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Relevo Vulcânico Na Região Metropolitana de Fortaleza: O Exemplo Do Domo Caruru

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Relevo Vulcânico na Região Metropolitana de Fortaleza: O Exemplo do Domo

Caruru.

TORRES, A.T ¹ ; V. CLAUDINO-SALES²;

¹ Mestrado em Geografia, Universidade Federal do Ceará. Departamento de Geografia.


Campus do Pici - Bloco 911 - CEP 60455-760 - Fortaleza - Ceará – Brasil
anatarino@yahoo.com.br;

² Professora-Doutora, Departamento de Geografia, Universidade Federal do Ceará.


vcs@ufc.br

Resumo

O último evento termotectônico ocorrido no Nordeste brasileiro, data do Tercíário (Oligoceno), por
volta de 30ma. Tal evento foi responsável pela origem de pequenos relevos vulcânicos nos estados do
Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba. Dentre estes distritos magmáticos originados neste período,
encontra-se a Formação Messejana, que se dispõe em setores da margem continental onshore, ao longo
da zona costeira da Região Metropolitana de Fortaleza. Esta formação compõe-se de uma dezena de
pequenos relevos, entre estes está o domo vulcânico do Caruru. Essa pesquisa tem por objetivo definir
as etapas da evolução geomorfológica desse relevo, e vem sendo pautada por pesquisa bibliográfica,
cartográfica, trabalhos de campo e uso de softwares como o global mapper. Os resultados indicam que
o “Monte Caruru” apresenta-se em forma de relevo dômico arredondado, com 59 metros de altitude
máxima e 350 metros de largura. Suas vertentes apresentam-se íngremes, o que provavelmente inibe,
em conjunto com as condições climáticas reinantes na área, do tipo semi-árido a sub-úmido, a
formação de solos bem desenvolvidos. No entanto, um detalhe importante levado em consideração
atualmente, refere-há mais de 3 décadas, esse relevo vem passando por atividade de mineração, o que
nos faz imaginar sua erradicação completa da paisagem nos próximos anos, em virtude da rapidez
com esta atividade avança sobre o relevo.

Palavras- Chave: Vulcanismo Terciário, Formação Messejana, Morfologia Vulcânica, domo do


Caruru.

Abstract

The last magmatic event occurred in the Brazilian Northeast was in the Tertiary period (Olygocen),
about 30ma ago. Such event was responsible by the origin of small volcanic shapes in the states of
Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. Among these magmatic districts originated in this period, there
is the Messejana Formation, situated on the Ceará continental margin, onshore, along the coastal zone
of Fortaleza city. This formation is represented by a set of ten of small volcanic reliefs, among them,
the dome of Caruru. This research has as objetive define the phases of geomorphological evolution of
this relief, as a result of bibliographical research, cartographical analyses, fieldwork and use of
softwares, as « global mapper ». The results indicate that the "Caruru Hill" has a rounded dome
shape, with 59 meters of maximum altitude and 350 meters of width. His slopes are steep, what
probably inhibits, together with the reigning climatic conditions in the area, of dry kind to sub-humid,
the formation of well developed soil and vegetation cover. It is surrounded in is basis by the
Caenozoic Barreiras Formation. At the present, the « Caruru Hill » is the site of mining activity, what
is probably going to completely destroy this volcanic relief in the next future.

Kay-words: Vulcanism Tertiary, Formation Messejana, geomorphological volcanic, Dome Caruru.


1-Introdução
A palavra vulcanismo é empregada quando o magma, material rochoso fundido, de
consistência pastosa extravasa a superfície terrestre. O material originado neste processo, de
maneira geral, ocorre em três estados: gasoso, líquido e sólido, e suas características
dependerão essencialmente da composição original do magma, e das condições de
temperatura e pressão (Boillot, 1990).

Uma das regiões influenciadas por eventos desse tipo durante a era Mesozóica
(250-65 M.a) foi o Nordeste Brasileiro, que passou por tais processos notadamente na sua
porção oriental. As atividades magmáticas ocorreram desde o Jurássico inferior (203-175
M.a) ao Cretáceo inferior (135-96 M.a) (Martins & Oliveira, 1992). Posteriormente,
ocorreram seqüências de deformações tectônicas cretáceas que resultaram na abertura dos
continentes africano e sul-americano, e na formação da margem continental do Nordeste
brasileiro associada, conseqüentemente, a geração e evolução do assoalho oceânico do
Atlântico Sul (Matos, 1992).

Essas manifestações se deram através de fenômenos magmáticos intrusivos


(internos) e efusivos (externos) que deram origem a diversos tipos litológicos (Almeida,
1988). Uma das últimas etapas de evolução termotectônica da margem continental do
Nordeste e do Estado do Ceará se deu por volta de 30 milhões de anos (M.a), na época do
Oligoceno no período Terciário, e foram responsáveis por pequenas atividades vulcânicas que
atingiram setores continentais dos estados do Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba. Dessa
atividade, resultaram pequenos relevos vulcânicos que, mesmo sendo feições altamente
susceptíveis à ação dos agentes geodinâmicos externo persistem na paisagem natural - um
deles é o domo vulcânico do Caruru, nosso objeto de estudo.

2- Localização geográfica e análise geomorfológica

O relevo vulcânico do Caruru situa-se no município do Eusébio, limite sudeste de


Fortaleza (figura 1). Apresenta-se de fácil acesso, a margem direita da Avenida Litorânea, que
liga nossa capital ao Porto das Dunas, em Aquiraz. Está limitado pelas coordenadas
geográficas 38º25’466” de longitude Oeste e 3º49’077” de latitude Sul.
Figura 1-- Mapa das principais vias de acesso ao Serrote Caruru. Fonte: Google Maps, adaptado por
Costa, 2008.

Quanto suas características morfológicas, este relevo apresenta-se em forma de


domo arredondado, tendo 59m de altitude máxima e 350m de comprimento (figura 2).

Figura 2--Visão da vertente Leste e morfologia do Caruru. Foto: Costa, 2008.


De acordo com a figura acima este relevo apresenta topo plano, vertentes
relativamente íngremes, mas com tendência à convexização. Desde o Oligoceno submetido às
intempéries, ele possivelmente não apresenta as mesmas formas originais. A caracterização
geomorfológica do Caruru nos remete a definir este relevo como um exemplo típico de domo
vulcânico. Tais características estão associadas a uma alta viscosidade de magma, fazendo
com que a lava, em vez de fluir, acumule-se no interior do edifício vulcânico, criando a feição
dômica com encostas íngremes e topo arredondado (figura 3.). No entorno do corpo pode-se
observar blocos arredondados e semi-arredondados (matacões) oriundos principalmente do
intemperismo físico ao longo do tempo.

Figura 3-- Esquema de formação de um domo vulcânico a esquerda e Perfil morfológico SE-NE do Caruru
construído a partir do programa Global Mapper. Costa, 2008.

Na atualidade, a vertente oeste do domo acha-se desfigurada, face à atividade de


mineração, fato que muda completamente a morfologia desse segmento (fig. 3, a esquerda).
Por se situar na zona costeira (apenas 2 km do mar), próximo ao estuário do rio
Pacoti, este relevo tem sua formação totalmente inserida no contexto geológico na cobertura
cenozóica da Formação Barreiras e dos depósitos eólicos dunares e fluviais que ocorrem ao
longo de todo o litoral do Estado do Ceará. A figura (4), para efeito de ilustração, mostra o
ambiente morfológico onde se localiza o relevo vulcânico. Na área, todas as formas, exceto o
Caruru, são de origem sedimentar.
Figura 4-- Visão em 3D da geomorfologia da área do Caruru. Fonte: Global Mapper

3- Origem do domo Caruru


A origem do relevo vulcânico do Caruru ainda não está bem definida. Entretanto,
Almeida (1988) diz que o Monte Caruru é a extremidade ocidental do alinhamento de vulcões
na zona de fratura “Altos Fundos”, que corta o Oceano Atlântico no Nordeste do Brasil, no
qual o arquipélago de Fernando de Noronha e Atol das Rocas participam. Portanto, este
relevo representa uma ramificação da dorsal média atlântica dirigida para a costa brasileira,
orientado segundo o paralelo de 4° Sul e a Formação Messejana, representando a terminação
na borda do continente dessa zona de fratura oceânica. Para o autor, esse magmatismo se
desenvolveu claramente em função da tectônica costeira da margem continental face à crosta
oceânica. Para Dal Ré Carneiro (1989), tal evento magmático teve lugar no período
compreendido entre o Eoceno e Mioceno, afetando áreas mais expressivas que o magmatismo
do Cenomaniano (97 a 90,4 M.a ), que se concentrou mais na região costeira de Pernambuco,
a Sul de Recife. Outra possibilidade é que a origem desse relevo juntamente com os outros
corpos da Formação Messejana possa ter se dado através da ação de um “hot spot”.
Provocando uma corrente de convecção anômala, com subida de material fundido até a
superfície. Com o deslocamento da crosta sobre o ponto quente, a saída de material deixa um
rastro de relevos vulcânicos, marcando o caminho de deslocamento da placa.
Dal Ré Carneiro (1989) chama atenção para anomalias geotérmicas situada na
região centro-norte do Ceará, estendendo-se desde o litoral até o limite sul do Maciço de
Tróia-Tauá e ao norte de Fortaleza. O autor supôs haver correlação entre as anomalias
geortémicas descritas e as áreas de atividades ígneas terciárias do Nordeste Oriental; a área do
magmatismo pode ser entendida como uma região ainda submetida a condições de
resfriamento e de perda de calor em ampla extensão decorridos cerca de 30 Ma. Reforçando
mais ainda a idéia, em trabalho recente, Almeida (2006) após analisar atuação de hot spot,
sugeriu que em meados do Eoceno (53-33.7 Ma) um hot spot teria surgido na região de
Fortaleza, ao longo da borda afinada e fraturada da crosta continental em contato com a
oceânica, originado por anomalia térmica na astenosfera. Segundo ele, o hot spot teria
produzido o vulcanismo representado pelas rochas alcalinas que se expõem nesse distrito
magmático.

4- Evolução da área de estudo

A evolução morfológica posterior ao vulcanismo que criou o monte Caruru é


completamente desconhecida. Sabe-se apenas que durante algum período pós-extrusão, o
edifício vulcânico foi erodido, resultando na exposição do domo criado durante a ascenção de
magma. Na sequência, a área sediou a deposição da cobertura sedimentar Barreiras, que
circunda o sopé do monte Caruru em toda a sua dimensão. Tal disposição morfoestratigráfica
indica que a idade da formação areno-argilosa Barreiras na área é posterior a 30 M.a – de fato,
alguns autores hoje consideram (e.g. Araí, 2006) uma idade miocênica para a Formação
Barreiras. Nesse sentido, a erosão do edifício vulcânico deu-se em curto intervalo de tempo,
entre o Oligoceno e o Mioceno, pois o contato com a Formação Barreiras e o domo vulcânico
ocorre com os fonólitos que o caracteriza. Esse episódio indica também que ocorreram
mudanças significativas na paisagem durante o evento Barreiras, transformando a paisagem,
de essencialmente cristalina, em sedimentar (Figura 5).
Figura 5--Ilustração mostrando a evolução da área onde se insere o relevo vulcânico do Caruru. Costa,
2008.

5- Tipos e idades das rochas


A Formação Messejana de acordo com Almeida (1988), apresenta a existência de
expressivo centro vulcânico alcalino oligocênico na região, constituido de neckes e diques de
rochas alcalinas encaixadas nas rochas do embasamento cristalino.
Vandoros e Oliveira (1968) foram os primeiros pesquisadores a estudar o Serrote
Caruru, descrevendo a petrologia deste relevo como sendo formado por fonólitos (rocha de
cores cinza a esverdeada, textura porfirítica com presença de cristais que se sobressaem sobre
os demais, com fenocritais que atingem até 3mm de dimensões, e granulação variando de fina
a muito fina).
Quanto à mineralogia, segundo os mesmos autores, o fonólito constitui-se
principalmente de feldspato potássico, nefelina, piroxênio sódico, biotita, plagioclásio, e
minerais do grupo da sodalita. O Feldspato potássico constitui mais de 50% da rocha e os
minerais máficos (Ca, Fe-Mg) menos de 10% (quadro 1).

Serrote Sio2 Tio2 Al2O3 Fe2O3 FeO MnO MgO CaO Na2O K2O P2O5
Caruru
(fn-11) 54, 5 0, 34 21,1 1, 02 1, 46 0, 18 0, 13 0, 97 9, 37 5, 97 0, 08

Quadro 1-- Resultado da análise química em amostras do fonólito do relevo vulcânico Caruru feitas por
guimarães et al. (1982) no laboratório da Geosol, em Belo Horizonte-MG.
Relacionado aos dados geocronológicos Vandoros e Oliveira (1968) utilizando o
método K-Ar (Potássio-Argônio) indicaram idade de 26.6+-0.8 Ma e 28.6+ 0.9 Ma em
Feldspato, para o fonólito do Serrote Caruru. Portanto, uma idade oligocênica (33,7-23,5 Ma).

6- Problemas ambientais

O Monte Caruru, há mais de 35 anos, vem sendo explorado para a obtenção de


material para a construção civil. Segundo dados colhidos na pedreira, o mecanismo de
exploração é um dos melhores do Nordeste, devido ao uso de equipamentos modernos
adotados durante as explosões. Como nos últimos anos a área ao entorno da pedreira passou a
ser mais povoada, começaram aparecer vários problemas devido à extração - a empresa faz
uma lavagem nas rochas depois de extração, para diminuir a poeira, mas a população do
entorno, ainda sim, reclama do nível de poluição atmosférica, que parece ser causador de
problemas respiratórios. Outro problema está relacionado às rachaduras que surgem nas
paredes ou nos rebocos das casas durante as explosões. O tema tem sido objeto de debate na
mídia, com reportagens mostrando os problemas causados em um condomínio de luxo (Alpha
Ville Fortaleza) que fica ao lado da pedreira - ao que consta, os moradores desse condomínio
estariam tentando através da justiça interditar a pedreira. Para além dos problemas sócio-
ambientais, registra-se que a atividade de mineração (figura 6) coloca em risco emininente de
erradicação da paisagem local esse relevo, de origem tão peculiar em meio à paisagem
costeira do estado.

Figura 6--Visão geral da Exploração. Foto: Costa, 2007.


8-Conclusões

O monte Caruru, quanto às suas características morfológicas, apresenta-se em


forma dômica de relevo vulcânico. Sua área de inserção esteve submetida a grandes mudanças
desde de que o relevo teve origem, passando seu entorno, de cristalino, a sedimentar. Na
atualidade, ocorre desconfiguração de sua forma original, condicionada por uma exploração
mineral. Desta forma, este relevo pode ser erradicado da paisagem local nos próximos anos, o
que representaria um perda enorme, levando em consideração que tal forma nos oferece um
especial interesse científico pelas informações que pode nos trazer sobre a origem e evolução
de processos vulcânicos ocorridos no Nordeste do Brasil durante o Terciário, e que nos
proporciona oportunidade de estudos geomorfológicos individualizados e aplicados
incomuns.

9--Referências bibliográficas

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