Silas Falcao MIOLO Pequenos Assombros
Silas Falcao MIOLO Pequenos Assombros
Silas Falcao MIOLO Pequenos Assombros
2018
© Bruno Paulino, 2018
Ficha técnica
Editor
Silas Falcão/Luazul Edições
Revisão
Bruno Paulino
Capa
Arievaldo Viana
Diagramação
Léo de Oliveira
Ficha Catalográfica
Bibliotecária Perpétua Socorro Tavares Guimarães
CRB 3/801-98
60p.
ISBN: 978-85-420-1152-4
CDD: 869
O momento que mais assusta
costuma ser aquele justamente
antes de começar.
Stephen King
Para o vô Luís Paulino que
não tinha medo de nada e
contava, como ninguém,
histórias de assombros.
A linhagem do medo
Carlos Vazconcelos
SALVA - VIDAS
17
A reação de todos foi tentar correr, mas se fez
impossível, pois continuamente lhe faltaram
forças, os corpos foram ficando paralisados e
adormecidos num pavor de transe, apesar de
as ideias permanecerem ainda perfeitamente
claras em suas mentes.
18
VISA
GEM
19
Até que o velho simplesmente sumiu.
20
UM VELHO
GATO
21
Mas era também um preguiçoso dos diabos,
igual a todos os outros gatos, ou pelo menos
parecido com Garfield, aquele gato das tiri-
nhas.
22
Não sei bem porque, os gatos têm seus mis-
térios, nos ensina o mestre Allan Poe em Gato
Preto. Sei que imediatamente recordei do
Dumbledore, o bichano mais legal que tive.
Companheiro fiel das horas de ócio, e fiquei
imaginando que ele deve estar no outro mun-
do aprontando das suas nas madrugadas, va-
gabundeando felinamente, tramando assom-
bros contra quem o envenenou.
23
A BOTIJA DE
DONA GUIDINHA
25
Em certa noite chuvosa, a terceira filha mais
velha do casal de agricultores que adquirira a
casa de seu Paiva — uma solteirona — sonhou
com a velha Dona Guidinha esticada em um
caixão no meio da sala. Vestia preto como as
antigas matriarcas trajando luto. Ela se apro-
ximou para ver a defunta que lhe abriu os
olhos, levantando-se em seguida.
26
os pais e contar-lhes o sonho com a antiga dona
da casa. Seu pai lamentou o relato, e disse à
filha que se ela tivesse seguido o conselho
da aparição, a situação financeira da família
teria mudado, já que ele cresceu ouvindo dos
mais velhos que quem toma coragem e encara
“arrancar” uma botija, vira rico. O curioso
é que realmente próximo ao local indicado
pela falecida como sendo o lugar do suposto
tesouro, havia uma marca no concreto de uma
mão, como se há algum tempo atrás algo tivesse
sido enterrado ali e posteriormente cimentado
novamente com aquela marca. Mesmo assim
ninguém ousou arrebentar o lugar para ver se
havia ou não a botija de Dona Guidinha.
27
O EXTERMINADOR DE
LAGARTIXAS
29
mas dois rabos nele. Nunca confirmei a vera-
cidade dessa engenhosa teoria cientifica, po-
rém, quando num tiro certeiro o rabo da la-
gartixa permanecia apresentando espasmos
depois de despregado do corpo era inevitável
que minha frutífera imaginação ansiasse que
emergisse dali um novo, grandioso e mons-
truoso lagarto, com potencial destrutivo e ca-
tastrófico.
30
O CASARÃO DAS
PEDRAS
31
e sem uma explicação racional, a única solu-
ção encontrada pelos simplórios moradores
foi mudar-se e procurar ajuda.
32
Então, confrontado pelos populares que re-
produziam em todas as esquinas da cidade o
acontecido com o padre e a beata, o delegado
Prudêncio reuniu seus principais auxiliares,
organizou uma expedição e foi ao amaldiçoa-
do recanto. Lá chegando também foi agredido
por uma saraivada de pedras e viu labaredas
de fogo surgirem no interior da casa.
33
Mantendo sua fama de destemido, e contra-
riando os conselhos dos populares, o jornalista
foi sozinho à sinistra morada entender aquele
caso.
Sobretudo à noite.
34
A MALDIÇÃO DO
VELHO PROFETA
Muitas mortes.
35
Ninguém deu trela às palavras malditas do ve-
lho profeta quando ele foi embora sozinho, hu-
milhado, rejeitado e expulso; um morto-vivo
alimentado e sustentado apenas pelo gosto da
vingança na boca.
36
Foi quando uma risada sinistra como se fos-
sem as trombetas do apocalipse retiniu por
entre as chamas.
37
GRI A
DO L
É
TOS M
39
Palavras soltas em voz de fúria e histeria: cle-
mência, misericórdia e perdão eram os apelos
mais recorrentes. Vozes indistintas, sucessi-
vas que ninguém sabia dizer quem as emitia.
40
A busca durou a noite inteira. E, embora a var-
redura tenha sido minuciosa, resultou inútil.
Clemência
Misericórdia
Perdão
41
autores de tamanho sacrilégio, quando fugis-
sem ao amanhecer.
42
minhado para Boa Fé. Convocado pelo povo
para exorcizar o cemitério, apesar de relu-
tante, inexperiente e também temeroso o re-
verendo não se fez de rogado, e afirmou que
se de fato havia energias do mal no cemitério
devia-se ao fato de ter existido ao lado um
terreno que servia de campo de açoite onde
muitos escravos foram torturados, violenta-
dos, mortos e enterrados, pois não podiam
ser sepultados juntos aos brancos no lado de
dentro da necrópole; dizia isso, pois tinha lido
essas informações nas anotações de um velho
caderno, espécie de diário que tinha encon-
trado na biblioteca da casa paroquial, escrito
provavelmente por algum outro padre que
há muito tempo morou ali. Nas anotações do
caderno também identificara que muitas víti-
mas da peste da cólera foram queimadas na-
quele campo putrefato. E assim chegou a con-
clusão que o local estava “carregado”.
43
e encontrassem a luz divina e, enfim, pudes-
sem perdoar os antepassados daquela gente.
44
EXCERTOS DO ESTRANHO DIÁRIO
DO DR. ALBUQUERQUE
45
Boa Fé, 7 dezembro de 1890
46
Boa Fé, 12 de janeiro de 1891
47
fera. No entanto tem uma forte evidencia que
não posso negar: ontem era noite de lua cheia.
48
da casa-grande enquanto fumava cachimbo.
A cena é aterrorizante. Todos estão chocados.
Os trabalhadores da fazenda relataram-me
que ainda entraram em confronto com o bi-
cho, atiraram nele, mas sem sucesso. Três ca-
chorros se engalfinharam com a fera, e foram
bastante açoitados. Talvez não sobrevivam.
Vou por um fim a esses assassinatos. Na pró-
xima lua cheia vou matar o Lobisomem. Não
tenho mais dúvidas, pois são fortes as evidên-
cias que me levam a crer que o Lobisomem
trata-se mesmo de Lupanar Oliveira, excêntri-
co sujeito.
49
um grito estridente perto do meu esconderijo.
De repente um vulto, a proximidade e o luar
foram me permitindo perceber aquela criatu-
ra repleta de pêlos, um monstro terrível, um
Lobisomem.
Um homem morto.
Eu matei o lobisomem.
50
O DESPERTAR DOS
CASSACOS
51
pas, as ambulâncias, os comércios, as escolas.
Um pandemônio.
52
POSFÁCIO
53
nem por isso o leitor deverá deixar de ler e re-
ler estes Pequenos assombros. O que fica ao
término desse livro é um gostinho de quero
ler mais e para isso existem os livros anterio-
res a esses contos de visagem que podem ser
lidos e apreciados por todas as idades. Essa
abertura que a obra de Bruno faz, lhe permite
atingir um vasto público não o restringindo a
leitores acadêmicos ou os que não têm tanta
informação teórica sobre a arte literária.
54
os contos O exterminador de lagartixas e Visa-
gem. O uso recorrente do narrador em primei-
ra-pessoa também é de uso dos cantadores,
dos repentistas e dos trovadores, preciso di-
zer que Bruno bebe dessa safra nordestina de
cordelistas encantadores do sertão?
55
vem demonstrando desde sua primeira inter-
venção literária na crônica e que aqui se rea-
firmam nestes contos. Isso não quer dizer que
o conto deva ser um texto escrito exclusiva-
mente de poucas páginas, note bem: é que a
modernidade tem exigido isso dos artistas.
56
de memórias as páginas de Bruno Paulino. Se não
são, serão de observações. (...) Pois Bruno sai em
passeio pelo passado, por gentes e bichos, terras e
águas...” esse comentário foi sobre a sua obra
de estreia, Lá nas Marinheiras e outras crô-
nicas, mas aproveito o ensejo e reafirmo esse
lado observador que o autor desses Pequenos
assombros tem. Eis um observador atento a
tudo o que lhe cerca e isso o faz contador de as-
sombros, estórias, crônicas, contos e visagens.
57
Bruno Paulino, quixeramobinense graduado em Le-
tras/Português pela UECE- Universidade Estadual do
Ceará – e FECLESC - Faculdade de Educação, Ciências
e Letras do Sertão Central. Autor dos livros de crôni-
cas A Menina da Chuva; Lá nas Marinheiras. Escritor e
professor de Língua Portuguesa da Rede Pública de
Ensino. Bruno Paulino é uma das referências quando
se fala em Literatura no Sertão Central do Ceará. No
seu livro mais recente, Sertão: poetas e prosadores, traça
perfis literários de vários escritores ligados ao Sertão
Central, destacando, sobretudo, os residentes em Qui-
xeramobim e Quixadá. O livro A Menina da Chuva, em
2ª edição, foi adotado em colégios da rede particular
de ensino de várias cidades do Sertão Central (CVA,
CPEF, CACD, CNRS e SENSO). Bruno organizou tam-
bém a antologia Cordéis de Histórias e faz parte das ins-
tituições literárias AQL - Academia Quixadaense de
Letras - desde 2013, sendo o primeiro escritor nascido
em outra cidade a integrar o quadro de acadêmicos, e
AQUILETRAS - Academia Quixeramobinense de Le-
tras, Ciências e Artes - no que tem colaborado para a
promoção da literatura na região.