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- Fracasso escolar.
- Culpa do aluno.
- Nota X aprendizagem.
- Discriminações.
- Medicalização.
- Pertencimento.
Pensar o insucesso escolar como produzido unicamente pelo sujeito ou como sendo
consequência do contexto sociocultural em que ele se insere, atribuindo-lhe, acriticamente, a
responsabilidade em relação a um fenômeno psicossocial de natureza complexa (fracasso
escolar), significa subverte a ordem das coisas, recorrendo a subterfúgios ideológicos e
reducionistas para legitimar as desigualdades no âmbito social.
Embora tenha sido identificada a existência de outras resenhas acerca do livro, cabe salientar
que estas são majoritariamente trabalhos de graduandos, realizados em disciplinas durante a
graduação, não sendo publicadas em periódicos. Ademais, a resenha que tem sido
reconhecidamente apreciada, uma vez que foi lançada em revista científica (Revista Brasileira
de Estudos Pedagógicos, nº 72, v. 171, pp. 215-217, maio/ago. 1991) data da década de 90
(referente à 1ª edição do livro), cuja autora é Maria das Graças de Castro Senna, que na
publicação aparece vinculada à Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Não obstante,
convémressaltar que o livro, face à grande aceitação no meio acadêmico, gerou novas edições.
A versão vigente (4ª edição) apresenta um dossiê "25 anos depois", assim, além de fazer o
percurso de análise crítica dos capítulos da obra, tem como novidade uma pesquisa de campo
que mostra a vida presente das quatros crianças acompanhadas por Maria Helena Souza
Patto, no estudo original. Além deste capítulo, que gera curiosidade ao leitor em relação ao
rumo de vida desses personagens, é apresentado outro que versa sobre a trajetória desse
clássico, bem como um posfácio da autora. Assim, considerando trata-se de um manuscrito
revisado e ampliado, pensa-se ser relevante a realização dessa resenha que objetiva recolocar
novamente o publico leitor em contato com o livro, mais de vinte cinco anos depois de seu
primeiro lançamento. Feito esse preambulo, nas linhas a seguir, procura-se sintetizar os
principais pontos da obra, apresentando-se ao final uma breve consideração.
No referido manuscrito, Maria Helena Souza Patto apresenta ao público sua pesquisa sobre o
fracasso escolar das crianças pobres de um bairro periférico na cidade de São Paulo.
Insatisfeita com os altos índices de reprovação e evasão escolar na escola pública de primeiro
grau, recorrente ao longo dos anos, inclusive no início da década de 80, e com as extensas
explicações parciais, enviesadas por preconceitos e estereótipos, fornecidas pela literatura na
tentativa de justificar as causas do fracasso escolar nesse âmbito educacional, Patto decide
estudar com mais afinco o fenômeno, indo às suas raízes, oferecendo uma forma alternativa de
compreensão da problemática.
A obra se estrutura em duas partes. Na primeira, a autora realiza uma revisão crítica da
literatura sobre a temática, identificando as concepções e discursos teóricos produzidos para
explicar as causas do fracasso escolar em escolares do ensino público do primeiro grau. Na
outra parte (segunda), Patto se dedica à análise dos dados coletados na pesquisa de campo,
obtidos através de observações e entrevistas com diferentes atores, nos espaços da escola,
nas ruas do bairro e residências das famílias acompanhadas durante o estudo.
Patto discute como a reprodução das teorias e/ou ideias europeias na descrição das
características dos sujeitos ganha espaço entre os escritores brasileiros, servindo mais para
naturalizar as desigualdades sociais, do que para elucidar o problema do fracasso escolar.
Uma destas ideologias, compatibilizada pelo meio intelectual do país, foi a Teoria das Raças,
na qual as desigualdades sociais são justificadas a partir de termos raciais.
Tendo isso em conta, os povos miscigenados são identificados como seres incapazes. Essa
tese, como mostra a autora, repercute no Brasil, ganhando contornos que chegam a
ultrapassar o limite da racionalidade. Na confluência do pessimismo, Sílvio Romero, um dos
representativos intelectuais da época, absorvido por essa crença, chega a propor o
branqueamento gradual da população através de sucessivas migrações, o que resultaria, na
sua visão, no progresso do país.
Com o intuito de contribuir de forma crítica para o entendimento do fracasso escolar, Patto
adota como pressupostos epistemológicos: o materialismo histórico dialético (Carl Marx) e o
conceito sociológico de vida cotidiana (AgnesHeller). Partindo destes aportes teóricos, a autora
demonstra como as relações de poder, cristalizadas no cotidiano dos espaços escolares e
sociais, influenciavam as práticas pedagógicas. É por esse percurso que a ela consegue
desconstruir os mitos, preconceitos e ideologias cientificamente legitimadas que enviesam o
processo educativo, culpabilizando o sujeito e a sua história de vida pelo fracasso escolar.
Sendo assim, aborda o fenômeno como uma construção histórica e social.
Concluída a primeira tarefa (revisão da literatura), Patto vai a campo, "permanecemos numa
escola pública de primeiro grau e num bairro da periferia da cidade de São Paulo, onde foram
realizadas observações em vários contextos e entrevistas formais e informais com todos os
envolvidos no processo educativo [...]" (Patto, 2015, p. 29).
As violências simbólicas, físicas e verbais eram constantes nas salas de aulas, como constatou
a pesquisadora. Tendo como fundamento os mitos difundidos por pseudoteorias, as
professoras, arbitrariamente, reproduziam a violência,classificando, discriminando e
patologizando as crianças. O hábito de falar mal dos alunos, focalizando apenas as
vulnerabilidades, esquivando-se das potencialidades inerentes a cada indivíduo, refletia, de
acordo com Patto, o grau de alienação das docentes.
Exposto os principais pontos presentes nas duas partes que compõe a obra no formato original,
em seguida apresenta-se uma síntese dos textos extras que aparecem na quarta edição do
livro, agrupados na parte "25 anos depois".
No texto de abertura, José Sérgio F. de Carvalho reflete sobre A produção do fracasso escolar:
a trajetória de um clássico. Nele, o autor mostra como a obra de Maria Helena Souza Patto foi
se consolidando nos diversos espaços sociais, atingindo e mantendo ao longo dos anos um
reconhecimento, que a tornou obra obrigatória em cursos de graduação, pós-graduação, etc.,
transformando-se em um trabalho de grande popularidade no meio acadêmico. O que
explicaria tal feito? De acordo com Carvalho, uma hipótese plausível é a de que o livro não é
meramente mais um manuscrito lançado em meio a um mercado volátil de ideias do campo da
educação, mas um clássico. Ademais, o autor ressalta o aspecto de ruptura
teóricometodológica e o acesso à cotidianidade das relações na instituição escolar e seu
entorno social, realizados por Patto, como fatores que contribuíram para longevidade e alcance
do livro.
Por meio de pesquisa de campo realizada entre maio de 2007 e fevereiro de 2010, foi possível
a localização de Ângela (que ainda morava na mesma residência por ocasião do primeiro
estudo na década de 80) e Nailton. O rumo de suas vidas transparece as marcas de um
processo de escolarização malsucedido. Ângela (à época da pesquisa), casada, mãe de dois
filos, ainda persistia na busca do sonho de, segundo ela, "ser uma mulher inteligente", fazendo
menção à busca por uma formação superior. Somente em 2004, com quase trinta anos de
idade, entre interrupções e continuidade, conseguiu concluir o ensino médio. Nailton seguiu a
profissão do pai: pedreiro. E como ele mesmo destaca "Ah, depois que tacha, já era",
sinalizando, de acordo com as autoras, o quanto os estereótipos e rótulos afetam o sujeito,
repercutindo no abandono da escola.
Por fim (posfácio), Maria Helena Souza Patto faz alguns apontamentos referentes ao estudo
sobre o fracasso escolar, das suas impressões referentes ao local da pesquisa, das influencias
teóricas que foram moldando sua visão sobre o fenômeno, das distorções presentes na
literatura, da própria conjuntura histórica e dos desdobramentos e repercussões no campo da
educação ao logo dos anos.
Nesse manuscrito, Patto promove uma ruptura na análise histórica das causas do fracasso
escolar. Indo às suas raízes, traz à tona diversos fatores ocultados pelas Teorias ao longo dos
anos, tratando do fracasso escolar como uma produção história e social. A partir desse livro é
possível ter um panorama mais detalhado a respeito desse fenômeno, uma vez que autora não
se limita a uma determinada visão de mundo, ou mesmo ao Zeitgeist de uma época. Trata-se
de uma obra indispensável àqueles que pretendem estudar a psicologia escolar educacional.
Deste modo, recomenda-se a leitura desse livro por estudantes, professores e pesquisadores
da psicologia ou áreas afins.
Resumo
As queixas escolares estão entre os principais motivos de encaminhamento de crianças
para atendimento especializado. Esta pesquisa teve por objetivos caracterizar o perfil da
demanda encaminhada por queixa escolar aos serviços públicos de saúde de um
município do interior paulista no período 2010-2011, bem como identificar e analisar a
conduta adotada pelos profissionais da Psicologia no atendimento destinado a ela.
Unidades Básicas de Saúde e o Centro Integrado de Atenção Psicossocial – CIAPS –
foram os locais designados para a coleta dos dados por serem responsáveis pelo
atendimento à população infantil. O estudo contemplou análise documental dos registros
sobre a demanda encaminhada e entrevista semiestruturada com os psicólogos que
trabalham nos respectivos espaços. Os resultados confirmaram o que aponta a literatura
na área da Psicologia Escolar com destaque para o encaminhamento de crianças do sexo
masculino com idades entre sete e dez anos que cursam o início do primeiro ciclo do
ensino fundamental. Com relação às concepções e práticas profissionais, constatou-se o
predomínio do modelo clínico de atenção e certa dificuldade na efetivação de novas
formas de atuar. Apesar dos avanços teórico-metodológicos propostos em novas
concepções sobre as queixas escolares, estes ainda não se fazem suficientemente
presentes na prática desses profissionais.
Introdução
Dificuldades de aprendizagem e/ou problemas de comportamento relacionados à escola
são denominadas queixas escolares e estão entre os principais motivos de
encaminhamento de crianças para atendimento nos sistemas públicos de saúde.
Trabalhos produzidos durante a última década, a respeito do atendimento psicológico de
crianças na rede pública e em clínicas-escola em diferentes regiões do país, sugerem que
uma parcela significativa das queixas apresentadas aos psicólogos nas Unidades Básicas
de Saúde se refere à escola. Daí a necessidade de problematizar a maneira como os
psicólogos analisam os conhecimentos da área da educação para a compreensão e o
atendimento da queixa escolar, bem como identificar os instrumentos e procedimentos
teórico-práticos da Psicologia que eles dispõem para acolher e trabalhar com essa
demanda.
Contudo, a partir do final da década de 1970 e início dos anos 1980, tem início um
processo de ruptura combinado a um movimento de crítica à Psicologia tradicional na
explicação do fracasso escolar. O eixo organizador desse movimento são as análises e
revisão crítica das relações entre Psicologia e Educação, as quais, ao explicitarem os
funcionamentos escolares produtores e/ou intensificadores das dificuldades de
aprendizagem das crianças, desvelam os mecanismos ideológicos presentes no interior da
escola que atribui especialmente às crianças pobres e provenientes da rede pública de
educação a culpa pela não-aprendizagem, evasão e fracasso, apresentando a escola
como vítima de uma clientela inadequada e despreparada.
Tais estudos revelam que mais de 70% das queixas apresentadas aos psicólogos nas
Unidades Básicas de Saúde – UBSs – abarcam questões relacionadas à escola, de ordem
pedagógica e/ou comportamental. Esse quadro mostra ainda que, apesar do crescente
número de pesquisas nas áreas da Psicologia e da Educação que reafirmam a importância
de identificar questões que extrapolam a dinâmica individual e familiar das crianças
encaminhadas, persiste uma tendência, tanto por parte dos profissionais da educação
quanto da saúde, de tratar os problemas escolares como de origem exclusivamente
biológica ou psicológica.
Método
A pesquisa aconteceu em um município localizado a 433 quilômetros da capital do estado
de São Paulo. No projeto inicial, optou-se por coletar os dados nas sete Unidades Básicas
de Saúde localizadas em diferentes setores da cidade e no Centro Integrado de Atenção
Psicossocial – CIAPS – por serem responsáveis pelo atendimento à população infantil. A
decisão de estender a pesquisa para este centro se justificou pelo fato deste contar com
uma equipe multiprofissional que inclui a presença do psicólogo e atender a demanda
infantil encaminhada, dentre outras queixas, por dificuldades de aprendizagem.
O estudo contemplou duas etapas: análise documental dos registros sobre a demanda
encaminhada – prontuários e/ou fichas de encaminhamento – e entrevista semidirigida
com os psicólogos que trabalhavam nas Unidades Básicas de Saúde e no Centro
Integrado de Atenção Psicossocial.
A pesquisa previa a coleta dos dados somente nos equipamentos de saúde em que o
atendimento à demanda infantil tivesse acontecido no período 2010-2011. O percurso
metodológico determinou a exclusão de algumas UBSs por não ofertarem mais
atendimento à população infantil, por dificuldades de acesso aos prontuários e registros
dessa demanda e pela recusa de uma profissional em participar do estudo.
Assim, a coleta dos dados por meio da análise documental ocorreu, apenas, no Centro
Integrado de Atenção Psicossocial, equipamento social responsável pelo atendimento de
crianças encaminhadas por diferentes setores do município onde foi possível acessar os
registros dentro do período estipulado para a pesquisa. A exploração das fontes
documentais pretendeu buscar dados de caracterização da população, como: sexo, faixa
etária predominante, segmento e ano de ensino (Educação Infantil, 1º ou 2º Ciclo do
Ensino Fundamental), bairro onde residem, escola que frequentam, as principais
dificuldades enfrentadas, o motivo do encaminhamento, o agente encaminhador, a
descrição detalhada da queixa e outras informações que fossem relevantes para
identificação do perfil da demanda.
Com relação à segunda parte da pesquisa, que previa entrevistas com os profissionais da
Psicologia, decidiu-se pela sua realização mesmo entre aqueles profissionais que
atualmente não atendem mais demanda infantil, mas que o fizeram até os anos de 2008-
2009, e com os demais que ainda realizam esse atendimento, totalizando uma amostra de
quatro psicólogos.
Vale destacar que nossa decisão de manter a amostra mesmo entre aqueles que
atualmente não atendem mais encaminhamento infantil reside no fato de eles terem tido,
durante certo período de tempo, contato com a população de crianças que chegavam às
unidades com queixa escolar. Os demais psicólogos da saúde foram contatados para
verificação sobre sua disponibilidade em participar da pesquisa, desde que tivessem
histórico de experiência profissional com essa demanda e ficou constatado que a amostra
selecionada era a mais representativa desse perfil.
Resultados
Foram avaliados os registros em prontuários referentes ao período 2010-2011 de crianças
e adolescentes com idades entre dois e dezesseis anos encaminhadas por queixa escolar,
totalizando 52 sujeitos. Analisaram-se as seguintes variáveis: idade, sexo, segmento de
ensino, origem do encaminhamento e tipo de queixa.
Há outros estudos (Cabral & Sawaia, 2001; Marçal & Silva, 2006; Nakamura et al.,
2008; Santos & Alonso, 2004; Scortegagna & Levandowski, 2004) confirmando o fato de
os meninos serem os mais encaminhados. De acordo com Souza (2002), existe uma
diferença quanto ao motivo do encaminhamento quando comparamos meninos e meninas.
Os encaminhamentos por “atitudes consideradas indesejáveis” estão mais presentes na
amostra masculina do que na feminina numa frequência de 18% contra 20%, já os
meninos são menos encaminhados por dificuldades no processo de aprendizagem.
Reitera que um dos motivos para o maior encaminhamento do sexo masculino tem relação
com a diferença de perfis comportamentais entre meninos e meninas e com o tipo de
conduta exigida pela escola, a qual parece se antecipar na indicação de acompanhamento
profissional no caso da manifestação de comportamentos indesejáveis visando assegurar
um padrão de obediência evitando, assim, o risco da delinquência.
Vale ressaltar que atualmente convivemos com mecanismos eficientes empregados para
dissimular os processos de produção do fracasso e exclusão educacional justificando que
tanto as dificuldades de aprendizagens como os transtornos de comportamentos podem
ser explicados por meio de disfunções neurológicas. Portanto, as tentativas de lidar com
casos de fracasso escolar como se eles fossem uma patologia são exemplos de
medicalização, ou seja, um recurso utilizado para transformar questões de origem
eminentemente social e política em demandas médicas (Collares & Moysés, 1996).
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Tabela 2
Descrição dos motivos do encaminhamento ligados ao comportamento.
No item que remete às explicações sobre o que seja uma dificuldade de aprendizagem no
contexto escolar, a maioria das respostas foi explanada por:dificuldades de memorização,
dificuldades de concentração, dificuldades de atenção, hiperatividade, decorrentes da
relação professor-aluno, decorrentes de fatores neurológicos, dificuldades de aprender,
questão emocional, questões familiares. Apenas uma profissional mostrou certo cuidado
na análise e interpretação do que seja uma dificuldade de aprendizagem:
Eu não tenho, procuro não ter uma visão pré-estabelecida, eu procuro contextualizar a
partir da realidade de cada criança, você corre o risco de ter uma visão unilateral e perder
a verdadeira dimensão de cada queixa, eu procuro não ter uma prévia avaliação,
concepção sobre a dificuldade de aprendizagem. Aqui, na minha prática, cada caso que a
gente recebe decorre de uma dada realidade, e essa condição individual do caso que me
faz trabalhar de um determinado jeito; eu não vou definir uma concepção única porque a
questão da aprendizagem pode estar ligada a questões familiares, à própria falência do
processo de ensino-aprendizagem; não dá para você previamente definir que aquela
questão de aprendizagem está ligada a esse aspecto ou àquele aspecto. Tem que olhar o
caso de maneira bastante ampla para poder avaliar e definir, ter um diagnóstico de quais
fatores estão interferindo na aprendizagem daquela criança.
Eu tenho uma tendência a olhar para o problema de comportamento como uma dificuldade
de motivação, eu acho que a maioria das crianças que apresentam problemas de
comportamento. A escola, às vezes, se distancia muito das necessidades da criança e
esse distanciamento faz com que as crianças não vejam sentido naquilo que está sendo
transmitido, e isso faz com que surjam os problemas de comportamento.
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Tabela 3
Frequência e porcentagem das causas atribuídas pelos psicólogos às queixas escolares.
[…] acho que a formação do professor tem que estar voltada a esse aluno,
entendeu? [...] porque eu sou uma professora, eu tenho que acreditar no meu potencial,
eu vejo assim, eu sempre achei que você tem que acreditar no seu potencial, e você ser a
professora e ensinar, professor não é aquele que todo mundo só tira nota A, não é,
professor é aquele que sabe entender um ao outro, entender o que está acontecendo, às
vezes, aquele aluno não está conseguindo aprender, mas o que será que está
acontecendo? [...] Eu vejo a criança que às vezes está com dificuldade e a professora fica
com medo, aí eu não consigo dar conta disso, aí, quando chega aqui, chega um caso
instalado, uma coisa complicada, que poderia ser resolvida antes, de uma outra forma
mas é isso que falta, falta profissionais na educação[...] são pequenas coisas que eu acho
que tem que ser antes do encaminhamento.É assim, a gente pensa que a escola talvez
não esteja preparada pra esse aluno, porque a gente sabe que a escola tem um padrão
pronto pro aluno que se adapta, pro aluno que vai, presta atenção, que está dentro das
normas. A escola, me parece, que ela não tem uma coisa mais individualizada [...] é que
me parece assim, que esse aluno ele não é olhado de um jeito diferente, vamos ajudar
esse aluno a pensar, vamos ver o que vem dele, fazê-lo participar, eu acho que os
professores de certa maneira eles são desmotivados. Eu penso que a questão é muito
mais profunda, primeiro a insatisfação do professor, primeiro a formação do professor e
antes disso ainda, a escolha que o professor faz de fazer Pedagogia, por quê? O que leva
ele a fazer Pedagogia? Depois a forma como ele recebe em termos de reconhecimento
salarial [...] e tem a coisa do compromisso sabe... se você está com um aluno na sala de
aula, a dificuldade que aparece na sala de aula, é minha responsabilidade! Então eu vou
reconhecer, o que eu vou fazer com o aluno que está desatento, com o aluno que não tem
interesse, sabe... Eu preciso conhecer, eu preciso me aproximar mais, eu preciso
conversar, colocar pra fazer atividade na lousa porque assim ele vai se sentir mais
valorizado, mais perto de mim, sabe, eu vou ouvir o que está acontecendo com ele, tem
uma dificuldade? Será que dá pra fazer uma tarefa com ele que corresponda ao que ele
vai poder fazer ou eu tenho que enquadrar, aquilo que está no padrão, sabe? São essas
questões, assim, que eu penso que a escola podia repensar, aliás, pensar no aluno antes
de encaminhar. A escola tem dificuldades em lidar com aquele aluno que foge às regras
estabelecidas pela escola: a regra é ir lá, se comportar e aprender tudo o que é passado,
não dar trabalho; se a criança tem alguma necessidade que foge a essas regras
previamente determinadas, eu acho que a escola falha no momento de diagnosticar isso e
propor atividades que ajudem a criança a superar esse momento de dificuldade, o
problema da escola é não conseguir lidar com aquele que foge à regra, que foge à
normalidade e aí se torna um problema, é aí, é quando a criança é encaminhada, é
sugerido para um atendimento psicológico, mesmo no atendimento pedagógico, acho que
decorre de uma dificuldade da escola em lidar com as diferenças, sempre que não segue
o padrão – no próprio momento escolar – é porque alguma coisa está errada e aí não é o
processo pedagógico que não está dando conta das necessidades das crianças, é a
criança que tem alguma dificuldade.
Quanto aos modos como esses profissionais realizam seu trabalho no atendimento às
queixas escolares, o presente estudo subdividiu as questões entre avaliação e
atendimento propriamente dito. As Tabelas 4 e 5 demonstram os modelos de atenção mais
encontrados.
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Tabela 4
Frequência e porcentagem das práticas de avaliação realizadas pelos psicólogos.
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Tabela 5
Frequência e porcentagem das práticas de atendimento realizadas pelos psicólogos.
[…] é que os encaminhamentos vêm pela escola, então quem informa é a professora, eu
não tomo aquele questionário como tudo Aquele questionário, pra mim, é só pra eu
entender o que está acontecendo, o que eu vejo como questão, o que eu vejo na criança,
meu olhar é pra criança e pra família, aquilo lá ajuda um pouco pra entender como ta a
situação na escola.
Com relação à conduta adotada pelos psicólogos na área da saúde, o trabalho de Bueno
et al. (2001 apud Braga & Moraes, 2007) aponta o predomínio da orientação familiar, o
psicodiagnóstico e as terapias individuais e em grupo. Braga e Morais (2007) também
referem que a orientação familiar foi a conduta que mais se destacou no conjunto
analisado e, nos casos de queixa escolar, a prática mais freqüente foi a terapia individual.
Apenas uma profissional menciona o fato de quase não ficar com a criança em
atendimento individual, apontando um modelo de trabalho que inclui ir até a escola,
acompanhar o trabalho pedagógico em sala de aula, fazer contatos com a professora e
promover um intercâmbio dessas observações com aspectos identificados na interlocução
com as famílias.
Na maioria, é orientação familiar ou orientação na escola, são poucos os casos que eu fico
com a criança... Eu trabalho orientação com os pais, com a família e trabalho com
orientação na escola, visita escolar, eu observo a sala de aula, né... A partir da
observação da sala de aula, eu faço contato com a professora, às vezes, dou orientação
para o professor, volto com a família, faço essas coisas...
Há um teor de insatisfação presente nas falas das profissionais com relação aos
resultados do trabalho de atenção à queixa escolar, evidenciado, principalmente, pela
elevada expectativa que se construiu acerca do trabalho do psicólogo na solução
independente dos problemas advindos da escola. Elas demonstram sentir necessidade de
um trabalho coletivo, de uma (re) aproximação com profissionais da educação
recuperando momentos da história do município em que isso acontecia; queixam-se do
distanciamento e argumentam a necessidade de inovar construindo outros modelos de
atenção que viabilize parcerias, desde o trabalho com as crianças em grupos e oficinas até
a interlocução e discussão de casos com outros profissionais.
Contudo, ainda se faz presente na maioria das respostas a concepção de que possíveis
dificuldades que originam problemas escolares estão centradas nas crianças ou em suas
famílias, sejam elas vinculadas a problemas com a autoestima ou ao envolvimento e
participação familiar no processo educacional e terapêutico.
Eu tenho pouca formação, por exemplo, em trabalho pedagógico, por exemplo, na minha
época lá de formação. Eu acho que a Psicologia mudou muito nessa questão de
Psicologia escolar, porque, na minha época, eu lembro que foi passado pra gente mais ou
menos uma visão do psicólogo que tá na escola, ele tá pra atender a criança-
problema,como se fosse uma clínica dentro da escola.Eu tive uma formação, na minha
época, era a psicanálise puramente.[...] Então, eu acho que o que me fez pensar e atuar
de forma diferente foram os espaços que eu fui ocupando posteriormente. Eu acho que
também tem uma coisa da gente ter, parece, uma tendência já em se posicionar de uma
forma e não de outra, né? Eu me envolvia, na formação, com ações mais sociais, com
grupos, com o CCI, eu fiz estágio lá, então já era uma vertente de olhar diferente, né, mas
não acho que foi fundamental, foi isso que me levou... Estudos na pós, a prática,
envolvimento com os movimentos sociais...
Pois é, a minha formação.... eu sei lidar muito com a questão afetiva da criança [...] Agora
eu acabo trabalhando as questões afetivas e emocionais de comportamento e de relação
que estão interferindo na questão escolar, que estão dificultando, agora essa parte da
psicopedagogia, talvez seja interessante trabalhar...