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Narrativas de Práticas em Educação e Tecnologia A Trajetória Do Professor Digital

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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO

ESCOLA DE COMUNICAÇÃO, EDUCAÇÃO E HUMANIDADES


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO-SENSU
MESTRADO EM EDUCAÇÃO

BRUNO TONHETTI GALASSE

NARRATIVAS DE PRÁTICAS EM EDUCAÇÃO E TECNOLOGIA:


A TRAJETÓRIA DO PROFESSOR DIGITAL

São Bernardo do Campo


2016
BRUNO TONHETTI GALASSE

NARRATIVAS DE PRÁTICAS EM EDUCAÇÃO E TECNOLOGIA:


A TRAJETÓRIA DO PROFESSOR DIGITAL

Dissertação apresentada à Universidade


Metodista de São Paulo como exigência
parcial do Programa de Pós-Graduação
Stricto Sensu para a obtenção do título de
Mestre em Educação, sob orientação da
Prof.ª Dr.ª Adriana Barroso de Azevedo.

São Bernardo do Campo


2016
G131n Galasse, Bruno Tonhetti
Narrativas de práticas em educação e tecnologia: a
trajetória do professor digital / Bruno Tonhetti Galasse.
2016.
151 p.

Dissertação (Mestrado em Educação) --Escola de


Comunicação, Educação e Humanidades da Universidade
Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2016.
Orientação: Adriana Barroso de Azevedo.

1. Educação e tecnologia 2. Tecnologias digitais de


informação e comunicação 3. Professores - Formação
profissional 4. Educação - Prática docente I. Título.

CDD 374.012
A dissertação de mestrado intitulada "NARRATIVAS DE PRÁTICAS EM
EDUCAÇÃO E TECNOLOGIA: A TRAJETÓRIA DO PROFESSOR DIGITAL",
elaborada por Bruno Tonhetti Galasse, foi defendida e aprovada em 12 de dezembro
de 2016, perante banca examinadora composta por Profa. Dra. Adriana Barroso de
Azevedo (presidente/UMESP), Prof. Dr. Marcelo Furlin (UMESP), Prof. Dr. Alan
César Belo Angeluci (USCS).

_________________________________________
Profa. Dra. Adriana Barroso de Azevedo
Orientadora e Presidente da Banca Examinadora

_________________________________________
Profa. Dra. Roseli Fischmann
Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação

Programa de Pós-Graduação.

Área de Concentração: Educação.

Linha de Pesquisa: Formação de Professores.


AGRADECIMENTO

À Deus por permitir o esclarecimento e a busca por reflexões e conhecimentos com


a mente e o corpo saudáveis.

À Bernadete, minha mãe, pelo exemplo e incentivo constante ao estudo.

Ao Carlos, meu pai, pelas palavras de incentivo, colaboração e apoio em todas as


horas.

Ao Fábio (in memoriam) pelo grande irmão que tenho saudade e que sei estaria
comigo apoiando em todas as horas e mostrando formas de tornar as coisas
melhores ou mais leves.

À Adriana Azevedo, minha orientadora e amiga de longa data, por me receber como
orientando, mesmo quase no final do percurso formativo do mestrado.

À Lumi Yada, grande amiga e sócia, companheira de conversas e reflexões sobre a


vida, pela valiosa revisão e proposições para um texto mais fluido.

Ao Rafael Moreno, amigo de todas as horas e sócio, pela compreensão da


necessidade do tempo de “hibernação” para o desenvolvimento desta pesquisa.

Aos amigos Marta e Elydio (in memoriam) pelo incentivo constante e auxílio na
realização do meu percurso formativo.

Ao Rafael Paes (Rafinha), pelo auxílio na transcrição e o humor leve que facilitam o
cotidiano.

Ao Alan Angeluci, membro da banca, pela valorosa contribuição teórica e forma


humilde e respeitosa em realizar cada sugestão.

Ao Marcelo Furlin, colega de trabalho e membro da banca, pelo carinho na leitura do


trabalho e valorosas contribuições para que o texto pudesse ficar mais afinado.

Aos amigos da família “Benfeitor” pela inspiração e acolhimento nas alegrias e nas
adversidades.

Aos familiares pela torcida e palavras de apoio.

Aos professores do mestrado e aos professores colegas de trabalho da


Universidade Metodista pelo auxílio, feedback e constantes trocas que me permitem
rever a prática docente e minhas posições como ser humano e professor.

Aos amigos de mestrado pelo incentivo no estudo, na indicação de autores e pelos


momentos de descontração tão necessários.

Aos alunos que me inspiram a ser um professor melhor e a fomentar uma formação
constante pautada na cidadania, na dialogicidade e na (auto)reflexão.
RESUMO

O presente trabalho buscou relatar práticas destacadas de professores de educação


básica que utilizam as TDIC (Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação) na
escola para fomentar novas possibilidades de construção de conhecimento na
relação didático-pedagógica com os alunos Kenski (1998), Livingstone (2011/2012),
Prensky (2001). A partir dos estudos, verifica como as TDIC contribuem para a
aprendizagem que fomenta reflexões críticas e científicas, tendo como base o
protagonismo dos alunos (FREIRE, P., 2006) na relação destes com o
conhecimento. Os sujeitos da pesquisa são professores da educação básica de
algumas escolas públicas e privadas. Para a seleção desses professores, buscou-se
identificar o uso das tecnologias em diferentes contextos e abordagens, não sendo
alvo desta pesquisa o uso da tecnologia com um fim em si mesmo, mas utilizada
como suporte ou ferramenta para o desenvolvimento da aprendizagem dos alunos
no âmbito escolar. Por meio da pesquisa narrativa de caráter (auto)biográfico e da
abordagem hermenêutico-fenomenológica trazida por (FREIRE, 2012) de seis
professores, o estudo procurou identificar em que medida o uso da tecnologia em
sala de aula contribui e promove um maior envolvimento e protagonismo dos alunos,
bem como de que forma esses professores tiveram contato com a tecnologia para
que esta pudesse ser incorporada e vista como possibilidade de desenvolvimento do
seu trabalho docente com os alunos.

Palavras-chave: educação e tecnologia; pesquisa narrativa; abordagem


hermenêutico-fenomenológica; formação de professores.
ABSTRACT

The purpose of this study is to report outstanding practices of basic education


teachers who use Digital Information and Communication Technologies (TDIC) in
school to foster new possibilities of knowledge construction in the didactic-
pedagogical relationship with students: Kenski (1998), Livingstone 2011/2012),
Prensky (2001). From those stories, it verifies how the TDICs contribute to a learning
process that promotes critical and scientific reflections, based on the empowerment
of the students (FREIRE, P., 2006) in their relationship with knowledge. The research
subjects are teachers of the basic education from some public and private schools.
For the teachers selection, it was identified those who have used technology in
different contexts and approaches, not being the aim of this research the use of
technology as a purpose itself, but its application as a support or tool for the
development of students' learning in School. Through the (auto)biographical narrative
research and the hermeneutic phenomenological approach brought by (FREIRE,
2012),it was possible to identify, from the stories of six teachers, to what extent the
use of technology in classroom contributes and promotes a greater involvement and
empowerment of the students, as well as how these teachers had contact with
technology so it could be incorporated and seen as a possibility of developing their
teaching work with the students.

Key-words: education and technology; narrative research; hermeneutic


phenomenological approach; teacher formation.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Talvez isso ........................................................................................... 15


Figura 2 – Selfie .................................................................................................... 68
Figura 3 – Rotinas de organização e interpretação .............................................. 97
Sumário

Introdução ............................................................................................................... 11

1. Um panorama da educação brasileira no século XXI ..................................... 21

1.1 Tempo de transições e incertezas ...................................................................... 21

1.2 O cenário da educação no Século XXI ............................................................... 25

1.3 Educação, contextos e conceitos ....................................................................... 29

1.4 Escolas do século XXI......................................................................................... 34

1.5 Os estudantes no século XXI.............................................................................. 39

1.6 Professores no século XXI.................................................................................. 48

2. Educação Básica e TDIC, perspectivas e possibilidades ............................... 56

2.1 Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) e suas relações ... 59

2.2 Formação de professores ................................................................................... 70

2.2.1 Formação inicial .............................................................................................. 71

2.2.2 Formação continuada ...................................................................................... 78

2.3 TDIC na escola: questões imbricadas ................................................................ 83

2.3.1 Perspectivas e possibilidades das TDIC na escola ......................................... 87

3. Metodologia e Análise ........................................................................................ 91

3.1 Metodologia ........................................................................................................ 91

3.1.1 A pesquisa narrativa e autobiográfica de professores .................................... 91

3.1.2 A abordagem hermenêutico-fenomenológica ................................................. 95

3.1.3 Os sujeitos da pesquisa .................................................................................. 99

3.2 Análise das narrativas ...................................................................................... 102


3.2.1 Parceria ......................................................................................................... 103

3.2.2 Motivação ...................................................................................................... 105

3.2.3 Protagonismo ................................................................................................ 106

3.2.4 Formação ...................................................................................................... 107

3.2.5 Desafio .......................................................................................................... 108

3.2.6 Restrição ....................................................................................................... 109

3.2.7 Mediação ....................................................................................................... 110

3.2.8 Reflexão ........................................................................................................ 112

Considerações finais ........................................................................................... 114

Referências............................................................................................................ 117

Apêndices.............................................................................................................. 126
11

Introdução

Minha primeira experiência com o computador se deu no início dos anos


1990. Por volta dos oito anos de idade, meus pais fizeram uma surpresa de natal
para mim e meu irmão: prepararam um caça-tesouro em que cada tesouro
encontrado era, na verdade, uma peça de um computador que passaríamos a ter em
casa.
Naquela época, meu irmão ficou muito mais empolgado que eu, afinal eu não
sabia bem o que era um computador, mas ele já conhecia, não me lembro bem por
onde.
Fato é que o computador esteve presente em minha vida desde muito cedo.
O primeiro foi um 3.8.6, de tela verde, e depois vieram outros com possibilidades
mais elaboradas e joguinhos como Doom e Carmen Sandiego.
Filho mais novo, sempre me senti convidado à aprendizagem quando meu
irmão estava estudando. Por vezes, via com ele os problemas e desafios que a
escola lhe passava e, por isso, queria algo mais desafiador.
Vivi bons anos na escola em que estudei. Dessa fase da infância, guardo
algumas recordações e saudades. Uma delas é do mimeógrafo. Posso dizer que vivi
no tempo do mimeógrafo e de seu cheiro de álcool inconfundível. Eu era um
daqueles alunos para o qual os professores gostavam de pedir ajuda. Muitas vezes
fui buscar o pesado mimeógrafo para a professora.
Tenho muitas recordações da escola, suas cores, organização dos espaços e
também daquele computador de tela verde em que jogávamos nas aulas de
informática. O laboratório era organizado com cadeiras e mesas para adultos,
ficávamos longe do computador, mas isso não nos impedia de aproveitar o que ele
tinha a oferecer.
Um contato com a tecnologia importante e de que me recordo bem se deu na
escola onde estudei durante nove anos (do antigo pré ao 1º ano do ensino médio).
Lá tive aulas de informática da 3ª série do primário à 6ª série do ginásio, como era
chamada à época. O início se deu com um joguinho que usava o MS-DOS para
rodar. O objetivo de cada fase do jogo era chegar com a personagem em um ponto
demarcado. Para tanto, era necessário retirar as caixas que ficavam pela frente,
utilizando apenas as setas do teclado. O desafio do jogo era a mobilidade da
12

personagem do jogo, que só fazia movimentos para frente, portanto, era necessário
entender onde ele estava e que espaços poderia ocupar (ele e as caixas). Anos
mais tarde, no mesmo laboratório de informática, começamos a fazer digitações e a
trabalhar com software de pintura (Paint).
De tudo que vivi no ambiente escolar, tenho lembranças das aulas em que
assistíamos a vídeos. Tínhamos um móvel grande de madeira que ficava em uma
sala mais escura, com carteiras universitárias. Essa sala era próxima à sala da
direção da escola, em um prédio mais antigo. Talvez tenha sido nesse ponto que
iniciou o meu interesse pela produção de vídeo, ao perceber a magia de estar
naquela sala e ver como todos paravam para prestar a atenção à tela. A televisão
era grande, de tubo, e o VHS não funcionava sempre bem, ainda assim, eu gostava
muito daquela sala.
Eu conhecia cada espaço daquela escola, porque lá havia passado nove anos
da minha vida. Infelizmente, o prédio dessa escola foi parcialmente demolido e hoje
deu lugar a um estacionamento. Dessa forma, recorro à minha memória toda vez
que desejo lembrar dos barulhos, dos cheiros e das pessoas que lá encontrei e que
até hoje fazem parte da minha vida.
Os anos finais da educação básica, o ensino médio, cursei em outra escola e,
por ter mudado repentinamente, acabei não fazendo muitas amizades. Uma delas,
no entanto, é bem significativa porque o então amigo se tornou meu sócio na Casa
da Joanna, negócio social na área de educação que iniciei, na região do grande
ABC, São Paulo, em 2014.
Há muitos outros fatos vivos na minha memória, mas procurei descrever
aqueles que acredito terem sido relevantes para formarem o professor que sou hoje.
Por isso, ainda que fora da linearidade, gostaria relatar momentos específicos que
vivi em sala de aula e que considero serem as melhores aulas que tive. Cabe
destacar que as aulas de que mais gostei tinham uma característica especial:foram
trabalhadas fora do conteúdo planejado e ocuparam o tempo ocioso na rotina
escolar.
Quando eu estava na 7ª série, em uma daquelas janelas entre bimestres, a
professora de português comentou que não poderia iniciar o conteúdo naquele dia e
então começou a falar sobre o hino nacional (era costume na nossa escola cantar o
hino e hastear a bandeira às quintas-feiras). Ela perguntou se sabíamos o que
significava a letra do hino nacional. De fato, embora repetíssemos há muitos anos o
13

ritual de cantar o hino semanalmente, não sabíamos o que realmente dizíamos. Ela
então explicou algumas estrofes da primeira parte do hino, falou sobre as palavras e
seus significados e explicou a raiz etimológica de algumas delas (algo que até hoje
eu gosto muito de pesquisar). Aquela aula foi muito especial, porque eu comecei a
entender melhor o sentido e a história de algumas palavras. Infelizmente, embora
ela tivesse prometido continuar na aula posterior, nunca concluímos o estudo do
hino nacional.
Outro fato marcante ocorreu durante a viagem de formatura dos terceiros
anos do Ensino Médio. Eu não participei da viagem e optei por ir à escola naquela
semana. Eu gostava ainda mais da escola quando havia poucas pessoas e os
professores proporcionavam experiências diferentes do habitual; eram
oportunidades nas quais eu podia conhecê-los melhor. Naquela semana, o professor
de matemática decidiu revisar um conteúdo passado e explicou como Pitágoras
havia chegado ao seu teorema. Eu, que sempre pensei que as fórmulas e os
teoremas haviam sido criados por seres fantásticos, quase super-heróis, descobriria
naquele dia como uma pessoa comum havia desenvolvido algo que até hoje se
estuda na escola. O professor expôs o problema que Pitágoras enfrentava quando
criou o teorema, mas para isso, ele contou a história, demonstrou o problema e
seguiu o raciocínio que Pitágoras teria percorrido até chegar à fórmula como
solução. Senti-me muito próximo de um teórico, que por estigma sempre se referia a
alguém de inteligente suprema e, na maioria das vezes, já morto, pois os teóricos
eram tratados assim.
É interessante resgatar esses momentos, sob uma perspectiva de
pesquisador, agora que estou no mestrado, porque percebo como já estava
presente na minha história essa busca por uma escola que preencha a vida de
sentido e que busque a construção da aprendizagem para compreender a vida.
Ao mesmo tempo em que faço a rememoração da escola, é preciso marcar
pontos importantes que definem a pessoa que sou hoje. Meu primeiro curso
universitário foi o de Comunicação Social; ao concluir o curso, iniciei a Pedagogia,
ambos na Universidade Metodista de São Paulo. Isso também é relevante, porque
durante meu primeiro curso foram muitos os momentos de busca pela reflexão sobre
a função social da profissão que havia escolhido; reflexões essas que me fizeram
buscar os estudos na área da educação.
14

Na Pedagogia, logo comecei a fazer as primeiras aproximações entre as


áreas da comunicação e da educação, de forma natural, afinal, os conhecimentos
construídos na comunicação ainda eram bem recentes. Desse modo, a constatação
das possibilidades de uso das tecnologias de informação e de comunicação no fazer
pedagógico fluiu naturalmente. Como relatam Dalpra e Marques apud Nóvoa (2008),
o valor da história de vida e a reflexão feita pelo próprio professor sobre a sua
atuação o leva a compreender o processo e a constituir sua identidade.
Esse relato particular da minha trajetória que me constituiu como professor e
me conduziu à atual pesquisa sobre a relação da comunicação com a educação
auxilia a compreender as escolhas dos autores que basearam minhas reflexões,
bem como a minha atuação profissional.
A partir dessas relações e da consciência de que a rememoração é uma
reconstrução da história, é possível buscar em Bosi (1997, p.55) a compreensão
dessa nova realidade reconfigurada:

Na maior parte das vezes, lembrar não é reviver, mas refazer,


reconstruir, repensar, com imagens e idéias de hoje, as experiências
do passado. A memória não é sonho, é trabalho. Se assim é, deve-se
duvidar da sobrevivência do passado, "tal como foi", e que se daria no
inconsciente de cada sujeito. A lembrança é uma imagem construída
pelo materiais que estão, agora, à nossa disposição, no conjunto de
representações que povoam nossa consciência atual. Por mais nítida
que nos pareça a lembrança de um fato antigo, ela não é a mesma
imagem que experimentamos na infância, porque nós não somos os
mesmos de então e porque nossa percepção alterou-se e, com ela,
nossas idéias, nossos juízos de realidade e de valor. O simples fato de
lembrar o passado, no presente, exclui a identidade entre as imagens
de um e de outro, e propõe a sua diferença em termos de ponto de
vista.

A partir dessa reconstrução, sou impulsionado a buscar a produção de


conhecimento como essência para o fazer educacional. A escola como produtora de
conhecimento é aquela que não entrega um conhecimento pronto, hermético aos
seus alunos. Pelo contrário, instiga o raciocínio científico desde cedo para que os
alunos ao assumirem-se seres históricos, a partir de sua leitura de mundo, criem
hipóteses, testem e construam conhecimento. Cortella (2008, p. 86) afirma que:

Quando um educador um uma educadora nega (com ou sem intenção)


aos alunos a compreensão das condições culturais, históricas e
sociais de produção do conhecimento, termina por reforçar a
15

mitificação e a sensação de perplexidade, impotência e a


incapacidade cognitiva.

A negação da possibilidade de construção do conhecimento, protagonizado


pelos alunos, se dá quando educadores se sentem responsáveis pela transmissão
de um conhecimento previamente elaborado por terceiros, do qual educandos
necessitam apenas decorar ou conhecer o que já foi produzido e elaborado.
Na perspectiva de compreensão do mundo e de construção do conhecimento
encontrada em Freire, P. (1996, p. 22) ao educador:

É preciso, sobretudo, e aí já vai um destes saberes indispensáveis,


que o formando, desde o princípio mesmo de sua experiência de
formadora, assumindo-se como sujeito também da produção do saber,
se convença definitivamente de que ensinar não é transferir
conhecimento, mas criar possibilidade para sua produção ou a sua
construção.

Trata-se de uma educação emancipatória em cuja relação sujeito-mundo


acontece de forma ativa, ou seja, não é o mundo que está pronto, fechado e,
portanto, deva ser estudado, mas essa relação da comunidade humana-mundo que,
de forma dialética, constrói-se ao se fazerem. Dizemos o mundo por meio das
palavras e das imagens, daquilo que lemos e por onde criamos hipóteses. Freire,
P.(2006) diz ser possível a construção do conhecimento a partir do momento que os
seres se permitem ter consciência da sua atuação e do mundo. Esse processo de
consciência, tomada de decisão, aprofundamento e reflexão do ser e estar no
mundo são constantes para o autor, pelo conceito do inacabamento e do não-pronto.
Convido à reflexão a imagem trazida por Campos (2007), cujos traços ajudam
a compreender a leitura de mundo que fazemos e aos modos de ver a vida. A tirinha
a seguir é uma metáfora das várias formas pelas quais podemos ler o mundo.

Figura 1 - CAMPOS, Marcelo. Talvez isso... Rio de Janeiro: Casa 21, 2007.
16

Considerar a visão de mundo das crianças que estão na escola é, como


aprofunda Freire, P. (2006), dar condição ao outro ser humano de o ser também, o
que permite que pensemos nas condições, possibilidades e oportunidades do nosso
próximo ser tão ser humano quanto nós.
Criar hipóteses, testar, fazer e refazer o processo de produção de
conhecimento leva tempo e exige dedicação de quem o faz. Nesse sentido, a escola
também deveria nutrir uma reflexão sobre o tempo e o espaço que tem dedicado à
experimentação e experienciação de seus alunos.
Se a experiência exige o tempo para realização, há também que se refletir se
a escola tem entendido a importância do tempo da experiência ou se tem funcionado
ao tempo ritmado do apito fabril das trocas das aulas. Assim, é importante indagar
sobre o espaço escolar que fomenta a criatividade, o raciocínio hipotético, o
empirismo para a ampliação da visão e do entendimento do mundo, considerando se
é possível criar um ambiente seguro para que os homens, mediados pelo mundo,
cumpram sua vocação de ser mais (Freire, P., 2006).
Considerando que a instituição escolar é basilar na formação humana, devem
ser preparados de forma criteriosa o espaço e o tempo que ela destina para uma
formação cuidadosa e sólida, que permita à sociedade compreender-se e ao mesmo
tempo progredir.
Há estudos significativos na área da Sociologia que buscam comparar
instituições que são mais reprodutoras do que transformadoras. A própria história da
escola no Brasil retratada por Veiga (2007) revela seu âmbito mais militarizado, com
mecanismos de controle e docilização dos corpos, expressão cunhada por Foucault
(2004).
A questão remanescente dessa realidade é: Que espaço é esse que se
destina à criação e às novas possibilidades de aprendizagem, acompanhando
assim, os saberes e a possibilidade de hipóteses? Saviani (2011, p. 429) ressalta
que “à escola cabia formar a mão de obra que progressivamente seria incorporada
ao mercado, tendo em vista assegurar a competitividade das empresas e o
incremento da riqueza social e renda individual”. Com frequência, encontrarmos
escolas que reproduzem a competição em detrimento da colaboração e cooperação,
como única forma de obtenção de sucesso.
Refutando a visão de uma educação voltada para o mercado, emerge a
possibilidade do potencial transformador da escola; um ambiente que reúne seres
17

humanos que estão na busca da ampliação da compreensão de mundo, quando se


assumem comunicantes, transformadores, sonhadores:

[...] uma das tarefas mais importantes da prática educativo-crítica é


propiciar as condições em que os educandos em suas relações uns
com os outros e todos com o professor ou a professora ensaiam a
experiência profunda de assumir-se. Assumir-se como ser social e
histórico, como ser pensante, comunicante, transformador, criador,
realizador de sonhos, capaz de ter raiva porque é capaz de amar.
(FREIRE, P., 1996, p. 46)

Em um mundo permeado pela tecnologia e com vários recursos


comunicacionais que expõem inúmeras ideias às crianças, cotidianamente, deve
haver a preocupação de como se trabalhar a emancipação dos sujeitos por meio da
criticidade e também da apropriação das ferramentas comunicativas e tecnológicas
como possibilidade do exercício da emancipação.
A escola convive com a possibilidade de enunciação da realidade. Fazer-se
ou não emancipadora e enunciadora cabe à crença daqueles que nela atuam em
diálogo com suas concepções e com a reflexão crítica que podem favorecer a
compreensão de si mesmos e sua extensão no outro. Professor não existe sem
aluno, assim como se faz na relação pedagógica que com ele estabelece.
Nesse sentido, a visão de mundo que as crianças trazem à escola e, por
conseguinte, a visão que têm dela, refletem a forma com a qual interpretam e dizem
esse mundo. Essa imbricada situação de ser e de fazer-se revela o sentido maior da
educação e da possibilidade de não reproduzir um mundo pronto, mas fazer-se ser
humano ao descobrir o mundo.
A partir dessa relação, vemos o uso da tecnologia como extensão do fazer
humano que possibilita uma nova compreensão de mundo. Tal conceito remete aos
estudos de McLuhan (1974) que, de forma sintética, definem os meios de
comunicação como extensão do homem e também da presença e da vivência do ser
humano na aldeia global1.
A tecnologia torna-se então, uma valiosa ferramenta para investigação por
meio dos diferentes recursos, sendo possível uma nova ou maior imersão naquilo
que se estuda, auxiliado pelos diferentes suportes e possibilidades, como o uso da
internet.
1
Termo cunhado por McLuhan (1974) referindo-se à relação do ser humano no local e no global, essa última
propiciada pelo avanço tecnológico.
18

A presente pesquisa nasce, substancialmente, das reflexões que foram


tecidas ao longo da minha formação e da minha atuação docente. Ela é pautada no
relato de seis professores de educação básica, de escolas públicas e particulares,
que possuem práticas destacas com o uso de tecnologias da informação e
comunicação na escola.
Por meio da metodologia de pesquisa narrativa e autobiográfica (Clandinin e
Connelly, 2000/Ferrarotti, 2010) o trabalho buscará verificar que percepções
emergem quando os professores estudados refletem sobre suas práticas com
tecnologia em sala de aula. Nesse sentido, busco averiguar como professores
refletem sobre suas práticas e, a partir disso, o que se torna significativo nessa
narrativa por eles construída.

As narrativas biográficas de que nos servimos não são monólogos


ditos perante um observador reduzido à tarefa de suporte humano de
um gravador. Toda entrevista biográfica é uma interação social
completa, um sistema de papéis, de expectativas, de injunções de
normas e de valores implícitos e, por vezes, até de sanções. Toda
entrevista biográfica esconde tensões, conflitos e hierarquias de poder;
apela pelo carisma e para o poder social das instituições científicas
relativamente às classes subalternas, desencadeando as reações
espontâneas de defesa. (FERRAROTTI, 2010, p. 46)

Conforme mencionado, as entrevistas e observações foram realizadas com


professores que conheci previamente, ou seja, antes da pesquisa, o que facilita,em
sua realização, que haja um maior entrosamento entre pesquisador e professores
participantes.
A pesquisa narrativa só pode ser feita com humanos, uma vez que somos os
únicos seres com capacidade de fazer história, como ressalta Clandinin e Connelly
(2000, p. 11) “somos organismos contadores de histórias, organismos que, individual
e socialmente, vivemos em vidas relatáveis”.
Dessa forma, por meio da pesquisa narrativa e autobiográfica, busquei relatar
práticas destacadas de professores de educação básica que utilizam as TDIC
(Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação) na escola, para fomentar
novas possibilidades de construção de conhecimento na relação didático-
pedagógica com os alunos, no intuito de oferecer a outros professores e à
comunidade acadêmica contribuições para a relação entre educação, comunicação,
linguagem, e tecnologia.
19

Tive ainda como objetivo na pesquisa: verificar como a formação inicial e a


formação continuada contribuem para o bom uso da tecnologia na sala de aula, no
sentido de identificar se tais práticas surgiram do cotidiano, de experiências
anteriores, de outras formações ou mesmo da formação inicial para docência;
identificar a possibilidade da promoção do protagonismo dos alunos na produção de
conhecimento com o uso de tecnologias na escola, aferindo nas práticas se os
alunos são considerados como pessoas aprendentes com professores que ensinam,
ou alunos promotores da própria aprendizagem com a mediação do professor;
perceber que sentidos os professores atribuem às suas práticas quando utilizam
tecnologias digitais, entendendo a autorreflexão na construção da narrativa como
possibilidades de reverem-se e pensarem nessa formação; refletir sobre a
potencialidade das TDIC no processo educativo me apropriando das experiências
dos sujeitos pesquisados como possibilidade de trabalho efetivo em sala de aula.
É importante ressaltar a reflexão trazida por Josso (2010) com relação à
formação que contribui para a composição do trabalho:

A palavra formação apresenta uma dificuldade semântica, pois


designa tanto a atividade no seu desenvolvimento temporal, como o
respectivo resultado. Designando o nosso objeto de investigação pelo
próprio conceito de processo de formação, indicávamos mais
claramente que nos interessávamos pela compreensão da atividade.
Todavia, mantém-se uma ambiguidade, à medida que o conceito
utilizado não permite distinguir a ação de formar (do ponto de vista do
formador, da pedagogia utilizada e de quem aprende) da ação de
formar-se. (JOSSO, 2010, p. 61).

Assim sendo, permeando a possibilidade que a palavra formação permite


fazer, procurei realizar algumas discussões nos próximos capítulos sobre educação,
tecnologias digitais da informação e da comunicação e suas possibilidades,
organizando-os da seguinte forma:
No capítulo I busquei retratar o enfoque da área de tecnologia e o cenário da
educação brasileira no século XXI, aprofundo na sequência como a cibercultura
altera significativamente a forma com que as novas gerações lêem o mundo e se
apropriam da forma de fazê-lo.
No capítulo II abordo as perspectivas e possibilidades do uso das tecnologias
digitais na educação e dou maior ênfase às mudanças e interferências que a
20

cibercultura promove no ambiente escolar, buscando reflexões sobre a formação


inicial e a formação continuada de professores, em especial da pedagogia.
O capítulo III apresento a metodologia da pesquisa narrativa e autobiográfica
(Clandinin e Connelly, 2000 / Ferrarotti, 2010) e trato das perspectivas que trabalho
nas reflexões e análises dos relatos dos seis professores de educação básica junto
às impressões de cada um sobre suas práticas e suas particularidades na forma de
relatar. As narrativas colhidas serão analisadas segundo a abordagem
hermenêutico-fenomenológica (FREIRE, 2012).
21

1. Um panorama da educação brasileira no século XXI

1.1 Tempo de transições e incertezas

A entrada do século XXI foi precedida por múltiplos acontecimentos mundiais


que dão pistas do atual estado da sociedade. Alguns deles, de ordem natural,
exigiram do ser humano certo grau de resiliência voltada inclusive à reconstrução,
como foi o caso do terremoto no Chile (2010) e o tsunami na China (2011), que
destruíram milhares de quilômetros de casas, empresas, escolas e desafiaram seus
povos a recomeçar.
Há ainda acontecimentos de ordem humana que modificaram e continuam
modificando a forma das pessoas perceberem e estarem no mundo, a exemplo dos
atentados terroristas em numerosos países e de ordens diversas. Semelhantes
acontecimentos marcam a história da humanidade.
O avanço da tecnologia também motiva importantes mudanças nas relações
estabelecidas socialmente e modifica as formas das pessoas se relacionarem e se
apropriarem do mundo.
As mudanças que vivemos socialmente são estudadas na
contemporaneidade por diversos pesquisadores e pesquisadoras, dentre eles Sherry
Turkle, que, a seguir, que apresenta um cenário instigante acerca dos dias atuais:

Nos dias de hoje, estes celulares em nossos bolsos estão mudando


nossas mentes e corações porque nos oferecem três fantasias
gratificantes. A primeira: podemos concentrar nossa atenção onde
quer que nós desejamos; segunda: sempre seremos ouvidos; e
terceira: nunca ficaremos sozinhos. E esta terceira ideia, de que nunca
ficaremos sozinhos, é fundamental para alterar nossas psiques.
Porque no momento em que as pessoas estão a sós, até mesmo por
alguns segundo, elas ficam ansiosas, inquietas, entram em pânico,
elas buscam um dispositivo (TURKLE, Conferência TED, 2012).

Tais estudos encontram reflexo nas preocupações que foram se modificando


socialmente, conforme a criação de novos dispositivos e ferramentas que passaram
a integrar o cotidiano humano.
Na virada do século, o mundo se inquietou ao saber que, do dia 31 de
dezembro de 1999 para o dia 01 de janeiro de 2000, poderia ocorrer uma pane
geral, intitulada Bug do milênio, em que as máquinas perderiam a referência de data
22

pela troca do milênio.Jornais de grande circulação e grandes emissoras destinaram


considerável espaço de transmissão e veiculação para esclarecer e sobrelevar o
risco do bug nos mais variados setores em que a computação era crucial, como na
área da saúde, ressaltando que, embora a tecnologia avance cada vez mais veloz,
há muito ainda a se compreender e se apropriar.
A sociedade caminha no âmbito da tecnologia. O surgimento das redes
sociais e sua subsequente popularização permitiu ao mundo conectar-se
instantaneamente a partir de distâncias continentais, em separação por quilômetros
e quilômetros de oceano, ressaltando o importante papel que tem a mobilidade e a
conectividade no mundo moderno.
Outros acontecimentos, no entanto, trouxeram obscuridade à história da
humanidade e resgatam ainda hoje a lembrança do papel da educação no
compromisso de uma formação ética e na promoção de transformações mundiais,
visando maior liberdade e justiça entre pessoas e povos.
Essas discussões fomentam dilemas à esfera educacional para aferir o
cumprimento da sua função social e repensar de que forma a educação tem
contribuído para uma sociedade melhor, pautada em valores fundamentais da vida
humana.
A avaliação sobre essa relação de sentido e da função social da escola em
períodos distintos permite associar que as ciências vigentes, bem como os
paradigmas que regiam a educação e o fazer científico não mais resolviam as
questões trazidas pela sociedade. Metaforicamente, é como se, ao saber as
respostas às perguntas até então existentes, houvesse de tal forma uma revolução
na humanidade em que os pensamentos, hipóteses e teses anteriores não são mais
suficientes para a compreensão da realidade presente, no que se inserem os
autores ao afirmarem que:

Desde a metade do século passado, as teorias vigentes vêm sendo


postas em questão e a ciência vive um momento de grande ebulição,
experimentando um movimento de transformação, na busca de novos
paradigmas (será que ainda podemos falar em paradigmas?) que
possibilitem explicar os fenômenos naturais e sociais de maneira mais
ampla. (PRETTO & PINTO, p. 19, 2006)

Esses paradigmas e desafios de fazer ciência configuram um cenário de


transições e incertezas que as novas gerações têm vivenciado e tentado se adaptar
23

rapidamente. Surgem pensadores que, por meio de suas pesquisas e teorias,


tentam compreender o mundo moderno, como a epistemologia do pensamento
complexo de Morin (2007) e o estudo da pós-modernidade em Bauman (2007).
Sem dúvida, novas possibilidades tecnológicas prenunciam mudanças sociais
pela apropriação que a população faz de tais ferramentas. É relevante lembrar que
muitas tecnologias inventadas não partiram de uma necessidade educacional, mas
tiveram sua gênese em urgências de guerra e que, posteriormente, se desdobraram
em possibilidades de uso na educação e em outros setores; é o caso da internet e
da criptografia, por exemplo.
É importante frisar que na área educacional cabe relevado destaque ao papel
que as tecnologias e, em especial as digitais, exercem para catalisar mudanças.
Necessário se faz, no entanto, refletir sobre a qualidade e a profundidade das
mesmas.
Nessa perspectiva, tanto as inovações físicas, com aparelhos e aparatos,
como as dos aplicativos e sistemas, permitem um novo fazer educacional e alteram
a forma com que os seres humanos se organizam, podendo gerar reflexos em maior
ou menor grau em outras espécies do ecossistema.
O surgimento da impressora 3d2 e sua imensurável possibilidade de uso nos
estudos, até mesmo para a construção de órgãos humanos, demonstra o quanto a
tecnologia tem buscado desenvolver elementos que interfiram e modifiquem a
realidade humana.
Com efeito, a tecnologia avança e permite à sociedade conectar-se cada vez
mais, possibilitando, por exemplo, eventos de mobilização global. Note-se a
importante e conhecida derrubada do governo ditatorial egípcio 3, que foi organizada
e noticiada por meio do Twitter4 e do Facebook5 para o mundo todo. O episódio teve
repercussão na mídia mundial a partir das redes sociais, uma vez que o governo
ditatorial não permitia a cobertura dos veículos internacionais. Um dos fatos
impactantes da época foi justamente o bloqueio ao acesso à internet pelo então

2
As impressoras 3D utilizam materiais como plástico e derivados para imprimir protótipos. A partir da
diversidade de materiais, elas têm sido utilizadas para produzir diferentes produtos. Têm representado um
grande avanço para a concretização de ideias, materialização de projetos e relevante potencial de avanço na
produção personalizada de produtos.
3
Regime do presidente Hosni Mubarak, que esteve no poder durante trinta anos.
4
Rede social que só aceita postagens de mensagens com no máximo de 140 caracteres.
5
Uma das mais poderosas redes sociais da atualidade devido à quantidade de pessoas que se utilizam
diariamente para comunicação e utilização dos recursos da ferramenta, como vídeos, fotos, bate-papo e
mensagens.
24

ditador egípcio Hosni Mubarak, em uma tentativa de conter os protestos populares.


A resposta que a Google deu ao ato de censura foi oferecer aos cidadãos egípcios o
serviço de tweet por meio de ligação telefônica, tendo por consequência a prisão de
um dos executivos da empresa durante 12 dias por ordem do governo egípcio.
Confere-se, assim, em vários episódios, a apropriação da tecnologia para
múltiplos objetivos e possibilidades. Se, por um lado, a tecnologia digital oportunizou
a queda de um governo ditatorial no Egito, por outro, a humanidade se apodera da
tecnologia para tornar o que já era bárbaro em espetáculo.
Supostamente em nome da segurança internacional e da nação dos Estados
Unidos, o mundo assistiu à execução de Sadam Hussein, veiculada em alguns
canais de televisão e cujos vídeos foram amplamente compartilhados por meio das
redes sociais, no ano de 2006. Uma execução por enforcamento após a condenação
por crimes contra a humanidade, decretada pelo tribunal especial iraquiano, pelo
assassinato de 148 xiitas iraquianos. Não se atendo ao fato em si, mas à sua
repercussão e à transformação de uma execução pública em um espetáculo
mundialmente transmitido, o evento remete aos tempos antigos quando a barbárie
era encontrada em grandes arenas de execução.

Não se pode contrapor abstratamente o espetáculo à atividade social


efetiva; este desdobramento está ele próprio desdobrado. O
espetáculo que inverte o real é produzido de forma que a realidade
vivida acaba materialmente invadida pela contemplação do
espetáculo, refazendo em si mesma a ordem espetacular pela adesão
positiva. A realidade objetiva está presente nos dois lados. O alvo é
passar para o lado oposto: a realidade surge no espetáculo, e o
espetáculo no real. Esta alienação recíproca é a essência e o sustento
da sociedade existente (DEBORD, 1997, p. 16)

O autor elucida uma característica que tem sido frequentemente motivo de


reflexão dos pesquisadores na área de comunicação e que se traduz no presente
contexto, em ambos os acontecimentos, na dimensão do uso da tecnologia como
ferramenta que interferiu diretamente na vida mundial cotidiana. Deflagra-se os
momentos em que a humanidade vivenciou, colocando a contrariedade entre a
libertação de um povo por meio da pressão internacional com o uso da internet e a
execução pública de um homem potencializada pela veiculação na grande mídia e
dissolvida nas redes.
25

Tais acontecimentos não contemplam totalmente o panorama do início do


século XXI, mas foram selecionados com o intuito de investigar as contradições
encontradas na sociedade que se apropria das tecnologias digitais para induzir
benefícios ou malefícios e, no entendimento de tais situações como fenômenos em
si, denunciam o estágio atual da humanidade.
Moreira e Kramer (p. 1038, 2007) fazem uma importante reflexão sobre como
o campo educacional tem se comportado frente à tecnologia, com o objetivo de
alertar como a escola se pautou por uma visão “salvadora” ou “purificada” da
entrada da tecnologia nesse ambiente.

Em síntese, é como se os objetos técnicos pudessem, por um passe


de mágica, garantir qualidade na educação. Em muitos casos, ocorre
transposição, para novos meios, dos conteúdos tradicionalmente
ensinados nas salas de aula. Nesse contexto, em que a fantasia se
sobrepõe à realidade, a dissociação entre as práticas escolares e as
demais práticas sociais persiste: não pode ser aplacada com base em
configurações textuais aproximadas, veiculadas nos mesmos suportes,
deixando-se de fora a dimensão ética da aproximação desejada (idem,
ibid.). Qualidade na educação passa a corresponder ao emprego, nem
sempre criativo e eficiente, de recursos tecnológicos que promoveriam
a atratividade dos ensinamentos “oferecidos” aos alunos ou por eles
apreendidos sem uma interferência significativa do/a professor/a.

Os autores trazem à luz, uma observação sobre como a escola percebe a


tecnologia, ainda sem a compreender, mas buscando as soluções para os seus
problemas, reforçando o movimento de ida ao externo para uma melhoria interna,
em contraposição ao necessário olhar lançado também sobre si mesma para
analisar-se e compreender por quais transformações passa na realidade em que
está inserida.

1.2 O cenário da educação no século XXI

Os acontecimentos vividos pela sociedade em diversos momentos da


humanidade são marcados por contradições nos muitos campos e áreas de
trabalho; uma delas é a educação. Um dos grandes dilemas que a educação
encontra é avançar com o que há de mais novo e moderno, dar conta de entender
essa sociedade pós-moderna e, ao mesmo tempo, não abandonar o que está
sedimentado, balizado.
26

Esta pesquisa busca esse viés e os variados contextos que emergem no


século XXI, a fim de refletir se as iniciativas até então adotadas nos diversos campos
de atuação dos profissionais da educação têm dado conta de responder às
demandas sociais e intelectuais que a sociedade contemporânea exige.
Os profissionais que atuam na educação têm sido constantemente desafiados
a repensar sua atuação e aferir se os métodos e concepções adotados realmente
são importantes para a construção de uma sociedade mais humana.
Os problemas educacionais existentes hoje são mais complexos do que a
formação inicial é capaz de resolver. Surge, portanto, a necessidade cada vez maior
da formação continuada que pode acompanhar o professor na complexidade e na
relação que se estabelece frente às mudanças sociais, situacionais, legislativas
dentre outras que interferem no cotidiano profissional. A formação continuada
possibilita maior reflexão de quem está na prática da docência quando consiste na
ação reflexão.
Para Imbernón (2004), situar a profissão numa sociedade em mudança, com
um alto nível tecnológico e um vertiginoso avanço do conhecimento, implica não
apenas na preparação disciplinar, curricular, mediadora, ética, institucional, coletiva,
mas também uma importante bagagem sócio-cultural.
Assim, a complexidade humana e os efeitos da pós-modernidade no cotidiano
social em que o professor está inserido e que dele se serve numa educação escolar
contextualizada implicam numa formação que não se encerra no ensino superior,
mas que se desdobra no olhar investigativo no fazer pedagógico e nas trocas que se
faz com outros professores.
Adota-se assim a perspectiva de formação segundo Moita (1992, p.115),
“Ninguém se forma no vazio. Formar-se supõe troca, experiência, interações sociais,
aprendizagens, um sem fim de relações. [...] Um percurso de vida e assim um
percurso de formação”.
Percebe-se assim a importância da troca, do compartilhamento e do contexto
para que haja uma formação que corresponda ao tempo histórico presente, mas que
também seja fruto do momento histórico em que os sujeitos se encontram.

Aprender a ser professor, neste contexto, não é, portanto, tarefa que


se conclua após estudos de um aparato de conteúdos e técnicas de
transmissão deles. É uma aprendizagem que deve se dar por meio de
situações práticas que sejam efetivamente problemáticas e que exijam
27

o desenvolvimento de práticas reflexivas competentes. Exijam ainda,


que além dos conhecimentos, sejam trabalhadas atitudes, as quais
são consideradas tão importantes quanto os conhecimentos
(MIZUKAMI, 2002, p. 12).

Tais concepções de formação e complementariedade de estudos fazem eco à


concepção de Freire, P. (2006) quando destaca que todo ato é político, como
ressaltado anteriormente, fica evidente que as decisões nos níveis de ensino partem
de uma concepção que é primeiro política e ideológica e se desdobra na concepção
de educação.
Nesse sentido, pode-se ensejar por uma educação mais emancipatória ou
mais colonizadora, mais libertária ou conservadora, tudo a depender das
concepções que norteiam as decisões e que, por consequência, facilitam com
financiamentos e linhas de pesquisa que se desdobram, nas universidades e na
formação dos licenciandos.
A emergência que algumas questões têm apresentado nos contextos
educacionais e mesmo midiáticos tem evidenciado que o debate sobre o tema
educacional não tem dado conta de responder aos anseios e necessidades de uma
população que desconhece, na maioria das vezes, o papel que representam para a
sociedade que desejam.
A educação tem destacada importância para a construção de uma identidade
de sociedade, o que não significa produzir uma pasteurização social6, que ignora a
diversidade do indivíduo, mas instituir uma unificação de objetivos em torno do
próprio querer pelo humanizar-se e desenvolver-se.
A exemplo disso, a relação de alunos, professores e comunidades tem sido,
historicamente, de muito desgaste e culpabilização por determinados resultados
obtidos com o modelo de educação pautado na repetição como forma de
aprendizagem.
Esse modelo tem se mostrado ineficiente por não responder aos anseios da
sociedade atual que urge por soluções criativas a problemas cada vez mais
complexos e tampouco promover uma experiência qualificada às crianças, jovens e
adultos que nela buscam uma compreensão e ampliação de leitura de mundo,
tornando-se em grande parte, um amontoado de momentos “sem sentido”.

6
Termo criado por John Rawls (2001) que explicita a criação de uma necessidade social fictícia de forma
universal a partir da necessidade de indivíduos. Cria-se uma necessidade como se todos fossem iguais ou
precisam da mesma coisa, desviando a possibilidade de se fazer justiça e do olhar para os indivíduos.
28

Tal jogo de culpabilização e a repetição de um modelo reprodutivista e sem


sentido tem condicionado desprazer a muitas crianças e a fazem terem vontade de
estar longe da instituição educacional basilar, a escola. Não é surpresa se ouvir que
a escola “é chata”.
Revelada essa angústia pela qual passam os agentes da instituição escolar,
modelos como o da desescolarização têm surgido por diferentes setores da
sociedade, na tentativa de ressignificar os espaços de aprendizagem, uma vez que,
na maioria dos casos, crianças que não desejam ir à escola continuam motivadas
pela busca da compreensão da vida.
Concomitante à busca pelo entendimento da realidade e do reinventar-se no
campo educacional partindo por iniciativas de ruptura com o modelo tradicional de
educação, há diversos acontecimentos que conferem ao cenário educacional atual
novas possibilidades dentro desse saber institucionalizado.
São muitos os movimentos de caráter popular, coordenados por pessoas de
além do espaço formal da educação – a escola – em que se pode encontrar ideias
importantes sendo discutidas. Um desses movimentos chama-se Virada Educação,
que tem por finalidade integrar a comunidade ao espaço escolar e vice-versa, no
intuito de provocar a comunidade local do entorno da escola a pensar sobre
possibilidades de parcerias entre escola e comunidade.
Se num primeiro momento a escola parece ter perdido o sentido ou se
apresentar desinteressante às pessoas, por outro lado, os movimentos de ocupação
das escolas em inúmeros estados brasileiros têm demonstrado que a comunidade
não nega a escola, mas a escolarização que tem recebido.
Tais iniciativas são um fenômeno da contemporaneidade que ajuda a
compreender como o modelo muito utilizado pode estar fadado a transformações
profundas. Outrossim, parece mais interessante considerar essas iniciativas, que
partem de pontos diferentes e que têm ocorrido na mesma época, como um
fenômeno que anuncia mudanças ao denunciar possíveis atrasos e espaços que a
educação não conseguiu ocupar até o momento.
Além de movimentos como o da Virada Educação, muitas fundações e
associações têm premiado professores por meio de inscrições de projetos realizados
nas escolas públicas e privadas. Embora as premiações dêem visibilidade a poucos
projetos, uma vez que há sempre a escolha de um projeto “melhor” (reiterando o
modelo de sociedade pautado em escassez e poucos vencedores), tais ações
29

catalisam possibilidades de ação educacional objetivando dar evidência a projetos


que poderiam permanecer desconhecidos.
Tratando-se de visibilidade e participação, deve-se ressaltar o importante
papel da internet como catalisador de iniciativas, bem como a tecnologia que
permite, além de registrar os projetos, ser ela mesma a possibilidade de trabalho.
A educação versada neste trabalho é a formal e pauta-se em conceitos e
concepções que serão melhor aprofundados no decorrer deste capítulo,
evidenciando as origens para se chegar à análise de projetos educacionais com o
uso das TDIC.
Para tanto, nas próximas seções, busca-se relatar o que se entende como o
ideal de uma educação transformadora, sem pretensão de crer a existência de um
modelo com essas características e tampouco considerá-lo a forma padrão de
educação, mas com a finalidade de demonstrar de onde se parte e o que se busca.
Nessa trajetória, as histórias narradas pelos professores na presente pesquisa se
fazem como um ensaio dessa educação idealizada, a qual uma das premissas é o
protagonismo dos sujeitos envolvidos.
Dessa forma, as linhas que se seguem trazem, de forma ampliada e
panorâmica, um ideal perseguido de educação, encontrada em maior ou menor grau
nas experiências dos professores em suas escolas e que serão descritas em
capítulo posterior.

1.3 Educação, contextos e conceitos

Diante dos cenários expostos anteriormente, à educação recaem vastas


responsabilidades. O termo educação aqui tratado é uma ampliação da
escolarização ou período escolar e não propõe a escola como única responsável
pela educação das pessoas, mas o entendimento de uma sociedade educadora.
Tudo se torna potencialmente educativo a partir da visão da curiosidade
epistemológica trazida por Freire P. (2006). Dos pequenos momentos e
circunstâncias simples e corriqueiras às mais complexas, às descobertas há
possibilidades de aprendizagem pela busca de compreensão dos fenômenos. Isso
porque aprender e fazer ciência implicam em uma educação com olhar para os
fenômenos que acontecem à própria volta, “intuindo” a retomada à não linearidade
30

da vida humana, a busca pelo entendimento por meio de uma auto revisão, a qual
se faz em parceria com outras pessoas e autores.
Tal postura epistemológica é tratada por Freire P. na moldura da curiosidade
ingênua e da curiosidade epistemológica.

Não é a curiosidade espontânea que viabiliza a tomada de distância


epistemológica. Essa tarefa cabe à curiosidade epistemológica –
superando a curiosidade ingênua, ela se faz mais metodicamente
rigorosa. Essa rigorosidade metódica é que faz a passagem do
conhecimento do senso comum para o do conhecimento científico.
Não é o conhecimento científico que é rigoroso. A rigorosidade se
acha no método de aproximação do objeto. A rigorosidade nos
possibilita maior ou menor exatidão no conhecimento produzido ou no
achado de nossa busca epistemológica. (FREIRE, P., 2003, p. 78)

Tudo se torna potencialmente educativo porque faz parte de uma organização


social, de um estar no mundo. A reflexão sobre as situações e sobre o respaldo na
ciência para além do senso comum aprofunda o sentido de viver e encharcar de
sentido a existência humana. A conscientização do fazer-se enquanto se vive, da
assunção de um ser inacabado que se constrói diariamente pelas escolhas, lutas e
compreensões a que se propõe traz uma maior compreensão de educação.
Parte-se dessa compreensão de realidade da qual surge uma consciência
própria de estar no mundo e do exercício de fazer-se com o outro por meio das
aproximações e confrontos, como ressalta Freire, P.(2006). Esse processo de
reinventar-se e rever-se é de tal modo libertar-se de um egocentrismo para a
compreensão maior da autonomia.
A vida social, em especial das cidades, pede e desafia que as pessoas
aprendam a conviver umas com as outras e, ao fazerem isso, convivam com o
espaço que as cercam, com vias a preservar não somente a vida humana, mas toda
vida que habita o planeta.
Essas reflexões podem partir de uma fonte externa, mas encontram maior
compreensão quando buscam o sentido de estar no mundo – uma reflexão individual
desse ser social, global.

[...] a construção da cidadania envolve um processo ideológico de


formação de consciência pessoal e social e de reconhecimento desse
processo em termos de direitos e deveres. A realização se faz através
das lutas contra as discriminações, da abolição de barreiras
segregativas entre indivíduos e contra as opressões e os tratamentos
31

desiguais, ou seja, pela extensão das mesmas condições de acesso


às políticas públicas e pela participação de todos na tomada de
decisões (MARTINS, 2010, p. 53).

O processo de refletir e agir sobre o mundo remete à práxis freiriana (1996)


que exalta a prática como propulsora da reflexão e não o sentido inverso.
Parece claro que, ao se tratar de tecnologia, esse mesmo movimento é
encontrado na relação dos sujeitos com as máquinas. A história demonstra que as
pessoas foram se apropriando das máquinas conforme as utilizam e sobre elas
refletindo as possibilidades de uso.
Na educação, o movimento é o mesmo, visto que as tecnologias, em especial
as digitais, não foram criadas para o campo da educação, mas apropriadas pela
área e de certa forma adaptadas ao fazer educacional dos sujeitos que nela atuam.
Nessa compreensão, é importante ressaltar que, embora o caminho da
autonomia passe pelo estar e viver com o outro, isso não significa criar um corpo
único, coletivo ou aceitar uma educação massificadora. Ao invés disso, reforça a
necessidade do protagonismo de todos os sujeitos como a raiz do processo de
emancipação do sujeito para uma consciência de si mesmo e de sua atuação no
mundo.
Para tanto, cabe à comunicação o papel fundamental de possibilitar que, ao
se comunicarem, os sujeitos reflitam e, na reflexão, se compreendam e se insiram
neste novo mundo desvelado que se descortina tanto maior for o grau de
aprofundamento e de conscientização.
As palavras educador e educando ganham ampliação de sentido e de uso
para uma educação que se faça não somente nos bancos escolares, mas que
transborde essa instituição para ganhar fundamento nos mais diversos momentos de
interação e de relação com o mundo.
Assim, a compreensão de comunicação trazida por Freire na interpretação
dos sujeitos educadores e educandos é de grande importância.

[...] somente na comunicação tem sentido a vida humana. Que o


pensar do educador somente ganha autenticidade na autenticidade do
pensar dos educandos, mediatizados ambos pela realidade, portanto,
na intercomunicação (FREIRE, 2005, p. 74).
32

Não se trata, no entanto, de uma comunicação massificadora e alienante.


Refere-se à comunicação que os sujeitos estabelecem entre si na relação humana e
que pode se desdobrar nos produtos comunicativos que a sociedade criou para
difundir informações e conhecimentos como sites, blogs e outros. Ou seja, não é o
produto, mas seu uso.
Cabe aqui salientar que as ferramentas e os saberes técnicos da
comunicação não são em si alienantes ou ideológicos, e sim o uso que se pode
fazer delas. Uso este protagonizado sempre por um sujeito ou por uma comunidade
com sua intenção e objetivo.
É crucial refletir sobre o protagonismo no processo de produção de um
artifício cultural para não recair na reprodução ingênua de modelos prontos, pré
determinados, que são apenas replicados em diferentes grupos sem a possibilidade
de autoria. A importância do educador, nesses casos, é ampliada se o sujeito ou
grupo não fizerem um uso consciente e crítico de determinada linguagem ou
recurso, denunciando um esvaziamento de sentido da proposta de educar pela
produção com a comunicação. Dessa forma, pode ocorrer uma reprodução do status
quo ou de um discurso dominante de forma mais ou menos crítica e consciente.

Estou afirmando que os produtos da mídia têm a capacidade de


transcodificar discursos de uma política dominante e hegemônica ao
mesmo tempo que têm poder de revelar anseios e conflitos culturais
internos de uma sociedade. Como qualquer produto da cultura, os
produtos da ficção midiática são documentos históricos que falam de
um povo, seus conflitos e inimigos, bem como também são registros
que explicitam as expectativas e anseios de todos nós. SETTON
(2004, p. 69)

Conforme afirma a autora, essa revelação pelos produtos culturais e


midiáticos pode ser entendida quando analisada em sua essência, na busca pelo
sentido de determinada ação sem para isso julgá-la como melhor, pior ou correta e
incorreta.
Isso posto, cabe salientar que estudar a comunicação somente pela
compreensão de receptores passivos se torna menos interessante, posto que a
própria análise do fenômeno vai relevar certo grau de consciência dos sujeitos que,
num processo de inacabamento, pode se fazer por meio da reflexão, inúmeras
vezes. Entretanto, essa perspectiva praticamente abandonada pela área
comunicacional a qual tem privilegiado a individualidade dos sujeitos ou a
33

comunicação um para um, ainda é muito encontrada no campo educacional quando


de programas, métodos e currículos massificadores.

Pensar a comunicação a partir da recepção permite entender o papel


dos meios de comunicação na vida da sociedade contemporânea,
como eles atuam no cotidiano dos grupos sociais, nas diferentes
comunidades e culturas. Possibilita sair da oposição emissor todo-
poderoso versus receptor passivo, ou, por outro lado, emissor neutro
versus receptor/consumidor todo-poderoso FÍGARO & BACCEGA
(201, p. 92).

Conforma ressaltam as autoras, por muito tempo a comunicação trabalhou


com a ideia do emissor “todo poderoso”. Traçando um paralelo com a escola, o
emissor seria o professor, quando considerado o detentor único de conhecimento
que vai transmitir ou incutir na cabeça das crianças e jovens, seus conceitos,
pensamentos e ideologias.
Essa argumentação auxilia o aprofundamento da conscientização que faz
necessária no campo educacional e das relações que se podem estabelecer com a
comunicação, superando uma visão retrógrada de que a comunicação é alienante e
que, portanto, deve se distanciar de tudo que é benéfico, como se vê nas pesquisas
sobre comunicação e educação e, mais recentemente da inserção do termo
educomunicação7 em Soares (2011) e Citelli (2011), para cursos de graduação e
pós-graduação.
Ao negar a comunicação, por vezes pelo seu caráter ideológico de persuasão
e manipulação explicitados, contamina-se o olhar para a possibilidade de
emancipação dos sujeitos a partir da apropriação das diferentes linguagens que
compõem os meios e a compreensão de suas sintaxes. É uma relação paradoxal,
porque uma vez mais a educação se permite se distanciar daquilo que a sociedade
tem consumido largamente e se apropriado por meio das facilidades que dispõem os
diversos aparatos tecnológicos.
Numa sociedade marcada pelo amplo uso das ferramentas comunicacionais,
suas linguagens e fazeres específicos, a relação de consumo desses produtos se
modifica. Não o consumo da relação comercial, monetizada, mas o consumo dos

7
A Educomunicação tem buscado espaço para se tornar um campo de conhecimento. O termo nasceu das
inter-relações da Comunicação e da Educação, tendo como princípio os trabalhos desenvolvidos no terceiro
setor como rádios comunitárias e imprensa local. Atualmente há cursos de licenciatura, bacharelado e de pós-
graduação lato sensu de Educomunicação.
34

produtos culturais que o pensador latino-americano Canclini (2010) releva como


possibilidade de construção de cidadania, justamente pela escolha que os cidadãos
fazem e nelas se referenciam.
Parece pertinente observar que à medida que a educação se debruça e se
apropria dos pensamentos comunicacionais também oportuniza trabalhos para
diferentes idades e propostas, pois, ao se apropriar da linguagem, pode lhe conferir
novas reflexões e compreensões dos produtos multimidiáticos.
Como afirma Canclini (2010, p. 158)

Os hábitos e gostos dos consumidores condicionam sua capacidade


de se converterem em cidadãos. O seu referente como cidadãos se
constitui em relação aos referentes artísticos e comunicação, às
informações e aos entretenimentos preferidos.

Se a relação de cidadania passa também pelos produtos comunicacionais


que se consomem e se produzem, é alarmante a urgência do olhar e da apropriação
pela educação dos recursos e linguagens da comunicação como possibilidade de
construção de sujeito, de emancipação e de anunciação de mundo.

1.4 Escola no século XXI

Ao se falar de escola, é comum haver uma imagem na memória, marcada


pelo espaço de vivência de importantes momentos da vida. Para alguns,
representada por uma sala preparada para a formação de grupos, respostas a
desafios e trilhas de aprendizagem personalizadas onde o próprio estudante é quem
organiza seus estudos. Para muitos outros, uma sala repleta de carteiras
enfileiradas em que o professor era o centro da aprendizagem.
Infelizmente essa última imagem é a mais comumente remetida ao modelo de
escola que se encontra até os dias atuais. Muitas vezes recheadas de aulas
estanques, as escolas são mais parecidas com presídios (Foucault, 2004), tamanha
a quantidade de grades e formas de controle para que os estudantes não fujam.
Ora, um sistema que necessita criar meios para que uma pessoa não fuja não
parece prover de momentos prazerosos ou proveitosos para as pessoas que lá
estão.
35

Há escolas diferentes do retratado, porém infelizmente, ainda são


encontrados espaços escolares que se tornam mais castradores da ontologia
humana, de sua capacidade criativa e criadora ao enquadrar em caixinhas, sejam
essas disciplinas ou disciplidoras.
A criança traz consigo uma vontade intensa de entender e de se apropriar do
mundo desde os primeiros dias de vida e, por isso, se demonstra interessada
naquilo que para ela representa um desafio ou um assunto interessante. O que
ocorre com as escolas que parecem não dar conta de continuar instigando a
curiosidade de suas crianças e de seus jovens a ponto destes preferirem saltar seus
muros e verem a vida que há para além deles?
O que parece é que a escola do século passado não era apropriada nem
mesmo à sua época e, conforme as novas gerações chegam aos bancos escolares
trazendo seus anseios, angústias e necessidades básicas de aprendizagem, mais a
escola e o estudante se encontram em um movimento de repulsão, porque ambos
necessitam de um esforço inaudito para se adaptarem e conviverem. Essas novas
gerações têm maior inserção e participação no cotidiano familiar, suas opiniões
foram mais relevadas que as das gerações anteriores e, em especial, estão imersos
em um mar de informações contidas nas redes de computadores.
Quando, no entanto, a escola passa a se adaptar ao seu tempo, propiciando a
compreensão do mundo por meio do empoderamento pela ruptura da ignorância de
suas crianças e jovens, embebendo de sentido a existência e a busca da ciência
para compreendê-la, a essas crianças e jovens cabe a motivação em estudar, não
para um fim profissional ou para uma avaliação pontual, mas para compreenderem a
si mesmos e em relação com os outros.
A busca por um sentido nos diferentes níveis de ensino e verificadas em
perguntas como “mas, para que eu preciso aprender isso?” alerta para uma geração
que busca o fundamento das coisas além de almejarem resultados imediatos e a
aplicação prática dos saberes aprendidos.
As diversas realidades encontradas pela miscigenação cultural do país e as
várias localidades com seus hábitos e histórias revelam que a tentativa de
padronização de escola, idealizada externamente, fugiria a qualquer compromisso
com a realidade.
A instituição escolar encontrada hoje possui diversas imagens no imaginário
do senso comum, em maior parte com atributos não positivos. Sua grade curricular
36

por vezes, engessada, limita os saberes dos estudantes e ainda os coloca em ritmos
únicos de aprendizagem, padronizando a qualidade da aprendizagem com
avaliações externas que não dão possibilidade de exploração do saber local. Desse
modo, ao pensar em uma pedagogia libertadora ensejada por grandes vultos como
Paulo Freire, é possível encontrar em Gallo (2011) uma questão fundamental já
trazida há muitos anos por Foucault.

O problema é que a gente pensa, em geral, na crítica que Foucault fez


da instituição escolar. E se a gente toma a crítica que Foucault fez em
relação à instituição escolar como o padrão do que é a educação,
dificilmente nós poderíamos falar de prática de liberdade na educação,
porque nós vamos ter a educação como essa ‘conformação do sujeito’,
como essa ‘construção externa’ do sujeito segundo determinados
princípios e determinados moldes sociais. Mas se a gente pensa a
educação como um desses instrumentos do cuidado de si, nós
também podemos ver no processo educativo esse modo de o sujeito
cultivar-se a si mesmo. Nós podemos ver no processo educativo não
apenas um processo de transmissão de saberes, de transmissão de
conhecimentos, essa educação extremamente conteudista que nós
estamos acostumados a ver; essa educação que sempre tem um
objetivo externo ao sujeito [...], que é terminar o ensino fundamental,
fazer um ensino médio, passar num vestibular, concluir um curso
superior e se inserir no mercado de trabalho [...]. Há sempre um
objetivo externo colocado para o processo educativo, e muito raras
vezes pensamos no processo educativo como um processo de
construção efetiva do sujeito, em que o objetivo é o do sujeito cultivar-
se através desse processo educativo. Mas se lançamos o foco sobre
essas obras do último Foucault [...], o que nós vamos descobrir é
justamente a possibilidade de pensar a educação como esse processo
de cultivo de si mesmo, de cuidar de si mesmo.

Apesar da maioria das escolas serem tradicionais e, por efeito, vêm somando
anos e anos de necessária análise e de compreensão, não se pode esquecer que há
certas escolas da cidade, do campo, organizadas em periferias, em cidades
pequenas, e que de certa forma se diferenciam das demais e se constituem em bons
modelos de organização, em especial por contemplarem a regionalidade e as
características onde estão inseridas para contextualizarem a educação.
Alguns trabalhos mais recentes têm contribuído com essas discussões e
abordagens por ajudarem a ecoar as vozes dos educadores dessas escolas para
além de seus espaços predeterminados. É o caso de documentários como Quando
sinto que já sei (LOVATO, PEREZ e LIMA, 2014), cuja abordagem se dá em
selecionadas escolas brasileiras de práticas pedagógicas destacadas e conta com
depoimentos de professores, diretores, coordenadores, estudantes e comunidade,
37

evidenciando novas possibilidades de trabalho com os mesmos recursos


educacionais.
Outro documentário amplamente divulgado que traz reflexões e práticas
importantes das escolas da América Latina se chama A Educação proibida (DOIN,
2012) que tece, sob várias perspectivas,um panorama latinoamericano sobre
educação pelo olhar de educadores e pensadores.
Ambos os documentários foram financiados por crowdfunding8 para que
pessoas comuns com interesse em propagar o assunto pudessem contribuir com
parte da produção do filme. Tais projetos demonstram o interesse coletivo para
assuntos ligados à educação e podem significar importante contribuição para que
outras iniciativas de uma pedagogia diferenciada possam ser largamente ampliadas
e discutidas.
Em ambos os filmes, algumas questões relacionadas à escola evidenciam
esse espaço para além dos saberes curriculares e provocam pensar esse espaço
constituído para a possibilidade da convivência, da experimentação, sobre a
tentativa, do prazer, do encontro, do viver e ao mesmo tempo forjar a realidade, do
fazer científico, do fazer empírico: um espaço de constante de fazer e refazer-se.
Essa perspectiva auxilia o desenvolvimento da ideia de uma instituição do
conhecimento que se fixa na experimentação, no fazer científico, mas que também
se volta ao desenvolvimento humano, cidadão e ético porque toma responsabilidade
pela educação para o desenvolvimento integral do ser humano.
Desse modo, a escola que se encontra fechada em si, nos seus muros,
recortada pelo seu material didático muitas vezes castrante e por tantas outras
barreiras invisíveis e sem sentido, não se abre à possibilidade do descortinar o
desconhecido e da redescoberta. Por consequência, não fomenta uma postura
científica que Freire (1996) vai resumir no termo curiosidade epistemológica, como
ressaltado anteriormente.
A postura científica é extremamente importante para um país que busca
desenvolver sua ciência própria, contudo, a formação cidadã tem também papel
fundamental na busca por uma sociedade mais justa. Evidencia-se, assim, a

8
Crowdfunding é o nome dado a forma de receber financiamento coletivo. Nas plataformas de financiamento
coletivo as pessoas tomam conhecimento de projetos e voluntariamente decidem contribuir financeiramente.
Cada contribuição financeira retorna para a pessoa com a uma recompensa. Atualmente, as plataformas mais
conhecidas de crowdfunding são: Catarse, Picante e Benfeitoria.
38

necessidade da construção de uma consciência coletiva que desdobre nos padrões


éticos que regem os grupos sociais.
A formação cidadã pelo viés científico leva aos sujeitos à pesquisa, à
produção de relatórios que refletem e criam teorias e conhecimento. Mas há,
igualmente, a necessidade da formação cidadã propiciar vivência, análise de
fenômenos, ressaltando o viés prático que se caracteriza em uma aprendizagem
transformadora.
Alinhado ao conceito anterior, ressalta-se a importância da dimensão estética
em uma formação integral que se encontra na possibilidade do desenvolvimento da
subjetividade, da interpretação, saber esse tão necessário quanto o das teorias e
teses trazidas pela objetividade. Tal dimensão é muito trabalhada nas propostas
comunicativas que podem adentrar a escola, como a produção de um blog, por
exemplo, que não compreende apenas a estética textual, mas imagética também.
Parece evidente que se a escola encontrada atualmente com sua postura
cartesiana centrada na objetividade e na racionalização não dá espaço para que a
ciência se desenvolva de forma apropriada, tampouco haverá espaço para a arte e
para a subjetividade que não são foco nessa concepção.
A essas questões ligadas ao modelo escolar ou ao desenvolvimento racional
não se pode desvincular o espaço institucional criado para que tais ideias se
desenvolvam.
Não é incomum identificar a ausência da arte nas escolas ou de um projeto
arquitetônico que não seja com o intuito de encaixotar, colocar em quadrados de
concreto. O que se verifica, na maioria das vezes, são grandes blocos de concreto
permeados de salas com carteiras enfileiradas, que não convidam ao
desenvolvimento estético e, além disso, nivelam os estudantes por idade e por
conhecimento transmitido.
Essa escola não se abre à possibilidade de trabalho com a aprendizagem,
porque está focada no ensino. Não se abre à possibilidade do prazer pela leitura,
mas pela quantidade de livros necessários à prova. Não permite ao estudante
avaliar-se, mas subjugar-se a uma avaliação externa. Não incita também o
desenvolvimento de todas as habilidades, mas predetermina os conhecimentos
importantes – para quem?
Nesse paradigma escolar, as tentativas de rompimento são vistas sob uma
perspectiva da perda do controle e, muitas vezes, marginalizadas a espaços de
39

menos prestigiados na experiência escolar. Isso acontece com a aula de artes, por
exemplo, que ocorre uma ou duas vezes na semana, às vezes destacada como
relevante apenas para algumas idades, visto que a disciplina não se encontra em
todos os ciclos e níveis escolares.
Justamente por seu caráter científico, a tecnologia entra na escola, em grande
parte das vezes, como um reforço ao racionalismo e à lógica. A exatidão encontrada
nos recursos tecnológicos corrobora para uma visão limitada, menor do que ela
pode representar para o espaço escolar. No entanto, a descoberta e a
ressignificação da tecnologia pelo viés da criatividade têm permitido um olhar
diferenciado à prática por meio de uma visão mais ampla e de desenvolvimento
global.
Pelas possibilidades da tecnologia digital, professores têm se apropriado dos
recursos e das suas linguagens para fomentar novas discussões e realidades que
auxiliam o estudante na possibilidade de construção, desconstrução e reconstrução
da realidade. Não tem sido incomum encontrar experiências com o uso de
aplicativos e de redes sociais para tal.

1.5 Os estudantes no século XXI

As grandes transformações sociais impulsionadas pelas mudanças


tecnológicas marcaram o início do século. A educação, em especial a escola, é o
local institucionalizado mais representativo que reúne pessoas com diversos
interesses, contextos, localidades, classes sociais e idades.
Marc Prensky (2001) auxilia a explicar a relação intergeracional pela qual
professores e estudantes têm se pautado, considerando-a como uma possibilidade
trazida especialmente pela educação nas cidades, contexto onde a presente
pesquisa foi realizada.

Os alunos de hoje – do maternal à faculdade – representam as


primeiras gerações que cresceram com esta nova tecnologia. Eles
passaram a vida inteira cercados e usando computadores, vídeo
games, tocadores de música digitais, câmeras de vídeo, telefones
celulares, e todos os outros brinquedos e ferramentas da era digital.
(PRENSKY, p. 1, 2001)
40

Cabe salientar que Prensky (2001) fala de uma realidade vivida em seu
contexto. No Brasil, esse pano de fundo, onde a maioria está imersa em tecnologia
desde a infância até a universidade, não representa a realidade no momento.
Verifica-se ainda em outras pesquisas essa relação entre diferentes gerações
e o uso e as apropriações que as mesmas fazem da tecnologia.

No caso das mídias mais antigas – livro, quadrinhos, cinema, rádio e


televisão – mesmo que os pais não tivessem familiaridade com os
conteúdos específicos sobre os quais seus filhos se interessavam,
pelo menos podiam ter acesso e, de qualquer forma, entender esse
meio se quisessem saber o que seus filhos estavam fazendo ou
poderiam compartilhar com eles a atividade. Com o advento das
mídias digitais, as coisas mudaram. As demandas da interface
computacional são significativas, relegando muitos pais à condição de
dinossauros na era da informação em que habitam seus filhos.
(LIVINGSTONE, 2011, p. 12)

Retomando Presnky (2001), dois termos importantes que o autor traz são:
imigrantes digitais e nativos digitais. Tais termos auxiliam na compreensão dessa
relação entre diferentes gerações encontradas, no caso da pesquisa, na escola.
Nativos Digitais para Prensky (2001) refere-se à geração que nasceu num
mundo em que seu cotidiano as pessoas já se apropriam das tecnologias digitais,
como smartphones e tablets, por exemplo.
O termo passa a ser não só uma forma de compreender aqueles que
nasceram com as tecnologias imersas no cotidiano, mas verificar como essas
pessoas lêem o mundo e ainda o compreendem, codificam e decodificam.
Como imigrante digital Presnky (2001) conceitua as pessoas nasceram num
período anterior, mas que buscam se aproprias das novas tecnologias.
Tomados esses conceitos e a relação entre gerações para o cotidiano escolar
quando verificamos a tentativa do docente na postura do “fazer para” o aluno, no
caso das tecnologias pode apresentar importantes riscos, uma vez que o imigrante
digital (Prensky, 2001) pode simplificar ou tipificar um uso de um recurso sem
considerar a apropriação que seus estudantes já fazem dele.

O “sotaque do imigrante digital” pode ser visto em coisas como


recorrer a Internet para buscar informação em segundo lugar, e não
em um primeiro momento, ou em ler o manual de um programa ao
invés de assumir que o próprio programa vai nos ensinar a usá-lo. As
pessoas mais velhas se socializaram de uma forma diferente de seus
filhos, e estão em processo de aprendizagem de uma nova língua. E
41

uma língua aprendida mais tarde, os cientistas confirmam, vai para


uma parte diferente do cérebro (PRENSKY, 2001, p.2)

Vale lembrar que, embora o docente possa ser um usuário dos mesmos
recursos, o fato de não ter nascido no ambiente imersivo em tecnologia pode
representar uma apropriação diferente e, portanto, mesmo com a tentativa de tornar
a aula mais prazerosa ou próxima dos estudantes, pode representar uma opção
verticalizada, tomada por quem não considerou que os estudantes pudessem
participar e se envolver com sua aprendizagem.
É comum entender que a apropriação do meio utilizado por si só garantirá
maior interatividade ou maior imersão dos estudantes aos conteúdos apresentados.
Para isso, Livingstone (2011) faz uma reflexão sobre como o uso de diferentes
gerações pode ser interpretado:

Na verdade, a própria dificuldade em acessar e usar a internet leva muitos


adultos a acreditarem que, se pudessem – como seus filhos –, dominar a arte
de clicar em links com o mouse então seriam experts em internet. Essa não é
uma crença que temos em relação à caneta, senão pararíamos de ensinar
inglês aos alunos quando tivessem aprendido a ler e a escrever, mas a
criança que maneja a tela nos parece tão habilidosa que podemos concluir
confortavelmente que já sabe tudo o que precisa. (LIVINGSTONE, 2011, p.
12)

As reflexões trazidas pelo autor encontram na escola possibilidades de


pesquisa, uma vez que é uma instituição que vive cotidianamente as relações
sociais, nesse caso, geracionais. Poucas são as organizações nas quais a diferença
de idade é uma constante e que se desdobra totalmente na prática e na relação
entre as pessoas.
A escola se dá em conhecimentos previamente validados. De certa forma, tal
conhecimento é validado pela experiência, pela comunidade acadêmica e cientistas.
Ou seja, há certa necessidade de perenidade e decantação dos saberes, o que
implica em um saber que pode não ser contemporâneo.
Essas questões remetem, mais uma vez, à concepção de educação e, mais
especificamente, à concepção de escola que se tem visto. Isso porque, a partir
desses conceitos, poderá se construir escolas com objetivos diferentes, como por
exemplo: com foco na cidadania, na área de exatas, nas relações sociais, no fazer
científico, no desenvolvimento local e global, dentre outros.
42

As concepções, quando claras e objetivas, auxiliam todos os agentes


educacionais a compreenderem de que lugares partem e por onde desejam que os
estudantes caminhem para chegarem ao objetivo pré-definido (pela escola sozinha
ou junto da comunidade, quando de uma gestão democrática).
Definidas essas questões, é provável se encontrar ainda algumas barreiras ou
observações que necessitam de atenção para que a construção do saber científico,
racional e filosofado possa ser desenvolvido, respeitando-se o momento em que
cada pessoa se encontra.
Embora todos os envolvidos estejam vivendo no mesmo período cronológico,
as variadas idades vivenciam realidades diferentes que “invadem” o espaço escolar
transformando-o num território de troca ou de disputas, aproximações e confrontos.
Para além das idades, a escola é um território em que as relações sociais são
complexas, por apresentarem diferentes interesses, objetivos. É da aproximação e
do confronto de ideias que o debate enriquece a compreensão da vida e que o fazer
científico ganha força.
A complexidade trazida por Morin (2007) auxilia a compreender essas
relações.

A um primeiro olhar, a complexidade é um tecido (complexus: o que é


tecido junto) de constituintes heterogêneos inseparavelmente
associados: ela coloca o paradoxo do uno e do múltiplo. Num segundo
momento, a complexidade é efetivamente o tecido de acontecimentos,
ações, interações, retroações, determinações, acasos, que constituem
nosso mundo fenomênico. Mas então a complexidade se apresenta
com os traços inquietantes do emaranhado, do inextricável, da
desordem, da ambigüidade, da incerteza. (MORIN, 2007, p. 13)

A complexidade está presente em pesquisas que se ligam à relação humana


e a tecnologia pela integração que a tecnologia permite na compreensão dos
sistemas. Morin (2011, p. 19) afirma que “a teoria dos sistemas e a cibernética se
interseccionam numa zona incerta comum” por possibilitarem o olhar sistêmico e não
analítico que facilitam tanto a compreensão da tecnologia em si e a cibernética,
como da relação humana com a mesma.
A partir da perspectiva da complexidade, ao se analisar as diferentes idades
dos sujeitos que povoam a escola, identifica-se não só uma imbricada relação
intergeracional, como uma mudança significativa na forma com que essas gerações
43

compreendem, codificam e decodificam o mundo. Almeida (2010) auxilia na


compreensão

Sendo a tecnologia compreendida como um instrumento estruturante


do pensamento, desde sua concepção como projeto e antes mesmo
de se fazer artefato, para que ela possa ser integrada criticamente ao
currículo e ao fazer pedagógico, é preciso que o professor possa
apoderar-se de suas propriedades intrínsecas, utilizá-la na própria
aprendizagem e na prática pedagógica e refletir sobre por que e para
que usar a tecnologia, como se dá esse uso e que contribuições ela
pode trazer à aprendizagem e ao desenvolvimento do currículo.
(ALMEIDA, 2010, p. 68).

Como bem conceitua a autora, cabe ao docente significar o aparato


tecnológico e sua linguagem para uma possibilidade de aprendizagem, o que exige
mais que preparo para o entendimento desses novos recursos, uma postura de
aprendiz ao permitir que estas novas gerações não só apresentem os recursos
como auxiliem nas possibilidades de uso da educação.
Outra questão importante a ser tratada pelo fato das novas gerações
nascerem imersas em um mundo tecnológico é a estruturação de pensamento, tanto
para a apropriação e aquisição da língua materna como das diferentes linguagens
que compõem os recursos digitais.
Consequentemente, a linguagem tecnológica representa o meio social em
que essas pessoas estão inseridas e a apropriação dessas ferramentas, mas em
especial das linguagens e da lógica que elas possuem, configura uma forma de ver
o mundo e nele se inserir e ainda, dele se apropriar. A apropriação do mundo se dá
por meio da interação social com os outros indivíduos e da cultura nela encontrada,
como afirma Vygostky (1989).
Assim, ao entender a apropriação de uma criança pela interação que faz com
as outras pessoas e com a linguagem que utiliza para isso, seja essa o celular, a
câmera, o contato pessoal ou a rede social, verifica-se uma ampliação da
propriedade da linguagem, algo que uma criança de outrora não vivenciaria.
Para o melhor entendimento da apropriação da linguagem, recorre-se a
Bruner (2001), que ajuda a compreender como o ser, ao apropriar-se da linguagem
e do simbólico, consegue decodificar o mundo, significá-lo e dizê-lo.
Indo mais a fundo na relação das diferentes linguagens e tecnologia, vale
ressaltar que para além da alfabetização da língua materna a alfabetização
44

multimídia ou alfabetização digital tornam-se importantes termos para a sociedade


atual.

A alfabetização multimídia que aqui propomos pretende superar a


mera habilidade mecânica de codificar e decodificar textos em
diferentes linguagens para focalizar as implicações individuais e
sociais de sua criação, difusão, interpretação, utilização, etc.
(MARTÍN, 2014, p. 190)

Há diferentes concepções na relação da alfabetização para os meios, para a


informática, para a mídia, sendo que diferentes autores conceituam ora de forma
mais analítica, ora sistêmica. Entretanto, a raiz dos diferentes termos está na
preocupação para a comunicação em um mundo permeado de ferramentas
tecnológicas e digitais cotidianas.
Diferentes autores têm contextualizado e verificado a importância dessa nova
alfabetização.

As "novas alfabetizações" propõem expandir a metáfora da leitura e da


escrita a uma "paisagem textual" que tem sido profundamente
transformada. Em uma reflexão que abrange o ensino da
alfabetização, da matemática, da informática e dos meios de
comunicação, observou-se que novas práticas de alfabetização
referem-se à capacidade de ler e escrever diferentes tipos de texto,
signos, materiais, matrizes e imagens em um sentido amplo
(Lankshear & Snyder, 2000). Para nós, a leitura e a escrita ocorrem
em ambientes que estão repletos de textos visuais, eletrônicos e
digitais, e que nos pedem para ler, ver, escutar e responder de ao
mesmo tempo (Walsh, 2008). Além disso, somos convidados a ser
"interativo" e "participativos" em todas as nossas atividades. Essas são
as habilidades ou novas disposições que apontam para outros modos
de conhecer o mundo social. (tradução livre). (DUSSEL, s.d., p2)

Nas palavras do pesquisador, evidencia-se às diferentes apropriações da


língua materna que passa, cada vez mais, pela alfabetização num sentido mais
amplo, por meio da apropriação, uso e compreensão dos meios digitais.
Posto isso, a escola, recebendo como uma de suas atribuições alfabetizar
suas crianças, jovens e adultos, deve preocupar-se com essa alfabetização num
conceito mais amplo, multimidiático e digital. Pretto e Assis (2008, p. 78) afirmam
que
45

Produzir informação e conhecimento passa a ser, portanto, a condição


para transformar a atual ordem social. Produzir de forma
descentralizada e de maneira não-formatada ou preconcebida.
Produzir e ocupar os espaços, todos os espaços, através das redes.
Nesse contexto, a apropriação da cultura digital passa a ser
fundamental, uma vez que ela já indica intrinsecamente um processo
crescente de reorganização das relações sociais mediadas pelas
tecnologias digitais, afetando em maior ou menor escala todos os
aspectos da ação humana. Isso inclui reorganizações da língua escrita
e falada, as idéias, crenças, costumes, códigos, instituições,
ferramentas, métodos de trabalho, arte, religião, ciência, enfim, todas
as esferas da atividade humana. Até mesmo os aspectos mais
pessoais, como os rituais de namoro e casamento, entre outras
práticas, têm a sua regulação alterada, dadas as novas formas de
interação vivenciadas na cultura digital.

Alteradas as apropriações da língua e das diferentes linguagens, o processo


de organização social até então mais linear sofre também modificações importantes
que as novas gerações, cotidianamente, evidenciam na forma com que se
relacionam com a aprendizagem e com o mundo.
O pensamento linear a que as pessoas se habituaram a entender o início, o
meio e o fim das coisas, como eventos seguidos cronologicamente, parecem não
condizerem com o que a nova formação social e os meandros que percorrem a vida
suscitam existir.
Deparando-se com diferentes dispositivos tecnológicos que se comunicam
entre si, não mais importando as barreiras geográficas e temporais, identifica-se que
o emaranhado propiciado pelas redes complexas e distribuídas não impactam
exclusivamente o campo tecnológico e comunicacional, como tem se desdobrado
também nas relações sociais.
Se a alfabetização digital nesse “novo terreno” do século XXI torna-se
importante fator para apropriação e transformação social, a quebra da linearidade
vão modificar dois elementos fundamentais da organização social: o tempo e o
espaço.
Não raro na atualidade, as pessoas se conhecem a partir de estados e países
diversos, interagem e, possivelmente, algumas delas nunca se encontraram ou se
encontrarão fisicamente. As antigas barreiras geográficas de comunicação hoje
parecem não existir mais e transformam-se com o avanço tecnológico, tornando-se
cada vez menos importantes para a conexão de pessoas.
46

Essa quebra de linearidade, corroborada pela forma com que as pessoas se


organizam socialmente e se comunicam, tem se desdobrado na forma com que as
pessoas compreendem a sociedade em que estão inseridas.

Com o surgimento da rede internet, essa ruptura sedutora, iniciada


com a TV, consolidou-se, e a linearidade textual pode vir a tornar-se
um mito. As crianças e jovens (Y e Z) navegam na rede livremente,
seduzidas por sua estrutura, que é uma metáfora de nosso
pensamento fluido e não-linear. Por isso é tão doloroso para muitos
jovens, hoje, a leitura de um livro. Ela é limitada, engessada, não faz
hiperlinks diretos. Por exemplo, imaginemos um jovem que está lendo
o capítulo de um livro no qual em um parágrafo lê sobre o suicídio de
baleias. O jovem quer saber mais sobre o tema, mas o livro não lhe dá
a possibilidade do link direto. A internet, sim. Em menos de um minuto,
ele não só saberá muito sobre o tema, como poderá ver as imagens e
ouvir os sons de muitos casos desses suicídios em um site como o
Youtube, e daí poderá dar novos saltos. E, note-se, muitas vezes não
retornando ao assunto/tema inicial de sua pesquisa/navegação.
(NETO e FRANCO, 2010, p. 15)

Edgar Morin (2005), importante pensador contemporâneo, estabelece uma


relação de como a cibernética possibilita uma nova forma de compreensão social,
não para imputar à sociedade uma nova forma de organização, mas esclarecer que
a cibernética e a compreensão das suas complexas redes auxiliam a compreender
as inter-relações existentes na vida social.
As gerações mais jovens, cujas vidas se estabelecem na imersão tecnológica
pelos múltiplos usos que fazem dos aparelhos de que dispõem, tendem a
compreender a sociedade a partir desse olhar da cibernética o que, em maior ou
menor grau, facilitaria a compreensão da vida com uma complexidade até então não
exigida na lógica linear. Tal perspectiva cria uma ruptura entre o sistemático e o
sistêmico, ou seja, para uma visão mais complexa de interações.

É com Wiener, Ashby, os fundadores da cibernética, que a


complexidade entra verdadeiramente em cena na ciência. É com Von
Neumann que, pela primeira vez, o caráter fundamental do conceito de
complexidade aparece em sua relação com os fenômenos de auto-
organização [...] todo sistema auto-organizador (vivo), mesmo o mais
combina um número muito grande de unidades da ordem de bilhões,
seja de molecular numa célula [...] a complexidade não compreende
apenas quantidades de unidade e interações que desafiam nossas
possibilidades de cálculo: ela compreende também incertezas,
indeterminações, fenômenos aleatórios. (MORIN, 2007, pp. 34 e 35)
47

Um dos paradoxos que a cibernética possibilita na compreensão da


complexidade é o fato de os artefatos digitais serem consumidos pelos próprios
produtores. Na história da comunicação de massa, emissores e receptores eram
claramente destacados. Com os meios digitais, consumidores passam a ser
produtores e a apropriação de linguagem passa de certa forma por uma
retroalimentação.
O termos prossumer ou prossumidor, cunhado por Toffler (1980, p.171),
demonstra essa característica já detectada pelo pensador visionário “a
desmassificação dos meios de comunicação de massa desmassifica igualmente as
nossas mentes. Hoje, em vez de massas de pessoas recebendo todas as
mensagens, grupos desmassificados menores recebem e enviam grandes
quantidades de suas próprias imagens de uns para os outros.”
Essa reconfiguração da relação produção-consumo dos meios digitais, é
também retratada por outros pensadores, como resume Prats (2014), ao citar que o
conceito de inteligência coletiva desenvolvido por Lévy (1999) é trabalhado Jenkins
(2008) como uma das três características definidoras da nova cultura, sendo as
demais: convergência midiática e cultura participativa.
Segundo Lévy (1999, p. 28) inteligência coletiva "é uma inteligência
distribuída por toda parte, incessantemente valorizada, coordenada em tempo real,
que resulta uma mobilização efetiva das competências”. O conceito trabalhado pelo
autor encontra na convergência midiática a possibilidade de uma comunicação mais
ágil e facilitada entre pessoas em tempos e espaços diferentes.
Rivoltella e Fantin (2010) evidenciam como os recursos tecnológicos têm
alterado o modo como pessoas de idades variadas têm se apropriado do seu meio
social, tendendo a uma lógica pela qual se estabelece na relação com a tecnologia.

O termo “comunicação digital” indica, como foi mostrado por Farrel


Corcoran (2006), uma paisagem comunicativa marcada pela
multimedialidade, pela intermedialidade (ou crossmediality), pela
portabilidade e versatilidade. Na multimedialidade, enquanto lemos
uma página Web sobre o laptop, podemos abrir uma janela na qual
vemos um vídeo e escutar música de fundo ou uma voz pocomenta
uma fotografia.
Por outro lado, na intermedialidade, o processo de convergência das
mídias ao digital já produziu e produzirá cada vez mais um processo
de contaminação e pluriespecialização dos diversos suportes: hoje se
pode ouvir rádio na Internet, navegar na Web e descarregar o correio
eletrônico pela televisão de casa, telefonar, escrever mensagens,
48

fotografar e ter uma agenda de anotações com um telefone celular.


(FANTIN e RIVOLTELLA, 2010, p. 90)

Evidencia-se assim a diferença entre lógicas de construção de pensamento


que passam a ser transformadas com o incremento das tecnologias e suas
características, uma vez que, imersos nessa nova realidade, as crianças e jovens
passam a pensar com as tecnologias e não apenas para elas.

1.6 Professores no século XXI

Quem são os professores do novo século? Aqueles que já estavam em sala


de aula no século XX e muitos outros que iniciaram sua carreira na docência depois.
O século mudou, mas os professores e suas práticas não necessariamente. Isso
porque a entrada do século foi marcada pelo tempo cronológico e não é uma data
que gera transformações apenas, mas todo um contexto.
O tempo cronológico já não era o melhor regulador temporal para a educação.
As séries, as fases de desenvolvimento, os sinais das indústrias, todos eles servem
para marcar um tempo que não é o da escola, da aprendizagem.
A escola, como espaço de socialização, de vivência, de descoberta e
aprendizagens, quando regulada pelo tempo chronos9 de forma estrita, arrisca
perder os momentos de afloramento da criatividade espontânea, do insight, para o
fazer atento.
O tempo chronos persiste em mitificar o fazer institucionalizado tipificando as
pessoas em seus “talentos”. Por meio do acerto pontual dos minutos e das horas,
marca a finalidade para que as pessoas foram talhadas nos bancos escolares e
universitários, insinuando um esquema fabril de produção de educandos tão bem
retratado no clipe da música de 1979, Another brick in the wall (Outro tijolo na
parede) da banda Pink Floyd.
Uma escola fabril homogeneíza seus educandos como se todos aprendessem
da mesma forma e ao mesmo tempo, como se tivessem as mesmas necessidades.

9
Na mitologia grega o tempo era dividido em duas formas de expressão. Chronos significava o tempo
que se pode medir, sequencial. Kairós significava o tempo qualitativo, como tempo de contemplação,
a experiência de um momento.
49

O mesmo acontece quando uma análise aligeirada é feita para toda a classe de
professores.
Pensar os professores do século XXI num sentido estreito seria igualar a
todos em um modelo existente, encontrado em todas as escolas, cujos hábitos e
comportamentos fossem reproduzíveis em todos os níveis e espaços escolares –
sem dúvida, um erro.
Ainda que a mudança de século se dê pelo tempo cronológico, pela simples
virada da meia noite de um ano para outro, não se pode tipificar os professores do
século XXI ou igualá-los pelo tempo em que estão inseridos.
Neste item, portanto, busca-se tecer impressões relacionadas às premissas
que o tempo (Kairós) tem trazido às escolas, com as mudanças sociais,
comportamentais e individuais, desafiando o professor nas suas mais diversas
competências.
Uma vez que o tempo chronos e o kairós podem conviver e é possível a
educação acontecer nas fronteiras e nas brechas, valioso se faz pensar, numa visão
crítica, a necessidade de uma constante reflexão sobre tal tema, uma vez que a
escola, inserida numa sociedade de produção, pautada pelo tempo poderá
reproduzir uma lógica mercantilista quando se afasta do exercício de (auto)reflexão.
Longe de esculpir um modelo de professor, pelo contrário, busca-se identificar
características ligadas ao ofício docente que são cada vez mais demandadas não só
desse profissional, como daquilo que o cerca, ou seja, uma reflexão sobre o espaço
escolar, seus tempos e sua organização.
A profissão docente exige uma ampla preparação para que possa ser
qualificada e apropriada àqueles que estão nos bancos escolares nas mais diversas
circunstâncias e regiões. Cada educando traz na bagagem um histórico de vida, de
familiar e de cultura. Dayrell (1996, p. 10) destaca que

Os alunos que chegam à escola são sujeitos sócio-culturais, com um


saber, uma cultura, e também com um projeto, mais amplo ou mais
restrito, mais ou menos consciente, mas sempre existente, fruto das
experiências vivenciadas dentro do campo de possibilidades de cada
um. A escola é parte do projeto dos alunos.

Ser professor exige uma grande qualificação que começa no ambiente


acadêmico, mas que se estende por toda a vida profissional. A formação inicial é tão
50

importante quanto a formação continuada, porque ambas têm impactos diferentes no


fazer pedagógico – tais termos serão aprofundados mais adiante.
A formação inicial ajuda a gerar as bases, concepções e alicerces da
profissão. A formação continuada traz novas reflexões, auxílios, apoios e
provocações do tempo presente para que o professor possa sempre agir e refletir
sobre sua prática.

A formação continuada busca novos caminhos de desenvolvimento,


deixando de ser reciclagem, como preconizava o modelo clássico,
para tratar de problemas educacionais por meio de um trabalho de
reflexividade crítica sobre as práticas pedagógicas e de uma
permanente (re) construção da identidade do docente. (MIZUKAMI,
2002, p. 28)

Esse movimento reflexivo feito pelo professor é uma necessidade daqueles


que desejam ressignificar o seu fazer docente aos educandos que recebem
diariamente nas escolas e em outros espaços educativos.
Evidencia-se a preocupação do professor de estar verdadeiramente inserido
em uma educação do século XXI. Não foi o tempo cronológico que mudou a
educação, mas os avanços que marcaram os últimos anos, seguidos das inserções
dos inúmeros recursos tecnológicos que aceleram as mudanças sociais. Isso é
possível ao passo que os avanços permitem novas apropriações desses recursos e
de outra forma, uma mudança comportamental a partir dessas inserções – questões
tratadas anteriormente neste capítulo.
Essa preocupação com uma nova docência não se dá pela mudança de
século, mas por uma postura, uma decisão de ser mais (Freire, 2005). A partir dessa
decisão de fazer-se constantemente durante a realização de sua existência como
professor é que se encontra a oportunidade de abrir-se ao novo, não como quem
aceita tudo que recebe e aplica, mas como quem reflete a partir de suas
concepções, convicções e experiências, o sentido da inserção de determinados
recursos para uma busca constante de assunção da aprendizagem.
Para isso, a relação entre educador e educando, entre docente e discente,
não se faz hierarquizada - de quem sabe mais para quem sabe menos. Pelo
contrário, o educador assume uma postura de aprendizagem, que se estabelece na
relação com o educando.
51

[...] Não há docência sem discência, as duas se explicam sujeitos


apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de
objeto, um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende
ensina ao aprender. Quem ensina, ensina alguma coisa a
alguém.(FREIRE, 1996, p. 23)

Fica evidente, nessa relação, o protagonismo dos sujeitos que, ocupando


posições diferentes, são aprendizes juntos. Aprendem coisas diferentes, mas isso se
dá na relação que estabelecem um com o outro, mediados pelo mundo, ou seja,
buscando sua compreensão. Essa busca passa pelas teorias até então
consolidadas, mas instiga o fazer científico.
Dessa forma, não se trata de se estudar uma teoria no sentido de apenas
aplicá-la, mas com ela ou a partir dela desenvolver hipóteses que possam
questionar a sua atuação. Assim, não é aprender o passado, mas buscar
compreender o presente estando preparado para descobrir o que ainda não foi
desvelado pela ciência. Preparar os educandos para entender que o mundo não é
algo pronto, mas um desafio a ser descortinado na relação da aprendizagem que se
dá entre educando e educador, entre mentor e aprendiz, a cada dia.
Essa relação estabelecida na confiança e na admiração propicia novas
descobertas e uma relação na qual o saber se constrói à medida que educando e
educador se tornam protagonistas da ciência que produzem ao descobrirem novas
aprendizagens.
Para isso, a docência não se faz somente na espontaneidade, assim como
também não se faz somente pela rigorosidade científica. É na fronteira entre ambas
que o educando pesquisador vai se constituindo como um ser relacional, complexo,
sistêmico, que se abre às possibilidades.

[...] o saber que a prática docente espontânea ou quase espontânea,


“desarmada”, indiscutivelmente produz é um saber ingênuo, um saber
de experiência feito, a que falta a rigorosidade metódica que
caracteriza a curiosidade epistemológica do sujeito. (FREIRE, 1996,
p.38)

Nessa moldura, fica evidenciado que a relação entre estudante e professor,


educando e educador é fundamental para que a aprendizagem científica aconteça.
Não se trata de uma deposição de conteúdos já balizados, mas da busca pela
compreensão do mundo, pela compreensão de conteúdos ou da apropriação destes
para algo maior.
52

A aprendizagem não deve ser tratada como uma mera apropriação dos
conteúdos curriculares, mas pelo desenvolvimento de uma postura epistemológica
que visa significar a experiência do educando com o fazer científico no meio social
em que este vive e, portanto, uma nova postura diante do mundo em que está
inserido.
A tecnologia, nessa relação entre educador e educando para a configuração
de uma construção do conhecimento protagonizada pelo educando e pelo educador
como aprendiz, pode ser um elemento catalisador posto seu potencial agregador de
diferentes sujeitos e gerações.
Considerando a relação entre educador e educando como propulsora para a
compreensão e aprendizagem do mundo, não se pode desprezar um fator cada vez
mais presente nos dias atuais: as novas gerações, conforme abordado
anteriormente, têm chegado às escolas com seus recursos tecnológicos e
dispositivos móveis. O uso que deles se fazem são os mais diversos. Não se
encontra, no entanto, um significativo uso por parte dos alunos dentro do ambiente
escolar, o que já não se reflete quando do uso nos seus lares.

Uma parcela importante dos alunos realizam tarefas escolares por


meio das TIC em casa. Entre os alunos de escolas públicas que
utilizam computador ou Internet para realizar atividades escolares, o
percentual daqueles que declaram fazer projetos ou trabalhos sobre
um tema, lição ou exercícios e pesquisas escolares em casa varia
entre 73% e 75%, ao passo que aqueles que afirmam realizá-los na
escola varia entre 22% e 24%. Os dados evidenciam o maior uso das
TIC fora do ambiente escolar, ainda que a atividade realizada seja
relacionada à educação formal. (CETIC, 2015, p. 111)

A pesquisa realizada pelo CETIC10 demonstra o quanto há ainda por se fazer


e a oportunidade de significar o uso dos recursos tecnológicos no ambiente escolar,
com o intuito de qualificá-lo para além do uso feito em casa. A pesquisa do CETIC
será retomada no próximo capítulo.
Essa qualificação remete à necessidade do professor primeiramente se
adequar ao cenário encontrado. Sobretudo, apropriar-se da linguagem é mais
importante do que precisamente dos recursos, até porque, os recursos tecnológicos
que ora se utilizam já estarão defasados em pouco tempo. Isso significa que, mais

10
Comitê Gestor da Internet no Brasil tem a atribuição de estabelecer diretrizes estratégicas
relacionadas ao uso e desenvolvimento da internet no Brasil.
53

importante do que saber manusear determinada máquina, câmera e outro recurso, é


saber como funciona o material que ela produz, sua linguagem, a fim de verificar
todo o potencial que possui. Outrossim, antes de saber operar uma máquina
fotográfica digital é preferível entender a linguagem da fotografia para a educação,
propiciar momentos de reflexão sobre seus recortes, sobre as histórias que as fotos
contam, sobre os ângulos que permitem contar inúmeras versões de fatos ocorridos
dentre outros.
Ficar atento aos recursos a fim de dominar todos os botões e configurações
se torna inócuo numa sala de aula em que todos os educandos conhecem as
possibilidades técnicas do aparelho. Kenski (1998, p.20) relembra que “as velozes
transformações tecnológicas da atualidade impõem novos ritmos e dimensões à
tarefa de ensinar e aprender. É preciso que se esteja em permanente estado de
aprendizagem e de adaptação ao novo”.
Esse estado de aprendizagem e adaptação sugere que o educador não pode
mais se achar no papel de detentor único do conhecimento e do saber, uma vez
que, na sala de aula, muitas ocorrências mostrarão que gerações mais novas fazem
melhor apropriação dos recursos tecnológicos, o que demonstra que embora haja
saberes diferentes entre educadores e educandos, ambos podem aprender
conjuntamente.
Querer ser o maior detentor do conhecimento de qualquer área não condiz
com a postura de um professor pesquisador que se sabe que não aprendeu tudo,
visto que não há saber fechado em um mundo em constante construção.
Com a entrada dos recursos tecnológicos e a abertura para a personalização
do ensino, o educador passa, progressivamente, a ser um interlocutor entre as
fontes, o conhecimento e o educando. É como se houvesse uma tríade entre
educando, conhecimento e educador.
Com efeito, pesquisas demonstram a necessidade cada vez maior dos
professores atuarem como curadores e auxiliadores no trajeto de aprendizagem dos
educandos. Nesse viés, o excerto abaixa ressalta a relevância de desafios e
enfrentamentos.

[...] os jovens, e também as crianças, sofrem ainda com outros


problemas. O mais gritante é o da aceleração dos processos
tecnológicos em todos os campos e a dificuldade para selecionar
informação útil, adequada e significativa, num oceano ilimitado de
54

fluxos informacionais diários. Esse caldo cultural escorre por todos os


lados, diariamente, impondo às mentes em formação o problema
grave de “selecionar”, saber separar “o joio do trigo”, não sentir-se
perdido dentro dessa teia infinita de informações, e transformá-las em
conhecimento pertinente para a formação de seu caráter e identidade.
(NETO e FRANCO, 2010, p. 15-16)

Diante do mar de informações, a associação que o educando faz com os


dados pode ser de simples verificação, o que não representa obrigatoriamente a
transformação dessa informação em conhecimento. Esta, por sua vez, necessita do
processo de observação crítica da informação e a articulação com demais saberes.

[...] a realidade é mais prosaica e mais complexa. A visão otimista dos


jovens como uma “geração digital” – liberada e potencializada
automaticamente em virtude de sua experiência das novas tecnologias
– é pouco mais que uma forma de ilusão. Esta concepção não leva em
conta algumas continuidades fundamentais, assim como importantes
diferenças e desigualdades nas experiências culturais dos jovens [...]
brecha importante, cada dia mais profunda, entre a experiência da
maior parte dos jovens com a tecnologia fora da escola e o uso de
tecnologia na sala de aula. E essa “nova brecha digital” é o que a
política educacional e a prática educativa devem agora abordar com
urgência (BUCKINGHAM, 2008, p. 110)

Em um mundo absorto em infindas informações, o papel do educador se torna


primordial na conquista da aprendizagem que passa pela rigorosidade científica
proposta por Freire (1996). Na sociedade da informação, cabe ainda ao educador
fazer reflexões e tecer críticas de forma a entender-se como um ser social
protagonista na relação com as tecnologias e da informação, encontradas em
abundância e em rede, reflexões estas que podem ser auxiliadas por importantes
autores do tema: Castells (1999), Lemos (2002), Levy (1999).
Em outras palavras,

[...] favoráveis ou não, é chegado o momento em que nós,


profissionais da educação, que temos o conhecimento e a informação
como nossas matérias-primas, enfrentamos os desafios oriundos das
novas tecnologias. Esses enfrentamentos não significam a adesão
incondicional ou a oposição radical ao ambiente eletrônico, mas, ao
contrário, significam criticamente conhecê-los para saber de suas
vantagens e desvantagens, de seus riscos e possibilidades, para
transformá-los em ferramentas e parceiros em alguns momentos e
dispensá-los em outros instantes. (KENSKI, 1998, p. 61)
55

Nesse sentido, o professor tem a oportunidade de auxiliar o estudante a


buscar as informações e, ainda mais, de mediá-lo na sua curadoria, passando por
crivos, teorias e conhecimentos prévios que lhe possibilitarão saber se determinadas
informações são realmente embasadas ou fictícias.
Tais reflexões contribuem com a rigorosidade científica e a aprendizagem
ativa dos educandos na sua relação com os educadores. O detentor único do
conhecimento, como era conhecido o professor, não existe mais nessa ligação, mas
este ainda representa uma figura importante, de inspiração e modelo aos educandos
em especial para auxiliá-los a estabelecerem novas conexões entre conhecimentos
e assim, significarem a aprendizagem de forma individual.
56

2. Educação Básica e TDIC, perspectivas e possibilidades

A entrada das tecnologias na educação é um fato que deve ser observado por
diferentes prismas, visto que não somente as diferentes tecnologias têm suas
especificidades, como também a educação tem seus matizes e suas variações.
É necessário atentar-se à uma visão mais macro e crítica e não incorrer em
uma visão reducionista, ainda muito comum, que é a de achar que a tecnologia é a
solução de todos os problemas ou simplesmente, sua causa, ou ainda uma visão
apocalítica (de que tecnologia vai acabar com a humanidade) e integrada (de que a
tecnologia é a solução para todos os problemas da humanidade) (ECO, 2015).
Presumir que ela é o mal do século ou ainda o maior benefício que a humanidade
pode ter, desprezando-se todos os demais adventos seria retirar todas as questões
que envolvem quando da entrada da tecnologia na educação e todas as
reorganizações que ela promovem, propõe e suscita.
Deve-se lembrar que os recursos e avanços tecnológicos, mesmo dentro das
salas de aula, podem não terem sido concebidos para este fim. A História mostra
que muitas tecnologias surgiram por diversos fatores. Alguns, inclusive,
prioritariamente para fins militares, como as primeiras linguagens codificadas (código
Morse, por exemplo) e mesmo com a rede mundial de computadores..

O sociólogo inglês da cultural, Raymond Williams, em seu livro O ano


2000, afirma que o desenvolvimento tecnológico tem dependido
historicamente não de decisões técnicas, mas de decisões políticas e
econômicas, e nos últimos anos tem dependido – eu agregaria -,
sobretudo, de um particular tipo de decisões econômicas: decisões do
mercado, dos mercados internacionais. Esta compreensão crítica do
desenvolvimento tecnológico na história mundial supõe entender que o
motor da tecnologia não é a descoberta científica nem sequer a
descoberta tecnológica em si mesma (OROZCO-GÓMEZ, G., 2011,
pp. 161-162)

Com a introdução das tecnologias nas escolas, alguns estudiosos e


professores começaram a produzir escritos, teorias e possibilidades de trabalho
pedagógico com a utilização dessas tecnologias; entretanto, ressalta-se que as
mesmas não foram criadas para esse ambiente, mas adaptadas.
Partindo desse princípio, é possível ressaltar um fator importante que será
aprofundado ainda neste capítulo: o paradoxo encontrado na era da conectividade
57

generalizada (LEMOS, 2003) vivida atualmente, mas que ao mesmo tempo, não
consegue extinguir ou resolver problemas da humanidade que deveriam ser mais
simples, como a fome, por exemplo.

Nosso mundo vive contrastes paradoxais, pois, se uma parte dele tem
uma hipertecnologia que nos permite falar em pós-humanidade, outra
parte está numa miséria tão grande que não é possível falar nem
mesmo em humanidade. No Brasil, vivemos estas duas realidades, e
os professores precisam desenvolver a capacidade de trabalhar com
estas duas situações, tanto no sentido de superar os fatores de
desigualdade e desumanização como no sentido de viver, com
desembaraço e competência, as realidades de um novo mundo que
vai sendo gestado. (NETO e FRANCO, 2010, p.12)

A tecnologia evidencia os contrastes sociais, mas também modifica a forma


com que as pessoas se organizam socialmente e se apropriam dos distintos padrões
e instituições estabelecidos historicamente. Isso abre campo para uma reflexão
sobre como essa hibridização entre cultura analógica e cultura tecnológica pode
interferir na forma com que a aprendizagem ocorre e com que as crianças se
apropriam dos espaços escolares.

A construção da personalidade e dos valores está acontecendo por


caminhos muito diversos daqueles tradicionais: família, igreja, escola,
TV. E a configuração de todos os processos perceptivos é muito mais
imagética e hipertextual/hipermidiática. A tradição oral permanece,
mas totalmente contaminada por estruturas definidas pelos processos
de globalização e pelas dinâmicas de consumo. A língua escrita está
sendo totalmente reconfigurada, e existe uma resistência grande à
forma tradicional de leitura: o livro com começo-meio-fim – sem a
sedução da imagem, da interação, da participação efetiva – está se
tornando obsoleto para essas novas gerações. (NETO e FRANCO,
2010, p.14)

A partir dessa breve contextualização, alguns aspectos serão contemplados


na utilização das tecnologias digitais de informação e comunicação como
possibilidade pedagógica, com o intuito de apresentar possibilidades e contribuições
que as mesmas puderam fazer à escola atual, que necessita se adequar às
mudanças e novas exigências da vida humana.
As tecnologias estão presentes nas escolas. Não se nega mais sua entrada,
mas muitos são os questionamentos e ressalvas porque educadores têm se
colocado para pensar a tecnologia nesse ambiente.
58

Ainda que de forma incompleta e talvez institucionalizada, as tecnologias


invadiram a sala de aula, trazidas, na maioria das vezes, pelos próprios alunos. Com
seus celulares e tablets, estudantes têm possibilitado que a velocidade com que a
tecnologia esteja presente na escola seja acelerada.
Com a popularização dos smartphones, mais pessoas tiveram acesso ao
recurso, o que possibilita hoje que o celular seja uma das principais ferramentas
tecnológicas digitais da nova era. Uma pesquisa realizada em 2014, com 1.034
escolas do Brasil pelo Comitê Gestor da Internet, Cetic.br (2015, p. 379), revelou
que 80% dos alunos acessaram a internet por meio do celular, sendo que não há
significativa diferença entre as cinco regiões brasileiras. Em complemento a
pesquisa Juventude Conectada da Fundação Telefônica11 (2014, p. 42) revela que A
conexão à internet via celular é intensamente utilizada por jovens de todas as
classes socioeconômicas: A (86%), frente aos das classes B (75%), C (69%) e D
(54%).
No cruzamento dos dados das duas pesquisas, entende-se que, embora com
grande número de acesso da internet pelo celular, o acesso efetivamente se dá mais
nas classes sociais com maior poder aquisitivo. Uma das possibilidades apontadas
pelas pesquisas se dá não somente pelo valor dos aparelhos, mas também pelo
plano contratado da operadora de telefonia.
Com o acesso à internet, o celular passa a ser um importante recurso que
pode ser incorporado ao trabalho pedagógico, uma vez que a escola ainda dispõe
de poucos recursos oficiais. Ocorre também que alguns aparelhos não recebem a
manutenção adequada, quebrando ou se tornando obsoletos.
O desafio, superior ao acesso aos recursos digitais, está em saber utilizar
esses recursos como benefício pedagógico e compreender suas linguagens, suas
possibilidades de forma que a escola passe a ser um local de produção digital de
cultura.

O computador, o rádio, a tevê, a internet e as mídias digitais precisam


estar presentes na escola, concorrendo para que essa deixe de ser
mera consumidora de informações produzidas alhures e passe a se

11A pesquisa Juventude Conectada da Fundação Telefônica foi iniciada em maio de 2013 e teve
como objetivo entender o comportamento do jovem na era digital e as transformações e
oportunidades geradas a partir daí. A pesquisa está apresentada em quatro eixos de investigação:
educação, ativismo, empreendedorismo e comportamento. Foram entrevistados 1.440 jovens, além
de entrevistas com 8 especialistas.
59

transformar – cada escola, cada professor e cada criança – em


produtores de culturas e conhecimentos. Cada escola, assim, começa
a ser um espaço de produção, ampliação e multiplicação de culturas,
apropriando-se das tecnologias. (PRETTO, 2008, p. 81)

Todavia, não basta ter aparelhos e recursos na escola e não saber fazer um
bom uso dos mesmos. A tecnologia e os meios de comunicação precisam ser
apropriados pelos diferentes sujeitos que estão na escola, em especial, educadores
e educandos. Para tal apropriação é necessário uma nova alfabetização, um
multiletramento nas linguagens que os recursos utilizam.

A alfabetização midiática ou “digital”, ao contrário da alfabetização


tradicional concentrada na lectoescrita, é também necessária para os
já “alfabetizados” e, inclusive, para os próprios professores. Para
muitos docentes é incômodo ter quer harmonizar seu analfabetismo
tecnológico com seu alto nível cultural e com sua função básica de
alfabetizar, socialmente atribuída a estes profissionais. (MARTÍN,
2014, p. 188)

Para alfabetização para os meios de comunicação e de informação Tyner


(1998) conceitua diferentes termos no sentido de especializar a alfabetização da
informação, da mídia, da imagem visual, dentre outros. Tais nomeações têm a
mesma derivação e caminham para um letramento nos diferentes meios de
comunicação e de tecnologia da informação.

2.1 Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) e suas


relações

As TDIC são conceituadas como tecnologias digitais que têm o computador e


a internet como instrumentos principais de diferenciação das Tecnologias da
Informação e Comunicação (TIC), segundo Marinho e Lobato (2008) e Afonso
(2002). Dessa forma, entende-se que celulares, tablets e computadores configuram
as TDIC.
O fato das tecnologias digitais se diferenciarem por terem computador e
internet como instrumentos principais caracteriza o uso que o ser humano faz das
ferramentas com essas tecnologia.
60

A internet pressupõe conectivismo, que no mínimo pode ser pensado entre


duas pessoas de forma assíncrona ou algo mais complexo com milhares de pessoas
interconectadas se relacionando por meio dos aparelhos.
O computador não necessariamente como surgiu com gabinete, monitor,
teclado e mouse, mas cada vez mais inserido nas tecnologias como smartphones,
que conseguem armazenar e processar uma maior quantidade de informações.
Crescentemente a escola tem convivido com esses aparelhos em seu espaço,
na maioria das vezes, para a execução de trabalhos burocráticos em detrimento do
trabalho pedagógico.

Os principais locais de instalação dos computadores na escola pública


são a sala do diretor ou do coordenador pedagógico (86%) e o
laboratório de informática (85%). Para 39% das escolas públicas, a
instalação dos computadores foi realizada entre cinco e dez anos
atrás. A presença de equipamentos obsoletos (81%) e a ausência de
suporte técnico (88%) são citadas por diretores de escolas públicas
como fatores que dificultam o uso pedagógico das TIC. (CETIC.BR,
2015, p. 113)

A pesquisa aponta para o uso mais burocrático da máquina e ainda


demonstra como os locais de instalação evidenciam outro dado revelado: a maior
parte dos equipamentos das escolas públicas se dá por computador de mesa, ou
seja, que fica instalado em um local específico. A possibilidade de mobilidade, tão
fundamental para a organização do trabalho pedagógico, fica comprometido pela
instalação de equipamentos que necessitem de lugares físicos, como ocorre com o
computador de mesa. Revela-se assim a complexidade que a tecnologia necessita
para que possa ser bem utilizada no ambiente escolar. Quando se fala em
infraestrutura, outro fator preponderante para o êxito no trabalho escolar é a internet.

92% das instituições com computador contavam com algum tipo de


conexão à Internet. As baixas velocidades de conexão ainda
predominam: 41% das escolas públicas com conexão à Internet
possuíam até 2 Mbps de velocidade. (CETIC.BR, 2015, p. 113)

A introdução da internet e o mundo em rede catalisaram e provocaram


mudanças na sociedade. Como nota-se na pesquisa do CETIC (2015), a velocidade
de internet ainda afeta imensamente o território nacional e, em especial, os espaços
escolares.
61

As dificuldades com uma internet de qualidade no espaço escolar contrasta


uma sociedade conectada em que muitas atividades diárias dependem ou se
baseiem no uso do celular sendo ele quase uma extensão do seu corpo (McLuhan,
1974). Mais um fator que demonstra como a escola e a sociedade vivem um
descompasso em inovação.
Alguns descompassos são vistos nessa relação entre a educação
escolarizada e as mudanças sociais que são catalisadas e provocadas de diversas
formas e por inúmeros fatores.
A teoria de cibernética ou a cibercultura auxilia a explicar as mudanças que a
tecnologia digital possibilitou ao mundo. As conexões interviram diretamente na
relação entre espaço e tempo que regia a sociedade o que modificou, dentre outras
coisas, na forma como as pessoas passaram poder conversar, comprar, acessar às
informações.

Os primeiros estudos sobre cibercultura sinalizavam que esta era a


cultura do ciberespaço, que é um hibrido da internet, infraestrutura
tecnológica, com os seres humanos em movimento e em processos de
comunicação e de redes sociais. (SANTOS, 2011, p. 77)

A internet trouxe outras possibilidades para o modus operandi de viver das


pessoas e de realizar suas atividades cotidianas. Por um lado ampliou e diversificou
as práticas e atividades que já existiam e faziam parte da sociedade antes da sua
invenção. Por outro, seu surgimento também criou formas de se viver que até então,
sem internet, não existiam.

A internet penetra em todos os domínios da vida social e os


transforma. Assim é uma nova configuração, a sociedade em rede,
que está em gestação em todo o planeta, ainda que sob formas muito
diversas entre um ponto e outro e com efeitos muito diferentes sobre a
vida das populações, devido à sua história, sua cultura, suas
instituições. Como as mutações estruturais anteriores, essa reviravolta
traz consigo tantas possibilidades quanto problemas novos. O
resultado que daí surgirá é indeterminado: dependerá de uma
dinâmica contraditória, da eterna luta entre os esforços sempre
renovados para dominar, para explorar, e a defesa do direito de viver e
de procurar dar um sentido à própria vida (CASTELLS, 2003, p. 333)

Como explica Castells, a humanidade vive um momento de fazer-se e refletir-


se no presente estágio. As transformações sociais que a tecnologia digital propiciou,
62

como a possibilidade de conexão com pessoas de diferentes partes do mundo


demonstram seu caráter peremptório na mudança do cotidiano das pessoas. Isso
tudo ocorreu num processo crescente com transições primeiro em outros setores até
que as tecnologias pudessem estar presentes mais fortemente nos dispositivos
pessoais.

Se analisarmos mais profundamente, a cibercultura, mesmo antes do


fenômeno da mobilidade conectada, já se instituía nos espaços
urbanos, por conta das relações que estabelecíamos e ainda
estabelecemos com as tecnologias digitais em nossas operações
cotidianas com os equipamentos das cidades, a exemplos das
operações bancárias, dos ambientes culturais, comerciais, industriais e
agrícolas, entre outros. (SANTOS, 2011, p. 83)

Essas mudanças são fatos que antes não eram noticiados e que hoje
interferem nas relações políticas, econômicas e sociais dos países. As facilidades de
locomoção por diferentes regiões também contribuem para que a cultura da vida em
rede se torne mais necessária.
Facilmente, pode-se falar com pessoas que estão a milhares de quilômetros
de distância, evidenciando que o local e o global interagem gradualmente.

Para lá das dimensões geográficas, surge um novo tipo de território,


que pode ser se base cultural, ideológica, idiomática, de circulação da
informação etc. Dimensões como as de familiaridade no campo das
identidades histórico-culturais (língua, tradições, valores, religião etc.)
e de proximidade de interesses (ideológicos, políticos, de segurança,
crenças etc.) são tão importantes quanto as de base física. São
elementos propiciadores de elos culturais e laços comunitários que a
simples delimitação geográfica pode não ser capaz de conter”
(PERUZZO, 2005, p.4).

Estando as crianças e os jovens estudantes inseridos nesse contexto, cabe


refletir sobre o modelo de aula encontrado em muitas escolas, em que o professor
deseja contar a história do mundo apenas por meio das letras e das imagens dos
artistas antigos. Também é preciso refletir sobre como pensam as crianças de hoje,
conectadas a outros lugares do mundo por meio dos jogos online, das redes sociais
e aplicativos de conexão e de aprendizagem de novas línguas que promovem a
conexão com pessoas no mundo todo.
63

A conectividade generalizada põe em contato direto homens e


homens, homens e máquinas, mas também máquinas e máquinas,
que passam a trocar informação de forma autônoma e independente.
Nessa era da conexão, o tempo reduz-se ao tempo real e o espaço
transforma-se em não espaço, mesmo que por isso a importância do
espaço real, como vimos, e do tempo cronológico, que passa, tenham
suas importâncias renovadas (LEMOS, 2003, p. 9)

A relação entre o local e o global que a cibercultura modificou quando a


estreitou, aliada à mudança na compreensão de determinados elementos como
ressalta Peruzzo (2005), evidenciam o desafio e a possibilidade de melhoria no
trabalho do educador quando este encontra um grupo de educandos que conhecem
pessoas de outros lugares do globo ou que ainda já visitaram alguns desses lugares.
O que se percebe é que as várias mudanças pelas quais a sociedade tem
passado não excluem o ambiente educacional, porque essa está inserida na
sociedade. Como relatado no capítulo anterior, vive-se momentos de intensas
reflexões sobre o espaço escolar.
Há questões que são mais pontuais e ora será exposto um panorama de
algumas delas. Um ponto importante diz respeito aos laços afetivos – fundamentais
para uma relação de confiança.
Os laços afetivos são importantes entre o grupo e, em especial, entre
educandos e educadores, isso porque é por meio da relação de confiança que o
educando se sente à vontade para experimentar, errar e se expor.
Entretanto, as novas associações que se estabelecem com o auxílio da
internet e das redes sociais colocam um ponto de atenção que deve ser cuidado
pela escola e seus agentes.

Quando o jovem participa de comunidades na internet, ele está


criando laços com outras pessoas, por afinidade. Isso tem um lado
maravilhoso, pois ele pode conhecer pessoas que possuem os
mesmos gostos em qualquer lugar do globo. Entretanto, existe outro
lado na questão: o perigo de avaliar e julgar os outros seres humanos
apenas a partir dessa “afinidade” que os une. Isso preocupa, pois os
seres humanos são criaturas muito mais complexas que as facetas
que conseguem apresentar num site que favorece a interação e os
relacionamentos. Analisar o outro apenas por um aspecto que “nos
une” é coisificar o outro. Eleger uma faceta como o todo. Isso contribui
para que as relações humanas não tenham solidez e produz a
expectativa que temos diante dos objetos utilitários: o celular fica
obsoleto depois de um mês, não atende mais às exigências de
novidade. Muitos jovens dessas novas gerações tratam as relações
humanas como aquelas que têm com seus objetos de consumo:se a
relação não me satisfaz de uma maneira, em um dos aspectos, deve
64

ser descartada. Ao longo do tempo, isso pode acelerar os processos


de intolerância e, no limite, de agressividade e exclusão. (NETO e
FRANCO, 2010, p. 16)

Como elucubrado pelos autores, há uma possível tendência de que as


relações estabelecidas entre as pessoas nas redes sejam espelhadas ou se tornem
a referência por aqueles que já nasceram imersos nessa tecnologia e que, portanto,
têm a relação social virtual como primária. Angeluci e Américo (2015, pp. 9-10)
buscam essa compreensão, ressaltando que:

Neste ponto, Katz & Aakhus (2004) colaboram ao ir mais a fundo nos
desdobramentos do contato perpétuo e observam como as mídias
móveis passaram a afetar a vida e as interações sociais dos indivíduos
na sociedade contemporânea [...] primeiro, a individualidade passa a
superar os laços primários e as relações face-a-face: “amizade,
intimidade, família e os vizinhos deixam de ser as principais fontes de
significado, e tornam-se os objetos de deliberação de mais um
domínio da realidade”. (KATZ e AAKHUS, 2004, p. 232. Tradução
nossa). Com a predominância das relações horizontais, fomentadas
pelas mídias sociais, fragilizam-se também a intimidade e
profundidade nos tratos humanos. Para os autores, também perdem-
se alguns critérios de qualidade ou censura no fluxo de informações, o
que leva a superação de determinados usos e costumes, cujo
“surgimento de um mundo de significados irá acabar com o jeito
pragmático da vida cotidiana.” (KATZ e AAKHUS, 2004, p. 234.
Tradução nossa).

Outro ponto importante a se ater diz respeito à demasiada exposição nas


redes. Por meio de sites e aplicativos de relacionamentos, jovens e algumas
crianças têm exposto detalhes das suas vidas, família e mesmo fotos pessoais. Tal
comportamento tem sido visto com grande preocupação por algumas famílias e
escolas, uma vez que as consequências da exposição demasiada costumam não
ser benéficas.
A superexposição na internet tem trazido prejuízos ao convívio social e à vida
de algumas pessoas. Fotos íntimas circulando por grupos de WhatsApp12 ou outros
aplicativos e redes, têm modificado a noção do que é público e do que é privado.
Mais ainda, há certa ingenuidade no compartilhamento irresponsável de imagens
sem autorização. Muitos jovens acabam tendo sua vida exposta para os colegas de
escola, familiares e até para toda a cidade.

12
Aplicativo para troca de mensagens, fotos e vídeos. Desenvolvido para celulares.
65

Uma vez que essas "zonas de privacidades" estão agora sendo


parcialmente gerenciadas on-line, a questão agora é a
(não)combinação entre as affordances13 tecnológicas e os conceitos
adolescentes sobre amizade. Pois, os adolescente não estão
obviamente priorizando o resguardo de sua privacidade frente a
estranhos (se fosse o caso, eles poderiam simplesmente desligar o
computador). Na verdade eles estão empenhados em compartilhar
suas experiências particulares, em criar espaços de intimidade, em
serem eles mesmos nas conexões com os amigos e através delas.
(LIVINGSTONE, 2012, p.111)

A falta de discernimento do que é privado e íntimo e a circulação livre de fotos


de todos os gêneros pautam as conversas em sala e nos corredores e alteram as
relações estabelecidas entre os educandos.

[...] a espetacularização da intimidade cotidiana se tornou habitual,


com todo um arsenal de técnicas de estilização das experiências vitais
e da própria personalidade para “sair bem na foto”. As receitas mais
efetivas imitam os modelos narrativos e estéticos da tradição
cinematográfica, televisiva e publicitária, cujos códigos são
apropriados e realimentados pelos novos gêneros que hoje proliferam
na internet (SIBILIA, 2008, pp. 59-60)

Nesse aspecto, ressaltam-se ainda outros meios midiáticos que promovem a


precocidade; por exemplo, é comum a veiculação de propagandas de crianças
pequenas vestidas como adultas e conversando sobre namorados e namoradas nos
canais de televisão destinados a crianças, bem como a criação de produtos que
estimulam o consumo de artifícios da vaidade, isso porque os comerciais em que as
crianças aparecem como pequenos adultos não tratam de um desenvolvimento
precoce de responsabilidades que os adultos possuem ou ainda de uma vida mais
densa, pelo contrário. Há um recorte de um adultocentrismo pautado no happy end –
esta questão será abordada mais à frente.
Nota-se assim que diversos meios de comunicação têm promovido a ideia de
crianças como mini adultas. Igualmente, os jovens têm desejado assumir a fase
adulta de forma precoce, esbarrando em vários problemas cada vez mais cedo.
Essa problemática é grave porque modifica o cotidiano escolar. O uso das
tecnologias digitais é um dos recursos que serve de via para que esses problemas
adentrem a escola e, por vezes, pautem o dia dos educandos.

13
Termo referente ao potencial de algo ser usado com o objetivo para que foi criado.
66

Esses mesmos recursos podem representar a melhor forma para a reflexão


sobre a apropriação por parte das crianças e dos jovens numa proposta para
compreensão da linguagem.
Na sequência, neste mesmo capítulo, se retrata a perspectiva
educomunicativa baseada na ação com as mídias com a perspectiva educativa. Esta
possibilidade refletirá o potencial que a mídia, quando bem empregada pelos
espaços educativos, tem de transformar a apropriação e compreensão dos sujeitos
que dela se utilizam para passarem de receptores para produtores das mensagens.
Assim, destaca-se que os recursos digitais em si não são produtores de boas
mensagens e reflexões como também não motivam os problemas que de seu mau
uso decorrem.
Há que se entender que, como ferramenta midiática, e ainda mesmo
apropriando-se de sua linguagem e potencial, os dispositivos e aparelhos nada
fazem sozinho. O seu uso depende da intervenção humana para produzir e para
consumir os produtos e as mensagens que neles são veiculadas.
Os meios digitais modificaram algumas relações humanas pela própria
apropriação desses recursos e suas especificidades. Também possibilitou a ênfase
de comportamentos já conhecidos em outras eras da humanidade. Ou seja,
modificou-se a forma e o contexto de determinadas ações, mas elas continuam a
existir, provando o avanço relativo da humanidade em relação à sustentabilidade e
autorregulação de sua espécie14.

A cibercultura é a cultura contemporânea estruturada pelo uso das


tecnologias digitais em rede nas esferas do ciberespaço e das
cidades. Compreendemos tais esferas como espaçostempos
cotidianos de ensino aprendizagem, que preferimos nomear de redes
educativas ou espaços multirreferenciais de aprendizagem. (SANTOS,
2011, p.77)

Essas considerações ajudam a compreender como a cibercultura intensifica


algumas relações sociais e humanas, assim como outras formas de informação,

14
Considera-se sustentabilidade de sua espécie como a capacidade do ser humano tende de habitar o espaço
em que está inserido produzindo o mínimo de resíduo possível e possibilitando que outras espécies florescem
pelo mínimo de intervenção no ecossistema. Neste sentido, é uma compreensão de regulação da espécie que
entende que ao permitir que o ecossistema se regule por si só, garante a continuidade da própria espécie
(GADOTTI, 2009).
67

como os meios de comunicação de massa que promovem por vezes a cultura do


happy end.

O espetáculo é ao mesmo tempo parte da sociedade, a própria


sociedade e seu instrumento de unificação. Enquanto parte da
sociedade, o espetáculo concentra todo o olhar e toda a consciência.
Por ser algo separado, ele é o foco do olhar iludido e da falsa
consciência; a unificação que realiza não é outra coisa senão a
linguagem oficial da separação generalizada. (DEBORD, 1997, p. 14)

A sociedade do espetáculo ajuda a compreender a influência que a vida


cotidiana recebe das mídias. Pode-se citar a interferência do cinema, por exemplo,
em especial ao cinema Hollywoodiano que é o mais veiculado nos canais de TV
aberta brasileira.
Confirma afirmam Libardi e Pacheco (2014, p. 75):

Segundo Morin (2011), no happy end, o herói está ligado fortemente


ao espectador, sendo sempre amado, capaz de gerar um elo
sentimental e pessoal. Assim, de acordo com o sociólogo francês, o
cinema se torna um meio pelo qual a sociedade de massa tem o seu
imaginário sincretizado a partir dos grandes gêneros cinematográficos.
Lipovetsky e Serroy (2009) corroboram esta perspectiva afirmando que
o cinema se impõe como matriz do imaginário midiático e cotidiano.

A visão do happy end, de certa forma, é transferida para outras esferas e


ambientes sociais. Um deles é a escola. Não é raro encontrar professores e
gestores escolares relatando o fato dos pais imputarem na escola o dever de tornar
seus filhos felizes em todo o processo educativo.
Não significa que a educação deva ser um ato triste ou ainda que necessite
de sofrimento. O prazer deve fazer parte da aprendizagem e contribui para que
educandos e educadores se sintam motivados para conhecer o mundo e transformar
as descobertas em conhecimento construído, teorizado e refletido.
Ocorre que as descobertas no processo da aprendizagem passam por
diferentes sentimentos e sentidos que fazem parte no objetivo da construção de um
ser integral.
Tornar o momento de aprendizagem ou o espaço escolar como de pura
felicidade ou da alegria espontânea, descompromissada, significa ignorar que o
trabalho necessário para a transformação da informação bruta em aprendizagem
deve ser desconsiderado. Não se defende aqui uma educação que parte ou que
68

precisa do sofrimento, entretanto, o processo de aprender, experimentar e


transformar não é composto só de alegria.
Retoma-se a superexposição, dessa necessidade de postar os momentos
vividos e torná-los agradáveis ou melhores que na realidade, como se houvesse
certa obrigação de postar as fotos e vídeos e perdendo o ato espontâneo.
Ryan Pagelow, desenhista e criador do coelho Buni, ficou conhecido pelas
suas tirinhas de começo feliz e final inesperado. Na tirinha abaixo, Ryan retrata essa
questão:

Figura 2 - Disponível em: <http://coisasdamiroca.centerblog.net/rub-fotografia-fotos-clic-.html>.


Acesso em: 05/06/2016.

Na tirinha, Buni demonstra a necessidade de postar a felicidade, mesmo que


ela não seja o sentimento vivido no momento do registro. Tal fato reflete nas
relações estabelecidas entre as pessoas e adentra também o ambiente escolar.
Encontra-se ainda em relatórios escolares a mesma foto retratando a felicidade,
como se todas as crianças tivessem que estar felizes em todos os momentos que
estão na escola, desconsiderando o olhar da descoberta, da inquietação, da dúvida,
do constrangimento, da reflexão, dentre outros.
Tomado o padrão social do aceitável, do esperado, do que é “correto” produz-
se do outro lado as marcas da intolerância, da não aceitação da diversidade, do
olhar preconceituoso.
Se não há a ruptura do que é considerado o único aceitável, o “correto”, como
se na vida existisse apenas um padrão, corre-se o risco de reproduzir esse mesmo
olhar de preconceito no espaço cibernético.
69

O fato das pessoas estarem representadas por uma foto ou ainda por avatar 15
imprime a sensação de maior de poder. É como se utilizassem uma máscara que
confere uma despreocupação com a escolha das palavras. As redes sociais e a
internet permitem a disseminação do preconceito de forma muito mais rápida e,
consequentemente, o impacto é muito maior.

Nos meus mundos mediados por computador, o eu é múltiplo, fluido, e


constituído na interação com as conexões da máquina; ele é feito e
transformado pela linguagem (...). No mundo artificialmente gerado
dos MUDs16, encontro personagens que me colocam em um novo
relacionamento com minha própria identidade (TURKLE, 1995, p.15 –
tradução livre).

As pessoas criam “coragem” para falar mais por acharem que não serão
identificadas ou descobertas e, dessa forma, aproveitam o possível anonimato para
enfatizarem seu comportamento. Mais uma vez, verifica-se que a internet não criou
o bulling, mas está claro que as pessoas encontram na internet uma possibilidade de
colocar em prática aquilo que desejam fazer na vida real.
Outra questão importante do cyberbulling é que a internet tem memória. Isso
quer dizer que os atos de preconceito e intolerância são muito mais perenes do que
os cometidos na vida off-line
É preciso rememorar que as tecnologias não são as promotoras autônomas
nem de pontos positivos nem de pontos negativos que acontecem na escola. Elas
são ferramentas que ampliam o que antes era considerado como evento isolado.
Os aplicativos e as redes sociais, são mais uma forma de conectar as
pessoas, as quais modificam a sua relação temporal de conversa e de troca (que
antes eram realizados apenas presencialmente) evidenciam problemas e eventos
que antes ficavam restritos a pequenos grupos ou às conversas paralelas e
“bilhetinhos”.
Por isso, da mesma forma que a internet pode ser a propulsora de grandes
ideias, invenções da maior disseminação e promoção da ciência que a humanidade
realizou até então, pode também realçar e ajudar a compreender as relações sociais

15
Imagem de personagem ou boneco aleatório que representa a pessoa no mundo virtual. O avatar personifica
as falas que ficariam anônimas na internet. Entretanto, nem sempre as pessoas utilizam seu nome real nos
avatares, é muito comum utilizarem o nickname (apelido).
16
Sigla que se refere à multijogadores. Os jogadores assumem o papel de personagens, suas descrições e
características.
70

estabelecidas uns com os outros e deflagrar preconceitos, vícios, intolerâncias que


de certa forma, estavam veladas.
Considera-se a escola como um microcosmo social, conforme apontado no
trabalho sobre o limiar da paz17, “as turmas tornaram-se microcosmos da
diversidade da sociedade mundial e a compreensão transcultural tornou-se uma
condição indispensável para o estabelecer de um bom clima de aprendizagem nas
escolas de todo o mundo.” (UNESCO, 1995, p. 12). Ou seja, uma pequena
reprodução de uma vida social maior, a vida em rede e as tecnologias digitais
podem também revelar várias relações que estavam encobertas e que passam a
fazer parte do cotidiano escolar.
Ao educador cabe, mais uma vez, reforçar o olhar atento para estar sensível
às mensagens que estão reveladas e veladas. Elas compõem o ambiente escolar e
representam questões importantes a serem desenvolvidas na formação de
professores, seja ela inicial ou continuada.

2.2 Formação de professores

É cada vez maior o desafio que os educadores enfrentam, seja na educação


formal, não formal ou informal. As mudanças ocorridas nos últimos tempos e
relatadas anteriormente desafiam novas possibilidades de significação e
ressignificação da docência. Desafio porque, a cada dia, inovações e demandas
diferenciadas são apresentadas à educação impositivas à adaptação e à capacidade
de explicar aos educandos tudo o que é novo e todo o conhecimento construído pela
humanidade até então.

A escola deve enfatizar o desenvolvimento das habilidades críticas e


criativas das crianças em relação aos novos meios e a “alfabetização
em novos meios” deve se constituir um direito educativo básico [...].
Não será possível compreender de forma acabada os meios digitais,
se insistirmos em considerá-los simplesmente uma questão de
máquinas e técnicas ou de “hardware” e de “software”. A internet, os
videogames, o vídeo digital, os celulares e outras tecnologias
contemporâneas proporcionam novas maneiras de mediar e
representar o mundo, assim como novas formas de comunicação.
Fora da escola, as crianças se relacionam com estes meios não como

17
Tolerância: limiar da paz – Manual educativo para utilização das comunidades e das escolas. UNESCO (1995).
71

tecnologias, mas como formas culturais. O problema da maioria dos


usos educativos desse meios é que continuam considerando-os como
meros meios instrumentais para distribuir informação, como se fossem
ferramentas neutras ou materiais de ensino (BUCKINGHAM, 2008, p.
153)

O quadro teórico ajuda a pensar sobre a formação no sentido de refletir como


as faculdades e universidades têm formado novos docentes em seus cursos de
licenciatura e que tipo de profissionais tem sido exigido no cotidiano. Isso se
desdobra nos cursos de formação continuada, estes promovidos por iniciativas
públicas e privadas e pelos mais diversos setores, como centros de formação,
institutos, empresas e entre os pares, na escola.
Dessa forma, o que se segue são diferentes perspectivas da formação inicial
e continuada de forma a contribuir para um fazer pedagógico que esteja integrado à
docência com tecnologia.

2.2.1 Formação inicial

Ao abordar a formação inicial, a intenção não é traçar um modelo ideal desse


tipo de formação inicial; se simples fosse, não haveria tantas possibilidades de
formação com matrizes curriculares nas faculdades e universidades.
Parte-se justamente do ponto em que pensar em um modelo ideal de
formação inicial seria cometer um grande erro, isso porque vive-se em realidades
diferentes de acordo com a região de atuação; cada uma tem suas necessidades e
especificidades.
Isso não significa que não haja conteúdos básicos a serem trabalhados nos
cursos de formação inicial que se referem às metodologias, concepções, reflexões e
embasamento teórico. Mais ainda, a necessidade de praticar a docência, como um
exercício de ação-reflexão, antes do exercício definitivo da profissão, e daí a
importância dos estágios.
É importante saber que a relação pedagógica é mais complexa do que
simples fazeres mecanizados ou planejados ao longo dos anos. Do cotidiano escolar
emergem situações que dificultam a expressão do real sentido que se estabelece
entre aquele que aprende e aquele que aprende com quem aprende.
72

Dessa relação resultam muitos fatores, dentre os quais destacam-se alguns


que demonstram ser, ao longo dos textos e pesquisas utilizadas como referência,
deste estudo, pontos eminentes quando do uso das tecnologias digitais.
Um dos princípios que norteiam o trabalho pedagógico é o autoconhecimento,
no sentido ontológico. Dessa forma, identifica-se que:

Trabalhar em qualquer atividade humana supõe um mínimo de


conhecimento deste universo particular, autoconhecimento, mas no
campo da educação, no trabalho como professores/as, este mergulho
em si mesmo é ainda mais fundamental. (SANTOS NETO, 2009, p.
122)

No autoconhecimento, identificam-se as concepções prévias, às vezes,


traidoras da razão. Avaliam-se as condições que se tem para ser mais e destacam-
se as questões que ainda precisam ser trabalhadas em si. Descobrem-se pontos de
apoio nos grupos trabalhados, sabe-se identificar onde mais se necessita de ajuda
e, em especial, tem-se consciência da própria construção pessoal e profissional
durante o fazer docente.
A partir do momento que se reconhece como ser humano, que se entende o
processo de conhecer, de não saber, de um vir a ser, adquire-se uma característica
essencial em qualquer profissão que lide diretamente com seres humanos: a
empatia, essa importante visão de colocar-se no lugar do outro, não apenas para
entender como o outro se sente, mas para tentar oferecer o melhor que o outro
possa necessitar.

O que importa, na formação docente, não é a repetição mecânica do


gesto, este ou aquele, mas a compreensão do valor dos sentimentos,
das emoções, do desejo, da insegurança a ser superada pela
segurança, do medo que, ao ser “educado”, vai gerando coragem.
(FREIRE P., 1996, p. 45)

Nesse sentido, a empatia auxilia os educadores a se colocarem no lugar


daqueles que têm dificuldades, deficiências, que não conseguem compreender. A
partir desse ponto, podem avaliar a melhor forma de atuar. Por isso, qualquer
tentativa de mecanização da afetividade e da relação humana incorre na perda de
vínculo.
Gerado esse elo de confiança, fundamental e basilar para que o processo
educativo aconteça, tanto grupo quanto indivíduo sentem-se capazes em sua
73

expressão, uma vez que, ao se conquistar confiança mútua, o terreno da


aprendizagem se torna “mais fértil”.
O movimento de humanização do ambiente escolar reflete na construção dos
sujeitos e auxilia a entender esse espaço escolar de disputa de poderes e
concepções, uma vez que a busca pela desumanização tem por objetivo sufocar as
expressões de cada indivíduo. Nesse sentido,

Entendo que o movimento capaz de provocar a consciência do


processo de desumanização ao qual estamos submetidos e também
as ações no sentido de superá-la tem um duplo aspecto: é um
movimento que requer a decisão e o compromisso do sujeito
individual, mas também a abertura e a construção do sujeito coletivo.
(SANTOS NETO, 2009, p. 122)

Esse compromisso se revela na assunção dos sujeitos como seres históricos,


políticos e sensíveis, ou seja, qualquer tentativa de desumanização passa por uma
pedagogia necrófila (Freire P., 2006) que insistirá em apagar a expressão de cada
ser.
Reconhecer-se humano, portanto, num contexto da extrema relação entre a
educação e as tecnologias digitais não é negar o uso da tecnologia, mas do
contrário, identificar como ela pode colaborar para que as pessoas exerçam sua
humanidade. As tecnologias não são utilizadas para a negação da humanidade, mas
justamente por isso que inseri-la no contexto escolar é tão importante para que se
possa refletir junto dos estudantes, qual é o uso que a humanidade tem feito das
tecnologias ao longo dos tempos, e convidar essas mesmas pessoas a construir
uma nova história e uma nova relação dos homens e mulheres com as máquinas.

A invenção da existência envolve, repita-se, necessariamente, a


linguagem, a cultura, a comunicação em níveis mais profundos e
complexos do que o que ocorria e ocorre no domínio da vida, a
“espiritualização” do mundo, a possibilidade de embelezar como de
enfear o mundo e tudo isso inscreveria mulheres e homens como
seres éticos. Capazes de intervir no mundo, de comparar, de ajuizar,
de decidir, de romper, de escolher, capazes de grandes ações, de
dignificantes testemunhos, mas capazes também de impensáveis
exemplos de baixeza e indignidade (FREIRE P., 1996, p.51)

As reflexões trazidas pelo autor convidam para o compromisso da educação e


de seus profissionais de propiciarem às pessoas a possibilidade de exprimirem as
suas potencialidades humanas, passando, no entanto, pelo reconhecimento de que
74

a comunidade humana deve pautar-se pela ética, ou seja, ao se expressar, deve


fazê-lo com extremo respeito ao outro, de forma que não oprima ou lhes retire a
liberdade.
Nessa perspectiva, criar uma relação da pedagogia estrita com a ciência
resultaria numa possibilidade de analisá-la, testá-la e teorizá-la, fator que as
múltiplas interfaces nela inerentes, recusam a possibilitar como única via de
compreensão.
Almeida (1999) propõe uma visão de pedagogia que direciona para a
educação em uma concepção mais global, ao indicar que a tentativa de resumir,
dissecar e analisar a pedagogia seria incorrer no risco de sistematizar e beirar um
reducionismo perigoso.

Gostaria de convidar a leitora ou o leitor a conceber uma imagem da


pedagogia que não fosse voluntarista, tão segura do domínio do seu
objeto teórico; nessa imagem a pedagogia não teria objeto sobre o
qual discursaria em primeira pessoa... seria outra imagem: uma
pedagogia afetada, possuída, portanto, apaixonada por aquilo que é
comumente tido como seu objeto. (ALMEIDA, 1999, p. 101)

Dessa forma, uma pedagogia apaixonada tem sido negada por aqueles que
tentam sobrepor à pedagogia o olhar científico analítico, duro, sem humanização.

É uma visão lamentável das coisas pensar a paixão como passividade,


atribuindo a esta um sentido pejorativo. A paixão leva à luta. Claro,
lutamos por aquilo que nos fez apaixonados. O grande problema do
sistema (educacional – inclusive ou sobretudo?) é que a paixão não
tem direção... ela é imprevisível. O apaixonado não “racionaliza” suas
ações. Ele entra em choque com a topologia triunfante. Por isso se diz
que o apaixonado “perdeu o chão”. Sim, ele perdeu o topos. Qual
topos? Certamente, o topos dominante. (ALMEIDA, 1999, p. 110)

O que parece mais evidente é que as ciências humanas tem se permitido


entender a ciência com o olhar humano, a fim de compreender que, mesmo
pesquisas como esta, não trarão respostas absolutas, repetíveis, aplicáveis, mas ao
se tratar das relações humanas, há que se considerar a complexidade que envolve
os sujeitos pesquisados, o pesquisador e tantas outras relações neles imbricadas.
Dessa forma, quando tratado anteriormente da rigorosidade científica e
mesmo da necessidade do professor pesquisador não se refere a um ponto de vista
para negar a ciência, tampouco de colocá-la em primeiro plano, mas de relativizá-la
75

considerando-se, em especial, as reflexões trazidas no texto de Almeida (1999) que


demonstram justamente uma perspectiva de ciência dominante, pensando em sua
contraposição.
Relevante destacar que a ciência trazida no texto relembra o eurocentrismo e
a racionalização acima do humanismo científico e, nesse sentido, ao abordar a
escola, tanto o caráter humanizador quanto o científico que toca, descobre, cria
hipóteses, testa, cria teses é relevante para a construção de uma sociedade
emancipada.
Assim, torna-se desafiador à formação inicial, que dá titulação e permite que
as pessoas se tornem professoras, buscar refletir e compreender suas concepções
para transformá-las na realização de um curso que atenda aos futuros professores,
de forma a inspirar-lhes a paixão pelo conhecimento e o desenvolvimento do
raciocínio e da rigorosidade científica.
Tomando por exemplo um curso de formação inicial em pedagogia, é possível
encontrar sua base na matriz curricular. Esta é organizada seguindo as diretrizes
básicas do Ministério da Educação, tendo a instituição promotora a liberdade de
organizar-se de acordo com as necessidades que seu colegiado entende ser
prioritário.
Esse é um dos motivos pelos quais as instituições acabam por realizar
formações diferentes, ainda que oferecendo o mesmo curso. Ou seja, há autonomia
para a inserção e a adequação de temáticas ao curso para atenderem às demandas
da região e os objetivos pedagógicos específicos, que podem ser traçados
igualmente para atendimento às demandas locais. Por isso, as atividades propostas,
as pesquisas e a extensão podem ser delimitadas a partir do local de atuação e das
necessidades dos alunos de forma a dar sentido à profissão docente e proporcionar
o aprofundamento das reflexões a partir do cotidiano.
Por mais que existam saberes básicos necessários à formação de qualquer
educador, estes podem ser trabalhados de forma próxima à realidade que os alunos
vêem nos estágios.
Essa possibilidade fomenta que os futuros educadores possam encontrar uma
possibilidade real de intervenção e vivência nas diferentes metodologias como a
pedagogia por projetos, ensino híbrido, dentre outros.
É importante que a ação de vivenciar as novidades seja realizada também no
espaço de formação inicial e não apenas na formação continuada para que os
76

educadores e educandos das universidades tenham a possibilidade de fazer


análises críticas e reflexivas no início de sua carreira docente.
Criando uma base sustentada na formação é possível que os educadores
verifiquem possibilidades concretas de atuar de forma humanizada, personalizada e
que possa unir diversos recursos e suas linguagens, como ocorre com a tecnologia
digital e a educação.

A atual formação profissional pede uma reflexão sobre a realidade


contemporânea, e os currículos possuem o papel de ajuda no
entendimento do ciberespaço. Elucidar como os currículos preparam
os futuros professores para lidar com o ciberespaço pode ajudar a
perceber como a cibercultura está envolvida nessa formação, ou seja,
como uma nova característica cultural torna-se presente nos
processos sociais, nesse caso, principalmente, os educacionais.
(ORNELAS, 2007, p. 14).

O fazer pedagógico atento e apaixonado torna a profissão uma atividade


intensa e inacabada, uma constante troca com o outro, com as aprendizagens, um
fazer que forjado na práxis. Tal prática deve ser iniciada na primeira formação e
acompanhar o professor durante toda sua carreira docente.
Professor pesquisador é aquele que realiza sua atividade com o olhar
investigativo, com a rigorosidade científica. Para tanto, vai além do senso comum,
testa hipóteses por meio de metodologias consistentes das quais encontrará
subsídios em diferentes livros e experiências da área, assim como com os seus
pares.
O olhar pesquisador do professor mata o olhar ingênuo, que não busca a
melhoria contínua e o compromisso com uma educação biófila (Freire P., 2006),
negando aos educandos a possibilidade de se fazerem construtores de sua
aprendizagem também por meio da pesquisa.
Entretanto, desenvolver o olhar científico, investigativo e crítico deve seguir a
rigorosidade da ciência, inclusive para não incorrer em um moralismo ou puritanismo
que nega a própria ciência, uma vez que esta se desenvolve na busca do olhar não
tendencioso, vicioso. Por isso mesmo, é cada vez mais necessário no
desenvolvimento de uma sociedade que pretende inovar e desenvolver sua própria
ciência.
77

A necessária promoção da ingenuidade à criticidade não pode ou não


deve ser feita a distância de uma rigorosa formação ética ao lado
sempre da estética. Decência e boniteza de mãos dadas. Cada vez
me convenço mais de que, desperta com relação à possibilidade de
enveredar-se no descaminho do puritanismo, a prática educativa tem
de ser, em si, um testemunho rigoroso de decência e de pureza.
(FREIRE P., 1996, p. 32)

Por essa razão, fazer ciência não pode ser privilégio de alguns educandos,
mas o educador deve estar consciente e preparado para atuar em todas as formas e
extensões para que o olhar científico possa ser uma prática entre os estudantes.
Disso resulta a promoção de uma educação mais democrática, que fomenta a
pesquisa e lança luz à descoberta, tantas vezes negada no ambiente escolar.

O educador democrático não pode negar-se o dever de, na sua prática


docente, reforçar a capacidade crítica do educando, sua curiosidade,
sua insubmissão. Uma de suas tarefas primordiais é trabalhar com os
educandos a rigorosidade metódica com que devem se “aproximar”
dos objetos cognoscíveis. (FREIRE P., 1996, p. 26)

O professor pesquisador é aquele que atua de forma científica em sua prática


profissional e que, com isso, oferece e convida os educandos à prática da pesquisa
para que possam passar do senso comum ao raciocínio crítico.
Consideradas algumas questões para a formação inicial, o uso dos recursos
tecnológicos não restritos a um espaço único, fechado, mas perpassando as
propostas pedagógicas permitem configurar a prática docente de forma mais
integral.
Verificar a necessidade de adequação das propostas pedagógicas e da
utilização da tecnologia compreende apropriar-se das tecnologias, mais
especificamente, letrar-se tecnologicamente para que a linguagem e o contexto em
que as tecnologias estão inseridas promovam a melhoria na aprendizagem.
Posto isso, identifica-se a dimensão interdisciplinar que a tecnologia
possibilita.
Como dissemos anteriormente o recurso à interdisciplinaridade se
impõe em função da exigência de um novo método de análise do
nosso mundo, mas também em função das finalidades sociais, já que
as disciplinas sozinhas não poderiam responder adequadamente às
problemáticas altamente complexas. [...] Outra reafirmação refere-se à
necessidade de equacionar respostas operacionais cuidadosamente
planejadas para as questões sociais ou tecnológicas que surgem.
Finalmente uma outra classe de reafirmação nos conduz a
78

necessidade de uma revisão da estruturação hierárquica das


disciplinas da reconciliação do ser humano com sua finalidade.
(FAZENDA, 2013, p. 31)

Como a autora afirma, colocar as disciplinas em caixinhas não confere mais a


possibilidade de organizar e compreender a vida e, portanto, a interdisciplinaridade
visa preencher essa lacuna.
Tão importante quanto pensar sobre a interdisciplinaridade no ambiente
escolar é também no ensino superior, de forma que o futuro educador possa
experienciar na prática como pode ser realizado o trabalho em sala de aula (ou fora
dela).

Quando se pensa nas implicações do currículo na formação para a


docência visualiza-se a necessidade de discutir sobre eixos na
formação de competências interdisciplinares para a atuação num
cenário aberto a situações pedagógicas desafiadoras. Portanto, um
currículo de formação profissional no ensino superior não pode ser
organizado em estruturas curriculares rígidas, fragmentadas e
desconectadas, uma vez que “a impossibilidade de ‘conhecer tudo’
originou a necessidade de aprender como se relaciona o que se
conhece” (HERNÁNDEZ, VENTURA, 1998, p. 49-50)

Evidencia-se assim o caráter da formação inicial, não apenas para oferecer os


contributos teóricos que servirão de base para a atuação profissional do professor,
mas possibilitar-lhe a experiência da teoria vivenciada e, portanto, da necessidade
de pensar as práticas educativas com o uso da tecnologia.

2.2.2 Formação continuada

A formação de um educador não se encerra após o curso no ensino superior.


Aliás, afirmar que ele se inicia na faculdade também pode representar um engano,
porque inúmeras pesquisas demonstram que os educadores trazem na sua história
e no seu fazer de professor muitas marcas que ficaram impressas quando eram
alunos em anos anteriores.
Essas marcas que fazem parte da história de vida desses educadores serão
mais tarde negadas ou aceitas como possibilidade de seu fazer educacional e sua
atuação na profissão. Entretanto, esse processo de negar algumas possibilidades de
79

trabalho baseadas na sua história de vida e mesmo afirmá-las pode se dar num
processo de ação-reflexão necessária para que haja uma autorreflexão.
Essas ponderações são fundamentais e esta pesquisa, inspirada nas
narrativas de alguns professores de educação básica e sua metodologia, busca
justamente essa reflexão sobre a docência.
Ser docente é ser pessoa antes de ser profissional, ser estudante antes de
professor, por isso essas dimensões se confundem e se entrelaçam no fazer
docente e exigem maior atenção durante a formação.

Ao longo dos últimos anos, temos dito (e repetido) que o professor é a


pessoa, e que a pessoa é o professor. Que é impossível separar as
dimensões pessoais e profissionais. Que ensinamos aquilo que somos
e que, naquilo que somos, se encontra muito daquilo que ensinamos.
Que importa, por isso, que os professores se preparem para um
trabalho sobre si próprios, para um trabalho de autoreflexão e de auto-
análise. (NÓVOA, 2009, p. 38)

Os espaços dessas formações são diversos, porque fazer-se professor


implica não apenas na formação inicial, mas na necessidade de uma formação
atualizada em seu tempo e que propicie uma compreensão mais ampla da função
social do profissional docente. À escola cabe o papel primordial de oferecer as
possibilidades de formação que podem iniciar e devem passar pelo
compartilhamento de experiências dentre do próprio grupo.
As reflexões e a construção coletiva são fundamentais para o trabalho
docente. Dessa forma, quando se destaca a reflexão de Castells (2003, s. p.), “a
escola precisa formar pessoas com potenciais muito flexíveis, que mudem,
transformem e transitem em diversas situações, experiências e contextos” identifica-
se que a docência está no constante desafio de trabalhar com os saberes
sedimentados pela humanidade e ao mesmo tempo ser a propulsora de
transformação para a sociedade.
Explicitado mais uma vez esse desafio, a formação continuada demonstra
grande relevância para que os educadores encontrem possibilidades e ao mesmo
tempo, ressonância das suas práticas nas experiências de outros professores e
assim, possam compartilhar entre si suas ideias e inovações, superando as
discussões da necessidade do professor como pesquisador, algo inerente à
profissão docente.
80

Fala-se hoje, com insistência, no professor pesquisador. No meu


entender o que há de pesquisador no professor não é uma qualidade
ou uma forma de ser ou de atuar que a acrescente à de ensinar. Faz
parte da natureza da prática docente a indagação, a busca, a
pesquisa. O que se precisa é que, em sua formação permanente o
professor se perceba e se assuma porque professor, como
pesquisador. (FREIRE P., 1996, p. 29)

Freire P. (1996) também remete a necessidade de uma reflexão sobre a


prática docente, práxis, que Nóvoa (2009, p. 32) resgata “A formação de professores
deve assumir uma forte componente práxica, centrada na aprendizagem dos alunos
e no estudo de casos concretos, tendo como referência o trabalho escolar.”
Entendida a formação dos educandos como possibilidade verdadeira de
aprendizagem dos professores, a formação continuada ganha um caráter maior que
o meramente instrucional após a formação inicial para ser uma oportunidade
concreta de pensar a escola com quem a faz, assim como os educandos com quem
eles participam ativamente.
A formação continuada representa rupturas para uma lógica cristalizada e
sedimentada e abre caminho para pensar novas possibilidades em educação, com
relação à linguagem e às inovações trazidas ou oferecidas para as escolas, levadas
por suas secretarias ou diretorias, respectivamente.
Ao afirmar anteriormente a relevância do protagonismo dos educandos no
processo de aprendizagem, cabe salientar essa participação tanto na formação
inicial e, em especial, na formação continuada. Isso considerado, vê-se o potencial
de jovens e crianças de ressignificarem o ambiente em que estudam para além de
um espaço acolhedor, mas um local em que novos moldes de educação são
forjados por eles.

Em todos os momentos estou aprendendo a incorporar as tecnologias


na mediação com os alunos, amigos, familiares e demais colegas de
profissão. Quando não sei algo ou tenho uma necessidade (que não
consigo resolver sozinha), peço ajuda a alguém que pode estar ao
meu lado ou no outro lado do planeta. Assim, percebo que as
ferramentas tecnológicas propiciam aprendizagem e comunicação do
sujeito com ele próprio, do sujeito com os outros sujeitos, instituições e
serviços, e do sujeito com a enorme potencialidade que a ferramenta e
os aplicativos lhe oferecem. (PORTO, 2012, p. 169)
81

O autor alerta para a concepção menos linear de formação, que busca por
diversas maneiras a expressão autêntica dos professores, mas que também
considera a comunidade acadêmica.
Com a entrada das tecnologias na escola, em especial a tecnologia digital,
novos arranjos e possibilidades pedagógicas se tornam reais, oportunizando que os
educandos participem do planejamento de sua própria educação, quando a escola
se abre para aprender com eles ou ao menos repensar seu planejamento por
intercorrências.
Mais do que se apropriar do uso, este estudo trata da necessidade da escola
assumir o seu caráter reflexivo com o uso das tecnologias. Não é mais possível
pensar o mundo sem as tecnologias digitais ou ainda afirmar que se trata de um
modismo com o uso do celular e outras tecnologias. A tecnologia se “popularizou” e
está nos lares de grande parte dos brasileiros.
Cabe salientar, que nestes novos tempos, é papel da escola propor a reflexão
para que os educandos construam suas trajetórias pensando a tecnologia de forma
a extravasar a mera apropriação dos seus recursos tecnológicos.

as tecnologias de informação e comunicação (TICs) são uma realidade


e, na escola, professores e alunos precisam trabalhar com elas. É
preciso conhecê-las, sabendo usar suas várias possibilidades, mas
também aprendendo a refletir sobre que tipo de mundo, de sociedade
e de relações queremos construir com o auxílio desses poderosos
recursos. Não é possível aqui separar os aspectos técnicos e os
éticos. (NETO e FRANCO, 2010, p. 20)

Para que os educandos possam refletir sobre a sociedade que desejam e


sobre sua história, é importante que os educadores também o façam, pela busca do
sentido de ser do professor, que é intermediado por sua relação com vários outros
fatores que também compõem seu eu. Dessa reflexão cabe relevada valorização do
“eu, pessoa” na construção da identidade do professor (Nóvoa, 2009). O ser docente
mistura-se à concepção do indivíduo inserido neste planeta como um ser social, de
direito e com autonomia.
Nessas idas e vindas do fazer-se professor, a formação é muitas vezes
entrecortada por profissionais de diversas áreas do conhecimento e não é assumida
pelos próprios professores.
82

A formação de professores deve passar para “dentro” da profissão,


isto é, deve basear-se na aquisição de uma cultura profissional,
concedendo aos professores mais experientes um papel central na
formação dos mais jovens.
[...] Na verdade, houve vários grupos que, progressivamente, foram
assumindo uma responsabilidade cada vez maior na formação dos
professores, e na regulação da profissão docente, relegando os
próprios professores para um papel secundário. Estou a referir-me a
um conjunto vasto e heterogéneo de especialistas que ocupam lugares
de destaque nos departamentos universitários de Educação (ou
Ciências da Educação) e nas entidades oficiais ou para-oficiais
responsáveis pela política educativa. (NÓVOA, 2009, p. 36)

Se a valorização da experiência é tão fundamental na formação docente, é


preciso identificar na rememoração, no contar, a reflexão sobre a atuação como
professores.
Na rememoração, é possível encontrar marcas, por vezes profundas, que
anunciam ou denunciam a atuação docente. O professor que não se abre ao
autoconhecimento corre o risco de ser superficial o que, na carreira docente, é
desprovido de possibilidade real de trabalho.

Gosto de ser homem, de ser gente, porque sei que a minha passagem
pelo mundo não é predeterminada, preestabelecida. Que o meu
“destino” não é um dado, mas algo que precisa ser feito e de cuja
responsabilidade não posso me eximir. Gosto de ser gente porque a
História em que me faço com os outros e de cuja feitura tomo parte é
um tempo de possibilidades e não de determinismo. (FREIRE, P.
1996, p. 53)

Essa memória e a rememoração na carreira docente têm sido colocada em


evidência nos últimos dez anos, porque diversos institutos e grupos de pesquisa têm
se preocupado em fazer pesquisas de cunho biográfico ou autobiográfico, revelando
o potencial das narrativas na formação dos educadores.
A memória não é o ato de relembrar os fatos com a maior fidelidade possível
ou o levantamento de dados por parte do pesquisador. Pelo contrário, a importância
da lembrança como trazida à memória demonstra a forma com que o sujeito
guardou aquela lembrança e preferiu revivê-la pela rememoração. “Memória e
profundidade são o mesmo, ou antes, a profundidade não pode ser alcançada pelo
homem a não ser através da recordação” (ARENDT, 2005, p. 31).
Importante considerar que em tempos de fotografias, vídeos e outras formas
de registro facilitadas pelos recursos tecnológicos, aumentam consideravelmente a
83

quantidade de suportes que poderão ser utilizados no futuro para essa


rememoração.

2.3 TDIC na escola: questões imbricadas

Neste subitem do capítulo, procura-se identificar os objetos que aproximam as


TDIC do cotidiano escolar e fazer algumas reflexões importantes, de forma a
propiciar o discernimento que pode contribuir com o material coletado dos
professores que narraram suas experiências.
Alguns dos itens deste capítulo são extraídos dos resultados obtidos na
pesquisa do CGI (2015, pp. 348-354), já citada no Capítulo I. Na pesquisa realizada
com professores, sobre a percepção dos obstáculos no uso de computadores e
internet, alguns fatores que dificultam o acesso foram apontados com mais de 50%,
como: números insuficientes de computadores conectados à internet; ausência de
suporte técnico ou manutenção; equipamentos obsoletos ou ultrapassados; pressão
ou falta de tempo para cumprir com o conteúdo previsto; ausência de formação
específica para o uso das tecnologias na prática pedagógica; pressão para
conseguir boas notas nas avaliações de desempenho; falta de apoio pedagógico
para o uso de computador e internet.
Tais questões auxiliam a compreender a atual situação das TDIC no contexto
escolar para além das políticas públicas ou mesmo das campanhas governamentais
que possibilitam a “pintura de um mundo que não existe”.
Corroborando com os dados acima, a pesquisa identifica uma expressiva
quantidade de professores que apresentaram melhoria do trabalho pedagógico na
diversificação de propostas e melhoria na colaboração com outros colegas (2015,
pp. 355-357) quando do uso do computador e da internet no meio escolar.
Com efeito, os dados são relevantes e auxiliam a compreender a realidade
que encontramos nas escolas brasileiras, indicando ganho significativo quando do
uso das TDIC na escola.
Se os recursos favorecem o trabalho diferenciado por parte do professor e
intensifica as linguagens cada vez mais multimidiáticas, a escola deve estar sempre
atenta ao seu papel principal, a fim de propiciar momentos de reflexão a partir das
84

linguagens que os diferentes meios digitais se utilizam, como também deve


identificar o papel da grande mídia na divulgação de materiais escolares.

Educar para a cidadania global significa formar seres capazes de


conviverem, se comunicarem, dialogarem num mundo interativo e
interdependente utilizando os instrumentos da cultura. É preparar o
indivíduo para ser contemporâneo de si mesmo, como membro de
uma cultura planetária e, ao mesmo tempo, comunitária próxima, que,
além de exigir sua instrumentação técnica para comunicação a longa
distância, requer também o desenvolvimento de uma consciência de
fraternidade, de solidariedade e a compreensão de que a evolução é
individual e, ao mesmo tempo, coletiva. É prepará-lo para
compreender que acima do individual deverá sempre prevalecer o
coletivo. (MORAES, 1997, p. 12-13).

Embora a evolução tecnológica e as redes permitam que mais pessoas


tenham acesso às ferramentas tecnológicas, na escola o assunto nem sempre é tão
simples, pois ao se tratar de democracia no acesso à tecnologia, deve-se entender a
possibilidade de todos a utilizarem.
Retomando o conceito de comunidade aprendente e comunidade escolar, é
preciso lembrar que fazem parte da comunidade não só os estudantes, professores
e gestão escolar, mas todos aqueles que trabalham na escola, bem como pais e
toda comunidade do entorno.
O acesso democrático às tecnologias deve ser para toda esta comunidade, no
sentido de verdadeiramente se criar uma comunidade aprendente em que o espaço
público atenda a todos, portanto, “basear-se numa definição abrangente de “nós”,
num compromisso de construir uma comunidade que é tanto da escola, quanto da
sociedade onde ela existe” (APPLE e BEANE, 1997, p. 39).
Mas, se em um exercício de reduzir a comunidade escolar como um grupo
apenas de estudantes e educadores, colocarmos que somente essas pessoas na
escola terão acesso aos recursos tecnológicos, ainda assim não se terá construído a
democracia no acesso porque, longe do ideal, as tecnologias ainda não estão em
todos os espaços da escola para que possam ser utilizadas e apropriadas pelos
alunos livremente.
Crianças, jovens e adultos têm adentrado à escola com seus aparelhos e
desafiado os professores tanto para se adequarem a esta nova realidade quanto a
pensarem propostas ou significarem o uso dessas tecnologias digitais no espaço
escolar. Em contrapartida
85

Contudo, agora que a internet converge múltiplas tecnologias,


formatos e espaços de mediação e informação – fundindo neste ponto
práticas sociais distintas de informação e entretenimento, trabalho e
lazer, público e privado, até mesmo infância e vida adulta, nacional e
global – é necessária uma convergência da literacidade relacionada às
mídias (ou ao audiovisual) e aquela relacionada à informação para que
uma rota seja traçada com o objetivo de compreender o que jovens
sabem e o que precisam saber muito além da ideia simplista de “usar
a internet.” (LIVINGSTONE, 2011, p. 22)

Assim sendo, se as políticas públicas e as iniciativas não possibilitam o


acesso democrático à tecnologia e, por consequência, a tudo que ela propicia, ao
utilizarem os aparelhos pessoais, educandos possibilitam um acesso mais
democratizado a uma série de conhecimentos e de possibilidades de uso dessas
ferramentas na escola.
Os modelos de organização da educação, em especial, nas escolas públicas
demonstram uma administração burocratizada que caminha na contramão do
avanço tecnológico.
Os processos licitatórios e editais têm demonstrado, na maioria das vezes,
uma grande defasagem no que concerne a possibilitar os ambientes escolares de
receberem máquinas e equipamentos que sejam mais modernos ou de última
geração.
A dependência de processos que envolvam diversos setores e a morosidade
que cada um possui acabam por atravancar os avanços pretendidos, pois a compra
dos materiais não chega no momento necessário.
Quando se relaciona essa burocracia à obsolescência programada, fator
muito presente no mercado tecnológico, conclui-se que, mesmo que a escola deseje
educar para o futuro, o modelo utilizado peca por não ser capaz de se organizar nem
mesmo para o tempo presente.
Considerando a questão da obsolescência programada de forma mais ampla,
há necessidade de se verificar de que formas a escola tem se ocupado a pensar
sobre o uso e o descarte que faz das máquinas que recebe, a fim de pensar de
forma mais global e ampliada sobre verdadeiramente trabalhar os conteúdos
relacionados ao meio ambiente.
As tecnologias têm um alto custo e, portanto, outro desafio que se coloca é a
popularização dos recursos de uma forma que, mesmo adaptada, educandos de
86

várias regiões e condições sociais distintas possam utilizar e vivenciar práticas com
tecnologia.
Atualmente, ainda há um grande número de recursos cujo custo com
tecnologia representa uma parte considerável do projeto. Este fato, na maioria das
vezes, acaba inviabilizando os projetos. É um desafio para educação e para uma
nova economia que se tem denominado como economia colaborativa ou economia
criativa e que vai mostrando possibilidades diferenciadas de consumo.
Talvez, um dos fatores mais relevantes seja o fato das pessoas se pautarem
mais no uso e no benefício que determinados produtos oferecem. Nesse sentido, as
pessoas não precisam adquirir determinado produto ou recurso para atingir seu
objetivo; existem alternativas como as compras coletivas e os usos de caráter
rodiziado.
É importante ressaltar essa questão, porque é muito comum entender que
democratizar o acesso significa oferecer em igual condição e posse a todos, o que
pode acarretar num consumo desenfreado.
Os novos modelos de economia têm desafiado não só a educação como
também a várias outras áreas, a exemplo da administração e da economia, fazendo
com que poucos profissionais consigam enxergar soluções viáveis para os
problemas que as escolas enfrentam hoje. Muitos acabam sobrevalorizando a falta
de recursos para aquisição, manutenção, reposição dos instrumentos tecnológicos,
aliando ainda ao argumento da falta de pessoas especializadas, o que resulta no
adiamento da renovação do parque tecnológico das escolas.
São muitas as questões que envolvem não só a aquisição dos equipamentos,
mas a sua perenidade com vistas a possibilitar ao professor o desenvolvimento
pleno de suas atividades.
Conforme indica a pesquisa da CGI (2015, p. 349), 75% dos professores
apontam que a ausência de suporte técnico ou manutenção dificulta o uso de
computador e da internet.
Nesse sentido, cabe entender a responsabilidade dos diferentes agentes
escolares; compreender que os professores atuam somente na parte pedagógica e
quando conseguem auxiliar na manutenção de algumas máquinas o fazem por
querer ajudar a escola.
Igualmente, a equipe gestora de uma escola que não possui manutenção
pode tender a liberar o uso dos recursos com menor frequência com o objetivo de
87

que mais pessoas possam utilizar os recursos, ainda que haja um tempo maior de
duração.
Embora haja um sentido nesse pensamento, ele acaba por permitir que as
propostas com os recursos tecnológicos não contemplem todas as necessidades,
uma vez que não permitem o uso total dos recursos.

2.3.1 Perspectivas e possibilidades das TDIC na escola

A partir das reflexões trazidas aqui, pretende-se, nesta seção, verificar


algumas possibilidades para o uso das TDIC de forma a considerar o uso dos
recursos para além das ferramentas, ou seja, na possibilidade de compreensão
como linguagem. Para tanto, discorre-se sobre termos que têm sido frequentemente
utilizados na relação das áreas de comunicação e educação, sendo “mídia e
educação” que trata da inserção dos diferentes meios na escola e trabalha numa
perspectiva mais analítica e de observação e o da “educomunicação” que busca
utilizar a linguagem dos meios como possibilidade de trabalho com os educandos,
pautando-se na confecção de produtos comunicacionais.
Os estudos de mídia e educação têm se detido, em maior grau, em fazer
reflexões sobre as grandes mídias e outros artefatos midiáticos no cotidiano escolar.
Sendo assim, buscam fazer pesquisas e observações daquilo que ocorre no exterior
da escola.
São objetos de estudos dessa área os anúncios no jornal, na televisão, no
outdoor, na rádio, dentre outros. Esses estudos, muitas vezes com grande
profundidade de reflexão, buscam analisar a comunicação a qual a população tem
sido exposta e, de certa forma, tem consumido.
Essa vertente da entrada da comunicação na área educacional se dá em
maior grau pelos estudos da Escola Alemã ou Escola de Frankfurt18, cujos principais
nomes são Adorno e Horkheimer (1947), que participaram da criação do conceito de
indústria cultural.

18
Escola de Frankfurt é o termo criado para definir um período em que a maioria dos teóricos se opunha à
comunicação de massa defendendo que sua prática era tamanha que poderia influenciar as pessoas a fazerem
o que a comunicação desejasse.
88

Para a escola alemã, há uma tendência de ver a comunicação em massa


como uma possibilidade de dominar. A ideologia predominante é a da dominação
pela comunicação de massa para apropriação da ideologia capitalista.
Um dos grandes pontos questionáveis dessa teoria é o entendimento das
massas (população) como algo amorfo, sem reação, como se qualquer elemento
comunicacional gerasse uma resposta quase que espontânea, algo criticado
posteriormente na teoria que ficou conhecida como leitura crítica dos meios.
Outra perspectiva, que se alinha mais a esta pesquisa, é a educomunicação
que vem se fortalecendo com um olhar multidisciplinar, a partir de diferentes
linguagens e perspectivas. Sua ação iniciou-se, primeiramente, no terceiro setor, em
iniciativas de educação informal.

A Educomunicação é entendida como um referencial teórico que


sustenta a inter-relação comunicação/educação como campo de
diálogo, espaço para o conhecimento crítico e criativo, para a
cidadania e solidariedade (SOARES, 2011, p. 13).

Várias são as pesquisas, atualmente, que se identificam com a


educomunicação no que tange à educação dialógica, a busca pelo protagonismo de
crianças e jovens que produzem comunicação, com práticas voltadas para a
cidadania e formação integral dos sujeitos.

Transformar alunos em sujeitos do conhecimento implica (de fato)


descentrar as vozes, colocando-as numa rota de muitas mãos que
respeite as realidades da vida e cultural dos educandos. É preciso (de
fato) fazer o aluno assumir a sua voz como instância de valor a ser
confrontada a outras vozes, incluindo-se a do professor. Desse modo,
a sala de aula passaria ser entendida como lugar carregado de história
e habitado por muitos atores que circulariam do palco à plateia à
medida que estivessem exercitando o discurso (CITELLI, 2000, p. 98).

Trata-se de uma vertente que se compromete com a busca pela autonomia,


coletividade, que visa o convívio, o respeito, o entendimento da ética, da cidadania.
Em diálogo com a teoria das mediações e os estudos de recepção, a
educomunicação se propõe a estimular o conhecimento da linguagem audiovisual,
de forma a desenvolver a leitura crítica dos meios audiovisuais.

O campo da Educomunicação nasceu, entre outras influências, da


corrente intitulada “leitura crítica dos meios”, hoje atualizada em
89

“leitura crítica da mídia”, que defende como papel da escola o auxílio


para que os educandos possam conhecer a linguagem e a gramática
audiovisual, com o objetivo de formar sujeitos críticos diante das
mensagens midiáticas. Outro apoio nessa proposição vem da teoria
das mediações que compreende o receptor como um sujeito ativo, que
negocia sentidos nas suas experiências pedagógicas e culturais
(MOGADOURO, 2011, p. 20).

Refere-se a trabalhar a partir de um ecossistema comunicativo que visa


buscar a boa relação entre os sujeitos e a expressão de grupos por meio das
ferramentas da comunicação.

À totalidade desses circuitos de retroalimentação envolvendo desde o


plano da produção material, passando pelas estratégias de
composição e circulação das mensagens, chegando aos jogos
coenunciativos, podemos chamar de ecossistema comunicativo –
conceito utilizado, em sentido próximo, por autores como Mário
Kaplún, Jesús Martin-Barbero, Pierre Lévy, Adilson Citelli e Ismar de
Oliveira Soares (CITELLI, 2011, p. 62)

Assim, pode-se estudar a relação que se estabelece entre os estudos de


recepção e as mudanças sociais trazidas com a tecnologia que modificaram e
modificam a relação que as pessoas estabelecem com os produtos digitais. Muitos
artigos têm sido publicados nessa área e trazem experiências internacionais, uma
vez que o Brasil ainda não tem experiências expressivas nessa perspectiva, sendo
esta pesquisa umas das contribuições para a área.
Se a educação é a área de entender o presente e dar o sentido histórico do
momento atual em que vivemos, é também nela que devem se configurar as ações
que poderão ditar o futuro. Se a educação tem cumprido esse papel não se pode
afirmar, mas ressalta-se que quando isso não ocorre, ela passa a receber
informações que vem de diversas áreas da sociedade e, por isso mesmo, se permite
estar entregue ao mercado e às tendências sem reflexão.
Ressalta-se assim a necessidade de uma educação que se fundamente pela
inovação e pela pesquisa, não com fins de se apropriar das ferramentas de última
geração encontradas atualmente, mas como concepção. Uma educação que não
sufoque a criatividade das crianças com suas inúmeras possibilidades de entender e
dizer o mundo e que não castre a inventividade natural do ser humano para
encaixotá-lo aos saberes impostos em uma diretriz, matriz ou grade curricular,
seccionando os saberes e dicotomizando a relação pedagógica em certo e errado.
90

Algumas perspectivas têm se apresentado como possibilidade de pensar o


presente e futuro das possibilidades tecnológicas e comunicativas no âmbito escolar.
Assuntos como big data permitirão à educação cada vez mais criar conexões e
produzir memória e história por meio de informações registradas. A robótica, já
presente em grande parte das escolas, desafia a possibilidade de uma sociedade
mais cidadã com o auxílio desses recursos. Igualmente desafiadora, a inteligência
artificial que contribui para que as máquinas e os dispositivos tomem decisões forma
mais autônoma, exige de seus criadores um compromisso ético.
Outro recurso ainda bem recente são as impressoras 3d. Não se sabe ainda
seu real potencial, mas elas têm ganho relevado destaque em diversos campos da
sociedade e na educação. Elas podem auxiliar na prototipação das ideias, produtos
e soluções para problemas reais da sociedade e da escola.
Com todas essas possibilidades e inovações cabe refletir como a educação
tem se preparado para se adequar ao presente e, em especial, preparar o futuro. As
metodologias presentes no ensino tradicional não conseguirão receber os alunos
inventivos sem perdê-los, assim como não bastará o uso das tecnologias de forma
indiscriminada.
Haverá uma necessidade cada vez maior de uma discussão coletiva sobre
em que sociedade e planeta se deseja viver: se povoados por predadores naturais
ou em equilíbrio com a natureza, se com empregos sub-humanos ou que respeitem
a capacidade humana, se socialmente respeitando as diferenças ou intolerantes, se
com grupos e comunidades que se expressam ou que preferem falar a voz do outro,
se um país sem a necessidade de leis porque sabe conviver ou com leis cada vez
mais detalhadas, se um país em que a fome e a extrema pobreza é tolerada e
convive com a mesa farta ou que exige condições mínimas e dignas de vida a todos.
91

3. Metodologia e Análise

“ta bem, ta bem... isso que o mundo está feito de


átomos... O mundo não está feito de átomos. O mundo
está feito de histórias” disse ela. E eu acredito que sim,
o mundo deve estar feito de histórias porque são as
histórias que a gente conta, que a gente escuta, recria,
multiplica. As histórias são as que permitem transformar
o passado em presente e que também permitem
transformar o distante em próximo. O que está distante
em algo próximo, possível e visível.
Eduardo Galeano

3.1 Metodologia

3.1.1 A pesquisa narrativa e autobiográfica de professores

A metodologia utilizada nesta investigação é a pesquisa narrativa e


autobiográfica por possibilitar que os professores pesquisados pudessem refletir
sobre sua prática e expressá-la por meio da narrativa.
A pesquisa narrativa é muito utilizada na educação por dar evidência à
experiência vivida pelo pesquisado e por facilitar o estreitamento do laço entre
pesquisador, pesquisa e pesquisado.

Se as palavras não são apenas uma representação da realidade, mas


uma forma de construir uma realidade humana, ou de humanizar a
realidade transformando-a em discurso, propomo-nos a começar pela
etimologia do termo experiência, que evoca sua natureza cambiante e
sua estreita relação com a formação humana.
O termo experiência, como se sabe, deriva do latim experientia/ae e
remete à “prova, ensaio, tentativa”,o que implica da parte do sujeito a
capacidade de entendimento, julgamento, avaliação do que acontece
e do que lhe acontece. (PASSEGGI, 2011, p. 148)

O conceito de experiência trazido pela autora ressoa na educação porque


valoriza a história que os professores edificam ao longo da carreira docente, bem
como permite refletir sobre essa história como parte integrante do sujeito.
Nesse sentido, Larrossa (2011, p. 5) ressalta a experiência com o olhar para a
educação e lembra que:
92

A experiência é "isso que me passa". Vamos primeiro com esse isso.


A experiência supõe, em primeiro lugar, um acontecimento ou, dito de
outro modo, o passar de algo que não sou eu. E "algo que não sou eu"
significa também algo que não depende de mim que não é uma
projeção de mim mesmo, que não é resultado de minhas palavras,
nem de minhas ideias, bem de minhas representações, nem de meus
sentimentos, nem de meus projetos, nem de minhas intenções, que
não depende nem do meu saber, nem de meu poder, nem de minha
vontade. "Que não sou eu" significa que é "outra coisa que eu", outra
coisa do que aquilo que eu digo, do que aquilo que eu sei, do que
aquilo que eu sinto, do que aquilo que eu penso, do que eu antecipo,
do que eu posso, do que eu quero.

É preciso entender a experiência pelo viés da subjetividade, evidenciando a


necessidade da interpretação dessa experiência para a presente pesquisa.
A experiência pode ser expressa, de forma sintética, como aquilo que
permaneceu do que foi vivido e vivenciado, aquilo que ressoou e ficou. Entretanto,
ela ganha novo significado no contexto da narrativa,uma vez que permite uma
reconstrução da realidade por meio da palavra.
A narrativa não consiste na busca pela fidedignidade dos fatos, como uma
investigação policial ou jornalística em que são checadas fontes, documentos
históricos para averiguar a cronologia e veracidade dos acontecimentos. A narrativa,
por sua vez, valoriza o que é contado por aquele que viveu a experiência e, por
conseguinte, o sujeito narrador da experiência. História e sujeito são os
protagonistas da pesquisa narrativa e é a partir dos relatos que surgirá a
investigação.
O ato de narrar a experiência dá ao sujeito a possibilidade de recriar a
história, colocando ou retirando elementos da mesma. “Por meio da narrativa nós
construímos, reconstruímos, e de alguma forma reinventamos o ontem e o amanhã”
(BRUNER, 2014, p.103). Na reconstrução e reinvenção do passado há a renovação
do vivido, os fatos passam a ganhar novos elementos de signifcação.
Ainda como ressalta o autor, construir-se por meio do narrar-se é um
processo incessante, perpétuo e dialético. Apesar das resolutas homiliadas de que
as pessoas nunca mudam, elas mudam sim. Elas reequilibram a sua autonomia e os
seus compromissos, de forma a honrar aquilo que foram um dia (BRUNER, 2014, p.
95).
93

A narrativa permite voltar o olhar para trás,sem saudosismo acrítico, mas na


possibilidade de fazer-se historicamente. Ao narrarem sua existência para si
mesmos e outros, os entrevistados historicizam-se e contextualizam-se
ressignificando seu presente.
A importância da narrativa e da biografia para a educação resultaram na
escolha do método (auto)biográfico em complementariedade à pesquisa narrativa.
Conforme ressalta Azevedo (2016, p.29) atrelando à experiência, o método
biográfico configura-se

como instrumento de investigação pelo fato de a narrativa ter a


capacidade de transmitir significado, valor e intenção na medida em
que nós, seres humanos, somos naturalmente contadores e
personagens de nossas próprias histórias e das histórias dos demais.
Ao contá-las, externalizamos como experimentamos o mundo e, ainda,
o que nos dizem dele e de nós mesmos. É sobre a experiência de
pesquisa que contempla esse duplo caráter investigativo e formativo,
com a proposição de um curso de extensão no decorrer da pesquisa
que este texto apresenta os resultados.

O método biográfico não corresponde somente à narrativa que o sujeito traz


de si isoladamente, mas considera as questões sociais, emocionais, históricas,
dentre outras presentes na narração.
A experiência narrada é forjada no cotidiano, assim como as experiências
presentes se tornarão memória e poderão ser narradas no futuro. Experiências
essas que estão marcadas em um tempo histórico, por um contexto.

A atividade biográfica [...] uma atividade mental e comportamental, a


uma forma de compreensão e de estruturação da experiência e da
ação, exercendo-se de forma constante na relação do homem com
sua vivência e com o mundo que o rodeia. A utilização dos termos
biografia e biográfico para designar não a realidade fatual do vivido, e
sim o campo de representações de construções segundo as quais os
seres humanos percebem sua existência. (DELORY-MOMBERGER,
2012, p. 525).

Não se trata de imergir na realidade da história narrada, mas na realidade do


campo das representações construídas pelos sujeitos que narram sua própria
experiência e ainda entender a realidade baseada na continuidade – passado,
presente, futuro (CLANDININ; CONNELLY, 2011, p. 84).
94

As características da metodologia supracitada encontram grande


receptividade no campo das ciências humanas por favorecerem a experiência do
sujeito, marcando assim o sentido da presença e da realidade vivida para
constituição dos dados de pesquisa.

O objeto da pesquisa biográfica é explorar os processos de gênese e


de devir dos indivíduos no seio do espaço social, de mostrar como
eles dão forma a suas experiências, como fazem significar as
situações e os acontecimentos de sua existência (DELORY-
MOMBERGER, 2012, p. 524).

Ao se tratar a formação pedagógica, verifica-se que “[...] o método biográfico


constitui uma abordagem que possibilita ir mais longe na investigação e na
compreensão dos processos de formação e dos subprocessos que o compõem”
(NÓVOA; FINGER, 2010, p. 25). Tal abordagem encontra receptividade no processo
de formação pedagógica porque, ao relatar as experiências práticas e relacioná-las
à formação, os sujeitos estabelecem relações entre as experiências vividas na sua
própria formação e como as mesmas contribuem ou não na sua atuação docente.
Como ressaltado por Nóvoa e Finger (2010) os processos formativos
encontram bases no método biográfico por facilitarem a compreensão de que
educadores tendem a repetir a educação que tiveram e também a formação
contínua após a formação inicial.
O método de narrativa com a perspectiva da (auto)biografia e suas
características guarda relações com a necessidade e o interesse de investigação
desta pesquisa.
É preciso considerar que nem toda pesquisa narrativa trabalha com o método
(auto)biográfico; essa escolha se deu por corresponder à temática pesquisada, bem
como por permitir confirmar ou refutar as hipóteses levantadas a partir do problema
de pesquisa.

[...] o método (auto)biográfico é uma via passível de produzir


conhecimentos que favoreçam o aprofundamento teórico sobre a
formação do humano e, enquanto prática de formação, conduzir o
diálogo de modo mais proveitoso consigo mesmo, com o outro e com
a vida (NÓVOA; FINGER, 2010, p. 16).
95

Tendo como base a conceituação das narrativas (auto)biográficas, foram


convidados sujeitos com vivência da tecnologia em sala de aula para que pudessem
relatar uma experiência.
Foram coletadas narrativas de seis professores, dos quais cinco tiveram
entrevistas realizadas online, por meio do aplicativo móvel WhatsApp e por e-mail;
uma narrativa foi feita pessoalmente, utilizando-se de câmera de vídeo e gravador
para registro. As transcrições integrais das narrativas encontram-se no apêndice 2
deste trabalho.
O registro pelo aplicativo whatsapp se deu por troca de mensagem de texto.
Embora o aplicativo permita uma comunicação assíncrona, as narrativas realizadas
pelos participantes se deram em uma comunicação síncrona que permitiu verificar
possíveis dúvidas no momento em que as narrativas eram escritas. O que fugiu à
essa possibilidade foi apenas a comunicação por e-mail.
O registro digital e o relato possibilitaram aos sujeitos revisitarem suas
práticas relatadas de forma a repensar em que medida a formação inicial contribuiu
para a prática realizada em sala de aula, tema base desta pesquisa. Durante o
relato, algumas vezes houve necessidade de maior aprofundamento e, ainda,
verificação da compreensão das experiências narradas, transformando o momento
do relato em um diálogo, em especial quando utilizado o WhatsApp.
Assim, assume-se nesta pesquisa o caráter qualitativo e investigativo que se
desenvolverá na metodologia da pesquisa narrativa (auto)biográfica e com a
abordagem hermenêutico-fenomenológica para a análise das narrativas dos sujeitos
pesquisados. Mais informações sobre ambas estarão disponíveis nos itens que se
seguem.

3.1.2 A abordagem hermenêutico-fenomenológica

A fenomenologia busca identificar a essência da experiência vivida. Assim,


segundo Merleau-Ponty (1962, p. vii) a fenomenologia se preocupa em estudar as
essências. Dessa forma, a contribuição da fenomenologia para a pesquisa se dá
justamente em perceber nas narrativas (auto)biográficas o que há de essência nos
fatos vividos e relatados.
96

A possibilidade do pensamento fenomenológico na pesquisa pode ser


duplamente realizada. De um lado, pelo sujeito que narra sua experiência na
necessidade de rememoração para a narração, qual seja sua interpretação do fato
ocorrido e sua forma de expressá-lo e, em seguida, pela interpretação hermenêutica
dessa narrativa pela busca do essencial na análise da pesquisa por parte do
pesquisador.
Ambos os movimentos fenomenológicos realizados pelos sujeitos
pesquisados e pesquisador se baseiam na palavra, na narrativa. Então, a
hermenêutica, como ciência da interpretação, fundamenta a compreensão do
fenômeno.
Passível de interpretações e não julgando estas como verdades únicas,
herméticas, a narrativa dos sujeitos desta pesquisa possibilita a junção da
hermenêutica e da fenomenologia.

Ao inserir-se no mundo da linguagem, a hermenêutica renuncia a


pretensão de verdade absoluta e reconhece que pertencemos às
coisas ditas, aos discursos, abrindo uma infinidade de interpretações
possíveis (HERMANN, 2002, p. 24)

A junção da hermenêutica e da fenomenologia estará presente, conforme


Freire (2012, p. 188), em Van Manen e Riceur (e também em Heidegger), que os
precede, e é apresentada como uma ciência interpretativa dos fenômenos como
forma de fazer pesquisa.
A abordagem então considerada hermenêutico-fenomenológica, com sua
hifenização pelo seu caráter indissociável (Freire, 2012),confere à investigação do
fenômeno um olhar mais filosófico e humano, porque coloca o sujeito pesquisado de
forma integrada à pesquisa, não dando evidência apenas aos dados coletados como
se fossem separados de seus sujeitos.Pelo contrário, evidencia os sujeitos como
seres históricos com suas interpretações e formas de narrar e recontar fatos
ocorridos por meio das narrativas apresentadas.

A abordagem hermenêutico-fenomenológica, como orientação


qualitativa de pesquisa, contempla um interesse investigativo que é,
essencialmente, baseado em experiências vividas uma vez que, como
assegura McCoy (1993, p.4), "o mundo não é fundamentalmente o que
se pensa sobre ele, mas o que nele se vive". (FREIRE, 2012, p. 182)
97

Conforme se vê no pensamento de Freire (2012), a relação entre o ocorrido e


o vivido, experienciado, é passível de interpretação, mas não pela busca de sentido
ou coerência com os fatos cronologicamente ocorridos, mas detém-se naquilo que é
contado pelos sujeitos, ressaltando mais uma vez o fenômeno.
Se a história pode preocupar-se com a cronologia e o registro fidedigno de
todos os fatos, a abordagem hermenêutico-fenomenológica buscará compreender o
que há de essencial nos discursos e narrativas dos sujeitos pesquisados.

Um pesquisador hermenêutico-fenomenológico interessa-se,


especialmente, pelo significado de uma experiência - particularmente
da uma experiência de vida - que, para van Manen (1990), consitui-se
no ponto de partida e no destino final de uma investigação que se
paute em tal orientação metodológica. (FREIRE, 2012, p. 183)

Os passos para a realização da análise hermenêutico-fenomenológica são


verificados na figura 3, a seguir, e serão descritos a seguir e foram realizados nesta
pesquisa em cada uma das narrativas dos seis sujeitos analisados.

TEMATIZAÇÃO

Refinamento:
identificação
Definição de
das primeiras Refinamento e Refinamento e
temas,
Textualização unidades de ressignificação ressignificação
subtemas...
significado

CICLO DE VALIDAÇÃO

Figura 3 – Rotinas de organização e interpretação (FREIRE, 2012).

A textualização consiste no relato textual dos fenômenos que os sujeitos


desejam descrever, de acordo com o enfoque da pesquisa que participam. Neste
caso, a relação entre educação e tecnologia.
98

Na presente pesquisa, a textualização se deu de duas formas, com diferentes


sujeitos: uma das narrativas se deu por meio da gravação de uma entrevista e o
registro em vídeo e gravador, que foi posteriormente transcrito. As outras cinco
narrativas ocorreram pela utilização do aplicativo de celular WhatsApp que permitiu
o relato escrito de forma digital e ainda o uso de mensagens de áudio.
As narrativas foram realizadas de forma espontânea e consistiram no relato
de uma experiência significativa com o uso de tecnologia na educação, seguido de
uma reflexão sobre como essa prática foi possível, relacionando-a a formação.
Após a coleta e organização das narrativas dos sujeitos pesquisados, há o
trabalho de tematização.

Após a geração e registro de textos que capturam as formas de


experiências o fenômeno em estudo, tem início uma sequência de
procedimentos - tematização (van Manen, 1990) - que corresponde à
etapa de interpretação desse fenômeno, à busca de identificação dos
temas hermenêutico-fenomenológicos (Freire, 2007, 2010, 2011) que
de forma sintética, expressam como se constitui o que está envolvido
na experiência interpretada, fornecendo, em última instância, sua
estrutura, sua essência. (FREIRE, 2012, pp. 191-192)

A tematização ocorre a partir do exercício de leitura e releitura das narrativas


na busca pela identificação de elementos menores de texto que expressem o
fenômeno relatado em essência. Após a identificação das unidades menores, ainda
no exercício constante de leitura e releitura, é realizado o procedimento de
refinamento (Freire, 2012) que consiste em idas e vindas na interpretação e
significação que poderão resultar na substituição, retirada ou inclusão de unidades
identificadas anteriormente - ressignificação.
O movimento de leitura, releitura e interpretação tem por objetivo chegar a
partículas menores de textos que são os substantivos (Freire, 2012). Para chegar
aos substantivos, é importante ressaltar que os mesmos não precisam estar
evidenciados e expressos nos textos das narrativas, mas podem ser resultado da
interpretação do pesquisador.
A partir dos substantivos é possível chegar à escolha do que seriam os
grandes temas e possíveis subtemas que estão presentes e emergem das narrativas
trazidas pelos participantes. Dessa forma, diferente da metodologia de análise de
conteúdo que pesquisa o texto em si, a abordagem hermenêutico-fenomenológica
99

mantém o olhar sobre o fenômeno, a fim de interpretá-lo a partir da escrita dos


sujeitos, considerando também aquilo que não está em evidência.
As idas e vindas na leitura do texto original das narrativas e de sua depuração
interpretativa resulta em um movimento chamado por Freire (2012) de ciclo de
validação. A leitura e releitura constante, na busca por unidades menores de texto
nas narrativas dos diferentes sujeitos, a posterior chegada aos substantivos e
conseguinte tematização e subtematização conferem validade à pesquisa.
Conforme ainda ressalta a autora, no movimento interpretativo é possível
identificar o que está em aparência, ou seja, relatado e possível de ser identificado
pelo pesquisador nos textos e o que se mostra em essência, que pode estar latente
ou oculto no texto. Portanto, a abordagem hermenêutico-fenomenológica exige do
pesquisador o conhecimento sobre o tema pesquisado, uma vez que determinados
vocabulários, formas de dizer costumam ser próprias da área.
O movimento interpretativo e a chegada aos elementos menores e sua
tematização ocorrem na análise, mas não os encerram. É na tematização e
subtematização, última etapa do ciclo de validação da abordagem hermenêutico-
fenomenológica, que são encontrados os elementos que passam a ser analisados
na retomada dos referenciais teóricos trazidos até então, no intuito de identificar as
similaridades com as fontes pesquisadas e responder à pergunta problema.

3.1.3 Os sujeitos da pesquisa

Para a realização da pesquisa foram convidados seis professores que atuam


em rede pública ou privada. Como requisito à participação da pesquisa os
professores precisariam utilizar tecnologia digital em sua prática. Além disso, outro
fator importante para a escolha é a preocupação com o protagonismo de seus
alunos no desenvolvimento das atividades propostas.
A abordagem metodológica utilizada nesta pesquisa não guarda relação entre
quantidade de sujeitos pesquisados para validação da qualidade do estudo,
conforme explica Ferrarotti “se nós somos, se todo o indivíduo é a reapropriação
singular do universal social e histórico que o rodeia, podemos conhecer o social a
partir da especificidade irredutível de uma práxis individual” (FERRAROTTI, 2010, p.
47).
100

Dessa forma, considerou-se a escolha dos profissionais pelo conhecimento


prévio de suas práticas por parte do pesquisador, levando-se em consideração o uso
da tecnologia em sua atuação e a abertura para a coleta de narrativas.
Os professores participantes da pesquisa relataram, cada um, uma prática
considerada por eles significativa. As narrativas apresentadas, embora sejam relatos
dos sujeitos, não são isoladas em si, pois abrigam muito mais pessoas,
considerando que a prática do professor nunca é um ato apartado, mas,
essencialmente, uma profissão que se forja no contato com o outro.

Nessa interface do individual e do social [...] o espaço da pesquisa


biográfica consistiria então em perceber a relação singular que o
indivíduo mantém, pela sua atividade biográfica, com o mundo
histórico e social e em estudar as formas construídas que ele dá à sua
experiência. (DELORY-MOMBERGER, 2012, p. 524).

Cada sujeito relatou uma prática com o uso de tecnologia em sala de aula. A
prática foi escolhida pelo próprio pesquisado, pois a relevância para a pesquisa
estava em buscar que fatores emergiam do relato do professor e não ater-se à
prática em si.
Os participantes da pesquisa seguem ordem alfabética e estão identificados
por haver concordância na divulgação de seus nomes, registro esse feito por
assinatura no termo de participação da presente pesquisa:

Prof. César Augusto do Prado Moraes - possui graduação em matemática


pela Fundação Educacional de Penápolis (2004), pedagogia pela Universidade Nove
de Julho (2012), especialização em metodologia do ensino e aprendizagem da
matemática pela Faculdade São Luís (2007), mestrado em Educação pela
Universidade Metodista de São Paulo (2010) e doutorando em Educação pela
Universidade Metodista de São Paulo (Atual). É professor universitário da Faculdade
de Tecnologia Hotelaria, Turismo e Gastronomia de São Paulo e professor efetivo na
disciplina de matemática na Escola Estadual Visconde de Congonhas do Campo.
Sua narrativa foi sobre o uso do Geogebra com os alunos do oitavo ano da
Escola Estadual Visconde de Congonhas do Campo.

Profa. Denise Evelin Cabral Ramos - professora de educação básica na


rede municipal de São Bernardo do Campo há 5 anos. Formada no magistério e
101

graduanda no curso de pedagogia na Universidade Metodista de São Paulo.


Experiência na educação infantil e creche. Fez também alguns cursos de formação
na área de língua portuguesa, matemática e tecnologia. Integrante do Grupo de
Estudos sobre Novas Tecnologias para Educação – GENTE, coordenado pela Profa.
Dra. Adriana Azevedo.
A profa. Denise fez seu relato sobre um projeto de construção de um blog
com alunos do 5º ano.

Prof. Marcelo Augusto Pereira dos Santos - especialista em


educomunicação: mídias, cultura e comunicação pela Universidade de São Paulo,
graduado em pedagogia pelo Centro Universitário Fieo. Experiência nas áreas de
alfabetização, educação infantil e ensino fundamental, formação de professores,
programação, tecnologia e mídias, em uma perspectiva educomunicativa.
Seu relato de experiência foi sobre a construção do blog Apertaqual com
crianças da educação infantil.

Profa. Sueli Rosa Gama Medeiros - professora da Rede SESI (CE SESI
416). Graduada em ciências sociais pelo Centro Universitário São Camilo (1998).
Complementação pedagógica – habilitação em administração escolar pela
Universidade Bandeirante de São Paulo (2004). Pós-graduada em didática e
metodologia e aprendizagem da história pela Faculdade de Educação São Luis
(2007). Experiência como docente no ensino fundamental II e médio.
Sua narrativa foi sobre a utilização de vídeos e redes sociais para a
compreensão da internet na vida cotidiana.

Profa. Verônica Martins Cannatá - coordenadora-assistente e professora de


tecnologia educacional no Colégio Dante Alighieri. Mestranda em educação pela
Universiadade Metodista de São Paulo e membro da ABPEducom - Associação
Brasileira de Pesquisadores e Profissionais em Educomunicação. Licenciada e
bacharel em ciências sociais pelo Centro Universitário Fundação Santo André. Pós-
graduada em Sistema de Informação pelo Centro Universitário Fundação Santo
André. Participou do Grupo de Experimentações em Ensino Híbrido, parceria entre o
Instituto Península e a Fundação Lemann. Organizadora do livro “Dante de portas
102

abertas: relatos de práticas exitosas” e autora do capítulo sobre a gestão escolar no


livro Ensino Híbrido: personalização e tecnologia na educação.
O relato se deu na construção de um livro digital com alunos de diferentes
idades e turmas.

Profa. Zuleika Ramos Tani - professora do Centro Paula Souza (Etec Getúlio
Vargas). Graduada em letras pela Universidade Paulista (2010), em administração -
comércio exterior pelo Centro Universitário Ítalo-Brasileiro (2000) e em secretariado
executivo bilíngue pela Universidade Anhembi Morumbi (1994). Pós-graduada em
administração -recursos humanos pela Universidade Paulista (2014). Especialista
em filosofia e sociologia pela Universidade Gama Filho (2012). Mentora e
coordenadora do CAP: Centro de Aperfeiçoamento Profissional MERITUM (2010-
2012). Experiência como professora do Ensino Fundamental II, Médio e Técnico.
Relatou a experiência com a utilização de games para o ensino da sociologia
com alunos do ensino médio.

3.2 Análise das narrativas

Após muitas leituras sobre os relatos das experiências dos professores que
integram esta pesquisa, junto ao embasamento teórico e suporte metodológico
apresentados, chego a uma interpretação do fenômeno em foco. Reconhecendo que
não se pode apreender a totalidade de um fenômeno de maneira absoluta, admito a
influência existente da bagagem teórico-experiencial para a interpretação das
narrativas desta pesquisa.

Todas as narrações autobiográficas relatam, segundo um corte


horizontal ou vertical, uma práxis humana. Ora, se “a essência do
homem [...] é, na sua realidade, o conjunto das relações sociais”
(Marx, VIa Tese de Feuerbach), toda a práxis humana individual é
atividade sintética, totalização ativa de todo um contexto social. Uma
vida é uma práxis que se apropria das relações sociais (as estruturas
sociais) interiorizando-as e voltando a traduzi-las em estruturas
psicológicas, por meio da sua atividade desestruturante-reestruturante.
Toda a vida humana se revela, até́ nos seus aspectos menos
generalizáveis, como a síntese vertical de uma história social. Todo o
comportamento ou ato individual nos parece, até nas formas mais
103

únicas, a síntese horizontal de uma estrutura social (FERRAROTTI,


2010, p.46).

A partir das narrativas foi realizado um “mergulho interpretativo” (Freire,


2012) que resultaram na interpretação que se segue. Os temas hermenêutico-
fenomenológicos que emergiram por meio dos procedimentos interpretativos foram:
parceria, motivação, protagonismo, formação, desafio, restrição, mediação e
reflexão.
O que se segue é a apresentação da interpretação dos temas que revelam a
essência da manifestação do fenômeno estudado.

3.2.1 Parceria

O tema parceria aparece como um fator importante de troca que se


estabelece para a construção da aprendizagem.

Pude perceber que a relação professor aluno foi estabelecida com


mais confiança e o processo de ensino aprendizagem de um conteúdo
de geometria como prisma, o qual não é bem recebido pelos alunos
por ser considerado complexo, foi construído de forma contextualizada
e significativa e assim, conseguimos discutir e dialogar. (CÉSAR)

A relação de parceria pressupõe confiança de ambas as partes, a partilha


daquilo que se sabe e a exposição por conta daquilo que não se sabe. Um trecho da
narrativa da Denise reflete essa situação: "Eu criei uma conta de email para a turma
e dei a senha para eles" e complementa “ali foi uma completa desconstrução. Criar
email para eles. Dar senha para eles. ‘Olha, eles vão acessar’; ‘Ah meu Deus, o que
eles vão fazer’."
Evidencia-se assim, por parte do professor, a consciência do inacabamento
(FREIRE, P., 1996) e a possibilidade de aprender, e do estudante, por sua vez, de
ensinar e de modificar a realidade.

A cooperação azeita a máquina de concretização das coisas, e a


partilha é capaz de compensar aquilo que acaso nos falte
individualmente. A cooperação está embutida em nossos genes, mas
não pode ficar presa a comportamentos rotineiros; precisa
desenvolver-se e ser aprofundada. O que se aplica particularmente
104

quando lidamos com pessoas diferentes de nós; com elas, a


cooperação torna-se um grande esforço (SENNETT, 2012, p. 9).

Tal aprofundamento ressaltado pelo autor verifica-se na narrativa

No começou eu tava meio receosa, ressabiada, por deixar eles


mexerem no blog, então eles começaram comentando e depois fui
abrindo de tal forma que quem alimentava passou a ser a turma e não
mais eu. (DENISE)

O conceito de parceria não se estabelece apenas entre professores e alunos,


mas também reflete na comunidade escolar, como a importância do trabalho a ser
realizado no apoio dos pares. "Quero pensar fora da caixa, gosto muito de trabalhar
em equipe e ninguém faz nada sozinho. Gosto de contar uma ideia e ouvir o outro.
Ajudar e ser ajudada.” (VERÔNICA), complementando, “não se trata apenas de uma
simples colaboração, mas da possibilidade de inscrever os princípios do coletivo e
da colegialidade na cultura profissional dos docentes.” (NÓVOA, 2008, p. 231).
Por fim, a parceria, num sentido mais abrangente em relação à comunidade
escolar, se dá também quando os pais apoiam o trabalho dos professores e dão
visibilidade para uma maior valorização do educando e de seu trabalho pedagógico.

A participação é o principal meio de se assegurar a gestão


democrática da escola, possibilitando o envolvimento de profissionais
e usuários no processo de tomada de decisões e no funcionamento da
organização escolar. Alem disso, proporciona um melhor
conhecimento dos objetivos e metas, da estrutura organizacional e de
sua dinâmica, das relações da escola com a comunidade, e favorece
uma aproximação maior entre professores, alunos, pais. (LIBÂNEO,
2004, p. 79)

É por meio de parceria e de participação nas atividades escolares, além das


decisões que são tomadas pelos professores ou pela gestão da escola, que o
trabalho se torna mais significativo e cooperado.

Eu tinha saído da sala de jogos, e na hora que eu voltei estava uma


mãe explicando para uma outra mãe qual é a importância dos jogos,
porque o filho tinha explicado para ela [...] eu nunca tinha conversado
com ela, tinha conhecido naquele dia, estava explicando para outra,
eu não tinha explicado nada para ela, foi o filho que fez, então você
percebe que dá pra caminhar isso junto com a família e junto com a
escola (ZULEICA).
105

3.2.2 Motivação

A motivação foi um tema bastante recorrente e apareceu de forma expressa


nas narrativas dos participantes da pesquisa. Destaca-se que os educandos notam
grande diferença quando os professores utilizam as tecnologias no trabalho de sala
de aula.

Sem tecnologia as turmas não eram participativas em sala de aula.


Agora com a tecnologia eles perguntam mais e estabelecem um
diálogo entre aluno e aluno e também entre aluno e professor em
relação ao conteúdo ministrado e no esclarecimento de dúvidas
(CÉSAR).

A motivação é resultado também da retomada do sentido do saber trabalhado


na escola para o cotidiano do aluno. As possibilidades tecnológicas ampliam o
contato do aluno com outros ambientes e linguagens e ressignificam a
aprendizagem, conforme emerge da narrativa de Sueli “Trazer alguns temas para
serem adaptados à realidade dos alunos motiva a sua participação e facilita esse
processo de aquisição e produção de conhecimento". Desta forma,

Hoje, para muitos alunos, a escola não tem qualquer sentido, nem
representa um projeto no qual eles próprios ou as suas famílias sintam
que vale a pena investir. A pedagogia, habituada a lidar com as
questões da motivação num quadro de adesão à ideia de escola, fica
desarmada perante estes alunos. Já não estamos apenas face a um
desafio de diferenciar na homogeneidade mas de construir uma
pedagogia que valorize a diversidade (NÓVOA, 2011, p. 41).

Uma das possibilidades encontrada pela professora Zuleica foi a inserção dos
jogos na sua prática.

Tinha alunos que detestavam livros, nunca queriam pegar livros, no


fim, leram todos os livros da série, porque a maioria dos jogos têm
livros, e esses livros são grandes, não são pequenos, e eles leram
aquilo com uma voracidade incrível (ZULEICA)

A relação que o aluno estabelece com o jogo extrapola os desafios escolares,


porque esse permite uma imersão tanto no próprio jogo, quanto no conteúdo nele
contido.
106

[...] o prazer que se retira do jogo provém do desafio, por vezes


extremado, quase desesperante, não de facilitações, sobretudo, não
da alegria do bobo alegre. Assim mesmo, seria sempre interessante
que a escola soubesse aprender algo dos cenários dos jogos, pelo
menos no sentido do envolvimento profundo (DEMO, 2009, p.99).

3.2.3 Protagonismo

Um dos temas que surgiram na análise hermenêutico-fenomenológica foi a


possibilidade do protagonismo dos alunos por meio do trabalho pedagógico junto às
tecnologias. Seja por um maior conhecimento da tecnologia ou pelas características
dos meios de comunicação e recursos tecnológicos, os alunos são convidados a
serem protagonistas da construção da aprendizagem.
Isso faz parte, inclusive, da identificação dos educadores quando permitem
que os educandos realmente se apropriem dos conteúdos e a relação pedagógica
estabelecida não se centre no professor, mas na relação entre professor e aluno
com um objetivo comum: a aprendizagem.

Professora, sabe aquele jogo? Será que não dá para encaixar tal
teoria de tal filosofo, de tal sociólogo que está falando?’ Coisas que eu
nem pensei, eu ainda não tinha me preparado para aquele jogo e para
aquela fase, e o aluno chega e fala ‘Olha, é assim’, e é verdade,
muitas vezes eu falei para ele ‘não sei, deixa eu jogar para depois eu
responder’ e esse relacionamento de ‘deixa eu jogar para depois eu
aprender’ eles começam a pensar que, opa, espera aí, se uma
professora está falando que vai jogar para me ensinar então porque o
jogo não pode transformar nisso (ZULEICA).

A facilidade com que o recurso tecnológico é apropriado pelas novas


gerações catalisa o protagonismo das crianças e dos jovens para a realização das
atividades e projetos propostos.

Eles também se perceberem naquela situação de protagonistas. Não é


mais a professora que posta. ‘Agora é a gente posta’ [...] nós
estávamos num ponto em que eu não fazia mais os posts. Eles que
faziam. Eles criavam título, colocavam uma síntese, um texto pequeno,
colocavam fotos e então eles estava manuseando a máquina digital,
aprenderam a descarregar fotos; eles aprenderem a entrar nos
comentários; a editar o texto; a inserir fotos (DENISE).
107

Para Kaplún (2014, p. 69) “a inserção dos meios de comunicação no interior


de um programa de autoeducação orientada põe à disposição dos educandos um
veículo de expressão”, conforme a narrativa "vi as crianças [...] dialogando,
questionando, se avaliando o tempo todo porque a proposta era que eles
escrevessem para outras crianças, então todo o tempo eles liam, reliam,
consultavam os amigos" (VERÔNICA).

3.2.4 Formação

A formação é um tema bastante presente nas narrativas quando se analisa o


fenômeno do uso das tecnologias nas salas de aulas dos professores participantes
da pesquisa.
Ela se desdobra em alguns aspectos. Um deles se refere à formação inicial e
a um predomínio da ausência de uma formação que contemple a utilização da
tecnologia "Só minha formação inicial, dentro do magistério, não foi suficiente para
me subsidiar no uso de tecnologia” (MARCELO).
Entretanto, verifica-se uma grande predisposição dos professores para a
formação continuada, bem como um reconhecimento que aponta para o letramento
digital, em parte, auxiliada pelos próprios alunos, como reforça Martín (2014).

Eu e os alunos estabelecemos trocas de conhecimento de ambas as


partes. Eu sobre os conteúdos matemáticos que pude auxiliar na
construção dos prismas e eles me ensinaram a descoberta de novos
recursos disponíveis no geogebra. Foi muito novo e gratificante para
ambos. Tanto para mim professor como para os alunos (CÉSAR).

O que se apresenta, por vezes de forma expressa e de forma oculta, é uma


busca por parte dos professores por uma aula que seja significativa para seus
alunos. Para isso, a busca por formações e mesmo a abertura para aprendizagem
conjunta é realizada durante a prática pedagógica.

Nosso pensamento ainda nos ata ao passado, ao mundo assim como


existia na época de nossa infância e juventude. Nascidos e criados
antes da revolução eletrônica, a maioria de nós não entende o que ela
significa. Os jovens da nova geração, ao contrário, se parecem com os
membros da primeira geração nascida em um país novo. Devemos
108

aprender junto com os jovens a forma de dar os primeiros passos


(MARTÍN-BARBERO, 1996, p. 19)

A perspectiva de uma formação continuada se apresenta de várias formas,


até mesmo pela inovação estar presente na tecnologia e o cenário dos recursos e
das linguagens mudarem de tempos em tempos.

Formação continuada é muito importante para o professor. Ele não


pode parar, pois o tempo não pára e o aluno muda. Eu não quero ficar
pra traz e quando digo isso não é medo do desemprego, é medo de
não fazer a diferença pro meu aluno e correr o risco da minha aula ser
indiferente pra ele (VERÔNICA).

Dentre as modalidades de formação, além dos alunos ou da troca entre


pares, a formação online é uma possibilidade que merece destaque, uma vez que
abre caminhos para a aceitação da docência e a construção de conhecimento a
distância, o que se torna coerente com a perspectiva dos professores.

Procuro me atualizar buscando informações e formação online,


geralmente discuto com os colegas quando o trabalho é
interdisciplinar. Entretanto é com os alunos que vejo algumas
possibilidades para trabalharmos alguns conteúdos e propostas
(SUELI).

Na narrativa da Sueli está presente a preocupação de uma prática


pedagógica alinhada aos sujeitos que com ela partilham a construção do
conhecimento - seus alunos.

3.2.5 Desafio

Um dos temas presentes nas narrativas é o desafio, seja ele trazido por um
elemento terceiro "fui provocado por minha orientadora do doutorado a realizar
práticas com tecnologia" (CÉSAR) ou na tentativa de inovação motivada pela própria
necessidade de desacomodação.

Ela fez uma proposta e eu aceitei. E a proposta foi a seguinte: ela


queria que eu desenvolvesse um blog , mas esse blog não era para
ser alimentado por mim com fotos dos alunos sobre as atividades, era
um blog da sala (DENISE).
109

César "verifiquei que este recurso estava disponível nos computadores da


sala de informática da escola em que trabalho. Assim, construí um planejamento
para utilizá-lo."
Verônica "fazer um ebookpoder ser mais do que uma simples "tarefa". Eu
queria que tivesse significado para eles e não para mim".
Zuleica "sociologia e filosofia tem muita teoria, explicar aquilo que aconteceu
no passado e qual a importância disso para o presente, e os alunos não tem
interesse de prestar atenção no que está acontecendo, eles querem saber da
atualidade, não algo muito distante."
Outro desafio do trabalho com tecnologia pode ser a aceitação ou
entendimento da comunidade escolar. As propostas mais inovadoras levam mais
tempo para serem aceitas porque fogem do senso comum e a imagem cristalizada
de que os alunos são os sujeitos de aprendizagem e os professores de ensinagem.
Conforme salienta Zuleica “alguns alunos falavam ‘Professora, posso tirar uma foto
da sua escrita na lousa? Porque meu pai não vai acreditar que eu tenho que jogar
para fazer lição de casa’”.

Tradicionalmente, a aprendizagem de informações e conceitos era


tarefa exclusiva da escola. Os conhecimentos teóricos eram
apresentados gradativamente às crianças após o ingresso nas
instituições formais de ensino. Eles eram finitos e determinados. Ao
final de um determinado grau de escolarização a pessoa podia
considerar-se formada, ou seja, já possuía conhecimentos e
informações suficientes para se iniciar em alguma profissão. O espaço
e o tempo de ensinar eram determinados (KENSKI, 2012, p.29).

3.2.6 Restrição

O tema restrição demonstra como a tecnologia ainda não está presente no


espaço escolar como um todo, remanescendo em laboratórios de informática ou
salas específicas, como sala multimídia.
Por isso mesmo, o trabalho com tecnologia, por vezes, é dificultado quando o
ambiente destinado aos recursos se encontra fechado ou com equipamentos
deteriorados.
110

Nos anos anteriores a sala de informática, ou seja, os recursos


tecnológicos eram restritos. Ou seja, se danificasse a responsabilidade
era do professor, pois não tem verbas para o concerto. Já neste ano
as portas da sala de informática foram abertas (CÉSAR).

O espaço físico pode se apresentar como uma dificuldade para que o


professor tenha autonomia para o desenvolvimento do seu trabalho e para que
possa ser mais criativo no planejamento de suas aulas.

O ambiente pedagógico tem de ser lugar de fascinação e


inventuidade. Não inibir, mas propiciar, aquela dose de alucinação
consensual entusiástica requerida para que o processo de aprender
aconteça como mixagem de todos os sentidos. (ASSMANN, 1998, p.
29).

Para tanto, o ambiente escolar não deve restringir algumas linguagens ao


ambiente específico. A criança e o jovem se expressam por outras linguagens e o
confinamento dessas múltiplas linguagens representa a negação da expressão do
educando.

3.2.7 Mediação

A mediação é um elemento importante quando se trabalha com educação e


tecnologia e emerge das narrativas. O papel do professor como mediador da criança
que acessa o conhecimento com o auxílio das tecnologias é fundamental na
compreensão de uma aprendizagem efetivamente protagonizada pelo educando. É
possível identificar isso no relato de Marcelo "a medida que ia conhecendo as
crianças e registrando suas capacidades direcionava as duplas".

Nessa escola, que pode ser repensada estruturalmente, desconstrói-


se, na formação, o papel do professor tradicional, que pode então
dedicar-se à mediação de descobertas, de investigação e pesquisa,
construindo o currículo pelo conhecimento compartilhado, a partir dos
interesses dos alunos e no contexto de uma escola em que a
representação do conhecimento seja o resultado do processo de sua
construção (BUSTAMANTE, 2009, p. 31).
111

“Eles são uma geração que sabe mexer na internet, sabe buscar as
informações, mas ainda precisa da mediação do professor para que as informações
sejam transformadas em conhecimento” (DENISE)

esta capacidade para obter acesso ou localizar uma informação é,


com certeza, importante mas as habilidades que as crianças
necessitam com relação aos meios digitais vão muito além. Da mesma
forma que com a letra impressa, também precisam estar em condições
de avaliar e usar a informação de forma crítica para que a possam
transformar em conhecimento (BUCKINGHAM, 2008, p. 195)

Para Demo (2005, p. 12), “parece evidente a dificuldade de transformar as


tecnologias em oportunidades de aprendizagem sem a mediação do professor.
Qualquer artefato técnico implantado na escola só frutifica sob a mediação do
professor”. O que se evidencia da necessidade do professor conhecer e se apropriar
das tecnologias para com elas construir propostas interessantes e significativas para
a construção da aprendizagem dos alunos.
O relato de Sueli nos mostra a importância de uma proposta que encontra
receptividade: "os alunos foram orientados para que em grupos, a exemplo do vídeo
‘História de natal na era da internet’, reinterpretassem e contassem como seriam
divulgados nas diferentes redes sociais os fatos". Após a organização dos grupos,
os alunos produziram materiais ricos que se encontram disponíveis na internet, no
youtube.
A apropriação das tecnologias e a superação do uso utilitarista para uma
alfabetização digital, possibilita novos métodos de ensinar e aprender, num fazer
dialógico, conforme Marcelo "Depois de me apropriar um pouco mais sobre
educomunicação, entendi que não importa as linguagens utilizadas, o giz, a tela, a
fotografia, o desenho na areia, o que importa são as pessoas e suas interações".
Desta forma,

[...] as novas tecnologias não substituirão o/a professor/a, nem


diminuirão o esforço disciplinado do estudo. Elas, porém, ajudam a
intensificar o pensamento complexo, interativo e transversal, criando
novas chances para a sensibilidade solidária no interior das próprias
formas do conhecimento (ASSMANN, 2000, p.7)

O professor como mediador do processo de aprendizagem colabora para o


protagonismo dos alunos e a construção mais significativa e autônoma da
112

aprendizagem. Ao se deparar com essa situação, a aprendizagem também se torna


mais significativa para o professor: "Hoje não consigo ver as minhas aulas sem
nenhuma proposta sem tecnologia, já faz parte da minha dinâmica e rotina" (SUELI).

3.2.8 Reflexão

A preocupação sobre a própria prática docente aparece de forma evidente


nas narrativas dos sujeitos, este tema será nominado de reflexão.

A prática docente crítica, implicante do pensar certo, envolve o


movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer.
[...] O que se precisa é possibilitar, que, voltando-se sobre si mesma,
através da reflexão sobre a prática, a curiosidade ingênua,
percebendo-se como tal, se vá tornando crítica. [...] A prática docente
crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento dinâmico,
dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer (FREIRE P., 1996 p.
38).

Conforme as narrativas se desdobram, é possível perceber a reflexão que


alguns professores fazem sobre suas práticas atuais e anteriores: "creio também
que não sabia deste recurso e fui um pouco tradicional em minha prática docente,
sem muitas mudanças" (CÉSAR).
Ao mesmo tempo em que a reflexão é feita sobre a sua prática, a fala
apresenta uma preocupação com o “ser professor”, deflagrado na narrativa da
Denise “a gente precisa pensar fora da caixinha, a gente precisa pensar diferente,
ampliar os horizontes [...] precisa se despir dessas cristalizações que a gente tem”.
A postura reflexiva do professor permite sempre revisitar sua prática. Da
mesma forma que uma prática pode ser cristalizada por um uso recorrente de
recursos antigos, ela também pode se tornar cristalizada se o uso das ferramentas
tecnológicas seguir um manual, algo pré-determinado, sem a possibilidade criadora
e inventiva por parte do educador, considerando a diversidade de cada grupo.
“Frente às novas tecnologias não cabem nem repulsa, nem encantamento, mas
posição de educador: crítica e autocrítica” (DEMO, 2009, p. 63).
Vê-se a preocupação do Marcelo "A rotina de escrever sobre as atividades no
blog me obrigou a refletir sobre ela, um processo contínuo de avaliação e
sistematização" e a conclusão da Verônica após usos diferenciados de tecnologia,
113

ao repensar o que realmente a faz ter uma prática inovadora. “Tive momentos que
ter o melhor equipamento tecnológico em sala era o mais importante pra mim. Hoje
ter uma metodologia bem estruturada é que faz sentido, a tecnologia é o de menos”.
Por fim, conforme as narrativas permitem interpretar

Uma prática reflexiva leva à (re)construção de saberes, atenua a


separação entre teoria e prática e assenta na construção de uma
circularidade em que a teoria ilumina a prática e a prática questiona a
teoria (ALARCÃO, 2005, p. 99).

A interpretação das narrativas por meio da abordagem hermenêutico-


fenomenológica contribuíram para que os conhecimentos trazidos pelo referencial
teórico pudesse ser verificados, bem como revistos sob outras perspectivas. Tal
interpretação revela o momento em que a pesquisa foi realizada, podendo-se chegar
a novas percepções no futuro que poderão desvelar novos conhecimentos.
114

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A realização deste trabalho possibilitou descortinar diversos autores e suas


teorias que contribuem para a compreensão e ampliação da relação estabelecida
entre educação, comunicação e tecnologia.
Tal relação se forja nas fronteiras que as áreas ocupam, mas também pela
crescente produção acadêmica com um olhar interdisciplinar, reconhecendo a
necessidade de superação do olhar cartesiano para a produção do conhecimento.
Nesse sentido, reconhece-se a educomunicação como uma nova área de
conhecimento que nasce do hibridismo entre educação e comunicação. Várias
produções têm sido realizadas com o intuito de situar essa nova área de
conhecimento, bem como dar visibilidade à proposta que diversos profissionais têm
realizado no âmbito da educação formal e não formal. Vale ressaltar a conquista da
educomunicação como curso de graduação e pós-graduação da Escola de
Comunicação e Arte da Universidade de São Paulo, no âmbito regional.
Os autores abordados advêm de variadas áreas do conhecimento, mas seus
constructos buscam a compreensão e idealização de uma sociedade melhor, seja
quais perspectivas adotem.Como ressalta Demo (2009, p. 77) “o desafio de
integração das novas tecnologias, não para nelas se afogar, mas para renascer”.
Verifica-se assim a possibilidade criadora e inventiva que a tecnologia pode
proporcionar ao ambiente escolar, ressaltando-se para isso a atuação crítica dos
sujeitos que dela participam por meio da assunção da tecnologia de forma
emancipada e fundamentada.
Admite-se nesta pesquisa a intenção clara pela busca do fazer científico com
o objetivo de pensar uma sociedade mais participativa, emancipada, promotora da
autonomia dos seus indivíduos e, por isso, a opção pelo trabalho com autores de
linha marcadamente militante nessas perspectivas.
Os temas encontrados na análise das narrativas dos participantes da
pesquisa colaboram para responder a pergunta de pesquisa: que percepções
emergem quando professores refletem sobre suas práticas com tecnologia em sala
de aula? O percurso da investigação seguiu alguns objetivos delimitados: verificar
em que medida a formação inicial e/ou continuada contribuía para tal prática;
analisar em que medida a prática com tecnologia em sala de aula permite o
115

protagonismo dos alunos na produção de conhecimento; perceber que sentidos os


professores atribuem às suas práticas quando fazem uma (auto)reflexão; por fim,
demonstrar possibilidades e potencialidades no uso das tecnologias em sala de
aula.
Nota-se que a formação inicial ainda não contribui para que os professores
tenham uma prática com o uso de tecnologia. No entanto, a formação continuada
apresenta-se como uma alternativa importante no que concerne à busca por cursos,
a formação entre pares e mesmo a aprendizagem que se dá entre professores e
alunos quando ambos decidem criar um ambiente de colaboração mútua para a
aprendizagem.
Verifica-se que as diferentes práticas com o uso da tecnologia são motivadas
por alguns fatores internos e externos, sendo os externos o convite de um professor
parceiro de trabalho, por exemplo, e como fator interno destaca-se uma busca
intensa para uma prática que seja significativa para os alunos.
Portanto, a relação de parceria é fortemente marcada nas narrativas dos
participantes pesquisados como possibilidade de promoção do trabalho, relevando-
se a grande preocupação para que os alunos desenvolvam sua autonomia e sejam
protagonistas do processo pedagógico com o uso de tecnologia.
Admite-se o uso mais fluido das tecnologias por parte dos alunos, mas
evidencia-se a necessidade do professor, na figura do mediador, provocador e
grande incentivador, para o desenvolvimento do olhar científico dos alunos. Nesse
sentido, a alfabetização digital ou alfabetização multimídia (MARTÍN, 2014) se dá na
relação entre professores e alunos, porque ambos descobrem novas possibilidades
e se apropriam das linguagens que os meios de comunicação digital e recursos
tecnológicos possuem.
Revela-se ainda que o uso das tecnologias de forma planejada e intencional
pelo professor permite que os alunos tenham uma experiência formativa mais
significativa e relacionada à sua realidade, oportunizando que o uso dos recursos
não esteja restrito a um espaço físico, mas que possam os recursos e as linguagens
permearem e permanecerem nos diversos espaços da escola.
Por fim, as reflexões que os professores participantes da pesquisa fizeram
sobre suas práticas foram fundamentais para que se chegasse aos temas
encontrados, mas foi possível identificar que esse processo de autoreflexão é uma
constante na prática pedagógica desses professores que buscam significar suas
116

aulas, bem como inovar, tendo como sujeito participativo nessa avaliação e prática,
seus alunos com suas opiniões e sugestões.
Assim, aponta-se a pesquisa narrativa (auto)biográfica (NÓVOA e FINGER,
2010) e a abordagem hermenêutico-fenomenológica (FREIRE, 2012) como de
extrema importância para a obtenção dos resultados que se frisa, mais uma vez, é
resultado do olhar interpretativo do pesquisador para as narrativas dos participantes,
junto do arcabouço teórico levantado.
Espera-se que a pesquisa possa trazer contribuições para as áreas da
educação, comunicação e educomunicação, compreendendo que a partir dos
levantamentos realizados e dos resultados obtidos, novas temáticas e possibilidades
de estudo se abrem.
Por fim, releva-se a extrema importância que a presente pesquisa possibilitou
para que novos conhecimentos fossem construídos e outros olhares descobertos, na
crença de que este estudo se encerra contribuindo para que novas aprendizagens,
reflexões e conhecimentos possam se realizar o futuro.
117

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Apêndice A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

UMESP – UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO

Programa de Pós Graduação Mestrado em Educação

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Eu, Bruno Tonhetti Galasse, RG nº 43.718.117-0, mestrando do Programa de Pós


Graduação Mestrado em Educação da Universidade Metodista de São Paulo, sob a
orientação da Profa. Dra. Adriana Barroso de Azevedo, proponho o
desenvolvimento da pesquisa intitulada “Narrativas de práticas em educação e
tecnologia: a trajetória do professor digital” que tem por objetivo verificar o que
emerge nas narrativas de experiência de professores da educação básica que têm
práticas destacadas com o uso de tecnologias digitais da informação e
comunicação em sala de aula. Para a coleta de dados será realizada a aplicação de
uma pesquisa narrativa com entrevista dos sujeitos pesquisados.

ESCLARECIMENTOS:

1. A participação nesta pesquisa é de livre escolha com a garantia de sigilo de


identificação dos sujeitos que se dispuserem a participar e, ainda, retirar seu
consentimento em qualquer fase da pesquisa, sem penalização alguma.
2. A pesquisa narrativa e/ou o relato de experiência não envolverão nenhum tipo
de custo para os participantes.
3. A participação na pesquisa não possibilita desconforto ou risco ao participante
por se tratar de realização de uma entrevista, pautada em diálogos, e na
produção de texto das narrativas poderá ser revista a qualquer momento
pelos participantes.
4. A qualquer momento o participante poderá declinar da pesquisa.

São Bernardo do Campo, 10 de Mario de 2016.

_______________________________________________

Bruno Tonhetti Galasse


Apêndice B – Narrativas dos sujeitos da pesquisa

Prof. César Augusto do Padro Moraes


Irei relatar uma prática com os 8os anos sobre o conteúdo de construção de prismas
regulares. Primeiramente utilizei o livro didático para apresentar o conteúdo e
desenvolver um referencial teórico. Assim, fizemos a resolução de alguns exercícios.
Logo após fui para a sala de multimídia e apresentei alguns vídeos do youtube sobre
prismas, planificação, construção, definição e classificação. Depois fomos para a
sala de informática e apresentei o app Geogebra. Em primeiro lugar eles conheciam
suas funções, seus recursos e expliquei que é um programa de geometria dinâmica,
que poderíamos fazer os prismas em 3D. Logo em seguida realizamos uma
pesquisa no youtube sobre vídeos de como utilizar o geogebra para construir
prismas – um tutorial. Assim, construímos os prismas com todos os recursos que
são disponibilizados no geogebra.
Seguem alguns exemplos:
E como foi a recepção dos alunos por usar multimídia? Era algo recorrente ou
você mudou a sua prática?
A recepção dos alunos fui de forma bem receptiva, agradável. Teve uma motivação.
Eu nunca tinha usado os recursos do geogebra. Fui uma mudança em minha prática
sim. Sabe, para mim também foi novo, pois não sabia muito como utilizar. Tinha um
conhecimento superficial e com isso também aprendi muito. Eu e os alunos
estabelecemos trocas de conhecimento de ambas as partes. Eu sobre os conteúdos
matemáticos que pude auxiliar na construção dos prismas e eles me ensinaram a
descoberta de novos recursos disponíveis no geogebra
Fui muito novo e gratificante para ambos. Tanto para mim professor como para os
alunos.
Com isso, também pude perceber que a relação professor aluno foi estabelecida
com mais confiança e o processo de ensino aprendizagem de um conteúdo de
geometria como prisma, o qual não é bem recebido pelos alunos por ser
considerado complexo, foi construído de forma contextualizada e significativa e
assim, conseguimos discutir e dialogar. A forma dos prismas com a forma de
embalagem é muito cotidiana na vida dos alunos.
Foi um trabalho em que pude verificar um bom rendimento escolar por parte dos
alunos e também consegui estabelecer uma formação continuada no contexto
escolar, a partir de uma prática escolar junto aos alunos.
E como você chegou ao Geogebra?
Em minha formação inicial tive algumas práticas na universidade, mas depois nunca
mais tinha utilizado. Este ano verifiquei que este recurso estava disponível nos
computadores da sala de informática da escola em que trabalho. Assim, construí um
planejamento para utilizá-lo.

O que fez você pensar isso nesse ano e nos anos anteriores não? Quando se
formou?
Nos anos a sala de informática, ou seja, os recursos tecnológicos eram. Ou seja, se
danificar a responsabilidade era do professor, pois não tem verbas para o
concerto. Já neste ano as portas da sala de informática foram abertas. Os motivos
ainda não sei. E também fui provocado por minha orientadora do doutorado a
realizar práticas com tecnologia para o desenvolvimento de minha pesquisa. Creio
também que não sabia deste recurso e fui um pouco tradicional em minha prática
docente, sem muitas mudanças.
Você acha que sua formação inicial tendo trabalhado com tecnologia propiciou
que você chegasse de forma mais aberta, disponível, para trabalhar com
tecnologias e, em especial, com o geogebra?
Não acho, pois em minha formação inicial a apresentação da tecnologia educacional
ocorreu de forma muito superficial. E o geogebra foi um caso isolado de
apresentação.
Você pretende continuar trabalhando com tecnologia?
Sim, com certeza, pois a prática desenvolva esse ano pode gerar um maior
interesse nos alunos. Pelos estudos da matemática também pude observar uma
maior participação, preocupação e responsabilidade pelos discentes e também uma
melhora significativa no rendimento escolar.
Qual a principal diferença que você nota entre as turmas anteriores sem
tecnologia e essa?
Sem tecnologia as turmas não eram participativas em sala de aula. Agora com a
tecnologia eles perguntam mais e estabelecem um diálogo entre aluno e aluno e
também entre aluno e professor em relação ao conteúdo ministrado e no
esclarecimento de dúvidas.

Profa. Denise Evelin Cabral Ramos

Meu nome é Denise, sou professora da rede do município de São Bernardo do


Campo. Este ano dou aula para uma turma de 5º ano do ensino fundamental de 9
anos. Eu me formei no magistério em 2003, uma das últimas turmas e, atualmente,
sou aluna do curso de Pedagogia pela Universidade Metodista, pelo programa
PARFOR.
O objetivo deste relato é falar um pouco das minhas práticas, das minha
percepções, das minhas observações relacionadas à educação e tecnologia. Meu
primeiro contato com as ferramentas tecnológicas relacionas à educação foi quando
eu entrei na prefeitura de São Bernardo do Campo em agosto de 2011.
Mas naquele momento, não fez sentido para mim. Eu entrei substituindo uma
professora que estava afastada. Ela tinha deixado um planejamento. As crianças
estavam explorando o jardim da escola e elas precisavam fazer uma ficha técnica
das plantas do jardim da escola. Elas iriam usar o computador para isso. Então,
tinha um site específico em que já tinham todas as informações contidas. A
professora deu um site para eles. E, daquele site eles precisaram extrair as
informações e montar. Era um PowerPoint que depois seria juntado e ficaria uma
espécie de livrinho.Como ela se afastou eu acabei pegando esse trabalho. Mas,
para mim não fazia muito sentido porque eu acho que a gente poderia fazer aquilo
numa cartolina ou folha de sulfite.
No ano de 2012 eu fui trabalhar em outra escola por reorganização da rede. Nessa
escola que fui trabalhar, por ser uma escola nova, não tinha o laboratório de
informática, mas tinha uns netbooks, os laptops educacionais. Eu também não me
envolvi muito, passou o ano todo, era a professora que faltava bastante e só quem
poderia pegar os netbooks era aquela professora. A gente não tinha autonomia para
desenvolver atividades sem aquela professora responsável.
No ano de 2013 por uma questão de organização da rede, eu mudei de escola
novamente. E, nessa escola eu comecei a entender o real significado do
relacionamento entre educação e tecnologia. É um relacionamento, porque são duas
coisas que, na atualidade, são quase que inseparáveis, não vou falar que são
totalmente inseparáveis, são duas coisas que são quase inseparáveis. E aí, como
uma professora chamada Sierlei. Ela fez uma proposta e eu aceitei.
E a proposta foi a seguinte: ela queria que eu desenvolvesse um blog, mas esse
blog não era para ser alimentado por mim com fotos dos alunos sobre as atividades,
era um blog da sala. Mas, a proposta que ela me fez foi a seguinte: que esse blog
era para ser construído pelas crianças, não só alimentado com fotos e vídeos. E
então fiquei pensando no que a gente poderia trabalhar e resolvi aliar a construção
desse blog a um conteúdo de ciências que eu tinha que trabalhar com as crianças.
E ali pra mim começou a se abrir um leque de possibilidades porque você precisa,
enquanto professor, para você aderir ao novo, você precisa se desconstruir. Então
eu precisei me desconstruir porque você nestes momentos, aliás, na maioria dos
momentos, praticamente todos, eu não tinha controle do que eles estavam fazendo
e isso é difícil, né!? Você conseguir lidar com a falta de controle da situação, mas
não é para o lado ruim. O que a gente precisa entender enquanto professores, é que
quando você lida com essa “falta de controle” na verdade, os seus alunos estão
adquirindo autonomia. Então, muitas vezes no decorrer desse trabalho com blog,
quem passasse pela minha porta achava que estava uma bagunça, mas não era,
porque eles estavam discutindo, resolvendo problemas, dialogando, estavam se
ajudando. Então, ali estavam acontecendo construções de várias coisas, de
relacionamento, de interações, além da construção do conhecimento do conteúdo
que a gente precisava estudar.
Bom, e qual era a proposta do blog?Nós começamos bem devagarinho até por
minha conta mesmo, porque era novo então a gente precisava caminhar aos
poucos. A gente vai aprendendo nesse percurso, a gente vai construindo mais
conhecimento.
A proposta do blog era: a gente fazia uma experiência, como já falei, o tema do blog
era ciências. A gente ia estudar as plantas. O objetivo do blog era estudar as
plantas. Então, a gente fez um experimento. Nós plantamos feijão dentre de um pote
e colocamos na janela e plantamos dentro de um outro pote e colocamos no
armário. Esperamos que essas sementes brotassem e depois de quase quinzes
dias, nós pegamos os dois potes, o que estava na janela e o que estava no armário,
e fizemos comparações.
Essas comparações foram postadas no blog porque inicialmente como eu fazia: eu
colocava uma pergunta no blog e as crianças respondiam nos comentários. Então,
usando os laptops educacionais, eles se sentavam em grupos e respondiam a
pergunta eu tinha feito, nos comentários. Eu lançava uma pergunta e eles tinham
que levantar uma hipótese. Foi o que aconteceu, eu coloquei “Será que essa planta
que eu vamos colocar no armário vai morrer? O que acontecerá com ela?” Então,
eles colocavam as hipóteses nos comentários e depois discutíamos, validávamos ou
refutávamos as hipóteses e registrávamos no blog o resultado, nos comentários.
Assim foi o percurso de experiências. Só que, o que aconteceu!? Nós não ficamos
só na questão dos comentários. Conforme a gente foi se apropriando do uso do
blog, daquela ferramenta, eu fui abrindo para eles. Eu criei uma conta de email para
a turma e dei a senha para eles. Eles podiam entrar no blog como colaboradores. E
aí eles criavam posts no blog. Então, por exemplo, teve uma parte do que a gente
fez que cada grupo precisava plantar e regar as suas sementes.
Interessante né!? A gente pressupõe que eles sabem fazer tudo. Parece uma coisa
muito fácil plantar feijão e aí teve grupo que colocou muita água, teve grupo que
esqueceu de regar, teve grupo que fez direitinho e, no final, umas cresceram, outras
não, mofaram, estragaram... Isso era uma coisa que eles tinham que registrar no
blog. Mas, eles não era mais no comentário. Nós estávamos num ponto em que eu
não fazia mais os posts. Eles que faziam. Eles criavam título, colocavam uma
sínteses um texto pequeno, colocavam fotos e então eles estava manuseando a
máquina digital, aprenderam a descarregar fotos; eles aprenderem a entrar nos
comentários; a editar o texto; a inserir fotos. Foi muito bacana porque fomos
caminhando devagar, esse trabalho durou uns 6 meses. A gente foi caminhando
devagar, no começou eu tava meio receosa, ressabiada, por deixar eles mexerem
no blog, então eles começaram comentando e depois fui abrindo de tal forma que
quem alimentava passou a ser a turma e não mais eu.
Hoje, eu olho para essa atividade e vejo a importância do uso das ferramentas, dos
recursos tecnológicos aliados ao processo de educação, construção do
conhecimento.
Quando a gente pensa em autonomia, no relacionamento com o outro, no
desenvolvimento do raciocínio. Porque, às vezes, a gente pensa: eles são nativos
digitais, já sabem tudo. Mas, não, eles não sabem tudo. Eu estava trabalhando com
minha turma desse ano, na quarta-feira, no laboratório de informática, e
precisávamos fazer o cadastro em um site. Eu dei para eles o email que íamos usar
e embaixo do email tinha uma senha. E, alguns alunos não sabiam diferenciar o que
era o endereço de email e o que era senha. Então, eles são uma geração que eles
sabem mexer na internet, sabem buscar as informações, sabem “buscar as
informações”, mas ainda precisa da mediação do professor para que as informações
sejam transformadas em conhecimento.
Então, por exemplo, muitos alunos, minha turma é de 5º ano, eles tem 10, 11 anos,
alguns já tem 12 anos, mas eles não têm conta de email. Eles não têm acesso à
esse tipo de comunicação que é via email. O negócio deles é youtube, são vídeos,
são músicas, whatasapp, às vezes.
Eles não usam a internet, às vezes, os recursos tencológicos da forma como
pensamos. E aí vem um papel que é fundamental do professor que é mediar tudo
isso. Mostrar ao aluno que essas ferramentas estão a favor da educação e a favor
do conhecimento dele.
No começo, aquilo que não fazia sentido para mim, aquilo que eu achava que
poderia fazer no papel, hoje eu vejo diferente. Eu vejo que a questão do aluno com
os recursos tecnológicos estão muito além daquilo que a gente possa imaginar e,
atualmente, eu até vejo que o uso de tecnologias na escola deveria ser uma área do
conhecimento, assim como matemática, língua portuguesa, ciências... Porque da
mesma forma que a gente pode trabalhar integrado com as outras áreas do
conhecimento, algumas coisas são da própria área da tecnologia, por exemplo,
quando a gente trabalha com programação.
Por que eu falo isso? Porque hoje o que eu vejo. Hoje a tecnologia não está apenas
para pensar na realização de um produto final para a sala de aula. Não precisa,
necessariamente, desenvolver trabalhos que estejam relacionados aos conteúdos
de sala de aula. Mas, não significa que desenvolvendo os trabalhos o aluno não terá
que mobilizar conteúdos que aprendeu na sala de aula.
Por exemplo, esse ano estou trabalhando com meus alunos programação com um
aplicativo chamado Scratch. Quando a gente vai programar e tem os personagens
que precisamos movimentá-los. Temos um espaço que é delimitado pelo plano
cartesiano, então temos os eixos X e Y. Tem -180° e +180°, -240° até +240°. Então
para que o aluno consiga determinar o espaço em que aquele objeto vai ser mover,
ele precisa compreender o que é o eixo X e o eixo Y. Precisa compreender porque -
240° até +240° e porque -180° até +180°, o aluno precisa compreender isso.
Então, quando digo que a tecnologia deveria ser trabalhada nas escolas como área
do conhecimento, então ter objetivos específicos para a área. Eu acredito que seria
muito importante não só para o aluno, mas para o professor também, porque a gente
precisa pensar fora da caixinha, a gente precisa pensar diferente, ampliar os
horizontes. Eu sei que é difícil, é complicado sair da zona de conforto e que envolve
muito mais coisas, porque envolve o processo de formação, a formação continuada,
a formação de qualidade. Não é simplesmente você chegar e entrar no laboratório e
colocar os alunos na frente do computador. Não, você precisa saber o que quer. O
que eu vejo muito que acontece é que aqui na prefeitura de São Bernardo do
Campo, tem uma professora que é responsável pelo laboratório e muitas
professoras deixam o trabalho nessa professora. O que eu observo muitas vezes é
que a professora do laboratório, às vezes, está lá com os alunos intervindo e a
professora está fazendo outra coisa, não está nem percebendo o que está
acontecendo. Ela não tem ideia de como fazer, desenvolver aquilo que a professora
do laboratório está fazendo com as crianças.
Então, o professor de sala de aula acaba não se inteirando. Porque nós pensamos
em caixinhas, laboratório/laboratório e sala de aula/sala de aula. Por isso que eu
penso que deveria ser considerando como área de conhecimento, porque a partir do
momento que entrar no currículo: “opa, eu preciso pensar nisso”, “Como que vou
pensar nisso?”, “Como que eu vou aliar isso a tudo que estou trabalhando?”, ou não,
como eu falei anteriormente, nós estamos trabalhando com linguagem de
programação. Não relacionado ao conteúdo específico da sala de aula, nós estamos
criando jogos de modalidades olímpicas, por conta das olimpíadas, jogos
relacionados às modalidades olímpicas. Eu não trabalhei olimpíadas na sala de aula,
embora eles tenham trabalhado em educação física, embora eles tenham trabalhado
em arte. Mas, como conteúdo da sala de aula, não foi trabalhado, mas eles precisam
mobilizar uma série de conhecimentos que são trabalhados na sala de aula para que
possam desenvolver esse trabalho, então é bem interessante.
Essa é a minha mudança de percepção relacionada à tecnologia.
Eu considero que essa atividade do blog foi muito legal, por ter sido a primeira, eu
considero que foi muito bacana. Porque ali foi uma completa desconstrução. Criar
email para eles. Dar senha para eles. “olha, eles vão acessar”; “ah meu Deus, o que
eles vão fazer”. E aí eles também se perceberem naquela situação de protagonistas.
Não é mais a professora que posta. “Agora é a gente posta”. Não é mais a
professora que tira foto. “É a gente que tira foto”.
Então, eu considero que essa atividade com blog foi uma das primeiras, mas ela foi
bem interessante porque ela foi o disparador para mim dessa questão da relação
entre educação e tecnologia.
E hoje eu vejo assim, a gente precisa continuar se formando, buscando. O professor
precisa continuar sempre buscando, não dá para parar. Cada ano entra um aluno
novo, novo no sentido que ele vem com uma bagagem diferente, com
conhecimentos diferentes, vem de um mundo diferente porque o mundo a cada dia
vai se modernizando e aí, os alunos vão trazendo para a sala de aula tudo isso que
eles absorvem do mundo lá fora. E como que a gente, professor, lida com isso, na
sala de aula, com esse aluno que já é mais autônomo e por várias questões. Essas
questões não só relacionadas à tecnologia. O aluno é mais autônomo hoje porque
os pais trabalham mais, ele passa mais tempo sozinho, então ele precisa se virar. E
aí ele chega na escola e a gente quer colocar ele numa forminha e não entende
porque que o cara não se encaixa ali. Porque ele vem com uma bagagem de fora e
a gente acaba, às vezes, desconsiderando isso.
E a tecnologia vem para salvar o professor de tudo isso, parece engraçado, pra
libertar a gente de tudo isso, porque a gente precisa se despir dessas cristalizações
que a gente tem, desse pensamento engessado e perceber que dar autonomia que
proporcionar ao aluno que ele seja protagonista do processo é benéfico para ambos,
tanto para aluno quanto para o professor. O fato do aluno ser protagonista do
processo não significa que o professor sumiu, significa que o professor está de fato
desenvolvendo seu papel enquanto mediador daquele processo.

Prof. Marcelo Augusto Pereira dos Santos

A experiência de ser Professor Orientador de Informática Educativa na Educação


Infantil foi extremamente singular e reflexiva. No Ensino Fundamental já faz parte a
presença do Laboratório de Informática, agora nas EMEIs19 da cidade São Paulo
são pouquíssimos casos. Na época, 2010, eram em torno de 6 POIEs20 na Diretoria
Regional de Pirituba Jaraguá.
Por isso o primeiro desafio era realizar um trabalho que pudesse ser visto, acessado
tanto pela comunidade das escolas (por questões de carga horária eu trabalhava em
duas unidades EMEI Eunice dos Santos e EMEI Antônio Munhoz Bonilha) como
também pelos professores das unidades e das demais escolas.
Por isso o projeto inicia-se com dois desafios: como utilizar as tecnologias com
crianças? Como publicizar este processo? Então desde o início surge o blog
Apertaqual. E ele é fundamental para esta experiência.
Estava consolidado para os professores da escola que os computadores deveriam
ser usados para jogos, apenas isso, inclusive para mim. Ao longo do tempo fui
explorando novas possibilidades, de produção de texto, de integração dos jogos com
o currículo proposto da escola, criar sequências de atividades entre as aulas. Penso
que uma experiência de construção coletiva, eu junto com as crianças e o blog. A
rotina de escrever sobre as atividades no blog me obrigou a refletir sobre ela, um
processo contínuo de avaliação e sistematização. Isso foi bem interessante, o blog
contribuiu na qualidade das atividades.
As atividades foram ficando cada vez mais diversas e complexas. Impediu uma certa
acomodação de minha parte.

19
EMEI – Escola municipal de educação Infantil
20
POIE – Professor orientador em informática educativa
Hoje, depois de participado da construção do documentário 21 o uso da tecnologia e
linguagem midiática na educação infantil sigo a linha do documento de acreditar que
esta organização de espaço - um laboratório de informática com um professor de
informática com uma aula na "grade" para cada turma - não faz muito sentido, pois
na educação infantil as linguagens se integram, se relacionam

Como foi a participação das crianças?

Por uma opção eu sempre colocava as crianças em duplas. Isso foi muito
importante, a medida que ia conhecendo as crianças e registrando suas
capacidades direcionava as duplas. Muitas discussões ocorriam entre elas, pois
enquanto um estava com o mouse o outro dava opinião em tudo. A maioria, em boa
parte do tempo, organizava bem esta dinâmica (Primeiro você, depois eu) no uso
dos computadores. O objetivo era um uso totalmente autônomo, as turmas de seis
anos chegavam em um LIE22 com computadores desligados. Tinham que ligar,
colocar a senha, acessar o software, fechar todas as telas e depois desligar.
As crianças menores, no início, tinham dificuldades em segurar o mouse. Então
começava por aí, uma aprendizagens mais técnica, utilitarista mesmo.
A dinâmica das aulas era a seguinte: primeiramente a roda de conversa para: definir
a proposta do dia, contar uma história ou avaliar a aula anterior. Depois as duplas
eram formadas para o uso do computador.
Superado o desafio da ferramenta o uso pelas crianças é muito intuitivo e curioso. O
"aperta qual, prô" era cada vez mais raro.

Como se deu seu interesse por unir a tecnologia à educação? Qual foi a
contribuição da sua formação inicial para isso?

Eu fiz ETEC paralelamente ao Magistério. Sou técnico em informática. E me tornei


POIE para juntar estas duas áreas. Se fosse só minha formação inicial dentro do
magistério não foi suficiente para me subsidiar no uso de tecnologia. A experiência

21
Doc – Documentário. Mais informações sobre o assunto tratado por Marcelo aqui:
http://portal.sme.prefeitura.sp.gov.br/Portals/1/Files/17138.pdf
22
LIE - Laboratório de informática educativa
do LIE me provocou a pensar mais na utilização das linguagens midiáticas com
propósitos pedagógicos e daí percebi que não tinha formação suficiente.
Contudo, eu fui ser POIE justamente na escola que criou o que seria a Primeira
Rádio Infantil... a Rádio Jacaré FM. Na inauguração da Rádio, com presença de
autoridades, também estavam presentes alunos de uma EMEF, da Rádio Graciosa,
para cobrir o evento. Ali conheci a Educomunicação. Ela, ao longo do tempo, se
tornou o pano de fundo, a base conceitual para a integração das linguagens
midiáticas nos processos educativos.

Como foi o início? Algo mais autônomo? A formação continuada te ajudou?

Começa livremente sim. na tentativa e erro. Depois de um tempo como POIE uns
três meses, comecei a participar de dois processo formativos: encontros entre os
POIEs de EI, organizados pela DRE-PJ, conheci os outros LIEs, atividades, etc. um
espaço de troca provocado pela mediadora da DRE-PJ.
O outro eram as formações oferecidas pelo Programa Nas Ondas do Rádio, fiz os
cursos: Aprender e Comunicar, Gestão de Projetos Educomunicativos e Nas Ondas
do Vídeo.
Quando realizei minha formação com Especialista em Educomunicação já não
atuava mais no LIE.
Depois de me apropriar um pouco mais sobre educomunicação, entendi que não
importa as linguagens utilizadas, o giz, a tela, a fotografia, o desenho na areia, o que
importa são as pessoas e suas interações.
A tecnologia ainda não substituiu o contato e o sentimento humano, pois penso que
é a troca de emoções e sensações que produz conhecimento marcantes.

Profa. Sueli Rosa Gama Medeiros

Conteúdo: Formas de sociabilidade e tecnologias de informação, este conteúdo


está presente no material didático da Rede SESI.
Expectativa de ensino e aprendizagem: Reconhecer os impactos das novas
tecnologias de informação, do desenvolvimento científico e da globalização nas
relações sociais.

Iniciei as atividades com aulas expositivas e dialogadas, com o objetivo de


apresentar e discutir com os alunos o conceito de tecnologia, desenvolvimento
científico e globalização. Para tanto, trabalhei com textos relacionados ao tema.
Discuti com as turmas o tema O mundo da internet na vida cotidiana, apresentando
para os alunos algumas indagações acerca desta temática.
Após as indagações, apresentei para as turmas os vídeos "História do natal na era
da internet", disponível no link https://www.youtube.com/watch?v=nkZBcZ-mkQE e
“Zygmunt Bauman - A amizade Facebook”, disponível no
link https://www.youtube.com/watch?v=5Lm2O3Q56Wg.
Após a exibição dos vídeos discutimos a questão:
Como essas novas tecnologias mudaram a nossa maneira de perceber o que está
ao nosso redor?
Finalizando a proposta, em sala de aula relacionamos o tema das inovações
tecnológicas com o dia-a-dia dos alunos. Discutimos como as atividades de estudo
se modificaram nos últimos anos, mostrando que eles (alunos) são parte do grupo
de atores sociais que influenciam a tecnologia e são por ela influenciados. Para
sistematizar os temas aqui discutidos, os alunos foram orientados para que em
grupos, a exemplo do vídeo “História de natal na era da internet”, reinterpretassem e
contassem como seriam divulgados nas diferentes redes sociais os fatos listados a
seguir ou tema sugeridos pelos próprios alunos na era da internet:
a) O casamento do Príncipe Charles e Lady Diana;
b) A Odisseia;
c) A História do “descobrimento” do Brasil;
d) A Independência do Brasil;
e) Uma comunidade virtual com Homero, Miguel de Cervantes, Dante Alighieri e
suas principais personagens.

O resultado desta proposta você pode ver nos links abaixo, são blogs/sites
elaborados pelos próprios alunos, é também um dos recursos tecnológicos que
utilizo nas minhas aulas.
http://cincomosqueteiros.wixsite.com/alssw
http://segundo-a-historia.webnode.com/inconfidencia-mineira/
http://acontecimentoshist.wixsite.com/acontecimentosht/historias-na-era-digital
http://passinhodoromano21.wixsite.com/caminhandonahistoria/tecnologia-e-suas-
influencias

Essa ideia não partiu da minha formação inicial, mesmo pois quando me formei o
tema tecnologia não fazia parte parte dos debates acadêmicos como hoje. O que
motiva trabalhar desta forma com certeza é a busca por aproximar alguns temas da
realidade dos meus alunos.
Trazer alguns temas para serem adaptados à realidade dos alunos motiva a sua
participação e consequentemente facilita esse processo de aquisição e produção de
conhecimento.

Quando e como se deu sua primeira proposta de trabalho com o uso da


tecnologia? De onde surgiu essa possibilidade?

Não consigo precisar a data exatamente, mas desde de 2010 procuro sempre
trabalhar com uma proposta que envolva as novas tecnologias. A possibilidade
surgiu quando percebi que poderia atrelar essa ferramenta à aprendizagem dos
alunos, pois é algo que eles gostam e muitos dominam muito bem.
A sua pergunta me fez relembrar de um trabalho desenvolvido em 2010 com uma
turma de 9º ano sobre o período da Ditadura Militar no Brasil, eles tinham alguns
temas e deveriam produzir um vídeo explicitando o tema do grupo.
Você pode verificar um dos vídeos de 2010 no link a seguir:
https://www.youtube.com/watch?v=KMqqTAoiqSE

Para o uso da tecnologia e das propostas você discute com colegas, faz
formação, como é para se atualizar?

Procuro me atualizar buscando informações e formação online, geralmente discuto


com os colegas quando o trabalho é interdisciplinar.
Entretanto é com os alunos que vejo algumas possibilidades para trabalharmos
alguns conteúdos e propostas.
Como você percebe a sala com e sem propostas com tecnologia?

Eu vejo que em muitas propostas os alunos se envolvem, veem nesse recurso uma
aliada para a própria aprendizagem. É lógico que numa sala de aula tem aqueles
que dominam demais esses recursos, outros que embora sejam nativos digitais
apresentam um certa dificuldade, por isso procuro fazer um trabalho colaborativo,
onde um ajuda o outro, mostro produções de anos anteriores, deixo que eles
também sugiram técnicas, aplicativos, etc. isso com certeza favorece a qualidade de
alguns trabalhos.
Hoje não consigo ver as minhas aulas sem nenhuma proposta sem tecnologia, já faz
parte da minha dinâmica e rotina.

Profa. Verônica Martins Cannattá

Eu tenho 42 anos, sou socióloga, com pós em sistema de informação e estou no


segundo semestre do mestrado em educação.
Estou em sala de aula e trabalho com Tecnologia Educacional desde 1994.
Eu gostaria de relatar pra você uma das experiências que eu considero mais
significativas da minha trajetória eu faço a mediação numa oficina de
educomunicacao com alunos de 5o ano ao Ensino Médio. A produção que eu vou te
relatar é de 2015.
Neste ano eu tinha 88 alunos na oficina. A oficina é anual e sempre temos um
produto já fizemos revista impressa, reportagens pra webtv e rádio do colégio, mas
eu queria produzir em um ebook com eles pelo fato de perceber que cada vez mais
eles estão nos dispositivos pessoais ou do próprio colégio fazendo leitura digital e
consumindo que informação, mas fazer um ebook poder ser mais do que uma
simples "tarefa". Eu queria que tivesse significado para eles e não para mim, Muitas
vezes o professor monta uma sequência didática brilhante com objetivos claros, mas
o aluno não se envolve porque não vê sentindo, apenas cumpre tarefa, literalmente.
Então, para tentar virar esse jogo, elaborei uma estratégia de sensibilização.
Na primeira aula, sem mencionar nada sobre o e-book, comentamos sobre o vídeo
sentimentário que você encontra facilmente no Youtube.
Disponibilizamos o link de acesso ao vídeo no ambiente Moodle das oficinas, como
pré-requisito para a primeira aula. O vídeo, disponível no Youtube, narra a história
de um menino que, apaixonado pela flor do Manacá, decide buscar no dicionário o
significado da sua flor preferida. A situação-problema, na visão do menino,
apresenta o dicionário como um livro de definições “chatas” das palavras e não
portador da beleza de significados que elas têm. O menino decide, então, criar o seu
próprio dicionário cheio de sentimentos, cores e sabores com o nome Sentimentário.
Na aula, discutimos se eles concordavam com o menino, o que achavam do
dicionário. Depois, propus uma dinâmica.
O Sentimentário da Dante Em Foco: apresentamos quatro palavras relacionadas à
nossa oficina: fotografia, rádio, telejornalismo e análise de mídia, para que os alunos
as definissem, utilizando-se dos tablets em no aplicativo gratuito Padlet. O produto
final dessa aula foi a confecção coletiva de quatro murais digitais.
Na segunda aula, abordamos outro vídeo. Disponibilizamos o link de acesso ao
vídeo no ambiente Moodle das oficinas, também como pré-requisito para esta
segunda aula. Trata-se de uma reportagem do Fantástico sobre o livro Casa das
Estrelas: o universo contado pelas crianças, escrito pelo professor colombiano Javier
Naranjo, que reúne definições poéticas dadas por crianças, definições essas
coletadas por quatro anos.
Ainda nesta aula, dialogamos com as crianças sobre os dois vídeos (o curta de
animação exibido na aula anterior e a reportagem do Fantástico) perguntando-lhes
se havia relação entre eles. Após a reflexão e relatos orais dos alunos, fizemos,
sentados em roda, uma dinâmica mostrando folhas de sulfite com palavras
impressas, por exemplo, óculos, janela, cadeira, professor, escola, jornal, rádio e
etc... Propusemos aos alunos a elaboração de definições orais de um jeito diferente,
não do jeito como o adulto fala, do senso comum ou como o dicionário apresenta,
mas sim como uma criança falaria. Tivemos respostas muito interessantes, como:
“tempo” é “aquilo que já passou”, “fotografia” é “o passado congelado”, “óculos” é a
“janela dos olhos”.
Somente na terceira aula é que lancei no e-book, mas não o fiz direto... Iniciamos
este encontro fazendo a leitura dos murais digitais confeccionados na aula anterior,
e os alunos avaliaram o quanto ficaram interessantes e de fácil compreensão as
definições por eles elaboradas. Depois disso, mediei um levantamento de hipóteses.
Será que existe algum dicionário sobre jornalismo? Respostas negativas. Será que
outras crianças, que não estudam no nosso Colégio, poderiam também fazer
jornalismo? Respostas afirmativas. Como? Respostas observadas: “Nós poderíamos
ensiná-las”. Como? Respostas observadas: “Contando como fazemos”. Onde
publicaríamos? Respostas observadas: “Na Apple Store”, “Na internet”, “No tablet”.
Poderia então ser um manual digital, como por exemplo, um e-book? Respostas
observadas: “Sim”, “Com certeza”. E por que vocês gostariam de fazer um e-book
sobre jornalismo? Respostas observadas: “Para ajudar outra criança a filmar, a
fotografar, a fazer seus textos, assim como fazemos”. Quando eles chegaram à
conclusão que poderiam produzir para ajudar o outro tudo ganhou sentindo, eles
sentiram que podiam, que sabiam algo que poder ser significativo 47 e o resultado
foi maravilhoso...
Trabalhamos mais sete aulas com revezamento por estações, alternando em
produção escrita, na radio e gravações em vídeo acho que foi um dos trabalhos mais
prazeroso que mediei. Vi as crianças crescerem, sentindo donas do produto,
dialogando, questionando, se avaliando o tempo todo porque a proposta era que
eles que escrevem para outras crianças, então todo o tempo eles liam, reliam,
consultavam os amigos. Foi demais!
Isso é o que me move como educadora... Eu preciso ver sentindo no que eu faço,
mas principalmente no que o meu aluno faz. Eu já fui aluna, tem que valer a pena. O
tempo é precioso pra mim e pro meu aluno também tem que ser... Quando eu dou
uma aula que não saio bem, fico mal... poxa meu aluno perdeu tempo comigo, isso
então me motiva a querer fazer mais, a pensar em ideias diferentes, a fazer
formações de design thinking, metodologias ativas, SOAP, Ensino Híbrido... Enfim,
vou me alimentar porque quando eu entro na sala de aula sou sugada e não posso
ser rasa entende? Tenho que ter repertório para me reinventar... Formação
continuada é muito importante para o professor. Ele não pode parar, pois o tempo
não pára e o aluno muda. Eu não quero ficar pra traz e quando digo isso não é medo
do desemprego, é medo de nâo fazer a diferença pro meu aluno e correr o risco da
minha aula ser indiferente pra ele.
Na educação básica tive professores tradicionais, na graduação também. Fiz alguns
cursos que foram trazendo ideias e fui juntando um pouquinho de cada. Sabe Bruno,
gosto de observar o mundo. Olho tudo. Rótulo de embalagem, outdoor, capa de livro
e fico tirando ideias... Quero pensar fora da caixa, gosto muito de trabalhar em
equipe e ninguém faz nada sozinho. Gosto de contar uma ideia e ouvir o outro.
Ajudar e se ajudada... O professor é muito solitário. Precisamos abrir as portas das
nossas salas de aula e deixar o outro olhar, palpitar, se insipirar
Acho que no fundo sou muito sonhadora e isso ajuda um pouco (risos)

Você sempre trabalhou dessa forma com os alunos?

Não, no começo eu copia os modelos que eu vivenciei mais tradicional depois


comecei a me arriscar. Eu adoro musica, então levava letra de musica para ensinar
o Word. Depois eu comecei a levar fotos para levar o ppt, depois eu pedi pra os
alunos produzirem as fotos isso em 1994, e ai comecei a ver que eles se
interessavam mais pelas minhas aulas, o sentido é muito relativo... Depende da sua
maturidade profissional naquele momento. Tive momentos que ter o melhor
equipamento tecnológico em sala era o mais importante pra mim. Hoje ter uma
metodologia bem estruturada é que faz sentido, a tecnologia é o de menos... Eu não
preciso ter uma BMW, eu preciso saber dirigir...
Docência não pode ser um oficio ou uma vocação, tem que ser uma profissão! Você
que está iniciando a carreira tenha em mente buscar excelência no que você faz.

Profa. Zuleica Ramos Tani

Conte um pouco como é o seu projeto com jogos.

O projeto de jogos começou com a necessidade de fazer com que os alunos


ficassem mais quietos, prestassem atenção e parassem de falar em sala de aula,
porque sociologia e filosofia tem muita teoria, explicar aquilo que aconteceu no
passado e qual a importância disso para o presente, e os alunos não tem interesse
de prestar atenção no que está acontecendo, eles querem saber da atualidade, não
algo muito distante. Aí começou o desafio de chamar atenção e jogos é uma coisa
que eu gosto desde sempre, e os alunos também gostam desde sempre, porque?
Por que é interessante quando é pequenininho, o que que os pais fazem? Vão lá,
compram aqueles brinquedos lúdicos vai aprender a chave da casinha, tão
tradicional, vamos pegar aquela chavinha e colocar, para aprender a coordenação
motora e depois passa a ser adolescente e não pode mais jogar porque vicia.
Qualquer coisa exagerada vai viciar não só jogos, então esse controle de
responsabilidade tem que ser dos pais e a criança vai aprender. Começou assim
então vamos fazer com que eles prestem atenção, e jogos é uma coisa que eu acho
que não tem adolescente que não conheça, e que já não viu alguma coisa e que já
não quis jogar algum momento, aí foi o meu primeiro trabalho né, aprender os jogos
por trás dos jogos, porque jogar por jogar é muito bom, é muito fácil, mas e aí, o que
tem por trás disso? Como fazer essa história? E essa busca pelo conhecimento foi
através de teorias, foi através de livros, você começa a pesquisar você percebe que
tem muita gente falando sobre isso, tem muitos autores reconhecidos, tem muitos
professores e mestres buscando alternativas na educação e foi aí que me chamou
atenção, então vamos pegar a teoria pra poder fazer, só que a teoria vai ter toda a
parte pedagógica de como aplicar isso, agora o jogo você tem que jogar, você tem
que aprender a jogar, você jogando aquilo você vai saber como desenvolver o seu
conteúdo programático que você precisa passar para o aluno, mais a parte
pedagógica que você está vendo com os outros teóricos e o jogo em sî, você tem
que juntar os três elementos pra você poder mostrar, porque senão a aula vai ficar
só jogo pelo jogo e não é essa a intenção. Então fazer com que o aluno entenda
isso, o Primeiro Momento foi uma tentativa disse que não conseguia fazer com que
os alunos prestassem atenção, daí eu trouxe numa aula, deixei em cima da mesa
livros, jogos e cheguei mais cedo, coloquei na mesa e sai da sala esperei eles
entrarem, eu entrei até atrasada na sala, na hora que eu entrei a minha mesa todo
mundo em torno dela, ninguém mexia, acho que tinha até um certo medo imagina
“jogos? Que que vou fazer”, ninguém tocou e eu entrei “Que que foi gente, boa
tarde” era uma aula a tarde, “que vamos fazer”, “Professora o que é isso?”, “Eu
trouxe”, “Mas como assim?”, e aí foi a grande descoberta, o que fazer com aquilo, ai
eu comecei a mostrar, bom, tinha alunos que até hoje que detestavam livros, nunca
queria, imagina, pegar livros, no fim, leu todos os livros da série, porque a maioria
dos jogos têm livros, e esses livros são grandes, não são pequenos, e eles leram
aquilo com uma voracidade incrível e a partir daí perceberam o que que o jogo tinha
a ver com isso, e também é muito interessante que tem aluno que eu nem falei no
nome de filósofos ou do sociólogo, mas o aluno já viu aquilo, jogou, “Professora,
sabe aquele jogo? Será que não dá para encaixar tal teoria de tal filosofo, de tal
sociólogo que está falando? ” Coisas que eu nem pensei, eu ainda não tinha me
preparado para aquele jogo e para aquela, e o aluno chega e fala “Olha, é assim”, e
é verdade, muitas vezes eu falei para ele “não sei deixa eu jogar para depois eu
responder” e esse relacionamento de “deixa eu jogar para depois eu aprender ” eles
começam a pensar que, opa, espera aí, se uma professora está falando que vai
jogar para me ensinar então porque o jogo não pode transformar isso. A grande
emoção que eu tive foi no meu segundo ano da semana GV, que eu tinha saído da
sala de jogos, e na hora que eu voltei estava uma mãe explicando para uma outra
mãe qual é a importância dos jogos, porque o filho tinha explicado para ela, então eu
entrei, parei pra ouvir e eu não acreditava, como é que pode uma mãe, que eu
nunca tinha conversado com ela, tinha conhecido naquele dia, estava explicando
para outra, eu não tinha explicado nada para ela, foi o filho que fez, então você
percebe que dá pra caminhar isso junto com a família e junto com a escola e junto
com o adolescente que está ali precisando disso, então esse é o grande projeto, é
fazer com que o aluno perceba que o que acontece aqui, eles vão usar pra vida, e
por ser uma escola técnica, que está acontecendo, seleção de pessoal está sendo
feita através de jogos, fiquei sabendo semana passada de um treinamento de uma
empresa que fez, porque o grupo estava muito disperso, não tinha união e o trabalho
precisava ser feito em equipe, como toda empresa, eles colocaram os jogos e
começaram a disputar ali com os consoles, tinha gente que não sabia nem jogar, e
os próprios funcionários tiveram que se unir pra poder conseguir passar aquela fase,
e assim, houve entrosamento, houve a união e a empresa conseguiu melhores
resultados na produção por causa disso, então jogo é uma coisa que integra a
sociedade, claro precisa tomar cuidado com o exagero, como em tudo, mas é algo
que veio para construir e não destruir.

E como começou seu interesse por jogos?

Meu pai quando era pequeno simplesmente adorava jogar canastra, buraco, poker,
ele adorava cartas, sempre gostou, e desde que eu era pequenininha ele reunia
amigos, parentes, primos, irmãos e todos iam para minha casa, eu lembro disso até
hoje, pra jogar, e varava a noite jogando, e com tempo a gente foi crescendo e
vamos aprender isso e aquilo, e daí eles foram aprendendo como é que era jogar,
jogar cartas é muito delicioso.
Vai crescendo né, a gente vai subindo na vida, de altura, de conhecimento, e vai
trazendo isso para cá, até hoje quando minha família se reúne a gente joga cartas, é
até um momento de união da família, de fazer com que as pessoas tanto que mais
novas e mais velhas consigam se comunicar, então o jogo está aí.
Depois vai crescendo, daí começaram os jogos digitais, eletrônicos, tecnológicos,
passou um pouco mais de tempo casei, e meu primeiro filho logo de cara quando
perguntamos o que ele queria ser quando crescer ele disse "quero ser testador de
videogames", e nossa reação foi "como testador de videogame?", profissão que na
época nem se falava, mas ele insistia, então ele fez faculdade de jogos digitais, e
minha maior frustração, meu filho sabe disso, foi o primeiro jogo que ele fez, que era
um de naves, em que você tinha que acertar uma nave em cima da tela, e ele que
programou, e eu não conseguia passar da primeira fase, ele fez tão bem que fiquei
frustrada porque não conseguia passar, então assim, em casa a gente sempre tem a
disputa, é isso e aquilo, todo mundo tem a sua senha, seu login, seu personagem,
independente do jogo que for, vira e mexe nós estamos jogando, um disputando
com o outro, e na parte de movimentação física a gente joga boliche, joga basquete,
fica disputando quantas cestas ou pontos fizemos, a gente faz com que a diversão
dos jogos fiquem dentro de casa, é uma forma de união da família também. Por
outro lado, a parte interessante, é saber que seus filhos estão sendo direcionados
para algo bom, existem tantas coisas ruins no mundo, e isso é uma coisa legal, é
uma coisa que faz com que haja união, então você não perde o filho no meio do
caminho. Conversando com outras mães, amigas que tem filhos, elas dizem que
estão preocupados com os filhos quando estão fora de casa, e comigo não, muitas
vezes meu filho fala que quer ficar em casa, porque "vamos jogar?", e essa é a parte
interessante, saber que eles estão próximos da gente por algo que eles gostam.

E como foi a inserção dos jogos na sala de aula?

Teve várias vezes que eu passava lição de casa que era para jogar, e eu punha na
lousa "Na fase tal, acontece isso, oque que vai acontecer, repare nesse aspecto..."
aí alguns alunos falavam "Professora, posso tirar uma foto da sua escrita na lousa?
Porque meu pai não vai acreditar que eu tenho que jogar para fazer lição de casa".
Muitos pais vieram me perguntar na semana da GV oque que era, eu tenho pais
com preconceito, que não aceitam jogos, que eles acreditam que não vai fazer nada
para o filho, e eu não tenho como forcar, eu só falo que não tem problema, que ele
não vai perder nota, mas que ele vai estudar da forma tradicional, vai ter que ler o
livro, vai ter que fazer o resumo, vai ter que fazer as atividades e exercícios que a
gente se propôs a fazer, mas a maioria deles, claro, prefere os jogos. Então alguns
pais são muito preconceituosos, eles não aceitam, não admitem, e outros que estão
começando a aprender e ver a importância disso, e aqueles que nem eu, que jogam,
que adoram, que querem que os filhos façam isso também, então tem três pontos aí,
que precisam ser trabalhados, já tive reclamação aqui de pais, que vieram conversar
comigo, que achavam que eu estava distorcendo a educação, e na hora em que
mostrei para eles os aspectos, eles deram uma chance para tentar entender. Esses
pais ainda não me retornaram com um "OK", porém eu tenho o "OK" dos filhos que
estão falando que os pais estão permitindo fazer o trabalho em cima disso, o
preconceito é gerado por algo que você não conhece, então não conhece, não vou
fazer, a partir do momento em que você se envolve com o assunto, você pode
despertar algo interessante, e é trazer o filho para perto de você, né? É parar de
brigar com ele, oque que é mais fácil? Você brigar com seu filho todo dia sobre a
escola, ou mostrar para o filho que ele pode aprender com isso. Nós temos hoje
educação a distância, oque que é educação a distância? É você trabalhar com
computador, você vai estudar através do computador, então você pode pegar ali a
sua vídeo-aula, que você vai estar com ela aberta, e você vai entrar em um monte
de outras coisas, pode estar com Facebook, com jogos online, mas vai da sua
capacidade de concentração, e o jogo te traz essa concentração, se você foca no
jogo, você vai saber que é só o jogo, não adianta você estar no jogo e ir pesquisar
no Youtube para ver como é que se passa de uma fase, já perdeu, isso ensina
também você a estudar, se você se foca naquele tempo, você não precisa depois ir
para o outro lado, ou você faz uma coisa ou outra, então vai direcionando o aluno
nisso também.

Fale um pouco mais sobre a mudança que ocorreu depois que você começou a
trabalhar com os jogos.

É, e não sou só eu que falo que senti isso, os alunos ficaram mais unidos, mais
focados, os trabalhos em grupo saíram muito melhores, mas existem pesquisas
provando isso, os alunos que jogam, que eles têm um foco nisso, eles conseguem
um desenvolvimento maior, eles conseguem aprender e perceber o mundo diferente.
A tecnologia hoje mudou, a gente consegue as informações muito rápidas e a gente
precisa ter um retorno também rápido, e deixar isso para depois... A gente fala muito
de imediatismo, mas como não ser imediato se você antigamente para fazer uma
pesquisa tinha que ir a biblioteca, pedir ajuda para a bibliotecária para ver qual era o
livro que você iria usar, como você iria usar, as vezes não sabia nem qual que era a
página, você tinha todo um trabalho, hoje você entra em segundos e ja tem tudo que
você precisa ali, você já tem a informação. Então nós precisamos ser ágeis, inclusive
também os país de aprender, que tem que mudar a forma de fazer com o filho, não
adianta falar para o filho sentar e ficar quieto, porque? Qual é o objetivo de ficar
quieto? Porque não posso fazer isso, tem que fazer o outro? Você tem que explicar
e o jogo te permite isso, ele te explica, ele explica situações, mesmo jogos que tem
mais violência, ou alguma coisa assim, eu concordo, não é esse tipo de jogo que a
gente que ter em sala de aula, mas até eles tem alguma motivação vai fazer o aluno
aprender alguma coisa, então precisa saber o que está por traz disso, acho que o
grande desafio da humanidade hoje é, o que está por traz dos jogos e como que ele
pode fazer você viver.

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