Livro Texto Bioquimica Clinica Completo
Livro Texto Bioquimica Clinica Completo
Livro Texto Bioquimica Clinica Completo
Graduada em Ciências Biológicas, modalidade médica, pela Universidade Santo Amaro – Unisa (1981), possui
especialização em clonagem em Bacillus subtilis pelo Public Health Department of the City of New York (1982),
mestrado em Bioquímica, na área de Biologia Celular e Molecular (1989) e doutorado em Bioquímica, na área de
Biologia Celular e Molecular (2003), ambos pela Universidade de São Paulo (USP). Tem pós-doutorado na Faculdade
de Medicina da USP com Dr. Roger Chammas, na área de adesão celular, e foi chefe de Departamento da Engenharia
Química da Fundação Armando Alvares Penteado – Faap (1994-2000). Foi professora do Instituto de Pesquisa e
Ensino em Saúde de São Paulo (Ipessp) na área de Bioquímica Básica e Clínica. Atualmente é docente titular da
Universidade Paulista.
Graduado em Ciências Biológicas, modalidade médica (bacharel em Biomedicina), pela Universidade de Mogi das
Cruzes – UMC (2002), é especialista em Genética Médica e Citogenética pelo Instituto de Assistência Médica ao Servidor
Público Estadual de São Paulo – Iamspe (2004), especialista em Administração Hospitalar pelo Ipessp/Unicid (2011) e
doutor em Ciências, na área de Citogenômica, pelo Programa de Patologia pela Faculdade de Mecidina da USP – FMUSP
(2015). Atualmente é docente titular da Universidade Paulista.
Biomédico graduado pela UMC (1996), especialista em Diagnóstico Laboratorial de Doenças Tropicais pela
FMUSP, mestre em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da USP (2000) e doutor em Patologia Ambiental
e Experimental pela UNIP (2017). Possui habilitação nas áreas de Análises Clínicas, Microbiologia, Imunologia,
Parasitologia e Saúde Pública. Atualmente é docente titular da Universidade Paulista, além de membro do Banco de
Avaliadores (BASis) do Inep.
CDU 616-074
U515.45 – 22
© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor
Unip Interativa
Material Didático
Comissão editorial:
Profa. Dra. Christiane Mazur Doi
Profa. Dra. Angélica L. Carlini
Profa. Dra. Ronilda Ribeiro
Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista
Profa. Deise Alcantara Carreiro
Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto
Revisão:
Vitor Andrade
Ingrid Lourenço
Sumário
Bioquímica Clínica
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................9
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................9
Unidade I
1 FUNDAMENTOS BÁSICOS EM BIOQUÍMICA CLÍNICA E A COLETA DE
MATERIAL BIOLÓGICO PARA OS ENSAIOS BIOQUÍMICOS................................................................... 11
1.1 Tipos de amostras e contextualização pré-analítica no laboratório
de bioquímica................................................................................................................................................. 11
1.2 Coleta de sangue venoso a vácuo.................................................................................................. 15
1.3 Como separar e armazenar o soro................................................................................................. 18
1.4 Recomendações do CLSI (Clinical & Laboratory Standards Institute)
para a sequência de tubos na coleta de sangue venoso a vácuo............................................. 19
2 PRINCIPAIS MÉTODOS ANALÍTICOS UTILIZADOS EM BIOQUÍMICA CLÍNICA............................ 23
2.1 Reações colorimétricas e cinéticas (com ou sem coenzimas) em
equipamentos semiautomatizados, automatizados e manuais................................................ 23
2.2 Fotometria................................................................................................................................................ 27
2.3 Quimioluminescência e eletroquimioluminescência.............................................................. 27
2.4 Ensaios imunoenzimáticos: marcadores tumorais, drogas
terapêuticas e de abuso............................................................................................................................. 29
2.4.1 Marcadores tumorais............................................................................................................................. 30
2.4.2 Drogas terapêuticas ou de abuso...................................................................................................... 30
3 CONTROLE DE QUALIDADE EM BIOQUÍMICA CLÍNICA...................................................................... 44
3.1 Controles internos e externos no laboratório de bioquímica e boas
práticas laboratoriais................................................................................................................................... 45
3.1.1 Controle interno da qualidade........................................................................................................... 47
3.1.2 Controle externo da qualidade.......................................................................................................... 47
3.2 Métodos estatísticos de controle.................................................................................................... 47
4 PERFIL BIOQUÍMICO RENAL E DOS FLUIDOS CORPORAIS............................................................... 55
4.1 Estrutura microscópica dos rins e filtração renal..................................................................... 56
4.2 Biomarcadores hidroeletrolíticos – sódio e potássio.............................................................. 58
4.3 Biomarcadores de função e lesão renal....................................................................................... 58
4.3.1 Creatinina.................................................................................................................................................... 59
4.3.2 Ureia.............................................................................................................................................................. 60
4.3.3 Ácido úrico................................................................................................................................................. 62
4.3.4 Microalbuminúria.................................................................................................................................... 62
4.4 Avaliação da função renal em termos laboratoriais............................................................... 63
4.4.1 Secreção tubular e filtração glomerular......................................................................................... 63
4.4.2 Equação de Cockcroft-Gault............................................................................................................... 64
4.4.3 Equação MDRD (modification of diet in renal disease)........................................................... 65
4.4.4 A equação CKD-EPI (chronic kidney disease epidemiology collaboration)...................... 66
4.4.5 Equação de Schwartz (específica para crianças)........................................................................ 66
4.4.6 Clearance de inulina............................................................................................................................... 67
4.5 Marcadores séricos para monitoramento de doenças renais.............................................. 67
4.6 O exame de urina tipo 1: aspectos fisico-químicos................................................................ 69
4.6.1 Exame de características físicas......................................................................................................... 69
4.6.2 Exame de características químicas................................................................................................... 71
4.7 Líquidos cavitários................................................................................................................................ 76
4.7.1 Análise bioquímica dos principais líquidos cavitários.............................................................. 77
Unidade II
5 PERFIS BIOQUÍMICOS HEPÁTICO E PANCREÁTICO............................................................................. 87
5.1 Perfil hepático......................................................................................................................................... 87
5.2 Sistema hepatobiliar: as bilirrubinas e as doenças correlatas............................................ 91
5.3 Marcadores de função hepática...................................................................................................... 93
5.4 Avaliação do funcionamento do pâncreas endócrino e exócrino..................................... 98
5.5 Importância clínico-laboratorial das determinações enzimáticas da
amilase e lipase; fibrose cística, pancreatite, hipo e hiperglicemias........................................ 99
5.6 Metabolismo glicídico: diabetes mellitus, diabetes gestacional, intolerância
à glicose e hipoglicemias. Determinações laboratoriais de testes de
tolerância e sobrecarga, frutosamina, hemoglobina glicosilada e glicemia.......................106
5.7 Medicamentos que influenciam no funcionamento pancreático...................................116
6 PERFIL BIOQUÍMICO LIPÍDICO, CARDÍACO E DE TRANSTORNOS MUSCULARES...................117
6.1 O infarto agudo do miocárdio (IAM)...........................................................................................117
6.2 Vantagens e desvantagens dos testes bioquímicos..............................................................124
6.3 Dislipidemias, aterosclerose e o IAM...........................................................................................125
6.4 Gasometria.............................................................................................................................................132
6.4.1 Distúrbios do equilíbrio ácido-básico........................................................................................... 134
7 PERFIL BIOQUÍMICO DAS ENFERMIDADES ÓSSEAS.........................................................................137
7.1 Metabolismo dos íons (cálcio, fósforo e magnésio)..............................................................137
7.1.1 Metabolismo do cálcio....................................................................................................................... 137
7.1.2 Metabolismo do fósforo..................................................................................................................... 140
7.1.3 Metabolismo do magnésio............................................................................................................... 142
7.2 Patologias mais comuns ligadas ao metabolismo de cálcio,
fósforo e magnésio....................................................................................................................................144
7.2.1 Osteoporose............................................................................................................................................ 144
7.2.2 Osteomalácia.......................................................................................................................................... 145
7.2.3 Raquitismo.............................................................................................................................................. 146
7.3 Marcadores bioquímicos de metabolismo ósseo atualmente em uso...........................147
7.3.1 Marcadores de reabsorção óssea.................................................................................................... 147
7.4 Perfil funcional tireodiano: triiodotironina total e livre, tetraiodotironina,
TSH e calcitonina........................................................................................................................................148
7.4.1 Patologias relacionadas com o funcionamento da tireoide................................................ 149
7.4.2 Perfil funcional das paratireoides e situações patológicas: hipoparatireodismo e
hiperparatireodismo....................................................................................................................................... 153
7.4.3 Medicamentos e alimentos que afetam o funcionamento da tireoide.......................... 155
8 MARCADORES TUMORAIS E A AVALIAÇÃO BIOQUÍMICA DE TUMORES.................................156
8.1 Vias de sinalização..............................................................................................................................158
8.2 Diagnóstico............................................................................................................................................159
8.2.1 Marcadores tumorais (MT)................................................................................................................ 159
APRESENTAÇÃO
O assunto da presente disciplina corresponde a uma das principais áreas de atuação do profissional.
Com o maior quantitativo e menu de testes laboratoriais, essa ciência permite uma visão integrada do
paciente, evidenciando doenças e confirmando suspeitas clínicas do médico assistente.
Dado tal cenário, este livro-texto aborda as bases fundamentais da área, desde a coleta de um
material biológico até os critérios de qualidade laboratorial. Aprofunda, ainda, os conhecimentos
do metabolismo humano aplicado à clínica médica, avaliando-se os perfis hepáticos, pancreáticos,
cardíacos, lipídicos, tireoidiano e ósseo, além do metabolismo do ferro e os marcadores tumorais
no contexto das doenças humanas (como diabetes, dislipidemias, coronariopatias, doenças
autoimunes e câncer).
Por meio deste livro-texto, o aluno poderá compreender melhor o funcionamento de diferentes
órgãos e a fisiopatologia das doenças, realizando a adequada interpretação clínica dos resultados dos
exames laboratoriais bioquímicos e contribuindo, dessa forma, para o diagnóstico, o prognóstico e
mesmo a terapêutica dos nossos pacientes.
INTRODUÇÃO
Pode-se dizer que a bioquímica estuda a química da vida. Em cada célula existente há várias
reações químicas de síntese (anabolismo), de degradação (catabolismo), ou intermediárias entre esses
dois processos (metabolismo). Dessa forma, o estudo do metabolismo pode explicar como está a saúde
de uma célula.
A forma mais simples de entender o funcionamento celular é analisar as reações químicas por
intermédio da quantificação de biomoléculas como enzimas que catalisam as reações metabólicas, dos
substratos e dos produtos. Entre os materiais biológicos que podem ser analisados, podemos citar o
sangue, a urina e o liquor; já entre os analitos temos a glicose, o colesterol e a ureia, além de enzimas,
como transaminases, no sangue.
Como sabemos o valor de referência de cada enzima, podemos analisar sua hiperfunção ou
hipofunção (também chamada de biomarcador), quantidade de substrato e de produto e, por
conseguinte, da reação. Avaliando-se as reações particulares de cada órgão, saberemos o que está
ocorrendo com sua função principal, chamando-as de perfil renal, perfil cardíaco, perfil hepático etc.
Além disso, sabe-se que algumas doenças são silenciosas, e, por vezes, os exames periódicos ou de
checkup são os únicos que podem prevenir ou diagnosticar o início de um desenvolvimento danoso a
fim de que o tratamento seja mais eficaz.
9
No laboratório de análises clínicas, temos testes de rotina e outros mais complexos, como os que
usam DNA, RNA e hormônios, colaborando com outros exames realizados em setores como hematologia,
microbiologia, imunologia, endocrinologia, parasitologia e uroanálise.
Antigamente todos os procedimentos eram manuais, mas hoje a maioria é automatizada. Entretanto,
caso ocorra algum problema de manutenção no aparelho, será imprescindível a participação do
profissional do laboratório clínico. Vale acrescentar ainda que aparelhos sofisticados, sensíveis e técnicas
avançadas ajudam a garantir a minimização de erros analíticos e a confiança nos resultados obtidos.
O livro foi organizado em duas unidades, de forma que a unidade I apresenta um apanhado geral
acerca da coleta de material biológico, para as análises bioquímicas, uma introdução dos principais
métodos laboratoriais utilizados em diagnóstico bioquímico, noções sobre controle de qualidade nos
ensaios. Também foi introduzido o conceito de perfis através do estudo das patologias, associadas ao perfil
renal – urinário, compreende de forma plena os marcadores de adoecimento, métodos de diagnóstico.
Na unidade II, damos sequência ao estudo dos perfis, através da compreensão das principais patologias
e dos métodos de diagnóstico de fígado, pâncreas, sistema cardíaco, lipídico, alterações musculares,
enfermidades ósseas e de tumores.
10
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Unidade I
1 FUNDAMENTOS BÁSICOS EM BIOQUÍMICA CLÍNICA E A COLETA DE MATERIAL
BIOLÓGICO PARA OS ENSAIOS BIOQUÍMICOS
No contexto das análises clínicas, a bioquímica clínica é um dos setores com uma das maiores
demandas de exames a serem realizados rotineiramente. No que tange aos materiais biológicos que
podem ser utilizados para tais avaliações, podemos destacar:
• sangue total;
• plasma;
• soro;
• liquor;
• saliva;
• urina;
• sêmen.
Vejamos agora as características das principais amostras biológicas citadas e os principais cuidados
na obtenção/coleta desse tipo de material (mas não se esqueça de rever o conteúdo da disciplina sobre
fluidos corporais, ele será de grande valia para a bioquímica clínica!).
O soro é obtido após a centrifugação do sangue coletado em tubo seco (tubo de tampa vermelha
com ativador de coágulo). Devido à formação do coágulo, o soro não contém os fatores da coagulação
ou o fibrinogênio.
O plasma é obtido após a centrifugação do sangue coletado em tubo com anticoagulante, seja ele
EDTA, citrato de sódio ou heparina. A presença do anticoagulante inibe a formação do coágulo. No
plasma estão presentes os fatores da coagulação e o fibrinogênio.
11
Unidade I
Logo depois da coleta, os tubos precisam ser homogeneizados delicadamente por inversão para
que o anticoagulante se misture corretamente na amostra. Idealmente, as amostras sanguíneas
normais precisam ser processadas em até 4 horas após a coleta, e as anormais em até 1 hora.
O desafio do laboratório é saber se a amostra é adequada ou não: ele deve indicar um protocolo que
defina o tempo em que as amostras foram processadas, o qual deve ser o mais rápido possível.
O líquido sinovial é encontrado nas cavidades articulares (ombro, cotovelo e joelho) e tem como
função lubrificar, proteger, transportar nutrientes e remover impurezas do espaço articular. Há
uma pequena quantidade de líquido nas articulações, sintetizado pelas células sinoviais, que estão
localizadas na membrana sinovial. É formado a partir do ultrafiltrado do plasma acrescido de uma
substância chamada de ácido hialurônico, proteína de alto peso molecular, como fibrinogênio e
globulinas responsáveis pela viscosidade, glicose e ácido úrico.
O líquido pleural está localizado entre a pleura parietal e a pleura visceral dos pulmões e tem um
volume normal de, aproximadamente, 30 mL. Assim como todos os outros líquidos, a formação do
derrame pleural indica que houve alterações nas forças coloidosmótica e hidrostática, modificando o
equilíbrio e acarretando o acúmulo do líquido entre as membranas. Várias causas estão relacionadas
à formação do derrame pleural, entre elas infecções bacterianas, hemotórax, tuberculose e neoplasias.
Vale destacar ainda que a diferenciação entre transudato e exsudato permite identificar se o processo
patológico é local ou não.
A urina, líquido orgânico que contém substâncias metabólicas a serem eliminadas, tem sua
formação nos rins, sendo posteriormente coletada na bexiga e, por fim, expelida pela uretra. Dentro
da rotina clínica e laboratorial, o exame de urina é um dos mais pedidos hoje, independentemente da
especialidade médica ou da condição do paciente, fazendo dele um importante exame de triagem ou
para uma condição já estabelecida.
Podemos encontrar vários sinônimos para o exame de urina de rotina, como: urina tipo I, exame
de urina, sumário da urina, urina simples, análise físico-química da urina e do sedimento, elementos
anormais e sedimentoscopia (EAS), exame químico da urina (EQU) e pesquisa de elementos anormais
e sedimento (PEAS). O mais utilizado na prática clínica parece ser o exame de urina de rotina.
Para Motta, Corrêa, Motta (2001) e Lopes (2003), a influência dos fatores de erros não analíticos
está relacionada às condições que alteram o resultado dos testes, mas que não estão ligadas ao
problema pelo qual o exame foi solicitado. As variações pré-analíticas não fisiológicas podem estar
relacionadas à coleta, ao transporte e ao armazenamento das amostras. Para evitar tais erros, que
acabam por levar a problemas na interpretação dos resultados, os laboratórios clínicos devem
definir claramente quais são as variáveis a serem avaliadas a fim de melhor atender a demanda de
seus pacientes.
13
Unidade I
De forma simples, listamos a seguir alguns importantes aspectos a serem observados objetivando
a implementação de um sistema que garanta uma adequada obtenção de amostras/coleta de material
biológico para a realização de quaisquer exames laboratoriais e, em especial, para a realização dos
exames de bioquímica clínica:
• Coleta de material: especificar o material a ser colhido (sangue venoso, arterial, capilar, plasma,
soro, sangue total, urina rotina, urina de 24 horas etc.).
Após a chegada das amostras ao laboratório, ocorre a fase de processamento e preocupação com
a sua qualidade, que tem o propósito de identificar prováveis distorções nos métodos analíticos a
serem empregados e minimizar o risco de obtenção de resultados ilegítimos.
Algumas amostras serão rejeitadas por exibir interferentes, como hemólise ou lipemia, exigindo o
pedido de nova coleta. Outras serão aceitas, ainda que haja alguma condição inadequada, que deverá
ser registrada no laudo para avaliação do resultado pelo clínico.
Amostras inapropriadamente identificadas não devem ser aceitas ou processadas, exceto quando
forem de complexa aquisição, instáveis ou críticas, como biópsias, líquidos de derrame, líquido
cefalorraquidiano, material coletado por punção de sítios profundos, medula óssea, entre outras.
Nesses casos, para garantir a rastreabilidade, o laboratório deve ter um processo para receber as
14
BIOQUÍMICA CLÍNICA
amostras, com o reconhecimento do encarregado pela coleta (seja ela efetuada no laboratório ou
por terceiros), e oferecer os resultados para, quando necessário, corrigir a identificação com o uso de
dados que autorizem rastrear esse processo.
Como já citado, entre as inúmeras amostras biológicas que podem ser utilizadas para dosagens
bioquímicas, a amostra de sangue obtida por coleta venosa e o posterior fracionamento da amostra
de sangue total em plasma ou em soro são indubitavelmente as mais utilizadas, motivo pelo qual
decidimos apresentar a seguir uma breve revisão dos procedimentos que envolvem a coleta de sangue
venoso, sobretudo pelo método a vácuo, o mais utilizado no momento por suas vantagens técnicas e
eficiência na obtenção de amostras com menor índice de hemólise.
A punção sanguínea pode ser executada pelo sistema a vácuo e por seringa e agulha. Na primeira
situação, mais comum atualmente, antes da técnica de coleta, compete ao flebotomista checar o
nome completo do paciente com o nome impresso nos tubos e fazer a higienização das mãos. A
coleta tem início com a preparação do material. Logo após garrotear o braço a 4 cm acima do local
escolhido para a coleta, deve-se pedir ao paciente que feche a mão. A técnica segue com a escolha
da veia, que deve ser apalpada com o dedo indicador.
Após realizar a assepsia, espere secar e rosqueie a agulha no adaptador do sistema a vácuo. Em
seguida, insira a agulha em uma angulação oblíqua de 30°, com o bisel da agulha revertido para cima.
Coletam-se todos os tubos no mesmo instante, solta-se o garrote e, só depois, retira-se a agulha. A
fim de prevenir hematomas, deve-se fazer a compressão com o algodão. Para concluir, é importante
trocar o algodão por uma bandagem séptica.
A coleta de sangue com seringa e agulha é a técnica mais antiga para obter sangue venoso, sendo
também usada para aplicar medicamentos. Essa técnica oferece risco para o profissional de saúde, que,
além de manipular o sangue, deve também descartá-lo. Por isso, por motivos de segurança, a punção
venosa feita com seringa e agulha deve ser dispensada. Essas são as normas do manual CLSI (2008) do
Clinical & Laboratory Standards Institute (CLSI), antigo National Committee for Clinical Laboratory
Standards (NCCLS), um roteiro de padronização que teve os direitos autorais em português adquiridos
15
Unidade I
pela Anvisa. No entanto, na prática, ainda ocorrem casos de coleta de sangue com seringa e agulha,
basicamente em pacientes pediátricos e geriátricos.
Quando a punção é processada com seringa e agulha, o sangue deve correr para o interior da
seringa sem que seja necessário realizar qualquer esforço para puxar o êmbolo da seringa. Quando
isso não ocorre, o turbilhamento provocado pelo esforço causa modificações celulares. Terminada a
punção, a agulha deve ser removida da seringa e o sangue passado aos tubos, cumprindo a proporção
de sangue e anticoagulante.
• Solicite ao paciente que diga seu nome completo para a confirmação do pedido médico e
das etiquetas.
• Confira e ordene todo o material a ser usado no paciente de acordo com o pedido médico
(tubos, gaze, torniquete etc.).
• Higienize as mãos.
• Coloque as luvas.
• Insira o primeiro tubo a vácuo. Quando o sangue começar a fluir para dentro do tubo, desgarroteie
o braço do paciente e peça a ele que abra a mão.
• Após a retirada do último tubo, retire a agulha e faça a compressão no local da punção com
algodão ou gaze seca.
16
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Observação
Os tipos de amostras sanguíneas colhidas para análise são o soro, que é a parte líquida do sangue
obtido quando coletado em tubo sem aditivo após a centrifugação; e o plasma, que é a parte líquida
do sangue adquirido quando coletado em tubo com anticoagulante e após a centrifugação. Na
amostra de sangue total, o sangue mantém suas propriedades próximas à normalidade, alcançado
quando coletado em tubo com anticoagulante, e não sofre o processo de centrifugação.
Conforme a análise, o exame poderá ser feito no sangue total (exemplo: hemograma); no plasma
(exemplo: glicose e provas de coagulação); e no soro (exemplo: bioquímicos e sorológicos). Quando
a análise for efetuada no soro, este será obtido por meio da coleta em tubo sem anticoagulante
(seco), para que aconteça o processo de coagulação. Quando se planeja fazer a análise no plasma, a
amostra deverá ser obtida em tubo de ensaio, incluindo um anticoagulante específico. Dessa forma,
não ocorre a coagulação, pois o anticoagulante atrapalha um dos fatores da coagulação (geralmente,
o cálcio), dificultando a formação do coágulo.
As amostras devem ser identificadas com o nome completo do paciente, seu local de origem, o
exame a ser realizado e a data da coleta.
Deve ser enviada uma amostra para cada exame a ser realizado, com volume adequado, de forma
a possibilitar o manuseio da amostra dentro do laboratório, e as amostras devem estar associadas de
acordo com cada setor de processamento: biologia molecular, sorologia, microbiologia, bioquímica etc.
Após a retração do coágulo, o soro pode ser separado de duas maneiras: espontânea ou
mecanicamente.
• use uma pipeta Pasteur ou automática (cuidado para não tocar no coágulo a fim de que as
células não se misturem com o soro);
18
BIOQUÍMICA CLÍNICA
• guarde em geladeira por, no máximo, 72 horas, ou em congelador a – 20 °C, até o envio ao laboratório.
• aspire, transfira cuidadosamente e guarde o soro até o envio ao laboratório, conforme descrito
na separação espontânea.
Por muito tempo, os tubos de vidro foram o padrão para retirar amostras de sangue nos
laboratórios clínicos. Porém, devido ao aumento do interesse pela segurança dos profissionais
dos laboratórios, além da necessidade de simplificar a eliminação de resíduos biológicos, novos
tubos de plástico foram desenvolvidos.
Os tubos de plástico possuem algumas vantagens em relação aos de vidro, como maior resistência
a altas velocidades de centrifugação, menor criação de resíduos sólidos após a incineração e maior
flexibilidade para uso em laboratórios automatizados e com manipulação de amostras por meio de
sistemas robotizados.
A sugestão para a sequência dos tubos durante a coleta é respaldada no CLSI H3‑A6 (2008) e deve
ser reconhecida para que não ocorra a contaminação cruzada dos anticoagulantes quando há coleta de
vários analitos no mesmo indivíduo. Vale acrescentar que a mudança na sequência de tubos pode causar
a contaminação por aditivos no tubo seguinte e produzir resultados alterados nos analitos, significativos
nesse tipo de interferência. A ordem de coleta do CLSI foi, a princípio, alterada, considerando a coleta
em tubos plásticos, pois os tubos plásticos para soro (tampa vermelha ou amarela com gel separador)
incluem o ativador de coágulo, podendo causar variação nos resultados dos testes de coagulação. Em
relação a esse elemento, esses tubos devem ser colhidos após o tubo para coagulação (tampa azul).
Observe a sequência de coleta para tubos plásticos pelo CLSI H3-A6 (2008):
3 – Tubos para soro com ativador de coágulo, com ou sem gel separador, para a obtenção de soro
(tampa amarela e/ou vermelha).
19
Unidade I
Tubo gel
• EDTA: anticoagulante que age em conjunto com o cálcio. Indicado para exames ligados à área
de hematologia e tipagem sanguínea. Sua função é exercer a preservação de plaquetas. Frasco
com tampa roxa.
• Citratos: anticoagulantes que agem em conjunto com o cálcio, mas de forma diferente do EDTA.
São utilizados nos exames de coagulação. Frasco com tampa azul.
• Fluoretos: anticoagulantes que atuam em conjunto com o íon cálcio, sua utilização se destina ao
exame de glicemia por ser um inibidor enzimático, mantendo a glicose. Frasco com tampa cinza.
• Heparina: anticoagulante produzido pelo fígado, que age diretamente na proteína trombina,
impedindo a formulação da fibrina. Utilizado em exames de gasometria, hematologia e
imunologia. Não é indicado para teste de coagulação, fosfatos e esfregaços para hemograma.
Frasco com tampa verde.
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BIOQUÍMICA CLÍNICA
Segundo o CLSI (2008), todos os tubos precisam ser homogeneizados por inversão, e o número
de inversões pode mudar de acordo com o fabricante. Não se deve homogeneizar tubos de citrato
fortemente devido ao risco de ativação plaquetária e distorção nos testes de coagulação.
Lembrete
Observação
Importante reforçar que, além de todos os cuidados já apontados para uma coleta eficiente, a qual
representará a certeza de um exame bem realizado com laudo adequado, devemos estar atentos também
para questões que envolvem a possibilidade de lipemia e de hemólise das amostras, situações que podem,
indubitavelmente, trazer complicações para a realização dos exames e para a interpretação dos laudos.
O termo lipemia, por sua vez, está ligado a uma série de ocorrências metabólicas referentes ao
acúmulo de lipoproteínas (LP) ricas em triglicérides (TG), quilomícrons (Qm) e seus remanescentes,
lipoproteína de muito baixa densidade (VLDL) e seus resíduos, verificada após a ingestão de gorduras.
Depois de uma refeição gordurosa, o pico de quilomícrons é atingido, normalmente, entre 3 e 6 horas,
e, após o período de 12 horas, esses elementos não são mais detectáveis em pessoas normais.
A existência de lipemia no sangue interfere na dosagem de hemoglobina, fornecendo resultados de
CHCM falsamente aumentados, por exemplo.
21
Unidade I
Saiba mais
Outro aspecto importante para a realização dos exames bioquímicos é o jejum. A maior parte
das coletas para exames de sangue pode ser realizada com 3 horas sem consumir alimentos e, em
alguns casos, até mesmo sem a obrigação de jejum. O clássico período de 12 horas foi estabelecido
com origem no tempo máximo que uma pessoa em situações normais gasta para metabolizar todo o
alimento absorvido na última refeição, todos os valores de referência dos exames foram determinados
com base em um grupo de pessoas nessa circunstância de jejum. Porém, devido ao metabolismo
diferente de cada pessoa, nos dias de hoje, a maioria dos exames pede até 3 horas de jejum.
Em alguns casos especiais, o médico pode pedir exames com um intervalo de 2 horas desde a
última refeição: são os exames identificados como em estado pós-prandial. Nessa situação, o médico
faz a solicitação por escrito. Para a porção de glicose para diagnóstico de diabetes, o menor tempo
ainda é de 8 horas, e para colesterol ainda são necessárias 12 horas. O jejum fixado para o perfil
lipídico é de 12 a 14 horas, em razão da dosagem de triglicérides. Ainda assim, para todos os exames
mantém-se a regra de não ultrapassar 14 horas de jejum.
Estudos recentes mostram que é possível fazer a avaliação do perfil lipídico sem o jejum, com
a vantagem de refletir as condições fisiológicas do dia a dia e de evitar o desconforto e possíveis
complicações do jejum prolongado. Além disso, há um consenso europeu que afirma que as pequenas
variações observadas entre dosagens com e sem jejum para definição de valores de risco cardíaco
poderiam ser corrigidas se fossem estabelecidos novos valores referenciais. A dosagem com jejum
prolongado seria necessária somente quando o nível de triglicérides, fora do estado de jejum, estivesse
acima de 440 mg/dL.
22
BIOQUÍMICA CLÍNICA
No quadro a seguir são dadas as recomendações para a coleta do perfil lipídico com e sem jejum.
Observação
Nas reações colorimétricas, o produto formado tem uma cor, e a intensidade dessa cor pode ser
medida através de leitura de uma faixa específica do espectro. Esse tipo de reação colorimétrica é
23
Unidade I
amplamente utilizado com as metodologias cinéticas, ou seja, aquelas que envolvem a velocidade da
formação de um produto em um dado intervalo de tempo.
Uma molécula orgânica que se liga a uma enzima para ativar a reação química é chamada de
coenzima. As coenzimas podem ou não ser utilizadas como substratos nas reações químicas utilizadas
nas técnicas laboratoriais. Elas podem ser adicionadas aos testes para favorecer o aumento da
velocidade, por exemplo, em uma reação do tipo cinética, com a consequente diminuição do tempo.
Sabe-se que a luz consiste em uma onda eletromagnética que possui um comprimento incluído
em um determinado intervalo que vai da luz ultravioleta (UV) até a luz infravermelha (IV). No entanto,
o olho humano é capaz de visualizar um intervalo menor da luz, sendo suas faixas extremas não
identificáveis pelos olhos humanos.
Vale ressaltar que a luz branca é formada pela união de todas as cores contidas nessa faixa
UV‑IV, cores que podem ser vistas quando um feixe de luz branca incide sobre um prisma (elemento
poliédrico capaz de refratar a luz), conforme visto a seguir.
24
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Monocromador
Leitor
Para que a leitura seja possível, é necessária a presença de um reagente específico para interagir
com a molécula que se está avaliando. Por exemplo, se o objetivo da análise for avaliar a concentração
de glicose no soro de uma pessoa, será necessário o uso de um reagente que possa interagir somente
com a glicose, uma vez que a leitura se baseia na cor que a glicose terá após interagir com o reagente,
de forma que, na presença de outros componentes do soro, pode haver algum tipo de interferência
na leitura. Se houver aplicação da técnica de acordo com os protocolos descritos para cada leitura, o
resultado será altamente específico e fidedigno.
Existe outro método de análise que se baseia na absorção da energia radiante na faixa do
ultravioleta (340 nm e 365 nm), conhecido como reações de ultravioleta. Tal método é usado na
avaliação de enzimas hepáticas e ureia, por exemplo.
As análises colorimétricas são consideradas metodologias estáticas porque, uma vez adicionado
o reagente à amostra, a reação acontece imediatamente e não muda mais, porém existem reações
que levam determinado tempo para acontecer, tempo que acaba se tornando um método de avalição
para algumas substâncias; nesse caso, estamos diante de uma reação cinética. Levando em conta
que toda reação química gera um produto, a análise por reação cinética avalia o tempo de formação
desse produto, que pode levar segundos, minutos ou até mesmo horas (mas mesmo aqui o produto
25
Unidade I
é analisado por colorimetria). Nesse tipo de análise são utilizadas enzimas e coenzimas, que são
catalisadores (aceleradores) de reações químicas orgânicas.
c
0,600
Absorbância
0,400
b
0,200
a
0,000
0 5 10 15 20
Tempo de reação (min)
Na reação cinética em tempo fixo com medição em ponto final, a análise requer muita atenção
em relação ao tempo de incubação e à temperatura, baseando-se em conhecimentos prévios sobre a
reação que será realizada, bem como sobre seus tempos. Uma vez que se conhece o padrão da reação,
pode-se comparar com a reação decorrente da amostra.
0,500
0,400
Absorbância
T1 T2
0,300
0,200
0,100
0 5 10 15 20
Tempo de reação (min)
26
BIOQUÍMICA CLÍNICA
2.2 Fotometria
A fotometria é uma área da óptica que mede a luz de acordo com o brilho emitido e que é
captado pelo olho humano. Conceitualmente, o termo cromóforo se refere à quantidade de luz que
é absorvida por determinada substância ou objeto. Ou seja, quanto mais cromóforo for um objeto,
maior a quantidade de luz absorvida e mais escuro ele será.
No início das aplicações analíticas pelo método de fotometria, fazia-se apenas a observação visual
para definir a concentração de determinada substância, afirmando-se que quanto mais escura uma
substância, mais concentrada ela era.
Com o passar do tempo, notou-se que as mesmas substâncias vistas, por indivíduos diferentes,
resultavam em análises diferentes, já que o olho humano não obedece a um padrão na visualização
de cores, podendo variar entre cada um. Assim, com o intuito de eliminar essa variável, criaram‑se
soluções padrão por meio das quais se comparavam as substâncias submetidas à análise por
fotometria, porém ainda assim as análises não eram tão precisas quanto necessário. Posteriormente,
foram criados equipamentos capazes de quantificar com precisão a emissão de fótons (partícula
elementar da força eletromagnética) por determinada substância.
A luz consiste em uma onda eletromagnética, sendo, assim, composta de dois tipos distintos de
ondas: a elétrica e a magnética, que interagem entre si. E é a interação entre as ondas que compõem a
luz, juntamente com a interação da luz com a matéria, que é usada como princípio básico das análises
por fotometria.
O espectro de luz varia de acordo com a substância em um determinado solvente, e essa variação
faz com que esse tipo de análise se baseie em comparação, a qual se dá através do confronto
entre o espectro de uma substância e um espectro conhecido. As análises qualitativas fornecem
resultados pouco específicos, porém de extrema importância para avaliar a presença ou a ausência de
determinada substância. Já os resultados quantitativos oferecidos pela fotometria são precisos e vão
além da presença ou não, indicando também a quantidade/concentração de determinada partícula
em uma quantidade conhecida de solvente.
A quimioluminescência baseia-se na emissão de luz sem calor após uma reação química. Isso porque,
quando um átomo recebe alguma forma de energia, os elétrons mais próximos ao núcleo passam para
as camadas mais externas e retornam para as proximidades nucleares, num movimento (excitação
eletrônica) que gera energia em forma de luz. Um exemplo comum de reação de quimioluminescência
é o luminol, muito utilizado em medicina forense, o qual consiste em uma substância formada
por C8H7N3O2 + H2O2 que, ao interagir com moléculas orgânicas como o sangue, utiliza o ferro da
hemoglobina como catalisador da reação, gerando uma luz azul brilhante.
27
Unidade I
Anticorpos são moléculas proteicas produzidas por células de defesa (linfócitos B ou plasmócitos)
com a seguinte estrutura:
A principal característica dessa molécula é sua altíssima especificidade para se ligar e neutralizar
partículas exógenas (antígenos), e a aplicação dessas moléculas nas análises por quimio e
eletroluminescência lança mão exatamente de tal especificidade. Para tanto, anticorpos são construídos
artificialmente, contendo em sua porção FaB uma molécula conhecida como fluorocromo, que emite luz
ao interagir com a substância em análise.
Enzima
Fluorocromo
Anticorpo primário
Antigênio
A B
Figura 8 – Esquema de reação utilizando anticorpos marcados por fluorocromo. Na detecção direta, o anticorpo marcado
liga-se diretamente à partícula pesquisada; na detecção indireta, um anticorpo primário liga-se à partícula e, só então,
é adicionado um anticorpo secundário marcado específico para se ligar ao anticorpo primário
28
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Amostra 1 Amostra 2
(antígeno A) (antígeno B)
29
Unidade I
Geralmente esses marcadores são encontrados em níveis baixos em pacientes que não apresentam
nenhum tipo de tumor. Dessa forma, devem ser sempre considerados a história clínica e os valores de
referência para o diagnóstico (retomaremos esse tema, com mais detalhes, adiante).
O princípio da reação é o mesmo de outras análises que se utilizam desse tipo de técnica, uma
vez que se faz uso de anticorpos altamente específicos, construídos artificialmente para se ligarem a
moléculas de drogas terapêuticas. Por exemplo, em pessoas que fazem uso contínuo de medicamentos,
essa técnica se mostra útil para avaliar se há algum tipo de acúmulo do princípio ativo do fármaco
que poderia levar, a médio e longo prazo, a algum tipo de dano, reversível ou não. Em relação à
detecção de drogas de abuso, como maconha, cocaína, heroína, utiliza-se o mesmo princípio, ou seja,
a alta especificidade do anticorpo marcado por substâncias luminescentes.
A coleta de sangue deve ser realizada em momentos em que a concentração é mínima (geralmente,
imediatamente antes da dose seguinte), para alguns medicamentos, ou concentração máxima, dependendo
do medicamento prescrito, podendo até ser solicitada uma coleta aleatória. A interpretação correta dos
resultados obtidos depende do momento em que a amostra foi colhida e, juntamente com esses testes,
deve-se fazer um perfil renal e um perfil hepático, entre outros exames que possam se mostrar necessários.
No caso do lítio, por exemplo, usa-se soro, no plasma ou nas hemácias, pois há correlações entre a
concentração eritrocitária e efeitos adversos neurológicos. Já a determinação de metotrexato (MTX) no
plasma é realizada por cromatografia líquida de alta eficiência por arranjo de fotodiodos (CLAE-PDA).
Vários são os testes usados em laboratórios de pesquisa e em laboratórios clínicos, mas podemos
destacar os principais.
Espectrofotometria
Teste de Scott
Esse teste é usado para detectar a presença de cocaína. O cloridrato de cocaína é um sal solúvel
em água, obtido na forma de pó, podendo ser usado dessa forma (aspiração do pó) ou via intravenosa.
O crack é um subproduto da pasta da cocaína, apresentando-se como pedra e pouco solúvel em água,
no entanto, facilmente volatilizado quando aquecido.
Observação
Teste de Duquenois-Levine
Trata-se de um teste colorimétrico com técnica qualitativa para detectar maconha. A reação
é feita com uma solução que contém acetaldeído e vanilina em etanol 95% mais o reagente de
Duquenois-Levine e ácido clorídrico. Em caso positivo, observa-se a formação de um anel com
coloração violeta na amostra, resultado da reação de protonação da vanilina e da reação com o THC,
formando um complexo.
Teste de Mayer
potássio) que, ao reagirem com a amostra, formam um precipitado branco leitoso com aspecto de
coágulo, com turvação da amostra.
É uma técnica física que separa substâncias com base nas interações com as fases da cromatografia:
fase móvel e fase estacionária, sendo que a fase estacionária, ou seja, fixa, é sólida, podendo até ser
papel de filtro. A fase móvel pode ser gasosa, líquida ou se mostrar um fluido supercrítico (substância
que foi submetida à temperatura acima de seu ponto crítico, apresentando propriedades intermediárias
entre líquido e gás), movendo-se sobre a fase estacionária (e junto a ela movem-se os componentes
da mistura a ser estudada).
Saiba mais
Tswett empregou inulina dentro de uma coluna como fase fixa, usando
vários solventes para separar os anéis de cor verde e amarelo. Você pode
conhecer mais detalhes dessa história por meio do artigo indicado a seguir.
Como feito por Tswett, pode-se usar a fase estacionária dentro de colunas de vidro ou de outro
material (aço inoxidável) ou aderidas em placas ou até papel de filtro; a fase móvel será um solvente
puro ou misturado com outros solventes. Então, com o auxílio de um revelador, identificam-se
manchas de acordo com a polaridade entre as fases.
No caso da maconha, usa-se como fase móvel uma solução hexano/éter etílico e como revelador
uma solução etanólica de Fast Blue RE Salt e vapor de hidróxido de amônio. Após a revelação,
observa‑se a coloração da mancha e determina-se o seu RF, comparando com a amostra padrão de
referência. Para a cocaína, opta-se por clorofórmio/acetona/hidróxido de amônio como fase móvel,
cabendo à solução de Dragendorff (solução de iodeto de bismuto de potássio) a função de revelar,
para, assim, obtermos o RF.
O RF, também conhecido como razão de frente ou fator de retenção, é calculado por meio da
divisão do caminho da amostra pelo caminho do solvente.
32
BIOQUÍMICA CLÍNICA
A B C Fim da corrida
4 cm 5 cm
Ponto de origem
Solvente
Esse método identifica e quantifica componentes de uma mistura usando a fase estacionária que
fica dentro de uma coluna com algum material adsorvente e um líquido (fase móvel) que empurra os
componentes por essa coluna (geralmente de aço inoxidável). É o método de escolha para identificação
de drogas utilizadas em suspeita de casos de doping. A Clae é a técnica mais utilizada até mesmo para
a quantificação dos níveis plasmáticos da droga, bem como os seus metabólitos presentes no sangue.
Como cada componente interage de forma diferente com o material da coluna (pode ser sílica,
por exemplo), saem da coluna com velocidades diferentes e passam por outro aparelho (detector que
pode ser um espectrofotômetro) caracterizando a absorção em determinados comprimentos de onda
e registrando em cromatogramas.
É uma das técnicas mais empregadas na área forense, permitindo a detecção de várias substâncias
e seus interferentes, apresentando alta sensibilidade e seletividade e fornecendo resultados precisos
e exatos. É muito utilizada pela criminalística em todo o Brasil e indicada como referência nos guias
de análise do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC – United Nations Office on
Drugs and Crimes).
Sabemos que não há dois compostos com um mesmo espectro de massas (EM). Nessa técnica,
criam‑se íons dos compostos (para isso, a substância deve estar no estado gasoso), que são separados
33
Unidade I
em um campo elétrico de acordo com a sua taxa de massa/carga (m/z), sendo, então, detectados
qualitativa e quantitativamente de acordo com sua taxa m/z e abundância.
Espectroscopia de Raman
Quando a mudança na energia do fóton propagado é menor que a energia do fóton incidente, a
difusão é chamada de difusão Stokes. Caso o relaxamento na etapa final for menor que a do estado
de excitação inicial, temos uma difusão anti-Stokes.
Há uma variedade de mercados que se utilizam dessa técnica, como a indústria farmacêutica
(medicamentos e pureza da matéria-prima), áreas que trabalham com carbono e diamante, com gemologia
(análise de pedras preciosas), geologia e mineralogia, ciência forense (drogas de abuso e falsificação de
objetos), nanotecnologia, arte e patrimônio (veracidade da obra), pesquisas biológicas e biomédicas.
A eletroforese consiste em separar moléculas de acordo com seu peso molecular: moléculas muito
grandes não conseguirão migrar ao longo do gel, o que não acontece com as moléculas menores.
Atualmente, se mostra uma técnica amplamente utilizada na detecção de ácidos nucleicos (DNA
e RNA) eproteínas como hemoglobina, lipoproteínas e albumina. Os géis mais utilizados são o de
agarose para ácidos nucleicos e o de poliacrilamida para proteínas (a diferença entre eles é o tamanho
da rede que oferecem).
A concentração da agarose determina o tamanho da rede que será formada e isso é baseado na
amostra a ser analisada. Após a “corrida” das amostras, o gel é retirado e colocado em solução de
brometo de etídio que fará com que a amostra que se deslocou no gel “brilhe” após a colocação em
câmara de luz UV.
35
Unidade I
A poliacrilamida é uma substância formada por dois tipos de polímeros, acrilamida (com
conformação linear) e bisacrilamida (com conformação em forma de “T”), e são as diferenças entre
as moléculas que levam à formação de uma rede diferenciada e mais “fechada”, útil na detecção
de proteínas que são consideradas moléculas pequenas quando comparadas aos ácidos nucleicos,
por exemplo.
Isopropanol Solução
Solução de gel de gel de
separador empilhamento
Pente
A agarose é um polissacarídio que forma uma espécie de rede, prendendo as moléculas durante
a migração. O gel de agarose é corado com brometo de etídeo, um intercalante de DNA que se
torna visível quando exposto à luz ultravioleta. Já a poliacrilamida é uma mistura de dois polímeros,
acrilamida (molécula linear) e bisacrilamida (em forma de T). Misturando essas duas moléculas, tem‑se
a formação de uma rede. Diferentes relações entre as concentrações dessas moléculas permitem a
36
BIOQUÍMICA CLÍNICA
criação de distintos gradientes de separação. O gel de poliacrilamida é corado com nitrato de prata e
não precisa ser exposto à luz ultravioleta.
E. multilocularis E. granulosus
M 1 2 3 4 5 6 7 8 C 9 10 11 12
700 bp-
500 bp-
300 bp-
37
Unidade I
A PCR é uma reação em cadeia porque as fitas de DNA, recentemente sintetizadas, atuarão como
molde para mais uma síntese de DNA nos ciclos subsequentes. Após cerca de 25 ciclos de síntese
de DNA, os produtos da PCR incluem, além do DNA que iniciou a reação, cerca de 105 cópias da
sequência-alvo específica. Na PCR convencional, os resultados são qualitativos.
A RT-PCR é uma reação da transcriptase reversa, seguida de PCR, que, nesse caso, será quantitativa.
A técnica não utiliza o DNA de cadeia dupla como molde, mas sim o RNA de cadeia simples. A partir do
RNA, a enzima transcriptase reversa sintetiza uma cadeia de DNA complementar (chamado de cDNA).
Ao cDNA, aplica-se a técnica de PCR. A RT-PCR é amplamente utilizada para verificar a expressão
gênica, uma vez que analisa o RNA responsável pela síntese de proteínas.
• Desnaturação (93 °C a 96 °C): separação da dupla hélice do DNA-alvo em duas fitas simples.
• Anelamento (50 °C a 70 °C): pareamento dos primers por meio de ligações de hidrogênio ao
DNA‑alvo de fita simples (a temperatura de pareamento depende da quantidade de citosina e
guanina da sequência a ser amplificada, cerca de 5 °C abaixo da temperatura média calculada).
38
BIOQUÍMICA CLÍNICA
• Extensão (70 °C a 75 °C): síntese da cadeia complementar de cada cadeia molde catalisada pela
DNA polimerase, enzima responsável por adicionar os dNTP à nova fita.
Reação da cadeia de polimerase - PCR
DNA original a
ser replicado
5' 3' 5' 3'
5' 3'
3' 5'
5' 3' 1 1
1 1 1 2 2
3' 5' 3 3
3' 5'
DNA primário 3' 5' 3' 5'
Nucleotídeo
1 Desnaturação a 94-96 ºC
2 Anelamento a ~68 ºC
3 Extensão a 72 ºC
A PCR em tempo real baseia-se na detecção e na quantificação do sinal fluorescente dos vários
amplicons gerados por ela, ou seja, do produto da amplificação do DNA. Essa detecção ocorre por meio
de um termociclador com sistema óptico para a captação da fluorescência e de um computador com
um software para aquisição de dados e análise da reação. Há vários fabricantes e esses equipamentos
diferem entre si quanto à capacidade da amostra e ao método de captação da fluorescência na
sensibilidade e nos softwares para a análise dos dados. Durante a PCR, as emissões de fluoróforos são
medidas de ciclo em ciclo, diretamente proporcionais aos amplicons que estão sendo gerados.
A principal característica da PCR em tempo real é que ela consegue monitorar o progresso da
PCR enquanto ocorre a reação, e os dados são coletados ao longo dos ciclos. Utiliza a primeira
amplificação de uma sequência-alvo e, a partir daí, quanto mais alto o número de cópias iniciais da
sequência de DNA-alvo, mais rápido será observado um aumento significativo da fluorescência.
39
Unidade I
100,0
10-0,5
10-1,0
Fluorescência normal
10-1,5
10-2,0
Limiar
10-2,5
10-3,0
5 10 15 20 25 30 35 40 45
Ciclo
Quanto mais DNA houver no início da reação, mais rapidamente terá início a fase exponencial
– quando o dobro de produto se acumula a cada ciclo (100% de eficiência). Como consequência, o
número de ciclos necessários para detectar o produto da PCR será menor e a concentração inicial de
DNA será maior. A detecção da amplificação ciclo por ciclo e o uso do começo da fase exponencial
fazem da PCR em tempo real uma técnica muito mais sensível quanto à quantificação de DNA do que
os métodos semiquantitativos.
40
BIOQUÍMICA CLÍNICA
A separação de diferentes proteínas pela eletroforese passou a ser realizada no início do século XX.
A utilização da técnica de detecção de proteínas mostrava-se limitada pelo fato de as proteínas
separadas em gel (matriz) se mostrarem com um acesso muito difícil para provas moleculares. Somente
após o desenvolvimento da técnica de transferência das proteínas para uma membrana adsorvente
foi possível detectar as proteínas com mais precisão (KURIEN; SCOFIELD, 2006).
A escolha do material da matriz depende da resistência necessária para a separação efetiva dos
fragmentos proteicos. O gel de agarose possui poros com diâmetro que permitem a separação de
fragmentos que variam de 200 pares de bases (pb) a 50 kilobases (kb). A poliacrilamida é o material
ideal para processos de sequenciamento, pois permite a separação de fragmentos muito pequenos, de
até 1.000 pb. A eletroforese em gel de poliacrilamida (Page) é um método simples e rápido que separa
pequenas proteínas de tamanhos diferentes usando enzimas de restrição. Quando submetidas a um
campo elétrico em pH neutro, as moléculas de proteína são atraídas para o polo positivo e repelidas
pelo polo negativo. Quando a matriz apresenta resistência à migração das moléculas, os fragmentos
menores podem se mover com maior facilidade do que os maiores, havendo, então, uma migração
diferenciada dos fragmentos.
Tempo
Mistura de permitido
fragmentos de
proteínas Gel
A fim de tornar as proteínas acessíveis à detecção por anticorpos, realiza-se a sua transferência
de um gel para uma membrana adsorvente. A membrana de transferência é colocada face a face com
o gel de separação, aplicando-se, então, uma corrente elétrica. Durante a transferência, o gel está na
face do eletrodo negativo e a membrana em sua face positiva. Então, as proteínas contendo carga
41
Unidade I
elétrica se movem do gel para a membrana mantendo a mesma disposição do gel. Como resultado
desse processo de transferência e ligação à membrana, as proteínas são expostas a uma fina camada
para detecção. A ligação das proteínas à membrana é baseada tanto em interações hidrofóbicas
quanto em interações de cargas entre a membrana e as proteínas.
Cátodo
Membrana
Dois filtros de papel
úmidos
Ânodo
Adição do anticorpo
42
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Proteínas
transferidas
Bloco de
membrana
Adicionar
anticorpo
Papel absorvente monoclonal
Adicionar conjugado
Eletroforese (anticorpo marcado
desnaturante em gel com enzima)
de poliacrilamida
(SDS-Page)
Adicionar substrato
incolor
Membrana
Detecção de antígenos
As proteínas no immublotting têm sido detectadas diretamente por uso de corantes orgânicos,
marcadores fluorescentes e vários métodos com coloração de prata e partículas coloidais como
ouro, prata, cobre, ferro ou indian ink (tinta-da-índia). O tipo de coloração a ser utilizado deve ser
compatível com a membrana usada para a transferência de proteínas. Após a adição do anticorpo
primário e do anticorpo secundário, dois métodos de detecção de antígenos são comumente usados:
radioativo e imunoenzimáticas.
43
Unidade I
Dessa forma, o médico pode indicá-lo com o intuito de detectar a anemia falciforme, a doença de
hemoglobina C. Inclusive, pode ser requerida com a finalidade de aconselhar geneticamente casais
que desejam ter filhos. Isso se deve ao fato de que, por meio dele, é possível informar se há chance de
o bebê ter algum tipo de distúrbio no sangue referente à síntese de hemoglobina.
A eletroforese de proteínas pode ser solicitada quando o médico suspeita de doenças que afetam
as concentrações sanguíneas das proteínas e/ou causem perda proteica na urina, como o mieloma
múltiplo, caracterizado pelos sintomas de dor óssea, anemia, fadiga, fraturas inexplicáveis e infecções
recorrentes. Também pode ser solicitada como parte de outros exames laboratoriais que apresentam
alteração, como níveis anormais de proteínas totais e/ou de albumina, níveis elevados de proteínas
na urina, níveis aumentados de cálcio e contagens baixas de glóbulos vermelhos ou brancos. Uma
vez que uma doença ou quadro clínico tenha sido diagnosticado, a eletroforese pode ser pedida a
intervalos regulares para monitorar o curso da doença e a efetividade do tratamento.
Ao longo da última década alguns questionamentos vêm sendo levantados em relação aos
cuidados com o gerenciamento de qualidade dos serviços de saúde. Tais questões são originadas
na comparação entre as evoluções tecnológicas e o conhecimento adquirido com a evolução na
qualidade dos serviços prestados aos clientes, bem como a diminuição da intervenção humana nas
análises devido à automatização da maioria das técnicas. Diante disso, inúmeras iniciativas vêm
sendo implantadas no intuito de melhorar os processos aplicando iniciativas já existentes em outras
áreas como gestão de qualidade total (GQT); pensamento enxuto, Seis Sigma, redesenho de processos,
normas ISO e prêmios de qualidade, além, é claro, das certificações e acreditações.
Entretanto, para que as inovações e melhorias deem certo, torna-se imprescindível o controle
desses processos, que deve ser capaz de identificar possíveis falhas que possam vir a acontecer ou
44
BIOQUÍMICA CLÍNICA
que já́ aconteceram. Além disso, o laboratório deverá estar preparado para agir prontamente a fim
de evitar ou minimizar as consequências e a recorrência dessas falhas. Isso tudo acaba por se traduzir
em um processo chamado garantia da qualidade.
O laboratório clínico deve assegurar que os resultados produzidos reflitam, de forma fidedigna
e consistente, a situação clínica apresentada pelos pacientes, assegurando que não representem o
resultado de alguma interferência no processo. A informação produzida deve satisfazer as necessidades
de seus clientes e possibilitar a determinação e a realização correta de diagnóstico, tratamento e
prognóstico das doenças. No entanto, para que todas as inovações e melhorias sejam assertivas,
é indispensável que haja um controle rígido de todos os processos, o qual ainda deve ser capaz de
pontuar possíveis falhas (as instaladas, as que podem vir a acontecer e as que já ocorreram, além
de, nesse último caso, tratar da forma como foram sanadas). A essa série de regras utilizadas, em
diferentes escalas, dá-se o nome de garantia de qualidade.
Para criar um padrão e poder aplicá-lo em todos os setores e processos laboratoriais, foram criados
programas de acreditação brasileiros, como o Programa de Acreditação de Laboratórios Clínicos (Palc),
da SBPC/ML, e o Departamento de Inspeção e Credenciamento de Qualidade (DICQ), da Sociedade
Brasileira de Análises Clínicas (SBAC).
Para a implantação das normas vigentes de controle de qualidade deve-se, além de integrar toda
a equipe, contar com a boa vontade e os cuidados da alta administração do local. Outros pontos
também devem ser considerados:
45
Unidade I
• avaliação de desempenho;
• registro de relatórios.
As boas práticas laboratoriais (BPLs) são normas fundamentais para se estabelecerem padrões
de qualidade e confiabilidade em todo o processo técnico científico. Tais normas condicionam o
funcionamento, a organização e as condições em que as análises laboratoriais deverão ser planejadas,
armazenadas e liberadas. Também consideram a preservação e o descarte das amostras e de que
forma os dados serão arquivados.
Todos estes quesitos fazem parte das fases pré-analíticas, analíticas e pós-analíticas. A etapa
pré‑analítica é considerada uma das mais complexas para se padronizar e controlar, pois envolve
uma série de fatores (inclusive os que não são inerentes ao próprio laboratório). Muitos desses fatores
podem, eventualmente, causar variações nos resultados difíceis de rastrear, como a identificação e
o preparo do paciente antes da coleta da amostra. As BPLs devem incluir também os cuidados com
manutenção e calibração dos equipamentos e insumos utilizados, limpeza, inspeção e padronização.
Também são necessários protocolos abordando a estabilidade e a pureza das substâncias de teste
ou referência, sempre se observando os registros de compra, informações sobre rotulagem e
armazenamento de todas as substâncias e reagentes utilizados.
46
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Entende-se por controle externo da qualidade (também chamado avaliação externa da qualidade)
a atividade de avaliação do desempenho de sistemas analíticos através de ensaios de proficiência,
análise de padrões certificados e comparações interlaboratoriais.
O laboratório clínico deve participar de ensaios de proficiência para todos os exames realizados na
sua rotina. Para os exames não contemplados por programas de ensaios de proficiência, o laboratório
clínico deve adotar formas alternativas de controle externo da qualidade descritas em literatura
científica. Vale acrescentar que a participação em ensaios de proficiência deve ser individual para
cada unidade do laboratório clínico que realiza as análises.
Fornecem medidas que podem caracterizar o comportamento dos elementos de uma série,
possibilitando determinar se um valor está entre o maior e menor valor da série ou se está localizado no
centro do conjunto de dados, por exemplo. As medidas de tendência central informam o valor em torno
do qual os dados se distribuem. Tem por objetivo representar os dados de uma forma mais condensada
que uma tabela, localizando a maior concentração de valores em torno de uma distribuição.
47
Unidade I
Medidas de
tendência central
Dispersão estatística
As medidas de posição (média, mediana, moda) descrevem características dos valores numéricos
de um conjunto de observações em torno de um “ponto de equilíbrio” dos dados. Nenhuma delas
informa sobre o grau de variação ou dispersão dos valores observados em relação à média. Em um
grupo de dados, os valores numéricos não são necessariamente semelhantes e apresentam desvios
em relação à tendência central, usualmente, a média aritmética. As medidas de dispersão quantificam
a variação dos dados em relação à média e indicam qual o seu grau de representatividade.
1
75 cm
2
75 cm
Figura 22 – As peças produzidas pela linha 1 de produção são melhores que as da linha 2,
pois a dispersão das medidas em torno da média é menor
Amplitude
48
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Com base nos dados estatísticos obtidos através de análises simples, é possível aplicar um conjunto
de regras e padrões que fornecerão os dados fidedignos voltados para o controle geral de qualidade.
ϕ(Z)
φ(z)
Z
z
A utilização da técnica de distribuição de dados utilizados por Gauss mostra informações valiosas
quando aplicadas às técnicas de controle de qualidade, pois representa a extensão das variáveis a fim
de serem minimizadas. A distribuição normal é um modelo bastante útil na estatística, e não seria
uma surpresa, pois a soma de efeitos independentes (ou efeitos não muito correlacionados) deveria,
se houvesse muitos desses, se distribuir normalmente (sempre sujeito a certos pressupostos).
Regras de Westgard
O controle de qualidade (CQ) de regras múltiplas utiliza uma combinação de critérios de decisão,
ou regras de controle, para decidir quando uma corrida analítica está “sob controle” ou “fora de
controle”. O procedimento de CQ de regras múltiplas de Westgard, como é mais conhecido, utiliza cinco
regras de controle diferentes para julgar a aceitabilidade de uma corrida analítica. Por comparação,
um procedimento de regra única de controle utiliza um único critério ou um único par de limites
de controle, assim como um gráfico de Levey-Jennings, com limites de controle calculados como
x ± 2 DP (média mais ou menos dois desvios padrão) ou x ± 3 DP (média mais ou menos três desvios
padrão). As regras de Westgard proporcionam maior sensibilidade do sistema na detecção de perdas
de estabilidade. Elas traduzem probabilidade estatística e, quando violadas, é necessário analisar os
variados fatores envolvidos para encontrar a causa do problema e promover ações corretivas.
49
Unidade I
As regras de Westgard são geralmente utilizadas com duas ou quatro medições de controle por
corrida, o que significa que elas são apropriadas quando dois materiais de um controle diferentes são
medidos uma ou duas vezes por material, que é o caso em muitas aplicações bioquímicas. Algumas
regras de controle alternativas são mais apropriadas quando três materiais de controle são analisados,
o que é comum para aplicações em hematologia, coagulação e imunoensaios.
Esses procedimentos são claramente mais complicados do que procedimentos de regras únicas,
o que é uma desvantagem. Entretanto, frequentemente oferecem melhores desempenhos do que os
procedimentos de regras únicas 12s e 13s. Há um problema de “falso alarme” com a regra 12s, assim
como o gráfico de Levey-Jennings com limites de controle 2 DP.
Dados de
controle
Não
12s Sob controle, aprovar corrida analítica
Sim Não
Figura 25 – Diferentes materiais de controle devem ser interpretados como diferentes níveis de controle
As vantagens dos procedimentos de regras múltiplas são principalmente duas: o número de falsas
rejeições pode ser mantido baixo e, ao mesmo tempo, mantém-se uma alta identificação de erros.
Isso é feito selecionando-se regras individuais que tenham níveis de falsas rejeições muito baixos,
regras as quais, quando utilizadas em conjunto, aumentam a capacidade de identificação de erros; é
como realizar dois testes funcionais do fígado e diagnosticar um problema se um deles der positivo.
Um procedimento de regra múltipla utiliza dois ou mais testes estatísticos (regras de controle) para
avaliar os resultados do controle de qualidade e, então, rejeitar uma corrida se qualquer um deles
for positivo.
A regra 1:3s refere-se a uma regra de controle que é comumente utilizada com um gráfico de
Levey‑Jennings quando os limites de controle calculados são x ± 3DP. A corrida é rejeitada quando
uma única medição de controle excede um dos limites.
50
BIOQUÍMICA CLÍNICA
+3DP
+2DP
+1DP
Média
-1DP
-2DP
Regra 13s violada
-3DP
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
A regra 1:2s refere-se a uma regra de controle que é comumente utilizada com um gráfico de
Levey‑Jennings quando os limites de controle calculados são x ± 2DP. No procedimento original
de regras múltiplas de Westgard, essa regra é utilizada como um alerta para acionar uma inspeção
cuidadosa dos dados de controle por meio das seguintes regras de rejeição:
+3DP
Regra 12s violada
+2DP
+1DP
Média
-1DP
-2DP
-3DP
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
51
Unidade I
• Regra 2:2s: rejeita-se quando duas medições de controle consecutivas excederem o mesmo
limite de controle x + 2DP ou x - 2DP.
+3DP
Regra 22s violada
+2DP
+1DP
Média
-1DP
-2DP
-3DP
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
• Regra 4s: rejeita-se quando uma medição de controle exceder o limite de controle x + 2DP e a
outra x - 2DP, em uma mesma corrida.
+3DP
+2DP
+1DP
Regra R4s violada
Média
-1DP
-2DP
-3DP
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
52
BIOQUÍMICA CLÍNICA
• Regra 4:1s: rejeita-se quando quatro medições de controle consecutivas excederem o mesmo
limite x ± 1DP.
+3DP
+2DP
+1DP
Regra 41s violada
Média
-1DP
-2DP
-3DP
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
• Regra 10x: rejeita-se quando dez medições de controle consecutivas estiverem no mesmo lado
em relação à média.
+3DP
+2DP
+1DP
Média
-1DP
Regra 10x violada
-2DP
-3DP
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
53
Unidade I
• Regra 8x: rejeita-se quando oito medições de controle consecutivas estiverem no mesmo lado
em relação à média.
+3DP
+2DP
+1DP
Média
-1DP
Regra 8x violada
-2DP
-3DP
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
• Regra 12x: rejeita-se quando 12 medições de controle consecutivas estiverem no mesmo lado
em relação à média.
+3DP
+2DP
+1DP
Média
-1DP
Regra 12x violada
-2DP
-3DP
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
Por exemplo, quando N = 2, espera-se que 9% de corridas com bons resultados sejam rejeitadas;
com N = 3, esse valor é ainda maior, aproximadamente 14%; com N = 4 esperam-se quase 18% de
falsas rejeições. Isso significa que, aproximadamente, de 10% a 20% das corridas com bons resultados
serão descartadas, o que causa desperdício de tempo e esforço do laboratório. Enquanto o gráfico
de Levey-Jennings com limites de controle 3DP tem uma taxa de falsa rejeição muito baixa, apenas
± 1% com um N entre 2 e 4, sua capacidade de identificação de erros (alarmes verdadeiros) também
será menor, assim o problema com a regra de controle 13s será que erros clinicamente importantes
não serão identificados.
• regulação da concentração de íons como sódio (Na+), potássio (K+), cálcio (Ca2+), magnésio (Mg2+),
cloreto (Cl-), bicarbonato (HCO3-), hidrogênio (H+) e fosfatos (HPO2-4 e H2PO- 4);
55
Unidade I
Ureter Rim
Bexiga
Uretra
Os rins estão localizados dentro da parede dorsal da cavidade abdominal, na região médio‑posterior.
Cada rim filtra o sangue e o transforma em um ultrafiltrado, a urina, que por sua vez é direcionada
para o ureter.
O ureter de cada rim conduz a urina para a bexiga urinária, onde é armazenada até ser excretada
pela uretra. A uretra é formada por uma estrutura tubular curta que se conecta ao meio externo por
56
BIOQUÍMICA CLÍNICA
meio do pênis ou na porção anterior da vagina. Dois esfíncteres musculares circundam a base da
uretra de modo a controlar a micção.
Nos bebês a micção é controlada pelo sistema nervoso autônomo, assim, quando a bexiga está
cheia, um reflexo espinal relaxa o esfíncter.
Cada rim contém mais de um milhão de néfrons, os quais, por sua vez, são formados por pequenos
túbulos e vasos conhecidos como glomérulo, que emerge de uma arteríola aferente. Os capilares
glomerulares são revestidos pela cápsula de Bowman, apresentando as seguintes estruturas: túbulo
contorcido proximal, alça de Henle, com um ramo descendente fino e um ramo ascendente grosso,
túbulo contorcido distal, túbulos coletores e ductos coletores.
Túbulo
contorcido distal
Arteríola
eferente
Arteríola
aferente
Ramo ascendente
da alça de Henle
Ramo
descendente
da alça de Ducto coletor
Henle
Alça de Henle
Até o ureter
Capilares
peritubulares
• membrana basal que controla a passagem de moléculas de acordo com o peso molecular e a carga;
• podócitos, que são células especializadas da Cápsula de Bowman cuja função é a manutenção
da membrana basal e a filtração de moléculas carregadas negativamente;
• capilares fenestrados que promovem uma barreira de filtração dos tipos celulares presentes
no sangue.
57
Unidade I
Em condições normais, a reabsorção tubular é de 178,5 L ao dia, ao passo que a excreção de urina
é de 1,5 L ao dia.
Mas como o sangue é filtrado? O sangue chega através dos rins pela artéria renal que se ramifica
nas artérias interlobulares, artérias arqueadas e nas artérias radiais corticais. Essas, por sua vez,
subdividem-se em arteríolas. As arteríolas aferentes levam o sangue para a primeira rede de capilares
glomerulares, onde ocorre a ultrafiltração. O sangue, então, sai dos capilares glomerulares através das
arteríolas eferentes, que o conduzem para os capilares peritubulares que circundam o néfron. Dos
capilares peritubulares, o sangue flui para pequenas veias que o drenam para a veia renal.
O volume médio de sangue filtrado gira em torno de 180 L, o que corresponde a uma filtração
glomerular de 125 ml por minuto, ou seja:
(125 ml X 60 minutos X 24 horas) = 180.000 mL
Além disso, para que ocorra o processo de filtração e a formação de ultrafiltrado (no caso, a
urina), é necessária uma força hidrodinâmica. Biofisicamente falando, a filtração glomerular sofre três
pressões: pressão hidrostática sanguínea, pressão hidrostática urinária e pressão osmótica do sangue.
O sódio e o potássio são quantificados no soro humano por muitos métodos, inicialmente, pelo
fotômetro de chama e por métodos enzimáticos. Todavia, atualmente destacam-se os equipamentos
automatizados que dispõem do módulo ISE (eletrodos de íon seletivo). Com a tecnologia da
potenciometria, os eletrodos específicos para cada marcador são dispostos no sistema e, conforme a
amostra (soro do paciente) circula nas tubulações e passa pelos eletrodos, por diferença de potencial,
as concentrações de sódio e potássio são verificadas.
Seus valores de referência variam de 135 mEq/L a 145 mEq/L e 3,7 6 mEq/L a 5,6 mEq/L,
respectivamente.
Consideramos biomarcador toda substância ou molécula capaz de ser mensurada por meio de um
exame clínico decorrente de uma doença ou outro estado fisiológico determinado em um indivíduo
para fins de diagnóstico clínico e laboratorial. Devemos considerar que os biomarcadores podem
sofrer influência de fatores endógenos ou exógenos, os quais, muitas vezes, podem levar à repetição
do resultado laboratorial.
58
BIOQUÍMICA CLÍNICA
De acordo com Taal e Brenner (2006), os principais fatores que comprometem a função renal são:
diabetes mellitus, hipertensão arterial sistêmica, idade avançada, tabagismo, anemia, dislipidemias,
obesidade e disfunção endotelial. Vejamos agora alguns biomarcadores renais e suas aplicações no
diagnóstico clínico.
4.3.1 Creatinina
Para estimar a taxa de filtração glomerular, determinados compostos do catabolismo são de suma
importância, como a creatinina. Mas, para entender melhor a importância desse metabólito, vamos
entender como ele é formado.
Essa creatina formada no fígado se dirige para a corrente sanguínea e outros tecidos (em particular,
para coração, músculos e cérebro), reage com o ATP para formar fosfocreatina ou fosfato e creatina.
Essa reação é catalisada pela creatina-fosfoquinase (conhecida como CK ou CPK, do inglês creatine
phosphokinase), que, por sua vez, sofre ciclização espontânea, ou seja, uma reação não enzimática
gerando, então, a creatinina, que é filtrada livremente no glomérulo (de 7% a 10% posteriormente é
excretada na urina proveniente da secreção tubular). Assim, esse pequeno percentual é suficiente para
estimar a taxa de filtração glomerular.
Glicina + arginina
H
Creatinina N
Guanidinoacetato P1 + H2O HN O H2O
N
H3C
Creatinina
Corrente
sanguínea
59
Unidade I
4.3.2 Ureia
A ureia é, certamente, um dos principais metabólitos excretados na urina. Mas, antes de nos
atentarmos a ela, retomemos o conceito de proteínas. Primeiramente vamos lembrar o conceito de
proteínas, o que são?
As proteínas são biomoléculas formadas por uma sequência de aminoácidos, os quais, por sua
vez, são ligados covalentemente por ligação peptídica. Essa ligação é formada por uma reação de
condensação entre o grupo carboxílico de um aminoácido e um grupo amina de outro aminoácido.
H CH3 H O CH3
H O H O H O
N C C + N C C N C C N C C +H2O
H OH H OH H OH
H H2O H H H H
Ligação peptídica
Glicina + Alanina Dipeptídeo
60
BIOQUÍMICA CLÍNICA
podendo, então, a amônia estar incorporada ao glutamato ou promover a sua liberação. Esse processo
fornece amônia para entrar no ciclo da ureia, sendo esse composto eliminado pela urina e evitando
sua toxicidade (em particular para o cérebro). Uma pequena parte da amônia (NH3) 30 µM a 60 µM é
encontrada no sangue, principalmente pelos aminoácidos alanina e glutamina.
Basicamente, o ciclo da ureia consiste em cinco etapas, com várias reações enzimáticas, tudo isso
descrito resumidamente a seguir:
• síntese do carbamoil-fosfato (amônia, bicabonato e ATP reagem para formar carbamoil-fosfato
catalisada pela enzima carbamoil-fosfato-sintetase I);
• carbamoil-fosfato reage com a ornitina para formar a citrulina;
• citrulina reage com aspartato formando arginino succinato, catalisada pela
argininosuccinato sintetase;
• clivagem da arginosuccinato pela enzima argininosuccinato liase formando fumarato e arginina;
• clivagem da arginina pela arginase produzindo ureia e regeneração da ornitina.
Ciclo da ureia
Argininosuccinato sintetase
Argininosuccinato liase
61
Unidade I
O ácido úrico é um ácido fraco proveniente do catabolismo das purinas (adenina e guanina), que é
metabolizado principalmente no fígado, a partir da xantina, e excretado pelos rins, sendo empregado
como marcador para várias anormalidades metabólicas e hemodinâmicas. Dessa forma, a degradação
das purinas produz a hipoxantina e esta forma a xantina, a qual sofre ação da xantina-oxidase
formando o ácido úrico (no plasma ele é encontrado como urato monossódico, sua forma ionizada).
Purinas
NH2 O
C N C N Xantina oxidase
N C HN C
CH CH Ácido úrico
HC C C C Hipoxantina Xantina
N N H2N N N
H H
Adenina Guanina
Tais biomarcadores, suas dosagens séricas (como a creatinina e a ureia), são utilizados na
avaliação indireta da função renal, sendo considerados indicadores clássicos de problemas renais.
Vale acrescentar que também podem ser analisados os níveis de ácido úrico, os quais, em níveis
elevados no sangue, formam cristais de urato, gerando precipitação nas articulações e provocando a
artrite gotosa.
4.3.4 Microalbuminúria
Corresponde à excreção de albumina acima dos valores normais de referência detectados na urina
isolada ou na urina de 24 horas; esse parâmetro pode indicar insuficiência renal crônica.
A microalbuminúria está associada com uma elevada mortalidade por doença cardiovascular em
pacientes diabéticos e não diabéticos. A associação entre a sensibilidade à insulina e microalbuminúria
tem sido demonstrada como a mesma em indivíduos normotensos e hipertensos. Alguns estudos
sugerem uma relação entre resistência à insulina e microalbuminúria em indivíduos não diabéticos,
que é parcialmente dependente de pressão arterial, glicemia e obesidade.
O diabetes tem sido demonstrado como a principal causa de doença renal no mundo, sendo,
portanto, de grande relevância a identificação precoce dos pacientes com elevado risco de desenvolver
62
BIOQUÍMICA CLÍNICA
nefropatia diabética. Isso é possível pela triagem sistemática através da avaliação da microalbuminúria.
Em relação às crianças diabéticas, cerca de 20% delas podem desenvolver microalbuminúria como um
sinal precoce de nefropatia incipiente. Por fim, é importante acrescentar que a retinopatia diabética
está, também, comprovadamente associada com a microalbuminúria e com a hemoglobina glico. A
retinopatia diabética está, também, comprovadamente associada com a microalbuminúria e com a
hemoglobina glicosilada.
Do ponto de vista clínico, a avaliação da função renal pode ser baseada em dois princípios básicos,
a função glomerular e avaliação da função tubular, pois apresentam funções bem diferentes. Sendo
assim, descreveremos resumidamente suas funções para entendermos, do ponto de vista laboratorial,
como são feitas as análises e suas correlações com os possíveis diagnósticos.
No túbulo contorcido proximal ocorre o transporte ativo para a reabsorção de glicose e sódio, além
do transporte passivo para água e íons cloreto, de modo a manter o equilíbrio osmótico; aqui também
se dá a absorção de aminoácidos e proteínas por transporte ativo. Nesse segmento há a participação
da bomba Na+/K+/ATPase (sódio-potássio ATPase) e temos, ainda, a reabsorção do bicarbonato filtrado,
com sua posterior absorção para o sangue.
Já no túbulo contorcido distal temos a reabsorção de sódio controlada pela aldosterona, processo
que libera íons K+ ou H+. A eliminação dos íons H+, quando combinados com os íons fosfato ou com
amônio, promove a formação de bicarbonato.
No ducto coletor há a alteração da permeabilidade da água por meio das aquaporinas estimuladas
pelo hormônio anidiurético (ADH), ocorrendo uma elevação da absorção de água.
O primeiro ponto de partida é avaliar a taxa de filtração glomerular (TFG), isso porque, através
de equações matemáticas, podemos mensurar os níveis de creatinina. A TFG é definida como a
capacidade renal de depurar uma substância a partir do sangue expressa de acordo com o volume de
plasma determinado pela depuração em unidade de tempo, dessa forma, uma fração dos compostos
que fazem parte, principalmente, do metabolismo proteico, é excretada e outra fração de outros
compostos que não obrigatoriamente fazem parte desse metabolismo são reabsorvidos. Do ponto de
vista clínico, a TFG é de suma importância, pois, a partir dela, podemos ter uma ideia das alterações
fisiológicas e metabólicas, bem como da hemodinâmica, o que permite determinar o prognóstico de
muitas patologias bem como definir a melhor estratégia terapêutica.
63
Unidade I
Para a determinação da TFG, foram propostos vários modelos matemáticos (mais de 46 fórmulas
matemáticas). Isso se deve, em parte, ao fato de a execução do exame depender da coleta de toda a
urina no período de 24 horas (o paciente não conseguir fazer a coleta adequada ou na própria execução
do exame muitas vezes pode tornar nulo o resultado, levando a erros e, dessa forma, invalidando o
resultado laboratorial). Vale lembrar que há uma associação com os níveis de creatinina sérica; tais
níveis, quando dentro dos parâmetros da normalidade, não descartam um comprometimento renal.
Vejamos agora as equações matemáticas mais utilizadas na determinação da TFG. De acordo com
a literatura da área, como dito, há mais de 46 fórmulas matemáticas, mas a mais aceita e utilizada
na clínica baseia-se em dados específicos como níveis séricos de creatinina, faixa etária, sexo, etnia
e superfície corporal. Contudo, devemos lembrar que os valores obtidos por essas equações são
uma estimativa, ou seja, os valores e/ou resultados obtidos apenas estão próximos da realidade dos
resultados laboratoriais do paciente.
Essa equação foi descrita em 1973 a partir de um estudo feito com homens caucasianos na faixa
etária aproximada de 57 anos. No entanto, dada a diferença da superfície corporal, trabalhou-se
com um fator de correção para as mulheres de 0,85 mL/min. Além disso, outra dificuldade gerada é a
exclusão de secreção tubular da creatina, obesidade e sobrecarga de fluidos.
Alguns autores, como Madero e Sarnak (2011), apontam que a obesidade reduz a massa muscular
e, por isso, haveria uma redução na excreção diária de creatinina urinária, principalmente quando
comparado a um indivíduo com peso normal e condizente com a faixa etária. Como essa equação
baseia-se na relação da redução da excreção da creatinina urinária com a faixa etária, alguns autores
enfatizam sua baixa acurácia para a determinação da TFG, ainda que ela seja utilizada nos laboratórios
de análises clínicas por ser um método barato, principalmente quando utilizada em conjunto com
equipamentos analíticos que aferem a creatinina sérica.
Mas, então, qual é a fórmula para se calcular a clearance de creatinina? A fórmula descrita a
seguir tem se mostrado a mais utilizada nos laboratórios de análises.
Na equação de Cockcroft-Gault atualizada, a idade deve ser incluída em anos, o peso corpóreo em
quilogramas (kg) e a creatinina sérica em mg/dL.
É importante ressaltar que o resultado obtido deve ser corrigido para a superfície corporal de 1,73 m2.
64
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Saiba mais
Essa equação foi desenvolvida em 1999, com base em dados de pacientes com doença renal
crônica (excluindo os pacientes saudáveis) por meio de um contraste radiológico, o iotalamato-I 125.
Esse contraste iônico é aplicado por meio de infusão endovenosa, e são realizadas várias coletas de
amostras de sangue seguidas de coletas das diureses extremamente cronometradas. Além disso, esse
contraste não é reabsorvido, sendo facilmente filtrado pelo glomérulo.
Contudo, como apresenta alta especificidade, seu custo é elevado. Essa equação estima precisamente
a TFG usando variáveis como creatinina sérica, idade, etnia e gênero a fim de observar as diferenças
causadas pela massa muscular. No entanto, quando essa equação é aplicada em diferentes grupos
étnicos, podem ocorrer redução da acurácia e da precisão.
TFG (mL/min/1,73 m2) = 170 x creatinina plasmática (mg/dL)-0,999 x idade (anos)-0,176 x 0,762
(se mulher) x 1,18 (se negro) x ureia plasmática (mg/dL)-0,17 x albumina plasmática (g/dL) + 0,318
TFG (mL/min/1,73 m2) = 186 x creatinina plasmática (mg/dL)-1,154 x idade (anos)-0,203 x 0,742
(se mulher) x 1,212 (se negro)
Já com a modificação para utilização com a creatinina calibrada, a equação fica assim:
TFG (mL/min/1,73 m2) = 175 x creatinina plasmática (mg/dL)-1,154 x idade (anos)-0,203 x 0,742
(se mulher) x 1,212 (se negro)
65
Unidade I
Essa equação foi desenvolvida em 2009 a partir da variação da fórmula MDRD, a qual abrangeu
indivíduos com ou sem doença renal, por apresentar uma maior acurácia e menos viés. Atualmente,
é bastante utilizada na área da nefrologia e exames laboratoriais.
TFG = 141 x min (CRs/κ, 1) α x máx. (CRs/κ, 1) -1,209 x 0,993 idade x 1,018 [se mulher] x
1,159 [se negro]
Onde:
Contudo, alguns autores (FLORKOWSKI; CHEW-HARRIS, 2011) acreditam que essa equação, na
prática clínica, pode não ser eficiente pelo fato de os pacientes poderem apresentar história clínica
e fatores de risco diferentes em relação à doença renal crônica, por isso são necessários uma boa
avaliação clínica e resultados laboratoriais fidedignos a fim de determinar corretamente o diagnóstico
do paciente. Assim, essa fórmula teria uma melhor aplicação para pacientes com doença renal crônica
confirmada, a fim de monitorar a doença.
Nessa equação, a altura deve ser incluída em centímetros (cm) e a creatinina sérica em mcmol/L.
Onde:
K = 48 (adolescentes)
66
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Lembrete
Observação
A inulina é um marcador padrão ouro para estimar a TFG, pois é considerada, do ponto de vista
fisiológico, uma substância inerte, a qual é livremente filtrada. Além disso, trata-se de um polímero
com peso molecular de 5.200 daltons. Contudo, há uma limitação quanto a seu uso em razão do alto
custo nas análises clínicas laboratoriais e da padronização do método, pois é uma técnica altamente
complexa e trabalhosa.
Quantidade excretada/min = V x U
Onde:
Vejamos agora os principais marcadores séricos para monitoramento de doenças renais e suas
principais características.
67
Unidade I
Cistatina C
Descrita pela primeira vez em 1961, pertence à superfamília das cistatinas, tendo um peso
molecular de 13.359 daltons e composta de 120 aminoácidos formando uma cadeia polipeptídica
simples. Corresponde a uma proteína catiônica com ponto isoelétrico de 9,3, sendo, dessa forma,
filtrada livremente pelos glomérulos. Assim, a Cistatina C é considerada um marcador precoce de
lesão renal. Por ser um marcador endógeno, possibilita estimar a TFG sem a necessidade de coleta
de urina. Como desvantagem, apresenta um custo elevado, o que faz com que a dosagem sérica de
creatinina seja a favorita para a análise laboratorial. Por fim, cabe destacar que o método utilizado
para a dosagem é a imunoturbidimetria.
Identificada inicialmente pela técnica de Microarray, diz respeito a proteínas que pertencem
às superfamílias de lipocalinas encontradas em neutrófilos humanos ligadas covalentemente à
gelatinase. Possui uma sequência de 178 aminoácidos com formas monoméricas, diméricas e
triméricas, podendo, assim, ser secretados pelos túbulos renais lesionados (em particular a dimérica,
secretada pelos neutrófilos) (DEVARAJAN, 2006).
É expressa em vários tecidos como rins, pulmões, estômago e cólon em níveis muito baixos, porém,
quando tais tecidos estão lesionados ou há uma infecção bacteriana, há uma aumento significativo
da sua expressão. Tem se mostrado um bom indicador de lesão renal na medicina translacional.
N-acetil-b-D-glucosaminidase (NAG)
Consiste em uma enzima lisossomal com aproximadamente 140 kDa presente em várias células
e que catalisa a hidrólise de glicoproteínas. É considerada um bom indicador de lesão renal por
mostrar-se sensível a lesões tubulares, contudo, pacientes com diabetes, artrite-reumatoide e
hipotireoidismo devem passar por uma análise criteriosa, pois podem apresentar resultado falso
positivo na determinação dessa enzima.
Glicoproteína transmembrana apenas expressa em lesão renal como insuficiência renal aguda
isquêmica e tóxica, é considerada um bom marcador uma vez que não está expressa em rins normais
e no processo de recuperação após lesão epitelial.
Interleucina-18
Citocina pró-inflamatória de 24 kDa utilizada como indicador de necrose tubular aguda, é clivada
pela caspase-1, que induz a síntese de interferon e outras citocinas inflamatórias, além do fator de
necrose tumoral. Seu aumento é muito significativo, pois eleva-se antes mesmo da creatinina sérica
em pacientes com insuficiência renal aguda e com insuficiência respiratória aguda submetidos à
ventilação mecânica. Pode ser determinada no plasma ou na urina de 6 a 24 horas após lesão renal.
68
BIOQUÍMICA CLÍNICA
O exame de urina de rotina inclui a análise das características físicas e químicas, além da análise
do sedimento. Em cada etapa é analisado um parâmetro específico.
As características analisadas na fase física incluem volume, cor, aspecto e densidade, como
veremos a seguir.
Volume
Cor
A cor da urina pode variar de incolor até preto. Essa gama de variações pode decorrer de funções
metabólicas normais, pela atividade física, por substâncias ingeridas (como medicamentos) ou por
condições patológicas. Normalmente, a coloração de uma urina normal é amarelada, resultante da
excreção de três pigmentos presentes no nosso organismo: urocromo (amarelado), uroeritrina (rosa
ou avermelhado) e urobilina (laranja), produtos normais do metabolismo do organismo.
Aspecto
Deve-se tomar cuidado ao analisar esse parâmetro, pois podem existir causas não patológicas
para a alteração do padrão normal da urina, como células escamosas de descamação do trato genital
feminino, muco, contaminação fecal, cremes vaginais e contraste radiológico, tornando essa urina turva.
69
Unidade I
refrigeração e a má conservação da amostra também podem levar a uma turvação não patológica. Já as
causas patológicas estão relacionadas à presença de hemácias, leucócitos, leveduras e cristais.
Densidade
Atualmente, existem duas maneiras de medir a densidade: uma pelo refratômetro e outra pela fita
reagente (que, em alguns casos, fica na parte do exame químico da urina). O refratômetro vai avaliar a
densidade, determinando a concentração de partículas dissolvidas em uma amostra, o que é chamado
de índice de refração ou índice refratométrico, o qual se baseia na comparação da velocidade da luz
no ar com a velocidade da luz em uma solução.
70
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Nessa etapa os parâmetros analisados são: pH, proteínas, hemoglobina, glicose, bilirrubinas,
urobilinogênio, corpos cetônicos, nitrito, densidade e esterase leucocitária (leucócitos). Para isso,
podemos utilizar as fitas reagentes (análise manual ou semiautomática do exame) ou os aparelhos
automatizados que existem atualmente nos laboratórios de análises clínicas.
A utilização das tiras reagentes permite, de uma maneira rápida e fácil, a realização das análises
químicas da urina. Existem no mercado diversas marcas de fita, fazendo com que tenhamos uma
certa variedade em relação ao número de parâmetros analisados, às variações na sensibilidade e na
especificidade e aos tipos de substâncias interferentes, ficando a critério de cada laboratório escolher
a mais adequada.
Ocorre a reação química quando a urina entra em contato com a fita. Os resultados podem ser
interpretados comparando-se a cor formada após a reação com uma tabela de cor padrão fornecida
pelo fabricante. Diversas cores ou intensidades de cores podem ser formadas para cada substância a
ser testada na fita.
71
Unidade I
Os resultados podem ser interpretados, então, após a comparação cuidadosa dessas cores, e um
valor sem quantitativo de traços, + 1, + 2, + 3 ou + 4, poderá ser relatado. Para alguns parâmetros,
uma estimativa em miligramas por decilitros poderá ser descrita.
pH
Como vimos, uma das funções do rim é ajudar o corpo a manter o equilíbrio ácido-base. Para
que o nosso organismo consiga manter o pH constante no sangue (cerca de 7,40), o rim deve variar
o pH a fim de compensar a influência dos alimentos da dieta e dos produtos do metabolismo. Essa
compensação ocorre pela secreção de hidrogênio (H+) e de ácidos orgânicos fracos, além da reabsorção
de bicarbonato do ultrafiltrado pelos túbulos contornados.
Se o organismo apresentar uma acidose (excesso de ácido), uma maior quantidade de H+ será
secretada, fazendo com que a urina se torne ácida. Já se houver uma alcalose (excesso de base), uma
menor quantidade de H+ será secretada, fazendo com que a urina se torne alcalina. O pH normal da
urina pode variar entre 4,6 e 8,0.
pH
60 segundos 5.0 6.0 6.5 7.0 7.5 8.0 8.5
Devemos tomar certo cuidado para não umedecer demais a fita reagente, para que o tampão
ácido da proteína não escorra na placa do pH, tornando-a laranja. É importante esclarecer ainda
que o crescimento bacteriano pode tornar o pH alcalino, devido ao fato de a ureia ser convertida em
amônio. Urinas ácidas, por sua vez, são encontradas em condições de dieta rica em proteína, acidose
metabólica ou respiratória e uso de certos medicamentos.
Proteína
72
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Glicose
A causa mais comum é o diabetes mellitus, no entanto algumas gestantes podem apresentar tal
quadro em um determinado período da gestação. Mas, caso o quadro persista, a paciente deverá
fazer um acompanhamento mais meticuloso com um endocrinologista. Outras patologias, como a
síndrome de Fanconi, também dificultam a reabsorção da glicose, levando à grande liberação desse
substrato por meio da urina.
A presença de corpos cetônicos na urina (acetona 2%, ácido acetoacético 20% e ácido
beta‑hidroxibutírico 78%) indica que os ácidos graxos estão sendo utilizados como fonte de energia, e
não os carboidratos (caso de dietas, jejum prolongado, desidratação, vômitos, diarreias e em pacientes
com diabetes mellitus descompensada) (MUNDT; SHANAHAN, 2012).
A verificação de cetonas na urina ocorre por uma reação química em que é utilizado, como
reagente, o nitroprussiato de sódio, que irá reagir com o ácido beta-hidroxibutírico, produzindo uma
mudança de cor conforme a reação indicada a seguir:
pH alcalino
Ácido acetoacético + nitroprussiato de Na + glicina cor violeta púrpura
Sangue
O sangue pode ser identificado na urina pela presença de hemácia íntegra (hematúria) e de hemácia
lizada, e a reação é positivada pela presença de hemoglobina (hemoglobinúria). Normalmente, não é
observada a presença de sangue na urina. Quando a fita reagente está positiva, deve-se investigar a
causa e a origem dessa alteração anormal.
A hematúria indica um sangramento em qualquer parte do trato urinário, desde o glomérulo até
a uretra, podendo ter como causa infecções, tumor, trauma, cálculo renal, glomerulonefrites, nefrites
ou o uso de anticoagulantes. Já a hemoglobinúria indica uma hemólise intravascular.
Sangue Moderado
Negativo Traços não
60 segundos não
hemolisados hemolisado
73
Unidade I
Bilirrubina
Em pacientes normais, não é observada a presença de bilirrubina na urina. Quando isso ocorre, é
indicativo de obstrução do ducto biliar ou alteração hepática, pois acontece o refluxo de bilirrubina
conjugada para a circulação.
Na fita reagente, a reação que ocorre é a reação de diazo, na qual há uma mudança de cor de
marrom-claro para violeta.
Urobilinogênio
Conforme visto no processo de sua formação, assim que a bilirrubina chega ao intestino, bactérias
(intestinais) reduzem-na a urobilinogênio e estercobilinogênio. Uma parte do urobilinogênio é
reabsorvida do intestino, voltando para o fígado, e excretada de volta para o intestino. Nessa fase,
quando o urobilinogênio faz a recirculação no fígado, ele passa obrigatoriamente pelos rins, sendo
filtrado pelo glomérulo. Portanto, uma pequena quantidade de urobilinogênio aparece na urina em
pacientes saudáveis. Já o estercobilinogênio que não pode ser reabsorvido fica no intestino e sofre
oxidação, transformando-se em urobilina e, então, sendo excretado nas fezes.
Nitritos
Cabe ressaltar que nem todas as bactérias causadoras de infecção urinária reduzem o nitrato a
nitrito, como o Staphylococcus saprophyticus, o Enterococcus faecalis e as leveduras. Por isso, deve-se
ter cuidado ao analisar o teste de nitrito, uma vez que o paciente pode apresentar uma infecção e o
74
BIOQUÍMICA CLÍNICA
parâmetro se mostrar negativo. A verificação de nitritos nas tiras reagentes está baseada na reação de
Griess, em que qualquer intensidade da coloração rosa é positiva.
Ácido
Ácido para – arsanílico + NO2 sal diazônio
Ácido
Sal diazônio + tetra-hidrobenzoquinolina azodye róseo
Reação A:
Esterase
Indoxil ou pirrol éster de ácido carbônico Indoxil ou pirrol
Granulocítica
Reação B:
Observação
A hiperuricemia corresponde ao aumento dos níveis de ácido úrico. A mais conhecida é a gota (ou
artrite gotosa). Existem outras patologias associadas ao aumento do ácido úrico (como as leucemias,
policitemia, mieloma múltiplo) e ao uso de alguns anti-inflamatórios.
75
Unidade I
Já a hipercreatinemia ocorre pela diminuição da excreção urinária e, portanto, aumento dos níveis
séricos. Os níveis de creatinina são observados em pacientes com diabetes melito não controlado,
com insuficiência cardíaca congestiva, hipertireoidismo, lesão glomerular e hipertrofia prostática,
entre outros.
Os líquidos cavitários, também conhecidos como líquidos serosos, estão situados nas cavidades
fechadas do organismo: a cavidade peritoneal, a cavidade pleural e a cavidade pericárdica. Todas
essas cavidades são revestidas por membranas, chamadas de membranas serosas, que recobrem cada
órgão e a parede corporal.
A membrana que recobre a parede da cavidade é chamada de membrana parietal, e a que recobre
os órgãos é denominada membrana visceral. Entre essas membranas, encontra-se o líquido seroso,
que tem a função de lubrificar o espaço entre as membranas, permitindo a movimentação desses
órgãos e diminuindo, assim, o atrito entre eles. Um exemplo dessa movimentação é a expansão e
a contração dos pulmões. O líquido seroso tem origem na ultrafiltração do plasma, que mantém
suas características sem que nenhuma outra substância seja adicionada pelas células mesoteliais
do revestimento das membranas nesse ultrafiltrado. Portanto, a composição do líquido é similar
à do plasma sanguíneo. Como dito, o equilíbrio entre as pressões coloidosmótica e hidrostática faz
com que o fluido fique localizado entre as membranas, e a manutenção do volume desse líquido em
situações fisiológicas depende do aumento da pressão coloidosmótica nos capilares, que favorece
a reabsorção do líquido de volta para os capilares, mantendo o volume normal do líquido entre as
membranas. Caso ocorra qualquer desbalanço entre essas pressões, o líquido aumentará e haverá a
formação do derrame.
Para que ocorra a formação do derrame cavitário, é preciso que haja: aumento da pressão
hidrostática (insuficiência cardíaca congestiva); diminuição da pressão oncótica da microcirculação
(hipoproteinemia); aumento da permeabilidade capilar (inflamação e infecção) e obstrução linfática
(tumores). A análise laboratorial do líquido cavitário inclui coleta, análise física, análise bioquímica,
análise citológica e análise microbiológica. A origem e a classificação desse líquido em transudato e
exsudato são os primeiros passos para um diagnóstico inicial, pois, dependendo dessa classificação,
será necessário realizar exames laboratoriais mais específicos, que variam entre os líquidos (ANGELERI
et al., 2016).
76
BIOQUÍMICA CLÍNICA
A coleta do líquido peritoneal é chamada de paracentese e é realizada pelo médico através de uma
punção aspirativa estéril no quadrante inferior esquerdo (no ponto central, em uma linha imaginária
que passa na crista ilíaca superior à cicatriz umbilical e longe dos vasos hipogástricos).
O líquido é transferido para tubos específicos para cada análise e enviado imediatamente após a
coleta para o laboratório. Um tubo contendo o anticoagulante etilenodiaminotetracético (EDTA) será
utilizado para a contagem das células e o diferencial; um tubo sem anticoagulante será utilizado
para as dosagens bioquímicas, imunológicas e de cultura microbiológica; e uma seringa heparinizada
será utilizada para dosar o pH. As amostras devem ser analisadas logo após a coleta. Caso isso não
seja possível, deverão ser armazenadas e conservadas sob refrigeração entre 2 ºC e 8 ºC por, no
máximo, 48 horas.
As dosagens bioquímicas mais comuns utilizadas para avaliação do líquido peritoneal são as de
glicose, LDH e proteínas. O valor da dosagem da albumina no líquido é representado da seguinte forma:
Os valores normais para a glicose são semelhantes aos valores séricos do paciente; se estão abaixo,
indicam peritonite bacteriana e tuberculosa nas neoplasias. A dosagem de LDH possui correlação
clínica para a diferenciação entre transudato e exsudado quando a relação entre a concentração do
soro e a do líquido é realizada através dos critérios de Light modificados.
77
Unidade I
Se apenas dois ou três desses critérios forem preenchidos, considera-se exsudato. Outros analitos
podem ser dosados em situações especiais. A dosagem de fosfatase alcalina sofre elevação quando
há perfuração do intestino delgado. A amilase também pode ser dosada e, quando elevada, indica
perfuração esofágica e adenocarcinoma, na pancreatite e na necrose intestinal. A análise citológica
é um importante parâmetro na avaliação dos exsudatos, pois detecta células neoplásicas de origem
primária ou metástase. A análise citológica é realizada em um esfregaço corado, e nela são feitas
a identificação e a contagem das células; quando aumentadas, é realizada a contagem diferencial
para verificar qual tipo celular é predominante e, com isso, identificar as possíveis causas. As células
neoplásicas também são identificadas, sendo um importante parâmetro para descobrir a origem
da neoplasia, que geralmente é gastrointestinal, da próstata e do ovário. As células mais comuns
observadas são: leucócitos, hemácias, células mesoteliais e macrófagos.
A coleta do líquido pleural é chamada de toracocentese e é realizada pelo médico através de uma
punção aspirativa estéril na região subescapular, sempre na borda superior do arco costal, para evitar
o feixe vásculo-nervoso. O líquido é transferido para tubos especiais, específicos para cada análise, e
enviado imediatamente após a coleta para a análise no laboratório. Um tubo contendo o EDTA será
utilizado para a contagem das células e o diferencial; um tubo sem anticoagulante será utilizado
para as dosagens bioquímicas, imunológicas e de cultura microbiológica; uma seringa heparinizada
será utilizada para dosar o pH. As amostras devem ser analisadas logo após a coleta. Caso isso não
seja possível, deverão ser armazenadas e conservadas sob refrigeração entre 2 ºC e 8 ºC por, no
máximo, 48 horas.
As dosagens bioquímicas devem ser realizadas para avaliação de pH, glicose, proteínas, adenosina
deaminase (ADA), amilase e LDH. A dosagem de triglicérides também pode ser utilizada para confirmar
a presença de um derrame quiloso. Os critérios de Light são muito utilizados para diferenciar um
transudato de um exsudato no líquido pleural.
78
BIOQUÍMICA CLÍNICA
• Relação LDH no líquido pleural > 2/3 do limite superior da normalidade da LDH sérica.
• Relação de LDH fluido: soro < 0,6 (transudato) > 0,6 (exsudato).
O valor de pH normal varia de 6,8 a 7,6. Abaixo disso, pode indicar a necessidade de drenagem ou
o uso de antibióticos, nos casos de pneumonia. Nos casos de acidose, o pH do líquido pleural deve
ser comparado com o pH sanguíneo; caso apresente uma variação de 0,3 abaixo do pH sanguíneo,
teremos um achado significativo.
O valor normal para a glicose varia de 70 mg/dL a 99 mg/dL. Abaixo disso, indica tuberculose,
inflamação reumatoide e infecções purulentas. Os valores normais para proteína vão até 2,9 mg/dL;
acima de 3,0 mg/dL, já é sugestivo de exsudato.
A ADA, enzima relacionada com o metabolismo e a proliferação dos linfócitos, é de alta sensibilidade
e especificidade. Está aumentada em 95% dos derrames pleurais por tuberculose; encontra-se também
aumentada no empiema e muito elevada nos linfomas. Em caso de ADA > 60 U/l, é praticamente
confirmado o diagnóstico de tuberculose, já ADA < 40 U/I exclui tal possibilidade.
Níveis elevados de amilase estão associados a pancreatite e a amilase, na maioria das vezes,
elevando-se primeiro no líquido pleural. Esse aumento pode também indicar uma ruptura esofágica
em neoplasias. Os níveis de LDH no líquido pleural com concentrações maiores que o nível de LDH
no plasma são indicativos de exsudatos, sugerindo a presença de doença inflamatória ou neoplásica.
Na análise bioquímica, são dosadas as concentrações de glicose, proteína, ácido úrico e LDH. As
concentrações de glicose no líquido sinovial são semelhantes às plasmáticas. Por isso, a interpretação
adequada dos valores de glicose do líquido sinovial requer uma comparação com os níveis séricos da
glicose em jejum. Em condições normais e na maioria das circunstâncias não inflamatórias, a diferença
é menor que 10 mg/dL. Diferenças significativas são encontradas nos processos inflamatórios e
infecciosos (maior que 40 mg/dL). Os valores da glicose podem ser mascarados pela glicólise, quando
da presença de um grande número de leucócitos.
A concentração normal de proteínas varia de 1,2 g/dL a 2,5 g/dL. Valores aumentados são
encontrados em processos inflamatórios e sépticos. Durante a fase inflamatória, proteínas maiores,
como o fibrinogênio, entram no líquido sinovial.
O ácido úrico no líquido sinovial varia de 6 mg/dL a 8 mg/dL, e a presença de valores aumentados
faz o diagnóstico de gota. Geralmente, esse aumento do ácido úrico está relacionado com a presença
de cristais.
79
Unidade I
A glicose entra no liquor através de transporte facilitado pelas células endoteliais, além de
atravessar um gradiente por difusão simples. A concentração normal de glicose no liquor corresponde
a 2/3 da glicemia ou > 60 mg/dL.
Os níveis de glicose são utilizados para diferenciar meningites bacterianas de virais. A diminuição
da concentração de glicose (hiperglicorraquia) é resultado de processos infecciosos (pois tanto
leucócitos quanto microrganismos consomem a glicose como fonte de energia), hipoglicemia e
carcinoma metastático.
As proteínas presentes no liquor são derivadas das proteínas plasmáticas, que são transportadas
pelas células endoteliais das meninges e pela síntese intratecal, constituídas, em grande parte, de
albumina e, em muito menor quantidade, de globulina. A dosagem de proteína é útil para detectar
doenças do sistema nervoso central que estão associadas com o aumento da permeabilidade da
barreira hematoencefálica ou a intratecal de imunoglobulinas.
Os valores normais para proteínas variam de 10 mg/dL a 45 mg/dL em adultos e 15 mg/dL a 60 mg/dL
em recém-nascidos. A hiperproteinorraquia é a mais comum de acontecer e está presente em infecções,
hemorragias intracranianas, esclerose múltipla, neoplasias e condições inflamatórias.
Níveis reduzidos de proteína podem aparecer em perda de volume do liquor, ruptura dural e
hipertireoidismo. A eletroforese de proteína pode ser realizada no liquor e indicará quais frações estão
presentes, assim como a concentração de cada uma delas.
80
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Para a diferenciação das meningites, encontramos o lactato com uma concentração de até
30 mg/dL nas meningites virais e acima de 35 mg/dL nas meningites bacterianas, fúngicas e
tuberculosas. Os níveis de lactado se tornam mais importantes quando temos coloração gram‑negativa
com predomínio de polimorfonucleares e dosagem de glicose baixa.
A LDH é uma enzima citoplasmática que está presente na maioria dos tecidos do corpo humano,
sendo útil para diferenciar uma punção traumática de uma hemorragia preexistente, já que na punção
traumática com hemácias íntegras não ocorre a liberação e o aumento da LDH. Alguns estudos têm
demonstrado que pacientes que possuem patologias de origem neoplásica e infecções bacterianas
apresentam níveis elevados de LDH no liquor, quando comparados aos valores de pacientes normais.
O sêmen é composto de células e do plasma seminal. Nesse plasma, encontramos várias substâncias
que fornecem suporte nutricional para os espermatozoides e substâncias que são produzidas nas
glândulas acessórias, como vesícula seminal e próstata.
Embora existam testes para a determinação desses marcadores, não se sabe ainda ao certo o papel
de cada um deles. A exceção a essa regra é a determinação da frutose, um açúcar presente no plasma
seminal que consiste na fonte de energia dos espermatozoides. A frutose pode estar ausente ou
diminuída em várias condições que causam infertilidade masculina. A ausência de frutose pode indicar
ausência congênita bilateral dos canais deferentes ou obstrução bilateral dos ductos ejaculadores.
81
Unidade I
Resumo
82
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Exercícios
Questão 1. Leia o texto a seguir.
Para o seu rastreamento, o exame citológico proposto por Papanicolaou (1941) baseia-se em uma
metodologia de diagnóstico presuntivo e preventivo para a detecção do câncer do colo de útero e
suas lesões precursoras. Como é um procedimento totalmente manual, desde a coleta do material até
a liberação do resultado pelo laboratório, sua vulnerabilidade a erros é considerável e pode interferir
na acurácia do diagnóstico. Desse modo, as etapas que compreendem a coleta, a fixação, a coloração
do esfregaço, a montagem da lâmina e a subjetividade na interpretação dos resultados são fatores
que podem comprometer drasticamente a sensibilidade do exame.
No Brasil, o Ministério da Saúde, na tentativa de aumentar a eficácia do rastreamento e diagnóstico
do câncer do colo útero, tem implantado sistemas de controle de qualidade interno e externo nos
laboratórios que realizam exames para o Sistema Único de Saúde (SUS), os quais visam garantir a
organização e a integridade de qualidade do serviço prestado. Na fase pré-analítica, são avaliados
os procedimentos técnicos relacionados à qualidade de confecção de esfregaço, fixação, coloração e
montagem. Essas etapas de execução podem influenciar significativamente a qualidade do laudo e a
produtividade entre os observadores.
SILVA, G. P. F. et al. O impacto da fase pré-analítica na qualidade dos esfregaços cervicovaginais.
Revista Brasileira de Análises Clínicas, v. 49, n. 2, p. 135-140, 2017 (com adaptações).
83
Unidade I
I – Afirmativa correta.
II – Afirmativa correta.
De acordo com Xie et al. (2020), os pacientes com provável infecção por SARS-CoV-2 podem
apresentar resultados iniciais negativos na RT-PCR, por diversas razões, mas principalmente pela
extração inadequada de ácido nucleico e a insuficiência de material celular para a detecção do vírus.
Ressalta-se que ainda não se sabe o intervalo dos níveis virais na covid-19 e o tempo ideal para
realizar a coleta do material.
Nesse contexto, cabe frisar que é indicada a realização da RT-PCR na fase aguda da doença entre
o primeiro ao oitavo dia do surgimento dos sintomas para o diagnóstico da covid-19, visto que após
esse período ocorrem o aumento da produção de anticorpos (inicialmente IgM) e a diminuição da
carga viral. Dessa forma, o resultado pode ser falso-negativo.
OLIVEIRA, E. S.; MATOS, M. F.; DE MORAIS, A. C. L. N. Perspectiva de resultados falso-negativos no teste de RT-PCR
quando realizado tardiamente para o diagnóstico de covid-19. InterAmerican Journal of Medicine and Health,
v. 3, e202003016, p. 1-7, 2020 (com adaptações).
84
BIOQUÍMICA CLÍNICA
O texto faz referência a um teste empregado na detecção de muitas enfermidades e que ganhou
papel de destaque no diagnóstico da covid-19, embora falhas possam ocorrer. Sobre esse exame e as
suas características técnicas, avalie as afirmativas a seguir.
I – A RT-PCR é uma reação que utiliza a enzima transcriptase reversa, seguida de PCR, atuando
sobre uma molécula de RNA (cadeia simples) para sintetizar uma cadeia de DNA complementar (cDNA).
II – Após a definição do RNA a ser usado na reação e a síntese do cDNA, está na hora de permitir
que as proteínas fiquem acessíveis à detecção pelos anticorpos pela transferência delas de um gel
para uma membrana adsorvente.
III – Por meio da RT-PCR, é possível monitorar o progresso da PCR enquanto ocorre a reação, e os
dados são coletados em tempo real ao longo dos ciclos.
A) I, apenas.
B) II, apenas.
C) III, apenas.
D) I e III, apenas.
E) I, II e III.
I – Afirmativa correta.
Justificativa: de fato, a Real Time Polimerase Chain Reaction (RT-PCR) destaca-se da técnica
original por não usar o DNA (cadeia dupla) no início da reação, mas, sim, o RNA (cadeia simples) em
associação com a transcriptase reversa.
II – Afirmativa incorreta.
85
Unidade I
86
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Unidade II
5 PERFIS BIOQUÍMICOS HEPÁTICO E PANCREÁTICO
O fígado é um dos principais órgãos que compõe o corpo humano. Localizado na cavidade
abdominal, o fígado é uma espécie de máquina do metabolismo, participando de processos críticos
de biotransformação de diferentes substâncias e na produção de proteínas plasmáticas fundamentais
para o controle do fluxo de energia e de nutrientes e para a desintoxicação e excreção de produtos
residuais do metabolismo.
Constituído pelos hepatócitos, o fígado é estudado desde 3000 a.C. devido à sua importância
clínica. A busca por alterações hepáticas relacionadas às doenças humanas é realizada de diferentes
maneiras, desde o exame físico dos indivíduos até exames de imagem e de laboratório clínico,
especificamente os exames bioquímicos. Aproximadamente 80% do diagnóstico de lesões hepáticas
podem ser realizados pelo exame clinico, entretanto, com o auxílio do laboratório bioquímico, o
índice de assertividade diagnóstica pode chegar a 95%.
Entre as provas bioquímicas mais utilizadas para a avaliação das funções hepatobiliares e as lesões
hepáticas, destacam-se a dosagem da aspartato aminotransferase (AST), alanina aminotransferase (ALT),
desidrogenase lática (LDH), fosfatase alcalina (FAL), gama glutamil transferase (GGT), albumina, tempo
de protrombina (TP) e as bilirrubinas totais e frações.
A utilização de testes para a avaliação do perfil hepático é importante para o diagnóstico de doenças,
monitoramento de tratamentos medicamentosos, para determinar a gravidade de enfermidades e
para, muitas vezes, avaliar o prognóstico do paciente.
As transaminases hepáticas (ALT e AST), também conhecidas como transaminase glutâmico‑pirúvica (TGP)
e transaminase glutâmico-oxalacética (TGO), respectivamente, são enzimas hepáticas agregadas ao
citosol dos hepatócitos.
87
Unidade II
A ALT é uma proteína produzida mais especificamente no fígado, podendo ser encontrada na
musculatura esquelética, nos rins, no cérebro, no pâncreas, no baço, no pulmão e nos eritrócitos. A
elevação nos níveis de ALT sérica é uma medida sensível, mas não 100% específica, para detecção de
lesão hepatocelular. Entre as causas mais comuns de sua elevação, destacam-se as lesões hepáticas
induzida por álcool, doença hepática gordurosa não alcoólica, hepatites virais, hepatite autoimune
e doenças hepáticas medicamentosas. Outras causas incluem hemocromatose, doenças vasculares e
doenças genéticas que acometem o fígado.
A AST é uma enzima produzida também nos hepatócitos, entretanto, também é encontrada em
outros tecidos. De importante valor preditivo em doenças cardíacas (infarto agudo do miocárdio), a
AST é uma enzima que catalisa a reação entre o aspartato e o alfa-cetoglutarato na formação de
oxaloacetato e glutamato.
Assim, a elevação de ALT é considerada mais específica em pacientes com lesão hepática do que a
elevação pura da AST. Atualmente, considera-se que, nas doenças hepáticas, a razão AST/ALT é menor
que 1. Já em pacientes com doença hepática causada por etilismo (alcoolismo), essa razão tende a
valores maiores que 2, pois há deficiência de piridoxal-5’-fosfato em indivíduos etilistas crônicos.
88
BIOQUÍMICA CLÍNICA
No caso das suspeitas de hepatites, o histórico do paciente é fundamental para uma correta
relação clínico-laboratorial. Ainda, sorologias devem ser realizadas para a constatação ou afastamento
da hipótese diagnóstica de hepatites virais. Além dos painéis sorológicos, o médico assistente do
paciente deve solicitar exames complementares, como hemograma, proteína C reativa e, em casos
específicos, testes de biologia molecular para identificação e quantificação da carga viral.
Por fim, quando um médico solicita testes para avaliação do perfil hepático, alguns fatores
pré‑analíticos são de suma importância para a correta relação clínico-laboratorial, como a verificação do
índice de hemólise do sangue. Uma amostra hemolisada é considerada imprópria para a realização
do teste. Essa constatação pode ser realizada com auxílio de espectrofotometria ou pela inspeção visual.
Um painel de testes laboratoriais para avaliar as funções hepáticas, também conhecido como
teste de função hepática, é comumente utilizado na prática clínica. O teste de função hepática
compreende as dosagens de bilirrubinas totais e frações, ALT, AST, LDH, FAL, GGT, TP e albumina sérica.
Na tabela a seguir estão os valores de referência básicos para as enzimas e proteínas de avaliação de
função hepática:
É muito importante ressaltar que esses valores de referência são uma base (modelo), uma vez que
essas informações podem se alterar diante de diferentes metodologias.
Considerando-se que qualquer lesão hepática pode alterar a função do fígado, os níveis séricos
das enzimas funcionais podem se encontrar alterados. Assim, rotineiramente observam-se aumentos
nos níveis séricos de AST e ALT de forma concomitante. Os níveis de ALT maiores que 1.000 U/L devem
considerar lesão isquêmica hepática aguda, lesão hepática grave induzida por drogas ou hepatite
viral aguda. Outras causas incluem cálculos do ducto biliar comum e infecção por hepatite E.
A isquemia hepática ocorre quando há uma redução aguda na perfusão sanguínea para o fígado,
levando esse órgão à necrose das células centrolobulares hepáticas. A ocorrência de dano hepático é
maior no choque séptico, quando a diminuição da perfusão do sangue para o fígado acontece devido
a processos infecciosos, com evolução para choque séptico. Nesses casos, a dosagem de ALT apresenta
maior sensibilidade diagnóstica, devendo ser acompanhada pelos marcadores lactato, proteína C
reativa, hemograma, dímero D e hemocultura.
No cenário das enfermidades hepáticas, a doença hepática gordurosa não alcoólica (esteatose
hepática) é uma das principais causas de alteração das enzimas do fígado. Com potencial de progredir
para fibrose hepática e cirrose, essa doença está geralmente associada a níveis mais elevados de
ALT e GGT. Como fatores de risco, destacam-se a obesidade mórbida, diabetes melito, hipertrigliceridemia,
hipertensão e resistência à insulina.
Para a avaliação das hepatites alcoólicas, virais e fibrose/cirrose hepática, a razão entre AST e ALT
é utilizada como marcador prognóstico, conforme apresentado na tabela a seguir.
A utilização dessa proporção é muito questionável por laboratórios de rotina. Entre os principais
motivos, destaca-se que a dosagem da AST é hemólise-comprometida; a proporção pode alterar-se
conforme o número de dias após a exposição e pela gravidade da doença, além disso, há a meia-vida
relativamente curta de AST (18 horas) em comparação com ALT (47 horas).
O LDH é uma enzima presente de maneira disseminada no organismo humano. Com função
de catalisar a oxidação reversível do lactato a piruvato, essa enzima se encontra de maneira mais
abundante no miocárdio, no fígado, no músculo esquelético, no rim e nos eritrócitos.
A desidrogenase lática é habitualmente solicitada pelo corpo clínico devido à sua elevação
em lesões isquêmicas hepáticas e para a detecção de tumores hepáticos de elevado grau de
comprometimento morfofuncional.
A Gama-glutamil-transferase (GGT)
A GGT é uma enzima primordialmente, mas não exclusivamente, hepática. Com função no
transporte de aminoácidos e peptídios através das membranas celulares, na síntese proteica e na regulação
dos níveis de glutationa tecidual, trata-se de uma enzima particularmente importante na avaliação do
90
BIOQUÍMICA CLÍNICA
A FAL é uma enzima associada ao transporte lipídico no intestino e aos com processos de
calcificação óssea. Sua forma predominante origina-se nos ossos, entretanto, também tem atividade nos
canalículos biliares. Dessa forma, a FAL é uma enzima hepática que apresenta boa sensibilidade para
o diagnóstico de doenças do trato biliar.
• hepatites e cirrose;
• mononucleose infecciosa;
• colangite;
• calculose biliar;
• fraturas ósseas.
As bilirrubinas totais são compostas de suas frações direta e indireta. De origem primária da
degradação e metabolização da porção heme da molécula de hemoglobina no baço, a bilirrubina
indireta (BI) é produzida e se liga a sua proteína transportadora, a albumina (ALB).
91
Unidade II
O complexo BI + ALB chegam aos hepatócitos, os quais conjugam essa BI em bilirrubina direta (BD)
com o ácido glicurônico no retículo endoplasmático liso. A bilirrubina direta, no intestino, é degradada
pelo microbioma intestinal em estercobilinogênio e urobilinogênio. O estercobilinogênio é excretado
pelas fezes e parte do urobilinogênio retorna ao sistema hepático para a sua excreção na urina.
As bilirrubinas são encontradas na circulação sanguínea de maneira diminuta ou, até mesmo,
ausente. Em situações de doença, o acúmulo de frações da bilirrubina, indireta ou direta, causa um
sinal no paciente denominado icterícia. A icterícia é evidenciada pela coloração amarelada que esse
pigmento, em excesso, manifesta na pele, na esclera dos olhos e na urina, entre outros.
As bilirrubinas são dosadas por métodos colorimétricos. Nos laboratórios de bioquímica, dosa-se
habitualmente a bilirrubina total (BT) e a bilirrubina direta (BD). Pela diferença entre a BT e a BD,
calculamos a BI. O teste é realizado com o ácido sufanílico diazotizado, que forma um conjugado
de composto azo com anéis porfirínicos da bilirrubina. Essa bilirrubina é, então, mensurada em
espectrofotometria, com a detecção da sua absorbância, sob comprimento de onda de 540 nm.
• icterícias pré-hepáticas;
• icterícias pós-hepáticas.
Icterícia pré-hepática
A icterícia pré-hepática é causada pelo aumento da bilirrubina indireta, por diferentes razões:
desde a sua característica fisiológica em recém-nascidos (devido à imaturidade hepática no processo
de conjugação) até casos de hemólise intravascular, em pacientes com quadro de anemia hemolítica.
92
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Além da elevação da BI, as icterícias pré-hepáticas são acompanhadas pelo aumento dos níveis de
LDH e, consequentemente, dos níveis de BT.
Icterícia hepática
As icterícias hepáticas são caracterizadas pelo aumento da bilirrubina direta. Como etiologia,
destacam-se os processos que levam à lesão dos hepatócitos, como nos processos infecciosos/
medicamentosos (caso das hepatites), por processos inflamatórios e tóxicos e por alterações no
parênquima hepático (por exemplo, cirrose).
As icterícias hepáticas são geralmente acompanhadas da elevação das enzimas hepáticas AST e
ALT e, também devido à disfunção hepática, dos níveis de BI.
Nas icterícias hepáticas, a dosagem de urobilinogênio na urina encontra-se elevada. Dessa forma,
na urina de pacientes com icterícia hepática poderemos encontrar aumento de BD e de urobilinogênio.
Icterícia pós-hepática
As proteínas plasmáticas são sintetizadas, em sua maioria, no fígado. Com absorção no intestino
delgado, as proteínas totais (PT) são dosadas como marcador para avaliação da função hepática. Entre
as proteínas mais importantes do organismo humano, destacamos a albumina e as globulinas, que
serão apresentada a seguir.
A albumina (ALB) corresponde a aproximadamente 60% das proteínas totais do sangue. Sintetizada
no parênquima hepático, apresenta meia-vida de aproximadamente 17 dias.
Com função na regulação osmótica celular e tecidual, a ALB atua como proteína transportadora
de substâncias. Um exemplo, já citado anteriormente, é o transporte da BI pela ALB até o parênquima
93
Unidade II
hepático. Além disso, a ALB atua também no armazenamento e na ligação de compostos pouco
solúveis em água, de fármacos e ácidos graxos livres, entre outros. Outra função da ALB é fornecer
aminoácidos para a formação de outras proteínas.
As alterações nos níveis de albumina sérica podem ser devido à sua elevação (hiperalbumineia)
ou sua diminuição (mais frequente, hipoalbuminemia). A hipoalbuminemia é, geralmente, causada
pela insuficiência do hepatócito no processo de síntese proteica. As principais causas de ambas são
apresentadas no quadro a seguir.
Hiperalbuminemia Hipoalbuminemia
Meningites bacterianas Perda excessiva de proteínas
Desidratação aguda Cirrose
Carcinomatose metastática Síndrome nefrótica
Diarreia Queimaduras
Mieloma múltiplo Desnutrição grave
Politraumas Perda gastrointestinal
Vômitos Hepatites virais
As globulinas, junto com a albumina, são as proteínas de interesse clínico na maioria das disfunções
hepáticas e outras doenças. As globulinas são classificadas em Alfa1, Alfa2, Beta e Gamaglobulinas
(responsável pela produção dos anticorpos humanos).
Colinesterase
94
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Leucina aminopeptidase
Para doenças hepáticas, os níveis séricos de leucina aminopeptidase encontram-se elevados. Já para
distúrbios regulatórios de controle de pressão arterial (hipertensão) via sistema renina-angiotensina-
aldosterona, há a diminuição da sua atividade.
A dosagem no soro da leucina aminopeptidase pode ser realizada por espectrofotometria cinética.
O pâncreas é uma glândula que possui função mista: endócrina e exócrina. O pâncreas é um órgão
impossível de ser apalpado por se localizar atrás do estômago, entre o intestino e o baço (ou seja, na parte
posterior do abdômen superior). Dividido em três partes (cabeça, corpo e cauda), tem aproximadamente
15 cm de comprimento, de 3 cm a 5 cm de largura e de 2 cm a 3 cm de espessura. Divide-se assim: a
cabeça (larga); o istmo ou colo (uma região estreita do órgão, com apenas 2 cm de comprimento); o
corpo (afilado, que é a maior parte); e a cauda (estreita e pontiaguda, que termina próximo ao baço).
Figura 45 – Desenho de pâncreas e duodeno seccionados: d = duodeno; dpa = duto pancreático acessório;
dpp = duto pancreático principal; cp = cabeça do pâncreas; cop = corpo do pâncreas; cap = cauda do pâncreas
95
Unidade II
Como dito anteriormente, o pâncreas é uma glândula que possui função mista: endócrina e
exócrina. As células endócrinas são grupos de células ricamente circundadas por capilares sanguíneos
e, como essas glândulas são endócrinas, ou seja, não têm ductos, os hormônios respectivos são
liberados diretamente no sangue. As células endócrinas são divididas em quatro tipos: as ilhotas de
Langerhans alfa, beta, gama e células PP ricamente vascularizadas por capilares (no pâncreas
temos cerca de 1 a 2 milhões de ilhotas de Langerhans, sendo 60% dessas ilhotas beta). As ilhotas
alfa fabricam e liberam o hormônio glucagon (estimulam o aumento da glicemia, portanto,
hormônio hiperglicêmico) na corrente circulatória, as beta fabricam e liberam o hormônio
insulina (hormônio hipoglicêmico) no sangue, as delta fabricam e liberam somatostatina
(regula a secreção dos dois hormônios anteriores) e as células PP fabricam e liberam peptídeos
pancreáticos (tendo função contrária a da colecistoquinina, pois inibem a secreção pancreática
e estimulam a secreção gástrica).
Em 1896 o cientista alemão chamado Paul Langerhans descobriu, usando o microscópio ótico,
certos grupamentos de células de pâncreas que eram diferentes do restante das outras células
deste órgão: as ilhotas de Langerhans. Essas células se coram menos intensamente pelos corantes
hematoxilina-eosina se comparadas com as outras células, ou seja, ficam mais claras, e o restante das
células fica mais escuro quando elas são analisadas em microscopia ótica. Por sua semelhança a ilhas
no mar, o cientista deu o nome de ilhotas de Langerhans.
Com tamanho de 100 µm a 200 µm de diâmetro, podem ser células poligonais ou arredondadas,
se dispondo em cordões, circundadas por capilares sanguíneos, com cerca de 1 e 2 milhões de ilhotas
de Langerhans, com uma pequena tendência para serem mais abundantes na região da cauda do
pâncreas, sendo que 60% destas são de ilhotas beta.
96
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Saiba mais
Como o alimento não “entra”, ou seja, não penetra no pâncreas, as enzimas produzidas para
digestão dos alimentos ingeridos são liberadas no intestino através de um ducto. A maioria das células
do pâncreas, as células exócrinas, têm a função de produção e liberação das enzimas envolvidas na
digestão (“quebra”) de vários alimentos (carboidratos, proteínas, lipídios e ácidos nucleicos) através
de ductos que se reúnem em um só, e este ducto chega até o intestino. Essas enzimas facilitam a
absorção desses alimentos, pois quebram ou clivam, deixando-os com menor tamanho, facilitando
sua passagem pelas células do intestino até o sangue (absorção dos alimentos).
O suco pancreático, com pH entre 8 e 8,3, neutraliza o quimo (bolo alimentar que vem do estômago
e tem pH ácido) com um de seus componentes: o íon bicarbonato, para propiciar um pH conveniente
para ação das enzimas.
A liberação do suco pancreático no intestino é estimulada pelo sistema nervoso. Quando uma
pessoa se alimenta, o cheiro ou a visão pode provocar impulsos nervosos que estimulam a liberação
do suco pancreático. Isso se dá em conjunto com os hormônios secretina (estimula a secreção de
bicarbonato de sódio) e colecistocinina (também chamado de hormônio da saciedade, pois diminui
motilidade estomacal e aumenta a secreção de enteropeptidase ou enteroquinase, que converte o
tripsinogênio em tripsina).
O suco pancreático se transfere do pâncreas ao duodeno pelo ducto pancreático, que se liga
ao ducto colédoco (que transporta a bile da vesícula biliar para o intestino) tornando-se um só a
desembocar no intestino pelo esfíncter muscular (chamado de esfíncter de Oddi).
97
Unidade II
Glândulas
salivares
Esôfago
Fígado
Estômago
Duodeno
Cólon
transverso
Cólon ascendente
Jejuno
Cólon descendente
Íleo
Ceco
Sigmoide
Apêndice
Reto
Ânus
Figura 47 – Esquema do aparelho digestório humano. Repare que o ducto que vem do pâncreas se
comunica com o que vem da vesícula, desembocando ambos no intestino
Quando nos alimentamos a glicemia aumenta, e o sangue passa pelo pâncreas estimulando as
células das ilhotas beta de Langerhans a produzirem e liberarem no sangue o hormônio hipoglicemiante
insulina, ao mesmo tempo também ocorre a inibição da liberação de glucagon.
A insulina liga-se aos receptores de membrana das células alvo (aquelas células que têm receptor
para insulina), e, mediante esta ligação, várias vias de sinalização são ativadas, sendo que um dos
resultados é a passagem da proteína GLUT que está no citoplasma para a membrana plasmática
(translocação do aparelho de Golgi para a membrana plasmática). Essa proteína se liga à glicose
(molécula polar, insolúvel na membrana plasmática) facilitando seu transporte para o interior da
célula pelo processo de difusão facilitada.
98
BIOQUÍMICA CLÍNICA
• GLUT1: células sanguíneas de adultos e rim. Transporta glicose na maioria das células.
• GLUT6: este gene na verdade não se expressa funcionalmente, sendo considerado um pseudogene.
Quando o nível da glicose baixa no sangue, as ilhotas alfa de Langerhans são estimuladas a liberar
glucagon (hormônio hiperglicemiante), que, por ser antagônico em relação à insulina, irá aumentar
a glicemia, principalmente pela “quebra” do glicogênio hepático, e, com isso, a produção de glicose
nas células do fígado.
Amilase
Há dois tipos de amilase no corpo humano: alfa-amilase salivar (amilase S) e amilase pancreática
(amilase P). A amilase é uma enzima que cliva o amido e o glicogênio, podendo estar acima do
valor de referência no sangue (estado chamado de hiperamilasemia) por causas pancreáticas (como
pancreatite aguda, carcinoma de pâncreas, trauma cirúrgico, obstrução dos ductos pancreáticos) e
não pancreáticas (insuficiência renal, neoplasia de pulmão, de ovário, de mama, de cólon, lesões das
glândulas salivares por infecção, irradiação, obstrução, cirurgia maxilofacial e tumores).
99
Unidade II
Parótida
Sublingual
Submaxilar
Lipase
Encontrada em tecidos de vários animais e plantas, a lipase, como a protease, a celulase e a amilase,
são classificadas como hidrolases. Podem ser produzidas por fermentação em indústrias farmacêuticas
por alguns microrganismos, tais como fungos, leveduras e bactérias; depois de purificadas, podem ser
comercializadas em farmácias.
No corpo humano ocorre lipase lingual produzida pelas glândulas serosas da língua, sendo liberada
com a saliva. Como a permanência do alimento na boca é muito curta, a digestão de lipídios não é
produtiva. Também ocorre lipase gástrica nesse processo. Todavia, por conta do pH ácido, que dificulta
a ação da enzima, praticamente não há ação dessa enzima, e o local onde realmente ocorre a digestão
dos lipídios é no intestino delgado, pois lá haverá condições necessárias para a catálise enzimática.
A lipase é uma enzima cuja suplementação pode ser benéfica nos casos de indigestão, doença
celíaca, fibrose cística e doença de Crohn. Na doença celíaca ocorre uma disfunção no sistema imune,
levando a um ataque autoimune causado pela intolerância ao glúten (proteína encontrada no trigo,
na aveia, na cevada, no centeio e seus derivados), que é diferente da intolerância ao glúten per se,
100
BIOQUÍMICA CLÍNICA
pois nesta última não ocorre dano no intestino delgado e também não há relação com o sistema
imunológico. Com a atrofia da mucosa do intestino, haverá má absorção dos nutrientes, sais minerais
e água, refletindo em sintomas como dor abdominal, diarreia e flatulência (gases), anemia e perda de
peso. A doença de Crohn tem causa desconhecida, mas pode ter relação com o sistema imunológico e
é um fator de risco para o câncer de intestino. É caracterizada por grandes pontos de inflamação no
intestino com o aparecimento de pequenas vesículas, as quais podem se abrir e serem pontos maiores
de infecção e inflamação, o que pode causar a necrose dessa porção. Os sintomas mais frequentes são
dores abdominais e diarreia, febre e perda de peso.
A fim de prevenir-se das complicações das doenças que acabamos de ver, deve-se realizar exames de
checkup periodicamente, obtendo-se o diagnóstico correto antes mesmo do aparecimento de sintomas.
Infelizmente, não há um teste ideal, mas costuma-se iniciar a pesquisa pelo perfil pancreático básico,
nada mais do que a determinação sanguínea de amilase, lipase (pode-se optar também pela dosagem
de tripsina).
A amilase aumenta no soro de 6 a 12 horas após o início do quadro, mas existem casos de
pancreatite em que não se vê um aumento da amilase sérica, em decorrência do fibrosamento
de tecido. A especificidade do teste é baixa, mas possui alta sensibilidade. Vale lembrar que pode
ocorrer amilasúria (amilase na urina) durante quatro dias após o episódio agudo.
Na pancreatite aguda, o sangue contém pelo menos três vezes a quantidade normal de amilase
e lipase, enzimas digestivas produzidas no pâncreas. Outras alterações também podem ocorrer no
estudo bioquímico (como glicose, cálcio, magnésio, sódio, potássio e bicarbonato). Nesse casos,
podem ser necessários os exames de ultrassom abdominal e tomografia computadorizada.
Lembrete
101
Unidade II
As lipases são produzidas exclusivamente pelo pâncreas e seu aumento no sangue ocorre após
24 ou 48 horas em relação ao episódio agudo, com um pico máximo em quatro dias, mas, como o
aumento é lento, torna-se desvantajoso.
Os testes indiretos a seguir, são simples, não invasivos, mais rápidos e menos dispendiosos do que os
testes diretos e ajudam muito no diagnóstico, apesar de terem sensibilidade e especificidade limitadas.
A avaliação da função digestiva pode ser realizada pelo exame coprológico funcional (importante
para pancreatite crônica), por meio do qual se pesquisa a gordura fecal; nesse caso, a análise da
excreção fecal deve se dar 24 horas após o indivíduo receber uma dieta com 100 g de gordura diárias
durante 3 dias. O resultado será positivo se houver perda de gordura superior a 7 g/dia (na clínica, a
ocorrência de esteatorreia é compatível com PC).
A enzima elastase fecal pode ser colocada como um padrão ouro, pois se trata de uma enzima
proteolítica exclusivamente produzida pelo pâncreas que permanece estável após passagem pelo
trato digestivo, sem sofrer interferência durante a digestão, apresentando alta sensibilidade e
especificidade em casos de PC.
Fibrose cística
A fibrose cística (FC), também conhecida como doença do beijo salgado ou mucoviscidose, é uma
doença genética crônica. É uma doença genética ligada a mutações no gene CFTR e com padrão de
herança autossômico recessivo (para qualquer casal com uma criança afetada, o risco de que uma
segunda criança venha a apresentar FC é de 25%). É caracterizada pelo fluxo anormal de cloro nas
células epiteliais, causando diversas manifestações clínicas que incluem insuficiência pancreática e
doença pulmonar, além de níveis aumentados de cloro no suor. Muitos dos genes podem atuar como
modificadores da FC, influenciando na gravidade da doença pulmonar, no controle de infecção, na
imunidade e na inflamação.
Entre os genes possivelmente envolvidos, podemos citar o gene responsável pela alfa-1-antitripsina
(A1AT), enzima sintetizada pelos hepatócitos e macrófagos alveolares cuja proteína pertence a uma
família de inibidores de proteases de serina que protege os tecidos do ataque proteolítico pelas
proteases leucocitárias (tal como a elastase, catepsina e tripsina), durante as reações inflamatórias.
Caso ocorra mutação no gene A1AT, a proteína defeituosa permite que o corpo produza muco de
30 a 60 vezes mais espesso que o usual, obstruindo os ductos pancreáticos; consequentemente, o suco
pancreático não chega ao intestino, não se dando a digestão correta dos nutrientes tampouco sua
absorção, o que gera sintomas como diarreia (geralmente volumosas, com odor fétido), perda de peso e
de estatura. Para esses casos, o tratamento também prevê medicamentos que ajudam na digestão e em
uma nutrição balanceada.
102
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Observação
Pancreatite
As causas mais comuns da pancreatite são ingestão excessiva de álcool e trauma abdominal, mas
pessoas que fazem uso do coquetel de HIV ou outras medicações também podem desenvolver esse
quadro. Os sintomas mais comuns são enjoo, dor abdominal, abdome distendido e sensível, perda de
peso (uma vez que os alimentos não são corretamente digeridos) e diarreia com fezes claras e mau
cheiro (devido à gordura não digerida).
As enzimas pancreáticas como protease, lipase e amilase, basicamente extraídas de fonte suína,
serão administradas ao paciente.
103
Unidade II
A pancreatite crônica (PC) é uma inflamação do pâncreas que não apresenta cura e é característica
de pessoas que ingerem muito álcool, levando à formação de cicatrizes teciduais que destroem
lentamente o órgão, eliminando as células produtoras de insulina, Ilhotas beta de Langerhans, o que
pode levar a diabetes. Pode também ser provocada por fibrose cística, hiperlipidemia, medicamentos
e certas condições autoimunes, sendo os sintomas os mesmos da pancreatite aguda.
A pancreatite pode ser de causa autoimune. A pancreatite tipo 1 causa a síndrome fibroinflamatória,
com o paciente apresentando icterícia obstrutiva, simulando câncer de pâncreas. Por sua vez,
a pancreatite tipo 2 pode ser diferenciada histologicamente, pois caracteriza-se por infiltração
neutrofílica no epitélio pancreático, que pode levar à obliteração ductal.
Hipoglicemia
Como principais sintomas estão tremores, nervosismo, palidez, taquicardia, sudorese, náusea,
vômito e como sinais de comprometimento cerebral pode-se listar alteração no humor, depressão,
choro, medo de morrer, irritabilidade, sono, tontura, delírio, visão dupla, confusão mental, alterações
do nível de consciência, perturbações visuais e de comportamento que podem ser confundidas com
embriaguez, cansaço, fraqueza, sensação de desmaio e convulsões, estupor, coma e respiração difícil.
Por que certas pessoas ingerem álcool e desmaiam por hipoglicemia? Após a ingestão do álcool,
ele faz o caminho normal: boca, esôfago, estômago e intestino, é absorvido e, chegando ao sangue,
passa rapidamente para o fígado. Por fazer a detoxificação de drogas em nosso corpo, o fígado terá
a função de transformar essa droga – álcool – para sua saída pelos rins. O fígado metaboliza um
drinque a cada 2 horas em média, isto é, transforma o álcool em acetaldeído e depois em acetato. Se
o consumo for maior do que o fígado pode metabolizar, o excesso de álcool permanece no sangue
e chega ao cérebro, causando: tontura, desinibição, diminuição da capacidade de raciocínio, euforia,
aumento do ritmo dos batimentos cardíacos e da frequência da respiração, provoca problemas de
equilíbrio e movimento, podendo levar à perda de consciência e parada respiratória, inclusive levar à
morte. Como o fígado tem reservas de glicose e tem a função de liberar ou guardar glicose quando o
corpo precisa, não regulariza a quantidade de açúcar no sangue de forma correta. O resultado é que
as taxas de açúcar no sangue podem cair, causando hipoglicemia.
104
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Assim, uma orientação importante é que não se deve beber de estômago vazio ou se as taxas de
glicose no sangue estiverem baixas. Indica-se beber lentamente, se possível, junto com água, para
manter sua hidratação.
A hipoglicemia pós-prandial ou reativa acontece de 3 a 5 horas após a pessoa ter feito uma
refeição, geralmente se manifestando em pessoas submetidas a cirurgia do estômago e em indivíduos
em fase inicial da resistência à insulina. Nesses casos, o paciente costuma sentir dor de cabeça,
tremores e tonturas.
O diagnóstico, além dos sintomas, deve incluir concentração de glicose no sangue, medida em
laboratório de análises clínicas, inferior a 50 mg/dL em jejum e melhora dos sintomas após consumo
de carboidratos no laboratório.
Observação
Hiperglicemia
A hiperglicemia é uma condição na qual o paciente apresenta um nível de glicose no sangue acima
do valor de referência (69 mg/dL a 99 mg/dL). A principal causa deve-se ao diabetes (pré-diabetes,
diabetes gestacional, diabetes tipo 1 e tipo 2 – DM1 e DM2, respectivamente), mas também pode ser
induzida por estresse elevado, síndrome dos ovários policísticos (SOP), hipercortisolismo (síndrome de
Cushing), pancreatite, trauma severo (como queimadura ou lesão), infecções (como pneumonia ou
infecção do trato urinário), uso incorreto de medicamentos (como os esteroides e diuréticos) ou uso
de drogas ilegais (como cocaína e ecstasy).
Observação
105
Unidade II
Diabetes
A diabetes – diabetes gestacional, diabetes tipo 1 (DM1) e tipo 2 (DM2) – é uma condição em que
a glicose está acima do valor de referência no sangue, devendo ser controlada com medicamentos,
alimentação e exercícios. São consideradas doenças poligênicas, isto é, as alterações que predispõem a
essas doenças estão em vários genes. Há predisposição genética associada a fatores ambientais (como
obesidade, no caso do DM2), mas existem duas formas de diabetes que são resultado da mutação em
um único gene, por isso denominadas monogênicas (testes genéticos podem identificar a maioria
das formas de diabetes monogênico): o diabetes neonatal e o tipo MODY (do inglês Maturity-Onset
Diabetes of the Young).
Como sintomas, podemos citar os principais: polidipsia (muita sede), poliúria (excesso de urina),
polifagia (fome excessiva, acompanhada de emagrecimento em DM2), cansaço e sonolência, pele
seca, dor de cabeça, podendo evoluir para náuseas e vômitos, além de hálito cetônico (devido à
formação de corpos cetônicos pelo organismo).
Um fato interessante é que, mesmo havendo no sangue taxas tão elevadas de glicose, como não
há insulina no cérebro, a glicose não o penetra, de forma que o cérebro, percebendo erroneamente
uma queda desse carboidrato em seu interior, toma como uma falta alimento no organismo, causando
muita fome no paciente (polifagia).
O fato de não ter glicose em seu interior para síntese de energia (ATP) faz com que as células
utilizem lipídios, e depois as proteínas, para cumprir tal função. O uso de lipídios leva ao aparecimento
de corpos cetônicos (acetona, ácido ace e ácido β hidroxibutirato), que baixam o pH sanguíneo,
levando à acidose metabólica.
Então, além de sintomas como urinar muitas vezes (durante o dia e a noite) e em grande
quantidade, sede exagerada, obesidade e perda de peso, fome, há outros sintomas diretamente
ligados a hiperglicemia, que são: dores, dormência e formigamento nas pernas, cansaço, piora da
visão, furúnculos frequentes, cicatrização difícil e infecções de pele, podendo chegar à impotência
sexual, glaucoma, amputações de membros, infarto agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral,
insuficiência renal e abortamentos (em caso de gestação).
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BIOQUÍMICA CLÍNICA
Observação
Como vimos anteriormente, a longo prazo, ocorrem alterações irreversíveis nos grandes e pequenos
vasos sanguíneos (microangiopatia e macroangiopatia), além de redução na capacidade do corpo para
resistir a infecções, podendo levar à amputação de membros (superiores e inferiores), envelhecimento
precoce e redução da esperança de vida.
A diabetes insípida (DI) não tem relação com o diabetes mellitus. A DI é um tipo de diabetes em
que a urina não apresenta glicose, ou seja, não é “melada” como no diabetes mellitus. É causada
pela ausência do hormônio vasopressina (hormônio antidiurético), o que causa produção excessiva
de urina muito diluída (poliúria) e sede. A vasopressina é o hormônio antidiurético produzido no
hipotálamo que tem por função ajudar na regulação da quantidade de água no corpo, induzindo os
rins à diminuírem a quantidade de urina produzida.
As causas podem ser tumor cerebral, lesão cerebral, cirurgia cerebral, tuberculose e algumas outras
doenças. Para o diagnóstico, toma-se como base o resultado dos exames de urina, sangue e do teste
de privação hídrica.
107
Unidade II
Observação
O diabetes mellitus tipo 1 (DM1) é caracterizado pela destruição autoimune das células-beta
pancreáticas, responsáveis pela produção da insulina. Para sobreviverem a essa doença crônica, os
pacientes devem fazer uso da insulina exógena. Para não terem complicações como cegueira, acidente
vascular cerebral, problemas renais e cardiovasculares, devem fazer uso da insulinoterapia. Para não
entrar nessa terapia, há duas opções: fazer o transplante de pâncreas (cirurgia que demanda UTI pois
tem muitos riscos) ou transplante de ilhotas pancreáticas (técnica não cirúrgica, mais simples).
Dirigida por ultrassonografia, o médico infunde as ilhotas acondicionadas em uma bolsa estéril
pelo fígado por um cateter na veia porta sem precisar de cirurgia. Em poucos dias o paciente já
começa a produzir insulina e esse progresso é acompanhado pela dosagem do peptídeo C, indetectável
antes do implante (peptídeo C é a parte da insulina que é retirada para que fique ativa no sangue).
Aproximadamente três anos após o transplante, 50% dos pacientes permanecem livres de insulina, e
após cinco anos apenas 13% não necessitam de insulina para controlar a sua glicemia. Deverá ocorrer
terapia imunossupressora por toda a vida, o que leva a outros efeitos colaterais, como: alterações de
provas hepáticas e trombose.
Saiba mais
No diabetes gestacional, a placenta – fonte de hormônios que reduzem a ação da insulina – acaba
por estimular o pâncreas a aumentar a produção desse hormônio numa reação compensatória.
Se a mulher consegue ultrapassar essas mudanças no equilíbrio hormonal, ótimo, caso contrário,
o pâncreas é levado ao estresse metabólico, elevando-se o nível de glicose no sangue. O bebê,
quando é exposto a grandes quantidades de glicose ainda no ambiente intrauterino, apresenta risco
de crescimento excessivo e, logicamente, partos traumáticos, além de hipoglicemia neonatal e até
mesmo obesidade e diabetes na vida adulta.
108
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Idade materna mais avançada, ganho de peso excessivo durante a gestação, hipertensão arterial
na gestação, histórico familiar de diabetes em parentes de 1º grau (pais e irmãos) são fatores de risco
que devem ser analisados. Caso necessário, deve-se seguir uma orientação nutricional adequada e
adotar a prática de atividade física para redução dos níveis glicêmicos. Em casos graves, associa-se o
uso de insulinoterapia. É frequente o desenvolvimento de DM2 após o parto. Nessa situação, ele pode
ser prevenido com alimentação balanceada e prática de atividades físicas.
Pacientes que começam com sintomas de diabetes na idade adulta podem ser erroneamente
caracterizados como DM2 ou diabetes MODY. Contudo, é um diabetes mellitus tipo 1 tardio,
principalmente se houver fatores de risco como histórico familiar ou obesidade. Hiperglicemia
com insulina insuficiente, em vez de resistência à insulina, a detecção de um peptídeo C baixo e de
anticorpos contra as ilhotas de Langerhans são importantes para o diagnóstico. Seu tratamento é
realizado com os antidiabéticos orais, podendo ser usada insulina.
Se comparar com o DM1 juvenil, pode-se dizer que os sintomas de LADA se desenvolvem muito
mais lentamente durante um período de pelo menos seis meses e se inicia com um episódio brusco
de cetoacidose diabética. Enquanto os pacientes com DM2 costumam ter sobrepeso, a maioria dos
tipo LADA têm IMC normal ou abaixo do normal. É comum perder muitos quilos um ano antes do
diagnóstico, pela redução na produção de insulina, essencial para a captação de açúcar.
Saiba mais
De acordo com a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), a intolerância à glicose de jejum (IGJ)
é caracterizada na faixa entre o limite superior de normalidade (> 100 mg/dL) e o limite inferior
de glicemia para o diagnóstico do diabetes (< 126 mg/dL). Para essas pessoas com tal quadro, o
109
Unidade II
diagnóstico pode evitar que o diabetes tipo 2 se estabeleça, apesar de já estar havendo lesões no
sistema circulatório. Essa situação, chamada de pré-diabetes, tem sua importância exacerbada ao
permitir que o indivíduo tome medidas preventivas a fim de evitar a evolução da doença (como dieta
adequada, exercícios físicos e medicamentos).
Resistência à insulina
A resistência à insulina seria a base para a pré diabetes e diabetes tipo 2. A resistência à insulina é
uma situação em que ocorre diminuição da resposta das células especialmente musculares e adiposas
à insulina. Como necessitam de glicose para várias reações inclusive síntese de energia, o organismo
faz com que o pâncreas compense este problema e produzindo bem mais hormônio, resultando em
excesso de insulina no sangue que por sua vez, estimula as células, provocando desequilíbrio no
pâncreas que entra em estresse metabólico.
Observação
110
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Alimento A
Glicemia
Alimento B
1 2
Horas após a ingestão do alimento
A glicemia basal (ou de jejum), quando medida no sangue capilar, poderá ser de 5% a 20% a mais
do que no soro ou plasma, portanto, servirá apenas de alerta/controle grosso, podendo não ser real.
Antigamente o método clássico de dosagem da glicemia era o que usava ortotoluidina como reativo,
mas, pela sua toxicidade, tal teste foi retirado de circulação, usando-se atualmente o método da
glicose-oxidase e peroxidade (GOD/POD), de extrema precisão e praticidade, com base em reagentes
pouco tóxicos e cujo padrão de referência encontra-se entre os valores de 70 mg/dL a 99 mg/dL.
Na dosagem de glicose para diagnóstico de diabetes, seria interessante um jejum mínimo de 8 horas,
mas, caso haja empecilhos, pode-se fazer o exame com menos tempo de jejum. Como alguns
laboratórios pedem 12 horas para o perfil lipídico, podemos deixar todos os exames para 8 horas.
Destaca-se que não é uma situação normal, pois as células já começarão a ser privadas de glicose.
Pode-se analisar o estado do paciente podem-se fazer três testes que refletem seu real estado, uma
vez que algumas pessoas, dias antes dos exames, modificam seu comportamento e sua dieta. São eles:
Para fazer qualquer exame de laboratório, nunca deixe de se alimentar por mais de 14 horas.
Isso porque, num jejum superior a tal intervalo de tempo, as células irão acionar outras vias a fim de
suprir as necessidades energéticas. Além disso, recentemente provou-se que, em jejum ou em estado
alimentado, não há, por exemplo, tanta interferência na avaliação do risco cardiovascular (medidas
do LDL-C e triglicerídeos). Adicionemos a isso o fato de que, se analisarmos friamente, passamos a
maior parte do tempo no estado alimentado, portanto esse estado reflete melhor as condições reais
do organismo.
• Glicemia pós-prandial de 2h
Glicemias entre 100 mg/dL e 126 mg/dL já classificam o paciente com glicemia de jejum alterada,
isto é, pré-diabetes. Para analisar melhor a situação, pode-se pedir o exame de glicose pós-prandial
de 2 horas, pois, como cada pessoa ingere quantidades diferentes de alimento, o exame pode dar
resultado falho; para sanar esse problema, o paciente tem seu sangue colhido a fim de avaliar a
glicemia de jejum, ingerindo-se uma quantidade fixa de glicose (75 g) no laboratório. Ao final de
2 horas, outra amostra de sangue é coletada para determinação da glicemia, avaliando-se também
a secreção de insulina após uma carga de glicose. A glicemia pós-prandial normal é aquela que, após
2 horas, se encontra abaixo dos 140 mg/dL.
Já os valores entre 140 mg/dL e 199 mg/dL indicam intolerância à glicose ou resistência à ação da
insulina, mostrando que o organismo não está se adaptando à elevação da glicose após as refeições.
É também considerado um estágio de pré-diabetes, mesmo que a glicemia em jejum esteja abaixo
de 100 mg/dL.
Observação
Com as coletas de 2 horas e 4 horas em mãos, compõe-se uma curva, avaliando sua área inferior,
chamada de incremento positivo na área sob a curva (iAUC 0 –2 h e iAUC 0 –4 h), no basal e depois de
seis e 12 semanas de suplementação – iAUC (incremental area under curve) analisado por estatística
ANOVA (analysis of variance).
112
BIOQUÍMICA CLÍNICA
As hemácias possuem uma estrutura simples: não apresentam núcleo e não são capazes de
se dividir. A hemoglobina possui átomos de ferro que têm como função transportar oxigênio dos
pulmões para os tecidos e gás carbônico das células para os pulmões. O tempo de vida das hemácias é
de 90 a 120 dias e sua quantidade normal, por mm3 de sangue, é de 4.500.000 a 5.500.000 no homem
e de 3.500.000 a 5.000.000 na mulher.
As células precursoras da hemácia contêm quatro genes alfa (α), dois genes beta (β), dois genes
delta (δ), quatro genes gama (γ), dois genes zeta (ς) e dois genes epsilon (ε). Já podemos encontrar
hemoglobina Hb A1 (α2 β2) em fetos de nove semanas de gestação. A Hb A2 (α2 δ2) aparece por
volta da 30ª semana de gestação e mantém-se até a vida adulta, já a hemoglobina fetal Hb F (α2 γ2)
compõe 90 a 95% do total das hemoglobinas do feto entre a 34ª e 36ª semana de gestação. No
adulto, essas concentrações são de 95% a 98% de Hb A1, de 2% a 4% de Hb A2 e de 0 a 2% de Hb F.
Quando o nível de glicose está muito alto no sangue, ela é adicionada, por meio de uma reação
lenta, estável e enzimática, ao aminoácido valina N-terminal da cadeia beta da hemoglobina A (A1c).
Como a hemácia tem um ciclo de vida que de cerca de 120 dias, a glicose permanece de tal forma
por todo esse tempo.
Ao fazer a análise da subfração HbA1c pode-se compreender como estava a glicemia do paciente
nas 8 a 10 semanas anteriores ao dia do teste, enquanto a glicose sanguínea (glicemia) reflete apenas
as 24 horas prévias. É importante destacar que pode ocorrer também a glicação em outros pontos da
cadeia beta e/ou na cadeia alfa, chamada de Hb A0 glicada.
5% – 97 (76-120)
6% – 126 (100-152)
7% – 154 (123-185)
HbA1c – Glicemia 8% – 183 (147-217)
média (variação) 9% – 212 (170-249)
10% – 240 (193-282)
11% – 269 (217-314)
12% – 298 (240-347)
113
Unidade II
Observação
Nesse teste, o paciente tem seu sangue colhido em jejum (mínimo de 8 horas) no laboratório,
posteriormente recebe uma dose de 75 g de glicose via oral, tendo seu sangue colhido, para glicemia
e insulinemia, nos tempos 0, 30, 45, 60, 90, 120 e 180 minutos (os valores considerados normais são
cerca de 180 mg/dL para uma hora, 155 mg/dL para 2 horas e 140 mg/dL para 3 horas). Caso seja
constatado um pico com valores de 2 horas superiores a 200 mg/dL, deve-se desconfiar de diabetes.
Deve-se esclarecer que esse exame não é indicado quando existirem distúrbios da absorção intestinal
ou em pacientes gastrectomizados e que fatores como tempo de jejum, idade, peso e estresse devem
ser analisados.
200
Níveis de glicose no
180
sangue (mg %)
160
140 Diabetes
120
100 Normal
80
60 Hiperinsulinismo
40
Horas
0 1 2 3 4 5
Figura 50 – Curva de glicemia após a ingestão de glicose. No indivíduo normal, o nível de glicose
no sangue sofre um aumento e depois volta ao normal; no diabético, no qual não ocorre aumento
da secreção de insulina após ingestão de glicose, a glicemia baixa muito vagarosamente
(após 3 ou 4 horas da ingestão de glicose)
114
BIOQUÍMICA CLÍNICA
• Glicosúria
A eliminação de glicose na urina ocorre quando a glicemia está superior a 160 mg/dL-180 mg/dL
(alguns autores falam em 180 mg/dL-200 mg/dL), pois, nesse contexto, os rins não conseguem reabsorver
a glicose que passou pelo túbulo contorcido proximal, sendo, então, liberada.
Devemos prestar atenção quanto à dosagem de glicose na urina, pois a ingestão de fluidos afeta
suas concentrações na urina; assim, o resultado não reflete a glicose sanguínea no exato momento do
teste, mas durante o tempo em que a urina foi acumulada na bexiga. E, quando os rins não conseguem
mais desempenhar sua função, pode-se desenvolver microalbuminúria, que está relacionada com um
dano renal leve.
• Frutosaminas
Nome genérico dado a todas as proteínas sanguíneas glicadas, entre as quais a albumina, a que
está presente em maior quantidade no sangue. O mecanismo de formação da ligação da glicose
com a proteína, que gera a frutosamina, é semelhante ao da hemoglobina glicada e sua importância
diagnóstica consiste em revelar como estava a glicemia cerca de uma a três semanas antes do exame.
Fazendo uma análise Homa (homeostasis model assessment), consegue-se predizer a sensibilidade
à insulina. Isso com base na medida da glicemia e da insulina de jejum, de acordo com a equação
descrita a seguir:
O Homa propõe-se a estimar a sensibilidade à insulina para o corpo total, assumindo que a RI seria
a mesma no fígado e nos tecidos periféricos.
• Dosagem de peptídeo C
A dosagem radioimunológica (ou Elisa), com o auxílio de antissoro, não gera reação cruzada com
a insulina, podendo-se dosá-la no soro sanguíneo e na urina. Essa dosagem reflete a quantidade de
insulina que o pâncreas produz, pois faz parte da molécula produzida pelos ribossomos das ilhotas.
Quando a molécula é clivada, libera o peptídeo C no sangue (então, teremos uma molécula de
insulina para uma molécula de peptídeo C, ou seja, equimolar, espelhando a insulina que o próprio
pâncreas produz).
115
Unidade II
Tal determinação é útil para a diferenciação do diabetes, pois na diabetes tipo 1 a reserva de
insulina vai acabando, da mesma forma no diabetes tipo LADA (com menor velocidade), enquanto no
diabetes tipo 2 a reserva insulínica dura mais tempo e os níveis de peptídeo C estão mais elevados
que no diabetes tipo 1.
A dosagem de peptídeo C é preconizada para avaliar a reserva insulínica de três a cinco anos após
o diagnóstico. Vale acrescentar que pode ser dosado no basal (sem estímulo).
No caso de hipoglicemia, esse exame também é muito útil, pois ocorre alta secreção de insulina e
peptídeo C, mostrando-se desproporcional em relação à glicemia, além de se poder observar também a
hipoglicemia reativa (quando as dosagens de insulina e de peptídeo C estão elevadas no pós-refeição).
Observação
116
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Saiba mais
É uma das principais causas de mortalidade e morbidade em todo o mundo. Cerca de 10% dos
pacientes admitidos em serviços de urgência no mundo todo, com os sinais e sintomas característicos
do IAM, são diagnosticados com infarto.
O IAM é uma condição que ocorre, primordialmente, por um quadro obstrutivo isquêmico no
coração ou por doença vaso-oclusiva das artérias coronárias. De etiologia aterosclerótica ou
trombótica, a obstrução vascular acaba por restringir a irrigação sanguínea no coração.
117
Unidade II
Um dos primeiros testes realizados é o ECG. Em razão de sua baixa sensibilidade, as Sociedade
Europeia de Cardiologia e o American College of Cardiology definiram as seguintes condições,
apresentadas na figura a seguir, como critérios diagnósticos.
Aumento
ou diminuição
característica dos
marcadores cardíacos
CK-MB e, de preferência,
Troponinas (cTnl
ou cTnT)
IAM
118
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Foi o primeiro biomarcador utilizado para o diagnóstico do IAM, fato ocorrido em 1954 por
John Ladue e seus colaboradores. Essa enzima é liberada para a circulação sanguínea quando os
cardiomiócitos sofrem necrose. Entretanto, devido à sua inespecificidade, a AST é atualmente
mensurada em conjunto com outras enzimas cardíacas.
Trata-se de uma enzima inespecífica, expressa e produzida em muitos órgãos, incluindo músculo
esquelético, rim, fígado, coração, pulmão e eritrócitos. Apresenta cinco isoenzimas, destacando-se
a presença da LDH1 (também inespecífica) no coração. A LDH1 se eleva entre seis e 12 horas após
o início dos sintomas clínicos do paciente com IAM, com pico elevatório entre um e três dias, com
retorno aos valores normais dentro de oito a14 dias.
Uma proporção de LDH1: LDH2 > 1, relatada como índice específico para IAM, atualmente não é
mais usada na rotina diagnóstica. Hoje o único uso de LDH é para distinguir as fases aguda de IAM da
fase subaguda em pacientes que chegam ao hospital no estágio avançado da doença, com dosagem
de troponinas positivas e valores de CK e CK-MB normais.
Para auxiliar no diagnóstico mais preciso do IAM, a relação entre CK-MB e CK total também pode
ser avaliado. A determinação deste índice ((CK-MB/CK) x 100), com resultado igual ou superior a
2,5%, sugere-se que a elevação da CK-MB tenha origem miocárdica.
119
Unidade II
Para obter um diagnóstico mais preciso do IAM, a relação entre CK-MB e CK total também pode
ser avaliada. Se a determinação desse índice, ou seja (CK-MB/CK) x 100, resultar em um valor igual
ou superior a 2,5%, sugere-se que a elevação da CK-MB tenha origem miocárdica. Outras condições
a serem levadas em consideração ao usar CK-MB para o diagnóstico de IAM são as relações entre CK
e CK-MB, a presença de macromoléculas CK e alterações decorrentes de hipotireoidismo. Assim, a
relação clínico-laboratorial é ditatória para a conclusão diagnóstica.
Mioglobina
Troponinas
Atualmente, as quantificações e a dosagem das troponinas I e T são consideradas padrão ouro para
o diagnóstico do IAM em razão de sua elevada especificidade e sensibilidade. Essas proteínas cardíacas
são sintetizadas e liberadas do músculo cardíaco quando lesionado ou necrosado, interagindo com a
tropomiosina para formar a estrutura principal do estriado músculo cardíaco.
120
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Uma pessoa saudável tem baixos níveis de TnC no soro. Quando um indivíduo sofre uma injúria
cardíaca, seus níveis se elevam em um período muito curto de tempo (cerca de 2 a 4 horas após o
dano miocárdico), atingindo-se o pico elevatório em 24 horas. Os níveis das troponinas cardíacas
permanecem elevados por aproximadamente duas a três semanas.
BNP e NT-proBNP
O BNP (brain natriuretic peptide) e o NT-proBNP (N-terminal proBNP) são marcadores bioquímicos
com importância diagnóstica para IAM e disfunções cardíacas. A família de marcadores NP inclui o
ANP (atrial natriuretic peptide), mais sintetizado e secretado nos miócitos dos átrios, o BNP e o CNO
(C-type natriuretic peptide). O marcador BNP, curiosamente, foi denominado nos primeiros estudos
como uma proteína do sistema nervoso central, isso porque, em 1988, esse marcador foi detectado
em cérebro de porcos. Com o avanço científico, a literatura mostrou que o BNP tem sua produção e
secreção centralizadas principalmente em cardiomiócitos do ventrículo esquerdo, como uma resposta
a lesões nas fibras cardíacas e ao aumento da pressão e do volume no ventrículo.
As ICs acometem cerca de 1,5% da população adulta mundial. A testagem dos marcadores BNP e
NT-proBNP é recomendada por diversas sociedades de cardiologia internacionais. Vale pontuar que,
em pacientes com IC aguda, os níveis séricos de BNP e NT-proBNP se mostrarão acima de 100 pg/mL
e 300 pg/mL, respectivamente.
Com base no International Collaborative of NT-proBNP (ICON), o diagnóstico das ICs baseado
na dosagem de NT-proBNP segue um escalonamento de cut-offs dependente da idade do paciente.
Dividido em três faixas etárias, os valores superiores ao cut-off são fortes indicativos de ICs. A seguir
temos uma tabela com os valores de NT-proBNP para o diagnóstico das ICs.
Assim, a doença cardíaca isquêmica aguda está associada a uma elevação dos níveis de BNP, o que
pode refletir a gravidade da disfunção do ventrículo esquerdo. Em pacientes com doença cardíaca
coronária estável, tanto o BNP quanto o NT-proBNP são fortes preditores de eventos cardiovasculares
adversos. BNP e NT-proBNP devem ser avaliados juntamente com marcadores de lesão miocárdica,
troponina T, mioglobina e creatinofosfoquinase-fração MB (CK-MB) em pacientes com infarto agudo
do miocárdio.
O NT-proBNP pode permanecer elevado por cerca de 12 semanas, sendo um bom marcador
diagnóstico e indicador da extensão do IAM. Além disso, esses dois marcadores também são
relacionados com as arritmias e cardiomiopatias.
Lembrete
hFABP
Uma das proteínas biomarcadoras que surge após o dano ao tecido cardíaco é a hFABP. O hFABP
é lançado das células danificadas para o sangue muito rapidamente, e sua meia-vida é de 20 minutos
após a liberação dos rins para a circulação. A hFABP tem como uma de suas funções atuar no
metabolismo de ácidos graxos de cadeia longa e, assim, proteger os cardiomiócitos contra a ação
desses lípidios. Os ácidos graxos de cadeia longa são encontrados em altas concentrações no sangue,
especialmente durante processos isquêmicos.
122
BIOQUÍMICA CLÍNICA
O aumento do hFABP tem início após 3 horas de a dor pré-cordial ter se apresentado, retornando
aos níveis de normalidade de 12 a 24 horas. Portanto, um aumento nos níveis de hFABP no sangue
deve ser avaliado em conjunto com outros marcadores clínicos, bioquímicos e de imagem.
No IAM, a GPBB é liberada no período inicial do dano cardíaco, com elevação nas primeiras 4 horas,
alcançando seu pico em até 10 horas e retornando aos níveis basais em até dois dias.
Irisina
PAPP-A
A PAPP-A é um marcador muito promissor para o diagnóstico do IAM. A partir de 2 horas do início
da dor pré-cordial, seus níveis já se encontram elevados.
Aldolase
Os níveis séricos de aldolase são avaliados por métodos enzimáticos, com elevação nas fases
iniciais de distúrbios musculares (sobretudo nas dermatopolimiosites e distrofias musculares), infarto
agudo do miocárdio, cânceres de pâncreas, fígado e próstata, infecções virais e os distúrbios hepáticos.
Já nas fases crônicas das miopatias, os níveis de aldolase podem se encontrar diminuídos.
123
Unidade II
A CK-MB, quando utilizada no diagnóstico de IAM, deve ser monitorada em intervalos de 4 horas.
A CK-MB deve se apresentar aumentada em 50% do seu limite de referência. Para sua dosagem única,
os níveis de CK-MB devem estar duas vezes acima do nível normal. Quando avaliado após 72 horas, é
importante que CK-MB esteja com valores superiores aos níveis de troponina e LDH.
A análise das troponinas é muito utilizada para diagnosticar IAM. A TnI é a enzima mais específica
na família das troponinas cardíacas. Eleva-se no sangue até o intervalo de sete a 14 dias após o evento,
com pico aproximadamente entre nove e 12 horas. Essa enzima apresenta 100% de sensibilidade.
Já a TnT não é específica para o coração, elevando-se 24 horas após o início dos sintomas, com
segundo pico no quarto dia. Ressaltamos que em pacientes com insuficiência renal crônica a TnT
pode estar elevada, sem nenhum dano ao miocárdio. Assim, enfatiza-se ainda mais que a TnI é o
melhor biomarcador no diagnóstico do IAM.
A figura a seguir ilustra um gráfico de elevação e o retorno aos índices basais dos principais
marcadores cardíacos relacionados ao IAM.
10
9
8
7 Globina
Grau de elevação
Troponina I
6
5
4
3 CK-MB Troponina T
2
1
0 4 8 12 16 20 24 28 32 36 40 44 48
Tempo após o início do IAM (horas)
124
BIOQUÍMICA CLÍNICA
As dislipidemias estão intimamente relacionadas com o estilo de vida das pessoas. Uma dieta
equilibrada e saudável é uma das principais ferramentas para o controle das taxas de colesterol e
triglicerídeos, o que, sem dúvida, auxilia na prevenção das doenças cardiovasculares, entretanto, nem
sempre alterações na rotina de alimentação e atividade física são suficientes para o controle das
dislipidemias. Atualmente, são conhecidos marcadores genéticos (single nucleotide polymorphisms – SNP),
que são responsáveis pela elevação de níveis lipídicos séricos e das lipoproteínas.
Dividido em três subunidades de interesse clínico, o colesterol total (CT) é composto pela somatória
das frações de HDL-colesterol (high density lipoproteins ou lipoproteínas de alta densidade),
LDL‑colesterol (low density lipoproteins ou lipoproteínas de baixa densidade) e VLDL-colesterol (very
low density lipoproteins ou lipoproteínas de baixa densidade). A IDL-c (lipoportepina de densidade
intermediária) não é utilizada de rotina nas investigações de dislipidemias em laboratórios bioquímicos.
O HDL colesterol é formado, na sua maior parte, pela Apo-A1, entretanto, na sua estrutura
bioquímica ele contém fosfolípides, colesterol e triglicerídeos. Com função de remover da circulação
sanguínea as frações de colesterol não esterificado, o HDL-colesterol desempenha função protetora
contra doenças cardiovasculares.
125
Unidade II
Os triglicerídeos são ésteres de glicerol e ácidos graxos, que constituem cerca de 95% dos lipídios
do tecido adiposo. Considerado a principal reserva energética do organismo, sua síntese é realizada
pelo fígado e pelo intestino e são essenciais para a formação dos quilomícrons e da VLDL. Também
apresenta importância clínica nas coronariopatias.
Por fim, o conjunto da avaliação dos níveis de HDL, LDL e VLDL-colesterol + triglicerídeos
constituem o que denominamos perfil lipídico. O perfil lipídico é dosado por métodos colorimétricos,
com avaliação dos níveis de absorbância e cálculo de concentração baseados em padrões e curvas de
calibração dos equipamentos automatizados.
Entre as moléculas dosadas nos laboratórios bioquímicos, destacamos o CT, HDL-c e TG. A partir
delas, os valores de LDL-c e VLDL-c são calculados de acordo com a equação de Friedewald.
Entretanto, a equação de Friedewald apresenta algumas limitações operacionais, destacando-se a
perda da linearidade para cálculo de VLDL-c em pacientes com dosagem de TG superior a 400 mg/dL,
da mesma forma que valores acima de 100 mg/dL para TG podem subestimar a concentração de LDL-c
na amostra. A seguir, temos a equação de Fredewald:
126
BIOQUÍMICA CLÍNICA
127
Unidade II
Exemplo de aplicação
Para obter a resposta, devemos primeiramente calcular o valor do não HDL-c. O não HDL-c é
obtido pela subtração entre o valor de CT e o nível de HDL-c dosado, ou seja:
não HDL-c = 200 – 60
Acompanhando a tabela anterior, a região de conjunção entre o valor de TG (98 mg/dL) e o de não
HDL-c (140 mg/dL) revela um índice de divisão para o cálculo do VLDL-c de 4,8. Dessa forma:
VLDL-c = TG/4,8
VLDL-c = 98/4,8
Uma vez obtidos os valores das frações do colesterol e dos triglicerídeos, a comparação com
índices de normalidade é essencial. A tabela a seguir traz os valores de referência para adultos jovens,
com mais de 20 anos de idade.
128
BIOQUÍMICA CLÍNICA
↔
< 175
Categoria de risco
< 130 < 130 Baixo
< 100 < 100 Intermediário
LDL-c
< 70 < 70 Alto
< 50 < 50 Muito alto
< 160 < 160 Baixo
< 130 <130 Intermediário
Não HDL-c
< 100 <100 Alto
< 80 < 80 Muito alto
* Conforme avaliação de risco cardiovascular estimado pelo médico solicitante; ↑ colesterol total > 310 mg/mL há
↔
probabilidade de hipercolesterolemia familiar; quando os níveis de triglicérides estiverem acima de 440 mg/dL
(sem jejum), o médico solicitante faz outra prescrição para a avaliação de triglicérides com jejum de 12 horas e
deve ser considerado um novo exame de triglicérides pelo laboratório clínico.
A busca por marcadores bioquímicos para predição do risco cardiovascular revelou muitas
ferramentas diagnósticas confiáveis e de impacto na terapêutica clínica. Entre muitos, destaca-se
a proteína C reativa ultrassensível (PCR-US). Mensurada por imunoquímica, a presença da PCR-US
em níveis superiores a 2 mg/dL em pacientes cardiológicos indica ao clínico (endocrinologista ou
cardiologista) que esse paciente necessita de atenção para o tratamento das dislipidemias.
129
Unidade II
Conforme citado anteriormente, não apenas o estilo de vida está relacionado às dislipidemias:
temos também as hipercolesterolemias familiares. Vejamos, então, essas questões de cunho genético
e, por muitas vezes, hereditário.
As deficiências nutricionais são altamente prevalentes na população, sendo que os níveis plasmáticos
de homocisteína são inversamente proporcionais aos níveis séricos de folato e vitaminas B6 e B12.
Os níveis séricos de homocisteína são avaliados por determinação cromatografia líquida de alta
performance (HPLC), sendo possível realizar a sua avaliação após sobrecarga de metionina.
Apesar de grande parte dos pacientes com HF apresentarem mutações no gene LDLR, outras
regiões codificadoras do genoma humano também podem conter variantes de impacto para a HF,
como os genes ApoB e PCSK9. Por se tratar de uma DAD, o paciente com HF necessita apenas de
um alelo alterado para desenvolver a doença. De acordo com a literatura, pacientes heterozigotos
apresentam uma elevação de cerca de duas vezes os valores de referência, mesmo em idade jovem. Já
para os homozigotos mutantes, esses níveis chegam a atingir a casa dos 1.000 mg/dL.
130
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Classificação da HF Impacto
Classe I Ausência de receptor ou falha no funcionamento do receptor de LDL-c
Classe II Menor expressão do receptor na membrana celular
Classe III Defeito no sítio de ligação do receptor da LDL-c
Classe IV Falha na internalização celular da LDL-c
Classe V Falha no retorno do receptor da LDL-c para a superfície celular
Hipercolesterolemia
isolada
*Aumento de LDL-c maior ou
igual a 160 mg/dL
Hiperlipidemia mista
*Aumento de LDL-c maior ou
igual a 160 mg/dL; TG maior
ou igual a 150 mg/dL
131
Unidade II
Atualmente, a classificação de Fredrickson está em desuso devido a sua baixa aplicabilidade clínica
e terapêutica. Entretanto, é interessante conhecê-la, pois tem como pilar de sustentação os níveis
sanguíneos de colesterol e/ou TG, sem pautar sua fundamentação nos níveis de HDL-c.
Saiba mais
Leia mais sobre a hipercolesterolemia familiar de causas genética
acessando o artigo indicado a seguir
FALUDI, A. A. et al. Atualização da diretriz brasileira de dislipidemias e
prevenção da aterosclerose. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 109, n. 2,
p. 1-76, 2017.
132
BIOQUÍMICA CLÍNICA
6.4 Gasometria
Os agentes ácidos e básicos do nosso organismo têm origem no metabolismo celular, com a
dissociação de ácidos orgânicos, do metabolismo da glicose, lípideos e proteínas. Já a sua eliminação
acontece principalmente por duas vias: as vias renais e pulmonares. Os ácidos são eliminados tanto
pela via pulmonar (ácido carbônico H2CO3) como pela via renal (ácido lático, cetoácidos, ácidos
alimentares). Por outro lado, as bases têm sua eliminação exclusivamente por via renal, com a liberação
de bicarbonato pela urina.
O controle do pH sanguíneo e dos demais líquidos corporais é fundamental para que o paciente
não evolua com quadros de acidificação (acidose) ou alcalinização (alcalose) desses meios. Como o
controle do equilíbrio ácido-básico do organismo é realizado pelos sistemas pulmonares e renais,
com o distúrbio desse equilíbrio, os pacientes podem evoluir com acidoses ou alcaloses de origem
respiratória e/ou renal.
Para essas análises, utilizamos seringas de plástico, com heparina liofilizada (minimiza a diluição
e quelação de íons), com proporcionalidade entre o volume de sangue/anticoagulante, para evitar
a formação de microcoágulos. De acordo com o International Federation of Clinical Chemistry and
Laboratory Medicine (IFCC), essa proporção deve ser de 50 UI de heparina lítica balanceada com cálcio
por mL de sangue total colhido. A amostra coletada deve estar isenta de ar, e na seringa não pode ter
espaço entre o êmbolo e a amostra sanguínea. A figura a seguir mostra uma não conformidade na
coleta de amostra de sangue para gasometria, a qual evidencia a presença de espaço com no espaço
ocupado pela amostra (ANDRIOLO et al., 2010).
133
Unidade II
O transporte da amostra de sangue para o teste de gasometria deve ser realizado em temperatura
ambiente.
134
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Acidose respiratória
Como principal causa, a acidose respiratória se instala devido a traumas relacionados ao sistema
nervoso central (SNC), por intoxicações exógenas, lesão medular, obstruções das vias aéreas altas,
pneumonias, derrame pleural, pneumotórax, afogamento, trauma torácico etc.
Acidose metabólica
Como principal causa, a acidose metabólica se instala devido a choque e hipotensão arterial,
cetoacidose diabética (com elevação de corpos cetônicos – inclusive visualizável no exame de urina
tipo I), intoxicação por ácido acetilssalicílico, na insuficiência renal (com perda de HCO3-), em casos
graves de diarreia, entre outros.
Alcalose respiratória
Alcalose metabólica
Esse aumento do tampão bicarbonato é verificado na gasometria pelo HCO3-, marcador metabólico
importante para constatação da etiologia da alcalinização do sangue.
Como principal causa, a alcalose metabólica se instala devido a episódios prolongados de vômito,
devido ao uso incontrolado de diuréticos e em casos de pacientes com sonda nasogástrica aberta.
Assim, há perda de agentes acidificantes, o que é essencial para o quadro de alcalose.
Ainda, temos mecanismos de neutralização das bases pelos ácidos do sistema tampão e pela via renal,
com eliminação de HCO3-.
O tratamento utilizado para os pacientes com alcalose metabólica é a reposição hídrica, moderação
do uso de diuréticos e administração de compostos acidificados.
Observação
O cálcio e o fósforo são os principais minerais responsáveis pela saúde óssea. A matriz óssea é
formada de uma parte flexível e orgânica, com cerca de 35% da composição do osso apresentando
colágeno tipo 1, e uma parte rígida e inorgânica, cerca de 65%, impregnada por cristais de hidroxiapatita
– Ca10(PO4)6(OH)2 – e substância fundamental amorfa (SFA), nada mais que um gel incolor, hidratado,
composto de proteoglicanas, glicosaminoglicanas (condroitin e queratan sulfato), proteínas envolvidas
na mineralização (osteocalcina), proteínas ligantes de cálcio (osteoconectina, sialoproteína), proteínas
de adesão celular (osteopontina, fibronectina), citocinas, fatores de crescimento, enzimas e água.
Observação
137
Unidade II
produtos no sangue, são os osteoclastos. Logo após esse processo de absorção, ocorre a remodelação
do tecido ósseo.
Já os elementos traço são aqueles que o corpo humano necessita em quantidades muito pequenas
(por isso, às vezes são chamados de oligoelementos), como é o caso de iodo, cobre, zinco, manganês,
cobalto, molibdênio, cromo, flúor, níquel, vanádio, silício, boro e alumínio.
Podemos dizer que o elemento cálcio é o mineral mais importante para o funcionamento do corpo
humano. Cerca de 1% a 2% do peso corpóreo de um adulto está relacionado a esse íon, presente,
majoritariamente, na forma de ossos e dentes. Mas o cálcio não participa apenas da rigidez dos ossos e
dentes, desempenhando também outras funções como excitabilidade neuromuscular, permeabilidade
da membrana, coagulação sanguínea, sinalizador celular e cofator enzimático.
As necessidades diárias de ingestão de cálcio variam conforme a faixa etária, sendo maior na
infância e adolescência (por causa do crescimento ósseo), na gravidez e na lactação (situações em que
há uma deficiência de cálcio), e na atividade física (quando há absorção de cálcio). A recomendação
para adultos (homens e mulheres) é de 1.000 mg/dia de cálcio, enquanto os adolescentes devem
consumir 1.300 mg/dia. Alguns estudos sugerem que tanto o excesso quanto a falta não fazem bem
à saúde, havendo risco de fraturas com uma ingestão diária abaixo de 800 mg e risco de problemas
digestivos, cálculos renais, arritmias cardíacas e infarto do miocárdio, por deposição de cálcio na
parede das artérias, quando tal ingestão excede os limites adequados.
Leite e derivados são importantes fontes de cálcio, mas a cada dia vemos mais pessoas com
intolerância à lactose, dificultando a ingestão de cálcio por essa via. Nesse caso, outras fontes
possíveis são folhas escuras (como espinafre e acelga), soja, feijão-branco, gergelim, grão-de-bico,
brócolis, linhaça e aveia, entre outros.
A absorção do cálcio se dá no intestino delgado, sendo realizada de forma ativa pela mediação da
vitamina D (chamada de 1,25-dihidroxivitamina D ou 1,25(OH)2D) e a ligação a uma proteína ligadora
de Ca (Ca-Bp), e de forma passiva pela difusão simples ou facilitada com a ajuda do paratormônio
(PTH) e do hormônio do crescimento (GH). Hormônios como glicocorticoides, excesso de hormônios
tireoidianos e possivelmente calcitonina diminuem a absorção desse íon. A sua biodisponibilidade
(que é a digestibilidade ou solubilidade para sua absorção) pode ser influenciada negativamente caso
ocorra formação de sais insolúveis do cálcio com ácido fítico ou oxálico (que podem ser encontrados
em fibras, importantes para o funcionamento do intestino) e formação de sabões (sabão de cálcio)
pelo excesso de gordura, além de presença de cafeína e ferro.
138
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Saiba mais
O cálcio do sangue encontra-se na forma ionizada (Ca2+) e ligado à albumina. Ele vai para o
líquido extracelular (LEC) e entra nas células. (LIC ou líquido intracelular). Esse mineral pode:
• pode ir para o fígado (bile) e daí para o intestino, sendo liberado nas fezes;
Osso
Dente
Tireoide Calcitonina
LEC LIC
Rins
Urina Sangue Fígado
139
Unidade II
Quando baixa a calcemia, a glândula paratireoide libera o PTH e as células produtoras de calcitonina
da tireoide são inibidas. Quando a calcemia está elevada, ocorre o contrário: a calcitonina é secretada
e a paratireoide é inibida. O hormônio PTH aumenta o nível de cálcio no sangue atuando no osso, no
rim (visa à reabsorção) e no intestino (PTH e vitamina D aumentam a absorção intestinal), enquanto
a calcitonina diminui o cálcio no sangue (hormônio hipocalcemiante).
Observação
Sustentação de peso e estiramento muscular, repouso, falta de
gravidade e imobilização causam rarefação do osso, enfraquecendo-o.
Hipercalcemia
Normalmente, a reabsorção óssea ligada ao câncer é o maior fator de hipercalcemia, mas essa
condição também pode estar relacionada ao hiperparatireoidismo, à imobilização prolongada ou
mesmo à ingestão exagerada de cálcio (na forma de antiácidos).
Os sintomas iniciais incluem fadiga, náuseas, vômitos, poliúria, polidipsia, desidratação, cefaleia,
perda de memória, torpor, problemas cardíacos e coma. Para diagnóstico laboratorial, pode-se pedir
dosagem de cálcio total e ionizado no soro, além de se analisarem a filtração glomerular (depuração
de creatinina), a dosagem do PTH e a dosagem de vitamina D. Os achados de ultrassom de pescoço
com cintilografia, ultrassonografia de rins e vias urinárias podem ajudar na avaliação do quadro
clínico. A hipercalcemia pode ser tratada com hidratação e diuréticos de alça, como a furosemida,
para aumentar a excreção urinária desse mineral.
Hipocalcemia
Trata-se de um quadro clínico que ocorre associado à alteração do fósforo (hipocalcemia com
elevação ou com redução do fósforo no sangue).
140
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Os sintomas vão de fraqueza muscular até a perda de memória, confusão mental, alucinação,
tremores, convulsões e depressão. No laboratório clínico, pode-se pedir dosagem de cálcio total e
iônico, albumina sérica, fósforo e PTH, além da dosagem de magnésio, creatinina e vitamina D. Nos
achados radiológicos, podemos citar calcificações intracranianas e alterações no eletrocardiograma.
Por fim, o tratamento é realizado com a infusão de sais de cálcio no sangue ou vitamina D.
O fósforo não está em sua forma livre no sangue, mas, sim, na forma de fosfato, mais precisamente
em compostos relacionados à energia do corpo (como ATP e fosfocreatina), à ativação de substâncias
(como aminoácidos, glicose, nucleotídeos e fosfolipídios), além de fazer parte da constituição de
ossos e dentes.
Os alimentos que apresentam cálcio são os mesmos que apresentam fósforo: cereais, nozes,
amendoim, amêndoas, leite e seus derivados (incluindo sorvetes e iogurtes), vísceras (miolos, fígado,
coração, língua, rins etc.), ervilha, feijão, chocolate, farinha de trigo integral, refrigerantes à base
de cola, cerveja e alguns legumes, todos eles apresentam níveis elevados de fósforo. Atualmente,
também é usado como aditivo alimentar por retardar a rancidez e remover os íons ferro e cobre, que
são responsáveis pela auto-oxidação de lipídios na carne (como em presuntos e frangos congelados
pré-embalados).
Os sintomas da deficiência de fósforo são diminuição de apetite, anemia, fraqueza muscular, dor
nos ossos e maior suscetibilidade a infecções. Quanto ao seu metabolismo, trata-se de um processo
relacionado diretamente ao PTH, como representado na figura a seguir.
Osso
Dente
LEC LIC
Rins
Urina Sangue Fígado
Intestino Ânus
Boca Fosfato PO42-
141
Unidade II
Hiperfosfatemia
• não ser excretado na quantidade correta, tendo sua concentração no sangue aumentada (caso
da doença renal crônica, do hipoparatireoidismo, da hemólise, da rabdomiólise, da hipertermia
maligna, da leucemia e do linfoma);
No laboratório clínico, podemos diagnosticar esse quadro pelas dosagens de fósforo, cálcio total
e iônico, albumina, magnésio e PTH analisadas em conjunto com achados radiográficos evidenciando
calcificações de tecidos moles, articulações e depósitos pseudotumorais. Quanto ao tratamento,
agentes quelantes de fósforo orais, como sais de alumínio, sais de cálcio e sais de magnésio, são
comumente usados.
Hipofosfatemia
• deficiência de vitamina D;
Para diagnóstico laboratorial, podemos citar dosagens de fósforo, cálcio total e iônico, albumina,
magnésio, PTH, baixo número de glóbulos vermelhos e de plaquetas, além de achados radiográficos.
A reposição oral de sais de fósforo é o método mais usado para tratamento.
142
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Participante de várias reações metabólicas, o magnésio está relacionado com a síntese de ATP,
metabolismo da glicose, proteínas e ácidos nucleicos. Age na estabilidade da membrana neuromuscular
e cardiovascular, na manutenção do tônus vasomotor e como regulador fisiológico da função
hormonal e imunológica.
Entre as fontes alimentares de magnésio, podemos citar: cereais integrais, vegetais folhosos
verdes, espinafre, nozes, frutas, legumes e tubérculos, como a batata. Grande parte desse íon é absorvida
no intestino. Destaca-se que fibras alimentares, oxalatos, fosfatos, entre outros, atrapalham sua absorção.
Armazenado nos ossos (67%) e nas próprias células (31%), o magnésio inibe o afluxo de cálcio
através da membrana celular e compete por seus sítios de ligação, reduzindo a liberação do cálcio no
retículo sarcoplasmático.
A hipomagnesemia tem como causas comuns a estadia de pacientes em UTI e cirurgias ósseas
extensas. Os sintomas são similares aos da hipocalcemia (convulsões e distúrbios de ritmo cardíaco),
além de piorar a função do PTH, alterando diretamente a quantidade de íons cálcio, fósforo e
indiretamente a função renal. Para corrigir o problema, deve-se ministrar sulfato de magnésio.
A hipermagnesemia tem como causas falência renal, uso abusivo de antiácidos e laxantes. Os
sintomas são náuseas e vômitos, fraqueza muscular, paralisia, ataxia, sonolência e confusão mental.
Como tratamento, podemos citar uso de diuréticos como furosemida, hidratação adequada e
gluconato de cálcio.
Quando observamos os ossos, percebemos que há uma proteína mais abundante: osteocalcina.
Esta é responsável por estimular a atividade dos osteoblastos, promovendo a mineralização óssea, ou
seja, é capaz de fixar o cálcio ao osso na hidroxiapatita na matriz extracelular. A vitamina K auxilia
na ocorrência de reações de carboxilação nela, permitindo a sua função de mineralização da matriz.
Essa proteína não pode ser usada como marcador bioquímico de reabsorção óssea, pois sua vida
plasmática é bastante curta.
A osteocalcina pode agir como se fosse um hormônio nas ilhotas beta de Langerhans (quando
está descarboxilada), ativando e estimulando a secreção e sensibilidade à insulina no tecido
adiposo e muscular. Por outro lado, a insulina e a leptina podem atuar no tecido ósseo modulando
a secreção da osteocalcina, e sua liberação e reabsorção são maiores durante a noite (ligada ao
ciclo circadiano). Valores acima do valor de referência são encontrados na doença de Paget e no
hiperparatireoidismo primário.
143
Unidade II
Ambas são verificadas nas ligações cruzadas da estrutura da hélice do colágeno tipo I. Como são
liberadas quando há destruição óssea, sua dosagem na urina de 24 horas está ligada com a reabsorção
óssea (atividade osteoclástica), sendo que são excretadas na razão 3:1 (deoxpiridinolina/piridinolina).
A deoxpiridinolina é mais sensível que a piridinolina, não sendo influenciada pela dieta. Níveis
elevados são encontrados em osteoporose, doença de Paget, metástases ósseas, hiperparatireoidismo
e hipertireoidismo. O hipotireoidismo pode diminuir níveis excretados.
Fosfatase alcalina
É uma enzima encontrada em diversos tecidos do corpo, incluindo fígado, ossos, rins, intestino e
placenta. As maiores concentrações de fosfatase alcalina estão no fígado e nos ossos. Em cada local
tem um papel biológico e tem pequenas diferenças entre elas, sendo chamadas de isoenzimas: nos
ossos, é produzida pelos osteoblastos (células que formam o tecido ósseo); no fígado, é encontrada
nas bordas das células que se unem para formar canais biliares, que drenam a bile do fígado para
o intestino.
Observação
7.2.1 Osteoporose
144
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Observação
Nos ossos longos, como os dos braços e das pernas, a fratura ocorre normalmente nas
extremidades dos ossos, não em sua região central, e nas vértebras, ocorrem geralmente no
meio ou na parte inferior das costas. Se várias vértebras quebrarem, uma curvatura anormal da
coluna vertebral pode se desenvolver (corcunda de viúva), causando tensão muscular e dor, bem
como deformidade.
145
Unidade II
Quanto aos exames, podem ser feitas dosagens sanguíneas de cálcio, vitamina D e hormônios,
além de perfil hepático e renal (no caso de osteoporose secundária). Cabe ressaltar que todas as
mulheres com 65 anos ou mais devem fazer o exame de densidade óssea (teste indolor, com pouca
radiação), exame de grande importância por poder diagnosticar a osteopenia (quando a densidade
óssea está diminuída, mas não como na osteoporose).
7.2.2 Osteomalácia
Osteo significa osso e malácia, amolecimento. Tal quadro pode ser descrito como o enfraquecimento
e a desmineralização dos ossos no adulto, circunstância que os deixa fracos e sujeitos a fraturas. Na
prática, pode se apresentar como uma osteopenia e o paciente pode ter dor óssea.
Sensação de dormência ao redor dos lábios, nos braços ou nas pernas e espasmos musculares
nas mãos, pés e garganta, além de dores ósseas e fraqueza muscular são os principais sintomas
da osteomalácia. Para fazer o diagnóstico, além da análise dos sintomas, os índices plasmáticos de
cálcio, fósforo e da fosfatase alcalina, considerados em conjunto com os exames de imagem, fecham
o quadro clínico. O tratamento dessa patologia geralmente está ligado ao aumento de fosfatos e de
vitamina D na dieta, por meio de alimentos como manteiga, ovos, óleo de fígado de peixe, derivados
de leite, sucos de frutas e peixes como atum e salmão. Por fim, a prevenção da osteomalácia baseia-se
em dietas com cálcio, fósforo e vitamina D, além de exercícios ao sol.
7.2.3 Raquitismo
Os sintomas mais comuns são deformidades ósseas, como maior espessura, maior extensão e
menor grau de mineralização. O diagnóstico físico é feito com base em fraqueza muscular, dor óssea
generalizada, deformidades de ossos longos e fraturas patológicas, levando a déficit de crescimento e
anormalidades cranianas. Nesse quadro, os achados radiológicos mostram alterações mais frequentes
em ossos longos.
No laboratório clínico verificamos valores baixos ou normais de cálcio e fósforo e níveis elevados
da fosfatase alcalina no sangue, refletindo o aumento da remodelação óssea, além de PTH elevado no
146
BIOQUÍMICA CLÍNICA
sangue e níveis baixos de vitamina D. O exame de densitometria óssea não irá apresentar osteopenia
nem osteomalácia no caso do raquitismo hipofosfatêmico, embora as manifestações clínicas e
radiológicas sejam parecidas com o raquitismo por falta de cálcio, mas, como a calcemia é normal,
não há estímulo na paratireoide (hiperparatiroidismo secundário), não havendo reabsorção óssea.
Vários tipos de câncer podem levar ao raquitismo hipofosfatêmico oncogênico, pois essas células
transformadas produzem proteínas (fatores) que agem nos túbulos renais, inibindo a reabsorção
proximal de fósforo.
A vitamina D pode ser obtida por duas vias: síntese a partir do acetil Co-A e ativada pela exposição
solar (durante 20 minutos, sem protetor solar) ou através da alimentação (sendo necessária sua
ativação também). Como a síntese pode ser realizada também nos rins, pacientes com insuficiência
renal crônica não são capazes de produzir vitamina D ativa suficiente. A vitamina D inibe a produção
do PTH e mantém as concentrações de cálcio e fósforo normais no osso.
Saiba mais
A remodelação óssea apresenta um ritmo circadiano, com maiores níveis durante a noite, motivo
pelo qual a primeira urina da manhã (ou a amostra de soro coletada nesse horário) reflete o pico
de reabsorção óssea, apresentando valores seguramente mais altos que uma amostra colhida em
outro horário.
147
Unidade II
Os melhores marcadores séricos de formação (fosfatase alcalina óssea e osteocalcina) devem ser
considerados mediante a interpretação dos valores de meia-vida biológica, pois a fosfatase alcalina
óssea tem em torno de 1,6 dia, e a osteocalcina menos de uma hora de existência. Dessa forma, crises
agudas estão relacionadas com os níveis de osteocalcina.
Deve-se ressaltar que o ciclo menstrual pode influenciar nos níveis de marcadores bioquímicos,
estando esses mais elevados durante a fase lútea (em comparação com a fase folicular).
• Hidroxiprolina urinária: com o desenvolvimento dos métodos mais específicos para avaliação
da reabsorção óssea, essa técnica tem sido abandonada.
Os exames de checkup com marcadores bioquímicos e uso de imagem têm a função de diagnóstico
e seguimento/tratamento da osteoporose.
A glândula tireoide localiza-se sobre a traqueia e apresenta dois lobos (um de cada lado da laringe)
pesando aproximadamente 20 gramas, com formato de borboleta.
148
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Epiglote
Faringe
Vaso sanguíneo
Tireoide Paratireoide
Traqueia
Os hormônios da tireoide (T3 e T4) atuam em várias reações químicas do organismo: regulando o
metabolismo de carboidratos, lipídios e proteínas; influenciando desde o crescimento e desenvolvimento
do organismo até questões como ciclo menstrual, fertilidade, perda de cabelos, emagrecimento etc.
A tireoide é formada por células chamadas de parafoliculares (que produzem calcitonina) e células
foliculares, que contêm substância amorfa de nome coloide, composto de glicoproteína chamada
tireoglobulina (Tg) na qual o íon iodeto, que veio do plasma, se liga em suas tirosinas na forma de
iodo por intermédio da enzima peroxidase que oxida iodeto em iodo. Essa enzima é estimulada pelo
hormônio da hipófise TSH - hormônio estimulante da tireoide, que por sua vez é estimulada por fator
de liberação de tireotropina (TRF) produzido no hipotálamo.
Lembrete
Quando os níveis de T3 e T4 no sangue aumentam, o hipotálamo para de secretar TRF, que não
estimula mais o TSH.
O T4 é metabolizado no fígado em sua forma mais ativa: o T3. Apesar de a maior parte do T3 ser
derivada do T4, a tireoide também produz esse hormônio, ainda que em menores quantidades.
149
Unidade II
Hipotireoidismo
Observação
Hipertireoidismo
Os sintomas mais frequentes são: intolerância ao calor, metabolismo basal alto, aumento da
frequência cardíaca, perda de peso, tremor nas mãos, nervosismo e outras perturbações psíquicas.
Também podem estar presentes protusão dos globos oculares (exoftalmia) e bócio (papo).
Observação
150
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Doença de Graves
Para fazer o diagnóstico de doença de Graves, deve-se analisar sintomas e fazer o levantamento
de hormônios da tireoide no sangue (como TSH, T4 e anticorpos contra a tireoide).
Como a tireoidite de Hashimoto, outro exemplo de doença autoimune que atinge a tireoide, a doença
de Graves é uma condição autoimune na qual o sistema imunológico estimula excessivamente a tireoide,
fazendo com que ela produza grandes quantidades de hormônio tireoidianos, consequentemente
aumentando o volume da tireoide.
151
Unidade II
O resultado de TSH reduzido com nível elevado de tiroxina livre (T4 livre) confirma o diagnóstico
clínico de hipertireoidismo. No início da doença, a triiodotironina (T3 livre) eleva-se e o nível de
T4 livre fica normal. No doente com hipertireoidismo e bócio difuso, os sinais de oftalmopatia e
dermopatia são suficientes para confirmar o diagnóstico. Concentrações elevadas de anticorpos
anti‑TPO e cintilografia detectam bócio difuso (mostrando captação de iodo difusa).
Tireodite de Hashimoto
Essa doença está relacionada com áreas onde há falta de iodo, levando as pessoas a apresentarem
bócio e hipotireoidismo adquirido, principalmente, no Brasil.
Observação
A dieta com pouco iodo pode levar a natimortos, no caso de gestantes, além do nascimento de
crianças com baixo peso, aumento da probabilidade de abortos e também de mortalidade materna.
Entre os distúrbios por deficiência de iodo (DDI), podemos citar também: cretinismo em crianças
(retardo mental grave e irreversível), surdez neurossensorial e anomalias congênitas, bem como a
manifestação clínica mais visível, o bócio (crescimento da glândula tireoide).
Cansaço e intolerância ao frio são sintomas iniciais e os pacientes deverão tomar hormônio
tireoidiano pelo resto da vida. Níveis sanguíneos dos hormônios tireoidianos tiroxina (T4) e
triiodotironina (T3) e do hormônio estimulante da tireoide (TSH), além dos anticorpos antitireoidianos,
conduzem ao diagnóstico final.
152
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Algumas pessoas apresentam uma função normal da tireoide, mas, em razão do desenvolvimento
de doenças preexistentes como diabetes ou outras doenças autoimunes (caso de anemia perniciosa,
artrite reumatoide, síndrome de Sjögren ou lúpus eritematoso sistêmico) a glândula se torna hipoativa.
A esse rol podemos adicionar ainda casos de anomalias cromossômicas como síndrome de Down,
síndrome de Turner e síndrome de Klinefelter.
De forma geral, os exames de laboratório que refletem o perfil da tireoide são TSH, T3 Total,
T3 Livre, T4 Total e T4 Livre, além da determinação de anticorpos contra a tireoide. Para saber a causa da
disfunção, deve-se pedir exames complementares (hemograma, exames imunológicos e de imagem).
É importante ressaltar que o TSH é o teste mais confiável para detectar hipo e hipertireoidismo.
Quando uma pessoa apresenta sintomas ligados ao hipertireoidismo, como nervosismo, perda de peso,
irritabilidade e náuseas, pede-se TSH ou T4, e T3, que pode estar aumentado, diminuído ou normal
(não esqueça que o T4 se transforma em T3 quando necessário). Vejamos algumas possibilidades.
• T3 reverso: é a forma inativa do hormônio derivada da conversão do T4; nos pacientes com
hipotireoidismo tem índices baixos e nos pacientes com hipertireoidismo está elevado.
• T4 total (T4 livre + T4 ligado a proteínas): o T4 é transportado pelo sangue até os órgãos ligado
a proteínas, mas está inativo, tornando-se ativo ao chegar nos tecidos, sendo, então, liberado.
153
Unidade II
Medicamentos como a levotiroxina (Puran T4, Eutirox, Tetroid ou Synthroid) substituem o hormônio
que é normalmente fabricado pela glândula da tireoide, permitindo a sua reposição.
Da mesma forma que se faz o autoexame das mamas, pode-se fazer o autoexame da tireoide a fim
de verificar a existência de cistos ou nódulos na glândula (principalmente, por mulheres com mais de
35 anos ou com histórico familiar de problemas na tireoide).
• localizar a tireoide (na frente do espelho, colocar a mão no pescoço, perto do pomo-de-adão
(homens), conhecido como “gogó”);
As paratireoides são quatro pequenas glândulas localizadas sobre a tireoide e pesam cerca de
140 mg. Apesar de compartilharem o mesmo sítio anatômico, têm funções diferentes. O único
hormônio produzido, o paratormônio (PTH), está relacionado com o metabolismo do cálcio e do
fósforo, aumentando a eliminação de cálcio e fósforo pela urina e retirando o cálcio dos ossos, além
de favorecer a absorção de cálcio pelo intestino, junto com a vitamina D ativada.
Cálcio
6,4
Injeção de hormônio
6,0
paratireoideo
5,6
Cálcio
5,2
4,8 1,4
1,2
4,4 1,0
Fosfato 0,8
0 4 8 12 16 20 24
Tempo
154
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Como o PTH age nos rins, se a pessoa tiver problemas renais, esse hormônio não induzirá a
produção de vitamina D nem a excreção de fósforo sérico na urina. Sendo assim, a única função
desse hormônio será tirar o cálcio dos ossos, deixando o fósforo ainda alto no sangue. Dessa forma, a
paratireoide fica sempre estimulada a produzir mais e mais hormônio na tentativa de retirar o fósforo
do sangue, desencadeando o hiperparatireoidismo.
Lembrete
O paciente com insuficiência renal não produz vitamina D em
quantidade suficiente para manter seus ossos saudáveis. Pelo contrário,
ele produz um excesso de PTH, que leva à desmineralização dos ossos.
Hipoparatireoidismo
O trauma cirúrgico em cirurgias de tireoide/paratireoide e neoplasias de cabeça e pescoço são as
causas mais frequentes de hipoparatireoidismo, já as doenças autoimunes das paratireoides são a
segunda causa mais frequente.
Quando há deficiência de paratormônio, ocorre a redução do cálcio sanguíneo, aumentando o
nível do fósforo sérico e diminuindo a excreção renal do cálcio e do fósforo. Tal quadro, por sua vez,
leva à tetania muscular por hiperexcitabilidade dos tecidos nervoso e muscular, causada, basicamente,
pela insuficiência dos íons de cálcio no sangue.
Níveis baixos de PTH, a dosagem de albumina (para cálculos de correção do cálcio), fósforo,
magnésio, vitamina D e dosagem de cálcio em urina de 24 horas são importantes fatores para o
diagnóstico de hipoparatireodismo. Os sintomas mais frequentes são espasmos musculares, tetania e
convulsões, além de alterações no eletrocardiograma.
Hiperparatireoidismo
Observação
Aumento de peso, queda de cabelo, mais depressão e bolsas inchadas abaixo dos olhos podem ser
sintomas de que algo possa estar acontecendo com a tireoide.
As células lábeis e estáveis podem se dividir por mitose, com a função de se renovar, já as células
permanentes não possuem tal habilidade, pois seus núcleos não são providos dos meios necessários
para dar início a essa divisão, caso dos neurônios e das fibras musculares estriadas. Quando ocorre a
divisão descontrolada de um grupo celular falamos que essa proliferação leva a um tumor, que pode
ser benigno ou maligno.
156
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Pelo fato de estarem fracamente ligadas à matriz celular, tais células podem se desprender e
invadir órgãos vizinhos ou até chegar ao sangue e invadir órgãos mais distantes (metástase).
O câncer (ou tumor maligno) pode ser não invasivo (ou in situ), caso em que essas células estão
circunscritas a um único local, ou seja, não se espalharam, o que torna mais simples sua retirada por
meio de um procedimento cirúrgico. Já o câncer invasivo pode iniciar metástase ou disseminação
(como explicado anteriormente).
Observação
As causas de câncer são classificadas em externas e internas. No caso das externas, temos riscos
ambientais como radiação, substâncias químicas, tabaco e até contaminação por alguns vírus. É
necessário lembrar, ainda, que o próprio envelhecimento afeta o processo de divisão celular, aumentando
as chances de erros nessas divisões e causando, consequentemente, genes mutados que irão progredir
para um câncer. Quanto às causas internas, temos mutações genéticas (pois erros não serão corrigidos)
e fatores hereditários. Alguns dos sintomas mais comuns que podem levar ao médico são: dor, fadiga,
falta de apetite, constipação intestinal, vesículas na mucosa oral, diarreia e sangramento.
Carcinomas são tipos de cânceres que estão em tecidos epiteliais (como pele ou mucosas), já os
sarcomas estão nos tecidos conjuntivos (por exemplo, osso, músculo ou cartilagem). Ainda temos outros
tipos de câncer, como leucemias (na medula óssea), linfomas e mielomas (no sistema imunológico).
Quando se trata de um tumor benigno, usa-se o sufixo oma com a designação referente ao tipo
de tecido acometido. Por exemplo, tecido cartilaginoso (condroma), tecido gorduroso (lipoma), tecido
glandular (adenoma) – podendo-se, ainda, explicitar o local do câncer, como em “adenocarcinoma de
pulmão”. No caso de tumores malignos, se o local acometido forem epitélios de revestimento, teremos
carcinomas; no caso de epitélio glandular, teremos adenocarcinomas e, por fim, caso se trate de tecido
conjuntivo, será adicionado o sufixo sarcoma (por exemplo, osteossarcoma – tecido ósseo). E, da mesma
forma que em tumores benignos, pode-se explicitar o local do câncer, como osteossarcoma de fêmur.
Para que o tratamento seja mais eficaz, o câncer deve ser detectado o quanto antes. Daí a importância
da regularidade dos exames de checkup, uma vez que possibilitam o diagnóstico precoce. Recentemente,
tornou-se mais comum o chamado rastreamento (ou screening), que examina proteínas ou genes alterados
que, já se sabe, estão ligados ao câncer e, assim, analisar a chance de a doença se desenvolver.
Para se confirmar que o tratamento, seja radioterapia ou quimioterapia, é adequado e está surtindo
efeito (ou seja, para ter certeza de que a doença está controlada), os exames devem ser realizados de
forma rotineira.
158
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Sinal
Receptor
SOS
GRB2
RAS
RAF
MEK
ERK
DNA
RNA
Oncoproteínas
Figura 61 – Esquema simplificado de uma via de sinalização que pode levar à formação de câncer
8.2 Diagnóstico
Temos vários exames que podem identificar o câncer, como diagnóstico de imagem (ressonância,
radiografia e tomografia), exame histopatológico e exames bioquímicos.
Observação
159
Unidade II
As células normais ou neoplásicas produzem certas proteínas continuamente, sendo que, quando
são produzidas em grande quantidade aumentada no sangue (periférico e medula) ou em outros
fluidos corporais (como urina, liquor, líquido ascítico), passam a se relacionar com a malignidade
(como enzimas, hormônios, por exemplo), e podem ser dosadas por vários métodos (bioquímicos,
imunológicos, citológicos ou moleculares). A detecção por marcadores tumorais é muito mais
precoce, pois, com poucas células, já se pode ter a confirmação (por imagem, a verificação só pode
ser realizada quando o tumor já está com muitas células, ou seja, num estágio mais adiantado).
A detecção precoce e o seu monitoramento após a cirurgia e o tratamento medicamentoso são
fundamentais para eliminar o tumor, e os marcadores tumorais (MT) sensíveis e específicos podem
ajudar nesse processo, junto com os exames de imagem.
Em sua grande maioria, são detectados por quimiluminescência, mas também podem ser analisados
por radioimunoensaio. Um bom marcador tumoral deve ter sensibilidade e especificidade superiores
a 90%, ou seja, boa sensibilidade (capacidade em detectar precocemente a existência de um tumor)
e boa especificidade (capacidade de mostrar-se negativo na ausência do tumor). Esses marcadores
auxiliam no diagnóstico, não estando relacionados a um exame de prevenção de câncer.
Vários marcadores tumorais podem estar aumentados em um único tipo de câncer, por conta das
várias alterações moleculares que produzem várias proteínas. Nesse caso, aquelas liberadas em maior
intensidade devem ser o melhor marcador para aquele tipo específico de tumor maligno. De maneira
geral, podem ser separados mediante alguns pontos como os indicados a seguir.
• Pelo produto das células tumorais (enzimas, hormônios, antígenos oncofetais, marcadores de
superfície celular e produtos de oncogenes).
Transcrição Tradução
DNA RNA Proteína
Transcrição
Replicação reversa
DNA
Figura 62 – Esquema dos processos que envolvem os genes (DNA). Imaginando-se que ocorra uma
mutação no DNA, tal mutação irá se propagar para o RNAm, modificando a proteína
• Pela resposta da célula quando ela se transforma. Marcador tumoral celular: antígenos
localizados na membrana celular, como o que ocorre na leucemia, como hormônios e receptores
de fatores de crescimento; marcadores humorais: substâncias que são sintetizadas pelo tecido
tumoral ou substâncias formadas pelo organismo em reação ao tumor; marcadores genéticos:
que são superexpressos e codificam para proteínas do desenvolvimento tumoral.
160
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Observação
Vejamos a seguir algumas das principais enzimas que são marcadores tumorais.
• LDH (ou lactato desidrogenase): é uma enzima do metabolismo dos carboidratos (fermentação
lática), liberada quando ocorre lesão ou destruição celular. Sua concentração no sangue é alta
em quase todos tipos de câncer (como também em muitas outras doenças), portanto não pode
ser usada para diagnosticar um tipo particular de câncer. Níveis séricos elevados: vários tipos de
câncer (como leucemias, linfomas não Hodgkin, câncer de fígado, testículo, mama, estômago,
cólon, pulmão e neuroblastoma). Algumas situações podem interferir em uma análise correta
como hepatite, infarto agudo do miocárdio, anemias hemolíticas, lesões musculares, drogas ou
medicamentos como aspirina, narcóticos, álcool e anestésicos.
• Catepsina D-enzima: é produzida por certas células de câncer de mama que indicam prognóstico
ruim, pois sugere-se que a catepsina D degrada os proteoglicanos da matriz da membrana
basal estimulando a angiogênese e a metástase, consequentemente, o espalhamento do câncer.
Níveis séricos aumentados: câncer de mama.
161
Unidade II
• Fosfatase ácida postática (PAP): inicialmente descoberta na próstata, mas pode ser
encontrada em eritrócitos, plaquetas, leucócitos, medula óssea, osso, fígado, baço, rim e
intestino. Níveis séricos elevados: câncer de próstata, osteossarcoma, hiperparatireoidismo,
mieloma múltiplo e metástases ósseas de outros tumores, mas também pode estar elevada
em hipertrofia prostática benigna (HPB), osteoporose (espalhado pelo osso), por essa razão, foi
substituída por PSA.
• Fosfatase alcalina placentária (PLAP): produzida a partir da 12ª semana de gestação pela
placenta, mas indivíduos fumantes também podem apresentar elevação no sangue. Níveis
séricos elevados: seminomas (surgem dentro das gônadas, testículos ou ovários), câncer de
ovário, testículo, pulmão e trato gastrointestinal.
• Fosfatase alcalina (ALP): encontrada em fígado, ossos, rins, intestino e placenta, mas as
maiores concentrações de fosfatase alcalina estão no fígado e nos ossos. Níveis séricos elevados:
câncer hepático primário ou metastático, câncer ósseo, leucemias, sarcomas e linfomas com
infiltração hepática.
• Creatina quinase (CK-BB) ou creatina fosfoquinase (CPK): possui três isoenzimas (CK-MM,
CK-MB e CK-BB, relacionadas com músculo esquelético, cardíaco e cerebral, respectivamente).
A CK-BB pode ser encontrada principalmente no cérebro, mas também nos pulmões. Níveis
séricos elevados: câncer de cérebro, de pulmão de pequenas células, de seio, de ovário e de rim.
Vejamos a seguir alguns dos principais hormônios que são marcadores tumorais.
• Calcitonina: produzida pela glândula tireoide quando a calcemia está elevada, inibindo a
liberação de cálcio pelo osso e diminuindo o nível do cálcio sérico. Níveis séricos elevados:
câncer de mama, carcinoide, hepatoma, hipernefroma, câncer de pulmão, gastrinoma, tumores
gastrointestinais e o carcinoma medular da tireoide, mas pode se apresentar elevada em
outras situações, como doença não malígna do pulmão, pancreatite, doença de Paget óssea,
hiperparatireoidismo e mesmo durante a gravidez.
162
BIOQUÍMICA CLÍNICA
Vejamos a seguir algumas das principais glicoproteínas que são marcadores tumorais.
• Alfafetoproteína (AFP): proteína fetal com pico na 14ª semana de gestação, diminuindo perto
do nascimento e com meia-vida sérica de aproximadamente cinco dias; fica baixa em crianças e
adultos saudáveis. Níveis séricos aumentados: adultos com carcinoma hepatocelular ou câncer
de célula germe de ovário ou testículo (câncer que começa nas células que dão crescimento aos
óvulos e aos espermas), mas apresenta-se alto também em gestação, hepatite e cirrose. Pode
avaliar também o estágio, o prognóstico e a resposta à terapêutica.
• Antígeno prostático específico (PSA): glicoproteína produzida pela próstata com alterações
benignas ou malignas com meia-vida sérica entre dois e três dias. Níveis séricos aumentados:
câncer de próstata, inclusive usado para monitorar o tratamento câncer de próstata, mas
também em hipertrofia prostática benigna, prostatite, trauma, manipulação da próstata
e ejaculação.
163
Unidade II
São antígenos com alto peso molecular e conteúdo em carboidratos que varia de 60 a 80%.
Células presentes na superfície epitelial expressam essas glicoproteínas.
• Antígeno mucoide (MCA): encontrado também na superfície celular. Níveis séricos aumentados:
carcinoma mamário, câncer de ovário, colo uterino, endométrio e próstata. Contudo, pode
aumentar durante a gravidez e em doenças benignas de mama. Ocorre a correlação entre esse
marcador e níveis de CA 15-3.
• Antígeno associado ao tumor da bexiga (bladder tumor antigen – BTA): usando urina,
dosa-se essa proteína superficial da mucosa de células cancerosas da bexiga, mas não por
normais. Níveis séricos aumentados: tumores de bexiga, mas pode ter valor elevado em litíase
urinária, irritação da bexiga e sonda vesical por período longo.
• Dupan-2: antígeno glicoproteico que, em combinação com CA 19-9, pode constatar o câncer
de pâncreas. Níveis séricos aumentados: câncer de pâncreas e do trato gastrointestinal, mas
também em situações benignas do sistema hepatobiliar.
• CA-50: glicoproteína expressa na maioria dos carcinomas epiteliais como câncer gastrointestinal
e de pâncreas. Sua sensibilidade e especificidade são muito semelhantes à do CA 19-9 no
que se refere ao câncer de pâncreas e gastrointestinal. Níveis séricos aumentados: tumores
gastrointestinais, câncer de mama, ovário, mas pode estar elevado em outras doenças como
pancreatite e doenças hepáticas.
• CA 72-4 (ou TAG 72): antígeno relacionado com o aparecimento de câncer de cólon, estômago,
pâncreas e trato digestivo e câncer de ovário. A pesquisa dessa proteína auxilia na percepção de
recidiva do câncer, mas outras situações também podem alterar seus níveis, como hepatopatias,
pancreatite e inflamações gastrointestinais.
Vejamos a seguir algumas das principais moléculas do sistema imunológico que são marcadores
tumorais.
• B2 microglobulina (B2-MG): proteína que se relaciona com prognóstico ruim de pacientes com
linfoma. Níveis séricos aumentados: mieloma múltiplo, linfoma e tumores sólidos, bem como
doenças não malignas. Níveis séricos elevados: mieloma múltiplo, leucemia linfocítica crônica
e alguns linfomas. Essa determinação leva ao prognóstico e contribui para o monitoramento
do tratamento.
Entre os marcadores mais recentes usados na prática do laboratório de análises clínicas, podemos citar:
• Human epidermal growth fator receptor 2 (HER-2): oncogene analisado direto do tumor
onde é pesquisada a hiperexpressão (ou amplificação) do gene HER-2. Essa alteração ocorre
em câncer de mama e gástrico. Com esse resultado, o médico pode determinar o tratamento
específico e o prognóstico.
• Epidermal growth factor receptor (EGFR): oncogene pesquisado direto no tumor onde se
pesquisa hiperexpressão (ou amplificação) do gene EGFR. Essa alteração ocorre em câncer de
pulmão de células não pequenas, principalmente. Com esse resultado, o médico pode determinar
o tratamento específico e o prognóstico.
165
Unidade II
• K-Ras: oncogene pesquisado direto no tumor que, quando é ativado, leva à hiperexpressão
de várias vias de sinalização. Essa alteração ocorre em câncer do tipo colorretal e câncer de
pulmão de células não pequenas. Com esse resultado, o médico pode determinar o tratamento
específico e o prognóstico.
• Breast cancer do tipo 1/tipo 2 (BRCA1/BRAC2): proteínas supressoras de tumor, mas, caso
ocorra alteração no gene do tipo hipoexpressão, não há proteção contra o desenvolvimento
de alguns tumores (ou seja, não ocorre reparo do DNA defeituoso e a célula não vai para
apoptose). Quando essa alteração no sangue é constatada, trata-se de um sinal de que há
câncer de ovário. Com esse resultado o médico pode determinar o tratamento específico e o
prognóstico.
• p53: proteína supressora de tumor que leva a célula à apoptose caso ocorra alguma modificação
no ciclo celular que leve ao aparecimento de uma célula cancerosa. Se ocorrer mutações nesse
gene, a proteína não consegue mais salvaguardar o conteúdo do genoma. Caso ocorra aumento
de p53 no sangue, sugerem-se câncer esofágico, colorretal, pâncreas, mama e carcinoma
hepatocelular, principalmente. Tal exame não só pode confirmar diagnóstico, mas monitorar
esses tipos de câncer.
• Fusão de gene BCR e ABL (BCR/ABL): quando não há separação correta das cromátides
(ocorre translocação) e os dois genes ficam unidos, surge o cromossomo anormal (Ph). Sua
pesquisa é realizada no sangue e/ou medula óssea e detecta leucemia mieloide crônica, leucemia
linfoblástica aguda e leucemia mieloide aguda. Com esse resultado o médico pode determinar
o diagnóstico, tratamento específico e o prognóstico.
• Proteínas solúveis 100 (S100): proteínas sanguíneas que se ligam ao cálcio e são classificadas
em S100A1, S100A4 até S100A12. Alteração pesquisada: concentração de S100. Sua elevação
166
BIOQUÍMICA CLÍNICA
pode ser verificada em melanoma cutâneo, câncer colorretal, sarcomas, astrocitomas, e câncer
gastrointestinal. Esse exame não só pode confirmar diagnóstico, mas também está associado
com a verificação de metástases nos linfonodos.
• Proteína da matriz nuclear 22 (NMP22): fibras que formam um envelope nuclear. Caso
ocorra aumento na concentração de NMP22 na urina, principalmente, sugere-se câncer de
bexiga. Com esse resultado, o médico pode determinar o tratamento específico e o prognóstico.
• Terminal deoxynucleotidyl transferase (TdT): enzima cuja expressão elevada pode ser dosada
no sangue e caracteriza leucemias e linfomas.
• Proteína histônica de número 67 (KI 67): proteína nuclear relacionada com câncer de mama
e próstata diretamente ligada ao grau de proliferação celular.
• Programed death ligand 1 (PD-L1): proteína do sistema imunológico que ocorre nos
linfócitos T que induzem as células à morte quando ativada. Certas linhagens tumorais
produzem proteínas estimuladoras de PD-L1 que causam a morte de linfócitos citotóxicos,
tornando os tumores mais agressivos devido à diminuição da imunidade celular do paciente.
Níveis séricos elevados: câncer de pulmão de células não pequenas, melanoma, câncer de
rim e câncer de bexiga, entre outros. Com esse resultado o médico pode analisar se a terapia
está correta.
167
Unidade II
Resumo
168
BIOQUÍMICA CLÍNICA
169
Unidade II
Exercícios
Figura 63
Diabetes mellitus (DM) é uma doença metabólica crônica não transmissível, de origem
multifatorial, caracterizada pela elevação permanente dos níveis glicêmicos decorrente da ausência
e/ou incapacidade da insulina de exercer sua função fisiológica, gerando uma série de complicações e
disfunções de órgãos essenciais. É considerada como uma epidemia mundial e um problema de saúde
pública, com crescente prevalência e considerada em todo o mundo. As estimativas da Organização
Mundial da Saúde (OMS) sobre DM sugerem que a doença foi responsável por 1,4 milhão de óbitos
em 2011. Apontam ainda que, entre 2010 e 2030, haverá um aumento de 69% no número de adultos
com DM nos países em desenvolvimento e de 20% nos países desenvolvidos. Até 2025, a expectativa
é de 350 milhões de pessoas acometidas pela doença em 2025 e no Brasil serão 18,5 milhões.
Em idosos, o DM tem sido encontrado em incidências que variam de 18,6% a 23,5% em pesquisas
realizadas no Brasil. O aumento da expectativa de vida em idosos, quando associados a hábitos de vida
inadequados, consequentemente reflete uma maior incidência de doenças crônicas nessa população,
especialmente, o DM.
170
BIOQUÍMICA CLÍNICA
I – Quando o nível da glicose abaixa no sangue é porque as ilhotas alfa de Langerhans bloqueiam
a produção de glucagon, hormônio que é antagônico à insulina; isso causa diminuição da glicemia,
quebra do glicogênio hepático e acúmulo de glicose pelas células do fígado.
III – Para sabermos como está a função endócrina do pâncreas, devemos dosar as enzimas
pancreáticas no soro, como a lipase e a amilase.
A) Apenas a I é correta.
B) Apenas a II é correta.
I – Afirmativa incorreta.
II – Afirmativa incorreta.
Justificativa: para sabermos como está a função exócrina do pâncreas, devemos dosar as enzimas
pancreáticas no soro, como a lipase e a amilase.
171
Unidade II
BERNARDI, H. L. F.; MOTTA, L. B. D. Desenvolvimento de aplicativo como ferramenta de apoio à investigação e prevenção de
osteoporose. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, v. 21, n. 4, p. 408-418. 2018 (com adaptações).
Com base na leitura e nos seus conhecimentos, avalie as asserções e a relação entre elas.
porque
A osteoporose pode, geralmente, ser prevenida e tratada gerenciando os fatores de risco, garantindo
a adequada ingestão de cálcio e de vitamina D e realizando a prática de exercícios de suporte de peso
e a ingestão de bifosfonatos ou outros medicamentos.
172
BIOQUÍMICA CLÍNICA
I – Asserção verdadeira.
Justificativa: de fato, a osteoporose corresponde a uma condição do ser humano em que ocorre
redução da densidade dos ossos, enfraquecendo-os a tal ponto que se torna uma pré-condição
importante para fraturas. Essa alteração nos ossos não causa sintomas e avança silenciosamente até
que ocorre o infortúnio de uma fratura decorrente de traumas como quedas e batidas. Os fatores de
risco mais importantes relacionados à osteoporose e às fraturas na pós-menopausa são: idade, sexo
feminino, etnia (branca ou oriental), história prévia pessoal e familiar de fratura, baixa densitometria
óssea (DMO) do colo de fêmur, baixo índice de massa corporal, uso de glicocorticoide oral, fatores
ambientais (inclusive o tabagismo), ingestão abusiva de bebidas alcoólicas, inatividade física e baixa
ingestão dietética de cálcio. Todos os pacientes com diagnóstico de osteoporose devem ser avaliados
para fatores de risco (já mencionados) antes do início do tratamento para a osteoporose e para as
fraturas, por meio de histórico, de exames físicos minuciosos e de exames laboratoriais mínimos. Em
casos de suspeita clínica, testes laboratoriais específicos devem ser solicitados para o diagnóstico de
causas de osteoporose secundária. Para tal diagnóstico, é preciso que, a partir de determinada idade,
as pessoas busquem orientação médica com a intenção de avaliar seu histórico clínico e realizar exame
físico detalhado. Recomenda-se, para todos os pacientes, antes do início de qualquer tratamento, uma
avaliação laboratorial mínima, que inclua hemograma completo, cálcio, fósforo, fosfatase alcalina,
função tireoidiana e dosagem de 25(OH), vitamina D sérica e calciúria de 24 horas, além de radiografia
simples lateral da coluna torácica e lombar e medidas da DMO na coluna lombar e no fêmur proximal.
II – Asserção verdadeira.
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