcia,

33 Bairros da cidade de Guarulhos.

41
conhecido como “Macuco”.
Macuco, inclusive, já participou de quase todos os grupos de Folia de Reis da
grande São Paulo e, lamentavelmente, veio a falecer em 2020. A viola, geralmente, fica a
cargo de três ou quatro violeiros, que vão de casa em casa cantando, entoando as velhas
canções de folias, dentre as quais, “seu” Oliveira nos apresentou um trecho para o registro
nesse trabalho:
“José é, é o filho de Davi, ai, lai
José, é o filho de Davi
ai, lai

Não tema em receber Maria, ai, lai


Ai le peço pra não
sair, ai, lai
Ai,aaiiiiiiiiiii”

(Em coro, várias vozes com notas altas, entoado no momento também de
“chegada” à residência do festeiro. Cantado por “seu” Oliveira, em
assistência nossa numa Folia realizada pelo seu grupo em 06/01/2019,
em Guarulhos).

2.1.2 Os Favoritos da Catira

O grupo Os Favoritos da Catira, nasceu em 1978 na cidade de Guarulhos, pela


idealização de “seu” Oliveira ou simplesmente Oliveira do Catira (outro nome pelo qual é
conhecido). Essa tradição, conforme nos contou, foi trazida de São José do Rio Preto. O
pai, “seu” Sebastião, e os amigos Luís Severo e Manuel Severo já dançavam a Catira e
faziam as festas onde tocavam viola a noite toda! (exclamação de “seu” Oliveira). Já
morando em Guarulhos, essa turma ia para a sua casa, onde ensaiava os passos de Catira
ao som da viola no espaço da garagem. “seu” Oliveira nos contou que aos 14 anos, ainda
em São José do Rio Preto, montou um grupo de Catira com seus colegas do interior,
improvisando modas, daí surgindo o gosto e o afinco pela questão da viola. A primeira
com a qual teve contato foi a de seu tio, e sempre que possível a pegava escondido,
passando a tocar nas horas vagas, conforme nos diz:

eu já vim com isso do interior, eu tinha mais ou menos uns 10 ano, 12 ano, meu
tio tinha uma violinha caipira daquelas "Meia-regra" e tocava ela todo fim de
tarde! Quando ele saia, que ficava descuidado, eu pegava a violinha escondido!
Aí com uns 13, 14 anos eu comecei cantá Folia de Reis, dança de Catira com as
molecada tudo amigo! Tudo incentivado pelos mais véio né, nós começou a tocá
viola, dançar Catira, cantá Folia de Reis! (OLIVEIRA, em entrevista, 2019).

42
A Catira é uma dança tradicional, relacionada às tradições caipiras e, de acordo
com alguns pesquisadores, é fruto de um intercâmbio cultural entre indígenas e
portugueses no início da colonização do país. Também se menciona como inerente à sua
criação o processo de catequização de índios guaranis pelos jesuítas. A dança é
caracterizada por pisadas fortes, com palmas ritmadas sincronizando-se com o sapateado.
A dança, geralmente, ocorre em círculos e também se verifica um “catireiro” se
posicionando de frente para o outro, acompanhados pelo som da viola 34. Ela é geralmente
executada no ponteio de uma moda de viola e o Recortado, ambos ritmos do universo da
Viola Caipira35.

2.1.3 Orquestra de Violeiros Coração da Viola

A orquestra surge quase que concomitante à AGAS, já descrita no Capítulo I, será,


neste momento, retomada com o intuito de aprofundarmos nossa análise do processo de
transformação da experiência musical tradicional e produto da indústria do disco.
Algumas duplas caipiras de Guarulhos se reuniam periodicamente na casa do presidente
da AGAS, o senhor Manoel Rezende, e numa dessas reuniões de violeiros, apareceu uma
dupla de irmãos mineiros que mais tarde seriam conhecidos como a grande dupla caipira
Pena Branca e Xavantinho. Foi, portanto, um começo promissor, pois a orquestra de
violeiros, em seus primórdios, contou com uma dupla que se tornaria muito popular
(MARTINS; OLIVEIRA; RAMOS, 2013).
A criação, de fato, da orquestra, surgiu com um convite de Tonico e Tinoco para
gravar um disco com coral e, quando descobriram a AGAS, os convidaram para participar
dessa empreitada. O projeto teve, a princípio, resistência de alguns violeiros, porém, estes
acabaram sendo convencidos e, então, formaram a Orquestra de Violeiros. O intuito era

34 A dança da Catira se popularizou graças à dupla Vieira e Vieirinha, no início dos anos 50, sendo estes os
pioneiros a introduzir esse ritmo musical caipira no disco e, com isso, popularizar a dança. Além de Vieira e
Vieirinha, outros catireiros famosos foram os seus primos e também violeiros, a dupla Liu e Léu e a dupla
Zico e Zeca, todos nascidos na cidade de Itajobi, interior de São Paulo.

35 A música caipira é caracterizada por sua grande variedade de ritmos musicais como, por exemplo, o
Cururu, Cateretê (origem indígena), Batuque de viola, Corta-Jaca, Lundú (origem africana), Guarânia, Polca
(origem paraguaia), dentre outros(CORRÊA, 2000). O Recortado e a Moda de viola são mais alguns ritmos
executados na viola.

43
reunir essa orquestra para a apresentação de Tonico e Tinoco no Teatro Municipal de São
Paulo, onde a dupla fez questão de ser acompanhada pela orquestra e a partir de então
seguiu-se o sucesso enquanto grupo. Assim, foi fundada a Orquestra de Violeiros Coração
da Viola, fazendo um trocadilho com o apelido da dupla Tonico e Tinoco (Coração do
Brasil). A Orquestra gravou três discos com a famosa dupla e a música de sucesso e título
do LP, A Viola no Teatro, foi composta, inclusive, por alguns integrantes da AGAS.
Foram gravados, ainda, alguns discos solo e a Orquestra excursionou por vários locais do
país, pois essa forma de experimento musical, com o uso das violas, era recente. 36

A rigor, nem toda orquestra é um conjunto formado por violeiros profissionais,


ao contrário, ela pode conter alunos de diversos níveis de formação (DIAS,
2012, p. 89).

O enunciado acima mostra uma característica detectada pelo violeiro e pesquisador


Saulo Sandro Alves Dias, em seu livro O Processo de Escolarização da Viola Caipira
(2012). O autor aborda o processo de criação de várias orquestras de violeiros de alguns
locais do país. A análise reforça a percepção de que o requisito principal para o ingresso
de um violeiro numa orquestra de violas é, normalmente, o interesse na cultura caipira e
também o gosto pelo instrumento, não sendo necessário, na maioria das vezes, um
conhecimento formal em música.
Vemos bem isto na composição da Orquestra Coração da Viola, onde grande parte
dos violeiros são trabalhadores (em sua maioria do ramo operacional), aposentados, que
têm origem rural e por vezes pouca escolarização formal, mostrando o quão democráticas
e acessíveis são essas orquestras, cujo intuito maior, a aprendizagem de como tocar a
viola, advém de uma relação de intercâmbio maior com a cultura caipira através da
música, onde emerge, mais uma vez, a relevância da viola enquanto um instrumento
musical de socialização.
Nas três linguagens descritas acima, Folia de Reis, Catira e a Orquestra de
Violeiros, “seu” Oliveira e seu filho Edson Catira, mostram-se atuantes e divulgadores da
Viola Caipira. As várias relações sociais que eles promovem, por meio do fomento a essas
manifestações, faz com que outras pessoas se insiram no contexto cultural orientadas pela
música e também, em decorrência, contribuem para a continuidade da cultura da Viola
Caipira entre nós, fenômeno verificado dentre todas as faixas etárias, cujos nexos se

36 Para um estudo mais aprofundado sobre a criação e difusão de Orquestras de Violeiros, ver: DIAS, 2012.

44
aprofundam com essa tradição popular e demais violeiros e artistas da cidade.

2.1.4 Duplas e artistas solo

Guarulhos é uma cidade com larga tradição em revelar duplas caipiras, dentre
tantas, podemos destacar as célebres Pena Branca e Xavantinho, Camões e Camargo,
Ronaldo Viola e João Carvalho, Joseval e Josiene e muitos outros artistas populares deste
estilo. Muitos são remanescentes da Orquestra Coração da Viola, ou da participação em
eventos culturais de música caipira como o Viola Viva, sob o comando de Áurea Fontes,
por exemplo, já descritos anteriormente e que despontaram na carreira no formato de
duplas, modalidade esta que é a mais conhecida pelo uso da Viola Caipira 37.
A dupla é um formato composto por dois músicos, geralmente com viola e violão,
que caracteriza a música caipira além do canto em dueto, sendo que um deles emite a
primeira voz, a melodia principal e o parceiro entoa a segunda voz, que resulta na
harmonia da “moda” (VENTURA, em entrevista, 2019).
Em Guarulhos encontramos também artistas solo que se apresentam por toda a
cidade e que trazem a essência da música de raiz, porém, fazendo novas leituras musicais
com o uso da Viola Caipira como, por exemplo, o músico, cantor e compositor Orlando
Alvorada, o também músico e compositor Amauri Falabella, e o violeiro Ricardo Dutra,
que são grandes expressões da viola na cidade e que já trazem um som considerado mais
refinado e diversificado com o instrumento.
Nesse nicho de duplas caipiras e artistas solo, entrevistamos o duo Quando o
Inhambu Cantou no Meu Quintal, formado pelo violeiro, cantor e compositor Antony
Ventura, 25 anos, natural de Guarulhos e seu parceiro Ricardo Santiago, 29 anos, nascido
em Itu, interior de São Paulo e, também, Orlando Alvorada, 69 anos, natural de Lucélia,
também interior de São Paulo, todos eles artistas e moradores na cidade. As entrevistas
com estes artistas serão analisadas no Capítulo III.

2.2. A Viola Repentista

A outra modalidade musical identificada pela pesquisa em Guarulhos, com o uso

37 De acordo com Ivan Vilela, a partir dos anos 40 começa-se a definir o padrão de duplas caipiras a duas
vozes, com acompanhamento de viola caipira e violão. Padrão esse que se mantém até os dias atuais.

45
de violas e que faremos a descrição a seguir, é a da Viola Repentista e/ou Viola de
Cantoria, as duas nomenclaturas são empregadas, porém, para efeito de clareza no texto,
só usamos aqui a expressão Viola Repentista. Outro ponto, também digno de nota é que,
devido à falta de registros históricos e bibliografias referentes a essa outra modalidade de
arte com o uso da viola na cidade (ver nota 3), nosso trabalho se respaldou nos
depoimentos e entrevistas a nós concedidas pelos violeiros repentistas que contatamos e o
resultado aqui apresentado buscou ser o mais próximo daquilo que os nossos
interlocutores nos disseram sobre sua arte e trajetória cultural. O resultado da migração
foi, portanto, uma configuração local particular que buscamos descrever conforme as
diretrizes metodológicas propostas por Geertz (1989), a propósito da importância da
etnografia enquanto estilo narrativo centrado na experiência microscópica ou local.
A cantoria, embalada ao som de violas, é uma arte de tradições rurais e das
pequenas cidades dos sertões do Nordeste brasileiro, principalmente da região do
semiárido nordestino. A partir da década de 70, quando há um fluxo do eixo rural para o
urbano, com o crescimento populacional nos grandes centros urbanos brasileiros, a Viola
Repentista, acompanhando esse movimento, migra para a cidade. No caso dos muitos
migrantes nordestinos que vieram para a região Sudeste em busca de trabalho, acabaram
também trazendo sua cultura e o apreço pela viola a tiracolo.
O cantador Dedé Laurentino, 66 anos, violeiro repentista residente em Guarulhos,
afirma que os migrantes: “incharam a cidade em busca de trabalho e melhores condições
de vida”, vieram trazendo na bagagem sua cultura, seus hábitos e, por consequência, a
viola, tão própria de seus locais de origem (LAURENTINO, em entrevista, 2019).
Assim, a Viola Repentista, que faz parte da cultura e da tradição dos sertanejos,
migrou para as grandes cidades e Guarulhos, como uma cidade caracterizada por um
elevado número de indústrias e ofertas de emprego, absorveu muitos migrantes entre as
décadas de 70 e 90, onde este migrante reelaborou a cultura tradicional, sendo os próprios
violeiros repentistas um dos principais agentes de tal processo. Quanto ao público ouvinte
dessas cantorias no Nordeste possibilitou que o estilo passasse a ter um tom urbano e
acabasse se inserindo no âmbito cultural da cidade.
Em seu livro Revirando a História de Guarulhos, o historiador Elói Pietá nos diz
que “[...] a cidade, ao explodir em indústrias, explodiu em população [...] milhares de
famílias do interior do estado de São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Mato Grosso, Nordeste

46
e Norte [...] dessa massa fez-se a maior parte dos habitantes de Guarulhos” (PIETÁ, 1992,
p.16).
Já, o pesquisador Expedito Leandro, em seu livro Formação de uma Metrópole,
salienta:

[...] com a metropolização da Grande São Paulo, Guarulhos também passou a


receber e continua recebendo grande número de migrantes, [...] pessoas vindas
das diversas regiões do país, especialmente do interior de São Paulo e dos
estados do Nordeste (LEANDRO,1998, p.33).

Em Guarulhos identificamos vários repentistas tocando e cantando “repentes” ao


som da viola, em diferentes contextos, em bares, Casas do Norte, em eventos culturais e
festas de família, dentre os quais, destacamos: Dedé Laurentino (cearense), Gilberto Alves
(alagoano), Antônio Dantas (paraibano), Gérson Bandeira (pernambucano), Severino
Souza (paraibano), Chico de Oliveira (cearense) e Luiz Ferreira (pernambucano), violeiros
nordestinos que são artistas e moradores na cidade. As entrevistas que fizemos foram com
os violeiros repentistas Dedé Laurentino, que reside em Guarulhos desde meados da
década de 90, Gilberto Alves, 54 anos, que fixou residência na cidade em 2015 e Antônio
Dantas, 53 anos, morador no município desde 1998. Essas entrevistas serão exploradas
mais adiante, no Capítulo III dessa Dissertação.

O desafio – ou peleja, cantoria ou porfia – entre dois violeiros que improvisam


versos sobre os mais variados temas, acompanhados pelo acorde simples e
repetido de uma viola ou violão, foi cultivado na Europa durante os séc. XVI,
XVII e XVIII, chegando ao Brasil através dos colonizadores portugueses (Rose
Guirro), Extraído da contracapa do LP da Dupla Repentista: Moacir Laurentino
e Sebastião da Silva,1980, Gravadora Chantecler (apud. POMPEU, 2014).

Com base nesta citação, identificamos uma particularidade da Viola Repentista,


isto é, o improviso. O toque da viola é simples e serve de acompanhamento para os versos
que são feitos na hora (LAURENTINO, em entrevista, 2019). Nessa forma de tocar a
viola, a mesma serve de um fundo musical para os versos que são criados “de repente”,
por isso a alcunha de Viola Repentista, e o músico que pratica esse estilo de arte é
chamado de violeiro Repentista ou, simplesmente, repentista (ALVES, entrevista, 2019).
No que tange à afinação, ela difere da Viola Caipira (que possui dez cordas), onde
são dispostas sete cordas, de baixo para cima em Ré-Lá-Fá-Dó-Sol, denominada Afinação

47
de Cantoria38. Mas, na atualidade, a maioria dos repentistas usam a viola com uma
afinação um tom acima dessa afinação clássica, bem mais alta nas notas, o que faz com
que a viola tenha um timbre bem mais agudo. É o caso de todos os repentistas que
pesquisamos, que geralmente usam o modelo de viola chamada Dinâmica, com um disco
de metal interno e ressonadores, que dão um timbre mais metálico e “anasalado” ao
instrumento e é a preferida pela grande maioria dos repentistas 39.
Outro ponto a esclarecer aqui é que existem vários nomes dados ao violeiro
Repentista, dentre eles, cantador, poeta, trovador, improvisador e simplesmente violeiro.
Mas, em nossa escrita buscaremos sempre a eles nos reportar pelo nome de violeiros
Repentistas, para frisar a diferença destes em relação aos violeiros Caipiras, já descritos, e
também para deixar mais didática a exposição do trabalho, cujo objetivo é mostrar a arte
dos violeiros em Guarulhos em ambas expressões artísticas.

2.2.1 O Improviso

A base da Viola Repentista é o improviso. O termo se refere aos versos que são
cantados e improvisados na hora, dentro de métricas e rimas muito bem estabelecidas e
com estruturas bem rígidas onde temos, por exemplo, as sextilhas, sete linhas, quadrão de
oito e de dez versos, décimas, decassílabos e uma gama de gêneros poéticos que fazem a
riqueza cultural da cantoria ao som da viola 40
. Neste quesito, o de “seguir à risca” as
regras da cantoria, o cantador Dedé Laurentino nos dá a seguinte afirmação:

É a única parte que canta rimado, que tem essas exigências de rima, são os
repentistas do Nordeste e aí tem um acompanhamento da viola né...... Tem esse
acompanhamento aqui ó, bonito!!! Fica bonito demais né menino?! Dá até
vontade de cantar né não?!(risos) (LAURENTINO, entrevista, 2019).

38 Para um estudo acerca das afinações e estilos de violas no Brasil, ver: CORRÊA, 2019, pp.41-43.
39 A viola de modelo Dinâmico se popularizou no Brasil através do luthier Angelo Del Vecchio, nos anos
40, dono da fábrica de instrumentos musicais de mesmo nome, que inovou na construção de um instrumento
inspirado no violão Ressonator norte-americano, usado no Blues. Esse modelo de viola se popularizou no
Brasil entre os cantadores repentistas a partir da década de 50. Tanto que, muita gente hoje comumente
chama esse estilo “dinâmico”, que consiste num instrumento com um disco metálico e ressonadores em seu
interior, que fazem com que o timbre do instrumento se torne peculiar. Até hoje, é muito popular entre os
violeiros repentistas.

40 Para um estudo mais aguçado acerca das métricas poéticas usadas no repente nordestino, ver: ASSIS,
1996 e SANTOS, 2012.

48
É importante destacar que o repente pode ser praticado com vários instrumentos de
acompanhamento, como o pandeiro (mais usado na Embolada e que não tem a obrigação
de métricas de rima como o repente com violas), ganzá, viola, ou até mesmo sem nenhum
instrumento, como se faz numa Mesa de Glosa muito comum no sertão nordestino, onde
vários poetas sentam-se em torno de uma mesa para improvisarem versos na hora, com
temas e assuntos sorteados pelo público (SANTOS, 2012).
O improviso é difundido por todo o Brasil, entretanto, cada região possui sua
forma de expressão desta poesia popular, sendo elas percebidas nas Trovas Gaúchas, com
seus vários gêneros poéticos, no Calango Mineiro da região do Norte de Minas Gerais, no
Cururu Paulista da região piracicabana e até no samba de Partido Alto do Rio de Janeiro,
ou seja, notamos que o improviso é parte central de muitas manifestações culturais pelo
país, mas no repente nordestino ao som de violas, o rigor métrico é imprescindível.
Mesmo na cidade, o violeiro Repentista não perde sua essência sertaneja e notamos
na sua arte um misto de cantar suas origens rurais e também suas experiências em relação
à cidade grande. Tal fato foi detectado nas falas dos entrevistados e percebemos que isso
se torna um fator fundamental para a manutenção dessa arte, pois o público que assiste a
uma cantoria de violeiros repentistas, muitas vezes solicita os temas para o cantador
improvisar. Surgem, nesses momentos, assuntos relacionados a sua infância, a sua terra, a
um passado que muitas vezes se assemelha à trajetória do cantador, fazendo com que o
repente ao som de violas tenha um caráter saudosista e representativo para aqueles que
ouvem, pois acabam se identificando e se emocionando com os versos do violeiro
Repentista.
A memória afetiva é recíproca, tanto para os artistas quanto para os apreciadores
do repente que se reconhecem nessa expressão artística. Mas também, o fato de viverem
agora em um ambiente urbano, tanto os repentistas quanto os ouvintes, possibilita que
novas temáticas surjam nos improvisos, principalmente trazendo a relação desse
nordestino com a metrópole, desse migrante no novo lugar, no qual vemos o repente como
uma linguagem representativa da experiência rural e urbana, que ao som das violas narra
de maneira poética o processo migratório e denota a plasticidade do repente, que tem a
característica de narrar o “momento”, o presente, uma arte que mesmo tradicional, sempre
se atualiza.

O público flui diretamente a presença dos cantadores e seu desempenho

49
artístico. Analisada deste ângulo, a cantoria torna-se um acontecimento
extraordinário jamais repetido, pela própria especificidade da poesia
improvisada. É uma espécie de ritual às avessas: um ritual que apresenta
sempre o novo, que sempre traz uma experiência nova, impossível de ser
repetida, tanto pelos cantadores quanto por seus ouvintes (AYALA,
1988, p.17).

Como a Viola Repentista está totalmente atrelada à questão do improviso, algo que
fica latente é que todo improviso deriva de alguma memória, de alguma experiência ou
fato já vivido (SAUTCHUK, 2009). Prova disso é que os cantadores entrevistados citaram
que se “descobriram” cantadores, ouvindo repentistas pelo rádio, quando criança,
frequentaram cantorias de violeiros cantadores de seus lugares de origem, mostrando que a
questão da memória é de suma importância dentro do contexto da Viola Repentista. Pois o
que é cantado, improvisado, é totalmente mergulhado em experiências e trajetórias, não só
dos artistas, mas também das histórias de vida das pessoas que ouvem esses violeiros, e de
toda uma relação com o meio de onde provêm e com a situação agora vivida no contexto
da cidade grande.
A Viola Repentista é um tipo de arte que necessita muito da vivência e da relação
do cantador com o meio no qual viveu ou vive, com suas experiências e também como
esse cantador consegue captar o interesse do público na hora de cantar os repentes. O
cantador, muitas vezes, sabe o que o ouvinte gostaria de ouvir em uma cantoria, portanto,
se mostra que o repente ao som de violas, além de ser uma arte que exige espontaneidade,
memória e vivência, exige também uma proximidade muito forte entre o violeiro e o
público, numa relação equânime e mais próxima entre artista e espectador (SAUTCHUK,
2009).
A Viola Repentista se afirma em Guarulhos como cultura popular com traços bem
tradicionais e, mesmo sendo difundida na cidade grande e absorvendo em suas práticas
valores urbanos, a estrutura de performance41 do violeiro repentista se mantém intacta.
Porém, vemos que ela vem se tornando muito mais urbana, acompanhando o fluxo
migratório desse ouvinte e até do repentista para a cidade. Isso faz com que ela se
“modernize” em relação aos assuntos que são abordados durante a cantoria, onde ela fica
nesse paradoxo, tradicionalmente presa às métricas poéticas e regras já há muito
estabelecidas, mas desenvolvendo temas e assuntos mais ligados a uma vida urbana, à

41 Para um estudo mais aprofundado sobre a performance do cantador repentista, ver: SANTOS, 2018.

50
tecnologia e questões atuais. Nesse ponto, o violeiro repentista Gilberto Alves nos
informa:

Porque na verdade, a cantoria rural né...ela hoje está acontecendo com muito
menos frequência, a cantoria hoje, tornou-se urbana porque... quando a
eletricidade chegou à zona rural, aí os costumes urbanos chegaram à zona rural,
a novela, a parabólica mostrando 1000 canais, internet, por isso que as
categorias estão saindo da zona rural mais para a zona urbana e as grandes
metrópoles (ALVES, em entrevista, 2019).

Ainda nesse quesito, o cantador repentista e pesquisador do Repente Nordestino,


Edmilson Ferreira dos Santos, em seu livro intitulado A Poética da Cantoria na
Contemporaneidade, apresenta a seguinte argumentação:

A abertura ao novo torna-se uma condição importante para a existência e a


resistência das poéticas populares, que percebem o quanto o meio exige delas,
no que concerne às trocas de experiências, às influências mútuas. A tradição,
nesse sentido, precisa se refazer, se reinventar para continuar viva (SANTOS,
2018, p.49).

Nas afirmativas acima, notamos que o fator da migração de uma arte, de seu
habitat para outro e também a modernidade, contribuem para a reconfiguração da arte da
Viola Repentista num ambiente urbano, onde se mostra o dinamismo da cultura. Também
ressalta-se que, quaisquer manifestações populares, por mais tradicionais que sejam,
acabam se abrindo a novas perspectivas e sendo esse, quiçá, um dos motivos de sua
permanência e difusão, num ambiente diferente do seu local de origem.

2.2.2 As métricas poéticas

Outra característica inerente à Viola Repentista são as métricas poéticas usadas


pelos cantadores na execução dos repentes. Sendo que, aqui, as métricas são exigências no
momento do cantador improvisar e um consenso entre os violeiros e “apologistas” 42
(AYALA, 1988). No instante em que se inicia a cantoria, as violas começam a embalar o

42 Apologistas é como são chamados os ouvintes de cantoria pelos cantadores, aqueles mais assíduos na
assistência às cantorias e que são mais exigentes na hora de pedir os motes e temas para o cantador
improvisar.

51
Baião43, que são toques no instrumento, com acordes bem simples, que inspiram o
cantador a improvisar os versos. O Baião de Viola, como também é chamado, é o
momento em que os violeiros repentistas estão improvisando com o acompanhamento das
violas e, “entre um baião e outro”, fazem um intervalo para beber uma “caninha” ou uma
cerveja e interagir com os ouvintes. Geralmente, uma cantoria dura de três a quatro horas e
ocorre, durante esse período, entre cinco a seis baiões de viola, intercalados com contação
de “causos” (estórias de Trancoso, como falam os nordestinos) e interpretações de canções
de outros repentistas e/ou cordelistas (ÂNGELO,1996; AYALA,1988; SAUTCHUK,
2009).
Assis Ângelo, jornalista e pesquisador da MPB e das métricas poéticas utilizadas
pelos violeiros repentistas, afirma em seu livro A Presença dos Cordelistas e Cantadores
Repentistas em São Paulo (1996), que existem mais de setenta modalidades de estruturas
poéticas que são utilizadas pelos violeiros repentistas, dentre as quais, daremos alguns
exemplos. São estrofes cantadas pelos repentistas que entrevistamos, respectivamente,
Antônio Dantas, Dedé Laurentino e Gilberto Alves:
A) Não sei a quem devo tanto
B) Pra sorte me castigar
A) Sou cantador, mas não canto
B) Que ela me obriga a chorar
C) Minha desdita talvez
C) Que a natureza me fez
D) Como uma coisa esquecida
E) E eu para me esparecer
E) Atrevi-me a escrever
D) Martírios da minha vida

Métrica poética: Décimas, estrofes com 10 versos de 7 sílabas poéticas -


(Antônio Dantas, violeiro repentista, interpretando a canção Martírios da Minha Vida, do
repentista e poeta cearense Antônio Maracajá, em cantoria realizada em Guarulhos, em
2016, no bairro Jardim Cumbica, na qual estive presente).

X) O meu pensamento cria


A) O juízo não se atrasa (Improvisada por Gilberto Alves)
X) Com vocabulário fácil
A) Com cada palavra arrasa

43 O Baião é um ritmo musical brasileiro que foi introduzido na MPB pelo sanfoneiro, cantor e compositor
Luiz Gonzaga (1912-1989) em 1945, em parceria com o também compositor Humberto Teixeira (1915-
1979). Porém, o Baião é oriundo do som das violas sertanejas usadas pelos repentistas, e essa célula rítmica
foi introduzida por Gonzaga na música brasileira e o Baião, que era o fundo musical para improvisar os
repentes, tornou-se um ritmo musical dançante. Mas, até hoje os violeiros repentistas usam o termo Baião
para designar o som de acompanhamento da viola enquanto improvisam seus versos .

52
X) Que quem canta de improviso
A) Não traz pronto de casa
________ ***_________
X) Sem ser avião da NASA
A) Meu verso passa na praça
X) Sobe pelo mundo afora (Improvisada por Dedé Laurentino)
A) Envolto pela fumaça
X) E passa por cima de nuvem
A) Que nem um avião passa

Métrica poética: Sextilhas, estrofes com 6 versos de 7 sílabas poéticas. O “X”


significa que o 1°, 3° e 5° versos não precisam rimar. Quando isso ocorre, os repentistas
chamam de Sextilha Fechada (Gilberto Alves e Dedé Laurentino, violeiros repentistas,
versos improvisados em cantoria realizada no bairro Ponte Alta, Guarulhos, em 2015, na
qual estive presente).

X) Eu voltando ao meu longo passado


A) Recordei-me de uma donzela
X) A quem dei um anel de noivado
A) Prometendo de casar com ela
X) Parece agora estou vendo-a
A) Debruçada naquela janela
X) Onde eu fiz uma jura e parti
A) Conduzindo o retrato dela

Métrica poética: Oitava Solta, estrofes de 8 versos de 7 sílabas poéticas. O “X”


significa que esses versos não precisam rimar (Gilberto Alves, violeiro repentista, em
cantoria realizada no bairro Ponte Alta, Guarulhos em 2015, na qual estive presente).

No que concerne às métricas poéticas, usadas pelos violeiros repentistas, podemos


citar as mais utilizadas durante as cantorias, de acordo com os depoimentos dos violeiros
contatados, que são: Galope a Beira-Mar, Mourão em Sete Linhas, Sete Linhas, Mote em
Sete Sílabas, Mote em Dez, Brasil Caboclo, No Tempo de Pai Tomás, Quando Eu Ia Ela
Voltava, O Cantador de Vocês, Toada Alagoana, Gemedeira, Coqueiro da Bahia, Martelo
Gabinete, Mourão de Pé Quebrado, Dez Pés Lá Vai, Quadrão Perguntado, Oito Pés a
Quadrão, Quadrão a Beira Mar, Oitavão Rebatido, Martelo Agalopado e Martelo
Alagoano44.Onde percebemos que a pluralidade na Viola Repentista é dada pelas várias

44 Para reforçar o entendimento sobre os vários estilos do Repente ao som de viola, citaremos o que Assis
Ângelo descreve sobre métricas antigas e recentes para mostrar ao leitor a grande variedade de estilos que
são usados pelos violeiros repentistas: “No reino da cantoria podem ser enumeradas mais de setenta
modalidades diferentes de repentes, algumas com pequenas variações entre si. Pouco mais de uma dúzia
delas, porém, está em desuso há muito tempo como ABC em Tercetos (quadros e sextilhas), o Ovilejo
(desconhecida pela maioria dos cantadores), Quadra ou Obra de Quatro Pés (as estrofes eram formadas de

53
métricas poéticas em que os violeiros improvisam seus versos (e compõem suas canções),
sendo, pois, essa a característica mais específica e tradicional da viola no estilo
Nordestino.
Já, na Viola Caipira, notamos uma característica de pluralidade nos ritmos que são
tocados na viola, como por exemplo, Moda de Viola, Huapango, Valseado, Pagode–de–
Viola, Moda Campeira, Cateretê, Toada, Chamamé, Guarânia, Polca, Rasqueado, Cururu,
Rancheira, Recortado e muitos outros45. De maneira sintética, podemos dizer que na Viola
Caipira há uma pluralidade de ritmos musicais e na Viola Repentista uma pluralidade de
métricas poéticas, sendo esta, pois, uma característica que difere ambos os estilos que
usam a viola como instrumento de expressão artística.

2.2.3 A divulgação das cantorias

Outro aspecto que destacaremos a seguir são as formas de divulgação das cantorias
de viola pela cidade, feitas em parte pelos próprios repentistas e também pelos ouvintes e
promoventes de cantorias. Vemos nesse processo um esforço coletivo na promoção e
realização dos eventos e, mais uma vez, fica clara uma relação de proximidade entre o

setessílabos), Mourão em 5 linhas, Mourão em 6 linhas, Mourão em 7, Galope por Dentro do Mato, Galope
Miundinho, Parcela (houve quem a identificasse como Embolada) e Quebra Cabeça é Assim, além da Oitava
Solta, muito rara. As demais modalidades são: Sextilhas, Septilha, Oitava, Décima Curta, Décima Solta,
Décima em Mote (ou Tema), Décima com Rimas Idênticas, Dez de Queixo Caído, Falta um Boi Vaqueiro
no Meio dessa Boiada, Parcelinha, Parcela de decassílabo, Brasil Caboclo, No Tempo de Pai Tomás,
Quando eu Ia ela Voltava (também conhecida por Rojão Pernambucano), O Cantador de Vocês (ou 13 por
12), o Oiteiro (13 por 13) ou Nó (desenvolvida em estrofes sem forma fixa, cujo o tema oferece dificuldades
que o cantador deve decifrar para não perder a cantoria, segundo Sebastião Nunes Batista), Embolada de
Dez Carreirão, Embolada de Dois Pés (ou Toco), Gemedeira, Gemedeira Dez Linhas, Nas Quebradas do
Sertão (variante do Oito Pés a Quadrão), Toada Alagoana (Nove Palavras por Seis), Gemer de Dois é Assim,
Comigo o Rojão é Quente, Coqueiro-da-Bahia, Galope Gabinete ou Martelo Cruzado (composto de sextilhas
em decassílabas, de pouco uso ultimamente), Gabinete Repetido, Mourão de Pé Quebrado (ou Mourão
Quebradinho), Pé Quebrado de Quatro Linhas, Mourão Voltado, Mourão Decassílabo, Mourão Trocado,
Mourão de Você Caí (ou Dez Pés lá Vai), A Resposta foi Bem Dada, Assim está Respondido Conforme foi
Perguntado, Perguntei um Martelo quem Responde Martelo é Campeão, do Seixas ao Rio Moa do Oiapoque
ao Chuí, No Pé da Cajarana, Tudo Sei Ninguém me Ensina, Segure o Remo, Quadrão Brasiliano, Quadrão
em Oito Linhas, Quadrão em Dez Linhas, Quadrão de Meia Fala, Quadrão Paraibano, Quadrão Paulista,
Quadrão Perguntado, Quadrão Mineiro, Quadrão a Beira-mar, Quadrão Respondido, Meia quadra, Meia
Quadra Ligeira, Oitavão Rebatido, Oitava Ligeira, Dezoito Linhas, Galope a Beira-mar, Galopeia Beira-mar
Soletrado, Martelo Alagoano, Martelão (O Que é que Me Falta Fazer Mais?), Martelo Agalopado, Dez Pés a
Quadrão, Taboada, Mote de 2 Pés em Decassílabo Glosado em Décima, Mote de 2 pés em Setessilabos
Glosado em Décima, Mote Glosado em Décima Trava a Língua, Rojão Brejeiro (10 por 7), Galope Caboclo
(10 por 12) e Desmancha (ou Décima Corrida)” (ÂNGELO, 1996).

45 Para um estudo sobre os ritmos musicais que são difundidos na cultura Caipira, ver: CORRÊA, 2000 e
HIGA, 2010.

54
apreciador da arte e o artista.
Os violeiros repentistas em Guarulhos usam principalmente três formas básicas
para divulgar suas cantorias para o público.
Em primeiro lugar, o “boca a boca”, onde os poetas violeiros convidam amigos e
conhecidos para as suas apresentações e esses acabam convidando outras pessoas, com o
objetivo de formarem o público da cantoria, marcado por um ambiente de amizade,
reencontro de amigos e um espaço onde os repentes cantados decantam as vivências dos
nordestinos migrantes e os sentimentos de recordação latentes em muitos versos que são
pedidos pelo público aos violeiros46.
Outro aspecto, também, a ser sublinhado é que a maioria das cantorias são ligadas
a um espaço físico delimitado, como uma casa de família, um bar, ou uma Casa do Norte.
Em Guarulhos, os violeiros repentistas não se apresentam em espaços abertos como feiras
e praças públicas, como se vê comumente no Nordeste. Sempre que são convidados para
cantar, é em algum momento de celebração, como em um casamento, um batizado, um
aniversário (ocasião mais comum), ou seja, as apresentações são acertadas previamente,
como dizem os repentistas. A cantoria é “tratada” antes da ida do cantador violeiro ao
local.
O segundo meio de divulgação das cantorias é o Rádio47, onde os violeiros se
apresentam, improvisam e anunciam ao público onde cantarão, sendo esta outra forma
eficaz para chamar o público, pois muitas vezes as cantorias ocorrem num bairro ou
município longe do interessado e com o endereço destas apresentações anunciado no
Rádio, mais pessoas de pontos distantes têm a oportunidade de assistir a uma cantoria de
viola. Em Guarulhos existe a Rádio Cumbica (AM 1500 kHz) que, aos domingos das 12h
às 14h, leva ao ar o programa Violas de Canto a Canto, onde são anunciadas as cantorias
dos violeiros não só na cidade, como também em outros municípios nos quais eles venham

46 É importante frisar que toda a apresentação de violeiros repentistas são em duplas, pois eles criam seus
repentes no esquema de “deixas”, ou seja, cada último verso serve de base para o parceiro criar a sua estrofe,
tanto que, muitos repentistas não cantam ou improvisam sozinhos. Raramente se vê repentistas cantando
improvisos sozinho, salvo quando interpretam canções já escritas, o que eles chamam de “trabalho feito”.

47 Devido a Pandemia da Covid-19, atualmente as cantorias estão sendo feitas por alguns violeiros, muitas
das vezes em formato digital por Lives, onde anunciam contas bancárias e pedem apoio financeiro para
continuarem fazendo sua arte, pois alguns, como Gilberto Alves, vivem exclusivamente da profissão de
Repentista e o isolamento imposto pelo problema de saúde pública impacta na renda do artista. A profissão
de violeiro Repentista é regularizada desde 2010, pela lei N°12.198 de 14 de janeiro de 2010.

55
a ter agenda48. Outra rádio muito utilizada pelos repentistas é a Rádio Imprensa (FM 102,5
Mhz), localizada na capital paulista mas muito frequentada pelos violeiros de Guarulhos,
que comumente se apresentam no programa Violas e Repentistas, realizado aos domingos,
das 9h às 11h, sob o comando do também poeta e promotor cultural Luiz Wilson.
Por fim, o terceiro meio de divulgação de cantorias, que está sendo muito usado
pelos violeiros repentistas atualmente, são as redes sociais, principalmente o Facebook e o
WhatsApp, onde são produzidos panfletos digitais (os famosos Flyers), contendo
informações sobre onde será o evento, se haverá ingresso ou “bandeja”49e quais
cantadores se apresentarão. Com artes gráficas bem simples, com um caráter meramente
informativo, mas que, pela rapidez de compartilhamento nessas mídias, torna-se outra
forma eficiente para a divulgação das cantorias.
Hoje, quase todos os repentistas possuem mídias sociais (inclusive os nossos
entrevistados) e, mais ainda, o processo de divulgação de seu trabalho é feito de maneira
autônoma e conta com a colaboração de amigos e fãs nos compartilhamentos das
atividades que desenvolvem. Não há um incentivo financeiro e nem divulgação desses
artistas por parte dos órgãos públicos ligados à cultura em Guarulhos, onde, de fato, eles
não tem nenhum suporte de caráter institucional, somente contam com o apoio dos
apreciadores da arte.
Nesse capítulo, abordamos algumas das peculiaridades e especificidades do
universo da Viola Caipira e da Viola Repentista, respectivamente, bem como sua difusão e
manutenção por intermédio dos interlocutores que nos cederam seus ricos relatos e a
consulta aos valiosos escritos sobre ambos os estilos que fazem uso das violas. Buscamos
sintetizar o que é essa rica arte, cheia de histórias e memórias, que ocorre em Guarulhos.
Adiante, no Capítulo III, vamos conhecer mais sobre a viola e os violeiros na
contemporaneidade.

48 O Rádio, durante muitos anos, foi um meio importantíssimo para o público conhecer o violeiro repentista
e o repentista ser reconhecido profissionalmente, e ter visibilidade na profissão. Atualmente, o Rádio já não
tem essa força, mas se mostra um veículo de relevância na divulgação das atividades dos cantadores.
49 As cantorias dos violeiros repentistas são pagas de duas formas já consolidadas entre eles e o público, que
são: o ingresso pago previamente e/ou a bandeja, que é colocada à frente dos cantadores durante todo o
tempo em que a cantoria permanece, onde o público deposita o dinheiro, a chamada “paga do cantador”.
Atualmente, a cantoria com bandeja está acontecendo com menos frequência e a maioria das cantorias
realizadas são acertadas previamente pelo organizador ou contam com a cobrança do ingresso.

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CAPÍTULO III – A VIOLA NO CONTEXTO GUARULHENSE
CONTEMPORÂNEO

3.1. Violeiros no presente

Atualmente, com a reestruturação da Orquestra de Violeiros Coração da Viola, os


violeiros voltaram à atividade artística, fazendo apresentações (no formato online),
principalmente em espaços como teatros ou eventos temáticos, conforme relata “seu”
Oliveira que, recentemente, participou de uma gravação em comemoração aos 40 anos da
Orquestra Coração da Viola em Guarulhos, realizada em 27 de março de 2021. Nessa
gravação, promovida pela Secretaria Municipal de Cultura de Guarulhos, com o apoio do
Fundo Municipal de Cultura (FUNCULTURA) e com recursos da Lei Federal Aldir
Blanc, de 2020, foi feita uma Série com três episódios que narram a trajetória e as
histórias de alguns remanescentes da Orquestra ao longo desses 40 anos de atividade
(intercalados por momentos de paradas e recomeços), e a forma como os violeiros
difundem esse fenômeno cultural no município.
Sobre a questão de eventos promovidos em formato online, verificamos que muitos
artistas estão usando essa ferramenta como meio de divulgação dos seus trabalhos, como é
o caso da dupla Anthony Ventura e Ricardo Santiago (o duo Quando o Inhambu Cantou
no Meu Quintal), que recentemente lançou seu mais novo trabalho: o disco Estrada Mãe
(2021), cuja divulgação foi feita pelas redes sociais dos músicos (Facebook e Instagram) e
por serviços de streaming (Spotify). Há também o recurso às lives e convites nas suas
páginas de relações, chamando o público para participar, interagir, colaborar (patrocinar)
com a produção do disco e compartilhar seu trabalho (Antony Ventura em depoimento
realizado em abril de 2021).
Os exemplos acima mostram a Internet como uma grande propulsora para a
divulgação da arte das violas em Guarulhos na atualidade, algo que se acentuou agora, no
contexto do isolamento social imposto pela Pandemia da Covid-19 desde 2020. A questão
da facilidade advinda da Era Digital está contribuindo ainda mais para a fruição dessa
cultura pela cidade. A viola está migrando de espaços presenciais para espaços virtuais e o
alcance é muito maior, na visão de Ventura, angariando públicos de várias faixas etárias.
O mesmo se verifica no caso da Orquestra de Violeiros, que mantém um público fiel,
tradicional, que já conhece o trabalho – um público de idade madura – que agora os

57
acompanham pelos meios digitais. Já os integrantes do Quando o Inhambu Cantou no Meu
Quintal apresentam um trabalho mais ligado à juventude, pois eles mesclam a arte da
Viola Caipira com um estilo mais contemporâneo e também com uma roupagem da Viola
Caipira nos moldes do já consagrado violeiro mato-grossense Almir Sater, que é uma das
fontes de inspiração de seu trabalho artístico.
Já o Evento Viola Viva permanece na estrutura tradicional, que são os encontros
presenciais, uma vez ao mês, no mesmo teatro, há 25 anos, o Teatro Nelson Rodrigues,
localizado na Vila Galvão, bairro de Guarulhos próximo a Zona Norte de São Paulo.
Devido ao contexto de pandemia e ao isolamento social, as atividades estão ainda
paralisadas e sem previsão de retorno50.
Em relação aos violeiros repentistas, uma coisa bem peculiar de sua arte é que o
improviso é a forma de angariarem recursos, ou seja, as cantorias online agora estão em
voga, devido também ao contexto da pandemia, sendo que muitos repentistas estão
promovendo esses encontros online e fazem o pedido para o depósito em conta bancária
da “paga do cantador”, pois, muitos artistas realmente vivem exclusivamente da arte
(como frisa Antônio Dantas). Essa forma de promover as cantorias, em formato virtual,
tem o intuito de obter verbas e se torna algo novo para os cantadores (Antônio Dantas em
encontro presencial e ocasional dia 06/05/2021).
Conforme mencionamos, um fato que chama bastante a atenção na promoção e
divulgação da viola, em ambas as linguagens, são as redes sociais. Esse novo canal de
divulgação para o fomento e a circulação da arte dos violeiros em Guarulhos também se
apresenta como alternativa ante ao fato de a Secretaria Municipal de Cultura atuar ainda
de maneira ínfima e, mesmo em seu site, não haver uma divulgação constante da Agenda
Cultural, que condense eventos de várias linguagens e os integre ao calendário cultural da
cidade. Outro fator a impulsionar as ações nas redes sociais é o fato deste site não ser tão
conhecido pelo público, sendo que a forma do convite pessoal, do “boca a boca” (via
mensagens), do contato de amigos para amigos, continua sendo a principal maneira de
aumentar a participação e assistência do público aos eventos de viola, mas, também este
recurso tradicional se encontra afetado pelo contexto da pandemia.

50 O Viola Viva está com suas atividades paralisadas desde o início de 2020, por conta da Pandemia da
Covid-19. E desde fins de 2018 ele era comandado pelo esposo de Áurea Fontes, o músico Potiguar Bloch e
a apresentadora de Rádio e auditório Maria José Tarumã, pois Áurea Fontes se retirou por problemas de
saúde. Os depoimentos coletados para essa pesquisa são respectivamente de 2019 e do primeiro semestre de
2020.

58
Outro fenômeno digno de nota em Guarulhos, é o fato de alguns artistas e
professores ministrarem aulas de Viola Caipira pela cidade. Podemos destacar aqui o
professor e multi-instrumentista Douglas Cruz, que por três anos fez parte da Orquestra de
Violeiros Coração da Viola e trabalhou com muitos artistas no município, em várias
linguagens e estilos musicais como, Rock, MPB e a própria Música Caipira. Foi produtor
cultural do Instituto Marungo51, organizado na residência de “seu” Oliveira em parceria
com o filho, Edson Catira, onde além das apresentações e do fomento cultural, através
deste Instituto, vários eventos artísticos aconteceram. O fato de ser o professor um exímio
instrumentista o credenciou a ministrar várias Oficinas de Viola Caipira, tornando-se
assim um dos divulgadores do instrumento na cidade.
Outro professor e virtuose da viola é o professor ZéHelder (entrevistado nesta
pesquisa), que divulga a Viola Caipira no Conservatório Municipal de Guarulhos desde o
ano de 2007 e faz parte também do grupo chamado Afina Toeira, que foi criado no próprio
Conservatório, sendo formado pelos alunos de Viola Caipira de sua Oficina. Trata-se de
um trabalho aberto à comunidade, não sendo necessário ao interessado ser aluno regular
do Conservatório para fazer parte da atividade, basta apenas “o querer aprender tocar a
Viola Caipira”. Um trabalho artístico do qual já fizeram parte muitos violeiros e violeiras,
em destaque a jovem violeira Natália Terra, um excelente exemplo da juventude que vem
difundindo a cultura das violas por Guarulhos. Natália Terra fez, a propósito, parte do
Afina Toeira e também da Orquestra Coração da Viola e, posteriormente, aprendeu a arte
da luthieria, o que a possibilitou confeccionar violas e violões.
Nesse campo do ensino, cumpre mencionar mais uma vez o nome do violeiro
Anthony Ventura, da dupla Quando o Inhambu Cantou no Meu Quintal, em parceria com
Ricardo Santiago que, além do trabalho artístico e promoção de sua carreira, também é
professor de Viola Caipira e coordena um grupo de violeiros no bairro onde reside e a
sede dos ensaios, isto é, a sua residência ou, às vezes, a residência dos violeiros alunos,
sendo uma fonte de intercâmbio cultural e divulgação da arte no bairro Vila Carmela,
próximo ao bairro Bonsucesso, um dos berços e referência da cultura Caipira na cidade de

51 O Instituto Marungo de Cultura, Educação e Ações Sociais, foi criado em 2016, com sede no Bairro Flor
da Montanha, na Vila Fátima em Guarulhos, na residência de “seu” Oliveira e seu filho, Edson Fontes, o
“Edson Catira”, na rua Monte Santo de Minas, n°192. O foco do Instituto é o fomento às culturas populares
e, mais precisamente, a difusão da cultura caipira nas Expressões da Catira, da Folia de Reis, e das Oficinas
(aulas) de Viola Caipira. A palavra Marungo, refere-se ao palhaço que acompanha a Folia de Reis, o folião
vestido com roupas caricatas que acompanha a comitiva dançando e estimulando o cortejo, figura típica
dessa expressão artística.

59
Guarulhos.
Na questão das sociabilidades e fruição de manifestações culturais, percebemos
que, nos dias atuais, as redes sociais são de suma importância para todos os artistas da
cidade (não só os violeiros), na divulgação dos seus trabalhos e para o apoio à sua arte.
Percebemos nesse novo contexto a emergência de uma “cena independente” em relação
aos meios institucionais de promoção de atividades culturais, onde, mais uma vez se
mostra a omissão e não colaboração por parte de órgãos públicos ligados à cultura, para o
fomento desses artistas, no tocante a recursos financeiros. Em Guarulhos, mesmo com o
advento da Era Digital, os artistas continuam “andando com suas próprias pernas”,
fazendo o seu trabalho de divulgação de forma totalmente autônoma e raramente contando
com um apoio por parte do Poder Público, ou seja, o principal suporte continua sendo o
auxílio dos ouvintes e dos apreciadores, sendo esta, na visão de “seu” Oliveira e Áurea
Fontes, uma forma de, realmente, essa arte sobreviver, pois as pessoas que estão nesse
meio fazem por apreço, fazem por zelo, por gosto! Sem isso, a viola já estaria fadada ao
desaparecimento ou total esquecimento na cidade.

3.2. As entrevistas

Foram realizadas, nessa pesquisa, entrevistas com mestres violeiros e


interlocutores ligados ao universo da viola em Guarulhos. O nosso objetivo foi dar um
enfoque orientado para a reconfiguração do fenômeno no município, enfatizando, a
despeito das dificuldades estruturais e contextuais, a maneira como se ela mantém viva.
Acreditamos que foi fundamental nesse processo os depoimentos dos interlocutores e
artistas. Devemos a eles informações que nos permitiram enriquecer nosso entendimento
acerca dessa arte e descobrir muitos fatos importantes sobre a cultura popular migrante na
cidade. As suas ricas histórias a nós contadas possibilitaram elaborar um panorama da
expressão das artes da Viola Caipira e da Viola Repentista.
É chegado o momento de inscrevermos por meio do recurso dialógico
(TEDLOCK, 1986) o dado central da pesquisa antropológica, muitas vezes apagado na
narrativa do pesquisador, isto é, o diálogo desenvolvido no campo entre pesquisador e
pesquisado, finalmente assumido na contemporaneidade como fundamento da etnografia
(CLIFFORD, 2002).
Seguem alguns fragmentos das entrevistas que realizamos, respectivamente

60
começando pelos representantes da Viola Caipira: com o violeiro, Mestre de Folia e
Catireiro “seu” Oliveira, a saudosa cantora e Promotora cultural Áurea Fontes 52, o
professor ZéHelder, e a jovem dupla Antony Ventura e Ricardo Santiago. Em seguida,
ficamos com os depoimentos dos violeiros Repentistas: Gilberto Alves, Dedé Laurentino e
Antônio Dantas, nomes que representam a Viola Nordestina e o Repente, que nos
apresentam num tom prático e explicativo o quão latente estão as manifestações com a
viola na cidade de Guarulhos, fazendo parte da cena cultural da cidade.

3.2.1 Os representantes da Viola Caipira

“seu” Oliveira
Oliveira Fontes, ou simplesmente “seu” Oliveira, 76 anos, natural de São José do
Rio Preto, interior de São Paulo. Veio para Guarulhos no final da década de 60, mais
precisamente em 1968, para “arranjar emprego e melhores condições de vida” e trouxe na
bagagem os seus costumes e a viola a tiracolo. Reside no Bairro da Vila Fátima, próximo
ao centro de Guarulhos. Violeiro, Mestre de Folia, Catireiro e um dos membros
fundadores da Orquestra de Violeiros Coração da Viola.

Mario Cabral (M.C.): “seu” Oliveira, conta para gente qual foi o motivo da sua vinda
para Guarulhos. Quais os motivos?
“seu” Oliveira (S.O.): O povo falava qui na cidade era milhor, eu vim pra cá pra trabaiá.
Aqui. Comecei a trabaiá de zelador de prédio, depois passei ser motorista de ônibu,
trabaiei em metalúrgica, mas sempre tocando uma violinha assim "mei de leve" né?!
(M.C.): O seu contato com a Viola Caipira, foi aqui ou você já trouxe isso de São José do
Rio Preto?
(S.O.): Não, eu já vim com isso du interior, eu tinha mais ou meno uns 10 ano, 12 ano,
meu tio tinha uma violinha caipira daquelas "Meia-regra" e tocava ela todo fim de tarde!
Quando ele saia, que ficava discuidado, eu pegava a violinha escondido! Aí com uns 13,
14 ano eu comecei cantá Folia de Reis, dança de Catira com as molecada, tudo amigo!
Tudo incentivado pelos mais véio né? Nóis começô a tocá viola, dançar Catira, cantá Folia

52 Infelizmente, em 03/05/2021, aos 71 anos de idade, de saúde frágil devido a um câncer no Útero, e por
ter contraído a Covid-19 durante estada no Hospital Municipal de Urgências (HMU), em Guarulhos, Áurea
Fontes faleceu. Mas, deixa-nos um legado de AMOR, ZELO E CARINHO pela Música Caipira em
Guarulhos, sendo uma das mais diligentes promotoras da viola e da Cultura Caipira na cidade.

61
de Reis!!

(M.C.): “seu” Oliveira, para o senhor, qual é a principal atividade da Viola Caipira? Onde
é que ela se insere na questão da Cultura?

(S.O.): Bom, no meu modo de entendê, a principal dela, atividade dela, é tá no meio
sertanejo, na música raiz né? Ela já é uma criação que veio, muitos cara fala que ela tem
origem portuguesa, mas não é bem isso também, sabe?! Porque a viola portuguesa, é bem
diferente da que nós tem, essa nossa, é mais brasileira memo eu diria sabe? É uma arte do
brasileiro mesmo. Essas coisas que nós faz aqui, vem tudo lá do mato né?!

(M.C.): Para você, “seu” Oliveira, a viola é um instrumento popular? É um instrumento


para gente simples?

(S.O.): É, a viola foi criada memo, a especialidade dela, é tá na ‘base da periferia’, do


‘músico periférico’ o coitado lá, que gosta de cantá, não tem intenção de ganhá dinheiro!
(risos).

(M.C.): E essas simpatias que o pessoal comenta para o violeiro tocar bem, você acredita
em alguma delas? Você conhece alguém que já fez algum pacto ou experiência?!

(S.O.): Tem uma história que diz que, você pega a viola vai na beira da mata, o Cachuêra
disse que fez isso não sei se é verdade (se referindo ao violeiro Índio Cachoeira), se pega,
e vai na beira da mata tem aquela samambaia bonita, bem viçosa que desce assim?! Disse
se ocê i lá meia-noite, se começar a tocá viola e a samambaia fazendo, tendo aquele
contato com a samambaia, disse que cê fica bão! Tem outro que fala, que tem que passar a
mão na costa daquela cobra Coral, mas quem que vai passá a mão naquilo?!(risos).

(M.C.): O que o senhor acha dessas músicas da atualidade que se dizem sertanejas,
música raiz, música caipira?

(S.O.): É qui nem o produto do Paraguai... é descartáve!! As música de hoje é descartáve!


Ela fica em evidência uns tempinho aí, daí a pouco, cê não vê mais falar, já aquela

62
verdadeira não... se vê aquele, Luar do Sertão, Tristeza do Jeca, Pagode em Brasília.
Cabocla Tereza, Chico Mineiro hoje em dia todo mundo canta, se chega num lugar que é
chei de jovem, eles tudo sabe, e essas nova de hoje não, se vê o cara grava aí, faz um
baruião danado, daí uns dias, se não vê mais falá tocá em lugar nenhum !!Some no
mercado, não permanece!

(M.C.): Conta pra gente um pouco da história da Orquestra de Violeiros. Como é que ela
se formou, como é que foi a história?

(S.O.): Tudo começô com Tonico e Tinoco né? Quando eles foi fazer um Show lá no
Teatro Municipal, lá em São Paulo, aí eles queria fazê uma coisa diferente. E convidou
nóis, tivero a ideia de formar uma coisa mei orquestral. A assessoria deles, insistiu muito e
eles (do Teatro) não queria dar uma data prêles. De tanto eles insisti, eles resolveu lá,
vamo dá um dia aí da semana, para eles tal. Aí eles encomendô pra nós, duas músicas,
Assim Que é o Sertão e Viola no Teatro pra gente ensaiá e fazer em forma de orquestra.
Eles procuraro primeiro a Associação dos Violeiros de Osasco, mai não deu muito certo
não, aí vieram aqui em Guarulhos procurou a nossa, e deu certo! Então a nossa Orquestra
de Viola, foi uma das primeira, uma das primeiras não! A primeira orquestra de violeiro a
se apresentar em televisão e gravar profissionalmente né! (fala num tom orgulhoso). Mai a
gente continuô, Tonico e Tinoco apadrinhô a gente, mas a gente conseguiu seguir estrada
né. Da primeira formação da orquestra, muitos parceiros já foi embora, já falecêro. Os que
puxava o couro era Patativa e Serrando, Sorridente e Camarada, Toni e Marcelito e muitos
outro companheiro, porque a Orquestra tinha mai de 40 elemento! Dessa época de 1978
pra cá só tem Eu, o Mario o japonês lá, o Toshiuo, o Xavier, esses são os que tá desde o
início da Orquestra.

(M.C.): E a Orquestra de Violeiros, hoje? Fala pra gente dela atualmente.

(S.O.): A Orquestra deu uma parada aí. Ficô parada um bom tempo. Mai, a uns oito ano
mais o meno, ela retornô as atividade, por causa que a Inezita ia fazer uma apresentação
aqui em Guarulhos. Aí tivero a ideia de reorganizar a Orquestra pra fazer uma homenage
pra ela. Aí daí, a gente continuô e não parô mai. Essa nova formação aí, já tem uns oito
ano aí, que tá na estrada, aí na atividade!

63
(M.C.): Como surgiu o grupo de catira Os Favoritos da Catira? Conte um pouco dessa
história para gente.

(S.O.): Começô primero com a Folia de Reis que nós fazia. Da Companhia de Reis qui nói
tinha aqui. Tinha um colega que morava lá pro lado do Brás em São Paulo e ele era mestre
de Folia, e eu cantava Folia lá na minha terra né! Já trouxe isso do interior. Aí eu
conversano com ele, conversa vai, conversa vém, aí falou: vamo montá uma companhia de
Reis?! Aí eu falei, vamo! Aí a gente montou a companhia Os Mensageiros dos Santos
Reis né?! Ele era da mesma região que eu, e se encontramo para cá, ele em São Paulo e eu
em Guarulho. Aí um dia, ele chegou aqui pra ensaiá a Folia de Reis, e viu a gente dançano
Catira com os colega conhecido né ! Aí ele perguntou:“cês dança Catira tamém? É, nói
dança!!(risos). Aí ele falou assim: mas o Catira docês é meio sem vergonha! Já que cês
dança Catira memo vô trazê mais quatro Catireiro bom pra nóis formá uma função! Aí
ocês vão aprimorá a Catira. Aí nós já tem o Grupo de Catira, só que ele não tinha nome.
Aí, foi lá no Viola Minha Viola da Inezita, inaugurô o programa e nóis tinha sido
convidado pra apresentá. Na hora de preencher a ficha lá, pediro o nome aí eu falei: mai
não tem nome! Aí o rapaz lá falô: vai ter que ter! Como é que vai apresentá?! Aí ele falou:
põe aí Favoritos Do Catira, que a gente pensava ser nome provisório né, aí ficou até hoje!
(risos). Nóis tá aí né, com a Folia de Reis, a Catira, a Orquestra onde tivé espaço pra
apresentá tamo aí.

(M.C.): “seu” Oliveira, como o senhor enxerga a divulgação e promoção da viola hoje?
No sentido de jovens tocando viola, outros espaços para ela e vários músicos tocando o
instrumento. Como você avalia isso?

(S.O.): Bão, na minha manera de vê, a viola tá cada dia mai divulgada né? Cada dia mai
os jove tá tocano viola em outros estilo de música, tá usano a viola! Tem roqueiro tocando
viola, tem viola sendo usada em concerto! Eu acredito que a viola só tende a ficá mais
popular! Ela era mai um instrumento nosso né? Do povo lá da roça, de música nossa do
mato! Mas agora, ela tá em todo espaço, todo estilo de música, né? Então, acredito que a
tendência da viola é ficá cada vez mais popular. É um instrumento que não vai morrê!
Nóis que é os tradicional né, vamo permanecê nessa arte, mas tem a juventude aí, que vai

64
levá pra frente isso! Que bão que tá acontecendo né, que bão que a viola tá passando pro
nossos filho, nossos neto, pra essa geração aí, que tem tudo pra fazê esse instrumento ficar
cada vez mai conhecido. É isso.

Áurea Fontes

Áurea Salvaia, nome artístico Áurea Fontes, 70 anos, natural de São Paulo, capital,
região da Vila Mazzei. Veio para Guarulhos em meados da década de 70, para residir e
para trabalhar. Herdou os costumes e o gosto pela música Caipira de seus pais, migrantes
da cidade de Santa Bárbara d’Oeste, interior de São Paulo. Residiu em Guarulhos por
muitos anos, no bairro Vila Santa Maria, região do Cocaia, próximo ao centro da cidade.
Cantora, apresentadora de programas de Rádio e Auditório e Promotora Cultural.
Dirigente do Evento Viola Viva, há exatos 25 anos, realizado mensalmente e que
apresenta vários artistas caipiras e sertanejos.

Mario Cabral (M.C.): Olá Áurea Fontes, é um prazer entrevistar você! Conta pra gente,
como é que surgiu o evento Viola Viva?

Áurea Fontes (A.F.): Olha, eu era funcionária da cultura aqui em Guarulhos e a gente
sempre tinha contato com os artistas da música raiz que a gente chama de caipira! A gente
chama de “raiz” para não misturar sabe? (risos). Mas a gente sempre teve contato com
todo mundo, com Carreirinho, Liu e Léu, Aleixinho e Hélio Bueno aqui de Guarulhos e
muitos artistas desse meio. Então a gente teve oportunidade de montar esse evento voltado
só exclusivamente à música raiz né? Foi aí que nasceu o Viola Viva. Criamos o programa,
só que, a princípio, ele era feito na Biblioteca Monteiro Lobato aqui na João Gonçalves,
centro de Guarulhos. Era um programa de auditório transmitido no Rádio. Só que o espaço
ficou pequeno, era muita gente né? Aí a gente migrou pro Teatro Nelson Rodrigues, que
fica na Vila Galvão. E lá a gente tá até hoje apresentando, não estamos por causa da
Pandemia! Mas quando isso acabar, vamo tá lá batendo viola com o povo e
cantando!(risos).

(M.C.): O evento é gratuito? Como funciona? Comente um pouco mais sobre o Viola
Viva.

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(A.F.): A entrada do Viola é franca. A gente faz a nossa parte! Porque se for esperar por
incentivo da parte do Governo, da Cultura, huummmmm… não sai nada! Às vezes, a
gente tem que fazer por nossa conta. Que vão pagar, que vão fazer as coisas para você se
apresentar…esquece!!! Aí se apresentam as duplas né, são várias duplas que se
apresentam no evento e a gente dá espaço para todo mundo.

(M.C.): Tem algumas datas especiais? Quem geralmente se apresenta no Viola Viva?

(A.F.): A gente entra em contato com alguns artistas da viola daqui da cidade e de outros
lugares também. Com os músicos violeiros dando oportunidade. Tem oportunidade para
todo mundo se apresentar! E às vezes a gente traz também, artistas de fora, como a gente
já fez por exemplo, uma homenagem ao Dino Franco da dupla Dino Franco e Mouraí,
fizemos homenagem ao Tonico e Tinoco, já fizemos homenagem ao Zé Fortuna, já
fizemos homenagem a Inezita Barroso, ao Tião Carreiro, enfim, a gente sempre tem
artistas para fazer homenagens e sempre aparece muitos violeiros nesses eventos. A gente
tem um público muito fiel que nos acompanha há muitos anos.

(M.C.): Então o Viola Viva é voltado sempre aos artistas da música Caipira, “de raiz”
como você diz?

(A.F.): Exatamente. É que o foco do Viola Viva é preservar a música Caipira, a música
Raiz sertaneja verdadeira! Então, a gente fala pros artistas que tem esse estilo musical que
pode vir se apresentar, E que procure não usar muito instrumento elétrico, como bateria,
guitarra, contrabaixo e primar mais pelo violão, a viola, a sanfona!! Pra manter mais uma
característica tradicional, que esse é o intuito do Viola Viva, é a preservação da música do
interior, da música sertaneja raiz.

(M.C.): Áurea, o que é para você a música raiz, a música Caipira?

(A.F.): Olha... Música raiz na minha pequena concepção, a música Caipira, é aquela que
entra no seu coração! Por exemplo, uma música como aquela Meu primeiro amor, ela não
veio do sertão. Mas quando ela toca, ela te leva, você viaja ao sertão por ela sabe? Ela tem
uma sonoridade que te transporta pra lá! E essa é a essência da música Caipira, te levar ao

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sertão através da música, daquilo que o violeiro está tocando! E também são músicas que
falam do dia a dia do homem do campo, do trabalho, da luta, das coisas que acontecem na
roça, é uma música que conta a história de um povo e por isso, que ela nos toca, ela
encanta!

(M.C.): Áurea, então Guarulhos é um celeiro de artistas da música Caipira, Sertaneja?


Comenta um pouquinho para gente.

(A.F.): Sim...com certeza. Inclusive, a gente pode falar de duplas famosas que viveram
aqui em Guarulhos, como o Pena Branca e Xavantinho, que tocaram na Orquestra do
Oliveira (referindo-se a “seu” Oliveira) que eram mineiros, mas, tiveram uma história
aqui em Guarulhos até fazer sucesso, teve a dupla caipira Camões e Camargo. Teve muita
gente boa aqui em Guarulhos. Se eu for começar a falar vai horas (risos). Tinha o Ronaldo
Viola e João Carvalho, Joseval e Josiene, enfim, uma porção de gente boa da música
Caipira.

(M.C.): Como é que você explica, Áurea, esse gosto do Guarulhense pela música Caipira,
pela viola?

(A.F.): Se você analisar bem, Guarulhos é uma cidade rural! A gente é uma cidade-
dormitório, vai muita gente trabalhar pra São Paulo. E tem a questão também dos
migrantes, que vieram pra cá. O que tem de mineiro, de goiano, de gente do Nordeste aqui
na cidade, não é brincadeira! Acho que esse é um dos grandes motivos sabe? Eu mesma,
eu não sou caipira, não nasci no interior, quem é do interior são meus pais, meus pais são
de Santa Bárbara d´Oeste, estado de São Paulo. Você vê, as pessoas que moravam no
interior vieram tudo morá pra São Paulo e o que aconteceu, eles trouxeram consigo essa
bagagem! Um exemplo, você precisa ficar lá carpindo pra você parecer caipira?! Não. De
repente você é “caipira de coração” como eu sou, eu não trabalhei na roça, meus pais
trabalharam!!

(M.C.): No Viola Viva, nas apresentações mensais, quantas duplas em média se


apresentam no projeto?

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(A.F.): Olha, tem dia que a gente tem que pedir pra os violeiros, olha... infelizmente não
vai dar pra apresentar todo mundo! Porque é muitas duplas. Teve domingo da gente
apresentar treze duplas e, domingo que a gente apresentou quinze duplas! Então, varia
muito, tem domingo que a gente apresenta mais, tem domingo que a gente apresenta
menos. Mas a gente procura dar espaço pra todo mundo. Quando tem poucas duplas, a
gente deixa eles cantarem três músicas e quando tem muitas duplas, cada dupla toca uma
só, pra poder dar espaço pra todos. São três horas de Viola Viva então, às vezes é muita
dupla e pouco tempo para as apresentações.

(M.C.): E os jovens, Áurea, eles gostam da música Caipira? Qual é a sua impressão sobre
isso?

(A.F.): Gostam! Gostam muito. É... acostumaram o pessoal a falar que só quem gostava
de música raiz era o pessoal de mais idade, o pessoal mais maduro e isso não é verdade!
Eu vejo no Viola Viva muito jovem que vai assistir e prestigiar e tem duplas de
adolescentes, tocando e cantando também. Então a gente vê que é um público muito misto,
tem os mais velhos, claro, que é o público tradicional, o público fiel mas, tem uma
garotada gostando muito de viola, tocando e assistindo e a gente percebe isso nos eventos
do Viola.

(M.C.): Você disse que conheceu a Inezita Barroso. Comente mais como que era essa
relação com ela.

(A.F.): Conheci muito! Era minha amiga pessoal a Inezita! A história da Inezita você
conhece?! A Inezita era uma moça de família rica, você entendeu?! Uma moça de família
rica que se dedicou, de corpo e alma, à música caipira! Ela não precisava disso, é que ela
acreditava nisso tá?! a Inezita tem muito, muito a ver com a preservação da nossa cultura,
que se não fosse por ela... há muito tempo a viola estaria esquecida!!!

ZéHelder

ZéHelder, professor de música erudita, violeiro, compositor, cantor, 48 anos.

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Natural de Cachoeira de Minas, estado de Minas Gerais. Veio para Guarulhos durante os
anos 2000 para ser professor regular do Conservatório Municipal de Artes (atual CMG-
Conservatório Municipal de Guarulhos). Conheceu o universo Viola Caipira, por
intermédio dos violeiros aqui residentes e trabalha no Conservatório como professor
erudito e também como divulgador da música Caipira. Já lançou diversos discos e atua
com a Viola Caipira em vários estilos musicais, desde a música caipira Raiz até o Pop
Rock.

Mario Cabral (M.C.): Professor, como é que você explica esse fenômeno da viola, dessa
Cultura da Viola Caipira aqui na cidade?

ZéHelder (Z.H.): Ah! cara, acho que o fato da migração é a resposta percebe? E o que
acontece quando essa pessoa sai do campo e vem para cidade, é justamente ela se blindar,
encontrar um ambiente hostil e agressivo, diferente do que ela tinha lá! E se agarrar a essa
sua origem né, como sendo a coisa mais importante para ela e talvez aqui esse fato de
você chegar numa cidade, que é meio hostil, que é meio agressiva, esse fato de você se
agarrar a sua cultura é mais forte aqui, às vezes, do que no ambiente rural hoje em dia
sabe?!

(M.C.): E qual foi o seu primeiro contato com a Viola Caipira, com a cultura Caipira?

(Z.H.): Que coisa curiosa é essa que aconteceu comigo! Aconteceu dessa minha mudança
pra São Paulo, quando eu vim trabalhar aqui né? Então eu descobri uma coisa
extraordinária... eu fui aprender sobre Música Caipira aqui em Guarulhos, descobri que
essa cidade tem e, sempre teve... foi meio que um foco, um berço de muita gente da
música raiz, da Viola Caipira! Mas o meu primeiro contato com a viola foi ainda em
Minas. Eu era baixista, tocava baixo há mais de 10 anos. Estudei música clássica, estudei
contrabaixo erudito e tudo. Aí eu tive contato com a viola pela primeira vez lá ainda no
Conservatório de Pouso Alegre, onde eu trabalhava. Lá tinha um almoxarifado com um
monte de instrumento. Aí, um dia eu descobri uma viola lá, e me encantei com o
instrumento! Aí caçando informação aqui e ali, fui aprendendo, tocando, descobrindo o
instrumento, e hoje é a minha identidade como artista cara!

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(M.C.): E como você descreve a viola? Qual é a sua importância, seu valor histórico?

(Z.H.): Esse instrumento aqui cara, você pode falar tanto dele assim... porque, é um
instrumento, primeiro, que tem origem portuguesa. Não é um instrumento que nasceu no
Brasil, que por sua vez essa viola mesmo lá em Portugal, tem cinco tipos diferentes, e tá
muito ligada à música tradicional e ao folclore local! Mas lá em Portugal, não tá tão viva e
tão presente assim, como está no Brasil! Porque aqui no Brasil, além da história toda que a
Viola tem né, tantos fatos legais que você pode contar sobre a viola, enfim, a viola é
apaixonante no Brasil! E ela se manteve na mão de gente simples, e muitas e muitas
histórias por exemplo, de “pacto”, para fazer “pacto com diabo” para aprender tocar viola,
coisas que... de gente muito do interior assim, que vê uma pessoa tocando aquilo é
inexplicável, como aprendeu a tocar desse jeito?! Toda pessoa que pega esse instrumento,
sei lá, se você ... todo mundo que tem a sua alma de brasileiro escutou uma “escalinha
duetada”, isso sei lá, te transporta pra um passado que muitas vezes, as pessoas não
conheceram, e isso aqui (referindo-se à viola) é o meio para fazer elas voltarem para lá
sabe?!

(M.C.): E as afinações da viola, quais as que são mais conhecidas aqui em Guarulhos?

(Z.H.): Bem... cara existe um monte de afinações de viola, por baixo.... umas dez sabe?!
Mas aqui na cidade eu só trabalho e conheço quem toca a afinação em Mi Maior, que os
violeiros chamam de Cebolão. Tem em Mi e também em Ré, mas a maioria prefere tocar
em Mi, mais agudinha!

(M.C.): Professor, pra você, o que é o Caipira? Como você descreveria esse povo, que é o
principal responsável por trazer a viola pra cidade?

(Z.H.): O que é o Caipira?! Caipira é o sertanejo, o morador da zona rural dessas regiões
assim... que era o que antigamente se chamava de Paulistânia né, que Paulistânia era desde
o estado de São Paulo, sul da Bahia até Paraná, parte do Mato Grosso e tal, essa região
central do Brasil era a Paulistânia. Então, a cultura Caipira se concentra aqui! Ele nada
mais é do que, um indígena, um bandeirante que se fixou na terra, um cara que aprendeu
boa parte dos hábitos alimentares dele, ele aprendeu com o índio né, como se rala

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mandioca, como se faz um beijú, se faz um bolo, a lidar com o café, com as culturas que
eles têm, aprendeu boa parte com índio, e boa parte das crenças, aprendeu do europeu, a
religião Católica, coisas de Santo, de reza, de terço, folias. Então esse é o Caipira! Que
quando vem pra cidade, vem em busca de serviço, de melhorar a vida, e certamente traz
seus hábitos, e... esse monte de violeiro nas cidades, não só aqui, é fruto disso sabe?!

(M.C.): Para você, a música Caipira está entrando em extinção? Com o novo Sertanejo
Universitário, com novas temáticas da música regional?

(Z.H.): A gente fala hoje por exemplo, que a música da mídia tá destruindo uma tradição,
(risos)... eu acho que esse negócio vem muito mais de trás cara!!! Né cara?! Talvez, em
estado puro mesmo, essas coisas só acontecem em pequenas comunidades, e se fizer
sentido pra aquelas pessoas que estão ali! Se não fizer sentido para elas também, é uma
coisa que tende a morrer! Aqui em Guarulhos, ela faz sentido pra muita gente, por isso é
que vem se mantendo a tanto tempo, mas não como era no sertão, né? Ela se mistura com
a cultura da cidade e a tendência é mudar... novos temas, gente nova tocando, a cultura
gira cara... ela tá sempre em mudança!

Antony Ventura

Antony Ventura, cantor, compositor e violeiro, paulistano nato e criado desde


criança em Guarulhos, 25 anos. Filho de migrantes baianos, morador do bairro Vila
Carmela. É um dos representantes da nova geração de violeiros aqui na cidade. Em
parceria com o também jovem, Ricardo Santiago, natural de Itu, interior de São Paulo, de
29 anos, formam o dueto, Quando o Inhambu Cantou no Meu Quintal, com uma nova
linguagem na música raiz, cuja obra é muito inspirada em estilos como os de Almir Sater e
Ivan Vilela, mas, também cultivam elementos da música tradicional caipira,
principalmente em temáticas religiosas, como a Folia de Reis.

Mario Cabral (M.C.): Antony, conte-nos um pouco sobre sua experiência como músico
em Guarulhos e sua relação com a cidade e o bairro em que vive.

Antony Ventura (A.V.): Então, minha experiência como músico em Guarulhos, ela nasce

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muito a partir do olhar da periferia né? Então como já havia dito, em um bairro periférico,
que não tem muito incentivo à cultura. Temos pouquíssimos espaços públicos aqui, de
incentivo à cultura né? Não temos uma biblioteca, não temos auditório... acho que isso
dificulta muito as pessoas, os moradores e as crianças aqui a descobrirem suas
potencialidades artísticas, culturais e, até o seu contato com a história do lugar onde vive!
Meus pais são católicos e sempre tive uma relação com os jovens na Igreja, e lá que tive
contato com os violeiros, por conta da Festa de Nossa Senhora de Bonsucesso. Sempre via
e ouvia os violeiros na Festa, e isso me influenciou muito em seguir o caminho da música
e tocar Viola Caipira! Enfim, eu venho desse contexto. Então a minha experiência, com
música em Guarulhos ela veio muito da luta né, de correr atrás de me reconhecer como um
artista, um espaço que eu fui conquistando com os anos e ainda tô conquistando, ainda tô
nesse caminho de conquista por esse espaço como artista, como músico, compositor e
professor.

(M.C.): Qual a sua opinião em relação a esse movimento de violeiros, de amantes da


música Caipira e dos fatores da migração em Guarulhos?

(A.V.): Então... eu acho que o movimento de caipiras em Guarulhos ele é muito


importante e faz uma conexão muito grande assim com a vida das pessoas que moram
aqui! Guarulhos é uma cidade que tem 90% da sua população de retirantes nordestinos, de
outras regiões do país, então, o movimento da viola, faz essa conexão com a essência da
vida desse povo, que vivia no campo e veio pra a cidade grande, pra poder construir São
Paulo! Acho que é muito, muito importante, esse momento da viola e é um ponto de
encontro aqui na cidade grande!

(M.C.): Fora o seu trabalho artístico, você conhece outras iniciativas, aqui em Guarulhos,
que fomentam a Viola Caipira ou divulgam e mantêm essa arte tradicional? Cite algumas.

(A.V.): Nós temos grandes nomes também que levam esse movimento da Viola Caipira
aqui na cidade, assim como “seu” Oliveira, vale lembrar a Áurea, acho que ela é um belo
exemplo né, de dar oportunidades pra pessoas que defendem a música sertaneja de raiz
aqui na cidade. Um movimento “super popular” o trabalho dela! Também tem a Vera

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Bianca do Café com Viola, tem crescido bastante esses encontros para falar sobre Viola
Caipira. Também a ocupação aqui, do Espaço Cultural da Carpição, em Bonsucesso.
Então, sem criticar, eu acho que poderia ter mais, porém, vejo que aos poucos, a gente está
conseguindo ocupar esses espaços e fazer com que a viola, a música Caipira de Raiz,
possa ser difundida por mim e pelos outros artistas e valorizada por quem tem esse gosto.

(M.C.): Diga sua opinião em relação ao incentivo cultural por parte dos órgãos públicos,
digo, a Secretaria de Cultura, ou departamentos culturais. Me conte se o poder público
incentiva atividades não só da Viola Caipira, mas, de outras linguagens em Guarulhos.

(A.V.): Quero dizer que a cidade de Guarulhos é uma cidade muito plural, muito grande,
muito diversa. Nós temos artistas maravilhosos aqui nessa cidade, pessoas com potenciais
incríveis né? E que acho, que são muito mal aproveitados, assim... não valorizados! Tem
até aquela frase que responde muito isso que eu tô dizendo que: “Santo de casa não faz
milagre!” Eu acho que já temos os “Santos”, acho que seria mais econômico e mais
respeitoso a gente valorizar eles, para que esses “milagres” possam acontecer né, os
“milagres” da Cultura, do acesso à educação, do investimento da Secretaria de Cultura nos
artistas daqui, incentivar a música de qualidade, porque nós temos um movimento de
cultura em Guarulhos e, ele é muito grande, muito diverso né? Nós temos várias
representatividades aqui, culturais dos mais variados nichos, e acho que a Secretaria e os
órgãos de cultura deviam nos ajudar mais, ela poderia se juntar a nós, ter um pouco mais
de conexão, uma vez que o artista, ele desenvolve trabalhos maravilhosos, e acaba saindo
de Guarulhos pra poder apresentar isso! Então... tem que ter essa preocupação em nos
incentivar, e nós, de cobrar também da gestão pública essa corrida né?! Nesse sentido, é
importante não só a criação de espaços públicos destinados à cultura, mas também um
investimento financeiro, investimento de tempo, dedicação, que o artista... ele precisa
comer né?! Precisa pagar suas contas, então se não tem esse incentivo, onde é que nós
vamos achar? O primeiro setor, que tem que se preocupar com isso é o setor público né?
Então, a gente tem muita coisa boa aqui que, infelizmente é mal aproveitada, mas, há de se
ter esperança, e sempre lutar por essa cultura, por esse movimento pela Música Popular
aqui na cidade de Guarulhos.

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(M.C.): Seus pais são baianos, conforme você citou. Essa influência no âmbito de família
também influenciou o seu gosto musical, além da relação com o bairro e com a
comunidade da igreja? Quais são as outras influências que culminaram no seu gosto pela
Viola Caipira e também influenciam seu trabalho musical?

(A.V.): Minha casa sempre foi um ambiente musical, mesmo não tendo músicos e
musicistas profissionais na família. Tenho tios que tocam violão, minhas avós com a
questão do canto nos “ofícios”, “ladainhas” e “benditos”, juntamente com meus pais que
cantam “lindamente”! São vivências que fazem parte da minha formação como pessoa e
amante incondicional da música popular e das expressões artísticas. Fui estudar violão
popular na Escola de Música Nel-Som, localizada no centro da cidade de Guarulhos, onde
pude ter contato com músicos e musicistas profissionais e assim, compreender a dinâmica
e possibilidades de trabalho nesse eixo. Foi então que resolvi fazer minha graduação em
Licenciatura em Música ao final do ensino médio. Na universidade me descobri como
educador, tema que tenho me dedicado desde a conclusão de minha graduação. Também
pude profissionalizar meus trabalhos artísticos autorais, com qual tenho dividido tempo e
dedicação. Hoje sou cocriador do duo de música folk Quando Inhambu Cantou no Meu
Quintal, projeto que nasce dentro da cidade de Guarulhos. Aos 14/15 anos.... comecei a
fazer aulas de violão com o professor (voluntário) Douglas Marques em uma igreja na
minha rua. As aulas, eram totalmente gratuitas e com abordagem coletiva. Pessoas que já
tinham grande conhecimento, partilhavam com os que estavam chegando recentemente.
Foi amor a primeiro acorde! Fiquei encantado pelo instrumento e decidi que gostaria de
levar a sério a aprendizagem, já que tinha contato frequente dentro de casa, por conta das
rodas de Moda de Viola com os amigos do meu pai, Antônio.

(M.C.): O curioso é que seus pais são baianos e você tem esse afinco mais pela cultura
Caipira, do Sudeste. Comenta um pouquinho sobre isso.

(A.V.): Sim, meus pais são baianos. Nasceram na zona rural de Bom Jesus da Serra,
município perto de Vitória da Conquista, sudoeste Baiano. Vieram para São Paulo desde
cedo para trabalhar. Meu pai chegou na cidade aos 15 anos, trabalhando junto a meus tios
na área da construção civil, como ajudante de pedreiro. Minha mãe se mudou nova para

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Vitória da Conquista para trabalhar, como doméstica e concluir os estudos. Em seguida
veio para São Paulo, onde trabalhou alguns anos na indústria têxtil. Meu primeiro contato
com a viola, foi a partir da vivência das Folias de Reis no interior da Bahia, na região dos
meus pais. Lá também tem Folia! Sanfona, viola, bumbo, “caixa do divino”, são alguns
dos instrumentos que os foliões utilizam para cantar as Toadas de Reis e as Cantigas de
Roda. A família do meu pai inteira é envolvida com os Ternos de Reis, então sempre tive
contato com esse tipo de manifestação cultural. Sempre quando era possível, gostava de
pegar os instrumentos para tentar tocar no descanso dos foliões, a viola era um deles, mas
nunca tive sucesso pois os dedos eram pequenos e o instrumento era grande demais para o
meu tamanho! Sem contar que, tinha de ser escondido para os donos não perceberem! Mas
fui realmente ter contato novamente com a viola, nas rodas de Música Caipira em minha
casa. Meu pai sempre teve amigos violeiros, era comum ter esses encontros aqui em casa.
Fui tentar tocar viola após as aulas de violão, quando já tinha um conhecimento musical
mínimo. Meu pai comprou uma viola pra eu aprender e, acabei me interessando também,
passava algumas horas tentando fazer os acordes e aprendia as batidas pela internet vendo
vídeos no YouTube.

3.2.2 Os representantes da Viola Repentista

Antônio Dantas

Antônio Dantas, violeiro Repentista, nascido em Luís Gomes no Rio Grande do


Norte, mas criado na Paraíba, na cidade de Triunfo, 53 anos. Reside no bairro Soberana na
periferia de Guarulhos, é um dos representantes da Viola Repentista na cidade. Reside no
município há mais de 25 anos. Embora cantador repentista e poeta, não vive da profissão,
sendo o ofício de mestre de obras a atividade que lhe dá o sustento. É repentista nas horas
de folga, nos momentos vagos e as cantorias que faz servem para o complemento de sua
renda. É um artista que concilia o trabalho que lhe garante a renda e o trabalho artístico.

Mario Cabral (M.C.): Poeta53 Antônio Dantas, conte um pouco sobre você, sua trajetória

53 Os repentistas, entre si e, também, com pessoas que os contatam, denominam-se comumente de “poetas”
e, durante as entrevistas com os violeiros Repentistas, essa foi a forma mais usada, pois além de ser mais
prática, foi a que constatamos ser a que demonstrava mais proximidade entre entrevistador e entrevistado.
Os repentistas também, chamam os ouvintes de poetas, às vezes, onde vemos essa palavra como uma

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e sua vinda para São Paulo.

Antônio Dantas (A.D.): Minha História .....eu sou nordestino da “gema”! Meu pai é
paraibano, a minha mãe também. Eu sou paraibano, me considero paraibano, só que eu
nasci em Luís Gomes no Rio Grande do Norte. Pai, e minha mãe quando se casaram,
foram pra o Rio Grande do Norte lá em Luís Gomes, aí eu nasci lá. Depois disso, vieram
pra Paraíba e eu me criei lá até os dezoito anos de idade. Depois vim pra São Paulo, São
Paulo e Guarulhos é onde estou até hoje, não sei se sou nordestino ou guarulhense. Fiquei
lá até os dezoito anos de idade. É a idade quando a gente vem do Nordeste pra cá! Pra
trabalhá poeta! Arrumar um emprego e mandar dinheiro pros que ficaram lá! É a sina de
muitos como eu. Mas as coisas do Nordeste eu nunca esqueci!

(M.C.): E o seu primeiro contato com a viola? Foi aqui em Guarulhos ou foi no Nordeste
mesmo?

(A.D.): Foi lá mesmo poeta, lá que eu sempre ouvi viola e Cantoria. Desde criança, eu sou
louco por cantoria! Às vezes não ia nas cantorias porque, não tinha dinheiro pra pagá o
cantadô, quando eu morava lá né? Mas sempre eu gostei, e depois... que eu vim pra aqui,
comprei um violão e mandei afinar pra viola 54.Os irmão de minha esposa, que eu casei
quando já tinha 23 anos, todos eles tocam violão bem demais, tem até três ou quatro
repentista na família!

(M.C.): E aqui em Guarulhos, onde, geralmente, você e os outros repentistas se


apresentam? Você vive como violeiro ou possui outra profissão?

(A.D.): Não, eu sou mestre de obras, a minha profissão é Mestre de obras, eu trabalho na
construção civil. É só nas horas vagas que eu toco viola, canto repente e faço as cantorias.

interação entre artista e público e também como sinônimo de quem aprecia a arte do Repente e os violeiros
nordestinos.

54 Entre os repentistas é muito comum o uso de violões com encordoamento de viola. Eles a chamam,
geralmente, de Viola Simples. A única diferença é que, a Viola Repentista mais comum é a que possui 10
cravelhas, e a qual o repentista usa 7 cordas, dispostas em um jogo triplo e as quatro restantes singelas. Na
Viola Simples, são usadas 6 cordas (onde se tira uma do jogo triplo) e mantêm-se as quatro singelas e a
mesma afinação.

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É minha segunda atividade, o outro mei de renda. E as cantorias poeta, a gente faz em
qualquer lugar, mas geralmente as famílias é que nos convida pra fazer a cantoria, nas casa
né? É as que mais acontece, essa de família e também a gente faz cantorias em Casa do
Norte, bar e lanchonete, ou seja, a gente sempre faz apresentação a convite, sempre
alguém convida! O dono da casa, o dono de um estabelecimento, convida a gente vai. Aí
tem a “Cantoria Tratada”, que é aquela que o dono nos dá o dinheiro, trata o dinheiro
antes! Ai a gente vai cantá e não tem necessidade da “bandeja”. E também tem a “Cantoria
de Bandeja” que é aquela que o povo bota o dinheiro na bandeja, a paga do cantadô. Essa
é a mais tradicional né, mas geralmente aqui em Guarulhos, a gente faz mais a Cantoria
Tratada que é essa que a gente já vai sabendo quanto vai ganhar.

(M.C.): Em que ocasiões, geralmente, vocês são chamados para fazerem uma cantoria?
Existem datas específicas? Conte pra gente.

(A.D.): Olhe, a gente canta em qualquer ocasião, é só chamá. Mas a gente vai, geralmente,
é em batizado, aniversário, geralmente de pessoas mais velhas ou então, quando vem
algum parente do nordeste ou um “bota fora”! “Bota fora é” aquele, quando o cara vai
passar uma estadia no nordeste ou, ele vai de vez, aí ele faz o “bota-fora” faz uma
despedida dos amigos, dos parentes, e aí ele geralmente contrata uma cantoria.

(M.C.): E os estilos do Repente como são? Me explique mais sobre essas métricas
poéticas que os cantadores usam na hora de improvisar.

(A.D.): Tem Sextilha, Mote de Sete, Mote de Dez, e o 13 por 12, várias modalidade 55,
mais eu só sei cantá! Tem muita modalidade diferente. Porque eu ouvia desde criança,
Repente né? Então, aquilo entra na sua cabeça e você faz mesmo na hora, você pega o
jeito. Mas eu não sei explicar muito bem, só sei a hora que eu tenho que cantá o verso
certo, se não “quebra a rima”!56

55 A respeito dos estilos e métricas poéticas do Repente Nordestino, ver o Capítulo II dessa dissertação.

56 Um ponto a se destacar é que, a linguagem da Viola Caipira é ministrada em aulas e ensinada por
professores de música formais e/ou por mestres violeiros, onde há de fato uma escolarização dessa
linguagem da viola em Guarulhos. Diferentemente da linguagem Repentista, onde não há um curso de Viola
Repentista, não existem oficinas culturais que promovam o toque desse estilo da viola, pois, os cantadores

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(M.C.): A cantoria e o Repente, você sabe, poeta, onde nasceu, onde surgiu? Sabe um
pouco da história?

(A.D.): A Cantoria surgiu no Nordeste, na Serra do Teixeira, na Paraíba. A primeira


cantoria foi feita lá com Inácio da Catingueira e Romano do Teixeira, um era senhor de
Engenho e o outro era escravo. E nessa cantoria, foi onde o escravo ganhou a alforria
porque ele ganhou do patrão, aí o patrão libertou ele! Ficou livre pela viola e pelo verso!
Romano com a viola e o outro com o pandeiro, e essa foi a primeira cantoria, não sei
quando foi a data, mas faz uns 145 ano mais ou menos, por aí! Até hoje tem Cantoria e ela
nunca vai morrer, porque a Cantoria é muito boa! Cantoria, por exemplo, tem vários
fatores pra você gostar da cantoria, exemplo, você vai pra cantoria porque você gosta de
Cantoria, o outro vai pra Cantoria porque o amigo dele convidou, ele vai por causa do
amigo. Outro vai porque o pai dele gostava né, então a Cantoria nunca vai morrer, ela vai
ter sempre!

Dedé Laurentino

José Laurentino dos Santos ou simplesmente Dedé Laurentino, nascido em Nova


Olinda no Ceará, 66 anos. Reside no bairro Alvorada, periferia de Guarulhos, e é outro
representante da Viola Repentista na cidade. Reside no município, desde meados da
década de 90. Cantador repentista, com vários anos de experiência, também promove sua
arte nas horas vagas e momentos disponíveis, pois, sua profissão é eletricista. Assim como
seu colega, Antônio Dantas, concilia sua atividade laboral com a arte de fazer Repente.

Mario Cabral (M.C.): Olá, poeta Dedé Laurentino. Conte pra gente, quais os motivos
que levaram a sua vinda para São Paulo e há quanto tempo você reside em Guarulhos.

repentistas atribuem o seu “dom” de fazer versos improvisados a um “dom divino” e Repente não se ensina!
(fala Dedé Laurentino e Gilberto Alves). Pois, além do toque da Viola Repentista ser muito simples, ele é
totalmente atrelado a seu uso como ferramenta para a execução dos “Repentes”, então, ela é indissociável do
improviso, no momento em que o cantador está construindo suas rimas. Diferente da Viola Caipira, pois ela
pode ser executada de forma meramente instrumental, com ausência de letras, ausência de uma melodia
cantada. Ou seja, a Viola Caipira, por si só, é um instrumento de harmonia para solos, para concerto e pode
ser executada com a ausência de vozes humanas, diferentemente da Viola Repentista, onde a palavra é a
essência dessa expressão.

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Dedé Laurentino (D.L.): Muito bem, eu sou nascido no Ceará, em 1952, na cidade de
Nova Olinda, na região do Cariri cearense, no sul do Ceará. E eu vim pra cá não como
muita gente diz, atrás de caminhos melhores... atrás de tal coisa... A gente veio para fazer
essa pregação né? Pra mostrar a viola, pra um resto de um país que infelizmente não
conhece. Realmente, muitos vieram por conta da condição de vida, a dificuldade né? Mas
eu vim mesmo com o intento de divulgar a minha arte, o repente. E por aqui estou até
hoje. Moro por cá a uns 30 anos, pra mais.

(M.C.): Conte um pouco da sua história na cantoria. Qual foi seu primeiro contato com o
repente, com a viola?

(D.L.): A minha história do começo de cantoria, foi como quase de todo mundo né?
Adolescente, influenciado por turma, por rodinha... por cachaça (risos). Eu agradeço muito
ao cantador de Alagoas, já falecido, chamava-se Caboclinho, que me fez pegar os dedos a
primeira vez no braço de uma viola e me deu algumas instruções. Cumecei novo de tudo a
fazer repente e daí fui me preparando, melhorando e estou até hoje na arte. Então eu
trouxe do Norte, isso certo? Já vei de lá!

(M.C.): E esses estilos, essas modalidades que você falou de Repente, são várias? Só tem
isso na viola do repentista, essas modalidades, esses tipos de Repente? Fale um pouquinho
sobre.

(D.L.): É a única parte que canta rimado, que tem essas exigência de rima, são os
repentistas do Nordeste, e aí tem um acompanhamento da viola né?.... Tem esse
acompanhamento aqui ó (pega a viola e toca um baião), bonito!!! Fica bonito demai né
menino?! Dá até vontade de cantá né não (risos)?! Assim poeta... eu também percebo que
isso só tem no Repente... a gente tem mais de uns 50 estilo na poesia do cantadô né? Tem
a Sextilha, tem a Gemedeira, tem os Motes de Setee de Dez, tem o Galope à Beira-mar,
tem um estilo antigo, Quadrão, isso vei muito antes da minha existência não é poeta?
Então, quando eu já nasci e já me entendi como cantadô, isso já existia! Mais isso alguns
pesquisadores dize, que vem de Portugal, outras coisas, dize que é invenção aqui do
Nordeste mêrmo, né? Mais é muito rico esse universo da nossa viola de cantoria, tem

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muito estilo de Repente pra gente cantá... Aí o povo pede cada estilo e a gente procura
atendê os pedidos na hora, cantando de improviso.

(M.C.): Poeta Dedé, a migração foi o que motivou a difusão da viola aqui em São Paulo,
aqui em Guarulhos, foi pelo migrante que essa cultura ganhou tanta força aqui? Qual a sua
opinião?

(D.L.): Oxe!..Demais menino! Hoje a maior cidade nordestina do país é São Paulo!!!
Numa cidade de uns onze milhões de habitantes, segundo o Censo, nóis temo quatro
milhões e meio de nordestino, que nenhuma capital do Nordeste tem! Tu imagina?! Esse
mundo de gente saindo do Nordeste e vindo pra qui? Aí traz os gosto, aí a cultura vem...é
coisa certa né?! Aí aqui, se reproduz, aqui a gente vai fazendo também, vai lembrando da
terrinha aí... a cultura de lá passa ser a cultura daqui! E é aí que o repentista entra né? Que
ele canta pros que vieram, as coisas que eles deixaram!. É uma arte saudosa, uma fonte de
inspiração pro poeta repentista.

(M.C.): Você tem alguns trabalhos gravados, eu digo discos, CD's? Já tem alguma
produção fonográfica sua? E de outros repentistas, você conhece?

(D.L.): Tenho sim! Acredito que eu tenho uns cinco disco gravado já, entre LP e CD não
é?! O primeiro que eu gravei foi com o repentista Fenelon Dantas, aqui em São Paulo,
naquele projeto da Rádio Atual né? Que trazia os violeiro, que fazia a gravação de muitas
duplas repentistas, que vinha do Nordeste pra cá! E a gente tinha essa facilidade, esse
incentivo né, então eu gravei o primeiro com Fenelon. Já gravei com Antôim Dantas, já
gravei com várias dupla de repentistas, mas eu tenho trabalhos gravados sim. Pra gente,
era como uma vitrine, da gente divulgar o nosso trabalho, do apologista ter sempre a
lembrança do repente guardada na sua casa... poder tocar quando quiser! Mas a graça do
repentista mêrmo é na hora, é cantar na hora de improviso, essa é a grandeza do cantadô
né... é fazer no ato! Só o trabalho gravado não nos ajuda financeiramente, a gente precisa
das cantoria pra levantar um dinheiro e para continuar fazendo a arte! Antigamente sim...
gravar um disco era bem mais importante, hoje em dia, com essa Internet aí meu fii... tem
tanto valô não!

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(M.C.): E o estilo da viola de vocês? Esse é o chamado modelo Dinâmico que a Del
Vecchio fabricava? Fale um pouco desse tipo de viola

(D.L.): Então poeta... essa viola aqui, ela tem um som mais alto, um som mai forte né ... e
desde o Nordeste eu sempre gostei de tocar com esse tipo de viola aqui! Que eles chama
mêrmo a Viola Dinâmica né isso? E hoje, um bocado de gente faz esse tipo de viola lá no
Nordeste. Tem alguns fabricante de instrumento que faz essa viola aqui, mais antigamente,
pra você comprar uma viola dessa, você tinha que vir em São Paulo, naquela loja da rua
Aurora, essa Del Vecchio mêrmo pra comprar uma viola dessa. Dessa aqui, só vendia em
São Paulo, só tinha pra qui pra São Paulo esse tipo de viola. Aí ela ficou famosa, populá
nas mão dos repentistas por causa do som dela, o som dela agradô, ai hoje quase todo
cantadô repentista ...a maioria usa essa viola daqui, que lá no Norte tem uns que chama de
Viola Sete Boca, mai o nome dela certo é Dinâmica né? Eu mêrmo, pra mim, viola pra
tocar repente é só essa aqui, só esse modelo aqui. Óia o som.... isso é um som bonito da
gota serena, né menino?! (risos e Dedé toca outro baião na viola)

(M.C.): E os meios de comunicação, onde vocês mais se apresentam, quais são? Onde
mais tem espaço aberto para a Cantoria e para o repentista?

(D.L.): Ainda é o Rádio poeta! É nas rádio que a gente se apresenta ao vivo né... e divulga
aonde vai acontecê as cantoria pra os ouvintes. Que quem escuta o rádio, no programa de
viola... aqui tem dois programa. Tem o que é feito em Guarulhos, que é o Violas de Canto
a Canto né... é pela Rádio Cumbica e também tem o Violas e Repentistas da Rádio
Imprensa FM né... esse é de São Paulo e, é nesses programa que a gente divulga nossas
cantorias, a gente apresenta os CD’s, quando a gente tá produzindo disco, pois hoje
ninguém faz disco mais! O negócio agora é Internet, as música né poeta... tá tudo lá.
Então o rádio é o meio principal que a gente ainda usa pra tá divulgando nosso trabalho
e cantá nosso repente. E no caso de divulgação, tem agora o tal do Facebook, tem o Zap
né?, aí ficou mais fácil a comunicação e de divulgar também, mas o Rádio ainda é muito
usado pelos repentista. Aqui quem apresentava o programa Violas de Canto a Canto, na
Rádio Cumbica era Erivaldo da Silva, mai ele já faliceu e... agora quem tá apresentando é

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o Moranguinho, um parceiro dos poetas, que faz a locução. E na Rádio Imprensa quem
comanda é Luís Wilson, todo domingo de manhã, e eu, Dantas e outros cantadores que
estão aqui por São Paulo, sempre se apresentamo por lá! E creio que só tem esses dois
mêrmo, que tem programa de repentista, só sei desses... que tem espaço pra cantadô hoje
por aqui por São Paulo.

Gilberto Alves

José Gilberto Alves, nome artístico Gilberto Alves, nascido no município de


Delmiro Gouveia em Alagoas, 54 anos. Reside em Guarulhos desde o ano de 2014.
Cantador repentista, com mais de três décadas como cantador profissional, é um dos
artistas da Viola Repentista, que vive exclusivamente do seu trabalho artístico.

Mario Cabral (M.C.): Poeta Gilberto, você como repentista, como analisa a cantoria na
cidade? O público que frequenta, aprecia os cantadores? São, geralmente, os migrantes
nordestinos ou também o pessoal daqui da cidade grande? Comente um pouco sobre isso.

Gilberto Alves (G.A.): É o seguinte... a Cantoria hoje, ela tá acontecendo em todo lugar
pois, os cantadores migraram não só do Nordeste para São Paulo, mas, do Nordeste para o
Rio e, do próprio Nordeste, para as capitais de lá! Então, a cantoria ela migrou para o
rádio, tá na Internet, ela tá mais acessível, ela tá moderna, ela tá urbana! Então o povo
daqui, às vezes, nunca teve contato com o Repente e quando tem contato se encanta, não
só... respondendo a sua pergunta, não só os migrantes que vão apriciá cantoria mas
também, a gente vê guarulhense, paulista que gosta de cantoria! Porque é na hora... uma
arte totalmente espontânea, creio ser por isso que ela cativa qualqué um! Na maioria das
vez, é frequentada pelos nordestino mesmo viu.... mas também tem público daqui, na
cidade que aprecia cantoria também.

(M.C.): Nisso que você falou de cantoria urbana, fale um pouquinho mais. Você acredita
que a cantoria hoje está acontecendo mais na cidade, é isso?

(G.A.): Eu acho isso viu! Porque na verdade, a cantoria Rural né... ela hoje está
acontecendo com muito menos frequência, a cantoria hoje, tornou-se urbana porque...
quando a eletricidade chegou na zona rural, aí os costumes urbanos chegaram à zona rural,

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a novela, a parabólica mostrando uns mil canais, Internet, por isso que as cantorias estão
saindo da zona rural mais para a zona urbana e as grandes metrópoles. E tem outra coisa
viu... veja, a grande maioria dos cantadores para se promoverem, crescerem na sua arte, no
Repente, eles vão para a cidade, tem contato com rádio, eles têm uma vida mais para
cidade do que pro sertão. Aquele público do sertão é o público que não pode migrar, é um
público assíduo de cantoria, os cantadores fazem cantorias na zona rural, mas, a grande
maioria do trabalho de produção de discos, divulgação do trabalho, rádio é tudo na cidade
grande então... esse é um dos motivos também, da cantoria ficá urbana, é onde o cantador
vai cantar, é onde ele tem a produção dele divulgada. Oitenta por cento do que repentista
canta, são coisas do Nordeste, coisas do sertão, coisas que ele viveu, coisas que muitos
nordestinos que vai ouvir as cantorias já viveram, que foi: tirar leite de vaca, foi trabalhar
com gado, foi trabalhar na lavoura, costume do sertão mesmo, então a gente canta isso
mesmo, a gente estando na cidade sempre procura trazer essas temáticas do Nordeste, que
é isso que alimenta também, o apreço desse povo que gosta de cantoria e também é o
manancial de poesia nosso né! Nossa fonte principal de poesia tá no Nordeste, nas coisas
do Nordeste.

(M.C.): Aqui em Guarulhos, há um público grande de cantoria? Na sua opinião, qual o


motivo principal da cantoria não estar na mídia, digo, em canais de TV aberta, divulgação
em grandes meios, jornais? Explica um pouco.

(G.A.): Poeta... eu acho que tem vários motivos. Para começar, a cantoria ela é totalmente
espontânea e, às vezes, aquilo que a gente improvisa pode não cair bem na hora que tá na
apresentação! Por exemplo, às vez a gente pode fazer um verso que eu toco uma ferida,
tem uma provocação, sabe? Então é uma arte, que você não espera, ela acontece na hora e
a televisão trabalha muito com coisa pronta, com o que pode e o que não pode passá. Eu já
vejo um motivo aí, outra, cantoria é muito comprida e para passá na televisão tem que ser
coisa rápida, música descartável que repete a letra várias vez, e cantoria não se repete... é
uma coisa nova a cada verso e cantoria no mínimo, no mínimo, de uns seis minutos e, seis
minuto na televisão do Brasil é muita coisa! Acho que não vai por isso. E outro motivo né,
eu vejo, a questão também, do preconceito que se tem com cultura populá, cultura populá
mesmo, que é feita por gente não famosa né ...por exemplo, música popular tem a MPB e

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nós somos mais populá que essa MPB não é?! E nunca teve espaço, pode ver, que até aqui
no programa daquela Inezita, era raro dupla de repentista! Tinha só caipira, mas o
programa era deles né, é dos caipira. A gente só aparecia esporadicamente na Inezita, que
eu só vi até hoje, Sebastião Marinho e Andorinha, não vi outros. Nunca vi na Globo,
então, eu acredito que esse preconceito não só com qualquer música popular, mas falando
de viola... tem com os caipira, tem com repentista ... Aqui o que salva a gente é o rádio, e
o público que vai ver a gente nas Casa do Norte, no bar, porque nem na televisão a gente
vai. Agora, no Nordeste, a gente tem mais espaço, no Nordeste eles visam mais, eu
acredito que também tem uma questão regional aí, pois somo de lá, se somos de lá temos
mais visibilidade, agora aqui, quem naturalmente tem mais visibilidade é o caipira, é isso
que eu acho. Por isso que a gente não tá na mídia. Ah, e respondendo o que você
perguntou, em Guarulhos tem um público grande de cantoria sim, quando a gente canta
nos locais que somos convidados! O público grande que a gente fala, é de trinta à quarenta
pessoas, em bar, em Casa do Norte, casa de família, porque cantoria não é uma coisa
muito de espetáculo, uma coisa grandiosa, a cantoria ela tem essa coisa de ser mais
reservada, quem vai ouvir cantoria apricia a cantoria, que gosta de tá sentado e ouvindo
verso, é uma arte que exige um pouco de silêncio, é uma arte que exige concentração!
Então, só vai quem gosta mesmo! Não tem essa coisa da festa na cantoria, você nunca vai
vê um Pop Star cantador! (risos)

(M.C.): Então, partindo disso que você comentou, poeta, você vê então a viola e o
Repente como uma arte de identificação, uma arte em que o ouvinte se reconhece, lembra
da sua terra, tem essa coisa de uma memória saudosa? Explique mais.

(G.A.): Perfeitamente. Isso é a base da nossa arte! Pois, enquanto cantadores, nós
decantamos o que as pessoas vivem, sentem, a gente narra acontecimento, lembramo do
passado, tudo em forma de rima, e o que a gente improvisa é sempre a história de alguém,
é sempre contando um fato verdadeiro, e muitos que ouve, se identifica com aquilo!
Então, no meu modo de vê, não existe, cantador sem ouvinte, e nem ouvinte sem cantador!
Um sempre vai tá aonde o outro estiver. É por isso que nossa arte, tá aí, existindo, e vai
continuá existindo, pois poesia tá em tudo, e história sempre vai ter pra contá! Enquanto
existir isso, vai ter repentista, e eu modéstia à parte, nasci repentista e sou um grande

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admirador e, também desbravador dessa cultura!

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Essa pesquisa quis trazer a lume uma manifestação cultural e artística que há muito
tempo é difundida em Guarulhos e trouxe com ela os seus aspectos socioculturais e a
questão da migração como um fator primordial para a subsistência e manutenção dessa
arte nesta cidade.
Trouxemos um pouco da Viola Caipira e da Viola Repentista como um patrimônio
cultural que é difundido pelas pessoas na cidade e fazem parte da cena cultural, embora os
órgãos públicos não lhes deem o devido reconhecimento e a devida atenção. Pois as
músicas que os violeiros entoam, são as músicas e as vozes dos migrantes! É a voz
daquele que saiu do seu chão e veio para a cidade grande para procurar trabalho e
melhores condições de vida, sendo essa música uma “indumentária”, uma identidade
desse migrante. Fizemos um “alinhavo” desde a década de 70 até os dias atuais desse
fenômeno da viola e buscamos, através dos interlocutores, entender um pouco sobre esta
manifestação cultural e o que é, o que significa a viola, pela ótica de quem produz e quem
pratica essa arte, os violeiros Caipiras e Repentistas.
No Capítulo I trouxemos um contexto histórico e um panorama da cidade, a qual
recebeu essa manifestação cultural e explicamos as razões pelas quais Guarulhos tem
tantos violeiros.
No Capítulo II mostramos as diferenças entre a Viola Caipira e a Viola Repentista
nos seus aspectos culturais e de execução, não só pela bibliografia consultada, mas
também pela fala de alguns violeiros entrevistados que nos revelaram certas
peculiaridades do instrumento dentro de ambas as linguagens.
No Capítulo III trouxemos as “vozes” dos entrevistados, ou seja, o principal intuito
dessa pesquisa, dar voz aos interlocutores contatados, mostrar que o fenômeno da viola é
vivo e precisa ser divulgado. Mostramos, pela ótica dos violeiros, o que é a viola, qual o
contexto social em que ela está inserida e quais as principais características dessa arte.
Em suma, buscamos trazer um pouco do que foi contado a nós, no intuito de
revelar um pouco da beleza cultural que se apresenta na invisibilidade cotidiana da cidade
de Guarulhos. Assim, buscamos penetrar em um aspecto da cultura urbana do município

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que é constitutivo da sua história, mas que é pouco conhecido. Quem sabe, na academia,
esse assunto possa ser mais divulgado, mais comentado e mais trabalhado, e que os
violeiros tenham o devido reconhecimento enquanto expressão não apenas artística, mas
de exprimirem as vozes e sentimentos dos migrantes. São os violeiros e os cantadores, os
cronistas do povo migrante, aqueles que trazem uma cultura totalmente popular e fazem
sua arte sem incentivo algum por parte dos órgãos públicos. Fazem por apreço, por gosto,
onde acreditamos ser o motivo principal da manutenção e difusão da arte das violas em
Guarulhos.

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ANEXOS

Os Caipiras

AGAS, contracapa do LP A Viola no Teatro, 1979. Fonte: Arquivo pessoal.

Apresentação da Folia de Reis de Seu Oliveira na Missa de Nossa Senhora de


Bonsucesso, durante a festa da Carpição de 2007. Fonte: Edson Catira.
Áurea Fontes apresentando o Viola Viva, transmitido por rádio AM em Guarulhos,
1997. Antes de ser um evento cultural, o Viola Viva era um programa de rádio e o
nome se manteve. Fonte: Áurea Fontes.

Banda Viola Viva, que organiza e toca o evento cultural. Foto de 2017. Fonte: Áurea Fontes.
Capa de Lp da Folia de Reis do bairro Vila Galvão de 1990. Fonte: Arquivo pessoal.

Capa do LP da Orquestra Violeiros de Ouro que foi comandada por Áurea Fontes no início
da década de 90. Fonte: Arquivo pessoal.
Capa do primeiro Lp gravado pelo grupo Os Mensageiros dos Santos Reis em 1980.
Fonte: Arquivo pessoal.

Cortejo da Folia de Reis comandada por Seu Oliveira no bairro que reside em 2019.
Fonte: Edson Catira.
Dupla Caipira Hélio Bueno e Aleixinho, dupla de grande importância na história da
arte da viola em Guarulhos. Fonte:Guilhermina Helfstein.

Encontro na residência da cantora e apresentadora Áurea Fontes em 2019, por


ocasião da visita da dupla João do Prado e Pratini, artistas caipiras da cidade.
Fonte: Potiguar Bloch.
Evento de Comemoração dos 40 anos da Orquestra de Violeiros Coração da Viola
em 2018, com a presença até do prefeito da cidade, Guti. Fonte: Site da Secretaria
Municipal de Cultura de Guarulhos.

Foto de 2019, do casal Áurea Fontes e Potiguar Bloch, promotores do Viola Viva,
movimento mais longevo na promoção da viola Caipira Guarulhos. Fonte: Áurea
Fontes.
Foto do encontro de violeiros organizado por Antony Ventura em 2018 durante a
Festa da Carpição. Fonte: Arquivo pessoal.

Foto tirada por ocasião da realização de estudo de caso no Evento Viola Viva de
Áurea Fontes em 2019, com a presença do Léu da Dupla Liu e Léu. Fonte: Potiguar
Bloch.
Fotos da primeira formação da Orquestra de Violeiros Coração da Viola na década
de 80. Fonte:Arquivo Histórico Municipal de Guarulhos.
Grupo Afina a Toeira, formado por alunos do Professor Zé Helder do
Conservatório Municipal de Guarulhos. Fonte: Arquivo pessoal.

Grupo Os Favoritos do Catira em foto para divulgação. Fonte: Edson Catira.


Orlando Alvorada, artista do estilo caipira em performance no anos 90. Fonte:
Orlando Alvorada.

Orlando Alvorada em Apresentação em 2016. Fonte: Orlando Alvorada.


Orlando Alvorada em apresentação sobre cultura caipira em 2016. Fonte:
Alexandre Leão, cineasta guarulhense.

Orquestra Violeiros de Ouro década de 90. Fonte: Áurea Fontes.


Os Mensageiros dos Santos Reis em cortejo pelo bairro Vila Fátima em Guarulhos.
Fonte: Edson Catira.

Os Mensageiros dos Santos Reis na Festa da Carpição no bairro Bom Sucesso.


Fonte: Edson Catira.
Os violeiros caipiras Carreiro, André Moraes e Seu Oliveira em sua residência, no
Bairro Vila Fátima. Fonte: Thiago Pires.

Os Violeiros caipiras Edson Catira, Ricardo Vignini e Zé Hélder em apresentação


no SESC Guarulhos em 2019. Fonte: Site SESC Guarulhos.
Panfleto digital do Evento Café com
Viola, organizado pela dupla caipira Vera
Bianca e Guaru em 2018. Fonte: Arquivo
pessoal.

Panfleto digital do evento comandado


pelo violeiro caipira Claiton Carvalho
em 2018. Fonte: Arquivo pessoal.
Ricardo Santiago e Antony Ventura, representam uma nova geração de violeiros
caipira aqui na cidade. Fonte: Antony Ventura.

Seu Oliveira e Edson Catira, pai e filho executando a dança da Catira ao som da
viola. Fonte: Edson Catira.
Thiago Pires, eu, Oliveira, Pardinho Filho, Carreiro e André Moraes, na residência
de Seu Oliveira, 2019. Fonte: Thiago Pires.

Violeira Natalia Terra quando fazia parte da Orquestra De Violeiros, 2014. Fonte:
Douglas Cruz, músico e violeiro.
Violeiros ensaiando no evento Viola Viva em 2019, realizado no teatro Nelson
Rodrigues no bairro Vila Galvão. Fonte: Áurea Fontes.

Professor Zé Helder no Conservatório Municipal de Guarulhos em 2016. Fonte:


Diogo Fonseca, músico guarulhense.
Os Repentistas

Cantadores Dedé Laurentino e Zé


Cândido. Fonte: Dedé Laurentino.

Cantadores Dedé Laurentino e Antonio Dantas. Fonte: Antonio Dantas.


Cantadores Valdir Teles e Gilberto Alves em cantoria realizada em São Paulo em
2017.
Fonte: Gilberto Alves.

Cantadores Dedé Laurentino e Gilberto Alves em cantoria realizada no Bairro


Ponte Alta em Guaurlhos, 2016. Fonte: Daniel Neves, cineasta guarulhense.
Panfleto digital de cantoria
realizada em Guarulhos em
2019. Fonte: Antonio
Dantas.

Panfleto digital de cantoria realizada


no Jardim Ponte Alta em Guarulhos
em 2018. Fonte: Edival Pereira.
Panfleto digital de cantoria
realizada no Jardim São João
em Guarulhos, 2018. Fonte:
Antonio Dantas.

Da esquerda para direita os cantadores: Antonio Dantas, Raulino Silva, Erivaldo da


Silva, Marcos Rabelo, Fenelon Dantas e Dedé Laurentino, em foto tirada na rádio
Cumbica no intervalo do programa: Violas de Canto a Canto, 2017. Fonte: Antonio
Dantas.
Cartão de apresentação do programa Violas de Canto a Canto da rádio Cumbica de
Guarulhos. Fonte: Arquivo pessoal.

Panfleto digital de cantoria realizada no bairro


dos Pimentas em Guarulhos, 2018. Fonte: Dedé
Laurentino.

Panfleto digital de cantoria online


realizada na página do Facebook do poeta
Antonio Dantas, 2021. Fonte: Antonio
Dantas.
Considerando, que fui informado(a) dos objetivos e da relevância do estudo proposto, de como
será minha participação, dos procedimentos e riscos decorrentes deste estudo, declaro o meu
consentimento em participar da pesquisa, como também concordo que os dados obtidos na
investigação sejam utilizados para fins científicos (divulgação em eventos e publicações).
Estou ciente que receberei uma via desse documento.

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Guarulhos, 18 de Novembro, de 2020 .

ANTONY VENTURA SILVA .

Contato com o Pesquisador (a) Responsável:

Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor ligar para o
pesquisador Mario Cabral de Almeida. Telefone:(11) 91054-9828. E-mail:
mario.cabral2012@bol.com.br e mariocabralalmeida@gmail.com.
Considerando, que fui informado(a) dos objetivos e da relevância do estudo proposto, de como
será minha participação, dos procedimentos e riscos decorrentes deste estudo, declaro o meu
consentimento em participar da pesquisa, como também concordo que os dados obtidos na
investigação sejam utilizados para fins científicos (divulgação em eventos e publicações).
Estou ciente que receberei uma via desse documento.

Impressãodactiloscópica

Guarulhos, 15 de Julho , de 2019 .

ÁUREA SALVAIA ( Áurea Fontes ) .

Contato com o Pesquisador (a) Responsável:

Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor ligar para o
pesquisador Mario Cabral de Almeida. Telefone:(11) 91054-9828. E-mail:
mario.cabral2012@bol.com.br e mariocabralalmeida@gmail.com.
Considerando, que fui informado(a) dos objetivos e da relevância do estudo proposto, de como
será minha participação, dos procedimentos e riscos decorrentes deste estudo, declaro o meu
consentimento em participar da pesquisa, como também concordo que os dados obtidos na
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Estou ciente que receberei uma via desse documento.

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Guarulhos, 08 de Setembro , de 2019 .

JOSÉ LAURENTINO DOS SANTOS (Dedé Laurentino ) .

Contato com o Pesquisador (a) Responsável:

Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor ligar para o
pesquisador Mario Cabral de Almeida. Telefone:(11) 91054-9828. E-mail:
mario.cabral2012@bol.com.br e mariocabralalmeida@gmail.com.
Considerando, que fui informado(a) dos objetivos e da relevância do estudo proposto, de como
será minha participação, dos procedimentos e riscos decorrentes deste estudo, declaro o meu
consentimento em participar da pesquisa, como também concordo que os dados obtidos na
investigação sejam utilizados para fins científicos (divulgação em eventos e publicações).
Estou ciente que receberei uma via desse documento.

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Guarulhos, 13 de Outubro , de 2019 .

ANTÔNIO FERREIRA DANTAS .

Contato com o Pesquisador (a) Responsável:

Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor ligar para o
pesquisador Mario Cabral de Almeida. Telefone:(11) 91054-9828. E-mail:
mario.cabral2012@bol.com.br e mariocabralalmeida@gmail.com.
Considerando, que fui informado(a) dos objetivos e da relevância do estudo proposto, de como
será minha participação, dos procedimentos e riscos decorrentes deste estudo, declaro o meu
consentimento em participar da pesquisa, como também concordo que os dados obtidos na
investigação sejam utilizados para fins científicos (divulgação em eventos e publicações).
Estou ciente que receberei uma via desse documento.

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Guarulhos, 06 de Agosto , de 2019 .

JOSÉ HELDER DE MACHADO E BUSTAMANTE ( Zé Helder ) .

Contato com o Pesquisador (a) Responsável:

Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor ligar para o
pesquisador Mario Cabral de Almeida. Telefone:(11) 91054-9828. E-mail:
mario.cabral2012@bol.com.br e mariocabralalmeida@gmail.com.
Considerando, que fui informado(a) dos objetivos e da relevância do estudo proposto, de como
será minha participação, dos procedimentos e riscos decorrentes deste estudo, declaro o meu
consentimento em participar da pesquisa, como também concordo que os dados obtidos na
investigação sejam utilizados para fins científicos (divulgação em eventos e publicações).
Estou ciente que receberei uma via desse documento.

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Guarulhos, 25 de Setembro , de 2019 .

ORLANDO JOSÉ DE OLIVEIRA (Orlando Alvorada) .

Contato com o Pesquisador (a) Responsável:

Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor ligar para o
pesquisador Mario Cabral de Almeida. Telefone:(11) 91054-9828. E-mail:
mario.cabral2012@bol.com.br e mariocabralalmeida@gmail.com.
Considerando, que fui informado(a) dos objetivos e da relevância do estudo proposto, de como
será minha participação, dos procedimentos e riscos decorrentes deste estudo, declaro o meu
consentimento em participar da pesquisa, como também concordo que os dados obtidos na
investigação sejam utilizados para fins científicos (divulgação em eventos e publicações).
Estou ciente que receberei uma via desse documento.

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Guarulhos, 17 de Novembro , de 2019 .

OLIVEIRA ALVES FONTES ( Seu Oliveira ) .

Contato com o Pesquisador (a) Responsável:

Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor ligar para o
pesquisador Mario Cabral de Almeida. Telefone:(11) 91054-9828. E-mail:
mario.cabral2012@bol.com.br e mariocabralalmeida@gmail.com.
Considerando, que fui informado(a) dos objetivos e da relevância do estudo proposto, de como
será minha participação, dos procedimentos e riscos decorrentes deste estudo, declaro o meu
consentimento em participar da pesquisa, como também concordo que os dados obtidos na
investigação sejam utilizados para fins científicos (divulgação em eventos e publicações).
Estou ciente que receberei uma via desse documento.

Impressãodactiloscópica

Guarulhos, 14 de Maio , de 2019 .

JOSÉ GILBERTO ALVES ( Gilberto Alves ) .

Contato com o Pesquisador (a) Responsável:

Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor ligar para o
pesquisador Mario Cabral de Almeida. Telefone:(11) 91054-9828. E-mail:
mario.cabral2012@bol.com.br e mariocabralalmeida@gmail.com.
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

BASEADO NAS DIRETRIZES CONTIDAS NA RESOLUÇÃO CNS Nº466/2012, MS.

Prezado (a) Senhor (a)

Você está sendo convidado a participar desta pesquisa que tem como objetivo compreender as
relações sociais que se estabelecem entre os artistas e promotores das expressões das Violas Caipiras e
Repentistas no Município de Guarulhos, e as relações que se estabelecem entre esses migrantes (em sua
maioria) e a cidade que o acolheu e como se mantem viva essa cultura na cidade.

Esta pesquisa chama-se: Violas Urbanas: A Expressão de uma Arte Popular e a Configuração
desse Fenômeno na Cidade de Guarulhos e está sendo desenvolvida por Mario Cabral de Almeida, do
Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), sob a
orientação do Professor Doutor Jose Carlos Gomes da Silva, cuja pesquisa é a nível de Mestrado.

Os outros Objetivos desta empreitada são: (1) Detectar o público frequentador, desses eventos de
viola em Guarulhos (no tocante a faixa etária e relações suas com a manifestação cultural); (2) Como são
organizados e realizados eventos de violas Caipiras e Repentistas na cidade e as regiões onde ocorrem;
(3) E o fator da migração como propulsor desta arte na cidade. Tais questões, caracterizam o presente
estudo. Os alvos que se deseja alcançar são: mais pesquisas sobre essa cultura por parte de outros
Pesquisadores, mais reconhecimento e estudos acadêmicos sobre culturas populares tradicionais e uma relação
mais direta entre a Universidade e a cidade na qual se insere pela pesquisa de seus agentes culturais (digno de
nota que o Campus de Ciências Humanas da UNIFESP se situa em Guarulhos).

Solicitamos a sua colaboração para a coleta de dados por meio de entrevistas sobre a
migração, a arte da Viola para você, sua trajetória artística na cidade, sobre os eventos culturais de
Viola, na média de 03 horas de conversas, com perguntas previamente estruturadas e também vossa
autorização para apresentar os resultados desta pesquisa no âmbito acadêmico e onde mais seja
necessário nacional e internacionalmente como estudo acerca da cultura popular do Brasil. Quando
da publicação dos resultados do projeto, seu nome será mantido no mais absoluto sigilo. Tal
pesquisa terá relatos de vivências no âmbito cultural, familiar e histórias pessoais dos interlocutores
entrevistados.

A título de clareza, fica exposto que sua participação no estudo é voluntária e, portanto, o(a)
senhor(a) não é obrigado(a) a fornecer as informações e/ou colaborar com as atividades solicitadas
pelo Pesquisador(a). Caso opte por não participar do estudo, ou resolver a qualquer momento
desistir do mesmo, não sofrerá nenhum dano e/ou sanção. Os pesquisadores estarão a sua
disposição para qualquer esclarecimento que considere necessário em qualquer etapa da pesquisa.
No concernente à procedimentos, serão utilizados entrevistas com os agentes culturais escolhidos,
coleta de dados e anotações em eventos de violas caipira e repentistas em Guarulhos e pesquisa à acervos
particulares (dos próprios entrevistados) e públicos (Arquivo Histórico de Guarulhos e Secretaria de Cultura do
Município). Os riscos envolvidos dizem respeito à: possibilidade do não aceite por parte do entrevistado em
dor entrevistas, motivos de saúde (alguns são idosos), vergonha de expor sua história de vida e/ou
constrangimento e melancolia devido a evocação de memórias pessoais.

A participação nesta pesquisa não inclui custos ou compensações financeiras por sua
participação.
Em caso de dúvidas e para maiores esclarecimentos, informo meu endereço e meus dados para futuros contatos;
Pesquisador responsável: Mario Cabral de Almeida, RG: 41.540.858-1, sob o CPF: 230.131.298-40. Número
para contato (11)91054-9828, vinculado à Instituição Universidade Federal de São Paulo, Escola de Filosofia,
Letras e Ciências Humanas (UNIFESP-EFLCH), situada à rua Estr. do Caminho Velho, 353 - Jardim Nova
Cidade, Guarulhos – SP.

No que diz respeito a dúvidas quanto a ética deste estudo, entrar em contato com o Comitê de Ética
em Pesquisa (CEP) da Unifesp - Rua Prof. Francisco de Castro, n: 55, - 04020-050., tel: (011)-5571-1062;
(011)-5539- 7162. E-mail: cep@unifesp.edu.br.; horário de atendimento telefônico e presencial: Segundas,
Terças, Quintas e Sextas, das 09:00 às 13:00hs.).

Assinatura do(a) pesquisador(a) responsável.


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PONTEIO: JOGARAM A VIOLA NO MUNDO, MAS FUI LÁ NO FUNDO


BUSCAR; LISA (Laboratório de Imagem e Som em Antropologia) – FFLCH-USP 2001,
Direção, pesquisa e roteiro: Francisco Simões Paes e Camilo Vannuchi. Ficha técnica:
NTSC, COR, 54 MIN, 2001. Realização: LISA, apoio FAPESP.

Intergerações Viola Paulista: VIOLA DE REIS. Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?
v=1i3uMzIJWng&list=PLMLMiXVn6V6fwaE966IDjVB07itmzW4t&index=91&t=0s

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REPENTE SP. Dir: Alunos da Faculdade Cásper Líbero, São Paulo, Fund. Cásper
Líbero, 2015, Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=b8rjmsowHkM >.

Sou Viola Caipira| Episódio 1. 2017;VIOLA PERPÉTUA. Dir: Mário de Almeida,


Bragança Paulista, Produção Independente, 2017, 1DVD. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?> Acesso em: 14 jun.

Entrevistas:

ALVES, Gilberto. Em entrevista concedida em 2019 [Violeiro repentista, compositor e


intérprete, morador do bairro Jardim Otawa em Guarulhos].

ALVORADA, Orlando. Em entrevista concedida em 2019 [Artista do estilo Caipira,


cantor, compositor e radialista, morador do bairro Alvorada em Guarulhos].

DANTAS, Antônio. Em entrevista concedida em 2018 [Violeiro repentista, agente


cultural de eventos de Viola Repentista, morador do bairro Fortaleza em Guarulhos].

LAURENTINO, Dedé. Em entrevista concedida em 2018 [Violeiro repentista, morador


do bairro Alvorada em Guarulhos].

FONTES, Áurea. Em entrevistas concedidas em 2018 e 2019 [Promotora cultural que


esteve a frente do projeto Viola Viva, moradora do bairro Bom Clima de Guarulhos].

115
OLIVEIRA, “seu”. Em entrevistas concedidas em 2018 e 2019 [Violeiro Caipira, cantor,
Mestre de Folia e Catireiro, morador do bairro Vila Fátima em Guarulhos].

VENTURA, Antony. Em entrevista concedida em 2019, por escrito [Violeiro Caipira,


cantor, compositor, morador do bairro Vila Carmela em Guarulhos].

ZÉHELDER. Em entrevista concedida em 2019 [Violeiro Caipira, músico, compositor e


professor de Música do Conservatório Municipal de Guarulhos].

116

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