SC Cosit N 311-2019
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SC Cosit N 311-2019
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Coordenação-Geral de Tributação
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Solução de Consulta n.º Cosit
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Relatório
1. A Consulente relata que era contratada de determinado grupo econômico e
que, em outubro de 2015, esse contrato foi abruta e unilateralmente rescindido, causando-
lhe relevantes perdas econômicas.
2. Referida ruptura motivou o ajuizamento, por parte do titular da Consulente, de
reclamação trabalhista contra as pessoas jurídicas contratantes, reclamação essa que partia
da premissa de que os serviços foram prestados com relação de subordinação e que,
portanto, deveria ser tratada na esfera trabalhista.
3. Afirma que, em acordo de conciliação, o autor da reclamação trabalhista
reconheceu que a relação havida era de natureza comercial e contratual, e assim, em
contrapartida, as reclamadas aceitaram pagar à Consulente indenização patrimonial no valor
de R$ 3.000.000,00 (três milhões de reais).
4. Relata ainda a Consulente que foi ajuizado embargo de declaração, por não
haver ficado claro na Ata de Conciliação que o valor acordado tinha natureza de indenização
por dano patrimonial, de maneira que a outra parte ficasse desobrigada de reter e recolher o
imposto de renda, como dispõe o art. 39, inciso XVIII, do Decreto 3.000/99.
5. Os embargos foram providos, tendo decidido a autoridade judicial que a
indenização deu-se em reparação patrimonial à rescisão contratual outrora mantida entre a
empresa do autor e as reclamadas.
6. Sustenta a Consulente que, para além de inquestionável, a não incidência do IR
e CSLL nos termos do art. 39, XVIII, do Decreto nº 3000/99, os valores são também
impassíveis de tributação pela Contribuição para o PIS/Pasep e pela Cofins, justamente pelo
fato de tais valores não serem incluídos no cômputo do rendimento bruto da empresa, que é
a base de cálculo das citadas contribuições, a teor do art. 195 da CF/88.
7. Anexou à consulta, dentre outros documentos: a) petição inicial da reclamação
trabalhista; b) ata da audiência na qual ocorreu a homologação do acordo entre as partes; c)
embargos de declaração opostos pelas reclamadas; e d) decisão judicial acerca dos embargos
de declaração.
8. Ao final, formula a seguinte indagação:
“É correto o entendimento da consulente de que os valores acordados não
compõem a base de cálculo do IR, da CSLL, do PIS e da Cofins, por serem
reparação de dano patrimonial em virtude de rescisão de contrato? ”
Fundamentos
DA ADMISSIBILIDADE E DOS EFEITOS DA CONSULTA
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17. Ainda na reclamação trabalhista, afirmou que a relação teve por termos iniciais
e finais, respectivamente, 25/02/2012 e 06/11/2015, e que desde agosto/2015 “não recebeu
as comissões a que tem direito, derivadas de contratos já firmados”, bem como não recebeu
todo o montante incidente sobre operação específica realizada antes do encerramento
abrupto do contrato.
18. Em resumo, e em suas próprias palavras afirma que “faz jus, portanto, ao
recebimento das comissões e diferenças inadimplidas nas épocas próprias, acrescidas de juros
e correção monetária desde os respectivos vencimentos e também de comissões vincendas,
derivadas” de diversos contratos firmados pela tomadora dos seus serviços, ora reclamada.
19. Deste modo, até aqui, as declarações firmadas pelo titular da consulente na
reclamação trabalhista anexada permitem concluir que: a) havia prestação de serviços aos
reclamados; b) os serviços eram remunerados mediante aplicação de percentual sobre os
contratos firmados pelo tomador do serviço com terceiros; c) o contrato firmado entre o
titular da consulente e os reclamados foi interrompido antes do prazo contratual, que não foi
explicitado na consulta; d) houve inadimplemento contratual em decorrência de serviços
prestados; e e) valores que eram devidos pelo titular da consulente em razão de contratos já
firmados deixaram de ser pagos em virtude da abrupta interrupção do contrato.
20. Na esteira do narrado em sua reclamação trabalhista, e já antecipando que a
suposta relação trabalhista foi caracterizada pelo magistrado como uma relação comercial,
não há dúvidas de que os valores devidos à consulente até o momento da interrupção
contratual dizem respeito ao adimplemento do preço cobrado pelos serviços prestados.
21. No mesmo sentido, a ata da audiência que homologou o acordo firmado entre
o titular da consulente e os tomadores dos seus serviços explicita que “as partes avençam que
o acordo ora entabulado se estabelece reconhecendo relação comercial entre duas Pessoas
Jurídicas”, que por essa razão os valores pagos em razão do acordo seriam pagos em favor da
consulente “a título de indenização nos termos da lei civil, por serviços prestados após 2014”.
22. Como a consulente havia afirmado, tanto na consulta quando na reclamação
trabalhista, que o encerramento abrupto do contrato ocorreu em 2015 (outubro na consulta
e novembro na reclamação), e a homologação do acordo expressava que a indenização se
dava por serviços prestados após 2014, a conclusão a que se chega é a de que tais valores
teriam a natureza jurídica de adimplemento pelos serviços prestados entre 2014 e o
encerramento unilateral do contrato. De modo que, a priori, não haveria novos reflexos
tributários, uma vez que as receitas devidas em razão de tais serviços já deveriam ter sido
oferecidas à tributação independentemente do recebimento efetivo de tais valores.
23. No entanto, opostos os embargos de declaração, o magistrado afirmou que “a
combinação final foi no sentido de que se reconhecia relação material entre pessoas jurídicas
e o valor do acordo dava-se por reparação de danos patrimoniais à empresa do autor em
razão da rescisão do contrato civil outrora mantido”, o que altera sobremaneira a natureza
jurídica de tais valores. É que, se a ata de homologação do acordo deixava claro que os
valores serviriam para o adimplemento pelos serviços prestados, a sentença proferida nos
embargos evidencia que tais valores em verdade são devidos como forma de reparação em
razão da interrupção do contrato. Em outras palavras, se antes dos embargos estávamos
diante de quantia destinada à quitação pelos serviços prestados no passado, agora estamos
diante de valores destinados a reparar a perda pelo que seria recebido pelos serviços que
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seriam prestados no futuro, cuja frustração foi provocada pelo contratante da consulente
mediante a interrupção abrupta e unilateral do contrato.
24. É no Código Civil que encontramos a natureza jurídica de tais valores, mais
exatamente na parte final no art. 402, que transcrevemos a seguir:
Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos
devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que
razoavelmente deixou de lucrar. (grifo nosso)
25. Doutrinariamente denomina-se “lucros cessantes” aquilo que razoavelmente
se deixou de lucrar, não havendo que o confundir com os chamados “danos emergentes”.
Neste sentido recorremos ao escólio de Rosa Maria de Andrade Nery (in NERY, Rosa Maria de
Andrade. Direito Civil: Obrigações, Volume 1 – Coleção doutrina, processos e procedimentos.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 989), que ao efetuar a distinção entre os dois
institutos nos ensina que “o dano emergente traduz-se em efetiva diminuição do patrimônio
do lesado; o lucro cessante consiste na frustração de um ganho que era esperado, de um
acréscimo patrimonial que o lesado teria, se não tivesse ocorrido o fato danoso”.
26. Portanto, a conclusão a que se chega é a de que os valores recebidos pela
consulente em razão do acordo homologado possuem como fundamento aquilo que
razoavelmente ela deixou de lucrar em razão da interrupção abrupta e unilateral do contrato,
de modo que o questionamento da consulente pode, em tese, ser reformulado para: é
correto o entendimento da consulente de que os lucros cessantes não compõem a base de
cálculo do IR, da CSLL, da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins? Deste modo, é sobre a
temática dos reflexos tributários do recebimento de lucros cessantes que versará a resposta
desta consulta.
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Art.70. A multa ou qualquer outra vantagem paga ou creditada por pessoa jurídica,
ainda que a título de indenização, a beneficiária pessoa física ou jurídica, inclusive
isenta, em virtude de rescisão de contrato, sujeitam-se à incidência do imposto de
renda na fonte à alíquota de quinze por cento.
(...)
§ 3º O valor da multa ou vantagem será:
(...)
II - computado como receita, na determinação do lucro real;
III - acrescido ao lucro presumido ou arbitrado, para determinação da base de
cálculo do imposto devido pela pessoa jurídica.
§ 4º O imposto retido na fonte, na forma deste artigo, será considerado como
antecipação do devido em cada período de apuração, nas hipóteses referidas no
parágrafo anterior, ou como tributação definitiva, no caso de pessoa jurídica isenta.
§ 5º O disposto neste artigo não se aplica às indenizações pagas ou creditadas em
conformidade com a legislação trabalhista e àquelas destinadas a reparar danos
patrimoniais.
29. Referido dispositivo legal foi regulamentado pelo Decreto nº 3.000, de 26 de
março de 1999 (RIR/99, vigente quando formulada a consulta), no artigo 39, inciso XVIII -
aplicável ao Imposto de Renda das Pessoas Físicas – IRPF, e no art. 681, § 5º, relativo ao
Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas – IRPJ (esses dispositivos vigem hoje na forma do art.
35, III, “d” e do art. 740 do Anexo do Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018).
LIVRO I
DA TRIBUTAÇÃO DAS PESSOAS FÍSICAS
Art.39. Não entrarão no cômputo do rendimento bruto:
(...)
XVIII - a indenização destinada a reparar danos patrimoniais em virtude de rescisão
de contrato;
(...)
LIVRO II
DA TRIBUTAÇÃO DAS PESSOAS JURÍDICAS
Art. 681. Estão sujeitas ao imposto na fonte, à alíquota de quinze por cento, as
multas ou quaisquer outras vantagens pagas ou creditadas por pessoa jurídica,
ainda que a título de indenização, a beneficiária pessoa física ou jurídica, inclusive
isenta, em virtude de rescisão de contrato.
(...)
§ 3º O valor da multa ou da vantagem será (Lei nº 9.430, de 1996, art. 70, § 3º):
(...)
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§ 4º O imposto sobre a renda retido na fonte, na forma prevista neste artigo, será
considerado como antecipação do imposto sobre a renda devido em cada período
de apuração, nas hipóteses previstas no § 3º, ou como tributação definitiva, quando
se tratar de pessoa jurídica isenta (Lei nº 9.430, de 1996, art. 70, § 4º).
§ 5º O disposto neste artigo não se aplica às indenizações pagas ou creditadas em
conformidade com a legislação trabalhista e àquelas destinadas a reparar danos
patrimoniais.
30. Como a indenização em causa opera-se de pessoa jurídica para pessoa jurídica
em decorrência de rompimento de contrato de natureza comercial, o fato descrito pela
consulente não tem supedâneo no art. 39, inciso XVIII, do RIR/99, que diz respeito a isenção
aplicável à pessoa física. Embora a autoridade judicial, nos embargos de declaração, tenha
feito referência ao art. 39, inciso XVIII, do RIR/99, ela própria afirma que o pagamento
decorre de uma relação comercial e se dá em benefício da pessoa jurídica da qual o
reclamante da ação trabalhista é titular. Tanto assim, que a presente consulta é formulada
pela pessoa jurídica e diz respeito à tributação desta.
31. Em realidade, o objetivo essencial dos embargos de declaração não foi o de
determinar a aplicação da isenção prevista no art. 39, inciso XVIII, do RIR/99 à pessoa física do
sócio da Consulente, mas esclarecer a natureza de reparação de dano patrimonial ao
pagamento, bem como que o valor do acordo não foi líquido, mas cabal e único. Assim se
expressa a parte dispositiva da decisão dos embargos de declaração:
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22. Leandro Paulsen (op.cit. p. 745), por seu turno, trilha o mesmo
caminho:
“Está bastante sedimentada a jurisprudência no sentido de que as
indenizações não ensejam a incidência de imposto de renda, pois não
implicam acréscimo patrimonial, apenas reparam uma perda,
constituindo mera recomposição do patrimônio. A análise da natureza de
cada verba, contudo, é que apresenta maior complexidade, implicando
divergências. Isso porque nem tudo que se costuma denominar de
indenização, mesmo material, efetivamente corresponde a simples
recomposição de perdas. Assim é que apenas a indenização-reposição do
patrimônio é que ficaria ao largo da incidência do IR, o mesmo não
ocorrendo com indenização-reposição [do lucro] e com a indenização-
compensação (dano moral ou extrapatrimonial), conforme bem destaca
Eduardo Gomes Philippsen (...).” (grifei)
23. Portanto, a variação patrimonial positiva é inerente à percepção
indenização a título de lucros cessantes, uma vez que o beneficiário recebe valor
que não constava de seu patrimônio mas que, contudo, esperava auferir, caso não
houvesse sofrido os efeitos da conduta lesiva.
24. De plano, verifica-se que esse “lucro esperado”, tivesse sido
normalmente percebido, não ensejaria qualquer dúvida quanto à elevação
patrimonial que representa e, por conseguinte, quanto à incidência dos tributos em
tela. É incongruente, desse modo, que a percepção de valores que visam substituir o
lucro frustrado receba tratamento tributário diverso daquele que o próprio lucro
receberia, uma vez que ambos possuem a mesma natureza de variação patrimonial
positiva.
25. O anteriormente exposto pode ser assim resumido:
a) o pagamento de valores a beneficiário pessoa física, a titulo de
reparação por dano causado a pessoa jurídica da qual a pessoa física faz
parte na condição de sócio não caracteriza recebimento de indenização
em decorrência de rescisão contratual;
b) somente a parcela de indenização relativa à redução real verificada no
patrimônio da pessoa lesada encontra-se abrangida pela norma legal que
determina a não tributação do IR em caso de indenização por rescisão de
contrato, uma vez que tal reparação não constitui acréscimo patrimonial;
c) o recebimento de valores passiveis de enquadramento sob o título de
“lucros cessantes” sujeita-se à tributação do Imposto de Renda, já que
nessa hipótese a reposição destina-se a compensar a elevação patrimonial
que presumivelmente ocorreria, não fosse o advento do ato lesivo.
34. Como se vê, a SC nº 86 – SRRF04/Disit, de 2011, faz uma distinção clara entre
duas modalidades de indenização patrimonial: a) a indenização por “dano emergente”, que
visa tão-somente, e na mesma medida, recompor perda efetivamente ocorrida e
quantitativamente determinada, não gerando ganho patrimonial e b) a indenização por
“lucros cessantes”, que visa compensar uma perda futura de lucros, que na hipótese da não
ocorrência do ato danoso, teria efeito aumentativo do patrimônio. Assim sendo, a
indenização por lucros cessantes, segundo o mesmo conceito, constitui fato gerador do IR.
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II - (VETADO)
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(...)
Art. 12. A receita bruta compreende: (Redação dada pelo art. 2º da Lei nº
12.973/2014)
I - o produto da venda de bens nas operações de conta própria; (Incluído pelo art.
2º da Lei nº 12.973/2014)
III - o resultado auferido nas operações de conta alheia; e (Incluído pelo art. 2º
da Lei nº 12.973/2014)
IV - as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não
compreendidas nos incisos I a III. (Incluído pelo art. 2º da Lei nº 12.973/2014)
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47. Em relação aos requisitos que devem ser atendidos na formulação da consulta,
destaca-se o seguinte (grifou-se):
(...)
XI - quando não descrever, completa e exatamente, a hipótese a que se referir,
ou não contiver os elementos necessários à sua solução, salvo se a inexatidão
ou omissão for escusável, a critério da autoridade competente;
(...)
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51. Porém, com relação à Contribuição para o PIS/Pasep e à Cofins, a referida Solução de
Consulta nº 21 – Cosit, de 2018, concluiu pela incidência de tais contribuições no regime de
apuração não cumulativa, reformando, inclusive, a Solução de Consulta nº 455 - Cosit, de 20
de setembro de 2017, em convergência com o entendimento aqui firmado.
Conclusão
52. Isso posto, soluciona-se a consulta afirmando que:
Assinado digitalmente
ELADIO ALBUQUERQUE COSTA NETO
Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil
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Assinado digitalmente
RAUL KLEBER GOMES DE SOUZA
Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil
Chefe da Direi
Ordem de Intimação
Assinado digitalmente
FERNANDO MOMBELLI
Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil
Coordenador-Geral da Cosit
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