Doutrina438 CRIME DE EXTORSAO
Doutrina438 CRIME DE EXTORSAO
Doutrina438 CRIME DE EXTORSAO
I –EXTORSÃO
Para Heleno Cláudio Frangoso(obra citada, pág. 307) não se exige que o agente
tenha conseguido o proveito que pretendia. O crime se consuma com o resultado do
constrangimento, com a ação ou omissão que a vítima é constrangida a fazer, omitir ou tolerar
que se faça, sendo um crime de perigo. Sendo assim o Código Penal brasileiro ficou longe do
modelo adotado nos Códigos Penais da Suíça e da Itália e inspirou-se no antigo § 253 do CP
alemão, que foi modificado por lei de 29 de maio de 1943. Para essa corrente, o momento
consumativo independia da obtenção da vantagem pretendida. Porém, a nova redação dada
ao §253 passou a exigir que surja a vantagem patrimonial, para que o crime se consuma,
orientação que é a mesma na Itália. A tendência seria considerar a extorsão um crime material
cuja consumação dependeria do efetivo dano ao patrimônio. No Brasil, há jurisprudência no
sentido de que é irrelevante que o agente obtenha a vantagem indevida, bastando para a
configuração do crime a simples atividade ou omissão da vítima(RT 447/394, 462/393,
513/412, dentre outros). O Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula nº 96, onde se diz
que: “crime de extorsão consuma-se independentemente de obtenção da vantagem indevida”.
Mesmo formal é possível se pensar na hipótese de tentativa, uma vez que o crime não se
perfaz em ato único. Ocorre a tentativa quando a ameaça não chega ao conhecimento da
vítima(RT 338/103), quando esta não se intimida(RT 525/432) ou quando o agente não
consegue que ela faça, tolere que se faça ou deixe de fazer alguma coisa(RT 481/363, 498/357,
dentre outros).
II – EXTORSÃO QUALIFICADA
O dispositivo exige que duas pessoas, pelo menos, pratiquem o ato executivo
do delito(ameaça ou violência) para qualificar-se esse crime.
Por sua vez, o Código Penal de 1969 dizia, no artigo 169: “Extorquir ou tentar
extorquir para si ou para outrem, mediante sequestro de pessoa, indevida vantagem
econômica”.
Tutela-se no crime o patrimônio, uma vez que o fim visado pelo agente é a
vantagem econômica. A liberdade individual, a incolumidade pessoal e a vida, estas nas formas
qualificadas, são ainda protegidas.
São sujeitos ativos do crime: quem sequestra, quem vigia o refém, vai apanhar
o resgate etc. Já se entendeu que, tratando-se de autoridade policial, se o móvel do agente foi
o de privar a vítima de sua liberdade para dela extorquir vantagem indevida, o delito será
tipificado no artigo 159 do CP, crime comum e não em qualquer daqueles que são os próprios
do funcionário público e especialmente os previstos no artigo 316 ou da Lei nº 4.898, de 9 de
dezembro de 1965(RT 503/409).
Sujeito passivo é a pessoa seqüestrada e ainda o que sofre o prejuízo
econômico.
Considera Fabbrini Mirabete(obra citada, pág. 241) que não exige a lei que a
lesão grave ou a morte resultem da violência; ocorre a qualificadora se elas decorrerem “tanto
dos maus-tratos infligidos ao sequestrado, quanto da própria natureza ou modo do
sequestro”. É correta a colação que se faz por não se distinguir para efeito de pena, as
hipóteses de dolo ou culpa.
Exigir ou receber, como garantia de dívida, abusando da situação de alguém, documento que
pode dar causa a procedimento criminal contra a vítima ou contra terceiro:
Afirmou Magalhães Noronha(obra citada, pág. 270) que “a lei procura impedir
uma espécie de usura e que o expediente usado para garantir o pagamento da dívida é a
ameaça pendente de processo criminal contra o mutuário, ou contra terceira pessoa”.
Lecionou Heleno Cláudio Fragoso(obra citada, pág. 315) que este crime, porém, não depende
da existência de usura, podendo configurar-se quando o agente, através de documento que
possa dar causa a processo penal, procura garantir-se em dívida legítima. Mas é crime que, em
regra, e praticado por usuários ou agiotas. O crime, segundo se afirma na doutrina, quase
sempre é praticado tendo em vista prestação ilegítima em dinheiro, que o agente procura
garantir através da ameaça de processo criminal contra o devedor.
O núcleo verbal do crime envolve os verbos exigir ou receber, que são duas
formas típicas do crime, de conteúdo variável. Na primeira hipótese há uma atividade positiva
e na segunda o agente passivamente aquiesce em receber o documento que o próprio
devedor toma a iniciativa de lhe entregar.
O objeto da ação deve ser documento público ou particular que, por sua
natureza, possa dar causa a processo criminal contra o devedor ou ainda contra terceiro.
Poderá ser um cheque sem fundos, uma confissão de prática de crime, que envolva
apropriação indébita, estelionato, falsidade documental etc. Procedimento criminal é a ação
penal e ainda inquérito policial ou investigação, como revela Guilherme de Souza Nucci(obra
citada, pág. 743). Lembre-se que há diversas decisões que entendem que o cheque sem
fundos, dado em garantia, não basta para configurar a extorsão indireta, tendo em vista que o
cheque dado nessas circunstâncias não constitui crime. Já se decidiu que para que haja
extorsão indireta, basta que o documento possa dar causa à instauração de procedimento
criminal, não se exigindo que seja prova de um crime efetivamente ocorrido e que possa surgir
uma condenação criminal(RT 297/90). Fabbrini Mirabete(obra citada pág. 243) entende que
pode ser o documento em que se confessa um delito(ainda que verdadeiro o fato), uma
cambial com assinatura falsa, um recibo de depósito não existente, um cheque sem suficiente
provisão de fundos etc. Disse ainda Nelson Hungria(obra citada, pág. 244) que possibilidade de
instauração de processo não se confunde com a certeza ou a possibilidade de condenação”. Já
se decidiu que o cheque, dado em garantia de dívida, não dá ensejo a procedimento penal
legítimo contra o emitindo, não configurando a extorsão indireta com o recebimento desse
titulo pelo tomador(RT 443/502, 486/253, 538/322 ,dentre outros). Aliás, já se entendeu que
embora seja pacífico na jurisprudência não existir o delito previsto no artigo 171, § 2º, inciso
VI, quando o tomador sabe da existência de fundos(cheque assinado em branco, pós-datado,
entregue em garantia de dívida),ocorre o crime de extorsão indireta(RJ 53/580, RT 433/426,
542/372). Heleno Claudio Fragoso(obra citada, pág. 316), enfrentando a matéria, lembra que
algumas decisões têm entendido que o cheque sem fundos, dado em garantia, não basta para
configurar a extorsão indireta, tendo em vista que o cheque dado em tais circunstâncias não
constitui crime. Para ele, há, evidentemente, um equivoco. Para que haja extorsão indireta,
basta que o documento possa dar causa à instauração de procedimento criminal, não se
exigindo que seja prova de crime efetivamente ocorrido e que possa surgir uma
condenação(RT 297/90). Disse bem ele que tem-se em vista a coação que exerce a ameaça de
um processo criminal, mesmo destinado à absolvição, pois não há dúvida de que os danos
causados à reputação do acusado num processo-crime são muitas vezes irreversíveis. Concluiu
Heleno Cláudio Fragoso(obra citada, pág. 316); “Que o cheque sem fundos, dado em garantia,
pode dar causa a processo criminal, não há quem o duvide.”
Assim não há crime sem que a ação tenha sido praticada abusando o agente da
situação da vítima. Ainda para Heleno Cláudio Fragoso(obra citada, pág. 317) não se trata da
simples situação do devedor, mas, sim, da condição de penúria financeira em que se encontra
o devedor ou terceiro a ele ligado, de suas dificuldades prementes ou da urgente de satisfação
de compromissos pessoais inadiáveis, reais ou supostos. A vítima deve estar em situação
aflitiva e opressiva, que lhe tire, de certa forma, a liberdade de escolha. Sendo assim é
indispensável o abuso, ou seja, que o sujeito ativo se aproveite da situação de necessidade de
alguém para a existência do crime(RT 398/73, RT 538/322).
Deve ser dito que não é indispensável que o documento dado como garantia
expresse a prática de crime inexistente, ou seja, que se trate de uma prova simulada de ilícito
penal imaginário, cuja autoria a vítima atribui a si ou a terceiro. Para Heleno Cláudio
Fragoso(obra citada, pág. 317) não deixará de haver crime se para garantia de um empréstimo
o agente obtém confissão escrita de crime efetivamente praticado pelo devedor em prejuízo
de terceiro. Mas outro será o caso se a exigência ou recebimento de escrito que pode dar
causa a processo criminal, efetua-se após uma apropriação indébita ou um furto, prometendo
o criminoso reembolsar o lesado.
O crime de extorsão indireta é crime formal ou de consumação antecipada,
não se exigindo que haja superveniência de qualquer dano. Consuma-se o crime quando a
exigência, seja oral ou escrita, é formulada ou quando o devedor efetua a entrega de
documento ao credor. Entende-se que, na forma de exigir, e se a superveniência for verbal,
será inadmissível a tentativa.
Uma discussão surge se o agente, não conseguindo receber seu crédito, utilize-
se de documento para a instauração da ação penal contra a vítima. A doutrina, à luz de
entendimentos como de Joachim Wolfang Stern(Extorsão indireta e denunciação caluniosa,
Justitia 79/296/297), entende que não há concurso com o delito de denunciação caluniosa,
pois a ação posterior fica consumida por ter sido praticada para utilizar a ação precedente e
principal, tratando-se de exaurimento do crime de extorsão indireta como um pós-fato não
punível.