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2.artigo Considerações Sobre A Formação e A Prática - JBorsa 2016

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Temas em Psicologia

ISSN: 1413-389X
comissaoeditorial@sbponline.org.br
Sociedade Brasileira de Psicologia
Brasil

Callegaro Borsa, Juliane


Considerações sobre a Formação e a Prática em Avaliação Psicológica no Brasil
Temas em Psicologia, vol. 24, núm. 1, 2016, pp. 131-143
Sociedade Brasileira de Psicologia
Ribeirão Preto, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=513754276006

Como citar este artigo


Número completo
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ISSN 1413-389X Trends in Psychology / Temas em Psicologia – 2016, Vol. 24, nº 1, 131-143
DOI: 10.9788/TP2016.1-09

Considerações sobre a Formação e a Prática


em Avaliação Psicológica no Brasil

Juliane Callegaro Borsa1


Departamento de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro,
Rio de Janeiro, RJ, Brasil

Resumo
O objetivo deste artigo teórico é discutir a prática e a formação em avaliação psicológica no contexto
brasileiro. Para tanto, serão apresentadas as resoluções e documentos normativos do Conselho Federal
de Psicologia, bem como artigos teóricos e empíricos de referência na área e que contextualizam o
cenário atual da avaliação psicológica no Brasil, suas particularidades e principais dificuldades. Espe-
cificamente, será discutido o papel das instituições de ensino superior para a formação de psicólogos
devidamente capacitados para atuação na avaliação psicológica nos seus diferentes campos de inserção.
Aponta-se para a necessidade de uma reflexão quanto ao ensino de avaliação psicológica nos cursos de
graduação em Psicologia, os quais ainda apresentam carga horária insuficiente e recursos materiais e
humanos incipientes. Entende-se que a formação básica e continuada é a principal forma de minimizar
o preconceito pertinente à área e, que de certo modo, está atrelado aos problemas éticos e técnicos ainda
presentes na prática da avaliação psicológica no contexto brasileiro atual.
Palavras-chave: Avaliação psicológica, formação do psicólogo, testes psicológicos.

Considerations about the Training and Practice


in Psychological Assessment in Brazil

Abstract
The aim of this article is to discuss the practice and training of psychological assessment in the Brazilian
context. Resolutions and normative documents from the Brazilian Federal Council of Psychology as
well as theoretical and empirical reference articles discussing the main difficulties and particularities of
psychological assessment in Brazil are presented. Specifically, the article highlights the role of Brazi-
lian higher education institutions on the proper training for psychologists and their ability to conduct a
psychological assessment in different contexts. It points toward a necessity to reflect upon the teachings
of psychological assessment in undergraduate psychology courses, which still lack sufficient academic
time loads, materials and experienced professors. It is understood that basic training and ongoing edu-
cation are the principal ways to minimize the prejudice in this area and those related to the ethical and
technical problems still present in the practice of psychological assessment within the current Brazilian
context.
Keywords: Psychological assessment, training of psychologists, psychological tests.

1
Endereço para correspondência: Rua Marquês de São Vicente, 225, Edifício Cardeal Leme, Gávea, Caixa-
postal 22470060, Rio de Janeiro, RJ, Brasil 22451-900. Fone: (21) 3527-1185, Fax: (21) 3527-1187. E-mail:
juliborsa@gmail.com
132 Borsa, J. C.

Consideraciones a cerca de la Formación y la Práctica


de la Evaluación Psicológica en Brasil

Resumen
El objetivo de este artículo es discutir la práctica y la formación de la evaluación psicológica en el con-
texto brasileño. Para ello, presentamos las resoluciones y documentos normativos del consejo federal
de psicología, así como trabajos de referencia en el área, tanto teóricos como empíricos, los cuales
contextualizan el actual escenario de la evaluación psicológica en Brasil, sus particularidades y princi-
pales dificultades. Específicamente, se analizará el papel de las instituciones de educación superior para
la formación adecuada de los psicólogos en la práctica de la evaluación psicológica en sus diferentes
ámbitos de inserción. Se apunta a la necesidad de una reflexión en lo que compete a la educación so-
bre la evaluación psicológica en las carreras de grado en Psicología, las cuales todavía presentan una
carga horaria insuficiente, y recursos materiales y humanos escasos. Se entiende que el grado básico y
la educación continua son las principales formas de reducir el preconcepto en el área y que de alguna
manera se relacionan con los problemas de ética y técnica aún presentes en la práctica de la evaluación
psicológica en el contexto brasileño actual.
Palabras clave: Evaluación psicológica, formación profesional del psicólogo, test psicológicos.

A avaliação psicológica é definida pelo mais complexo. Enquanto a primeira envolve a


Conselho Federal de Psicologia (CFP) como o integração de informações oriundas de diferen-
processo técnico-científico de coleta de dados, tes fontes (testes, entrevistas, observações, entre
estudos e interpretação de informações a respei- outras), a testagem psicológica pode ser consi-
to dos fenômenos psicológicos, que são resul- derada uma etapa da avaliação psicológica em
tantes da relação do indivíduo com a sociedade que a principal fonte de informação são os testes
(CFP, 2003a). Segundo Urbina (2007), a avalia- psicológicos de diferentes tipos (CFP, 2013b;
ção psicológica é um processo flexível que tem Primi, Nascimento, & Souza, 2004). A avaliação
por objetivo chegar a uma conclusão a respeito psicológica configura-se, assim, como um com-
de uma ou mais questões psicológicas por meio plexo processo de análise que exige do psicólo-
da coleta, da avaliação e da análise de dados go um grande preparo técnico e um aprofundado
apropriados ao objetivo em questão. Por meio conhecimento teórico que extrapola o conheci-
da avaliação psicológica, é possível investigar, mento presente nos manuais dos testes psicoló-
descrever e/ou mensurar características e proces- gicos. Segundo a Resolução do CFP, nº 07/2003,
sos psicológicos, como emoção, afeto, cognição, os resultados das avaliações devem considerar
inteligência, motivação, personalidade, atenção, a influência do contexto e seus efeitos no psi-
memória, percepção, entre outros (CFP, 2003b). quismo, devendo servir como instrumentos para
A avaliação psicológica é uma das áreas mais an- atuar não somente sobre o indivíduo, mas na mo-
tigas da Psicologia (Anastasi & Urbina, 2000) e dificação dos condicionantes históricos e sociais
uma prática exclusiva do psicólogo, contribuin- (CFP, 2003a).
do para sua inserção nos mais diversos contextos No Brasil, a avaliação psicológica vem
de atuação profissional (Löhr, 2011). sendo cada vez mais reconhecida e respeitada
A avaliação psicológica diferencia-se da como uma importante área da Psicologia (Am-
testagem psicológica, embora muitas vezes estas biel, 2011). No entanto, apesar dos inquestio-
práticas sejam confundidas ou até compreendi- náveis avanços, os problemas concernentes à
das como sinônimos. Embora o uso de testes psi- sua prática ainda são uma realidade (Noronha,
cológicos seja uma importante fonte de coleta de 2002; Noronha & Reppold, 2010). Esses pro-
informações no âmbito da avaliação psicológi- blemas referem-se, em grande parte, à forma-
ca, esta é um processo mais amplo e, sobretudo, ção desqualificada e, consequentemente, ao
Considerações sobre a Formação e a Prática em Avaliação Psicológica no Brasil. 133

despreparo técnico e teórico dos psicólogos que a elaboração de orientações sobre a prática da
atuam na área. avaliação psicológica em diferentes contextos e
O presente artigo tem por objetivo apresen- para diferentes finalidades. Como exemplo, cita-
tar reflexões sobre a prática e a formação em ava- -se a Resolução nº 018/2008, que dispõe acerca
liação psicológica nos cursos de graduação em do trabalho do psicólogo na avaliação psicológi-
Psicologia no Brasil. Entende-se como relevante ca para concessão de registro e/ou porte de arma
apresentar tais questões em um periódico não es- de fogo, a Resolução n° 016/2002, que dispõe
pecífico de avaliação psicológica, que conta com acerca do trabalho do psicólogo na avaliação
leitores de diferentes áreas da Psicologia e que psicológica de candidatos à Carteira Nacional de
poderão compreender a importância da forma- Habilitação e condutores de veículos automoto-
ção qualificada em avaliação psicológica como res e a Resolução n° 001/2002, que regulamen-
um direito de todos os psicólogos brasileiros. ta a avaliação psicológica em concurso público
e processos seletivos da mesma natureza, entre
A Avaliação Psicológica no Brasil outras (CFP, 2011).
Outro importante avanço, decorrente da Re-
Ao longo das décadas, psicólogos, profissio- solução 002/2003 (CFP, 2003b), foi a criação,
nais de outras áreas e a sociedade em geral vem no ano de 2003, do Sistema de Avaliação de Tes-
identificando uma série de problemas na prática tes Psicológicos (Satepsi). O Satepsi é o sistema
da avaliação psicológica no contexto brasileiro. do CFP responsável pela elaboração de critérios
Estes problemas envolvem desde falhas na pos- de qualidade para que os testes psicológicos
tura ética e na qualificação técnica dos profissio- possam ser comercializados e utilizados por psi-
nais até a escassez de instrumentos psicológicos cólogos no contexto brasileiro (CFP, 2014). A
de qualidade e apropriados para uso nos contex- página destinada ao Satepsi (http://satepsi.cfp.
tos específicos de aplicação (CFP, 2011; Frizzo, org.br/) apresenta a lista dos testes psicológicos
2004; Noronha, 2002). Com o objetivo de mudar com pareceres favoráveis e desfavoráveis para
essa realidade, o CFP vem tomando importantes uso. Tais pareceres são emitidos pela Comissão
medidas para qualificar esta prática (Noronha & Consultiva em Avaliação Psicológica, a qual é
Reppold, 2010). formada por pesquisadores e conselheiros com
A Resolução 002/2003 (CFP, 2003b), que experiência e produção científica na área da ava-
define e regulamenta o uso, a elaboração e a co- liação psicológica. Em sua apreciação, a Comis-
mercialização de testes psicológicos e revoga a são Consultiva considera se os testes psicológi-
Resolução CFP n° 025/2001 foi, sem dúvida, cos possuem, pelo menos, um conjunto mínimo
uma importante contribuição para a área da ava- de estudos que atesta sua qualidade, com base
liação psicológica no Brasil. Outro importante nos critérios definidos na Resolução 002/2003
documento foi a Resolução n° 007/2003, que (CFP, 2010).
institui o Manual de Elaboração de Documentos O site do Satepsi disponibiliza, também, as
Escritos produzidos pelo psicólogo, decorrentes resoluções e as principais publicações do CFP
de avaliação psicológica, e revoga a Resolução sobre a prática avaliação psicológica. No site é
nº 017/2002. O primeiro documento apresenta possível consultar, ainda, os instrumentos ava-
importantes orientações sobre os requisitos mí- liados e que não foram considerados testes psi-
nimos necessários para atestar a qualidade dos cológicos e os instrumentos que foram conside-
testes psicológicos. Já o segundo, tem como ob- rados testes psicológicos tendo, portanto, seu
jetivo orientar os psicólogos na elaboração de uso privativo aos psicólogos (CFP, 2014). Tais
documentos decorrentes das avaliações psicoló- informações são de acesso livre e estão dispo-
gicas, fornecendo orientações sobre os aspectos níveis para psicólogos e para a comunidade em
éticos e técnicos necessários (CFP, 2003a). geral (CFP, 2014).
Além destas resoluções, muitos outros avan- Preocupado com a qualidade técnica e cien-
ços aconteceram na área como, por exemplo, tífica dos profissionais que trabalham com ava-
134 Borsa, J. C.

liação psicológica, o CFP lançou, em 2010, o ses que tem como escopo a avaliação psicológica
documento intitulado Avaliação Psicológica: Di- aplicada e seus fundamentos.
retrizes na Regulamentação da Profissão (CFP, Importante referenciar, também, o empenho
2010). Este documento reforça o compromisso dos grupos de trabalho do Simpósio de Pesqui-
do CFP com a prática da avaliação psicológica sa e Intercâmbio Científico em Psicologia, pro-
no Brasil e salienta a necessidade de assegurar movido pela Associação Nacional de Pesquisa
o respeito e garantir o comprometimento desta e Pós-Graduação em Psicologia (ANPEPP). Na
prática com os direitos humanos. Além disso, edição de 2014, na cidade de Bento Gonçalves
com o objetivo de discutir sobre a qualificação - RS, o encontro contou com cinco grupos de tra-
da área da avaliação psicológica, o CFP por meio balho referentes à avaliação psicológica, quais
da Assembleia das Políticas, da Administração e sejam: Pesquisa em Avaliação Psicológica, Mé-
das Finanças (APAF), instância deliberativa do todos Projetivos nos Contextos da Avaliação
Sistema de Conselhos de Psicologia, instituiu Psicológica, Avaliação Cognitiva e Neuropsico-
o Ano Temático da Avaliação Psicológica, em lógica, Avaliação em Psicologia Positiva e Cria-
2011. Neste período, foram promovidas ativida- tividade, Avaliação Psicológica: Personalidade
des nas sedes do CFP e de seus conselhos regio- e Psicopatologia. Esses grupos ilustram a com-
nais, buscando refletir sobre diferentes questões plexidade da área de avaliação psicológica que,
pertinentes a essa temática, dando especial ênfa- cada vez mais, amplia seu escopo de atuação e
se a questão dos direitos humanos no processo investigação, articulando-a com outras áreas de
de avaliação psicológica e na devolução e uso conhecimento científico (ANPEPP, 2014).
de seus resultados (Ambiel, 2011; CFP, 2011). Dentre as principais instituições que vem
Essas atividades resultaram em um documento trabalhando para a qualificação técnica e cien-
intitulado Relatório do Ano temático da Avalia- tífica da avaliação psicológica, está o Instituto
ção Psicológica (CFP, 2013a), disponível para Brasileiro de Avaliação Psicológica (IBAP).
acesso no site do CFP (http://site.cfp.org.br/ Fundado em 1998, o IBAP tem como objeti-
publicacao/relatorio-do-ano-tematico-da-avalia- vo promover o desenvolvimento da área, divul-
cao-psicologica-20112012/). gando o conhecimento, orientando os psicólogos
No âmbito da pesquisa em avaliação psico- e os membros da comunidade com interesses nos
lógica, também tem-se observado um importante procedimentos de avaliação psicológica, incenti-
crescimento no número de publicações brasileiras vando e promovendo a formação de especialis-
sobre o tema (Hutz & Bandeira, 2003; Joly, Silva, tas e pesquisadores (IBAP, 2014). Dentre ações
Nunes, & Souza, 2007; Primi, 2010). Muito deste promovidas pelo IBAP, duas merecem maior
crescimento se deve ao surgimento e fortaleci- destaque: A primeira é a realização do Congres-
mento das linhas de pesquisa pertinentes à área so Brasileiro de Avaliação Psicológica, evento
da avaliação psicológica, vinculadas a importan- bienal que em 2015 realizará sua sétima edição.
tes instituições de ensino. Apenas como exemplo, A segunda é a publicação da Revista Avaliação
cita-se o Programa de Pós-Graduação Stricto Sen- Psicológica, criada em 2002 e publicada trimes-
su da Universidade de São Francisco (CAPES 6), tralmente. Esta configura-se como um impor-
que tem como área de concentração a avaliação tante meio de divulgação da produção científica
psicológica, além do Programa de Pós-Graduação iberoamericana na área de avaliação psicoló-
em Psicologia da Universidade Federal do Rio gica publicando trabalhos originais, artigos de
Grande do Sul (CAPES 7), e do Programa de revisão da literatura, notas técnicas e comuni-
Pós-Graduação em Psicologia da Pontifícia Uni- cações breves de pesquisa e resenhas de livros
versidade Católica de Campinas (CAPES 5) que importantes na área e notícias. Recentemente a
contam com linhas de pesquisa específicas sobre revista passou a receber o nome de Interameri-
instrumentos e processos de avaliação psicológica can Journal of Psychological Assessment, am-
e de onde derivam-se diversas dissertações e te- pliando, assim, sua abrangência. Seus números
Considerações sobre a Formação e a Prática em Avaliação Psicológica no Brasil. 135

vêm sendo publicados sem interrupção, desde não reconhecidas, a falta de qualidade destas
2002 e todos os artigos são de livre acesso, po- ferramentas, a falta de orientações sobre enca-
dendo ser consultados por meio do portal Perió- minhamentos adequados ou a emissão de docu-
dicos Eletrônicos em Psicologia, no endereço mentos sem fundamentação teórica (Anache &
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_ Reppold, 2010; Frizzo, 2004; Noronha, 2002).
serial&pid=1677-0471&lng=pt. Essa realidade demonstra a necessidade de uma
Outra importante associação atuante na área profunda revisão na qualidade do ensino da ava-
é a Associação Brasileira de Rorschach e Méto- liação psicológica na graduação e aponta para a
dos Projetivos (ASBRo), fundada em 1993, e que importância do aprimoramento e da formação
tem por objetivo promover o desenvolvimento continuada na área.
das técnicas projetivas e fomentar o aprimora-
mento técnico-científico dos psicólogos brasi- A Formação em Avaliação
leiros nas técnicas projetivas, oferecendo cursos Psicológica no Brasil
de formação e de aprimoramento profissional. A
cada dois anos, a ASBRo realiza o Congresso da A avaliação psicológica é um importante
Associação Brasileira de Rorschach e Métodos campo de estudo, ensino e atuação da Psicolo-
Projetivos, ocasião em que acontece o intercâm- gia e deve ser realizada com base em teorias e
bio entre psicólogos que pesquisam e utilizam as estudos empíricos. Essa área deve ser parte obri-
técnicas projetivas (ASBRo, 2014). gatória nos currículos dos cursos de Psicologia
Como consequência do crescimento na área (CFP, 2010; Nunes et al., 2012). Atualmente,
da avaliação psicológica observa-se, também, cresce a preocupação quanto à capacitação dos
uma crescente oferta de testes psicológicos dis- psicólogos que realizam a avaliação psicológica
poníveis no mercado. Esse efeito é natural e espe- (Noronha, Carvalho, Miguel, Souza, & Santos,
rado, já que nenhum teste surge ao acaso, sendo 2010; Reppold & Serafini, 2010). Como já re-
necessários muitos anos de estudo para sua cons- ferido, a avaliação psicológica é, por lei, uma
trução e validação. Em um levantamento realiza- prática exclusiva do profissional de Psicologia
do para este artigo, verificou-se que, em 2014 a (CFP, 2011). Uma vez habilitado psicólogo, o
lista contava com 153 testes psicológicos favo- profissional poderá realizar procedimentos de
ráveis para comercialização e uso (CFP, 2014). avaliação psicológica, sem haver a obrigatorie-
Apesar dos avanços recentes na área, carac- dade legal de qualquer treinamento, especializa-
terizados pelo crescimento das pesquisas e pu- ção ou qualificação adicional para além das dis-
blicações e pelo aumento do rigor sobre a qua- ciplinas constantes nos currículos de graduação.
lidade dos testes psicológicos, a formação dos No entanto, como aponta Noronha e Reppold
psicólogos que atuam em avaliação psicológica (2010), esta reserva de mercado não garante que
ainda apresenta importantes lacunas. As mudan- a avaliação psicológica seja realizada com rigor
ças necessárias para a qualificação da prática da e competência.
avaliação psicológica dependem, sobretudo, da Sabe-se que a formação em avaliação psi-
qualidade da formação oferecida nos cursos de cológica está distante da sua condição ideal e
graduação em Psicologia. E quanto a este as- embora com importantes variações, as limita-
pecto, ainda há um longo e árduo caminho a ser ções estão presentes nos mais diversos cursos
percorrido. de graduação em Psicologia do Brasil. Dentre
Chama a atenção, por exemplo, o fato de os problemas encontrados nos currículos, cita-se
que a maioria das infrações éticas denuncia- a carga horária reduzida, a falta de qualificação
das ao CFP refere-se ao exercício equivocado dos professores e a visão fragmentada, limitada
da avaliação psicológica (Anache & Reppold, e preconceituosa em relação à avaliação psicoló-
2010). Muitas dessas infrações envolvem o uso gica (Fonseca, 2011; Noronha & Reppold, 2010;
de testes e técnicas psicológicas inadequadas ou Noronha, Oliveira, et al., 2002). Além disso, por
136 Borsa, J. C.

muitos anos o ensino da avaliação psicológica pera-se que, ao longo do processo de formação
ficou restrito ao ensino descontextualizado de seja possível desenvolver 27 competências bási-
testes, com ênfase na mera aplicação e correção cas, dentre elas: história da avaliação psicológi-
(Alchieri & Bandeira, 2002) e com bibliografia ca; legislação da avaliação psicológica; ética na
desatualizada (Noronha & Alchieri, 2004). Esses avaliação psicológica; conhecimento sobre psi-
problemas podem ser entendidos como resquí- cometria e fundamentos dos testes psicológicos;
cios de um período em que a carência de profis- conhecimento sobre a prática da avaliação psico-
sionais capacitados para a prática da avaliação lógica; impacto social da avaliação psicológica
psicológica, a falta de qualidade dos testes psico- para os indivíduos; noções sobre fundamentos e
lógicos e a proliferação de cursos de Psicologia aplicabilidade de diferentes instrumentos psico-
no Brasil era um problema ainda mais intenso e métricos e técnicas projetivas, entre outros (Nu-
frequente que nos dias de hoje (Hutz & Bandei- nes et al., 2012).
ra, 2003). Na segunda parte, os autores apresentam
Em 1997, o CFP promoveu um importante propostas de disciplinas e conteúdos progra-
fórum que teve por objetivo discutir diferentes máticos fundamentais na grade curricular dos
problemas pertinentes à avaliação psicológica, cursos de graduação em Psicologia: (a) Ava-
dentre eles a deficiência do ensino e da formação liação Psicológica I (história, legislação, ética,
na área. Salientou-se a necessidade de revisar, fundamentos da avaliação psicológica, etc.); (b)
por exemplo, a formação do corpo docente e do Avaliação Psicológica II (teoria dos testes psi-
conteúdo ensinado, de modo a proporcionar uma cométricos, aplicação, correção, interpretação
formação crítica e aprofundada do processo de dos testes cognitivos, etc.). (c) Avaliação Psi-
avaliação (CFP, 1997). Em função destas difi- cológica III (instrumentos de autorrelato, apli-
culdades, pesquisadores se reuniram em 2002 cação, correção, interpretação dos testes cogni-
durante o Simpósio da ANPEPP para discutir a tivos para avaliação afetiva e comportamental,
situação da avaliação psicológica no país e, em etc.); (d) Avaliação Psicológica IV (fundamen-
conjunto com as diretorias do IBAP e a ASBRo, tos e aplicação, correção, interpretação dos tes-
elaboraram o documento intitulado “Em Defesa tes projetivos e expressivos, etc.); (e) Avaliação
da Avaliação Psicológica” (Noronha, Ziviani, et Psicológica V (planejamento da avaliação psi-
al., 2002) no qual sugeriram conteúdos que de- cológica, técnicas de entrevista, elaboração de
veriam fazer parte dos currículos de formação do documentos, etc.) e (f) Estágio Supervisionado
psicólogo brasileiro na área de avaliação psico- em Avaliação Psicológica (aplicação prática dos
lógica, incluindo teoria das medidas, psicome- conhecimentos por meio da condução do proces-
tria, avaliação da inteligência e da personalida- so de avaliação psicológica; Nunes et al., 2012).
de, entre outros. Segundo os autores, tais conteúdos podem ser
Em 2012, pesquisadores da área publica- reorganizados de acordo com as especificidades
ram um documento, em parceria com o IBAP, de cada IES, respeitando as particularidades da
contendo as diretrizes para o ensino de avalia- grade curricular de cada curso.
ção psicológica (Nunes et al., 2012). O objetivo A terceira parte trata da estrutura do ensi-
do documento foi apresentar às Instituições de no da avaliação psicológica, incluindo aspectos
Ensino Superior (IES) uma proposta de conte- físicos (criação de locais específicos para arma-
údos desejáveis para as disciplinas de avaliação zenamento dos testes, criação de laboratórios de
psicológica ao longo do curso de graduação em avaliação psicológica e investimento em livros
Psicologia. O documento subdivide-se em qua- atualizados), métodos de ensino (incluindo au-
tro partes. A primeira delas refere-se às compe- las expositivas e dialogadas, atividades práticas
tências mínimas a serem alcançadas na formação entre outros), formação docente (formação com-
do aluno do curso de Psicologia na temática de patível, atualização contínua e experiência pro-
avaliação psicológica. Segundo os autores, es- fissional na área). Os autores também apresen-
Considerações sobre a Formação e a Prática em Avaliação Psicológica no Brasil. 137

tam algumas recomendações importantes como as IES (Bandeira, 2011). Como aponta Noronha
a necessidade de cuidado no armazenamento de (2002), os cinco anos do curso de graduação em
testes e outros materiais privativos do psicólogo Psicologia, não preparam o aluno para a atuação
e a oferta de estágios supervisionados em dife- em todas as áreas de conhecimento. É importan-
rentes contextos em que a avaliação psicológica te referir que, embora a avaliação psicológica
se insere (Nunes et al., 2012). Por fim, a quarta seja uma prática garantida a todo psicólogo, nem
parte do documento apresenta sugestões de refe- todos os psicólogos estão habilitados para tal. A
rências bibliográficas para as disciplinas na área escolha por uma prática em detrimento de ou-
da avaliação psicológica, incluindo livros atua- tras deve depender, sobretudo, das competências
lizados de autores nacionais e internacionais e profissionais (Noronha & Reppold, 2010). Neste
as principais resoluções do CFP. O documen- sentido, parece que a especialização se torna um
to está disponível na integra no site do IBAP e recurso necessário, já que a carga horária ofe-
pode ser acessado por meio do link http://www. recida nos cursos de Psicologia não é suficiente
ibapnet.org.br/docs/ensino_de_avaliacao_psi- para oferecer todo o conhecimento teórico e prá-
cologica.pdf. tico necessário para uma atuação adequada em
Utilizando documentos internacionais de avaliação psicológica.
referência na área, Noronha et al. (2010) apre- A especialização em avaliação psicológica
sentaram critérios a serem considerados no pro- vem sendo amplamente discutida na atualidade
cesso de aprendizagem da avaliação psicológica, (Bandeira, 2011; Noronha & Reppold, 2010;
incluindo conteúdo, infraestrutura, métodos de Primi, 2010). Os debates são intensos e giram em
ensino apropriados, possibilidades de avaliações torno de ser a avaliação psicológica uma ativida-
informatizadas, validade clínica dos instrumen- de específica ou um conhecimento básico perti-
tos psicológicos, entre outros. Do mesmo modo, nente ao psicólogo. Por um lado, argumenta-se
a proposta recente de Nunes et al. (2012) apre- que a avaliação psicológica não corresponde a
senta importantes aspectos teóricos, científicos e uma atividade profissional específica, mas um
técnicos fundamentais para o ensino da avalia- conhecimento que perpassa todas as atividades
ção psicológica nos cursos de graduação. desenvolvidas pelo psicólogo nas mais diversas
A preocupação com as diretrizes para a for- áreas (Primi, 2010). Por outro lado, argumen-
mação em avaliação psicológica, no entanto, ta-se que, dada a característica generalista dos
não é recente. Ainda na década de 90, algumas cursos de graduação em Psicologia, somente a
orientações básicas foram propostas por Jacque- especialização em avaliação psicológica é ca-
min (1995) no que se refere à qualidade teórica e paz de proporcionar aos psicólogos o aprofun-
técnica dos instrumentos ensinados nas discipli- damento teórico e prático necessário para a ade-
nas dos cursos de graduação. Do mesmo modo, quada atuação na área (Bandeira, 2011).
os diversos estudos conduzidos por Noronha e As discussões sobre a especialização em
colaboradores são importantes materiais de con- avaliação psicológica são atuais e necessitam
sulta sobre o ensino e a formação em avaliação de maior reflexão e aprofundamento por parte
psicológica no Brasil (Noronha, 2002; Noronha de instituições, profissionais e pesquisadores. É
& Alchieri, 2004; Noronha et al., 2010; Noro- necessário, por exemplo, discutir se o título de
nha, Oliveira, et al., 2002; Noronha & Reppold; especialista habilitaria o psicólogo para toda e
2010; Noronha, Ziviani, et al., 2002). qualquer avaliação ou se seria necessário exis-
Considerando a exigência de uma formação tir especialidades específicas para finalidades e
generalista (Decreto-lei nº 53.464, 1964) e levan- contextos específicos. Também é importante dis-
do em conta a duração dos cursos de graduação cutir sobre a possibilidade de haver certificações
em Psicologia, a oferta de um número consisten- para práticas específicas. Por exemplo, certifica-
te de disciplinas de avaliação psicológica nem ções para uso de escalas, para uso de testes pro-
sempre se apresenta como uma opção viável para jetivos, para avaliações clínicas, para avaliações
138 Borsa, J. C.

em contexto de seleção de pessoal, para perícia ria e prática (MEC, 2011) e essa realidade se
no contexto jurídico, etc. estende à prática em avaliação psicológica (No-
Entende-se que entre a condição ideal da ronha et al., 2010; Nunes et al., 2012). No ano de
formação e o que, de fato, vem sendo realizado, 2011 o MEC instituiu as Diretrizes Curriculares
há inúmeros caminhos possíveis para qualificar Nacionais para Cursos de Graduação em Psico-
o ensino da avaliação psicológica no Brasil, seja logia referentes tanto à formação básica quanto
no âmbito da graduação, seja no âmbito da pós- à ênfase da formação do psicólogo. O núcleo co-
-graduação. Especificamente, no que se refere à mum da formação em Psicologia estabelece uma
graduação, importantes propostas de melhorias base homogênea para a formação no Brasil e
vem sendo discutidas pelas instituições que atu- uma capacitação básica para lidar com os conteú-
am na área da avaliação psicológica, seja em ter- dos da Psicologia, enquanto campo de conheci-
mos de grade curricular, seja em termos de infra- mento e de atuação. O Art. 5º, por exemplo, pro-
estrutura e qualificação do corpo docente. Como põe que os cursos de graduação em Psicologia
bem define Noronha et al. (2010), as IES devem devem articular os conhecimentos, habilidades
proporcionar aos alunos o desenvolvimento de e competências quanto aos procedimentos para
habilidades e competências tanto para a atuação a investigação científica e a prática profissional,
profissional generalista quanto, especificamente, de forma a garantir tanto o domínio de instru-
para a realização da avaliação psicológica. mentos e estratégias de avaliação e de interven-
Um aspecto importante para a melhoria da ção quanto à competência para selecioná-los,
formação em avaliação psicológica é, sem dú- avaliá-los e adequá-los a problemas e contextos
vida, a prática profissional (Ministério da Edu- específicos de investigação e ação profissional.
cação [MEC], 2011). Entende-se a relevância O Art. 8º, por sua vez, dispõe sobre as competên-
da formação aplicada de modo a complementar cias do psicólogo e recomenda que a formação
os fundamentos teóricos que, obviamente, são deve garantir o domínio básico de conhecimen-
essenciais para a formação de psicólogos habili- tos psicológicos e a capacidade de utilizá-los
tados em avaliação psicológica. O contato com em diferentes contextos de aplicação. Dentre as
as diferentes técnicas e o treinamento na aplica- competências são elencadas a capacidade de (a)
ção, no levantamento e na correção dos testes escolher e utilizar instrumentos e procedimen-
psicológicos é essencial para a qualidade da for- tos de coleta de dados em Psicologia tendo em
mação. Sobretudo, o ensino de avaliação psico- vista a sua pertinência; (b) avaliar fenômenos
lógica não deve se resumir ao ensino de testes e humanos de ordem cognitiva, comportamental
técnicas isoladas e deve proporcionar aos estu- e afetiva, em diferentes contextos; (c) realizar
dantes a integração entre teoria e prática, permi- diagnóstico e avaliação de processos psicológi-
tindo o desenvolvimento de competências para cos de indivíduos, de grupos e de organizações;
uma atuação autônoma. História e fundamentos (d) saber buscar e usar o conhecimento científico
da testagem psicológica e legislação, aspectos necessário à atuação profissional, entre outros.
éticos e consequências sociais da avaliação psi- Ainda quanto à relevância da formação prá-
cológica são alguns dos conteúdos obrigatórios tica nos cursos de graduação em Psicologia, o
que deveriam estar presentes em todos os currí- Art. 19 dispõe que o planejamento acadêmico
culos dos cursos de Psicologia (Bandeira, 2011; deve assegurar, em termos de carga horária e de
Nunes et al., 2012). planos de estudos, o envolvimento do aluno em
atividades individuais e de equipe que incluam
A Prática na Formação exercícios em laboratórios, práticas didáticas
em Avaliação Psicológica como parte de disciplinas ou integradas a outras
atividades acadêmicas e aplicação e avaliação
A formação em Psicologia tem como pers- de estratégias, técnicas, recursos e instrumentos
pectiva a necessidade da aproximação entre teo- psicológicos.
Considerações sobre a Formação e a Prática em Avaliação Psicológica no Brasil. 139

As diretrizes do MEC (2011) não se refe- ca clínica é a criação de clínicas-escola espe-


rem, especificamente, à formação em avaliação cializadas. As clínicas-escola de Psicologia são
psicológica, de modo que foi apresentado aqui serviços obrigatórios, segundo a Lei nº 4.119
um recorte das disposições que parecem estar (Decreto-lei nº 53.464, 1964), que dispõe sobre
diretamente relacionadas com a formação nes- os cursos de formação e regulamenta a profis-
ta área. Entende-se que a prática é um aspecto são de psicólogo no Brasil. Em linhas gerais,
primordial da formação em Psicologia como um o objetivo das clínicas-escola é possibilitar um
todo e não deve ser diferente no que se refere à espaço adequado à formação profissionalizante,
avaliação psicológica. assim como consolidar e articular as competên-
Nunes et al. (2012) apontam para a impor- cias centrais desenvolvidas nas graduações em
tância do uso de diferentes estratégias e técnicas Psicologia (Borsa, Oliveira, Yates, & Bandeira,
de ensino, como forma de desenvolver dife- 2013). As clínicas-escola devem oferecer atendi-
rentes habilidades. Citam, por exemplo, a rea- mento gratuito ou a baixo custo para a comuni-
lização de atividades práticas que utilizem os dade, constituindo-se em um local onde o aluno
conceitos teóricos aprendidos em sala de aula, a recebe treinamento e orientação com o objetivo
apresentação de estudos de caso, as oficinas de de capacitá-lo para a prática e a reflexão do exer-
elaboração de documentos psicológicos, a rea- cício profissional (Borsa, Oliveira, et al., 2013).
lização de pesquisas científicas sobre avaliação As clínicas-escola cumprem, assim, o complexo
psicológica e a oferta de estágios supervisiona- objetivo de atender da forma mais eficaz possí-
dos. Do mesmo modo, salientam que o contato vel à comunidade e, ao mesmo tempo, capacitar
com os instrumentos e o treinamento na aplica- o aluno de forma ética, técnica e teórica para o
ção, no levantamento e na correção dos testes exercício da Psicologia (Decreto-lei nº 53.464,
psicológicos é essencial para a qualidade da 1964; Campezatto & Nunes, 2007). Entende-se
formação do psicólogo e deve permitir o desen- que a formação do psicólogo deve ser consoan-
volvimento de competências para uma atuação te com a realidade do contexto social em que o
autônoma e qualificada. Para tanto, é essencial aluno está inserido e, neste sentido, os cursos
que o curso de graduação em Psicologia conte de Psicologia devem oferecer oportunidades de
com uma estrutura física minimamente adequa- atuação junto às comunidades, qualificando as
da para o bom desenvolvimento da prática da estratégias profissionalizantes do currículo (Bo-
avaliação psicológica. eckel et al., 2010).
Experiências exitosas são encorajadoras e No Brasil, as clínicas-escolas de Psicologia
apontam para soluções aos velhos problemas oferecem diferentes modalidades de atendimen-
pertinentes à formação em avaliação psicoló- to (Boeckel et al., 2010), contudo, o que se pode
gica. Reppold e Serafini (2010) apresentam, observar é que nem todos os locais oferecem a
por exemplo, a experiência de implantação do prática da avaliação psicológica, fator limitante
curso de Psicologia da Universidade Federal de para a formação dos alunos e preocupante no que
Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), se refere à crescente demanda por estes serviços.
na capital do Rio Grande do Sul, o qual conta Entende-se que a prática em avaliação psicoló-
com sete disciplinas obrigatórias de psicome- gica nas clínicas escolas pode proporcionar o
tria/avaliação psicológica, além de disciplinas aprendizado mais aprofundado da complexidade
eletivas na área. Outro diferencial do curso é a do processo (Borsa, Oliveira, et al., 2013). Além
proposta de relacionar teoria e prática por meio disso, um serviço de avaliação psicológica pode
de atividades multidisciplinares de avaliação proporcionar diagnósticos mais apurados, otimi-
desenvolvidas pelos alunos em um hospital psi- zando os encaminhamentos a serem realizados
quiátrico. para os diferentes serviços de saúde, como a psi-
Um importante meio de proporcionar a coterapia, psiquiatria, neurologia, psicopedago-
prática supervisionada da avaliação psicológi- gia, fonoaudiologia, terapia ocupacional, entre
140 Borsa, J. C.

outros, e reduzindo as taxas de não-aderência e ção psicológica nos cursos de graduação em Psi-
de abandono de psicoterapia (Borsa, 2014). cologia no Brasil. A avaliação psicológica é uma
Um exemplo de clínica-escola especializada prática importante da Psicologia e configura-se
em avaliação psicológica é o Centro de Avalia- como uma área em plena expansão. Além disso,
ção Psicológica, da Universidade Federal do Rio seu exercício é um direito e uma prática privati-
Grande do Sul (UFRGS) (Borsa, Oliveira, et al., va do psicólogo e, neste sentido, a qualificação
2013). Trata-se de um serviço especializado na técnica dos profissionais que atuam na área é
realização de avaliações psicológicas e neurop- primordial. Para o exercício adequado da ava-
sicológicas e que tem como finalidade oferecer liação psicológica, é necessário a compreensão
atividades práticas aos alunos de graduação, de dos seus objetivos e o conhecimento do contexto
especialização, de extensão universitária e de em que os indivíduos estão inseridos, para que se
mestrado e doutorado do Instituto de Psicologia possa realizar a condução adequada do processo
da UFRGS. O objetivo da clínica é promover e manejo adequado das técnicas e instrumentos
atividades de ensino, pesquisa e extensão nas de acordo com a especificidade de cada demanda
diferentes áreas concernentes à avaliação psico- (CFP, 2010, 2013b).
lógica, quais sejam: avaliação cognitiva, afetiva Mesmo com os avanços ocorridos na área, a
e neuropsicológica de crianças, adolescentes, avaliação psicológica ainda sofre com a falta de
adultos e idosos. Especificamente, o serviço profissionais qualificados do ponto de vista téc-
visa a oferecer estágios curriculares e extracur- nico e teórico. Do mesmo modo, não é incomum
riculares, fomentar a pesquisa nas suas áreas de os problemas éticos referentes ao mau uso dos
abrangência, atender as demandas de avaliação testes psicológicos e a má condução do processo
psicológica da comunidade de Porto Alegre e re- da avaliação como um todo. Tais problemas po-
gião metropolitana e responder às necessidades deriam ser sanados ou, ao menos, reduzidos se a
específicas de avaliação, especialmente aquelas formação em avaliação psicológica fosse ofere-
demandadas por órgãos e agências municipais, cida de forma qualificada. Sabe-se, no entanto,
estaduais e federais (Borsa, Oliveira, et al., 2013; que a maioria dos cursos de graduação em Psi-
Borsa, Segabinazi, Sternert, Yates, & Bandeira, cologia está muito longe de alcançar os requisi-
2013). tos mínimos para adequado ensino em avaliação
Além do atendimento à comunidade e da psicológica.
formação dos alunos, a clínica-escola pode Nos últimos anos têm sido constantes os
atuar no sentido de identificar as característi- debates sobre a formação em avaliação psico-
cas da população atendida e conhecer a pre- lógica. As diretrizes curriculares dos cursos de
valência dos problemas mais comuns naquela graduação precisam garantir que as competên-
região específica. Estas informações podem cias em avaliação psicológica sejam, de fato,
contribuir para o fomento de políticas públicas desenvolvidas. Neste sentido, é importante que
em saúde mental e para gerar serviços efetivos as IES invistam na qualidade da formação já nos
que atendam as demandas reais da comunida- cursos de graduação, de modo a garantir o co-
de. Reitera-se a relevância da formação práti- nhecimento mínimo necessário para a prática da
ca, de modo a complementar os fundamentos avaliação psicológica. Do mesmo modo, é ne-
teóricos que, obviamente, são essenciais para a cessário que as IES e demais instituições possam
formação de psicólogos habilitados em avalia- oferecer cursos de especialização, treinamentos
ção psicológica. e cursos de extensão para profissionais que de-
sejam buscar o aprimoramento e a atualização
Considerações Finais dos aspectos teóricos e práticos concernentes à
avaliação psicológica.
Este artigo teve por objetivo apresentar re- Por fim, reitera-se a relevância do conhe-
flexões sobre a prática e a formação em avalia- cimento prático, de modo a complementar os
Considerações sobre a Formação e a Prática em Avaliação Psicológica no Brasil. 141

fundamentos teóricos que, obviamente, são es- gica – Textos geradores (pp. 129-132). Brasília,
senciais para a formação de psicólogos devida- DF: Conselho Federal de Psicologia.
mente capacitados para atuação em avaliação Boeckel, M. G., Krug, J. S., Lahm, C. R., Ritter, F.,
psicológica (Nunes et al., 2012). Entende-se Fontoura, L. O., & Sohne, L. C. (2010). O pa-
que a oferta de estágios nas clínicas-escolas pel do serviço-escola na consolidação do projeto
de Psicologia pode proporcionar aos alunos de pedagógico do curso de Psicologia. Psicologia,
Ensino & Formação, 1(1), 41-52.
graduação uma formação completa e qualifica-
da na área, permitindo a integração entre teo- Borsa, J. C. (2014, abr.). Avaliação dos problemas
ria e prática. Como aponta Noronha e Reppold de comportamentos na infância: Exemplos prá-
(2010), somente assim os psicólogos poderão ticos da clínica à pesquisa. In A. E. Villemor-
-Amaral (Coord.), Psicopatologia, saúde mental
sair das universidades preparados para con-
e avaliação psicológica. Simpósio conduzido
duzir avaliações psicológicas adequadas. Se a
em VII Congresso da Associação Brasileira de
formação em avaliação psicológica for, de fato, Rorschach e Métodos Projetivos, Ribeirão Preto,
valorizada ao longo do curso de graduação em SP, Brasil.
Psicologia, será possível qualificar cada vez
Borsa, J. C., Oliveira, S. E. S., Yates, D. B., & Ban-
mais a área, diminuindo o preconceito e os pro-
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blemas ainda presentes nela.
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