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Celeridade Processual Versus Ampla Defesa

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THAISE FORMIGARI FONTANA

CELERIDADE PROCESSUAL VERSUS AMPLA DEFESA: O TEMPO


RAZOÁVEL DO PROCESSO. UMA DISCUSSÃO ANTIGA, À LUZ DO
PROJETO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

CURITIBA
2010
1

THAISE FORMIGARI FONTANA

CELERIDADE PROCESSUAL VERSUS AMPLA DEFESA: O TEMPO RAZOÁVEL


DO PROCESSO. UMA DISCUSSÃO ANTIGA, À LUZ DO PROJETO DO CÓDIGO
DE PROCESSO CIVIL

Monografia apresentada ao Núcleo de


Monografia, Pesquisa e Extensão, como
requisito parcial à conclusão do Curso de
Bacharelado em Direito, Setor de Ciências
Jurídicas da Universidade Federal do Paraná.

Orientador: Professor Doutor Manoel Caetano


Ferreira Filho

CURITIBA
2010
2

TERMO DE APROVAÇÃO

THAISE FORMIGARI FONTANA

CELERIDADE PROCESSUAL VERSUS AMPLA DEFESA: O TEMPO RAZOÁVEL


DO PROCESSO. UMA DISCUSSÃO ANTIGA, À LUZ DO PROJETO DO CÓDIGO
DE PROCESSO CIVIL

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Paraná,


como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito da
Universidade Federal do Paraná, pela seguinte banca examinadora:

Professor e Orientador Doutor Manoel Caetano Ferreira Filho

Universidade Federal do Paraná

Professor Doutor Clayton Maranhão

Universidade Federal do Paraná

Professora Doutora Liliane Busato

Pontifícia Universidade Católica do Paraná

Curitiba, 17 de Novembro de 2010.


3

“Aprendi que há mais dos meus pais em mim do


que eu supunha; que membros de minha família
são os amigos que não me permitiram escolher.”
William Shakespeare
A vocês, meu porto.
4

AGRADECIMENTO

Agradeço primeiramente a Deus por ter me dado forças e iluminando meu caminho
para que pudesse concluir mais uma etapa da minha vida.
Ao meu pai, por todo amor, dedicação e paciência que sempre teve comigo, me
fazendo ter o maior orgulho de chamá-lo de Pai.
À minha mãe, por sua dedicação incondicional aos filhos, por ser a pessoa que mais
me apóia e acredita na minha capacidade, até mesmo quando eu duvido.
Mostrando-me que sou capaz de chegar onde desejo.
Ao meu irmão, pelo forte laço de carinho, amizade e confidência formado nestes
anos.
À minha família por seu apoio absoluto e presença marcante em todos os momentos
que precisei. Por seu meu porto seguro.
Aos amigos que fiz durante o curso, pela verdadeira amizade que construímos em
particular aqueles que estiveram ao meu lado nos momentos difíceis. Por todos os
momentos que passamos durante esses cinco anos, meu agradecimento. Sem
vocês essa trajetória não teria o mesmo gosto.
Aos meus amigos, Jamile e Kleber que de uma forma especial estiveram presentes
e contribuíram para que mais essa fase fosse vencida.
Em especial ao meu professor, orientador, e mestre, Manoel Caetano Ferreira Filho,
pelo ensinamento e dedicação dispensados em sala de aula, e principalmente pelas
lições sobre o verdadeiro sentido da Advocacia.
Ao professor Paulo Nalin que, com carinho e dedicação, tem me conduzido nos
primeiros passos da advocacia sendo, diariamente, minha fonte de inspiração com
seu espírito inovador.
A todos os professores do curso de direito, pela paciência, dedicação e
ensinamentos disponibilizados em aulas, cada um de forma especial contribuiu para
a conclusão desse trabalho e consequentemente para minha formação profissional.

Obrigada por insistir.


5

“convém que a justiça seja pronta, mas mais do


que isso, convém que seja justa. O problema
fundamental da política processual consiste
exactamente em saber encontrar o equilíbrio
razoável entre as duas exigências: a celeridade e
a justiça.”
Alberto dos Reis
6

RESUMO

O processo moderno apresenta novos anseios, entre os principais está a celeridade


processual. Como princípio constitucional que é, deve ser primado, mas quando em
colisão com outros princípios tal qual, deve ser ponderado.
O presente estudo tem por objetivo expor a dicotomia processual entre celeridade do
processo e ampla defesa. Uma discussão que transcende a simples aplicação da lei.
Buscou-se trata sobre as minudências dos princípios em si e dos agregados a eles.
Por isso, em que pese ser um trabalho teórico trata em muito da realidade vivida
hoje nos fóruns e tribunais.
Defende-se que a ampla defesa e o contraditório são carros-chefes enquanto a
brevidade do processo não deve ser um fim, mas o meio de se atingir um resultado
maior: a Justiça.
Por fim, tratou-se do Projeto de Lei nº. 166/2010, e com qual intuito surge no cenário
jurídico processual. O Código de Processo Civil tem funcionado com maestria em
boa parte de seus institutos, e as últimas reformas nem foram experimentada ainda.
Sendo assim, fica o questionamento se temos realmente necessidade de uma nova
lei.

Palavras-chaves: Ampla defesa. Celeridade processual. Contraditório. Princípios


constitucionais. Projeto de lei nº 166/2010.
7

ABSTRACT

The modern process brings new anxieties, among the main ones is the celerity
process. As a constitutional principle which is to be the rule, but when in collision with
other principles as such, should be considered.
This study aims to expose the dichotomy between the celerity process and legal
defense. A discussion that goes beyond the simple application of the law. We tried to
talk about the details of the principles themselves and aggregate them. Even so it is
a theoretical work is far from reality as experienced today in the forums and courts.
It is argued that the contradictory and full defense are very important and the brevity
of the process is not an end but the means to achieve a better result. Justice.
Finally the little need / applicability of the Bill nº. 166/2010. The Code of Civil Process
has worked masterfully in most of its institutes, and the latest reforms have not been
tested yet. In this case, we really do not have the valed of a new law.

Keywords: constitutional principles, process celerity, legal defense, contradictory,


reform, Code of Civil Process Project.
8

SUMÁRIO

RESUMO.............................................................................................................. 06

ABSTRACT.......................................................................................................... 07

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................. 10

2. OS PRINCÍPIOS .............................................................................................. 12

2.1. NORMAS DE DIREITO FUNDAMENTAL ..................................................... 12

2.1.1. A Positivação de princípios para uma busca mais efetiva de cumprimento 19

2.1.2. 2.1.2. Espécie de princípios. Um enfoque a mais nos princípios jurídicos e


princípios econômicos .......................................................................................... 21

2.2. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA......................................................... 22

2.2.1. Formas de preservação da defesa do autor e do réu ................................. 25

2.3. CELERIDADE PROCESSUAL ...................................................................... 26

2.3.1. A Emenda Constitucional n. 45 .................................................................. 29

2.4. O DEVIDO PROCESSO LEGAL. O ENCONTRO DOS PRINCÍPIOS........... 32

2.4.1 O princípio da motivação das decisões judiciais ......................................... 34

2.4.2. O princípio da isonomia de tratamento entre as partes .............................. 36

3. CELERIDADE VERSUS AMPLA DEFESA. A DICOTOMIA PROCESSUAL . 39

3.1. O SISTEMA DISPOSITIVO E O SISTEMA INQUISITÓRIO.......................... 39

3.2. O PROCESSO E O TEMPO. UMA QUESTÃO A SER ANALISADA ............ 41

3.3. MECANISMOS DE ACELERAÇÃO PROCESSUAIS MODERNOS .............. 49

3.4. UMA BUSCA PELA VERDADE REAL .......................................................... 53

3.5. CUSTO-DURAÇÃO: MAL CONTEMPORÂNEO DO PROCESSO ............... 55

3.6. DIREITO DAS PARTES A EFETIVA TUTELA JURISDICIONAL .................. 59


9

4. O PROJETO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: VERDADEIRAS MUDANÇAS


OU A REESCRITA DO MESMO?........................................................................ 62

4.1. MAQUINÁRIO DA BREVIDADE NO PROJETO DO CÓDIGO DE PROCESSO


CIVIL .................................................................................................................... 64

4.2. AS PRINCIPAIS MUDANÇAS TRAZIDAS PELO PROJETO DO CÓDIGO DE


PROCESSO CIVIL ............................................................................................... 66

4.2.1. Uma maior relevância aos princípios na letra da lei ................................... 68

4.2.2 A ampliação do pode dos magistrados........................................................ 71

4.2.3. A supressão dos Embargos Infringentes .................................................... 74

4.2.4. O Agravo e suas principais mudanças ....................................................... 76

4.2.5. O Recurso de Apelação e a não preclusão consumativa ........................... 79

4.2.6. A resolução dos conflitos por meio da conciliação, mediação e arbitragem.


Institutos que tendem a crescer ........................................................................... 82

4.3. Mudanças efetivas? Uma questão a ser ponderada ..................................... 85

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 88

7. BIBLIOGRAFIAS ............................................................................................. 91
10

1. INTRODUÇÃO

No desenrolar histórico do projeto da modernidade, muitas questões são


levantadas, entre as principais delas está o tempo do processo. Neste diapasão, a
celeridade processual tornar-se o cerne da discussão. Princípio Constitucionalmente
garantido deve ser primado, mas, quando em embate com outros princípios também
Constitucionais, fica a dúvida: pelo que devemos primar?
Pois bem, o presente trabalho irá partir desta dicotomia para fazer uma
breve análise do sistema processual vigente e qual rumo tomará nos próximos anos.
A Constituição Federal de 1988, promulgada após uma dura ditadura, traz a
certeza aos que tanto lutaram para isso, de um Estado Democrático de Direito, o
qual irá primar e garantir um processo justo.
Algumas reformas ocorreram. A principal delas foi a Emenda Constitucional
nº 45, surgindo agora, na letra da Carta Magna, a celeridade processual.
A ampla defesa posiciona-se de um lado e a brevidade processual do outro.
O sistema, ainda que uniforme, pontualmente apresenta-se dividido entre duas
garantias, restando ao julgador decidir o que deverá ser feito.
Neste sentido, caminhamos para tentar encontrar a solução. A priori,
faremos uma breve análise sobre princípios, qual sua importância no ordenamento
e, ainda, uma reflexão sobre sua ponderação, em caso de colisão.
Em um segundo momento, traremos ao palco a ampla defesa e a celeridade
processual propriamente ditas, bem como os demais princípios agregados a estes.
Qual a relevância e porque cada um se faz presente no nosso Ordenamento.
Nesta esteira, algumas questões invariavelmente são suscitadas. O que o
processo deve garantir? Qual melhor solução é apresenta para a resolução da lide
na sociedade? Qual decisão socialmente é mais justa?
E por fim, em qual direção estamos caminhando? O processo civil brasileiro
está sendo reformulado e nesse diapasão não podemos deixar de lado tantas
garantias já conquistadas até aqui.
Por isso, faremos uma análise do Projeto do Código de Processo Civil. Tal
desenho surge com muitas promessas, algumas inclusive perigosas, diriam os mais
11

conservadores, mas a questão é: o que traz, realmente, o projeto de lei nº


166/2010? Teremos mudanças efetivas? Resolveremos problemas antigos, tais
como da morosidade processual sem que haja ofensa ao contraditório? Ou ainda,
resta saber se o Projeto será aprovado, visto estar se esgotando o seu tempo de
tramitação no senado.
Em suma, muitas questões acaloram a discussão e procuraremos abordá-
las ainda que sem esgotamento do tema.
A reflexão sobre o tema é essencial, na medida em que as respostas ainda
estão sendo formuladas por cada doutrinador e aplicador. E, o resultado, somente
saberemos mais à frente.
“Adequar os velhos dados normativos às renovadas conjunturas, às
situações emergentes, aos conflitos outrora inexistentes e, hoje, recorrentes”1. A
brilhante afirmação do ilustre jurista, Clèmerson Clève, agora deve ser lida em seu
oposto. Adequar dados normativos novos aos conflitos antigos torna-se o principal
desafio.

1
CLÈVE, Clèmerson Merlin. Temas de Direito Constitucional (e de Teoria do Direito). São Paulo:
Academia, 1993. p. 49
12

2. PRINCÍPIOS

2.1. NORMAS DE DIREITO FUNDAMENTAL

Os princípios são normas gerais que embasam todo ordenamento jurídico.


Por isso, antes de qualquer avaliação é necessário entender sua importância para o
Sistema.
Segundo Dworkin, “todos usamos os mesmos critérios factuais para
formular, aceitar e rejeitar a afirmação sobre a natureza do direito”2. Neste sentido,
há divergências doutrinárias que atestam a discussão, estando de um lado as
correntes do direito natural, havendo pequenas diferenciações entre elas, e no outro
vértice as teorias semânticas, as quais, para o autor, devem ser primadas.
Estas teorias sustentam que o direito deve ser visto como simples questão
de fato, sendo que o único desacordo sobre sua natureza deve estar no campo
empírico, não podendo comprometer a efetivação, ou seja, não teórico. Abrindo a
era pós-positivista.
Apesar das considerações trazidas, o ilustre doutrinador protesta, visto que
todos os juristas concordam que não existe um direito único, então, porque não
adotamos como regra esse posicionamento, ou seja, de que, para cada caso haverá
um direito diferente?

E se assim não foi – se a maioria das pessoas ainda pensa que


sempre existe um direito que os juízes devem seguir –, por que os
juristas temem corrigir seus erros tendo em vista os interesses de
uma prática mais honesta de justiça? seja como for, como essa
simulação pode funcionar? Não seria fácil, para a parte
decepcionada, demonstrar que realmente não havia direito segundo
os fundamentos que todos sabem ser os fundamentos corretos? E se
a simulação é tão fácil de demonstrar, por que preocupar-se com a
charada? Tampouco existe alguma prova, nos referidos casos, de
que os advogados ou juízes realmente acreditavam naquilo que essa
alegação lhe atribui. Muitos de seus argumentos seriam totalmente
inadequados enquanto argumentos em favor da alteração ou do
aperfeiçoamento do direito; só têm sentido enquanto argumento
sobre aquilo que os juízes devem fazer em razão de suas
responsabilidades de aplicar o direito tal como ele é3.

2
DWORKIN, Ronald. O Império do Direito. Tradução de Jefferson Luiz Camargo. 2 ed. Martins
Fontes: São Paulo, 2007, p. 39
3
Idem. Ibidem. pp. 46-47
13

Para tanto, o verdadeiro argumento em favor das teorias semânticas, está


na forma como deve ser vista a mesma regra. Se duas pessoas estão de fato
seguindo regras diferentes ao empregar a palavra direito, tendo cada qual algo
distinto em mente, na realidade as duas pessoas não estão realmente divergindo
sobre coisa alguma, apenas estão falando um sem entender o outro.
Para que não haja problemas como este, os juízes devem aplicar a lei, em
vez de ignorá-la, e os cidadãos devem obedecê-la,4 ou seja, a menos que haja uma
divergência de critérios factuais sobre os fundamentos do direito, não poderá haver
nenhuma idéia ou debate significativos sobre o que é o direito. Sendo possível
formular um programa apolítico para decidir casos constitucionais, onde é permitido
ao juiz decidir se leis são constitucionais sem entrar no mérito da questão.
Neste diapasão, temos duas correntes, a primeira, leva em consideração a
intenção constitucional, não fazendo escolhas substantivas, apenas impondo as já
feitas, as quais, a Constituição ratificou. Já na segunda vertente, utilizando da
mesma idéia, contudo fazendo uma distinção entre material e substancial no
processo.
Tais considerações foram realizadas no sentido de embasar a interpretação,
a qual deve ser realizada em se tratando, então, dos princípios. Sendo assim, os
julgadores não analisariam a equidade ou a justiça substancialmente, mas apenas
verificariam a equidade do processo, pelo qual a lei foi elaborada5.
Todavia, para Dworkin, as duas maneiras de fugir do substancialismo
acabariam por terminar em fracasso, na medida em que:

Os juízes não podem decidir qual foi a intenção pertinente dos


constituintes, ou qual processo político é realmente justo ou
democrático, a menos que tomem decisões políticas substantivas.
(...) A intenção e o processo são idéias nocivas porque encobrem
essas decisões substantivas com a piedade processual e finge que

4
DWORKIN, Ronald. O Império do Direito. Op. Cit. p. 54
5
É importante ressaltar que Dworkin, após uma era positivista, traz ao cenário jurídico a idéia dos
Princípios, em que pese estar fortemente ligado às teorias positivistas, entende os princípios não
como normas, mas fontes de interpretação. Sendo somente com Alexy que os princípios passaram a
ser considerados como normas constitucionais.
14

elas não foram tomadas. As velhas idéias são agora abandonadas


aqui6.

Cabendo, por conseguinte, que a interpretação apóia nas intenções


constituintes, pois quase toda teoria constitucional apóia-se em alguma concepção
de intenção ou compreensão original. Contudo, a questão mais importante, “não é
se a intenção dos que fizeram a Constituição deveria ser considerada, mas antes o
que deveria contar com essa intenção”7.
Complementando a teoria de Dworkin, Robert Alexy8 diz que,
equivocadamente, pode-se pensar que são apenas normas de direito fundamental
aquelas que estão expressamente expostos no texto legal.
Contudo, pondera ser infrutífera tal conclusão na medida em que: primeiro
nem todo o direito enunciado “fundamental” expressa necessariamente regras do
direito base, e segundo, pode haver questões ditas de direito fundamental,
expressas nestes dispositivos que não necessariamente o são.
Considera, Alexy9 que os princípios, são “mandatos de optimización” ou
seja, ordenam que algo seja efetivado, “na maior medida possível, dentro das
possibilidades jurídicas e fáticas existentes”10.
Consoante Canotilho11, são os princípios que servem de embasamento às
decisões jurídicas, a interpretação e a aplicação das normas constitucionais.
No mesmo foco, Marinoni, analisando a obra de Alexy, completa o estudo
dizendo que “as regras contêm determinações em um âmbito fático e juridicamente

6
DWORKIN, Ronald. Uma Questão de Princípio. Tradução de Luís Carlos Borges. Martins Fontes:
São Paulo, 2005. p. 43
7
Idem. Ibidem. p. 79
8
Tradução Livre de: “El primeiro consiste em que, como no todo los enuncados de la ley fundametal
expresan normas de derecho fundamenta, presupone um critério que permita clasificar los
enunciados de la ley fundamental en aquéllos que expresan normas de derecho fundamental y
aquellos que no. el segundo problema puede formularare com la pregunta acerca de si las normas
de derecho fundamenta de la ley fundamental reament pertenecen solo aquellas que son expresadas
directamente por enunciados de la ley fundamental. (In: ALEXY Robert. Teoria de los Derechos
Fundamentales. Centro de Estudios Constitucionales: Madri, 1997, p. 62)
9
Idem. Ibidem. p. 86
10
MARINONI Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 4 ed. Revista dos Tribunais: São Paulo,
2010, p. 50
11
CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4 ed. Almedina:
Coimbra. pp. 260-271
15

possível, ao passo que os princípios podem ser realizados em diferentes graus,


consoante as possibilidades jurídicas e fáticas”12. Isso significa dizer que um
princípio não necessariamente vale para duas situações diferentes, sendo uma
característica inerente a sua estrutura, a possibilidade de ser vingado ou não em
situações diferentes13, sendo uma espécie de transmutabilidade.
Sendo assim, o grau abstração, e portanto aplicabilidade dos princípios
depende das possibilidades jurídicas e fáticas da situação concreta, as quais são
condicionadas pela oposição deles, exigindo-se uma espécie de peso, quando
colocados em colisão, conforme o caso concreto14.
Para demonstrar com clareza matemática sua teoria, Alexy faz uma fórmula
numérica onde explana a aplicação dos princípios, em caso de choque15.
Neste sentido, entende-se que eles devem ser vistos, como se passasse por
uma espécie de processo seletivo, sendo que, em uma primeira etapa dever-se-á

12
MARINONI Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. Op. Cit. p. 50
13
Idem. Ibidem. p. 50
14
Idem. Ibidem. p. 50
15
Fabio Portela Lopes de Almeida, Mestre em Direito, Estado e Constituição e Especialista em
Filosofia (ambos pela Universidade de Brasília) e membro do grupo de Trabalho em Meditação,
Negociação e Arbitragem e do Grupo de Pesquisa Pensamento Social escreveu o artigo “Os
princípios constitucionais entre deontologia e axiologia: pressupostos para uma teoria
hermenêutica democrática” para a Revista de Direito GV. São Paulo.
O autor faz uma tradução/interpretação da formula matemática criada por Alexy: “Para Alexy, quando
dois princípios entram em colisão, um deve ceder proporcionalmente ao outro: para decidir qual deve
prevalecer, é necessário utilizar a lei de colisão, que é definida nos seguintes termos: em face de dois
princípios (P1 e P2) que colidem, é preciso dar preferência (P) a um deles em face do outro, o que se
dá tendo em vista as condições fáticas (C1) presentes na situação concreta, que fornece elementos a
serem abstraídos logicamente pelo julgador na busca por uma resposta (R) (ALEXY, 2002, p. 157-
158).
A estrutura da decisão judicial no caso de colisão entre princípios é a seguinte, no modelo de Alexy:
(P1 P P2) C1 ? R (lê-se: o princípio 1 é preferível ao princípio 2 na condição 1, que leva à resposta
jurídica R).Todavia, essa preferência não é total: ela deve estar de acordo com o princípio da máxima
proporcionalidade, que é estruturado em torno de três máximas parciais: (i) o princípio da máxima
proporcionalidade em sentido estrito, de acordo com o qual os princípios são mandatos de otimização
em relação às possibilidades jurídicas; (ii) o princípio da adequação de meios a fins; e (iii) o princípio
da necessidade, pelo qual a decisão deverá buscar o equilíbrio entre os princípios que seja menos
lesivo às partes envolvidas. A primeira máxima aplica-se a circunstâncias jurídicas e as outras duas, a
circunstâncias fáticas (ALEXY, 2002, p. 111-113). No esquema de Alexy, o julgador deve abstrair a
sua decisão do caso concreto a ser decidido a partir da lei de colisão, ou seja, deve levar as
circunstâncias fáticas apresentadas no caso concreto (C1) para o plano lógico e, a partir dessa
perspectiva, verificar qual dos princípios deve ser preferido.”
<http://www.direitogv.com.br/subportais/publica%C3%A7%C3%B5e/RD-
08_8_493_516_Os%20principios%20constitucionais%20entre%20deontologia%20e%20axiologia_Fa
bio%20Lopes%20de%20Almeida.pdf> Acessado em 02/09/2010. As 22h10min.
16

primar pela adequação, seguida de uma análise quanto à necessidade e por fim sua
exigibilidade.
Neste sentido, as apreciações realizadas pelos subprincípios são,
respectivamente, decisão, efeito da decisão, e finalidade. Por isso, somente
botaremos reparo no subprincípio subsequente se satisfeito o precedente.
Sendo assim, entende-se que a tese da máxima da proporcionalidade visa à
proteção do núcleo essencial dos direitos fundamentais levando em consideração a
sua eficiência.
Finalmente, tendo em vista que as normas de direito fundamental têm
caráter principiológico, decorre-se a necessidade de harmonizar os pontos de tensão
normativa entre elas16.
Contudo, na prática, essa aplicabilidade torna-se muito mais difícil, que a
apresentada na teoria.
Há situações concretas que, mesmo buscando uma preservação ponderada
de ambos, deverá o juiz prevalecer a outro17. A questão não é, simplesmente, dar
maior “valor” a um princípio ou a outro, deve-se levar em conta que todos os ditos
constitucionais precisam ser contemplados, respeitando-se para tanto, o limite de
cada um, sendo foco primordial o equilíbrio do ordenamento jurídico e a ética
processual.
Neste sentido, uma breve diferenciação entre regras e princípios deve ser
trazida a tona: Borowski18 diz que os princípios constituem deveres prima facie e as
regras um dever definitivo. A forma de aplicação de um princípio é a ponderação,
enquanto as regras apenas se subsumem.
O conflito de princípios, nestes termos, será solucionado pela ponderação
realizada pela atribuição de pesos, conforme já elucidado, uma vez que em hipótese
alguma poderá se pensar em retirar um deles do ordenamento. Já as regras, quando
em conflito, solucionam-se pela invalidação de uma das normas.

16
BARROS, Suzana de Toledo. O princípio da Proporcionalidade. Brasília Jurídica: Brasília, 1996,
pp. 177- 200
17
Assunto que será tratado no capítulo Celeridade Versus Ampla Defesa. A Dicotomia
Processual.
18
BOROWSKI, Martin. La estructura de los derechos fundamentales. Universidad Externado de
Colômbia: Bogotá, 2003, pp. 90-98
17

Por isso, uma regra deve ser sempre aplicada quando o seu suporte fático
for realizado, uma vez que possuem um baixo grau de abstrição. Ao passo que os
princípios, no caso concreto a ser discutido, podem assumir uma importância maior
ou menor no contexto da argumentação19, podendo ser aplicados ou não. Segundo
Dworkin, são assim, pois são como políticas públicas.
Neste sentido, cumpre esclarecer uma diferenciação feita pelo autor. Para
ele, o juiz, ao decidir, além de solucionar questões jurídicas deve aperceber-se do
caráter político delas. Em muitos casos, a decisão de um juiz será aprovada por um
grupo político e reprovada por outros, pois há controvérsias políticas20.
Por isso, conclui que

o Tribunal deve tomar decisões de princípio, não de política –


decisão sobre que direitos as pessoas têm sob nosso sistema
constitucional, não decisões sobre como se promove melhor o bem-
estar geral –, e quem deve tomar essas decisões elaborando e
aplicando a teoria substantiva da representação, extraída do princípio
básico de que o governo deve tratar as pessoas como iguais. Se
estou certo a respeito disso e do que isso significa, são questões
para a teoria jurídica e política21.

E ainda, esclarece que “o direito, nada mais é que aquilo que as instituições
jurídicas, como as legislaturas, as câmaras municipais e os tribunais, decidiram no
passado”22, apresentando opiniões divergentes. De um lado, posicionam-se os que
entendem como dever dos juízes tentar melhorar as leis, sempre que possível,
sendo “seres políticos”, então. E no outro polo, os que defendem que os juízes

19
DWORKIN, Ronald. O Império do Direito. Op. Cit. p. 40-49
20
DWORKIN, trás alguns exemplos sobre a aplicação das políticas públicas na Corte britânica: “Em
Charlter e Dockers, a Câmara dos Lordes interpretou a Lei de Relações Raciais de tal maneira que
associações políticas, como o Clube Conservador de West Ham, não fossem obrigadas pela lei a não
discriminar os negros. Em Tameside, a Câmara rejeitou uma ordem do ministro trabalhista revogando
a decisão de um conselho conservador de não modificar seu sistema escolar segundo o plano
abrangente patrocinado pelo governo do Partido Trabalhista. No famoso caso Shaw, a Câmara dos
Lordes confirmou a condenação do editor de um guia de prostitutas. Sustentou que ele era culpado
do que chamou crime no Common Law de ‘conspiração para corromper a moralidade pública’,
mesmo reconhecendo que nenhuma lei declarava que tal conspiração fosse crime. (...)
Portanto, existe os que pensam que os juízes britânicos realmente tomam decisões políticas. Mas
isso não significa dizer que devem fazê-lo.” (In: DWORKIN, Ronald. Uma Questão de Princípio. Op.
Cit. pp. 05-06)
21
DWORKIN, Ronald. Uma Questão de Princípio. Op. Cit. p. 64
22
Idem. Ibidem. p. 10
18

devem sempre seguir o direito, em vez de tentar aperfeiçoá-lo. Ainda que sejam
pessoalmente contra a decisão, devem aplicá-la. Ficando para o autor que a
segunda opção é a melhor.
Neste prisma, é perfeitamente possível haver ponderação entre dois ou mais
princípios, a partir do qual um valor moral cede perante o outro, realizando a ambos
proporcionalmente.
No mesmo sentido, Marinoni conceitua a natureza dos princípios. Devido a
pluralidade e ainda a impossibilidade de submetê-los a uma lógica hierárquica,
devem conviver. Todavia, em alguns casos surge a necessidade de uma
metodologia que permita a aplicação23.
Fala-se em ponderação ou aplicação da proporcionalidade, permitindo a
coexistência ou prevalecendo um ao outro. Tudo isso faz com que um deles seja
eliminado em abstrato24.
Não obstante, por serem os princípios fruto de um pluralismo marcado pelo
caráter de abstração, a idéia de que um prevaleceria sobre outro, pode afrontar a
idéia de democratização e pluralismo da sociedade, para alguns autores25.
Contudo, não é desta forma que devemos entender. Alexy assevera que não
se pode admitir qualquer direito fundamental (neste caso, os princípios) como
absoluto, sobre o qual não possa exercer nenhuma restrição.
Embora possa parecer contraditório, preservar um ao outro, se assim os
visemos, de forma absoluta sempre, seria um risco maior ainda a segurança jurídica.
O que se admite é a garantia de um núcleo mínimo essencial, o que deverá ser
preservado sempre26. Ou seja, ao admitir que, em determinado caso deva
prevalecer a ampla defesa, o mínimo da celeridade deve estar garantido.
Nestes termos, apesar de conseguirmos enxergar a problemática vista por
alguns autores em ponderar princípios, havendo consequentemente uma
prevalência de um ao outro, o modelo trazido por Dworkin, ampliado e modificado

23
MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. Op. Cit. p.55
24
Idem. Ibidem. p. 55
25
Idem. Ibidem. p. 54
26
ALEXY, Robert. Teoria de los Derechos Fundamentales. Op. Cit. p.150
19

em alguns aspectos, tornando-o menos positivista por Alexy, tem se mostrado,


historicamente, como a melhor opção.
Portanto, devemos entender a classificação trazida por ele e relida por
tantos outros autores, como a melhor visão tida hoje sobre a otimização do princípio
no sistema judiciário, sendo a adotada no presente estudo.

2.1.1. A Positivação de princípios para uma busca mais efetiva de cumprimento

É sobre esta perspectiva que devemos analisar a questão da positivação


dos princípios. Não é de hoje a ideia de positivá-los, mesmo o nosso atual Código de
Processo Civil não ter utilizado de tal mecanismo, assim como vem buscando fazer,
em alguns momentos, o Projeto de lei nº 166/2010, não há de se esquecer a
influência de outros ordenamentos.
Celso Ribeiro Bastos faz uma importante consideração ao dizer que a
Constituição é muito mais que um aglomeramento de regras, as quais guardam para
si o mesmo grau de importância. Elas se afiguram estruturalmente em um todo,
mantendo uma unidade hierárquico-normativa.

Ainda assim, contudo, é possível identificar o fato de que certas


normas, na medida em que perdem o seu caráter de precisão de
conteúdo, isto é, vão perdendo densidade semântica, elas ascendem
para uma posição que lhe permite sobrepairar uma área muito mais
ampla. O que elas perdem, pois, em carga normativa, ganham em
força valorativa a espraiar-se por cima de um sem-número de outras
normas. No fundo tanto são normas as que encerram princípios
quanto as que encerram preceitos27.

Neste sentido, quando se apercebe que determinada norma-princípio se faz


mais presente que outras, entendemos o porquê de se positivar valores. A influência
do direito italiano é notória no processo civil brasileiro, e uma vez mais não poderia
ser diferente.

27
BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ive Gandra. Comentários à Constituição do Brasil:
Promulgada em 5 de Outubro de 1988. v.1. Editora Saraiva: São Paulo, 1988, p. 340
20

O Código de Processo Civil italiano, em seu artigo 38428, dispõe sobre o


acolhimento do recurso, fundamentado em violação ou falsa aplicação de norma de
direito, estabelecendo, como princípio de direito, que o tribunal nacional deve
conformar ou decidir sobre o mérito.
Essa positivação caminha no sentido de garantir as partes o direito a um
devido processo legal. Sobre isso, Celso Ribeiro Bastos diz que este princípio “se
caracteriza pela excessiva abrangência e quase que se confunde com o Estado de
Direito”29. Sendo esta a razão para o princípio referido se desdobrar em tantos
outros direitos, os quais são protegidos de maneira específica pela Constituição
Federal30.
Deste modo, as garantias constitucionais do devido processo legal
transformam o processo em um mecanismo que propicie a “cooperação” entre as
partes, garantindo a neutralidade do juiz. Pois, a participação delas no processo, não
possibilita apenas uma maior facilidade de se obter uma decisão favorável aquele
que “mais trabalhou”, mas significa do mesmo modo, uma cooperação maior no
exercício da jurisdição31.
Para o autor, este objetivo está acima das intenções egoístas das partes, “a
estrutura dialética do processo existe para reverter em benefício da boa qualidade
da prestação jurisdicional e da perfeita aderência da sentença à situação de direito
material subjacente”32.

28
Artigo 384 do Código de Processo Civil Italiano diz: “(Enunciazione del principio di diritto e
decisione della causa nel merito) La Corte, quando accoglie il ricorso per violazione o falsa
applicazione di norme di diritto, enuncia il principio di diritto al quale Il giudice di rinvio deve
uniformarsi ovvero decide la causa nel merito qualora non siano necessari ulteriori accertamenti di
fatto. Non sono soggette a cassazione le sentenze erroneamente motivate in diritto, quando il
dispositivo sia conforme al diritto; in tal caso la Corte si limita a correggere la motivazione.”
29
BASTOS, Celso Ribeiro e MARTINS, Ive Gandra. Op. Cit. p. 261
30
Notando a importância deste princípio (o devido processo legal) abriremos um tópico, neste mesmo
capítulo, para tratar de modo mais específico. IV – O Devido Processo Legal. O Encontro dos
Princípios.
31
Idem. Ibidem. p. 264
32
Idem. Ibidem. p. 264
21

2.1.2. Espécie de princípios. Um enfoque a mais nos princípios jurídicos e princípios


econômicos

Não há duvida da importância dos princípios no ordenamento jurídico. “São


eles, que a rigor, fazem com que exista um sistema”33.
Neste diapasão temos quatro classificações quanto sua aplicabilidade. Os
princípios jurídicos; os princípios econômicos; os princípios políticos e os princípios
lógicos.
Sucintamente, os políticos são aqueles que dão a estrutura do processo, ou
seja, “das regras disciplinadores da atividade desenvolvida no processo, deve ser
conformada à estrutura política que tenha sido adotada no país”34. Neste sentido, as
normas de um Estado devem ser condizentes com a sua concepção de democracia.
Os princípios lógicos são aqueles que amparam todos os demais na busca
da finalidade – a sentença. “Isso quer dizer que as leis processuais, pelo princípio
lógico, devem prever os meios que mais sejam capazes de permitir o descobrimento
da verdade subjacente ao processo”35.
Já em se tratando dos Jurídicos, é relevante o ensinamento trazido por
Cretella:

São os que visam a obtenção de justiça por meio do processo legal,


concedendo as partes igualdade de tratamento no meio do processo
legal, concedendo as partes igualdade de tratamento no processo;
exemplo de principio jurídico é o da ampla defesa, pelo qual aos
litigantes, em processo judicial ao administrativo, e aos acusados em
geral, lhe é garantido deduzir quaisquer provas pertinentes à questão
controversa, em juízo, bem como aproveitar as mesmas
oportunidades processuais36.

No mesmo sentido, Luiz Rodrigues Wambier e Eduardo Talamini ensinam


que os princípios jurídicos informam que tudo deve ser feito em conformidade com a

33
WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil. Teoria
geral do processo e Processo de conhecimento. 1 v. 11 ed. Revista dos Tribunais: São Paulo,
2010, p. 61
34
Idem. Ibidem. p. 63
35
Idem. Ibidem. p. 62
36
CRETELLA Neto, José. Fundamentos Principiológicos do Processo Civil. 2 ed. Forense: Rio de
Janeiro, 2006, p. 32
22

lei. “Devendo ser entendido como determinante da conformação das regras


processuais em geral”, norteando, por meio da Constituição, a elaboração legislativa
infraconstitucional, servindo, inclusive, de diretriz para sua aplicação.
Sendo, portanto, eles os propiciadores da igualdade das partes no litígio e
da justiça na decisão. Por isso a relevância dada ao conceito no presente estudo,
uma vez ser ele o responsável pela segurança no ordenamento.
Não se deve olvidar ainda dos princípios econômicos, sendo aqueles

que visam a garantir a acessibilidade de todos os processos judiciais,


independentemente de sua situação econômica, mediante a
realização do ideal de Justiça com o menor custo e a mais curta
duração possível; dentre aqueles que servem como exemplo de
princípio econômico37.

Sendo assim, os econômicos são, “ao mesmo tempo, fonte de interpretação


da norma, como direito positivo que esta é, e critério legitimador, ou seja, expressão
de sua legitimidade e aceitação moral, como regra de conduta social”38, e ainda, não
deve ser o processo objeto de gravosa taxação, seja pela longa duração, seja pelas
despesas, as quais podem prejudicar o acesso.
Por isso, deve ser objeto de almejo, tanto para o legislador processual,
quanto para os operadores do direito, busca-se o máximo de rendimento com o
mínimo de dispêndio39. Nada obstante, não há como se falar em brevidade
processual sem lembrar dos princípios econômicos.

2.2. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA

Antes de qualquer conceituação, a ampla defesa e o contraditório devem ser


vistos como princípios de acesso a justiça, os quais contribuem para a efetivação do
devido processo legal. Tratando-se “de um poder quase absoluto no processo

37
Idem. Ibidem. p. 32
38
Idem. Ibidem. p. 26
39
WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Op. Cit. p. 63
23

civil”.40 Pois, segundo Portanova, quando o Estado retira do sujeito a legitimidade de


resolver seus próprios conflitos, este deve lhe proporcionar o melhor tratamento.
Portanto, a ampla defesa propriamente dita não deve ser vista como uma
generosidade do Estado, mas sim um interesse público, pois o direito de defender-
se é essencial a todo e qualquer Estado que se pretenda minimamente democrático.
Cabe esclarecer ainda que tal direito, além de primordial, deve ser
distribuído com equidade entre as partes para que uma garantia não se torne um
ônus.

A ampla defesa visa, assim, a restaurar um princípio de igualdade


entre partes que são essencialmente diferentes. Daí afirmarem Celso
Bastos e Ives Gandra que ‘a ampla defesa só estará plenamente
assegurada quando uma verdade tiver igual possibilidade de
convencimento pelo magistrado, quer seja ela alegada pelo autor,
quer pelo réu’41.

Apesar disso, o autor entende que o Código de Processo Civil ainda


contempla a ampla defesa como ônus, e não um dever. Tanto é assim, que no artigo
29742 tem-se que o réu poderá oferecer, no prazo de 15 dias, contestação, enquanto
ao comparar com o Código de Processo Penal no artigo 26343, tem-se que, em
matéria de defesa, há a obrigatoriedade de ser nomeado, ainda que o réu não
compareça, um procurador dativo44.45

Assim, o principio da ampla defesa, para atender perfeitamente aos


termos constitucionais, mais do que nunca, deve ser cuidadosamente

40
PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. 3 ed. Livraria do Advogado: Porto Alegre,1999,
p. 109
41
GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Técnica de Aceleração do Processo. Lemos & Cruz: São
Paulo, 2003, p. 63
42
Artigo 297. “O réu poderá oferecer, no prazo de 15 (quinze) dias, em petição escrita, dirigida ao juiz
da causa, contestação, exceção e reconvenção.”
43
Artigo 263. “Se o acusado não o tiver, ser-lhe-á nomeado defensor pelo juiz, ressalvado o seu
direito de, a todo tempo, nomear outro de sua confiança, ou a si mesmo defender-se, caso tenha
habilitação.”
44
PORTANOVA, Rui. Op. Cit. p. 127
45
O autor considera o sistema do Código de Processo Penal muito mais avançado que o de
Processo Civil, devendo os civilistas olharem um pouco mais para os outros ramos do direito e
utilizarem de boas influências.
24

informado pelo princípio da efetividade social do processo. Exigi-se


interpretação a mais abrangente possível. Não basta só direito de
defender-se; é indispensável, para que a defesa seja plena, que a
parte tenha a liberdade de oferecer alegação e meios de uma defesa
efetiva. Só assim ter-se-á certa paridade de partes no processo46.

Não obstante, está o princípio do contraditório. No sentido de que “ninguém


poderá ser julgado sem ser ouvido”, antes de ser um conceito ser jurídico, é um
fundamento político.

Esse princípio, guiando à condição de garantia constitucional,


significa que é preciso dar ao réu possibilidade de saber da
existência de pedido, em juízo, contra si, dar ciência dos atos
processuais subseqüentes, às partes (autor e réu), aos terceiros e
aos assistentes, e garantir a possível reação contra decisão, sempre
que desfavoráveis47.

Não sendo apenas uma obrigação das partes, mas o próprio juiz deve
enfatizá-lo. O processo moderno prima pelo “dever de diálogo” do juiz e das partes,
não sendo um mero formalismo, mas uma obrigação do julgador.

Assim, não basta intimar a parte para manifestar-se, ouvi-la e permitir


a produção de alegações e provas. Mas do que isso, o contraditório
tem que ser pleno e efetivo, e não apenas nominal e formal. Mas do
que acolher as razões das partes, o contraditório preocupa-se com o
fato de estas influírem efetivamente no convencimento do juiz e até
de criar dúvida em seu convencimento. Mais do que prestar
informações às partes, o contraditório é informado pelo principio do
respeito da dignidade da pessoa48.

Nestes termos, positivamente tem caminhado a conceituação da doutrina e a


jurisprudência. A relevância dada ao princípio é elogiável, visto que, neste sentido a
Constituição cumpriu seu papel, e não deve deixar que mecanismos alheios alterem
essa visão sobre o princípio.

A dogmática processual tem captado muito bem a necessidade de


fortalecimento da atividade argumentativa no processo. Sinal claro

46
Idem. Ibidem. p. 128
47
WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Op. Cit. pp. 64-65
48
PORTANOVA, Rui. Op. Cit. p. 161
25

disso se vê nas ricas abordagens teóricas acerca do princípio do


contraditório. Trata-se possivelmente do princípio reverenciado pela
doutrina processual contemporânea. Graças a tal empenho, a visão
formal e limitada do contraditório, como mera ciência bilateral dos
atos do processo, acompanhada da possibilidade de uma reação, vai
ficando superada. Em seu lugar, tem prevalecido uma leitura
bastante apreciada na era pós-positivista49.

Nelson Nery vai mais além e complementa, na medida em que não deve ser
garantido garantindo apenas as partes, o direito de contradito no processo, mas a
todos aqueles que fizerem parte da lide, seja, autor, réu, assistentes de
litisconsórcios, Ministério Público (tanto quando atuam como parte ou como ficais da
lei) ou terceiros interessados. “Todos aqueles que tiverem alguma pretensão de
direito material a ser deduzida no processo têm direito de invocar o principio do
contraditório em seu favor”50.

2.2.1. Formas de preservação da defesa do autor e do réu

As normas de conduta social impedem que os indivíduos se auto regulem, a


autotutela ou a autodefesa é vedada no ordenamento social e, por óbvio jurídico.
Salvo raras situações, excepcionalíssimas, previstas na própria lei, a composição
dos conflitos de interesse deve ocorrer mediante a entrega do pleito ao poder
jurisdicional e, assim sendo, coibir a efetivação particular dos direitos51.
Neste diapasão, de primordial importância para o processo são os princípios
do contraditório e da ampla defesa, sendo esta a razão para a Constituição Federal
colocá-los em um mesmo artigo, visto ambos buscarem a isonomia entre as partes.
Para dar tratamento isonômico é preciso primeiramente reconhecer a
disparidade natural entre autor e réu, assegurando, principalmente ao requerido, que

49
SOUSA, José Augusto Garcia de. Em defesa dos Embargos Infringentes: Reflexões Sobre os
Rumos da Grande Reforma Processual. Revista IOB de Direito Civil e Processual Civil. v. 11, n.
66. jul/ago. 2010, p. 61
50
NERY JR., Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. 3 ed. Revista dos
Tribunais: São Paulo, 1996, p. 132
51
SANTOS, Carlos Fernando Fecchino dos. Princípio da Celeridade Processual. São Paulo, ano
98, v. 887, Setembro 2009. p. 41
26

já é, por natureza, desfavorecido, uma possibilidade de alcanças a igualdade com o


autor.
Em suma, para que tudo isso seja alcançado, muito antes, o direito de
defesa concreta deve estar assegurado. Um processo somente poderá ser
considerado verdadeiramente justo, ainda que a verdade indubitável seja utópica e
quase inalcançável, quando autor e réu tiverem as mesmas possibilidades de
demonstrar os fatos narrados.
Por isso, torna-se imprescindível, no processo, que as garantias individuais
das partes estejam contempladas verdadeiramente, só assim poderemos tratar
minimamente de justiça.

2.3. CELERIDADE PROCESSUAL

Celeridade processual é a necessidade de se entregar aos processos uma


maior efetividade e, para tanto, garantir a todos, seja no âmbito administrativo, ou
judicial, uma razoável duração da lide.
Neste sentido, “efetividade, consoante qualquer dicionário, é a qualidade
daquilo que é efetivo; efetivo por sua vez, é o que produz efeito ou aquilo que existe
de fato”52. Sendo assim, não resta dúvida que quando morosa a decisão, não surtirá
os mesmos efeitos53.
Por se tratar de um princípio tipicamente econômico, sendo a sua quarta
vertente54, deve ser primado pelo conceito do devido processo legal.
Destarte, impetrado a esse princípio maior (o devido processo legal) é que
se deve aplicar o princípio da celeridade, a qual foi amplificado em nosso sistema,
em especial pelo inciso LXXVIII do artigo 5º da Constituição Federal, inserido pela
Emenda Constitucional número 45.
Contudo, esta não foi sua primeira aparição. Em 1969, o Brasil, na qualidade
de Estado signatário, juntamente com outros países, assinou o Pacto de San José

52
Idem. Ibidem. p. 44
53
Idem. Ibidem. p. 44
54
Segundo PORTANOVA, o princípio da economia processual é dividido em quatro vertentes, sendo
estas: economia de custo; economia de atos; eficácia da administração e celeridade processual.
27

Costa Rica – também chamada de Convenção Americana de Direitos Humanos. A


referida convenção foi internalizada por força do Decreto Legislativo 27 de 1992, e
ratificada pelo Vice-Presidente no mesmo ano.
Neste ato, o país assumiu o compromisso de dar cabo a brevidade
processual estabelecida no artigo 8º, I do Pacto55.
Ainda que de forma precária, o ordenamento jurídico brasileiro assumiu
desde antes o compromisso de prover um processo breve, embora poucos
mecanismos tenham sido criados, ganhando mais espaço somente com a Emenda
Constitucional nº 4556.
Na mesma esteira, Carlos Fernando diz que o referido princípio deve ser
atrelado ao conceito de acesso a justiça, e a efetividade do processo, exigindo que o
pronunciamento do julgador seja o mais efetivo possível, sob pena de, embora ter-se
cumprido sua função não terá atingido sua finalidade57. O processo é um mal, e o
sendo, deve ser eliminado da sociedade o mais rápido possível58.
Como instrumento apto a por fim a uma situação “anormal”, que é o
processo, vez que, “o conflito de interesse reflete inequivocamente uma situação
socialmente indesejável, com a qual o Direito deve conviver o mínimo possível”59,
Eduardo Arruda Alvim trás a tona a teoria dos prazos, onde, como via de regra, os
prazos processuais não poder ser reeditados, fazendo com que os processos não se
prolonguem indevidamente60.
Contudo, uma ponderação deve ser frisada. Embora a busca por uma
prestação jurisdicional célere e eficaz deva ser um ideal buscado, quando esta
afrontar garantias processuais de ordem constitucional, igualmente importantes,

55
Artigo 8º do Pacto de São José da Costa Rica: “Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as
devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente
e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada
contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de
qualquer outra natureza.”
56
SANTOS, Carlos Fernando Fecchino Op. Cit. p. 45
57
Idem. Ibidem. p. 39
58
ALVIM, Eduardo Arruda. Curso de Direito Processual Civil. 1 v. Revista dos Tribunais: São
Paulo, 1999, p. 339
59
Idem. Ibidem. p. 339
60
Idem. Ibidem. p. 339
28

deve-se indubitavelmente aplicar o mecanismo inverso, desacelerando, portanto,


para que assim não gere um efeito indesejável na sociedade.
Portanto, o princípio da brevidade processual visa dar ao processo o menor
tempo possível com a melhor prestação jurisdicional pelo Estado, para assim
conferir efetividade às decisões judiciais, pois a lentidão pode transformar o princípio
da igualdade processual em coisa irrisória, vez que a morosidade gera a descrença
no Poder Judiciário.
Tudo isso não poderia gerar um resultado diferente. A pouca ou total
inaplicabilidade deste ditamente constitucional, visto a dificuldade de uma
ponderação perfeita.
Pensando nisso, Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e
Cândido Rangel Dinamarco elucidam que a garantia jurisdicional sem dilações
indevidas deve-se tornar o alvo de um devido processo legal61. “Justiça tardia não é
verdadeira justiça”62.
Para se determinar a duração razoável do processo, deve ser levado em
conta a complexidade do assunto, o comportamento dos litigantes e a atuação dos
órgãos jurisdicional63 e assim poderemos dizer, ao menos na teoria, que se tem o
processo bom e justo.
No mesmo loco, Cândido Dinamarco, antes mesmo da promulgação da
Emenda Constitucional nº 45, antenado às mudanças que urgiam, ressaltou que a
Constituição de 1988 trouxe à tona a necessidade de realizar-se um processo justo,
o qual produza resultados efetivos e tempestivos64.
Tais “problemas” poderão ter nova chance de serem corrigidos, vista o
Projeto de lei nº 166/201065. Caso aprovado, teremos ao menos no campo teórico

61
Tal assunto será tratado neste mesmo capítulo tópico VI – O Devido Processo Legal. O encontro
dos Princípios.
62
CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel.
Teoria Geral do Processo. 18 ed. Malheiros: 2002. p. 86
63
Idem. Ibidem. p. 86
64
DINAMARCO, Candido Rangel. A Reforma da Reforma. Malheiros: São Paulo, 2002, p. 29
65
Conforme será explanado no capítulo 4 deste trabalho, o projeto do novo código de processo civil,
atualmente em votação no Senado Federal, fez questão de positivar, em seu artigo 4º o princípio da
celeridade processual.
29

algumas mudanças quanto a relevância dada a este princípio. Resta saber se serão
efetivas.

2.3.1. A Emenda Constitucional n. 45

A Emenda Constitucional nº 45, conhecida, entre outros, por ter realizado


uma ampla reforma no Poder Judiciário, inseriu diversos mecanismos para melhorar,
tanto o acesso a justiça, quanto sua aplicação.
A reforma ocorreu de maneira que o constituinte derivado, preocupado em
dar efetividade ao princípio do acesso à justiça66, positivou o que a doutrina,
paralelamente já exigia. Adentrou ao corpo Constitucional, o princípio da celeridade
processual, acrescentando o inciso LXXVIII.
Portanto, esta onda renovatória, pode ser dividida em três vertentes: a
primeira em se tratando das melhorias na assistência judiciária, que aqui pouco
pode ser dita, pois não modificou o tempo do processo, apenas garantiu alguns
benefícios, como a acesso gratuito ao judiciário, entre outros.
Outra aba é vista no “propiciamento de uma representação judiciária para os
interesses difusos”67 em que o pedido de tutela jurisdicional, pode ser feito por um
titular de direito deduzido, por exemplo, a ação civil pública e ação popular. E por
fim, a “implementação de reformas nos aparelhos judiciais”68, criando uma série de

66
Sobre o Princípio do acesso a justiça é salutar trazer o pensamento do ilustre autor já citado: “Muito
já se discutiu, e muito se discute, sobre o princípio do acesso à justiça, que no Brasil, enquanto
Estado Democrático de Direito, encontra-se positivado e sob os auspícios do art. 5º, XXXV, da
CF/1988, in verbis: ‘a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
Literalmente, a análise do dispositivo constitucional supra leva a crer que o Poder Judiciário não
poderá deixar de apreciar nenhuma espécie de lesão a direito, nem sua ameaça, como se o princípio
do acesso à justiça a isso se limitasse.
Muito além, o princípio em comento abrange não apenas essa ‘não-exclusão’ da apreciação de
situações concretas, e às vezes em abstrato – como nas ações direta de inconstitucionalidade, cuja
legitimidade poucos possuem – mas também significa que o processo tem de ser efetivo.
Neste sentido, a mera consideração judicial da situação posta de nada serviria se dela não se
pudesse extrair uma gama de efetividade. (...) Assim, o princípio do acesso à justiça, repita-se, direito
constitucional e fundamental de todos, indubitavelmente, oportuniza a provocação do Poder Judiciário
para que, como poder estatal, análise as situações que lhe são colocadas.” (In: SANTOS, Carlos
Fernando Fecchino dos. Op. Cit. p.39)
67
Idem. Ibidem. p. 40
68
Idem. Ibidem. p. 40
30

instrumentos viabilizadores da efetivação do processo, mediante inserção de novos


institutos. Sendo aqui o nosso foco.
Neste sentido, Cândido Dinamarco reproduz:

É natural que uma Reforma Constitucional do Poder Judiciário atue


com expressiva intensidade sobre a ordem processual, dada a
notória filiação do direito processual à Constituição e dada a íntima
relação existente entre os modos de exercício da jurisdição e a
configuração funcional dos órgãos e organismos que a exercem
(organização judiciária). Só isso bastaria para que a recente emenda
constitucional n. 45, de 8 de dezembro de 2004, responsável pela
chamada Reforma do Poder Judiciário, tivesse relevante atuação
sobre o sistema do processo civil brasileiro, ao menos como reflexo
das alterações impostas á estrutura e funcionamento dos organismos
jurisdicionais. Mas também diretamente a nova emenda atuou sobre
o processo civil, ditando uma série de regras tipicamente processuais
relevantes69.

A referida emenda tem por objetivo, entre outros, inserir no rol dos direitos e
garantias fundamentais, expressamente, o direito público subjetivo à celeridade
processual. Sendo a consagração expressa, pela petrificação constitucional.
Torna-se notório, dada a disparidade existente entre a estrutura do Judiciário
e os avanços sociais, a necessidade de ser realizada uma mudança mais abrupta,
com a inserção, de alguns dispositivos, no próprio texto constitucional.

Com o propósito de reformar mais profundo que aquele declarado, a


emenda de 2004 apresenta, em síntese, esse complexo conteúdo
substancial: a) estabelece algumas – embora poucas – regras sobre
a estrutura desse Poder; b) institui a continuidade da atividade
jurisdicional, com a proibição de férias coletivas em todas as
Justiças; c) traz novas normas relacionadas com os deveres e
direitos dos magistrados, com especial realce para a chamada
quarentena; d) determina a criação e um órgão administrativo com
amplo poder disciplinar e censório, que é o Conselho Nacional de
Justiça; e) também manda instituir ouvidorias de justiça no âmbito
das Justiças da União e dos Estados, com a finalidade de captar os
sentimentos e reclamações dos cidadãos em relação aos órgãos
judiciários e canalizá-los inclusive ao Conselho Nacional de Justiça;
f) incluir entre as competências do Supremo Tribunal Federal a de
emitir súmulas vinculantes; g) alterar ligeiramente a competência
originária e recursal do Superior Tribunal de Justiça, em associações
com alguma alteração nas hipóteses de admissibilidade do recurso
extraordinário e do especial ao requisito da repercussão geral, que é

69
DINAMARCO, Cândido Rangel Dinamarco. Instituições do Direito Processual Civil I. 5 ed.
Malheiros: São Paulo, 2005, p. 32
31

uma represtinação da vestuta relevância da questão federal e


depende de regulamentação em lei; i) manda que a distribuição de
feitos e recursos seja imediata, em todo juízo ou tribunal; j)
recomenda o automatismo judiciário, para que juízes deleguem a
serventuários cestas atividades administrativas e atos de impulso
processual sem cunho decisório; k) traz uma série de disposições
referentes ao Ministério Público, buscando uma equivalência de seus
direitos, deveres e impedimentos aos direitos, deveres e
impedimentos dos magistrados; l) manda implantar um Conselho
Nacional do Ministério Público, e ouvidorias do Ministério Público,
com vista ao efetivo controle da Instituição e do comportamento de
seus integrantes70.

Contudo, não é de se espantar que, embora muitas mudanças tenham sido


anunciadas, não se solucionou todos os problemas do judiciário. Longe disso, as
suas modificações, aqui especificamente sendo tratada as processuais, trouxeram
significativas melhoras, mas que estão muito longe de resolver o déficit vivido
atualmente.
É necessário dotar o Poder Judiciário de uma estrutura apta a receber e
processar, com celeridade, as demandas judiciais. Para tanto, é cogente a
informatização completa da Máquina, como um aumento do número de magistrados
e servidores, além da realização periódica de cursos de qualificação para os
funcionários do Judiciário.
Outrossim, sinaliza a modificação na cultura dos Magistrados antes de mais
nada, focando a desformalização, em que a resolução dos conflitos, seja vista como
um propósito específico a ser atingido, ou seja, a realização do direito material.
Estando equivocado os que vislumbram o processo como uma realidade autônoma
e apartada de seu fim.
Por isso, mais que mudanças legislativas, é preciso mudanças fáticas, para
que as modificações que já se sucederam na lei passem a ser cumpridas com mais
afinco. Assim, as várias outras louváveis mudanças trazidas pela emenda, que,
isoladamente pouco ou nada contribuem pra a brevidade da lide, sejam então
efetivadas.
De qualquer modo, deve ser enaltecido o clamor que a referida emenda
trouxe à sociedade jurídica, na medida em que é dela o grande mérito de ter
conclamado os aplicadores do direto e até mesmo a sociedade como um todo a

70
Idem. Ibidem. pp. 33-34
32

discutir sobre o assunto, para se perceber algo muito simples: o que se busca,
afinal, é uma coisa só: pacificar os conflitos sociais de forma célere e com a máxima
realização de justiça.

2.4. O DEVIDO PROCESSO LEGAL. O ENCONTRO DOS PRINCÍPIOS

O processo caminha para um fim, a pacificação dos conflitos é nesta esfera


o devido processo legal. Neste sentido, a elaboração das leis deve obedecer a
critérios primadores do “senso de justiça”71 preservando sempre os preceitos
constitucionais de aplicação das normas.
Em um polo, o Estado apresenta o direito por meio de atos normativos
gerais e vinculados e, no outro, deve estar o mesmo Estado com artefatos que lhe
permita solucionar as controvérsias geradas por suas próprias normas promulgadas
ou pela diversidade de interpretação.
É exatamente a conjugação desses fatores, sendo a possibilidade de um
mesmo órgão, apresentado de forma tripartida, ao mesmo tempo elaborar um
dispositivo e ser o responsável por sua vedação, ou não aplicação, apenas em
determinados casos que demonstra um Poder Judiciário independente72.
Para isso, “utiliza mecanismos em que as partes são colocadas em pé de
igualdade quanto às oportunidades que lhe são oferecidas, remetendo o conceito de
processo justo”73.
Portanto, o devido processo legal em sentido processual, (procesural due
process) não indica somente a tutela processual. O conceito, segundo Nelson Nery,
temporalmente, vem sofrendo ampliações manifesta em todos os campos do
direito74. Sendo o dever de proporcionar ao litigante75:

71
Expressão utilizada pelo autor CRETELLA Neto, José. Op. Cit. p. 43
72
Idem. Ibidem. p. 43
73
Idem. Ibidem. p. 43
74
NERY JUNIOR, Nelson. Op. Cit. pp. 35-37
75
Essa base principiológica é ensinada por Nelson Nery, trazida do sistema processual norte
americano.
33

a) comunicação adequada sobre a recomendação ou base da ação


governamental; b) um juiz imparcial; c) a oportunidade de deduzir
defesa oral perante o juiz; d) a oportunidade de apresentar provas ao
juiz; e) a chance de reperguntar às testemunhas e de contrariar
provas que forem utilizadas contra o litigante; f) o direito de ter um
defensor no processo perante o juiz ou tribunal; g) uma decisão
fundamentada, com base no que consta dos autos76.

Ou seja, o devido processo legal abarca inúmeras garantias constitucionais,


as quais, não observadas, interferem, negativamente, no resultado final da lide.
Tal princípio está insculpido na Constituição Federal, reunindo muitas outras
garantias processuais e em razão dele são previstas uma série de garantias, tais
como: ampla defesa, contraditório, inafastabilidade do Poder Judiciário, duplo grau
de jurisdição, motivação das decisões judiciais, tempo razoável do processo,
razoabilidade, fungibilidade entre outros.

O devido processo legal é uma garantia do cidadão. Garantia


constitucionalmente prevista que assegura tanto o exercício do
direito de acesso ao Poder Judiciário como o desenvolvimento
processual de acordo com normas previamente estabelecidas.
Assim, pelo princípio do devido processo legal, a Constituição
garante a todos os cidadãos que a solução de seus conflitos
obedecerá aos mecanismos jurídicos de acesso e desenvolvimento
do processo, conforme previamente estabelecido77.

Neste mesmo sentido, Nelson Nery afirma que o princípio do due process of
Law é caracterizado pelo trinômio vida-liberdade-propriedade, servindo de
fundamento para todas as decisões com base constitucional, se manifestando em
todos os campos do direito, tanto material quanto processual. Tamanha importância
tem esse princípio que bastaria o artigo 5º da Constituição Federal ter mencionado o
princípio do due process of Law, teria contemplado grande parte das garantias
referida nos seus incisos.
Portanto, deve ser visto como um princípio agregador, uma vez que boa
parte dos ditames da justiça são necessários para se ter um devido processo legal.

76
Idem. Ibidem. p. 38.
77
PORTANOVA, Rui. Op. Cit. p. 145
34

No mesmo prisma, Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover


e Cândido Rangel Dinamarco afirmam:

Pode-se afirmar que a garantia do acesso à justiça, consagrado no


plano constitucional o próprio direito de ação (como direito à
prestação jurisdicional) e o direito de defesa (direito à adequada
resistência às pretensões adversárias), tem como conteúdo o direito
ao processo, com as garantias do devido processo legal. Por direito
ao processo não se pode entender a simples ordenação de atos,
através de um procedimento qualquer. O procedimento há de
realizar-se em contraditório, cercando-se de todas as garantias
necessárias para que as partes possam sustentar suas razões,
produzir provas, influir sobre a formação do convencimento do juiz. E
mais: para que esse procedimento, garantido pelo devido processo
legal, legitime o exercício jurisdicional78.

Por todo o exposto, torna-se salutar o entendimento das minúcias desse


princípio, cabendo ressaltar ainda, o que seria mais relevante em se tratando de
contraditório, ampla defesa e celeridade processual.

2.4.1 O princípio da motivação das decisões judiciais

Antes de adentrar ao conceito de motivação das decisões judiciais, cumpre


trazer o pensamento de Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e
Cândido Rangel Dinamarco:

A função política da motivação da decisão judicial, cujos destinatários


não são apenas as partes e o juiz competente para julgar eventual
recurso, mas quis-quis de populo, com a finalidade de aferir-se em
concreto a imparcialidade do juiz e a legalidade e justiça da decisão.
Por isso, diversas Constituições – como a belga, a italiana, a grega e
diversas latino-americanas – haviam erguido o princípio da
motivação à estatura constitucional, sendo agora seguida pela
brasileira de 1988, a qual veio adotar em norma expressa (art. 93, IX)
o princípio que antes se entendia defluir do § 4º do art. 153 da
Constituição de 196979.

78
CINTRA, Antônio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel
Op.Cit. p. 84
79
Idem. Ibidem. pp. 68-69
35

A decisão judicial deve cumprir seu papel na sociedade, antes mesmo de


acalorar os anseios da parte. Por isso, a relevância do exposto pelos autores.
Já, em se tratando do conceito cerne do princípio, melhor referência não
poderia se ter que o artigo 93, IX80, da Constituição de 88, o qual dispõe sobre a
necessidade das decisões judiciais serem motivadas, sob pena de nulidade. De
igual maneira, a previsão da norma infra-constitucional, no artigo 458, II81 e 16582 do
Código de Processo Civil, os quais tratam respectivamente da sentença e das
decisões judiciais.
E ainda que a lei não trouxesse expressamente, sua importância é tão
grande que é possível extrair sua interpretação, ainda que de forma implícita, do
modelo Político de Estado Democrático de Direito proposto pela Constituição83.
Neste mesmo prisma, Eduardo Arruda Alvim acalora o entendimento:

A necessidade da motivação das decisões judiciais, em rigor, nem


haveria de constar no texto constitucional, pois que decorre do
próprio Estado de Direito. E, ainda, do princípio do due process. (...)
Fundamentar significa dar as razões de fato e de direito que levaram
à tomada da decisão. A fundamentação deve ser substancial e não
meramente formal.
A sanção para a ausência de fundamentação é expressamente
cominada pelo próprio texto constitucional: nulidade de decisão84.

No mesmo sentido, Nelson Nery elucida:

A motivação da sentença pode ser analisada por vários aspectos,


que vão desde a necessidade de comunicação judicial, exercício de
lógica e atividade intelectual do juiz, até sua submissão, como ato
processual, ao estado de direito e às garantias constitucionais

80
Artigo 93. “Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto
da Magistratura, observados os seguintes princípios:
IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas
as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às
próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do
direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;”
81
Artigo 458. “São requisitos essenciais da sentença:
II - os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;”
82
Artigo 165. “As sentenças e acórdãos serão proferidos com observância do disposto no art. 458; as
demais decisões serão fundamentadas, ainda que de modo conciso.”
83
WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Op. Cit. p. 66
84
ALVIM, Eduardo Arruda Op. Cit. pp. 134-135
36

estampadas no art. 5º, CF, trazendo consequentemente a exigência


da imparcialidade do juiz, a publicidade das decisões judiciais, a
legalidade da mesma decisão, passando pelo princípio constitucional
da independência jurídica do magistrado, que pode decidir de acordo
com sua livre convicção, desde que motive as razões de seu
convencimento. (...)
Fundamentar significa o magistrado dar as razões, de fato e de
direito, que o convenceram a decidir a questão daquela maneira. A
fundamentação tem implicação substancial e não meramente formal,
donde é licito concluir que o juiz deve analisar as questões postas a
seu julgamento, exteriorizando a base fundamental de sua decisão85.

Como é possível ter uma decisão fundamentada sem que haja uma ampla
produção de prova e direito de defesa pelas partes?86
Para que a decisão esteja fundamentada, além de, por óbvio, dever o juiz
utilizar-se do mecanismo legal, ou seja, fazer uso da legislação, é preciso que ele
encontre fatos que demonstrem o real direito do autor ou outros impeditivo,
modificativos ou extintivos de seu direito, e assim, prevaleça as alegações do réu.
Consoante, para que isso possa ocorrer, deve haver artefatos no processo
possibilitadores dessa motivação. Ou seja, é importante que as partes tenham
tempo hábil para demonstrar o alegado e, portanto, todo o esforço movido, pelo
aparelho judiciário, partes e envolvidos, não sejam em vão.

2.4.2. O princípio da isonomia de tratamento entre as partes

O artigo 227, §3º, IV87 da Constituição Federal garante as partes o equilíbrio


que, por ventura, possa ser-lhe tirados por motivos alheios as suas vontades.

85
NERY JR., Nelson. Op. Cit. pp. 169-170
86
Ainda que se tenha conhecimento de que, quando diz o autor decisão substancialmente
fundamentada, estar-se-á querendo dizer, decisão fundamentada em respaldo jurídico, não apenas
embasada em documentos provas testemunhais, ressaltamos a importância da produção destas
provas para se encontrar o melhor instituto jurídico para ser aplicado.
87
Artigo 227. “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao
jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão. (...)
§ 3º - O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos: (...)
37

Neste diapasão, a célebre frase de Rui Barbosa, “tratar os desiguais na


medida de sua desigualdade” deve ser aplicada com perfeição.
Para tanto, o artigo 125, I88 do Código de Processo Civil proclama como
obrigação do juiz “assegurar as partes igualdade de tratamento”, e o artigo 9º, que
seja proporcionado ao incapaz, curador especial, que não tenha um ou que seus
interesses colidam com o seu representante.
Tais artigos servem como exemplo para entender que igualdade é esta. Não
necessariamente trata-se todos da mesma maneira, mas sim tratá-los de maneira
diferente na medida proporcional de suas diferenças, para assim termos igualdade
de aplicação.
Outrossim, a igualdade deve ser primada também nas decisões. O princípio,
segundo Marinoni, se refere no mesmo sentido a forma como são decididas as
questões. A sociedade não pode e nem deve se contentar com a “sorte” para que
tenha uma decisão favorável ou contrária, dependendo da vara que for distribuída
sua lide.
Pensando nisso, Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e
Cândido Rangel Dinamarco, trazem à tona:

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (...) prevê, no art.


8.1: ‘toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias
e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente,
independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na
apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para
que se determine seus direitos ou obrigações de natureza civil,
trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza89.

Não é a toa que os autores fazem tal consideração. Não basta a dita
igualdade jurídica caso haja desigualdade econômica, pois assim de forma desigual,

IV - garantia de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, igualdade na relação


processual e defesa técnica por profissional habilitado, segundo dispuser a legislação tutelar
específica;”
88
Artigo 125. “O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, competindo-lhe:
I - Assegurar às partes igualdade de tratamento;”
89
CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel
Op.Cit. p. 53
38

configurarão as partes no processo, fazendo-se necessário cumprir a igualdade


substancial, ou ainda melhor se fala hoje, a igualdade proporcional90.
Conforme já tratado, um processo somente será considerado justo em sua
plenitude, ainda que para alguns doutrinadores isso seja visto de forma utópica,
quando o autor e o réu possuírem os mesmos meios para comprovar os fatos
alegados91.
Neste diapasão, Eduardo Arruda Alvim faz um importante comentário, na
medida em liga a igualdade de tratamento com a celeridade processual, fazendo
uma ponte entre os dois conceitos:

O principio da brevidade, de certa forma, pode entroncar-se com o da


paridade de tratamento, pois, se uma parte é diligente, praticando os
atos que lhe incumbem dentro dos prazos, se fosse permitir a prática
de atos, pela outra parte, depois de escoado o prazo, esta última
estaria virtualmente tendo uma vantagem que a outra não teve92.

Não de forma excludente do trazido por Eduardo Alvim, mas com uma
conotação diferente, Nelson Nery Jr. elucida sobre a interligação entre a brevidade e
a possibilidade de defesa das partes:

O princípio do contraditório, além de fundamentalmente constituir-se


em manifestação do princípio do estado de direito, tem intima ligação
com o da igualdade das partes e do direito de ação, pois o texto
constitucional, ao garantir aos litigantes o contraditório e a ampla
defesa, quer significar que tanto o direito de ação, quanto o direito de
defesa são manifestações do princípio do contraditório93.

Assim, portanto, deve ser visto o princípio da igualdade, como uma forma de
preservação do direito das partes, de possibilidade de garantia de pilares da justiça
e de demonstrar os fatos por elas declarados.

90
Idem Ibidem. p. 54
92
ALVIM, Eduardo Arruda Op. Cit. p.339
93
NERY JR., Nelson. Op. Cit. 131
39

3. CELERIDADE VERSUS AMPLA DEFESA. A DICOTOMIA PROCESSUAL

Antes de adentrar no assunto propriamente dito, cumpre esclarecer a


diferenciação entre dois sistemas, que, embora aparentemente opostos, não se
pode dizer que sejam exclusivos. E, ao serem entendidos, explicaram boa parte das
questões trazidas sobre o tempo do processo.

3.1. O SISTEMA DISPOSITIVO E O SISTEMA INQUISITÓRIO

Apresentada ao sistema brasileiro por Jacinto Nelson de Miranda Coutinho,


a classificação em sistema inquisitivo e sistema dispositivo explica grande parte do
nosso sistema processual vigente. Nesta medida, tais considerações são tecidas
para explicar que, antes de ser uma questão jurídica, o tempo do processo é uma
questão política.
A forma como o processo é dividido e as regeis do comando são ditadas
pelo sistema que foi adotado como base.
Em se tratando do dispositivo, temos que o juiz deve julgar a causa com
base nos fatos e direitos alegados pelas partes, proibindo o julgador de buscar
acontecimentos não alegados e basear-se em provas não postulada pelas partes. O
que vincula o julgador a considerar o alegado pela parte, e não contestado pela
outra, como verdade absoluta.
Para tanto, o autor ensina:

Segundo este princípio o juiz deve julgar a causa com base nos fatos
alegados e provados pelas partes (iudex iudicare debet allegata et
probata partium), sendo-lhe vedada a busca de fatos não alegados e
cuja prova não tenha sido postulada pelas partes. Tal princípio
vincula duplamente o Juiz aos fatos alegados, impedindo-o de decidir
a causa com base em fatos que as partes não hajam afirmado e
obrigando-o a considerar a situação de fato afirmada por todas as
partes como verdadeiras94.

94
SILVA, Ovídio A. Baptista; GOMES, Fábio. Teoria Geral do Processo Civil. 3 ed. Revista dos
Tribunais: São Paulo, 2002, p. 47
40

Já em se tratando de princípio inquisitivo, o juiz pode tomar a iniciativa


probatória para a comprovação de fatos alegados pelas partes, ainda que não tenha
sido requerido por parte dos litigantes.
Segundo este sistema, compete ao juiz a iniciativa da prova, para a
determinação dos fatos postos pela parte como fundamento da demanda. Tal
sistema é reconhecido quando o juiz tem o poder de limitar ou ampliar o poder
probatório95.
Contudo, ainda que em campos opostos, estes sistemas não devem ser
tidos de forma absoluta. Neste sentido, Ovídio Baptista96 diz que tais mecanismos,
ainda que, com mais preponderância, não ocorrem de modo exclusivo em nenhum
sistema processual97.

Esses princípios não ocorrem de modo exclusivo em nenhum


sistema processual, sendo normal que o legislador de ambos se
utilize, dando prevalência ora a um deles ora a outro.
Desta forma, mesmo naqueles sistemas mais comprometidos com o
princípio dispositivo, onde o juiz tenha limitado poderes de iniciativa
probatória, encontra-se exemplos de aplicação do princípio
inquisitivo. (...)
No direito brasileiro, pode-se dizer que ainda vigora o princípio
dispositivo como regra fundamental, ou como simples princípio
diretivo, sujeito, porém, a severas limitações previstas pelo legislador
em inúmeros dispositivos legais que o abrandam
consideravelmente98.

Portanto, ao verificar o artigo 33399 do Código de Processo Civil teremos


que o ônus probatório incumbe às partes, cabendo ao autor fazer prova dos fatos

95
Idem. Ibidem. p. 47
96
O autor chama este sistema de princípio inquisitivo e princípio dispositivo. Tal classificação, em
hipótese alguma deve ser comparada com o conceito trazido por Alexy e adotado no presente
trabalho. O autor apenas adora uma nomenclatura diferenciada, mas que, no presente trabalho deve
ser entendido como sistema.
97
Idem. Ibidem. p. 45
98
SILVA, Ovídio A. Baptista. Curso de Processo Civil. v 1. 5 ed. Revista dos Tribunais: São Paulo.
2001. p. 62
99
Artigo 333. “O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
Parágrafo único. É nula a convenção que distribui de maneira diversa o ônus da prova quando:
I - recair sobre direito indisponível da parte;
II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.”
41

constitutivos de seu direito e ao réu dos impeditivos modificativo ou extintivo do


direito do autor.
Neste ponto, cumpre a importância da ampla possibilidade de defesa da
parte. Pois, em se tratando de prevalência do princípio dispositivo pelo sistema
brasileiro, sendo legitimado pela preservação da imparcialidade do juiz, não poderá
a parte, seja autor, seja réu, ter minimamente seu direito de defesa cerceado, uma
vez que somente esta oportunidade terá de evidenciar os fatos alegados.

3.2. O PROCESSO E O TEMPO. UMA QUESTÃO A SER ANALISADA

Muitas razões podem ser atribuídas como causa para a crise da longa
duração do processo, fazendo com que sempre estejamos em busca de reformas.
Contudo, todas essas mudanças modificam pouco ou nada na realidade judiciária
vivenciada diariamente nos fóruns e tribunais brasileiros.
Neste sentido, Gajardoni100 faz uma importante crítica ao sistema como se
apresenta atualmente por ser em grande medida ineficaz.
Ao se invocar a tutela jurisdicional, ainda que oferecida verdadeiramente,
quando obtida tardia, já não ter o cordão de recompor as relações sociais, não
recobrindo o status quo ante.
Sendo assim, mesmo diante de conflitos, direitos e garantias já conhecidos
e, há muito contempladas no direito material, o fato é que o processo tradicional não
tem sido capaz de solucionar tempestivamente os impasses e assegurar,
eficazmente, as situações jurídicas de vantagem, os quais tem gerado dados
alarmantes.
Barbosa Moreira, em uma ferrenha crítica a duração dos processos, diz ser
“generalizada a convicção de que os processos judiciais duram bem mais do que
seria razoável”101, traz a tona dados alarmantes, o problema tornou-se tão grave

100
GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Op. Cit. p. 33
101
MOREIRA, José Carlos Barbosa. A Duração dos Processos. Revista Síntese de Direito Civil e
Processo Civil. v. 5, n. 29, maio/jun, 2004, p. 28
42

que atinge, atualmente, desde o velho continente até países cuja fama de primar
pelo curto tempo do processo está em sua base.

O problema, na verdade, é universal e multissecular. Em passado


longínquo, no início do século XIV, tornou-se necessária a
intervenção do Papa CLEMENTE V a criar um procedimento sumário
para determinar causas, tão alto era o grau de insatisfação com a
morosidade do processo102.

Neste diapasão, vemos que a crise, de lá pra cá, só piorou, bem como a
insatisfação, que consequentemente gera a descredibilidade da população para com
a justiça. Segundo estatísticas trazidas pelo autor, o país que se encontra em pior
situação (do continente europeu), é a Itália. O que por si só é um grande paradoxo,
visto ser dela a doutrina de maior repercussão no âmbito processual103.
Não muito distante, ainda que sejam os países de melhores dados, está a
França e a Alemanha. Quanto àquele, com relação aos anos de 1995-1999 temos
apontado uma duração média de 9,1 meses para as causas que tramitam perante o
tribunaux de grande instence (órgão de primeira instância, com competência
comum, ou seja, com atribuição residual). Tais estatísticas foram repetidas nos dois
anos seguintes104.

102
Idem. Ibidem. p. 29
103
“No relatório sobre a administração da Justiça, apresentado pelo Procurador-Geral junto à Corte di
Cassazione, na inauguração do ano judiciário de 2003, lê-se que a preocupante situação configura
‘crise que existe e pendura já há muitos decênios’. Não destoa o relatório mais recente, datado da
inauguração do ano judiciário de 2004: a Justiça italiana está inegavelmente ainda em crise,
sobretudo por causa de sua escassa eficiência e da excessiva duração dos processos’.
Reforma legislativa de 1991 introduziu juízo monocrático de primeiro grau (denominado giudice di
place); e os processos instaurados perante esse órgão – cuja competência, vale ressaltar se limita
quase exclusivamente às pequenas causas – duram bem menos que os atribuídos aos outros juízos
de primeira instância. O ritmo dos restantes, porém, não dá sinal de ter experimentado melhoras
sensíveis, de modo que o panorama global permaneça carregado de nuvens. A luz do relatório de
2003, a duração média dos pleitos, em primeiro grau de jurisdição, seria de 337 dias (quer dizer,
pouco mais de 11 meses) no âmbito dos giudici di place, mas triplicando no dos tribunali; noutra
passagem, fala-se de uma duração média superior a 3 anos. O relatório de 2004 informa que, nos
processos de competência dos tribunali, ela decresceu de 953 para 879 dias, isto é, cerca de dois
anos e 5 meses; em compensação, houve ligeiro aumento no campo dos processos realizados
perante o giudice di place, onde aquela duração, em todo caso, continua inferior a 1 ano. Segundo
fonte fidedigna, só em 2002 a Itália foi condenada pela Corte de Estrasburgo, por excesso de demora
na prestação jurisdicional, nada menos de 289 vezes, muitas das quais em processo civis.” (In: Idem.
Ibidem. pp. 29-30)
104
Idem. Ibidem. p. 30
43

Em se tratando da justiça alemã, tem-se um critério de divisão um pouco


diferenciado. Grosseiramente explicando, entre os órgãos de primeira instância de
1998 a 2000, terminaram antes de um ano, cerca de 94% dos processos instaurados
na Amtsgericht, e 85% - 86% dos instaurados perante os Landgerichte.
Merece mesmo destaque os dados da jurisdição na Inglaterra:

Até alguns anos atrás, embora tida como de boa qualidade, a Justiça
inglesa no consenso dos especialistas, era lenta e muito cara. (...)
Com referencia ao ano de 1990, fonte autorizada aponta uma
distancia média de 145,3 semanas (ou sejam, 2,78 anos) entre o
começo e a extinção do processo, quer chegasse, quer não (como
ocorreria na maior parte dos casos), à sessão de julgamento (trial).
De algum tempo para cá, o sistema começou a passar por
modificações importantes. As reformas culminaram com a edição de
um Código de Processo Civil (...) Sob a denominação de Civil
Procedure Rules, o código entrou em vigor em abril de 1999 e,
conforme depoimento dignos de crédito, vem produzindo impacto
benéfico na realidade forense inglesa, notadamente no que tange à
demora dos processos105.

Estes números não parecem nenhum pouco alarmante se pensarmos na


nossa situação, vez que pouco mais de nove meses para o grau de jurisdição é
marca que não soa mal aos ouvidos brasileiros. (Ainda que as informações não
estejam completamente atualizadas), inevitavelmente, gera uma indagação de como
está o nosso sistema atualmente.
De qualquer maneira, quando falamos em números na justiça brasileira, é
notório, por exemplo, que no Rio de Janeiro, especialmente em primeira instância,
os processos são absurdamente lentos. Mesmo que sem dados precisos, em razão
da escassez de pesquisas – “as estatísticas judiciárias ou inexistem, ou não
recebem a necessária divulgação, ou não se mostram confiáveis”106 – qualquer
tentativa de expressar numericamente o descompasso, torna-se imprecisa107.
Em todo caso, a duração média dos processos, especialmente nas Varas
Cíveis do Rio de Janeiro, a qual trata de processos de competência comum, o tempo
médio de duração de uma lide foi de 410 dias, isto é 13,7 meses, entre 2000 a 2002.

105
Idem. Ibidem pp. 31-32
106
Idem. Ibidem. p. 28
107
Idem. Ibidem. p. 33
44

Tal dado não é de todo ruim, contudo torna-se claro que estas estatísticas
não devem ser lavadas a cabo em todo território nacional, variando principalmente,
nas comarcas do interior.
Cumpre esclarecer ainda, quando falamos em recursos, estes números
tornam-se ainda pior. Estimativa aponta que uma apelação costuma demorar de três
a quatro anos só para ser distribuída ao relator, no Tribunal de Justiça de São
Paulo.108 109
Entretanto, muito longe disso, Gajardoni, entende que ao se falar em
duração média do litígio judicial, esta não deve ultrapassar um ano, considerando
esse tempo como já demasiado e para isso, o autor mexe em um ponto importante
do judiciário brasileiro: os prazos para os magistrados.

Ao lado da efetividade do resultado, imperioso é também que a


decisão do processos seja tempestiva. É inegável ‘que, quanto mais
distante da ocasião tecnicamente propicia for proferida a sentença, a
respectiva eficácia será proporcionalmente mais fraca e ilusória’110,

108
“Em matéria de recursos, aumenta a dificuldade de análise, em razão da extrema diversidade
entre os ordenamentos e, mesmo dentro de cada qual, entre os vários procedimentos recursais. No
direito brasileiro, por exemplo, não tem sentido tomar dados referentes ao agravo (recurso cabível
contra as decisões não finais de primeiro grau) e à apelação (recurso cabível contra a sentença), tão
grande é a diferença das respectivas características e, por conseguinte, o tempo presumivelmente
necessário para o processamento e julgamento de um e de outro. Qualquer ‘média’ que se apontasse
careceria de significação.
Ademais, afigura-se menos difundido, à luz da minha parca experiência, os dados atinentes ao
campo recursal. Eles são referidos aqui e ali, em regra com menor sistematização, e devem ser vistos
como mais aleatórios. Em todo caso, das fontes consultadas emergem pontos interessantes. Por
exemplo: segundo se informa na conferência da professora FERRAND (nº 8), a duração média dos
processos perante a Cour de Cassation – órgão de cúpula da Justiça francesa – foi, em 2001, de 24,8
meses, quer dizer, bem superior ao dobro de duração em primeira instância. O dado não deixa de ser
curioso, se se tiver em mente que o número de feitos que chegam até a Cour de Cassation há de
representar pequena percentagem total. Quanto a Itália, ainda na mesma conferência supracitada,
noticia TARUFFO que a duração média total por pleitos, em 1996, computadas a instancias da
apelação e a pendência na Corte di Cassazione, era de 116 meses ( mais de 9 anos e meio) –, a
maior da Europa, no dizer do autor. Não se distancia dessa estimativa a contida em artigo também
recente: média de 10 anos.
Infelizmente, não foi possível localizar , sobre o assunto, estatísticas brasileiras abrangentes. As
tabelas do TJRJ contém dados sobre a duração da pendência dos vários recursos, cíveis e criminais.
Deixo aqui de lado a matéria criminal, para não exagerar na mistura, já inevitável, em certa medida,
de alhos e bugalhos. Focalizo o recurso civil por excelência, que é a apelação, verifica-se que o
tempo médio entre a autuação e o julgamento tem sido, em 2001, de 182 dias; em 2002, de 171 dias
– oscilando, pois, em torno de 6 meses. Os números não entusiasmam quem, como o palestrante,
exerceu judicatura por 15 anos na 5º Câmara Cível quase sempre levada a palma às outras no que
tange à rapidez – posso afirmá-lo sem jactância, por ser apenas um dentre cinco desembargadores,
da sorte que o merecimento era coletivo.” (In: Idem. Ibidem. pp. 34-35)
109
Estes dados são de 2003 a 2004, antes mesmo do surgimento do CNJ e da meta 2.
45

pois ‘um julgamento tardio irá perdendo progressivamente seu


sentido reparador, na medida em que se postergue o momento do
reconhecimento judicial do direito; e transcorrido o tempo razoável
para resolver a causa, qualquer solução será, de modo inexorável,
injusta, por maior que seja o mérito cientifico do conteúdo da
decisão’. Conforme já se assinalou no passado, para que a justiça
seja injusta, não é necessário que atue equivocadamente. Basta que
não julgue quando deva111.

Sobre isso, severo é o autor ao criticar a falta de rigor com relação aos
prazos impróprios, na medida em que não faz cumprir o artigo 262 do Código de
Processo Civil brasileiro que diz que “o processo começa por iniciativa das partes,
mas se desenvolve por impulso oficial”.
No mesmo diapasão, Carreira Alvim, completa:

O direito processual, tanto quanto o material, comporta abusos,


sendo que o cometido no processo é mais pernicioso que o
perpetrado contra o direito mesmo, uma vez que, além das partes,
atinge o próprio Estado, na sua tarefa de distribuir justiça, tornando
morosa a prestação jurisdicional112.

Para tanto, concluí-se que nosso sistema é demasiadamente rigoroso com


em relação aos prazos referentes às partes, e soberbamente permissivo em relação
aos prazos referentes aos órgãos judiciários113.

Ao lado da efetividade do resultado, imperioso é também que a


decisão do processos seja tempestiva. É inegável ‘que, quanto mais
distante da ocasião tecnicamente propicia for proferida a sentença, a
respectiva eficácia será proporcionalmente mais fraca e ilusória’114,

110
TUCCI, José Rogério Cruz, Garantia do processo sem dilação indevidas, Garantias
constitucionais do processo civil, Homenagem aos 10 anos da Constituição Federal de 1988.
Revista dos Tribunais: São Paulo, 1989, pp. 235-236. Aput GAJARDONI, Fernando da Fonseca Op.
Cit. p. 34-35
111
GAJARDONI, Fernando da Fonseca Op. Cit. p. 47
112
ALVIM, Carreira. Código de Processo Civil Reformado. 3 ed. Del Rey: Belo Horizonte, 1996, p.
124.
113
GAJARDONI, Fernando da Op. Cit. p. 59
114
TUCCI, José Rogério Cruz, Garantia do processo sem dilação indevidas, Garantias
constitucionais do processo civil, Homenagem aos 10 anos da Constituição Federal de 1988.
Revista dos Tribunais: São Paulo, 1989, pp 235-236 Aput GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Op.
Cit. p. 59
46

pois ‘um julgamento tardio irá perdendo progressivamente seu


sentido reparador, na medida em que se postergue o momento do
reconhecimento judicial do direito; e transcorrido o tempo razoável
para resolver a causa, qualquer solução será, de modo inexorável,
injusta, por maior que seja o mérito científico do conteúdo da
decisão’. Conforme já se assinalou no passado, para que a justiça
seja injusta, não é necessário que atue equivocadamente. Basta que
não julgue quando deva115.

Contudo, até agora não há dados oficiais sobre o que seria um prazo
razoável para a duração do processo, não havendo parâmetro concreto de um lapso
temporal ideal, sem dilações indevidas116.
Não há critérios universais absolutos, como vimos, na Europa, por exemplo,
cada país adota parâmetros individuais. Já nos Estados Unidos, busca-se uma
rapidez na resolução dos litígios que pode deixar dúvida da eficiência ou não do
sistema117. 118
Outros problemas são igualmente evidenciados, tais como o acúmulo de
serviço oriundo do grande número de demandas pendentes no judiciário, somando-
se a pequena quantidade de juízes, faz com que a brevidade processual, ainda que
constitucionalmente garantida, não consiga ser efetivada.
A questão que fica de toda essa problemática seria: é possível uma decisão
justa, condizendo ao máximo com a verdade real dos fatos, e, em um tempo tão
curto?

115
GAJARDONI, Fernando da Fonseca Op. Cit. p. 47
116
Idem. Ibidem. p. 57
117
A título de curiosidade: A American Bar Association publicou, (...) o tempo tolerável de duração
dos processos nos tribuanis ordinários da justiça norte-americana. De acordo com a tabela de
referida associação:
Casos cíveis em geral: 90% devem ser iniciados, processados e concluídos dentro de 12 meses;
sendo que os 19% restantes, em decorrência de circunstancias excepcionais, dentro de 24 meses;
Casos cíveis sumários: Processados perante juizados de pequenas causas (small claims), devendo
ser finalizados e 30 dias; e
Relações domesticas: 90% das pendências devem ser iniciadas e julgadas, ou encerradas de outro
modo, no prazo de 30 dias; 98%, dentro de 6 meses e 100% em uma ano. (in: TUCCI, José Rogério
Cruz. Garantias constitucionais do processo Civil. Revista dos Tribunais: São Paulo, 1989. p. 249)
118
Tal consideração é feita apenas como dado numérico, uma vez que reconhecemos a diferença
sistemática e conceitual entre o objetivo do processo na visão norte-america e a latino- americana. A
intenção aqui não é aprofundar a pesquisa em tal sistema, apenas trazer as diferenciações entre
conceitos do princípio da brevidade processual nos vários sistemas processuais.
47

O Poder Judiciário tem caminhado no sentido oposto, o acúmulo excessivo


de processos intermináveis pendurado no judiciário brasileiro gera a descrédito no
instituto.
Para tanto, Gajardoni censura boa parte da doutrina brasileira que considera
o quesito tempo algo irrelevante na busca pela verdade real. Para ele, isso ocorre
basicamente por:

Não se tratar de um tema propriamente jurídico, grande parcela da


doutrina brasileira sempre encarou a questão do tempo no processo
– a sua duração – como algo, se não irrelevante, de importância
marcadamente secundaria.
Contudo, o doutrinador que imagina que a questão da duração do
processo é irrelevante e não tem importância cientifica não é só
alheio ao mundo em que vive, como também não tem a capacidade
de perceber que o tempo do processo é fundamento dogmático de
vários importantes temas do processo contemporâneo (tutela
antecipada, ação monitoria, Juizado Especial, entre outros)119.

A verdade é que: o processo somente chegará perto de seu objetivo primeiro


se for possível de ser desenvolvido rapidamente, pois a excessiva demora, mesmo
que ao final traga uma decisão segura, acaba por gerar as partes litigantes,
principalmente ao vencedor da demanda um dano marginal que poderá ser maior
que um principal.
Sendo assim,

O grande desafio do processo civil contemporâneo reside no


equacionamento desses dois valores: tempo e segurança. A decisão
judiciária tem que compor o litígio no menor tempo possível. Mas
deve respeitar também as garantias da defesa, sem as quais não
haverá decisão segura. Celeridade não pode ser confundida com
precipitação. Segurança não pode ser confundida com
eternização120.

119
GAJARDONI, Fernando da Fonseca Op. Cit. pp. 38-39
120
Idem Ibidem. p. 41
48

Este problema pode ser ainda agravado quando pensamos que nem sempre
os partícipes da lide estão dispostos a uma solução rápida121. Sendo outro ultrajante
da morosidade processual à litigância de má-fé.
Para se buscar a agilidade como foco, não basta apenas entender e aplicar
o princípio da celeridade processual, é de fundamental importância, e aqui,
novamente gera divergência doutrinária, classificar o que seria um processo rápido e
seguro, conforme dito, não temos dados fidedignos.
Apesar de tratarem ambos de princípios constitucionais, como já elucidado,
suas naturezas, por si só são excludentes.

Não há relatos, até a presente data, de um só sistema que tenha


conciliado tão bem essas forças (celeridade X segurança), a ponto
de satisfizer plenamente os jurisdicionados122. 123

A fórmula mítica encontrada para maquiar a solução desse problema foi


desmistificar a idéia de que, a denominada “efetividade do processo com celeridade
em sua tramitação” está vinculada a uma urgencialidade na prestação jurisdicional.
Busca-se reorganizar os institutos jurídicos do processo, da jurisdição, da
efetividade, da legitimidade das decisões judiciais e do devido processo legal, visto
indispensáveis à compreensão do Estado de Direito Democrático na pós-
modernidade124.

121
Cabe aqui uma breve consideração: apesar de não ser o tema do presente trabalho, não poderia
deixar de ser tocado. A demora do judiciário é aumentada, consideravelmente, devido a falta de
vontade, a má-fé de uma das partes.
Uma das inovações já trazidas nas últimas reformas do código de processo civil foi positivar a má-fé
e puní-la. Ainda que não perfeitamente, tem-se caminhado para uma maior vigilância matéria e
processual.
122
GAJARDONI, Fernando da Fonseca Op. Cit. p.42
123
Cumpre ressaltar que “dados da própria Corte Européia revelam que o direito humano mais
violado, conseqüentemente o mais tutelado, é o constante no artigo 6.1 da Convenção de Roma, ou
seja, o direito a uma tempestiva tutela jurisdicional. Só para termos uma idéia, em 1999, dos 177
casos apreciados pela Corte, 137 reclamavam de violação a referida garantia (77%). Desses 137, foi
constatada violação em 83 (61%), sendo quem em outros 34 processos (23%), o Estado ofensor e o
jurisdicionado se compusera amigavelmente, sem oportunidade para que o Tribunal supranacional
declarasse, ou não, violado o direito. Em apenas 7 casos apreciados (5%), decidiu a Corte não ter
havido violação ao artigo 6.1 da conversão, tendo, nos demais 15 processos analisados no período
(11%), se declarado sem jurisdição, ou admitido ter sido apresentada a reclamação intempestiva”. (In:
Fonte Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. Aput GAJARDONI, Fernando da Fonseca Op. Cit. p.
51)
49

Tereza Arruda Alvim corrobora para o enriquecimento da discussão ao dizer


que:

Efetividade dos resultados do processo significa que o direito


processual civil deve construir instrumentos que sejam aptos a
proporcionar precisamente aquilo que o cumprimento de uma
obrigação ou obediência ao dever proporcionaria se não tivesse
havido ilícito algum125.

Portanto, muito mais que diminuição dos recursos, a morosidade deve ser
combatida com uma reforma sistêmica do judiciário.

3.3. MECANISMOS DE ACELERAÇÃO PROCESSUAIS MODERNOS

Não há dúvida que todos queremos um processo rápido e seguro, em que


os atos processuais são realizados no momento oportuno, preservando o binômio
rapidez e eficácia, ou seja, atendendo seu fim126.
Segundo Paulo Cézar Pinheiro Carneiro, citado por Alvaro Couri Antunes
Sousa:

O dilema de ontem, entre a segurança e a celeridade, hoje é um


falso dilema. A rapidez, sem dúvida, deve ser priorizada, com o
mínimo de sacrifício da segurança dos julgados. Da exacerbação do
fator segurança, como ocorre em regra no nosso sistema, não
decorre maior justiça das decisões. É perfeitamente possível priorizar
a rapidez e ao mesmo tempo assegurar justiça, permitindo que o
vencedor seja aquele que efetivamente tem razão127.

Neste diapasão, uns sem-números de exemplos podem ser trazidos, quando


da leitura dos autores que tratam da celeridade processual. Portanto “desnecessário

124
<http://www.conpedi.org.br/manaus////arquivos/anais/salvador/isabella_saldanha_de_sousa.pdf>
Acessado em 03/09/2010. As 18h25min
125
LOPES, João Batista. Tutela Antecipada e o art. 273 do CPC Coordenadora WAMBIER, Teresa
Arruda Alvim. Aspectos Polêmicos da Antecipação de Tutela. Revista dos Tribunais: São Paulo,
1997, pp. 206-209
126
TUCCI, José Rogério Cruz e. Tempo e Processo: Uma análise empírica das repercussões do
tempo na fenomenologia processual (civil e penal). Revista dos Tribunais, São Paulo, 1997, p.14
127
Idem. Ibidem. p. 118
50

repetir que o fator que permeia a noção de processo judicial, constitui, desde há
muito, a mola propulsora do principal motivo da crise da justiça”128. O tempo129.

O tempo é a dimensão fundamental na vida humana, no processo


desempenha ele idêntico papel, não somente porque, como já dizia
Carnelutti, processo é vida, mas também porquanto, tendente o
processo a atingir seu fim moral com a máxima presteza, a demora
na sua conclusão é sempre detrimental, principalmente às partes
mais pobres ou fracas, que constituem a imensa maioria da nossa
população, para as quais a demora em receber a restituição de suas
pequenas economias pode representar angústias psicológicas e
econômicas, problemas familiares e, em não poucas vezes, fome e
miséria130.

Com o intuito de atender com mais rapidez às causas, o Conselho Nacional


de Justiça criou, em 2009, um novo método de aceleração, batizado de Meta 2.
Nesta política judiciária, o juiz tem um prazo real para sentenciar os
processos de acordo com o ano da distribuição da exordial131.

128
Idem, Ibidem. pp. 15-16
129
Partindo para uma análise um tanto quanto filosófica, José Rogério Cruz e Tucci faz uma
apreciação sobre o tempo: “Afirmou Heidegger em 1924, em uma conferencia perante a Sociedade
Teológica de Marburgo: ‘Se o tempo encontra o seu sentido na eternidade, é preciso então que seja
compreendido a partir dela... Pelo mesmo motivo, o ponto de partida e caminhando de uma tal
pesquisa estariam previamente delineados: da eternidade ao tempo. E acrescentava que, nesse
caso, ‘é o teólogo o verdadeiro especialista do tempo’, uma vez que trata do ser temporal do homem
em sua relação com Deus.
O conhecimento do tempo é, pois, enigma ou, ‘para utilizar a célere expressão de Santo Agostinho,
um saber que se tem antes de se pensar nisso, e que logo se desconhece ao pensar-se o que é o
tempo... É ainda o paradoxo êxtases do tempo na sua evanescência: o passado que já não é, o futuro
que ainda não é e o presente que é fluente de um ao outro...’”. ( In: Rafael A. Bielsa e Eduardo R.
Graña, El tiempo y El proceso, in Revista Del Colégio de Abogado de La Plata, 55 (1994): 185. V., em
senso idêntico, Oscar G. Chase, Civil Litigation delay in Italy and the United States, in The American
journal of comparative law, 36 (1988): 41 Aput TUCCI, José Rogério Cruz e. Op. Cit. p.14)
130
MARINONI, Luiz Guilherme. O direito à adequada tutela jurisdicional. RT, 1991, v. 663, ano 80.
São Paulo, p .244
131
No 2º Encontro Nacional do Judiciário, realizado no dia 16 de fevereiro, em Belo Horizonte (MG),
os tribunais brasileiros traçaram 10 metas que o Judiciário deve atingir no ano de 2009 para
proporcionar maior agilidade e eficiência à tramitação dos processos, melhorar a qualidade do serviço
jurisdicional prestado e ampliar o acesso do cidadão brasileiro à justiça.
Atualmente, o Judiciário está empenhado em alcançar a Meta 2: “Identificar os processos judiciais
mais antigos e adotar medidas concretas para o julgamento de todos os distribuídos até 31.12.2005
(em 1º, 2º grau ou tribunais superiores)”. O objetivo é assegurar o direito constitucional à “razoável
duração do processo judicial”, o fortalecimento da democracia, além de eliminar os estoques de
processos responsáveis pelas altas taxas de congestionamento.
Neste sentido, os tribunais e associações sob a coordenação do Conselho Nacional de Justiça,
criaram a campanha “Meta 2: bater recordes é garantir direitos”. Trata-se de um desafio que o
51

Contudo, o Professor José Miguel Garcia Medina132 faz relevantes


considerações sobre o assunto:

Para mim, o que mais preocupa é que a ênfase da Meta 2 está na


quantidade, está em resolver um problema de números. Quando
alguém fala em qualidade, é para dizer que para se alcançar a Meta
2 não se poderá esperar que as decisões judiciais sejam tão boas.
Como disse Miguel Kfouri Neto: ‘juiz não é máquina. Sentença não
se faz alimentando o computador e esperando sair algo pronto. Exige
trabalho, pesquisa. Além disso, é preciso amadurecer a decisão,
debruçar-se sobre a questão’.
Claro que algo deve ser feito, para se reduzir a quantidade muito
grande de processos que tramitam no Poder Judiciário. Mas fico
incomodado em perceber que, ao invés de se dar primazia a
aspectos qualitativos, nós estejamos nos contentando com
elementos exteriores. Certamente, ao final, serão divulgados os
números (sempre eles…) alcançados com a Meta 2, e todos
comemorarão. Mas a vida das pessoas não é apenas um número.
Quando alguém vai ao Poder Judiciário, não espera apenas uma
decisão proferida rapidamente – qualquer que seja o resultado. Ao se
“resolver” tudo com a Meta 2, esquece-se (ou, pelo menos, deixa-se
de lado) de investigar a causa da morosidade dos processos133.

Neste ponto, vale esclarecer que não estamos concordando com o não
cumprimento dos prazos pelo judiciário, muito pelo contrário. A tentativa de obter
decisões mais rápidas é louvável, e é dever sim dos magistrados cumprir com mais
seriedade seus prazos, assim como já é obrigação do advogado. A breve
observação consiste na forma como essa aceleração tem sido feita.
Deve-se primar por uma verdadeira efetivação do artigo 133134 do Código de
Processo Civil, aplicando, quando necessário, as perdas e danos do referido texto
legal, para que assim torne-se verdadeiramente norma.

Judiciário deve superar e um serviço que a sociedade merece receber.


<http://www.cnj.jus.br/index.php?Itemid=963> Acessado em 27/09/2010. As 20h36min.
132
<http://professormedina.wordpress.com/2009/09/14/meta-2-do-cnj-e-o-judiciario-que desejamos/>
Acessado em 27/09/2010. As 22h 35min.
133
Aqui cumpre uma importante ressalva. O conteúdo supracitado foi extraído do site do professor
Medina. Mesmo sabendo do caráter não jurídico de tal meio, fizemos uso devido ao pertinente e
brilhante esclarecimento trazido pelo autor, o qual faz parte da comissão elaboradora do Projeto do
Código de Processo Civil.
134
Artigo 133. “Responderá por perdas e danos o juiz, quando:
I - no exercício de suas funções, proceder com dolo ou fraude;
II - recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deva ordenar de ofício, ou a
requerimento da parte.
52

Todavia, fixar que milhares de processos devam ser sentenciados até


determinada data estará abrindo margem para uma imensa quantidade de decisões
imperfeitas, que não necessariamente estão maduras, a ponto de serem decididas
em definitivo.
A prática vem demonstrando, ainda que sem dados oficiais, que as
decisões, sejam de 1º ou 2º instância advindas da Meta 2, têm sido alvo de muitas
críticas, principalmente pelo caráter não investigativo e pela quantidade de erros.
Mas, nem tudo são condenações. É notável que o judiciário tem buscado,
ainda que insuficiente, meios elogiáveis para a aceleração dos processos, tais como:
a instalação de mais varas, sendo algumas delas especializadas; informatização
crescente; desburocratização; aprovação da Lei n. 9.800/99 que permite a
transmissão por fax de petições; o processo eletrônico; a prioridade de tramitação
dos processos de pessoas com idade igual ou superior à 65 (sessenta e cinco) anos,
entre outros.
Sobre o mais novo avanço, o processo eletrônico, pode-se dizer que foi de
grande valia, e que irá, certamente, repercutir na celeridade, efetividade e
respeitabilidade da tutela jurisdicional e do Poder Judiciário.
Igualmente, o artigo 461135 do CPC traz como exemplo a possibilidade do
juiz aplicar multa diária ao réu, com o intuito de fazê-lo cumprir uma ordem seja de

o
Parágrafo único. Reputar-se-ão verificadas as hipóteses previstas no n II só depois que a parte,
por intermédio do escrivão, requerer ao juiz que determine a providência e este não Ihe atender o
pedido dentro de 10 (dez) dias.”
135
Artigo 461. “Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o
juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências
que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.
o
§ 1 A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível
a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.
o
§ 2 A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa (art. 287)
o
§ 3 Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do
provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado
o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão
fundamentada.
o
§ 4 O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu,
independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe
prazo razoável para o cumprimento do preceito.
o
§ 5 Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o
juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa
por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e
impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.
o
§ 6 O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se
tornou insuficiente ou excessiva.”
53

fazer ou não fazer, tanto em antecipação de tutela (§3º); na decisão final (§ 4º); ou
ainda o § 5º, sobre as “medidas necessárias”.
Outro importante aparelho acelerador encontrado no atual Código de
Processo Civil brasileiro é o artigo 537136, o qual determina o prazo pra que o juiz
julgue os Embargos de Declaração.
O que se deve buscar primordialmente é um devido cumprimento deste
prazo. Não basta a lei estabelecer se não houver uma devida fiscalização,
consumando, com a real exigência do dispositivo, permaneceremos na mesma
estaca.
Segundo Marinoni, o legislador atribuiu ao juiz o poder/dever de impor meios
adequados para uma efetiva tutela jurisdicional, a qual, sendo aplicada
corretamente, torna-se um meio coercitivo valido de aceleração processual137.

3.4. UMA BUSCA PELA VERDADE REAL

É dever do processo buscar uma decisão justa no menor tempo possível.


Quanto a isso não resta dúvida, o que vem “tirando o sono” de muitos
processualistas é como fazer isso de forma com que a decisão agregue justiça e
tempo. A verdade real, ainda que, essencialmente, inatingível, deve ser alvo do
julgador.
Segundo Canotilho:

Estado de justiça é aquele em que se observam e protegem os


direitos (Rights) incluindo os direitos das minorias (Dworkin). Estado
de justiça é também aquele em que há equidade (Fairness) de
distribuição de direitos e deveres fundamentais na determinação da
divisão de benefícios da cooperação em sociedade. (Rawls). Estado
de justiça considerar-se-á ainda o estado social de justiça (justiça
social) e que existe igualdade de distribuição de bens e igualdade de
oportunidades (Marx). Embora a idéia de justiça compreenda
diversas esferas, nela está sempre presente (embora com ela não se

136
Artigo 537. “O juiz julgará os embargos em 5 (cinco) dias; nos tribunais, o relator apresentará os
embargos em mesa na sessão subseqüente, proferindo voto.
137
MARINONI, Guilherme. A legitimidade da Atuação do Juiz a partir do Direito Fundamental à
Tutela Jurisdicional Efetiva.
<http://www.professormarinoni.com.br/manage/pub/anexos/20080320041013A_legitimidade_da_atua
cao_do_juiz.pdf> Acessado em 21/09/2010. As 08h36min.
54

identifique) uma idéia de igualdade: “direito a ser considerado como


um igual (Rawls)138.

Conforme dito pelo nobre constitucionalista, deve haver equidade de


distribuição de direitos e deveres para que haja segurança jurídica. Sendo um dos
elementos constitutivos do Estado de Direito139.
No mesmo diapasão, o princípio da segurança jurídica propriamente dita,
construída em torno de dois conceitos: a estabilidade, uma vez que as decisões dos
poderes públicos não podem arbitrariamente ser modificadas, e previsibilidade, em
relação aos efeitos jurídicos dos atos normativos140. Ou seja, a segurança que o
cidadão terá de uma decisão justa, tanto no conteúdo quanto na forma e
cumprimento.
Ao buscar a rápida prestação de serviços de modo a atender o princípio da
celeridade, em detrimento à segurança jurídica, estará atentando ao próprio
equilíbrio do Ordenamento Jurídico e, consequentemente intensifica ainda mais a
fragilidade das relações societárias.

Sem embargos, é evidente que a celeridade processual não pode ser


encarada como valor absoluto e invencível, um direito magno a se
deslocar no solo processual com a pujança de um rolo compressor.
Não. Também a celeridade é meio, não fim. Sem que haja um
mínimo de qualidade na prestação jurisdicional, o sentido positivo da
celeridade desvirtua-se por completo. Se a decisão judicial é
equivocada, melhor que venha morosa do que a jato.141 (sem grifo no
original)

Pois, conforme os ensinamentos de Barbosa Moreira142, uma justiça lenta é


de má qualidade. Contudo a recíproca não necessariamente é verdadeira, uma
justiça rápida, não será boa apenas se verificado o seu tempo.

138
CANOTILHO, J.J. Gomes. Op. Cit. p. 245
139
Idem. Ibidem. p. 256
140
Idem Ibidem. p. 263
141
SOUSA, José Augusto Garcia. Op. Cit. p. 47
142
MOREIRA, José Carlos Barbosa. O futuro da Justiça: alguns mitos. Temas de direito
processual. 8 ed. Saraiva: São Paulo, 2004. p.5
55

Somente será possível uma aproximação desse Estado de Justiça,


defendido por Canotinho, ao se preservar a dita igualdade de direito das partes, que
ocorrerá com uma defesa justa e real dela.
Deve haver equilíbrio entre duas exigências antagônicas. De um lado, a
celeridade processual que tem por objetivo a solução do conflito em tempo razoável,
e de outro a qualidade dos julgamentos, trazendo segurança jurídica às partes e
justiça social. Para tanto, aplica-se a teoria de Alexy.
Que a brevidade processual atende os anseios da sociedade, não há dúvida,
seja pela vida moderna que vivemos, pelo elevado número de ações, ou ainda, em
razão da crescente busca de Pacificação Social. A celeridade processual deixou de
ser algo ideal para ser o real. Ela se faz necessária hoje, e não pode mais ser
retardada. Porém milagres não há.
Sem reestruturação judiciária, não há celeridade processual. Na prática,
devem ser implantados procedimentos materializadores deste princípio.
Por isso, devemos ter em mente que a garantia da razoável duração do
processo foi um avanço, o qual não necessariamente prejudica o devido processo
legal, pelo contrário, desde que ponderado, de forma com que preserve o
contraditório, a isonomia e a paridade das partes é um poderoso agente
constitucional garantidor do equilíbrio do Ordenamento Jurídico.
Neste sentido, a celeridade deve ser tida pelo nosso sistema como uma
regra a mais, jamais contemplada em separado, como princípio exclusivo, mas “uma
espécie de bonificação”, de grande importância sim, mas que não deve, jamais, vir
em primeiro lugar.

3.5. CUSTO-DURAÇÃO143: MAL CONTEMPORÂNEO DO PROCESSO

“Velocidade e incerteza são fenômenos intimamente conectados. O ritmo


acelerado atropela sem dó os juízos reflexivos”144. Neste diapasão, a sociedade
acaba por se perder, sem saber o que realmente é importante e dever ser primado.

143
A expressão custo duração foi muito utilizada por Vicenzo Vigoritti. (In: WAMBIER, Teresa Arruda
Alvim. (coordenadora); LOPES, João Batista. Aspectos Polêmicos da Antecipação de Tutela;
Tutela Antecipada e o art. 273 do CPC. Op. Cit. p. 207)
56

Muitos princípios (e aqui dizemos princípio se perdendo do caráter jurídico


tratado no primeiro capítulo do trabalho), são simplesmente deixados de lado. Como
nas palavras da ilustre doutrinadora Maria Celina Bodin de Moraes, citada por José
Augusto Garcia de Sousa145, vivemos atualmente em uma sociedade da “explosão
da ignorância”, gerada por essa incerteza e instabilidade.
Isso é gerado pela imensa exposição que vivemos às informações, em uma
espécie de biblioteca virtual. “À medida que cresce os horizontes do saber, cresce,
na mesma proporção, o leque das questões sem solução, do desconhecimento e,
mais, se incrementa a consciência da própria ignorância, a qual gera, assim, novas
incertezas”146, consequentemente estamos sempre a margem do conhecimento e
sem certeza do que realmente enfrentamos.
Tais incertezas, permeiam o campo do direito com a mesma magnitude que
os outros ramos. Preocupado com isso, Kelsen, há quase cem anos, buscou
elaborar uma Teoria Pura do Direito, com a pretensão de organizar de formar que
universalizasse o direito.
Óbvio que não foi possível. Após a segunda guerra mundial, surgiram
correntes que levaram o direito para o outro polo. Caminhamos para uma
desformalização, dando cada vez mais importância para os casos concretos, fatores
extra jurídicos ganharam espaço no processo hermenêutico.
Novamente, vimos o insucesso. Hoje buscamos um equilíbrio, contudo as
dificuldades são imensas. A primazia por uma objetividade transformou-se em um
dos desafios do pós-positivismo, elevando a taxa de insegurança e incerteza no
campo jurídico. “Foi o preço a pagar pelo ambicioso projeto de (re)aproximar o
direito da justiça”147.148

144
SOUSA, José Augusto Garcia de Op. Cit. p. 34
145
MORAES, Maria Celina Bodin de. Constituição e Direito Civil. Tendências. Revista de Direito
da Defensoria pública. Rio de Janeiro. n 16. pp. 175-176, 2000 Aput SOUSA, José Augusto Garcia
de. Op. Cit. p. 34
146
SOUSA, José Augusto Garcia de. Op. Cit. p. 34
147
Idem. Ibidem. p. 36
148
Neste ponto apenas de caráter ilustrativo trazemos o pensamento de Margarida Maria Lacombre
Camargo, citada por José Augusto Garcia de Sousa: “Ao contrário dessas posições monopolíticas, o
que se aponta agora, sob o viés da pós-modernidade, é que, no lugar do único, o plural; no lugar do
abstrato, o concreto; e no lugar do formal, o retórico. Não se vê mais como condizente à prestação
jurisdicional aquele juiz que se reporta a conceitos abstratos, que procura uma verdade absoluta
57

Nesta atmosfera de ponderação o processo assume uma função impar,


levantada por José Augusto Garcia de Sousa, que não em todo será levado a cabo
por este estudo:

Em abono ao avanço da argumentação no processo, salienta-se que


a incidência da racionalidade pós-positivista acarreta mudanças
profundas na própria teleologia do processo. Ela deixa de ser
instrumento destinado puramente a declarar e realizar um direito
material prévio, transformação que põe em xeque a tese dualista.
Nos dias atuais, mas do que nunca, o processo – é preciso dizer com
todas as letras, sem ressalva – cria direito149.

Tais ensinamentos não devem ser descartados. Mais do que nunca, o


terreno processual está abarroto não só de processos, mas também de questão
altamente problemáticas, ato das próprias entranhas do processo, tanto do ambiente
externo que interferem de igual maneira na resolução da lide, quanto interno, no
maquinário do processo, dando enfoque maior aqui a problemática do tempo.
Sob este prisma é que devemos nortear nossos pensamos. Vicenzo Vigoriti,
citado por Álvaro Couri Antunes Sousa, diz que “a imperiosa urgência de se obter
uma prestação jurisdicional em tempo razoável, através de um processo sem
dilações”150, leva a estudos aprofundados em um norte. “o processo não pode ser
tido como um fim em si mesmo, mas deve constituir-se sim em instrumento eficaz de
realização do direito material”151.
Brevidade processual há tempos é meta do Estado, na administração da
Justiça, nunca se falou o contrário. Tem-se buscado prever sistemas mais céleres de
prestação jurisdicional, dada a crise enfrentada.
Diante do quadro de desolação na solução do problema em tela, o legislador
pátrio tem optado pela adoção de medidas como a simplificação dos procedimentos,

capaz de decidir a questão, descurando-se do subjetivismo (ou do intersubjetivismo) social (...). O


pensamento jurídico não se conforma com um tipo de raciocínio linear que ignora a dialética e os
valores que informam a hermenêutica. A inegabilidade dos pontos de partida, que aponta para a
inexorabilidade da lei, não impede de trabalharmos uma interpretação mais adequada para cada
caso. Por isso, é preciso encontrar uma nova racionalidade capaz de orientar a dogmática jurídica e,
ao mesmo tempo, defendê-la da pecha da arbitrariedade.” (In: SOUSA, José Augusto Garcia de. Op.
Cit. p 36)
149
Idem. Ibidem. p. 38
150
SOUSA, Álvaro Couri Antunes. Juizados Especiais Federais Cíveis: aspectos relevantes e o
sistema recursal da lei n. 10.259/01. Renovar: Rio de Janeiro, 2004, p. 109-110
151
Idem. Ibidem. pp. 109-110
58

tais como, as restrições do direito de recorrer das decisões, a criação de ritos mais
céleres, a diminuição dos incidentes processuais. Contudo questionamos a
efetividade destes mecanismos.

José Roberto dos Santos Bedaque, sobre o particular, assim manifesta-se:

Como condutor do processo, o juiz tem o dever de, sem sacrificar o


contraditório e a ampla defesa, procurar a solução mais rápida
possível para o litígio. Para tanto, é dotado de inúmeros poderes,
especialmente aqueles destinados a evitar a litigância de má-fé (arts.
17 e ss) e a realização de atos instrutórios inúteis e protelatórios (art.
130) (...).
A busca da rápida solução do litígio não deve transformar-se,
todavia, no objetivo maior do julgador. Ao lado do valor celeridade,
encontra-se a segurança, proporcionada pelo devido processo legal.
Ambos devem ser levados em consideração pelo juiz, na condução
do processo152.

Na realidade, segundo o autor, o que não pode ocorrer é a colisão entre os


princípios da celeridade e o da segurança jurídica, resumidamente, deve ser
acertado um processo que preserve todas as garantias aos litigantes.
Não é seguro pensar em uma prevalência de um princípio sobre o outro. Na
medida do possível os dois devem se complementares, preservando o limite de cada
um, como debatido na primeira parte do estudo.
Ou seja, no caso concreto, em função da busca desenfreada da celeridade,
a defesa não pode ser afetada pela insegurança jurídica, pois da mesma forma
prejudicará as partes.
Uma vez mais, a intenção não é regozijar a demora absurda dos processos,
pelo contrário, o presente estudo reconhece que a demora faz com que muitas
demandas simplesmente percam seu objeto, quando contempladas. Em todos os
casos, a celeridade deve existir, em cada ato ou procedimento, porém, ao se
verificar dano a segurança jurídica, há de se desacelerar, e primar pela ampla
investigação do ato comprometido.
Esta seria a solução ideal do processo, uma perfeita ponderação entre
acuidade e a defesa ampla, chegando então ao devido processo legal.

152
BRASIL, Código de Processo Civil Anotado. Organização dos textos, notas remissivas e índices
por Theotônio Negrão, 35 ed., São Paulo: Saraiva, 2003. p. 348
59

3.6. DIREITO DAS PARTES A EFETIVA TUTELA JURISDICIONAL

A jurisdição moderna está em crise. O Judiciário tem sido questionado


quanto a sua verdadeira legitimidade pois a lentidão dos processos, a morosidade
da justiça e a ineficácia de muitos provimentos judiciais têm feito com que a
comunidade caia em uma espécie de descrença no Poder Judiciário.
É pasmoso que o jurisdicionado não consiga obter, do Estado, uma decisão
rápida para os conflitos. Não basta garantir o acesso ao Judiciário, é mister
assegurar a possibilidade de obter uma decisão justa, célere e eficaz.
Pois não podemos, simplesmente, admitir, sem que haja questionamentos,
uma demora de dez, quinze anos para prestar a tutela jurisdicional153.
Neste prisma, surge novamente o questionamento: o que vem a ser a
razoável duração de um processo? Tem-se que, para cada caso um tempo diferente
é “necessário” para ser julgado.
Por exemplo, demandas que necessitam de ampla produção de provas
indubitável é que será entendido como tempo razoável, um espaço temporal muito
maior que uma simples homologação.
Todavia, entramos em uma seara de obscuridade, pois a celeridade não
pode ser entendida com uma simplicidade matemática, um conceito acabado e
fechado. Marinoni, quem melhor definiu a efetiva tutela jurisdicional, assim a
conceitua:

É o elemento indissociável do due processo of Law. Direito à


adequada tutela jurisdicional quer dizer direito a um processo efetivo,
próprio às peculiaridades da pretensão de direito material de que se
diz titular aquele que busca a tutela jurisdicional154.

Contudo, diz que a maior dificuldade de se atingir o “estado ideal” paira


sobre o próprio mecanismo judiciário. A dificuldade de se concretizar o direito ao
acesso à justiça, e ainda a ineficácia dos procedimentos, gerando a morosidade do
processo são os principais empecilhos.

154
MARINONI, Luiz Guilherme. O Direito à adequada tutela jurisdicional. Op. Cit. p. 244
60

Uma ordem processual reverente às garantias fundamentais não


descuida das necessidade especiais apresentadas por determinados
casos. Levar a sério a dignidade humana é valorizar a riqueza e a
complexidade dos casos concretos, não deixando nenhuma
peculiaridade relevante sem tratamento adequado. Um sistema
processual insensível à diversidade é um sistema que, a pretexto de
agradar às estatísticas, acaba esquecendo do homem155.

Indo de encontro com a opinião de outros autores, Marinoni não culpa


simplesmente a figura do Juiz, como o grande vilão da morosidade na resolução dos
conflitos. Para ele, o problema é um pouco mais complexo, o sistema como um todo
está pervertido e deve ser reparado. Boa parte da solução está em construir
tecnologias que permitam ao judiciário obter respostas que seja ao mesmo tempo
tempestiva e efetiva.

Deve ser afastada a idéia simplista de que o juiz é o culpado pela


demora do processo, ou mesmo pela falta de qualidade de seu
serviço. Esta questão, como é obvio, passa por uma dimensão muito
mais profunda, ou seja, pela própria ideologia que permite que o
Poder Judiciário seja o que é, pois como é intuitivo, nada,
absolutamente nada, possui uma determinada configuração sem
razão ou motivo algum. Nesta perspectiva é possível dizer que
nenhuma “justiça” é boa ou má, ou efetiva ou inefetiva, já que ela
sempre será da “forma” que os detentores do poder a desejam e,
portanto, para alguns, sempre “boa” e “efetiva”. Aliás, em pesquisas
realizadas pelo IDESP (Instituto de Estudos Sociais e Políticos), no
qual foram ouvidos 351 juízes de vários estados brasileiros, foi
alcançada a unanimidade: todos os entrevistados (isto é, 100%)
afirmam que a justiça brasileira é muito lenta156.

A dificuldade permeia-se em alguns aspectos, primeiro a peculiaridade de


cada caso faz com que cada decisão, para ser justa deva ser única, além de que, as
necessidades da sociedade mutantes como são, fazem com que o judiciário não
consiga atender a todos de forma efetiva.
Outrossim, é função da jurisdição atender a todos envolvidos no litígio, e
conforme já elucidado, dar tratamento igualitário, cuidando anseios, com igualdade,
seja autor, réu, terceiros interessados, entre outros. Por isso, é dever do juiz, antes

155
SOUSA, José Augusto Garcia de. Op. Cit. p. 64
156
MARINONI, Luiz Guilherme. Novas Linhas do Processo Civil. 4 ed. Malheiros: São Paulo, 2000,
pp. 33-34
61

de dar a resposta definitiva às partes, admitir todas as alegações de todos os


envolvidos, o que evidentemente leva tempo, podendo sentir-se prejudicada,
inevitavelmente, ao final, a parte que teve reconhecido seu direito157.
Assim, a efetividade jurisdicional, cada vez mais está no campo ideal
utópico. E, equivocamente, estamos colocando a culpa nos agentes errados.

157
MARINONI, Luiz Guilherme. O Custo e o Tempo do Processo Civil Brasileiro.
<http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/files/journals/2/articles/32905/public/32905-41006-1-PB.pdf
Acessado em 30/09/2010> Acessado em 03/10/2010. As 20h19min.
62

4. O PROJETO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: VERDADEIRAS MUDANÇAS


OU A REESCRITA DO MESMO?

Uma onda renovatória atingiu o processo civil de tal maneira que inúmeras
reformas aconteceram até a propositura do projeto de lei nº 166/2010. “O processo
civil moderno quer um processo de resultados, não um processo de conceitos ou de
filigranas”158, sobre isso, pondera Dinamarco:

O processo civil brasileiro tem sido particularmente receptivo a essas


novas tendências, seja pelo expressivo número de estudiosas de
primeira linha que nelas se engajam, seja pelas repercussões que as
propostas doutrinárias vêm tendo em nosso direito positivo. Um
estudo da história recente do processo civil brasileiro, (...) revela a
tomada de consciência, que antes foi da doutrina vanguardeira e
agora é também do legislador, de três premissas fundamentais: a
abertura do processo aos influxos meta-jurídicos que a ele chegam
pela via do direito material, a transmigração do indivíduo para o
coletivo (Barbosa Moreira) e a necessidade de operacionalizar o
sistema, desburocratizá-lo ou deformalizá-lo tanto quanto possível,
com vista a facilitar a obtenção dos resultados justos que dele é lícito
esperar159.

Apesar das considerações feitas pelo autor se tratarem da reforma ocorrida


em 2001, são perfeitamente aplicáveis ao atual Projeto.
A busca por uma simplificação do sistema tem se mostrado um anseio
antigo, o qual, a cada reforma, novamente vem à tona, e gera polêmica, ao ser
ponderado sobre sua repercussão no sistema.
Quando da promulgação do código de 1973 substituindo o código de 1939,
não há dúvida dos grandes avanços em temos de técnica processual. Foram
adotados conceitos modernos, havendo, inclusive, a correta estruturação dos
institutos.

158
DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma do Código de Processo Civil. Leis 8.455, de
24.8.92; 8.637, de 31.3.93; 8.710, de 24.9.93; 8.718 de 14.10.93; 8.898, de 29.6.94; 8.950, de
13.12.94; 8.951 de 13.12.94; 8.952 de 13.12.94; 8.953 de 13.12.94; 9.079, de 14.7.95; 9.139, de
30.11.95; 9.245, de 26.12.95. 5 ed, Malheiros: São Paulo, 2001, p. 22
159
Idem. Ibidem. p. 22
63

Igualmente, ao pensamos no código de 1939, o qual trouxe um grande


avanço, ainda que não totalmente satisfatório, conseguiu reunir todas as legislações
extravagantes ligadas à tradição lusitana das Ordenações160.
Naquele momento, precisávamos de um código novo, a doutrina, a
jurisprudência e a sociedade pediam uma lei única. O mesmo pode ser dito do
código de 1939 urgia-se por uma nova lei.
Desde então, muitas reformas sucessivamente vêm ocorrendo, em especial
de 1995 para cá, sendo significativas, principalmente, no campo processual
recursal161.
Neste prima, não há como deixar de questionar se há a necessidade real de
uma ruptura latente, que um novo ordenamento pede, na medida em que, não
conseguimos ainda experimentar, com profundidade as últimas reformas.
Nesta atmosfera, o Projeto do novo Código de Processo Civil surge com a
brilhante promessa de revolucionar o processo civil brasileiro. Torná-lo mais ágil,
resolvendo todas, ou, ao menos, quase todas as antigas falhas processuais vividas
até hoje.
Para tanto, permanece uma espécie de “salvador”, surgindo várias
promessas tais como: Mudanças no Código de Processo Civil reduzirá em até 50%
do tempo do processo, ou ainda A brevidade do processo está preste a ser
concretizada.
Contudo, resta saber, se ocorreram mudanças substanciais na estrutura do
código, a ponto de ser necessários um novo, ou ainda, o que ocorreu foi apenas a
reescrita do código de 1973, como uma espécie de consolidação.
Outrossim, se a sociedade, e quando dizemos sociedade nos referimos a um
todo, Poder Judiciário e cidadãos, está pronta para aceitar as mudanças, juntamente
com os prós e contras que qualquer transformação verdadeira impõe. (se é que o
Projeto proporciona isso).
E por fim, o que isso repercutirá, na prática jurídica. Quais os efeitos dessa
dita “abreviação recursal”, se isto trará transformações benéficas à sociedade, e
principalmente se elas ocorrerão de modo efetivo, na prática judiciária.

160
Idem. Ibidem. p. 23
161
ALVIM, Eduardo Arruda; ALVIM, Angélica Arruda. As Reformas e o Sistema Recursal. Revista
de Direito Civil e Processo Civil. v. 9, n 52, mar/abri, 2008 p. 23
64

Tais questões pairam no mundo jurídico e estão até agora sem uma
resposta concreta. A angústia permanece, questiona-se se será possível, em tão
pouco tempo, aprovar-se um novo código.

4.1. MAQUINÁRIO DA BREVIDADE NO PROJETO DO CÓDIGO DE PROCESSO


CIVIL

Por óbvio, o sistema não é capaz de conviver com pronunciamentos judiciais


que sejam aptos a causar prejuízo às partes162, por isso, há necessidade de
fazermos reformas ou, no caso em tela, uma modificação mais aprofundada, com a
proposta de um novo ordenamento.
O quesito tempo – podemos arriscar dizer, ser o instituto mais discutido,
quiçá o mais primado, no Projeto do novo Código de Processo Civil –. Como nas
palavras de José Augusto Garcia de Souza, “enfrentar o dilema maior do processo
nos dias atuais, é enfrentar o dilema tempo”163 completando que não se refere
somente a luta contra a morosidade do processo mas principalmente o que essa luta
ansiosa pode causar. O tempo o qualquer custo?

Sem negar de maneira alguma o mérito da dura batalha travada


contra o tempo em terras processuais, não se pode deixar de
observar que o processo, paradoxalmente, padece cada vez mais de
seu grande inimigo! De fato, à medida que o processo judicial vai
ganhando complexidade e transcendência sem precedentes na
história, um tempo mais dilatado – para argumentos e debates – lhe
é indispensável em não poucos casos. Eis aí o segundo lado
(frequentemente negligenciado) do grande dilema do processo nos
dias que correm164.

Neste sentido temos que a velocidade é um dos maiores signos da


atualidade, não só no processo, mas na sociedade geral165, vivemos com o relógio
enforcado em nossos pescoços, sendo “assaltados pela sensação de que estamos

162
ALVIM, Eduardo Arruda; ALVIM, Angélica Arruda. Op. Cit. p. 10
163
SOUSA, José Augusto Garcia de. Op. Cit. p. 32
164
Idem. Ibidem. p. 32
165
Idem. Ibidem. pp. 32-33
65

em uma bicicleta que exige pedaladas cada vez mais frenéticas para não tombar”166.
Contudo as incertezas geradas por esse emblema, não podem ser olvidadas.
O ritmo acelerado acaba por, quase invariavelmente, comprometer a
qualidade do processo (tanto já criticado no presente trabalho). Sendo a grande
preocupação com os meios que o novo código irá utilizar-se.
Todavia, não devemos esquecer que o Projeto trás também características
benéficas. Prima por simplificar o processo, resolvendo problemas e reduzindo a
complexidade dos procedimentos, tais como o recurso, e principalmente,
proporciona maior rendimento a cada processo em si, imprimindo organicidade ao
sistema, a qual foi perdida no código vigente e assim, dando-lhe mais coesão167.
Isto é feito de forma com que não fira, ao menos não aparentemente, as
diretrizes do processo, ao contrario, segundo Marinoni e Daniel Mitidiero:

Como projeção da direito de igualdade, (...) “é assegurada às partes


paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e
faculdades processuais, competindo ao juiz velar pelo efetivo
contraditório em casos de insuficiência técnica” (art. 7º).
Como manifestação da segurança jurídica, da confiança legítima, da
igualdade e ainda com o objetivo de acelerar e racionalizar o trabalho
do Poder Judiciário, o Projeto prevê o ‘incidente de resolução de
demandas repetitivas’ (arts. 895 a 906). Trata-se de expediente que
muito provavelmente poderá ocasionar bons frutos no que tange a
vinculação dos demais órgãos do Poder Judiciário àquilo que nele foi
decidido, patrocinando, pois, sensível proteção à segurança, à
confiança e à igualdade.”
Sendo ineficiente o sistema processual, todo o ordenamento jurídico
passa a carecer de real efetividade. De fato, as normas de direito
material se transformam em pura ilusão, sem a garantia de sua
correlata realização, no mundo empírico por meio do processo168.

Contudo é tênue e quase imperceptível a linha que separa a celeridade


processual e o aceleramento comprometedor do processo. Por isso devemos ter em
mente que, se a complexidade do direito cresce exponencialmente nos dias atuais,
não há lógica em tornar o sistema processual mais arredio, devemos sim buscar a
simplicidade e a brevidade.

166
Idem. Ibidem. pp. 33-34
167
Exposição de Motivos do Projeto do Código de Processo Civil
168
MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. O projeto do CPC. Críticas e Propostas.
Revista dos Tribunais: São Paulo, 2010. p. 16
66

Por isso, diminuir por diminuir o número de recursos, ou cortar


procedimentos ditos desnecessários, quando na realidade não o são, apenas “em
atenção ao mantra de que há recursos em excesso entre nós, não vai contribuir,
certamente, para o aperfeiçoamento do processo civil brasileiro”169.
Outrossim, simplificar demasiadamente pode ser sinal de retrocesso.
Construíram-se por anos afinco, teorias e diferenciações importantes, que não
podem se reunidas simplesmente, como se fossem idênticos. Ainda quem na
verdade tratam de assuntos próximos, mas que em sua essência são diferentes.
Isso não é simplificar, mas sim retroceder temporalmente.

4.2. AS PRINCIPAIS MUDANÇAS TRAZIDAS PELO PROJETO DO CÓDIGO DE


PROCESSO CIVIL

Primeiramente, é necessário esclarecer que a diretriz do Projeto do Código


de Processo Civil traz em certa medida uma evolução dos institutos já inseridos no
ordenamento nas últimas reformas.

Não há formulas mágicas. O Código vigente, de 1973, operou


satisfatoriamente durante duas décadas. A partir dos anos noventa,
entretanto, sucessivas reformas, a grande maioria delas lideradas
pelo Ministro Athos Gusmão Carneiro e Sálvio de Figueiredo
Teixeira, introduziram no Código revogado significativas alterações,
com o objetivo de adaptar as normas processuais e mudanças na
sociedade e ao funcionamento das instituições. (...) Criou-se um
Código novo, que não significa, todavia, uma ruptura com o passado,
mas um passo à frente. Assim, além de conservados os institutos
cujos resultados foram positivos, incluíram-se no sistema outros
tantos que visam a atribuir-lhe alto grau de eficiência170.

A Idéia principal da Comissão de Reforma do Código de Processo Civil,


segundo seu Presidente Luiz Fux, Ministro do Superior Tribunal de Justiça, é
simplificar e agilizar os procedimentos, de forma a garantir a celeridade
processual171. “Isso por si só, importa em uma mudança substancial e importante

169
SOUSA, José Augusto Garcia de. Op. Cit. p. 59
170
Exposição de Motivos do Projeto do Código de Processo Civil
67

para uma nova fase de retomada da credibilidade das instituições jurídicas


brasileiras”172.

O enfraquecimento da coesão entre as normas processuais foi uma


conseqüência natural do método consistente em se incluírem, aos
poucos, alterações no CPC, comprometendo a sua forma
sistemática173.

Sob este comando, consoante a Exposição de Motivos do Projeto do Código


de Processo Civil, são objetivos preceptores do novo ordenamento, estabelecer ora
expressa, ora de forma implícita, uma forte ligação com a Constituição. As quais
criaram condições para que o juiz decida com mais liberdade embasado na
realidade fática subjacente à causa174.
Outrossim, não há como deixar de lado a reforma no sistema recursal. A
priori um grande clamor foi levantado, principalmente por parte dos mais
conservadores, e o que verificou foi sim modificação, mas aparentemente nada de
caráter revolucionário.

Um dos métodos de trabalho da Comissão foi o de resolver


problemas, sobre cuja existência há praticamente unanimidade na
comunidade jurídica. Isso ocorreu, por exemplo, no que diz respeito à
complexidade do sistema recursal existente na lei revogada. Se o
sistema recursal que havia no Código revogado em sua versão
originária, era consideravelmente mais simples que o anterior, depois
das sucessivas reformas pontuais que ocorreram, se tornou,
inegavelmente, muito mais complexo175.

E ainda o crescente avanço de institutos judiciais e extrajudiciais de


resolução de conflito.

171
SOARES, Carlos Henrique. Considerações Preliminares sobre o Relatório do Novo Código de
Processo Civil. Revista IOB de Direito Civil e Processual Civil. v. 11, n 65, maio/jun, 2010. Porto
Alegre. p.120
172
Idem. Ibidem. p. 121
173
Exposição de Motivos do Projeto do Código de Processo Civil
174
Trataremos mais especificamente sobre essa liberdade dada ao juiz, no capítulo 4.2.2 A ampliação
do pode dos magistrados
175
Exposição de motivo do Projeto do Código de Processo Civil
68

Em suma, o Projeto insere modificações, as quais não serão esgotadas por


completo, mas que, aparentemente, manterão a mesma linha em grande parte dos
institutos, já seguida até aqui pelo processo civil brasileiro.

4.2.1. Uma maior relevância aos princípios na letra da lei

O Projeto Código de Processo Civil, assim como fez a Constituição, utilizou-


se, em grande medida, do conceito de positivação de princípios, na primeira parte.

A necessidade de que fique evidente a harmonia da lei ordinária em


relação à Constituição Federal da República176 fez com que se
incluíssem no Código, expressamente, princípios constitucionais, na
sua versão processual.
Por outro lado, muitas regras foram concebidas, dando concreção a
princípios constitucionais, como, por exemplo, as que prevêem um
procedimento, com contraditório e produção de provas, prévio à
decisão que desconsidera da pessoa jurídica, em sua versão
tradicional, ou “às avessas”177.

Nesse sentido, tem-se, como exemplos o artigo 4º e 8º do projeto:

Art. 4º. As partes têm direito de obter em prazo razoável a solução


integral da lide, incluída a atividade satisfatória.

Art. 8º. As partes têm o dever contribuir para a rápida solução da lide,
colaborando com o juiz para a identificação das questões de fato e
de direito e abstendo-se provocar incidentes desnecessários e
procrastinatórios.

Todavia, resta saber se há eficácia em tal mecanismo. A Constituição,


conforme elucidado anteriormente, petrificou, em seu artigo 5º LV178 o princípio da

176
Exposição de Motivos do Projeto do novo Código de Processo Civil
177
Idem. Ibidem.
178
Artigo 5º “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”
69

ampla defesa e no mesmo artigo, inciso LXXVIII179 da celeridade processual.


Contudo, mudanças significativas não foram sentidas na sociedade, desde a
inserção destes último dispositivos.
O que gera nova questão: se a Constituição que prima por ser a guardiã da
sociedade, dos princípios, e “mãe” de todos os demais ordenamentos, não
conseguiu efetivar a celeridade processual, como o código, ordenamento infra-
constitucional fará isso?
A questão torna-se muito mais complexa ao entender que a celeridade
processual, muito antes de ser um problema extrínseco, é um problema interno.
Pouco, ou nada adianta a simples normatização de conceitos, na medida em que a
resolução desta questão depende muito mais da “política” judiciária.
Indo de encontro com o abordado, Marinoni e Daniel Mitidiero, em sua
brilhante obra recém lançada, a qual faz uma análise sobre o Projeto do Código de
Processo Civil, refere-se como um ponto de grande valia, a normativização dos
princípios:

Ponto positivo do projeto está em que inicia a disciplina do direito


processual civil enunciando direitos fundamentais processuais civis
(arts. 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 9º, 10º e 11). É claro que aí há apenas
explicitações na ordem infraconstitucional destes preceitos. A muitos
isto pode parecer uma superfetação e, portanto, inútil. Esta
reafirmação, contudo, não deixa de ter significado simbólico
importante, na medida em que dissemina na cultura jurídica em geral
a necessidade de encarar a legislação infraconstitucional como
desdobramento da Constituição e de interpretá-la de acordo com os
direitos fundamentais processuais civis180.

Esta mecanização, segundo os autores, contribuirá na efetivação do


processo, garantindo maior segurança e estabilidade jurídica onde a sociedade
saiba, com precisão, como será resolvida sua lide. “A confiança legítima é a face

179
Artigo 5º “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do
processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”
180
MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Op. Cit. p. 16
70

subjetiva da segurança jurídica. Prende-se a calculabilidade e à previsibilidade dos


atos dos poderes públicos”181, sendo assim, deve ser primada.
Desde a exposição de motivos é notória a relevância dada a esse
mecanismo.

A coerência substancial há de ser vista com objetivo fundamental,


todavia, e mantida em termos absolutos, no que tange à Constituição
Federal da República. Afinal, é na lei ordinária e em outras normas
de escalão inferior que se explica a promessa de realização dos
valores encapados pelos princípios constitucionais.
O novo Código de Processo Civil tem o potencial de gerar um
processo mais célere, mais justo, porque mais rente às necessidades
sociais e muito menos complexo182.

Neste diapasão, o Projeto surge com o objetivo primeiro: simplificar o


processo com a utilização de meios que garantam, na letra da lei, a rapidez e a
segurança.
Contudo, novamente não é possível concordar com tal mecanismo183. Para
isso, basta se lembra dos sistemas processuais que nos inspiraram na elaboração
do Código de 1973.
A base legislativa brasileira é de origem italiana, em grande medida, e com
influência da doutrina alemã. Por isso, pouco diferenciamo-nos, na lei, destes
países, contudo o que nos torna tão diferente na pratica?
Muito mais ligado está com a forma de aplicação de suas normas. O nosso
código vigente, apesar de ter perdido sua sistematização – e quanto a isso não há
duvida, após tantas reformas não há coerência substancial entre os dispositivos –
possui uma forma bastante eficaz, o que não o faz perfeito, grande parte do
problema está em sua aplicação, ou melhor, não aplicação. Sendo assim, ao que
parece, pouca eficácia trará nova legislação.
Contudo não resta somente críticas. O projeto traz boas mudanças, sendo
muitas delas as quais tratam da celeridade como cerne da discussão.

181
Idem, Ibidem. p. 16
182
Exposição de Motivos do Projeto do Código de Processo Civil
183
Cumpre esclarecer aqui que, não há uma descredibilidade neste mecanismo, a intenção não é
reprová-lo, mas apenas ensejar uma maior ventilação sobre sua eficácia no caso concreto.
71

4.2.2 A ampliação do pode dos magistrados

Conforme já elucidado, a Exposição de Motivos do Projeto Código de


Processo Civil traz entre suas evoluções a atribuição de maior liberdade e
autonomia ao magistrado, sendo, nestes termos, uma aproximação maior dos
moldes da Constituição.

Tal modificação no novo CPC, já era esperada. O Código de


Processo Civil de 1973, que ainda está em vigor, com mais de 60 leis
reformadas, sempre privilegiou o aumento do chamado movimento
“ativismo judicial”. Tal movimento, que possui grande aplicação nas
leis processuais brasileiras, garante ao Magistrado uma posição de
destaque e relevância. É ele o responsável por todas as coisas boas
e ruins que acontecem no processo. Tudo tem que passar pela
fiscalidade judicial.
Tal atribuição de poderes ao Magistrado é justamente o que defende
há muito tempo a escola da relação jurídica processual, que ganhou
novos contornos com a chamada escola instrumentalista do
processo,184 defendida por importantes estudiosos do Direito
Processual Civil e que sabidamente são adeptos da escola de Oskar
Von Bülow185.186

184
Sobre a Escola Instrumentalista do processo cabem algumas considerações:
“Os instrumentalistas defendem que ‘o processo, então, pode ser encarado pelo aspecto dos atos
que lhe dão corpo e das relações entre eles, e igualmente pelo aspecto das relações entre seus
sujeitos. (...)
A noção de procedimento é puramente formal, não passando da cooperação de atos que sucedem.
Concluí-se, portanto, que o procedimento (aspecto formal do processo) é o meio pelo qual a lei
estampa os atos e formulas da ordem legal do processo. O processo é indispensável à função
jurisdicional exercida com vistas ao objetivo de eliminar conflitos e fazer justiça mediante a atuação
da vontade concreta da lei, è, por definição, o instrumento através do qual a jurisdição opera
(instrumento para a positivação do poder)’.
Os instrumentalistas não negam a essencialidade da garantia constitucional do contraditório dentro
do processo. Entretanto, eles defendem que o contraditório não anula a idéia de processo como
relação jurídica. (...)
Na realidade, a presença da relação jurídica-processual no processo é a projeção jurídica e
instrumentação técnica da exigência político constitucional do contraditório. Terem as partes poderes
e faculdades no processo, ao lado de deveres, ônus e sujeição, significa, de um lado, estarem
envolvidas numa relação jurídica; de outro, significa que o processo é realizado em contraditório. Não
há qualquer incompatibilidade entre essas duas facetas da mesma realidade.” (In: CITRA, Antônio
Carlos de Araujo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Candido Rangel. Teoria geral do
processo. 18 ed. São Paulo, 2002. p.277-285 )
185
Oskar Von Bülow é o idealizador da teoria do processo com relação jurídica processual, no qual foi
ofertado ao mundo jurídico no ano de 1868.
186
SOARES, Carlos Henrique. Op. Cit. p. 126
72

Primeiro, ressalta-se que essa ampliação não é novel em nosso sistema,


visto que muitas reformas caminharam neste sentido, tais como a antecipação de
tutela, a fungibilidade, entre outras. O poder do magistrado, durante o processo, é
um instituto perfeitamente enquadrado e aceito no processo contemporâneo,
advindo do nosso sistema processual, dito dispositivo187.
A novidade permeia-se quando tratamos da ampliação deste poder, mais
especificamente os incisos III, V e VI do artigo 107188. Algumas críticas devem ser
tecidas.
Tratando de uma forma mais abrangente, temos que o aumento exagerado
do poder do magistrado trará, segundo Carlos Henrique Soares, uma tirania no
processo, podendo gerar grandes e incalculáveis problemas judiciários.189
Pare ele, o mais importante é que haja um equilíbrio. Para que aumente o
poder do julgador é necessário uma elevação, na mesma medida, da
responsabilidade do Estado, pela prestação jurisdicional.
Caso não ocorra desta forma, o que foi criado com o intuito de dar mais
celeridade ao processo poderá ser um termômetro de retardamento, pois “o
processo sem dilação indevida é justamente aquele que não possui justificativa para
ficar parado, concluso, aguardando uma decisão por anos, a fio, sem justificativa”190.

187
Conforme elucidado no Capítulo 3.1. O SISTEMA DISPOSITIVO E O SISTEMA INQUISITIVO
188
Art. 107.” O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:
I – promover o andamento célere da causa;
II – prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações
impertinentes ou meramente protelatórias, aplicando de ofício as medidas e as sanções previstas em
lei;
III – determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias
para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto
prestação pecuniária;
IV – tentar, prioritariamente e a qualquer tempo, compor amigavelmente as partes, preferencialmente
com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais;
V – adequar as fases e os atos processuais às especificações do conflito, de modo a conferir maior
efetividade à tutela do bem jurídico, respeitando sempre o contraditório e a ampla defesa;
VI – determinar o pagamento ou o depósito da multa cominada liminarmente, desde o dia em que se
configure o descumprimento de ordem judicial;
VII – exercer o poder de polícia, requisitando, quando necessário, força policial, além da segurança
interna dos fóruns e tribunais;
VIII – determinar, a qualquer tempo, o comparecimento pessoal das partes, para interrogá-las sobre
os fatos da causa, caso em que não incidirá a pena de confesso;
IX – determinar o suprimento de pressupostos processuais e o saneamento de outras nulidades.”
189
SOARES, Carlos Henrique. Op. Cit. pp.127-128
190
Idem. Ibidem. p. 128
73

Devendo estabelecer, inclusive, sanções reais àqueles magistrados que não


cumprirem os princípios da celeridade e da não dilação indevida191.
Outro ponto cume, é que com a ânsia de simplificar o processo e
proporcionar maior autonomia ao magistrado, aboliu-se do ordenamento as
diferenciações de rito. Pelo Projeto, todas as matérias tramitaram apenas por um
procedimento, cabendo ao juiz conduzir o processo.
Este mecanismo é um tanto quanto perigoso, pois não podemos dizer que a
nossa magistratura nacional é uniforme, sem esquecer ainda o quanto o judiciário é
utilizado com fins políticos.
Já, em se tratando de pontos específicos sobre a ampliação deste
dispositivos, temos nas palavras de Marinoni e Daniel Mitidiero, o inciso III, em que a
redação do artigo diz: incumbe ao juiz “determinar todas as medidas indutivas,
coercitivas192, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o
cumprimento de ordem judicial”. A novidade consta na possibilidade de utilização de
meios coercitivos para a obtenção de tutela ressarcitória193.
Para os autores, desde que respeitado a contraditório e primado o direito
material, este mecanismo não gerará prejuízos.

Trata-se de medida que visa a retirar do procedimento todas as


potencialidades para a justa solução do caso concreto. A previsão de
normas processuais abertas tem a virtude de permitir a construção
do direito à ação adequada às peculiaridades do direito material,
permitindo primeiro olhar para a tutela do direito para depois
perguntar pelas técnicas processuais necessárias para sua
promoção. Promove-se a adequação do processo à tutela do direito.
Semelhante técnica deve ser concretizada pelo juiz em diálogo com
as partes, respeitando o contraditório. A previsão de respeito à ampla
defesa, aliás, é supérflua. Rigorosamente, basta às necessidades
evidenciadas pelo direito material194.

Impossível, por todo o exposto, concordar com as palavras dos autores. Há


um sem-número de outros institutos que devem ser preservados, e a ampla defesa
em nenhuma hipótese torna-se supérflua.

191
Idem. Ibidem. p. 128
192
Sem grifo no original
193
MARINONI, Luiz Guilherme, MITIDIERO, Daniel Op. Cit. p. 88
194
Idem. Ibidem. pp. 88-89
74

Por isso, deve-se sim, tomar muito cuidado com o emprego ampliado do
conceito poder do magistrado, mesmo sendo uma aproximação com o disposto
constitucional.
Outro ponto, sem grandes qualificações, é o inciso VI, assim reza o item: ao
juiz caberá: “determinar o pagamento ou o depósito da multa cominada
liminarmente, desde o dia em que se configure o descumprimento de ordem judicial”.
Aqui não cabendo considerações proeminentes, apenas, uma vez mais,
positivando princípios e exigindo a exequibilidade antes mesmo do transito em
julgado.195 196
Por isso, o que se tem de mais significativo quando falamos em aplicação do
poder do magistrado é a incerteza gerada quanto à sua aplicação. A idéia é positiva
e, em certo modo, bem vinda. Contudo, imprescindível que seja efetivado de forma
consciente pelo julgador e vigiado pelo Estado, respeitando as limites processuais
os quais devem ser muito bem determinados. E, infelizmente o Projeto não faz.

4.2.3. A supressão dos Embargos Infringentes

Os Embargos Infringentes, previstos no artigo 531197 do Código de Processo


Civil, passaram por algumas mudanças significativas desde sua contemplação na
promulgação do Código em 1973.
A lei nº 8.950/1994 simplificou e restringiu, em muito, as hipóteses de
cabimento deste recurso198. No mesmo loco, outras alterações fizeram com que o
recurso ganhasse mais simplicidade de tramitação. Contudo, ainda é alvo de críticas
por parte da doutrina e da jurisprudência, fazendo com que, cada vez mais

195
Idem. Ibidem. p. 89
196
Neste ponto, salutar dizer que o presente trabalho não pretende adentrar na serra do Coisa
Julgada, antecipada ou não. Tal assunto desprende de uma análise aprofundada e caberia um
trabalho apenas para esclarecer esse quesito.
197
Art. 531. “Interpostos os embargos, abrir-se-á vista ao recorrido para contra-razões; após, o relator
do acórdão embargado apreciará a admissibilidade do recurso.”
198
THEODORO JUNIOR, Humberto. As Inovações no Código de Processo Civil. 6 ed. Forense:
Rio de Janeiro, 1996, pp. 26-27
75

tenhamos julgados unânimes, evitando assim, a possibilidade de interposição do


recurso.
Em razão do exposto é que os Embargos Infringentes deixarão o
ordenamento, se aprovado o Projeto do Novo Código de Processo Civil.
Todavia, há autores que ainda defendem sua permanecia, seja porque a
retirada de alguns recursos acaba por comprometer o direito das partes, visto existir
uma relação intima entre a ampla defesa e o direito de recorrer. Carlos Henrique
Soares diz que para “alguns, e parece que assim será o novo Código de Processo
Civil, tendem a acreditar que o recurso não é uma garantia fundamental e que o
mesmo traz o descrédito à decisão de primeiro grau”199, gerando um aumento
desnecessário na duração do processo.
Seja ainda por homenagem a tradição, visto que os Embargos Infringentes já
foram limitados, na última reforma, chegando ao seu estado ideal, cumprindo
importância para o aprimoramento da prestação jurisdicional, “na exata medida em
que permite nova reflexão a respeito das questões trazidas ao tribunal, a partir do
voto divergente obtido no julgamento colegiado”200.

Cumpre criticar o discurso que atribui aos recursos grande parte da


responsabilidade pela morosidade do processo. Muito forte na mídia
brasileira, ele transita bem, igualmente, entre os profissionais
jurídicos. Como todo discurso reducionista, privilegia superfícies e
não mostra maior disposição para enfrentar dados empíricos ou
nuances do problema. Recursos atrasam o processo? Certamente
sim. Mas o próprio processo atrasa a vida. Nada mais rápido e
fulminante que a autotutela. Só que a civilização atual deplora,
felizmente, a justiça pelas próprias mãos. Há então a necessidade
imperiosa do processo, por mais pesado que seja para as pessoas e
para a sociedade. O mesmo não se pode dizer dos recursos.
Também eles consistem em um ‘mal’ necessário, dada a exigência
intransponível de ser minimamente democrático o sistema de
justiça201.

Nesta medida, a “perda” do tempo, torna-se nobre. O que não quer dizer que
não deva haver uma investigação quando o recurso é prolongado de forma

199
SOARES, Carlos Op. Cit. p.132
200
Idem. Ibidem. p. 51
201
SOUSA, José Augusto Garcia de Op. Cit. p. 52
76

exacerbada. Por isso, concluímos que o autor não privilegia a morosidade do


processo, apenas busca a preservação dos recursos como eles são.
Segundo Sergio Cruz Arenhart202 se queremos acabar com os recursos,
teremos que acabar com a Instituição Tribunal, pois, enquanto houve uma instância
superior, um tribunal, haverá recursos.
Em pouco adiantaria acabar com os Embargos Infringentes, uma vez que, o
ganho em celeridade processual é basicamente nulo e estariamos deixando de lado
uma questão relevante. A incerteza gerada pelo voto divergente, que converge com
o voto do juiz a quo203.
Enfim, a questão suscitada a respeito dos recursos, quanto ao tempo e
direito de defesa, é louvável e deve ser analisada com mais relevância. Já quanto
aos Embargos Infringentes, mesmo que não unânime, acreditamos que o
desaparecimento ou a conservação mudará pouco na realidade dos processos, vez
que sua previsão é diminuta, e cada vez mais os julgadores ad quem têm buscado
formular seus votos de maneira que, ao final os resultados sejam unânimes.

4.2.4. O Agravo e suas principais mudanças

O agravo, previsto genericamente no artigo 522204 do Código de Processo


Civil, atualmente é o recurso cabível de toda e qualquer decisão interlocutórias
proferida no processo civil, salvo se houver disposição legal em contrário.205 Para

202
CONGRESSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL. Desafio do novo Processo Civil e Penal. (IAP),
2010. Estação Convention Center.
203
Desta forma, mesmo considerando o peso formalmente superior dos votos oriundos do órgão ad
quem, fica caracterizado, sem dúvida, sob o ângulo substancial, uma situação aguda de incerteza,
insegurança. Só que a jurisdição existe exatamente para aplicar as crises de incerteza e insegurança
que grassam no meio social. jurisdição incerta não é jurisdição, é uma contradição em termos. (In:
Idem. Ibidem. p. 52)
204
Art. 522. “Das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na forma retida,
salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem
como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é
recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento.”
205
WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI. Op. Cit. p. 65
77

tanto entende-se que a referida decisão deva gerar dano a parte, ou seja, contra os
atos pelos quais o juiz, no curso do processo, resolveu questões incidentais.206
Pode ainda ser dividido em agravo de instrumento e agravo retido. Sendo
este de grande relevância ao sistema, pois permite não que a matéria não urgente,
mas questionável, preclua no decurso do processo e impeça ser discutida.
Tal procedimento ganhou a forma como o conhecemos hoje pela reforma
ocorrida, em 2005, pela Lei nº 11.187. A maior inovação se deu no seu
processamento. “Com isso, o agravo retido, que tinha papel secundário, ganhou
relevo no sistema recursal”207.

Com o agravo retido, a parte recorrente apenas manifesta sua


discordância em face de determinada decisão interlocutória,
mediante manifestação fundamentada (ainda que sucintamente) e
que é apresentada perante o próprio juízo a quo. (...). O agravo fica
então “retido” nos autos do processo208.

Sendo assim, a função única do agravo retido é impedir que a matéria


preclua, sendo que parte da doutrina ainda entende que somente há necessidade de
se agravar retido caso a matéria não fique acobertada pela preclusão, nos demais
casos, o recurso é desnecessário.
Já em se tratando de Agravo de Instrumento, a regra virou a exceção –
ainda que para boa parte das pessoas isso soe de forma equivocada, visto a
quantidade de agravo de instrumento que se tem hoje e a quantidade de agravos
retidos – somente deve ser interposto em face de decisão que gere grave dano
imediato ou de difícil reparação.
Ao contrário dos demais recursos, este sempre deve ser interposto perante o
órgão judicial responsável por proferir a nova decisão.
Segundo Humberto Teodoro Júnior, com essa sistemática, dois grandes
inconveniente foram sanados pelo legislador. Primeiro, a interminável tramitação do
agravo fazia com que ele praticamente perdesse seu objeto. Visto ser um recurso

206
THEODORO JUNIOR, Humberto Op. Cit. p. 89
207
WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Op. Cit. p. 655
208
Idem. Ibidem. p. 656
78

basicamente para discutir questões urgentes do processo, estava “em flagrante


contradição com a natureza interlocutória das decisões por ele impugnada”209.
Com isso, segundo o autor, acabava por gerar um uso constante, quiçá
abusivo do mandado de segurança, pois buscava-se com ele suspender os efeitos
da decisium que estivessem gerando prejuízos graves e imediatos à parte. “O
agravo não tinha efeito suspensivo, nem contava com o mecanismo interno que
acelerasse o conhecimento da impugnação pelo tribunal ad quem”210.
Por isso, quando o Projeto do Código de Processo Civil fala em seu artigo
929, sobre Agravo de Instrumento, poucas novidades são visualizadas, apenas que:
a certidão de intimação da parte para o agravo poderá ser substituída por outro
documento que comprove a tempestividade; a não juntada da petição do agravo de
instrumento na origem não gerará mais a nulidade, apenas impedirá o juízo de
retratação211.
Já quando tratamos do agravo retido, deparamo-nos com grandes
inovações. O recurso foi retirado do sistema por completo, não havendo mais a
preclusão consumativa. Ou seja, todas as matérias que não forem urgentes,
merecedoras de tutela imediata, as quais deveram ser tratadas pelo agravo de
instrumento, devem ser alegadas na apelação.
Alguns autores não concordam com tal posicionamento do Projeto,
entendendo que ao ser retirado os recursos (e aqui se referindo aos Embargos
Infringentes também) estarão retirando das partes, a garantia e a participação no
processo de conhecimento, gerando o inverso do desejado. Ao permitir que as
partes participem ativamente no processo, os recursos são diminuídos, seja pela
aceitação da decisão pelas partes, seja pela qualidade com que tais decisões foram
proferidas212.
Contudo, não há como concordar com tal afirmação. Não é surpresa para
nenhum doutrinador, julgador ou legislador pátrio, que quanto mais recursos há em

209
THEODORO JUNIOR, Humberto. Op. Cit. p. 89
210
Idem. Ibidem. p. 90
211
Tais considerações em nada comprometem a celeridade processual, e portanto pouca relevância
têm no presente estudo.
212
SOARES, Carlos Henrique. Op. Cit. p. 132
79

um ordenamento, diretamente proporcional é a quantidade de interposição. Não é à


toa que existe o instituto da multa à parte, quando de recursos desnecessários,
apenas com caráter protelatório.
Por isso, não há como concordar com tais argumentos, ainda que
concordássemos com a manutenção do recurso, a questão é muito mais profunda.
Para se concordar ou não com a retirada do agravo retido, deve se ter em
mente qual o benefício para que este seja mantido no ordenamento. E, portanto,
conclui-se que sua exclusão pouco modificará na rotina forense.
Apenas demandará, por parte dos advogados, uma organização maior,
quanto os seus pedidos, para serem feitos em sede de apelação, todos juntos. Ainda
que não contribua significativamente para a brevidade da lide, nota-se uma
simplificação judiciária.
Outrossim o relator também deverá despender mais atenção as questões
apreciadas de ofício, visto ser a hora, agora na apelação, para se decretar possíveis
nulidades/anulabilidades.

4.2.5. O Recurso de Apelação e a não preclusão consumativa

Em razão da extinção do agravo retido, as questões resolvidas na fase


cognitiva não ficaram mais acobertadas pela preclusão213, assim como acontece
atualmente, segundo o artigo 245214.
Tal assunto é tratado pelos artigo 929, parágrafo único215 e 923, também
parágrafo único216 do Projeto do Código de Processo Civil.

213
Marinoni e Daniel Mitidiero trazem uma importante observação quanto a preclusão: “O art. 476, III,
Projeto, autoriza a superação da preclusão consumativa, jamais da coisa julgada” (In: MARINONI,
Luiz Guilherme, MITIDIERO, Daniel Op. Cit. p. 132)
214
Art. 245. “A nulidade dos atos deve ser alegada na primeira oportunidade em que couber à parte
falar nos autos, sob pena de preclusão.”
215
Art. 929. “Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias:
I – que versarem sobre tutelas de urgência ou da evidência;
II – que versarem sobre o mérito da causa;
III – proferidas na fase de cumprimento de sentença ou no processo de execução;
IV – em outros casos expressamente referidos neste Código ou na lei.
Parágrafo único. As questões resolvidas por outras decisões interlocutórias proferidas antes da
sentença não ficam acobertadas pela preclusão, podendo ser impugnadas pela parte, em preliminar,
nas razões ou contrarrazões de apelação.”
80

Sendo assim, as matérias decididas interlocutoriamente passam a ser


discutidas em apelação, como se, o apelado tivesse agravado retidamente de todas
as matérias que lhe foram prejudiciais até a sentença.
Se assim mesmo funcionar, entendemos ser uma medida de significativo
avanço, pois dará efetividade a um dispositivos, vigente no atual código, de pouca
serventia.
Contudo, tal entendimento não é unânime. Fredie Didier Jr. vai de encontro
com o abordado. Para ele a não preclusão das decisões interlocutórias retardará
mais o processo e o tornará mais moroso.

Se a decisão interlocutória é impugnável, caso o sujeito não recorra,


há preclusão, que impede o reexame do que já foi decidido. Se a
decisão interlocutória não é recorrível, a preclusão só ocorrerá se, no
recurso contra a sentença, a parte não pedir a revisão da decisão
proferida no decorrer do procedimento. Se a parte incluir a decisão
interlocutória no objeto da apelação, o tribunal poderá revê-la. Se o
tribunal acolher a apelação e, com isso, revir a decisão interlocutória
proferida há tempos (às vezes, anos atrás), o processo será anulado,
a questão voltará à primeira instância e tudo terá de ser refeito.
Situações estabilizadas seriam desfeitas. Qualquer processo onde
houvesse sido proferida uma decisão interlocutória (todos, me
parece) ficaria em perene situação de instabilidade.
Em vez de processo, retrocesso.
Em vez de decisão de mérito, reinício de fases procedimentais já
superadas. (...)
Se a interlocutória é recorrível, haverá preclusão do direito ao
recurso se a parte não a impugnar no primeiro momento que lhe
couber falar nos autos. Aquela questão, já decidida, não poderia
mais ser revista. O órgão jurisdicional passaria a ocupar-se das
demais questões objeto da sua cognição, sejam elas questões de
mérito ou de admissibilidade, questões de fato ou de direito. Haveria,
assim, redução da extensão da cognição, já que em relação a
algumas questões teria havido decisão já estabilizada217.

Nada obstante, não há como concordar com a opinião do ilustre doutrinador.


Ainda que não saibamos precisamente como funcionará a não preclusão, pensamos
ser uma boa opção, pois todas as matérias alegadas no agravo retido, atualmente,

216
Art. 923. “Da sentença cabe apelação. (...)
Parágrafo único. As questões resolvidas na fase cognitiva não ficam cobertas pela preclusão e devem
ser suscitadas em preliminar de apelação, eventualmente interposta contra a decisão final.”
217
<http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI103549,81042Preclusao+e+decisao+interlocutoria+Ant
eprojeto+do+Novo+CPC+Analise+da> Acessado em 18/10/2010. As 21h43min
81

devem ser reiteradas na apelação. Portanto, pelo Projeto, diminuirá um


procedimento.
Sendo assim, a alegação de que o novo procedimento retardará o processo
não deve reinar, pois as matérias urgentes continuaram sendo impugnadas pelo
Agravo de Instrumento e somente as decisões interlocutórias que não gerarem dano
grave de difícil reparação deverão ser discutidas na apelação218.
O parágrafo único do artigo 929, que trata sobre o Agravo de Instrumento
deixa clara essa observação: “As questões resolvidas por outras decisões
interlocutórias proferidas antes da sentença não ficam acobertadas pela preclusão,
podendo ser impugnadas pela parte, em preliminar, nas razões ou contrarrazões de
apelação.”
Outra questão relevante, em se tratando da apelação, é quanto aos seus
efeitos.

O cabimento da apelação impedirá a execução da decisão


impugnada e a manifestação do Tribunal acerca do juízo de
admissibilidade, oportunidade em que poderá, ou não, ser concedido
o efeito suspensivo requerido pelo apelante.
Portanto, a regra de atribuição de efeito suspensivo da apelação
quando da interposição torna-se exceção, ou seja, a regra passa a
ser a apelação sem efeito suspensivo, podendo tal efeito ser
concedido no caso de restar demonstrada a probabilidade de
provimento do recurso219.220

Nesta esteira, temos um positivo avanço, o recorrente deverá aplicar-se


muito mais do que atualmente caso deseje o efeito suspensivo da decisão
guerreada.

218
Alega o autor: “decisões somente poderiam ser revistas muito tempo depois de terem sido
proferidas, exatamente no momento do julgamento da apelação. Acolhida a apelação nesta parte,
todos os atos do procedimento posteriores à decisão anulada também seriam anulados. E os atos
anulados teriam de, em regra, ser novamente praticados.”
<http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI103549,81042Preclusao+e+decisao+interlocutoria+Antepr
ojeto+do+Novo+CPC+Analise+da> Acessado em 18/10/2010. As 21h43min.
219
CARDOSO, Hélio Apoliano; CARDOSO JUNIOR, Paulo Régis; PORTO, Sandra Maria. O Projeto
do Novo Código de Processo Civil. Revista IOB de Direito Civil e Processual Civil. v. 11, nº 66,
jul/ago. 2010. p. 88
220
A citação direta do autor Hélio Apoliano Cardoso, está correta, contudo é importante fazer a
ressalva do artigo 520 do CPC, o qual traz as exceções de quando a apelação é recebida somente no
efeito devolutivo.
82

Novamente, não há como deixar de reconhecer um mérito se pensarmos


que as decisões do primeiro grau serão pouco reformadas. Mas, se analisarmos a
atual conjuntura do judiciário brasileiro, onde uma significativa parte das decisões é
refeita em segundo grau, temos uma preocupação, quando da não atribuição, quase
automática de efeito suspensivo na apelação.
A questão é: para se tornar eficaz, requer uma ponderação do sistema
judiciário na íntegra, pois precisaremos que as decisões monocráticas sejam mais
bem ponderadas, para que, diminuam as reformas na instância superior. Assim esse
instituto, que por si só, carrega um grau de evolução, tenha cumprimento positivo.
De modo idêntico, o Projeto propõe que a apelação tenha seu juízo de
admissibilidade realizado tão somente no tribunal, mantendo-se, contudo, sua
interposição em primeiro grau de jurisdição. Conforme reza o artigo 926221.Tal
modificação, ainda que não expressivamente acabará contribuindo para o
encurtamento do tempo no processo.
Nada obstante, fará com que muitos recursos que, declaradamente
intempestivo, sejam remetidos ao Tribunal, indevidamente.

4.2.6. A resolução dos conflitos por meio da conciliação, mediação e arbitragem.


Institutos que tendem a crescer

Outra modificação elencada no Projeto é a criação do procedimento único,


bifásico, o qual é iniciado pela audiência de conciliação222, além de que, imprimir na
lei, a obrigação do julgador, sempre que possível, buscar a conciliação.
Cumpre esclarecer que esse espírito de conciliação não é novo no nosso
ordenamento e também é aquecido pelo sistema arbitral, que a cada dia cresce
mais. Para Ada Pellegrine, os chamados meios alternativos de solução de litígios
vêm perdendo sua característica negocial de direito privado, inserindo, cada vez
mais no quadro de política judiciária.

221
Art. 926. “A apelação será interposta e processada no juízo de primeiro grau; intimado o apelado e
decorrido o prazo para resposta, os autos serão remetidos ao tribunal, onde será realizado o juízo de
admissibilidade.”
222
SOARES, Carlos Henrique. Op. Cit. p.128
83

Por isso, antes de discutirmos sua importância ou eficácia no sistema é


relevante diferenciar esses três institutos. A mediação e a conciliação como meios
de autocomposição e a arbitragem como meio de heterocomposição.
Para a autora são mais “adequados do que o processo para um certo grupo
de controversas e, sobre tudo as primeiras, atingem a pacificação social muito mais
eficazmente do que a sentença autorizativa do juiz”223.
A conciliação é a mais simples, sendo aquela que ocorre no processo
judicial, e com a redação do Projeto deve ser buscada a todo tempo.
Já a mediação, segundo Luiz Rodrigues Wambier e Eduardo Talamini
coordenada por uma terceira pessoa alheia ao processo224. O mediador deve ser um
“profissional qualificado que atua no intuito de levar os litigantes a uma solução
embasada na identificação e eliminação das causas que geraram o conflito”225.
Em se tratando de arbitragem, as partes, sem a intervenção do poder
judiciário resolveram seus litígios por meio de um arbitro, que poderá ser escolhido
pelos litigantes ou por alguém que eles deleguem a escolha. “Por se tratar de opção
que deva ser feita necessariamente e exclusivamente pelos próprios interessados
(...) não implica violação ao princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional” 226.
Embora saibamos que este instituto não é novo, o que espanta é o seu
crescente avanço. Para a autora esse fenômeno é resultado de um clamor social,
fazendo com que o legislador fortaleça, cada vez mais, a vertente extrajudicial de
solução de controversas.
As primeiras manifestações significativas da arbitragem, no nosso
ordenamento, se deram com a Lei nº 9.307/1996, há mais de dez anos atrás.
Reforçando também os poderes do conciliador, no âmbito judicial, que já havia sido

223
GRINOVER, Ada Pellegrini. Mudanças Estruturais no Processo Civil Brasileiro. Revista IOB de
Direito Civil e Processual Civil. v.8, nº 44, Nov/dez, 2006. pp. 51-52
224
A Autocomposição pode ser entendida como conciliação na medida em que a resolução do conflito
consiste no sacrifício por parte de um dos litigantes ou de todos, do seu interesse próprio em favor do
interesse do outro. “segundo a melhor doutrina, gênero, do qual são espécies a transação (concessão
mútua), a submissão (reconhecimento da procedência do pedido) e a renúncia da pretensão
deduzida.” Podendo ocorrer, inclusive, dentro do processo. (In: WAMBIER, Luiz Rodrigues;
TALAMINI, Eduardo – Curso Avançado de Processo Civil Op. Cit. p. 94)
225
Idem. Ibidem. p. 94
226
Idem. Ibidem. p. 94
84

modificado pela lei nº 8.952/1994, a qual, alterou os artigos 125 e 331 do Código de
Processo Civil227.
Novamente falando de conciliação, nem tudo são méritos.

A conciliação judicial sofre uma série considerável de pressões


adversas, de modo a tornar limitados seus resultados práticos: as
pautas dos juízes estão lotadas, de tal sorte que estes não podem
dedicar-se ao trabalho naturalmente lento da mediação; nem todos
os magistrados são treinados (e muito menos vocacionados) para
conciliar; as partes mostram-se sempre intimidadas pela presença
dos juízes, de modo que a inibição e o receio de avançar posições,
que podem posteriormente desfavorecê-las no julgamento da causa,
acabam por tornar difícil a composição dirigida pelo magistrado228.

Contudo, o Projeto busca dar mais ênfase a conciliação, como uma tentativa
de, primeiro, torná-la mais natural aos olhos das partes e, segundo, desabarrotar o
judiciário, na medida em que, quanto mais litígios são resolvidos por meio da
conciliação, menos demandas teremos pendente de decisão judicial.
Nesta linha temos que o réu não é mais citado para contestar, assim como já
ocorre no procedimento sumário, quando citado, o réu deve comparecer, antes de
apresentar a contestação, para a audiência de conciliação. (artigo 333229).

No procedimento comum sumário do Código vigente a citação


também é realizada para que o réu compareça à audiência de
conciliação (art. 277), tal como se propôs para o procedimento
comum do Projeto. A diferença mais marcante entre as duas
audiências está em que inexistindo conciliação, no procedimento
comum sumário, tem o réu de responder à demanda na própria
audiência (art. 278), ao passo que no procedimento comum do
projeto a contestação poderá ser oferecida no prazo de 15 (quinze)
dias, que corre a partir da audiência de conciliação. (art. 334)230.

Todavia, uma vez mais, este procedimento funcionará na contramão do


proposto. Primeiro, as partes, como dito por Ada Pellegrino, têm medo de

227
GRINOVER, Ada Pellegrini Op. Cit. p. 52
228
Idem. Ibidem. p. 52
229
Art. 333. “Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de rejeição
liminar da demanda, o juiz designará audiência de conciliação com antecedência mínima de quinze
dias.”
230
MARINONI, Luiz Guilherme, MITIDIERO, Daniel. Op. Cit. p. 119
85

“confessar” na conciliação e isso prejudicá-la no decorrer do processo, e em


segundo, a demora para marcar as audiências.
A não ser que se aproxime do sistema dos Juizados Especiais, em que a
primeira audiência, a de conciliação, é realizada por um juiz leigo, o qual não
participará no decorrer do processo, em não havendo conciliação. Não
comprometendo assim nem o entendimento do juiz nem o tempo do processo.
Caso contrário, essa modificação retardará ainda mais a lide, visto a demora
que temos hoje para que seja marcada a audiência de instrução e julgamento.
Por todo o exposto, não há como concordar com a forma que o Projeto trata
a primeira fase do processo e a ânsia por conciliação, pois a ausência de
infraestrutura do Poder Judiciário somada a imposição que está se apresenta em
nada ajudara na brevidade da lide.
Conciliar é admirável, desde que seja uma opção das partes, “qualquer
tentativa de forçar a conciliação sob argumentos autoritários e que importem em
renúncia de direitos deveria ser considerada ilegal e abusiva”231.
No mesmo diapasão caminha a arbitragem. A ineficiência, seja pela demora,
seja pela descredibilidade das decisões, tem feito com que muitos, principalmente
empresas internacionais, venham buscando a arbitragem para resolver seus
conflitos.

4.3. Mudanças efetivas? Uma questão a ser ponderada

Não há como concluir diferente no quesito tempo, “o objetivo primordial do


Novo Código de Processo Civil será obter, a um só tempo, a tão almejada celeridade
processual sem perder de vista as garantias constitucionais do processo”232.

A ideologia norteadora dos trabalhos da Comissão foi de conferir


maior celeridade à prestação da justiça, por isso que, à luz desse
ideário maior, foram criados novéis institutos e abolidos outros que
se revelaram ineficientes ao longo do tempo, mercê da inclusão de

231
SOARES, Carlos Henrique. Op. Cit. p. 129
232
Idem. Ibidem. p. 120
86

ônus financeiro aptos a desencorajar as aventuras judiciais que


abarrotam as Cortes Judiciais do nosso País233.

Contudo, conforme todo o exposto no trabalho não há como não temer esse
foco dado à celeridade em detrimento a segurança jurídica234. A busca pela
segurança jurídica deve ser primada para que haja uma maior previsibilidade das
decisões. Só assim teremos uma possibilidade de que o Projeto seja eficiente.
Não há como não questionar todos esses quesitos apresentados, sendo que
trouxemos, apenas algumas preocupação apresentadas pelo Projeto, sabendo que,
tudo que questionamos está apenas no campo empírico e somente com a
aprovação, se é que será aprovado, saberemos como estes institutos funcionaram
na prática.
Sem deixar de ponderar o erro de foco dado à reforma. O problema não está
no número de recursos ou de procedimentos que o atual código tem, mas sim uma
questão política judiciária de infraestrutura se faz presente.
Em síntese, para que a ficção se transforme em uma realidade que melhore
a atual conjuntura

é necessário inclusive que o processo legislativo de formação do


novo instrumento normativo processual também seja muito bem
discutido e fundamentado por toda a sociedade, para que possamos
evidentemente declarar, como está previsto no art. 1º da Constituição
Federativa235.

233
<http://www.senado.gov.br/senado/novocpc/palavra_presidente.asp> Acessado em 18/10/2010.
As 20h
234
Na tentativa de justificar a prevalência dada a celeridade em detrimento a segurança jurídica
Carlos Henrique Soares faz uma análise sobre o que seria segurança jurídica atualmente, contudo,
não justifica essa emprego: “Podemos dividir o pensamento jurídico a respeito da segurança jurídica
em cinco grupos, quais sejam: a) os negativistas; b) a segurança jurídica como valor principal; c) a
segurança jurídica como valor autônomo; d) a segurança jurídica como justiça; e) a segurança
jurídica como valor anexo à justiça. (...)
Todas as teorias que buscam explicar o significado de segurança jurídica estão, de certa forma,
buscando justificar que o Estado precisa garantir aos seus cidadãos a previsibilidade de suas
decisões. Isso quer dizer que o Estado garante a segurança jurídica na medida em que permita aos
seus interessados deduzir, com maior certeza possível, qual será o resultado de uma demanda
colocada no Poder Judiciário.
No entanto, tal definição de segurança jurídica já não pode mais explicar o Estado Democrático de
Direito. É impossível, em um Estado que tem características marcantes a complexidade e a
pluralidade, a creditar que as decisões que sirvam de base para um concreto possam também servir
para serem aplicadas em outros casos. (In: SOARES, Carlos Henrique. Op. Cit. p. 125)
235
Idem. Ibidem. p. 124
87

Por isso, uma reforma em tão pouco tempo torna-se um tanto quanto
perigosa, mas há de ser ponderado o quesito tempo, novamente, e agora não o
tempo no processo, o tempo de elaboração/discussão/aprovação do Projeto.

O que garante a segurança jurídica é justamente a legitimidade das


decisões. E o que garante a legitimidade das decisões jurídicas é
justamente o processo de formação das mesmas, e só será legítima
a norma jurídica e a decisão jurídica que atender ao princípio
discursivo do direito236.

Portanto, para que há uma decisão legítima é necessário que haja processo
de formação legislativo ponderado e sério o qual resultará em um ordenamento
melhorado, o que não necessariamente significa a promulgação de um novo Code.

236
Idem. Ibidem. p. 126
88

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma sociedade plural e complexa resultante de um Estado que se pretenda


minimamente Democrático deve ter como base a concreta incidência do devido
processo legal guiado pelo contraditório e pela ampla defesa.
Na mesma esteira, não podemos deixar sem reparo o tempo de tramitação
do feito. Garantia Constitucional (inserida pela Emenda Constitucional nº. 45),
juntamente com os outros preceitos anunciados, tornam-se fontes inquestionáveis
de legitimidade para uma decisão perfeita.
Não há de se ignorar, contudo, as prováveis dificuldades operacionais
decorrentes desse processo justo, legítimo e rápido. Muito mais questões podem
contribuir para que essa situação ideal não ocorra.
Para demonstrar isso, necessário foi realizar uma análise no sistema
processual e, consequentemente, constitucional. Para tanto, trouxemos ao palco,
inicialmente, os princípios, os quais são de primordial importância para o aparelho,
na medida em que norteiam o trabalho dos aplicadores do direito, além de servirem
de normas para tomada de decisões, sendo este o foco dado pelo presente estudo.
Para melhor explicar como deve funcionar a aplicação dos princípios como
normas, fizemos uso da teoria apresentada por Dworkin e modificada em grande
medida por Alexy, ousando dizer que seus ensinamentos, chamados de teoria da
ponderação dos princípios, chegaram ao mais próximo do ideal.
Segundo os pensamentos de Alexy, os princípios por possuírem um alto
grau de abstração, quando em choque não devem ser subsumidos, assim como é
feito com as regras. Mas sim, deve haver a ponderação, para que estejam
contemplados um em maior grau que o outro.
Sendo assim, explicação melhor não pode haver quando falamos em
celeridade processual e ampla defesa. De grau maior, ambos se fazem essenciais,
são garantidos por previsão constitucional, contudo o cerne da discussão permeou-
se em qual deve prevalecer.
Neste diapasão a brevidade, característica marcante do processo moderno é
importante, mas, quando em colisão com o contraditório e a ampla defesa,
89

indubitável é que se desacelere e prime-se por um processo justo e com ampla


possibilidade de manifestação, não só das partes, mas de todos os envolvidos na
lide. A celeridade jamais deve ser vista como fim, mas um meio, indispensável, para
se atingir um fim maior, a justiça.
Conforme o próprio título anuncia, a discussão sobre esses dois preceitos
constitucionais é antiga, e há tempos os doutrinadores e aplicadores do direito, vêm
debatendo como satisfazer com mais afinco os anseios da sociedade.
Para isso, muitas reformas ocorreram no Código de Processo Civil, fazendo
com que, a nossa lei processual civil tenha perdido grande parte de sua
sistematização.
Sendo assim, com intuito de organizar a metodologia do Código, simplificar o
ordenamento e anunciar uma celeridade mais latente, formou-se a comissão
responsável pela criação do Novo Código de Processo Civil, a qual elaborou o
projeto de lei nº. 166/2010, atualmente em tramitação no Senado.
Com um espírito revolucionário e um pouco “assustador”, surgiram os
primeiros rumores sobre o que conteria o novo dispositivo. A priori teríamos grandes
revoluções no sistema, com mudanças abruptas, principalmente nos recursos.
Todavia a realidade do Projeto é bem diferente.
Notou-se em grande medida uma conservação do Código atual, contendo
ainda algumas modificações pontuais. Portanto, inevitável que tenha sofrido críticas,
não só pelo presente estudo, mas por boa parte dos pensadores e aplicadores do
direito.
Concluímos, deste modo, que, primeiro, simplesmente não necessitamos de
uma nova lei para reger o processo. O nosso Code tem trabalhando muito bem, e
grande parte das reformas realizadas, nos últimos anos, estão engatinhando e mal
foram sentidas pela sociedade.
Outrossim, o Projeto anunciou promessas avassaladoras que dariam conta
de todos, ou, ao menos, quase todos os problemas vividos hoje, quanto a
morosidade dos processos. Mas na realidade, notório é que o problema da demora
para obtermos o fim da lide não consiste em quantos recursos temos ou quanto
tempo as partes tem para recorrer. O problema é muito mais profundo.
90

Vivemos hoje sim em uma profunda crise processual, mas esta deficiência
não está na lei e um novo ordenamento não resolverá a parábola do tempo. Nossa
esfinge concentra-se em um ponto mais longínquo e enredado.
A grande crise do processo está no sistema. De pouco adianta suprimirmos
os Embargos Infringentes se não tivermos juízes suficientes para, em tempo
razoável, sentenciar.
Uma reforma abrupta deve sim ocorrer, mas na organização do judiciário. O
problema do tempo do processo se deve a falta de investimento material e
intelectual no Sistema Justiça e não a lei que temos vigendo atualmente.
Por isso, não poderíamos rematar de forma diversa. A celeridade é
importante, e deve ser buscada sempre, desde que resguardadas as garantias de
defesa, mas, se aplicarmos o remédio correto, não feriremos outros preceitos
constitucionais, e assim teremos um processo justo e célere. Na medida em que
deve ser.
91

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