Obras de Mãos Humanas
Obras de Mãos Humanas
Obras de Mãos Humanas
Obra de
mãos
humanas
Uma crítica teológica à
Missa de Paulo VI
Em memória de
Sua Excelência Reverendíssima
M.L. Guérard des Lauriers OP
Autor da Intervenção Ottaviani
Segunda edição
Dedicada a
Fabiola Silvaggi
3
Prefácio
4
Prefácio
ÍNDiCE
Abreviações bibliográficas 12
Outras abreviações 13
Prefácio do autor 14
Capítulo 1
Missa Tridentina ou Missa Nova:
O debate é sobre o quê? 19
MOTIVOS DOUTRINAIS 20
OU MERA PREFERÊNCIA? 23
O ESCOPO DESTA OBRA 26
Capítulo 2
O Movimento Litúrgico:
Os Agentes de Mudança 33
ORIGENS DO MOVIMENTO 35
O MOVIMENTO SE DESVIA 36
ESTUDOS LITÚRGICOS E O MODERNISMO 38
OPOSIÇÃO AO MOVIMENTO 40
A SANTA SÉ INTERVÉM 41
A ENCÍCLICA MEDIATOR DEI 43
O MOVIMENTO NA DÉCADA DE 50 45
JOSEF A. JUNGMANN, S.J. 47
LOUIS BOUYER 55
MONTINI ANTES DO VATICANO II 66
A LIGAÇÃO MODERNISTA RECONHECIDA 69
RESUMO 71
5
Prefácio
Capítulo 3
As mudanças litúrgicas 1948-1969:
A criação da Missa Nova 75
O PLANO DA COMISSÃO DA REFORMA (1948) 76
A VIGÍLIA PASCAL EXPERIMENTAL (1951) 82
RUBRICAS SIMPLIFICADAS (1955) 84
A NOVA SEMANA SANTA (1955) 86
A INSTRUÇÃO SOBRE A MÚSICA SACRA (1958) 90
O NOVO CÓDIGO DE RUBRICAS (1960) 94
A CONSTITUIÇÃO DO VATICANO II SOBRE A LITURGIA (1963) 99
AS MUDANÇAS NO ORDO DA MISSA (1964) 107
MISSA DE FRENTE PARA O POVO (1965) 108
MAIS MUDANÇAS NO RITO (1967) 109
NOVAS ORAÇÕES EUCARÍSTICAS (1968) 109
O NOVO ORDO DA MISSA (1969) 110
RESUMO 112
Capítulo 4
Do Latim ao Vernáculo:
Perdido na Tradução 115
A MISSA EM LATIM: ORIGENS E EXCEÇÕES 118
LATIM VS. VERNÁCULO: PROBLEMAS DOUTRINAIS 122
ERROS DE TRADUÇÃO PÓS-VATICANO II 127
ROMA E OS ERROS DE TRADUÇÃO 129
SE O PAPA AO MENOS SOUBESSE… 136
RESUMO 137
Capítulo 5
A Instrução Geral de 1969:
A Missa como Assembleia 139
O QUE É A MISSA? 142
COMO CRISTO ESTÁ PRESENTE NA MISSA? 147
O QUE A MISSA REPRESENTA? 155
6
Índice Prefácio
Capítulo 6
A Instrução Geral de 1970:
“A Esperteza dos Revisores” 175
A INTERVENÇÃO OTTAVIANI 176
O NOVO PROÊMIO 185
MUDANÇAS NA INSTRUÇÃO 192
UMA REVISÃO ESPERTA 202
RESUMO 204
Capítulo 7
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico:
Prontos para a Assembleia 207
“IMAGEM DE UMA ASSEMBLEIA REUNIDA” 209
A MISSA DE FRENTE PARA O POVO 211
O NOVO SANTUÁRIO 221
O TABERNÁCULO DESAPARECIDO 229
ESTÁTUAS E IMAGENS 232
ALTARES LATERAIS 236
VASOS SAGRADOS 238
AS VESTIMENTAS SACERDOTAIS 240
A MISSA NOVA E O MATERIAL LITÚRGICO RETRÔ 243
RESUMO 245
Capítulo 8
Ritos Introdutórios:
Reunião e Saudação 249
NOTAS PRELIMINARES 250
UMA NOVA DIREÇÃO E PROPÓSITO 252
7
Prefácio Índice
Capítulo 9
As orações revisadas:
“Novos Valores, Novas Perspectivas” 277
A ORIGEM DAS ORAÇÕES 279
O PROCESSO DE REVISÃO 280
ESTATÍSTICAS SOBRE AS REVISÕES 281
“NOVOS VALORES, NOVAS PERSPECTIVAS” 282
A ELIMINAÇÃO DA “TEOLOGIA NEGATIVA” 283
O CRISTÃO E O MUNDO 293
ORAÇÕES PARA OS DEFUNTOS 296
ACOMODANDO-SE AO ECUMENISMO 299
OS MÉRITOS DOS SANTOS 303
O DESAPARECIMENTO DOS MILAGRES 305
AS CONSEQUÊNCIAS 307
RESUMO 308
Capítulo 10
A Liturgia da Palavra:
Escolhas Hábeis, Vozes Gigantescas 311
NOVA DIREÇÃO E EQUIPE 313
O RITO REESTRUTURADO 316
O LECIONÁRIO TRADICIONAL 323
O VATICANO II E AS LEITURAS 324
A CRIAÇÃO DO NOVO LECIONÁRIO 326
8
Índice Prefácio
Capítulo 11
A Preparação dos Dons:
Novas Oferendas 345
O RITO DO OFERTÓRIO TRADICIONAL 347
AS OBJEÇÕES DE LUTERO 349
POR QUE ABOLIR O OFERTÓRIO? 350
O CANTO DO OFERTÓRIO 352
A PROCISSÃO LEIGA DO OFERTÓRIO 353
OFERECER A VÍTIMA 355
PÃO DA VIDA, VINHO DA SALVAÇÃO 357
PREPARAÇÃO DO CÁLICE 362
COM ESPÍRITO DE HUMILDADE 364
VINDE, Ó SANTIFICADOR 365
ORAÇÕES DE INCENSAÇÃO 366
O LAVABO 368
RECEBEI, Ó SANTA TRINDADE 370
ORAI, IRMÃOS 371
A SECRETA 372
A ORAÇÃO SOBRE OS DONS 374
RESUMO 377
Capítulo 12 381
A Oração Eucarística:
“Empobrecimento Deplorável” 381
O PREFÁCIO 382
O SANCTUS 384
A ORIGEM DO CÂNON ROMANO 385
O MOVIMENTO PARA MUDAR O CÂNON 387
9
Prefácio Índice
Capítulo 13 435
Comunhão Na Mão:
Impiedade Em Ação 435
O PAI NOSSO 436
O LIBERA NOS 438
PREPARATIVO PARA A COMUNHÃO 441
DISTRIBUIÇÃO DA COMUNHÃO 445
A COMUNHÃO NA MÃO 454
RITOS PÓS-COMUNHÃO 460
OS RITOS DE CONCLUSÃO 462
EFEITOS CUMULATIVOS 466
RESUMO 468
Capítulo 14 471
Conclusões:
“A Missa acabou...” 471
UMA RUPTURA COM A TRADIÇÃO 471
UMA ESPÚRIA “RESTAURAÇÃO” DA ANTIGUIDADE 473
GRAVE IRREVERÊNCIA 475
A DESTRUIÇÃO DA DOUTRINA CATÓLICA 478
TRÊS SOLUÇÕES 488
DELENDA EST 492
10
Prefácio
Apêndice 493
1951, 1958 ou 1962: Qual Missal deve ser usado? 493
Bibliografia 497
LIVROS LITÚRGICOS 497
DOCUMENTOS OFICIAIS, TEXTOS E COLEÇÕES 497
OBRAS DE MEMBROS OU ASSOCIADOS DA CONSILIUM
OU DA COMISSÃO PIANA 502
OUTRAS FONTES 507
11
Prefácio
aBrEViaÇÕES BiBliogrÁfiCaS
12
Prefácio
oUTraS aBrEViaÇÕES
13
PrEfÁCio Do aUTor
C
omecei a trabalhar neste livro quando tinha treze anos. Era o Pri-
meiro Domingo do Advento, 29 de novembro de 1964. Tinha
apenas acabado de servir à primeira Missa celebrada em minha
paróquia, conforme as novas normas estabelecidas pelo Concí-
lio Ecumênico. A “liturgia nova” (como ela era então chamada) pareceu-me
estranha e um pouco desrespeitosa. Não gostei dela.
Menciono esse fato, a princípio, porque nos círculos tradicionalistas sou
bem conhecido como sedevacantista. Mas muito antes disso, as mudanças na
Missa me inquietaram — e são tais mudanças, não o sedevacantismo, que são
o tópico deste livro.
Desde aquele fatídico dia de novembro em diante — aos meus olhos juve-
nis parecia que tudo começava a desmoronar na Liturgia e na Igreja. No ano
seguinte, em setembro de 1965, entrei em um Seminário Menor, e até os doze
anos que seguiram até minha ordenação sacerdotal, observei de perto e de
dentro a destruição da Missa e os ataques contra a fé católica que se seguiram
ao despertar do Vaticano II.
Mesmo no meu primeiro ano de Ensino Médio no Seminário, eu queria
fazer parte da batalha. Lancei-me ao estudo do órgão e composição musical,
de modo que pudesse lutar contra o lixo (folk, pop, gospel, gravações) que só
estavam começando a substituir a música sacra na Missa. Li livros sobre Li-
turgia, assisti conferências conservadoras e assinei publicações (The Wanderer,
Triumph), que denunciavam a dessacralização da liturgia e as heresias moder-
nistas daí a pouco onipresentes.
Enquanto minhas habilidades musicais se desenvolviam, procurei empre-
gá-las em paróquias onde o clero fosse mais conservador, e onde eu estivesse
livre para usar somente músicas escritas ao modo tradicional. Uma vez que a
Missa de Paulo VI apareceu em 1969, empenhei-me ao máximo para aprender
as normas que vinham com ela a fim de poder, em meu trabalho como músi-
co, escolher as opções mais “tradicionais” que o rito permitisse.
Nos primeiros dez anos, acreditei (ou talvez somente desejei) que as causas
da devastação que eu testemunhava se encontrassem, não no que o Papa e o
Concílio realmente prescreveram e ensinaram, mas, em vez disso, nas violações
da lei litúrgica e na má interpretação do ensinamento conciliar promovido pelos
14
“liberais” em toda parte. Se os sacerdotes apenas seguissem as rubricas da nova
liturgia e aderissem estritamente aos ensinamentos do Vaticano II, a Missa seria
reverente e a fé estaria a salvo.
A reforma em si não era o problema, os neomodernistas é que eram.
Essa crença mudou em 1975. Naquele tempo, tinha me tornado monge em
um mosteiro conservador, no qual todas as cerimônias litúrgicas, inclusive a
Missa de Paulo VI, eram celebradas em latim com canto gregoriano. Depois
dos primeiros votos, a Ordem enviou-me à Suíça para estudar numa antiga
abadia que seguia práticas litúrgicas semelhantes.
Aqui, no entanto, em meio a todo esse latim, canto gregoriano e perfeito
cumprimento das rubricas, houve a desilusão. Os jovens monges, para o meu
espanto, aprendiam a mesma teologia modernista que era frequente nos semi-
nários americanos, e, na Missa conventual, eles recebiam a comunhão na mão.
Também aconteceu que o Arcebispo Lefebvre estava saindo bastante nas
notícias pouco depois da minha chegada à Suíça. O abade, que gozava na Or-
dem de reputação como liturgista conservador, condenou o Arcebispo por sua
“desobediência” a respeito da Missa Nova e do Concílio. Como nosso modelo
de verdadeira obediência, em contraste, ele propôs um abade fictício do ro-
mance Catholics de Brian Moore, que por obediência aos seus superiores renun-
ciou à fé na transubstanciação e mandou que seus monges fizessem o mesmo.
Naquela noite, no recreio, tive uma acalorada discussão com o abade (o
verdadeiro) sobre sua declaração. Não podia admitir que o chefe do mosteiro
mais liturgicamente conservador do mundo, onde tudo era latim e segundo
o cerimonial, pudesse seriamente dizer tal coisa, e, além do mais, aquilo tudo
me parecia uma acusação contra a Missa Nova. Foi nesse ponto que comecei
a pensar que a reforma litúrgica em si mesma, e não meramente sua interpre-
tação ou aplicação, era o verdadeiro problema.
Pouco depois, deixei a Ordem, e organizei-me para entrar no Seminário
do Arcebispo Lefebvre em Écône, Suíça. Dois anos depois, ele me ordenou
sacerdote.
Em 1977, iniciei a minha obra sacerdotal lecionando cursos de liturgia aos
seminaristas. Naturalmente, a questão da Missa Nova surgia repetidamente.
Comecei a coletar escritos tradicionalistas sobre o tópico na esperança de
descobrir uma obra claramente escrita e bem documentada, que eu pudesse
recomendar a sacerdotes, seminaristas e também a leigos.
No mundo anglófono, a maior parte da literatura sobre as reformas li-
15
Prefácio
16
Prefácio
1 Bem Vindo à Missa Tridentina. Atibaia: Seminário São José, 2019. [NT]
17
Prefácio
Depois da eleição de Bento XVI em abril de 2005, era inevitável que algum
tipo de permissão oficial mais abrangente para o uso do rito antigo fosse ga-
rantida. Isso veio em julho de 2007, com o Motu Proprio Summorum Pontificum
de Bento XVI, que permitiu a qualquer sacerdote celebrar a Missa com o
Missal de 1962, a última edição publicada antes que as mudanças litúrgicas
pós-Vaticano II fossem introduzidas.
O Motu Proprio não resultou em católicos se reunindo em toda parte para
a Missa Antiga — o correspondente vaticano, John Allen, disse que a con-
gregação típica é pequena, o que os italianos chamam “quatro gatos e um
cachorro”. No entanto, é permitido a mais pessoas verem por si mesmas as
chocantes diferenças entre o rito novo e o antigo e assim, talvez, procurarem
por suas razões.
Portanto, em novembro de 2008, retomei a sério a tarefa de terminar este
livro. Um ano depois, no primeiro sábado de Advento de 2009, quarenta anos
depois da introdução da Missa de Paulo VI, completei o último capítulo.
Também aconteceu de ser quarenta e cinco anos do dia de 1964, no qual
eu começava a me perguntar por que a liturgia nova era tão perturbadora.
Que esse livro ajude outros católicos a encontrarem a resposta, ao menos, um
pouco mais de pressa.
— A.C.
West Chester, Ohio
4 de dezembro de 2009,
Festa de São Pedro Crisólogo.
18
CaPÍTUlo 1
E
m 7 de julho de 2007, Bento XVI publicou o Motu Proprio Sum-
morum Pontificum, que permitia aos sacerdotes de todo o mundo
celebrarem a Missa Tridentina, “Antiga” ou “em latim”, com
o Missal de 1962, a última versão em vigor antes do Concílio
Vaticano II (1962-5).
Os católicos que por uma razão ou por outra achavam-se insatisfeitos com
as mudanças litúrgicas pós-Vaticano II, e em particular com o Novo Ordo da
Missa (Novus Ordo Missae) promulgado por Paulo VI em 1969, acolheram o Motu
Proprio com alegria. A ação de Bento também deu um grande impulso às frater-
nidades sacerdotais aprovadas pelo Vaticano (a Fraternidade São Pedro, o Insti-
tuto Cristo Rei etc.), que já vinham utilizando o rito antigo em seus apostolados.
Sites promovendo a Missa Tridentina se proliferaram, com as fotos mais
recentes de Missas Solenes celebradas no rito antigo, conduzidas em basílicas
romanas por clérigos com vestes barrocas de saltar aos olhos — ambientes
onde uma tentativa de montar uma tal produção dez anos antes teria prova-
velmente impelido o sacristão a chamar os carabinieri.1 Mobílias de igreja ao
modo antigo, ligadas ao rito tridentino, que outrora eram quase impossíveis de
encontrar, estão agora disponíveis nos vendedores de artigos litúrgicos nova-
mente. Diga-se o mesmo sobre os antigos livros e manuais litúrgicos.
O Motu Proprio igualmente atraiu a atenção de uma geração jovem e mais
conservadora do clero, tanto diocesana quanto religiosa, que vinha utilizan-
do os ritos reformados pós-Vaticano II na administração dos sacramentos.
Organizações que promoviam o uso dos ritos pré-Vaticano II conduziram
seminários e produziram vídeos para ensinar a estes sacerdotes como celebrar
a Missa Tridentina corretamente.
Apareceram artigos na imprensa citando jovens sacerdotes que falavam
19
Capítulo 1
MoTiVoS DoUTriNaiS
Isso é extremamente irônico. Essas organizações existem — e de fato as
Missas de “Motu Proprio” patrocinadas pela diocese existem — unicamente
porque o Vaticano não podia conter a contínua resistência tradicionalista à
Missa Nova, que tinha começado nos anos 60. E desde o começo, as razões
que os tradicionalistas ofereciam para aderir à liturgia antiga e rejeitar as re-
20
Missa Tridentina ou Missa Nova
formas pouco tinham a ver com a beleza e a preferência — elas eram quase
exclusivamente doutrinais e morais:
1 Vide o relato do arcebispo sobre sua audiência de 11 de setembro de 1976 com Paulo VI:
“Quando também lhe falei que estava de fato me baseando no ‘pluralismo’, eu disse: ‘Mas,
afinal, dado o presente pluralismo, por que não deixar aqueles que desejam manter a tradição
estar em pé de igualdade com os demais? Isso é o mínimo que nos poderia ser concedido.’”
citado em Michael Davies, Apologia pro Marcel Lefebvre: Part One (Dickinson TX: Angelus Press
1979), 283.
21
Capítulo 1
22
Missa Tridentina ou Missa Nova
oU MEra PrEfErÊNCia?
Portanto, os oficiais do Vaticano estavam agudamente conscientes de que o
fundamento subjacente das objeções tradicionalistas à Missa de Paulo VI era
doutrinal. Por isso, o indulto de 3 de outubro 1984 permitindo, sob limitadas
5 Muitas obras curtas tiraram sua inspiração do Breve Exame Crítico do Novus Ordo Missae,
que os cardeais Ottaviani e Bacci submeteram a Paulo VI em 1969, uma obra conhecida nos
países anglófonos como The Ottaviani Intervention. (vide abaixo, Capítulo VI.) Entre as obras
mais extensas publicadas estão: The Great Sacrilege (1971) do Padre James Wathen, La Nouvelle
Messe (no começo dos anos 70) de Louis Salleron, La Nouvelle Messe de Paul VI (primeira pu-
blicação em português, 1970-1) de Arnaldo Xavier da Silveira, Analyse du Nouveau Rite (1978)
de Myra Davidoglou, Pope Paul’s New Mass (1980) de Michael Davies, Lex Orandi: La Nouvelle
Messe et la Foi (1983) de Daniel Raffard de Brienne, Le Sacrifice de la Messe (1985) de Domini-
que Michel Morin e The problems with the New Mass (1990) de Rama Coomaraswamy. Em sua
maioria, essas obras se limitavam a examinar o material encontrado no Ordinário da Missa e
não chegavam a investigar as mudanças nos Próprios da Missa (as orações variáveis, cantos e
leituras assinaladas para as diferentes festas e tempos do ano litúrgico).
6 (Kansas City: Angelus Press 2001).
7 A obra até mesmo atraiu um louvor bem merecido de um adversário teológico no campo
modernista. “Em nenhum outro lugar eu tenho visto o que está em jogo na reforma pós-
Vaticano II da liturgia, sendo tão claramente delineado e tão bem compreendido… nada
parece escapar à sua atenção… em tudo isso [entendendo os princípios teológicos por trás
da reforma], eles estão completamente certos. Isto é, essas são as questões que estão em jogo
na reforma da liturgia. A liturgia reformada representa uma mudança radical na teologia e
piedade católica.” John F. Baldovin, Reforming the Liturgy: A Response to the Critics (Collegeville
MN: Liturgical Press 2008), 138-9.
23
Capítulo 1
1 Sagrada Congregação do Culto Divino, Epistula Quattuor Abhinc Annos (03 de outubro de
1984), Acta Apostolicae Sedis 76 (1984), 1088-9. “Sine ambiguitate etiam publice constet talem
sacerdotem et tales fideles nullam partem habere cum iis qui legitimam vim doctrinalemque
rectitudinem Missalis Romani, anno 1970 a Paulo VI Romano Pontifice promulgati, in du-
bium vocant.”
2 Indulto de 1984, Quattuor abhinc: os católicos que estão “apegados” à Missa Tridentina.
Carta de João Paulo II, Ecclesia Dei (1988): a Missa Tridentina faz parte de um “enriqueci-
mento em Igreja com uma diversidade de carismas, tradições de espiritualidade e apostola-
do, que também constitui a beleza da unidade na diversidade; dessa harmonia mista que a
Igreja na terra eleva ao céu, sob o impulso do Espírito Santo… deve-se tratar com respeito
os sentimentos de todos aqueles que estão apegados à tradição litúrgica latina.” João Paulo
II, Alocução de 1990 aos Beneditinos do Barroux: a Missa Tridentina é permitida porque a
Igreja “respeita e adota as qualidades e talentos de várias raças e nações… essa concessão
pretende facilitar a união eclesial da pessoa que se sente apegada à essas formas litúrgicas.”
Cardeal Mayer, Carta de 1991 aos Bispos dos Estados Unidos: “Diversidade” e respeito pelos
“sentimentos”. Cardeal Ratzinger, Alocução de 1998 em Roma aos Tradicionalistas: “Dife-
rentes ênfases espirituais e teológicas… essa riqueza pertencente à única e mesma fé cató-
lica.” Cardeal Castrillon-Hoyos, maio de 2007: “expressão ritual estimada por alguns… esta
sensibilidade.”
24
Missa Tridentina ou Missa Nova
rumo. Ele falou da Missa Tridentina como um “sinal de identidade… uma for-
ma de encontro” para muitos católicos, que é “particularmente feito para eles.”
O rito antigo possui “uma sacralidade que atrai muitas pessoas”, que aderem
a ele por conta do “apego”, “afeição”, “cultura”, “familiaridade pessoal” etc.
Como uma estratégia, isso foi extremamente inteligente: ele se esquivou in-
teiramente da questão doutrinal. Não há nenhum problema doutrinal — tudo
é apenas uma questão de opções e escolhas. E se você suspeita que talvez haja
algum problema, por favor, não seja ingrato ao Santo Padre em mencioná-la…
Além disso, consagrar a preferência pessoal como a norma subjacente ape-
lava à oposição tradicionalista, trazendo-a debaixo da grande estrutura da di-
versidade pós-Vaticano II, com suas Missas de violão e piano, coros luteranos
reciclados, comunhão na mão, cantos gregorianos ocasionais, meninas coroi-
nhas, ministros da Eucaristia leigos, liturgias “inculturadas” hindus e africa-
nas e música mariachi. Permitindo que a Missa Tridentina se torne o que um
oficial vaticano, envolvido na redação da Summorum Pontificum, chamou de um
“aumento de opções”, de modo que, valendo-se da Missa Tridentina sob os
auspícios do Motu Proprio de 2007, um sacerdote ou leigo reconhecem implici-
tamente a legitimidade de todas as outras opções aprovadas também.
O prospecto de explicitamente fazê-lo, tornaria muitos desses sacerdotes e
leigos profundamente indispostos, porque, como um grupo, eles tendem a
ser conservadores, pessoas para as quais os mantras de escolha, diversidade e
preferências pessoais produzem nada além de mau carma. Mas, neste sistema,
uma escolha é tão boa quanto a outra.3
Mas optar pelo rito antigo ao novo nesses termos — sentimento, prefe-
rência, herança, “sacralidade” pomposa etc. — é cair diretamente em um tipo
de anglicanismo da High Church, em que belíssimas cerimônias substituem a
fé e distraem os participantes da realidade de que o rito da Missa oficialmente
sancionado, que a maioria dos seus correligionários assistem, foi desenhado
para destruir largas porções da doutrina e piedade católica.
25
Capítulo 1
1 Through Scylla and Charybdis: The Old Theology and the New (London: Longmans 1907), 34.
2 Citado em Nicola Giampietro OFMcap, Il Card. Ferninando Antonelli e gli sviluppi della Rifor-
ma Liturgica dal 1949 al 1970 (Rome: Studia Anselmiana 1998), 257.
26
Missa Tridentina ou Missa Nova
27
Capítulo 1
28
Missa Tridentina ou Missa Nova
do novo rito.2
• Nós examinaremos as orações e cerimônias da Missa de Paulo VI na
ordem que elas ocorrem no próprio rito. Para mais explicações, vamos
frequentemente nos voltar aos comentários escritos pelos liturgistas
que estiveram diretamente envolvidos na criação da Missa Nova.
• Uma vez que nós vamos analisar o rito litúrgico com algum detalhe,
aqueles que não são peritos em liturgia poderão ter dificuldades para
entender claramente alguns dos pontos na discussão que se segue. Por-
tanto, inclui um resumo no final de cada capítulo, e isso também será
uma ajuda para os revisores preguiçosos.
4. Revisão Geral. Uma vez que o material que iremos tratar cobrirá um
diferente número de tópicos, será de grande ajuda providenciar ao leitor uma
pequena revisão geral do que será abordado nos capítulos seguintes.
• O Movimento Litúrgico. Esse movimento para a restauração da liturgia
católica começou no século XIX, desviou-se no século XX, quando
os modernistas em seus postos delinearam o arcabouço teórico para a
destruição da Missa Tridentina e criação da Missa Nova. Entre os seus
luminares estavam Josef Jungmann, que sustentava que a liturgia tinha
2 O Missal de 1962 autorizado pelo Summorum Pontificum, por consequência, foi usado
apenas por dois anos.
29
Capítulo 1
30
Missa Tridentina ou Missa Nova
31
Capítulo 1
*****
Tendo disposto tão claramente quanto possível o nosso argumento de que
o problema da Missa Tridentina ou da Missa Nova não gira em torno de prefe-
rência, estética ou sentimento, mas sobre questões que afetam a fé e a piedade
católica, nós nos voltaremos agora para nossa comparação da Missa de Paulo
VI com a Missa Tridentina, tendo em mente que a Sagrada Liturgia é de fato,
como disse Pio XI, “o órgão mais importante do Magistério Ordinário da
Igreja.”1
32
CaPÍTUlo 2
o MoViMENTo liTÚrgiCo:
oS agENTES DE MUDaNÇa
A
pós minha ordenação sacerdotal em 1977, fui ensinar no pri-
meiro seminário da Fraternidade São Pio X nos Estados Uni-
dos, a Casa de Estudos São José, que fica em Armada, Michi-
gan, uma pequena cidade ao nordeste de Detroit. Uma vez que
já tinha conhecimento prévio em música sacra e havia sido monge por dois
anos, o Padre Donald Sanborn, o reitor, pensou que eu seria a escolha natural
para o curso de Liturgia Sagrada. No verão, pois, comecei a reunir materiais
para preparar o curso.
Usar um manual pós-Vaticano II estava fora de cogitação. Então, me apoiei
em uma obra pré-Vaticano II dos anos 40, a Missarum Solemnia ou Missa do Rito
Romano do padre Josef Jungmann, um livro que um jovem sacerdote conser-
vador, que havia sido meu professor de Liturgia no final dos anos 60, tinha
louvado enormemente. Era uma obra impressionante de dois volumes, repleta
de extensas referências para milhares de fontes. Certamente, Jungmann for-
neceria uma defesa irrefutável em prol da liturgia tradicional que eu poderia
transmitir aos meus estudantes, um arsenal de argumentos para eles usarem
contra a liturgia pós-Vaticano II.
Porém, após algumas horas lendo e tomando notas, fiquei apreensivo. En-
quanto a obra de Jungmann era um tesouro de fascinantes materiais histó-
ricos, percebi nela uma atitude subjacente de crítica à Missa Tridentina: um
aspecto do rito era decadente, outro era corrupção, outro se desviava do ideal
primitivo, etc. Muita embora Jungmann tivesse escrito a obra nos anos 40,
o tom era o mesmo que eu já tinha ouvido de professores modernistas que
tentavam impor suas agendas suspeitas. De fato, minhas reações a Jungmann
33
Capítulo 2
1 Anthony Cekada, “The Mass Examined: Oaks and Acorns”, The Roman Catholic I.1
(1978), 28-9. O título se referia a duas maneiras de examinar a Missa, uma católica (a aborda-
gem orgânica: aceitar e entender o que a tradição nos deixou — apreciar o carvalho) e a outra,
modernista (a abordagem crítica de homens como Jungmann: reclamar dos “acréscimos” e
das “corrupções do espírito litúrgico da antiguidade cristã” — i.e., deplorar o carvalho como
uma corrupção da bolota).
34
O Movimento Litúrgico
origENS Do MoViMENTo
Dom (Padre) Prosper Guéranger (1805-1875), que restaurou o monasticis-
mo beneditino na França depois da Revolução, é considerado o fundador do
Movimento Litúrgico. Sua Abadia de Solesmes se tornou um centro de estudo
e promoção da Sagrada Liturgia.
O Ano Litúrgico, comentário em vários volumes de Guéranger sobre as fes-
tas e tempos litúrgicos da Igreja, é um trabalho extraordinário e dele nunca se
falará suficientemente. Ele gozou de enorme popularidade — o pai de Santa
Teresinha costumava ler em voz alta para sua esposa e filhas — e ele ainda é
reimpresso periodicamente.
As Instituições Litúrgicas (1840) de Guéranger são consideradas um marco
histórico nos estudos litúrgicos. Elas também são de considerável interesse
aos católicos tradicionais por conta da denúncia de Guéranger ao que ele
chama de “a heresia anti-litúrgica” — a hostilidade que todas as heresias ma-
nifestam perante a liturgia católica tradicional, tentando mudá-la para atingir
seus fins.2 A heresia anti-litúrgica, diz Guéranger, promove um ódio à tradição,
o uso seletivo das Escrituras, a invenção de novas fórmulas, princípios contra-
ditórios, falsos apelos à antiguidade, aversão ao místico, a substituição do altar
por uma mesa, o uso do vernáculo, a redução da duração das cerimônias e a
debilitação do sacerdócio.3 Tudo isso, claro, soa como uma acusação de um
tradicionalista contra as reformas litúrgicas pós-Vaticano II.
Em seus primeiros anos, o Movimento Litúrgico alcançou um sucesso no-
tável por toda a Igreja através da promoção do estudo litúrgico, do canto
gregoriano, da música sacra e da execução solene dos ritos litúrgicos da Igreja.
Como um jovem sacerdote, um bispo e então patriarca de Veneza, São Pio X
35
Capítulo 2
o MoViMENTo SE DESVia
Porém, no começo do século XX, o movimento se desviou. Alguns de
seus mais proeminentes colaboradores começaram a defender ideias teoló-
gicas suspeitas e, eventualmente, reformas litúrgicas radicais que seriam um
prenúncio das mudanças pós-Vaticano II.
O Padre Didier Bonneterre fornece uma história excelente e concisa desse
período em seu livro O Movimento Litúrgico: de Guéranger à Beauduin à Bugnini.1
Aí aprendemos:
• Dom Lambert Beauduin (1884-1960) primeiramente usou a liturgia
como meio de educar os leigos para a ação social e então como uma
ferramenta para promover o ecumenismo. Suas iniciativas ecumêni-
cas foram condenadas na encíclica Mortalium Animos de 1928, mas ele
continuou a promover suas ideias através de retiros sacerdotais (con-
duzidos em segredo para aqueles “em concordância com suas ideias”),
de publicações e centros de estudos litúrgicos. Beauduin era amigo de
Angelo Roncalli (depois João XXIII) e durante sua última doença, após
a morte de Pio XII, predisse:
“Se elegerem Roncalli, tudo estará a salvo. Ele será capaz de convocar um Con-
cílio e canonizar o ecumenismo… Creio que temos uma boa chance. A maioria
dos cardeais não estão certos do que fazer. Eles são capazes de votar nele.”2
• Em 1918, Dom Ildefons Herwegen (1874-1946), Abade de Maria Laa-
ch, fundou uma publicação litúrgica que tinha como objetivo recrutar
uma “elite” litúrgica. Ele e seu discípulo, Dom Odo Casel, sustentaram
que a liturgia tinha se tornado sobrecarregada por fantasiosas inter-
pretações medievais e por uma excessiva ênfase na Presença Real. Ele
advogou um “antiquarismo” ou “arqueologismo” (uma reintrodução
das formas primitivas da liturgia cristã) que manifestavam um desprezo
1 (Kansas City: Angelus Press 2002), originalmente publicado como Le Mouvement Liturgi-
que de Dom Guéranger à Annibal Bugnini (Escurolles, France: Editions Fideliter 1980).
2 Louis Bouyer, Dom Lambert Beauduin, citado em Bonneterre, 78.
36
O Movimento Litúrgico
3 Citado em Bonneterre, 27
4 Ibid. 31-2.
37
Capítulo 2
1 Vide Alec Vidler, A Variety of Catholic Modernists (Cambridge: University Press 1970),
134-52.
38
O Movimento Litúrgico
39
Capítulo 2
oPoSiÇÃo ao MoViMENTo
No entanto, eventualmente, os erros e desvios no Movimento Litúrgico
atraiu certa oposição de palavras, especialmente na Alemanha, onde dois li-
vros foram publicados os denunciando. Em 1939, a facção a favor do movi-
mento designou o bispo de Passau, Simon Landesdorfer, como seu porta-voz.
No ano seguinte, a Conferência dos Bispos Alemães formou uma comissão
para lidar com a controvérsia e o bispo Landesdorfer foi designado para com-
pô-la. Assim, dentro de um ano, diz Bonneterre, “a Conferência Episcopal da
Alemanha estava nas mãos da ‘renovação’”.1
Mas a oposição não desistiu. No final de 1942, o Arcebispo Conrad Groe-
ber de Friburgo, Alemanha, fez circular um memorando de dezessete pontos
entre os bispos alemães sobre os perigos e excessos do Movimento Litúrgico.2
Essas críticas de Groeber, que se referiam especificamente às práticas litúr-
gicas que o movimento defendeu nos anos 40, vai soar o alarme dos tradicio-
nalistas pós-Vaticano II:
• Defesa do vernáculo, que “frequentemente serviu às forças do erro
como uma arma no arsenal da heresia”.
• Insistência na participação vocal por parte dos leigos na Missa.
• Depreciação das Missas privadas e orações de devoção (Rosário, Via
Sacra etc.).
• Mudanças arbitrárias nas rubricas.
• Defesa da comunhão sob duas espécies.
Os erros teológicos que os membros do movimento ofereciam para justi-
ficar essas práticas também soarão familiares:
• Promoção da noção de que “é a comunidade que celebra” e redução
do papel do sacerdote a um “delegado pela paróquia para a celebração
da Missa”.
• Supervalorização do sacerdócio dos leigos.
• Contudo, ainda mais significativos são os desvios teológicos mais
amplos, que o arcebispo Groeber acusou o movimento de promover.
Primeiro, elementos do falso ecumenismo, a saber:
• Crescente influência do dogma protestante sobre a maneira como a fé
é apresentada.
40
O Movimento Litúrgico
a SaNTa SÉ iNTErVÉM
Quando a notícia do memorando de Groeber chegou a Roma, a Santa Sé
manifestou sua preocupação com o Movimento Litúrgico. Ela exigiu informa-
ções adicionais sobre a questão, solicitou a vigilância por parte dos ordinários,
proibiu discussões sobre o assunto e demonstrou sua vontade de considerar a
garantia de certos privilégios pelo bem das almas. Os bispos alemães, por sua
vez, trataram de fazer manobras para proteger o movimento e, se possível,
evitar intervenções futuras.3
Mesmo assim, a primeira grande intervenção veio em 1943 com a encíclica
Mystici Corporis, que propôs o ensinamento católico sobre a qualidade de mem-
bro na Igreja. Encontramos a seguinte passagem, que parece ser uma clara cen-
sura àqueles membros do Movimento Litúrgico que, nas palavras do memo-
rando de Groeber, “estendiam os limites da Igreja para incluir protestantes”.
Como membros da Igreja contam-se realmente só aqueles que receberam
o lavacro da regeneração e professam a verdadeira fé, nem se separaram vo-
luntariamente do organismo do corpo... os que estão entre si divididos por
motivos de fé ou pelo governo, não podem viver neste corpo único nem do
seu único Espírito divino.4
Esta foi logo seguida por uma carta da Secretaria de Estado ao cardeal
Bertram, que alertava acerca de “novidades aberrantes em matérias litúrgicas”,
ameaçando a disciplina e fé da Igreja na Alemanha, assim como de abusos
3 Bonneterre, 42-3.
4 Pio XII, Encíclica Mystici Corporis, 29 de junho de 1943, DZ 2286.
41
Capítulo 2
42
O Movimento Litúrgico
43
Capítulo 2
1 Richstatter, 6.
2 Richstatter, 11.
44
O Movimento Litúrgico
o MoViMENTo Na DÉCaDa DE 50
Isso foi, a teoria da Mediator Dei. Mas a ala progressista do Movimento
Litúrgico continuou a levar adiante sua agenda assim como fazia antes. Na
verdade, ela foi indo de vitória em vitória, começando em 1948, passando os
anos 50 até às vésperas do Vaticano II.
Durante estes anos, o movimento tinha muitos amigos influentes em altas
posições, dentre eles Mons. Angelo Roncalli (nesta época Núncio em França
e depois Cardeal Patriarca de Veneza), Agostinho Bea, S.J. (confessor de Pio
XII, depois cardeal e um dos líderes ecumenistas do Vaticano II) e Mons.
Giovanni Battista Montini (Paulo VI). O movimento usava os bispos liberais
para requerer de Roma várias mudanças e concessões, elogiava e cultivava ou-
tras,3 ao mesmo tempo em que promovia seus objetivos através de pesquisas
históricas, publicações, escolas de verão e congressos.
Em França, seus apoiadores estavam fortemente envolvidos no movimen-
to da Ação Católica. A Conferência Episcopal Francesa publicou um diretório
litúrgico incorporando as propostas do movimento e autorizou a fundação
em 1956 do Instituto Superior de Liturgia de Paris. Na Alemanha, o movi-
mento obteve a aprovação do Vaticano para a “Missa Cantada Alemã”, uma
mistura de latim e vernáculo. Na Itália, os escritos dos progressistas franceses
foram traduzidos e dentre os apoiadores pertencentes ao episcopado italiano,
além de Montini, o movimento incluia Giacomo Lercaro, o Arcebispo de Bo-
lonha. Nos Estados Unidos, os beneditinos de Collegeville e sua publicação
Orate Fratres (depois Worship), editada pelo padre Hans Reinhold, estavam na
vanguarda do movimento, assim como estava o centro de estudos litúrgicos
da Universidade de Notre-Dame da Indiana.4
3 Os livros do jesuíta Gerard Ellard apresentam fotos de alguns bispos americanos que
são bajulados por terem supostamente elevadas sensibilidades litúrgicas. O exemplo mais
divertido: o Arcebispo Richard Cushing de Boston. Ele não sabia latim, então, no Vaticano
II, decidiu bancar um serviço de tradução simultânea do Concílio — fazendo com que um
prelado europeu engraçado sugerisse que Cushing também poderia se interessar em pagar a
instalação de ar-condicionados no inferno. O escritor Thomas Day disse que Cushing “con-
fundia muitos não católicos quando eles o assistiam grasnar no curso de uma cerimônia; [ele]
sempre soava como alguém vendendo amendoim e pipoca num jogo de beisebol”. Tinha-se
a impressão de que, como em uma Missa Solene celebrada por jesuítas, qualquer rito litúrgico
realizado por Cushing seria considerado um sucesso, se ninguém saísse machucado.
4 Vide Bonneterre, 66-70.
45
Capítulo 2
1 Pio XII, Sacred Liturgy and Pastoral Action, Alocução ao Congresso Internacional sobre
Liturgia Pastoral, 22 de Setembro de 1956, PTL 793.
2 Bonneterre, 70.
3 “Sacred Liturgy and Pastoral Action”, PTL 822.
46
O Movimento Litúrgico
4 Vide Alcuin Reid OSB, The Organic Development of the Liturgy, 2ª ed. (San Francisco:
Ignatius 2005), 164-5.
5 H.A. Reinhold, “Missarum Solemnia”, Orate Fratres 23 (1948-9), 126.
47
Capítulo 2
48
O Movimento Litúrgico
5 Ibid. 2-3.
6 Ibid. 60,63,66,66,67,67,68,69,78.
7 Ibid. 82.
49
Capítulo 2
1 Ibid. 88.
2 The Early Liturgy to the Time of Gregory the Great (South Bend IN: University of
Notre Dame Press 1959), 4-5.
3 “Pastoral Idea”, 29-30.
4 Early Liturgy, 2.
5 K. Hughes, 27.
50
O Movimento Litúrgico
51
Capítulo 2
ver a história da liturgia e é o critério em relação ao qual tudo deve ser medido.
Logo, diz Jungmann:
A liturgia os levaria mais longe [do que aparecendo diante de Deus], ela
levaria os fiéis à completa consciência de seu cristianismo… Assim pode-
mos entender como durante séculos um cuidado pastoral cristão foi possível,
[que] permitiu a uma cristandade florecente viver — porque as grandes ver-
dades da cristianismo foram mantidas vivas na e pela liturgia… A liturgia foi
projetada para ser aos fiéis um guia à oração cristã… Por séculos, a liturgia,
celebrada ativamente, teria sido a forma mais importante de cuidado pastoral.
Isto foi especialmente verdadeiro naqueles séculos em que a liturgia estava
sendo criada.1
E depois de tudo isso, obviamente, é inevitável que Jungmann se volte
para a teoria da corrupção e, finalmente, lamente uma liturgia que se tornou
“rígida”.2
Destarte, a liturgia pastoral neste segundo sentido é a liturgia que é “fle-
xível” em vez de “rígida”, porque o objetivo principal é o cuidado do povo. Por
isso, a liturgia pode — na verdade deve — acomodar-se às necessidades per-
cebidas do povo, porque atualmente:
Os fiéis de uma maneira especial necessitam da mesma orientação pela liturgia
que era o privilégio de muitos dos cristãos dos primeiros séculos. Hoje, a rigidez
está começando a diminuir.3
No primeiro sentido de pastoral, a liturgia “adapta” o povo a si; no segundo,
a liturgia se adapta ao povo.
52
O Movimento Litúrgico
53
Capítulo 2
54
O Movimento Litúrgico
loUiS BoUYEr
Depois de Jungmann, o segundo intelectual mais influente no Movimento
Litúrgico durante esse período foi o Padre Louis Bouyer (1913–2003), um
membro da Congregação do Oratório.
Nascido em Paris e criado em um ambiente protestante, Bouyer se tornou
um luterano e entrou no ministério. Ele recebeu um diploma protestante em
Teologia; sua tese, publicada em 1943, focava na teologia do Corpo de Cristo
nos escritos de Santo Atanásio. A data exata de conversão de Bouyer é incerta,
mas, até 1947, ele havia se tornado um padre católico do Oratório, tinha com-
pletado um doutorado no prestigioso Instituto Católico de Paris e se tornado
professor de Teologia Ascética e Mística. 2
Bouyer tinha uma mente sagaz, com uma pena afinada e um conhecimento
enciclopédico da história da liturgia e da teologia, uma combinação que trouxe
um verdadeiro arsenal para avançar a causa da revolução litúrgica nos anos 50.
O livro que assegurou o lugar de Bouyer na vanguarda foi sua obra de 1954,
Piedade Litúrgica, baseada em uma série de 24 conferências e 6 seminários que
ele deu no verão de 1952 para o Programa de Estudo Litúrgico da Universida-
de de Notre Dame em Indiana.
Sua publicação marca o que o Padre Didier Bonneterre chamou de estágio
decisivo na história do Movimento Litúrgico: “O movimento tira sua másca-
1 IL 1:399.
2 Grant Sperry-White, “Louis Bouyer: Theologian, Historian, Mystagogue”, em Robert L.
Tuzik, ed., How Firm a Foundation: Leaden of the Liturgical Movement (Chicago: Liturgy
Training Publications 1990), 96-7.
55
Capítulo 2
56
O Movimento Litúrgico
5 LP, 15.
6 LP, 4,6,7,8.
7 LP, 10-1.
8 LP, 11-3.
57
Capítulo 2
1 LP, 44-7. “Na igreja da Inglaterra encontrou-se também alguns homens que primeira-
mente perceberam que o caminho para a verdadeira renovação litúrgica não se encontra nem
no protestantismo, nem na mentalidade barroca… Os primeiros homens que enxergaram de
modo mais ou menos claro onde o verdadeiro caminho deveria se apoiar… Esses homens
foram, na verdade, levados a enfatizar as melhores tendências da Reforma primitiva… A ver-
dadeira tradição deveria antes ser separada de todas as adições espúrias e nocivas, assim reno-
vando sua pureza primitiva, a fim de ser reexpressa novamente em um quadro que a tornaria
acessível às pessoas do dia. Logo a insistência no uso do vernáculo… [As cerimônias pro-
testantes inglesas nas catedrais] não são apenas umas das mais impressionantes, mas também
uma das formas mais puras de oração comum cristã a serem encontradas em todo mundo.”
2 Ver LP, 53-4. “Jubé insistiu primeiramente no carácter público e coletivo da missa. [Ele
instituiu a prática] de não ter nenhuma outra cruz ou [velas] sobre o altar além da cruz pro-
cessional e dos círios, que eram trazodos no começo da Missa. Jubé começa a Missa dizendo o
salmo Judica e o Confiteor, acompanhado pelo povo; então ele se sentava no lado da Epístola
e escutava a Epístola e o Evangelho serem cantados pelos ministros-assistentes, após ele pró-
prio ter cantado a Coleta. Ele cantava o Kyrie, o Glória e o Credo com o povo, em vez de ele
próprio os dizer em voz baixa. Ele também voltou com a procissão do ofertório… Ele nunca
começa o Cânon antes do canto do Sanctus ter acabado, e ele dizia as orações do Cânon de
modo suficientemente alto para ser ouvido por toda a congregação de sua pequena igreja.”
3 LP, 29.
58
O Movimento Litúrgico
Pelo que já foi dito acerca do “Qehal Yahweh” e o banquete fraterno daqueles
que estão esperando a consolação de Israel, já se esclareceu o bastante que o
núcleo da liturgia cristã deve ser encontrado na synaxis [assembleia] eucarís-
tica, na Missa.4
A Missa como foi desenvolvida a partir da “Qehal Yahewh” era realmente
o povo de Deus no processo de fazer a si mesmo. A Palavra de Deus convo-
cava esta assembleia… para fazer o povo, mediante a convocação mesma e da
escuta da Palavra de Deus no curso dela… o sacrifício com o qual esta assem-
bleia sempre terminava, era sempre o vínculo de união que, de fato, constituía
o povo como tal, enquanto o dedicavam a Deus.5
A “assembleia”, assim, constitui o que Bouyer diz ser a forma permanente
da liturgia “na tradição católica”.
Para explicar o que isso implica, Bouyer se volta para Eucharistic Faith and
Practice (Fé e Prática Eucarística), um livro escrito nos anos 30 pelo ecumenista
luterano sueco, Yngve Brilioth.6 Ele nos dará “a plena tradição católica em
toda sua riqueza e pureza”. Resumindo o ensinamento de Brilioth,7 Bouyer
traça quatro elementos nessa tradição:
• Comunhão. Bouyer diz que isso não significa a recepção do Sacramen-
to por um fiel em particular, mas a participação comum nos mesmos
dons em uma ceia da comunidade.
• Sacrifício. A assembleia cristã continua a Qehal e tudo nela é sacrificial.
• Ação de Graças. O pão e o vinho são o ponto de partida que represen-
tam todas as coisas criadas e um reconhecimento de que “tudo é uma
graça”.
• Memorial: a memória da Cruz é mantida “no pão e no cálice”. Isto é um
memorial, não só da Cruz, mas de toda a história do povo de Deus.8
Bouyer vê como particularmente importante o último elemento, o memo-
rial. Toda a celebração eucarística, segundo ele, é um memorial. Há uma cone-
xão inseparável entre as duas partes da assembleia cristã, a leitura da Bíblia e
o banquete. As leituras levam ao banquete, e o banquete comemora o clímax
4 LP, 74-5.
5 LP, 160.
6 Eucharistic Faith and Practice: Evangelical and Catholic (London: SPCK 1930).
7 Eucharistic Faith, 18-69.
8 LP, 75-8.
59
Capítulo 2
desse processo na Cruz de Cristo. O banquete necessita das leituras para as-
sinalar como entender o banquete corretamente. Toda a Missa é “uma única
liturgia da Palavra”.1
Isso pode parecer ao leitor como algo ilógico. E é, mas ainda vamos conter
o fogo por mais um momento.
1 LP, 79.
2 LP, 80.
3 LP, 80-1.
60
O Movimento Litúrgico
4 LP, 81.
5 LP, 160. Grifo do autor.
6 Catecismo para crianças mais utilizado nos Estados Unidos antes do Vaticano II, equiva-
lente ao Catecismo da Doutrina Cristã, dito de São Pio X. (NT)
61
Capítulo 2
1 LP, 138.
2 LP, 157.
62
O Movimento Litúrgico
3 Uma definição típica: “O sacrifício incruento da nova lei, no qual o Corpo e o Sangue de
Cristo, sob as espécies de pão e vinho, por uma imolação mística, são oferecidos a Deus por
meio de um ministro legítimo de Cristo, a fim de reconhecer Seu supremo domínio e aplicar
a nós os méritos do Sacrifício da Cruz.” B. Merkelbach, Summa Theologiae Moralis, 8ª ed.
(Montreal: Desclée 1949) 3:308.
63
Capítulo 2
1 The Invisible Father: Approaches to the Mystery of the Divinity, traduzido por Hugh
Gilbert OSB (Petersham MA: St. Bede’s Publications 1999), 248.
64
O Movimento Litúrgico
65
Capítulo 2
1 Peter Hebblethwaite, Paul VI: The First Modem Pope (New York: Paulist 1993), 182-3.
2 Hebblethwaite, 132 e nota. Grifo meu.
3 Hebblethwaite, 256-7.
66
O Movimento Litúrgico
67
Capítulo 2
1 “Liturgical Formation”, 153-4. “[Os fiéis] se encontrarão excluídos de seus próprios cír-
culos espirituais internos, enquanto que o progresso da cultura os acostumou a compreender
e saber tudo sobre cada coisa que está em seu meio e campo de interesse. Devemos transfor-
mar a dificuldade colocada pelo rito litúrgico em uma ajuda para a penetração no significado
oculto contido no culto católico.”
2 “Liturgical Formation”, 161, citando Jungmann, Maison-Dieu, 47-9, 62.
3 “Liturgical Formation”, 147.
4 “Liturgical Formation”, 148.
5 LP, 29, citado em “Liturgical Formation”, 148.
68
O Movimento Litúrgico
69
Capítulo 2
1 Ernest Benjamin Koenker, The Liturgical Renaissance in the Roman Catholic Church
(Chicago: University of Chicago Press 1954), 29.
2 Ibid. 29-30, citando Walter Lypgcns, “Romano Guardini”, Dublin Review 455 (Spring
1949), 80-92.
3 Ibid. 30-1. Grifo meu.
70
O Movimento Litúrgico
rESUMo
• O beneditino francês, Dom Prosper Guéranger, fundou o Movimento
Litúrgico no século XIX a fim de renovar o fervor pela liturgia dentre o
clero e os fiéis católicos. O Movimento Litúrgico alcançou um impres-
sionante sucesso na restauração do canto, da música sacra e da correta
execução das funções litúrgicas.
• Em suas Instituições Litúrgicas, Guéranger condenou a “heresia anti-li-
túrgica”. As características que ele atribuiu a ela (ódio ao latim, falsos
apelos à Antiguidade, invenção de novas fórmulas, princípios contradi-
tórios etc.) lembram, em um grau impressionante, as objeções que os
tradicionalistas do século XX levantaram contra as reformas litúrgicas
pós-Vaticano II.
• Porém, no começo do século XX, Lambert Beauduin, Ildefons Herwe-
gen, Odo Casel, Romano Guardini, Pius Parsch e outros conduziram
o Movimento Litúrgico ao falso ecumenismo, modernismo teológico
(imanentismo e evolução do dogma), arqueologismo litúrgico, ver-
naculismo, ideias perigosas sobre a Igreja e sobre a Presença Real e
experimentos litúrgicos). Às vésperas da Segunda Guerra Mundial, o
Movimento Litúrgico já estava nas mãos dos teólogos modernistas.
• Há diversas explicações possíveis para essa reviravolta. Por um lado,
temos que a errônea percepção popular sobre os estudos litúrgicos
como “apenas as rubricas” fez com que o terreno aparentasse estar
imune aos enganos modernistas. Por outro lado, os modernistas seriam
atraídos aos estudos litúrgicos por conta do papel importante que os
símbolos, os sentimentos e a experiência religiosa ocupam em sua he-
resia da evolução do dogma.
• Em 1942, os conservadores da Alemanha acusaram o Movimento Li-
túrgico de promover o vernaculismo, exagerar o sacerdócio dos leigos,
incorporar ideias dogmáticas protestantes, estender os limites da Igreja
aos não católicos, adotar a noção modernista de fé como experiência,
negligenciar a teologia dogmática, dando preferência à sistemas filosó-
ficos modernos, e promover o arqueologismo litúrgico.
71
Capítulo 2
• Pio XII interveio com duas encíclicas que tentavam corrigir esses erros:
Mystici Corporis sobre a natureza da Igreja (1943) e a Mediator Dei sobre
a Sagrada Liturgia (1947). Ambas claramente reafirmaram a doutrina
católica, condenaram diversos erros e buscaram fazer o Movimento
Litúrgico voltar ao caminho certo.
• Apesar disso, durante os anos 50, o Movimento continuou a seguir o
mesmo rumo, protegido e promovido por amigos do alto escalão da
Igreja, dentre eles o Arcebispo Giovanni Battista Montini (Paulo VI).
• Joseph Jungmann ganhou a reputação de portento intelectual do
Movimento Litúrgico com a publicação de sua imensa obra de 1948,
Missarum Sollemnia ou A Missa do Rito Romano. Este livro, mais do que
qualquer outro, pavimentou o caminho para as reformas litúrgicas pós-
Vaticano II.
• Em seus escritos, Jungmann desenvolveu dois conceitos importantes:
(1) Teoria da Corrupção, que sustenta que a Missa como estava represen-
tava um afastamento dos ideais litúrgicos primitivos. (2) Liturgia Pasto-
ral, que defendia a reestruturação da Missa para atender às necessida-
des percebidas do homem contemporâneo.
• A teoria da corrupção de Jungmann e seu conceito de liturgia pastoral
são princípios contraditórios: (a) restaurar a liturgia ao ideal antigo, pré-
corrupção; (b) adaptar a liturgia às percebidas necessidades modernas.
Portanto, uma ou outra teoria pode ser utilizada para justificar ou ex-
cluir quase qualquer mudança litúrgica imaginável — e este será o caso
depois do Vaticano II.
• Em 1954, Louis Bouyer publicou a Piedade Litúrgica, outra obra que
influenciaria o curso das reformas pós-Vaticano II. Bouyer era um mo-
dernista e os métodos e teorias de seu livro também o eram. Bouyer,
assim como Jungmann, acreditava que a liturgia católica havia se cor-
rompido.
• Os principais conceitos que Bouyer desenvolveu para aplicar à Missa
são: (1) teologia da assembleia, que Bouyer recorre para se desviar da dou-
trina católica de que a essência da Missa consiste no sacrifício. (2) Ou-
tras Presenças “Reais”, que Bouyer infla a fim de atacar e minar o dogma
católico sobre a Presença Real.
• Como Arcebispo de Milão, Montini promoveu ambas as teorias jung-
manianas de corrupção e liturgia pastoral. Montini via o latim e os ritos
72
O Movimento Litúrgico
73
Capítulo 2
74
CaPÍTUlo 3
D
urante meu primeiro ano no Seminário da Fraternidade São
Pio X, as cerimônias da Semana Santa me deixaram de algu-
ma forma intrigado. Elas se pareciam notavelmente similares
aos ritos pós-Vaticano II que eu me lembrava dos meus anos
como seminarista diocesano. Por que, eu me perguntava, as pessoas que impu-
seram o Novus Ordo em 1969 não tinham mudado também os ritos da Semana
Santa?
Essa resposta era, aprendi eventualmente, que eles não precisavam fazê-lo,
pois os mesmos homens que tinham produzido o Novus Ordo já tinham muda-
do a Semana Santa muito antes do Vaticano II. Para eles, a Missa Nova com-
pletaria meramente o longo processo de mudanças litúrgicas, que eles tinham
posto em movimento durante o reinado de Pio XII.
Obras que criticavam a Missa Nova frequentemente não faziam essa cone-
xão. A verdadeira ruptura, os tradicionalistas assumem, veio com o Vaticano
II. Antes disso, apesar de haver muitos ratos pelos cantos em alguma parte da
Igreja, tudo ainda estava bem com a Sagrada Liturgia em si mesma, e o ápice
da tradição litúrgica católica poderia ser encontrado nos livros litúrgicos de
1958 ou 1962 (dependendo de sua convicção).
Mas até então (e você pode escolher qualquer data) o processo de minação
das fundações da sagrada Liturgia já estava de fato bem adiantado, não somen-
te na teoria (como vimos no último capítulo) mas também na prática.
Assim Annibale Bugnini, como o protagonista na criação de todos os ritos
pós-Vaticano II, intitulou suas memórias, A Reforma Litúrgica: 1948-1975 —
note a data inicial — e intitulou o seu primeiro capítulo sobre as mudanças
pré-Vaticano II “a chave para a Reforma Litúrgica”.
De fato, em sua Constituição Apostólica de 1969, promulgando o Novo
Ordo da Missa, Paulo VI aponta para as reformas de 1951 e da Semana Santa
de 1955, introduzidas durante o reinado de Pio XII, como sendo o início do
75
Capítulo 3
76
As mudanças litúrgicas 1948-1969
77
Capítulo 3
1 RL, 23.
2 Wagner, LO, 264. “Daß eine liturgiegeschichtlighe Stunde geschlagen hatte, die nicht ver-
paßt werden durfte.” Depois do Vaticano II, Bugnini apontaria tanto Wagner quanto Jungmann
para o Grupo de Estudo 10 da Consilium, o pequeno sub-comitê diretamente responsável pela
criação do Novus Ordo Missae.
3 “Zur Reform”, LO, 264. “In aller Stille… seine Gedanken für eine mögliche Meßreform
der Kommission zur Diskussion vorzulegen.”
4 Confira “Zur Reform”, LO, 265-6.
78
As mudanças litúrgicas 1948-1969
5 RL, 21. Em 1951, o Arcebispo Enrico Dante foi acrescentado como representante da
Sagrada Congregação dos Ritos. Em 1960, outros quatro foram acrescentados: Monsenhores
Pietro Frutaz e Cesario D’Amato; Padres Luigi Rovigatti e Carlo Braga. Braga era um mem-
bro da mesma Ordem que Bugnini, e aparentemente servia como seu assistente em perío-
do integral na Comissão Piana, mesmo antes que fosse oficialmente apontado. Ele também
serviu a Bugnini nesta capacidade na Comissão Preparatória para o Vaticano II e depois no
Secretariado da Consilium.
79
Capítulo 3
Liturgica (Memória sobre a Reforma Litúrgica),1 que foi publicada no ano seguinte
e privadamente circulada aos destinatários designados pela Congregação dos
Ritos. A Memoria serviria como ponto de partida na discussão das mudanças
litúrgicas que seguiram nos anos 50.
A Memoria é uma obra extensa que discute os motivos para começar uma
Reforma Litúrgica, os princípios gerais que a governariam, a situação do clero,
o estado do Movimento Litúrgico e assuntos relacionados.2 Muito espaço é
devotado aos aspectos técnicos de mudar o Calendário Litúrgico e o Breviário.
Alguns pontos da Memoria são de particular interesse aqui, porque eles in-
sinuam o que está por vir para a Missa.
Monsenhor Wagner, que estava presente na reunião de Banz em junho de
1948, disse que o autor da Memoria, Padre Löw, aprovara os desejos para a Mis-
sa que Jungmann havia articulado.3 Portanto, não é surpresa ver Löw se referir
aos ritos tradicionais de Semana Santa — um ponto sempre doloroso para os
adeptos do Movimento Litúrgico — como “um problema agudo e grave, que
requer absolutamente algum tipo de solução”.4
A Memoria de Löw diz que repetir todo ano as mesmas leituras da Escri-
tura nos mesmos domingos depois de Pentecostes causou uma “esterilidade
geral na pregação”. Ele recomenda permitir outras leituras da Escritura para
serem usadas, quer como um suplemento opcional, quer como obrigatório. E
até mesmo sugere a introdução de um ciclo multianual.5 Paulo VI certamente
implementaria o último vinte anos depois.
No que toca à própria Missa, a Memoria menciona em linguagem bastante
neutra “problemas” levantados pelo Movimento Litúrgico durante os anos
precedentes — o vernáculo, a participação dos fiéis e várias formas de cele-
bração (cantada, rezada, pontifical), mas então menciona “a própria estrutura
interna da Missa”,6 um assunto que (como Reid assinala) dá a impressão de
1 Sagrada Congregação dos Ritos (Seção Histórica). Memoria sulla Riforma Liturgica (Va-
ticano: Poliglota 1948),reimpresso com suplementos (Roma: CLV 2003).
2 Para uma visão geral em inglês, vide Reid 150-64.
3 “Zur Reform”, LO,264.”Diese Desiderate wurden von der Ritenkongregation, insbeson-
dere von P.Löw, begrüßt.
4 Memoria, 59. “Come un problema acuto e grave, che richiede assolutamente una qualche
soluzione.”
5 Memoria, 253.
6 Memoria, 305.”struttura interna della Messa stessa.” ênfase do autor.
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As mudanças litúrgicas 1948-1969
aparecer sem qualquer explicação posterior.7 A Memoria diz pouco mais sobre
este “problema”, salvo que “parece oportuno” deferir a consideração dessa
questão e aquela do Missal para uma “segunda fase da obra da Comissão.”8
Mas, com o benefício da retrospectiva, não é difícil de imaginar o que aque-
les envolvidos tinham em mente.
Depois de uma discussão inicial da Memoria, a Comissão recebeu permissão
de Pio XII para enviá-la sub secreto (em termos de sigilo estrito) a três liturgistas
para que tecessem seus comentários: Padres Bernard Capelle, Mario Righetti
e, sem dúvida, Josef Jungmann.9
81
Capítulo 3
1 RL, 25. “Colse di sorpresa gli stessi ufficiali della Congregazione dei Riti.”
2 Vide Decreto da Sagrada Congregação dos Ritos Dominicae Resurrectionis Vigiliam, 9
de Fevereiro 1951, AAS 43 (1951), 128-9.
82
As mudanças litúrgicas 1948-1969
do para trazer o fogo pascal para dentro da Igreja foi abolido, o clero e o povo
devem portar velas, o número das profecias se reduziu de doze para quatro, o
celebrante senta e escuta as leituras, ele canta a Coleta da sedilha, uma pausa
para oração é introduzida depois de flectamus genua nas orações, a água batismal
é abençoada no santuário de frente para o povo, “em vez de ser no batisté-
rio”, a ladainha se divide em duas e é abreviada, todos os presentes recitam
uma “renovação dos votos batismais”, o Salmo 42 e o Último Evangelho são
excluídos da Missa.3
Tudo isso foi retratado como uma restauração da Antiguidade, assim como
as características do Novus Ordo o seriam duas décadas depois, mas a alegação
era igualmente falsa. A antiga Vigília Pascal ia do crepúsculo do Sábado Santo
até a aurora do Domingo de Páscoa (isto era chamado a pannuchia, termo gre-
go para “toda a noite”) e consistia de uma aparentemente interminável série
de leituras, cantos, orações e ladainhas espalhadas pela noite. Em Roma, as
leituras eram cantadas em latim e então novamente em grego; as petições nas
ladainhas dos santos eram repetidas sete vezes. Tudo isso era perpassado por
largos ritos de batismo, confirmação e ordenação.4 Ademais, uma vez que não
havia banco nas igrejas, os leigos suportavam tudo isso de pé. Então, o número
de leituras da “restauração” de 1951 deveria ter sido triplicado para, digamos,
trinta e seis, em vez de reduzido a meramente quatro. E leigos segurando velas
acesas? Cera nos tempos antigos era um produto precioso e os leigos doariam
velas para ajudar a manter a Igreja. Na Igreja Primitiva, dar velas para os leigos
acenderem teria sido semelhante a eu pedir aos meus paroquianos suburbanos
para queimarem notas de vinte dólares. Bastante improvável.
No entanto, na Vigília Pascal de 1951 vemos de fato alguns princípios e
práticas que dezoito anos mais tarde serão impostos universalmente no Novus
Ordo Missae de Paulo VI: abreviação de ritos (três orações para uma; doze
profecias para quatro), invenção de novos ritos (cravejar o círio, o povo car-
regando velas, renovação dos votos batismais), cerimônias de frente para o
povo (para a benção da água batismal), redução das ações do sacerdote (ele
3 Para uma comparação dos antigos e novos ritos da vigília em formato de coluna paralela,
vide Herman Schimidt, Hebdomada Sancta (Roma: Herder 1956) 1:18ss.
4 Um ano, nós planejamos ter uma ordenação sacerdotal conferida durante nossa Vigília
Pascal. A vigília durou seis horas e uns quinze minutos; se a tonsura, as quatro ordens me-
nores, o subdiaconato e o diaconato também tivessem sido conferidos, não há como dizer
quanto tempo isso teria tomado.
83
Capítulo 3
84
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7 Simplification of the Rubrics (Collegeville MN: Doyle and Finegan 1955), 18.
8 Simplification of the Rubrics, 22. Grifo meu.
9 Ibid. 21-2.
10 Ibid. 19.
11 Ibid. 21. Grifo meu.
85
Capítulo 3
1 In Novum Codicem Rubricarum, 2ª Edição. (Roma: Edizioni Liturgiche 1960), 211. “Ex-
titit ergo quasi praeludium quoddam ad generalem instaurationem, quae iam parabatur, et
cuius principia quaedam in praxim tunc reducta fuerunt.”
2 Sagrada Congregação dos Ritos, Decreto Maxima Redemptionis, 16 de novembro 1955,
AAS 47 (1955), 838-41.
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Novus Ordo.3
3 Para uma comparação lado-a-lado dos ritos de Semana Santa tradicionais e aqueles da
reforma de 1955, vide: Schimidt, Hebdomada Sancta, volume 1.
4 O Papa São Pio V estabeleceu o requerimento de que o sacerdote recite todas as leituras
da Escritura.
87
Capítulo 3
1 Os ritos de 1955 introduziram textos especiais para a Missa do Crisma na qual o Bispo
consagra os santos óleos para o ano. As novas rubricas prescrevem que o Credo e Último
Evangelho sejam omitidos dessa Missa.
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89
Capítulo 3
1 Sagrada Congregação dos Ritos, Instrução De Musica Sacra, 3 de setembro de 1958, AAS
50 (1958), 630-3.
2 Sacerdotes simultaneamente celebrando Missas em múltiplos altares na mesma igreja, e
recitando as orações juntos entre si.
3 §31.
90
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4 §14.
5 §14.
6 §26.
91
Capítulo 3
1 §46.
2 Vide Alfred C. Longley e Frederick R. Mcmanus, That They May Share: A Mass Commentary
(New York: Benziger 1960). Eu desafio qualquer sacerdote que celebra a Missa Tridentina e
que é cético sobre minhas colocações de que as mudanças litúrgicas instituídas sob Pio XII
foram um ensaio para as mudanças do Vaticano II a utilizar Longley e McManus nas suas Mis-
sas Dominicais ordinárias servilmente por um mês. Você vai deixar sua capela antes que o seu
comentador leigo de “bom caráter” (confira Instrução §96) possa dizer: “a santa assembléia
do povo de Deus agora começa seu culto com o canto…” (Longley, 1).
3 Jungmann, certamente, era um cérebro privilegiado se já houve um, e é dito que Pio XII
guardava uma cópia do Missarum Sollemnia de Jungmann na sua mesa. (Vide Day 91.) O jesuíta
Pierre Teilhard de Chardin, silenciado por modernismo pelo Santo Ofício em 1925, também
era considerado como um intelecto brilhante. De acordo com o professor Bernard Fäy, isto
levou Pio XII à conduzir uma correspondência privada com Teilhard em uma tentativa de
“convertê-lo”.
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4 Gerard Ellard, citado em Joanne Pierce, “Pope Pius XII and Pre-Conciliar Liturgical
Reforms”, em Tuzik, ed., How Firm… Leaders, 275.
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Capítulo 3
1 RL, 22.
2 Sagrada Congregação dos Ritos, Decreto Novum Rubricarum, 26 de julho de 1960, AAS
52 (1960), 596-729.
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Capítulo 3
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1960.5 Em um comentário sobre o Código de 1960, Braga diz que uma vez
que os Padres do Concílio Ecumênico tratariam unicamente dos princípios
gerais da renovação litúrgica,
[tendo] o texto das rubricas já reduzido a uma forma mais simples e sistemá-
tica certamente tornará não poucas decisões dos Padres [do Concílio] muito
mais fáceis.6
Em outras palavras, as rubricas foram simplificadas para tornar mais fácil
para os Padres do Concílio matar o sistema inteiro. Porém, infelizmente:
A presente obra de simplificação das rubricas, ademais, não foi empreendida
com uma liberdade completa, de tal modo que permitisse construir um edifí-
cio completamente novo...7
Tendo visto a necessidade de mudar todos os livros litúrgicos, uma vez que
o Concílio tenha terminado, e para colocar suas decisões em efeito, pareceu
oportuno não compelir todos os clérigos a já mudarem de livros agora.8
Novamente, as mudanças de João XXIII são vistas como nada mais que
um expediente temporário até que todos os livros litúrgicos possam ser mu-
dados depois do Concílio.
Então chegamos ao fim da quinta etapa para a Missa Nova, e descobrimos
que, longe de ser o que o Arcebispo Lefebvre chamou La Messe de Toujours — a
Missa de Sempre —, a Missa de João XXIII era desde o princípio nada mais
que a La Messe de Passage — designada para desaparecer uma vez que os refor-
madores tivessem preparado uma coisa inteiramente nova.
A cereja do bolo da quinta etapa viria em 13 de novembro de 1962, quando
João XXIII, por impulso, adulterou o sacrossanto Cânon Romano pela inser-
5 Braga também foi o autor da Instrução Geral da Missa Nova de 1969, uma obra que
muitos tradicionalistas consideram herética.
6 In Novum Codicem, 221. “Immo textus rebricarum iam ad simpliciorem et systematicam
formam redactus nonnullas Patrum determinationes faciliores certo reddet.”
7 In Novum Codicem, 222. “Aliis: hodiernum quoque opus simplificationis rubricarum viam
prae se omnino liberam non habuit, quae aedificationem novam permitterit, quamvis a tradi-
tione non alienam.”
8 In Novum Codicem, 222. “Praevisa itaque necessitate omnes libros liturgicos mutandi,
expleto Concilio, eiusque statutis in rem deductis, opportunum visum est clerum omnem
non adigere ad eosdem libros nunc etiam variandos.” entre as sugestões de Braga: recitar os
Salmos em duas semanas, em vez de uma.
97
Capítulo 3
ção do nome de São José na lista dos santos. Isso foi uma ruptura radical com
a tradição, porque a tradição litúrgica ditava que somente mártires podiam
ser mencionados no Cânon e a Santa Sé tinha rejeitado essa proposta muitas
vezes desde 1815.
Se você pode adulterar o Cânon, nada é intocável.
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8. O próprio Ordo Missae não é sacrossanto e adições mais recentes podem ser
omitidas, tais como as Orações ao Pé do Altar, o Último Evangelho e a Bên-
ção.
9. O Credo Niceno não precisa ser recitado em algumas ocasiões solenes.
10. Quando a Escritura é proclamada o sacerdote “preside” passivamente da se-
dilha, enquanto que na Missa Solene de outrora o lugar do sacerdote era no
altar.
11. Certas funções litúrgicas devem ser conduzidas “de frente para o povo”.
12. A ênfase na devoção dos santos deve ser reduzida pelo rebaixamento das
classes de suas festas, redução das leituras do Breviário sobre eles, abolição
das oitavas para suas festas e geralmente dando precedência ao Ciclo Tempo-
ral da Liturgia (Advento, Natal, Pentecostes etc.), em vez daquele dos Santos.
13. Textos ou práticas litúrgicas que possam ofender aos hereges, cismáticos ou
judeus devem ser modificados.
14. Expressões litúrgicas de reverência ao Santíssimo Sacramento devem ser
“simplificadas” ou reduzidas, inclusive decoração, adoração contínua, procis-
são solene e incensações.
15. Até mesmo o Cânon da Missa pode ser mudado.
1 Vide Reid, 231. O Cardeal Spellman de Nova Iorque viajou a Roma em uma tentativa de
impedir a promulgação da Nova Semana Santa.
99
Capítulo 3
1 RL 31. Um ano depois, uma vez começado o Concílio, o Cardeal Ottaviani acusaria
aqueles que prepararam o esquema de terem “uma verdadeira ânsia por inovações em maté-
rias em que elas não só são desnecessárias e inúteis, mas podem até se tornar prejudiciais.”
100
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2 RL, 36.
3 RL, 38.
101
Capítulo 3
versidade Lateranense, e quase fez com que fosse removido de seu trabalho
na Pontifícia Universidade Urbaniana. A base para essas demissões, de acordo
com Bugnini, era a acusação de que ele era um “‘progressista’, ‘um fanático’ e
‘um iconoclasta.’”1 Bea e Montini, antigos aliados de Bugnini nos anos 50, que
tiveram papéis-chave na obtenção da aprovação de Pio XII das mudanças pré-
Vaticano II, agora eram cardeais e tentaram desfazer o dano, mas sem sucesso,
ao menos no momento.
Mas enquanto Bugnini diminuía, a sua obra continuava. A Constituição so-
bre a Sagrada Liturgia que ele tinha escrito recebeu a aprovação inicial do Concí-
lio em 14 de novembro de 1962. (A questão de permitir o vernáculo para partes
da Missa, no entanto, foi ardentemente debatida.) Várias emendas e mudanças
ao texto foram aprovadas em 1963, durante as quais João XXIII morreu.
O Cardeal Montini foi eleito pelo conclave e tomou o nome de Paulo VI.
Em 22 de novembro de 1963, o Vaticano II deu à Constituição sobre a Sagra-
da Liturgia sua aprovação final (2147 a favor, 4 contra) e Paulo VI a promul-
gou em 4 de dezembro de 1963.2
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Capítulo 3
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3 RL, 62.
4 RL, 62.
5 O livro de Bugnini era um manancial de informação. Embora consegui-las seja uma ta-
refa difícil, uma vez que o livro carece de um índice e chega a quase mil páginas. A tradução
inglesa (Collegeville: Liturgical Press 1990) fornecia um índice de pessoas, mas este é de limi-
tada utilidade, já que os assuntos do livro requerem extensa referência cruzada.
6 Ronald Jasper, Massey Shepherd, Raymond George, Friedrich Künneth, Eugene Brand
e Max Thurian, representando os anglicanos, o Conselho Mundial das Igrejas, os luteranos e
a comunidade ecumênica Taizé.
105
Capítulo 3
106
As mudanças litúrgicas 1948-1969
gico. Nos anos 50, pela sua posição de influência na Comissão Piana, gradual-
mente introduz alguns elementos do programa modernista. Em 1960-1, reúne
as propostas para a Constituição do Vaticano II sobre a Sagrada Liturgia. Em
1962, escreve o esquema da Constituição sobre a Sagrada Liturgia. De 1964
em diante, dirige a Comissão que interpreta a Constituição, escolhe aqueles
que o vão ajudar e implementa a Constituição que escreveu para a criação
dos novos ritos. Depois da criação da Missa Nova, vai dirigir a Congregação
Vaticana do Culto Divino.
Bugnini vai de bem para melhor até 1975, quando será sumariamente re-
movido sem qualquer explicação oficial. Naquele tempo, histórias circulavam
na imprensa tradicionalista de que ele tinha sido desmascarado como um crip-
to-maçom. Bugnini denunciou isso como uma calúnia, e a imprensa oficial a
dispensou como uma típica paranóia de teoria da conspiração. 30 anos depois,
no entanto, a história agora parece ser aceita como verdadeira, e oficiais do
Vaticano fazem saber que a questão de fato era a pertença à maçonaria: “é
certo”, um deles disse, “ao menos, tão certo quanto qualquer coisa pode ser
neste mundo.”3
Seja como for, com a promulgação da Constituição do Vaticano II sobre a
Sagrada Liturgia e a instalação de Bugnini por Paulo VI como o homem-chave
que a implementará, completamos a sexta etapa da criação da Missa Nova. E
agora a revolução realmente começa a ganhar impulso.
3 Robert Moynihan, editor da extremamente conhecida publicação oficial Inside the Vatican,
forneceu o seguinte depoimento, baseado em uma conversação de 2009 com um oficial do
Vaticano: Em 1975, ele deixou uma pasta para trás, após uma reunião na Secretaria de Estado
do Vaticano. O Monsenhor que achou a pasta abria-a para determinar quem era seu proprie-
tário, e descobriu cartas endereçadas a Bugnini, como irmão do Grão Mestre da Maçonaria
Italiana. A evidência foi eventualmente levada a Paulo VI, que aprovou a demissão de Bugni-
ni. Bugnini foi exilado para o Irã como Delegado Apostólico. “O fim de um mistério”, Inside
the Vatican, 19 de julho de 2009, http:/www.insidethevatican.com/newsflash/2009/newflash-
jul-19-09.htm#top.
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Capítulo 3
Inter Oecumenici.1
Essa Instrução introduziu muitas práticas pela Missa que a legislação de
1951-52 já tinha permitido ou prescrito, de um modo ou de outro, e instituiu
algumas novas práticas também.
A lista de mudanças é consideravelmente extensa: o celebrante não lê os tex-
tos cantados ou lidos pelo coro, povo, leitores ou outros ministros. O Salmo 42
é omitido das Orações ao Pé do Altar e todas aquelas orações são omitidas onde
quer que um outro rito preceda a Missa. As leituras sempre devem ser procla-
madas de frente para o povo e um ambão pode ser usado. A Oração dos Fiéis é
introduzida. A patena é deixada sobre o altar na Missa Solene. A Secreta é dita
em voz alta. A última oração do Cânon, o Per ipsum, deve ser dita ou cantada em
voz alta. Todos devem recitar o Pai-Nosso com o celebrante, até mesmo no ver-
náculo. A fórmula para a comunhão é mudada para: “Corpus Christi”, “Amem”.
O Último Evangelho é omitido e as Orações Leoninas suprimidas.
O vernáculo agora poderia ser amplamente utilizado, mesmo para as pró-
prias orações litúrgicas. A Instrução de 1964 permitia o vernáculo para todas
as leituras; a Oração dos Fiéis; o Kyrie, o Gloria, o Credo, o Sanctus e o Agnus
Dei; aclamações, saudações e formulários de diálogo; as fórmulas de comu-
nhão; o Pai-Nosso e a oração que se segue.
A Instrução prescrevia que o altar deveria ser afastado da parede para per-
mitir a celebração de frente para o povo. A Eucaristia pode ser reservada ou
guardada no altar principal ou em um altar menor, mas “verdadeiramente
digno”, ou em uma outra “parte da igreja especial, propriamente adornada”.
1 Sagrada Congregação dos Ritos (Consilium), Instrução (Primeira) Inter Oecumenici, sobre
como executar ordenadamente a Constituição sobre a Liturgia, 26 de setembro de 1964, DOL
293-391.
2 Sagrada Congregação dos Ritos (Consilium), Decreto Nuper Edita Instructione, promulgando
o novo Ordo Missae e o Ritus Servandus in Celebratione Missae, 27 de janeiro 1965, DOL 1340.
108
As mudanças litúrgicas 1948-1969
3 Sagrada Congregação dos Ritos (Consilium), Instrução (Segunda) Tres Abhinc Annos,
sobre como executar ordenadamente a Constituição sobre a Liturgia, 4 de maio de 1967,
DOL 445-74.
109
Capítulo 3
1 Para informação biográfica sobre os membros do Grupo de Estudo 10, vide Maurizio
Barba, La Riforma Conciliare dell”Ordo Missae”, nova ed. (Roma: edizione Liturgiche 2008), 103-
12.
2 Vide Wagner, “Zur Reform”, LO, 263ss.
110
As mudanças litúrgicas 1948-1969
Esse rito foi usado pela primeira vez em 20 de outubro de 1965, como uma
demonstração ou experimento para os membros do Grupo de Estudo 10.
Bugnini mesmo a celebrou.3
Durante o curso do Sínodo de Bispos em outubro de 1967, a Missa Nor-
mativa foi celebrada na Capela Sistina a fim de estimar as reações dos Bispos
presentes. O próprio Paulo VI estava enfermo naquele tempo e assim foi in-
capaz de assisti-la. A maioria das reações dos Padres parece ter sido favorável.4
Alguns membros da Cúria manifestaram sua oposição, mas essas objeções
parecem ter tido pouco efeito.
Uma vez que Paulo VI recuperou sua saúde, Bugnini arranjou que a Missa
Normativa fosse celebrada em 3 dias sucessivos (11-13 de janeiro de 1968) na
Capella Matilde do Palácio Apostólico. Mais tarde, um pequeno grupo que
incluía um punhado de leigos apresentou suas impressões sobre o rito à Paulo
VI. Por todo o ano de 1967 e maior parte de 1968, várias propostas e con-
trapropostas sobre detalhes da Missa Normativa circularam entre a Consilium,
Paulo VI e outras agências da Cúria.5 Finalmente, depois de uma reunião pri-
vada realizada na noite de 6 de novembro de 1968, Paulo VI escreveu de seu
próprio punho sobre o livreto contendo o Novo Ordo da Missa: “Eu aprovo
em nome do Senhor. Paulo VI, Papa”.
Embora isso tenha estabelecido a forma do Ordinário da Missa revisado,
os outros grupos de estudo não tinham ainda completado o trabalho sobre os
Próprios, que também deveriam ser totalmente revisados. Então, o “Missal”
de Paulo VI, em vez de compreender um livro com todos os elementos cons-
titutivos da Missa, tinha que ser publicado em partes.
O Calendário revisado, a nova ordem das leituras da Escritura e o Novus
Ordo Missae apareceram primeiro.
Em 3 de abril de 1969, com sua Constituição Apostólica Missale Romano,
Paulo VI finalmente promulgou seu Novus Ordo Missae, juntamente com um
documento preliminar intitulado Instrução Geral sobre o Missal Romano. Eles fo-
ram publicados pela imprensa vaticana em um livro de brochura de 171 pági-
nas. O Missal completo, com todas as orações e uma Instrução Geral revisada
111
Capítulo 3
rESUMo
• O Novo Ordo da Missa promulgado por Paulo VI em 1969 foi um
longo processo de mudança litúrgica, que começou em 1948 com o
apontamento da Comissão Piana da Reforma.
• Annibale Bugnini, que secretamente apoiava as propostas de reforma
da “ala esquerda” do Movimento Litúrgico, dirigiu o trabalho da Co-
missão e por duas décadas supervisionou o processo que criou a Missa
Nova. Em 1975, ele foi repentinamente removido do seu posto no
Vaticano. O fundamento para essa demissão foi sua alegada pertença
à maçonaria, um fato agora considerado como “certo” no Vaticano.
• Em uma reunião secreta, em 1948, Jungmann delineia seu “sonho do
coração” para a Reforma da Missa; este seria implementado no Novus
Ordo Missae de 1969; Jungmann se tornou um consultor da Comissão
Piana da Reforma.
• A Vigília Pascal experimental de 1951 foi, disse Bugnini, “a primeira
etapa para uma Reforma Litúrgica geral.” Ela introduziu princípios e
práticas que seriam finalmente implementadas compulsoriamente 18
anos depois, na Missa de Paulo VI.
• A Simplificação das Rubricas de 1955, disse Bugnini naquele tempo,
representou uma “reviravolta” para a Liturgia, o “segundo” estágio da
reforma, “uma ponte para o futuro”, para tornar a Liturgia “uma nova
cidade para que o homem de nossa época possa viver e se sentir à
vontade.” Aos que estavam dispostos a uma “renovação” mais plena,
Bugnini instava que “mantivessem seus olhos abertos”, porque a Re-
forma Litúrgica havia de requerer a “colaboração esclarecida de todas
as forças ativas.”
• O Novo Ordo Renovado para a Semana Santa de 1955 introduziu uma
outra série de mudanças que seria permanentemente incorporada na
Missa Nova. Os novos ritos de Semana Santa, disse Bugnini em 1956,
representaram a “terceira etapa para uma Reforma Litúrgica geral.”
• A Instrução sobre Música Sacra de 1958 permitiu ainda mais práticas
que seriam incorporadas no Novus Ordo: a recitação pelo povo do Or-
dinário e Próprio da Missa juntamente com o sacerdote, maior uso do
vernáculo, leitores e comentadores leigos e Salmo Responsorial.
112
As mudanças litúrgicas 1948-1969
113
Capítulo 3
114
CaPÍTUlo 4
Do laTiM ao VErNÁCUlo:
PErDiDo Na TraDUÇÃo
N
o momento em que a Missa Nova apareceu em 1969, o pro-
cesso de colocar a Missa Tridentina em vernáculo já tinha se
completado. O latim tinha desaparecido da Missa em pratica-
mente todos os lugares do mundo.
Desde o momento que essa transformação começou em 1964, os conser-
vadores e progressistas discutiram acerca do que o Vaticano II realmente queria
dizer quando lidava com os problemas do latim e do vernáculo.
Mas, sobre essa questão, assim como em tantas outras na Constituição so-
bre a Sagrada Liturgia, ambos dos lado e nenhum deles estava simultaneamen-
te errado e certo. Eles estavam discutindo sobre mais uma formulação clássica
do Vaticano II, escrito ao modo sim-mas-não, por-um-lado/por-outro.1
Então, por um lado, de acordo com a Constituição, sim, o latim deve ser
preservado. Mas, por outro lado, também de acordo com a Constituição, não, o
latim não deve ser preservado — se dar à língua materna um “local conveniente”
em algumas partes da Missa pode ser “de grande vantagem para o povo”. Além
disso, especialmente onde “é urgente fazer uma adaptação mais profunda da
Liturgia”, um “uso mais amplo” do vernáculo pode ser “oportuno”.
O efeito prático desse jargão ininteligível iria depender de quem interpre-
115
Capítulo 4
taria ou definiria os termos utilidade para o povo, lugar conveniente e uso amplo. E,
depois do Vaticano II, estes certamente eram Bugnini (quem escreveu a Cons-
tituição), a Consilium (que tinha autoridade para interpretar a Constituição),
Paulo VI (que apoiava as decisões da Consilium) e as Conferências Nacionais
dos Bispos (que sob as provisões da Constituição tinham o direito de requisi-
tar pelo vernáculo).
O próprio Paulo VI era um entusiasta do vernáculo. Em 1969, ele compa-
rou o latim na Missa a uma “cortina espessa” que fecha a Igreja às crianças,
jovens e afazeres cotidianos1 — a imagem é emprestada da “cortina de fuma-
ça” de Jungmann, ele também não acreditava que a tradução era um mero
“substituto” ao latim; ela era a voz da Igreja.
Agora, contudo, as traduções se tornaram parte dos próprios ritos; elas se
tornaram agora a voz da Igreja. O vernáculo, tomando o seu lugar na Liturgia,
deve chegar ao alcance de todos, até mesmo das crianças e dos ignorantes.2
Não era certo, Paulo VI disse alhures, “tornar a linguagem mais importante
que a compreensão da mente, especialmente quando se refere ao culto divino
e à conversação com Deus.”3
Para Paulo VI e para as instituições envolvidas na Reforma, portanto, a
definição de lugar conveniente para o vernáculo parecia significar “qualquer lugar
onde quer que apareça uma palavra em latim”. Então, em 1968, o latim se foi.
1 A locução à uma audiência geral sobre o Novo Ordo da Missa prestes a ser introduzido,
26 de novembro de 1969, DOL 1762. “Estamos sacrificando um tesouro inestimável. Por que
razão? … A resposta pode parecer trivial e prosaica, mas ela é sã porque ela é tão humana
quanto apostólica. Nossa compreensão da oração é digna mais do que roupas antigas nas
quais ela tem sido majestosamente vestida de maior valor, ademais, é a participação de um
povo de um povo moderno que está cercado por uma linguagem clara e inteligível, traduzível
a sua conversação ordinária. Se nosso sagrado latim deve, como uma cortina espessa, nos
fechar do mundo das crianças e dos jovens, do trabalho e dos negócios de cotidianos, então
nós, pescadores de homens, seríamos sensatos em permitir seu exclusivo domínio sobre a
linguagem da religião e oração?”
2 A locução aos tradutores dos textos litúrgicos, 10 de novembro de 1965, DOL 787.
3 Locução aos participantes de um congresso internacional sobre o estudo do latim, 16
de abril de 1966, DOL 815. “O Segundo Concílio Ecumênico do Vaticano em seus sábios
decretos permitiram o uso do vernáculo nos ritos litúrgicos quando quer que considerações
de utilidade pastoral [o] exijam. Já que pela sua própria natureza as palavras expressam pen-
samentos, não é certo tornar a linguagem mais importante que a compreensão da mente,
especialmente quando se refere ao culto divino e à conversação com Deus.”
116
Do Latim ao Vernáculo
4 Um Hino devocional composto por Michael Joncas, baseado sobretudo no Salmo 90,
que é comumente usado nos Estados Unidos como um canto da Missa Nova. [N.T.]
5 É um gênero originado nos Estados Unidos e criado por afro americanos, presente par-
ticularmente em denominações batistas ou pentecostais. [N.T.]
6 Missas de uma organização e movimento juvenil originado nos Estados Unidos, uma
espécie de mistura entre Renovação Carismática e Pastoral da Juventude. [N.T.]
7 É a sigla em inglês para Eternal Word Television Network (Rede de Televisão Palavra
Eterna), um canal de televisão fundado por Madre Angélica, PCPA, a versão americana da TV
Canção Nova, Século XXI, TV Aparecida ou Rede Vida. [N.T.]
117
Capítulo 4
118
Do Latim ao Vernáculo
3 Ranieri, Il Latino, Lingua Liturgica”, EL 65 (1951), 26, citando Theodore Klauser, Gus-
tave Bardy e Christine Morhrmann.
4 RV, 22.
5 RV, 19.
6 RV, 19
7 Jungmann, Early Lirtugy, 206. Os missionários pareciam estar inconscientes das teorias
de Jungmann sobre a “Liturgia Pastoral” e a “Cortina de Fumaça”.
8 RV, 93.
119
Capítulo 4
1 DZ 956. Para uma descrição das discussões que precederam à condenação, vide Liturgie
et Langue Vulgaire, 95-153; RV, 93-134; e Rochus Rogosic OFM, “De Concilii Tridentina
Decreta super Antiquitate in Ritibus Retinenda”, EL 68 (1954), 345-52.
2 Encíclica Musicae Sacrae Disciplinae, 25 de Dezembro de 1955, PTL 765-6.
120
Do Latim ao Vernáculo
121
Capítulo 4
1 Vide as explicações eloquentes e extensas de Gihr: HSM, 324, 326. Guéranger foi tam-
bém eloquente neste ponto: “Os realces de uma língua misteriosa sozinhos ecoam através da
santa assembleia e transportam o pensamento além dos limites do presente – mesmo aqueles
que não compreendem a língua sabem que algo extraordinário está acontecendo. Em breve,
as palavras desta língua sagrada se perdem no coração de um silêncio em que só Deus penetra.
Mas as cerimônias simbólicas prosseguem e, através de suas formas visíveis, não cessam de
elevar o povo santo ao amor das coisas invisíveis.” IL 3:83
2 Herman Schmidt, “The Problem of Language in Liturgy”, Worship 26 (1951-2), 278.
3 RV, 115.
4 Ranieri, 27.
5 Le Plat, 4:394, quoted RV, 115.
122
Do Latim ao Vernáculo
6 HSM, 324.
7 HSM, 327.
8 Le Plat, 12:753,34-45, citado em RV, 123.
9 MD 60. Em 1951, o acadêmico jesuíta Herman Schmidt disse o seguinte desta passagem
da Mediator Dei: “Os termos usados na Liturgia, que não constituem nada menos que um
locus theologicus autêntico e privilegiado – mais do que o testemunho dos Padres da Igreja, já
que permanecem vivos – possuem uma exatidão incomparável. O fato de que estão em uma
língua morta constitui um elemento positivo que trabalha em seu favor, porque os protege
contra as contínuas transformações encontradas nas línguas modernas.” “The Problem of
Language in Liturgy”, 279-80. Recordo-me de ter lido em uma antiga tradução da Summa
em inglês que a matéria da Eucaristia era o pão feito de “corn”, uma palavra que antigamente
significava “trigo”, mas que no inglês corrente designa “milho”. No vernáculo, mudanças de
significado são comuns, e.g. gay, mistress, intercourse, que já significaram alegre, uma mulher
responsável por outros e conversação, mas que agora têm conotações completamente dife-
rentes.
123
Capítulo 4
veniências.1
O latim era o laço vivo da Igreja com o passado, um sinal de sua contínua
fidelidade à tradição. O latim foi a língua da Missa da Igreja Ocidental
por quase 1.600 anos. Santo Agostinho o usava quando ele celebrava
a Missa, como o fez Santo Ambrósio, São Gregório, Santo Agostinho
de Cantuária, São Bernardo, São Domingos, São Roberto Belarmino, os
mártires ingleses, São Pio V, Santo Afonso, São Pio X e inúmeros outros
Santos do Céu.
Portanto, quando um sacerdote entoa o Oremus e recita a Coleta da
Missa Tridentina, ele não somente usa a mesma língua latina dos santos
romanos do século IV — em muitos casos, ele pode estar usando exa-
tamente as mesmas palavras que eles usaram. O latim é um sinal de que
a fé da Igreja continua inalterada.
1 Liturgie et Langue Vulgaire, 189. Similarmente, Fortescue fala que o “instinto conser-
vador” no homem explica sua inclinação a usar uma língua mais antiga no culto. Os judeus
continuaram a usar o hebraico no culto após o cativeiro da Babilônia, mesmo que essa língua
tivesse desaparecido do discurso diário. Os muçulmanos, mesmo que falassem turco, farsi ou
afegão na vida cotidiana, ainda leem seu Alcorão em árabe clássico. As cerimônias dos “orto-
doxos” russos são conduzidas em eslavo antigo, uma língua que não é usada no cotidiano por
séculos. “Rites”, CE 13: 68.
2 Anônimo A.F., Liturgical Discourse of the Holy Sacrifice of the Mass (1670), 52. “A de-
voção do povo católico em sua Missa em Latim”, ele acrescentou, “vai, em todos os aspectos,
superar a daqueles que frequentam a cerimônia vulgar inventada.”
124
Do Latim ao Vernáculo
3 IL 1:402-3.
4 HSM,320.
5 É um truque antigo. Tertuliano (†220) expôs como os tradutores do livros do Gênesis
haviam traduzido errado uma palavra-chave, assim permitindo que os hereges de seu tempo
atribuíssem pecados ao “Espírito” de Deus. “Quidam enim de Graeco interpretantes, non
recogitata differentia, nec curata proprietate verborum, pro afflatu spiritum ponunt, et dant
haereticis occasionem spiritum Dei delicto infuscandi, id est, ipsum Deum.”
6 Philip Hughes, The Reformation in England (New York: Macmillan 1956) 2:144.
125
Capítulo 4
feita e com tonsuras, eles ali sentam com a cabeça descoberta, gemem
e lamentam diante de seus ídolos.”1 O original certamente não diz nada
sobre casulas ou tonsuras — o objetivo de Lutero era comparar o clero
católico com os sacerdotes pagãos da Babilônia.
3. Para tornar os sacramentos subjetivos. No caso do protestantismo, a
insistência no vernáculo era uma consequência lógica inevitável de sua
teologia herética sobre os sacramentos. O valor da Missa não era objetivo
(o ensinamento católico), mas somente subjetivo — a Missa meramente
“avivaria a fé”, ou seria o sinal das promessas de Deus ou da união com
Cristo.2 Portanto, a Missa deve ser em vernáculo. As palavras devem ser
inteligíveis para comunicar ideias que, por sua vez, “excitam a fé”. Schmidt
resumiu a relação entre o ensino protestante e o uso do vernáculo:
O culto cristão é o culto da Palavra; o culto da Palavra não pode ser exercido
com fruto pela comunidade a não ser que essa Palavra seja compreendida,
isto é, a não ser que seja expressa na língua vernácula. Logo, o culto cristão
deve ser celebrado em língua vernácula.3
1 Vide Hartmann Grisar SJ, Luther (St. Louis: B. Herder 1913) 5:512-8.
2 Lutero, por exemplo, ensinava que o propósito principal do culto público era espalhar
a Palavra de Deus e estimular a fé: “Cristo pode e deve ser pregado de tal forma que tanto
em mim quanto em vós, a fé cresça e seja recebida da pregação… E essa fé é recebida e
cresce quando sou informado do porquê Cristo veio.” Freedom of A Christian (Weimar
edição 7), citado em RV, 96. “As liturgias devem sempre promover a fé e nutrir o amor; elas
nunca devem ser um obstáculo para a fé. Se não mais servem a esse propósito, elas já estão
mortas e destruídas e não têm mais valor… Nenhuma liturgia tem um valor independente
em si mesma, apesar de ser assim que as liturgias papistas foram consideradas até agora.” The
Lord’s Supper and Order of Divine Service (Weimar edição 19:72-8), citado em RV, 96. Para
Lutero, a questão da língua litúrgica “estava intimamente na base de sua fé protestante. John
L. Murphy, The Mass and Liturgical Reform (Milwaukee: Bruce 1956), 310. Similarmente,
João Calvino: “Nosso Senhor nos recomendou que celebrássemos o Mistério [da Última
Ceia] com verdadeiro entendimento… Os Sacramentos tiram seu valor da palavra quando ela
é compreendida; sem isso, não são dignos do nome de Sacramento. Portanto, é necessário que
haja uma doutrina inteligível na Missa, e, caso contrário, o Mistério é desperdiçado, como se
tudo fosse feito de forma oculta, e nada é compreendido.” Petit Tracté de la Sainte Cene de
Nostre Seigneur, in Corpus Reformatorum, 33:57-9, citado em RV, 100.
3 Liturgie et Langue Vulgaire, 170.
126
Do Latim ao Vernáculo
4 Vide Gary K. Potter, “The Liturgy Club”, Triumph (Maio de 1968), 10-4. Este artigo
circulou amplamente entre os conservadores católicos na época. Eu o li quando era estudante
no Seminário Menor. Mas, mesmo antes disso, sabendo apenas um pouco de latim, havia
descoberto que as traduções estavam “fora”.
5 Le Missel Traditionnel de Paul VI: Essai de Réflexion Théologique, Canonique, Liturgi-
que sur le Nouvel “Ordo Missae” (Paris: Tequi .1977), 63-4.
6 Ibid. 67.
127
Capítulo 4
1 Ibid. 63-4 Jacques Maritain sustentou que a tradução francesa do Credo Niceno era
herética.
2 Citado em Davies, Pope Paul’s New Mass (Dickinson TX: Angelus Press 1980), 617-8.
3 Pope Paul’s New Mass, 621.
128
Do Latim ao Vernáculo
129
Capítulo 4
1 “Normas Gerais: A língua a ser usada”, em Annibale Bugnini, ed., Commentary on the
Constitution on Sacred Liturgy (1965), 114-5.
2 §40.a, DOL 332.
130
Do Latim ao Vernáculo
131
Capítulo 4
cos. Essa Instrução conhecida pelo seu título francês Comme le Prévoit, estabe-
leceu os princípios que produziram as distorções, omissões e erros definitivos
nas traduções modernas ao vernáculo.
A Instrução é uma típica produção modernista, repleta de termos ambíguos
provenientes dos campos da psicologia, comunicações modernas, sociologia
e antropologia: as traduções litúrgicas não devem “meramente” reproduzir as
expressões, ideias e palavras do texto original; elas devem seguir “o contexto
total do ato específico de comunicação”1 — seja lá o que isso quer dizer. As
palavras e expressões “devem ser usadas em seu próprio sentido histórico, so-
cial e ritualístico.”2 Além do mais, “a precisão e valor de uma tradução só pode
ser avaliada em termos do propósito da comunicação.”3 Mas, avaliar o “con-
texto total” não quer dizer traduzir as palavras verbatim — deve-se adaptá-las:
A oração da Igreja é sempre a oração de alguma comunidade real, reunida
aqui e agora. Não é suficiente que uma fórmula transmitida de outro tempo
ou região seja traduzida verbatim, mesmo que de modo preciso, para o uso
litúrgico. A fórmula traduzida deve se tornar uma genuína oração da congre-
gação e nela cada um dos membros deve poder encontrar e expressar a si
mesmo.”4
A precisão nas traduções, então deve dar lugar ao “encontrar-se a si mes-
mo” e à “auto-expressão”.
Acima, mencionamos que os tradutores extirparam certos conceitos de
suas traduções das orações em latim, de modo a promover a agenda teológica
modernista. A seguinte passagem da Instrução Romana foi o ponto de partida
para seu trabalho:
As orações (oração de abertura [Coleta], oração sobre os dons [Secreta], ora-
1 Instrução Comme le Prévoit, 25 de janeiro de 1969, §6, DOL 843: “Para alcançar esse
fim, não é suficiente que o texto litúrgico meramente reproduza as expressões e ideias do
texto original. Em vez disso, ele deve comunicar fielmente a um determinado povo, e em sua
própria língua, aquilo que a Igreja por meio desse texto originalmente pretendeu comunicar
a outros pessoas em outros tempos. Uma tradução fiel, portanto, não pode ser julgada com
base em palavras individuais: o contexto total desse ato específico de comunicação deve ser
tido em mente, assim como a forma literária própria da respectiva língua.” Grifo meu.
2 Ibid. §13.d, DOL 850.
3 Ibid. §14, DOL 852.
4 Ibid. §20.c, DOL 856.
132
Do Latim ao Vernáculo
Para completar sua obra de destruição, a Instrução lista alguns termos la-
tinos específicos e fornece critérios de como sim e como não traduzi-los.
Imediatamente se percebe que os erros nas traduções ao vernáculo não se ori-
ginaram com as Conferências Nacionais dos Bispos, mas com as autoridades
litúrgicas de Roma:
Pius, pietas: são “inadequadamente vertidos” como pio ou piedade.
Salus: Pode significar salvação no sentido teológico — mas também pode ser
traduzido como saúde ou bem-estar.
Caro: é “inadequadamente vertido” como carne.
Servus, famula: são “inadequadamente vertidos” como escravo, serva ou cria-
da.6
Beatissima, gloriosa, sanctus: Traduzir essas palavras (beatíssima, gloriosa,
santo), quando se referem a Nossa Senhora ou aos Santos, “pode, na verdade,
diminuir a força da oração.”7
Jejunium: Essa palavra (jejum) “agora tem o sentido de observância quares-
mal, tanto litúrgica quanto ascética; o significado não está restrito à abstinên-
cia de comida.”
Humilis: seu significado original tinha uma conotação de “classe”. Não deve
ser traduzido como humilde ou modesto.
Dignare, clementissime, majestas: Essas expressões (dignar, clementíssimo,
majestade) “foram originalmente adaptadas de formas de se endereçar ao so-
berano nas cortes de Bizâncio e Roma.” É “necessário estudar o quão longe
133
Capítulo 4
134
Do Latim ao Vernáculo
1969.4 Suas observações teriam um peso notável, porque ele era provavelmen-
te o principal autor da Instrução sobre as traduções.5
Era impossível, disse Dumas, produzir uma boa tradução sem “a transpo-
sição perfeita da mensagem a um outro contexto, sua delicada adaptação às
circunstâncias históricas, sociais e rituais que são completamente diferentes.”6
Ele ofereceu uma longa lista de termos que devem ser “adaptados” na tradu-
ção: expressões em latim que, por exemplo, fazem referência a aplacar a ira de
Deus, devem ser atenuadas para dar a noção de “reconciliação”; termos que
fazem referência a mortificação e jejum “devem ser vertidos para expressões
mais gerais, adaptadas à mentalidade contemporânea”; a palavra quaesumus (nós
Vos pedimos) normalmente não deve ser traduzida, mas caso seja o verbo prin-
cipal de uma oração, deve ser traduzido como orar sem nenhuma sombra de
súplica.7 A ira de Deus, a mortificação e a súplica certamente não têm lugar no
sistema teológico modernista. Por isso, elas devem desaparecer.
As liturgias protestantes, disse Dumas, mostram um uso moderado de lin-
guagem moderna e “fornecem um belo exemplo para seguirmos.”8 Portanto,
não é surpreendente vê-lo recomendar que a palavra latina hostia (uma palavra
que levou os reformadores protestantes à ira) não deveria ser traduzida como
vítima.
Em vez disso, ele continua, muitas vezes a palavra designa somente “os
dons preparados para a Eucaristia” e pode ser simplesmente vertida como
nossas oferendas. Ele explica:
Certas figuras de linguagem tradicionais [tournures] devem ser mitigadas na
tradução sob a luz do que nós devemos nos lembrar acerca da verdadeira
natureza do começo da Liturgia Eucarística — o trazer os dons ao altar e
a apresentação deles pelo celebrante, finalizando com uma oração sobre os
dons. Nessa perspectiva, as palavras hostiam quam immolamus [a vítima que
oferecemos], susceptíveis a uma interpretação muito forte, devem ser tradu-
4 “Pour Mieux Comprendre les Textes Liturgiques du Missel Romain”, Notitiae 6 (1970),
194-213.
5 A prática comum em documentos importantes do Vaticano é de dar ao seu autor princi-
pal (que de outra forma seria anônimo) o privilégio de escrever um extenso comentário sobre
ele, que é então imediatamente publicado em um periódico acadêmico.
6 “Pour Mieux”, 195.
7 Ibid. 208-9.
8 Ibid. 197.
135
Capítulo 4
zidas pelo menos como “os dons que apresentamos” e, no máximo, como “o
sacrifício que vamos oferecer.”1
O desaparecimento de vítima da versão oficial inglesa do Cânon Roma-
no, deve-se notar, deixou Michael Davies e outros conservadores anglófonos
irados contra a ICEL, que eles severamente denunciaram por ter perpetrado
tal remodelação.2 Mas a parte responsável foi o provável autor da Instrução
Romana oficial sobre as traduções.
5. Análise. Então, no que foi dito, vemos o mundo bizarro em que todos
os princípios tradicionais sobre a língua litúrgica da Missa foram virados de
cabeça para baixo. Um estilo “sacro” deve ser evitado na língua da Missa. Um
balbucio de línguas modernas substituem a unidade de uma língua universal.
Termos com significados fixos como expressões dos dogmas católicos estão
sujeitos ao capricho dos tradutores e à evolução das línguas. A continuidade
com a tradição é rompida. A pedagogia substitui a ideia de culto. E, acima de
tudo, as traduções devem ser intencionalmente falsificadas.
Qual é o melhor argumento a favor do latim e contra o vernáculo na Missa?
A algazarra total feita com as traduções, que foram baseadas nos princípios
promulgados pelos modernistas do mais alto escalão da Igreja pós-conciliar.
1 Ibid. 199. Similarmente, A.M. Rouget OP e Lancelot Sheppard, “Translation of the Ro-
man Canon”, em The New Liturgy, cd. por Lancelot Sheppard (London: Darson, Longmann
and Todd 1970), 161-73.
2 Vide Pope Paul’s New Mass, 618-9.
3 Pope Paul’s New Mass, 621.
136
Do Latim ao Vernáculo
rESUMo
• Os trechos da Constituição do Vaticano II sobre Sagrada Liturgia, que se re-
ferem à preservação do latim e à introdução do vernáculo, foram escritos de
modo ambíguo e suscetível a interpretações contraditórias.
• Aqueles que oficialmente autorizaram a implementação dessa legislação (Bug-
nini, Consilium, Paulo VI e as Conferências Nacionais dos Bispos) permiti-
ram ou impuseram o uso quase universal do vernáculo após o Vaticano II.
• A inteligibilidade absoluta não era um requisito para a língua litúrgica no tem-
po de Nosso Senhor ou na Igreja Primitiva.
• Por 1.600 anos, a Igreja cuidadosamente preservou a posição especial do la-
tim como a língua da Missa do Rito Romano.
• A Igreja encorajou os ritos orientais a manterem suas próprias línguas e oca-
sionalmente permitiu que a Missa do Rito Romano fosse celebrada em uma
língua moderna.
• Estes casos não podem ser aduzidos como precedentes para o processo de
137
Capítulo 4
138
CaPÍTUlo 5
E
ntre os muitos tipos de cursos de Liturgia de Seminário que eu
ensinei ao longo dos anos, o mais difícil de tornar interessante é
aquele sobre rubricas. Rubricas são as direções, frequentemente
impressas em vermelho,1 que dizem ao sacerdote que orações
recitar e que gestos fazer no decorrer da Missa, do Ofício Divino ou de qual-
quer outro rito litúrgico.
A maior parte das rubricas para a Missa Tridentina aparecem no começo
do Missal. Elas descrevem com detalhe minucioso e aparentemente intermi-
nável as diversas ações que o sacerdote deve realizar em cada ponto do rito:
como ele deve manter suas mãos, onde e quão baixo ele deve se inclinar, quão
alta sua voz deve estar, quando o Altar deve ser beijado etc. Rubricas são con-
sideradas leis que o sacerdote está obrigado a observar. Elas não explicam por
que se deve realizar um gesto de determinada maneira — essa informação se
encontra em comentários de Liturgia e teologia sobre a Missa — elas apenas
dizem para fazê-lo.
Depois do Vaticano II, essa compreensão da lei litúrgica sofreu uma mu-
dança fundamental, e adquiriu o que o Padre Thomas Richstatter chamou
de “um novo estilo, um novo espírito”. As rubricas seriam doravante inter-
caladas de comentários explicativos para fornecer os porquês e os portantos
doutrinais dos ritos, a regulamentação precisa da Liturgia seria relaxada e, de
fato, a própria noção de rubrica seria mudada de uma lei para uma direção
ou norma geral.
Então, quando a Missa Nova foi primeiro publicada em 1969, ela veio
acompanhada de um documento preliminar chamado Instrução Geral sobre o
Missal Romano (doravante a IG). Esse estilo de documento litúrgico pós-Va-
139
Capítulo 5
ticano II, uma “Instrução”, não pretendia lidar somente com rubricas. Ele
também pretendia explicar as razões dos ritos,1 ou servir como uma espécie de
“tratado doutrinal e pastoral, uma pequena summa” para auxiliar na compre-
ensão de um rito.2
Durante o ano antecedente à publicação da IG de 1969, a Consilium afir-
mou que o documento por vir conteria os “princípios teológicos” da Mis-
sa Nova, e serviria como uma “exposição teológica”, ou uma “apresentação
doutrinal” que ajudaria a se compreender a “natureza e significado” dos ele-
mentos do rito novo.3
A IG de 1969 era assim o modelo teológico ou o plano de base que os
arquitetos da Missa Nova assumiram para explicar sua criação. Uma vez que
nos propusemos a examinar o tratamento da doutrina católica na Missa Nova,
esse documento será de grande interesse para nós.
A quantidade de tempo que a Consilium gastou na composição da IG de
1969 indica a relevância que os reformadores atribuíam aos seus conteúdos.
De outubro de 1967 a abril de 1969, o texto passou por cinco redações e foi
enviado à Paulo VI para revisão ao menos duas vezes, com as últimas mudan-
ças vindo dele pouco antes que o Novus Ordo Missae fosse para a imprensa.4
De acordo com o Padre Carlo Braga, o chefe do subcomitê da Consilium
responsável por escrever a IG, o segundo capítulo em particular intitulado
“A Estrutura e as Partes da Missa”, recebeu a “especial atenção” do comitê
140
A Instrução Geral de 1969
5 “Punti”, 245.
6 Jean-Marie R. Tillard OP, “La Réforme Liturgique et le Rapprochement des Églises”,
LO, 224.
141
Capítulo 5
o QUE É a MiSSa?
É relativamente fácil definir a Missa de um modo que seja claro, preciso
e inequívoco. Eis a definição típica, baseada no ensinamento do Concílio de
Trento e formulada na linguagem da teologia tomista tradicional:
O sacrifício incruento da Nova Lei, no qual o corpo e sangue de Cristo, sob as
espécies do pão e do vinho, por uma imolação mística, são oferecidos por um
legítimo ministro de Cristo a Deus, a fim de reconhecer seu supremo domínio
e aplicar a nós os méritos do Sacrifício da Cruz.1
Isso diz o que é a essência da Missa — o que faz a Missa ser a Missa. A de-
finição é tão simples e direta que uma versão quase idêntica aparece na edição
do Catecismo de Baltimore para alunos do 5º e 6º ano.
Mas a própria clareza de tal linguagem segue em direção contrária aos dois
princípios-guia da Reforma Litúrgica pós-Vaticano II: o ecumenismo e o mo-
dernismo. O ecumenismo reza que no falar sobre a Missa, evitem-se palavras
como sacrifício incruento, imolação, méritos etc., porque os não católicos re-
jeitam esses ensinamentos; o modernismo, posto que se baseia na evolução do
dogma e na filosofia existencialista moderna, rejeita essências e simplesmente
prefere descrever as coisas.
1 B. Merkelbach, Summa Theologiae Moralis, 8th ed. (Montreal: Desclée 1949) 3:308.
142
A Instrução Geral de 1969
2 §7: “Cena dominica sive Missa est sacra synaxis seu congregatio populi Dei in unum con-
venientis, sacerdote praeside, ad memoriale Domini celebrandum. Quare de sanctae Ecclesiae
locali congregatione eminenter valet promissio Christi: ‘Ubi sunt duo vel tres congregati in
nomine meo, ibi sum in medio eorum.’ (Mt 18,20).” Tr.em DOL 1297, nota a. Os textos
latinos citados nas notas de rodapé deste capítulo são tomados do texto da IG publicado no
Ordo Missae de 1969.
3 “Aspetti Pastorali del Nouvo ‘Ordo Missae,’” EL 83 (1969), 388-9. “La definisce proprio
a partire dall’assemblea. Viene così rimesso al primo posto il segno-assemblea, nella linea della
più genuina tradizione che fin dalle origini aveva visto nella Messa la ‘sinassi’ della comunità
cristiana.”
4 Ibid. 388, grivo do autor: “Tuttavia, sotto un profilo eminentemente pastorale, sembra
che il grande segno che determina e qualifica la celebrazione, secondo il nouvo ‘Ordo Missae’,
sia l’assemblea eucaristica.”
5 Assim, a Liturgia é “a reunião do povo de Deus unido em convocação…” LP, 29. “Do
que já foi dito sobre a ‘Qehal Yahweh’ e o banquete fraterno daqueles que estão esperando a
consolação de Israel, tem sido feito suficientemente claro que o núcleo da Liturgia cristã deve
ser encontrado na synaxis eucarística [assembleia], na Missa.” LP, 74-5. “A Missa como desen-
volvida a partir da ‘Qehal Yahweh’ era na verdade o povo de Deus no processo de fazer-se a
si mesmo.” LP, 160.
143
Capítulo 5
1 Assim, por exemplo, Henry Bullinger, genro e sucessor de Zurgílio, cujo ensinamento
grandemente influenciaria os protestantes ingleses: “A Ceia do Senhor é uma ação sagrada
instituída na Igreja de Deus, na qual o Senhor, pondo o pão e o vinho perante nós no banque-
te, certifica-nos de sua promessa e comunhão … [e] reúne um corpo visivelmente; e, para ser
breve, vai ter sua morte mantida pelos fiéis em recordação…” Decades, V, sermon 9, (Cambri-
ger: Parker Society, no date) 4:403, quoted in ESR, 173. 14. Tillard, 224.
2 Tillard, 224.
144
A Instrução Geral de 1969
145
Capítulo 5
146
A Instrução Geral de 1969
5 Vide ESR, 172. Para o católico, a Missa é um memorial da paixão de Cristo porque ela
é um ato sacrificial dirigido a Deus, ele se opera objetivamente porque Cristo o instituiu, e
acontece porque um sacerdote ordenado torna o pão e o vinho em Corpo e Sangue de Cristo.
Para o protestante, a Eucaristia é um memorial por outras razões — porque ela é uma recor-
dação dos benefícios que a paixão de Cristo nos logrou tempos atrás ou um sinal de alegria
por “estar salvo”, ou um símbolo da unidade da assembleia no espírito de Cristo.
6 “Réforme Liturgique”, 223.
7 Vide Society, Problem of the Liturgical Reform, 71-2
8 Ibid. 78.
9 The Modern Rite: Collected Essays on the Reform of the Liturgy (Farnborough, England: St.
Michal’s Abbey Press 2002), 43. “A palavra sacrifício é deliberadamente evitada no texto…
não é realmente credível que esta é uma matéria do acaso. É em vez a intenção deliberada de
um grupo de liturgistas progressistas o relegar ao segundo plano o caráter sacrificial da Missa,
e correspondentemente enfatizar a sua qualidade como um banquete.”
147
Capítulo 5
148
A Instrução Geral de 1969
5 Vide §§ 35-9, DOL 1178-83. “Pelo que não se pretende excluir todos os outros tipos
de presença, como se elas não fossem ‘reais’ também…” “quae quidem praesentia “realis”
dicitur non per exclusionem, quasi aliae ‘reales’ non sint, sed per excellentiam, quia est subs-
tantialis.” AAS 57 (1965), 764.
6 OMP, 31. Grifo meu.
7 OMP, 31-2. Grifo meu.
149
Capítulo 5
1. Presença em geral. Há três modos em que se diz que alguém está presente:
1. Presença física. Tanto a substância como os acidentes de uma pessoa estão
presentes. Essa espécie de presença é delimitativa; ela é limitada pela ca-
pacidade da carne e sangue físicos de alguém serem vistos pelos outros.
Esta foi a maneira em que Cristo estava presente no Templo, quando
Ele o purificou. Desde Sua Ascensão, Cristo está presente desta manei-
ra somente no Céu.
2. Presença substantial. A substância do corpo de alguém está presente, mas
sem os acidentes. Isso não pode ocorrer naturalmente, e somente é pos-
sível pelo poder de Deus.
Cristo está presente na Santíssima Eucaristia desta maneira, que é real-
mente e verdadeiramente a substância do seu Corpo e Sangue como
Ele está no Céu, mas sem os acidentes de Seu Corpo e Sangue.1
3. Presença virtual. Esta ocorre se a atividade de uma pessoa está presente
para outra.
Desta maneira, a Santíssima Trindade está presente nas almas dos jus-
tos pela atividade da graça ou o Espírito Santo está presente mediante
a Sua assistência ao Papa e aos Concílios Gerais realizados em união
com ele.
Eis um exemplo mais prosaico: Uma pessoa pode estar virtualmente
presente para outra mediante uma carta que escreveu ou um vídeo em
que apareceu.
1 Os acidentes que nós vemos e percebemos são aqueles do pão e do vinho, que continu-
am muito embora a substância do pão e do vinho já não esteja ali.
2 §7: “Quare de sanctae Ecclesiae locali congregatione eminenter valet promissio Christi:
‘Ubi sunt duo vel tres congregati in nomine meo, ibi sum in medio eorum’. (Mt 18,20).” Tr.
in DOL 1397, note a.
150
A Instrução Geral de 1969
3 Hadrian Simón CSsR, Praelectiones Biblicae, Novum Testamentum (Turim: Marietti 1951)
1:507. “Ubi enim sunt duo vel tres, i.e. plures discipuli congregati in nomine meo, propter me, meam
causam, agentes, ibi sum in medio eorum, non ratione, divinae praesentiae, qua ubique sum, sed
gratiae et assistentiae: ad eorum preces adjuvandas e exaudiendas, ad eorum concilia dirigen-
da. Eo majestas communitatis ostenditur et excellentia orationis communis liturgicae praeser-
tim.” Grifo do autor. Até mesmo comentários protestantes entendem a presença descrita em
Mt 18,20 como virtual.
4 §28, DOL 1418.
151
Capítulo 5
1 “Liturgical Assembly: Biblical and Patristic Foundations”, in The Church Worships, Con-
silium Series, vol 12 (New York: Paulist Press 1966), 15. Grifo meu. Note como ele assume
a ideia de Paulo VI da Mysterium Fidei, §39, DOL 1183 — de que outras presenças são “não
menos reais do que a Presença Real”.
2 Robert J. Ledogar, “Eucharistic Prayer and the Gifts over Which It Is Spoken” (Worship
41 [Dezembro de 1967], 515-29), in LB 78.
152
A Instrução Geral de 1969
153
Capítulo 5
espírito do povo mediante as leituras,1 “Cristo está presente aos fiéis pela sua
própria palavra”,2 o povo é “alimentado por sua palavra”,3 as leituras “apre-
sentam a mesa da Palavra de Deus aos fiéis”,4 as aclamações do povo, na hora
do Evangelho, “reconhecem que Cristo está presente e lhes fala.”5
Essa palavras e figuras apresentam dois problemas:
1. Virtual e Substancial. Cristo está de fato presente a nós, em um certo
sentido, quando nós ouvimos Suas palavras proclamadas na Escritura.
Mas essa presença, novamente, é unicamente virtual, ela não é substan-
cial, i.e., a mesma que Sua Presença Real sob as espécies do pão e do
vinho depois da Consagração.
Na IG, temos ambas presenças confundidas e misturadas no mesmo
nível. Assim a “excessiva ênfase na Presença Real” que Bouyer disse que
“degradou” a compreensão correta da Missa6 simplesmente desaparece.
2. Figuras de Banquete. A IG usa termos tais como alimento, alimentando os
fiéis e a mesa da palavra do Senhor para se referir às leituras da Escritura.
No comentário de Patino até mesmo a homilia é descrita como “a
comunhão da Palavra que é completada na Comunhão Sacramental.”7
Esse é outro truque de mão com metáforas tipicamente modernista. Quan-
do se fala sobre a Missa, alusões ao alimento espiritual são normalmente em-
pregadas somente para se referir à parte da Comunhão na Missa. Falar de
escutar uma leitura da Escritura como alimento é igualá-la com a recepção do
Santíssimo Sacramento, o alimento espiritual, o que, certamente, era o ponto.
As figuras confusas e a linguagem equívoca da IG conduzem à conclusão de
que escutar uma leitura da Escritura e receber a Eucaristia são simplesmente a
mesma coisa; Cristo está presente em ambas as “mesas”.
Mas essa não é a primeira vez que os hereges tentaram corromper a dou-
trina através do uso escorregadio da linguagem sobre presença. Um escritor
protestante disse de Cranmer:
154
A Instrução Geral de 1969
Ele permite que o pão e o vinho sejam chamados o Corpo e o Sangue de Cris-
to; que pode ser dito que Cristo está presente no Sacramento; que a palavra
sacrifício pode ser aplicada à Eucaristia. Mas ele mostra que o significado que
ele atribuiu a essa terminologia é, em sua mente, consistente com as negações
que temos mencionado… Cristo está presente no Sacramento como ele está
presente no Batismo, ou durante a oração, ou como o sol está presente onde
quer que o seu calor seja sentido.8
8 Darwell Stone, History of the Doctrine of the Eucharist (London: 1909) 2:127, quoted in
ESR, 162.
9 Msgr. Joseph Pohl, The Sacraments, A Dogmatic Treatise, ed. By Arthur Preuss (St. Louis:
B. Herder 1957) 2:333.
10 Ibid 337.
11 Assim, Brandolini, “Aspetti Pastorali”, 400.
155
Capítulo 5
e o banquete pascal.1
Similarmente, o §55.d, que trata da Narrativa da Instituição — outrora a
Consagração:
A Narrativa da Instituição: onde pelas palavras e ações de Cristo a Última
Ceia se faz presente, na qual Cristo o Senhor mesmo instituiu o sacramento
de sua Paixão e Ressurreição quando deu aos seu apóstolos o seu Corpo e
Sangue sob as espécies do pão e do vinho, para comerem em beberem, e dei-
xou com eles o mandato de perpetuar esse mesmo mistério.2
Existem ao menos dois erros aqui.
1. A“Ceia” substitui a “Cruz”. A fórmula ecumenicamente aceitável de que
a Missa representa a Última Ceia substitui o ensinamento do Concílio
de Trento de que a Missa representa o Sacrifício da Cruz.
2. Narrativa da Instituição. No lugar da expressão católica Consagração (que
denota uma mudança substancial no pão e no vinho), a IG de 1969
adotou a terminologia protestante de uma “narrativa”. Os protestan-
tes acreditam que seus ministros não têm nenhum poder especial para
consagrar, mas que eles meramente repetem ou narram a história que
aconteceu há muito tempo atrás, na Última Ceia.3
Assim, o Artigo 55.d ensina que ao recontar a história do que Cristo
fez naquela primeira noite de Quinta-Feira Santa, a Última Ceia é re-
presentada. Isso é heresia.
1 § 48: “Cena novissima, in qua Christus memoriale suae mortis et resurrectionis insti-
tuit, in Ecclesia continue praesens efficitur cum sacerdos, Christum Dominum repraesentans,
idem perficit quod ipse Dominum egit atque discipulis in sui memoriam faciendum tradidit,
sacrificium et convivium paschale instituens.” DOL 1438, note h. Grifo meu.
2 § 55. d: “Narratio institutionis: qua verbis et actionibus Christi repraesentatur cena illa
novissima, in qua ipse Christus Dominus sacramentum Passionis et Resurrecionis suae ins-
tituit, cum Apostolis suum Corpus et sanguinem sub speciebus panis et vini manducandum
et bibendum dedit, iisque mandatum reliquit idem mysterium perpetuandi. Tr. in OMP, 131.
Grifo meu.
3 Omitir o termo “consagração” também foi um dois-por-um ecumênico para agradar os
cismáticos orientais que acreditam que os elementos sobre o altar se tornam o Corpo e o
Sangue de Cristo não naquilo que nós chamamos de Palavras de Consagração, mas, em vez,
na epiclesis, uma oração invocando o Espírito Santo. Vide Tillard, 215-7.
156
A Instrução Geral de 1969
4 MD 60-9.
5 MD 93.
6 Assim: a celebração da Missa é “a ação de Cristo e do povo de Deus organizada hierarqui-
camente” (§1, DOL 1391). Na Oração dos Fiéis, “o povo, exercendo sua função sacerdotal,
intercede por toda a humanidade” (§45, DOL 1435). O significado da Oração Eucarística é que “a
congregação inteira se une a Cristo no reconhecimento das grandes coisas que Deus tem feito e
no oferecimento do sacrifício” (§54, DOL 1444). Os fiéis “oferecem a vítima não somente pelas
mãos do sacerdote, mas também juntamente com ele” (§62, DOL 1452). O povo “deve se tornar
um corpo...sobretudo oferecendo juntos o sacrifício” (§ 62, DOL 1452). “Grande importância deve
ser atribuída à Missa celebrada por qualquer comunidade… isso é particularmente verdade para a
celebração da comunidade no Dia do Senhor” (§ 75, DOL 1465). Grifo meu.
7 MD 83. “o povo goza de verdadeiro poder sacerdotal, enquanto o sacerdote age unica-
mente por ofício a ele confiado pela comunidade. Afirmam, em consequência, que o sacrifício
eucarístico é uma verdadeira e própria ‘concelebração’, e que é melhor que os sacerdotes
‘concelebrem’ junto com o povo presente, do que, na ausência destes, ofereçam privadamente
o sacrifício.”
157
Capítulo 5
1 Vide MD 84. O povo, ensina Pio XII, “de nenhum modo” representa o Divino Reden-
tor, não é seu próprio mediador e de nenhum modo possui o poder sacerdotal.
2 MD 92. “Para não dar ensejo a erros perigosos neste importantíssimo argumento, é
necessário precisar com exatidão o significado do termo ‘oferta’. A imolação incruenta por
meio da qual, depois que foram pronunciadas as palavras da consagração, Cristo está presente
no altar no estado de vítima, é realizada só pelo sacerdote enquanto representa a pessoa de Cristo e não
enquanto representa a pessoa dos fiéis.” Grifo meu.
3 OMP, 70-1.
4 OMP, 71. Grifo meu.
5 Ibid. Grifo meu.
158
A Instrução Geral de 1969
159
Capítulo 5
1 A Didaqué, A Carta de Clemente aos Coríntios, Santo Inácio de Antioquia, São Justino
Mártir, Santo Irineu, Hipólito, Tertuliano, São Cipriano e uma “tradição canônica” alega-
damente tirada de Hipólito. Vide Hervé-Marie Legrand, “The Presidency of the Eucharist
According to the Ancient Tradition”(Worship 53 [setembro de 1979], 413-38, em LB, 199-211.
2 Capítulos 65.3, 65.5, 67.5 e 67.6, tr em TM, 18-21.
3 Proestos, TM, 18n4.
4 “De Cena Domini”, 143-6.
160
A Instrução Geral de 1969
escrita para o imperador pagão Antônio Pio (138-61 AD). Se São Jus-
tino tivesse usado a palavra grega para sacerdote, haveria o risco de que
o imperador confundisse o sacerdócio cristão com o sacerdócio pagão.
A palavra grega para presidente, por outro lado, era uma palavra neutra,
facilmente entendida pelos pagãos.5
2. Ou o Presidente de Hoje? A verdadeira questão sobre presidência, no en-
tanto, não é o que ela significava para São Justino no segundo século,
mas sim o que ela significa para os liturgistas hoje. Seu interesse em
retornar ao cristianismo primitivo, no fim das contas, ocupa-se uni-
camente daquelas práticas antigas que melhor se adequam ao sistema
teológico modernista. (Quem, afinal de contas, já ouviu algum liturgista
advogar a restauração de práticas cristãs primitivas, tais como exigir
que as mulheres usem véu na Missa, separar os homens das mulheres
na Igreja em lados opostos de uma cortina, impor penitência pública
para pecados de adultério ou anunciar que hereges, judeus e pagãos
deveriam ir embora?)
O termo presidente vem da palavra latina praesideo, que significa “sentar
antes, proteger, tomar cuidado de” ou “presidir, gerenciar, dirigir ou
governar”. Assim aquele que preside:
Auxilia em uma operação realizada por um outro, supervisionando-a ou di-
rigindo-a. Consequentemente, para presidir uma ação (a construção de um
edifício, por exemplo) não é o mesmo que realizar aquela ação por si mesmo.6
É fácil ver o quanto presidência se adequa de perto com o paradigma
da teologia de assembleia de Bouyer/Brilioth. Se na IG, a assembleia
aparece para concelebrar a Eucaristia com Cristo, o presidente deve
então assistir a assembleia em sua concelebração agindo como um líder
por sua vontade. Uma vez que presidir significa nada mais que dirigir ou
governar, ele não possui necessariamente um caráter sacramental associa-
do a ele.
Liturgistas modernos descrevem a presidência como “um serviço de
5 Vide Legrand, em LB, 204. Legrand, naturalmente, recusa a ideia de que a palavra proestos
foi escolhida deliberadamente.
6 Myra Davidoglou, “Analyse du Nouveau Rite”, suplemento a Matines 13 (1978), 19-20.
161
Capítulo 5
1 Rev. Robert W. Hovda, Strong, Loving and Wise: Presiding in Liturgy (Collegeville MN: Li-
turgical Press 1976), 7. Também Crichton, Christian Celebration, 62.
2 Hovda 53-4.
3 Vide Legrand, em LB, 196-221.
4 OMP, 48.
5 § 10, DOL 1400
6 § 60: “Etiam presbyter celebrans coetui congregato in persona Christi praest.”
7 § 48, DOL 1438, nota h.
8 Da Silveira, La Nouvelle Messe, 31.
9 OMP, 71.
10 OMP, 142.
11 OMP, 62.
162
A Instrução Geral de 1969
12 § 11, DOL 1401. Vide também Sagrada Congregação do Culto Divino, Carta Circular
Eucharistiae Participationem, 27 de abril de 1973, DOL 1975-93.
13 § 14, DOL 1404.
14 OMP, 56.
163
Capítulo 5
calorosas.”1
Depois da introdução da Missa Nova, toda uma geração de sacerdotes
levou essas ideias à sua conclusão lógica, transformando suas Missas em apre-
sentações.2 Onde os diáconos outrora aprendiam as rubricas para a Missa, eles
agora recebem cursos sobre o “estilo presidencial”. Um sacerdote americano,
Robert Hovda, escreveu um best-seller altamente influente sobre o tópico,
que estava carregado com todos os tipos de dicas de apresentação.3
Enquanto essas ideias humanísticas e dessupernaturalizantes parecem
completamente insanas, elas meramente implementam os princípios que a
própria IG enunciou. Se a assembleia celebra a Missa e o sacerdote exerce
sua presidência sobre a assembleia por meio de instruções e diálogo, então
ele deve ajudar o povo a celebrar “ativamente”, i.e., dinamicamente. Ele deve
atrair sua atenção e interesse apresentando-se para eles, comunicando-se com
eles, usando a troca de olhar, brincando um pouco e assim por diante. O sa-
cerdote se torna um ator, um apresentador, um animador, cujo objetivo é ser
convincente, persuasivo e atrativo de modo que a celebração da assembleia
seja mais “efetiva”.
1 OMP, 95.
2 O presidente deve proclamar a oração eucarística “de tal modo que a congregação seja
capaz de experenciá-la como sua oração. Isso requer grandes esforços na qualidade de apre-
sentação da parte do presidente.” Smits, “Congregational Order of Worship”, em LB, 297.
3 Vide Hovda. Alguns de seus pontos: O negócio da Igreja “é criar uma sensibilidade
consensual” no culto (6). Uma função do presidente é que ele “facilite, discretamente passe
o foco para aquele que está atuando em um momento particular, guie, disponha quando
necessário, conduza a congregação na assistência da ação” (17). O presidente tem “uma ne-
cessidade muito especial de se tornar uma pessoa corporal, confortável na carne, movendo-
se graciosamente e expressivamente, gesticulando espontaneamente, dizendo algo ao povo
com estilo tanto no caminhar quanto no falar, comunicando-se pelo ritmo e articulação da
pessoa inteira, sabendo como vestir-se e usar roupas, etc. Você pode chamá-lo de ‘espírito’,
como muitos fazem” (31). É um pouco difícil imaginar que São Justino Mártir sentisse uma
necessidade de ser uma “pessoa corporal”. Hovda queria ver “uma geração de presidentes
que querem ser loucos, engraçados, dados a fantasia, que não se importam em vestir casulas
malucas e fazer coisas improdutivas” (43), um desejo infelizmente que parece ter se tornado
realidade. Ser um presidente significa “consentir em ser um ponto focal em ação, estar em
constante comunicação com os outros ministros e a assembleia inteira mediante o contato do
olhar, do gesto, da postura corporal e movimentos, assim como por palavras” (57). Quando
o presidente dá a Comunhão a um indivíduo, “esse momento oferece uma oportunidade para
uma troca de olhares e um toque de mãos de afeto respeitoso e encorajamento mútuo” (71).
164
A Instrução Geral de 1969
a DESrEgUlaMENTaÇÃo Da liTUrgia
Embora a IG de 1969 explique os princípios teológicos por trás da Missa
Nova, a maior parte do documento se ocupa de fornecer as direções práticas,
“como fazer”, para celebrar o rito, o que os livros litúrgicos pré-Vaticano II
chamariam de rubricas. Quando nos voltarmos para o Ordo da Missa em si,
examinaremos as direções particulares da IG que lidam com cada sessão do
rito individualmente.
Nesta sessão, no entanto, olharemos para algo mais geral: a natureza das dire-
ções litúrgicas da IG. Isso, como veremos, não somente tem consequências que
põem em perigo a doutrina católica, mas também explica o fato de que nunca se
sabe o que se vai encontrar na Missa de uma igreja pouco familiar — o que se
poderia chamar, e não sem razão, de o “Elemento Surpresa Bugnini-Montini”.
Este último sempre tem sido um ponto particularmente doloroso para os
conservadores (e eu outrora estive entre eles), que anseiam por uma celebra-
ção “reverente” da Missa Nova, mas enfrentam uma escala litúrgica pós-Va-
ticano II que vai do estilo casual de um subúrbio americano ao esteticismo
elevado; contemplando ainda o estilo sentir-se bem do Newman Center, o
estilo Mariachi e o estilo “Quero ser famoso da EWTN”.
165
Capítulo 5
1 The Congregation of Rites, CUA Canon Law Studies Nº. 352 (Washington: CUA Press
1954), 136.
2 Liturgical Law, 6. Embora os Papas tenham exercido sua autoridade universal em matérias
litúrgicas durante os primeiros quinze séculos da Igreja (vide McManus 14-21), até que os
livros litúrgicos papais eventualmente viessem a ser usados mais amplamente, havia de fato
alguma diversidade nos ritos litúrgicos do Ocidente. A regulamentação centralizada de todo o
aspecto do culto público foi estabelecida depois do Concílio de Trento a fim de conter abu-
sos largamente difundidos e proteger a Liturgia das incursões dos hereges; tal centralização
fez-se possível pela invenção da imprensa, que podia tornar os textos aprovados prontamente
disponíveis.
3 MD 45-7.
166
A Instrução Geral de 1969
4 Vide capítulo 2.
5 SC § 38, DOL 38.
167
Capítulo 5
1 “Os novos livros litúrgicos são acompanhados pela Instrução Geral, uma nova etapa nos
livros do Rito Romano; o propósito da Instrução Geral é dizer como o livro deve ser usado e
o que ele significa. A direção na Instrução Geral tem precedência sobre os detalhes minucio-
sos nas páginas do próprio livro, e a primeira diretiva afirma que a celebração litúrgica deve
ser ‘pastoralmente efetiva’ — inteligível, auxiliando a participação do povo.” Ralph A. Keifer,
To Give Thanks and Praise: General Instruction of the Roman Missal wich Commentary for Musicians and
priests (Washington DC: National Association of Pastoral Musicians 180, 113-4.
2 PGC, 33.
168
A Instrução Geral de 1969
3 PGC, 143.
4 PGC, 22.
5 “Aspetti Pastorali”, 390-1.
6 Seasoltz, New Liturgy, 189.
7 Liturgical Law, 163.
8 Liturgical Law, XI.
9 Liturgical Law, 165.
169
Capítulo 5
pelo próprio Bugnini e aprovado por Paulo VI,1 permitia aos celebrantes uma
liberdade quase total para mudar e criar textos e cerimônias em tais celebra-
ções, como lhes parecesse conveniente.
As celebrações resultantes eram geralmente sacrílegas e uniformemente
bobas.2
Houve também apelos por “indigenização”, isto é, incorporar em larga
escala na Liturgia práticas culturais locais. Rituais pagãos e práticas culturais já
têm sido introduzidos na Missa Nova em muitas nações não ocidentais.3 As
memórias de Mons. Bugnini brilhantemente listam a multidão de adaptações
oficialmente aprovadas para a Tailândia, Paquistão, Índia, Laos, Camboja, Ja-
pão, China, Zâmbia, Congo e Zaire,4 incluindo dança litúrgica na África5 e a
celebração do Ano Novo Chinês que, como ele nota, foi condenada como
supersticiosa pelo Papa Bento XIV.6
O grande prêmio para a indigenização litúrgica pós-Vaticano II, no entan-
to, vai para a “Missa Papal” que João Paulo II celebrou em 8 de maio de 1984
na Papua, Nova Guiné, onde uma mulher nativa com os seios descobertos leu
a Epístola.7
Começando em meados dos anos 80, oficiais do Vaticano de tendência
mais conservadora (Joseph Ratzinger inclusive) periodicamente tentaram de-
ter algumas das práticas litúrgicas que o pluralismo tinha gerado. Mas, em úl-
tima análise, isso é como Canute mandando nas ondas. A natureza da própria
IG impede a noção de que a nova legislação tenha a mesma força obrigatória
que as antigas rubricas.
De todos os princípios perigosos da Instrução Geral de 1969, sua desre-
1 Sagrada Congregação do Culto Divino, Diretório para as Missas com Crianças, Pueros
Baptizatos, 1 de novembro de 1973, DOL 2134-88.
2 Para um excelente relatório documentado, vide Pope Paul’s VI New Mass, 169-93.
3 Para uma breve discussão das adaptações africanas e índias, vide William J. Freburger,
Liturgy: Work of the People (Mystic CT:Twenty-Third Publications 1984), 83-90. Vide também
a lista de adaptações extensivas aprovadas para a Índia em “Acta Conferentiarum Episcopa-
lium: India”, Notitiae 5 (1969), 363-74.
4 RL, 263-74.
5 RL. 274.
6 RL, 270.
7 Vide (com a devida continência dos olhos) Daniel LeRoux, Peter, Lovest Thou Me? (Victo-
ria Australia: Instauratio Press 1988), 154.
170
A Instrução Geral de 1969
rESUMo
• A Instrução Geral sobre o Missal Romano (IG) de 1969 não contém somen-
te as direções rituais para celebrar a Missa de Paulo VI, mas também os
princípios teológicos por trás dela. Os criadores da Missa Nova viram
a IG como uma exposição teológica ou apresentação doutrinal para
ajudar a entender a natureza e significado dos elementos do novo rito.
Como tal, a IG de 1969 deveria ser tida como seu “programa teológi-
co” para o Novus Ordo Missae.
• No lugar da definição tradicional da essência da Missa como sacrifício, o
parágrafo 7 da IG define a Missa como assembleia. Esta “define a Missa
exatamente” e é “o grande sinal que define e qualifica a celebração inteira”.
• A definição da IG é uma reformulação da teologia da assembleia da
Missa de Louis Boyer, que estava ela mesma baseada na doutrina eu-
carística do ecumenista luterano sueco, Yngve Brilioth. Ela também
reflete a teologia existencialista do Vaticano II.
• Elementos individuais da definição (Ceia do Senhor, povo de Deus, memorial
etc.) foram adotados “com um espírito explicitamente ecumênico” e
foram “os frutos de convergência doutrinal” com os hereges.
• Os quatro “elementos irredutíveis” da Eucaristia propostos por Bou-
yer/Brilioth (banquete, sacrifício, ação de graças, memorial) então
emergem por todo o resto da IG.
• O sacrifício assim se torna meramente um elemento entre quatro. A IG
assim se desfaz dos perigos ecumênicos desse termo (1) empregando-o
com a figura do banquete para ofuscá-lo e (2) evitando referências ex-
plícitas à Missa como um sacrifício de propiciação (fazendo satisfação
pelo pecado), porque essa doutrina é repugnante aos hereges.
• Em vez disso, a IG insiste em memorial, um termo entendido de um
modo por católicos e de outro pelos protestantes. O significado equí-
voco de memorial fez dele um “termo precioso” da teologia ecumênica,
o que é a razão pela qual ele foi empregado na IG de 1969.
• No seu tratamento da presença de Cristo na Missa, a IG omite o termo
transubstanciação, um termo detestado por protestantes e modernistas.
171
Capítulo 5
172
A Instrução Geral de 1969
173
Capítulo 5
174
CaPÍTUlo 6
O
leitor que entra em contato com seu coordenador de liturgia
(geralmente uma mulher, frequentemente uma ex-freira) e lhe
pede emprestada uma cópia do Missal de Altar para poder
examinar as passagens incriminatórias da Instrução Geral do
Missal Romano de 1969, mencionadas no capítulo anterior, ficará intrigado.
O material mais questionável parece ter sido mudado. Além disso, encontra-
rá um documento chamado Prefácio ou Introdução, contendo todo tipo de
terminologia que soa tradicional, assim como as garantias repetidas de que o
Missal que você segura em suas mãos é totalmente, completamente e manifes-
ta inquestionavelmente o ensinamento do Concílio de Trento sobre o Santo
Sacrifício da Missa.
Ora, como isso foi parar ali? E, no fim das contas, acaso isso não garantiria
de algum modo que tudo está bem com a Missa de Paulo VI?
A resposta para essas perguntas é o tópico deste capítulo. Quando a Missa
Nova e a IG de 1969 apareceram pela primeira vez, imediatamente provoca-
ram uma controvérsia e uma resistência considerável. Isso levou à publicação
da Intervenção Ottaviani, uma crítica teológica à Missa Nova que se torna-
ria, com efeito, a carta magna do movimento tradicionalista. Em resposta, o
Vaticano e até o próprio Paulo VI defenderam publicamente a ortodoxia do
novo rito, e então publicaram uma versão revisada da IG que buscava “triden-
tinizar” a teologia protestante e modernista da original. Esta, com algumas
mudanças subsequentes, é substancialmente o texto da IG que agora aparece
no início dos Missais de Altar usados na Missa Nova.
Deve ser notado mais uma vez que, desde o começo da controvérsia sobre
a Missa Nova de 1969, aqueles católicos que a rejeitaram o fizeram no terreno
doutrinal e moral — isto é, considerando-a protestante, modernista, antitri-
dentina, perigosa à fé, sacrílega, etc. Fatores como a beleza da Missa Tridenti-
na e o seu apelo sentimental, ou a feiura da Missa Nova e o seu abandono das
175
Capítulo 6
a iNTErVENÇÃo oTTaViaNi
No tempo em que Paulo VI promulgou o Novus Ordo Missae e a Instrução
Geral em 3 de abril de 1969, católicos conservadores — eles depois seriam
chamados de “tradicionalistas” — sofreram quase cinco anos de mudanças
litúrgicas, cada estágio parecia trazer a Missa mais perto do protestantismo
e mais perto do ensinamento dos teólogos modernistas, que buscavam sub-
verter a Igreja desde dentro. No Novo Ordo da Missa e na Instrução Geral,
o protestantismo e a nova teologia pareciam ter triunfado. Mas o que fazer?
No campo conservador, havia duas membras da aristocracia romana, Vit-
toria Cristina Guerrini e Emilia Pediconi. Ambas eram amigas do Cardeal Al-
fredo Ottaviani (então retirado do seu posto como Prefeito do Santo Ofício)
e ambas tinham conexões no Vaticano e em outros círculos eclesiásticos. As
senhoras usaram os seus contatos para reunir um pequeno grupo de teólogos
conservadores, liturgistas e párocos que preparariam um estudo sobre os con-
teúdos do Novo Ordo da Missa. O Cardeal Ottaviani concordou — não está
claro até que ponto — em revisar o estudo e apresentá-lo a Paulo VI.1
O grupo se reuniu algumas vezes em abril e maio de 1969. A tarefa de pre-
parar um texto adequado coube a um teólogo dominicano e filósofo, o Padre
M. L. Guérard des Lauriers, então professor na Pontifícia Universidade La-
teranense em Roma. Trabalhando a partir de suas notas em francês, Guérard
176
A Instrução Geral de 1970
2 “Avertissement”, 5-6.
3 “Avertissement”, 7. Guérard perdeu sua posição em Latrão como resultado do seu en-
volvimento no projeto. Ele ensinou depois no Seminário de Ecône, Suíça, e foi consagrado
bispo em 1981 pelo Arcebispo aposentado de Hué, Mons. Pierre-Martin Ngo-dinh-Thuc. Eu
tive a honra de ter o Padre Guérard como professor em Ecône.
4 “Avertissement”, 7.
5 Baseado em um relato de uma das organizadoras, a Dr. Elizabeth Gerstner, um resumo
que é fornecido em Davies, em Pope Paul’s New Mass, 483-4.
177
Capítulo 6
1 O trabalho foi Tito Casini, La Tunica Stracciata (A Túnica Rasgada), (Roma: 1967).
2 OI, 27-8.
178
A Instrução Geral de 1970
3 RL, 184.
4 RL, 379. Davies, Pope Paul’s New Mass, 506, repete uma história dos “boatos romanos”
— um sacerdote francês anônimo que ouviu dizer do Cardeal Journet, que ouviu dizer do...?
— que um “desobediente” Bugnini detinha o texto da IG de 1969 longe de Paulo VI e que
Paulo VI “chorava”. Conversa fiada. Tanto Braga (“Punti”) quanto Bugnini (em RL) atestam
o envolvimento de Paulo VI. E, como vimos, quando Montini era Arcebispo de Milão, ele
promoveu a teologia da assembleia da Missa de Bouyer/Brilioth, que apareceria no §7 da IG
de 1969.
5 RL, 285.
179
Capítulo 6
180
A Instrução Geral de 1970
181
Capítulo 6
1 [Annibale Bugnini CM], “Decima Sessio Plenaria ‘Consilii’”, Notitae 4 (1968) 181: “2. De
Institutione generali pro Missali Romano. Agitur dc principiis theologicis et de normis pasto-
ralibus ct rubricalibus pro celebratione Missae, Missali Romano pracmittendis. Labor paratus
est a peculiari coetu a studiis a Secrctaria ‘Consilii’ constituto.” Grifo meu.
2 Revista Eclesiástica Brasileira 28 (1968), 628, citado em da Silveira, 22n20. Grifo meu.
182
A Instrução Geral de 1970
3 [Annibale Bugnini CM], “Ordo Missae et Institutio Generalis”, Notitiae 5 (1969), 151,153:
“È uno dei capitoli fondamentali del documento. Offre la descrizione della celebrazione, non
tanto sotto il profilo rubricale e cerimoniale, quanto piuttosto sotto l’aspetto dottrinale. Viene
messa in luce prima la natura e il significato dei vari elementi che ricorrono nella celebrazione:
parola di Dio, preghiere presidenziali, canto, atteggiamenti esteriori, silenzio. Ciascuno viene
presentato c spiegato, perché da ciò dipendono poi le applicazioni pratiche… Da rilevare,
infine, che per ogni parte della Messa, in questo capitolo vengono congiunti e l’espressione
rubricale di carattere generale e la parte dottrinale e pastorale, in modo da far comprendere
come tutto questo complesso deve crescere tenuto presente per un esatto ed efficace ordi-
namento della celebrazione.” Grifo meu. Em suas memórias de 1983 (RL, 382-3), Bugnini
repete a passagem citada, palavra por palavra e sem atribuição.
4 Ibid. 153: “II capitolo è una presentazione piuttosto dottrinale e pastorale dei diversi
uffici e compiti che i differenti ministri e participanti devono svolgere nella celebrazione.”
Grifo meu.
5 PGC, 3. Grifo meu.
183
Capítulo 6
1 “In Novum Ordinem Missae”, EL 83 (1969), 380-1: “[...] fundamentale est in univer-
sa Institutione: constituit quodammodo summam qua exponitur sensus totius celebrationis,
uniuscuiusque ipsius partis atque singulorum elementorum, sub aspectu doctrinali, pastorali
et rubricali..” Grifo meu.
2 “Punti”, 246. “È un documento liturgico, ma con una finalità dottrinale e catechetica.”
3 Vide Fraternidade, Problem of the Liturgical Reform, 2-3.
4 Alocução a uma Audiência Geral sobre o rito novo da Missa, que estava para ser intro-
duzido, 19 de novembro de 1969, DOL 1758.
184
A Instrução Geral de 1970
o NoVo ProÊMio
Quando o Novo Ordo da Missa e a Instrução Geral foram publicados em
abril de 1969, a Consilium ainda estava trabalhando sobre os Próprios para o
Missal Novo. A Constituição Apostólica de Paulo VI Missale Romanum apare-
ceu em 30 de novembro de 1969, o Primeiro Domingo do Advento, na data
em que o novo Missal começaria a ser usado. Mas, porque a controvérsia co-
meçou com a Intervenção Ottaviani tendo “fomentado” o clima de suspeita
185
Capítulo 6
1 Alessandro Pistoia CM, “II ‘Proemium’ e le Modifiche della ‘Institutio Generalis’: Com-
mento”, EL 84 (1970), 241-2.
2 Vide RL, 389.
3 “L’Ordo Missae”, La Pensée Catholique 122 (1969), recentemente reimpresso em Soda-
litium 63 (abril de 2009)
4 Citado em RL, 287.
5 O Cardeal estava cego nessa época. Seu secretário, Mons. Gilberto Agustoni, juntamente
com Bugnini e Mons. Anton Hänggi, tinha composto um memorando a Paulo VI propondo
um Ordo Missae que era mais ou menos o que se tornaria o Novus Ordo. Vide Anthony Ceka-
da, “Background to the Ottaviani Intervention”, OI, 7-10.
186
A Instrução Geral de 1970
6 Ela foi decorada com uma série de gravuras modernas elegantemente feias que pareciam
os esboços de uma antiga edição de Frankenstein. A única coisa faltando nas figuras dos
“santos” eram os parafusos no pescoço.
7 Vide RL, 390-1.
8 Vide por exemplo: Pistoia, “Il ‘Proemium’... Commento”, 244.
187
Capítulo 6
1 §l, DOL 1376. O título “Proêmio” (em latim, “Proemium”) é às vezes vertido ao inglês
como “Introdução”. O latim original divide o Proêmio à Institutio Generalis de 1970 em 15
artigos. Os artigos no corpo da Institutio de 1970 seguem a mesma numeração que ela tinha
na Institutio de 1969.
2 §2, DOL 1377.
3 §2, DOL 1377.
188
A Instrução Geral de 1970
189
Capítulo 6
1 M70, 241. “Aquele Filho Unigênito que constituístes, pela unção do Espírito Santo,
como Sumo Sacerdote do Novo e Eterno Testamento e que por inefável disposição se dig-
nou sancionar que o seu único sacerdócio fosse conservado na Igreja. Pois ele não somente
adornou Seu próprio povo com o sacerdócio real, mas também, por Sua bondade fraternal,
elegeu homens para fazer partícipes em Seu santo ministério pela imposição de mãos.” “Qui
unigenitum tuum Sancti Spiritus unctione novi et aeterni testamenti constituisti Pontificem, et
ineffabili dignatus es dispositione sancire, ut unicum ejus sacerdotium in Ecclesia servaretur.
Ipse enim non solum regali sacerdotio populum acquisitionis exornat, sed etiam fraterna ho-
mines digit bonitate, ut sacri sui ministerii fiant manuum impositione participes.” Grifo meu.
2 §5, DOL 1380. Grifo meu.
3 Da Silveira, La Nouvelle Messe, 104-5.
190
A Instrução Geral de 1970
191
Capítulo 6
MUDaNÇaS Na iNSTrUÇÃo
O novo Proêmio do Missal de 1970 foi seguido pelo texto revisado da
Instrução Geral, e a Congregação do Culto Divino emitiu uma Apresentação
para explicar as mudanças que tinham sido feitas. Assim como a Clarificação
192
A Instrução Geral de 1970
193
Capítulo 6
1 Ibid.
2 Elas são dadas em ‘Variationes in ‘Institutionem Gcneralem Missalis Romani’ Inductae”,
Notitiae 6 (1970), 177-93. A versão original e revisada são postas lado a lado em “Variationes
Praecipuae in Institutionem Inductae”, EL (1970), 233-40.
3 Christian Celebration, 52.
194
A Instrução Geral de 1970
4 “ In Missa seu Cena dominica populus Dei in unum convocatur, sacerdote præside per-
sonamque Christi gerente, ad memoriale Domini seu sacrificium eucharisticum celebrandum.
Quare de huiusmodi sanctæ Ecclesiæ coadunatione locali eminenter valet promissio Christi:
“ Ubi sunt duo vel tres congregati in nomine meo, ibi sum in medio eorum ” (Mt 18, 20). In
Missæ enim celebratione, in qua sacrificium crucis perpetuatur. Christus realiter præsens adest
in ipso cœtu in suo nomine congregato, in persona ministri, in verbo suo, et quidem substan-
tialiter et continenter sub speciebus eucharisticis.” DOL 1397.
5 Pistoia, “Il ‘Proemium’... Commento”, 244.
195
Capítulo 6
Na última Ceia, Cristo instituiu o sacrifício e banquete pascal, que faz o sa-
crifício da cruz continuamente presente na Igreja, quando o sacerdote, re-
presentando a Cristo Senhor, faz o mesmo que o Senhor fez e mandou aos
discípulos que fizessem em sua memória.1
Esta versão alude à relação existente entre a Missa e o Sacrifício da Cruz, e
substituiu comemoração – um termo que protestantes geralmente aplicam à
Eucaristia - por sacrifício e banquete pascal.
A versão revisada, porém, ainda não faz referência à Missa como um sa-
crifício de propiciação – a grande “pedra de tropeço” ao ecumenismo, como
Jungmann a chamou. E a teologia do “Mistério Pascal” que aparece aqui é
(como os autores do estudo teológico da Reforma Litúrgica, feito pela FSS-
PX, tão convincentemente demonstraram) um sistema teológico inteiramente
novo, que os modernistas formularam para “superar” não só o ensinamento
de que a Missa é um sacrifício propiciatório, mas também a doutrina católica
tradicional sobre o pecado e até mesmo sobre a própria Redenção.2
Além do mais, é incorreto dizer que na Última Ceia, Cristo instituiu o ban-
quete pascal. O banquete pascal era, na verdade, o banquete festivo que Nosso
1 §48: “In Cena novissima, Christus sacrificium et convivium paschale instituit, quo sacrifi-
cium crucis in Ecclesia continue præsens efficitur, cum sacerdos, Christum Dominum repræ-
sentans, idem perficit quod ipse Dominus egit atque discipulis in sui memoriam faciendum
tradidit.” DOL 1438. Grifo meu.
2 Os autores do Problem of the Liturgical Reform, 40-50, resumem a teologia do “Mistério
Pascal” da seguinte forma: “O pecado não deve mais ser visto a partir da perspectiva da ira
divina, já que não se incorre em dívida de justiça com relação a Deus… o pecado do homem
parece prejudicar apenas ele próprio e a sociedade, sem ser prejudicial a Deus. Além do
mais, o pecado não ofende a justiça de Deus, mas apenas Seu amor… Consequentemente,
a necessidade de satisfazer a justiça divina não é mais aparente, e a doutrina da satisfação
expiatória de Cristo parece escandalosa… Se a palavra ‘satisfação’ é mantida ocasionalmente,
é apenas pelo motivo de que ‘não é um requerimento do amor de Deus, mas apenas o que o
amor pede em nós’ [para recuperar] nossa própria saúde espiritual… [agora é apenas] uma
punição puramente corretiva e não mais, de forma alguma, relacionada com a vingança di-
vina… A Redenção não é mais a satisfação da justiça divina como conquistada por Cristo,
mas sim a revelação suprema da aliança eterna que Deus fez com a humanidade e que jamais
foi destruída pelo pecado… O ato principal da Redenção não é mais a morte de Cristo, mas
sim Sua Ressurreição e Sua Ascensão… A satisfação expiatória de Cristo e Sua mediação na
oração não mais se mostra de absoluta necessidade.” Tais noções, o autor observa, “têm sido,
portanto, vastamente removidas do novo Missal e notavelmente das Orações Eucarísticas”. A
necessidade de prestar satisfação pelo pecado desaparece.
196
A Instrução Geral de 1970
3 Vide Cornelius a Lapide, Commentaria in Matthaeum 26:26. “Ubi nota triplicem hic fuis-
se Christi coenam, primam sacram agni paschalis... secundam communem aliorum ciborum
post agnum... Christus vero tertiam addit sacerrimam, imo divinam, scilicet institutionem
Eucharistiae.” Estou ciente de que esse comentário sofre do defeito geral de tratar o Novo
Testamento como um relato histórico, em vez de tomá-lo como um mero conto de fadas.
4 “Variationes in ‘lnstitutionem...’Inductae,” 180. Grifo meu.
5 §55.d: “Narratio institutionis et consecratio: verbis et actionibus Christi sacrificium pe-
ragitur, quod ipse Christus in Cena novissima instituit, cum suum Corpus et Sanguinem sub
speciebus panis et vini obtulit, Apostolisque manducandum et bibendum dedit et iis manda-
tum reliquit idem mysterium perpetuandi.” DOL 1445. Grifo meu.
197
Capítulo 6
1 §60: “Etiam presbyter, qui in societate fidelium sacra Ordinis potestate pollet sacrificium
in persona Christi offerendi, exinde coetui congregato praeest, cujus orationi praesidet, illi
nuntium salutis proclamat, populum sibi sociat in offerendo sacrificio per Christum in Spiritu
Sancto Deo Patri, fratribus suis panem vitae aeternae dat, ipsumque cum illis participat....”
DOL 1450. Grifo meu.
2 §56, DOL 1446.
3 §56.a, DOL 1446.
4 §80.c, DOL 1470 e §117, DOL 1507.
5 §109, DOL 1499.
6 §235.e, DOL 1625.
7 §276, DOL 1666.
198
A Instrução Geral de 1970
199
Capítulo 6
1 “Slowing the Pace of Liturgical Revolution? Reflections on the Third Millenium Missal,
Latin Mass, outono de 2002, 26. E.g., sugerir ao sacerdote que improvise o texto do intróito
(§48, IG 2000), permitir acólitas (107), censurar implicitamente sacerdotes que não desejam
concelebrar (114), autorizar permanentemente que certas Orações Eucarísticas adicionais se-
jam usadas universalmente (147), favorecer a recepção da Comunhão de pé em procissão,
em vez da recepção de joelhos à mesa da Comunhão (160), proibir na prática a celebração
de três Missas consecutivas no Dia de Finados (204), reduzir a quantidade de genuflexões
durante a Missa (274), dizer que a Missa de frente para o povo “é desejável aonde quer que
seja possível” (299).
2 “Slowing the Pace,” 30-1
3 “Slowing the Pace, 26, “citando AAS 87 (1995), 304. Ele cita o original em latim “...
manuum percussio seu plausus, fluctuationes rhythmicae seu motus modulati, aut chorae
motus”, um vocabulário não encontrado normalmente nos decretos da Congregação dos
Ritos pré-Vaticano II.
200
A Instrução Geral de 1970
4 Enrico Mazza, The Eucharistic Prayers of the Roman Rite (New York: Pueblo 1986), 304.
201
Capítulo 6
202
A Instrução Geral de 1970
2 ESR, 182.
3 “Tradition und Fortschritt in der Liturgie ” Liturgisches Jahrbuch 25 (1975), 218-9: “Aus
der Allgemeinen Einführung zum Meßbuch von 1969 sei die schon in der Liturgiekonstitu-
tion (47) und in der Eucharistieinstruktion (1967) sich abzeichnende, ökumenisch tragfähige
sakramentale Theologie der Meßfeier herausgehoben. Trotz der von reaktionären Angriffen
erzwungenen, dank des Geshicks der Redaktoren Schlimmeres verhütenden Neufassung von
1970 führt sie — ganz im Sinn Odo Casels — als Sackgassen nachtridentinischer Opferthe-
orien heraus und entspricht dem Konsens, der sich in manchen interkonfessionellen Doku-
menten der letzten Jahre abzeichnet.” Grifo meu. Note, a propósito, a ligação que Lengeling
fez entre os princípios por detrás das reformas litúrgicas pós-Vaticano II e as teorias do Mis-
tério Pascal de Odo Casel. Para uma excelente e detalhada análise acerca desta relação, vide
Problem of the Liturgical Reform, 53-68.
203
Capítulo 6
Por acaso eles modificaram o novo Ordinário da Missa em 1970 a fim de que
o próprio rito refletisse, daí em diante, ao menos um pouco da teologia “tri-
dentina”?
Não precisaremos dedicar outras dez páginas para este assunto, porque a
resposta é não. As orações e ritos do Novus Ordo Missae de 1970 são idênticas
àquelas do de 1969.
Logo, o episódio da IG de 1970 não foi nada mais do que um jogo feito
no papel. Foi como se um arquiteto tivesse projetado uma construção que
prontamente começou a cair, e ele então “resolvesse” o problema fazendo
algumas pequenas mudanças nos projetos originais e os colocasse de volta na
gaveta. O que o arquiteto desenhou em seus projetos defeituosos não mudam
a estrutura que ele construiu na realidade, e com certeza não impedirá que os
tijolos caiam na cabeça de alguém. A única solução real é explodir o edifício
em colapso e recolher os escombros.
Portanto, a chave para o entendimento da teologia por trás da Missa de
Paulo VI, agora usada em nossas catedrais e igrejas paroquiais, não se funda-
menta no Proêmio pseudo-tridentino e na Instrução Geral de 1970, mas na
Instrução Geral de 1969 de Bouyer/Brilioth e, sim, de Montini.
rESUMo
• Depois que Paulo VI promulgou a Missa Nova em abril de 1969, um
grupo de católicos decidiu apresentar um protesto a Paulo VI com a
ajuda do Cardeal Ottaviani, ex-chefe do Santo Ofício. O Padre Guérard
des Lauriers preparou o texto de um breve exame crítico da Missa
Nova e, em setembro de 1969, os Cardeais Ottaviani e Bacci entrega-
ram-no a Paulo VI, juntamente com uma Carta de Apresentação.
• O estudo e a carta ficaram conhecidos nos países anglófonos como
“The Ottaviani Intervention”. São considerados como a “carta mag-
na” do movimento tradicionalista dos católicos pós-Vaticano II, que se
recusaram a aceitar a Missa Nova de Paulo VI.
• Dentre as características da Missa de Paulo VI, que a Intervenção Ot-
taviani criticou, estavam: a nova definição de Missa, a desvalorização
da Missa como um sacrifício propiciatório, a redução do papel do sa-
cerdote, negações implícitas da Presença Real e da transubstanciação,
a transformação da consagração em uma narrativa, a fragmentação da
unidade de crença da Igreja e, de modo geral, a linguagem que compro-
204
A Instrução Geral de 1970
205
Capítulo 6
206
CaPÍTUlo 7
N
a época em que Bugnini era editor da Notitiae, a publicação
oficial da Consilium e da Congregação do Culto Divino, o
periódico raramente continha quaisquer fotos. No volume
de 1975, porém, existem duas fotos do interior da Igreja de
Santo Estanislau, Bay City, Michigan, tiradas antes e depois das mudanças li-
túrgicas. A primeira foto mostra um altar com um amável retábulo neogótico.
Em um nicho sobre o altar, está uma esplêndida cena da crucifixão, cercada
por estátuas de vários santos. A segunda foto mostra um santuário esvaziado
para se acomodar à Missa Nova, um arranjo que Bugnini na legenda da foto
chamou de “elegante e robusto”. O retábulo está despojado do crucifixo e
das estátuas; a única imagem religiosa que permanece é um moderno “Cristo
Ressuscitado”, uma figura semelhante ao superman, suspensa por fios invisí-
veis sobre a mesa desnuda, que fica de frente para a congregação.
Algumas estátuas na foto de “antes” pareciam muito familiares. Acontece
que elas agora residem, graças a alguns amigos do Michigan, sobre o altar da
igreja em West Chester, Ohio, onde eu celebro a Missa Tridentina diariamente.
Bugnini, um burocrata sombrio e esnobe, não ficaria contente com isso.
Santo Estanislau e milhares de igrejas como ela por todo o mundo foram
esvaziadas e refeitas depois do Vaticano II. Altares ornados foram despojados
ou destruídos, mesas de frente para o povo foram montadas, tabernáculos
foram escondidos e imagens de Nossa Senhora e dos santos foram destruídas,
guardadas ou vendidas. Novas igrejas foram construídas em um estilo novo,
na forma de ventilador ou diamante, vazias de imagens e símbolos, todas elas
puro concreto, tijolo à vista e madeira clara − a Arquitetura do Pizza Hut.
Cálices finamente trabalhados e ricos paramentos foram vendidos ou jogados
fora, e em seu lugar vieram taças de cerâmica e casulas tie-dye. Não somente
a Missa mudou, mas também o seu cenário − o que os liturgistas modernos
gostam de chamar de o “ambiente de culto”.
207
Capítulo 7
208
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
209
Capítulo 7
são renovados.1
A assembleia, então — e não Deus — deveria ser a medida do novo am-
biente litúrgico. Isso não deveria parecer surpreendente para aqueles que en-
tendem os princípios teológicos por trás da Missa de Paulo VI, em que (como
Brandolini disse), “o sinal da assembleia retornou à sua posição inicial, seguin-
do a linha de uma tradição mais genuína.”2
Pistoia disse que as novas regras sobre o mobiliário litúrgico da Igreja apre-
sentavam um “novo espírito”, que deriva do ensinamento do Vaticano II.
Agora, “a estrutura e o ambiente [para a Missa Nova] devem começar uma vez
mais a ‘falar’ à fé do povo de Deus.”3
Naturalmente, esses princípios produziram efeitos, já que eles vinham de
cima. O Decreto do Vaticano II sobre Liturgia deu autoridade às Conferências
Nacionais dos Bispos para regulamentar o mobiliário sacro,4 e as burocracias
litúrgicas nacionais começaram a colocar em prática a teologia de assembleia.
Nos Estados Unidos, por exemplo, o Comitê dos Bispos Americanos emi-
tiu diretrizes sobre a arquitetura e arte na igreja.5 Os cristãos, o Comitê dos
Bispos aconselhou, devem “respeitar a primazia da assembleia viva”.6 Todo o
mobiliário de uma Igreja — imagens, paramentos, vasos sagrados etc. — de-
vem “falar” à assembleia. O ambiente do culto deve promover uma recepção
calorosa, bons sentimentos, hospitalidade e irmandade em geral. “A Liturgia”,
o Comitê disse, “deve florescer em um clima de hospitalidade; uma situação
em que as pessoas se sintam confortáveis umas com as outras, quer se co-
nheçam ou sejam apresentadas umas às outras.”7 O primeiro requerimento
1 Ibid. “Dietro questa norma sta tutta la riscoperta teologia bíblico-liturgica dell’assemblea,
di cui l’Ordo Missae si dimostra fedele interprete là dove descrive la Messa a partire dal segno
dell’assemblea: [Citação do Artigo 7]. Viene così portato in primo piano l’aspetto dinâmico
della Messa como “azione” di una comunità intera appositamente convocata, cosciente di
essere per natura sua il tempio vivente in cui e per cui si rinnovano i sacri misteri.”
2 “Aspetti Pastorali del Nuovo ‘Ordo Missae,’” EL 83 (1969), 389
3 “L’Ambiente,” 421: “Strutture ed ambiente devono iniziare nuovamente a ‘parlare’ alla
fede del popolo di Dio.”
4 Vide SC §22.2, DOL 22, e §128, DOL 128.
5 Environment and Art in Catholic Worship, Impresso em Gabe Huck, ed., The Liturgy Docu-
mente: A Parish Resource (Chicago: [Archdiocesan] Liturgy Training Program 1980), 216-44.
6 §40, §41, 226-7.
7 Ibid. §11, 218.
210
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
211
Capítulo 7
1 Consilium, Carta Renouveau Liturgique aos presidentes das conferências dos Bispos so-
bre a implantação da reforma litúrgica, 30 Junho 1965, §6, DOL 415.
2 Consilium, Carta L’Heureux Développement aos presidentes das conferências dos bispos-
sobre problemas da reforma da Liturgia, 25 de Janeiro de 1996, §6, DOL 428.
3 Homilia na paróquia de Maria Imaculada, em Roma, 27 de março de 1966, DOL 430.
212
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
4 Apologeticus, c. 16, PL 1:426. “Denique inde suspicio, quod innotuerit nos ad Orientis
regionem precari.”
5 Adversus Valentinianos, c.3, PL 2:580. “in editis semper et apertis et ad lucem.”
6 De Oratione, c. 32. PG 11:555. “illuc nos symbolice conversos, anima veri luminis ortum
veluti respiciente, orare debere.”
7 De Oratione Dominica, serm. 5, PG 44:1183. “quando ad orientem nos convertimus... sed
quod in orientalibus partibus prima nobis patria sit: dico autem de ea quam in paradiso ha-
buimus, habitatione, ex qua ejecti sumus: Plantavit enin Deus paradisum in Eden in partibus
orientalibus.”
8 De Sermone Domini in Monte, 2.5.18, PL 34:1277. “cum ad orationem stamus, ad orientem
convertimur, unde coelum surgit... ut admoneatur animus ad naturam excellentiorem se con-
vertere, id est ad Deum.”
9 Summa Theologica, 2-2.84.3 ad 3.
213
Capítulo 7
1 “Mass ‘Versus Populum’ re-examined”, Theology Digest 22 (verão de 1974), 154. Eu era
seminiarista quando esse artigo apareceu pela primeira vez. Ele confirmou minhas suspeitas
de que os modernistas estavam alimentando a todos cinicamente com mentiras sobre a histó-
ria a fim de promover suas heresias.
2 Ibid. 154-5.
3 Ibid. 155.
4 Der christliche Altar in seiner geschichtlichen Entwicklung, 2nd ed. (Munich: 193), 2 vols.
5 Christliche Altar 1:412ff.
214
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
igualmente desconhecida na Idade Média. Ela fez uma primeira aparição nas
rubricas dos Missais Romanos impressos no século XVI. Então, o sacerdote,
quando é ordenado a virar [“para o povo”] para dizer “Dominus vobiscum”,
é advertido que, se a disposição do altar é tal que ele já esteja nessa situação,
ao menos concernente a uma notável parte da congregação, ele não precisa se
virar. Nunca, e em nenhum lugar antes disso, houve qualquer indicação de que
qualquer importância, ou mesmo atenção, fosse dada a se o sacerdote celebrava
com o povo perante ele ou atrás dele.6
Note o quão absoluto os seus termos são: nunca, em nenhum lugar, antes
do século XVI, a Igreja deu qualquer atenção a esse tema.
Em uma obra de 1959, Jungmann diz que os ritos orientais jamais tolera-
ram a celebração da Missa de frente para o povo, e acrescentou: “Isso é digno
de nota, porque esses ritos geralmente preservaram as práticas primitivas e
tradicionais da Igreja mais fielmente.”7
Apesar de muitos altares construídos em muitas igrejas desde a Idade Mé-
dia, de fato, não estarem voltados para o oriente, o sacerdote e o povo reza-
vam olhando para a mesma direção; isso era pelo menos uma “orientação”
simbólica, que manifestava com muita força o papel do sacerdote. Jungmann
o descreve assim:
Agora o sacerdote está de pé no altar, geralmente construído de pedra, como
o chefe de seu povo; o povo olha para ele e o altar ao mesmo tempo, e juntos
com o sacerdote eles olham na direção do oriente. Agora, toda a congregação
é como uma imensa procissão, sendo conduzida pelo sacerdote e se movendo
ao oriente rumo ao sol, para o Cristo Senhor.8
Além disso, havia uma tendência de ocultar os ritos sagrados, precisamente
porque eles eram sagrados, separados e provocavam temor no fiel. Por isso,
havia a iconostasis (parede de ícones) entre os orientais, assim como as cortinas
do altar, o coro alto e, na Espanha, até mesmo paredes, que separavam e obs-
cureciam o local onde acontecia a ação sagrada.
6 Liturgy and Architeture (Notre Dame IN: University of Notre Dame Press 1967), 54-5.
7 The Early Liturgy, 138.
8 Ibid. 138.
215
Capítulo 7
de sua introdução?
A resposta é simples: os pressupostos teológicos modernistas por trás da
Missa de Paulo VI. A Instrução Geral de 1969 sobre a Missa como uma as-
sembleia presidida por um sacerdote, e reunida para celebrar um memorial
da Ceia. Cristo, de alguma forma, está “presente” nessa assembleia; segue-se,
portanto, que o “presidente” que conduz o memorial da Ceia deve dirigir to-
das as suas ações para essa assembleia. Seu papel é instruir, motivar e animar
a assembleia, “o templo vivo”, como disse Pistoia, “em que e através do qual
os mistérios sagrados são renovados.”
Em sua Missa do Rito Romano, Jungmann discutiu brevemente os prós e
os contras da Missa de frente para o povo. Ele fez a seguinte observação:
Se a Missa fosse apenas um serviço da instrução ou uma celebração de co-
munhão, a outra posição, de frente para o povo, seria mais natural. Mas é
diferente, se a Missa for uma imolação e homenagem a Deus.1
A primeira sentença, escrita em 1948, descreve perfeitamente o Novo
Ordo da Missa que Jungmann, com seus companheiros membros do Grupo
de Estudo 10 da Consilium, prepararam vinte anos depois: Um serviço de ins-
trução (Liturgia da Palavra) acompanhado de uma celebração de comunhão
(Liturgia Eucarística). A segunda sentença descreve o rito que eles destruíram:
um sacrifício que rende homenagem a Deus. A natureza dos dois ritos é dife-
rente: um é dirigido para o homem, de modo que o sacerdote se volta para o
povo, enquanto o outro é dirigido para a Deus, de modo que o sacerdote se
volta para o altar.
Outra exagero tradicionalista, talvez? Não, simplesmente uma explicação
da Missa de frente para o povo, dada por outro membro do Grupo de Estu-
dos 10, Padre Martin Patino:
A posição do altar e do sacerdote no altar parece seguir a perspectiva do pensa-
mento contemporâneo, viz., uma teologia teocêntrica ocasionou a iconostasis e
o altar longe do povo nos ramos orientais da Cristandade, assim como o povo e
o sacerdote juntos de frente para Deus na Cristandade Latina durante e depois
da Idade Média; uma ênfase antropocêntrica em teologia ocasionou a atual po-
sição do sacerdote e do povo em diálogo imediato um com o outro.2
216
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
217
Capítulo 7
1 “Eastward”, 140-3.
2 “Eastward”, 144.
218
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
teologia ortodoxa pré-Vaticano II. De fato, Ratzinger tirou essa noção cós-
mica de dois modernistas, Hans Urs Balthazar e Pierre Teilhard de Chardin.
Von Balthasar (1905-1988), um heideggeriano que disse que “sentia como
se estivesse deitando a baixo” a teologia tomista “com a própria força de San-
são”,3 escreveu duas obras, Liturgia Cósmica4 e A Glória do Senhor.5 No mesmo
livro onde Ratzinger argumenta pela posição ad orientem, ele cita essas duas
obras de Von Balthasar como base para a sua afirmação de que “a Liturgia
cristã deve ser uma Liturgia cósmica.”6
Ainda pior, cósmico e cosmo são ideias que aparecem nas obras de Tei-
lhard Chardin (1881-1954), um jesuíta evolucionista, silenciado pelo Santo
Ofício em 1925 e desde de então proibido de escrever. As ideias de Teilhard
sobre o “Cristo Cósmico”, “a evolução da consciência-crística”, a “noosfera”,
o “Ponto Ômega” da evolução cósmica etc., tiveram grande voga depois do
Vaticano II e se resumiam a um panteísmo não tão mitigado. Ratzinger tem
sido por um bom tempo um promotor desse herege,7 e de fato como Bento
XVI, ele mesmo empregou Teilhard e a terminologia teilhiardiana em seus
discursos públicos.8
Ratzinger começa o seu Espírito da Liturgia, no qual ele igualmente argumen-
ta pela posição ad orientem, com uma seção intitulada “A essência da Liturgia”.
No segundo capítulo, “Liturgia, Cosmo, História”, Ratzinger favoravelmente
traça aos seus leitores o paralelo entre o cosmo, Teilhard e a Eucaristia:
E assim nós agora podemos dizer que o objetivo do culto e o objetivo da
criação como um todo são um e o mesmo — divinização, um mundo de liber-
219
Capítulo 7
dade e amor. Mas isso significa que o histórico faz sua aparição no cósmico.
O cosmo não é algum tipo de edifício fechado, um container estacionário em
que a história pode acontecer por acaso. Ele é o próprio movimento, do seu
único começo ao seu único fim. Em um sentido, criação é história. Teilhard
de Chardin representou o cosmo como um processo de ascensão, uma série
de uniões... mesclado em uma síntese crescente levado à “Noosfera”, em que
o espírito e seu entendimento abraça o todo e são fundidos em um tipo de
organismo vivo... Teilhard vê Cristo como a energia que nos leva à Noosfera
e finalmente nos incorpora por completo em sua “plenitude”. A partir daqui
Teilhard veio a dar um novo significado ao culto cristão; a hóstia transubstan-
ciada é a antecipação da transformação e divinização da matéria na “plenitu-
de” cristológica. Em sua visão, a Eucaristia fornece o movimento do cosmo
com a sua direção; ela antecipa o seu objetivo e ao mesmo tempo insta-o para
que aconteça.1
Tal linguagem talvez pareça muito profunda para algumas pessoas. Na ver-
dade, porém, é apenas o típico pedantismo modernista, cheio de ideias vagas
amarradas de tal forma a desafiar qualquer lógica ou linha de raciocínio. As-
sim, Ratzinger nos dá divinizações, edifícios fechados, containers estacioná-
rios, processos de ascensão, “plenitude” (com aspas em torno para distinguí-la
de apenas uma simples plenitude?), sínteses crescentes (crescentes por sua
própria conta?), energias que levam, movimentos do cosmo “com” a sua dire-
ção (“com” oposta a “sem” ou contra a sua direção?), etc.
Escutar Ratzinger falar sobre cósmico e ad orientem na entrevista da EWTN
(como eu já fiz) é enervante. Ele oferece uma conclusão que agradará os ca-
tólicos de uma inclinação tradicional (voltem-se para o Senhor! Olhem para
o oriente com reverência!), mas os princípios teológicos em que ele baseia o
seu argumento (aqueles de Balthasar e da teologia do cosmo de Teilhard) são
puro veneno.
Tudo isso possui tons do louvor do modernista Tyrrell à Missa Cantada em
latim. Em ambos os casos, uma correta conclusão prática não nos deve cegar
quanto à heresia escondida atrás dela.
220
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
o NoVo SaNTUÁrio
Se o novo culto era para ser verdadeiramente antropocêntrico, as normas
antigas e detalhadas que governavam a disposição antiga do santuário, tinham
que ser eliminadas, silenciadas ou feitas opcionais.
Primeiro, havia a mesa da comunhão que separava o santuário da igreja
de sua nave. Ela reforçava a ideia de que o que se passava no altar era de
algum modo santo, e que o clérigo que realizava os ritos sagrados estava de
algum modo separado do resto dos homens. A Instrução Geral nem sequer
fez menção à mesa de comunhão; a única prescrição geral remanescente é que
o santuário “deve ser claramente distinguido do corpo da igreja, quer sendo
um tanto elevado, quer por sua distinta arquitetura e disposições.”2
Tal como a Missa de frente para o povo, a abolição da mesa de comunhão
foi às vezes apresentada como um “retorno à tradição primitiva”, e como a
Missa de frente para o povo, ela não era. O Pe. O’Connell observa que do
quarto século em diante, quando os cristãos foram pela primeira vez capazes
de usar edifícios permanentes para o culto, uma pequena barreira de metal,
pedra ou madeira separava o clero do povo na igreja.3
Três tipos importantes de móveis devem adornar o santuário remodelado
para a Missa Nova: um altar, uma cadeira do presidente e um ambão. Como
eles devem ser dispostas? A Instrução diz que a atenção da congregação deve
estar espontaneamente elevada para o altar,4 uma declaração um tanto surpre-
endente, uma vez que nada acontece ali até o Ofertório.
Os liturgistas dizem que há três focos de atenção na Missa Nova: o altar, a
cadeira do presidente e o ambão. Pistoia chama-o de um “sistema triangular”.5
O Comitê dos Bispos dos Estados Unidos sobre Liturgia deu o seguinte con-
selho sobre a localização do altar:
A localização do altar será central em qualquer celebração eucarística, mas
isso não significa que ele deva estar espacialmente no centro ou sobre um eixo
central. De fato, uma localização fora do centro pode ser uma boa solução em
221
Capítulo 7
1. O Altar. A prática da Missa de frente para povo foi a mais chocante das
inovações pós-Vaticano II afetando o altar, mas ela não foi a única. Algumas
eram óbvias: altares que se pareciam com mesas de açougue, mesas de restau-
rante, meteoritos, bigornas gigantes2 ou cópias do Cubo Mágico. Outras mu-
danças eram um pouco mais sutis e a maioria passou despercebida aos leigos.
Mas as mudanças sutis não são necessariamente mudanças insignificantes, e
elas são dignas de um comentário aqui.
a. Material. A lei da Igreja tradicionalmente prescrevia que a Missa somen-
te poderia ser celebrada sobre um altar que fosse (1) de pedra natural e
(2) consagrado.3 O altar podia ser fixo ou móvel. Um altar fixo consis-
tia de uma grande pedra retangular posta sobre apoios permanentes de
pedra; esses eram construídos em catedrais e igrejas paroquiais perma-
nentes. Um altar móvel consistia em uma pequena pedra retangular, em
geral somente larga e alta o bastante para acomodar a hóstia, o cálice
e o cibório; em igrejas onde um altar fixo não poderia ser construído,
um altar móvel era posto em uma moldura de madeira larga o bastante
para apoiar todos os requisitos para a Missa.
O altar de pedra é uma tradição antiga na Igreja. Os primeiros cris-
tãos, que eram perseguidos e não tinham estruturas permanentes para
a celebração da Missa, provavelmente construíram os primeiros altares
de madeira. A segunda forma de altar se originou logo no segundo
século, quando os sacerdotes frequentemente celebravam a Missa so-
1 Environment and Art, §73, em Liturgy Documents, 235. Vide também “The Altar of Wor-
ship”, Bishops’ Committee on the Liturgy Newsletter 13 (Julho 1977), 73. Essa sugestão foi
retirada do Built of Living Stones.
2 Uma monstruosidade foi instalada em frente do altar da Cátedra na Basílica de São Pedro.
3 Código de Direito Canônico [1917], 822. Por indulto, sacerdotes em terras de missão
podiam oferecer a Missa sobre um “corporal grego”, i.e., um tipo de corporal decorado con-
tendo relíquias e abençoado por um Bispo de rito oriental.
222
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
4 Geoffrey Webb, The Liturgical Altar (Westminster MD: Newman Press 1949), 25-6.
5 O’Connell, Church Building, 142.
6 Summa Theologica, 3.83.3 ad 5.
7 IG 69 §263, DOL 1653.
8 IG 69 §266, DOL 1656.
9 Rito de dedicação…, introduções, 2, §19, DOL 4387.
10 Ibid. 2 §5.A, DOL 4373.
223
Capítulo 7
224
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
11 Citado em Michael Davies, Crammer’s Godly Order: Part 1, The Liturgical Revolution (Devon,
England: Augustine 1976), 97.
12 “L’Ambiente”, 415.
13 O’Connell, Church Building, 162. Agora, porém, encontram-se rampas para cadeirantes
que levam à área da mesa; o fruto, talvez, de uma Oração de Acesso Igualitário.
14 Caeremoniale Episcoporum (Malines: Dessain 1906), 1.12.13.
15 Caer. Epis.1.12.11.
16 Caer. Epis. 1.12.11.
17 Vide Mt. 27,59; Mc. 15,46; Lc 23,53; e Jo 19,40; 20,5, 6.
225
Capítulo 7
séculos.1
A IG exigia somente uma toalha,2 e não faz menção ao uso do linho, e
não exigia que as toalhas fossem abençoadas.
• As rubricas tradicionais prescreviam que um crucifixo fosse posto no
centro do altar. Ele é um objeto de veneração, colocado ali para mos-
trar a relação entre o sacrifício da cruz e o sacrifício da Missa.3
A Instrução de 1969 inicialmente prescrevia que uma cruz fosse posta
“sobre o altar ou próxima dele.”4 Não havia nenhum requerimento
específico para que a cruz fosse do modelo latino padrão ou que ela
tivesse uma imagem do Cristo crucificado nela. Então, cruzes de tipos
estranhos (e.g., cruzes em forma de X, cruzes de Jerusalém, cruzes de
adaga) se multiplicaram em toda a parte, adornadas com corpos fora
do comum como o “Cristo ressuscitado” ou o abstrato “Lagarto retor-
cido de Paulo VI”.
De acordo com as novas regulamentações, a cruz podia ser a cruz pro-
cessional carregada antes e depois da Missa. As regulamentações da
Arquidiocese de Cincinnati proibiram permanentemente a instalação
de cruzes nas igrejas e prescreveram que a única cruz da igreja deve ser
a cruz processional, que é carregada para dentro e para fora.
Levou até o ano 2000 para o Vaticano resolver prescrever “uma cruz
com a figura de Cristo crucificado nela.”5
• Normalmente, seis castiçais ficavam sobre a banqueta do altar de toda
igreja católica. As velas mesmas tinham que ser ou de cera pura ou ao
menos predominantemente de cera.
Na Instrução, o número de castiçais de altar não foi especificado. Cera
já não era requerida para as velas mesmas, que podiam ser feitas de ma-
teriais que as Conferências dos Bispos julgassem convenientes.6
• Para as festas maiores, as rubricas tradicionais presumiam que as relí-
quias dos santos fossem expostas para veneração na banqueta do altar
226
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
227
Capítulo 7
usar um trono; em vez disso, ele se sentava sobre uma cadeira estofada sem
apoio chamada faldistório. A Igreja era tão escrupulosa sobre manter o trono
do bispo como um símbolo de sua autoridade, que a Congregação dos Ritos
publicou não menos que sete decretos proibindo os clérigos inferiores de usa-
rem poltronas no santuário.1
Se a cadeira do presidente não é nem uma sedilia e nem um trono, de onde
ela veio? Os criadores da Missa Nova parecem a terem inventado. Um prece-
dente no entanto vem a mente: as grandes poltronas que os ministros presbi-
terianos frequentemente usam quando presidem o seu serviço de comunhão
— um perfeito complemento à mesa de comunhão de madeira à vista.
228
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
o TaBErNÁCUlo DESaParECiDo
Antes do Vaticano II, o Santíssimo Sacramento era guardado em um ta-
bernáculo sobre a banqueta do altar de praticamente toda igreja católica no
mundo. A lei da Igreja prescrevia que o Santíssimo fosse mantido no lugar
mais nobre e proeminente da Igreja — normalmente sobre a banqueta do al-
tar, a não ser que houvesse ainda um lugar mais esplêndido na igreja para ele.4
Tudo isso mudou. Hoje você nunca sabe onde vai encontrar o tabernáculo
— ele pode estar em uma capela lateral, em um altar lateral, em um buraco
na parede do Santuário, sobre a antiga banqueta do altar, na parte de trás da
Igreja, na parte de frente da igreja, em algum lugar à parte do corredor. As
possibilidades são infinitas. Como isso veio a acontecer?
4 Vide Código de Direito Canônico [1917], 1268.2. O parágrafo seguinte do Cânon declara
que em Catedrais, colegiados e igrejas conventuais em que as funções corais são realizadas
(i.e. o canto público do Ofício Divino, diversos cerimônias pontificais etc.), o Santíssimo
Sacramento poderia ser guardado em uma outra capela ou sobre um outro altar. A presença
do Santíssimo Sacramento na banqueta do altar de tais igrejas levaria a certas mudanças nas
rubricas dessas cerimônias frequentemente complexas.
5 SC §128, DOL 128.
6 Instrução Inter Oecumenici, 26 de setembro de 1964, §95, DOL 387.
7 Sagrada Congregação dos Ritos, Instrução Eucharisticum Mysterium, sobre o culto eucarís-
tico, 25 de maio de 1967, §53, DOL 1282.
229
Capítulo 7
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Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
231
Capítulo 7
ESTÁTUaS E iMagENS
Uma vez que o Santíssimo Sacramento e o tabernáculo passaram tão mi-
seravelmente pelas reformas, seria apenas natural esperar que os santos e os
altares laterais enfrentassem coisas ainda piores. A média de igrejas america-
nas construídas desde as mudanças é praticamente desprovida de imagens
sagradas e altares laterais nem se ouvem dizer. Além disso, muitas igrejas mais
antigas tanto na América quanto pelo mundo foram radicalmente transforma-
das depois do Vaticano II para se acomodarem ao novo culto; afrescos foram
cobertos com tinta, estátuas foram destronadas de seus nichos e inúmeros
altares devocionais foram destruídos.
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Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
233
Capítulo 7
1 IG de 2000, §318.
2 Environment and Art, §99, in Liturgy Documents, 241-2.
3 Vide Adrian Fortescue, “Images,” CE 7, 665-7.
4 De Consensu Evangelii, 10, PL 34:1049. “in pictis parietibus quaesierunt.” Contra Faustum
Manichaeum, 22.73, PL 42:446. “tot locis pictum.”
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Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
5 In Jonam, 4.
6 Vide Appendix Operum S.Paulini, PL 61.884.
7 Uma das mais antigas igrejas em Roma, Santa Maria em Cosmedin, (da palavra grega
para “beleza”) foi assim chamada por conta das pinturas que cobriam as suas paredes, obra de
monges gregos que tinham fugido dos iconoclastas do Oriente.
8 Environment and Art, §98, in Liturgy Documents, 241.
235
Capítulo 7
alTarES laTEraiS
Os altares laterais foram outro alvo dos inovadores. Igrejas medievais e barro-
cas estavam repletas de altares, cada qual dedicado a um santo em particular. No
século doze, era difícil encontrar menos de dois altares laterais mesmo nas mais
humildes igrejas paroquiais. O costume remonta a tempos longínquos. A multi-
plicação dos altares foi plenamente estabelecida no século sexto, devido ao au-
mento no número de sacerdotes e Missas privadas. Capelas laterais em uma igreja
também se multiplicaram quando aumentou o culto aos santos e suas relíquias.1
236
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
Igreja Latina.”6
Os reformadores pós-Vaticano II também tinham em vista reduzir o culto
dos santos e devoções privadas. Uma vez que cada altar lateral era normal-
mente dedicado a um santo em particular, era apenas uma questão de consis-
tência que eles defendessem a abolição desses santuários.
237
Capítulo 7
guiçosos para dizer a Missa sozinhos, mas corruptos o bastante para ainda
querer o estipêndio por ela, o Vaticano decretou em 1965 que cada concele-
bração equivale ao estipêndio de uma Missa individual.1
VaSoS SagraDoS
Por causa da crença da Igreja na Presença Real de Cristo na Eucaristia sob
as espécies do pão e do vinho, ela tomava grande cuidado para assegurar que
somente os mais nobres materiais tocassem Seu Corpo e Sangue. Nada senão o
melhor para Deus. Aquelas partes do cálice, da patena e do cibório que entras-
sem em contato com as Espécies Sagradas, pois, tinham que ser de ouro ou pelo
menos banhadas a ouro. O sanguíneo para limpar o cálice, a pala para cobrir o
cálice e o corporal sobre o qual a Hóstia Sagrada ficava tinham que ser de linho.
Depois que essas peças de linho tivessem entrado em contato com o Sangue e o
Corpo de Cristo, elas tinham que ser purificadas pelo clérigo de ordens maiores
antes que elas pudessem ser dadas a um leigo para lavar e passar.2
A Igreja considerava esses objetos como sagrados e especialmente reser-
vados ao culto divino. O cálice e a patena eram solenemente consagrados
por um bispo, ungidos com o Santo Crisma, e, como dizia o ritual, “feitos
um novo sepulcro para o Corpo e Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo pela
graça do Espírito Santo.”3 Somente os clérigos eram autorizados a segurá-los.4
Cibórios, sanguíneos, palas e corporais, cada um recebia uma benção especial.
238
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
vasos poderiam ser fabricados “em um formato que esteja em harmonia com a
cultura de cada região.”7 A patena pequena e rasa usada somente para acomodar
a Hóstia do sacerdote não era exigida; ela poderia ser substituída por uma patena
larga o bastante para conter hóstias para a congregação inteira.8
Com efeito, a legislação autorizava uma liberdade quase absoluta para os
sacerdotes decidirem a forma e o material dos vasos sagrados. Não surpre-
ende que poucos cálices, patenas e cibórios modernos seguissem o modelo
tradicional. Vasos de cerâmica se tornaram populares entre os progressistas
americanos, talvez porque o modelo complementava a fixação por “banque-
te” da Missa Nova. Os cálices e os cibórios criados desse estilo geralmente se
pareciam com canecas de café e tigelas de cereal, uma forma certamente “em
harmonia com a cultura da região” — a sabedoria folclórica americana, afinal,
diz que um café saudável é a melhor maneira de começar bem o dia. Tipos
menos progressistas usavam grandes cálices de metal com um modelo simples;
esse geralmente se pareciam com troféus de boliche, sem a miniatura do topo.
Quanto à forma inusual das patenas do novo estilo, eu falo de minha pró-
pria experiência. Enquanto estudava em um seminário do centro-oeste, eu
quase apaguei um cigarro em uma delas. O sacristão tinha acidentalmente dei-
xado uma patena nova sobre uma mesa na sala de recreação, e eu a confundi
com um cinzeiro.
O prêmio de criatividade em vasos sagrados, porém — um troféu de boli-
che encravado? — vai para o Comitê dos Bispos dos Estados Unidos sobre a
Liturgia. Para as celebrações paroquiais que apresentam “comunhão em duas
espécies”, o Comitê recomendava que os sacerdotes colocassem o vinho em
uma jarra9 — um vaso com uma alça, um bico e uma tampa que parece um
bule. Este é um outro belo toque ecumênico; os protestantes vem usando
jarras em suas cerimônias de comunhão há anos.
A IG de 2000 reintroduziu a ideia de que os vasos usados na Missa de-
veriam, de algum modo, ser sagrados em sua aparência,10 e “metal nobre” é
novamente prescrito.11 Isso é um sinal do quão longe a Liturgia tem decaído,
239
Capítulo 7
que essas duas provisões causaram quase delírio nos círculos conservadores.
Não mais louça amish — a restauração começou!
aS VESTiMENTaS SaCErDoTaiS
A Missa do Rito Romano de Jungmann contém uma sentença particular-
mente eloquente sobre as vestimentas sacerdotais:
O fato de que o sacerdote veste roupas que não são somente melhores, mas
realmente especiais, distintas das roupas da vida civil ordinária, enriquecidas
quando possível pelo valor do material e pela decoração — tudo isso pode ter
senão um significado — o sacerdote em um sentido deixa essa terra e entra
em outro mundo, cujo esplendor reflete em suas vestes.4
O sacerdote que celebra a Missa Tridentina veste seis paramentos sobre
sua batina. Enquanto ele toma cada vestimenta, ele recita uma oração que re-
corda o que ela simboliza. As vestes tradicionais, juntamente com as orações
240
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
5 RLC, 115.
6 RLC, 121.
7 IG 69, §298, DOL 1688.
241
Capítulo 7
1 Sagrada Congregação dos Ritos (Consilium), Instrução (segunda) Tres Abhinc Annos,
sobre a reta execução da Constituição sobre a Liturgia, 4 de maio de 1967, §25, DOL 471.
2 IG 69, §161, DOL 1551.
3 Sagrado Congregação do Culto Divino, Concessão La Sacrée Congrégation, permitindo
o uso de casula-alva, 1 de maio de 1971, §2.c DOL 4540. Essa concessão, originalmente con-
cedida à França, foi estendida à outras conferências de bispos.
4 Vide IG 69, §305, DOL 1695.
5 IG 69 §306, DOL 1696.
6 LRC, 131.
242
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
7 HSM, 273.
8 IO, 47.
243
Capítulo 7
244
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
novo ambiente de culto — com o que o Padre Didier Bonneterre chamou seu
froideur glacielle (frio glacial) — e se voltassem com saudade às glórias ornamen-
tais do passado litúrgico da Igreja. Mas “tridentinizar” os ornamentos do rito
novo não pode transformá-lo no que ele nunca pretendeu ser.
Pois a igreja em roda, o altar simples, a casula sem adorno, a alva de poli-
éster, os castiçais baratos, o cálice de troféu de boliche, o crucifixo abstrato,
a estátua solitária e, sobretudo, a parede vazia são a verdadeira tradição para a
Missa de Paulo VI.
rESUMo
• A Instrução Geral de 1969 e o Rito pós-Vaticano II para Dedicação de
uma Igreja prescrevia que o projeto de uma igreja deveria transmitir “a
imagem da assembleia reunida”.
• A “exaltação da majestade de Deus, a glorificação dos santos [e] a de-
voção privada” já não são mais considerações importantes no modelo
das igrejas.
• O objetivo do novo ambiente litúrgico, em vez, é promover “uma ce-
lebração em que a assembleia ativamente participe”. A base para isso
é “toda a teologia bíblico-litúrgica da assembleia redescoberta”, que o
Novo Ordo da Missa fielmente interpreta, onde ele descreve a Missa
“como começando com o sinal da assembleia” no parágrafo 7 da IG
de 1969.
• A Missa de frente para o povo foi adotada em quase toda a parte depois
do Vaticano II, uma prática que era claramente a vontade de Paulo VI.
• A ideia de que a Missa de frente para o povo era uma prática cristã pri-
mitiva é um anacronismo do século XX. O que realmente determinava
a direção da oração litúrgica na Igreja antiga era onde estava o oriente.
• A noção de Missa de frente para o povo se baseia em uma teologia
antropocêntrica (centrada no homem), em vez de se apoiar, como antes,
em uma teologia teocêntrica (centrada em Deus).
• Embora o Cardeal Ratzinger defendia o celebrar a segunda parte da
Missa Nova (a Liturgia Eucarística) voltado ao oriente (ad orientem), ele
assim o fez não com base no ensinamento tradicional, pré-Vaticano
II, mas sim porque (1) isso alinharia a prática litúrgica católica com
o “balanço” litúrgico alcançado pelos protestantes e (2) isso era mais
“cósmico”.
245
Capítulo 7
246
Arte, Arquitetura, Mobiliário Litúrgico
rial nobre”.
• As seis vestimentas sacerdotais tradicionais exigidas para a Missa, cada
qual julgada como tendo um especial simbolismo espiritual, foram na
prática reduzidas a três.
• O uso do material litúrgico tridentino na Missa de Paulo VI (vestimen-
tas, cálices, imagens etc.) carece de congruência, porque o rito novo se
baseia em um entendimento da Missa que reflete uma teologia inteira-
mente nova.
• Em suma, enquanto os adornos da Missa Tridentina tinham um fim
místico e espiritual — a glorificação de Deus — os adornos da Missa de
Paulo VI têm somente um fim prático e psicológico — instruir a assem-
bleia. Assim, os reformadores retiveram somente aqueles adornos que,
como disse Pistoia, “falam à fé da assembleia” — e enviou para as
trevas exteriores aqueles que meramente honravam a glória de Deus.
247
Capítulo 7
248
CaPÍTUlo 8
riToS iNTroDUTÓrioS:
rEUNiÃo E SaUDaÇÃo
N
os anos 80, quando comecei a pesquisa para este livro, eu
tinha estado longe das celebrações típicas de paróquia da
Missa Nova por mais de uma década. Então, decidi coletar
“amostras” em várias Missas dominicais em Rochester, Nova
Iorque, depois de celebrar a Missa Tridentina na capela tradicionalista local.
Minha experiência mais memorável ocorreu em uma igreja no centro da
cidade de Rochester, durante os Ritos Introdutórios da Missa Nova.
A banda no santuário (com violões e baterias) tinha apenas terminado um
canto de entrada cafona e barulhento, e o sacerdote tinha entusiasticamente
desejado bom dia à congregação — ao que todos responderam com igual en-
tusiasmo: “Bom dia, Padre Chuck!”
Padre Chuck, então, tirou o microfone sem fio do suporte, e como um
apresentador de talk show, aqueceu seu auditório, casualmente subindo e des-
cendo pelo corredor, fazendo comentários divertidos com o microfone e so-
licitando respostas de indivíduos próximos no meio da congregação. Isso foi
acompanhado de risos e aplausos da assembleia celebrante.
Padre Chuck me viu no fundo, vestindo um colarinho romano e um terno
preto. Ele falou à congregação que era realmente ótimo ver um jovem diácono
que provavelmente seria ordenado muito em breve. Ele fez a congregação me
dar uma salva de palmas.
Naquele tempo, o incidente me chocou por ser surpreendentemente bi-
zarro (e irônico também, considerando realmente o porquê de eu estar ali).
Mas o que eu tinha experienciado, cortesia do Padre Chuck, era meramente a
extensão lógica da “teologia da saudação” pós-Vaticano II, um dos fatores que
tiveram parte na formulação dos Ritos Introdutórios da Missa de Paulo VI.
Neste capítulo, começaremos nosso exame da Missa Nova em si, tratando
dos seguintes tópicos: (1) Algumas notas preliminares sobre o método que
utilizaremos na análise da Missa Nova. (2) A direção e o propósito geral dos
249
Capítulo 8
NoTaS PrEliMiNarES
Nosso método aqui será comparar e contrastar a Missa Tridentina com a
Missa de Paulo VI. Nossos dois textos-base serão o Missal Romano de 1951
e o Missal de Paulo VI de 1970 (a versão latina, com modificações posteriores
indicadas quando apropriado). Os seguintes pontos devem ser notados:
1. Nossa tese principal, novamente, pode ser resumida da seguinte forma:
a Missa de Paulo VI (a) destrói a doutrina católica das mentes dos fiéis, e em par-
ticular, a doutrina católica concernente ao Santo Sacrifício da Missa, ao sacerdócio
e à Presença Real. E (b) permite e prescreve grave irreverência.
2. Os dois corolários que vão surgir no curso de provar a tese principal
são: (a) a Missa de Paulo VI representa um divórcio completo ou rup-
tura com a tradição litúrgica que a precedeu. (b) A Missa de Paulo VI
de fato não restaurou a “tradição dos Padres”, isto é, os ideais e práticas
litúrgicas da Igreja Primitiva.
3. A fim de explorar os pontos (1) e (2), em muitos casos recorreremos a
livros, artigos e comentários gerais escritos por aqueles mais diretamente
envolvidos na reforma da Missa — quer membros do Grupo de Estudo 10
da Consilium, que criaram o próprio Ordo da Missa,1 quer membros
do secretariado da Consilium, que dirigiram a reforma em geral. Es-
ses incluem Padres Louis Bouyer, Carlo Braga, Peter Coughlan, Josef
Jungmann, Martin Patino, Johannes Wagner e, claro, Padre Annibale
Bugnini, o secretário e chefe executivo da Consilium.
Iremos também nos servir de comentários escritos por membros da
Consilium que trabalharam em outros aspectos da Missa Nova (ora-
ções, leituras da Escritura, intercessões em geral, orações eucarísticas
etc.) ou que auxiliaram a Consilium neste trabalho. Esses incluem os
Padres Henry Ashworth, Matias Augé, Luca Brandolini, Antoine Du-
mas, Walter Ferretti, Gaston Fontaine, Joseph Lecuyer, Pierre Jounel,
A.G. Martimort, Gottardo Pasqualetti, Alessandro Pistoia, Vincenzo
Raffa, A.M. Rouget e Cipriano Vagaggini.
250
Ritos Introdutórios
Os escritos de todos esses homens nos fornecerão uma visão dos prin-
cípios, métodos e intenções que influenciaram o processo de reforma.
4. Embora, não iremos sempre assinalá-las — seria cansativo fazê-lo —,
muitas mudanças no rito parecem derivar das teorias de Jungmann e
Bouyer. Suprimir orações ou ritos místicos introduzidos na Missa du-
rante a Idade Média, ou introduzir novos elementos na Missa para um
propósito de instrução reflete respectivamente a teoria da corrupção de
Jungmann e sua teoria da liturgia pastoral. A ênfase do rito novo na par-
ticipação comum e vocal reflete não somente as ideias do Movimento
Litúrgico pré-Vaticano II em geral, mas também a teologia da assembleia
de Bouyer, segundo a qual toda a assembleia celebra a Missa.
5. No decorrer do que se segue, deve-se também ter em mente que os
precedentes de muitas práticas introduzidas para todos na Missa Nova
foram estabelecidas em pequenas doses nas mudanças litúrgicas entre
os anos 1948-1962. Essas incluem acomodar a liturgia às necessidades
percebidas dos fiéis, uso mais amplo do vernáculo, reduzir o papel do
sacerdote, participação vocal como ideal para os leigos, inventar novos
papéis litúrgicos, mudar orações e cerimônias para se acomodarem às
necessidades modernas, reduzir “duplicações”, omitir partes do Ordo
Missae, conduzir cerimônias de frente para o povo, desvalorizar os San-
tos, modificar os textos que não católicos achariam ofensivos, reduzir
as expressões de reverência para com o Santíssimo Sacramento e até
mesmo mudar o Cânon.
6. Finalmente, os leitores de inclinação mais conservadora devem para
sempre deixar de lado a noção de que a Consilium empreendeu uma
gigantesca conspiração para enganar Paulo VI sobre o rito que eles
estavam criando.
Como já temos notado, quando Montini trabalhava na Secretaria de
Estado, ele celebrava Missas jovens no estilo Parsch/Guardini, e con-
seguiu que as produções litúrgicas pré-Vaticano II de Bugnini fossem
aprovadas por um Pio XII enfermo. Em sua carta pastoral como Ar-
cebispo de Milão, ele promoveu o vernáculo, a teologia da assembleia
de Bouyer e a teoria da corrupção e da teologia pastoral de Jungmann.
Como Cardeal, ele protegeu Bugnini, e como Paulo VI, instalou Bug-
nini como o Grande Arquiteto da Reforma Litúrgica, subordinado-o
unicamente a si mesmo. Enfim, como tem sido repetidamente docu-
251
Capítulo 8
252
Ritos Introdutórios
SaÍDa Do iNTrÓiTo
A Missa Cantada no rito tridentino começa quando o coro canta o Intrói-
to, um canto esplêndido que dá o tom espiritual da celebração. O Intróito
tem quatro partes: uma antífona, um versículo dos Salmos, o Glória ao Pai e
a repetição da antífona. O Glória ao Pai é omitido nas Missas de Requiem e
253
Capítulo 8
1 MRR 1:330.
2 Em Latim, “ant. ad introitum.”
3 GI 69 §25, DOL 1415. “Unionem congregatorum fovere.”
4 MRR 1:328. Jungmann provavelmente considerava a inclusão do Glória ao Pai como
uma corrupção deixada pela batalha contra o arianismo teutônico. (vide capítulo 2.)
254
Ritos Introdutórios
SaUDaÇÃo Da aSSEMBlEia
Uma vez que o canto de entrada da Missa Nova terminou e o sacerdote
chegou à sua cadeira presidencial, ele começa com o Sinal da Cruz. Então,
“saúda” a assembleia com uma das três fórmulas que fornece o Missal.
5 Luca Brandolini CM, “L’Ordo Antiphonarum del Nuovo Messale”, EL 84 (1970), 344n6.
6 IG 69§ 26, DOL 1416.
7 Vide “Appendix to the General Instruction for the Dioceses of the United States of
America”, em Keifer,To Give Thanks and Praise, 87.
255
Capítulo 8
256
Ritos Introdutórios
257
Capítulo 8
ministro apropriado pode introduzir os fiéis na Missa do dia” com breves pa-
lavras.1 Permitir um lugar na liturgia para tais comentários foi especificamente
prescrito pelo Vaticano II.2
Aqui, o sacerdote (ou a equipe de liturgia) tem completa liberdade para
determinar o que deve ser dito. Coughlan chamou isso uma oportunidade que
“permite ao celebrante completar a saudação de um modo mais espontâneo
e informal.”3 Outros comentadores seguiram esse caminho. Você pode “ir
além da saudação oficial para uma mais pessoal.”4 A exortação, “além de sua
conveniência psicológica, também pode ser vista como uma comunicação do
Espírito à comunidade… é lamentável que alguns celebrantes estejam negli-
genciando essa oportunidade de fazer contato com o povo e alguns nunca
pareçam terem dela se servido de todo.”5 Em um estudo da Universidade de
Notre Dame,os liturgistas concluíram que existe:
Uma forte correlação entre esses comentários de abertura e o tom geral da
liturgia que se segue. Por exemplo, se os comentários de abertura são omi-
tidos… toda a liturgia deve ser provavelmente em tom rígido e formal. O
mesmo é verdade se o celebrante falha em usar uma nota amigável em suas
palavras de abertura. Por outro lado, os dados mostram que onde o celebrante
estabelece contato com a congregação neste ponto, a sequência da celebra-
ção deve ser provavelmente marcada por uma contínua boa relação entre o
sacerdote e o povo, por uma forte consciência horizontal do povo reunido e
mesmo participação mais orante da comunidade.6
Novamente, existe a direção incansável, psicológica, centrada no homem
disso tudo: tudo é informalidade, calor, relacionamento — como dar uma
palestra em um rancho do Rotary Club. A espontaneidade do Padre Chuck
é encorajada, mas mesmo um sacerdote como o Padre Retreaux, que é mais
engomado (no sentido figurado e, graças a Gammarelli, mesmo literalmente),
pode assinar um serviço de uma editora litúrgica que lhe fornecerá comentá-
258
Ritos Introdutórios
o aTo PENiTENCial
Tanto a Missa Tridentina quanto a Missa de Paulo VI incorporam orações
ou ritos penitenciais em suas sessões de abertura. Parece haver ao menos su-
perficialmente uma semelhança entre os ritos quando o Confiteor reduzido é
usado na Missa Nova.
Um exame mais de perto de ambos os ritos, no entanto, revela que sua
estrutura, conteúdo e propósitos são bem diferentes.
7 O Salmo é omitido nas Missas do tempo a partir do Domingo da Paixão até a Quinta-
Feira Santa e nas Missas de Réquiem. O versículo, no entanto, é recitado.
259
Capítulo 8
1 LRC, 226.
2 MRR 1:291.
3 MRR 1:293.
4 ™, 164.
260
Ritos Introdutórios
5 ™, 225.
6 TNM, 163-4. Ele indiretamente defende a introdução de um rito penitencial comum
mencionando uma “forma simplificada” do rito de Quinta-feira Santa para reconciliação dos
pecadores, alegadamente introduzida depois do Evangelho em algumas igrejas durante a Ida-
de Média. No entanto, isso parece ter sido parte das devoções populares não litúrgicas ligadas
ao sermão, em vez de uma parte da Missa propriamente dita.
261
Capítulo 8
1 To Give Thanks and Praise, 111. Para exemplos, vide Martin Bucer’s Strassburg Liturgy (1539),
John Calvin’s Form of Church Prayers (1542 e 1545), Thomas Cranmer’s Book of Common prayer
(1552) e John Knox’s The Forme of Prayers (1556) in Thompson, Liturgies of the Western Church.
2 Luther D. Reed, The Lutheran Liturgy (Philadelphia: Fortress 1947), 257.
3 Vide Carta Circular Eucharistiae Participationem, §14, DOL 1988.
262
Ritos Introdutórios
263
Capítulo 8
raramente utilizada.1
O ato penitencial C não é realmente um rito penitencial de todo — ele é
uma ladainha com três petições. Um diácono ou um comentador leigo podem
conduzi-lo:
264
Ritos Introdutórios
265
Capítulo 8
1 MRR 1:310.
266
Ritos Introdutórios
o KYRIE
Na Missa Tridentina, depois que o sacerdote venerou o altar (e incensou-o
na Missa Cantada), ele lê o Intróito e então recita o Kyrie, alternando com os
ministros. As palavras Kyrie eleison (Senhor, tende piedade) são ditas três vezes;
então se diz Christe eleison (Cristo,tende piedade de nós) três vezes e Kyrie eleison
novamente, três vezes.
Egéria, uma peregrina que visitou Jerusalém em 390 AD, escreveu o pri-
meiro relato que menciona o Kyrie. Ela disse que um diácono lia uma lista de
petições em Vésperas e “enquanto ele falava cada um dos nomes, uma mul-
tidão de meninos ficavam ali e respondiam-no cada vez Kyrie eleison, como se
diz, Senhor, tende piedade; seu clamor é sem fim.”2
Durante o século seguinte, outros relatos começam a aparecer que mos-
tram como o Kyrie foi gradualmente introduzido na Missa do Ocidente. As
palavras Kyrie ou Christe eleison parecem primeiro ter sido respostas a uma ladai-
nha no começo da liturgia. Pelo tempo de São Gregório I (+604), no entanto,
as petições da ladainha foram tiradas das Missas diárias.3
O livro de Jungmann sobre a Missa Nova insinua que a ladainha usada
durante o reinado do Papa Gelásio (492-6) poderia ser considerada um anti-
go precedente para o Ato Penitencial C.4 Mas a única coisa que a Oração de
Gelásio tem em comum com ele é a frase “Senhor, tende piedade de nós.”
Ela também contém algumas petições que até mesmo a Consilium poderia ter
achado um tanto difícil de retocar e restaurar. Eis uma delas:
Por aqueles enganados pelas mentiras dos judeus… ou pela perversidade he-
rética, ou cheios da superstição pagã, nós imploramos ao Senhor da verdade:
tende piedade.5
267
Capítulo 8
1 MRR 1:341.
2 TM, 237.
3 Meu palpite para a razão: Jungmann viu a petição em três versos triplos como uma
“corrupção” anti-ariana.
4 Eucharist, 122.
5 IG 69 §30, DOL 1420.
6 GI 69 §30, DOL 1420.
7 M70, 892.
8 M70, 524.
9 M70, 178.
10 M70, 232.
268
Ritos Introdutórios
o glÓria
Somente o sacerdote, de pé no centro do altar, inicia o Glória na Missa Tri-
dentina; se ela é uma Missa Cantada, ele canta as palavras de abertura, Glória
in excelsis Deo (Glória a Deus nas alturas) e o diácono e o subdiácono em voz
baixa recitam o resto da oração com ele, enquanto o coro canta o texto.
O sacerdote diz o Glória em todas as festas de qualquer classe pelo ano,
nos domingos fora do Advento, Septuagésima e Quaresma, e em certas outras
ocasiões.12 Ele aparece frequentemente, uma vez que existem muitas festas de
santos no calendário tradicional.
A Instrução Geral, como se poderia esperar, ofereceu um número de op-
ções para lidar com o Glória no rito novo: a congregação, a congregação e
o coro, ou só o coro o canta; ou ele pode ser recitado por todos juntos ou
alternadamente.13
Seu uso foi drasticamente reduzido. O Glória é empregado somente nos
domingos fora do Advento e da Quaresma, em festas de Nosso Senhor, em
festas maiores de Nossa Senhora, festas dos Apóstolos e Evangelistas e “em
celebrações especiais, mais solenes”. Outras festas de santos no calendário
não têm nenhum Glória.
O texto latino do Glória permaneceu intacto. Mas o Missal alemão prevê
que “o Glória possa ser substituído por um canto de glória.”14 Assim, na Ale-
manha, um canto que uma equipe de liturgia pensa ser mais “pastoralmente
efetivo” pode substituir esse antigo texto.
Os liturgistas somente podem oferecer especulações sobre os precedentes
11 O texto antigo começa: “no ano 5199 da Criação do Mundo, quando Deus no começo
criou o céu e a Terra.” O novo texto omite os anos, (não científico, anti-evolucionista, som-
bras de Galileu perante a Inquisição etc.) e começa, em vez, com algo como “há muito tempo
atrás, em uma galáxia distante, muito distante…”
12 Vide O’Connell, Celebration of Mass, 1:168-9.
13 GI 69 §31, DOL 1421.
14 Citado em Emminghaus, 126.
269
Capítulo 8
a ColETa
Depois do Glória na Missa Tridentina, o sacerdote beija o altar, volta-se
para a congregação, estende as suas mãos e diz: Dominus vobiscum (o Senhor
esteja convosco). Depois da resposta, ele vai para o lado da Epístola e diz
Oremus, inclina-se para o crucifixo, ergue as suas mãos e recita ou canta uma
oração chamada Coleta.
Como seu nome implica, a Coleta é uma breve declaração das aspirações
que a Igreja traz consigo e apresenta a Deus no domingo ou festa sendo cele-
brada. Seu estilo é geralmente muito breve e direto, e sua forma usual é como
se segue: (1) uma invocação do nome de Deus; (2) a atribuição de uma obra ou
qualidade a Ele; (3) uma petição e (4) uma invocação da Trindade. As coletas
antigas são criações maravilhosas; elas apresentam um pensamento espiritual
exaltado em umas poucas palavras seletas e possuem um ritmo e balanço qua-
se impossíveis de reproduzir na tradução.
Para a maior parte dos dias, o Missal tradicional prescreve uma ou duas
coletas adicionais chamadas de “comemorações”. Se, por exemplo, o Décimo
Domingo depois de Pentecostes cai em 4 de agosto, o sacerdote diz a Coleta
para o Décimo Domingo depois de Pentecostes e acrescenta a Coleta hon-
rando a São Domingos, cuja festa é em 4 de agosto. Cada santo assim recebe
o seu devido; em outros dias, o Missal prescreve comemorações de Nossa
Senhora e de todos os Santos ou orações para várias necessidades.
Os criadores da Missa de Paulo VI mantiveram a Coleta na forma de ora-
ção, mas eles as trataram em grande parte como o resto da Missa. Eles move-
ram algumas coletas e eliminaram completamente outras. (o Capítulo 9 será
1 MRR 1:358. No entanto, ele cita um texto que fala do canto popular do Glória, mas o
qualifica dizendo que em igrejas menores ele “muito provavelmente” se tornou um costume.
2 MRR 1:356. Jungmann observa que somente bispos tinham permissão para entoá-lo.
270
Ritos Introdutórios
Oremus
[que o Cristo ressuscitado nos ressuscite e renove nossas vidas]
Pausa para oração silenciosa
Deus Nosso Pai, pela ressurreição de Cristo Vosso Filho
Vós conquistastes o poder da morte
e abristes para nós o caminho da vida eterna.
Que nossa celebração hoje nos ressuscite e renove nossas vidas
pelo Espírito que está dentro de nós.
Concedei-nos por Cristo...6
Note a repetição: o celebrante primeiro pede ao povo para rezar para que
Cristo “nos ressuscite e renove nossas vidas”; faz-se uma pausa para a oração,
e então — certo o bastante — o sacerdote diz uma coleta que reza para que
a “celebração de hoje nos ressuscite e renove nossas vidas”.
271
Capítulo 8
1 Ibid. 14.
2 Eis uma Oração de Abertura Alternativa para o Domingo de Páscoa do Sacramentário
Americano: “Oremos [nesta manhã de Páscoa para a vida que nunca mais verá as trevas.]
Deus Nosso Pai, criador de todos, hoje é o dia da Alegria Pascal. Esta é a manhã na qual o
Senhor apareceu para homens que começaram a perder a esperança e que abriram os seus
olhos para o que a Escritura profetizava: que primeiro Ele deve morrer, e então Ele deveria
ressurgir e ascender à presença gloriosa de seu Pai. Que o Senhor Ressuscitado inspire em
nossas mentes e abra os nossos olhos para que possamos conhecê-Lo na fração do pão, e
seguí-lo em sua vida ressuscitada. Conceda-nos isso por Cristo Nosso Senhor.” Incansável
falatório de Missa-como-sala-de-aula.
272
Ritos Introdutórios
ganha prestígio em razão do fato de que, uma vez mais, tal como originalmen-
te, somente uma tal oração é oferecida, e não há segunda ou terceira série de
pedidos ou comemorações.3
Embora a prática possa muito bem ser um “retorno à antiguidade”, este
é um outro pequeno detalhe que ajudou a apagar os nomes dos Santos da
Liturgia Sagrada.
3 TNM, 171.
4 IG 70 §234, DOL 1624.
273
Capítulo 8
274
Ritos Introdutórios
rESUMo
• Os ritos preparatórios da Missa Tridentina e da Missa de Paulo VI são
fisicamente orientados para direções opostas, que refletem os seus di-
ferentes propósitos. Na Missa Antiga, o sacerdote fica de frente para o
altar (simbolicamente perante Deus), e o propósito do rito é a purifica-
ção do sacerdote que vai celebrar a Missa e o louvor de Deus. Na Missa
Nova, o sacerdote fica de frente para a assembleia (simbolicamente
perante o homem) e o propósito do rito é engendrar a unidade entre
os membros da assembleia, que vão coletivamente celebrar a Missa.
• A Missa Nova efetivamente eliminou o Intróito, que na prática real foi
substituído por um canto selecionado pela equipe de liturgia da paró-
quia local.
• Os liturgistas modernos construíram uma teologia inteira em torno
da saudação na Missa Nova, entendida como “um reconhecimento
da presença de Cristo na assembleia.” Eles derivam essas ideias dos
próprios criadores da Missa Nova, um dos quais explicou a saudação
como um ato “que produz comunhão.” Tal linguagem desvaloriza o
significado da comunhão sacramental.
• A Instrução Geral, implementando uma prática especificamente pres-
crita pelo Vaticano II, permite ao sacerdote, diácono ou outro ministro,
inserir comentários introdutórios depois da saudação. O conteúdo é
deixado unicamente a critério da pessoa que faz os comentários.
• Muitas características das antigas Orações ao Pé do Altar se distanciam
da teologia ecumênica ou modernista e foram, por isso, suprimidas
da Missa de Paulo VI: o Salmo 42 (por causa da teologia negativa),
menção de Anjos e Santos pelo nome (aversão modernista geral), incli-
nação profunda (humildade), oração de absolvição (ecumenismo e en-
fraquecimento das confissões), a antiga oração afastai nossas iniquidades
(teologia negativa), a oração honrando as relíquias dos santos (méritos
rejeitados pelos protestantes e a abolição das relíquias) e, na oração
para a bênção da água, alusões ao demônio e ao juízo (descrença no
diabo e teologia negativa).
• As Orações ao Pé do Altar, além disso, eram um rito de purificação sacer-
dotal. O novo rito penitencial é um rito congregacional, que o sacerdote e o
povo realizam em conjunto. Esse tipo de rito não tinha qualquer prece-
dente na Missa Romana e foi primeiro introduzido pelos protestantes
275
Capítulo 8
276
CaPÍTUlo 9
aS oraÇÕES rEViSaDaS:
“NoVoS ValorES, NoVaS PErSPECTiVaS”
U
m aspecto da Reforma Litúrgica que passou em grande parte
despercebido entre os tradicionalistas foram as mudanças nas
orações variáveis do Missal chamadas as orationes.
Embora eu pensasse que fosse bastante versado em matérias
litúrgicas (ensinei cursos de liturgia em seminário, li todas as críticas disponí-
veis à Missa Nova e mesmo tinha escrito artigos sobre isso), deparei-me com
esse assunto por puro acidente nos anos 80.
Estava eu sentado em uma poltrona com o caderno de anotações no colo,
ocupado compondo um sermão sobre Santa Gertrudes, a Grande. Como de-
cidi citar a Coleta da festa da santa, então alcancei a estante mais próxima e
retirei um Missal Latino. Era um Missal de Paulo VI, mas eu imaginava que a
Coleta em latim seria a mesma de qualquer forma.
Embora o começo da oração soasse familiar, o resto parecia um tanto
“fora.” Isso era motivo o bastante para eu sair da poltrona, achar um Missal
antigo e então comparar os textos latinos antigo e novo. Eles se mostraram
bem diferentes. Intrigado, comecei a comparar outras orações nos dois Mis-
sais e achei mais disparidades, e nenhuma delas (até onde eu sabia) tinham
sido discutidas em críticas tradicionalistas à Missa Nova.1
Neste capítulo, vamos comparar as orações do antigo Missal Romano com
suas correspondentes no Missal de Paulo VI. Seguindo nosso procedimento
usual, notaremos as alterações que os reformadores fizeram no seu conteúdo
doutrinal.
A comparação linha a linha entre as orações antigas e novas é uma tarefa
277
Capítulo 9
278
As orações revisadas
4 M7, Pent 23, C, “M.” Bruylants Les Oraisons du Missel Romain é a obra-padrão de referên-
cia, contendo todas as orações do Missal tradicional.
5 The Liturgical Year (London: reimpresso por Britons Catholic Library 1983) 1:16.
279
Capítulo 9
clo Temporal. Embora nós não saibamos quem as escreveu todas ou quem
designou seus lugares no Missal,1 sua ordem de recitação ao longo do ano
litúrgico corresponde à sequência do Sacramentário Leonino do século sex-
to. A tradição atribui a autoria do núcleo das Coletas ao papa São Dámaso
(366-84).2
Como a Igreja acrescentou mais festas no curso dos séculos, ela também
acrescentou novas orações, e o tamanho do Missal cresceu. Mas as orações
mais antigas continuaram a manter os seus lugares designados no ciclo tem-
poral. Assim, por exemplo, se você abre tanto o Missal antigo quanto o
antigo sacramentário gregoriano para o Domingo da Quinquagésima, verá
as mesmas orações prescritas para a Coleta, a Secreta e a Pós-Comunhão da
Missa do dia.
o ProCESSo DE rEViSÃo
Enquanto a identidade daqueles que criaram as orações do Missal tradi-
cional ficou perdida para sempre nas névoas da história, nós sabemos que
as orações do Missal de Paulo VI foram a obra do Grupo de Estudo 18 da
Consilium, que foi apontado por Bugnini em 1965. O corpo de membros
consistia nos Padres Henry Ashworth, Placide Bruylants, Antoine Dumas,
W. Durig, G. A. Gracias, G. Lucchesi e A. Rose.3 A esses nós podemos acres-
centar os nomes dos Padres Matias Augé, Walter Ferretti, Vincenzo Raffa
e Carlo Braga, o assistente de Bugnini. Seus escritos, retirados de outras
fontes, fornecem muitas informações valiosas sobre como eles mudaram as
orações e o porquê.
O grupo de estudo se encontrou pela primeira vez em Lovaina, Bélgica, em
abril de 1965. Sua primeira manobra foi começar vistoriando as orações do
Ciclo Temporal (Advento, Quaresma, Pentecostes etc.).
Considerando a idade dessas orações, esse foi um ato de impressionante
arrogância, mas isso era típico dos reformadores. A introdução do vernácu-
1 Nem mesmo a investigação histórica moderna, parece, foi capaz de reconstruir os regis-
tros relevantes para além do século quinto. Vide MRR 1:49.
2 LRC, 244.
3 RL, 392-3.
280
As orações revisadas
4 Matias Augé CMF, “Le Collette del Proprio del Tempo nel Nuovo Messale”, EL 84
(1970), 275-6.
5 Augé, “Le Collette275, citando SC §21, DOL 21.
6 Citado em RL, 393.
281
Capítulo 9
282
As orações revisadas
3 Carlo Braga, “Il ‘Proprium de Sanctis,’” EL 84 (1970), 419. “La revisione del testo
preesistente diviene più delicata quando si arriva alla necessità di un aggiornamento del con-
tenuto o del linguaggio, e quando tutto ciò tocca non solo la forma, ma la realtà dottrinale.
Si è già accennato alla nuova prospettiva dei valori umani considerati in relazione e quasi
come via ai beni soprannaturali: il Concilio la propone chiaramente, ed è stata tenuta presente
nella revisione del Temporale; non poteva ignorarsi nella rivisione del santorale. Altre volte
l’opportunità di una revisione del linguaggio è dettata da esigenze ecumeniche; espressioni
che richiamano posizioni o lotte del passato non sono più in armonia con le nuove posizioni
della Chiesa. Aspetti devozionali, o di particolari modi di venerazione e invocazione dei Santi,
sono superati da tutta una nuova impostazione della teologia eucaristica: anche qui è stato
necessario ritoccare il testo per mettere in luce nuovi valori e nuove prospettive.” Grifo meu.
4 Augé, “Le Collette 275-8.
5 Augé, “Le Collette 287.
283
Capítulo 9
1 O progresso dos estudos litúrgicos e os frutos que isso gerou em sua reforma, disse Pau-
lo VI, garantiria que essas riquezas doutrinais e espirituais, longe de ficarem escondidas nas
trevas seriam agora “postas em uso para o esclarecimento da mente dos cristãos e a nutrição
do seu espírito.” Constituição Apostólica Missale Romanum, aprovando o novo Missal Roma-
no, 3 de abril de 1969, DOL 358.
2 Carlo Braga CM, “Il Nuovo Messale Romano” EL 84 (1970), 272.
3 Cf. M155 (Prava despiciens) & M70, 552, S.Gregorii VII. Suprimida: M585 (vincula
nostrae pravitatis).
4 Cf. M992 (Culpae vulnera) & M70, 213; M785 (peccati vulnere disgregatae) & M70, 380.
284
As orações revisadas
5 Cf. M330 (pravitatis insidias) & M70, 558, S. Ephraem. Suprimida: M314 (ex nostra
pravitate affligimur).
6 Cf. M1030 (majestatem tuam graviter delinquendo offendimus) & M70, 622, S. Brunonis.
7 Suprimida: M340 (de perditionis via).
8 Cf. M344 (divinae tuae iracundiae terrores) & M70, 818,#34. Supressed: M319, (flagella
tuae iracundiae quae meremus); M395 (iracundiae tuae flagella); M532 (ab iracundiae tuae
terroribus);
9 Suprimida: M450 (numquam indignationem tuam provocemus elati); M167 (te indignan-
te talia flagella prodire).
10 Suprimida: M798 (cujus iram terrae fundamenta concutientem expavimus).
11 Cf. M649 (pondus propriae actionis gravat) & M70, 517, S.Fabiane; M261 (peccatorum
nostrorum pondere premimur) & M70,589, P. Suprimida: M914 (malorum nostrorum pon-
dere premimur).
12 Suprimida: M429 (a captivitate animae liberemur); M286 (peccatorum captivitate).
13 Suprimida: M6, M302, M365, M472 (vincula peccatorum).
285
Capítulo 9
não ser lembrado das adversidades,1 dos perigos,2 dos inimigos,3 dos males,4 e
das tribulações.5 Ele não acredita que mereça o mal nesta vida por obras más,6
que as aflições aqui resultem dos pecados,7 que ser golpeado por Deus lhe
cura8 ou que ele é digno de castigos.9
Graças à diligente obra da Consilium, a “psicologia” deste homem en-
contrará poucas dificuldades com as novas orações, uma vez que elas não
enfatizam tais noções obsoletas como a fragilidade da condição humana,10 as
1 Cf. M192 (in tot adversis) & M70, 236, C; M333 (liberemus adversis), & M70, 540 C, S.
Vicentii Ferrer. Suprimida: M44, M158, M1138 (tueantur adversis); M37 (inter adversa securi);
M196 (ab omnis adversitate); M231, (omnia adversantia); M325 (omni adversitate fugata);
M388 (a acunctis eripi mereamur adversis); M867, M884 (cuncta nobis adversantia); M945
(contra omnia adversa); M1091 (contra omnes adversitates subsidium); M1133 (a cunctis ad-
versitatibus protege); M1155 (nulla ei necebit adversitas).
2 Cf. M947 (humanis non sinas subjacere periculis) & M70, 373 P; M482 (praesentibus
periculis liberati), & M70, 555 P. Suprimida: M1 (corporis defende periculis); M24 (ab omni
malo et periculo liberemur); M34 (a periculis omnibus eruamur); M240 (amotis periculis);
M488 (praesentis tempores pericula devitare); M730 (a cunctis nos defende periculis); M910
(ab omnivus mentis et corporis periclis).
3 Suprimida: M36 (ab hostium furore defende); M94 (de inimicis nostris victores nos effi-
ciat); M201 (hostium sublata formidine); M241 (eorum insidiis potenter eripe); M249, M270
(omnium hostium superatis insidiis); M587 (ab inimicorum defendat insidiis); M811 (ab hos-
tium impugnatione defende); M1080, M1158 (ab hostium liberemus insidiis).
4 Suprimida: M152 (a presentis vitae malis eroptos); M801 (a presentis vitae malis).
5 Suprimida: M380 (ex quacumque tribulatione); M682 (continuis tribulationibus laboran-
tem); M11179 (in tribulatione percipimus).
6 Cf. M688 (mala omnia, quae meremur, averte) & M70, 548, S. Suprimida: M6 (quiquid
pro eis meremur, propitiatus averte); M134 (ex merito nostrae actionis affigimur).
7 Suprimida: M6 (pro peccatis affigimur); M406 (ea quae pro peccatis nostris patimur);
M648 (et a poenis, quas pro his meremur, eripias); M887 (qui juste pro peccatis nostris aff-
gimur).
8 Suprimida: M463 (nos percutiendo sanas).
9 Suprimida: M806 (dignis flagellationibus castigatus).
10 Cf. M394 (fragilitatem conditionis humanae) & M70, 179; M981 (fragilitatis subsidium)
& M70, 349, S. Suprimida: M406 (pro humana scis fragilitate non posse subsistere); M684
(fragilitas nostra subsistat; ut, quae sua conditione atteritur).
286
As orações revisadas
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Capítulo 9
288
As orações revisadas
e às dores do inferno13 e ao seu fogo14 — tudo isso Deus aboliu tão completa-
mente em harmonia, assim se presume, com o espírito do Vaticano II.
Tal é o nosso retrato espiritual do homem contemporâneo. Embora algu-
ma linguagem levemente negativa possa ser encontrada no Missal novo, com
uma exceção (mal traduzida na versão oficial inglesa),15 ela tem sido relegada
aos dias feriais (frequentemente durante a quaresma), quando o homem con-
temporâneo raramente, se alguma vez, vai à igreja; ou aos formulários opcio-
nais no final do Missal.
13 Cf. M208 (non poenas inferni sustineat) & M70, 853, C#2.
14 Suprimida: M600 (debita flammarum incendia).
15 M70, 366, C (ut dimittas quae conscientia metuit). “Forgive our failings.” M70, 595, P
(a cunctis malis imminentibus liberemur), é usado somente se há uma Missa de vésperas na
vigília da Assunção.
16 Cf. M911 (et sic transeamus per bona temporala, ut non amittamus aeterna) & M70,
356, C.
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Capítulo 9
1 Cf. M364 (a perpetuae mortis eripuisti casibus) & M70, 315, Hebdomada 4.
2 Cf. M981 (fragilitatis subsidium) & M70, 349, S. Similarly, M1083 (infirmitatis auxilium)
& M70, 324, S.
3 Cf. M947 (humanis non sinas periculis) & M70, 373, C.
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As orações revisadas
4 M313 Quad 3,C (omni nos virtute destitui… a pravis cogitationibus mundemur in mente).
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Capítulo 9
292
As orações revisadas
o CriSTÃo E o MUNDo
“Todo aquele que quiser ser amigo deste século”, diz São Tiago em sua
Epístola, “se constitui inimigo de Deus.” [Tg 4,4] Esse ensinamento sóbrio
ecoa em outras passagens da Escritura e nos escritos de incontáveis teólogos,
ascetas e santos através das eras.
Portanto, no Missal tradicional, muitas orações aos santos destacavam
seu desdém ou desprezo pelas coisas terrenas como algo singularmente vir-
tuoso. De novo e de novo, a frase terrena despicere — desprezar as coisas
terrenas — aparece como um ideal que um santo alcançou e que nós espe-
ramos obter.
Essa realidade doutrinal em particular, os revisores extirparam em sua in-
teireza do Missal novo, o que eles agora chamaram de “mais positivo”,7 “mais
respeitoso em face da realidade terrena.”8
Podemos citar três textos para ilustrar como a Consilium “retocou” a lin-
guagem ofensiva. Na Pós-Comunhão do Segundo Domingo do Advento, os
textos em ambos os Missais começam com as mesmas frases,9 e então avan-
6 Cf. M356 (spiritu compunctionis repleas), M394 (fragilitatem conditionis humanae, hu-
militatis, ob pravitatis nostrae demeritum in pulverem reversuros, praemmia poenitentibus
repromissa); & M70, 178-80.
7 Braga, “Il ‘Proprium’”, 420.
8 Augé, “Le Collette”, 296.
9 Cf. M970 (terrena despicere et amare caelestia) & M70, 130.
293
Capítulo 9
A perspectiva dos novos textos, como facilmente pode ser visto, é comple-
tamente diferente, mais “horizontal”, menos severa, menos sobrenatural. O
fim do homem é diminuído, e a fronteira entre o sagrado e o profano, entre o
1 Cf. M123 (per terrestrium rerum contemptum aeterna gaudia consequamur) & M70, 529.
2 Cf. M277 (sola caelestia desiderare) & M70, 588.
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As orações revisadas
295
Capítulo 9
1 Cf. M348 (illecebras saeculi superare fecisti… mundi hujus blandimenta vitare), & M70,
577. Esta foi tão editada que quase constitui um texto inteiramente novo. Também abolido:
M946 (terrena despicere), Ss. Cyrilli et Methodii, P; M1068 (facias terrena despicere, et te
solum Deum pura mente sectari), S.Joannae Franciscae de Chantal, P.
2 M174 (superbis saeculi vanitatibus exutis), S. Margaritae Mariae Alacoque, P.
3 M201 (da servis tuis illam, quam mundus dare non potest pacem), Pro Pace, C.
4 M908 (a terrenis cupiditatibus liberati), Pent 24, S; 259 (supra terrenas omnes cupititates
elevati), S.Josephi a Cupertino, C.
5 M291, (terrenum postponere, caduca despicere, aque aeterna sectari), S. Hermenegildi, C;
M303, (cuncta mundi despicere), S. Petri Caelistini, C.
6 M593 (ambitionem saeculi), Ad Postulandam Humilitatem, S.
7 M709 (a delectationibus terrenis expediant), Epip 4, P.
8 M873 (terrenis affectibus mitigatis), Quad 4. 4, C.
9 M876 (spretis mundi oblectamentis), S. Ludovici Regis, S.
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As orações revisadas
10 Cf. M208 (ut non tradas eam in manus inimici, neque obliviscaris eam in finem, sed jube-
as eam a sanctis Angelis suscipi… no poenas inferni sustineat) & M70, 853, C2.
11 Cf. M845 & M70, 855, P; M703 & M70, 857, S; M906 & M70, 862, S.
12 Henry Ashworth OSB, “The prayers for the Dead in the New Roman Missal EL 85
(1971),5. Grifo meu.
297
Capítulo 9
ma) tem, para todos os efeitos práticos, desaparecido das orações novas pelos
mortos. Nas nove orações usadas na Missa Nova no Dia de Finados (ou Dia
de Todas as Almas dos Fiéis Defuntos), por exemplo, “alma” não aparece
sequer uma vez, enquanto o Missal tradicional a utiliza em todas as nove ora-
ções. Talvez o dia 2 de novembro deveria ter sido renomeado para o “Dia de
Nenhuma Alma...”
Além disso, ao selecionar as orações pelos mortos do Missal novo, os reviso-
res removeram onze das orações tradicionais que empregavam a palavra “alma”1
— e das vinte e cinco orações tradicionais que foram mantidas, eles eliminaram
a palavra “alma” de vinte e três destas.2 Portanto, as orações já não são ofere-
cidas “pela alma de João Smith”, mas simplesmente “por João Smith” — uma
outra ruptura com a tradição antiga, já que os antigos sacramentários romanos
empregam a palavra em suas orações pelos mortos.3 As omissões foram inten-
cionais — feitas, disse Ashworth, a fim de “aliviar” as orações.4
Além de uma implícita negação da doutrina da Igreja sobre o Purgatório
e do desejo de cortar conceitos negativos, acaso poderia estar em ação um
princípio teológico inteiramente novo? Em um artigo de alguns anos atrás, no
The Wanderer, o Padre Paul Trinchard observou:
Uma heresia fundamental, largamente não reconhecida e tratada, invade
as igrejas da América. Ela ensina que nós não somos compostos de corpo
e alma. Cada qual é visto de forma holística. É impossível à vossa alma
ou espírito existir sem o vosso corpo, segundo essa visão. De acordo com
essa heresia fundamental, todo indivíduo deve existir como espírito, alma e
1 M51, 207, 223, 529, 606, 608, 892, 905, 1097, 1117 & 1119.
2 Cf. M208 & M70,853; M845 & M70, 855; M210 & M70, 856; M703 & M70, 857; M931
& M70, 858; M233 & M70, 861; M644 & M70, 862; M906 & M70, 864, M5 & M70, 863; M53
& M70, 863; M567 &b M70, 864; M620 & M70, M864; M52 & M70, 865; M214 & M70, 867;
M645 & M70, 868; M909 & M70, 871; M1120 & M70, 872; M884 & M70, 872; M851 & M70,
879; M407 & M70, 880; M1134 & M70, 881; M106 & M70, 881; M465 & M70, 881. Uma
vez que as duas orações em que ela ainda ocorre (formulário 14, super oblata e post commu-
nionem) vem no próprio fim das orações pelos mortos no Missal novo, suspeita-se que os
revisores simplesmente esqueceram de cortar a palavra anima (às vezes, até Lutero combina
com Homero). Recolocar as doze orações sem a palavra anima, em todo caso, teria tornado
difícil seguir as regras de estilo clássico do latim.
3 Vide, por exemplo Sacramentrium Veronese, EEFL 1115, 1117-20, 1122; Gelasianum Vetus, EEFL
1293-5. Vide também o suplemento ao Hadrianum Gregorianum, EEFL 1593, 1596-1600.
4 “Prayers for the Dead”, 9.
298
As orações revisadas
aCoMoDaNDo-SE ao ECUMENiSMo
Tendo em vista descobrir o que Braga disse que “já não está em harmonia
com as novas posições da Igreja”,6 voltamo-nos brevemente para as mudanças
feitas por razões ecumênicas.
5 “Liturgical Reflections: All Souls Day” The Wanderer (30 de outubro de 1986), 2.
6 “Il ‘Proprium,’” 419.
7 Cf. M173 (te solum verum Deum) & M70, 534.
8 Cf. M416 (ut… omnes gentes cognoscant te solum Deum verum) & M70, 795.
299
Capítulo 9
300
As orações revisadas
2. Destruição das Orações Antigas. Para que não seja pensado que os
revisores estivessem retornando à tradição cristã primitiva, cortando a lingua-
gem que condenava o mal da heresia e proclamava os direitos de Deus e de
sua Igreja, tem-se apenas que considerar as orações solenes de Sexta-Feira
Santa. Essas orações, as mais antigas do Missal tradicional, remontam aos dias
das mais antigas perseguições.13 No Sacramentário Gelasiano, um manuscrito
do século oitavo, que é a compilação oficial mais antiga das orações litúrgicas
11 Cf. M250 (ad errorem insidias repellendas et Apostolicae Sedis jura propugnanda) &
M70, 612.
12 Cf. M731 (praeesse) & M70, 776, S; M1153 (regimini) & M70, 780, S.
13 Jungmann, Early Liturgy, 61.
301
Capítulo 9
romanas existentes,1 os textos dessas orações são, salvo por algumas poucas
diferenças gramaticais, idênticos aos que encontramos no Missal tradicional.2
A comparação desses textos com seus correspondentes do Missal de Paulo
VI revela que:
• Na Oração pela Igreja, os revisores omitiram as petições para que os
príncipes e poderes sejam submetidos à Igreja,3 um “anacronismo”,
disse Bugnini, quando o assunto é o papel temporal da Igreja.4
• Os revisores aboliram a seguinte oração pelos hereges e cismáticos:
Oremus pelos hereges e cismáticos,
que nosso Deus e Senhor liberte-os de seus erros;
e se digne chamá-los à nossa Santa Mãe,
a Igreja Católica e Apostólica.
Ó Onipotente e Eterno Deus, que a todos salvais,
e que quereis que ninguém pereça:
Olhai sobre as almas daqueles enganados pelas armadilhas do demônio:
Que, sendo o mal da heresia removido de seus corações,
possam os errantes se arrepender e retornar à unidade da Vossa verdade.
Os conceitos doutrinais que esse texto expressa repudiam diversos pressu-
postos fundamentais do sistema teológico modernista. Ele coloca os hereges
e cismáticos fora da Igreja, implica que o erro leva ao Inferno, menciona a
existência do demônio, caracteriza a heresia como má e localiza os hereges
fora “da unidade da Vossa verdade.” Esse é o equivalente ecumênico de um
incêndio nível 4. Em seu lugar, os revisores colocaram uma oração vaga pela
unidade dos cristãos.5
• A Oração pelos Judeus já não fala de sua “incredulidade”, sua “ceguei-
ra” e do “véu” sobre seus corações por se recusarem a reconhecer a
Cristo. A oração agora pede a Deus que os judeus cresçam em fideli-
302
As orações revisadas
6 Cf. M778 (Oremus et pro perfidis Judaeis… auferat velamen de cordibus eorum; ut et
ipsi agnoscant Jesum Christum dominum nostrum… preces quas pro illius populi obcaecatio-
ne deferimus…) & M70, 254. Algumas das frases já tinham sido removidas por João XXIII.
7 Cf. M790 & M70, 254-5.
8 RL, 127.
9 Cerca de 160 vezes nas orações e durante as oitavas e cerca de 40 vezes nos comuns.
Cheguei a cifra usando o index verborum no volume 1 do Bruylants e tomando em consideração
as repetições de certos textos que ocorrem no decorrer do ano.
10 Cf. M651.1 & M70,516; M413 &M70, 521; M262 & M70, 528; M295 & M70, 533; M333
& M70, 540; M401 & M70, 542; M540 & M70, 547; M330 & M70,588;M401 & M70, 599;
M112 & M70, 575; M651.1 & M70, 576; M13.1 & M70, 582; M293 & M70, 598; M290 &
M70, 606; M523.1 & M70, 608; M228 & M70, 611; M740 & M70, 611; M398 & M70, 613;
M916.1 & M70, 614; M300 & M70, 617; M331 & M70,621; M523 & M70, 621; M1030 &
M70, 622; M269 & M70, 625; M506 & M70, 625; M10081 & M70, 629; M1036 & M70, 638;
M10115 & M70, 646; M370 & M70, 647.
303
Capítulo 9
1 Cf. M246 & M70, 518; M510 & M70, 310; M376.1 & M70, 527; M238 & M70, 528;
M433.1 & M70, 540; M287 & M70, 542; M97 & M70,553; M300 & M70,558; M697 & M70,
579; M282 & M70, 585; M17 & M70, 590; M296 & M70, 602; M250 & M70, 612; M361
&M70, 642; M194 & M70; 657; M1084 & M70, 712; M374 & M70, 715, M659 & M70, 718;
M114 & M70, 719; M13 & M70, 722; M478 & M70, 724.
2 S. Aloisii Gonzaga, C; S.Dominici, C, e S. Teresiae a Jesu Infante, S.
3 Cf. M361 (meritis, cordis nostri maculas absterge) & M70, 642.
304
As orações revisadas
mo. Enquanto a Igreja ensina que nós podemos merecer por nós mesmos e
pelos outros, o protestantismo clássico sustentava que a natureza humana era
tão corrupta que não poderia merecer qualquer coisa. Remova a palavra mé-
rito das orações para os santos, e um outro obstáculo ecumênico desaparece.
305
Capítulo 9
facilmente os culpados.
Se os santos são “desmitologizados”, por que não a Rainha de Todos os
Santos? A oração para a Festa de Nossa Senhora de Lourdes já não menciona
a sua aparição,1 nem as orações novas para a festa de Nossa Senhora do Rosá-
rio se preocupam em mencionar o seu Rosário.2
E, finalmente, nem mesmo as orações que recontam o miraculoso na vida
de Nosso Senhor estiveram a salvo dos racionalistas: a voz de Deus já não fala
desde a nuvem na Festa da Transfiguração,3 e o milagre de Cristo da ressurrei-
ção de Lázaro foi sepultado para sempre.4
Nada disso, com certeza, tomará de surpresa qualquer pessoa que tenha tido
um curso de Escritura em um seminário ou (normalmente) uma universidade
católica desta era pós-Vaticano II. Os biblistas modernistas de Escritura — há
hoje qualquer outro tipo? — rotineiramente tratam os milagres narrados na
Bíblia, mesmo aqueles realizados por Nosso Senhor, como impossíveis, impro-
váveis, incompreensíveis, mitos, fábulas, eventos meramente naturais, “refle-
xões da Fé” e, geralmente, como desprovidos de verdade histórica. Enquanto
os modernistas que criaram a Missa de Paulo VI não podiam fazer os mila-
gres desaparecerem das leituras da Escritura, podiam e de fato os extirparam
das orações, assim impondo seu ceticismo racionalista aos leigos incautos, que
mantiveram sua devoção a Nosso Senhor, Nossa Senhora e aos Santos.
aS CoNSEQUÊNCiaS
Comparar os textos das orações novas com as orações antigas, então, pro-
duz uma longa lista de doutrinas católicas que os revisores obliteraram ou
fizeram desaparecer como o Gato Risonho no pano de fundo: Inferno, juízo,
ira de Deus, castigo pelo pecado, a perversidade do pecado como o maior mal,
desapego do mundo, as almas dos defuntos, a realeza de Cristo sobre a terra,
a Igreja Militante, o triunfo da Fé Católica, os males da heresia, do cisma e do
erro, a conversão dos não católicos, os méritos dos Santos e os milagres.
A lista parece como um syllabus das doutrinas e práticas católicas rejeitadas
306
As orações revisadas
5 Problem of the Liturgical Reform, 27-33. Por isso, argumentam os autores, que as noções de
dor pelo pecado e necessidade de fazer satisfação por ele foi ou suprimida ou reduzida. “Assim,
a dimensão propiciatória tem, por assim dizer, desaparecido do Missal novo.” Isso eles veem
como a consequência lógica da nova doutrina de que a Missa é antes um memorial do que
um sacrifício; “ação de graças” então, substitui a propiciação. 147: fonte para a demonstração
verdade teológicas
6 Aimé Georges Martimort, “Structure and Laws of Liturgical celebrationem Irénée Henri
Dalmais, etc., Principles of the Liturgy, tr. por Matthew J.O’Connell, The Church at Prayer, vol.1,
Editado por A.G. Martimort, new edition (Collegeville MN: Liturgical Press 1986), 159.
7 A existência de anjos e demônios, por exemplo. Para uma discussão, vide Paul M. Quay
SJ, “Angels and Demons in the New ‘Missale Romanum,’” EL 94 (1980), 401-10.
8 “Il Nuovo274.
307
Capítulo 9
Neste contexto, é difícil para o leigo ver como o Inferno, o jejum, o desape-
go ou a alma deveriam importar para ele, já que eles não aparecem mais em seu
culto semanal. E se ele já não acredita (ou mesmo não está consciente) desses
e de outros pontos fundamentais da doutrina da Igreja, isso é em grande parte
devido à mutilação da doutrina católica nas orações Missal de Paulo VI.
rESUMo
• A grande parte dos conteúdos do Missal tradicional e do Missal de
Paulo VI consiste de orações curtas chamadas orationes.
• As orações mais antigas do Ciclo Temporal do Missal tradicional são
recitadas em uma sequência que tem sido seguida desde pelo menos o
século sexto.
• Embora o Vaticano II não tenha prescrito especificamente uma revisão
do conteúdo ou da ordem litúrgica das orações, a Consilium empreen-
deu uma revisão total de ambas.
• Como resultado, somente 33% das orações no Missal tradicional fo-
ram incorporadas no Missal de Paulo VI. Destas, mais da metade foram
alteradas pelos revisores. Assim, somente 17% das orações vindas do
Missal antigo sobreviveram intactas no Missal de Paulo VI.
• Os revisores mudaram não meramente o estilo das orações, mas seu con-
teúdo doutrinal também. Doravante, disseram eles, estas refletiriam novas
visões dos valores humanos, requerimentos ecumênicos, novas posi-
ções da Igreja, um novo fundamento da teologia eucarística, uma nova
realidade doutrinal, novos valores e novas perspectivas. Uma compa-
ração das orações antigas e daquelas do Missal de Paulo VI revela que
isso afetou seis áreas em particular.
• Teologia Negativa. Os revisores sistematicamente eliminaram das orações
diversos conceitos doutrinais em desacordo com a teologia modernis-
ta. Exemplos: a perversidade do pecado, o pecado como ofensa grave
à Majestade Divina, perdição, ira divina, o jugo do mal, castigos nesta
vida pelo pecado, nossa vontade débil, concupiscência, nosso orgulho,
nossa indignidade, compunção, a perda do Céu, o castigo eterno, as pe-
nas do Inferno, o fogo do Inferno, jejum, mortificações e morte como
pena por nossa culpa.
• O Cristão e o Mundo. Os revisores removeram das orações as formula-
ções padrões do conflito eterno entre o cristão e o espírito do mundo:
308
As orações revisadas
309
Capítulo 9
310
CaPÍTUlo 10
a liTUrgia Da PalaVra:
ESColHaS HÁBEiS, VoZES gigaNTESCaS
E
m sua crítica devastadora e muito sagaz ao culto católico moder-
no, o músico sacro Thomas Day observou que, onde uma vez
os católicos tinham espaço para levar adiante seus próprios pen-
samentos e orações na Missa Dominical, agora são implacavel-
mente bombardeados por uma “Voz Gigantesca”, amplificada eletronicamen-
te, ansiosa por transmitir “informações”. O corriqueiro padrão litúrgico, diz ele:
É blá, blá, blá — com rapidez, atiram na congregação um barulhento Aleluia,
que dura uns 15 segundos; blá, blá, blá — rapidamente, atiram na congregação
um Amém; blá, blá, blá, e o católico que tentasse escutar cada sílaba da Missa
— é isso o que alguns peritos pretendem — há de ficar louco por conta da cas-
cata de “informações” e terá de ser tirado da igreja em uma camisa-de-força.1
Como um organista que tocou em igrejas durante o final dos anos 60 e iní-
cio dos 70, eu posso atestar da minha própria experiência que esse era o estado
de coisas na maioria das paróquias de então. E provavelmente ainda é assim.
Esse estranho fenômeno da Missa Nova não é nada mais que a conclusão
lógica da teoria da liturgia pastoral de Jungmann (Missa-como-sala-de-aula).
Bem-vinda, ó Voz Gigantesca...
A Liturgia antiga, sem dúvida, formava os homens nas verdades de sua fé.
Mas a formação religiosa era meramente um subproduto do verdadeiro objeto
da Missa: a glorificação da Santíssima Trindade e o oferecimento a Deus de
um sacrifício propiciatório ao pecado. Se no curso de obter esse propósito
primordial, a Missa catequizava os homens, muito bem. Mas a Missa cumpria
seu propósito primordial — era “efetiva” — quer a instrução religiosa tenha
ou não tenha sido ofertada, recebida e guardada no coração.
A Missa de Paulo VI transformou a instrução religiosa em um fim em si
mesmo. A Missa deve servir agora como um tipo de sala de aula fornecendo
311
Capítulo 10
312
A Liturgia da Palavra
2 IL 1:398.
313
Capítulo 10
1 To Hear and Proclaim: Introduction, Letionary for Mass with Commentary for Musi-
cians and Priests (Washington: National Association of Pastoral Musicians 1983), 65.
2 IG 69 §66, DOL 1456.
314
A Liturgia da Palavra
315
Capítulo 10
o riTo rEESTrUTUraDo
O panorama litúrgico que ronda as leituras sofreu mudanças substanciais.
Nos Domingos e dias Santos, a estrutura da Liturgia da Palavra vis-à-vis com
o antigo rito é a que se segue:
1 O que é designado como Epístola na Missa Tridentina é algumas vezes de fato uma lei-
tura do Antigo Testamento. Em algumas ocasiões durante o ano litúrgico, ademais, o Missal
antigo prescreve leituras adicionais do Antigo Testamento antes da Epístola.
2 Eucharistiae Partipationem, §14, DOL 1988.
316
A Liturgia da Palavra
317
Capítulo 10
prática da Igreja Primitiva,1 outros como Archdale King indicam que o mé-
todo original de se cantar o Salmo depois da leitura da Escritura era ter um
cantor salmodiando diretamente, sem nenhuma resposta do povo.2 Seja lá qual
tenha sido o caso — e esses liturgistas também não têm certeza — os cantos
entre as leituras tornaram-se muito ornamentados já bem cedo na história da
Igreja e sua performance foi confiada a apenas um solista. Se a participação
congregacional tivesse sido a prática primitiva, ela teria morrido bem depressa.
Terceiro, os revisores insistiram que o Salmo Responsorial e a Aclamação
ao Evangelho fossem cantos congregacionais. Ora, é praticamente impossível
compor músicas que combinem verdadeira excelência artística com uma me-
lodia para um não-músico, particularmente com textos tão curtos como aque-
les que o novo Lecionário estabelece como refrãos da congregação. Portanto,
os compositores litúrgicos foram forçados a criar arranjos musicais que se
mantivessem no mais baixo nível do menor denominador comum. O resulta-
do é uma música desagradável, que raramente excede o nível artístico de uma
musiquinha composta para um comercial de creme dental.3
Quarto, enquanto a Consilium fornecia uma grande matriz de textos para
os Salmos Responsoriais e a Aclamação ao Evangelho, os revisores permitiam
múltiplas opções. As Conferências Nacionais dos Bispos poderiam substituir o
Salmo Responsorial por outros textos do tempo litúrgico ou aboli-lo por com-
pleto. Qualquer outra das várias dúzias de textos poderia ser selecionada como
Aclamação ao Evangelho, e esta poderia ser deixada de lado se ela não fosse
cantada. Mesmo a noção de uma universalidade superficial na oração da Igreja
nos cantos entre as leituras, cai assim vítima da anarquia litúrgica legalizada.
318
A Liturgia da Palavra
319
Capítulo 10
Deus seria tão Santo, que os meus lábios deveriam ser purificados pelo fogo?1
Ambos os ritos mantêm a mesma oração de bênção que o sacerdote pro-
nuncia sobre o diácono antes do evangelho.2
320
A Liturgia da Palavra
321
Capítulo 10
1 Vide Inter Oecumenici, §56, DOL 348 & R18; Consilium, The Universal Prayer of the Faithful,
1° ed., pro manuscript, 13 de Janeiro de 1965, 2° ed., 17 de Abril de 1966, DOL 1890-928.
2 Vide IG 69 §45-7, DOL 1435-7.
3 “La Restauration,” 317.
4 IG 69 §47, DOL 1437.
322
A Liturgia da Palavra
o lECioNÁrio TraDiCioNal
Uma vez que os primeiros cristãos continuaram a tomar elementos da ce-
rimônia da sinagoga palestina do primeiro século em seu culto, a celebração
da Missa sempre incluía leituras da Escritura e dos Salmos. No segundo sé-
culo, São Justino Mártir notava que a leitura na Missa continuava, “até onde
o tempo permitisse”.6 Historiadores da liturgia discordam se as passagens da
Escritura eram lidas continuamente — isto é, começavam do ponto da Bíblia
em que se tinha chegado na celebração anterior. Seja como for, o bispo da
diocese selecionava as passagens bíblicas antecipadamente, inicialmente nin-
guém tinha feito uma tentativa generalizada de organizar e impor um sistema
fixo de leituras.7
Os cristãos eventualmente começaram a associar passagens particulares da
Escritura com certos dias de festas ou observâncias — digamos, a festa de um
mártir ou um dia penitencial em alguma igreja particular. Vários sistemas foram
usados para organizar e arranjar as passagens apropriadas — o termo técnico
para cada passagem é pericope, do verbo grego “recortar”. A princípio, as pe-
rícopes eram anotadas no começo da Bíblia Litúrgica ou na margem do texto.
Posteriormente, os escribas copiaram os excertos dessas passagens da Missa
em novos livros chamados Lecionários — livros contendo as leituras ou lições.
Os sistemas das leituras dos Evangelhos e das leituras das Epístolas de-
senvolveram-se isoladamente e foram depois combinadas de uma forma um
tanto casual.8 A informação mais antiga que possuímos sobre quais passagens
eram lidas e quando, data somente do século sexto.9
O Missal tradicional prescreve precisamente quais leituras da Escritura o
sacerdote deve recitar em qualquer dia. Nos dias dos Santos, ele toma os tex-
tos do designado Próprio ou Comum dos Santos. Se nenhuma festa particular
ocorre em um dia de semana, ele pode então selecionar uma Missa Votiva ou
323
Capítulo 10
Missa de Requiem com suas próprias leituras. Aos Domingos e em certas ob-
servâncias mais antigas do ano litúrgico, o sacerdote deve usar textos próprios
do tempo litúrgico.
Certas características do sistema tradicional de leituras da Escritura são
bem antigas. Enquanto o Papa São Pio V finalmente o fez obrigatório para
toda a Igreja Latina somente em 1570, os estudiosos remontam as leituras do
Ciclo Temporal ao arranjo usado em Roma no século oitavo.1 Portanto, desde
o tempo do imperador Carlos Magno até o século doze, as mesmas passagens
das Escrituras eram lidas durante a Quaresma, Semana Santa e Semana da
Páscoa e outras observâncias mais antigas do ano litúrgico,2 uma tradição viva
que se estende para mais de 1100 anos atrás.
o VaTiCaNo ii E aS lEiTUraS
Nem mesmo a tradição de 1100 anos conseguiu dissuadir a ala radical do
Movimento Litúrgico. Entre os anos de 1951-1954, foram realizadas quatro
conferências litúrgicas sucessivas, de âmbito internacional, que recomenda-
vam adicionar ou abolir o antigo Ciclo de Leituras da Escritura — uma pro-
posta amplamente circulada à época pedia ainda o estabelecimento de um
ciclo de três anos em seu lugar.3 Durante os mesmos anos, o movimento litúr-
gico começou a se agitar por outras mudanças, tais como renomear a Missa
dos Catecúmenos como “Liturgia da Palavra”, ler a Epístola e o Evangelho
em vernáculo de frente para o povo e requerer que o sacerdote se sentasse
quando alguém proclamasse as Leituras.4
Paralelamente a essas propostas concretas, alguns especialistas do movi-
mento desenvolveram teorias perigosas sobre a “presença” de Cristo quan-
do a Escritura é proclamada, uma presença que parecia ofuscar Sua Presença
Real sob as Sagradas Espécies. A importância que eles concediam à “palavra
proclamada na assembleia” implicava que os sinais sacramentais seriam meras
ilustrações da “Palavra recebida na Fé”5 — uma clássica posição protestante.
324
A Liturgia da Palavra
6 Como é notado acima, Bouyer mantinha que “toda a Missa é uma única Liturgia da Pa-
lavra.” LP, 79.
7 SC § 24, DOL 24.
8 SC § 56, DOL 56.
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Capítulo 10
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A Liturgia da Palavra
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Capítulo 10
328
A Liturgia da Palavra
5 RL, 205: non volevano che ragioni ecumeniche impedissero l’abbandono del lezionario
tradizionale.” Vide também RL, 4212.
6 Vide RL, 412.
7 Note Lectionarium Feriale, sobre o Lecionário fornecido pela Consilium, Janeiro de 1957.
8 Lectionarium Feriale, §5, DOL 1836.
329
Capítulo 10
CaraCTErÍSTiCaS DiSTiNTiVaS
Além de ser uma criação completamente artificial, que não possui rela-
ção com aquilo que é substituído, o novo Lecionário tem duas características
distintas que o colocam à parte do antigo Lecionário: o novo ciclo trienal de
leituras e as muitas opções que são permitidas ao usá-lo.
330
A Liturgia da Palavra
331
Capítulo 10
332
A Liturgia da Palavra
consideração pela Igreja, agora ela pode ser proposta com base no alvitre do
Padre Chuck ou, apenas hipoteticamente, mesmo naquele de um Padre Re-
traux surpreendentemente criativo.6
6 Eu conheci um jovem sacerdote dos 70 que, usando todas as regras no novo Lecionário,
descobriu um modo de justificar o uso de todas as antigas leituras em suas celebrações sema-
nais da Missa Nova.
7 LI §7.c, DOL 1849.
8 LI §8.d, DOL 1849.
9 LI §8.d, DOL 1850.
333
Capítulo 10
334
A Liturgia da Palavra
Ausentes do Lecionário
• A vingança pertence ao Senhor e Ele vai retribuir; é coisa terrível cair
nas mãos do Deus vivo.3
• Deus é o legislador e o juiz que pode tanto destruir, quanto libertar.4
• Se no juízo de Deus o homem justo mal pode se salvar, onde aparecerá
o ímpio e o pecador?5
• Quem quer que cumpra toda a lei, mas falta em um só ponto, torna-se
culpado de tudo.6
2. O Castigo nesta vida pelo pecado. Avisos de que pode-se incorrer no
castigo divino nesta vida por causa dos pecados cometidos são inconvenien-
tes. Talvez mais inconveniente ainda seja o pensamento de que Deus às vezes
inflige a punição dramaticamente e miraculosamente. Portanto:
Versículos removidos do meio da passagem
• Em Atos, o relato do suicídio de Judas e sua caracterização como a
“recompensa da iniquidade”.7
• O aviso de São Paulo de que, no Antigo Testamento, os fornicado-
res, intemperantes e murmuradores foram golpeados e destruídos por
Deus nesta vida, em razão de sua iniquidade. (anteriormente, Pente-
costes, IX.)8
Ausentes do Lecionário
• Ananias e Safira caídos mortos pela fraude.9
• Herodes prostrado e comido por vermes pelo pecado de blasfêmia.10
• Elimas, o mago, cegado por tentar desviar o procônsul Sérgio Paulo da Fé.11
3 Heb 10,30-1.
4 Jas 4,12.
5 1 Ped 4,17-18.
6 Tg 2,10.
7 At 1,18 - 20b. Cf L 61, Pasc 7b.
8 1 Cor 10,7 - 9. Cf. L 30, Quad 3c.
9 At 5,1-11.
10 At 12,19-23.
11 At 13,7-12.
335
Capítulo 10
Versículos opcionais
• Na parábola dos convidados à festa de casamento, a expulsão do ho-
mem que veio sem o traje nupcial, seu lançamento nas trevas exteriores
onde há choro e ranger de dentes, e as palavras “muitos são chamados,
mas poucos os escolhidos” (antigamente, Pentecostes XIX).5
Versículos removidos das passagens
• Na parábola dos trabalhadores chamados à vinha, a frase: “pois muitos
são chamados, mas poucos os escolhidos” (antigamente, Septuagésima).6
• No Apocalipse, a exclusão do céu no fim do mundo dos “cães” [i.e. dos
hereges], e feiticeiros, e incontinentes, e murmuradores, e servidores
dos ídolos e todo aquele que ama e professa uma mentira.”7
1 Col 3,6. Cf. L 115, Annm 18 c. A frase “questionável” é usada somente na leitura do dia
da semana.
2 Heb 12,16.
3 Heb 13,4.
4 Gal 6,8.
5 Mt 22,11 - 4. Cf. L 143, Annm 28a.
6 Mt. 20,16b. Cf. L 134, Annm 25a.
7 Ap 22,15. Cf. L 62, Pasc 7c.
336
A Liturgia da Palavra
5. Inferno. O Inferno e suas chamas são “difíceis”. Uma vez que Nosso
Senhor mesmo parece ter esquecido dos sentimentos de seus ouvintes sobre
a matéria, os revisores naturalmente se sentiram compelidos a suprir a notável
falta de sensibilidade do Divino Pastor. Assim:
Versículos opcionais
• A palavra de Nosso Senhor: “E o que lhe disser: És um tolo, será réu
do fogo do inferno” (antigamente, Pentecostes V). “Porque melhor te
é que se perca um de teus membros, do que todo o teu corpo vá para
o inferno”.8
• A explicação de Nosso Senhor: o joio reunido para ser queimado
simboliza os seguidores do demônio; no fim do mundo, aqueles que
obram iniquidade serão lançados em fornalha de fogo, onde há choro
e ranger de dentes.9
• A explicação de Nosso Senhor da parábola comparando o reino dos
céus a uma rede: os anjos, no fim do mundo, separarão os ímpios dos
justos e lançarão os ímpios em uma fornalha de fogo.10
• Na parábola dos convidados à festa de casamento, a expulsão do ho-
mem que veio sem o traje nupcial, seu lançamento nas trevas exteriores,
onde há choro e ranger de dentes, e as palavras “muitos são chamados,
mas poucos os escolhidos” (antigamente, Pentecostes XIX).11
• Na parábola dos talentos, o castigo do servo mal e preguiçoso, e sua
expulsão para as trevas exteriores, onde há choro e ranger de dentes.12
6. O mundo. Uma “nova visão dos valores humanos” vai ditar um uso
mais criterioso dos textos que condenam o espírito do mundo, portanto:
Leituras substitutas permitidas:
• As palavras de Nosso Senhor: “O que ama a sua vida, perdê-la-á: E o
que aborrece a sua vida neste mundo, conservá-la-á para a vida eterna.”13
337
Capítulo 10
Versículos opcionais
• Condenação de São Paulo dos “inimigos da cruz de Cristo, cujo fim é
a destruição; cujo Deus é o seu ventre e cuja glória é a sua vergonha”
e daqueles “que buscam as coisas terrenas”. (antigamente, Pentecostes
XXIII).1
Ausente do Lecionário
• Aqui não temos cidade permanente.2
338
A Liturgia da Palavra
9 Heb 10,26-7.
10 At 9,21-5.
11 At 14,1-4.
12 At 17,1-14.
13 At 19,8-16.
14 At 21,27-31.
15 Tt 1,10-6.
16 Ap 2,9; 3,9.
17 1 Tes 2,14-5.
18 2 Cor 1,13-4.
19 Fil 3,2.
20 2 Tim 2,16-26.
339
Capítulo 10
Ausente do Lecionário:
• Que as cabeças das mulheres sejam cobertas quando elas orarem pe-
rante Deus; a mulher foi criada para o homem e está sujeita a ele.5
• Que as mulheres guardem silêncio na igreja, pois não é permitido a elas
falar, antes devem ser submissas.6
• As mulheres devem adornar-se com modéstia, aprender em silêncio e
não ter autoridade sobre o homem; uma mulher será salva pela prole.7
• As esposas devem sujeitar-se aos seus maridos, mas que elas sejam
honradas como um vaso frágil.8
1 Heb 13,9.
2 Tt 3,10-1.
3 Jo 1,10-11.
4 2 Ped 2,1-22.
5 1 Cor 11,2-16.
6 1 Cor 14,34-35.
7 1 Tim 2,9-15.
8 1 Ped 3,1-7.
340
A Liturgia da Palavra
aNÁliSE
Então, nos termos da proposta que Paulo VI tinha anunciado para a re-
visão do Lecionário — aquela de comunicar aos fiéis “o fundamento da ins-
trução cristã e o núcleo de todo o estudo teológico” — o resultado real foi
uma gigantesca fraude. Sob o disfarce de apresentar mais a Escritura, os re-
formadores de fato apresentaram menos de sua mensagem real, assim, en-
9 1 Cor 11,27-9.
10 Vide L 40 e L 170.
11 Ap 22:19. Cf. L 62, Pasc 7c.
341
Capítulo 10
rESUMo
• O propósito da Liturgia da Palavra é fornecer uma instrução religio-
sa direta e imediata aos membros da congregação reunida. Esse novo
propósito falsifica o real fim da Missa — glorificar a Santíssima Trin-
dade e oferecer a Deus um sacrifício de propiciação pelo pecado — e
o substitui por outro.
• Como os ritos introdutórios, a Liturgia da Palavra é conduzida de fren-
te para o povo como “uma ação de uma assembleia deliberativa”.
• Quando a Liturgia da Palavra é realizada de uma maneira ideal, prevista
na Instrução Geral, o papel do sacerdote é limitado a recitação em voz
alta de duas orações — a introdução e a conclusão da Oração dos Fiéis.
• Durante os anos 50, alguns membros do Movimento Litúrgico propu-
seram um ciclo de três anos de leituras da Escritura.
• O Vaticano II ensinou que a Escritura é “de enorme importância na
342
A Liturgia da Palavra
343
Capítulo 10
fender o fiel mediano que vai à igreja aos domingo das passagens que
continham “temas negativos” — ira divina, a punição nesta vida pelo
pecado, a pecaminosidade da impureza, o inferno, as condenações do
mundo, dos infiéis, dos hereges e da dignidade necessária à recepção
da Eucaristia. Eles lidaram com tais passagens excluindo-as dos do-
mingos, tornando partes delas opcionais, tirando versículos individu-
ais, permitindo uma leitura substituta ou mantendo-as totalmente fora
do Lecionário.
• No sentido, portanto, da finalidade anunciada de apresentar aos fiéis o
que Paulo VI chamou de “o fundamento da instrução cristã e o núcleo
de todo estudo teológico”, o Lecionário da Missa de Paulo VI é uma
fraude gigantesca.
344
CaPÍTUlo 11
D
urante os anos do movimento tradicionalista, sacerdotes
como eu passavam seu domingo indo de cidade em cidade
celebrar a Missa Tridentina para grupos dispersos de católi-
cos que desejavam não ter nada a ver com o Novus Ordo.
Um dia, um amigo sacerdote que estava em seu caminho para o circuito
da Pensilvânia (Clearfield, Pittston, Williamsport) parou para comer em um
restaurante em Bath, PA. Ele percebeu que, juntamente com o menu sobre
a mesa, o devoto proprietário do restaurante tinha colocado um cartão que
não somente encorajava os visitantes a darem graças antes das refeições, mas
também fornecia textos de oração usados por várias denominações religiosas.
Meu colega, naturalmente, estava intrigado, e passou a ler as diversas ora-
ções até que seus olhos pousaram na ação de graças judaica: “Bendito sejais,
Senhor Deus do Universo, pois pela Vossa bondade nós temos esse pão…”
— a oração do Ofertório, sem dúvida, da Missa Nova. E, sem dúvida, ele a
estava lendo em um restaurante em Bath simplesmente porque algum sacer-
dote por perto também estava — como a oração do Ofertório do Novus Ordo.
Neste ponto, eu seria talvez interrompido pela Voz Gigantesca da antiga
Irmã Alberta Magna (a quem Padre Retreaux tem astutamente apelidado de
“Grande Al”), lembrando-me que não há nenhum “Ofertório” na Missa de
Paulo VI, meu caro senhor, porque agora ela se chama “a Preparação dos
Dons”.
A única resposta apropriada, com certeza, é um muito manso “sim, irmã”.
Mas antes que nós discutamos essa mudança particular na terminologia, de-
vemos primeiramente explicar os novos títulos das duas seções principais da
Missa de Paulo VI.
As duas principais divisões da Missa Tridentina se chamam a Missa dos
Catecúmenos (do começo até o Credo, incluindo-o) e a Missa dos Fiéis (Ofer-
tório, Cânon, Rito de Comunhão e Conclusão). Os títulos refletem a disciplina
345
Capítulo 11
antiga da Igreja, de acordo com a qual somente os fiéis (i.e., os batizados) po-
deriam estar presentes na parte da Missa que pertencia diretamente à oferenda
sacrificial.
Se os termos tinham raízes na antiguidade cristã, por que os criadores da
Missa Nova — autoproclamados restauradores das “normas primitivas dos
Padres” e tal — substituíram-nas por títulos como “Liturgia da Palavra” e
“Liturgia Eucarística”, que parecem ser de cunhagem moderna?1 Penso que
há duas explicações possíveis.
Primeiro, na Instrução Geral o termo “Missa” tomou o segundo plano
para dar lugar à expressão ecumenicamente palatável e protestante de “Ceia
do Senhor”. É difícil pretender que o antigo termo possa figurar como uma
subdivisão do próprio rito.
Segundo, a antiga disciplina cristã, que a terminologia antiga refletia, era,
de fato, exclusivista e explicitamente antiecumênica. Não somente eram os
não-batizados excluídos do resto da Missa antes do Ofertório, mas, em alguns
lugares, o diácono até mesmo cantava uma fórmula ritual de expulsão, que era
como a Saudação da Missa Nova, só que em tom inverso:
… Saiam agora os hereges!
Saiam agora os judeus!
Saiam agora os pagãos!
Saiam agora os arianos!
Saia agora quem quer que não tenha parte aqui!2
Compare esses sentimentos com a situação da Igreja pós-Vaticano II —
onde os hereges são sócios de declarações conjuntas, bispos celebram a Pás-
coa com rabinos, religiões não-cristãs são meios de salvação e neo-arianos
abundam em departamentos de teologia — e você terá alguma ideia de por
que a frase “Missa dos Fiéis” tinha que ser atualizada.
Aqui, examinaremos a Preparação dos Dons da Missa Nova, tratando dos
seguintes tópicos: (1) O Rito do Ofertório da Missa Tridentina. (2) As Ob-
jeções de Lutero a ele. (3) As razões dadas para substituir o Ofertório pela
346
A Preparação dos Dons
3 Vide, por exemplo, J.B.Molin FMC, “Depuis Quand le Mot Offertoire sert-il à Désigner
une Partie de la Messe?” EL 76 (1962), 355-80.
4 Vide geralmente, Paul Tirot OSB, “Histoire des Prières d’Offertoire, dans la Liturgie
Romaine du VIIe au XVIe Siècle”, EL 98 (1984), 148-97 e 321-91.
5 Public Worship: A Survey (Collegeville MN: Liturgical Press 1957), 123.
347
Capítulo 11
348
A Preparação dos Dons
aS oBJEÇÕES DE lUTEro
Foi a linguagem explicitamente sacrificial do rito do Ofertório tradicional
— vítima, sacrifício, oferenda, oblação — que os protestantes do século XVI
objetaram. Lutero, disse Callewaert “foi o primeiro a rebelar-se contra o con-
ceito tradicional de oblação.”7 Embora depois de ter caído em heresia, Lutero
tenha continuado a celebrar Missa por um tempo, ele imediatamente tirou o
Ofertório, chamando-o “aquela abominação completa… por conta da qual
quase tudo soa e cheira a oblação”. Colocar as palavras de Cristo na mesma
cerimônia que o Ofertório, ele compara a deixar a Arca do Testamento no
templo dos ídolos, próximo de Dagon.8
Além disso, o Ofertório era um rito sacerdotal e assim tinha que ser despre-
zado. “Todos os reformadores”, disse o historiador luterano Luther Reed, “re-
jeitaram o Ofertório romano e sua ideia de uma oferenda do sacerdote pelos
pecados, em vez de uma oferenda do povo em ação graças.”9
Os protestantes também objetavam a linguagem do rito que “antecipava”
o sacrifício. As orações do Ofertório, diz Reed, “antecipavam a consagração e
o ‘milagre da Missa’ e invocavam a bênção divina em vista do sacrifício euca-
rístico a ser oferecido.”10
Em 1523, Lutero publicou sua primeira série de revisões do Ordo da Mis-
sa, “repudiando”, como ele disse, “todas aquelas coisas que lembram sacrifí-
5 HSM, 494-5.
6 HSM, 495-6.
7 “De Offerenda”, 70.
8 Formula Missae (1523), trans. in Thompson, 111.
9 The Lutheran Liturgy, 312.
10 Reed, 312.
349
Capítulo 11
cio e Ofertório.”1 Ele aboliu todas as orações antigas e deixou em seu lugar
as seguintes breves direções: “durante o Credo ou depois do [sermão], que o
pão e o vinho sejam preparados, da forma costumeira, para a consagração.”2
350
A Preparação dos Dons
351
Capítulo 11
o CaNTo Do ofErTÓrio
O Rito do Ofertório na Missa Tridentina começa depois do Credo. O ce-
lebrante venera o altar com o ósculo costumeiro, volta-se para o povo, diz ou
canta Dominus vobiscum e fica de frente para o altar para recitar o texto do canto
do Ofertório, que na Missa Cantada também é cantado pelo coro.
A seleção e arranjo dos textos da Escritura usados no canto do Ofertório
têm, como nos outros cantos da Missa do Rito Romano, cerca de 1000 anos
de idade.2 Ele se originou na África do Norte e se estendeu à Roma por volta
do tempo de Santo Agostinho.3 De acordo com Jungmann, nos seus dias mais
antigos, o Canto do Ofertório não era um canto congregacional, mas era can-
tado em sua inteireza por um coro treinado.4
Na Missa de Paulo VI, o Canto do Ofertório achou o mesmo destino que o
Gradual e o Tracto — praticamente falando, ele não existe mais. A Instrução
Geral de 1969 meramente afirma que a procissão trazendo os dons é acom-
panhada por um Canto de Apresentação.5 Não há textos assinalados para ele
no Missal de 1970; decidir quais textos devem ser cantados e qual música deve
352
A Preparação dos Dons
353
Capítulo 11
1 MD 95.
2 “The Offertory Rite: A recent Study”, 246.
3 Ibid. 246.
354
A Preparação dos Dons
ofErECEr a VÍTiMa
A oração para o oferecimento da hóstia e a oração para o oferecimento
do cálice são o coração do Rito do Ofertório tradicional. Após de ter lido o
Canto do Ofertório, o sacerdote recita em silêncio a oração Suscipe Sancte Pater
enquanto oferece a hóstia:
Aceitai, ó Santo Padre, Deus omnipotente e eterno,
Esta hóstia imaculada,
Que eu, vosso indigno servo, ofereço-vos, meu Deus vivo e verdadeiro,
Por meus inumeráveis pecados, ofensas e negligências
E por todos aqui presentes;
Como também por todos os fiéis cristãos, vivos e mortos,
Para que este possa beneficiar a mim e a eles para a salvação na vida eterna.
Amém.
4 The New Mass: A Clear and Popular Explanation of the New Mass Liturgy (New York: Cacho-
lic Book Publishing 1970), 99.
5 Os documentos de trabalho interno do Grupo de Estudo 10 admitiram que o rito que
eles propuseram não era realmente a prática antiga (confira Barba, 259), e acrescentaram que,
no entanto, non despiciendos videtur (parece que não deva ser desprezado) — não exatamente
um endosso confiante.
355
Capítulo 11
Essa oração, cuja a primeira versão aparece no nono século,1 é, diz Gihr,
“tão suave em sua composição como rica em pensamento.”2 Ela expõe todo
um mundo de verdade dogmática sobre a Missa: o sacerdote, como represen-
tante de Cristo, oferece a Hóstia (por antecipação, a Vítima substancialmente
presente), ao Pai. O sacrifício é oferecido pelos próprios pecados do sacerdote
e por todos os fiéis, vivos e mortos, para que eles obtenham a salvação eterna
no Céu. Mesmo Pius Parsch estava impressionado pelo Suscipe Sancte Pater:
“Essa oração”, escrevia ele nos anos 40, “tão rica em doutrina, poderia servir
como a base de um tratado inteiro sobre a Missa.”3
Depois de o sacerdote preparar o cálice (vide abaixo), ele o oferece en-
quanto recita em voz baixa o Offerimus Tibi:
Nós vos oferecemos, ó Senhor, o cálice da salvação,
Implorando a Vossa clemência,
Que ele possa se elevar perante a Vossa divina Majestade,
Como um odor de suavidade para a nossa salvação,
E para aquela do mundo inteiro. Amém.
De acordo com Archdale King, essa oração vem da liturgia moçárabe (es-
panhola) e, começando no nono século, aparece em um número de Missais.4
Como o Suscipe Sancte Pater, ela forma um pequeno catecismo da doutrina
católica sobre o sacrifício eucarístico: a Missa faz satisfação a Deus pelos pe-
cados, dá glória à Santíssima Trindade, implora à divina misericórdia e é um
meio de graça e santificação para os filhos da Igreja e, em última instância,
para o mundo inteiro.
A doutrina que essas duas orações continham era anátema para os líderes
da revolta protestante, que negavam ao sacerdote qualquer função hierárquica,
e que rejeitavam o ensinamento católico de que os frutos da Missa poderiam
ser aplicados aos mortos e aqueles de outro modo não presentes. Além disso,
as orações expressavam a ideia de que a Missa é um sacrifício de propiciação
— uma “abominação” para os protestantes. De fato, a identificação do Suscipe
Sancte Pater com a doutrina católica é tão completa, que o liturgista luterano
1 TM, 305. ela “ocorre primeiro (com leves variações) no Livro de Oração de Carlos, o
Calvo (875-7).”
2 HSM, 516.
3 The Liturgy of the Mass, 3rd ed. (London: Herder 1957), 185.
4 LRC, 284.
356
A Preparação dos Dons
357
Capítulo 11
Mais uma vez, nos deparamos com a mesma equivocidade básica. De acordo
com a nova definição de Missa, Cristo está somente espiritualmente presente
entre os seus; aqui, pão e vinho estão somente espiritualmente — e não subs-
tancialmente — mudados.1
Como de costume, a mudança cede ao ecumenismo (erradicando fórmulas
ofensivas aos hereges) e ao modernismo (obliterando os acentos negativos de
propiciação).
As expressões indeterminadas para o que o pão e o vinho se tornariam fo-
ram deliberadamente escolhidas. O esquema original das novas orações de apre-
sentação, escritos pelo Padre Jounel, especificaram que o pão “se tornaria o
Corpo do Vosso Unigênito Filho” e que o vinho se tornaria “o sangue de Nos-
so Senhor Jesus Cristo”.2 Essas sentenças ao menos apresentavam claramente
um aspecto da doutrina tradicional católica sobre a Eucaristia. Mas elas foram
rejeitadas e substituídas pelo “pão da vida” e “vinho de salvação”.
Além disso, diz a Intervenção Ottaviani, a oração nova de apresentação:
Altera a natureza da oferenda sacrificial, convertendo-a em um tipo de troca
de dons entre Deus e o homem. O homem traz o pão, e Deus o transforma
em “o pão da vida”; O homem traz o vinho, e Deus o transforma em “vinho
de salvação”.3
O biblista Padre Ceslaus Spicq caracterizou a ideia de oferecer coisas mate-
riais, tais como pão e vinho (em vez de Cristo), como uma blasfêmia.4
2. Raízes judaicas. Uma vez que os criadores da Missa Nova não po-
deriam achar sequer uma oração do Ofertório no Rito do Ocidente que não
empregasse a temível terminologia sacrificial, de onde é que eles tiraram sua
inspiração para o texto novo?
Jungmann diz que ela se baseia em uma bênção judaica sobre os alimentos,
provavelmente usada no tempo de Cristo, e reconstruída pelos estudiosos ca-
tólicos modernos.5 O texto que ele cita é idêntico, quase palavra por palavra,
1 OI, 37-8.
2 RL, 359n. “ut fiat unigeniti Filii tui corpus.. ut sanguis fiat Domini nostri Iesu Christi.”
3 OI, 37.
4 Em uma palestra de 1974 no seminário São Pio X, Ecône, Suíça.
5 TNM, 190.
358
A Preparação dos Dons
ao seguinte:
Bendito sejais, ó Eterno, Nosso Deus,
Rei do Universo,
Criador dos frutos da terra.
Bendito sejais vós, ó Eterno, Nosso Deus,
Rei do Universo,
Criador do fruto da videira.
Essas formas aparecem no Haggadah de Páscoa e estão entre as orações que
os judeus recitam sobre o prato de pão matzo e a taça de vinho na refeição
Seder da Páscoa.
359
Capítulo 11
te cósmico.1 Eis aqui Teilhard falando sobre a ideia do trabalho humano ofe-
recido a Deus como matéria para a consagração na Missa:
A verdadeira substância a ser consagrada a cada dia é o desenvolvimento do
mundo durante aquele dia — o pão simbolizando apropriadamente o que
a criação logra produzir, o vinho (sangue) o que a criação tem perdido em
exaustão e sofrimento no curso deste esforço.2
Colocarei sobre minha patena, ó Deus, a colheita a ser vencida por esta renova-
ção do trabalho, em meu cálice, eu derramarei toda a seiva que será espremida
este dia dos frutos da Terra.3
Todas as coisas do mundo pelas as quais este dia trará crescimento; todas aque-
las que diminuirão… este é o material do meu sacrifício; o único material que
vós desejais… recebei, ó Senhor, esta hóstia que tudo engloba, que toda a vossa
criação, movida pelo vosso magnetismo, vos oferece na aurora de um novo dia.
Este pão, nosso trabalho, é de si mesmo nada senão um imenso perfume; este
vinho, nossa dor, não é mais, eu sei, do que uma gota que se dissolve...4
Pronunciai Vós agora, pois, falando por meus lábios sobre esse trabalho ter-
reno, a vossa palavra duplamente eficaz… isto é o meu corpo… isto é o meu
sangue.5
De acordo com o ensinamento católico, sem dúvida, a matéria do Sacra-
mento da Santa Eucaristia é o pão de trigo e o vinho feito de uva — ponto.
Implicar, como fazem as novas orações, que “a obra das mãos humanas”,
como o pão e o vinho, é de algum modo consagrada na Missa é um outro
exemplo do truque modernista de substituição e desvalorização. Isso destrói
a realidade da Consagração, degrada a Presença Real e torna sem sentido o
ensino da Igreja sobre a matéria requerida para a confecção do sacramento.6
360
A Preparação dos Dons
(a) Olhos para a Cruz. Na Missa Tridentina, o sacerdote ergue seus olhos
para o crucifixo (“para Deus”, como O’Connell diz) antes de recitar as ora-
ções prescritas, um gesto que claramente significa o sacrifício sendo oferecido
a Deus.
Isso desaparece na Missa de Paulo VI, talvez porque as orações mesmas já
não falem de sacrifício. (Ou talvez porque o celebrante poderia gastar muito
tempo tentando achar um crucifixo em seu santuário renovado).
(b) Corporal vs. Prato. Quando o sacerdote termina o Suscipe Sancte Pater
na Missa Tridentina, coloca a hóstia no corporal que fica sobre o altar; na
Missa Rezada, ele, então, esconde a patena sob o corporal, enquanto na Missa
Solene, ele a entrega ao subdiácono que, um minuto mais tarde, afasta-a do al-
tar de uma vez, prática que remonta, pelo menos, ao século sétimo.8 A patena
reaparece novamente somente depois do Pai Nosso, quando inicia a parte do
“banquete” da Missa.
No entanto, na Missa Nova, o pão permanece em sua patena semelhante a
um prato durante toda a cerimônia. Enquanto os sacrifícios oferecidos a Deus
7 Enquanto a oração tradicional para oferecer o cálice começa também na primeira pessoa
do plural, ela é assim formulada porque, como Fortescue nota, na Missa Solene o sacerdote e
o diácono recitam-na juntos. Vide TM 306.
8 Vide LRC, 281-2.
361
Capítulo 11
PrEParaÇÃo Do CÁliCE
Na Missa Tridentina, o vinho é derramado no cálice e uma gota de água
é então adicionada. Todos os povos antigos misturavam a água com o vinho
que bebiam e não há dúvida de que o próprio Nosso Senhor tenha usado um
cálice misturado na Última Ceia, por isso o costume foi incorporado na Missa.
362
A Preparação dos Dons
363
Capítulo 11
364
A Preparação dos Dons
ViNDE, Ó SaNTifiCaDor
Em seguida, na Missa Tridentina, o sacerdote ergue seus olhos para o cru-
cifixo e os abaixa para olhar a hóstia e o cálice enquanto abre, eleva e junta as
suas mãos para recitar o Veni Sanctificator:
Vinde, Santificador, ó Deus Eterno e Onipotente,
E abençoai † este sacrifício,
preparado para a glória do Vosso Santo Nome.
Nesta oração, que primeiro aparece em um Missal do século oitavo ou no-
no,5 o sacerdote pede que, pela operação do Espírito Santo (o Santificador), a
hóstia e o vinho possam se tornar a Divina Vítima pelo milagre da transubs-
tanciação. Os gestos que a acompanham (levantar, juntar e abaixar as mãos e,
então, abençoar as oferendas) correspondem perfeitamente ao texto, uma vez
que simbolizam a descida do Espírito Santo.
O Veni Sanctificator não existe na Missa de Paulo VI. Ele foi removido por-
que se refere aos dons como “deste sacrifício” — linguagem ecumenicamente
inaceitável que “antecipava” a Oração Eucarística.
Pode haver uma outra razão para o seu desaparecimento. Uma teoria de
estimação dos revisores era que toda Oração Eucarística tinha de conter uma
invocação do Espírito Santo (o termo técnico é epiklesis), algo que eles inclu-
4 Service Book and Hymnal, autorizado pelas igrejas luteranas cooperando na comissão sobre
a liturgia e o hinário, edição musical (Minneapolis: Augsburg 1958), 26-7.
5 Tirot, 187.
365
Capítulo 11
íram em cada uma das novas Orações Eucarísticas. Assim, conservar o Veni
Sanctificator do novo rito de preparação também teria “antecipado” a lingua-
gem das Orações Eucarísticas.
oraÇÕES DE iNCENSaÇÃo
No rito tradicional da Missa Cantada Solene, o esplêndido e complexo
rito de incensação se segue ao Veni Sanctificator. A incensação das oblações no
Ofertório, mais tarde expandida para incluir o altar, o clero e o povo, originou-
se na França ao menos tão cedo quanto no século sétimo. O costume fran-
cês, ele mesmo possivelmente baseado na liturgia bizantina, eventualmente
chegou a ser observado em Roma.1 Os contornos da forma agora achada na
Missa Tridentina eram usados em alguns lugares já no século onze.2
A conveniência de usar o incenso na Missa deve ser autoevidente: ele eleva
a solenidade do rito, lembra-nos da purificação e da santificação, alude ao sa-
crifício do Antigo Testamento e, sobretudo, simboliza a nossa oração subindo
ao Céu, juntamente com o perfume de nossas boas obras.
1 LRC, 285.
2 Vide MRR 2:71-2.
366
A Preparação dos Dons
367
Capítulo 11
o laVaBo
Tanto na Missa Tridentina quanto na Missa Nova, o celebrante em seguida
vai para o lado do altar para uma lavação ritual de suas mãos (o Lavabo).
O costume aparece em alguns dos documentos litúrgicos mais antigos que
possuímos, embora nem sempre no mesmo ponto da Missa. Em Jerusalém,
durante o século quarto, por exemplo, o Lavabo acontecia quando se iniciava
a Missa dos Fiéis, uma prática também prescrita nas Constituições Apostólicas do
século quinto. Em Roma, a posição exata do rito na Missa não era fixada para
algum tempo; alguns documentos relatam que a cerimônia era realizada duas
vezes durante o curso da Missa, uma no começo da Missa dos Fiéis e nova-
mente depois da incensação das oferendas.5
O que o rito simboliza deve ser consideravelmente óbvio: o Lavabo signi-
fica a purificação interior e limpeza de todo homem do que quer que manche
a alma e o corpo.
O texto selecionado para acompanhar esse gesto na Missa Tridentina foi
aquele mais comumente usado pela história da Missa: o Salmo 25,6-12, cha-
mado o Lavabo. Ele se encontra no Ocidente tão cedo quanto no século onze,
368
A Preparação dos Dons
6 LRC, 289.
369
Capítulo 11
Assim, com o antigo salmo abolido, a nova cerimônia do Lavabo está agora
“mais de acordo com a linguagem da teologia moderna”, onde a iniquidade,
a danação e um verdadeiro sacerdócio sacrificante têm mais ou menos desa-
parecido.
1 LRC, 290.
2 HSM, 544.
370
A Preparação dos Dons
orai, irMÃoS
Tanto na Missa Tridentina quanto na Missa de Paulo VI, o sacerdote co-
meça a oração Orate Fratres:
Sacerdote: Orai irmãos, para que o sacrifício meu e vosso
seja aceito por Deus, o Pai Onipotente.
Povo: Que o Senhor receba o sacrifício por tuas mãos,
para o louvor e glória de Seu nome, para nosso benefício
e para o de toda Sua Santa Igreja.
O Missal Novo mudou o procedimento de recitar a oração: o sacerdote diz
toda a primeira parte da fórmula em voz alta e a congregação inteira responde.
Na Missa Tridentina, porém, o sacerdote recita somente as duas palavras em
voz alta (mas em voz submissa), termina sua parte silenciosamente e se volta
para o altar, depois disso, os ministros sagrados ou os acólitos dão a resposta,
seguida pelo Amen do sacerdote.
Neste ponto, acaso a Missa Nova devolveu ao povo alguma coisa que foi
usurpada dele há muito tempo atrás pelo clero? Aparentemente não. Jung-
mann diz que o primeiro exemplo de oração, encontrado em uma fonte do
século oitavo, mostra que ela era dirigida aos sacerdotes que ficavam em torno
do altar.3 Além disso, o sacerdote recitava-a em voz submissa — dificilmente
uma introdução para uma oração congregacional.
Os comentadores conservadores consideraram a inclusão do Orate Frates
na Missa Nova como prova de que o rito novo fielmente reflete o constante
ensinamento da Igreja sobre a Eucaristia. O Padre Guy Oury, em uma res-
posta de 1975 às críticas tradicionalistas, assinalava que a palavra “sacrifício”
na oração era uma clara evidência do caráter sacrificial da Missa Nova.4 Mas,
como o In Spiritu Humilitatis também mantido na nova Preparação dos Dons,
3 MRR 2:82.
4 La Messe de S. Pie V à Paul VI (Solesmes: 1975), 58.
371
Capítulo 11
a SECrETa
Depois do Orate Frates na Missa Tridentina, o sacerdote recita uma oração
breve, própria ao domingo ou festa, chamada a Secreta.
O termo “Secreta” a princípio parece um pouco enigmático para falantes
de inglês — o Dicionário de Webster, afinal, define “secreto” como “escon-
dido, ou agindo sem o conhecimento dos outros”. (Ora, se ela está impressa
no meu Missal latim-inglês, o que é assim tão secreto sobre ela?) Na verdade,
a oração é assim chamada porque por séculos o sacerdote a recitava em voz
baixa — secrete em latim — uma prática ainda observada quando a Missa Tri-
dentina é celebrada.
Uma descrição do século sétimo da Missa Papal fornece talvez o primeiro
registro escrito da recitação de uma oração especial nesse ponto da Missa:
quando o Papa terminava os ritos do Ofertório, um sinal era dado ao coro
372
A Preparação dos Dons
para cessar o seu canto; o Papa então dizia uma oração antes de recitar o can-
to do Prefácio.4 O documento indica que a oração era cantada em voz alta.
Mas uma outra fonte aproximadamente do mesmo período5 se refere a uma
oração como a Secreta, assim insinuando que o sacerdote podia tê-la recitado
silenciosamente.
De qualquer modo, a recitação em voz baixa da oração gradualmente pas-
sou a ser assumida como regra por todo o reino da França do século oitavo
em diante, de modo que, como uma fonte antiga diz, “ninguém senão [o sa-
cerdote] e Deus somente podem ouvi-la.”6
Uma Secreta é sempre uma parte de um conjunto de três orações, as ou-
tras duas sendo a Coleta e a Pós-Comunhão. Geralmente, uma Secreta pede a
Deus duas coisas: primeiro, que as oblações sobre o altar sejam santificadas e
consagradas, e segundo, que as graças do sacrifício sejam dadas aos homens.
Como as outras orações, o latim das Secretas combina uma beleza e balanço
incomparáveis com uma deleitosa economia de palavras.
Ocasionalmente, essas qualidades transparecem mesmo na tradução. Ob-
serve a seguinte Secreta da Festa de Pentecostes:
Santificai, nós Vos pedimos, ó Senhor, essas oblações,
e purificai os nossos corações pela luz do Espírito Santo.
Um sacerdote que disse a Missa Tridentina por um número de anos (ou
de fato um leigo atento) vai se maravilhar com os conteúdos da Secreta. As
Secretas estão intimamente conectadas com a celebração do dia, seja ela um
domingo, um dia ferial da Quaresma, uma festa comemorando um santo ou
algum outro mistério do ano litúrgico da Igreja. A nota de propiciação, como
Gihr observou, frequentemente possui um lugar proeminente nas Secretas.
Mas esse não é o único elemento presente, como pode ser visto facilmente
analisando um certo número de orações; seu conteúdo continuamente mutá-
vel manifesta a eloquência inexaurível da sabedoria celestial da Igreja.7
Se o domingo ou dia de festa é de uma classe litúrgica inferior, ou se o
4 MRR 1:72.
5 O Sacramentário Gelasiano. Thompson, 36 fixa sua data de composição entre 604 e 731,
mas afirma que ele pode de fato ter se constituído durante o reino do Papa Gelásio (492-6).
6 Vide MRR 2:90ss.
7 HSM, 450.
373
Capítulo 11
1 “Le Orazioni sulle Offerte del Proprio del Tempo nel Nuovo Messale”, EL 84(1970),
299-321.
374
A Preparação dos Dons
2 Ibid. 307.
3 Vide ibid. 304-6.
4 Cf. por exemplo, alguns textos das Orationes super Oblata com suas alegadas fontes no
Missal Antigo: M70, 164 & M723 (nosque a peccatorum nostrorum maculis emunda); M70,
189 & M908 (ut a terrenis cupiditatibus liberati, ad caelestia desideria transeamus); M70, 195
& M1044 (purget); M70, 200 & M605 (non gravemur externis).
5 “Le Orazioni sulle Offerte”, 308.
6 Ibid. 310. “Ora l’orizzonte si allarga, prendendo un respiro ecumenico ed universalistico,
così rispondente alle aspirazioni del nostro tempo.”
7 Tirot, 342.
375
Capítulo 11
1 Cf. M70, 183, 351 (Suscipe, Domine, sacrificium placationis et laudis) & M1121 (Suscipe,
Domine, sacrificium, cujus te voluisti dignanter immolatione placari).
2 Cf. M70, 291 (sacrificia… offerimus) & M1002 (sacrificia… immolamus). Cf. Também o
texto final da Oratio super oblata do Missal Novo, in Exequiis A. Extra Tempus Paschale com o ori-
ginal encontrado no Sacramentário Leonino, em Ashworth, “The Prayers for the Dead…”, 13.
3 Vide M70, 130, 131, 143, 158, 167, 168, 180, 181, 182, 183, 190, 192, 196, 197, 200, 203,
204, 212, 214, 216, 219, 220, 221, 235, 237, 241, 246, 287, 291, 295, 296, 304, 307, 308, 341,
351, 355, 357, 360, 366, 367, 370, 372, 380,
4 Vide Eucharistiae Participationem, §14, DOL 1988.
376
A Preparação dos Dons
rESUMo
• No rito novo, a nomenclatura para a segunda parte da Missa, a Missa
dos Fiéis, foi mudada para “Liturgia Eucarística”, um novo termo in-
ventado, muito provavelmente, por razões ecumênicas.
• Existem três elementos comuns a todos os Ritos do Ofertório: o sa-
crifício é preparado, o sacrifício é dirigido a um determinado fim e se
começa a oferta do sacrifício.
• O Rito do Ofertório da Missa Tridentina e outros ritos relacionados
no Ocidente contém linguagem sacrificial (e.g. Vítima) que antecipa a
consagração real dos elementos.
• As orações e ações cerimoniais do rito do Ofertório tradicional se rela-
cionam a um duplo objeto: (1) retirar o pão e o vinho do uso comum.
(2) Oferecer a Divina Vítima à Divina Majestade, como se a consa-
gração dos elementos sacrificiais tivesse acontecido na expectativa dos
efeitos que vão derivar do oferecimento da Divina Vítima.
• Lutero e outros protestantes explicitamente repudiaram o rito do Ofer-
tório católico por conta de sua linguagem antecipatória e, na formula-
ção de suas cerimônias de comunhão, substituíram-no por uma simples
direção para que se prepare o pão e o vinho.
• A Missa Nova substituiu o Rito do Ofertório por uma Preparação dos
Dons. Seus criadores defenderam essa substituição mentindo sobre a
natureza do rito (uma cerimônia leiga) e repetindo a objeção da “ante-
cipação” de Lutero. No entanto, o verdadeiro motivo era eliminar um
rito que “ameaçava o diálogo ecumênico”.
• Embora Pio XII mencionasse a procissão leiga do Ofertório na Me-
diator Dei, ele devotou os seguintes cinco parágrafos condenando um
377
Capítulo 11
378
A Preparação dos Dons
379
Capítulo 11
380
CaPÍTUlo 12
a oraÇÃo EUCarÍSTiCa:
“EMPoBrECiMENTo DEPlorÁVEl”
U
m dos menores aborrecimentos das reformas litúrgicas pós-
Vaticano II foi a mudança na terminologia e rotulação de qua-
se tudo. Não era mais apenas o Introito, o Gloria, o Aleluia ou
o Credo; tinha que ser o Canto de Entrada, o Hino dos Anjos,
a Aclamação ao Evangelho e a Profissão de Fé. Um antigo termo não iria
ficar quando se pudesse arranjar um novo, de preferência com várias sílabas e
idealmente o mais didático possível.
Até mesmo as pessoas cuja conexão com a liturgia na prática era remota
precisavam ser renomeadas: eu já não era apenas um organista — era um
ministro da música. Um homem que mostrasse às pessoas o assento não era
apenas o arrumador — ele era o ministro da acolhida ou da saudação.
No entanto, às vezes a mudança na nomenclatura refletia uma verdadeira
mudança na coisa em si. Esse foi o caso do rito do Ofertório, como vimos no
último capítulo. O rito antigo e a função que ele tinha (preparar o sacrifício,
dirigí-lo a um determinado fim, começar o oferecimento do sacrifício) se foi e
alguma coisa nova o substituiu, de modo que o antigo rótulo já não era apro-
priado. O “Ofertório” tinha dado lugar à “Preparação dos Dons”.
Assim também, o assunto deste capítulo, a Oração Eucarística, que substi-
tuiu o que era antigamente chamado o Cânon.
Todas as liturgias históricas do Oriente e do Ocidente, de uma maneira ou
de outra, inserem as palavras de Consagração no contexto de uma oração mais
longa. Essas liturgias utilizaram uma variedade de nomes para essa oração:
Anáphora, Eucharistia, Oração de Oferenda, Oração Eucarística, etc. Na Missa
do Rito Romano, o texto usado para designar essa oração era Canon Actionis
ou simplesmente o Cânon.
“Cânon” é a palavra grega para norma ou regra. Ela também tem notas de
“medida fixa” ou “critério”, e seu uso não está limitado ao contexto litúrgico.
O Cânon da Escritura, por exemplo, é a lista fixa ou normativa que a Igreja
381
Capítulo 12
o PrEfÁCio
Depois da Oração sobre os Dons (chamada a Secreta no rito tradicional), o
sacerdote canta ou recita um breve diálogo introdutório (O Senhor esteja con-
vosco, etc.) e prossegue com o Prefácio. Um Prefácio — a raiz da palavra de-
riva ou da noção de um “discurso antes de alguma coisa” ou de Praefari (cantar
em voz alta)3 — é uma oração de ação de graças que varia de acordo com a
festa ou o tempo litúrgico. Ele contém três elementos: (1) homenagem a Deus
1 De Sacrosancto Missae Sacrificio, II. 12, Opera Omnia (Prado: Aldina 1843), 8:73. Grifo meu.
2 Vide LRC, 305.
3 LRC, 296.
382
A Oração Eucarística
Pai. (2) Enumeração das razões para dar graças.4 (3) Invocação dos Anjos.5
Nos séculos primitivos da Igreja, havia uma tendência de fornecer um Pre-
fácio próprio para cada formulário da Missa. O antigo Sacramentário Ge-
lasiano, por exemplo, continha 54 Prefácios. A grande parte dos Prefácios
pertencia às festas dos mártires, mas outras festas e necessidades particulares
estavam incluídas também. Às vezes as coisas eram um tanto específicas: entre
os 267 Prefácios do Sacramentário Leonino, encontramos um que é um ata-
que longo e violento aos monges.6
Por volta do século onze, o número de Prefácios nos livros romanos foi
reduzido a dez. Isso continuou sendo a norma até o século doze, quando os
Prefácios de São José, dos Mortos, de Cristo Rei e do Sagrado Coração foram
acrescentados. Certos países e lugares (aliquibus locis) tinham o privilégio de usar
um número adicional de Prefácios.7
Teria sido possível argumentar em prol de introduzir alguns dos últimos no
uso geral para toda a Igreja. Todavia, porém, os criadores da Missa Nova não
se contiveram e vieram com mais uma série estonteante de opções: a edição de
1970 do Missal contém 81 Prefácios. E mais três foram acrescentados em 1975.
A Instrução Geral não estabelece quaisquer regras firmes sobre qual Pre-
fácio deve ser usado e quando.8 Aqui, assim como no caso de tantas outras
opções na Missa Nova, o texto escolhido é determinado unicamente pelo que
o sacerdote em cena vê como “pastoralmente efetivo”.9
Em sua Constituição Apostólica que promulga o novo Missal, Paulo VI
disse que grande número de Prefácios são “tirados da antiga tradição da Igreja
Romana ou recentemente compostos.”10 Este é o costumeiro apelo à antigui-
dade e novamente, assim como no caso das novas orações e do lecionário
revisado, descobrimos que isso é antiguidade com uma distorção moderna.
Em sua obra de 600 páginas que documenta as fontes para os novos Pre-
383
Capítulo 12
o SANCTUS
Tanto na Missa Tridentina quanto na Missa de Paulo VI, as últimas pala-
vras do Prefácio levam diretamente ao Sanctus:
Santo, Santo, Santo, o Senhor Deus Sabaoth.
Os Céus e a Terra estão cheios da Vossa glória.
Hosana nas alturas.
Bendito o que vem em nome do Senhor.
Hosana nas alturas.
O texto, baseado em Isaías 6,3, era usado na Igreja Oriental ao menos des-
de o terceiro quarto do século quarto. Os padres latinos do mesmo período,
que comentaram sobre a passagem de Isaías, não fizeram referência ao seu
uso litúrgico.3
Os liturgistas parecem divididos sobre exatamente quando o Sanctus foi
1 Anthony Ward SM & Cuthbert Johnson OSB, “The Sources of the Roman Missal (1975)
II: Prefaces”, Notitiae 252-4 (1987), 423, Grifo meu.
2 Antoine Dumas OSB, “Les Préfaces du Nouveau Missel”, EL 85 (1971), 19. Similarmen-
te, Braga, “Il Nuovo Messale Romano”, 271.
3 Cabié, 95.
384
A Oração Eucarística
385
Capítulo 12
386
A Oração Eucarística
8 Hugh Ross Wiliamson, The Great Prayer (New York: Macmilan 1956).
9 Jerome Gassner OSB, The Canon of the Mass: Its History, Theology and Art (London: Herder
1950).
10 Vide Wagner, “Zur Reform”,LO, 266.
11 Emminghaus, 180-1.
387
Capítulo 12
1 Reed, 339.
2 Reed, 340.
388
A Oração Eucarística
Assim também, uma outra frase aplicada aos Santos que contradizia o en-
sinamento protestante de que a natureza humana é tão corrupta que ela não
pode merecer nada, a saber: “por cujos méritos e orações”. E, sem dúvida,
todo o Memento pelos Mortos cairia em condenação, uma vez que os protes-
tantes negam a existência do Purgatório.
À parte das frases específicas, existem outros elementos do Cânon que os
protestantes considerariam questionáveis.
O texto incorpora várias alusões ao sacerdócio e as reforça requerendo
que o sacerdote realize gestos rituais em muitos pontos durante a recitação do
texto. Além disso, no sistema teológico protestante, toda a oração seria consi-
derada uma “obra”, cuja realização é inútil para o homem justificado somente
pela fé. E, para terminar, o Cânon é tão romano quanto um texto pode ser e,
portanto, ele é o produto da Grande Prostituta da Babilônia.
Eliminar as características ecumenicamente questionáveis do Cânon Ro-
mano ou, na falta disso, ao menos neutralizá-las, seria o objetivo maior dos
revisores. Se a acomodação aos hereges era um motivo para espoliar o Ofer-
tório Romano, a fortiori o seria para atacar o Cânon Romano.
389
Capítulo 12
1 Carlo Braga CM, “De Novibus Precibus Eucharisticis Liturgiae Latinae”, EL 82 (1968),
216.
390
A Oração Eucarística
tendem esta palavra) e não-didático (não tanto quanto uma aula de religião). Ele
é místico, recitado em um silêncio sobrenatural, preenchido de complexos ges-
tos rituais e totalmente indiferente à presença da assembleia viva, que no sistema
modernista espera-se que seja a mais fundamental presença “real” de Cristo.
A atitude dos modernistas é melhor resumida por um comentário de Bugni-
ni: o uso do Cânon Romano somente, disse ele, era “um empobrecimento de-
plorável que tinha sido um resultado típico de séculos de decadência litúrgica.”2
391
Capítulo 12
Padres da Igreja.
Esses amplos princípios gerais poderiam e seriam utilizados para justificar
quase toda mudança litúrgica imaginável. Nesse ponto, um comentário feito
em 1963 por Monsenhor Henri Jenny, Arcebispo de Cambrai, que tinha servi-
do tanto nas comissões que ajudaram a redigir a Constituição quanto a própria
Consilium, foi particularmente profético:
Ninguém jamais saberá a quantidade de palavras trocadas e o volume de pá-
ginas escritas sobre um parágrafo pequeno e simples. Mas as consequências
serão consideráveis para certos princípios adotados: esta manhã falei a meu
vizinho que tive a impressão de que, sobre as expressões aparentemente ino-
fensivas de um parágrafo, nós poderíamos estar depositando bombas-relógio.1
4. A Crítica de Vagaggini. Esperando nas alas para armar os relógios,
estava o Padre Cipriano Vagaggini OSB, um dos periti (peritos) do Vaticano
II que, em 1966, publicou Il Canone della Messa e la Riforma Liturgica (O Cânon
da Missa e a Reforma Litúrgica), uma obra altamente influente que afundaria o
Cânon Romano.
Nesse livro, Vagaggini examinou e analisou oito anáforas mais antigas
(cânones), assim como “correções” ao Cânon Romano propostas por Hans
Küng e Karl Amon. Ele também listou o que definia méritos e defeitos do
Cânon Romano. Com respeito aos últimos:
O presente Cânon Romano peca em diversos modos contra esses requeri-
mentos de boa composição litúrgica e de sadio senso litúrgico que foram
enfatizados pelo Concílio Vaticano II.2
Tais requerimentos, com certeza, tinham sido inventados muito antes por
outros críticos modernistas, e então escritos na própria Constituição sobre a
Sagrada Liturgia por Bugnini.
Vagaggini devota 14 páginas aos pecados do Cânon Romano, eis sua lista:
(1) A impressão que ele dá de constituir uma aglomeração de qualidades com
nenhuma unidade aparente… (2) a falta de uma conexão lógica de ideias... (3)
o modo insatisfatório em que as várias orações de intercessão são reunidas
392
A Oração Eucarística
393
Capítulo 12
que, se um Cânon variável já tivesse existido em Roma, dele não se teria dei-
xado nenhum traço.1
Seja como for, os duendes da oficina de Bugnini ficaram ocupados pre-
parando um outro daqueles típicos retornos à antiguidade cristã. Durante o
verão de 1966, Vagaggini gastou três meses em uma biblioteca de mosteiro
estudando o Cânon Romano e compondo o que se tornaria as Orações Euca-
rísticas 3 e 4.2 Mas em 1967, duas mudanças significativas foram introduzidas
no Cânon Romano que seriam incorporadas nas novas Orações Eucarísticas
quando estas finalmente aparecessem: a recitação dos textos em voz alta no
vernáculo e a má tradução do pro multis como “por todos” na forma de Con-
sagração do Cálice.
394
A Oração Eucarística
5 MRR 2:138-9.
6 Charles A. Lewis SDV, The Silent Recitation of the Canon of the Mass (Bay Saint Louis MO:
Gregorian University 1962).
7 Vide Lewis, 11-33. (1) O diálogo invitatório e o Amém do povo mencionado em várias
fontes patrísticas. (2) Outro testemunho de apenas três fontes (um bispo do norte da Itália,
Santa Melânia e uma passagem de Santo Agostinho), que ele concede ser implícita ou indireta.
(3) Duas provas, que ele mesmo caracteriza como “incertas”.
8 Lewis 33-4.
9 Vide Lewis, 34. Ele repete os mitos costumeiros sobre “nenhuma mesa de comunhão”,
o significado de circunstantes, liturgia em vernáculo, etc. Uma grande quantidade deles, uma
cortesia (naturalmente) de Jungmann, alojados nas conclusões de Lewis, 87-8.
395
Capítulo 12
1 Lewis, 34n.
2 Anônimo, Quotiens contra se, (ca. 800), PL 96: 1595-6, citado em Lewis, 35.
3 Eclogae de Ordine Romano 24, Hanssens, Alarii Episcopi Opera Omnia Liturgica, 3:255-6,
citado em Lewis, 36.
396
A Oração Eucarística
4 Lewis, 86. A primeira explicação é afirmada em favor da suposição de que o Cânon era,
previsivelmente, cantado em voz alta durante os séculos primitivos.
5 Um mosteiro onde eu passei algum tempo usava o Novus Ordo em latim, nas maiores
festas, a Oração Eucarística 1, que contém a maior parte do antigo Cânon Romano, era fre-
quentemente cantada. Era de fato algo bem longo, e apesar das boas vozes dos sacerdotes
envolvidos, o resultado não era particularmente agradável, quer de um ponto de vista devo-
cional ou musical.
397
Capítulo 12
E uma vez que a natureza dos homens é tal que eles não podem ser facilmente
elevados à meditação das coisas divinas sem auxílios externos, por essa razão
tem a Santa Madre Igreja instituído certos ritos, nomeadamente, que algumas
coisas na Missa sejam pronunciadas em voz baixa [submissa voce], e outras
em uma voz mais alta [elatiore]...1
No fim de sua exposição, o Concílio, exercendo sua autoridade infalível,
então pronunciou um anátema contra aqueles que condenavam a recitação
silenciosa do Cânon:
Se alguém disser que o rito da Igreja Romana, onde parte do Cânon e das
Palavras da Consagração são ditos em voz baixa [submissa voce], deva ser
condenado… seja anátema.2
3. A Oração Eucarística em Voz Alta. Esse pronunciamento do Con-
cílio de Trento fez os modernistas do século XX do Movimento Litúrgico
estrebucharem-se. Nada poderia ir mais contra as suas teorias sobre o “culto
coletivo” do que um Cânon silencioso — e sem dúvida eles teriam meramente
condenado “o rito da Igreja Romana, onde parte do Cânon e das Palavras da
Consagração são ditos em voz baixa”.
Mas o peso de um anátema ficava em seu caminho — até o Vaticano II.
As mesmas passagens bombas-relógio na Constituição do Vaticano II so-
bre a Sagrada Liturgia que foram empregadas contra a conservação do texto
do Cânon Romano poderiam ser usadas a fortiori contra a rubrica de recitar o
Cânon silenciosamente. Como poderia uma oração possivelmente transmitir
aos fiéis uma “instrução rica” (SC 33) ou tornar-lhes “conscientes do que eles
estão fazendo” (SC 48), se eles não podem ouví-la?
Assim, a abolição do Cânon silencioso, uma tradição do Rito Romano tão
antiga e venerável que ninguém pode realmente dizer ao certo quando, onde
ou como ela começou, caiu vítima da noção modernista do culto-como-sala-
de-aula e do “primado da assembleia viva” em maio de 1967, quando foi dada
aos sacerdotes permissão para dizer o Cânon em voz alta nas Missas com uma
congregação.3
A sagrada quietude não reina mais…
1 DZ 943.
2 DZ 953.
3 Sagrada Congregação dos Ritos (Consilium), Tres Abhinc Annos, §10, DOL 456.
398
A Oração Eucarística
4 Este foi o caso das traduções oficiais em inglês, alemão, italiano, português e espanhol.
A tradução francesa verteu-o como “a multidão”.
5 3.ª Impressão, ampliada (Reno NV: Athanasius 1969). Também reimpresso em Patrick
Henry Omlor, The Robber Church (Stouffville, Ont.: Silvio Mattacchione 1998), 16-81.
399
Capítulo 12
não acontecia.
Juntamente com isso, Omlor assinalava que a mudança contradiz tanto o
Catecismo Romano como São Tomás, e que ela estava conectada, além disso,
a erros modernos sobre o ecumenismo e sobre a natureza da Igreja. Final-
mente, na melhor forma escolástica, Omlor apresentava e então respondia a
várias objeções.
Pe. Lawrence S. Brey, um sacerdote da diocese de Milwaukee, que foi per-
seguido por sua resistência às primeiras mudanças litúrgicas pós-Vaticano II,
escreveu o Prólogo da obra de Omlor. Ele também escreveu um apêndice a
ela, no qual fazia um convincente argumento, baseado nos ensinamento dos
teólogos Noldin, Tanquerey e de la Taille, de que a consagração inválida do
vinho resultante da forma defectiva em vernáculo, igualmente invalidava ou ao
menos lançava dúvidas sobre a consagração do pão.1
Questionando a Validade passou por várias reimpressões e se tornou um clás-
sico tradicionalista. Omlor assim se tornou um pioneiro do movimento tra-
dicionalista nos Estados Unidos, muito antes que qualquer um tivesse ouvido
falar sobre Arcebispo Lefebvre ou a Intervenção Ottaviani.
Muitos católicos que estavam céticos sobre as mudanças do Vaticano II
passaram a rejeitá-las inteiramente, uma vez que eles leram Omlor e se tor-
naram convencidos de que, graças a essa tradução fraudulenta, até mesmo o
Santíssimo Sacramento tinha sido tirado deles.
400
A Oração Eucarística
2 De Defectibus in Celebratione Missae Occurrentibus V. “Si quis autem aliquid diminueret, vel
immutaret de forma consecrationis Corporis et Sanguinis, et in ipsa verborum immutatione
verba idem non significarent, non conficeret Sacramentum.”
3 Vide seu The Eucharistic Words of Jesus (Philadelphia: Fortress 1977), 178-82, 225-31.
401
Capítulo 12
contexto teológico.1
Quanto à objeção (aquela de Omlor e outros tradicionalistas) de que a frase
por todos sugeria que “todos seriam salvos”, bem, disse Zerwick, “o perigo de
um tal entendimento errôneo surgindo entre católicos dificilmente poderia
parecer real.”2
Mas, sem dúvida, era precisamente a ideia anterior que as traduções deseja-
vam transmitir, e é de fato todo o ponto do ecumenismo e da nova teologia
do Vaticano II − que todos, e não apenas muitos, vão se salvar. “Por muitos”
é necessariamente exclusivo. Assim, o texto do Cânon Romano (e de fato as
próprias palavras de Nosso Senhor) precisavam ser falsificadas nas traduções
em vernáculo por causa do ecumenismo e do tão desejado universalismo.
Além disso, existem ainda outros problemas com argumentos como o de
Zerwick:
1. Não é tarefa do tradutor “corrigir” o original. Quando São Jerônimo
pedia desculpas por infortúnios linguísticos na sua tradução do Antigo
Testamento, ele disse que as pessoas deveriam escutar a Escritura e não
a Jerônimo. Ainda menos na Consagração da Missa deveriam eles ouvir
a Max Zerwick fazendo eco a Joachim Jeremias.
2. Substituir muitos por todos em outras passagens do Evangelho resulta
em manifesta absurdidade. Isso também produz um resultado diver-
tido, mas não pretendido: versículos mais “negativos”, que Bugnini e
companhia teriam então se sentido no dever de cortar ou tornar opcio-
nais no novo Lecionário.3
3. É sacrilégio mudar as palavras de Cristo − sobretudo no caso de um
dos dois sacramentos para os quais ele mesmo especialmente assinalou
a fórmula.
1 Max Zerwick SJ, “Pro Vobis et pro Multis Effundetur”, Notitiae 6 (1970), 140. “Phrasis…
menti nostrae (non praemonitae) excludit illam universalitatem operis redemptivi quae pro
mente semitica in illa phrasi connotari potuit et prepter contextum theologicum certe con-
notabatur…”
2 “Pro Vobis…,”140. “Qui scl. Alicui suggerere possit omnes actu salvatum iri, periculum
talis erroneae intelligentiae apud cacholicos vix existere censendum videtur.”
3 E.g., “largo é o caminho que conduz à destruição, e todos a que ali são lançados.” (Mt
7,13) “todos me dirão naquele dia Senhor, Senhor… e Eu direi: Eu nunca vos conheci.” (Mt
7:22). “Pois todos virão em meu nome… e enganarão a todos.” (Mt 24,5). “A caridade de todos
esfriará” (Mt 24,12).
402
A Oração Eucarística
403
Capítulo 12
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A Oração Eucarística
405
Capítulo 12
Idealmente (embora esse não fosse o caso com muitos padres antes do
Vaticano II), esperava-se que os gestos fossem realizados sem pressa, sem
afetação, levemente e com atenção.1 Se eles são executados desse modo, as
ações manuais do sacerdote vividamente reforçam o que o texto exprime no
momento em que cada gesto é feito; eles são, além disso, um apoio para a
atenção pessoal e devoção do sacerdote durante a parte mais solene da Missa.
Eis aqui os gestos do sacerdote, achados no Cânon Romano, juntamente
com uma indicação de como ele se passa nas novas Orações Eucarísticas.
1. Estende as mãos sobre as oblações. Mantido. Na OE1, movido para Quam
oblationem. Nas outras OEs, ele ocorre nas recém-criadas orações de epicle-
sis, invocando o Espírito Santo.
2. Pequena elevação antes do Pater Noster. Mantido.
3. Sinais da cruz sobre as oblações. Reduzidos de 26 vezes no Cânon Romano
para uma só vez em todas as OEs.
4. Genuflexões. Reduzidas de cinco para duas. O sacerdote agora se ajoelha
depois de mostrar a Hóstia ao povo, não antes e depois.
5. Bater no peito. Mantido na OE1. Abolido nas outras OEs.
6. Elevar os olhos à cruz. Reduzido de duas vezes para uma vez na OE1.
Abolido nas outras OEs.
7. Elevar e juntar as mãos. Três vezes no Cânon Romano. Abolidos em todas
as OEs.
8. Beijar o Altar. Duas vezes no Cânon Romano. Abolido em todas as OEs.
9. Inclinação Profunda. Quatro vezes no Cânon Romano. Abolida. Substi-
tuída por duas inclinações “leves” para a recitação do Verba Domini. E uma
inclinação leve adicional na OE1.
10. Grande Elevação das Sagradas Espécies. Abolida. A antiga rubrica dirigia
o sacerdote a “erguer para o alto” a Hóstia e o Cálice. A nova rubrica diz em
vez que o sacerdote “mostre ao povo” a Hóstia e o Cálice.2
11. Polegar e indicador juntos até as abluções. Abolido.
Como pode ser visto acima, o número de gestos nas Orações Eucarísticas
foi reduzido ao mínimo funcional. Por quê?
Tomadas em conjunto, as ações rituais múltiplas no rito tradicional trans-
mitiam de um modo ou de outro as ideias que o novo rito foi desenhado para
diminuir ou suprimir inteiramente − o papel único do sacerdote na oferta do
406
A Oração Eucarística
oS NoVoS TEXToS
Não é possível em uma obra deste escopo analisar em detalhe o texto de
cada nova Oração Eucarística. No entanto, alguns poucos comentários sobre
cada um deles demonstrarão que as mesmas bestas que nós encontramos pre-
viamente − ecumenismo, modernismo e falsas “restaurações” − enfiam suas
cabeças aqui, assim como fazem em todo o Novus Ordo Missae.
3 Sagrada Congregação dos Ritos (Consilium), “Normas sobre o Uso das Orações Euca-
rísticas I-IV”,DOL 1931.
407
Capítulo 12
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A Oração Eucarística
5 “[Esta é] uma descrição cristológica de origem judaico-cristã que hoje nada nos diz mesmo
quando traduzida como ‘mensageiro da vossa vontade’. A frase exprimia a ideia do revelador
que, depois de ter sido abusada no passado, é hoje mal entendida como se eximisse o cristão do
trabalho humano de estudar e pesquisar. Ainda esse tipo de busca esforçada é considerado hoje
como sinal de nossa humanidade autêntica e um critério metodológico de verdadeiro progresso.
De acordo com o espírito de nosso dia, aquilo que não se conquista pela pesquisa laboriosa não
é digno de consideração. Alguma coisa que não é assim obtida, mas é o resultado de revelação é
visto como pertencente ao “mundo peculiar do misticismo”, no qual a revelação é confundida
com sonhos, a iluminação com fantasias sobre realidades inautênticas.” Mazza, 92-3.
6 Sagrada Congregação dos Ritos, “Normas… OE’s”,DOL 1936.
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Capítulo 12
1 TNM, 201.
2 Mazza, 125.
3 Cf. Vagaggini, 124ss..
4 OI, 46. Grifo do autor.
5 LP, 160. “Aqui está o significado mais profundo da palavra ‘sacrifício’: sacrum facere, tornar
sagrado. Que coisa sagrada é produzida…? Podemos dizer que é o povo, pois ele se faz povo
ao se tornar o povo de Deus.” Grifo do autor. Vide acima Capítulo 2.
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A Oração Eucarística
6 Vide DZ 21ss.
7 Sagrada Congregação dos Ritos, “Normas… EPs”,DOL 1939.
8 TNM, 200. LRL, 169.
9 Emminghaus, 187.
10 Emminghaus, 187-8.
11 Vide Vagaggini, 129ss.
411
Capítulo 12
dadeiro,”1 ela foi apelidada de “o Cânon Ariano”. E já que você fez os nesto-
rianos felizes na OE3, por que não alegrar os arianos na OE4?
5. OE pela Reconciliação 1. Essa pode ser usada para as Missas que pro-
movem a concórdia, reconciliação, perseverança da paz e justiça, em tempo
da guerra ou distúrbios públicos, para a remissão dos pecados, para obtenção
da caridade; Missas Votivas da Santa Cruz, da Eucaristia, do Preciosíssimo
Sangue; e na Quaresma. Ela tem um Prefácio especial, mas também pode ser
usada com outro Prefácio que se refira à penitência e conversão (e.g., Prefá-
cios Quaresmais).
Alguns excertos vão fornecer a ideia geral desta Oração Eucarística:
[Vós] não cessais de nos chamar para uma vida mais abundante.
Unida a família humana a Vós por um laço tão forte…
Concedei-lhes… o poder de servir a todos os seres humanos, entregando-se
mais plenamente à ação do Espírito Santo.
Mantenha-nos sempre unidos em comunhão de espírito e coração
Aqui nós vemos qualquer pretensão de adesão à tradição litúrgica, oriental
ou ocidental, em linguagem ou estilo, lançada pelos ares. A linguagem-padrão
de pensamento é aquela da “espiritualidade” do grupo de encontro modernis-
ta do final do século XX, tornando-a (assim como as 5 OEs que se seguem)
uma favorita de sacerdotes como o Padre Chuck.
1 “Quia solus es Deus vivus et verus”. Barba, 597. O erro apareceu em sua versão original
da OE4, que Paulo VI promulgou em maio de 1968, quando as novas OEs foram publicadas
pela primeira vez. A versão latina parece ter sido corrigida na primeira edição do Novo Ordo
Missae do ano seguinte. Todavia, o erro não foi corrigido na tradução oficial inglesa por
muitos anos.
412
A Oração Eucarística
amizade por aqueles que partiram] para o banquete de uma unidade duradoura
no [novo céu e] novo mundo, onde a paz em sua plenitude brilhará radiante.2
Isso é a linguagem do internacionalismo global da Irmandade-do-Homem
-Paternidade-de-Deus de Paulo VI, que o Abbé Georges de Nantes chamava
a MASDU - Movimento pela Animação Espiritual da Democracia Universal.3
Perfeita para o uso na sala de meditação das Nações Unidas.
2 As frases entre colchetes aparecem no texto latino de 2002, mas não em Mazza, 207.
Aparentemente o texto original omitiu as interseções pelos mortos.
3 “Mouvement pour l’Animation Spirituelle de la Démocratie Universelle.”
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Capítulo 12
11. OE para as Crianças 1-3. Elas têm o objetivo de ser usadas em Missas
celebradas com pré-adolescentes e crianças, e são governadas pelo Diretório
das Crianças.1
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A Oração Eucarística
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Capítulo 12
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A Oração Eucarística
3 Mazza, 148.
4 Aqui eu deveria acrescentar que esse incidente e aquele que eu recontei sobre o Padre
Chuck no começo do capítulo 8 de fato ocorreram − representando aquilo que os biblistas
modernistas do novo Testamento poderiam chamar “Padre Chuck da história” como distinto
de um “Padre Chuck da Fé”,o qual a contínua reflexão teológica desse livro tem desenvolvido
a partir do cerne de suas poucas ipissima verba (“bom dia”).
417
Capítulo 12
MUDaNÇaS Na CoNSagraÇÃo
Tendo trilhado o nosso caminho pelas muito diversas facetas da demolição
sistemática dos revisores do Cânon Romano, voltemos nossa atenção novamen-
te para a parte mais importante e sagrada do Cânon, a própria Consagração.
Na Missa Tridentina, o termo Consagração se aplica àquela parte do Cânon
Romano que contém as palavras ditas por Nosso Senhor na Última Ceia, que
transforma pão e vinho em Seu Corpo e Sangue. As rubricas para a Missa
Tridentina chamam essas palavras de as Palavras da Consagração.1
As rubricas do Missal tridentino também especificam que essas palavras
são a forma do sacramento2 − Isto é, a breve fórmula essencial em cada rito
sacramental que realmente produz o efeito do sacramento.
Assim como os gestos sacerdotais do Cânon, esses detalhes, quando to-
mados em conjunto, apontam para todo o edifício magnificente da doutrina
católica sobre o Santíssimo Sacramento, o sacerdócio e o Santo Sacrifício da
Missa. O sacerdote, agindo na pessoa do próprio Cristo, pronuncia as palavras
do próprio Cristo e transforma − consagra − o pão e o vinho no Corpo, San-
gue, Alma e Divindade de Cristo, cuja transformação é efetuada objetivamen-
te uma vez que o sacerdote recitou a forma do sacramento − aquelas palavras
que realmente produzem o efeito.
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A Oração Eucarística
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Capítulo 12
como sendo “palavras mágicas” − em vez disso, “toda Oração Eucarística faz
Jesus presente.”1 Assim, Boyeur farejou, “reduzir essa ação a poucas palavras
de Deus em Cristo… é simplesmente uma tendência para desintegrar a Eu-
caristia Cristã.”2
Em conformidade a isso, na Instrução Geral de 1969, que delineava os
princípios teológicos por trás da Missa Nova, e nos documentos promulgando
e explicando as novas Orações Eucarísticas mesmas, qualquer referência dire-
ta à Consagração (a sessão do Cânon contendo as fórmulas de consagração) e
Palavras de Consagração (as próprias fórmulas) desapareceram.3 Em seu lugar
estão os termos protestantes, Narrativa da Instituição4 e Palavras do Senhor.5
Luther Reed, para não mencionar o seu homônimo, teria se deleitado
achando que a Igreja Romana havia finalmente visto a luz.
No tocante à expressão teológica tradicional “forma do Sacramento”, ela
desapareceu completamente da legislação que governa as Orações Eucarísti-
cas e dos comentários oficiais desde então. As diretrizes catequéticas da Con-
silium publicadas para explicar as novas OEs falam, em vez disso, de uma
“narrativa-reatualização”6 − um neologismo que soa como se estivesse rela-
cionado a religar uma bateria de carro.
E, de fato, na Constituição Apostólica promulgando o novo Missal, o pró-
1 Esses erros foram promovidos aparentemente em toda parte pelos modernistas depois
do Vaticano II.
2 LP, 138.
3 Contudo, assim como o termo “Ofertório”, depois de ser substituído por “Preparação
dos Dons”, uns poucos usos indiretos do termo “Consagração” podem, apesar disso, ser
encontrados em algumas legislaçãos de 1968: em um documento que dava as rubricas para a
concelebração: “aclamação memorial depois da consagração”, DOL, 1934, 1937, 1939; em
normas para explicar as novas OEs: “Epiclesis consecratória”, DOL 1956; em uma declara-
ção que faz as “palavras do Senhor” se conformarem àquelas das novas OEs: “formulários
de consagração… na consagração do pão… na consagração do vinho”; nas rubricas das OEs,
depois que as palavras do Senhor são recitadas: “para mostrar a hóstia consagrada ao povo”.
4 Consilium, Linhas-guias Au Cours Des Derniers Mois, para assistir a catequese sobre as
Anáforas da Missa, 2 de junho de 1968, DOL 1947, 1950, 1955-7. GI 69 §55.d. “Narratio
institutionis.”
5 Sagrada Congregação dos Ritos (Consilium), Normas sobre o uso das Orações Eucarís-
ticas I-IV, 23 de maio de 1968, DOL 1934, 1937, 1969 Ordo Missae, antes da “Instituição da
Narrativa” em cada OE: “verba Domini.”
6 Diretivas Au Course, DOL 1946-7.
420
A Oração Eucarística
421
Capítulo 12
…e deu aos seus discípulos, dizendo: …e deu aos seus discípulos, dizendo:
Tomai e comei todos disto,
TOMAI E COMEI TODOS DISTO,
POIS ISTO É O MEU CORPO POIS ISTO É O MEU CORPO,
− QUE SERÁ ENTREGUE POR VÓS
… …
E deu aos seus discípulos, dizendo: E deu aos seus discípulos dizendo:
Tomai e bebei todos disto:
TOMAI E BEBEI TODOS DISTO:
POIS ESTE É O CÁLICE DO MEU POIS ESTE É O CÁLICE DO MEU
SANGUE SANGUE
DO NOVO E ETERNO TESTAMEN- DO NOVO E ETERNO
TO: TESTAMENTO:
O MISTÉRIO DA FÉ: −
QUE SERÁ DERRAMADO QUE SERÁ DERRAMADO
POR VÓS E POR MUITOS POR VÓS E POR MUITOS [TODOS]
PARA A REMISSÃO DOS PECADOS PARA A REMISSÃO DOS PECADOS.
− FAZEI ISTO EM MEMÓRIA DE
MIM.
422
A Oração Eucarística
de “muitos bispos e sacerdotes, além dos peritos nas ciências litúrgicas” − i.e.,
a claque modernista do Movimento Litúrgico − que lhes tinha proposto pela
causa de tornar as palavras “mais claras”. As fórmulas iriam assim “responder
às verdadeiras necessidades dos nossos tempos, especialmente em relação à
catequese e ao trabalho pastoral.” Essa proposta, por sua vez, foi secundada
pelos padres do Sínodo de 1967.1
Isso era mais conversa fiada modernista. O verdadeiro problema com as
palavras era que elas eram demasiadamente claras para os protestantes e mo-
dernistas.
De qualquer forma, da comparação dos textos acima, pode ser visto pronta-
mente que nas novas Orações Eucarísticas, a mudança de “Consagração” para
“Narrativa da Instituição” não era só uma questão de renomear a seção. Os
revisores alteraram o texto do próprio rito de modo a transformar as passagens
em narrativas. A antiga fórmula sacramental foi envolvida nas ordens de Nosso
Senhor relatadas na Escritura (tomai e comei/bebei, fazei isto…) e uma frase
adicional também foi dita por Nosso Senhor (que será entregue por vós).
O produto final é uma narrativa histórica que inclui uma citação.
423
Capítulo 12
vras: “Este é o mistério do Novo Testamento: tomai e comei dele: este é o meu
corpo que é partido por muitos para a remissão dos pecados.”1 Fortescue diz
que a evidência textual para o uso desta frase já aparece nos Sacramentários
(Missais) dos séculos sexto e sétimo e que talvez elas estivessem conectadas
com o papel do diácono de tomar conta do cálice.2
Gassner fornece uma longa e interessante discussão sobre esse assunto
em seu livro sobre o Cânon Romano.3 Como é usual, seus comentários são
livres do tom arrogante e desrespeitoso que se pode encontrar nos trabalhos
de tantos escritores modernistas. Em sua pesquisa das várias teorias, Gassner
nota que a frase é atribuída à própria tradição apostólica:
Muitos teólogos mantém que as palavras “mysterium fidei” dentro da forma
de Consagração são uma matéria de divina tradição apostólica. O Papa Leão
IX declara que essas palavras são “uma tradição transmitida por São Pedro,
autor da liturgia romana”. O Papa Inocêncio III diz que essas palavras foram
acrescentadas às Palavras da Consagração a partir da tradição apostólica e se
referem a I Timóteo 3,9. São Tomás sustenta que essas palavras são matéria
de tradição, transmitidas pelos Apóstolos à Igreja.4
Com relação ao significado dessas palavras, Gassner diz:
As palavras “mysterium fidei” do Cânon são aposição à “Cálice do Novo
Testamento”... a Eucaristia é um mistério, é um sacramento. Na Santa Euca-
ristia não está escondida somente a divindade, mas também a humanidade, o
Corpo e o Sangue. Ela é o sacramento mais excelente porque contém toda a
glória do mistério de Cristo falado em I Timóteo 3,9.16. O resto dos outros
sacramentos meramente contêm o Seu poder… a Eucaristia é chamada mis-
tério da fé (a) um objeto da fé: somente pela fé nós conhecemos a verdadeira
presença de Cristo, de sua Presença Real, de seu Corpo e Sangue. Ela é cha-
mada de mistério da fé, (b) porque a paixão de Cristo, representada nela, salva
pela fé. E, ao mesmo tempo, é chamada de sacramento do amor, com relação
ao que significa e ao que são seus efeitos.5
1 Citado em EEFL 618. “ Hoc est mysterium novi testamenti, accipite ex eo, manducate,
hoc est corpus meum quod pro mulis frangitur in remissionem peccatorum”.Grifo meu.
2 TNM, 193.
3 Canon of the Mass, 278-88.
4 Canon of the Mass, 279.
5 Canon of the Mass, 285-6.
424
A Oração Eucarística
(b) Remoção nas Novas OEs. Uma vez que se decidiu transformar a
consagração em uma narrativa da instituição, toda a bagagem dogmática deve
ser abandonada, então “mistério da fé” tinha que ir embora. Sem dúvida, os
modernistas sempre podem encontrar razões (à parte da verdadeira razão)
para retirarem as fórmulas consagradas pela tradição apostólica. Em suas me-
mórias, Bugnini ofereceu várias razões para justificar a remoção de mysterium
fidei.6
1. As palavras “não são bíblicas”. Essa é uma das objeções típicas que os
aderentes da heresia antilitúrgica levantam contra as fórmulas consa-
gradas pela tradição eclesiástica.
A atitude católica é diferente. Mais um vez, nos voltamos a Gassner
sobre mysterium fidei:
No entanto, se a Igreja inseriu as palavras “mysterium fidei”, deve haver uma
razão muito importante, graves motivos. Embora essas palavras, neste caso,
não seriam parte da fórmula de consagração, o mero fato de que a Igreja as
tenha inserido nas Palavras de Consagração as eleva, em sua significação e
dignidade, sobre o resto do Cânon, instituído pela Igreja, recitado em nome
da Igreja. Essa aposição aparece como uma declaração solene, um grande
testemunho, um pronunciamento pela Igreja da mais alta autoridade.7
Então, se a própria Igreja de fato inseriu “mistério da fé” em um relato
bíblico, isto é uma razão para manter as palavras, não para removê-las.
2. As palavras, disse Bugnini, “são encontradas somente no Cânon Ro-
mano”. Vide acima. Em qualquer caso, qual rito da Missa Bugnini esta-
va engajado em reformar? O Siro-Malancarense?
3. Mysterium fidei é “de origem e significado incerto”, e alguns peritos
“atribuem às palavras um significado bastante perigoso, já que eles a
traduzem como ‘um sinal da fé’.”
Se é assim, o perigo existiu por mais de 1300 anos sem ninguém ter
notado − até mesmo os protestantes, que ensinavam que a presença de
6 RL, 447.
7 Canon of the Mass, 286-7.
425
Capítulo 12
426
A Oração Eucarística
Além disso, “há um precedente para isso nas liturgias egípcias, em que o
memorial do Senhor era sublinhado por tal aclamação.”2 Por que o venerável
Rito Romano deveria imitar a prática litúrgica dos coptas cismáticos − here-
ges monofisistas renomados pela ignorância teológica, teologia sacramental
incoerente e disciplina canônica irregular − não é de todo claro. Mas foi um
belo pretexto para introduzir uma inovação que desvaloriza o sacerdócio um
pouco mais mediante uma intervenção vocal da assembleia.
2 TNM, 203.
3 Braga, “De Novis Precibus,” 236-7 “dum in novo contextu sensum aliquanto diversum
et magis amplum accipiunt, qui respicit ipsam Eucharistiam in genere. At dolendum esset
sinificatio, in interpretationibus et in catechesi tradenda, ulterius limitaretur mysterium prae-
sentiae Domini sub speciebus eucharisticis.”
427
Capítulo 12
428
A Oração Eucarística
3 Isto seria de alguma forma análogo ao Padre recitar todo o Mt 28,19 (Ide pois e ensinai
todas as gentes: Batizando-as em nome do Padre, e do Filho, e do Espírito Santo.”) enquanto
derrama a água durante o batismo, em vez de simplesmente dizer: “Eu te batizo em nome do
Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”.
4 CDF; Diretrizes para a administração da Eucaristia entre a Igreja Caldéia e a Assíria do
Oriente, 20 de julho de 2001. Para uma controvérsia, cf. Donald Sanborn, Ó, sacramento não
santo, http://www.traditionalmass.org/articles/article.php?id=34& “Pela denúncia até mes-
mo do próprio Vaticano, os Nestorianos não têm uma fórmula consacratória em sua anáfora
(cânon) da Missa. Seus sacerdotes nunca recitam as palavras da consagração, ‘Isto é Meu
Corpo’, nem ‘Isto é Meu Sangue...’ com as palavras subsequentes. Nem mesmo recitam nada
similar a elas.” A declaração da CDF defende que ela não é necessária porque “as palavras
da Instituição Eucarística” estão contidas “em uma forma escatológica dispersa, isto é, inte-
grada em sucessivas orações de ação de graças, louvor e intercessão”. Este princípio destrói
inteiramente – inteiramente – a doutrina católica acerca das fórmulas sacramentais essenciais.
429
Capítulo 12
1 OI, 44.
2 Cf. OI, 60n29. O Arcebispo Lefebvre também levantou essa questão em uma conferência
quando eu era um seminarista em Ecône na década de 70.
3 J.O Connel, The celebration of mass: A Study of the Rubrics of the Roman Missal (Milwaukee:
Bruce 1941) 1:225-6. Grifo meu.
430
A Oração Eucarística
rESUMo
• O termo “Cânon”, aplicado à grande oração da Missa contendo Con-
sagração, denotava uma regra fixa, algo praticamente imutável. Na Re-
forma Litúrgica pós-Vaticano II, os revisores trocaram o termo para
“Oração Eucarística”, com a intenção de permitir o uso de múltiplos
4 Merbelbach, Summa Theologie Moralis. 8 th ed. montreal descl´´e 1942). Ênfase dele.
5 Felix Capello, Tractatus Canonico-Moralis de Sacramentis (Roma; Marietti 1951) 1:289. Verba
consecrationis non solum recitative, i.e., materialiter dicenda sunt, sed etiam signifative seu
formaliter, quatenus sacerdos consecrans non tantum id refreat quod Christus dixerit, sed
praetera, ea verba professans, intendat affirmare quod ipsa sonat, scil., hoc esse revera corpus
est sanguinem Christi. Grifo do autor.
6 “55. Praecipua elementa e quibus Prex Eucharistica constat, hoc modo distingui pos-
sunt… d) Narratio institionis
431
Capítulo 12
textos.
• Os Prefácios do novo Missal não representam uma restauração integral
dos textos antigos, mas um “mosaico de palavras” daqueles textos que
poderiam ser “adaptados à mentalidade moderna”. Somente alguns
textos foram mantidos em sua forma original, pois, de outra forma,
poderiam ter sido “insuportáveis”.
• Apesar de não se poder fornecer uma data exata de sua origem, o Câ-
non Romano da Missa Tridentina é extremamente antigo. Alguns au-
tores dizem que ele se origina na tradição apostólica; outros rastreiam
seu núcleo ao segundo e terceiro século.
• A ala modernista do Movimento Litúrgico já tinha em vista a reforma
do Cânon Romano no final dos anos 40.
• Os motivos para se mudar o Cânon eram os habituais que estavam
em execução em outros locais na reforma da Missa. O texto do cânon
continha ideias que há muito tempo tinham sido alvos dos hereges pro-
testantes, então ele apresentava um obstáculo ao ecumenismo.
• Para os modernistas, o Cânon Romano estava ligado à teologia “triden-
tina”, não se conformava com suas conclusões acerca do que era certo
em uma tal oração, cheirava à teologia negativa e não era participativo.
Ele precisava ser examinado à luz da crítica textual e critérios psico-
lógicos para que “respondesse mais adequadamente às exigências dos
nossos tempos.”
• A atitude dos revisores diante do Cânon Romano é melhor resumida
nas palavras de Bugnini, que disse que ele representava um “deplorável
empobrecimento”, resultante de “séculos de decadência litúrgica”.
• O Vaticano II não autorizou explicitamente uma mudança no Cânon.
Em vez disso, princípios gerais escritos na Constituição sobre a Sagra-
da Liturgia foram utilizados para justificar a mudança.
• O livro de 1966 de Cipriano Vagaggini atacando o cânon e propondo
textos alternativos, eventualmente levou à decisão de Paulo VI de per-
mitir a introdução de textos alternativos ao Cânon Romano.
• Não se pode dizer com certeza quando ou onde a recitação silenciosa
do Cânon teve origem. Ela se tornou generalizada no Ocidente por
volta do ano 800, muito provavelmente por conta de um espírito de
reverência na presença dos mistérios sagrados. Os hereges protestantes
denunciaram a prática, e o Concílio de Trento, por sua vez, pronunciou
432
A Oração Eucarística
433
Capítulo 12
434
CaPÍTUlo 13
CoMUNHÃo Na MÃo:
iMPiEDaDE EM aÇÃo
E
nquanto as mudanças litúrgicas eram introduzidas gradualmen-
te nos anos 60, a prática que os conservadores viam com maior
horror era a comunhão na mão. O simbolismo da ação punha
abaixo tudo o que os católicos acreditavam sobre a Missa, sobre
o Santíssimo Sacramento e o Sacerdócio.
Começou como um abuso — uma violação deliberada de uma lei litúrgica
— que ocorria em algumas Missas “clandestinas”. Naquele tempo, parecia in-
concebível que essa prática tão irreverente pudesse se tornar tão disseminada.
Em um dia no início de 1969, quando eu ainda era um aluno de quarto ano
no Seminário Menor, estava caminhando pelo coro da capela quando olhei
para baixo e vi um pequeno grupo de seminaristas do colégio de pé, em volta
do altar, para aquilo que era chamado de “Missa de Grupo”. O sacerdote, um
tipo bobo, dado a mudar substantivos em verbos e a tirar os artigos definidos
das frases (“Jesus nos talenta com Eucaristia para sermos Igreja...”), já estava
distribuindo a comunhão na mão. Já que eu estava planejando entrar no semi-
nário naquele outono, achei esse acontecimento bastante deprimente.
Em contrapartida, eu sabia que o Santo Padre em breve colocaria um fim a
todas essas práticas irreverentes e sacrílegas de uma vez por todas, publicando
um Novo Ordo da Missa. Isso poria um fim àquele circo!
Bem, como se veria, não exatamente...
Nosso exame da Missa de Paulo VI até agora se concentrou primordial-
mente nas deficiências doutrinais do rito. Uma vez que as cerimônias do Rito
de Comunhão estão focadas no Santíssimo Sacramento, moveremos nossa
atenção para a segunda parte da nossa tese: aqueles elementos da Missa Nova
que não somente atacam a fé, mas que também provocam irreverência e im-
piedade.
Neste capítulo, trataremos dos seguintes tópicos: (1) O Pai Nosso. (2)
O Libera Nos. (3) As preparações para a Comunhão. (4) A distribuição da
435
Capítulo 13
o Pai NoSSo
Começando no século quarto, fontes gregas e latinas indicam igualmente
que o Pai Nosso era usado na Missa. Tanto na Missa Tridentina quanto na
Missa de Paulo VI, a oração aparece no começo do Rito de Comunhão, e é
precedida por um texto introdutório, com exceção do Oremus, ela é idêntica
nos dois ritos;
[Oremos]
Advertidos pelos preceitos do Salvador,
e instruídos pelos seus divinos ensinamentos,
ousamos dizer.
Embora o Ordo da Missa de 1969 em si mantivesse o texto tridentino para
essa introdução, ela não era obrigatória,1 e assim proporcionava outra oportu-
nidade para um caloroso e acolhedor “Momento do Padre Chuck”. O Sacra-
mentário Americano (Missal de Altar) oferece quatro opções de introdução.
Serviços de abastecimento de materiais litúrgicos oferecem introduções para
todos os Domingos e Dias Santos de Guarda.
Na Missa Tridentina, somente o sacerdote recita o Pai Nosso, o acólito
ou o coro respondem com a frase, mas livrais-nos do mal, e o sacerdote por fim
acrescenta o Amém. Na Missa Nova, o sacerdote e a congregação recitam
toda a oração juntos:
Todos: Pai Nosso…
E não nos deixeis cair em tentação,
Mas livrai-nos do mal.
[Amém.]
Naturalmente, a nova prática (que apareceu na forma de experimento no
436
Comunhão na Mão
Rito de Comunhão da Sexta-Feira Santa de 1955) foi pintada como uma res-
tauração da oração ao povo, que lhes tinha sido tirada. Mas uma passagem
de Santo Agostinho atesta que no Norte da África os fiéis não recitavam o
Pai Nosso: “No altar do Senhor essa oração é dita diariamente, e os fiéis a
escutam.”2
Mais significativa era a prática em Roma. Aqui também, somente o sacer-
dote — e não o povo — recitava o Pater Noster. O próprio São Gregório disse
que essa era uma característica distintiva do rito romano: “Embora entre os
gregos a Oração do Senhor é dita por todo o povo, entre nós é dita somente
pelo sacerdote.”3
Os próprios revisores até se sentiram compelidos a citarem um precedente
para a sua “inovação mais relevante” (como eles a chamaram): a Instrução
para Música Sacra de 1958, que permitiu que a congregação recitasse o Pai
Nosso juntamente com o sacerdote na Missa Dialogada.4
Então, a recitação comum do Pai Nosso é um dos mais substanciais pon-
tos de ruptura da tradição do rito romano, e é uma outra instância em que a
teologia da congregação pisoteou na tradição.
Os revisores também deixaram o amém do fim do Pai Nosso. Apesar de
parecer um pequeno detalhe, essa não é de fato uma mudança insignifican-
te, porque ela é considerada tradicionalmente como uma parte da oração. A
Bíblia Vulgata Latina coloca o amém no final do Pai Nosso (vide Mt 6,13), e
o extremamente antigo rito de batismo de adultos trata explicitamente dessa
palavra como o completamento da oração.5 Como resultado da omissão, os
leigos que assistem à Missa Nova abandonam o Amém do Pai Nosso fora da
2 Sermo 58:10.12, PL 38:399. Grifo meu. “In ecclesia enim ad altare Dei quotidie dicitur ista
Dominica oratio, et audiunt ilam fideles.”
3 Epistola. 9:12, PL 77:957. Grifo meu. “Sed et Dominica oratio apud Graecos ab omni po-
pulo dicitur, apud nos vero a solo sacerdote.” Uma rubrica para o diácono na Missa Cantada
Solene do rito tradicional igualmente sublinha a ideia de que a oração pertence de um modo
especial ao sacerdote: antes do Pai Nosso, o diácono desce ao lado do sacerdote para um
degrau inferior e retorna quando o sacerdote terminou de cantar a oração.
4 Barba, 290-1. “La novità più rilevante...”
5 No Ritual Romano pré-Vaticano II, depois que o catecúmeno recita o Pai Nosso de joelhos,
o sacerdote o exorta: “Levanta-te, completai tua oração e diga amen”, ao que o catecúmeno
responde amen.
437
Capítulo 13
o LIBERA NOS
Tanto na Missa Tridentina quanto na de Paulo VI, o Pai Nosso é seguido
por outra oração chamada de Libera Nos (Livrai-nos) ou o embolismo (porque
alarga ou expande a ideia da última frase do Pai Nosso).
1 Quando digo o rosário em um velório, posso julgar a porcentagem relativa das pessoas
presentes que vão à Missa Nova a partir de quantas parecem omitir o amén no final do Pai
Nosso. Um outro indicador, a propósito, é a resposta ao Credo dos Apóstolos. Uma vez que
as igrejas pós-Vaticano II são, em sua maioria, zonas livres do Rosário, o silêncio mortal na
segunda parte do Credo significa que a única pessoa na sala que já se aproximou da Missa
Tridentina, e assim como de um rosário, é o defunto.
2 O motivo para tirar o amén do final do Pai Nosso, como também o Oremos, de sua intro-
dução, era a SC §50; (DOL 50), que estabeleceu que duplicações “acrescentadas com pouco
proveito” deveriam ser eliminadas da liturgia. O amén, além disso, aparecia no Novo Testa-
mento da Vulgata latina, mas não no texto grego — e nenhum modernista sequer pensaria de
se apoiar em um texto latino em vez de um grego.
3 A Senhorita Gauleiter o refutaria dizendo que isso é tudo “desenvolvimento orgânico” e
dizendo-lhe para ir ler Dom Alcuin Reid.
438
Comunhão na Mão
modo especial a Paixão de Cristo.4 Por essa razão, somente a conclusão era
então dita em voz alta.
No Missal de Paulo VI, as palavras entre colchetes abaixo foram omitidas e as
palavras em itálico foram acrescentadas. Toda a oração é recitada em voz alta.
Sacerdote: Livrai-nos, Senhor,
de todos os males
[passados, presentes e futuros,
e, pela intercessão da Bem-Aventurada e gloriosa sempre Virgem Maria, Mãe
de Deus,
com os Bem-Aventurados Pedro e Paulo e André
e todos os Santos]
Concedei-nos propício a paz em nossos dias;
De modo que, ajudados com os auxílios da vossa misericórdia,
sejamos sempre livres do pecado,
e assegurados contra toda perturbação.
[Por Nosso Senhor Jesus Cristo, Vosso Filho...]
Enquanto, vivendo a esperança, aguardamos a vinda
do Cristo Salvador.
A respeito das omissões e adições no novo texto:
• A referência aos males que são “passados, presentes e futuros” foi re-
movida, obviamente, porque ela era muito negativa. Ela se mostrou
uma citação de São Jerônimo.
• A eliminação da menção explícita de Nossa Senhora, São Pedro, São
Paulo e Santo André era consoante com o princípio geral da reforma
litúrgica de diminuir a honra rendida aos Santos5. Os nomes de san-
tos, disse Patino em seu comentário, “parecem desnecessários em uma
oração que conta com a mediação de Cristo, que faz sua própria a voz
da assembleia”6 — ecumenismo, modernismo e teologia de assembleia
novamente.
• A conclusão Por Nosso Senhor Jesus Cristo... foi alterada, disse Patino, em
favor da referência para aguardar na santa esperança a vinda de Nosso
Salvador Jesus Cristo.
4 MRR 2:289.
5 LRC, 348-9. São Gregório acrescentou o nome de Santo André à oração. Ele tinha esta-
belecido um mosteiro dedicado a Santo André no Monte Coeliano.
6 OMP, 172.
439
Capítulo 13
1 OMP, 172-3
2 Braga, “In Novum Ordo,” 370.
3 E durante Missas no Seminário onde estudei, também.
4 Cabié, 214n.
5 Reform of the Liturgy, 57. Vide também Cabié, 214n.
440
Comunhão na Mão
6 Estou ciente das considerações práticas que podem ter inicialmente levado à prática de
remover a patena do altar. Mas como muitas coisas na liturgia, a ação eventualmente adquiriu
uma conotação simbólica. E mudando a ação, os revisores alteraram o significado simbólico
também.
7 MRR 2:330-1.
8 Braga, “In Novum Ordinem,” 370.
441
Capítulo 13
1 LRC, 362.
442
Comunhão na Mão
3. Agnus Dei. Papa Sérgio (687-701) ordenou que o Agnus Dei fosse in-
troduzido na Missa. Ele era de origem síria, de Palermo, onde o rito bizantino
pode ter inspirado o seu uso. Primeiramente, o Agnus Dei era cantado pelos
2 OMP, 174.
3 OMP, 175.
443
Capítulo 13
1 LRC, 357.
444
Comunhão na Mão
DiSTriBUiÇÃo Da CoMUNHÃo
A Missa Tridentina possui um rito duplo para a recepção da Santa Comu-
nhão, primeiro o do sacerdote, depois o do povo.
O sacerdote recita em voz baixa uma série de breves orações, acompanha-
das de ações rituais (genuflexões, sinais da cruz, inclinações, bater no peito,
gestos de recolhimento e de indignidade, recolher as partículas da hóstia, etc.),
que expressam tanto a fé no Milagre da Presença Real quanto humildade em
face desse mistério.
Quando o sacerdote termina a sua própria comunhão, ele adiciona outro
rito, se algum dos fiéis presentes estão dispostos a comungar. Os ministros ou
servidores se inclinam para o Confiteor em nome de todos os que irão recebê
-la. O sacerdote abre o tabernáculo, faz uma genuflexão, retira o cibório, des-
cobre-o, faz outra genuflexão e vira sua face para aqueles que irão comungar.
Então ele recita as seguintes orações (às quais os ministros respondem Amem)
e abençoa os comungantes.
Que Deus tenha misericórdia de vós, perdoe os vossos pecados e vos condu-
za à vida eterna.
Perdão, absolvição e remissão dos vossos pecados, vos conceda o Senhor
onipotente e misericordioso.
O sacerdote se vira para o cibório, ajoelha-se e então mostra uma hóstia aos
comungantes enquanto recita Eis o cordeiro de Deus, etc. e Senhor, eu não sou digno.
O rito duplo expressa a distinção entre o papel do sacerdote na Missa e dos
fiéis que estão presentes. O sacerdote recebe a Comunhão, porque essa é uma
parte integral do sacrifício. A recepção pelos fiéis presentes, embora louvável, não
é uma parte integrante do próprio sacrifício e as rubricas da Missa Tridentina
445
Capítulo 13
refletiam isso.1
Não é preciso dizer que a Missa de Paulo VI combinou a comunhão do
sacerdote com a comunhão do povo (a assembleia celebra, o sacerdote presi-
de...), e suprimiu as orações negativas (Confiteor, etc.).
O precedente para a combinação da comunhão do sacerdote e do povo,
entretanto, já havia sido estabelecido no Missal de João XXIII em 1962. Essas
rubricas de transição suprimiram o Confiteor, o Misereatur e o Indulgentiam ante-
riores à Comunhão do povo. Após o sacerdote ter consumido o Preciosíssimo
Sangue, ele imediatamente mostra a hóstia ao povo enquanto recita o Ecce
Agnus Dei, etc.2
1 Em muitos lugares, além disso, não era costumeiro distribuir a santa comunhão aos fiéis
durante a Missa Cantada Solene ou a Missa Cantada Pontifical, ou porque assim fazendo teria
grandemente aumentado o tempo da cerimônia, ou porque muitas pessoas achavam mais fácil
comungar em uma Missa rezada anterior, devido às regras de jejum.
2 Apesar disso, os grupos tradicionais que em teoria observam as rubricas do missal de
João XXIII (algumas paróquias diocesanas, a Fraternidade São Pio X nos Estados Unidos e
outros) seguem a prática anômala de continuar a usar o Confiteor, Misereatur e Indulgenciam antes
da distribuição da comunhão.
446
Comunhão na Mão
O Sangue de [nosso Senhor Jesus] Cristo guarde [a minha alma] para a vida
eterna. [Ámen.]
Assim como no caso das orações pelos mortos, aqui também os revisores
eliminaram a palavra anima (alma) dessas fórmulas. Jungmann explica que a
palavra foi suprimida “aparentemente como uma reação deliberada contra a
tendência um tanto platônica da Idade Média de supervalorizar o espiritual”3
— a qual, só para constar, não era exatamente um grande perigo nos anos 60.
Mas, seja como for, a fórmula pré-data aquela temível Idade Média e foi usada
pelo próprio São Gregório.4
Da mesma forma, foram suprimidos do Novus Ordo a parte em que o sacer-
dote se benze com a hóstia e o cálice e quando ele se inclina ao Santo Nome,
assim como foram estes dois textos que precedem a comunhão do sacerdote
no rito antigo:
Tomarei o pão do céu, e invocarei o nome do Senhor.
Que hei-de eu retribuir ao Senhor por tudo quanto Ele me concedeu?
Tomarei o cálice da salvação, e invocarei o nome do Senhor.
Em louvores invocarei o Senhor,
e livre serei dos meus inimigos.
O uso litúrgico para ambos os textos data do século treze. As alusões ao
sobrenatural (pão do céu?) e negativo (inimigos) possivelmente seriam proble-
máticas para a psicologia do homem moderno.
A fórmula para dar a hóstia ao comungante no antigo rito é similar à co-
munhão do celebrante:
Que o Corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo preserve a vossa alma para a vida
eterna. Amém.
Enquanto o sacerdote recita a fórmula, ele abençoa o comungante como a
hóstia e se inclina ao Santo Nome.
No rito novo, o texto e as rubricas se foram. A palavra alma, a inclinação
e a benção provavelmente se mostraram mais uma vez como uma tendência
infeliz “de supervalorizar o espiritual”. Novamente, observe a prática habitual
3 TNM, 212.
4 Vide João, o Diácono, S. Gregorii Magni Vita, 2.41, PL 75:103. “Corpus Domini nostri Jesu
Christi conservet animam tuam...”
447
Capítulo 13
1 LRC, 375-6.
2 LRC, 376.
3 LRC, 382-4.
448
Comunhão na Mão
449
Capítulo 13
450
Comunhão na Mão
3 LRC, 369ss.
4 Isso era também a maneira em que o Papa recebia o Preciosíssimo Sangue na Missa Pa-
pal. vide RLC, 400.
451
Capítulo 13
sões, lotando as ruas de Roma com tochas em Sua honra.1 De fato, o calendá-
rio do Missal Novo aboliu a Festa do Preciosíssimo Sangue.
A razão verdadeira é, mais uma vez, a teologia da assembleia-ceia por trás
da Missa Nova. Se o rito não é nada além de uma banquete, então se deve
comer e beber.
452
Comunhão na Mão
2 Sagrada Congregação do Culto Divino, Holy Communion and Worship of the Eucharist of
Mass, 21 de Junho de 1973, 17, DOL 2095.
3 Despois do Vaticano II, Paulo VI aboliu as ordens menores, e as substituiu por dois “mi-
nistérios” de leitor e acólito, que eram conferidas de acordo com o pontifical revisado. Vide
seu Motu Proprio Ministeria Quaedam, 15 de agosto de 1972, DOL 2922-38.
453
Capítulo 13
a CoMUNHÃo Na MÃo
A comunhão na mão não foi uma das reformas propostas na Constituição
do Vaticano II sobre a Sagrada Liturgia: como mudar o Cânon, isso teria sido
inconcebível. Mesmo assim, uma vez que a prática foi introduzida, ela se espa-
lhou rapidamente, e agora é encontrada quase em toda a parte.
Há duas questões separadas para serem discutidas: Os antecedentes histó-
ricos da prática e as consequências doutrinais.
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Comunhão na Mão
455
Capítulo 13
1 Censura, Whittaker edition, 34-6, quoted in Davies, Pope Paul’s New Mass, 464.
2 Encíclica Mysterium Fidei, 3 de setembro de 1965, DOL 1145ss.
3 Vide §35ff, DOL 1178-83.
456
Comunhão na Mão
457
Capítulo 13
colocadas em sacos, nos bolsos, nos bancos (e até mesmo vendidas no eBay),
partículas de hóstias são deixadas espalhadas no chão da igreja, crianças ou
não-católicos levavam as hóstias para casa como lembrança, etc. Um conser-
vador como o Padre Retreaux pode ter um acólito segurando uma patena de
Comunhão banhada a ouro enquanto apresenta a hóstia para o comungante,
mas o exercício é o cúmulo do absurdo se o bom sacerdote tem de colocar a
hóstia, partículas e tudo, na mão do comungante.
De tempos em tempos ao longo dos anos, os oficiais do Vaticano emitiram
documentos aludindo aos problemas da comunhão na mão, ou batendo na
tecla de que a comunhão na língua de alguma forma era preferível.
O exemplo mais bem conhecido é encontrado em uma Carta de João Paulo
II de 1981, Dominicae Cenae, na qual lamentava que “uma deplorável falta de
respeito pelas espécies eucarísticas” estava sendo relatada nos países onde a co-
munhão na mão tinha sido introduzida, acrescentando que “tocar as espécies
sagradas e as distribuir com as próprias mãos é um privilégio dos ordenados.”1
Quando era Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, o Cardeal
Ratzinger emitiu críticas semelhantes, assim como vários outros oficiais da
Congregação para o Culto Divino. Esses pronunciamentos criaram inevitavel-
mente uma grande excitação nos círculos conservadores, mas nada veio deles
até agora.
Como parte dessas discussões, pode-se, inevitalmente, ouvir dizer que a
comunhão na língua é “a lei”, enquanto a comunhão na mão é apenas tolera-
da por indulto — uma exceção especial da lei. Como defesa, isso é patético.
O próprio Paulo VI permitiu a comunhão na mão e, passados quarenta anos,
essa se tornou universalmente um “costume ordinário” que, como tal, obtém
a força de lei.
A introdução da comunhão na mão nos anos 60 não tinha nada haver com
a restauração de práticas cristãs primitivas — por que então não restaurar os
véus para as mulheres, separar os homens das mulheres na nave da Igreja e
1 João Paulo II, Carta Dominicae Cenae sobre o Mistério e o Culto da Eucaristia, 24
February 1980, §11, http://www.vatican.va/holy_fathcr/john_paul_ii/letters/documents/
hf_jpii_let_24021980_dominicae-cenae_en.html. É duro dizer, mas na hora da Comunhão
durante a “Missa da juventude”, em Denver, presidida por João Paulo II, estavam atirando
aos comungantes sacolas plásticas cheias de hóstias. Antes do Vaticano II, um sacerdote que
fizesse coisa como essa teria incorrido na forma mais grave de excomunhão - uma cuja absol-
vição era reservada somente ao Papa.
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Comunhão na Mão
459
Capítulo 13
riToS PÓS-CoMUNHÃo
Uma característica da Missa Tridentina é que ela termina quase abrupta-
mente depois da distribuição da Comunhão. Naturalmente, isso foi diminuin-
do ainda mais na Missa de Paulo VI.
1. Purificações. Depois da distribuição da Comunhão em ambos os ritos,
o sacerdote purifica os vasos, uma ação que é acompanhada por orações priva-
das. Na Missa Nova, o primeiro texto abaixo (do Sacramentário Leonino) foi
mantido, enquanto que o segundo (o de origem não-romana) foi suprimido.
Em 1570, São Pio V prescreveu as duas orações para o Rito Romano:
Com pureza de alma recebamos, Senhor,
o que em nossa boca tomamos.
Esse dom, que nos foi concedido no tempo,
nos seja remédio para a eternidade.
O vosso Corpo, Senhor, que eu comi
e o vosso Sangue que eu bebi,
se unam às minhas entranhas;
refeito que fui com estes puros e santos sacramentos,
fazei que em mim não fique mancha alguma de pecado.
Vós que viveis...
O segundo texto foi provavelmente suprimido por causa da expressão ne-
gativa “mancha de pecado”.
Quanto às ações rituais, no rito tridentino existem duas purificações do
cálice; durante a segunda, água e vinho são derramados sobre os indicadores
e polegares do sacerdote (unidos até esse momento) para remover qualquer
partícula que ainda possa estar aderida a eles. Se o sacerdote purifica o cibório,
o vinho e a água também são derramados neles.
Na Missa Nova, há uma purificação da patena e do cálice, e nenhuma dos
dedos do sacerdote. O sacerdote, diácono ou acólito instituído podem realizá
-la, e esta pode ser feita em uma mesa lateral.
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Comunhão na Mão
1 Vide Book of Common Prayer anglicano de 1662, da era dos queridos “Caroline Divi-
nes” de Bouyer.
461
Capítulo 13
oS riToS DE CoNClUSÃo
Se qualquer outra ação litúrgica se segue, o rito de conclusão da Missa
Nova é inteiramente omitido – o resultado final do precedente estabelecido
nas cerimônias de Semana Santa de 1955, que cortava partes do Ordo Missae
sempre que a Missa era precedida ou seguida por outro rito litúrgico.
Depois das orações pós-Comunhão, o novo rito pode ser interrompido
novamente para mais conversa – dessa vez, para os avisos. Então, a Senhori-
ta Gauleiter pode ir mais uma vez ao microfone, e com sua Voz Gigantesca
pedir para que a congregação participe da doação de sangue, se inscreva no
seminário sobre a Teologia do Corpo, mande cartões de agradecimento ao
predecessor presidiário do Padre Chuck e compre bilhetes para ouvir a banda
da Conferência de Ordenação de Mulheres (As Quirotônicas).
1 Para a discussão do uso especifico das orações da Comunhão, vide Walter Ferretti, “Le
Orazioni Post-Communionem de Tempore,” EL 84 (1970), 321—41; Thomas A. Krosnicki,
Ancient Patterns in Modem Prayer (Washington: CUA Press 1973). Ferretti era um membro
da Consilium responsável pela edição e colagem das orações pós-Comunhão para o ciclo tem-
poral na Missa nova. A publicação de Krosnicki é um estudo sistemático de todas as orações.
2 Vide TNM.214. 59.
462
Comunhão na Mão
3 LRC, 384. Comparando as orações sobre o povo no Missal dos anos 70 com seus supos-
tos antecedentes, eu suspeito, iria revelar os mesmos tipos de omissões já apontadas no resto
das novas orações.
4 VMRR 2:437-8.
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Capítulo 13
1 LRC, 385ss.
2 LRC, 390.
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Comunhão na Mão
3 Uma das forças motores por trás do decreto, Jules Isaac, havia escrito um livro que assi-
nalava o Evangelho de São João particularmente como “antissemita”. Ele se encontrou com
João XXIII em julho de 1960, com o objetivo de propor que a Igreja mudasse o seu ensina-
mento sobre os judeus.
4 Instrução Inter Occumenici, §48, DOL 340.
5 Assim chamadas em homenagem a Papa Leão XIII, que as instituiu. Elas consistem de
três Ave Marias, Salve Rainha com uma Colecta, oração a São Miguel e, eventualmente, três
jaculatórias ao Sagrado Coração.
6 Vide Anthony Cekada “Russia and the Leonine Prayers” Sacerdotium 5 (outono de 1992)
Esse artigo, para minha surpresa, causou uma controvérsia, porque muitos tradicionalistas
estavam sob uma impressão mal entendida de que as orações estavam de alguma forma co-
nectadas com a mensagem de Fátima ou possuíam o seu objeto para a conversão da Rússia
à Fé Católica.
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Capítulo 13
EfEiToS CUMUlaTiVoS
Em sua Alocução de 19 de novembro de 1969, defendendo a Missa Nova
contra as acusações feitas pela Intervenção Ottaviani, Paulo VI argumentou que
as várias mudanças nas rubricas do novo rito não implicavam em “uma al-
teração ou diminuição da verdade”, garantida pela fé católica, e que foram
“sujeitas a uma qualificação teológica de valores diversos, diferindo de acordo
com o seu contexto na liturgia.”2
Mas quando você se volta para o Rito de Comunhão da Missa Nova, você
descobre que Paulo VI aboliu quase todos os antigos gestos rituais de adora-
ção ou reverência para com o Sacramento e desencorajou impiedosamente a
devoção e a piedade individuais. Eis a lista dessas mudanças:
1. Introdução antes da Comunhão de um sinal da paz congregacional,
que destrói o recolhimento privado necessário a uma recepção mais
frutuosa do Sacramento.
2. Conversão da recepção da Comunhão em uma “procissão” comunitá-
ria em que os comungantes, em vez de fazer atos privados de devoção,
devem estar cantando.
3. Substituição do ajoelhar-se para receber a Comunhão, uma postura de
adoração e humildade, pelo ficar de pé.
4. Distribuição da Comunhão por não ordenados, incluindo mulheres.
5. Permissão para a comunhão na mão, que agora é praticada quase em
toda parte, e que está ligada inseparavelmente às heresias protestantes
e modernistas.
6. A concomitante falta de preocupação para com as partículas que caem
das hóstias.
7. Purificação dos vasos sagrados por leigos.
8. Sentar-se, como uma postura prescrita para a ação de graças depois da Co-
munhão, em vez de se ajoelhar, novamente em uma postura de adoração.
466
Comunhão na Mão
3 LP, 80.
467
Capítulo 13
rESUMo
• No Rito Romano, uma tradição atestada por Santo Agostinho e São
Gregório Magno prescreve que somente o sacerdote canta ou recita
o Pai Nosso. Os criadores da Missa Nova transformaram-no em uma
oração congregacional, uma prática que admitiram ser uma “novidade
mais relevante”.
• Na oração Libera Nos que se segue, o nome dos Santos e a expressão
atribuída a São Jerônimo foram removidas a fim de acomodar-se res-
pectivamente à teologia da assembleia e eliminar a linguagem negativa.
Duas frases foram acrescentadas, uma para aumentar a consciência da
“presença do Senhor na assembleia”, outra por causa de sua “impor-
tância ecumênica”.
• A oração Pax, recitada antigamente em voz baixa, é agora recitada so-
lenemente em voz alta por causa do “costume de usar essa oração em
468
Comunhão na Mão
encontros ecumênicos.”
• O próprio sinal da paz não desce hierarquicamente de Cristo para o
sacerdote, para o clero e para o povo, mas, em vez disso, troca-se entre
os membros da assembleia.
• A Missa Nova combina o Rito de Comunhão do sacerdote com o Rito
da Comunhão dos fiéis, um desdobramento lógico da teologia da as-
sembleia.
• A palavra alma foi removida das fórmulas de Comunhão porque ela
reflete uma tendência “de supervalorizar o espiritual.”
• A recepção da Comunhão foi transformada de um ato de devoção
individual em uma “procissão” coletiva na qual os participantes devem
cantar a fim de torná-la “mais completa, como um ato da comunidade.”
• Ajoelhar-se para a recepção da Comunhão, um ato de humildade e
adoração, foi substituído pelo de ficar de pé.
• A prática de empregar leigos homens e mulheres para distribuir a Co-
munhão desvaloriza o Sacerdócio e a crença na Presença Real; além
disso, autorizar as mulheres a realizar essa função contradiz a tradição
apostólica.
• Independentemente do que se possa concluir sobre seus antecedentes
no início da Igreja, a comunhão na mão nos tempos modernos foi in-
troduzida por hereges com o objetivo de repudiar os dogmas católicos
sobre a Presença Real e o Sacerdócio.
• O efeito cumulativo dessas mudanças, juntamente com a supressão de
muitos gestos rituais que manifestavam externamente a adoração e a re-
verência ao Santíssimo Sacramento (o olhar para a hóstia, sinais de cruz,
inclinar-se, genuflexões, bater-se no peito, bênçãos com a hóstia, segurar
e manter os dedos unidos, etc.), ataca a fé católica na Presença Real e
promove uma grande irreverência contra o Santíssimo Sacramento.
469
Capítulo 13
470
CaPÍTUlo 14
CoNClUSÕES:
“a MiSSa aCaBoU...”
C
omeçamos este estudo observando que a reverência, dignidade,
beleza e a continuidade com a tradição que uma nova geração
de sacerdotes têm descoberto na Missa Tridentina leva natural-
mente à questão de como explicar as diferenças impressionantes
e fundamentais entre a Missa Tridentina e a Missa de Paulo VI.
A resposta, sugerimos, deveria ser encontrada nos diferentes conjuntos
de proposições doutrinais por trás de cada rito. Já que toda palavra e todo
gesto da liturgia transmitem uma ideia teológica, essas proposições doutrinais
emergem de incontáveis maneiras na medida que os respectivos ritos se des-
dobram. Foi o nosso dever aqui descobri-los.
Neste capítulo, iremos apresentar as nossas conclusões, começando com
os nossos dois corolários (a Missa Nova como uma ruptura com a tradição
e como uma restauração espúria da liturgia da Igreja Primitiva). Nós passa-
remos então para a nossa tese principal (a Missa de Paulo VI é gravemente
irreverente e destrói a doutrina católica na mente dos fiéis).
Para evidências em apoio de cada uma dessas conclusões, referimos o leitor
às seções pertinentes para dos capítulos anteriores.
Finalmente, vamos olhar brevemente para três soluções propostas para os
problemas que nós listamos, e depois concluiremos com uma recomendação
nossa.
471
Capítulo 14
472
Conclusões
3. Oração do Fiéis. A Oração dos Fiéis foi restaurada — mas com ladai-
nhas ao estilo “faça você mesmo”, em vez das antigas coletas originais, que
nunca variavam e que estavam cheias de teologia “negativa”.
473
Capítulo 14
474
Conclusões
graVE irrEVErÊNCia
A segunda parte principal da nossa tese sustenta que a Missa de Paulo
VI permite ou prescreve uma grave irreverência. A base dessa afirmação foi
a alteração ou eliminação de orações, atos cerimoniais ou leis litúrgicas que
manifestavam a reverência devida ou reconheciam uma qualidade sagrada ine-
rente a uma pessoa, lugar ou coisa ligada à celebração da Missa, em particular
o Santíssimo Sacramento.
475
Capítulo 14
• Avisos podem ser dados depois da Comunhão, uma prática que destrói
o devido recolhimento.
• Quase todos os atos do sacerdote do rito antigo que expressavam adora-
ção e profunda reverência ao Santíssimo Sacramento foram eliminados.
• A comunhão na mão, uma prática introduzida por hereges para repudiar
a Presença Real e o caráter sacerdotal, é permitida em quase toda parte.
1 Os conservadores dizem que o Vaticano II não fez uma tal coisa, e citam a passagens da
Constituição sobre Liturgia que falam do “primeiro lugar” do canto gregoriano (§116) e do
“tesouro da música sacra” (§114). Essa linguagem, como de costume, é simplesmente mais da
novilíngua “sim-mas-não” do Vaticano II, porque elas são inutilizadas por outras passagens da
Constituição, que insistem sobre uma “participação ativa” que certamente pertence ao povo
(§114), o ”espírito da ação litúrgica” (§116) e as tradições “de certas partes do mundo” que
refletem “o gênio nativo” (§118) etc.
476
Conclusões
2 De fato, na mesma manhã em que escrevi esse parágrafo, acabei cruzando com a notícia
de como o Arcebispo Malcolm Ranjith de Colombo, Sri Lanka (antigo secretário de Congre-
gação do Culto Divino) denunciou o uso de músicas ao estilo protestante de “glória e louvor”
nas Missas de sua arquidiocese.
477
Capítulo 14
478
Conclusões
479
Capítulo 14
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Conclusões
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Capítulo 14
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Conclusões
483
Capítulo 14
484
Conclusões
1 Para (1) vide as seções pertinentes na IG e IL. Para (2) vide as rubricas intercaladas den-
tro dos textos de vários ritos. Para (3) vide capítulos 8 e 10-13 acima.
485
Capítulo 14
todo caso, a sociologia é uma disciplina sem Deus, ela não pode reconhecer
nenhum princípios ou causas sobrenaturais de forma alguma.
Quanto ao atribuir o declínio alarmante da frequência à Missa e da crença
entre os católicos a uma má interpretação do Vaticano II, isso tampouco re-
solve. O homem no banco não obtém o seu entendimento da doutrina católi-
ca a partir dos jornais teológicos que apresentam intermináveis sutilezas sobre
o que realmente significam as confusas formulações do Vaticano II, escritas na
linguagem do por um lado/por outro lado. Em vez disso, ele o obtém quase
exclusivamente daquilo que ele vê e daquilo que ele ouve na Missa todo do-
mingo — supondo, sem dúvida, que ele ainda vai à Missa.
E o que ele obteve do Vaticano II (e ainda obtém) é a Missa de Paulo VI,
um rito que foi expurgado das doutrinas católicas negadas pelos hereges, e que
foi mergulhado na teologia da assembleia modernista, um conjunto de propo-
sições nebulosas formuladas para obliterar o ensinamento tridentino sobre a
transubstanciação e a essência da Missa como um sacrifício propiciatório.
Sempre escutamos os assim chamados cães de guarda da ortodoxia da hie-
rarquia pós-Vaticano II lamentarem a “apostasia silenciosa” da fé, a “herme-
nêutica da descontinuidade”, a “ditadura do relativismo” e a “crise eclesiásti-
ca” entre aqueles que no passado eram católicos. Se eles buscam pelas causas,
então que eles primeiro examinem o Missal que é trazido diariamente à sua
cadeira do presidente.
No curso da história católica, todos os proponentes da revolução doutrinal
reconheceram que a liturgia expressa e comunica crenças. Tire dela os antigos
ensinamentos e os substitua por novos, e o homem no banco já não irá mais
crer como antes.
Esse é apenas o efeito que os criadores da Missa Nova haviam antecipa-
do. O Missal de Paulo VI, disse o assistente de Bugnini, Carlo Braga, estava
alterando “a realidade doutrinal”, implicando “novos valores e novas pers-
pectivas”, introduzindo “um fundamento inteiramente novo para a teologia
eucarística”1 e teria “um efeito transformador na catequese.”2 O Missal Novo
estava destinado a se tornar o locus theologicus (fonte para demonstrar as ver-
dades teológicas), disse Martimort, porque os seus conteúdos “interpretam
1 “II ‘Proprium de Sanctis’”, 419. “la realtá dottrinale... una nuova impostazione della
teologia eucarística.”
2 “Il Nuovo”, 274.
486
Conclusões
487
Capítulo 14
TRÊS SOLUÇÕES
Ao longo dos anos, católicos que vieram reconhecer algumas das deficiên-
cias mais óbvias do rito novo chegaram a uma variedade de soluções, a maior
parte das quais caíram em uma das três categorias gerais: (1) condenação e
evasão da Missa Nova, (2) a coexistência dos dois ritos como opções legítimas
e (3) a “reforma da reforma”.
A primeira delas é fundamentalmente visceral e prática; ela apela mais ao
leigo médio no banco. A segunda e a terceira são as soluções mais intelectual-
mente sofisticadas; elas apelam primariamente para os clérigos, entusiastas em
liturgia e aqueles preocupados com questões canônicas.
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Conclusões
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Capítulo 14
490
Conclusões
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Capítulo 14
DELENDA EST
“Não falemos, pois, de uma ‘Missa Nova’”, disse Paulo VI em seu discurso
de novembro de 1969 sobre o rito novo, “mas de uma ‘nova era’ na vida da
Igreja.”
De fato, ela foi. Porque nos quarenta anos desde aquele fatídico domingo
de Advento de 1969, quando a Missa de Paulo VI fez a sua estreia, as ordena-
ções nos Estados Unidos diminuíram 72%, a inscrição nos seminários 90%,
os seminários 66%, as freiras professoras 94%, as inscrições em escolas católi-
cas 55% e o comparecimento à Missa 60%. As instituições que permaneceram
estão infestadas de modernismo.
A vida católica em outros países sofreu um declínio dramático similar.
Agora tudo está morto na Europa, e um dia em um futuro não tão distante, o
continente que outrora foi da cristandade será muçulmano.
O Vaticano II, longe de trazer aquilo que João Paulo II chamava de nova
“primavera da Igreja”, revelou-se uma bomba atômica que deu origem a um
inverno nuclear. E o que espalhou as suas partículas radioativas aos quatro
cantos do mundo católico foi a Missa de Paulo VI, o motor da revolução re-
ligiosa que destruiu a fé e a piedade nas mentes e corações dos católicos em
toda parte.
Está na hora de colocar as evasões e negações de lado, e livrar o mundo da
monstruosidade ecumênica e modernista que é a Missa de Paulo VI.
Esta Missa acabou. Ela deve ir.
492
aPÊNDiCE
493
Apêndice
1 Essa decisão de impor o Missal e as rubricas de 1962 levou a uma disputa em 1983 entre
o Arcebispo Lefebvre e um grupo de nove (depois doze) sacerdotes americanos da Fraterni-
dade São Pio X, eu estava entre eles.
494
1951, 1958 ou 1962
495
Apêndice
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Bibliografia
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Bibliografia
518
ÍNDiCE oNoMÁSTiCo
A
Santo AFONSO: 124
Santo AGOSTINHO: 213, 234, 256, 291, 305, 352, 395, 437, 448, 454, 468,
472
Santo AGOSTINHO DE CANTUÁRIA: 124, 242, 305
AGUSTONI Luigi: 110
AGUSTONI Gilberto: 186
ALBAREDA Anselmo: 79
ALLEN John: 18
ALMARIUS de Metz: 396
Santo AMBRÓSIO: 124, 291, 370, 386, 448
AMON Karl: 392
Santa ANGELA MERICI: 295
ANTONELLI Ferdinando: 4, 26, 79, 467, 511
ASHWORTH Henry: 160, 250, 280, 297
AUGÉ Matias: 250, 280, 281
B
BACCI Antonio: 23, 176, 177, 178, 204, 515
BALTHASAR Hans Urs Von: 219
BARRY RYAN John: 391
BAUM William: 106
BEA Augustin: 45, 79, 81, 93, 94, 102, 104, 328
BEAUDUIN Lambert: 36, 42, 71, 514
BENTO XIV: 170, 382
BENTO XVI: 18, 19, 24, 117, 219, 244, 489, 490, 495
São BERNARDO: 124
BERTRAM Adolf: 41, 42, 502
BIRNBAUM: 70
BISHOP Edmund: 38
BONNETERRE Didier: 17, 36, 55, 245
BOTTE Bernard: 408
BOUIX Marie-Dominique: 26, 27, 487
519
Índice Onomástico
BOUYER Louis: 30, 34, 36, 46, 55, 64, 68, 72, 73, 118, 141, 214, 250, 450,
517
BRAGA Carlo: 79, 96, 100, 130, 140, 183, 250, 256, 257, 280, 283, 284, 292,
351, 390, 486
BRANDOLINI Luca: 18, 19, 24, 117, 219, 244, 489, 490, 495
BRAUN J.: 214
BREY Lawrence S.: 400
BRILIOTH Yngve: 59, 65, 73, 106, 141, 171
BRUYLANTS Placide: 12, 279, 280, 282, 303
BUCER Martin: 262, 456
BUGNINI Annibale: 12, 17, 30, 32, 36, 42, 75, 77, 78, 79, 81, 82, 84, 85, 86,
89, 93, 94, 99, 100, 101, 102, 103, 104, 105, 106, 107, 110, 111, 112, 113, 116,
130, 131, 137, 141, 165, 169, 170, 172, 179, 180, 182, 183, 186, 187, 201, 207,
209, 233, 250, 251, 256, 280, 281, 282, 302, 303, 321, 325, 326, 327, 328, 346,
351, 390, 391, 392, 394, 401, 402, 404, 408, 410, 415, 425, 426, 427, 428, 432,
451, 457, 485, 486, 496
C
CABIÉ Robert: 416
CAESARIUS DE ARLES: 455
CALLEWAERT K.: 347
CALVINO João: 126, 146, 159, 329
CANIZARES-LLOVERA Antonio: 491
CAPELLE Bernard: 81
CARINICI Alfonso: 79
CARLOS MAGNO: 324
CASEL Odo: 36, 66, 71, 203
São CASIMIRO: 295
CHENU Marie-Dominique: 93
CHRICTON J.D.: 145
CHUCK: 249, 252, 256, 257, 258, 315, 317, 322, 333, 372, 377, 412, 417,
436, 438, 442, 462, 476
CICOGNANI Gaetano: 99, 100, 101
São CIPRIANO: 160, 363, 454
CLARK Alan: 348, 350, 354
CLARK Francis: 202
CLÓVIS II: 455
520
Índice Onomástico
CONGAR Yves: 93
COOMARASWAMY Rama: 23
COUGHLAN Peter: 168, 183, 250
CRANMER Thomas: 146, 154, 191, 244, 262, 329, 372, 491
D
São DÁMASO: 280, 386
D’AMATO Cesario: 79
DANTE Enrico: 79
DA SILVEIRA Arnaldo Xavier: 23
DAVIDOGLOU Myra: 23, 161
DAVIES Michael: 16, 21, 23, 128, 134, 136, 225
DAY Thomas: 311
DEISS Lucien: 452
DE LA TAILLE Maurice: 400
DE LUBAC Henri: 93
DE MARCO Angelus: 118
DES NANTES Georges: 413
DIEKMANN Godfrey: 101, 326
DOLAN Daniel: 494
São DOMINGOS: 124, 270
DUMAS Antoine: 134, 250, 280, 384
DUPLOYÉ T.: 42
DUPUY Jacques: 127
DURIG W.: 280
E
Santa EDWIGES: 295
ELLARD Gerard: 45, 93
EMMINGHAUS Johannes: 224, 257, 258, 264, 268, 269, 387, 411
F
FERRETTI Walter: 250, 280, 462
São FIDÉLIS DE SIGMARINGA: 300, 305
FISCHER Balthasar: 47
FONTAINE Gaston: 250, 327
FORTESCUE Adrian: 124, 160, 234, 361, 424
521
Índice Onomástico
522
Índice Onomástico
I
Santo INÁCIO DE ANTIOQUIA: 160
Santo INÁCIO DE LOYOLA: 300
INOCÊNCIO I: 88
INOCÊNCIO III: 424
INOCÊNCIO IV: 121
Santo IRINEU: 160, 300
ISAAC Jules: 465
J
JACOPONE da Todi: 319
JASPER Ronald: 329
JENNY Henri: 392
JEREMIAS Joachim: 401, 402
São JERÔNIMO: 234, 266, 402, 439, 448, 468, 473
São JOÃO: 371, 418
São JOÃO BATISTA: 263, 370
São JOÃO DE DEUS: 305
JOÃO PAULO II: 24, 170, 360, 458, 492
JOÃO VIII: 121
JOÃO XXIII: 36, 94, 95, 96, 97, 99, 101, 102, 113, 303, 446, 465, 478, 493,
494
JOHNSON Cuthbert: 278, 384, 474
JOUNEL Pierre: 110, 250, 358
JUBÉ: 58
JUNGMANN Josef: 29, 33, 34, 46, 66, 70, 78, 81, 100, 113, 114, 250
São JUSTINO: 160, 161, 164, 172, 323
K
KEIFER Ralph: 261, 314
KING Archdale: 260, 318, 356, 370, 386, 393, 454, 455
KLAUSER Theodore: 78, 119, 321
KNOX John: 329
KOENKER Ernest: 70
KROSNICKI Thomas A.: 462
KÜNG Hans: 392
523
Índice Onomástico
L
LANDESDORFER Simon: 40
LARRAONA Arcadio: 101, 177
LEÃO IX: 424
LÉCUYER Joseph: 151
LEDOGAR Robert: 152
LEFEBVRE Marcel: 21, 22, 177, 493
LEGRAND Hervé-Marie: 161
LENGELING Emil Joseph: 203
LERCARO Giacomo: 45, 93, 104, 178, 212, 498
LEWIS Charles: 395, 396, 397
LÖW Joseph: 76, 79, 80, 81, 101
LUCCHESI Giuseppe: 280
LUTERO Martinho: 16, 22, 125, 126, 146, 159, 176, 178, 191, 214, 329, 342,
346, 349, 350, 351, 371, 377, 378, 379, 388
M
MALOTTE Albert: 440
MARINI Guido: 491
MARITAIN Jacques: 128
MARTIMORT A.G.: 100, 140, 250, 307, 486, 508, 510
MATERNUS Firmicus: 386
MAZZA Enrico: 408, 409
MCCARTHY John F.: 400
MCMANUS Frederick: 92, 101, 127, 128, 166
MINDSZENTY Jozsef: 466
MOLIN Jean-Baptiste: 321, 322, 347
MONCKTON Christopher: 128, 134
MONTINI Giovanni Battista: 30, 45, 66, 67, 72
MORGAN Peter: 494
MOST William G.: 400
MOYNIHAN Robert: 107
MURRAY John: 93
N
São NICOLAU: 305
NOCENT Adrien: 324, 342, 487
524
Índice Onomástico
525
Índice Onomástico
526
Índice Onomástico
527