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Artigo 07 - Cumbane - 01-06-2021 - Revisto Pelo Autor

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Tendência da Criminalidade na vigência do Estado de Emergência

em Moçambique

Resumo

O problema da violência sempre motivou interesse da sociedade em compreender as


suas manifestações, motivações e possíveis soluções. Com a pandemia da Covid-19 que
afeta a humanidade têm sido reportados casos de incremento da violência entre as
pessoas. Este estudo avalia a tendência criminal em Moçambique durante a vigência do
Estado de Emergência, declarado no 2º trimestre de 2020, no âmbito das medidas de
prevenção contra a Covid-19. Com base em análise estatística da variação dos registos
policiais entre o 1º e o 2º trimestre, relacionou-se a evolução da criminalidade com
certas decisões decorrentes do Estado de Emergência. A violência não incrementou com
a declaração do Estado de Emergência, havendo, no geral, registo de uma tendência
para a redução de casos. Não obstante, algumas categorias criminais como injúrias e
violência contra as autoridades públicas, e crimes contra o ambiente tiveram uma
tendência crescente. A tendência da criminalidade durante o período de vigência do
Estado de Emergência não pode ser explicada de forma generalizada ou associada aos
mesmos fatores. Cada família ou estrato criminal ou até tipo legal de crime tem uma
explicação particular e associa-se a uma determinada medida imposta pelas autoridades
no âmbito da prevenção contra a Covid-19.
Palavras-chave: Criminalidade, Diminuição da violência; Análise estatística; Pandemia
da Covid-19.

Introdução

A Organização das Nações Unidas (ONU) tem alertado sobre possível


incremento da violência durante a pandemia da Covid-19. Por meio das suas agências, a
ONU mostra preocupação com o provável aumento da violência contra a mulher e
criança; o tráfico de pessoas e de drogas; violência sexual; entre outros. Na base do
alerta da ONU estão as medidas de isolamento social e o fecho de fronteiras que têm
sido decretadas pelos Governos de quase todo o mundo, como forma de conter a
propagação do novo coronavírus, que causa a Covid-19.
Em Abril de 2020, por razões de calamidade pública provocada pela pandemia
de Covid-19, em Moçambique, foi declarado o Estado de Emergência, com duração de
30 dias, tendo sido prorrogado por três vezes até junho do mesmo ano. Com a vigência
do Estado de Emergência, impôs-se algumas medidas restritivas, tais como:
encerramento parcial das fronteiras; limitação da circulação interna de pessoas;
suspensão de eventos públicos e privados; suspensão das aulas em todos os níveis de

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ensino; redução do número de funcionários no local de trabalho, com a introdução do
regime de rotatividade laboral; encerramento de estabelecimentos de diversão noturna,
bares e outros locais de venda e consumo de bebidas alcoólicas; redução da lotação
permitida nos transportes de passageiros.
Neste período, a Comunicação Social tem reportado casos de violência, que se
enquadra em diferentes esferas criminais. Por exemplo, a Rádio Moçambique, na sua
página on-line, noticiou em 8 de Junho, a detenção de um indivíduo suspeito de
homicídio precedido de violação sexual a uma cidadã de 68 anos, no povoado de
Chólue, Distrito de Chimbunila, no Niassa, no fim-de-semana anterior. Ainda, a Rádio
Moçambique na edição de 16 de Junho, referiu-se ao aumento de crimes contra a
liberdade sexual na província de Maputo, durante os meses de Abril e Maio, que
coincidiram com a declaração do Estado de Emergência no País, com um registo de 33
casos contra 26 em igual período do ano passado (RM, 2020).
Por seu turno, o Jornal Notícias, na edição on-line de 7 de Junho, reportou um
caso de homicídio seguido de suicídio de um agente da Polícia da República de
Moçambique (PRM), afeto ao Comando da Cidade de Maputo, no Bairro de Malí,
Distrito de Marracuene, província de Maputo. Na edição de 21 de Junho, o mesmo
Órgão de Comunicação Social relatou a detenção, no dia anterior, na 2.ª Esquadra da
PRM, na Matola, província de Maputo, de oito indivíduos, incluindo uma mulher,
indiciados de consumo e venda de estupefacientes (JN, 2020).
Existe uma percepção de que as medidas de confinamento ou restrição de
circulação de pessoas dentro e fora do país criam um ambiente favorável para a
ocorrência de actos de violência, embora essa relação não esteja explicada. Se no
ambiente familiar o confinamento parece abrir espaço para o aumento da exposição das
vítimas de violência doméstica, devido a maior proximidade daquelas ao agressor,
parece existirem outros fatores como o stress do cotidiano, as dificuldades financeiras e
de relacionamento que se afiguram decisivos para a tendência da violência.
O encerramento das fronteiras tem sido associado aos crimes de tráfico de
drogas e de pessoas, considerando-se que elas não foram totalmente encerradas,
admitindo-se casos excepcionais no interesse do Estado, apoio humanitário, saúde e
transporte de carga. Tal exceção pode ser aproveitada pelos criminosos para o tráfico de
drogas e de pessoas. Acresce-se a isso a tendência do aumento da exposição dos
cidadãos à utilização de facilitadores de migração ilegal.

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A questão central é: qual é a tendência da criminalidade durante os três meses da
vigência do Estado de Emergência em Moçambique? Para responder este
questionamento elaborou-se o seguinte objetivo: Avaliar a tendência criminal em
Moçambique durante a vigência do Estado de Emergência. Especificamente, pretende-
se verificar a variação da criminalidade durante o período em análise; e relacionar a
tendência da criminalidade com certas medidas decretada nesse âmbito.
O estudo considera que, por meio das estatísticas criminais, é possível conhecer
a relação entre a criminalidade e os diferentes fatores, quer sejam sociais, políticos,
jurídicos, ambientais ou outros. Não obstante a relevância das estatísticas oficiais, é
importante não perder de vista a existência das chamadas cifras negras e cifras
douradas. As primeiras referem-se aos crimes não comunicados às autoridades, quer por
inércia ou desinteresse das vítimas ou outras causas, dentre as quais os erros de coleta e
a tratamento de dados. As cifras negras são, de grosso modo, representadas pela
ausência de dados de delito comum ou crimes de rua, como furtos, roubos, estupros, e
outros. Por sua vez, as cifras douradas cobrem os crimes do colarinho branco, praticados
por indivíduos com forte influência, capazes de manipular o poder do Estado e, por isso,
muitas vezes, os seus crimes não são apurados ou, quando apurados, não são revelados.
São os casos de crimes de sonegação fiscal, as falências fraudulentas, a lavagem de
dinheiro, os crimes eleitorais (Filho, 2013). Por isso, a análise estatística feita teve
sempre presente a noção dos conceitos de criminalidade real (totalidade de crimes
cometidos) versus a criminalidade revelada (quantidade de crimes que constam dos
registos oficiais).

Revisão Bibliográfica

O crime é um mal que acompanha a existência da sociedade e, por isso, a


preocupação com a sua compreensão e busca de soluções tem motivado diversos
estudos, alguns dos quais consolidados em verdadeiros paradigmas ou teorias.
O conceito do crime é variável em função de vários fatores, dentre eles, o espaço
geográfico, a cultura, a época e o modelo político vigente. Uma determinada ação ou
omissão pode ser considerada ofensa criminal num certo país, mas não o ser num outro
(AUTOR, ANO). Por exemplo, o consumo de estupefacientes ou de álcool pode ser
bem tolerado numa certa cultura do que noutra e, por via disso, ganhar ou não relevo
para constar na legislação penal dos estados. De igual modo, o que na atualidade é

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considerado crime pode não ser futuramente e não ter sido no passado. Por exemplo, o
adultério e o aborto já foram considerados crimes em Moçambique, mas hoje deixaram
de o ser.
De entre as diversas teorias que buscam explicar o problema do crime, o
presente texto discute algumas das chamadas teorias sociológicas, nomeadamente a
Escola de Chicago, a associação diferencial, a anomia, a teoria de controlo. Em
oposição às denominadas teorias biológicas de Cesare Lombroso, que supõem que
algumas pessoas nascem criminosas e que os criminosos são fisiologicamente distintos
dos não criminosos, as teorias sociológicas têm em comum a proposição de que o crime
é enformado por fatores externos ao indivíduo, como suas experiências na família, na
escola, na amizade e na vizinhança (SANTOS, 2016).
A Escola de Chicago é um paradigma de pensamento desenvolvido na
Universidade do mesmo nome, nos Estados Unidos da América, entre 1920 e 1930,
pelos sociólogos Clifford Shaw e Henry McKay. Também denominada teoria ecológica
ou de desorganização social, este paradigma teve como precursores mais destacados
Albion W. Small; Robert Ezra Park (1864-1944); Ernest Watson Burgess (1886-1966);
Roderick Duncan McKenzie (1885-1940) e William Thomas (1863-1947). A tese
central da teoria ecológica é de que o espaço físico e as relações humanas influenciam
no estilo de vida do indivíduo e no nível de controlo social, sendo que a mobilidade e a
fluidez reduzem o efectivo controlo social nas grandes cidades, abrindo espaço para
altos índices de criminalidade.
A associação diferencial, teoria de Edwin Sutherland (1883-1950), defende a
tese de que o crime é resultado de aprendizagem directa ou indirecta com pessoas mais
próximas, num processo de influência para acções mais favoráveis à violação da lei. As
pessoas aprendem o crime ou a respeitar as leis em função das suas relações com as
outras. Alguns fatores como o grau de supervisão dos pais, o nível de coesão dos grupos
de amizade, a percepção dos jovens sobre os outros com problemas de delinquência, são
determinantes para o envolvimento ou não do indivíduo no crime (SANTOS, 2016;
CERQUEIRA e LOBÃO, 2004). A teoria de associação diferencial também aborda os
crimes do colarinho branco afirmando que a associação entre os diferentes atores neste
tipo de crime é um factor chave para a sua prática (SUTHERLAND, 1945, 2012).
A teoria de anomia, ou abandono às regras de convivência em sociedade, de
Robert Merton, tem a sua gênese nas ideias de Émile Durkheim e explica o crime com
base nas tensões existentes na estrutura da sociedade, que, no entender dos sociólogos,

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são a base da desorganização social e das suas patologias, de entre as quais o crime. O
crime seria resultante da frustração do indivíduo em alcançar as suas aspirações ou
metas, devido aos condicionalismos estruturantes da sociedade (SANTOS, 2016).
A teoria de controle defende que todo o indivíduo tem potencialidades para o
crime, sendo que a sua efetiva participação depende das objetivas condições favoráveis
e do grau de controle exercido pelas autoridades (SANTOS, 2016). Neste âmbito,
emergem algumas teorias que têm em comum o espaço como elemento de influência da
criminalidade, designadamente: a Teoria das Atividades de Rotina. Segundo esta teoria
o crime ocorre quando coexistem três elementos (vítima, potencial agressor e a presença
ou ausência de elementos dissuasórios); a Teoria das Janelas Quebradas, que advoga a
necessidade de resolução proativa dos problemas, para que não se agigantem; a Teoria
da Escolha Racional, que sustenta que o criminoso avalia as vantagens e as
desvantagens dos seus actos e toma a decisão em função dos ganhos que vislumbra com
a sua atitude; e a Teoria da Prevenção Situacional do Crime, que prescreve a redução de
oportunidades da prática de crime e o aumento dos riscos para o potencial criminoso
(SANTOS, 2016, pág. 55).
Francois et al.(2015), no Distrito Municipal de Ho, no Ghana, estudaram as
causas e tendências da criminalidade e chegaram à conclusão de que a negligência
parental, a pobreza, o desemprego, a pressão dos colegas e o abuso de drogas eram as
principais causas do crime. Shader (2004) categoriza os factores de risco da
criminalidade em pelo menos cinco dimensões: do indivíduo, da família, do grupo, da
escola e da comunidade. A presente análise não contempla o estudo de fatores
individuais, o enfoque está ao nível social.
Em relação à estrutura familiar, são apontados os seguintes factores de risco:
deficientes competências parentais, tamanho da família, um histórico familiar de
violência, como pais conflituosos e anti-sociais (Shader, 2004; Derzon, 2010). No que
tange à influência do grupo, estudos estabelecem uma relação entre envolvimento em
um grupo com parceiros criminosos e comportamento criminoso (Shader, 2004, p. 6).
Como efeito da teoria de associação diferencial, opera-se um processo de aprendizagem
decorrente de contacto com outros indivíduos criminosos.
Quanto à escola, a literatura refere que políticas educativas que privilegiam
medidas como a reprovação do aluno, suspensão ou expulsão da escola provocam um
efeito adverso, contribuindo para a formação de delinquentes no futuro (Shader, 2004).
Na mesma perspectiva, Loeber (2003) relaciona algumas características das escolas com

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a probabilidade de as crianças se envolverem com o crime, no presente ou no futuro, são
exemplos: baixos níveis de satisfação pouca cooperação entre professores; má relação
aluno-professor; prevalência de normas e valores que apoiam comportamentos anti-
sociais; erro na definição das regras e expectativas de conduta; e uma aplicação
inadequada de regras, estas condições influenciam na propensão de delinquência
juvenil, segundo o autor.
Relativamente à comunidade, numa perspectiva da Escola de Chicago, os
estudos citados apontam para uma forte ligação entre a propensão à criminalidade e
residir num bairro com sérios problemas de pobreza, tráfico e consumo de drogas, com
possibilidade de contato com armas de fogo, fraca estrutura de controle social,
solidariedade urbana, alta rotatividade residencial (Shader, 2004; Loeber, 2003).
Da revisão teórica, fica evidente que o crime não pode ser explicado a partir de
um único factor, sendo resultado da interacção entre factores individuais, sociais e
político-sistémicos.

Material e Métodos

No que diz respeito à natureza, trata-se de pesquisa aplicada. Quanto a


abordagem do problema é quantitativo, em que foram utilizadas análises estatísticas
criminais de Moçambique, e os objetivos são exploratórios e descritivos. Para os
procedimentos técnicos a pesquisa é do tipo documental, que segundo Godoy (1995),
trata-se de dados que não receberam nenhum tratamento análito por parte do
pesquisador. Moçambique é um país da costa oriental da África Austral, que tem como
limites: a norte, a Tanzânia; a noroeste, o Malawi e a Zâmbia; a oeste, o Zimbábwe, a
África do Sul e a Suazilândia; a sul, a África do Sul; a leste, a secção do Oceano Índico
designada por Canal de Moçambique, ao largo do qual se encontram o Madagáscar e as
Comores.
Com uma população de 27. 909. 798 habitantes, dos quais 52% são mulheres e
48% são homens, os principais grupos criminais registados em Moçambique são: contra
a propriedade, contra pessoas e contra a ordem e tranquilidade públicas (INE, 2018, p.
11).
Os dados utilizados nesta pesquisa foram fornecidos pela Direcção de Operações
do Comando Geral da PRM e referem-se aos registos policiais em todo o País, no
período compreendido entre Janeiro e Junho de 2020. Era importante usar os dados a

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partir de Janeiro de modo a permitir a comparação entre os primeiros três meses do ano,
período antes da declaração do Estado de Emergência, e os três meses seguintes à
declaração. Propositadamente, foi excluído o mês de Julho por considerar-se que a
terceira prorrogação do Estado de Emergência foi acompanhada pelo relaxamento de
certas medidas de maior impacto em indicadores socioeconómicos e demográficos
importantes no controle da criminalidade como a autorização do retorno gradual às
aulas e a retomada de certas atividades econômicas.
Para a análise dos dados foi utilizada estatística descritiva, utilizando medidas de
tendência central, como o cálculo de variação (BUSSAB; MORETTIN, 2017), a fim de
extrair a tendência da criminalidade no período estudado.

Resultados e Discussão

Na Tabela 1 são apresentados os dados comparativos dos crimes registados antes


e durante o Estado de Emergência. A análise dos dados indica a tendência da violência e
da criminalidade em Moçambique no período estudado.

Tabela 1 -Variação dos crimes ocorridos em Moçambique, antes e depois do estado de


emergência, 2020.
Estado de
Variação
SUB - GRUPOS Emergência
Antes Depois Nº %
Crimes contra a propriedade 2358 2198 -160 -6,79
Violência doméstica 668 568 -100 -14,97
Injúrias e violências contra as autoridades públicas 5 351 346 6.920,0
Crimes contra a integridade física 443 291 -152 -34,31
Crimes contra a vida 152 118 -34 -22,37
Crimes contra a liberdade sexual 106 113 7 6,6
Falências, burlas e outras defraudações 83 88 5 6,02
Crimes de corrupção, peculato e concussão 111 72 -39 -35,14
Incêndio e danos 118 68 -50 -42,37
Crimes contra a reserva da vida privada 74 65 -9 -12,16
Crimes contra o ambiente 42 56 14 33,33
Reuniões criminosas, sedição e assuada 50 50 0 -
Armas, caça e pesca 33 24 -9 -27,27
Crimes contra a honra 12 16 4 33,33
Nomes, trajos, empregos e títulos supostos ou usurpados 9 14 5 55,56
Falsificação de escritos, moeda, notas e/títulos 28 13 -15 -53,57
Crimes contra a liberdade das pessoas 21 8 -13 -61,9
Crimes informáticos 6 8 2 33,33
Crimes contra a saúde pública 0 3 3 -
Crimes contra o estado das pessoas 2 2 0 -
Violação das leis sobre inumações, violação de túmulos 2 2 0 -
Associação de malfeitores 2 1 -1 -50

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Total 4325 4129 -196 -4,53
Fonte: Comando Geral da PRM (ANO).

De um modo geral, a Tabela 1 demonstra que os crimes registados tiveram um


comportamento tendencialmente decrescente, com variações positivas baixas. Supõe-se
as possíveis explicações do comportamento de cada classe de crimes.
Os crimes contra a liberdade de pessoas reduziram significativamente, fato que
pode ser explicado pelo encerramento das fronteiras estatais, enquanto o
comportamento regressivo na categoria dos crimes de corrupção, peculato e concussão
pode ser associado ao reduzido volume de movimento de documentação e peças de
expediente em nível de administração pública durante a vigência do Estado de
Emergência.
A tendência decrescente dos crimes contra a integridade física e contra a vida
pode-se relacionar à restrição de circulação interna de pessoas e ao encerramento de
locais de venda e consumo de bebidas alcoólicas e de diversão noturna, considerando
que a estatística deste tipo de crimes é fortemente influenciada por consumo de álcool.
Embora se tenha uma ideia quase generalizada de que o crime de violência
doméstica tenderia a aumentar no período do Estado de Emergência, esta percepção é
contrariada, pois os dados estatísticos revelam que esta categoria criminal reduziu. Essa
redução pode estar influenciada pelo desenvolvimento ou consolidação de afetividade
entre os membros das famílias, decorrente de maior convivência entre si.
A tendência geral de diminuição da violência no país durante a vigência do
Estado de Emergência sofreu um relativo desvio nos crimes de injúrias e violência
contra as autoridades públicas, crimes contra o ambiente e nos crimes contra a liberdade
sexual. É possível estabelecer uma relação direta de subida dos crimes de injúria e
violência contra as autoridades públicas com a oposição de certos cidadãos à ação das
autoridades que operacionalizam o cumprimento das medidas impostas pela declaração
do Estado de Emergência. Quanto aos crimes ambientais, ganharam destaque com o
aproveitamento, por parte dos exploradores ilegais, de recursos florestais e de espécies
protegidas. Por seu turno, o crescimento dos crimes sexuais pode ser relacionado com o
confinamento e consequente aumento da vulnerabilidade das vítimas perante seus
predadores que, muitas vezes, são pessoas da família.

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Considerações Finais

A pesquisa concluiu que durante a vigência do Estado de Emergência, houve


tendência para a diminuição da criminalidade no geral. São exemplos os crimes contra a
liberdade de pessoas; os crimes de falsificação de escritos, moeda, notas de bancos e
títulos do Estado; incêndio e danos; corrupção, peculato e concussão; os crimes contra a
vida e integridade física; o crime de armas, caça e pesca; e violência doméstica.
Contudo, algumas categorias criminais como injúrias e violência contra as autoridades
públicas, e crimes contra o ambiente tiveram uma tendência crescente.
O comportamento dos dados analisados permite concluir que a tendência da
violência e criminalidade durante o período estudado não pode ser explicada de forma
generalizada ou com base nos mesmos fatores. Cada grupo, tanto o dos crimes que
aumentaram como o dos que decresceram, tem os seus próprios fatores e, mesmo dentro
dessas duas categorias, cada família ou estrato criminal, ou até tipo legal de crime,
também tem a sua explicação particular. Porém, parece existir uma relação entre a
tendência da criminalidade e as medidas restritivas impostas durante o Estado de
Emergência. Em pesquisas futuras, a robustez desta relação poderá ser aferida com base
numa análise multivariada, desagregando as famílias criminais e analisando cada tipo
legal de crime.

Referências Bibliográficas

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