Guia Unicef
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GUIA DE ESTRATÉGIAS
DE ÁGUA, SANEAMENTO E HIGIENE
PARA REDUÇÃO DE DOENÇAS
RELACIONADAS AO SANEAMENTO
AMBIENTAL INADEQUADO
2024
GUIA DE ESTRATÉGIAS
DE ÁGUA, SANEAMENTO E HIGIENE
PARA REDUÇÃO DE DOENÇAS
RELACIONADAS AO SANEAMENTO
AMBIENTAL INADEQUADO
PARCEIRA PARCERIA
REALIZAÇÃO: TÉCNICA: ESTRATÉGICA:
4 UNICEF UNICEF 5
FICHA TÉCNICA
Capacitação: planejamento em saneamento – Unicef+Ondas+UFMG
e a construção da educação popular em saneamento
REALIZAÇÃO
Fundo das Nações Unicdas para a Infância (UNICEF)
Gregory Bulit – Chefe de Emergências e WASH do UNICEF no Brasil
Rodrigo Resende – Oficial de WASH do UNICEF no Brasil
ELABORAÇÃO
Ondas e UFMG SanBas
COORDENAÇÃO GERAL
Renata de Faria Rocha Furigo
Rafael Kopschitz Xavier Bastos
COORDENAÇÃO EXECUTIVA
Profª. Uende Aparecida Figueiredo Gomes - DESA/UFMG
ILUSTRAÇÕES
Aline Franceschini e Isabela Izidoro - às margens
6 UNICEF UNICEF 7
No Brasil, o acesso universal, adequado e equitativo Em 2010, a ONU declarou que a água limpa e segura e
ao saneamento básico consiste em princípio fundamental o saneamento são um direito humano essencial para
da Lei Federal n° 11.445/2007, atualizada pela possibilitar os demais direitos humanos. Em 2015, o Brasil
Lei n° 14.026/2020 (BRASIL, 2007; 2020). assinou o compromisso da Agenda 2030, para cumprir 17
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), dentre eles
Apesar desse reconhecimento normativo, a violação do o ODS 6 – Assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da
direito humano ao saneamento básico ainda é verificada água e saneamento para todas e todos.
no Brasil e no mundo. A falta de acesso à água potável,
coleta e manejo de esgotos sanitários e condições Atualmente o Brasil registra um déficit urbano de
inadequadas de higiene coloca em risco a saúde e abastecimento de água de 7,1% da população. Esse déficit
compromete o futuro de meninas e meninos. O percentual não é uniforme: na região Norte é de 29,6%, no Nordeste, de
de crianças e adolescentes sem acesso a banheiro e rede 11,8%; Sudeste, Sul e Centro-Oeste têm déficits de 4,1%,
de esgoto no Brasil passou de 56,2%, em 2009, para 1,3% e 2,4%, respectivamente. Com relação a coleta de
44,6%, em 2018, e sem acesso a água passou de 3,7% esgotos, o déficit urbano nacional é de 38,1%, mas na região
para 3,6% no mesmo período, segundo a Pesquisa de Norte é de 84,2%; no Nordeste é de 63,3%; no Sudeste é de
Orçamentos Familiares (POF) (Unicef 2023). 16,3%; no Sul é de 46,9% e no Centro-Oeste é de 36,4%. Se
a variação entre as cinco regiões é grande, o mesmo ocorre
No Brasil, é predominante a perspectiva do saneamento entre os mais de cinco mil municípios.
básico resumido a obras de infraestrutura e desvinculado
do setor saúde, o que cria desafios para o diálogo sobre Ou seja, não é possível falar de saneamento utilizando os
as dimensões do planejamento e da garantia de direitos mesmos parâmetros para todas as regiões, municípios, ou
humanos essenciais ao exercício da cidadania e ao sequer dentro de um mesmo município. O que se pode dizer,
pleno gozo da vida. No contexto de compreensão das invariavelmente, é que garantir saneamento é disponibilizar
dificuldades de diálogo sobre esta temática, decorrentes os meios seguros de acesso à água potável, afastar e
de uma perspectiva tecnicista que caracterizou a área tratar os esgotos, adotar estratégias adequadas de manejo
de saneamento básico ao longo de sua história no país, das águas de chuva, e realizar a coleta e o tratamento dos
concebeu-se a proposta deste guia. resíduos sólidos. A forma de fazê-lo é aquela que melhor se
adequa à realidade local. Não se trata de um problema sem
Assim, o Unicef - Fundo das Nações Unidas para a Infância, o solução, pois há inúmeras formas de garantir saneamento,
Ondas - Observatório dos Direitos à Água e ao Saneamento desde que tenhamos respeito pela diversidade socioambiental
e a UFMG - Universidade Federal de Minas Gerais se uniram e cultural brasileira.
para o desenvolvimento deste material didático e pedagógico.
Para percorrermos o caminho da universalização do
Neste guia será apresentada a relação entre saneamento, tendo algo positivo para apresentar ao mundo
saneamento e saúde humana, bem como as estratégias em 2030, é preciso um projeto mais arrojado, que se
para implementação de condições adequadas de adapte melhor aos cenários existentes. Não se trata de
abastecimento de água, saneamento e higiene, com foco questão tecnológica ou de viabilidade econômica, mas
na redução de doenças e agravos à saúde humana. Você de realidades sociais e ambientais que precisam ser
vai conhecer os tipos de doenças que podem ser prevenidas respeitadas.
8 UNICEF UNICEF 9
Já o Saneamento Ambiental é definido na publicação Perceba que os conceitos de Saneamento Básico, Saneamento
“Política e Plano Municipal de Saneamento Ambiental” Ambiental e WASH possuem como elemento central a Saúde.
(2005), do Ministério das Cidades e da Organização Pan- E conforme definido pela Organização Mundial da Saúde (OMS),
Americana da Saúde (Opas), como: “o conjunto de ações na Conferência Internacional de Saúde de 1946 (BRASIL, 1948):
técnicas e socioeconômicas entendidas fundamentalmente
como de saúde pública, tendo como objetivo alcançar níveis
crescentes de salubridade ambiental, compreendendo o
abastecimento de água em quantidade e dentro dos padrões
de potabilidade vigentes, o manejo de esgotos sanitários, de A saúde é um estado de completo
águas pluviais, de resíduos sólidos e emissões atmosféricas,
o controle ambiental de vetores e reservatórios de doenças, a bem-estar físico, mental e social,
promoção sanitária e o controle ambiental do uso e ocupação
do solo e a prevenção do controle do excesso de ruídos, tendo e não apenas a ausência de doença
como finalidade promover e melhorar as condições de vida
urbana e rural”. ou enfermidade.
A Organização Mundial da Saúde (OMS), por sua vez, utiliza o
acrônimo WASH para se referir às condições de abastecimento
de água, saneamento e higiene (Water, Sanitation and Hygiene),
UNICEF/BRZ/Jenny Marques
e afirma que condições seguras de WASH são cruciais para
a saúde e o bem-estar humano. A organização destaca que
além de pré-requisitos para a saúde, as condições seguras
de WASH contribuem para os meios de subsistência, a
frequência escolar e a dignidade, além de ajudar a criar
comunidades resilientes que vivem em ambientes saudáveis.
O gozo do melhor estado de saúde que lhe Nesse contexto, é importante conhecermos as Doenças
seja possível atingir, como um dos direitos Relacionadas ao Saneamento Ambiental Inadequado (DRSAI),
um conjunto de agravos transmissíveis à saúde, relacionados
fundamentais de todo ser humano, seja ao contexto ambiental, à infraestrutura, aos serviços e às
instalações operacionais que contribuem ou dificultam a
qual for sua raça, sua religião, suas opiniões
reprodução da vida no contexto do saneamento ambiental. O
políticas, sua condição econômica ou social. quadro 1 reúne essas doenças e agravos (BRASIL, 2010a).
Quadro 1 - Doenças Relacionadas ao Saneamento Ambiental Este quadro foi proposto no relatório intitulado “Impactos na
Inadequado (DRSAI) saúde e no sistema único de saúde decorrentes de agravos
relacionados a um saneamento ambiental inadequado”,
da Fundação Nacional de Saúde (BRASIL, 2010), a partir da
sistematização de doenças e agravos realizadas por Cairncross
CATEGORIA DOENÇAS e Feachem (1993). Cabe ressaltar que novas doenças surgiram
após sua elaboração, como a Zika e a Chikungunya, e devem ser
Diarreias incorporadas em eventual atualização.
DOENÇAS DE
Febres entéricas
TRANSMISSÃO FECO-ORAL Importante observar que as DRSAI estão organizadas em
Hepatite A categorias conforme a rota de transmissão das doenças,
o que auxilia na identificação de estratégias para redução das
Dengue doenças e dialoga com a perspectiva da prevenção da saúde,
Zika
uma vez que a atenção está no processo de transmissão ao
invés do tratamento da doença (COSTA, DIAS, OLIVEIRA, 2022).
Chikungunya
Por exemplo, o acesso à água potável1 em quantidade
Febre Amarela
necessária para ingestão, preparação de alimentos e
DOENÇAS TRANSMITIDAS
Leishmanioses higiene pessoal, aliado à coleta e tratamento de esgotos
POR INSETO VETOR L. tegumentar sanitários reduzem doenças de transmissão feco-oral e
L. visceral
aquelas relacionadas aos hábitos de higiene; boas práticas
de abastecimento de água previne arboviroses, pois o
Filariose linfática
armazenamento inadequado pode resultar em focos de criadouro
Malária de mosquitos que transmitem doenças; estratégias de coleta
e manejo dos resíduos sólidos são fundamentais para reduzir a
Doença de Chagas
proliferação de ratos e outros vetores de doenças; e condições
Esquistossomose adequadas de drenagem e manejo das águas de chuva são
DOENÇAS TRANSMITIDAS ATRAVÉS
importantes para prevenir leptospirose, uma vez que a principal
DO CONTATO COM A ÁGUA Leptospirose forma de contaminação é o contato com urina de ratos em
Doenças dos olhos
eventos de enchentes.
1 Água potável: água que atenda ao padrão de potabilidade estabelecido na norma nacional e que não
Fonte: Adaptado de BRASIL, 2010. ofereça riscos à saúde.
16 UNICEF UNICEF 17
Figura 3 - Taxa de cobertura regular do serviço de coleta Quadro 2 – Critérios de caracterização do atendimento e do déficit ao
de resíduos domiciliares, por município brasileiro, 2021. saneamento no Brasil - Plansab - Plano Nacional de Saneamento Básico
Recebe água de
Recebe água potável
poço ou nascente
de rede geral de
na propriedade, sem
distribuição;
canalização interna;
ABASTECIMENTO Recebe água de
Utiliza água de
poço ou nascente
DE ÁGUA cisterna de captação
na propriedade, com
de água
canalização interna.
de chuva.
Possui coleta
Possui coleta domiciliar domiciliar por rede
ESGOTAMENTO por rede geral de geral de esgotos,
Todas as
esgotos, seguida de não seguida
SANITÁRIO situações não
tratamento; de tratamento;
enquadradas
Possui fossa séptica. Possui fossa
nas definições
rudimentar.
de atendimento
Fonte: SNIS (2021) e que se
Dentre o conjunto constituem
com coleta, a parcela em práticas
Coleta direta ou indireta
de domicílios que se consideradas
(4), na área urbana,
Os estudos que subsidiaram a elaboração do Plansab encontram em pelo inadequadas*.
com frequência mínima
LIMPEZA menos uma das
- Plano Nacional de Saneamento, aprovado em 2014 e de três vezes por
seguintes situações:
URBANA E semana e destinação
revisado em 2019, indicam baixos índices de acesso ao final ambientalmente
· na área urbana,
MANEJO com coleta cuja
saneamento básico. Este quadro revela que a situação sanitária adequada dos resíduos;
frequência não seja
DE RESÍDUOS · Coleta direta ou
do Brasil não é compatível com sua situação econômica, já de pelo menos três
indireta, na área rural,
que o país já foi considerado a sexta maior economia do globo. SÓLIDOS vezes por semana;
com destinação final
com destinação final
Entre as contribuições do Plansab, está a definição de acesso ambientalmente
ambientalmente
adequada dos resíduos.
adequado, deficitário e sem atendimento. Para aprender mais inadequada dos
resíduos
sobre este tema apresentamos os Quadros 2 e 3 a seguir,
sugerimos também consulta à versão revisada do Plansab.
Para o manejo de águas pluviais e drenagem urbana ainda não
MANEJO DE foi possível o desenvolvimento de um conceito de déficit capaz
ÁGUAS PLUVIAIS de apresentar um panorama nacional. Existem dois problemas:
um problema conceitual - já que o manejo de águas pluviais é
E DRENAGEM transversal em diversas áreas e um problema de ausência de dados
URBANA - a coleta de dados sobre este componente somente foi iniciada
pelo SNIS em 2018.
A exemplo de coleta de água em cursos de água ou poços a longa distância; lançamento direto de esgoto em
valas, rio, lago, mar ou outra forma pela unidade domiciliar; ausência de coleta, com resíduos queimados ou
enterrados, jogados em terreno baldio, logradouro, rio, lago ou mar ou outro destino pela unidade domiciliar.
Quadro 3 – População (%) com atendimento adequado e com déficit, Importante observar que a exclusão do acesso ao saneamento
por componente do saneamento básico no Brasil, em 2017, segundo configura violação de direitos humanos. Neves-Silva e Heller
conceito adotado no Plansab. (2016; 2022) abordam que o reconhecimento de que a água é
elemento fundamental para assegurar as necessidades básicas
dos seres humanos foi inicialmente estabelecido em 1977
durante a Conferência das Nações Unidas sobre Água em Mar
COMPONENTE ATENDIMENTO DÉFICIT Del Plata, na Argentina.
ADEQUADO
Atendimento Sem
O plano de ação desenvolvido durante aquela conferência
precário atendimento determinava que todas as pessoas, independente da situação
econômica e social, tinham direito ao acesso à água potável
em quantidade e qualidade suficiente para garantir as
ABASTECIMENTO necessidades básicas. Desde então, foram desenvolvidos vários
DE ÁGUA 59,9 37,4 2,7 planos de ação reconhecendo a água e o esgotamento sanitário
como direito humano.
BRASIL
22,7% - 17,9%
Segundo o Programa Nacional de Saneamento Rural (PNSR), apenas • isolamento político e geográfico das localidades e
40,5% da população rural brasileira tem atendimento adequado seu distanciamento das sedes municipais;
ao abastecimento de água, enquanto 33,5% dessa população
tem atendimento precário e 26,0% não é atendida. Quanto ao • localização em área de difícil acesso, seja por via
esgotamento sanitário, os números são ainda mais alarmantes, com terrestre ou fluvial;
apenas 20,6% com atendimento adequado, 54,1% com atendimento
precário e 25,3% sem atendimento. Por fim, a realidade do manejo de • limitação financeira ou de pessoal, por parte dos
resíduos sólidos para a população rural é tão ou mais preocupante - municípios, o que dificulta a execução dos serviços
23,6% com atendimento adequado, 20,9% com atendimento precário voltados para o saneamento;
e 55,5% sem atendimento. (BRASIL, 2019).
• ausência de estratégias que incentivem a participação
Ainda de acordo com o PNSR (2019), as metas estabelecidas social e o empoderamento dessas populações;
nos Planos Plurianuais do Governo Federal de 2004 a 2019
relacionadas às políticas públicas de saneamento rural • inexistência ou insuficiência de políticas públicas de
contemplavam apenas ações de abastecimento de água e de saneamento rural, nas esferas municipais, estaduais ou
esgotamento sanitário. Tal fato evidencia o descompasso das federal (BRASIL, 2019).
políticas públicas voltadas para ações de manejo de resíduos sólidos
e drenagem de águas de chuva em relação aos demais eixos.
UNICEF/BRZ/Jenny Marques
26 UNICEF UNICEF 27
Figura 5 - Incidência de internações por DRSAI e 2019, representando 21,7% dos óbitos atribuídos a doenças
a cada 100.000 habitantes, em 2022. infecciosas e parasitárias no período. As principais causas
de óbito foram Doença de Chagas, diarreia e disenteria,
que corresponderam a quase 81,5% do total. Outros números
chamam atenção: o maior número de óbitos ocorreu em pessoas
com 60 anos ou mais de idade (371,5 óbitos/100 mil hab.); 67,5%
dos óbitos por diarreias e disenteria ocorrem em pessoas com
idade superior a 60 anos e 12,8% em crianças menores de 1
ano, evidenciando maior fragilidade da saúde nos extremos
etários; e a Região Nordeste apresentou o maior número de
óbitos por diarreias e disenteria (22.131 ou 40,4%) (IBGE, 2021).
essencial para o pleno gozo da vida, Tal exigência foi regulamentada pelo Decreto nº 7.217 de
2010, o qual determinava sua validade a partir do exercício
o Brasil apresenta grandes déficits que financeiro de 2014. No entanto, os prazos limites para a
elaboração dos planos de saneamento foram ampliados para
resultam em números preocupantes 31 de dezembro de 2015, depois 31 de dezembro de 2017,
31 de dezembro de 2019, 31 de dezembro de 2022 e, até o
de adoecimento e óbitos. Para que a momento, 31 de dezembro de 2024.
população tenha esse direito respeitado, Os planos de saneamento básico são instrumentos que
reúnem planejamentos de curto, médio e longo prazos
é necessário transformar de forma para as ações correspondentes, e devem ser construídos
a partir de ampla discussão com a sociedade. O plano
efetiva a realidade atual. Nesse sentido, apresenta os problemas relacionados ao abastecimento de
água, ao esgotamento sanitário, à drenagem e ao manejo
precisamos falar um pouco sobre das águas pluviais e ao manejo de resíduos sólidos, e aponta
o que a Prefeitura Municipal, os prestadores de serviços de
planejamento e como estão organizadas saneamento básico e a população devem fazer em busca de
uma solução adequada (SanBas, 2023).
as políticas públicas do setor de
saneamento no Brasil. O Plano Municipal de Saneamento Básico,
comumente denominado PMSB, constitui o meio
pelo qual o município pode se organizar para
O planejamento é instrumento indispensável para implementação universalizar o acesso e melhorar a qualidade dos
da política pública de saneamento básico. Pelo seu caráter de
serviços prestados à população. Neste sentido, é um
ordenação de ações e de auxílio em tomadas de decisões,
tem papel social essencial na universalização do saneamento, instrumento de redução das desigualdades sociais
ao proporcionar condições para concretização dos objetivos
traçados. O planejamento desenvolvido adequadamente e de proteção dos recursos naturais e ambientais
potencializa a gestão dos serviços, com correções operadas
em curto prazo e projeções de ações em médio e longo prazo, (CORDEIRO, 2022).
reduzindo improvisações e decisões emergenciais
(LISBOA; HELLER; SILVEIRA, 2013).
32 UNICEF UNICEF 33
Para alcançar os objetivos propostos, é fundamental que se O Panorama dos Planos Municipais de Saneamento Básico
tenham recursos financeiros suficientes, recursos humanos no Brasil, publicado em janeiro de 2017, coletou informações
capacitados e participação social. Nesse sentido, é preciso sobre a elaboração dos planos de uma amostra de 3.903
que a população e o corpo técnico das prefeituras e serviços de municípios brasileiros, correspondente a 70% do total. Os
saneamento possuam o conhecimento necessário tanto para a dados reportam que, à época, 30% destes possuíam plano e
formulação, como para o acompanhamento da implementação 38% estavam em elaboração (BRASIL, 2017).
dos Planos Municipais de Saneamento Básico (PMSB).
Após a publicação desse panorama, a Equipe da
Além disso, é fundamental que o PMSB se estabeleça como Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) envolvida no
parte integrante da Política Municipal de Saneamento. desenvolvimento do Projeto SanBas construiu um banco
De acordo com Peixoto (2022), a compreensão de tudo que de dados sobre os PMSB no Brasil, a partir de duas
consiste a Política Municipal de Saneamento Básico é de questões centrais: “Possui PMSB?” e “Foram localizados?”.
fundamental importância para a sua instituição e para a correta A primeira, referente à existência de PMSB, foi respondida
organização e gestão dos serviços de saneamento básico. O conforme declaração dos municípios ao Sistema Nacional
mesmo autor define a política municipal como: de Informações sobre Saneamento (SNIS) no ano de 2021.
A segunda foi preenchida de acordo com a localização
dos documentos por busca ativa em diferentes fontes de
o conjunto de normas legais e regulamentares disponibilização dos planos, como Funasa, sites institucionais,
notícias veiculadas, e contato direto via telefone ou e-mail com
e de atos jurídicos e administrativos que definem os os responsáveis pelos órgãos municipais.
princípio e diretrizes e estabelecem como ela deve ser
Nas Tabelas 1 e 2, apresentadas a seguir, são detalhadas as
executada. Isso inclui os planos, programas, projetos informações referentes ao Brasil, Amazônia Legal e Semiárido.
267 49 108
NÃO DECLAROU
AO SNIS
4,8% 6,3% 8,6%
TOTAL DE
MUNICÍPIOS
5570 772 1262
34 UNICEF UNICEF 35
Tabela 2 – Municípios com PMSB localizados Figura 6 – Panorama do planejamento em saneamento nos municípios
da Amazônia Legal, declaração ao Sistema Nacional de Informações
em Saneamento
VARIÁVEIS BRASIL AMAZÔNIA LEGAL SEMIÁRIDO
PMSB
LOCALIZADO
62 49 34
PARCIALMENTE
1,1% 6,3% 2,7%
TOTAL DE
MUNICÍPIOS
5570 772 1262
Sobre o semiárido brasileiro (Figuras 8 e 9) o panorama de Figura 9 – Panorama do planejamento em saneamento nos municípios
planejamento segue a mesma tendência do observado para do Semiárido Brasileiro, PMSB disponibilidade de documentos
a Amazônia Legal. Conforme Tabelas 1 e 2, dos 1262, somente
497, 39,4% dos municípios da região declararam ao SNIS
possuir PMSB e destes somente os PMSB de 293 municípios,
23,2% do total, foram efetivamente localizados.
Conforme o Art. 25 do Decreto nº 7.217/2010 (BRASIL, 2010b), Segundo este documento, o PMSB precisa contemplar os
que regulamenta o Art. 19 da Lei nº 11.445/2007 (BRASIL, quatro componentes dos serviços de saneamento básico e
2007), o PMSB deve abranger, no mínimo: abranger todo o território do município, ou seja, áreas urbanas
e rurais, incluindo comunidades tradicionais, e também onde
notadamente reside população de baixa renda (por exemplo,
favelas, ocupações irregulares e assentamentos precários).
Além disso, o plano deve ser elaborado com horizonte de
I. diagnóstico da situação e de seus impactos nas planejamento de 20 anos, com metas de prazos imediato, curto,
condições de vida, utilizando sistema de indicadores de médio e longo, de forma a alcançar gradualmente a universalização
saúde, epidemiológicos, ambientais, inclusive hidrológicos, dos serviços de saneamento básico (BRASIL, 2020). Ainda de
e socioeconômicos e apontando as causas das deficiências acordo com o TR Funasa, cada etapa de elaboração do PMSB
detectadas; é composta por atividades específicas e deve culminar em um
Produto, conforme apresentado no Quadro 4.
II. metas de curto, médio e longo prazos, com o objetivo de
alcançar o acesso universal aos serviços, admitidas soluções
graduais e progressivas e observada a compatibilidade com
os demais planos setoriais; ETAPA DE PRODUTO
ELABORAÇÃO DO PMSB RELACIONADO
III. programas, projetos e ações necessários para atingir os
objetivos e as metas, de modo compatível com os respectivos
Produto A, contendo: portaria de
planos plurianuais e com outros planos governamentais
nomeação do Comitê Executivo; ma-
correlatos, identificando possíveis fontes de financiamento; peamento dos atores locais; proposta
Atividades iniciais de composição do Comitê de Coorde-
nação; proposta com a definição dos
IV. ações para situações de emergências e contingências; e Setores de Mobilização; relatório de
acompanhamento das atividades*.
V. mecanismos e procedimentos para avaliação sistemática
da eficiência e eficácia das ações programadas.
Produto B, contendo: decreto de no-
meação do Comitê de Coordenação e
respectivo regimento interno; relatório
da estratégia de mobilização, partici-
Elaboração da estratégia pação social e comunicação, prevendo
de mobilização, participação todos os eventos participativos, tendo
Importante destacar que no Brasil o processo de planejamento social e comunicação do PMSB sido aprovada por deliberação do
do saneamento nos municípios é direcionado por Termos de Comitê de Coordenação; relatório de
acompanhamento das atividades*, in-
Referência - documento técnico que guia a elaboração do formando qual sistema de informação
PMSB. Dentre os mais conhecidos e utilizados, está o Termo de será adotado na elaboração do PMSB.
Referência para Elaboração de Plano Municipal de Saneamento
Básico da Fundação Nacional de Saúde (TR Funasa-2018 Construção do diagnóstico técnico-par-
Produto C, contendo: relatório do
Termo de referência para elaboração de plano municipal de ticipativo dos serviços de saneamento
diagnóstico técnico-participativo e
básico, englobando os quatro componen-
Saneamento Básico (funasa.gov.br)). tes, com base no enfoque técnico em
apresentação do quadro com o resu-
mo analítico do diagnóstico do PMSB;
diálogo permanente com a população,
relatório de acompanhamento das
realizado por meio dos eventos previstos
atividades*.
na estratégia participativa do PMSB
40 UNICEF UNICEF 41
é fundamental estabelecer diretrizes a serem seguidas Essa premissa se torna ainda mais
para auxiliar na tomada de decisão, visando solucionar as
situações adversas de maneira rápida e eficiente, incluindo a importante quando olhamos para o
prevenção, controle e contenção de riscos à saúde (BRASIL,
2014; SANBAS, 2016). processo saúde-doença, uma vez
que o reconhecimento do território
permite identificar e localizar riscos,
Emergência não é rotina! É preciso agir em
causas, danos e os determinantes
tempo oportuno, de forma qualificada e
sociais associados, contribuindo
cooperativa!
para as intervenções serem mais
resolutivas, atendendo às necessidades
e respondendo aos problemas de saúde
O município deve ser protagonista na e saneamento em territórios específicos
elaboração do PMSB, pois é o maior (MONKEN et al, 2022).
conhecedor de sua própria realidade!
UNICEF/BRZ/Jenny Marques
Não é possível planejar e executar
sem ter conhecimento do contexto.
É evidente que a maioria das medidas de controle das DRSAI são observar a diversidade e as particularidades do território, identificando,
as ações de saneamento, que como vimos até aqui, é um campo em conjunto com a população, as reais necessidades e a definição
interdisciplinar, com estratégias que envolvem a implantação de de estratégias adequadas para cada contexto identificado.
tecnologias, as mudanças de comportamento e a utilização de
ferramentas para monitoramento, regulação e financiamento.
Com relação aos serviços para manejo de resíduos sólidos, Promoção da higiene
assim como para os demais eixos, a definição da solução
técnica deve levar em consideração o contexto local. Por e educação em saúde
exemplo, no meio rural, onde há menor densidade populacional
e, em especial, situações de isolamento ou de dificuldades
de acesso, considera-se a ampliação de ações de educação
popular em saúde e saneamento para fortalecer a premissa da
Política Nacional de Resíduos Sólidos (2010) de não geração, Os espaços coletivos e institucionais
redução, reutilização, reciclagem e, em última instância, a
possibilidade de implantar aterros locais (BRASIL, 2019). passaram a receber maior
Nesse contexto, não podemos deixar de mencionar a atenção no campo das ações
importância do papel cumprido pelos catadores de materiais
recicláveis e reutilizáveis. O Programa Nacional de Saneamento de água, saneamento e higiene,
Rural (PNSR) recomenda a integração desse trabalho ao manejo
de resíduos sólidos, de modo que possam atuar não só na etapa principalmente na última década,
de destinação, mas também na coleta e mobilização social
(BRASIL, 2019). com destaque para as escolas e
os estabelecimentos de saúde.
Esses locais foram incorporados
A ampliação e a adequação das soluções
nos indicadores dos Objetivos de
de saneamento nos diversos e desiguais
Desenvolvimento Sustentáveis
espaços no Brasil é urgente!
(ODS), por serem ambientes de
fácil transmissão e multiplicação de
UNICEF/BRZ/Jenny Marques
• o controle de vetores, a partir do manejo adequado De forma complementar, Roose et al (2010) e Jenkins
dos resíduos sólidos e das águas pluviais. e Sugden (2006), sugerem realizar poucas práticas
de cada vez, iniciando pelas que apresentam maior
benefício para a saúde e nas quais as comunidades
têm maior interesse. Outro ponto crucial é ampliar o
discurso sobre os efeitos positivos da promoção da
O acesso a essas infraestruturas e soluções técnicas deve ser
garantido à população no âmbito doméstico, bem como em higiene para além das melhorias na saúde, incluindo
espaços coletivos, tais como escolas, estabelecimentos de saúde, pautas como dignidade, privacidade, estatuto social,
rodoviárias, portos, aeroportos, banheiros públicos, entre outros. redução de gastos, entre outras.
Os serviços de saneamento devem ser regularmente Sobre o monitoramento previsto, os responsáveis pelo
prestados, com atendimento universal e adequado à fornecimento de água à população devem verificar
toda população do município, cumprindo os requisitos rotineiramente se a água fornecida atende aos requisitos
legais. Nesse sentido, cabe lembrar que todo esgoto deve legais para ser considerada potável, e as secretarias de saúde
ser coletado e tratado antes de ser lançado nos corpos cumprem o papel de fiscalizar se esses prestadores de serviço
receptores, em conformidade com a Resolução CONAMA estão cumprindo a norma.
nº 430/2011, que dispõe sobre as condições e padrões de
lançamento de efluentes (BRASIL 2011). Além da fiscalização realizada pelas secretarias de saúde,
é importante salientar o importante papel das agências
reguladoras de saneamento básico, que são responsáveis
por fiscalizar e regular os serviços de saneamento básico
prestados pelos municípios, observando padrões de qualidade
No que se refere ao abastecimento de e eficiência na prestação dos serviços, manutenção e
operação dos sistemas, regulação tarifária dos serviços
água, os prestadores de serviço devem prestados, cumprimento de metas estabelecidas etc.
2 Controle da qualidade da água para consumo humano: conjunto de atividades exercidas regular-
mente pelo responsável pelo sistema ou por solução alternativa coletiva de abastecimento de água,
destinado a verificar se a água fornecida à população é potável, de forma a assegurar a manutenção desta
condição (BRASIL, 2017)
3 Vigilância da qualidade da água para consumo humano: conjunto de ações adotadas regularmente
pela autoridade de saúde pública para verificar o atendimento a este Anexo e avaliar se a água consumi-
da pela população apresenta risco à saúde (BRASIL, 2017)
62 UNICEF 63
Desde 2000 a norma brasileira de potabilidade assume A ferramenta orienta aos prestadores de serviços priorizar
elementos da gestão preventiva de riscos à saúde, sendo as ações de melhorias e gerir o desempenho do sistema
que, em sua última atualização (2021), a norma recomenda de esgotamento sanitário, olhando para toda a cadeia de
expressamente aos prestadores de serviços a elaboração serviços (desde a coleta, transporte, tratamento, destinação
do Plano de Segurança da Água (PSA). e disposição final), sob a perspectiva da gestão preventiva de
riscos à saúde (WHO, 2022). Apesar desse instrumento não
ser tão difundido como o PSA, ele deve se destacar no campo
do saneamento quando falamos de saúde, pois ele promove
a articulação entre ambos os setores, além de auxiliar na
O PSA é definido como um instrumento construção de sistemas melhores (WHO, 2022).
Esse instrumento ganha destaque para o setor saúde, Como vimos, água, saneamento
pois possui como pano de fundo a segurança da água
para consumo humano, a partir do controle e eliminação e higiene são elementos que despertam
dos riscos à saúde, em tempo oportuno, em todo processo
de produção e distribuição da água. Dessa forma, a norma fascínio, no entanto, persistem grandes
contribui diretamente na prevenção e promoção da saúde.
desafios, venha conosco, faça parte
Em uma perspectiva semelhante, a OMS desenvolveu
diretrizes para o Plano de Segurança do Esgoto (PSE), no da transformação da nossa realidade
entendimento que para além de assegurar o consumo
seguro da água é preciso gerir adequadamente as sanitária e vamos de mãos dadas!
excretas, águas cinzas e efluentes produzidos pelas
atividades humanas sem oferecer riscos à saúde. Assim
como o PSA, esse instrumento também está voltado para os
prestadores de serviços, tendo como base a abordagem de
avaliação e gerenciamento de riscos à saúde, mas com foco
para o sistema de esgotamento sanitário (WHO, 2022).
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