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Análise Literária – O Cortiço
O Cortiço - Uma alegoria do Brasil do século XIX
O Cortiço é um romance urbano (se passa no Rio de Janeiro), romance de costumes (descreve os hábitos e os costumes da população carioca da época) e também de tese (pois quer provar que o ambiente do cortiço teve influência da vida dos moradores). O romance tornou-se peça-chave para o melhor entendimento do Brasil do século XIX e não há como ignorar que a ideologia e as relações sociais representadas de modo fictício em "O Cortiço" estavam muito presentes no país. Crítica ao capitalismo (luta de classes). Essa obra de Aluísio de Azevedo tem como influência maior o romance "L’Assommoir" do escritor francês Émile Zola, que prescreve um rigor científico na representação da realidade. A intenção do método naturalista era fazer uma crítica contundente e coerente de uma realidade corrompida. Zola e, neste caso, Aluísio combatem, como princípio teórico, a degradação causada pela mistura de raças. Por isso, os romances naturalistas são constituídos de espaços nos quais convivem desvalidos de várias etnias. Esses espaços se tornam personagens do romance. Também sofreu influências pelo positivismo de Conte, o evolucionismo de Darwin e o determinismo de Taine. É o caso do cortiço, que se projeta na obra mais do que os próprios personagens que ali vivem. Em um trecho do romance o narrador compara o cortiço a uma estrutura biológica (floresta), um organismo vivo que cresce e se desenvolve, aumentando as forças daninhas e determinando o caráter moral de quem habita seu interior. Mais do que empregar os preceitos do naturalismo, a obra mostra práticas recorrentes no Brasil do século XIX. Na situação de capitalismo incipiente, o explorador vivia muito próximo ao explorado, daí a estalagem de João Romão estar junto aos pobres moradores do cortiço. Ao lado, o burguês Miranda, de projeção social mais elevada que João Romão, vive em seu palacete com ares aristocráticos e teme o crescimento do cortiço. Por isso pode-se dizer que "O Cortiço" não é somente um romance naturalista, mas uma alegoria do Brasil. O autor naturalista tinha uma tese a sustentar sua história, a intenção era provar, por meio da obra literária, como o meio, a raça e a história determinam o homem e o levam à degradação, portanto é um romance de tese. A obra está a serviço de um argumento. Aluísio se propõe a mostrar que a mistura de raças em um mesmo meio desemboca na promiscuidade sexual, moral e na completa degradação humana. Mas, para além disso, o livro apresenta outras questões pertinentes para pensar o Brasil, que ainda são atuais, como a imensa desigualdade social. O Cortiço - Narrador A obra é narrada em terceira pessoa, com narrador onisciente (que tem conhecimento de tudo), como propunha o movimento naturalista. O narrador tem poder total na estrutura do romance: entra no pensamento dos personagens, faz julgamentos e tenta comprovar, como se fosse um cientista, as influências do meio, da raça e do momento histórico. Ele faz uso do discurso direto e indireto. O foco da narração, a princípio, mantém uma aparência de imparcialidade, como se o narrador se apartasse, à semelhança de um deus, do mundo por ele criado. No entanto, isso é ilusório, porque o procedimento de representar a realidade de forma objetiva já configura uma posição ideologicamente tendenciosa. O Cortiço - Tempo Em "O Cortiço", o tempo é trabalhado de maneira linear, com princípio, meio e desfecho da narrativa. A história se desenrola no Brasil do século XIX, sem precisão de datas. Há, no entanto, que ressaltar a relação do tempo com o desenvolvimento do cortiço e com o enriquecimento de João Romão. O Cortiço - Espaço São dois os espaços explorados na obra. o O primeiro é o cortiço, amontoado de casebres mal-arranjados, onde os pobres vivem. Esse espaço representa a mistura de raças e a promiscuidade das classes baixas. Funciona como um organismo vivo. Junto ao cortiço estão a pedreira e a taverna do português João Romão. o O segundo espaço, que fica ao lado do cortiço, é o sobrado aristocratizante do comerciante Miranda e de sua família. O sobrado representa a burguesia ascendente do século XIX. Esses espaços fictícios são enquadrados no cenário do bairro de Botafogo, explorando a exuberante natureza local como meio determinante. Dessa maneira, o sol abrasador do litoral americano funciona como elemento corruptor do homem local. o Os dois espaços estão lado a lado, o que vai gerar uma miscigenação, ou seja, uma mistura dessas raças que de acordo com o determinismo não será positivo. O Cortiço - Contexto Sociopolítico da Época O início do século XIX no Brasil é marcado, em 1808, pela chegada da família real portuguesa, que fugia do conflito entre a França napoleônica e a Inglaterra. No Brasil, ainda, apreciava-se a arte barroca-colonial. A transferência da corte portuguesa para o Brasil e a elevação da colônia a Reino Unido e sede do governo metropolitano renovaram o país. O Cortiço - Comentários O cortiço é considerado o melhor representante do movimento naturalista brasileiro. As principais características do Naturalismo seriam a animalização das personagens e, consequentemente, a ação baseada em instintos naturais, tais como os instintos sexuais e os de sobrevivência. Em "O cortiço" aparecem basicamente duas linhas de conduta: uma que trata das questões sociais e outra das questões individuais e sentimentais. o No caso das questões sociais, temos como maior representante a personagem João Romão, que torna-se um grande comerciante passando por cima de tudo e todos. Assim, através de uma representação crua das relações sociais, que aqui são puramente movidas pelo interesse individual, têm-se uma crítica social. o Já nas questões individuais/sentimentais, temos a personagem de Jerônimo, que casa com a Rita Baiana, mas não por amor. Ele se envolve com ela porque se sente atraído sexualmente por ela. Outro ponto que pode ser destacado é o fato de o próprio cortiço acaba de se tornando, de certa forma, uma personagem principal do livro devido a uma personificação do espaço. Por exemplo, em certo momento o narrador diz que “os olhos do cortiço se abrem”, ao invés de dizer “as janelas do cortiço se abrem”. Essa característica tem bastante a ver com o fato de, para a corrente naturalista, o meio ter grande influência na ação das personagens. Outro exemplo disso na obra O cortiço é o próprio sol. Em certo momento, a esposa de Jerônimo culpa o sol por todas as desgraças que ocorreram em sua vida. São personagens psicologicamente superficiais, isto é, servem apena para configurar tipos sociais. o João Romão é o capitalista explorador. o Bertoleza é o trabalhador escravo. o Miranda é o burguês (burguesia). o Jerônimo a disciplina do trabalho (apenas no começo do livro, depois o meio o transforma, mostrando que a má influência pode afetar o homem). o Piedade é a mulher europeia. o Rita Baiana a mulher brasileira. Rita Baiana representa a tropicalidade brasileira, e no momento em que Jerônimo fica doente ela leva a beberagem (café com cachaça) para ele melhorar, e este gesto pode ser comparado a Iracema que dava a bebida Jurema ao português; No livro, a ordem e a desordem misturam-se como em Memórias de um Sargento de Milícias, pois a filha do policial Alexandre era protegida de Leonie.